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Análise da toxicidade aguda (DL 50 ) de metabissulfito de sódio em Anomalocardia brasiliana (Gmelin, 1791) Aline Pessoa de Negreiros Carla Freitas de Vasconcelos Danilo José Lima de Sousa Jéssica Oliveira Lima Talita Magalhães de A. Santos Orientadora: Profa. Dra. Ana Fontenele Urano Carvalho Centro de Ciências Departamento de Biologia Disciplina de Fisiologia Animal Introdução A carcinicultura no Estado d Ceará avança de forma desordenada e impactante sobre as regiões de manguezais. Em relatório promovido pelo IBAMA e por pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (MEIRELES, 2005), no qual foi o estudo mais completo sobre os impactos ambientais da carcinicultura no Ceará já efetuado, foram definidos aproximadamente 39 indicadores diretos de impactos ambientais. Os principais danos ambientais relacionados com a carcinicultura foram: desmatamento do manguezal, da mata ciliar e do carnaubal; soterramento de canais de maré; contaminação da água por efluentes dos viveiros e das fazendas de larva e pós- larva; salinização do aqüífero; impermeabilização do solo associado ao ecossistema manguezal, ao carnaubal e à mata ciliar; erosão dos taludes, dos diques e dos canais de abastecimento e de deságüe; fuga de camarão exótico para ambientes fluviais e fluviomarinhos; redução e extinção de habitats de numerosas espécies; extinção de áreas de mariscagem; disseminação de doenças (crustáceos); expulsão de marisqueiras, pescadores e catadores de caranguejo de suas áreas de trabalho; dificultar e/ou impedir acesso ao estuário e ao manguezal; exclusão das comunidades tradicionais no planejamento participativo; doenças respiratórias e óbitos com a utilização do metabissulfito de sódio; desconhecimento do número exato de fazendas de camarão; inexistência de manejo; não definição dos impactos cumulativos e biodiversidade ameaçada (MEIRELES, 2009). Dentre todos esses impactos enumerados, um dos problemas gerados pela indústria da carcinicultura que vem preocupando ambientalistas e estudiosos da área da

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Análise da toxicidade aguda (DL50) de metabissulfito de sódio em

Anomalocardia brasiliana (Gmelin, 1791)

Aline Pessoa de Negreiros

Carla Freitas de Vasconcelos

Danilo José Lima de Sousa

Jéssica Oliveira Lima

Talita Magalhães de A. Santos

Orientadora: Profa. Dra. Ana Fontenele Urano Carvalho

Centro de Ciências

Departamento de Biologia

Disciplina de Fisiologia Animal

Introdução

A carcinicultura no Estado d Ceará avança de forma desordenada e impactante

sobre as regiões de manguezais. Em relatório promovido pelo IBAMA e por

pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (MEIRELES, 2005), no qual foi o

estudo mais completo sobre os impactos ambientais da carcinicultura no Ceará já

efetuado, foram definidos aproximadamente 39 indicadores diretos de impactos

ambientais.

Os principais danos ambientais relacionados com a carcinicultura foram:

desmatamento do manguezal, da mata ciliar e do carnaubal; soterramento de canais de

maré; contaminação da água por efluentes dos viveiros e das fazendas de larva e pós-

larva; salinização do aqüífero; impermeabilização do solo associado ao ecossistema

manguezal, ao carnaubal e à mata ciliar; erosão dos taludes, dos diques e dos canais de

abastecimento e de deságüe; fuga de camarão exótico para ambientes fluviais e

fluviomarinhos; redução e extinção de habitats de numerosas espécies; extinção de áreas

de mariscagem; disseminação de doenças (crustáceos); expulsão de marisqueiras,

pescadores e catadores de caranguejo de suas áreas de trabalho; dificultar e/ou impedir

acesso ao estuário e ao manguezal; exclusão das comunidades tradicionais no

planejamento participativo; doenças respiratórias e óbitos com a utilização do

metabissulfito de sódio; desconhecimento do número exato de fazendas de camarão;

inexistência de manejo; não definição dos impactos cumulativos e biodiversidade

ameaçada (MEIRELES, 2009).

