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INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
ANA BEATRIZ CARNEIRO GUERRA DURO
DECISÕES FEITAS COM BASE NA EMOÇÃO: um estudo sobre como a paixão por
futebol pode influenciar a tomada de decisão, mesmo em situações que não envolvam o
esporte.
RIO DE JANEIRO
2011
ANA BEATRIZ CARNEIRO GUERRA DURO
DECISÕES FEITAS COM BASE NA EMOÇÃO: um estudo sobre como a paixão por
futebol pode influenciar a tomada de decisão, mesmo em situações que não envolvam o
esporte.
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração, Instituto COPPEAD de Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do
título de Mestre em Administração (M.Sc.).
Orientador : Prof. Mauricio Mittelman, PhD.
RIO DE JANEIRO
2011
ANA BEATRIZ CARNEIRO GUERRA DURO
DECISÕES FEITAS COM BASE NA EMOÇÃO: um estudo sobre como a paixão por
futebol pode influenciar a tomada de decisão, mesmo em situações que não envolvam o
esporte.
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração do Instituto de Pós Graduação e
Pesquisa em Administração de Empresas (COPPEAD) da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em
Administração (M.Sc.).
Aprovada por:
_____________________________________________
Mauricio Mittelman, PhD. – COPPEAD/UFRJ
_____________________________________________
Luís Antônio Dib, D.Sc. - COPPEAD/UFRJ
____________________________________________
Angela Maria Cavalcanti da Rocha, Ph.D. - PUC-RIO
RIO DE JANEIRO
2011
Agradecimentos:
Agradeço a Deus e a todos que contribuíram de
alguma forma para a realização deste trabalho,
em especial aos participantes dos experimentos,
pela disponibilidade; ao Roberto por toda ajuda
na elaboração das imagens; aos funcionários do
Coppead, pelo apoio e pela ajuda ao longo
desses anos; e ao professor Maurício Mittelman,
pela orientação e pelo aprendizado
proporcionado, não só pelo desenvolvimento
deste trabalho, como pelas demais disciplinas
ministradas.
Dedicatória:
Dedico este trabalho aos meus pais e minhas
irmãs que sempre me apoiaram e acreditaram em
mim. Ao avô Martins e as minhas avós Rosa e
Quina que são anjos na minha vida. E ao Diego,
por ter tornado minha vida mais feliz.
RESUMO
DURO, Ana Beatriz C. Guerra. Decisões feitas com base na emoção: um estudo sobre
como a paixão por futebol pode influenciar a tomada de decisão, mesmo em situações
que não envolvam o esporte. Dissertação (Mestrado em Administração) - Instituto
COPPEAD de Administração. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2011.
Todos os dias as pessoas tomam decisões. Para tornar o processo mais simples, muitas
vezes elas utilizam alguns atalhos mentais chamados heurísticas. Em uma destas heurísticas,
chamada de heurística da afetividade, as pessoas usam as emoções que sentem,
conscientemente ou não, para tomar decisões. Nesta dissertação conduzimos um experimento
para examinar se a heurística da afetividade poderia levar consumidores a serem influenciados
pelas cores de um clube de futebol quando tomam uma decisão que não tem nenhuma relação
com o esporte. Mostramos que torcedores do Flamengo são mais propensos a investir em
quadros que tenham as cores do Flamengo do que outros torcedores, mesmo que esta decisão
não tenha nenhuma relação com futebol. Também mostramos que torcedores que não gostam
do Flamengo são menos propensos a investir em quadros que tenham as cores do Flamengo
do que outros torcedores, novamente, mesmo que esta decisão não tenha nenhuma relação
com futebol. Concluímos discutindo as implicações teóricas e práticas destes resultados.
Palavras-chave: Heurística da Afetividade. Futebol.
ABSTRACT
DURO, Ana Beatriz C. Guerra. Decisões feitas com base na emoção: um estudo sobre
como a paixão por futebol pode influenciar a tomada de decisão, mesmo em situações
que não envolvam o esporte. Dissertação (Mestrado em Administração) - Instituto
COPPEAD de Administração. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2011.
Everyday people make decisions. To make this process simpler, many times they take
mental shortcuts called heuristics. In one of those heuristics, called affect heuristic, people use
the emotions that they feel, consciously or not, to make decisions. In this thesis, we have
conducted an experiment to study if the affect heuristic can take consumers to be influenced
by the colors of a soccer team, when they make decisions not related to sports. We have
shown that Flamengo’s supporters are more likely to invest in pictures that have the
Flamengo´s colors than other supporters, even if these decisions are not related to soccer. We
have also presented that Flamengo`s rivals supporters are less likely to invest in pictures with
Flamengo`s colors than other supporters, again, even in decisions with no relation to soccer.
We have come to a conclusion, discussing the practical and theoretical implications of these
results.
Keywords: Affect Heuristic.Soccer.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Cartaz do Banrisul no estádio do Internacional de Porto Alegre ............................ 13
Figura 2 – Sistemas 1 e 2 .......................................................................................................... 24
Figura 3 - Características dos dicionários................................................................................. 27
Figura 4 - Características dos sorvetes ..................................................................................... 29
Figura 5 - Cartaz na sede do Flamengo .................................................................................... 35
Figura 6 - Gráfico do % de escolha da opção conservadora pelos torcedores ......................... 49
Figura 7 - Gráfico do % de escolha da opção conservadora pelos não torcedores................... 50
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 11
1.1. Objetivos do estudo .................................................................................................... 13
1.2. Relevância do tema e contribuição do estudo ............................................................... 14
1.3. Organização do estudo ............................................................................................... 15
2. REFERENCIAL TEÓRICO .......................................................................................... 17
2.1. Racionalidade Limitada ............................................................................................. 17
2.2. Heurísticas de Julgamento e Tomada de Decisão ......................................................... 19
2.2.1. Heurística da Representatividade ............................................................................ 20
2.2.2. Heurística da Disponibilidade ................................................................................. 21
2.2.3. Heurística da Ancoragem e Ajustamento ................................................................. 21
2.3. Afetos e Processos de Julgamento e Tomada de Decisão ............................................... 22
2.4. Heurística da Afetividade ........................................................................................... 25
3. CONTEXTO ................................................................................................................. 31
3.1. Futebol ...................................................................................................................... 31
3.2. Cores dos Clubes ........................................................................................................ 35
4. FORMULAÇÃO DAS HIPÓTESES .............................................................................. 37
5. DISCUSSÃO DO MÉTODO .......................................................................................... 38
5.1. Experimentação ......................................................................................................... 38
5.2. Coleta dos Dados ........................................................................................................ 42
5.3. Amostra ..................................................................................................................... 43
5.4. Desenho do Experimento ............................................................................................ 44
5.5. Previsões .................................................................................................................... 46
5.6. Tratamento dos Dados ............................................................................................... 46
5.7. Resultados ................................................................................................................. 48
5.8. Discussão sobre os Resultados..................................................................................... 50
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 53
6.1. Sugestões para pesquisas futuras ................................................................................ 55
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................... Erro! Indicador não definido.
APÊNDICES ............................................................................ Erro! Indicador não definido.
“O futebol é assim: desperta na pessoa um
sentimento virtuoso que transcende a amizade,
que vai além do amor e culmina no santo
desvario da paixão. Tem de tudo um pouco,
porém, é mais que tudo. Torcer por uma camisa
é plena entrega.”
Armando Nogueira
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1. INTRODUÇÃO
Todos os dias as pessoas tomam decisões. Estas decisões vão desde as mais triviais,
como a escolha de que sapato usar, até as mais complexas, como a decisão de com quem se
casar. Para lidar com este número grande decisões freqüentemente usamos heurísticas, que
são atalhos mentais para simplificar o processo de julgamento e tomada de decisão. É quase
inevitável utilizar as heurísticas, pois elas nos ajudam a viver em um mundo onde estamos
constantemente tomando decisões. Por isso, é importante conhecê-las para que haja
consciência dos vieses que elas podem causar.
Nesta dissertação estudamos uma heurística em particular: a chamada affect heuristic,
traduzida aqui como a heurística da afetividade. Sabemos que as emoções têm um papel
importante no processo de tomada de decisões (SLOVIC et al, 2002). Além de considerar
aspectos racionais, as pessoas também consideram aspectos emocionais quando tomam uma
decisão. Por exemplo, elas muitas vezes consultam seus sentimentos e acreditam que esses
sentimentos são uma fonte de informação importante. Quando isto ocorre, dizemos que as
pessoas usaram a heurística da afetividade.
A heurística da afetividade pode ser definida como o poder que as emoções que
sentimos têm para influenciar na formação de um julgamento ou na tomada de uma decisão.
Diversos autores como Kahneman e Tversky (1984) encontraram evidências do uso da
heurística da afetividade na tomada de decisão, demonstrando inclusive que as emoções
podem possuir extrema influência nestes processos e, às vezes, até serem o principal fator
decisório.
12
Wilson et al. (1993) conduziu um estudo interessante que traz evidência da
importância do uso das emoções no processo de tomada de decisão. Estudantes avaliaram
alguns quadros e escolheram um deles para levar para casa. Alguns participantes escreveram
em um pedaço de papel as justificativas para escolher o quadro (ou seja, tomaram a decisão
baseados em razões). Outros apenas fizeram a escolha (comparado ao outro grupo, tomaram
uma decisão menos racional). Após três semanas, os pesquisadores entraram em contato com
todos os estudantes para saber se estavam satisfeitos com a escolha. Aqueles que escreveram
as justificativas responderam que estavam menos satisfeitos do que aqueles que não
escreveram nada. Os resultados sugeriram, portanto, que decisões onde a emoção tem um
peso maior poderiam ser consideradas melhores.
Nesse trabalho, examinamos a heurística da afetividade quando as emoções são
provocadas pelo futebol. Há evidência de que o futebol é capaz de provocar fortes emoções.
