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TERMO DE APROVAÇÃO
DAIANE ANDRADE CANDIDO
JESSÉ HENRIQUE DE LIMA
REMEMÓRIAS: A Trajetória dos Condenados
Livro-reportagem sobre presos da Colônia Penal Agro industrial do Paraná e da
Penitenciária Central do Estado
Trabalho de conclusão de curso aprovado com nota 10,0 como requisito parcial
para a obtenção do grau de bacharel em Comunicação Social – Jornalismo pelas
Faculdades Integradas do Brasil – Unibrasil, mediante banca examinadora composta por:
Prof.(a) Maura Oliveira Martins, orientadora e presidente
Prof.(a) Laura Jane Ribeiro Garbini Both, membro
Prof.(a) Paulo Camargo, membro
Curitiba, 26 de novembro de 2012.
FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL
DAIANE ANDRADE CANDIDO
JESSÉ HENRIQUE DE LIMA
REMEMÓRIAS: A TRAJETÓRIA DOS CONDENADOS
LIVRO-REPORTAGEM SOBRE PRESOS DA COLÔNIA PENAL
AGROINDUSTRIAL DO PARANÁ E DA PENITENCIÁRIA CENTRAL DO
ESTADO
CURITIBA
2012
DAIANE ANDRADE CANDIDO
JESSÉ HENRIQUE DE LIMA
REMEMÓRIAS: A TRAJETÓRIA DOS CONDENADOS
LIVRO-REPORTAGEM SOBRE PRESOS DA COLÔNIA PENAL
AGROINDUSTRIAL DO PARANÁ E DA PENITENCIÁRIA CENTRAL DO
ESTADO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
à banca de defesa como requisito para
obtenção do título de Bacharel em Jornalismo
junto à Escola de Escola de Comunicação
Social das Faculdades Integradas do Brasil -
UniBrasil.
Orientadora: Professora Maura Oliveira Martins
CURITIBA
2012
Agradecimentos
A Deus que me permitiu chegar até aqui. À minha mãe, Geleide, que
acreditou no meu sonho, nunca me abandonou e que sempre me serviu de
exemplo. Ao meu esposo, Nogueira, que me amparou como uma rocha a cada
vez que meus pés fraquejaram na caminhada e que soube me amar e me dar
carinho nos instantes mais difíceis. À minha filha, Ellen, meu maior tesouro, por
ter compreendido como adulta, apesar de ainda ser criança, os momentos de
ausência, estresse e falta de tempo. Aos meus irmãos, Fábio e Viviane, aos
familiares em geral, aos amigos e colegas de trabalho pela compreensão e
estímulo. E, é claro, ao colega Jesse que, ao meu lado, transpôs as diferenças
em prol de um objetivo maior e comum: este trabalho.
Daiane
Meus agradecimentos à minha mãe, dona Eva, que aos 50 anos de
idade voltou a estudar e me mostrou de onde herdei a determinação, e a meu
pai, Wauracy, que já na casa dos 60, também voltou a estudar junto com ela.
Jessé
À mestre Maura Oliveira Martins, pela dedicação, orientações precisas,
paciência e pelos momentos de euforia compartilhados. Ao professor Felipe
Harmata Marinho, que foi uma inesgotável fonte de boas ideias na primeira
fase deste trabalho. Aos internos da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná
(CPAI) e Penitenciária Central do Estado (PCE), pela confiança em nos revelar
a sua história. Ao Departamento de Execução Penal do Paraná (Depen), na
figura do doutor Maurício Kuehne, por abraçar a iniciativa e nos dar subsídios
para a execução desta tarefa. Às colegas de academia Andréa Moraes e
Elisana Fuckner, que nos abriram portas ainda no início desta pesquisa. E a
todos que, de alguma forma, ajudaram na concretização.
Nós
"Liberdade é um princípio não absoluto,
submetido a um outro, muito maior, que
é a dignidade humana, e os seus
limites são os da alteridade, ou seja, o
respeito pelo outro”.
(Felipe Pena)
Resumo
Este trabalho busca compreender como o jornalismo pode expor, por meio de um livro-reportagem, a trajetória de vida de presos internalizados na Colônia Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI) e na Penitenciária Central do Estado (PCE), construída a partir de suas próprias narrativas e distante de uma visão estereotipada. A fundamentação teórica é realizada a partir da teoria das representações sociais, enquanto a metodologia conta com uma pesquisa de análise de conteúdo dos conteúdos veiculados sobre o assunto na página virtual do jornal Gazeta do Povo, além de dois grupos focais e da pesquisa bibliográfica, que discute conceitos importantes como o que é crime, prisão e liberdade, bem como passeia por entre os aspectos do sistema penitenciário brasileiro e paranaense. Por fim, a presente iniciativa também debate o jornalismo como forma de conhecimento e um meio de comunicação que pode reproduzir estereótipos sociais.
Palavras-chave
Jornalismo, representações sociais, estereótipos e livro-reportagem.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................. 7
2 DELIMITAÇÃO DO TEMA E PROBLEMATIZAÇÃO............ ........... 9
2.1 O QUE SE ENTENDE POR CRIME ............................................... 9
2.1.1 Teoria e prática: como entende o crime no Brasil......................... 12
2.2 O CONCEITO DE PRISÃO ............................................................. 13
2.3 CONCEPÇÕES SOBRE LIBERDADE ............................................ 15
2.4 O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO ................................. 17
2.4.1 Medidas de ressocialização e reincidência criminal ..................... 22
2.4.2 O cenário no Estado do Paraná .................................................... 26
2.4.2.1 Infraestrutura............................................................................... 26
2.4.2.2 Projetos de recuperação dos presos .......................................... 29
2.4.2.3 Complexo penal em Piraquara ................................................... 31
2.4.2.3.1 Colônia Penal Agroindustrial do Paraná – CPAI.................... 31
2.4.2.3.2 Penitenciária Central do Estado – PCE.................................. 32
2.5 O CRIMINOSO E A MÍDIA .............................................................. 33
2.5.1 Os presos no jornal: como os internos da Colônia Penal
Agroindustrial do Paraná e da Penitenciária Central do Estado
são retratados pela imprensa ........................................................ 36
2.5.1.1 Tipo e tamanho do conteúdo ...................................................... 38
2.5.1.2 Detalhamentos sobre as imagens .............................................. 40
2.5.1.3 Detalhamentos sobre o texto ...................................................... 43
2.5.1.4 Temas apresentados................................................................... 48
2.5.1.5 Conclusões da análise de conteúdo ........................................... 51
3 OBJETIVOS........................................ .............................................. 54
3.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ........................................................... 54
4 JUSTIFICATIVA ............................................................................... 55
4.1 O CRIMINOSO COMO INSPIRAÇÃO ............................................ 58
5 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................... 61
5.1 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS...................................................... 61
5.2 JORNALISMO LITERÁRIO E O NEW JOURNALISM.................... 64
5.3 LIVRO-REPORTAGEM................................................................... 69
5.4 CONCEITOS DE REPORTAGEM .................................................. 71
5.5 TÉCNICAS DE ENTREVISTA......................................................... 74
5.6 HISTÓRIA ORAL............................................................................. 77
6 METODOLOGIA DE PESQUISA ...................................................... 79
6.1 MÉTODOS UTILIZADOS NA PESQUISA BIBLIOGRÁFICA .......... 79
6.2 PESQUISA DE CAMPO .................................................................. 80
6.2.1 Métodos empregados no desenvolvimento da análise de
conteúdo ........................................................................................ 81
6.2.2 Métodos empregados no desenvolvimento dos grupos focais .... 86
6.2.2.1 Grupo focal da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná ........... 88
6.2.2.2 Grupo focal da Penitenciária Central do Estado.......................... 91
6.2.2.3 Resultados dos grupos focais: CPAI e PCE................................ 93
6.2.2.3.1 Os presos e as representações sociais: estereótipos, mídia e
sociedade ................................................................................. 94
6.2.2.3.2 Relações com a família ............................................................ 97
6.2.2.3.3 Perspectivas sobre a prisão e ressocialização ........................ 99
6.2.2.3.4 Relações com os funcionários .................................................. 101
7 DELINEAMENTO DO PRODUTO .................................................... 103
7.1 FORMATO....................................................................................... 103
7.2 PERSONAGENS............................................................................. 104
7.3 FOCOS NARRATIVOS................................................................... 106
7.4 LINGUAGEM E TÉCNICAS ............................................................ 107
7.5 PÚBLICO-ALVO E VEICULAÇÃO .................................................. 108
7.6 RECURSOS MATERIAIS E ORÇAMENTO.................................... 108
8 CRONOGRAMA DE ATIVIDADES......................... .......................... 110
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................. ................................. 111
10 REFERÊNCIAS................................................................................. 114
10 APÊNDICES ..................................................................................... 130
11 ANEXOS ........................................................................................... 140
7
1 INTRODUÇÃO
O principal objetivo desta pesquisa é produzir um livro-reportagem sobre as
histórias dos presos de duas unidades penais do município de Piraquara, no Paraná:
a Colônia Penal Agroindustrial do Paraná – CPAI e a Penitenciária Central do
Estado – PCE. Por meio de entrevistas, procurar-se-á conhecer os relatos desses
indivíduos e reproduzi-los no produto, utilizando para isso elementos do Jornalismo
Literário e recursos do Novo Jornalismo, também conhecido como New Journalism.
Dessa forma, espera-se encontrar histórias que despertem o interesse da
sociedade pelo assunto e que, de alguma forma, isso contribua para promover
debates sobre o tema.
A escolha para a realização das entrevistas com presos das unidades penais
CPAI e PCE define-se por recomendação do Departamento de Execução Penal do
Paraná - Depen-PR, órgão responsável por administrar as prisões no Estado.
Segundo o departamento, essas instituições são as mais relevantes para atender
aos propósitos da presente pesquisa por dois motivos: primeiro, por disporem de
uma vasta gama de personagens; e, segundo, porque constituem duas formas de
regime distintas: na CPAI, o sistema semiaberto; na PCE, fechado.
Segundo Duarte (2012), a mídia atual é responsável por estimular o caráter
parcial de se perceber as situações, reproduzindo o senso comum e mascarando os
acontecimentos por meio da espetacularização das notícias. Logo, os autores desta
pesquisa acharam oportuno mostrar a realidade dos presos de outro ponto de vista:
o da Comunicação Social.
Assim, na delimitação do tema procura-se trazer à luz nuances da realidade
do sistema prisional no Brasil, no Paraná, e, afinal, na grande Curitiba. O tema é
discutido até a identificação dos problemas de comunicação. Para isso, os
pesquisadores utilizam conceitos de autores e especialistas das mais variadas
áreas, como a Sociologia, a Psicologia, as Ciências Sociais, o Direito Penal e até
mesmo alguns meios de comunicação, em especial o site do jornal Gazeta do Povo,
veículo aceito majoritariamente como o mais importante do Estado do Paraná.
Depois de se definir a plataforma e o veículo de comunicação a ser analisado
pela pesquisa, utiliza-se como metodologia inicial a análise de conteúdo das notícias
que se referem aos presos. A investigação, desenvolvida no site do jornal Gazeta do
Povo, permite identificar quando e como o detento é mencionado, e sob quais
8
circunstâncias. Como critério para essa etapa, utiliza-se o recurso de palavras-
chaves que, selecionadas segundo a temática, revelaram as bases para uma
compreensão prática dos pesquisadores em relação ao assunto em foco. Aliás, é
também nesse ponto que os pesquisadores indicam o planejamento para a segunda
abordagem prática da pesquisa, necessária para estreitar o contato dos proponentes
com o universo investigado.
No referencial teórico, os estudos sociológicos são utilizados de modo a
conduzir a discussão para o plano da comunicação. Assim chega-se às concepções
das representações sociais, psicologia social, jornalismo literário, novo jornalismo,
reportagem e entrevista – o caminho para a obtenção dos dados, além da teoria da
História Oral. Tais discussões se fazem pertinentes e essenciais, haja vista que o
suporte teórico para o desenvolvimento do produto está intrinsecamente ligado a tais
teorias.
Por fim, com base em tais conceitos e análises, os pesquisadores pretendem
– como já foi dito – fazer com que a construção do livro-reportagem utilizando, para
tanto, características jornalístico-literárias e recursos do New Journalism, possa
colaborar para enriquecer o número de obras que discorram sobre o tema proposto
e que o mesmo possa ser debatido em diversos tipos diferentes de grupos sociais,
sobretudo no acadêmico.
Isso porque, considerando o fato de que o jornalismo é um dos canais de
influência sobre a sociedade, o que se espera é que o livro-reportagem crie
condições para que o leitor tenha acesso ao ponto de vista dos personagens (os
presos), conhecendo suas experiências e, com isso, refletir sobre o assunto.
9
2 DELIMITAÇÃO DO TEMA E PROBLEMATIZAÇÃO
2.1 O QUE SE ENTENDE POR CRIME
Ao longo da história, o entendimento sobre o que se considera crime sofreu
várias transformações ao redor do mundo. Isso porque, ao passo em que as
sociedades se modificam, o direito também precisa de adaptações que atendam aos
interesses de cada povo, em cada região, conforme seus costumes, em determinado
recorte de tempo, e desse modo transmuta-se.
Segundo Noronha (2001), “a história do direito penal é a história da
humanidade. Ele surge com o homem e o acompanha através dos tempos, isso
porque o crime, qual sombra sinistra, nunca dele se afastou” (p. 20). Também
Urbanski (2010) partilha dessa concepção, e compreende que “o crime é um fato
antigo, tanto quanto o homem. É um fato que preocupa a humanidade. Assim,
através dos tempos, estudos e pesquisas foram realizadas sobre esse fenômeno
social” 1.
Como não se pretende aqui discutir o surgimento do direito penal, e sim a
criminologia em alguns de seus aspectos, a presente pesquisa não se restringe ao
aprofundamento de tal abordagem. Para tanto, tomam-se como ponto de partida as
considerações que defendem esse direito que vem compartilhando a passagem dos
séculos lado a lado com a humanidade.
Analise-se a figura do crime de modo complexo e dicotômico. Embora existam
várias linhas de pensamento acerca do berço da criminalidade, é possível agrupá-
las em dois grandes grupos, quais sejam: os que consideram o próprio indivíduo
como fator dominante para o cometimento de delitos, e as que responsabilizam a
sociedade pela produção desse tipo de agente.
Em relação à primeira concepção, há dois campos de pesquisa, de acordo
com Vergara (2002). Um deles é o que define o sujeito criminoso segundo
predisposições biológicas, como a Frenologia2, por exemplo – já completamente
1 URBANSKI, Rodrigo Barbosa. Criminologia Crítica: Um Suspiro na Modernidade. Web Artigos.
Seção Direito. [S.l.], 2010. Disponível em: http://www.webartigos.com/artigos/criminologia-critica-um-suspiro-na-modernidade/50032/. Acesso em: 08/03/2012. 2 Teoria do início do século XIX, segundo a qual as faculdades e funções da mente humana são
determinadas, basicamente, de acordo com o formato do crânio (O’DONNEL, 1985, apud MICHELETTO, 2000).
10
descartada nos dias atuais –, a má nutrição ou a transmissão genética, entre outras.
O outro é aquele que busca as causas desse tipo de comportamento na psique
humana, considerando uma espécie de desequilíbrio na personalidade do criminoso,
que Freud (apud RODRIGUES, 2012) define como tripartida em ego, superego e id.