Dentre todos esses impactos enumerados, um dos problemas gerados pela

indústria da carcinicultura que vem preocupando ambientalistas e estudiosos da área da

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saúde, é atribuído à um dos produtos químicos utilizados nas atividades de produção do

camarão, o metabissulfito de sódio, responsável pelo registro de mortes na Delegacia

Regional do Trabalho – Ceará decorrentes da contaminação por esse produto. Essa

substância é utilizada na conservação dos camarões logo após a retirada desses

organismos do viveiro quando eles atingem o tamanho comercial (MEIRELES, 2005).

O metabissulfito de sódio é um composto oxidante e, ao ser lançado no

ambiente, diminui a concentração de oxigênio dissolvido, podendo provocar a morte de

organismos aquáticos. Após se lançado na água, o metabissulfito de sódio libera o gás

dióxido de enxofre que é considerado de insalubridade máxima pelo quadro N° 01 da

Norma Regulamentadora N° 15 do Ministério do Trabalho e Emprego, quando atinge 4

ppm, podendo causar intoxicação aguda se inalado em concentrações elevadas

(MEIRELES, 2005).

A absorção pela mucosa nasal é rápida, e aproximadamente 90% de todo o

dióxido de enxofre inalado é absorvido na via superior, onde a maioria dos efeitos

ocorre. Logo após a absorção, ele é distribuído prontamente pelo organismo, atingindo

tecidos e o cérebro. Observa-se irritação intensa da conjuntiva e das mucosas das vias

aéreas superiores, ocasionando dificuldade para respirar, desconforto, extremidades

arroxeadas, rapidamente seguidas por distúrbio da consciência. A morte pode resultar

do espasmo reflexo da laringe, edema de glote, com conseqüente privação do fluxo de

ar para os pulmões, congestão da pequena circulação, surgindo edema pulmonar e

choque (ARAÚJO & ARAÚJO, 2004).

Segundo ARAÚJO & ARAÚJO (2004), “trabalhar na despesca do camarão

manipulando o metabissulfito de sódio é uma perigosa ocupação. Esses trabalhadores

laboram durante longas horas, realizando a despesca e ao mesmo tempo manipulando os

sacos de metabissulfito de sódio para conservação do camarão. Sua saúde e segurança

esta constantemente em risco”.

Além dos perigos aos humanos por intoxicação através da inalação, podemos

citar também os riscos que podem existir pela ingestão de organismos contaminados

extraídos dos mangues, que são consumidos principalmente pelas comunidades que

moram nas proximidades destes ecossistemas e que tiram o sustento e a sobrevivência

da coleta desta fauna (crustáceos, moluscos, peixes).

Este composto é utilizado também na conservação de alguns tipos de alimentos

pela indústria da alimentação, e seu uso está sob constante e rigorosa supervisão da

Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), na qual estipula como limite

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máximo para o uso como função conservadora em polpas e purês de vegetais as

quantidades de 0,03 g/100 g ou g/100 mL e 0,06 g/100 ou g/100 mL, respectivamente.

Os riscos ambientais, não menos importantes que os riscos causados à espécie

humana, decorrentes da utilização do metabissulfito de sódio na indústria do camarão,

provenientes da carcinicultura, incluindo o metabissulfito de sódio, são lançadas

diretamente nas águas dos manguezais e, como grande parte da fauna desses ambientes

são organismos filtradores, parte deste composto pode acumular-se nesses organismos,

comprometendo, assim, a salubridade desta fauna, bem como do ecossistema de

mangue como um todo.

O molusco bivalve Anomalocardia brasiliana utilizado no presente estudo, é um

representante da fauna de mangue que se utiliza da filtração de material em suspensão

para a captura de sua alimentação. Esta espécie é também utilizada na alimentação

humana e tem grande potencial para o cultivo (BOEHS, 2004). Esse organismos vive

em águas tranqüilas, enterrado alguns centímetros abaixo da superfície da areia

compacta, e possui dois sifões, um inalante, por onde ocorre o fluxo de água para o

interior do animal, e o exalante, por onde a água sai após ser filtrada pelas brânquias do

animal (NARCHI, 1972).