Segundo Barbosa (2002), o esporte carrega na sua essência a emoção. No Brasil, o futebol é o
esporte mais popular. Segundo dados de pesquisa feita pela Informidia/SportTrack em 2006
no Estado de São Paulo, o futebol é o esporte preferido por 80% dos homens e 45% das
mulheres, e é assistido por 93% dos homens e 73% das mulheres.
Para provocar essas emoções relacionadas ao futebol usamos um elemento
extremamente simbólico e fortemente associado aos clubes – suas cores. A associação entre o
clube de futebol e suas cores é tão intensa que estas se tornam um de seus elementos
essenciais, e são utilizadas em quase tudo que envolve o clube (por exemplo, na pintura da
sede e dos estádios, nos objetos utilizados pela torcida, nos produtos licenciados pelo clube,
entre outros). Além disso, diversas empresas mudam suas cores para poder expor sua marca
dentro dos estádios sem que haja rejeição da torcida. Um exemplo disso é o Banrisul (Banco
do Estado do Rio Grande do Sul) que tem uma logo azul, mas dentro do estádio do
13
Internacional esta logo é vermelha, já que azul é a cor do clube rival Grêmio. A figura 1
mostra a logo no estádio.
Figura 1 – Cartaz do Banrisul no estádio do Internacional de Porto Alegre Fonte: imagem registrada pela autora
Examinamos a influência das emoções provocadas pelo futebol na tomada de decisões
através de um experimento. Especificamente, conduzimos um experimento que mostrou que
as cores de um clube podem ter influência em decisões totalmente independentes de futebol
tanto para as pessoas que torcem e gostam deste clube como para as pessoas que não gostam
do mesmo.
1.1. Objetivos do estudo
O objetivo desta dissertação foi examinar o uso da heurística da afetividade quando a
emoção era provocada pelo futebol. Especificamente, pretendíamos mostrar que a emoção
14
provocada pelas cores de um clube de futebol poderia influenciar escolhas, mesmo que estas
não tivessem nenhuma relação com o futebol.
1.2. Relevância do tema e contribuição do estudo
O estudo de como as pessoas formam seus julgamentos e tomam suas decisões é o
primeiro passo para entender porque cometemos erros (no sentido de não julgar ou decidir
como gostaríamos) e, portanto, saber o que podemos fazer para evitá-los. Estudar heurísticas é
fundamental para que nos tornemos melhores julgadores e decisores, afinal as heurísticas são
utilizadas em todos os tipos de decisão, desde as mais simples e cotidianas, até as que
envolvem muita complexidade e maior relevância.
Estudos envolvendo a heurística da afetividade são relativamente recentes
(aproximadamente dez anos), portanto trata-se de um assunto ainda pouco explorado e que
vem ganhando cada vez mais relevância. No entanto, estudos já mostraram que a importância
de se considerar a emoção na tomada de decisão é tão grande que Kahneman (2002)
classificou a heurística da afetividade como “provavelmente o mais importante
desenvolvimento no estudo das heurísticas de julgamento nas últimas décadas”.
Como discutimos anteriormente, uma das maiores fontes de emoção no Brasil é o
futebol. Pela posição de destaque que esse esporte ocupa na vida dos brasileiros, é
fundamental conhecer até que ponto a paixão pelo futebol pode influenciar as decisões das
pessoas. No caso de decisões relacionadas a consumo, as empresas devem tomar cuidado para
que suas ofertas não sejam prejudicadas por questões envolvendo o futebol. Por exemplo,
torcedores muitas vezes rejeitam produtos ou serviços que de alguma forma estão associados
a cores de clubes rivais. A Coca-Cola abriu mão de sua tradicional cor vermelha por uma
15
preta na imagem da marca dentro do estádio do Grêmio, já que o time rival, Internacional,
possui a cor vermelha como símbolo.
Sugerimos que quando as pessoas precisam tomar uma decisão e se deparam com as
cores de um clube de futebol, estas cores provocariam emoções, que por sua vez
influenciariam esta decisão. A consulta a estas emoções, isto é, o uso da heurística da
afetividade, faria com que um objeto com as cores de um clube de futebol fosse visto como
mais atrativo pelos torcedores deste clube do que pelos torcedores de clubes rivais, mesmo
que as cores deste objeto não tivesse importância na decisão a ser tomada. Esta dissertação
testou esta hipótese.
1.3. Organização do estudo
O estudo em questão foi dividido em seis capítulos dispostos da seguinte maneira:
• Capítulo 1: Introdução. No primeiro capítulo introduzimos o assunto e
descrevemos o objetivo e a relevância da dissertação.
• Capítulo 2: Revisão da literatura. No segundo capítulo apresentamos os conceitos
teóricos sobre racionalidade limitada, heurísticas e, mais profundamente, a
heurística da afetividade.
• Capítulo 3: Contexto. Abordou temas importantes para a melhor compreensão do
trabalho em questão, tais como a importância do futebol para os brasileiros e o
significado das cores associadas aos clubes.
• Capítulo 4: Formulação das hipóteses. Desenvolvimento das hipóteses testadas.
16
• Capítulo 5: Discussão de método. Apresentou o método e o experimento realizado,
descrevendo seu procedimento e resultados.
• Capítulo 6: Conclusões e sugestões para pesquisas futuras. Discussão dos
resultados obtidos e sugestões para futuros estudos para explorar de outras formas
o tema abordado neste trabalho.
Os seis capítulos são seguidos pela referência bibliográfica e por apêndices.
17
2. REFERENCIAL TEÓRICO
Este capítulo explicitou o referencial teórico utilizado para construção deste trabalho,
abrangendo todos os temas fundamentais para a elaboração do estudo. A racionalidade
limitada e as principais heurísticas que influenciam no processo decisório foram discutidas.
Além disso, a heurística da afetividade, foco deste estudo, foi examinada com mais detalhes.
2.1. Racionalidade Limitada
A teoria econômica neoclássica defende que as pessoas comportam-se como seres
estritamente racionais, que maximizam a utilidade e o prazer, e possuem preferências estáveis
e bem definidas. Além disso, defende que elas têm perfeito conhecimento de todas as
alternativas possíveis, usando as informações que possuem para identificar, ponderar e
ordenar todas as opções viáveis de acordo com suas preferências, escolhendo, no fim do
processo, aquela que maximiza sua utilidade ou seu prazer (CIARELLI, 2005).
Tal teoria começou a ser questionada por diversos trabalhos que traziam evidências de
que as pessoas, na verdade, nem sempre buscam a solução que maximiza a utilidade, e sim
uma solução razoável, porque é muito difícil ter que passar por todas as etapas do pensamento
lógico em todos os julgamentos e decisões que formamos e tomamos diariamente. Ainda na
década de 50, Herbert Simon apresentou a Teoria da Racionalidade Limitada (Bounded
Rationality), na qual defende que o conhecimento de informações e probabilidades de eventos
futuros é restrito. Por isso, a racionalidade humana fica limitada às informações disponíveis.
Simon também sugere que as pessoas simplesmente buscam satisfazer as necessidades ao
invés de maximizar a utilidade (CIARELLI, 2005).
18
De acordo com Macedo, Alyrio e Andrade (2007), existem restrições de tempo e custo
que limitam a quantidade e qualidade da informação disponível. Além disso, as restrições em
relação à capacidade de reter informações e as limitações de inteligência e percepção
restringem a capacidade de calcular com precisão a escolha ótima, e em consequência
dificultam um comportamento estritamente racional. Diante de tais limitações, a solução
maximizadora é substituída pela solução razoável, ou seja, ao invés de examinarem todas as
possíveis alternativas, os decisores estão satisfeitos em encontrar uma decisão que atenda a
um determinado nível aceitável de desempenho.
Segundo Bazerman (2002), existem dois tipos de modelos de tomada de decisão: os
prescritivos ou normativos, que prescrevem métodos para a tomada de decisão ótima, e os
modelos descritivos, que estão relacionados à maneira limitada de como as decisões são
efetivamente tomadas. O presente trabalho examina uma proposição do modelo descritivo.
Ao longo do tempo, pesquisadores como Herbert Simon, Daniel Kahneman e Amos
Tversky mostraram que o modelo racional de julgamento e tomada de decisão (modelo
prescritivo) pode ser inadequado a uma série de situações nas quais as pessoas fazem sua
escolha através de processos mentais diferentes daqueles sugeridos pelo modelo racional. Esta
limitação à racionalidade pode ser justificada pela complexidade e lentidão atribuída ao
processo idealizado pelo modelo racional.
Kahneman e Tversky (1984) complementam dizendo que as dificuldades cognitivas
são a principal limitação para solucionar problemas complexos segundo o que se espera do
comportamento racional. O julgamento e a decisão são feitos, muitas vezes
inconscientemente, em um contexto de busca constante de estratégias mentais simplificadoras
(ÁVILA et al, 2007). Dessa forma, os indivíduos passam a criar atalhos mentais que facilitem
19
e acelerem tal processo, os quais são chamados de heurísticas. Desta maneira, esses
mecanismos passam a ter grande influência no processo de tomada de decisão, visto que
possibilitam uma forma de economia de esforços ao tomar decisões em situações de incerteza
(SANTOS E SPERS, 2007). A utilização destes atalhos pode acontecer em diversas situações,
desde aquelas que envolvam alta complexidade, como decisões estratégicas ou de
investimento por empresas, até as decisões mais simples e rotineiras, como a escolha do
almoço por consumidores.
Não há dúvidas de que as heurísticas facilitam o processo decisório. Porém, elas
também podem induzir a uma visão distorcida da realidade, gerando erros de estimativa de
probabilidade e frequência que podem levar a uma interpretação equivocada do mundo real
(CIARELLI, 2005). Por exemplo, um estudo realizado por Ciarelli (2005) fez a seguinte
pergunta: “qual é o fator responsável pelo maior número de mortes no Rio de Janeiro, roubo
seguido de morte ou AIDS?”. O resultado indicou que as pessoas tendem a responder roubo
seguido de morte, pois as notícias sobre esse tema divulgadas pela mídia são muito mais
frequentes, embora na realidade a AIDS é responsável por um número de óbitos muito
superior do que os assaltos. Isso ocorre devido a utilização da heurística da disponibilidade
que considera que os eventos são mais prováveis de acontecer se as pessoas têm facilidade de
trazê-los à mente. Portanto, o reconhecimento da existência desses vieses pode ser válido na
medida em que possibilitam à pessoa ter cuidado para não cometê-los, melhorando o processo
de tomada de decisão.