Ou seja, teorias construídas segundo o princípio de que o crime é uma característica
inerente à condição do indivíduo, uma passagem na sua vida, fruto de seus conflitos,
anseios e ambições, resultado dos desejos e paixões internos de cada pessoa.
Intrínsecos a ela, portanto.
Tal abordagem assemelha-se às que fundamentam, segundo Foucault
(2009), o julgamento dos instintos, das anomalias, das enfermidades, das
inadaptações, dos efeitos de meio ambiente e hereditariedade, concomitantemente
ao crime. No entanto, o objetivo do autor é ressaltar o enfoque oposto, ou seja, além
de facetas da personalidade, ou efeitos sobre ela, esses seriam os objetos
invocados para “explicar os fatos a serem julgados e determinar até que ponto a
vontade do réu estava envolvida no crime” (p. 22). Foucault entende que “não há
natureza criminosa, mas jogos de força que, segundo a classe a que pertençam os
indivíduos, os conduzirão ao poder ou à prisão” (id, p. 274). Em outras palavras, o
crime seria uma espécie de efeito da civilização, o lado selvagem da sociedade, uma
parte dela, e não uma nuance da alma humana. Uma condição imposta ao indivíduo,
portanto, e que leva à segunda concepção de criminalidade, muito utilizada na
Sociologia para explicar os problemas do mundo.
Outro autor que aborda a intervenção social nas atitudes do sujeito é
Rousseau (1999). Embora não trate diretamente do assunto criminalidade, sua obra
é relevante porque se refere à natureza humana como receptáculo de influências
que a conduzem para atitudes cunhadas na bondade ou maldade. Em outras
palavras, o teórico defende que o homem nasce essencialmente bom, mas se
corrompe na vida em sociedade. Ele foi um dos pensadores que teorizou o que ficou
conhecido por Contrato Social3.
Ora, mesmo contrapostos, esses posicionamentos se interligam por
determinados elementos de significação. E combinam, quando o que se busca
3 Teoria sobre a qual o homem abre mão da sua liberdade (poder) individual em favor de uma
coletividade (o Estado), de modo a superar obstáculos e garantir a própria sobrevivência e bem-estar. Esse soberano seria responsável por criar normas e aplicá-las a todos os membros da sociedade, igualmente, para que todos vivessem livres (sob o rigor da lei), como eram em seu estado de Natureza (ROUSSEAU, 2002).
11
compreender é a relação de contiguidade entre crime e humanidade, como o fez
Silva (2004):
Desde que há homem, há crime; e desde que há crime, há castigo. O castigo é como que uma sombra sinistra que segue o homem em seu caminho pela história. Ele é seu lado sombrio e sinistro, mas que lhe é inafastável. Sinistra sombra, o castigo não é, todavia, estranho ao homem. Pelo contrário, é dele parte constitutiva e, num certo sentido, o constituiu enquanto homem. A história do homem é, em grande parte, a história do castigo (p. 1).
Assim como essas, várias outras teorias sobre a origem da criminalidade no
ser humano foram desenvolvidas por pensadores em diferentes momentos
históricos, inclusive trazendo visões que se classificam na interseção entre as duas
vertentes teóricas. Essas, aliás, são abordagens mais relativistas, que não se
limitam a determinar de onde surge o crime, mas de que forma ele é percebido, o
que as torna essencialmente relevantes, já que contribuem significativamente para
uma compreensão plural do que se pode entender por crime.
Não se pode compreender o crime se abstrairmos a sua efetividade objetiva, concreta e determinada. O pensamento sociológico burguês tem se caracterizado exatamente em seguir o caminho oposto. Nele, o crime aparecerá como um caso particular de uma disfunção genérica, ou de estados anômicos, ou de comportamentos divergentes definidos diretamente no campo da instância ideológica, implicitamente irredutível ou indeterminada (MOTTA; MISSE, 1979, p. 13).
Também Durkheim (2001) admite uma relativização do conceito de crime
quando parte do princípio de que é um Fato Social4. Isso porque um Fato Social,
como o próprio nome diz, carrega-se de aspectos da cultura em que se desenvolve,
ou seja, não obedece a regras rígidas e específicas de compreensão, apesar de se
repetir nas sociedades. O próprio teórico é quem argumenta que “consiste o crime
num ato que ofende certos sentimentos coletivos dotados de energia e nitidez
particulares” (p. 58). Então, seguindo a lógica do estudioso, o crime seria assim
considerado por contrariar as normas de uma coletividade, e não contrariar a
coletividade por ser um crime. Ou, nas palavras de Misse (2010), que “o crime é
definido primeiramente no plano das moralidades que se tornaram hegemônicas e
cuja vitória será inscrita posteriormente nos códigos jurídicos” (p. 22).
4 Para Durkheim (2001), fato social consiste em toda e qualquer forma de indução exercida sobre as
pessoas mediante fatores externos a elas, com existências independentes e comuns a toda a sociedade.
12
Portanto, ainda que amplamente discutida no meio acadêmico, a natureza da
criminalidade ainda não teve um consenso encerrado entre os estudiosos.
Mas então o que é crime? Em que se define?
Até mesmo em fontes de consulta enciclopédicas o termo é tratado
tangencialmente. Segundo a pesquisa de Arnaud (1999), o crime consiste na “ação,
omissão, ou mesmo o modo de vida que o direito penal autoriza o juiz a aplicar pena
ao seu autor” (p. 176). Ou seja, um comportamento impróprio classificado como
contrário às normas em determinado local, tempo e cultura, que pode ser punido
mediante entendimento (subjetivo) de um poder judiciário.
O Crime não existe na lei, nem existe nas figuras concretas ou nas ações concretas que serão designadas criminais. A alcunha de criminal a uma pessoa ou ação, afora a da amoral dominante que é, em geral, subsumida na lei, não pode se concretizar unilateralmente na Universalidade do Direito ou na Singularidade da pessoa ou do ato isolados. [...] O acusado é inocente até prova em contrário (MOTTA; MISSE, 1979, p. 49).
Por fim, a significação etimológica também remete à indefinição do termo, já
que – derivada do latim crimen – a palavra significa acusação (Arnaud, 1999). Nesse
sentido, crime seria algo de que se acusa uma pessoa, o que depende, como já foi
dito, do entendimento legal, baseado em variantes diversas sobre o que é tolerado
ou não, permitido ou não, no momento em que se verifica.
2.1.1 Teoria e prática: como se entende o crime no Brasil
No Brasil, não há ainda uma definição legal específica sobre o que se
considera crime, apesar do entendimento corrente de que consista em tudo aquilo
que seja típico, ou seja, próprio do comportamento humano, bom ou ruim, e por isso
previsto em lei; antijurídico, ou contrário às normas vigentes; e culpável, relacionado
ao pressuposto da pena. E como nem mesmo o Código Penal (1940) apresenta
qualquer dispositivo nesse sentido, tal juízo é concebido diferentemente pelas
dezenas de escolas penais (ELEUTÉRIO, 1997). “A ideia de crime funda-se no
problema da transgressão. A transgressão à lei, a transgressão àquilo que a lei e as
normas sociais regulariam no comportamento humano, nos atos humanos” (MOTTA;
MISSE, 1979, p. 15).
13
Tal ausência de conceituação, entretanto, não compromete a ação dos
mecanismos punitivos com relação ao que se julga por crime no país. Pelo contrário,
em agosto de 2012, o universo de presos somava 501.521 pessoas, das quais
93,65% eram homens e apenas 6,35% eram mulheres5. E entre eles havia “3.191
estrangeiros [...], segundo os dados mais recentes do Departamento Penitenciário
Nacional – Depen, do Ministério da Justiça” (MONTENEGRO, 20126). Desse modo,
e com base no levantamento do Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística – IBGE (2010a), que verificou uma população total de
190.755.799 habitantes no Brasil no ano de 2010, é de se notar que o volume total
de brasileiros natos ou naturalizados presos consiste em aproximadamente 0,26%.
2.2 O CONCEITO DE PRISÃO
Como é possível perceber, falar sobre a criminalidade introduz outros
assuntos na discussão que, longe de serem acessórios, integram diretamente o
tema central. Um deles, e talvez o que mais intimamente se ligue à questão do
crime, é o enclausuramento forçado, a prisão em si que, como dito anteriormente,
acomete cerca de meio milhão de pessoas em todo o país.
Além de ser considerada uma das consequências àqueles que incorrem na
ilicitude, a prisão também representa, segundo Foucault (2009), uma “peça
essencial no conjunto das punições” (p. 217). Tal modalidade de castigo que, para
Gaio e Bordignon (2011), tem raízes fixadas em tempos remotos, só foi incorporada
ao sistema judiciário como sanção penal a partir do período compreendido entre o
final do século XVIII e início do século XIX (Foucault, 2009).
Ela se constituiu fora do aparelho judiciário, quando se elaboraram, por todo o corpo social, os processos para repartir os indivíduos, fixá-los e distribuí-los espacialmente, classificá-los, tirar deles o máximo de tempo e o máximo de forças, treinar seus corpos, codificar seu comportamento contínuo, mantê-los numa visibilidade sem lacuna, formar em torno deles um aparelho
5 Informações colhidas em 06/08/2012 no banco de dados Geopresídios, do Conselho Nacional de
Justiça. O levantamento, atualizado diariamente, pode ser consultado acessando o endereço http://www.cnj.jus.br/geo-cnj-presidios/?w=1280&h=800&pular=false. 6 MONTENEGRO, Manuel Carlos. Órgãos criarão banco de dados sobre estrangeiros presos. Portal
CNJ. Brasília, DF, mar. 2012. Seção Notícias. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/18520:orgaos-criarao-banco-de-dados-sobre-estrangeiros-presos. Acesso em: 11/03/2012.
14
completo de observação, registro e notações, constituir sobre eles um saber que se acumula e se centraliza (id, p. 217).
Portanto, até o advento da prisão-castigo a que se refere Foucault (ibid), estar
preso significava apenas um estado passageiro, uma transição penosa entre a
liberdade e a execução da pena em si que, conforme Gaio e Bordignon (2011),
podia consistir tanto na morte do réu quanto em mutilações corporais ou penas
infamantes7. Tal mudança de sentido, segundo Chiaverini (2009), é característica
própria da Justiça, que se adapta às transformações inerentes à passagem dos
tempos. “A prisão serviu para a contenção e a guarda dos réus a fim de preservá-los
fisicamente até o momento de serem julgados. [...] A prisão era uma espécie de
‘antessala’ de suplícios, pois usava-se a tortura como forma de conseguir a verdade,
sendo na realidade uma extinção física do indivíduo” (Gaio; Bordignon, 2011, p. 3).
Por mais extrema que seja a definição dos autores, ela é útil para reforçar a
ideia de que a prisão não é uma invenção moderna e que já foi objeto de estudo de
vários teóricos. E embora tenha sido admitida como penitência apenas cerca de dois
séculos atrás, ela já existia e acompanhava a humanidade há muito tempo, desde a
antiguidade, ou antes. “A forma geral de uma aparelhagem para tornar os indivíduos
dóceis e úteis, através de um trabalho preciso sobre seu corpo, criou a instituição-
prisão, antes que a lei a definisse como pena por excelência” (Foucault, 2009, p.
217).
Com a mudança, no entanto, a prisão que havia nascido socialmente e com o
objetivo de estender o sofrimento do condenado, teria passado a contar com os
novos contornos da lei, cunhados na tentativa de ressocialização do preso, de
recuperação e de utilização dentro de uma lógica capitalista, finalidade que, segundo
Foucault (id), é comum nas sociedades atuais, principalmente as ocidentais.
As discussões a respeito de penas mais brandas ou mais severas, sobre a condição do apenado não faziam parte das preocupações dos discursos oficiais, só a partir da emergência de um discurso especializado e científico sobre o tema é que a prisão passou a ser construída como tipo ideal de punição aos delitos (Sormanny; Sousa, 2009, p. 7).
É claro que existem outras análises acerca da delimitação do que seria a
prisão e, consequentemente, estar preso. Abordagens mais simbólicas, que se 7 Segundo Moreira Filho (2007), penas infamantes seriam todas aquelas que atingem diretamente a
honra do condenado, como a publicação da condenação ou de fatos relacionados ao julgamento em veículos de comunicação de grande circulação ou audiência, por exemplo.
15
referem a um tipo de cerceamento antes psicológico do que físico, praticado
mediante mecanismos de interferência cognitiva, como a televisão, por exemplo
(Férres, 1998). Entretanto, para a presente pesquisa, o conceito de prisão fica
limitado à sua abordagem física e criminológica.
2.3 CONCEPÇÕES SOBRE LIBERDADE
Vários teóricos conceituaram o que acreditavam ser o estado tal de um
indivíduo em que quaisquer formas de amarras físicas, sociais e/ou intelectuais
inexistem, ou existem e não exercem tanta influência, ou existem e não são
percebidas por ele, ou existem por imposição da lei, dentre outras possibilidades.
Para fins desta pesquisa, no entanto, consideram-se algumas que se relacionam,
assim como a discussão anterior, com um entendimento mais pragmático sobre o
que a liberdade representa; voltadas ao aspecto corporal de sua significação,
portanto.
Assim sendo, invocam-se primeiramente as análises de Constant (1985), que
embasou o entendimento legal acerca da liberdade em diversos países:
É para cada um o direito de não se submeter senão às leis, de não poder ser preso, nem detido, nem condenado, nem maltratado. [...] O direito de dizer sua opinião, de escolher seu trabalho e de exercê-lo; de dispor de sua propriedade, até de abusar dela; de ir e vir, sem necessitar de permissão e sem ter que prestar conta de seus motivos ou de seus passos. [...] O direito de reunir-se a outros indivíduos, seja para discutir sobre seus interesses, seja para professar o culto que ele e seus associados preferem. [...] É o direito, para cada um, de influir sobre a administração do governo (p. 1).
Mais do que simplesmente conceituar o termo, o autor pretendia comparar a
compreensão fundamental da liberdade corrente nas civilizações modernas em
relação às mais antigas, como a de Esparta e Roma, por exemplo. Tudo isso com o
objetivo de mostrar que certas instituições empregadas em determinados momentos
históricos nem sempre cabem e são eficientes fora do contexto em que surgiram e
se desenvolveram. Em outras palavras, ele acreditava que o tipo de liberdade
exercido no passado seria inócuo se aplicado nas sociedades contemporâneas.
Antes dele, entretanto, o tema já era abundantemente discutido no campo da
Filosofia e Sociologia, dentre outras áreas do conhecimento humano. E entre os
principais nomes dessa fase está Montesquieu (2000), que analisava as questões da
16
liberdade em sua base de significação política. Assim, o autor concluiu que a
liberdade é o direito de fazer tudo “o que se deve querer fazer e em não ser forçado
a fazer o que não se tem o direito de querer” (p. 166). Sob esse enfoque, também
Férres (1998) entende que a liberdade é relativa, ou mesmo mítica, pelo menos nas
sociedades ocidentais, já que consiste em “poder fazer o que se deseja porque se
deseja o que os outros desejam que se deseje” (p. 16).
Ora, mesmo enfocando aspectos diferentes do que se entende por liberdade
– um se refere à política e o outro, à televisão –, os pensamentos dos dois autores
se encontram. E mais que dialogar, dizem praticamente a mesma coisa, ou seja, que
uma vez inseridos em um grupo, os sujeitos são impelidos a querer aquilo que é
mais conveniente para a coletividade em determinada época, local, conforme os
costumes e demais variantes que podem influenciar na delimitação do que uma
sociedade espera de seus integrantes. Traduzindo, as pessoas não são diretamente
livres, ainda que acreditem no contrário. E mesmo que o tentassem ser,
possivelmente acabariam pressionadas a mudar de atitude ou punidas, já que, como
membros da sociedade, devem viver e agir mediante as regras estabelecidas por
ela.