A Anomalocardia brasiliana é classificada como um organismo lamelibrânquio

(comedor de suspensão), possuindo grandes e eficientes brânquias que, além de atuarem

nas trocas gasosas, são usadas para filtrar o alimento em suspensão na água. Cada

brânquia dos bivalves é formada por quatro lamelas. Considerando que cada anima

possui duas brânquias, uma direita e outra esquerda, cada organismo possui oito

lamelas. A porção frontal é a parte mais importante desta estrutura, pois é onde se

encontram os cílios frontais, filamentos longos e delgados que capturam as partículas de

alimentos. Cada um desses filamentos tem uma configuração em V e estão aderidos em

um eixo central (RUPPERT, 2005).

As brânquias são de fundamental importância para a sobrevivência do animal,

pois elas desempenham dois fundamentais processos fisiológicos: a respiração e a

alimentação.

Este trabalho tem como objetivo geral determinar qual a concentração de

metabissulfito de sódio necessária para causar a morte de pelo menos 50% da população

de Anomalocardia brasiliana (DL50).

Tem como objetivo específico realizar análises microscópicas das brânquias de

A. brasiliana e observar mudanças celulares causadas pelo efeito do metabissulfito de

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sódio, bem como, relacionar os possíveis do metabissulfito de sódio em outros

organismos filtradores que fazem parte do mangue.

Metodologia

a) Metodologia de campo.

A coleta do bivalve Anomalocardia brasiliana foi realizada no Rio Ceará (união

do rio com o mar), no Bairro do Ceará em Fortaleza no dia 24 de Outubro de 2009,

sendo coletados 60 espécimes.

Foi realizada a pesquisa da tábua de marés no site do Centro de Previsão de

Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), encontrando-se os dados do nível da maré do

Terminal Portuário do Pecém localizado no litoral do Oeste do Estado do Ceará, que é o

mais próximo do local de coleta. A maré no momento da retirada dos animais do

ambiente, aproximadamente às 08h30min, foi de 1,9, sendo considerada uma maré alta.

Os animais foram coletados manualmente no substrato arenoso da praia e foram

levados em um recipiente com água do próprio ambiente. Também foi coletada água do

ambiente em duas garrafas com capacidade de 20 litros em média para a manutenção

dos animais em aquários e a posterior execução do experimento com metabissulfito de

sódio.

b) Metodologia laboratorial

Para realização do experimento de toxicidade aguda (DL50), foram utilizados 9

aquários, 9 aeradores, 27 litros de água do local da coleta, 54 espécimes de A. brasiliana

e 22,5 g de metabissulfito de sódio. Em cada aquário foram colocados 3 litros de água

do local de coleta e seis espécimes de A. brasiliana. Um dos aquários foi denominado

grupo controle e os oito restantes foram divididos em dois grupos de quatro aquários, o

grupo A e o grupo B, pois o experimento foi feito em duplicata. Em cada grupo, foi

colocado um aquário com cada uma dessas concetrações: 0,75 g/L, 1,5 g/L, 3 g/L e 6

g/L. O experimento ficou montado por um período de uma semana. Após essa semana,

foi feita a contagem de mortos e vivos em cada aquário com o objetivo de

identificarmos a DL50. O esquema da metodologia laboratorial encontra-se no anexo I.

Após essa identificação, foram retiradas as brânquias dos animais que faziam

parte do grupo controle e dos animais que faziam parte dos grupos A e B que estavam

expostos a maior concentração de metabissulfito de sódio.