2.2. Heurísticas de Julgamento e Tomada de Decisão
As heurísticas de julgamento são definidas por Tversky e Kahneman (1974) como
uma série de estratégias simplificadoras em que as pessoas se baseiam ao tomarem decisões.
20
Funcionam como atalhos que, implicitamente, dirigem o comportamento decisório e servem
como um mecanismo para se lidar com o ambiente complexo que cerca as decisões. De
acordo com Bazerman (2002), as pessoas acabam utilizando heurísticas porque quando
comparados os benefícios de tempo economizado na busca e análise de informações com os
custos de uma redução potencial na qualidade da decisão, os custos parecem ser menores do
que os benefícios gerados. No entanto, é importante frisar que a utilização desses atalhos pode
conduzir a severos e sistemáticos erros. Os três principais tipos de heurísticas apresentados
por Tversky e Kahneman (1974) são: da representatividade, da disponibilidade, e da
ancoragem e ajustamento.
2.2.1. Heurística da Representatividade
A heurística da representatividade pode ser considerada como um julgamento por
similaridade ou baseado em estereótipos. De acordo com Macedo e Fontes (2008), tal
fenômeno acontece quando comparamos a probabilidade de um acontecimento com a de
categorias semelhantes preexistentes. De forma geral, pode-se dizer que uma amostra é
representativa quando ela encerra em si as mesmas propriedades da população. Com isso,
quanto mais representativa for uma amostra, mais provável ela parecerá ser.
Um exemplo dessa heurística, especialmente desse último viés apresentado, pode ser
ilustrado ao perguntar às pessoas sobre a probabilidade de uma sequência de caras (A) ou
coroas (O) quando se joga uma moeda seis vezes. Elas acreditam que a sequência “A-O-A-O-
O-A” é mais provável que a sequencia “A-A-A-O-O-O”, porque essa não parece ser aleatória,
e também mais provável que a sequência “A-A-A-A-O-A” porque não representa a “justiça”
da moeda (TVERSKY E KAHNEMAN, 1974).
21
2.2.2. Heurística da Disponibilidade
A heurística da disponibilidade está associada ao julgamento pela memória, ou seja, a
avaliação da possibidade de certo evento acontecer é estimada pela facilidade com que as
ocorrências do evento podem ser trazidas à mente (KAHNEMAN et al., 1982). Por exemplo,
Kahneman, Slovic e Tversky fizeram um estudo no qual os participantes deveriam ler uma
lista com nomes de personalidades conhecidas de ambos os sexos e depois dizer se a lista
continha mais nomes masculinos ou femininos. Havia dois tipos de listas: uma com nomes de
mulheres relativamente mais famosas do que os homens na lista, mas que incluía, no total,
maior número de nomes masculinos, e outra com nomes de homens relativamente mais
famosos do que as mulheres, mas que tinha, no total, mais nomes femininos. Para os dois
casos, os participantes foram influenciados pelos nomes mais famosos e opinaram
incorretamente sobre o sexo com a maior presença.
De acordo com Bazerman (2002), um dos maiores problemas oriundos dessa
heurística é que um evento que evoca emoções, é vívido, facilmente imaginado e específico
será mais disponível do que um evento que é não emocional em sua natureza, insípido, difícil
de imaginar ou vago. Além disso, a superexposição a uma determinada situação também pode
torná-la mais disponível na memória e, consequentemente, tendemos a acreditar que seja mais
provável de acontecer.
2.2.3. Heurística da Ancoragem e Ajustamento
A heurística da ancoragem e ajustamento ocorre quando um indivíduo se apóia em um
valor de referência (âncora) para escolher um determinado rumo de ação e ajusta
22
insuficientemente esse valor para chegar a uma decisão final (ajustamento). Esse efeito
consiste na elaboração de previsões com relação a uma determinada variável através de um
processo de ajuste de valores previamente estabelecidos como ponto de partida. Nesse caso,
as previsões estariam sempre enviesadas, uma vez que pontos de partida diferentes levariam a
previsões diferentes. Por exemplo, dois grupos do ensino médio tinham cinco segundos para
estimar o valor de uma expressão numérica escrita em um quadro (TVERSKY E
KAHNEMAN, 1974). Para um grupo foi apresentada a seguinte ordem: 8x7x6x5x4x3x2x1.
Já para o segundo grupo a ordem foi inversa: 1x2x3x4x5x6x7x8. Com apenas cinco
segundos, não era possível fazer o cálculo e a estimativa era feita por extrapolação ou
ajustamento. Os resultados mostraram que o primeiro grupo teve como média o número
2.250, já o segundo, teve como média 512.
2.3. Afetos e Processos de Julgamento e Tomada de Decisão
De acordo com Slovic et al (2002), o termo “affect”, aqui traduzido como afeto ou
reações afetivas, é descrito como a qualidade de bom ou ruim que pode assumir o estado de
espírito de uma pessoa “conscientemente ou não” frente a um determinado estímulo.
Como dito anteriormente, a emoção não foi considerada na literatura de julgamento e
tomada de decisão por um longo período, cujos mecanismos foram tradicionalmente
conceituados como cognitivos por natureza e descritos como baseados somente no modelo
racional. Apesar do afeto ter desempenhado um papel importante em várias teorias
comportamentais, ele raramente era reconhecido como um importante componente do
julgamento e tomada de decisão (SLOVIC et al, 2002).
23
Um dos primeiros pesquisadores que defendem a importância do afeto na tomada de
decisão foi Zajonc (1980), ao propor que reações afetivas a um estímulo são frequentemente
as primeiras reações, ocorrendo de forma automática e guiando e influenciando o
processamento da informação e o julgamento (SLOVIC et al, 2002). Zajonc diz que todas as
percepções contêm algum nível de afeto. Por exemplo, as pessoas não vêem apenas uma casa;
elas vêem uma casa bonita ou uma casa feia. Também sugeriu que às vezes os indivíduos se
iludem achando que se comportam de uma maneira extremamente racional e analisam os prós
e contras das alternativas, quando na verdade eles decidem por “X” simplesmente porque eles
gostaram de “X” (ZAJONC 1980). Desta forma são escolhidos carros, casas e empregos e,
posteriormente, as pessoas justificam essas escolhas com várias razões. Kahneman e
Frederick (2002) complementam dizendo que a maior parte dos julgamentos e das escolhas é
feita intuitivamente e que as regras que guiam a intuição geralmente são as mesmas que
guiam a percepção (KAHNEMAN, 2003).
Solomon (2002) coloca o afeto como um dos componentes das atitudes, estando
associado às emoções ou sentimentos do indivíduo e fazendo algum tipo de avaliação em
relação ao objeto. O mesmo pesquisador sugere que, tradicionalmente, as variáveis
componentes das atitudes estejam dispostas em uma sequência fixa com a seguinte ordem:
cognições � afeto � comportamento. Isso estaria de acordo com o pensamento de “antes de
eu poder gostar ou desgostar de algo, eu preciso saber do que se trata”. Porém, Solomon
(2002) já destacava que esta sequência poderia variar dependendo do nível de envolvimento
do consumidor e das circunstâncias.
Alguns pesquisadores, como Zanjoc (1980), em oposição ao pensamento de Solomon,
defendem que a cognição deve vir após o afeto, que é sempre o primeiro desta sequência,
visto que as respostas afetivas ocorrem rapidamente e automaticamente. Para ilustrar essa
24
afirmação, Slovic et al (2002) atenta para a velocidade das sensações associadas ao estímulo
das palavras “tesouro” ou “ódio”, e sugere que, apesar da análise ser muito importante em
determinados tipos de tomada de decisão, confiar no afeto e na emoção é um jeito mais
rápido, fácil e eficiente de navegar em um mundo incerto, complexo e, às vezes, perigoso.
Com base na importância de um componente afetivo na tomada de decisão, Epstein
(1994) explica que as pessoas percebem a realidade de duas maneiras diferentes: uma de
forma intuitiva, automática, natural, não verbal, narrativa e empírica; e outra de forma
analítica, deliberativa, verbal e racional. De maneira semelhante, Kahneman (2003) propõe
que existem dois modos de pensar e decidir: um baseado na razão e outro baseado na intuição.
O primeiro é feito de forma deliberativa e com esforço; já o segundo é espontâneo,
inconsciente e sem esforço. Para tanto, ele utilizou a nomenclatura criada por Stanovich e
West (2000): Sistema 1 para o sistema intuitivo e Sistema 2 para o sistema deliberativo
(FARIAS, 2009). A figura a seguir mostra o mapeamento proposto por Kahneman.
Figura 2 – Sistemas 1 e 2 Fonte: Adaptado de Kahneman, 2003
25
De acordo com Kahneman (2003), o Sistema 1 age de maneira rápida, automática,
associativa, sem esforço e frequentemente carregado de emoção. Além disso, é difícil de
controlar e modificar este sistema. Já o Sistema 2 atua de forma lenta, serial, controlada
deliberadamente, com esforço, relativamente flexível e potencialmente guiada por regras.
Esses dois sistemas são independentes, porém eles interagem e se misturam, influenciando
todo o processo de julgamento e tomada de decisão.
Farias (2009) explica que os processos perceptuais (visão, audição, olfato) em
conjunto com as operações intuitivas do Sistema 1 gerariam impressões de qualquer elemento
analisado. Tais impressões seriam involuntárias e não seriam necessariamente verbalizadas de
forma explícita. Já o Sistema 2 estaria envolvido em todos os julgamentos, independente deles
terem sido originados em impressões do Sistema 1 ou pelo raciocínio deliberado do próprio
Sistema 2. O termo “intuitivo” seria aplicado a todos os julgamentos formados por impressões
geradas pelo Sistema 1.