Em se relacionando liberdade com punição, aliás, a obra de Foucault (2009)
traz uma abordagem interessante e, como se poderá notar a seguir, bastante
pertinente. O autor classifica a liberdade como um direito e um bem, no sentido de
que o corpo – tido como instrumento para o castigo – é colocado em um “sistema de
coação e de privação, de obrigações e de interdições. [...] O castigo passou de uma
arte das sensações insuportáveis para uma economia dos direitos suspensos” (p.
16). Tal constatação se refere aos métodos de tortura e suplícios utilizados até
meados do século XIX como forma de punição aos condenados pela Justiça,
substituídos pelos meios que se instalaram nessa época e que perduram até os dias
atuais – uma troca jurídica, portanto.
Noutras palavras, para Foucault (id), em dado momento histórico, a liberdade
teria se transformado em uma espécie de objeto sobre o qual a Justiça pode lançar
mão para punir atos delinquentes. Por isso, além de ser um direito intrínseco à
condição de indivíduo, a liberdade também poderia ser caracterizada como um bem
jurídico passível de suspensão temporária ou definitiva, conforme as circunstâncias.
Tal entendimento não só é válido como pode ser verificado em momentos
importantes da construção do conceito de liberdade nas sociedades. Na Declaração
17
Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1998), por exemplo, obra contemporânea à
do autor e que fala a diversas nações concomitantemente, é clara a deliberação de
que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São
dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com
espírito de fraternidade” (p. 1). O acordo ainda versa que “todos são iguais perante a
lei e têm direito [...] a igual proteção da lei” (id, p. 2).
Por outro lado, o mesmo documento também determina que ninguém pode
ser preso, detido ou exilado de modo arbitrário, ou seja, sem razão motivadora, e
que mesmo naqueles casos onde o indivíduo incorra em atitude delituosa, ele tem o
direito a um julgamento para decidir sobre sua conduta. Ou seja, o indivíduo pode
sim ter a sua liberdade limitada, mas apenas em casos específicos, analisados
mediante o rigor da Justiça.
Assim sendo, fica claro o caráter ambivalente da concepção defendida por
Foucault (2009), de que a liberdade humana está sujeita à interpretação como direito
e como um bem, conforme o contexto em que é analisada.
Por fim, também a Constituição Federal do Brasil de 1988, em seu artigo 5º,
trata do tema sob abordagem semelhante. No texto, a liberdade, em todas as suas
variações, é determinada como um direito (Incisos II, IV, VI, IX, XIII, XV, XVII e XLI),
mas também um bem jurídico que, conforme as circunstâncias, pode ser retirado de
um indivíduo como forma de punição, caso ele venha a infringir a lei (Incisos XLVI e
LIV).
2.4 O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO
Em agosto de 2012, o sistema penitenciário brasileiro compunha-se de 2.751
estabelecimentos, entre penitenciárias8 (526), colônias agrícolas ou industriais9 (37),
casas de albergado10 (67), cadeias públicas ou casas de detenção11 (1.838),
8 De acordo com o Departamento de Execução Penal do Paraná (2012i), órgão oficial subordinado ao
governo do estado, penitenciária é um estabelecimento penal de segurança máxima, destinado a presos condenados ao cumprimento da pena em regime fechado.
9 Segundo o Departamento de Execução Penal do Paraná (2012a), as colônias agrícolas ou
industriais são estabelecimentos penais de segurança média, que abrigam condenados para o cumprimento da pena em regime semiaberto.
10
Segundo Santos (2001), albergues penais são instituições que trabalham com a semiliberdade, onde o preso cumpre sua pena em regime aberto, mas pode sair para trabalhar, sem escolta nem vigilância, nos horários fixados, e depois disso retorna à instituição para ali passar a noite.
18
hospitais de custódia ou de tratamento psiquiátrico12 (29) e delegacias13 (254). Toda
essa infraestrutura, distribuída pelos 26 estados do país, mais o Distrito Federal,
concentra um total de 334.454 vagas, quase de 170 mil a menos do que o
necessário para suprir toda a demanda de presos14.
O problema do déficit de vagas no sistema prisional brasileiro não é novidade
e pauta as discussões sobre o tema há vários anos. Isso porque, dentre as
alternativas de punição15 previstas no Código Penal Brasileiro de 1940, as privativas
de liberdade “parecem ser a medida mais lógica e correta a ser tomada contra os
criminosos. Embora normalmente nos sintamos pressionados a negar, a sociedade
contemporânea clama por prisão e pela ação do Estado contra os delinquentes”
(Sormanny; Sousa, 2009, p. 4). Uma espécie de remédio social, portanto, destinado
a sanar o problema da criminalidade.
Pode-se compreender o caráter de obviedade que a prisão-castigo muito cedo assumiu. Desde os primeiros anos do século XIX, ter-se-á ainda consciência de sua novidade; e, entretanto ela surgiu tão ligada, e em profundidade, com o próprio funcionamento da sociedade, que relegou ao esquecimento todas as outras punições que os reformadores do século XVIII haviam imaginado. Pareceu sem alternativa, e levada pelo próprio movimento da história. [...] Ela é detestável solução, de que não se pode abrir mão (Foucault, 2009, p. 218).
Entretanto, essa tendência verificada no Brasil de aprisionar seus condenados
não surge limitada às fronteiras do país. Não é concepção apartada do resto do
globo, independente, única. Pelo contrário, faz parte de uma trama muito mais
complexa, que se funda na utilidade das prisões, nos objetivos que elas têm e no
que se espera do sistema de encarceramento como um todo.
11
As cadeias públicas – também chamadas de casas de detenção – definem, para Santos (2001), os locais de aprisionamento provisório, abrigos passageiros para os presos. 12
Sobre os hospitais de custódia, são estabelecimentos médicos-penais que buscam a readaptação física do preso, mediante vigilância constante e ininterrupta, durante determinado período de tempo dentro do qual o condenado recebe tratamento. Em relação às instituições destinadas ao tratamento psiquiátrico, consistem naquelas que oferecem tratamento mental aos condenados, e que buscam mais o acompanhamento do que necessariamente a cura (id). 13
Para Santos (ibid), as delegacias são repartições públicas nas quais o delegado exerce a sua função e onde, por consequência, os presos acabam abrigados por determinado período de tempo. 14
Informações colhidas em 06/08/2012 no banco de dados Geopresídios, do Conselho Nacional de Justiça. O levantamento, atualizado diariamente, pode ser consultado acessando o endereço http://www.cnj.jus.br/geo-cnj-presidios/?w=1280&h=800&pular=false. 15
As penas principais são de reclusão, de detenção e de multa.
19
Assim, longe de ser uma escolha banal, segundo Foucault (id), a opção pela
prisão daqueles que descumprem as leis de uma sociedade é uma característica
própria dos grupos ditos civilizados. Para o autor, isso se deve ao duplo caráter da
liberdade que, como já dito anteriormente, se configura, ao mesmo tempo, como um
direito e um bem jurídico, e que não apenas é comum a todos da mesma maneira
como também se liga aos sujeitos por meio da emoção, de sentimentos universais e
constantes. Consequentemente, segundo o teórico, a sua limitação ou perda
acarreta a mesma sensação de dano, custa o mesmo preço simbólico para todos os
integrantes da comunidade; uma pena igualitária, portanto, e justamente por isso,
ainda mais eficiente do que a aplicação de multas, por exemplo.
Foucault (ibid) entende que, como a falta de liberdade tem um custo para o
condenado, certo é pensar que há aí uma faceta jurídico-econômica da pena. É
como uma reparação, pois “retirando tempo do condenado, a prisão parece traduzir
concretamente a ideia de que a infração lesou, mais além da vítima, a sociedade
inteira” (p. 218). Também Rego (2004) partilha dessa compreensão e defende que a
prisão “traz consigo a concepção cristã da penitência, cujo objetivo quase
terapêutico é o de submeter o criminoso a condições precárias de vida como forma
de pagar o mal que fez à sociedade. É preciso sofrer para reparar as faltas
cometidas” 16.
Todavia, além de exigir uma espécie de reparação pelo erro cometido, a
cadeia também carrega, intrinsecamente, outra função igualmente importante. De
acordo com a obra de Foucault (2009), junto com essa relativa reparação
econômica, a prisão também cumpriria a função de transformar o indivíduo, torná-lo
uma pessoa melhor. Por isso, além do aspecto jurídico-econômico, a prisão –
considerada por ele a “mais civilizada das penas” (p. 219) – também se serve de um
caráter técnico-disciplinar, como se fosse, em uma associação bastante simplória,
uma espécie de quartel, ainda que mais estrito, ou escola, porém sem qualquer
compaixão. Nesse sentido, também Sousa (2004a) apurou, mediante pesquisa junto
a funcionários e dirigentes de complexos prisionais, que as cadeias de modo geral
têm essa conotação dupla de punir e educar, de ressocializar o preso. “Funciona
16
REGO, Isabel Pojo do. Sociologia da prisão. Seção Sociedade e Estado. Brasília, DF, v. 19, n.1, jan-jun. 2004. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-69922004000100011&script=sci_arttext. Acesso em: 20/03/2012.
20
para punir, afastar do convívio social o infrator e, ao mesmo tempo, recuperar esse
elemento, capacitá-lo pra conviver novamente no seio da sociedade” (p. 4).
Em resumo, essas seriam as vantagens que, reunidas, teriam justificado a
utilidade das prisões desde o momento em que se buscou uma forma mais coerente
de punição em substituição aos suplícios, e que teriam transformado as cadeias na
opção mais sólida e eficaz para se chegar a esse objetivo.
Por outro lado, considere-se também o seguinte: desde a implementação da
Constituição Brasileira de 1988, ficou estabelecido que, no país, a penalização
máxima permitida é o aprisionamento. Ou seja, não se admite, em território nacional,
a execução de penas capitais17, salvo em situações de guerra, nem de caráter
perpétuo18, nem de trabalhos forçados, nem mediante crueldade. Portanto, afora
sentenças mais brandas como a de pagamento de multas ou de prestação de
serviços à comunidade, ou outras em menor escala, como aquelas em que se
permite, já de início, o cumprimento da pena em regime aberto ou semiaberto,
ligadas a crimes igualmente menos graves e/ou contravenções, o acolhimento dos
condenados da Justiça em instituições penais, seja pelo tempo que for, é a única
saída para a penalização de criminosos no Brasil.
No entanto, há outros fatores que influenciam esse cenário. Para Viégas
(2003), entre as principais razões para o aumento dos índices da criminalidade e,
por consequência, do número de apenados, está o crescimento da população
urbana de uma sociedade. Também Resende (2008) partilha dessa concepção,
porém de modo ainda mais direcionado, já que não se refere apenas às regiões
urbanas em geral, mas àquelas no entorno das grandes metrópoles. Ele defende
que “as maiores taxas de criminalidade podem ser vistas nas regiões metropolitanas
dos diferentes estados. Dos 141 municípios com taxa de homicídios maior do que 50
por cem mil habitantes, 54 municípios têm uma população maior que cem mil
habitantes” (p. 216).
Para se ter ideia, a taxa de homicídios na Grande Curitiba, cuja população é
de 3.174.201 habitantes (IBGE, 2010b), foi de 49 mortes para cada 100 mil
habitantes em 2011, índice muito acima do máximo estabelecido pela Organização
17
Segundo Cavalcanti (2010), penas capitais são aquelas que culminam na morte do condenado.
18
De acordo com o artigo 75 do Código Penal, o tempo máximo para o cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 anos, mesmo que os anos de condenação ultrapassem esse período.
21
das Nações Unidas – ONU, que é de 10 assassinatos por 100 mil habitantes
(MARÉS, 2012), e praticamente o mesmo mencionado na obra de Resende (2008),
em trecho já citado. Também Panucci (2004) identifica o fator urbanização entre os
primordiais para o desenvolvimento do crime, em várias de suas concepções:
No Brasil, quando se compara as taxas de homicídios entre estados e municípios, a dimensão de maior impacto é o grau de urbanização. Estados e cidades com maior população rural revelam taxas de homicídio muito inferiores aos locais em que a maioria da população concentra-se na zona urbana. [...] Os fatores muito intensos de déficits sociais são capazes de moldar a personalidade, os valores, de tal modo que é de ser observado se o comportamento do delinquente foi criado pelo próprio meio, pela sociedade desorganizada que se forma em torno das grandes cidades (p. 18-19).
De fato, a população brasileira vem crescendo nas últimas décadas,
principalmente a partir dos anos 40, quando começaram a cair os índices de
mortalidade no país em contrapartida aos níveis de fecundidade, que ficaram mais
acentuados (IBGE, 2011). “Em comparação com o Censo 2000, a população do
Brasil apresentou um crescimento relativo de 12,3%” 19. No mesmo período,
entretanto, os índices relativos à população carcerária foram bem mais significativos:
saltaram de 233 mil presos, em 2000, para 496 mil em 2010 – uma elevação de
113% (Canário, 2011).
Com isso, é possível mesmo admitir que o adensamento urbano também
figure entre os fatores para o surgimento e crescimento da criminalidade no Brasil,
mas ainda há mais que se considerar. Outros estudos apontam que a acentuação no
rigor da lei é, igualmente, um aspecto determinante para o aumento do número de
internos nas cadeias.
Várias explicações podem ser encontradas para se entender o fenômeno do crescimento da população carcerária. Os números mostram que o endurecimento na punição de certos crimes levou mais gente às prisões. [...] Só que o maior rigor das leis não pode ser considerado uma vitória na luta contra o crime (id
20).
19
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Sinopse do Censo Demográfico 2010 – Primeiros resultados definitivos do Censo 2010: população do Brasil é de 190.755.799 pessoas. Brasília, DF, 2011. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=1866&id_pagina=1. Acesso em: 22/03/2012. 20
CANÁRIO, Pedro. População Carcerária dobra em dez anos. Consultor Jurídico. [S.l.], 2011. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2011-jul-23/numero-presos-cresce-indice-criminalidade-brasil. Acesso em: 23/03/2012.
22
Como se pode notar, a explicação para a situação carcerária que se desenha
no Brasil depende de variados fatores, inter e independentes entre si, e que regulam
a concepção de prisão que se tem atualmente no país. Em todo caso, é certo que
uma vez aumentada a criminalidade, também a população carcerária será ampliada,
ainda que em proporções diferentes. E como se tem visto, a infraestrutura do
sistema prisional brasileiro caminha a passos bem mais lentos, razão pela qual o
déficit de vagas nas unidades penais já representa mais de 33% da quantidade total
de presos, segundo análise dos dados acerca da quantidade de internos em relação
às vagas disponíveis.
2.4.1 Medidas de ressocialização e reincidência criminal
Uma vez que a prisão surge socialmente e legalmente como castigo, mas
também como medida corretiva, há de se explorar o caráter de ressocialização das
penas que, segundo Foucault (2009), “fazem parte da armadura institucional da
detenção penal” (p. 220). O autor defende que a disciplina, na figura das leis, surge
como uma forma de disfarçar uma intenção maior que é a do controle sobre o corpo
do condenado que, por sua vez, deve se tornar dócil e útil ao fim da pena, para
então ser reinserido e reaproveitado dentro da lógica capitalista.