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Após a retirada da brânquia, esta foi fixada em Cacodilato de Sódio por um

período de 24h, para que ocorra a insolubilidade das proteínas do tecido. Após a

fixação, o tecido foi desidratado sendo submetido a banhos crescentes de etanol por um

período de 1h cada, iniciando em etanol 50% e finalizando em etanol 100%. Realizada a

desidratação, o tecido passou pelo processo de pré-infiltração e infiltração em resina

pelo período de 24h cada. Posteriormente, a formação dos blocos de resina, com o

tecido infiltrando no mesmo, esses blocos foram cortados em micrótomo

(JUNQUEIRA, 1995).

Os cortes feitos em micrótomos foram corados pelo método de Tricrômico de

Gomori para a visualização de tecido conjuntivo e células em geral (CARVALHO,

1993). Para utilização desse método, o corte é mergulhado por 2 min em hematoxilina

sendo posteriormente lavado em água destilada. Após isso, o corte é imerso no corante

Tricrômico de Gomori por 18 min (JUNQUEIRA, 1995).

Além do método de Tricrômico de Gomori, alguns cortes foram corados pelo

método do Azul de Bromofenol, onde ficaram imersos por 1h em Azul de Bromofenol e

depois em ácido acético por 5 min. Após essas imersões, os cortes foram lavados com

água destilada (JUNQUEIRA, 1995). Depois de corados, os cortes foram registrados em

documento fotográfico.

c) Metodologia estatística.

Com o intuito de se encontrar a Dose Letal Média (DL50), os dados encontrados

foram analisados pelo cálculo do probit (FINNEY, 1971) e logit como demonstrado na

tabela abaixo:

Em seguida, foi construído o gráfico onde no eixo da abscissa foram plotados os log das

concentrações e no eixo das ordenadas o logit da porcentagem de mortes. Desta forma,

foi desenhada a reta. Para determinarmos a DL50 foi observado no gráfico onde a reta

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intercepta o eixo da abscissa, encontrando-se o valor de x e este foi utilizado no seguinte

cálculo:

DL50= 10x

Para a confirmação dos resultados, os dados foram analisados através do

software StatPlus 2009. Neste programa, além da DL50 e o seu respectivo gráfico, pode

ser encontrado também os seguinte resultados: erro padrão, limite inferior, limite

superior e nível de significância

Resultados e Discussão

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O metabissulfito de sódio é utilizado como conservante na carcinicultura,

inibindo a deteriorização provocada por bactérias e fungos, evitando também, o

aparecimento de manchas negras, também denominados “Black spot” ou melanose.

Segundo SILVA (1988) o metabissulfito de sódio é o conservante de maior

estabilidade que apresenta a maior quantidade de dióxido de enxofre, quando diluído em

água. LAURILA (1998) afirma que os sulfitos apresentam uma capacidade controladora

do desenvolvimento microbiológico.

Quando em água, o metabissulfito de sódio libera dióxido de enxofre (SO2), a

única forma que possui a capacidade de atravessar as paredes celulares de leveduras e

bactérias. Logo a atividade microbiana é mais pronunciada quanto maior for a

quantidade de SO2 liberada. Por ter uma ação antioxidante, o metabissulfito de sódio

seqüestra o oxigênio tanto da água quanto do alimento, gerando um ambiente anaeróbio,

interferindo sobre os organismos aeróbios presentes. A toxicidade se dá, principalmente,

pela retirada desse oxigênio, ocasionando a mortalidade por asfixia da fauna. Todavia,

os aeróbios que tem a capacidade de serem anaeróbios facultativos e os anaeróbios são

favorecidos com essa redução de oxigênio. Isto faz-se necessário, um conhecimento de

qual microbiota presente no ambiente em que vive o animal (PERAZOLLO, 1994

APUD LIMA, 2008).

No presente trabalho, observa-se um aumento na quantidade de organismos

mortos de Anomalocardia brasiliana à medida que há um aumento na concentração de

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metabissulfito de sódio. A dose letal de metabissulfito de sódio que determina a

quantidade de substância necessária para provocar a morte de pelo menos 50% da

população é 3,18 g/L.