Assim, pode-se dizer que o Sistema 1 está diretamente ligado ao afeto e, ao se deparar
com qualquer objeto ou situação, procura automaticamente em seus bancos de memória os
eventos relacionados, incluindo as emoções provocadas por esses eventos. Dessa forma, se os
sentimentos ativados são agradáveis, eles motivam ações e pensamentos para reproduzir os
mesmos sentimentos. Por outro lado, se os sentimentos são desagradáveis, eles motivam
ações e pensamentos para evitá-los (EPSTEIN,1994).
2.4. Heurística da Afetividade
As respostas afetivas explicitadas anteriormente que podem aparecer no processo e
tomada de decisão vão depender de alguns fatores, como as características da pessoa, da
situação, além da interação entre essas características (SLOVIC et al, 2002).
26
Slovic defende que essas impressões afetivas, positivas ou negativas, guiariam
julgamentos e tomadas de decisão posteriores. Isto ocorreria da seguinte forma: todas as
situações vividas, as imagens, as representações de objetos que povoam a mente das pessoas
seriam marcadas e associadas a algum tipo de impressão afetiva de acordo com a sensação
gerada, seja ela boa, má, forte, neutra, etc. Desta maneira, ao se deparar com uma situação
semelhante em um novo processo de julgamento ou tomada de decisão, as pessoas
resgatariam (de forma automática) de seu “arquivo afetivo” as “impressões” associadas
consciente ou inconscientemente aos objetos/pessoas/eventos em questão (FARIAS, 2009).
Isso serviria como uma espécie de atalho mental não apenas para decisões rotineiras, mas para
julgamentos e decisões relevantes.
De acordo com Slovic et al. (2002), esse “resgate” a uma resposta afetiva prontamente
disponível pode ser mais fácil e eficiente do que pesar os prós e contras ou recuperar da
memória uma gama de exemplos relevantes, especialmente quando a decisão ou julgamento
em questão é complexo demais ou os recursos mentais são limitados. Em conseqüência o uso
das respostas afetivas se caracteriza como um “atalho mental” é o que nos permite classificá-
la como uma heurística, aqui chamada de “affect heuristic” ou heurística da afetividade.
Vários estudos empíricos demonstram o uso da heurística da afetividade. Para ilustrar,
descreveremos alguns destes estudos.
O primeiro estudo mostra que apesar dos riscos e benefícios serem positivamente
correlacionados na maior parte das situações, eles podem ser negativamente relacionados na
cabeça das pessoas. Alhakami e Slovic (1994) concluíram que a relação inversa entre o risco e
benefício percebido em uma atividade está ligada à intensidade do afeto positivo ou negativo
relacionada a esta atividade, já que as pessoas baseariam seu julgamento no que elas sentem e
não no que elas pensam. Ou seja, se elas gostam da atividade, elas vão avaliar os riscos como
27
baixos e os benefícios como altos. Se elas não gostam, elas tendem a considerar os riscos altos
e os benefícios baixos (SLOVIC et al., 2002). Por exemplo, cigarro e bebidas alcoólicas
tendem a ser considerados com alto risco e baixo benefício. Por outro lado, vacinas,
antibióticos e raio-X tendem a ser considerados com altos benefícios e baixo risco.
O segundo estudo sugere que a forma como as pessoas percebem a situação influencia
as impressões afetivas. Em um estudo feito por Hsee (1996) foi pedido que os participantes
imaginassem que estavam à procura de um dicionário de música. Na condição de avaliação
conjunta, foram apresentados aos participantes dois dicionários A e B (Figura 3) e perguntado
quanto eles pagariam por cada um. Os participantes estavam dispostos a pagar mais pelo
dicionário B, provavelmente porque ele possuía um maior número de verbetes. No entanto,
nas condições de avaliação separada, quando um grupo avaliou somente o dicionário A e
outro grupo avaliou somente o dicionário B, o valor médio que os participantes
demonstravam estar dispostos a pagar pelo dicionário A foi muito mais elevado do que o
valor médio referente ao dicionário B.
Figura 3 - Características dos dicionários Fonte: Adaptado de Hsee (1996)
A discrepância entre o valor atribuído aos dicionários nas duas condições é explicada
por Hsee como efeito do princípio de “evaluability”, traduzido como capacidade de avaliação.
No caso do estudo exposto anteriormente, na condição de avaliação separada é difícil avaliar
28
quão bom ou ruim é o número de verbetes em um dicionário sem que haja uma comparação
direta. Porém, o estado da capa é um atributo fácil de ser avaliado, levando a uma impressão
positiva ou negativa, e com isso tem um impacto significativo na avaliação dos dicionários. É
compreensível que a maior parte das pessoas ache um dicionário defeituoso desinteressante e
um dicionário novo atrativo. Na condição de avaliação conjunta, na qual o participante pode
fazer uma comparação direta, o número de verbetes que para muitos é mais importante que o
estado da capa, torna-se mais precisamente “avaliável”, e em consequência ganha mais peso
no julgamento de quanto se está disposto a pagar pelo dicionário. Com base no princípio da
capacidade de avaliação, pode-se dizer que o peso de um atributo em uma avaliação ou
escolha é proporcional à facilidade ou à precisão com que este atributo pode ser convertido
em uma impressão afetiva (FARIAS, 2009).
Seguindo o mesmo conceito, probabilidades ou proporções são em geral altamente
avaliáveis, refletindo a facilidade em que as pessoas reconhecem que uma probabilidade alta
de um evento desejável é algo bom, e uma probabilidade baixa do mesmo é ruim (FARIAS,
2009). Hsee (1996) descreve um experimento no qual dois diferentes recipientes contendo
sorvete (apresentados na figura 4) foram avaliados separadamente e em conjunto por grupos
diferentes. Quando avaliados separadamente, o valor médio que as pessoas estavam dispostas
a pagar pelo recipiente de tamanho maior (semi-cheio e contendo a maior quantidade de
sorvete) era menor do que o valor médio para o recipiente menor (contendo uma quantidade
de sorvete menor, porém “transbordando”). Vale ressaltar que os participantes foram
informados sobre o tamanho dos copos e a quantidade de sorvete, juntamente com o desenho
dos mesmos. Por outro lado, quando foi feita a avaliação conjunta, o resultado era o oposto,
ou seja, o valor médio que as pessoas estavam dispostas a pagar pelo recipiente de tamanho
maior era maior do que o valor médio para o recipiente menor.
29
Figura 4 - Características dos sorvetes Fonte: Adaptado de Hsee (1996)
Desta forma, percebemos que a proporção do recipiente que estava cheio obteve maior
valor médio nas avaliações em separado do que a quantidade absoluta de sorvete, o que,
ocorreu porque as proporções provocaram impressões afetivas mais precisas, tornando-se por
isso atributos mais fáceis de serem avaliados do que quantidades absolutas, que por sua vez
levaram menor peso nas avaliações em separado (FARIAS, 2009).
Outro experimento que utiliza esse conceito já foi realizado nos EUA, no Reino Unido
e, há pouco tempo, no Brasil por Farias (2009). Nele foi solicitada a cada um dos três grupos
participantes a avaliação, através de uma escala de zero (não é atrativo de nenhuma forma) a
20 (extremamente atrativo), de um dos três jogos abaixo (cada grupo só tinha acesso ao seu
próprio jogo):
• Jogo A: probabilidade de 7/36 de ganhar US$9,00 e 29/36 de ganhar nada.
• Jogo B: probabilidade de 7/36 de ganhar US$9,00 e 29/36 de perder US$0,05.
• Jogo C: probabilidade de 7/36 de ganhar US$9,00 e 29/36 de perder US$0,25.
30
O jogo B (com a perda de US$0,05) teve média de 13,18 de atratividade, e o jogo C
(com a perda de US$0,25), teve média de 12,45. Ambos obtiveram uma avaliação maior do
que a do jogo A (sem perdas), que ficou apenas com 11 de atratividade.
O resultado esperado era que o jogo A fosse percebido como mais atrativo já que é o
único que não envolve perdas financeiras em caso de derrota e que as características dos três
jogos são idênticas, com exceção dos payoffs em caso de perda. Farias (2009) justifica que o
resultado inesperado sugere que no jogo A a probabilidade de ganho de 7/36 gera uma
impressão afetiva razoavelmente precisa: é uma possibilidade não interessante, já que é muito
mais provável não ganhar do que ganhar. Ao contrário, a impressão afetiva referente aos
US$9,00 pode ser imprecisa, refletindo a dificuldade de avaliar esta quantia monetária sem
nenhum contexto particular. Já nos jogos B e C a adição de uma pequena perda à dimensão
dos payoffs fornece um novo contexto para a avaliação do payoff em caso de vitória
(US$9,00). Segundo Bateman et al. (2007), a combinação de um possível ganho de US$9,00
com uma possível perda de US$0,05 (ou até US$0,25) consiste em uma relação muito
atraente de ganho ou perda. Assim, os participantes ao se depararem com estas relações
atraentes (que invocariam impressões afetivas positivas precisas) de perda e ganho (US$9,00/-
US$0,05 e US$9,00/-US$0,25), ao avaliarem os jogos B e C colocariam mais peso nesta
relação atraente de payoffs, e menos nas probabilidades, que, como vimos anteriormente, são
consideradas desinteressantes, pois há maior probabilidade de perda do que de ganho
(FARIAS, 2009).
Através da análise desses experimentos é possível perceber que as respostas afetivas
transmitem significado às informações. Sem elas, as informações careceriam de relevância, e
por isso receberiam menor peso na tomada de decisão. De acordo com Farias (2009), a
utilização destas impressões afetivas na tomada de decisão caracterizaria a heurística afetiva.
31
3. CONTEXTO
Este capítulo teve por objetivo descrever os elementos que provocam as emoções usadas
pela heurística da afetividade estudada nesta dissertação. Para tanto, discutimos o futebol em
geral e no Brasil e a importância das cores de um clube.