Na verdade, a prisão foi criada como uma instituição completa e austera, se transformando em um sinônimo de privação da liberdade, um bem decantado como universal e medido em tempo na sociedade mercantil, e correção individualizada dos detentos que podiam ser libertados antes do prazo. Sua base não está na violência dos guardas ou no despotismo administrativo, mas no fato de exigir-se que a prisão seja útil, desempenhando um papel técnico positivo e realizando transformações no indivíduo. (Sormanny; Sousa, 2009, p. 9).
Ora, certo é que uma das principais finalidades da prisão na modernidade
consiste mesmo na recuperação dos indivíduos e na sua recolocação no meio
social. Tanto é verdade que Capez (2000) trata do tema já dentro da definição do
que se entende legalmente por pena no Brasil, ou seja, de forma completamente
comprometida, deixando cedo os dois conceitos interligados. Para ele, trata-se de
uma “sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, e, execução de uma
sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou
privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao
23
delinquente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela
intimidação dirigida à coletividade” (p. 313).
Nesse sentido, o autor defende que a ressocialização do preso se faz
presente em duas vertentes teóricas. A relativa, finalista, utilitária ou da prevenção,
que defende o fim prático e imediato de prevenção geral ou especial do crime e na
qual “a pena objetiva a readaptação e a segregação sociais do criminoso como
meios de impedi-lo de voltar a delinquir” (id). E a mista, eclética, intermediária ou
conciliatória, segundo a qual “a pena tem a dupla função de punir [...] e prevenir a
prática do crime, pela reeducação e pela intimidação coletiva” (ibid, p. 313 e 314).
Portanto, o entendimento teórico corrente acerca da recuperação do preso
gira em torno das iniciativas educacionais de reintegração social, cuja função
primordial é colocar o preso em condição de voltar a conviver pacificamente com os
seus semelhantes. Tanto isso é verdade que Alvim (2006) defende que “a forma
através da qual o infrator é punido tem que ser eficaz e a pena deve ser justa, uma
vez que o condenado deve estar recuperado quando sair da prisão, pronto para
reincorporar-se à sociedade e não mais agir em desacordo com a lei” 21. Exemplo
disso, segundo o autor, é o trabalho desenvolvido pela Associação de proteção e
Assistência ao Condenado – Apac. Ele aponta que os presídios administrados pela
instituição não apenas no Brasil, mas também na Argentina e no Peru, conseguem
desenvolver um trabalho de resgate social dos presos, e dessa forma recuperam e
ressocializam os indivíduos, exatamente conforme versam as teorias.
Os presos são tratados de forma diferente, como se fossem pessoas detentoras de direitos e deveres assim como qualquer outra, o que não ocorre nos demais presídios brasileiros [...]. Nos presídios sob a administração da Apac não existem policiais civis nem militares, os internos têm as chaves de todas as portas e portões da unidade – inclusive entrada e saída. No interior da unidade há lanchonete e sorveterias, o dinheiro não é proibido, o uso de roupas normais é permitido. Todas essas mudanças implicam na porcentagem de reincidência: 4,5 por cento, contra 85 por cento de instituições tradicionais (id
22).
Apesar de representar um trabalho importante, no entanto, os métodos
empregados pela instituição no trabalho de recuperação dos presos não vão além
21
ALVIM, Wesley Botelho. A ressocialização do preso brasileiro. Direito na net. [S.l: s.n.], 2006. Disponível em: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2965/A-ressocializacao-do-preso-brasileiro. Acesso em: 24/03/2012. 22
Idem ao 21.
24
do que a legislação determina, como é possível perceber. O diferencial em relação
às demais instituições penais, na verdade, se dá muito mais pelo respeito ao preso
como ser humano do que pelas atividades desenvolvidas, já que a Apac atua no
sentido de realmente cumprir os preceitos de reintegração dos sujeitos na
sociedade.
Entretanto, para Silva (2003), “a regeneração no sistema penitenciário
nacional, apesar de todas as reformas que praticamente nascem junto com a prisão,
sempre foi uma dissimulação justificada” (p. 33). O autor esclarece que a prisão –
longe de reeducar os criminosos e prepará-los para um retorno à sociedade – acaba
os transformando em sujeitos ainda mais nocivos, seja por conta dos tormentos
físicos pelos quais passam, seja pelas humilhações a que são submetidos, seja pelo
convívio entre os próprios condenados. Com isso, segundo o teórico, as cadeias
estariam muito mais próximas de serem indústrias do crime, que transformam os
presos em sujeitos ainda piores, do que de se tornarem instituições
ressocializadoras. “Hoje os juízes sentenciam, condenam acusado ou acusada a
uma pena. E sem se dar conta, condenam os réus a outra pena muito mais grave.
No despojamento frio do texto do Código, a sentença aparece como uma privação
de liberdade. Na realidade, muitas são cumpridas com requisitos da Casa de
Correção Imperial” (id).
Também Assis (2007) acredita que as penas infligidas aos condenados são
muito maiores do que a simples suspensão do direito de ir e vir:
A partir do momento em que o preso passa à tutela do Estado, ele não perde apenas o seu direito de liberdade, mas também todos os outros direitos fundamentais que não foram atingidos pela sentença, passando a ter um tratamento execrável e a sofrer os mais variados tipos de castigos, que acarretam a degradação de sua personalidade e a perda de sua dignidade, num processo que não oferece quaisquer condições de preparar o seu retorno útil à sociedade (p. 75).
Entre os problemas apontados por Assis (id) como empecilho à recuperação
do preso estão a superlotação, a precariedade estrutural das unidades prisionais, a
insalubridade, a má alimentação, a falta de trabalho e de estudo e o uso de drogas.
Para ele, tais fatores, somados ainda à falta de um esquema verdadeiramente eficaz
de segurança nessas instituições e ao ócio dos detentos, levam “à deflagração de
outro grave problema do sistema carcerário brasileiro: as rebeliões e as fugas de
presos” (p. 76). O autor ainda defende que, embora se caracterizem pela violência,
25
essas reações nada mais são do que reivindicações de direitos e de respeito, uma
forma de chamar a atenção das autoridades para a situação à qual eles estão
subjugados.
Já para Silva (2003), salvo raras exceções, o ideal de ressocialização ainda é
uma realidade bem distante da que se encontra, de fato, nas instituições penais
brasileiras. Um objetivo descrito e discutido, mas que na prática se comporta de
forma oposta. “Na atualidade o modelo ressocializador demonstrou ser ineficaz,
sendo provada a sua falência por meio de investigações empíricas que identificaram
as dificuldades estruturais e os escassos resultados conseguidos pelo sistema
carcerário em relação ao objetivo ressocializador” (p. 39).
Desse modo, segundo os autores, é de se concluir que a efetiva recuperação
do preso não é tarefa fácil de ser alcançada. E justamente por isso é que, segundo
eles, muitos presos acabariam reincidindo na prática criminosa, e vez por outra
retornando às prisões. No entanto, se um dos principais objetivos da pena imposta
ao condenado é o de ressocializá-lo, ou seja, recuperá-lo e reinseri-lo na sociedade,
então o fator reincidência pode ser considerado a prova de que tal sistema não tem
sido eficaz para restaurar esse indivíduo (Assis, 2007). Para se ter ideia, tal é o
tamanho do problema que, “embora não haja números oficiais, calcula-se que, no
Brasil, em média, 90% dos ex-detentos que retornam à sociedade voltam a delinquir,
e [...] acabam retornando à prisão” (p. 77).
Por outro lado, Julião (2010) entende que a reincidência não se funda apenas
nas questões internas, intrínsecas ao sistema penitenciário, “mas também por
fatores externos inerentes ao ambiente social, político, econômico e cultural em que
o apenado vive” 23. Em outras palavras, o autor defende que a reincidência não
define, por si só, o sucesso ou o fracasso das intenções do sistema penal em
relação ao indivíduo. Tal fenômeno, segundo ele, seria resultado de vários
movimentos combinados que se centralizariam na figura do criminoso.
Portanto, a questão da reincidência é um problema que preocupa a sociedade
no sentido de que se constitui não apenas como um agravante da criminalidade
primária, mas também como “a espinha dorsal das chamadas carreiras criminais, ao
23
JULIÃO, Elionaldo Fernandes. O impacto da educação e do trabalho como programas de reinserção social na política de execução penal do Rio de Janeiro. Revista Brasileira de Educação. Rio de Janeiro, v. 15, n. 45, set-dez. 2010. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-24782010000300010&script=sci_arttext. Acesso em: 25/03/2012.
26
redor dos quais o fenômeno da criminalidade adquire uma dimensão estrutural
dentro da sociedade” (MARIÑO, 2002, p. 220).
2.4.2 O cenário no estado do Paraná
Segundo o Departamento de Execução Penal do Paraná (2012f), o sistema
penal paranaense começou a ser formado em 1909, quando surgiram as cadeias
públicas no estado e também quando foi inaugurada a primeira penitenciária da
região, no bairro Ahú, em Curitiba, sob a influência das “ideias correspondentes ao
Período Criminológico em seu momento inicial de Antropologia Criminal” (Lima,
200624). De lá para cá, sempre se ampliando, a estrutura passou por diversas
mudanças e, em 1954, foi unificada por um único órgão administrativo, denominado
primeiramente Departamento de Estabelecimentos Penais do Estado – Depe,
passando a Departamento Penitenciário do Paraná – Depen-PR em 2001 e, por
último, em agosto de 2012, Departamento de Execução Penal do Paraná – Depen-
PR, subordinado à Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e dos Direitos
Humanos – Seju (Depen-PR, 2012f)25.
2.4.2.1 Infraestrutura
Em agosto de 2012, o Depen-PR possui três níveis executivos:
estabelecimentos penais fechados, que podem ser definitivos e/ou provisórios, os
semiabertos e os patronatos penitenciários, que atendem os egressos beneficiados
com a progressão para o regime aberto, aqueles em liberdade condicional, os
sentenciados a trabalhos externos, em liberdade vigiada, prestação de serviços à
comunidade e suspensão condicional da pena (id, 2012d). Trata-se de 260 unidades
penais, que juntas representam 9,45% de toda a estrutura punitiva nacional e que
oferecem 21.311 vagas para 26.230 presos – um déficit de 4.919 vagas, portanto, ou
24
Segundo Lima (2006), essa primeira penitenciária incorporou o ponto de vista das figuras históricas já mencionadas, ou seja, de que representava a tendência hegemônica da época. Essa estrutura possuía, inicialmente, 52 celas individuais e contava com cozinha, horta, alfaiataria, sapataria, tipografia e marcenaria. A autora explica que o trabalho diurno e o estudo noturno eram obrigatórios, até que o preso soubesse ler, escrever e contar. As disciplinas ministradas eram noções de gramática, aritmética, geografia e história do Brasil. 25
Conforme estrutura organizacional atual (Decreto nº 5558/12 – PR) junto aos anexos, na página 148.
27
23,08%26. Entretanto, apesar da falta de vagas, os principais objetivos do conjunto
punitivo consistem na efetiva reinserção dos apenados na sociedade, através do
respeito à pessoa e humanização das prisões, bem como a busca pela excelência
na gestão penal (ibid, 2012b). Talvez por isso é que o governo do Paraná tem
investido no setor e ampliado tais instalações.
Para se ter ideia, no início de março de 2012, um novo prédio do complexo
pertencente à Penitenciária Central do Estado foi inaugurado. A entrega representou
a abertura de 1.156 novas vagas no local e precedeu a inauguração da Penitenciária
Estadual de Cruzeiro do Oeste, em 30 de março, com 720 novas vagas criadas com
o objetivo de diminuir a população carcerária das delegacias da região (GUILLEN;
LOPES, 2012). Essas vagas, somadas às outras, provenientes das inaugurações
realizadas em seguida, no mês de maio – a unidade de regime semiaberto de
Maringá (Colônia Penal Industrial), com 330 novas vagas, e a reforma e ampliação
da Cadeia Pública de Foz do Iguaçu, com a criação de 700 novas vagas –
diminuíram um pouco o déficit verificado no estado na época (Depen-PR, 2012e).
Do mesmo modo, em abril de 2012 foi iniciado o processo de licitação para a
construção de um novo estabelecimento penal no complexo de Piraquara, com
capacidade para 516 presos de 18 a 25 anos de idade. A obra, que segundo o
Depen-PR (id) faz parte do Programa Nacional de Apoio ao Sistema Prisional do
Ministério da Justiça, será viabilizada por meio da parceria entre os governos federal
e estadual. Ao todo, projeta-se a construção, até 2014, de mais 14 estabelecimentos
penais, abrindo 6.348 novas vagas no sistema penitenciário paranaense (ibid27).
Ainda de acordo com o Depen-PR (ibid), as intenções do governo do estado
também incluem, além da unidade destinada a jovens e adultos em Piraquara,
outros cinco estabelecimentos penais que devem ser construídos em Apucarana,
Campo Mourão, Foz do Iguaçu, Londrina e Maringá, com 540 vagas cada, ao
mesmo tempo em que serão ampliados outros oito estabelecimentos penais. No
complexo penitenciário de Piraquara, a meta é criar uma unidade a mais, com 492 26
Informações colhidas em 06/08/2012 no banco de dados Geopresídios, do Conselho Nacional de Justiça. O levantamento, atualizado diariamente, pode ser consultado acessando o endereço http://www.cnj.jus.br/geo-cnj-presidios/?w=1280&h=800&pular=false. 27
DEPARTAMENTO DE EXECUÇÃO PENAL DO PARANÁ. Governo inaugura novas instalações da PCE e envia Mensagem à Assembleia para criação de Fundos Estaduais. Seção Notícias. Curitiba, PR, [2012]. Disponível em: http://www.depen.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=311&blid=8&tit=Governo-inaugura-novas-instalacoes-da-PCE-e-envia-Mensagem-a-Assembleia-para-criacao-de-Fundos-Estaduais. Acesso em: 28/03/2012.
28
vagas, e outra com 432 vagas. Já em relação às unidades de Foz do Iguaçu,
Maringá, Ponta Grossa e as duas de Londrina, o plano é de expansão e, com isso,
devem ser geradas mais 384 novas vagas em cada unidade, assim como em
Cascavel, que deverá ganhar 288 novas vagas. Entretanto, Lima (2006) enfatiza que
o crescimento na quantidade de instituições penais e, por consequência, do
quantitativo total de vagas, deve ser analisado com cautela.
É necessário ressaltar que esta conclusão pode não representar fielmente a realidade, já que esses estados (assim como os outros da Federação), segundo o DEPEN (2005), possuíam em junho de 2004, além dos presos sob a responsabilidade da administração penitenciária, um outro contingente, isto é, aqueles sob os cuidados das secretarias estaduais de segurança pública (id
28).
Ora, tal fator há mesmo de ser considerado, já que diminui o universo de
vagas disponíveis, mesmo com as novas instalações. Afinal, apesar da inauguração
e dos projetos iminentes, o Depen-PR também recebeu 7.026 presos em 2012, que
estavam sob a guarda da Secretaria de Estado de Segurança Pública desde 2011.
“Com isso, dos mais de 16.000 presos que estavam em cadeias e delegacias de
polícia do Paraná, em janeiro de 2011, hoje restam cerca de 12.000” (Depen-PR,
2012e29).