Segundo VALENÇA E MENDES (2004) a solução de metabissulfito de sódio

usada para tratamentos com camarões em tanques de 2000 litros contém 120 kg deste

sulfito, o que equivale a 60 g/L, caracterizando assim, uma concentração muito alta. São

esperados efeitos mais agressivos á fauna do mangue onde esta solução geralmente é

descartada, visto que neste presente trabalho, no qual as concentrações utilizadas foram

bem abaixo do valor citado acima, observa-se já um efeito agressivo.

Efeitos adversos à saúde humana têm sido relacionados a sua ingestão,

principalmente crises asmáticas, reações cutâneas, diarréias, choque anafilático, dores

de cabeça, dores abdominais, náuseas e tonturas em indivíduos sensíveis. O que é

preocupante, devido ao grande número de pessoas que utilizam esse bivalve como

alimento.

A coloração com Tricrômico de Gomori é uma técnica que cora em vermelho o

citoplasma das células devido ao cromotrop 2R presente na solução (BARTH, 1952).

Como podemos observar, os citoplasmas das células dos filamentos braquiais estão

corados em vermelho, o que nos permite identificar as delimitações das células. Durante

o processo de filtração a água passa por entre esses filamentos branquiais, que formam a

lamela, e são filtrados por cílios que estão presentes nos mesmo (foto 02) (RUPPERT,

2005). Através dessa coloração, observamos o formato arredondado dos núcleos, o que

nos permite inferir que as células do tecido branquial são também arredondadas.

O corante Azul de Bromofenol é utilizado para identificar principalmente

proteínas (GUERINO, CRUZ-LANDIM, 2003). Nos cortes onde foi utilizado o método

de Azul de Bromofenol, podemos observar uma coloração mais acentuada nas

extremidades dos filamentos branquiais, evidenciando a presença marcante dos cílios

nos mesmos, que tem papel fundamental no transporte das partículas alimentares (foto

01).

Nas lamelas branquiais de espécimes que não tiveram contato com o

metabissulfito de sódio, observamos um arranjo relativamente ordenado do tecido, onde

os filamentos branquiais se apresentam unidos por suas junções interfilamentosas e as

lamelas unidas por junções interlamelares. Já nos animais com altas concentrações de

metabissulfito de sódio, ocorre um desarranjo do tecido dos filamentos branquiais e das

suas junções, sendo evidenciadas pelo extravasamento celular desse tecido.

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As brânquias são formadas por filamentos branquiais que contem cílios

responsáveis por filtrar o alimento. No decorrer da evolução dos bivalves, a alimentação

por detritos foi sendo gradualmente substituída por uma alimentação por filtração. Nos

animais protobrânquios, que se alimentavam de detritos, a brânquia tinha a função

apenas de respiração, tendo a capacidade de retirar de sua superfície as partículas que,

ao acaso, caiam em sua rede de filamentos. Porém, era vantajoso que o bivalve pudesse

aproveitar essas partículas alimentares que ficavam aderidas em suas brânquias. Com o

tempo, a alimentação seletiva de detritos foi sendo substituída pela filtração, sendo

atualmente os bivalves lamelibrânquios, que são filtradores, os mais abundantes.

O composto usado no experimento, o metabissulfito de sódio, é uma substância

antioxidante que, ao reagir com a água, libera o dióxido de enxofre, um composto que

causa irritações em mucosas. Além de causar irritação nas mucosas, a reação do

metabissulfito de sódio com a água, retira o oxigênio o ambiente que é essencial para a

sobrevivência dos moluscos.

As brânquias dos bivalves são usadas tanto para a respiração como para a

alimentação. A deformação observada no tecido branquial (foto 03), principalmente nas

junções interlamelares e interfilamentosas, sem dúvida estão interferindo nesse

processo. Para que a filtração ocorra, é necessário que o fluxo de água passe por entre os

filamentos para que as partículas de alimento fiquem retidas nos cílios laterais. Como

podemos observar (foto 04) o tecido das junções interfilamentosas foi afetado devido a

reação do metabissulfito de sódio com a água.