3.1. Futebol
O futebol é certamente um dos esportes mais populares do mundo. O atual presidente da
FIFA Joseph Blatter comentou com o antigo secretário Geral da ONU, Kofi Annan, que a
FIFA reunia mais países que a própria ONU (DOSSIÊ DO ESPORTE, 2006). Isso pode ser
comprovado já que praticamente todas as nações do mundo, da Albânia ao Zaire, participaram
da fase de qualificação para a última Copa do Mundo.
Além disso, o evento esportivo mais lucrativo e esperado do mundo é a Copa do
Mundo, ocorrida de quatro em quatro anos e acompanhada por mais da metade da população
mundial. Para se ter uma ideia de como a competição é importante e ganha ainda mais
importância com o passar do tempo, Ricardo Teixeira (presidente da Confederação Brasileira
de Futebol - CBF) declarou já ter conseguido amealhar 300 milhões de dólares para a Copa do
Mundo no Brasil, mesmo três anos antes da competição que ocorrerá em 2014. Para fins
comparativos, a África do Sul (último país sede da Copa) não conseguiu faturar 40 milhões de
dólares em todo o período dos jogos.
No Brasil essa relação com o futebol é tão forte que o país é conhecido como “o país
do futebol”. Sem dúvida, o futebol é o esporte preferido da população. Segundo dados de
pesquisa feita pela Informidia/SportTrack, em 2006, o futebol é o esporte preferido por cerca
32
de 80% dos homens e 45% das mulheres, sendo assistido por 93% dos homens e 73% das
mulheres. A pesquisa publicada em 2010 pelo diário “Lance!” também confirma o futebol
como o esporte preferido pelos brasileiros, tanto como o esporte mais praticado como o
esporte mais acompanhado pela mídia.
Em grandes eventos, como a Copa do Mundo de Futebol, é comum ver ruas e casas
ornamentadas, pessoas usando roupas e adereços com as cores da seleção brasileira e uma
mobilização grande para que amigos se reúnam para assistir aos jogos. Até as pessoas que
dizem não gostar de futebol também participam. O futebol possui um lugar de destaque tão
relevante na vida dos brasileiros que qualquer partida envolvendo a seleção brasileira de
futebol, mesmo amistosos, tem espaço garantido na grade de programação da maior emissora
do país, independente do horário. Além disso, brincadeiras como dizer que “cada pessoa
possui um técnico dentro de si” também demonstram essa relação. Já dizia o escritor Nelson
Rodrigues que a seleção brasileira é “a pátria de chuteiras”.
A pesquisa publicada em 2010 pelo diário “Lance!” apresenta dados muito
interessantes sobre o consumo do torcedor de futebol no Brasil. As principais conclusões
estão relacionadas a um mercado potencial gigantesco, mas ainda pouco explorado pelos
clubes e seus patrocinadores, sobretudo na relação com seus milhões de torcedores,
comercialização de seus jogos, e ações de marketing e vendas de produtos.
No entanto, os números atuais já demonstram um mercado robusto. De acordo com a
área Esporte Total da BDO RCS, empresa de auditoria e consultoria, o mercado brasileiro de
clubes de futebol atingiu receita recorde de R$ 2,18 bilhões em 2010, montante 13,4% maior
em relação a 2009. Na evolução dos últimos oito anos, o crescimento acumulado é de 171%.
33
As fontes que mais contribuíram para esse resultado foram patrocínio e publicidade
(responsáveis por 17% do faturamento dos clubes) e cotas de TV (28%).
Segundo dados da Informídia (empresa especializada em pesquisas sobre retorno de
mídia no esporte), em 2010 o futebol foi responsável por mais de 65% de toda programação
esportiva na televisão brasileira. Além disso, detém mais de 77% do valor de exposição
(medida feita com o preço do espaço de mídia em que o esporte foi transmitido).
Desta maneira, o destaque que o futebol alcança no Brasil o caracteriza como uma
identidade cultural1. A expressão pessoal de um torcedor dentro dessa identidade cultural é
feita pelo seu clube de escolha. Mullin, Hardy e Sutton (2004) explicam que os fatores que
levam um indivíduo a escolher um determinado clube podem ser ambientais e/ou individuais.
Os fatores individuais incluem a auto-imagem da pessoa, etapa da vida, ciclo familiar,
motivações e atitudes. Já os fatores ambientais são apontados como os maiores
influenciadores no processo de escolha de um clube e incluem outras pessoas significativas
como familiares e amigos, normas sociais e culturais, e condições geográficas. Existem dois
destes fatores que merecem destaque. O primeiro é a influência que os pais exercem nessa
escolha, muitas vezes caracterizada através de presentes associados ao clube, como a camisa
oficial. O outro fator é a localização geográfica, já que torcedores estarão em geral mais
propensos a optar por clubes de sua região.
Entretanto, vale ressaltar que torcer por um clube é uma questão mais psicográfica do
que geográfica já que existem torcedores de um mesmo clube em diversas regiões e a divisão
1 Identidade cultural é o sentimento de identidade de um grupo ou cultura, ou de um indivíduo, na medida em que ele é influenciado por pertencer a um grupo ou cultura.
34
é feita com base em interesses e como as pessoas conduzem suas vidas (Churchill e Peter,
2005).
Mullin, Hardy e Sutton (2004) afirmam que devido às condições de elevadas
descargas emocionais que o esporte proporciona, o consumidor esportivo possui um
comportamento diferenciado. Isso porque o torcedor possui uma fidelidade com seu clube que
nenhum outro produto é capaz de oferecer (BENAZZI E BORGES, 2008). Essa fidelidade é
justificada porque raramente as pessoas mudam de clube. No entanto, não basta que um clube
tenha muitos torcedores para que seus produtos sejam vendidos com sucesso; é necessário
incentivar o envolvimento da torcida com o clube. É a qualidade do fã em termos de
envolvimento e comprometimento que irá determinar seus hábitos de consumo e seu potencial
para geração de receitas para o clube.
Como o Dossiê do Esporte (2006) bem destaca, sob qualquer aspecto que se olhe, o
torcedor é tão importante para o esporte quanto o atleta. Isso justifica o fato de que, em alguns
casos disciplinares um clube pode ser condenado a jogar sem a presença de sua torcida.
Roberto da Matta, no mesmo dossiê, complementa dizendo que “a torcida sabe que tem
capacidade de jogo, sabe que pode influenciar o resultado”.
Devido ao enorme peso que a paixão e emoção possuem no esporte, pode-se perceber
que a influência destas não está limitada a questões que estejam relacionadas ao futebol.
Também não se pode limitá-las a decisões ou produtos que envolvam futebol. Até em
decisões distantes deste tipo de assunto, a paixão pelo futebol pode ter uma grande influência
na escolha que as pessoas fazem, muitas vezes até de forma inconsciente.
35
3.2. Cores dos Clubes
Os torcedores tendem a torcer por um clube graças ao que ele representa em termos
emocionais e graças à identificação com seus símbolos, como uniforme, brasão, hino,
bandeira, e torcida organizada. Entre esses símbolos, um dos elementos mais associativo ao
clube são suas cores. A associação entre o clube de futebol e suas cores é tão intensa que elas
acabam sendo elementos essenciais, utilizados em quase tudo que envolve o clube, como na
pintura da sede e dos estádios, nos objetos utilizados pela torcida, e nos produtos licenciados
pelo clube. Além disso, elas também exercem um papel de destaque para identificar o clube,
como o rubro-negro carioca (Flamengo) e o tricolor das Laranjeiras (Fluminense). Utilizando
a mesma ideia, o Flamengo, quando foi campeão da Taça Guanabara em 2011, colocou um
enorme outdoor em sua sede mostrando uma imagem do Rio de Janeiro em preto e vermelho
com os seguintes dizeres: “o Rio na cor certa”. A figura 5 mostra como era o cartaz.
Figura 5 - Cartaz na sede do Flamengo Fonte: imagem registrada pela autora
Reconhecendo essa importância, diversas empresas que querem se associar ao futebol
se adaptam para agradar aos torcedores. O site Globo Esporte, um dos sites mais populares de
esporte no Brasil, muda a cor de sua logo em cada página de notícia dos clubes. Ou seja, na
página no Palmeiras, a logo aparece em verde, na do Cruzeiro, em azul. Outro caso muito
conhecido é o do Mc Donald’s. A empresa que é reconhecida mundialmente por seu nível de
36
padronização, trocou o vermelho e amarelo característicos de seus restaurantes em todo o
mundo perto do estádio do Besiktas, na Turquia, porque são as cores do seu maior rival
Galatasaray.
Como este estudo foi realizado no Rio de Janeiro, a escolha para o desenvolvimento
do experimento foi baseada nos quatro principais clubes do estado: Botafogo (Botafogo de
Futebol e Regatas), conhecido pelas cores branca e preta; Flamengo (Clube de Regatas do
Flamengo), conhecido pelas cores preta e vermelha, Fluminense (Fluminense Football Club),
conhecido pelas cores branca, grená e verde; e Vasco (Clube de Regatas Vasco da Gama),
conhecido pelas cores branca e preta, com a cruz de malta vermelha. Para simplificar os
experimentos usamos as cores de um único clube. Em uma análise prévia, foi possível
perceber que as cores branca e preta, que representam Botafogo e Vasco, formam uma
combinação muito comum, que dificilmente seria associada ao futebol quando apresentadas
fora de um contexto esportivo. Optamos por usar as cores do Flamengo, e não do Fluminense,
porque este clube possui a maior torcida do Brasil. Segundo a 4ª Pesquisa LANCE!-Ibope
realizada com 7.109 pessoas em 141 cidades do território nacional, pelo instituto de pesquisas
Ibope, no primeiro trimestre de 2010, 17% dos respondentes declararam-se torcedores deste
clube, enquanto apenas 1,5% declararam-se torcedor do Fluminense. Além disso, tal pesquisa
também perguntou sobre a rejeição aos clubes, e mostrou que o Flamengo é o clube carioca
mais rejeitado (16% dos entrevistados). Já o Fluminense, parece ser o clube carioca com a
menor rejeição por parte dos torcedores de clubes rivais.