Até o final de 2013, presos de 29 carceragens administradas pela Secretaria da Segurança Pública devem ser transferidos para o Sistema Penitenciário Estadual. Com a medida, a responsabilidade pela guarda dos detentos fica a cargo da Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos. A previsão do governo é que até o mês de junho, cerca de 2,5 mil detentos deixem as delegacias e distritos. A prioridade será a transferência das mulheres. Aproximadamente 660 presas que estão em delegacias na região de Curitiba e no interior serão levadas para uma unidade feminina no Complexo Penitenciário de Piraquara (GUILLEN; LOPES, 2012
30).
28
LIMA, Regina Campos. Um panorama sobre o Sistema Penitenciário Paranaense. Revista Sociológica Jurídica. [S.l.], n. 3, jul-dez. 2006. Disponível em: http://www.sociologiajuridica.net.br/numero-3/179-um-panorama-sobre-o-sistema-penitenciario-paranaense-. Acesso em: 28/03/2012. 29
DEPARTAMENTO DE EXECUÇÃO PENAL DO PARANÁ. Governo inaugura novas instalações da PCE e envia Mensagem à Assembleia para criação de Fundos Estaduais. Seção Notícias. Curitiba, PR, [2012]. Disponível em: http://www.depen.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=311&blid=8&tit=Governo-inaugura-novas-instalacoes-da-PCE-e-envia-Mensagem-a-Assembleia-para-criacao-de-Fundos-Estaduais. Acesso em: 28/03/2012. 30
GUILLEN, Fabio; LOPES, Elisa. Oito mil presos devem ser transferidos de delegacias para penitenciárias. Gazeta do Povo. Curitiba, PR, 3m mar. 2012. Caderno Vida e Cidadania. Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?tl=1&id=1239352&tit=Nova-
29
Portanto, é possível constatar, como o fez Lima (2006), que tais ampliações
não resultam, necessariamente, numa contenção ou diminuição nos índices
relacionados à população carcerária, muito menos na resolução definitiva do
problema da superpopulação carcerária no estado, ainda que se configure como “um
dos mais graves problemas diagnosticados pelo Depen nacional” (id31). Todavia,
como já observado, é de se compreender que o Paraná tem buscado diminuir os
problemas relacionados à falta de vagas nas suas instituições penais, raiz das
superlotações que contribuem para outras dificuldades, como a disseminação de
doenças, violência e rebeliões, entre outras coisas.
2.4.2.2 Projetos de recuperação dos presos
Entre os projetos de recuperação e reinserção dos presos no convívio social
desenvolvidos pelo sistema penal paranaense está o Oficinarte, no qual os presos
se expressam através de criações artísticas de modo significativo, “demonstrando o
pensamento, a sensibilidade, a imaginação, a percepção e a intuição, visando a
aprimorar o desenvolvimento de suas capacidades criativas” (Depen-PR, 2012g32).
Nesse sentido, segundo a iniciativa, a arte é tratada como instrumento para que os
presos possam interpretar o mundo e transformar as experiências vividas em
criações originais – um projeto plástico de ressocialização dos condenados, cujas
obras estão incluídas no Museu Virtual da instituição33. Porém, o trabalho limita-se
apenas aos presos atendidos no Complexo Médico Penal, localizado em Piraquara,
na região metropolitana de Curitiba.
Em relação ao investimento no trabalho dos presos, o Depen-PR (2012j)
aponta a existência de 466 canteiros, sendo 359 próprios e 107 de empresas. E
penitenciaria-de-Cruzeiro-do-Oeste-vai-aliviar-delegacias-da-regiao-Noroeste. Acesso em: 31/03/2012. 31
LIMA, Regina Campos. Um panorama sobre o Sistema Penitenciário Paranaense. Revista Sociológica Jurídica. [S.l.], n. 3, jul-dez. 2006. Disponível em: http://www.sociologiajuridica.net.br/numero-3/179-um-panorama-sobre-o-sistema-penitenciario-paranaense-. Acesso em: 28/03/2012. 32
DEPARTAMENTO DE EXECUÇÃO PENAL DO PARANÁ. Oficinarte. Curitiba, PR, [2012]. Disponível em: http://www.oficinarte.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=2. Acesso em: 28/03/2012. 33
É possível acessar as obras do museu no link: http://www.oficinarte.pr.gov.br/oficinarte/modules/galeria/listaEventos.php.
30
neles, atuam 2.987 presos – 1.597 nos canteiros próprios e 1.390 nos canteiros das
empresas. Assim, segundo a instituição, o percentual de internos que trabalham de
alguma forma chega a 20,92%. Já o desenvolvimento educacional dos presos é
tarefa proveniente de um convênio entre a Secretaria de Justiça, Cidadania e
Direitos Humanos – Seju, gestora do Depen-PR, e a Secretaria de Estado da
Educação – Seed, para a escolarização dos internos a nível fundamental e médio.
Segundo o Depen-PR (2012c), em 2010, o atendimento às unidades penais chegou
a abranger 25% da população carcerária. Além disso, desde 1993 também são
oferecidos cinco cursos de qualificação profissional aos encarcerados, cujo objetivo
é preparar os alunos para a reinclusão no mundo do trabalho depois do
cumprimento da pena, e abrangem as áreas de prótese dentária, eletricista
instalador predial de baixa tensão, auxiliar de serviços de panificação, hidráulica e
pintura (id, 2012h).
Há ainda outros processos que auxiliam o desenvolvimento do preso de modo
paralelo, como os relacionados à educação religiosa, acompanhamento psicológico
e acompanhamento jurídico. Ainda assim, segundo Lima (2006), enquanto algumas
unidades penais aparentam realmente se preocupar com a aplicação de tais
programas, prioritariamente as instaladas no interior do estado, outras,
especificamente as de Piraquara, ignoram a aparelhagem disponível para o
crescimento intelectual do preso.
Nem mesmo o trabalho que é tão valorizado no discurso do tratamento penal é ofertado de modo satisfatório no sistema penitenciário paranaense. [...] Mesmo naquelas que fogem a esse escopo, o que se observa é o oferecimento de atividades que, em geral, não possibilitam o desenvolvimento de capacidades profissionais ou que podem, posteriormente, quando o sentenciado se encontrar em liberdade, habilitá-lo para o mercado de trabalho. Situação parecida é a dos cursos profissionalizantes que, quando oferecidos, tendem igualmente a se voltar para áreas que dificilmente habilitarão o condenado a competir no mercado de trabalho (id
34).
Isso tudo, segundo a autora, serve para demonstrar que o sistema penal
paranaense opera em duas esferas – a teórica e a prática – que não se
34
LIMA, Regina Campos. Um panorama sobre o Sistema Penitenciário Paranaense. Revista Sociológica Jurídica. [S.l.], n. 3, jul-dez. 2006. Disponível em: http://www.sociologiajuridica.net.br/numero-3/179-um-panorama-sobre-o-sistema-penitenciario-paranaense-. Acesso em: 28/03/2012.
31
correspondem adequadamente. E tal condição coloca toda a infraestrutura em sério
risco de falência, situação semelhante à do complexo nacional.
2.4.2.3 Complexo penal em Piraquara
A cidade de Piraquara, na Grande Curitiba, concentra sete estabelecimentos
penais, quais sejam: o Centro de Triagem, a Colônia Penal Agroindustrial do Paraná
(CPAI), a delegacia de Polícia Civil, a Penitenciária Central do Estado (PCE), as
Penitenciárias Estaduais de Piraquara (PEPs) I e II e a Penitenciária Feminina do
Paraná. Juntas, essas unidades concentram 6.278 vagas para um total de 6.389
presos, um déficit de 111 vagas, ou 1,77%, índice bastante inferior do que o
registrado a nível estadual, que é de 23,08%35.
Em agosto de 2012, o complexo penal instalado em Piraquara representa
29,46% de todas as vagas disponíveis no estado. Entretanto, apesar de relevantes,
apenas uma das sete unidades apresenta condições de funcionamento
consideradas regulares – o centro de triagem. Quanto às demais, segundo
levantamento divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, por meio do
sistema Geopresídios (2012), a delegacia figura na categoria ‘ruim’, enquanto as
quatro penitenciárias e a colônia pesam na classificação ‘péssimo’36. Para fins desta
pesquisa, entretanto, por recomendação da Escola de Educação em Direitos
Humanos do Depen-PR, conforme consta na Justificativa desta pesquisa, serão
estudadas a CPAI e a PCE, simultaneamente.
2.4.2.3.1 Colônia Penal Agroindustrial do Paraná
Inaugurada no ano de 1941, consiste em um estabelecimento penal de
segurança média, voltado a condenados masculinos em cumprimento de regime
punitivo semiaberto (Depen-PR, 2012a). Com área total construída de mais de 22
mil metros quadrados, a estrutura abriga 1.453 presos, distribuídos em 1.395 vagas,
35
Informações colhidas em 06/08/2012 no banco de dados Geopresídios, do Conselho Nacional de Justiça. O levantamento, atualizado diariamente, pode ser consultado acessando o endereço http://www.cnj.jus.br/geo-cnj-presidios/?w=1280&h=800&pular=false. 36
Idem ao 35.
32
e registrou, entre agosto de 2011 e agosto de 2012, um total de 132 fugas37. Além
disso, inclui uma escola de alfabetização e profissionalização dos detentos e parque
industrial com cinco mil metros quadrados, que abrigam três empresas.
De acordo com o Depen-PR (id), a Paraná Esporte utiliza a mão de obra dos
internos para a fabricação de bolas de futebol de campo e de salão, além de redes
esportivas e bonés, dentro do projeto Pintando a Liberdade. O programa surgiu de
uma iniciativa do Ministério do Esporte e Turismo com o objetivo de promover as
atividades esportivas dos menores carentes. Já a Auto Capas e Capotas Felipe
produz capotas para vários tipos de pick-ups nacionais e importadas, além de redes
para caçambas, capas para carros e marítimas e sacos de areia para carrocerias,
enquanto a Flexi Office Store trabalha com a industrialização e pintura de
aglomerados de fibra de madeira em peças para móveis de escritório.
2.4.2.3.2 Penitenciária Central do Estado
Destinada a presos masculinos condenados a penas de cumprimento em
regime fechado, configura-se como estabelecimento de segurança máxima (ibid,
2012i) e concentra uma população carcerária de 1.432 pessoas distribuídas entre
1.480 vagas38.
Segundo Lima (2006), a unidade foi inaugurada no ano de 1954, tendo sido a
terceira unidade penal construída no Paraná, e funciona em uma estrutura com 25
mil metros quadrados, dentro da qual há 11 galerias, duas cozinhas, dois refeitórios,
sete pátios, 63 quartos para visita íntima, nove salas de aula, uma biblioteca, quatro
salas para atendimento técnico, uma enfermaria, um consultório médico e um
odontológico. Entretanto, tais dados não contemplam as melhorias verificadas com a
inauguração da nova ala, em março de 2012. De acordo com o sistema
Geopresídios (CNJ, 2012), não houve registros de fugas na unidade no período
compreendido entre agosto de 2011 e agosto de 201239.
37
Informações colhidas em 06/08/2012 no banco de dados Geopresídios, do Conselho Nacional de Justiça. O levantamento, atualizado diariamente, pode ser consultado acessando o endereço http://www.cnj.jus.br/geo-cnj-presidios/?w=1280&h=800&pular=false. 38
Idem ao 37. 39
Idem ao 37.
33
Por fim, depois de explicitados os meandros do sistema penal brasileiro,
paranaense e de Piraquara, com destaque aos locais que serão de fato trabalhados,
faz-se necessário compreender de que forma os presos – objetos centrais desta
pesquisa – são abordados e construídos no relato midiático.
2.5 O CRIMINOSO E A MÍDIA
A construção social da imagem do sujeito criminoso, longe de ser um
processo simples, depende de diversos fatores, nem sempre coerentes. Partindo do
princípio de que o crime consiste em tudo aquilo considerado ilegal dentro de uma
sociedade, o infrator é, cedo, resumido como marginal, bandido, deslocado, o que
não traduz com justiça a complexidade da personalidade e nem mesmo os atos ou
motivações desses sujeitos. E mesmo antes de serem definitivamente condenados,
via de regra esses indivíduos acabam julgados, execrados e até punidos pelos
diversos atores das sociedades, dentre os quais a mídia se destaca com excelência.
Desde o momento em que se abandonaram os suplícios físicos, segundo
Foucault (2009), teve início um período que ainda não se encerrou e que inclui a
inversão de objetos e a transmutação de valores para o exercício da punição. “É a
própria condenação que marcará o delinquente com sinal negativo ou unívoco:
publicidade, portanto, dos debates e da sentença” (p. 15). Tal premissa, como se
tem visto, não apenas permanece presente como parece servir de justificação para
um movimento constante, apesar de ilógico, de etiquetar os indivíduos segundo o
que se cogita que ele tenha feito já no momento do surgimento da suspeita.
Entretanto, se ninguém pode ser considerado culpado até uma condenação
final e definitiva, como determina a Constituição Federal de 1988, então rotular os
sujeitos como criminosos ou bandidos, muitas vezes até mesmo antes de serem
capturados, é no mínimo injusto, para não dizer ilegal.
Nesse confronto se destacam não apenas o sistema de Justiça criminal (polícia, promotores, juízes, agentes da execução da pena, assistentes sociais e psicólogos responsáveis pelos laudos criminológicos), mas membros da sociedade (vizinhos, conhecidos, colegas, ex-empregadores e futuros empregadores), políticos, imprensa e, também, os cientistas sociais profissionais que elaboram teorias científicas sobre a ocorrência do comportamento criminoso (MAGALHÃES, 2006, p. 76).
34
Para Duarte (2012), o sistema penal se estrutura sobre uma lógica
maniqueísta entre o bem e o mal, ou seja, admite apenas dois lados de uma coisa
jurídica: a parte certa e a errada. Segundo o autor, essa forma de tratar os
acontecimentos, dentro do que se entende por senso comum penal acaba por limitar
a análise dos fatos, prejudicando a busca das reais causas dos problemas.
Essa forma simplificada de pensar nasce da intolerância ou do desconhecimento da verdade do outro, é entender as coisas sem perceber o motivo, mas sim apenas numa relação de causa e efeito, mas o problema do maniqueísmo não é a existência de forças antitéticas, mas sim a defesa de que um é o bem e o outro o mal e por isso este deve ser destruído por aquele (id
40).
De acordo com o autor, é nessa perspectiva que a mídia atua, já que
enquanto formadora de opinião é também responsável por estimular esse caráter
parcial de se perceber as situações segundo o Direito Penal. Ele acredita que a
mídia, na figura da imprensa, traz intrinsecamente a característica de ser
contundente ao tratar determinados temas, tomando partido, e com isso molda a
opinião do público segundo a sua visão crítica e tendenciosa da coisa, banalizando e
estigmatizando o indivíduo.
A mídia tem criminalizado a exclusão social através do Direito Penal, seu poder é extremamente arbitrário e os danos causados às pessoas em razão da veiculação por pretensa prática de crime – via de regra ainda em fase de investigação – jamais poderão ser reparados, haja vista que o desmentido nunca terá a força do mentido. A mídia condena antes e durante o processo criminal, sendo completamente irrelevante o resultado do mesmo (GUIMARÃES apud Duarte, 2012
41).