Observamos na foto 03 que as junções interlamelares também foram afetadas

pela reação da água com o metabissulfito de sódio. Sem as junções interlamelares, as

lamelas ficam sem conexão, o que desestrutura o canal por onde passa o fluxo de água,

interferindo diretamente no processo de respiração que ocorre nesse canal.

Em relação ao tecido dos filamentos, quando estes são afetados, os cílios que

estão contidos no mesmo ficam com suas funções comprometidas. Sem os cílios

desempenhando suas funções, a filtração do alimento fica impossibilitada de acontecer.

Com as funções respiratórias e alimentares comprometidas, os processos fisiológicos do

animal são afetados e, com o tempo, provoca a morte do mesmo.

Podemos constatar través do estudo realizado que o metabissulfito de sódio pôde

causar danos irreparáveis à fisiologia do animal estudado, assim inferimos que tenha

semelhante ação, ou outras ações tão danosas quanto à observada, à muitas outras

espécies da fauna do mangue.

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O metabissulfito de sódio proveniente da carcinicultura é um composto que

causa impactos ambientais e que, por isso, seu descarte deve ser minimizado nas áreas

de mangue devido a sua toxicidade (ATKINSON, 1993 APUD LIMA, 2008). A

deposição deste resíduo sem tratamento contribui para a salinização do solo e, quando

descartado no meio aquático, compromete a fauna existente no ecossistema (LIMA,

2008).

Tendo em vista a importância ecológica fundamental do manguezal, devido a ser

um local de desova de muitas espécies animais, a utilização e descarte do metabissulfito

de sódio e outros produtos nesse ecossistema causam um grande desequilíbrio,

comprometendo toda uma cadeia alimentar dependente desse ecossistema.

Em estudo desenvolvido na Universidade do Rio Grande do Norte, o

pesquisador Iran Marques de Lima propõe e testa medidas que correspondem a

benefícios ambientais que derivam de ações simples de melhoria do processo produtivo.

Dentre essas medidas, ele indica a utilização de lagoas de decantação para que o

descarte desses resíduos, provenientes da utilização de produtos nocivos, seja o mínimo

possível.

Como medida de minimização da contaminação do efluente com o

metabissulfito de sódio, o pesquisador propõe e também, um sistema de remediação

físico-química, com o objetivo de oxidar os sulfitos à sulfato de sódio, produto

inofensivo em termos ambientais, como uma forma viável e sustentável de produção.

Conclusão

No presente trabalho, verificou-se que houve um aumento na quantidade de

organismos mortos de Anomalocardia brasiliana à medida que houve um aumento na

concentração de metabissulfito de sódio administrada.

Concluímos também que a dose letal de metabissulfito de sódio para A.

brasiliana é de 3.18 g/L, ou seja, a dose necessária para provocar a morte de 50% da

população.

Através das análises histológicas, verificou-se que o corante Tricrômico de

Gomori corou em vermelho o citoplasma das células dos filamentos branquiais. O

corante Azul de Bromofenol corou de forma acentuada as extremidades dos filamentos

branquiais, evidenciando a presença marcante de cílios e demonstrando a composição

protéica destas estruturas ciliares. Constatou-se uma diferenciação histológica entre as

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lamelas branquiais dos animais que foram submetidas ao contato com metabissulfito de

sódio e destas mesmas estruturas do grupo controle do experimento.

Observou-se que o grupo controle apresentou um arranjo ordenado do tecido em

questão, nos quais os filamentos branquiais se apresentaram unidos por suas junções

interfilamentosas e as lamelas unidas por junções interlamelares. Nos animais que foram

submetidos a altas concentrações de metabissulfito de sódio, verificou-se um desarranjo

das lamelas branquiais, sendo evidenciado pelo extravasamento celular. É necessário

que mais estudos sejam feitos para que os impactos causados pelo metabissulfito de

sódio na fauna do mangue sejam amenizados.

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Anexos

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