37
4. FORMULAÇÃO DAS HIPÓTESES
O capítulo anterior mostrou que a paixão pelo futebol é tão forte que pode influenciar
as escolhas das pessoas, até mesmo sem que elas percebam. Essa capacidade de gerar tanta
emoção faz com que as pessoas recorram à heurística da afetividade para tomar as decisões
que elas tenham que tomar. Além disso, as cores de um clube de futebol não geram apenas
emoções positivas. Quando estas cores são de um clube rival, elas também geram emoções
negativas. Com base na teoria sobre a heurística da afetividade exposta no capítulo 2 e na
capacidade que as cores de um clube de futebol tem de provocar emoções discutida no
capítulo 3, formulamos as seguintes hipóteses para nortear o experimento:
H1: Os torcedores de um clube de futebol tendem a perceber uma opção como mais
atrativa do que os outros torcedores quando esta opção faz referência às cores de seu
clube, ainda que a decisão não tenha nenhuma relação com esportes.
H2: Os torcedores que não gostam de um clube de futebol tendem a perceber uma
opção como menos atrativa do que os outros torcedores quando esta opção faz
referência às cores deste clube, ainda que a decisão não tenha nenhuma relação com
esportes.
Um experimento foi conduzido para testar estas hipóteses.
38
5. DISCUSSÃO DO MÉTODO
Este capítulo teve por objetivo explicitar como a pesquisa foi conduzida, fornecendo
informações sobre aspectos metodológicos e detalhes do experimento realizado. Primeiro,
colocamos uma breve explicação sobre a experimentação, metodologia utilizada no
desenvolvimento deste estudo, bem como suas vantagens e limitações. Em seguida
descrevemos o experimento, detalhando o procedimento de coleta de dados, as características
da amostra, o desenho geral do experimento e as previsões feitas com base nas hipóteses
formuladas. Concluímos apresentando os resultados obtidos e discutindo estes resultados.
Em resumo, este estudo utilizou a metodologia experimental. O experimento teve
como objetivo responder a seguinte questão: emoções provocadas pelas cores de um clube de
futebol podem influenciar julgamentos e decisões que não sejam de nenhuma maneira
relacionados a esporte? Utilizamos as cores de um clube de futebol para provocar as emoções
que supostamente seriam usadas se os participantes recorrerem à heurística da afetividade
para tomarem suas decisões.
5.1. Experimentação
A metodologia empregada no trabalho em questão é a experimentação. De acordo com
Malhotra (2006), experimento é o processo de manipulação de uma ou mais variáveis
independentes e medição de seu efeito sobre uma ou mais variáveis dependentes, controlando
ao mesmo tempo as variáveis estranhas. Desta maneira, o pesquisador manipula determinadas
variáveis (chamadas de variáveis independentes) com o objetivo de medir e comparar seu
efeito sobre outras variáveis (chamadas de variáveis dependentes). No entanto, isso deve ser
39
feito com cautela para que outras variáveis, diferentes das variáveis independentes, não
influenciem as respostas.
Segundo Tonetto (2009), para comparar se uma resposta muda em função da
manipulação do estímulo, utiliza-se pelo menos dois grupos: um grupo de controle, que não
recebe tratamento, e um grupo experimental, que recebe tratamento. Quando aplicamos o
tratamento ao grupo experimental dizemos que fizemos uma manipulação.
Ao realizar um experimento, o pesquisador tem duas opções: realizá-lo em laboratório
ou em um ambiente de campo. Na primeira opção, é criado um ambiente artificial com as
condições específicas para o experimento; já na segunda opção, o experimento se realiza em
condições efetivas de mercado. O grande risco de criar o ambiente é que a artificialidade do
ambiente pode causar erro de reação, ou seja, o efeito é obtido porque o experimento foi
desenhado de tal forma que os participantes acabam fazendo o que se quer, ou porque os
respondentes tentam adivinhar o propósito do experimento e responder de acordo com o
esperado, e não porque a hipótese está correta.
Uma das grandes vantagens da utilização de experimentos é a possibilidade de detectar
relações entre o comportamento limitadamente racional dos consumidores e suas causas
(MUNIER et al., 1999). Por esse motivo, a condução de experimentos, tanto em pesquisa de
mercado quanto acadêmica, tende a expandir-se em perspectiva internacional.
Segundo Farias (2009), esta expansão já vem acontecendo nos últimos anos de
maneira significativa, porém questões relacionadas a possíveis violações das validades interna
e externa da pesquisa podem limitar a confiabilidade de seus resultados. Com base em
Malhotra (2006), esses dois conceitos de validade serão explicados a seguir.
40
Dizemos que um experimento tem validade interna se pudermos afirmar com alto grau
de certeza (é impossível ter certeza absoluta) que a manipulação das variáveis independentes,
ou tratamentos, foi a causa dos efeitos observados sobre as variáveis dependentes. Caso os
efeitos observados sejam influenciados ou confundidos por variáveis estranhas, será difícil
fazer inferências válidas sobre a relação entre as variáveis independentes e dependentes.
Portanto, para que seja possível tirar quaisquer conclusões sobre os efeitos do tratamento é
fundamental que a validade interna seja atendida. E o controle de variáveis estranhas é então
uma condição necessária para que o experimento seja considerado internamente válido
(MALHOTRA, 2006).
Desta forma, é muito importante que o desenho do experimento seja feito de maneira
cautelosa para evitar qualquer tipo de viés originário de um experimento mal planejado.
Como destacado por Farias (2009), a formulação das perguntas de pesquisa merecem atenção
especial devido ao chamado “framing effect”, o efeito da forma com que um problema é
apresentado ao decisor (Kahneman e Tversky, 1984). Isto é, participantes podem responder a
uma mesma pergunta de maneira distinta dependendo da forma como a pergunta ou a situação
é apresentada.
Já a validade externa refere-se à extensão com que as relações e resultados
encontrados nos experimentos podem ser generalizados para outras situações além daquela
examinada no experimento. É preciso destacar que esta validade pode ser ameaçada na
medida em que o conjunto específico de condições experimentais não leva em consideração
de forma realista as interações de outras variáveis relevantes no mundo real. É desejado
planejar um experimento dotado tanto de validade interna como de validade externa, mas
frequentemente é necessário trocar um tipo de validade por outro. Por exemplo, para controlar
variáveis estranhas, um pesquisador pode realizar um experimento em um ambiente artificial,
41
como já explicado anteriormente. Isto reforça a validade interna, mas pode limitar o aspecto
generalizador dos resultados, reduzindo, assim, a validade externa. Por outro lado, se um
experimento carece de validade interna, a generalização dos resultados pode não ter sentido.
Os fatores que ameaçam a validade interna podem ameaçar também a validade externa.
Além disso, é importante lembrar que a interferência do pesquisador nos experimentos
não é desejada, e qualquer outra possível causa de interferência nos resultados que não seja
proveniente da interação das variáveis deve ser eliminada (Humphrey et al., 2004). Tomou-se
cuidado, como será explicitado adiante, para atender a essas exigências.
A Internet foi utilizada para a coleta de dados do experimento. Malhotra (2006) afirma
que a utilização da Internet com essa finalidade, além de reduzir a interferência do
pesquisador, permite outros benefícios como a possibilidade de evitar que o respondente
preencha o questionário de forma incorreta, por exemplo, marcando mais de uma opção onde
somente poderia marcar uma ou esquecendo-se de responder alguma questão. Outra vantagem
é que o preenchimento pode ser feito no momento em que o respondente desejar. Uma
desvantagem, entretanto, é a falta de controle sobre a amostra, já que não temos certeza de
quem está realmente participando do experimento, se o respondente está na companhia de
outra pessoa ou se está atento, etc.
O experimento realizado foi desenhado de forma a garantir uma validade interna e
externa. Além disso, era muito difícil descobrir a hipótese testada no estudo, o que
impossibilitaria o participante de escolher uma opção por considerá-la mais adequada.
Uma limitação potencial do experimento realizado diz respeito à seleção da amostra.
Foi utilizada uma amostra não probabilística, ou seja, que não pode ser considerada
representativa da população. Porém, apesar de este estudo ter trabalhado com uma amostra
42
relativamente homogênea de pessoas, é improvável que diferenças demográficas, geográficas
ou sócio-econômicas afetem a utilização da heurística afetiva como auxílio em tomadas de
decisão, visto que a paixão por futebol vai além desses limites. Fatores como idade, sexo e
condição econômica não parecem ter relação direta com o envolvimento entre torcedor e
clube.
5.2. Coleta dos Dados
Para a realização desse trabalho foram utilizados dados primários coletados através do
experimento. Tais dados foram coletados por meio de questionários que eram
disponibilizados para os respondentes através da Internet. Assim, os respondentes deveriam
dirigir-se a um determinado endereço na Web para completar o questionário elaborado no site
de pesquisas pela Internet chamado Encuesta Fácil. Os links que levavam a estes
questionários foram enviados aos respondentes através de e-mail com uma mensagem que
explicava o propósito geral do estudo - entender as preferências de investimento dos
participantes - e pedia a colaboração para o preenchimento do questionário online. O apêndice
I mostra a mensagem de e-mail enviada aos participantes.
O questionário possuía quatro páginas: a primeira continha as instruções (em
particular foi informado que não havia respostas certas nem erradas); a segunda continha o
experimento de fato; a terceira continha perguntas sobre preferências relacionadas a futebol; e
a última continha um agradecimento pela colaboração e o pedido de que o estudo não fosse
comentado com outras pessoas. O tempo de preenchimento do questionário era, em geral,
inferior a 5 minutos. Os modelos dos questionários encontram-se reproduzidos nos apêndices
II, IIIa, IIIb, IV e V.