Não é preciso ir longe para encontrar exemplos dessa realidade que, embora
não esteja necessariamente presente em todos os veículos, deixa claro que o
jornalismo tem ignorado alguns princípios importantes, como a correta apuração, o
respeito à presunção de inocência – um dos fundamentos da atividade jornalística,
segundo o Código de Ética da profissão (FENAJ, 2007) –, e o tratamento da notícia
como produto ou simples preenchimento de conteúdo em papel. Na busca pelo furo
40
DUARTE, Frederico de Sousa Almeida. A influência da mídia na esteriotipação dos criminosos. Web Artigos. [S.l.], 2012. Seção Direito. Disponível em: http://www.webartigos.com/artigos/a-influencia-da-midia-na-esteriotipacao-dos-criminosos/83938/. Acesso em: 25/03/2012. 41
Idem ao 40.
35
de reportagem42, muitos profissionais incorrem numa prática ainda mais perigosa
que os supostos criminosos aos quais se refere: a espetacularização dos fatos como
chamariz para vender a notícia.
Para Magri (2010), “a dramatização dos fatos de uma notícia é um dos
recursos utilizados pelo jornalismo popular para vender informação. [...] Os
telejornais populares sensacionalistas transformados em produtos de consumo
reforçam o caráter perecível da notícia. Na busca por novos produtos, esse gênero
pode contribuir para o acúmulo de imagens e estabelecer o espetáculo” (p. 64).
Paralelamente, Marcondes Filho (2002) defende que o mais preocupante é
que “hoje em dia as pessoas não questionam se o que o jornal está mostrando é
verdadeiro ou não. Mais importante que isso, o espetáculo-telejornal tem que ser
instigante, tem que fixar audiência” (p. 85). Sob essa perspectiva, segundo o autor, o
jornalista cada vez mais estaria se afastando da busca pela apuração da realidade
para fazê-la entrar no mundo da representação. “Nesse aspecto entende-se mais
claramente porque a TV, e principalmente ela, é procurada com ansiedade e
vontade pelas pessoas: só ela – e de forma forte, convincente e tecnicamente bem
resolvida – reconstrói sem conflitos o mundo, que as imagens das nossas janelas
teimam em refutar” (id, p. 110).
Ainda segundo Marcondes Filho (ibid), tal problema se funda já na fase de
produção da notícia. Por tratar-se de atividade muito complexa, envolver muitas
pessoas – apesar do movimento contrário, de redução das redações – e exigir uma
velocidade muito grande na construção do produto final, o autor defende que é
comum que os fatos não sejam apurados corretamente, isto é, não sejam de fato
verificados por falta de tempo hábil.
A máquina informativa tem processos que são detonados por jornalistas - associados aos seus próprios vícios (clichês) e visões de mundo parciais e preconceituosas -, produz, ela mesma, a desinformação através de diversos procedimentos de intoxicação com informação e, além disso, dá margem a processos livres, incontroláveis, inadministráveis de mistificação e desinformação (ibid, p. 113).
Portanto, independentemente da qualidade de investigação com que as
notícias são construídas, elas recorrentemente ganham rápido um valor de verdade,
ao menos por determinado período de tempo. E quando o tema é crime, nesse
42
Para Alvarenga (2011), furo de reportagem se refere à circunstância em que a informação é publicada em um veículo antes de todos os demais.
36
ínterim é comum que os suspeitos sejam cedo demais tratados como culpados,
mesmo antes de serem investigados pelos órgãos competentes.
Assim, há de se constatar que existe na imprensa uma predisposição para
escolher apenas um ponto de vista, um lado, na maioria das vezes com base em
fontes oficiais, como se poderá ver adiante, em detrimento das outras perspectivas
do mesmo fato. “Na tentativa de manter a pauta atualizada além da repetição as
reportagens se excedem tanto na ótica dramática quanto na técnica, e as matérias
se tornam parecidas” (Magri, 2010). Consequentemente, os consumidores da
informação, seja ela impressa, de áudio, vídeo ou eletrônica, acabariam limitados a
conhecer uma gama muito pequena de discursos, principalmente porque, segundo a
autora, os veículos cada vez mais se pautam uns pelos outros. E, uma vez os fatos
sendo regidos por uma única (ou poucas) linha(s) de raciocínio, eles podem carregar
consigo os aspectos da opinião do jornalista que os reproduziu, ainda que tragam –
talvez apenas como forma de justificação moral – um discurso modulado do que
seria o outro lado, que nem sempre o é, e sob a prerrogativa do respeito ao
interesse público.
Por isso é que, quando se trata de crimes, as notícias – desde as manchetes
– assumem um caráter muito mais impactante do que os temas gerais, por exemplo,
o que acaba produzindo efeitos substanciais em relação à opinião do público. E
apesar de o compromisso fundamental do jornalista, segundo o Código de Ética da
profissão (FENAJ, 2007), ser com a verdade no relato dos fatos, que por sua vez
deve pautar o trabalho da imprensa na precisa apuração dos acontecimentos e na
sua correta divulgação, o que se constata de fato é um relaxamento no cumprimento
dessa premissa. Nesse sentido, pensando na forma como a mídia divulga os casos
de crimes e os possíveis suspeitos desses atos é que se decidiu pelo
desenvolvimento desta pesquisa.
2.5.1 Os presos no jornal: como os internos da Colônia Penal Agroindustrial do
Paraná e da Penitenciária Central do Estado são retratados pela imprensa
Partindo do fato de que o acesso aos presos das duas unidades em questão
é restrito basicamente aos familiares e advogados dos internos, bem como aos
funcionários do sistema prisional, salvo raras exceções, condição que impede o
contato entre os internos e a sociedade, é de se constatar que a opinião formulada
37
junto à sociedade em relação a esse grupo de pessoas passa por um tipo bem
específico de mediação – neste caso, a imprensa. Portanto, fez-se necessário o
desenvolvimento de uma pesquisa prática em relação às reportagens veiculadas
sobre o assunto, de modo a compreender melhor o cenário que se desenha em
torno do tema.
O formato escolhido para abordar essa realidade foi a análise dos
conteúdos43 produzidos pelo jornal Gazeta do Povo – selecionado tanto por se tratar
de um veículo tradicional no estado quanto por representar, segundo Quadros,
Quadros e Massip (2009), o impresso de maior circulação no Paraná44. Assim, a
investigação foi desenvolvida junto à página virtual da empresa por meio da
utilização das palavras-chave ‘bandido colônia penal agroindustrial Piraquara’ (e
colônia penal agrícola Piraquara), ‘bandido penitenciária central Piraquara’, ‘preso
colônia penal agroindustrial Piraquara’ (e colônia penal agrícola Piraquara), e ‘preso
penitenciária central Piraquara’45.
Os resultados da pesquisa mostraram que o acervo de materiais sobre o tema
na página virtual do veículo, é composto por conteúdos produzidos e publicados
entre os anos de 2006 e 2012. Durante as buscas, verificou-se também que, exceto
no caso das combinações dos termos ‘bandido colônia penal agroindustrial
Piraquara’, que não obteve resultados, e ‘preso colônia penal agroindustrial
Piraquara’, que acusou apenas uma correspondência, em todas as outras cinco
abordagens o volume de textos localizados não equivaliam à quantidade real
disponível para leitura.
Assim, dos 698 conteúdos46 que a página acusava existir sobre o tema,
apenas 239 estavam de fato acessíveis ao público, ou seja, eram passíveis de
consulta – o que corresponde a pouco mais de 34% do volume inicial.
Consequentemente, a pesquisa considerou apenas o quantitativo de textos válidos e
verificáveis.
43
Os detalhamentos do processo podem ser verificados no tópico ‘Metodologia de Pesquisa’, a partir da página 79. 44
Segundo a Associação Nacional de Jornais (2012), a média de circulação do jornal verificada entre os anos de 2010 e 2011 ultrapassa os 43.500 exemplares vendidos diariamente. 45
Idem ao 43. 46
Resultado proveniente da soma dos quantitativos obtidos em todas as buscas combinadas.
38
Contudo, em meio às produções comprovadamente disponíveis para
consulta, 43 foram descartadas por representarem duplicações, ou seja, conteúdos
repetidos, e outras 16 acabaram rejeitadas por conta de tratarem de temas
totalmente alheios à pesquisa. Sendo assim, a análise foi aplicada tendo como base
um volume total composto por 180 textos.
Acima de tudo, o contato com as produções jornalísticas foi essencial para
consolidar os objetivos desta pesquisa por permitir uma compreensão mais precisa
acerca do tema deste trabalho e sobre como ele é tratado pela mídia. Afinal, se “a
identificação das falhas pode ser um meio viável de não repeti-las” (ROSA;
TEIXEIRA, 2010, p. 21), então considerar os materiais já produzidos sobre o assunto
seria, de todo modo, etapa obrigatória e primordial para uma fundamentação
coerente da presente investigação.
A pesquisa foi desenvolvida por intermédio da leitura flutuante47, que
viabilizou a identificação de categorias de análise como: tipo; tamanho; presença de
imagens e eventuais detalhamentos; modo de referência do criminoso no texto;
tipificação da principal fonte do texto; apresentação dos criminosos e eventuais
detalhamentos; temas principal e secundário da mensagem. Os dados levantados
foram fixados em um formulário de codificação, cujos resultados podem ser
verificados nos tópicos a seguir.
2.5.1.1 Tipo e tamanho de conteúdo
Os textos foram divididos nas modalidades entrevista, nota e reportagem com
o objetivo de revelar os formatos empregados pelos jornalistas na construção dos
conteúdos relacionados ao tema. Desse modo, as entrevistas compreendem o
formato pergunta-resposta, enquanto as notas e reportagens consistem nas
composições textuais em forma de redação, mais ou menos aprofundadas em
relação ao assunto.
Para diferenciar esses dois últimos tipos, adotou-se como critério a presença
de citações diretas, ou seja, pequenos trechos inseridos entre aspas, que
representam a transcrição da fala das fontes e, por isso, pressupõem maior
apuração através do contato direto com os entrevistados. Por isso, nesta pesquisa
47
Os detalhamentos do processo podem ser verificados no tópico ‘Metodologia de Pesquisa’, a partir da página 79.
39
foram consideradas reportagens os textos em que há ao menos uma citação direta,
enquanto as notas são representadas pelos textos nos quais esse recurso não
aparece.
Assim, dos 180 textos analisados, a grande maioria era composta por
reportagens (108), seguida pelo volume de notas (70) e pelas entrevistas (2). E uma
vez observado o critério de diferenciação entre as modalidades, o que se pode
perceber é que a maior parte das produções jornalísticas analisadas foi
desenvolvida em um formato que permite o tratamento mais apurado da informação,
com a consulta direta das fontes relacionadas ao assunto em questão.
MODALIDADES DE CONTEÚDO
Figura 1 – gráfico demonstrativo das modalidades de conteúdo
Tabela 1 – MODALIDADES DE CONTEÚDO
Entrevista
2 1,1% Nota
70 38,9%
Reportagem
108 60,0%
Já em relação ao tamanho dos textos, foram tratados como pequenos os
conteúdos compostos por até cinco parágrafos, médios os materiais com até 10
parágrafos e grandes os que tinham a partir de 11 parágrafos. Tal classificação foi
aplicada igualmente tanto nas duas modalidades de redação quanto nas entrevistas
encontradas.
Segundo esses critérios, portanto, verificou-se que há uma divisão
tecnicamente equilibrada dos conteúdos, já que os textos médios somaram 65
ocorrências, os grandes 62 e os pequenos 53. Em todo caso, o tamanho médio
acabou sendo o mais recorrente entre os conteúdos analisados, com 36,2% das
ocorrências.
40
TAMANHO DO CONTEÚDO
Figura 2 – gráfico demonstrativo dos tamanhos dos conteúdos
Tabela 2 – TAMANHO DO CONTEÚDO
Pequeno
53 29,4% Médio
65 36,2%
Grande
62 34,4%
2.5.1.2 Detalhamento sobre as imagens
Dentre os 180 conteúdos analisados, constatou-se que em 108 casos não
havia qualquer imagem para situar o leitor quanto aos acontecimentos e
personagens tratados no texto. Entretanto, como não se pode excluir a possibilidade
de tal condição ser proveniente da linha editorial do veículo48 em relação ao
tratamento dos conteúdos policiais49, passou-se a uma análise mais detalhada
acerca dos demais 72 casos, nos quais as ilustrações apareciam de algum modo
associadas ao texto.
PRESENÇA DE IMAGENS
Figura 3 – gráfico demonstrativo da presença de imagens junto aos textos
48
Características que norteiam o posicionamento dos veículos de comunicação. 49
O jornal Gazeta do Povo não possui uma editoria específica para os conteúdos policiais, de modo que as reportagens sobre esse assunto são geralmente incluídas no caderno Vida e Cidadania.
41
Tabela 3 – PRESENÇA DE IMAGENS
Sim
72 40,0% Não
108 60,0%
Do mesmo modo, na busca por uma análise criteriosa em relação à presença
de imagens junto aos conteúdos escritos, verificou-se primeiramente o modo como
essas imagens apareciam. De todas as produções compostas com a ajuda de
ilustrações, o que se observou foi que a maioria apresentava delas apenas uma
unidade (51), enquanto alguns poucos casos traziam duas (18) e outros mais raros
ainda somavam três (3) – número máximo de imagens verificado nos conteúdos
analisados.
QUANTIDADE DE IMAGENS
Figura 4 – gráfico demonstrativo das quantidades de imagens presentes junto aos textos
Tabela 4 – QUANTIDADE DE IMAGENS
Uma
51 28,3% Duas
18 10,0%
Três
3 1,7% Conteúdos sem imagens
108 60,0%
Na sequência, tendo em vista a necessidade de universalizar a abordagem
em relação aos casos em que havia imagens junto aos conteúdos escritos, optou-se
pelo aprofundamento da análise das ilustrações, mas apenas em se tratando da
principal em cada texto, descartando as secundárias por não serem recursos
presentes em todos os casos e por se apresentarem, em sua maioria,
complementarmente à primeira. Nessa linha, verificou-se que a fotografia foi o
formato utilizado em praticamente todos os casos, com 69 ocorrências, concorrendo
com apenas dois vídeos e um desenho. Paralelamente, como além de quantificar
também é importante observar o que as imagens revelam, optou-se pelo
desenvolvimento de uma análise relacionada aos elementos exibidos. Com isso, o
42
que se observou nas imagens localizadas junto aos conteúdos da pesquisa foi a
incidência de 14 temas imagéticos diferentes.
A classificação dos assuntos nas imagens também foi feita através de leitura
flutuante, ou seja, enfatizando os principais assuntos dos conteúdos e quantificando-
os numérica e estatisticamente. O resultado demonstrou que o tópico mais incidente
foi o que apontava para os casos em que o criminoso aparece como figura central
na imagem, característica presente em 18 conteúdos, contra oito materiais cujas
imagens retratavam vítimas.
TEMA DAS IMAGENS
Figura 5 – gráfico demonstrativo dos temas predominantes nas imagens
43
Tabela 5 – TEMAS DAS IMAGENS
Ações da polícia/Apreensões/Prisões
5 2,8% Ações da Justiça
2 1,1%
Criminosos/Ex-detentos/Presos
18 10,0% Documentos
2 1,1%
Especialistas
1 0,6% Familiares de presos
1 0,6%
Fugas
3 1,7% Insegurança/Medo
5 2,8%
Instituições penais/Instituições prisionais
7 3,9% Policiais
7 3,9%
Rebeliões
7 3,9% Simulações/Encenações
3 1,7%
Superlotação
3 1,7% Vítimas
8 4,4%
Conteúdos sem imagens
108 60,0%
2.5.1.3 Detalhamentos sobre o texto
Com relação ao texto em si, buscou-se detectar indícios acerca do
posicionamento do jornalista sobre o tema. Para tanto, a análise foi feita por
intermédio da leitura flutuante50 dos textos na íntegra, de modo que a combinação
do título com a estrutura do conteúdo permitisse uma observação mais completa.