43
5.3. Amostra
A seleção dos respondentes utilizada para o experimento foi a não-probabilística por
conveniência. Samara e Barros (2007) afirmam que a amostra não probabilística é selecionada
por critérios subjetivos do pesquisador, de acordo com experiência e objetivos do estudo. Não
é obtida utilizando-se conceitos estatísticos. E é classificada como “por conveniência” porque
são entrevistadas pessoas que estão ao alcance da pesquisadora e dispostas a responder ao
questionário.
Também por isso os resultados devem ser interpretados e analisados cuidadosamente,
pois as estimativas obtidas não são estatisticamente projetáveis para a população
(MALHOTRA, 2006).
Além disso, o procedimento de snow-balling, ou bola de neve, foi utilizado em parte.
Segundo Malhotra (2006), esse procedimento é uma técnica de amostragem em que um grupo
inicial de entrevistados é selecionado aleatoriamente e, após serem entrevistados, eles
fornecem informações sobre outros indivíduos que poderiam participar do estudo, o que leva
a um efeito bola de neve. Neste estudo, foi pedido para que quem recebesse o e-mail
encaminhasse para outras pessoas sem que, no entanto, fizessem comentários a respeito do
mesmo.
Desta maneira, a amostra foi composta por 178 respondentes, que foram distribuídos
aleatoriamente entre as condições de controle (80) e Flamengo (98) descritas em breve.
Assim, a amostra contou com respondentes com média de idade de 25 anos, dos quais 56%
eram homens. Perguntas feitas após o experimento revelaram que 38% informaram que
torciam pelo Flamengo, 18% pelo Botafogo, 18% pelo Vasco, 15% pelo Fluminense, 7%
44
torciam por outros clubes e 5% informaram que não torciam para qualquer clube. Além disso,
44% do total de respondentes informaram que não gostavam do Flamengo, 15% do Vasco,
3% do Botafogo, 3% do Fluminense e 31% não disseram que não gostam de algum clube.
5.4. Desenho do Experimento
Pedimos aos respondentes que se colocassem na posição de um investidor de obra de
artes e então que tomassem uma decisão sobre em qual de duas obras investiria. Uma tabela
apresentava as principais características das opções de investimento, que eram quadros
bastante similares, exceto por possuírem retornos distintos sobre o investimento. No texto que
descrevia a situação a ser considerada era dito que um especialista do mercado de obras de
arte havia feito uma estimativa de retorno sobre o investimento da seguinte forma:
• Na opção de investimento arriscada, o respondente tinha 25% de chance de ganhar R$
4.500,00 e 75% de chance de não ganhar nada.
• Na opção de investimento conservadora, o respondente tinha 60% de chance de ganhar
R$ 1.200,00 e 40% de chance de não ganhar nada.
Acima de cada opção, havia uma figura ilustrando a obra em questão. O quadro
associado à opção arriscada sempre tinha as cores azul e roxa. Já o quadro associado à opção
conservadora teve suas cores manipuladas. Na condição controle, ele tinha as cores amarelo e
marrom, supostamente neutras por não serem associadas a nenhum clube de futebol de
renome no Brasil. Na condição tratamento, que chamaremos de condição Flamengo, ele tinha
as cores vermelho e preto, que são associadas ao Clube de Regatas Flamengo, clube de
futebol com a maior torcida do Rio de Janeiro. Os respondentes foram distribuídos
45
aleatoriamente entre a condição controle e a condição Flamengo. Os quadros das duas
condições, controle e Flamengo, eram exatamente iguais, exceto pelas suas cores. A descrição
da obra, o seu preço, e a figura eram exatamente os mesmos.
Para evitar o viés da ordem de apresentação das opções, esta ordem era modificada, ou
seja, em cerca de 60% dos questionários a opção conservadora estava à esquerda e nos
demais, estava à direita.
O experimento foi conduzido da seguinte forma: após receber o e-mail, o respondente
clicava no link e era direcionado ao site no qual a pesquisa estava disponível. Na primeira
tela, eles eram informados que o objetivo do estudo era entender o comportamento de
investimento das pessoas e que deveriam escolher uma entre duas opções de investimento em
obras de arte. Na segunda tela, as duas obras eram descritas e se pedia aos respondentes que
escolhessem um investimento, isto é, uma obra de arte. Havia uma pergunta de múltipla
escolha para que o respondente selecionasse a opção que mais a agradasse (a opção arriscada
ou a opção conservadora). Como explicitado acima, a manipulação foi feita através das cores
da obra de arte associada ao investimento conservador (para a condição controle foram usadas
as cores amarela e marrom e para a condição Flamengo foram usadas as cores vermelha e
preta). Após a escolha, na terceira tela, os respondentes preenchiam um questionário sobre
preferências e hábitos com relação a futebol. E na quarta e última tela, agradecíamos aos
respondentes e lhes pedíamos que não fizessem nenhum comentário sobre o estudo. Não era
permitido voltar à página anterior em nenhum momento do estudo. Note que até a escolha do
investimento, nenhuma referência foi feita sobre futebol. Com isso, evitou-se o que Malhotra
(2006) chama de artefatos de demanda, que são respostas dadas porque os respondentes
procuram adivinhar o propósito do experimento e responder de acordo com isso.
46
O apêndice IIIa mostra a versão do questionário com a condição de controle e o
apêndice IIIb mostra a versão da condição Flamengo.
5.5. Previsões
Para este experimento, duas previsões foram feitas com base nas hipóteses do estudo.
Previsão 1: Torcedores do Flamengo vs. outros torcedores
Os torcedores do Flamengo escolherão a opção de investimento conservadora mais
frequentemente que outros torcedores quando o quadro tiver as cores vermelha e preta (do
Flamengo), mas não quando o quadro tiver as cores amarela e marrom (neutras).
Previsão 2: Torcedores que não gostam do Flamengo vs. torcedores indiferentes:
Os torcedores que não gostam do Flamengo escolherão a opção de investimento
conservadora menos frequentemente que outros torcedores (torcedores indiferentes) quando o
quadro tiver as cores vermelha e preta (do Flamengo), mas não quando o quadro tiver as cores
amarela e marrom (neutras).
5.6. Tratamento dos Dados
Os dados coletados através das respostas dos questionários foram tratados de forma
quantitativa, utilizando o programa estatístico Stata para a realização do teste de regressão
logística (logit model).
47
Como defendido por Hair et al. (1995), a técnica de análise de dependência mais
versátil e utilizada é o processo de regressão. Seu uso mais comum tem por finalidade
descrever o valor médio de uma ou mais variáveis dependentes em função de um conjunto de
variáveis independentes. Essas variáveis independentes (X) são utilizadas para analisar e
descrever o comportamento da variável dependente (Y). Quando a variável dependente é uma
variável discreta, não contínua, podendo assumir dois ou mais valores definidos, o método
mais utilizado para a análise é a regressão logística (BUENO, 2007).
Deste modo, pode-se dizer que através da utilização de regressão logística é possível
analisar a relação entre uma ou mais variáveis independentes (x1, x2,..., xn) e uma variável
dependente (y). Mais especificamente, é possível analisar a probabilidade de um resultado
ocorrer ou não (o valor assumido pela variável discreta dependente Y) a partir dos valores
assumidos pelas variáveis independentes xi. A variável dependente é dicotômica, assumindo
os valores 0 ou 1. Para este experimento, o 0 (zero) representa a escolha do quadro com as
cores roxa e azul, que era apresentado nas duas condições, e o 1 (um) representa a escolha do
quadro alvo, ou seja, a escolha do quadro com as cores amarela e marrom na condição
controle ou do quadro com as cores vermelha e preta na condição Flamengo. Foram feitos
dois tipos de análise: a primeira para testar a primeira previsão, dividindo os respondentes
entre flamenguistas e não flamenguistas, segundo indicado pelos próprios, e a segunda para
testar a segunda previsão, dividindo os respondentes entre aqueles que informaram que não
gostam do Flamengo (alguns, mas nem todos, torcedores de clubes rivais ao Flamengo) e
aqueles que não informaram que não gostam do Flamengo (torcedores do Flamengo e alguns
torcedores de times rivais ao Flamengo). A equação a seguir representa o modelo:
Y = p1X1 + p2X2 + p12X1X2 + E
48
Onde:
Y representa a variável dependente, ou seja, a escolha pelo quadro com as cores roxa e azul
(0) ou pelo quadro alvo (1 - escolha do quadro com as cores amarela e marrom na condição de
controle ou a escolha do quadro com as cores vermelha e preta na condição Flamengo).
X1: variável que indica se o respondente foi alocado na condição de controle ou na condição
Flamengo.
X2: variável que indica (1) se o respondente é torcedor do Flamengo ou não é torcedor do
Flamengo (para primeira análise) e (2) se o respondente informou que não gosta do Flamengo
ou se não informou que não gosta do Flamengo (para segunda análise).
p12X1X2 representa a interação entre as variáveis X1 e X2.
E representa o erro.
5.7. Resultados
Os resultados serão divididos em duas partes: uma que faz referência à primeira
previsão e outra que faz referência à segunda previsão. Nos dois casos as análises indicaram
que a ordem de apresentação dos quadros não teve influência nos resultados.
Analisando a equação com base no clube pelo qual a pessoa torce, os resultados
obtidos foram os seguintes. Conforme previsto, houve uma interação entre a cor do quadro e
se o respondente é torcedor do Flamengo ou não (z = 1.88, p = 0.06). Na condição Flamengo,
quando a opção de investimento conservadora era o quadro com as cores vermelha e preta, os
49
torcedores do Flamengo escolheram essa opção mais frequentemente que os outros torcedores
(78% vs. 54%; χ2 = 5.82, p = 0.02). No entanto, na condição controle, quando a opção de
investimento conservadora era o quadro com as cores amarela e marrom, a diferença entre os
torcedores do Flamengo e os outros torcedores não foi significativa (74% vs. 79%; χ2 = 0.21,
p > 0.10). O gráfico abaixo ilustra estes resultados.
Figura 6 - Gráfico do % de escolha da opção conservadora pelos torcedores Fonte: Elaborado pela autora
Analisando a equação com base no clube que o respondente não gosta, os resultados
obtidos foram os seguintes. Novamente, conforme previsto, houve uma interação entre a cor
do quadro e se o torcedor não gosta do Flamengo ou é indiferente (z = -2.89, p < 0.01). Na
condição Flamengo, quando a opção de investimento conservadora era o quadro com as cores
vermelha e preta, os torcedores que não gostam do Flamengo escolheram essa opção com
menos frequência que os torcedores indiferentes (49% vs.77%; χ2 = 8.59, p < 0.01). No
50
entanto, na condição controle, quando a opção de investimento conservadora era o quadro
com as cores amarela e marrom, a diferença entre os torcedores que não gostam do Flamengo
e os torcedores indiferentes não foi significativa (71% vs. 84%; χ2 = 2.00, p > 0.10). O gráfico
a seguir ilustra estes resultados.
Figura 7 - Gráfico do % de escolha da opção conservadora pelos não torcedores Fonte: Elaborado pela autora
5.8. Discussão sobre os Resultados
Os resultados obtidos sugerem que a mera referência a um clube de futebol aqui feita
através de suas cores pode influenciar significativamente até as decisões não relacionadas a
futebol, tanto para aqueles que torcem pelo clube quanto para aqueles que não gostam deste
clube.
51
Em resumo, quando o quadro da opção de investimento conservador tinha as cores
amarela e marrom, os torcedores do Flamengo consideraram a opção de investimento
conservadora tão atrativa quanto os torcedores de outros clubes. No entanto, quando este
mesmo quadro tinha as cores vermelha e preta, os torcedores do Flamengo consideraram a
opção de investimento conservadora mais atrativa que os torcedores de outros clubes. As
cores do quadro influenciaram as preferências sobre as opções de investimento. Estes
resultados sugerem que torcedores do Flamengo estarão mais propensos a escolher opções
que estejam relacionadas de alguma maneira a este clube, mesmo em situações alheias a
esportes de maneira geral.
Similarmente, quando a análise foi feita segundo o clube que os respondentes
indicaram que não gostam, os resultados também são expressivos. Quando o quadro da opção
de investimento conservadora tinha as cores amarela e marrom, os torcedores que não gostam
do Flamengo consideraram a opção de investimento conservadora tão atrativa quantos
torcedores indiferentes. Porém, quando este mesmo quadro tinha as cores vermelha e preta, os
torcedores que não gostam do Flamengo consideraram a opção de investimento conservadora
menos atrativa que o grupo de torcedores indiferentes. Isso mostra que houve rejeição dos
respondentes em relação ao time que está simbolizado através das cores, mesmo em situações
que não possuem nenhuma relação com esportes.
Com base nos dados obtidos é possível dizer que as cores associadas a um clube de
fato influenciam de maneira significativa decisões, mesmo quando estas não estão
relacionadas a futebol ou qualquer outro esporte. Os resultados levam a crer que o torcedor do
Flamengo pode considerar como mais atrativa a opções que tem algum tipo de associação
com o seu clube (no caso estudado através das cores). Além disso, o torcedor que não gosta
do Flamengo tende a considerar como menos atrativa a opção que tem algum tipo de relação
52
com esse clube. Aparentemente isto ocorreu de forma inconsciente, já que nenhuma
referência a futebol foi feita.
53
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esse trabalho investigou se a paixão e o envolvimento com o futebol podem fazer com
que as pessoas sejam influenciadas ao tomar decisões que não tem nenhuma relação com
esportes. Para tanto, foi realizado um experimento sobre uma decisão de investimento
utilizando as cores do Clube de Regatas Flamengo. Os resultados obtidos mostraram que os
torcedores do Flamengo consideraram a opção de investimento com as cores do seu clube
mais atrativa do que quando a mesma opção tinha cores neutras. De maneira semelhante, os
torcedores que declararam não gostar do Flamengo consideraram a opção de investimento
com as cores deste clube menos atrativa do que quando a mesma opção tinha cores neutras.
Com isso, percebe-se que as cores representativas dos clubes de futebol podem
influenciar de maneira determinante a tomada de decisões, mesmo em situações que são
totalmente independentes do mundo esportivo. A paixão e o envolvimento com o clube
podem fazer com que as pessoas avaliem de maneira mais favorável as opções que estejam
relacionadas com o seu clube ou avaliem de maneira menos favorável as opções que estejam
relacionadas com os clubes rivais. No caso deste estudo, a relação com o clube era
estabelecida através das cores.
A heurística da afetividade, que serviu como base teórica desse estudo, é um tema
relativamente recente e, portanto, com um número limitado de trabalhos relacionados. Este
estudo contribuiu para a literatura do assunto mostrando a heurística da afetividade em um
contexto diferente: o futebol. Este esporte possui tanto destaque na vida dos brasileiros que é
capaz de provocar fortes emoções e um grande envolvimento, fazendo com que os
consumidores usem esta heurística em situações que envolvam futebol de maneira explícita
ou não.
54
Como todos os experimentos foram desenvolvidos de forma a não indicar uma relação
nem com futebol, nem com esportes de maneira geral, os resultados sugerem que os
profissionais da área de marketing devem estar atentos aos benefícios e malefícios que uma
associação com algum clube esportivo pode trazer para seu produto ou serviço, mesmo que
não tenha sido planejada, visto que os consumidores podem ser influenciados por este aspecto
de maneira inconsciente.
Isso deve ser analisado com cautela pelas empresas, pois um produto pode ser
rejeitado pelos consumidores, até de maneira inconsciente, por apresentar características que
estejam associadas com as de um clube rival ao clube para o qual torcem estes consumidores.
Nesse caso as cores foram tidas como referência. Ou seja, na hora de planejar um produto ou
serviço é necessário cuidado, pois, se por um lado características (como cores) associadas a
um clube podem aproximar clientes (torcedores deste clube), por outro lado elas também
podem afastar outros clientes (torcedores que não gostam deste clube).
Uma das limitações do estudo pode ser a utilização das cores do Flamengo, que é um
clube bastante amado pelos flamenguistas e aparentemente também bastante odiado pela
maior parte dos torcedores dos clubes rivais. Talvez se tivéssemos usado outro clube, os
resultados tivessem sido diferentes. Além disso, tentamos desenvolver o experimento usando
uma decisão que não tinha nenhuma relação com futebol. A decisão a ser tomada era
relacionada a investimentos, que é um dos assuntos que mais demanda a racionalidade das
pessoas. Mesmo assim, o efeito foi observado neste tipo de decisão específica, mas talvez em
outro tipo de decisão, o mesmo não ocorresse.
Esperamos, com este estudo, ter destacado o poder que a paixão por futebol tem na
vida dos brasileiros, capaz de influenciar até mesmo decisões que não possuem nenhuma
55
relação com esportes. Dessa forma, acreditamos ter cumprido o que foi proposto e ter
contribuído para a literatura da heurística da afetividade.
6.1. Sugestões para pesquisas futuras
O presente trabalho poderia ser utilizado como alicerce para explorar outras
possibilidades não enfocadas neste projeto. A pesquisa poderia ser feita novamente, utilizando
outros clubes de futebol, principalmente em locais onde a rivalidade é ainda maior, como em
Porto Alegre (Grêmio e Internacional) ou em Minas Gerais (Cruzeiro e Atlético Mineiro). Ou
ainda algum outro símbolo associativo aos clubes poderia ser usado, com o mascote do clube,
por exemplo, em substituição às cores.
56
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57
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59
APÊNDICE I – Mensagem de e-mail aos participantes
"Boa tarde,
Eu estou fazendo mestrado no Instituto Coppead de Administração - UFRJ e gostaria de pedir sua colaboração para a minha pesquisa de dissertação. Basta responder a pesquisa clicando no link a seguir. O trabalho é sobre preferências por investimentos e o estudo leva apenas alguns minutos para ser preenchido. Este estudo é totalmente anônimo. Qualquer dúvida, estou à disposição.
Muito obrigada!
Ana Beatriz Guerra"
60
APÊNDICE II – Primeira página do questionário: Instruções Gerais
Pesquisa sobre preferências sobre investimentos
Estamos interessados em estudar as preferências das pessoas por investimentos. Para tanto,
será apresentada uma situação de investimento em que você deverá escolher uma das opções
disponíveis. Em seguida, pediremos que você complete um breve questionário. Não existem
respostas certas ou erradas. Este estudo é totalmente anônimo.
61
APÊNDICE IIIa – Segunda página do questionário – Experimento versão Controle
Investimento em obras de arte
Imagine que você é um investidor de artes e está considerando duas opções de investimento.
Essas opções são quadros de um mesmo pintor. Uma breve descrição dos quadros e
estimativas de retorno sobre o investimento feitas por um especialista do mercado de obras de
arte são apresentadas abaixo.
Qual das duas opções de investimento você escolheria?
Opção A Opção B
62
APÊNDICE IIIb – Segunda página do questionário – Experimento versão Flamengo
Investimento em obras de arte
Imagine que você é um investidor de artes e está considerando duas opções de investimento.
Essas opções são quadros de um mesmo pintor. Uma breve descrição dos quadros e
estimativas de retorno sobre o investimento feitas por um especialista do mercado de obras de
arte são apresentadas abaixo.
Qual das duas opções de investimento você escolheria?
Opção A Opção B
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APÊNDICE IV – Terceira página do questionário: Preferências sobre Futebol
Preferências sobre futebol
*Qual é o seu time?
Botafogo
Flamengo
Fluminense
Vasco
Outro. Qual?
*Existe algum time do Rio que você não gosta?
Sim
Não
Se sim, qual é o time que você menos gosta?
Botafogo
Flamengo
Fluminense
Vasco
Outro. Qual?
*Sexo:
Feminino
Masculino
*Idade:
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APÊNDICE V – Última página do questionário: Agradecimento
Como o estudo ainda está em andamento, é muito importante que nenhum comentário seja
feito a respeito dele, pois outras pessoas também irão participar. Obrigada pela colaboração.
Muito obrigada pela sua participação!