Como consequência, algumas categorias de palavras acabaram surgindo e foram
inseridas no formulário de codificação de modo a contribuir para a identificação de
tais características.
A primeira delas trata da forma como os presos da Colônia Penal
Agroindustrial do Paraná e da Penitenciária Central do Estado são nomeados no
texto. A leitura flutuante permitiu a identificação de oito modos diferentes
empregados pelos jornalistas para cumprir essa função, reunidos aqui em grupos
por semelhança de significados, quais sejam: acusados/suspeitos; bandidos;
condenados/detentos/ex-detentos/presos; conforme o crime; criminosos;
foragidos/fugitivos; indivíduos/sujeitos; ou não eram referidos diretamente.
Os resultados mostraram que, dentre as classificações levantadas, aquela
que indicava o tratamento do preso pela sua condição (condenado/detento/ex-
detento/preso) foi a mais recorrente entre os conteúdos analisados, concentrando
46,1% dos casos (83 incidências), seguida pela que apontava os casos em que os
internos não eram referidos diretamente nos textos, que somaram 16,1% (29
incidências). 50
Os detalhamentos do processo podem ser verificados no tópico ‘Metodologia de Pesquisa’, a partir da página 79.
44
REFERÊNCIA AOS PRESOS
Figura 6 – gráfico demonstrativo dos modos de referência aos presos nas mensagens
Tabela 6 – REFERÊNCIA AOS PRESOS
Acusado/Suspeito
27 15,0% Bandido
8 4,4%
Condenado/Detento/Ex-detento/Preso
83 46,1% Conforme o crime (ladrão, sequestrador, etc)
8 4,4%
Criminoso
2 1,1% Foragido/Fugitivo
19 10,6%
Indivíduo/Sujeito
4 2,2% Não é referido diretamente
29 16,1%
Igualmente útil, a análise também considerou a presença dos presos no
desenvolvimento dos textos, bem como a forma como eles acabam referidos. Nesse
sentido, dos 180 conteúdos verificados, a maioria (108) não traz qualquer
informação sobre a sua identidade, quantitativo que representa a maioria dos casos,
com 60% das incidências.
É claro que não se pode descartar a possibilidade de que a não identificação
desses indivíduos seja fruto de um tratamento mais cuidadoso em relação à sua
imagem, bem como uma forma de proteção contra eventuais processos por danos
morais e materiais, entre outros, mas, se assim fosse, seria incoerente o fato de que
em 67 dos 180 conteúdos analisados (37,2% dos casos) a divulgação da identidade
real dos detentos foi verificada. E considerando que a legislação vigente no país
45
permite a publicidade do andamento de processos judiciais51, salvo nos casos
específicos em que se concede o benefício do segredo de Justiça52, o que, por sua
vez, representa exceção à regra, é de se constatar que a divulgação ou não dos
nomes dos presos é detalhe determinado por cada veículo de comunicação,
sobretudo pelos responsáveis diretos pela elaboração das reportagens, ou seja, os
repórteres e editores.
PRESENÇA DO PRESO
Figura 7 – gráfico demonstrativo da presença dos presos nas mensagens
Tabela 7 – PRESENÇA DO PRESO
Sim
72 40,0% Não
108 60,0%
Assim sendo, em se tratando das produções em que há a identificação
desses personagens, que representam 40% dos conteúdos, foram observados
aspectos como a nominação, idade e tipo de crime.
Nesse sentido, verificou-se que os casos em que os presos aparecem em
meio ao desdobramento do conteúdo com nomes reais somam 67 incidências,
contra cinco em que eles são apresentados com nomes fictícios – números que,
apesar de parecerem positivos, representam a parte minoritária de um cenário
composto também pelos 108 outros textos em que os internos são referidos apenas
pela sua condição de condenado, detento ou ex-detento, ou seja, sem qualquer
referência à sua identidade ou individualidade.
51
Segundo a Constituição Federal do Brasil (1988), a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem (Art. 5º, inciso LX). 52
Conforme Dall’Agnol (apud CHUERI; FERREIRA; GOMES JUNIOR, 2008), “a regra é que os procedimentos administrativos e processos judiciais sejam públicos, a absoluta exceção é a tramitação sob a égide do segredo de justiça. A finalidade da publicidade é clara: a-) permitir a fiscalização quanto à distribuição da Justiça; b-) garantia ao julgador perante à comunidade de que o mesmo agiu com imparcialidade” (p. 3).
46
IDENTIFICAÇÃO DOS PRESOS
Figura 8 – gráfico demonstrativo da identificação dos presos nas mensagens
Tabela 8 – IDENTIFICAÇÃO DOS PRESOS
Com nomes verdadeiros
67 37,2% Com nomes fictícios
5 2,8%
O preso não aparece como personagem, apenas como referencial para o tema
108 60,0%
Do mesmo modo, a indicação de detalhes como a idade dos presos
acompanha a análise anterior em relação à sua identificação no texto, ou seja, pode
ser verificada apenas nos casos em que o interno é nominado, seja com seu nome
verdadeiro, seja com nomes fictícios. Assim, o volume de conteúdos em que esse
recurso aparece representa 26,7% dos casos.
PRESENÇA DA IDADE DOS PRESOS
Figura 9 – gráfico demonstrativo da presença da idade dos presos
Tabela 9 – PRESENÇA DA IDADE DOS PRESOS
Sim
48 26,7% Não
24 13,3%
O preso não aparece como personagem, apenas como referencial para o tema
108 60,0%
Em relação à divulgação do crime cometido pelo preso, é um recurso
presente na grande maioria dos casos em que o interno é identificado de algum
modo, somando 66 incidências – número que representa 36,7% dos textos. Na
47
direção oposta, apenas seis conteúdos não revelaram o motivo pelo qual o detento
chegou a essa condição, volume que se traduz em 3,3% do total.
PRESENÇA DOS TIPOS DE CRIMES COMETIDOS
Figura 10 – gráfico demonstrativo da presença dos tipos de crimes
Tabela 10 – PRESENÇA DOS TIPOS DE CRIMES
Sim
66 36,7% Não
6 3,3%
O preso não aparece como personagem, apenas como referencial para o tema
108 60,0%
Por fim, a escolha dos entrevistados dos textos também foi critério analisado
durante a realização da pesquisa. Tal investigação revelou que, dentre os 180
conteúdos verificados, 157 traziam como vozes predominantes das mensagens as
fontes oficiais – aqui entendidas como profissionais que representam determinados
órgãos governamentais –, oito apresentavam vítimas, sete referiam-se aos presos,
cinco reproduziam a opinião de especialistas, dois traziam familiares de presos e
outros dois a apuração de representantes da imprensa. Por isso é que, como foi
possível constatar, a maior parte dos textos trazia um tom mais oficial, pouco plural e
sem o debate de ideias.
TIPOS DE FONTES
Figura 11 – gráfico demonstrativo dos tipos de fontes nos textos
48
Tabela 11 – TIPOS DE FONTES NOS TEXTOS
Criminoso/Preso/Ex-detento
6 3,3% Especialista
5 2,8%
Familiares de presos
2 1,1% Fonte Oficial
157 87,2%
Imprensa
2 1,1% Vítima
8 4,4%
2.5.1.4 Temas apresentados
Os 23 assuntos que integraram o formulário foram selecionados, como já dito,
por meio de leitura flutuante, de modo que os principais assuntos abordados
compuseram duas listas diferentes, voltadas ao tema principal e secundário das
mensagens. A análise duplicada serviu para dar mais eficiência à investigação, já
que são raros os casos em que um texto jornalístico apresenta e desenvolve apenas
um assunto.
Assim, sobre os temas principais, os resultados mostraram a maioria dos
conteúdos trazia o crime como assunto mais recorrente, ou predominante, com 30
casos, ou 16,7%, seguido das fugas dos presos dos estabelecimentos penais, que
somaram 24 ocorrências – número que representa 13,3% dos conteúdos verificados
durante a pesquisa.
Tabela 12 – TEMAS PRINCIPAIS
Agentes penitenciários
4 2,2% Assistência médica aos criminosos/presos
1 0,6%
Ataques/Brigas/Confrontos
10 5,6% Condicional/Indultos
6 3,3%
Crimes
30 16,7% Criminosos/Presos
6 3,3%
Facções/Gangues/Quadrilhas
8 4,4% Fugas
24 13,3%
Histórias de criminosos/Histórias de organizações criminosas
4 2,2% Histórico institucional
2 1,1%
Instalações penais/Instalações prisionais
5 2,8% Investimentos/Reformas
8 4,4%
Insegurança/Medo/Violência
4 2,2% Julgamentos/Decisões da Justiça
6 3,3%
Legislação/Normas
1 0,6% Polícia/Ações dos policiais
16 8,9%
Programas educacionais e profissionalizantes
6 3,3% Rebeliões
14 7,8%
Redução de pena/Progressão
3 1,7% Ressocialização
1 0,6%
Reincidência criminal
0 0,0% Transferências
9 5,0%
Superlotação/Falta de vagas
12 6,7%
49
TEMAS PRINCIPAIS
Figura 12 – gráfico demonstrativo dos temas principais das mensagens
Já com relação aos temas secundários, os resultados mostraram um
movimento oposto aos obtidos na análise dos temas principais. Nessa etapa da
50
investigação, verificou-se que o tema fuga de presos foi o mais repetido, seguido de
conteúdos que abordavam diretamente a incidência de crimes.
TEMAS SECUNDÁRIOS
Figura 13 – gráfico demonstrativo dos temas secundários das mensagens
51
Tabela 13 – TEMAS SECUNDÁRIOS
Agentes penitenciários
4 2,2% Assistência médica aos criminosos/presos
0 0,0%
Ataques/Brigas/Confrontos
7 3,9% Condicional/Indultos
6 3,3%
Crimes
22 12,2% Criminosos/Presos
6 3,3%
Facções/Gangues/Quadrilhas
5 2,8% Fugas
37 20,6%
Histórias de criminosos/Histórias de organizações criminosas
1 0,6% Histórico institucional
1 0,6%
Instalações penais/Instalações prisionais
6 3,3% Investimentos/Reformas
6 3,3%
Insegurança/Medo/Violência
4 2,2% Julgamentos/Decisões da Justiça
1 0,6%
Legislação/Normas
0 0,0% Polícia/Ações dos policiais
14 7,8%
Programas educacionais e profissionalizantes
3 1,7% Rebeliões
18 10,0%
Redução de pena/Progressão
3 1,7% Ressocialização
10 5,6%
Reincidência criminal
11 6,1% Transferências
9 5,0%
Superlotação/Falta de vagas
6 3,3%
2.5.1.5 Conclusões da análise de conteúdo
Dentre todos os aspectos observados na análise de conteúdo, os que mais
chamam a atenção são justamente os últimos investigados. Assim, a repetição de
determinados temas nas produções jornalísticas demonstra que os presos se tornam
notícia quando o assunto é negativo, ou seja, quando estão relacionados ao
cometimento de crimes ou, mais ainda, quando fogem ou se rebelam. É claro que
não se pode negar o fato de que determinados crimes, fugas e rebeliões são temas
tratados cotidianamente pelo jornalismo, até por conta do interesse público e social,
entretanto tal condição aponta também para uma possível falha comunicacional, já
que – como pessoas – os presos são personagens muito mais complexos que seus
atos em determinado período de tempo e circunstâncias. Aliás, essa característica
parece estar passando despercebida entre os produtores da informação, tanto que
em nenhum dos 180 textos analisados havia detalhes sobre a história dos presos,
nem mesmo pistas da trajetória que os levaram ao crime. Consequentemente, esse
tipo de prática pode contribuir para a construção de uma imagem redutora sobre o
preso.
Ainda sobre o texto, verificou-se que, na maioria dos casos, os presos são
tratados pela sua condição de interno, ou seja, com palavras como detento, ex-
52
detento e similares, o que demonstra uma preocupação dos jornalistas em não
rotular esses personagens com termos pejorativos. Entretanto, tal característica
também aponta para outro aspecto importante, que é o fato de que poucas vezes o
preso é referido pelo próprio nome. O risco de os conteúdos tratarem do preso com
tamanho distanciamento é que isso pode contribuir para uma espécie de
homogeneização da classe carcerária, generalizando os integrantes desse grupo e
relegando-os a uma massa definida por determinados termos (preso, detento, etc), o
que consequentemente distancia a perspectiva de uma abordagem individual desses
sujeitos.
Na prisão não há uma apropriação do espaço, ninguém se projeta nele. A população reclusa, heterogênea, de múltiplas origens e de renovação intensa, é percebida como uma unidade distinta – o estigma tem aqui uma inscrição espacial: quem está preso, é delinquente – mas não se percebe necessariamente desse modo. Trata-se de uma identidade negativa, imposta do exterior (CUNHA, 1994, p. 4)
Também a presença maciça de fontes oficiais como vozes predominantes nos
textos (157) imprime, como já foi dito, opiniões muito limitadas em relação ao
assunto, já que não permite o desenvolvimento de uma discussão plural, construída
pela inserção de tipos diferentes de entrevistados. Como exemplo, é possível
destacar a pequena quantidade de materiais em que os presos ganham espaço
como fontes (7), ou a escassez de entrevistas com especialistas sobre o assunto (5)
– condição que pode também comprometer o desenvolvimento do assunto no
âmbito jornalístico (percentuais ou quantitativos). Porém, o fato de a maioria dos
conteúdos não considerar a visão do preso sobre o assunto é uma espécie de
contradição, já que ele é uma das figuras centrais em boa parte dos textos
analisados. Aliás, sobre os casos em que os presos são nomeados e têm as idades
e crimes revelados, o fato de essa identificação vir acompanhada de uma
contextualização pouco favorável acaba contribuindo para reforçar os preconceitos
correntes em relação ao criminoso.
Outro ponto importante para a pesquisa foi a análise das imagens. Percebeu-
se que esse recurso não foi muito utilizado pelos jornalistas, tendo em vista que está
presente em menos da metade dos conteúdos verificados. Entretanto, nos casos em
que as imagens estavam presentes, elas geralmente transmitiam uma ideia negativa
em relação ao preso, retratando-o como um agente nocivo à sociedade, já que
53
revelavam momentos de capturas (ou recapturas) realizadas pela polícia e rebeliões,
dentre outras cenas igualmente impactantes.
Assim, a conclusão a que se chega é que a produção midiática gira em torno
de uma construção demasiadamente rasa da imagem do preso, relegando a ele
aspectos que podem não traduzir, de fato, o sujeito por trás do crime. Entretanto,
como também a “participação do jornalismo na construção da realidade, feita por
meio de imagens, palavras, depoimentos, da ideologia dos profissionais e do
agendamento dos assuntos veiculados, não deve ser desprezada” (ROSA;
TEIXEIRA, 2010, p. 32), há de se supor que a imprensa como um todo carece de um
olhar mais cuidadoso para com esse tipo de personagem.
Nesse sentido, e considerando, portanto, a necessidade de pensar em uma
modalidade jornalística que permita a construção de um relato mais plural do que os
costumeiramente divulgados nos jornais, Pessa (2009) defende que o livro-
reportagem “é o veículo de comunicação impressa não-periódico que apresenta
reportagens em grau de amplitude superior ao tratamento costumeiro nos meios de
comunicação jornalística periódicos. Por grau de amplitude superior, se entende
maior ênfase ao tratamento do tema em foco nos aspectos extensivo e intensivo” (p.
2).
Entretanto, o conceito livro-reportagem será oportunamente discutido adiante
nesta pesquisa.
Por ora, chega-se à questão:
Como um livro-reportagem pode servir de suporte para dar elementos para a
representação das histórias de vida de presos da Colônia Penal Agroindustrial do
Paraná e da Penitenciária Central do Estado, ambas localizadas em Piraquara, na
Grande Curitiba?
54
3 OBJETIVOS
Construir relatos escritos sobre a história de vida dos condenados da Colônia
Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI) e da Penitenciária Central do Estado (PCE), a
partir do ponto de vista dos próprios presos.
3.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Analisar a forma como o jornalismo se refere aos criminosos nas reportagens, de
modo a verificar se existem ou não estereótipos disseminados acerca do tema;
Pesquisar as representações sociais em que os presos se enquadram;
Produzir um livro-reportagem, experimentando, para tanto, as técnicas do
jornalismo literário53, combinadas com entrevistas, levantamento e interpretação
de dados, pesquisas documentais e de campo;
Incentivar a discussão sobre o tema, ao dar voz ao sujeito internalizado nas
instituições penais selecionadas, construindo o produto levando em conta as
experiências das fontes consultadas.
53
Para Pena (2006), o Jornalismo Literário reside na potencialização dos recursos do jornalismo, na transposição de limites dos acontecimentos cotidianos, nas amplas visões da realidade propostas, Segundo o autor, tal categoria exerce plenamente a cidadania, de modo que rompe as correntes burocráticas do lide, evita os definidores e, principalmente, garante perenidade e profundidade aos relatos.
55
4 JUSTIFICATIVA
A forma como a mídia brasileira, em especial a paranaense da capital, divulga
os casos de crimes e como trata os possíveis suspeitos nas matérias jornalísticas
foram elementos fundamentais para iniciar esta pesquisa. Entretanto, antes de falar
sobre esse assunto, faz-se necessário o esclarecimento de alguns pontos.
A escolha pela criminalidade, ou o criminoso, como foco desta pesquisa
funda-se majoritariamente na ideia de que o crime, independentemente das suas
causas, é uma característica própria das sociedades e, justamente por isso, é
impossível de ser eliminada (Durkheim, 2001). Isso porque, segundo vários estudos,
entre eles o de Misse (2010), a concepção do que se entende por crime varia de
acordo com o local onde ele é verificado, o período histórico, entre outros fatores
igualmente relevantes.
Assim, como já definiu Silva (2004), em qualquer local, em qualquer tempo,
onde houver homens vivendo em comunidade, lá haverá também aquele que
infringirá as regras, implícita ou explicitamente estabelecidas. Afinal, como defende
Misse (2010), “o crime é definido primeiramente no plano das moralidades que se
tornaram hegemônicas e cuja vitória será inscrita posteriormente nos códigos
jurídicos” (p. 22). Portanto, tão importante quanto falar dos movimentos sociais, das
tendências e dos fenômenos que todos os dias surgem nas sociedades, é essencial
abordar a criminalidade como mais um aspecto dos grupamentos humanos.
Outro fator importante e que justifica esta pesquisa é que a população
carcerária tem aumentado muito nos últimos anos – mais até que a população
brasileira, em percentuais. Pois enquanto o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística – IBGE (2011) aponta um crescimento demográfico de 12,3% entre 2000
e 2010, no mesmo período a quantidade de presos no sistema penitenciário
brasileiro aumentou 113%, segundo Canário (2011) – o que denota um fenômeno
social que exige um tratamento direcionado.
Entretanto, o que se percebe nos veículos de comunicação de Curitiba54 é,
pelo contrário, uma generalização de conceitos, abordagens verticalizadas que
muitas vezes seguem um caminho construído apenas a partir do ponto de vista do
jornalista que as escreve, ou do veículo que as publica. E ainda que, segundo
54
Conforme pode ser verificado nos resultados da análise de conteúdo, no subtópico ‘Os presos no jornal: como os internos da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná e da Penitenciária Central do Estado são retratados pela imprensa’, a partir da página 36.
56
Jackobson (2008), qualquer comunicação seja impossível sem determinada parcela
de possibilidades preconcebidas ou de representações pré-fabricadas, o tema é
complexo demais para ser tratado de modo superficial. Por isso, Resende (2002)
defende que, ainda que o leitor aceite o conteúdo do jornal como palavra utilizada
para representar a realidade, não há como negar que essa realidade seja apenas
uma das possíveis, diante das ficções que também nela se perfazem. Assim, é de se
concluir que o assunto inspira investigação e, por isso, torna-se adequado
desenvolvê-la no ambiente acadêmico.
Para tanto, o uso de ferramentas técnicas e oficiais, junto com os livros e
artigos, cunham maior confiabilidade às pesquisas. Por isso, são abundantes as
consultas ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, ao Departamento
de Execução Penal Paraná – Depen-PR e ao sistema Geopresídios, do Conselho
Nacional de Justiça – CNJ.
No caso do IBGE, os dados são relevantes porque representam o cenário
nacional nos vários temas trabalhados, de modo compilado e garantido. O instituto
realiza levantamentos nacionais, mediante pesquisa junto à população, e com isso
apresenta os aspectos abordados do cenário brasileiro com total fidelidade.
Em relação ao Depen-PR, é órgão fundamental porque se configura como o
setor responsável por gerir as unidades penais do estado do Paraná, o que o torna
indispensável à presente pesquisa, seja na coleta de dados, seja nas orientações e
até autorizações para desenvolver tal trabalho, uma vez que será necessário um
contato direto com os presos.
E sobre o Geopresídios (CNJ), trata-se de um banco de dados oficial,
gerenciado pelo Conselho Nacional de Justiça, denominado como uma radiografia
do sistema carcerário e que abrange todo o sistema punitivo nacional, com dados
detalhados e atualizados diariamente. Desse modo, é uma fonte de consulta que
não possui data de publicação, uma vez que é republicada todos os dias, mas se
configura como peça fundamental, pois reúne em si uma gama considerável de
informações indispensáveis a esta pesquisa.
Também é relevante esclarecer os motivos que levaram à escolha da Colônia
Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI) e da Penitenciária Central do Estado (PCE)
como cenários para a pesquisa. Tais locais foram indicados pelo Depen-PR, que
gere as unidades penais do estado, primeiramente em contato informal e depois,
57
mediante resposta à solicitação encaminhada por escrito55. Isso em virtude do
ambiente encontrado em ambos os locais para a abordagem do tema, seja por conta
da infraestrutura, pela diversidade de presos, sobretudo por conta da relevância
social do trabalho, uma vez que as instituições trabalham com regimes diferentes: na
CPAI é o semiaberto e na PCE é o fechado. Assim, acredita-se, o contato com os
dois universos, distintos entre si, permitirá o desenvolvimento de um trabalho mais
denso e abrangente.
Por fim, a opção por assentar o resultado da pesquisa em um livro-
reportagem, construído sobre as bases da linguagem jornalístico-literária, surgiu
pela proposta de mostrar as informações de modo diferente do adotado pelo
jornalismo convencional. Isso porque, segundo Pessa (2009), o livro-reportagem
configura-se como o veículo de comunicação “que apresenta reportagens em grau
de amplitude superior ao tratamento costumeiro nos meios de comunicação
jornalísticos periódicos” (p. 2). Ou seja, para o autor, o livro construído nesses
moldes permite uma maior ênfase ao tratamento dos temas em foco, nos aspectos
extensivo e intensivo. Ou ainda como define Pereira (2007):
O livro-reportagem, como o próprio nome designa, é uma reportagem publicada na forma de livro. A diferença primordial entre esse tipo de matéria e as feitas para serem veiculadas por jornais, TVs e emissoras de rádio é que o jornalista pode ser sujeito da notícia e não, apenas, um indivíduo que "descreve" a notícia. Isso quer dizer que ele tem compromisso com o leitor e com a verdade. Mas com a sua verdade que é definida a partir das ideologias que o interpelam, e não com a verdade definida pelos conceitos – extremamente subjetivos – da imparcialidade, da isenção e da objetividade que "dominam" o jornalismo diário (p. 1.195).
Assim, ao permitir que o leitor leia e releia as histórias – característica própria
das publicações impressas –, e que as possa consultar mesmo depois de muito
tempo – aspecto inerente à condição de livro, cuja vida útil é bem maior que a de um
jornal, por exemplo –, pretende-se abrir um veio comunicativo dentro do qual as
pessoas possam lançar um olhar diferenciado sobre o tema.
Afinal, [...] esse tipo de discurso jornalístico é um discurso da resistência. E isso por dois motivos. Um deles seria a resistência ao poder do discurso da objetividade jornalística. O outro seria a resistência aos poderes que produzem, e mantém, assim, as desigualdades sociais. Resistências que possibilitam ao jornalista manifestar sua ideologia e, ao mesmo tempo,
55
A solicitação consta junto aos apêndices, nas páginas 131 e 132, e as respostas estão nos anexos, nas páginas 143, 144 e 145.
58
cumprir suas funções sociais: informar e levar a sociedade a pensar sobre seus problemas e, por decorrência, provocar deslocamentos (id, p. 1.197).
E mesmo considerando as limitações impostas pela cultura, língua, pré e pós-
conceitos dos escritores, a ideia é chegar o mais próximo possível do que seria
contar a versão da história dos presos sob a sua própria lógica, afastando-se dos
discursos maniqueístas comumente veiculados, a fim de que as impressões sobre
os personagens sejam assimiladas pelo leitor, qualquer que seja ele.
4.1 O CRIMINOSO COMO INSPIRAÇÃO
Várias obras já foram desenvolvidas sobre o tema em foco. Trabalhos que
retratam as facetas do ambiente prisional e/ou os movimentos da criminalidade,
entre outros aspectos passíveis de observação. Exemplo disso é o
videodocumentário Cantinho Feliz (2010), produzido pelas estudantes Daiane
Pereira da Rosa e Graziele Francini Teixeira como Trabalho de Conclusão de Curso.
A obra retrata o cotidiano das internas da Penitenciária Feminina de Piraquara que
têm filhos na creche da instituição – crianças que, por não terem com quem ficar,
acabam privadas da liberdade, tal como suas mães. Construída a partir da visão das
detentas sobre si mesmas, a produção foge aos estereótipos a que normalmente
essas mulheres acabam submetidas, seja pela imprensa, seja pela sociedade em si.
Na mesma linha, o videodocumentário O Prisioneiro da Grade de Ferro –
Autorretratos (SACRAMENTO, 2003) é interessante por ter sido produzido pelos
próprios internos do presídio do Carandiru. Desse modo, traz à luz a visão dos
presos sobre o sistema penitenciário brasileiro, sobretudo as falhas no processo de
ressocialização. Além de apresentar os detentos e as condições de vida no cárcere,
a obra também expõe o cotidiano no interior da instituição, que foi desativada em
2002.
O livro-reportagem Estação Carandiru (VARELLA, 1999) traz um relato sobre
as experiências do autor, que também é médico, durante o longo período em que
esteve inserido no ambiente prisional trabalhando voluntariamente junto aos presos.
Além de descrever detalhadamente a maioria dos espaços da insituição penal, a
obra também explica o vocabulário dos internos, expõe o cotidiano da unidade e
apresenta breves perfis de alguns dos presos que se tornaram personagens no
volume. Vale lembrar que, por ser de autoria de um médico, a obra não exige
59
necessariamente a aplicação de certas técnicas e formatos próprios da linguagem
jornalística, como a citação ou indicação das fontes em todas as falas, por exemplo.
Como consequência, também o filme Carandiru (BABENCO, 2002), inspirado no
livro, segue praticamente o mesmo enredo.
O assunto foi tema também de um dos programas Profissão Repórter, da
Rede Globo, sob o título ‘Depois de 20 dias em liberdade, ex-interno da Fundação
Casa é preso’, veiculado no dia 13 de dezembro de 2011. E de reportagens da
revista Veja publicadas na edição do dia 5 de agosto de 2011, cujo foco era a prisão
de Itaí, em São Paulo, que abriga condenados de 89 nacionalidades.
Também relevante, o filme Salve Geral (REZENDE, 2009) aborda os
acontecimentos envolvendo a facção criminosa Primeiro Comando da Capital em
São Paulo. Inspirada em fatos reais, a obra expõe aspectos como a rotina dentro e
fora do ambiente prisional e discute a participação das mulheres no crime
organizado, construindo as personagens e a narrativa de modo diferente da ideia
comumente veiculada sobre o tema que, por sua vez, costuma ser calcada em
noções demasiadamente rasas sobre o bem e o mal, moral e amoral, ou seja, em
um maniqueísmo próprio de produções pouco aprofundadas.
Outro trabalho interessante é o livro A Sangue Frio, de Truman Capote (2003).
Trata-de se uma obra de suma importância pelas soluções em relação à construção
da narrativa quanto pela forma de abordagem junto aos presos que serviram de
fontes para este trabalho. O volume relata o assassinato de uma família inteira na
cidade de Holcomb, nos Estados Unidos, incluindo detalhes como o planejamento
do crime, o impacto junto à população local e a execução dos condenados pelo feito.
Por fim, o videodocumentário Ônibus 174 (PADILHA, 2002) também tem
relação com o tema explorado neste trabalho. A obra narra a história da vida do
sequestrador do ônibus que deu nome à produção, mas pela voz das pessoas que
conheceram o criminoso, de modo paralelo à descrição e reconstituição do delito.
Como é possível perceber, muito já se produziu sobre o tema em foco, talvez
com o objetivo de melhor reproduzir esse tipo de ambiente e representar esses
indivíduos – motivo esse que também inspirou o presente trabalho – de modo que
seria extremamente difícil reunir e listar aqui todo o material disponível sobre o
assunto. Entretanto, basta observar os principais aspectos de obras importantes e
recorrentemente consultadas sobre a matéria, como as indicadas acima, para notar
que as histórias de vida dos presos e a sua representação por meio dos próprios
60
relatos é, ainda hoje, uma saída pouco utilizada para expor a trajetória desses
agentes sociais.
Sendo assim, fica claro que o livro-reportagem – fruto desta pesquisa – não é
uma iniciativa completamente inédita, já que precedida por outros materiais e
estudos assemelhados, ao menos parcialmente. Por isso, compreende-se que o
referido produto poderá contribuir para tornar ainda mais fiel o entendimento que se
tem de um assunto que, apesar de tão presente, é ainda tratado de modo muito
superficial, trazendo à luz detalhes desconhecidos ou ignorados pela grande mídia.
61
5 REFERENCIAL TEÓRICO
5.1 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
Ao estudar categorias cujas definições científicas em si são demasiadamente
complexas e pouco esclarecedoras, como os conceitos de crime e liberdade, por
exemplo– termos que envolvem o indivíduo que vive em sociedade –, procurou-se
aliar a psicologia social às Ciências da Comunicação, de modo a analisar os efeitos
do comportamento humano pelo viés da teoria das representações sociais, criada
por Serge Moscovici em 1961, na França, e que se tornou o assunto da publicação
de seu estudo La Psychanalyse: Sonimage et son public.
As representações sociais, como define Sêga (2000), apresentam-se como
uma "maneira de interpretar e pensar a realidade cotidiana, uma forma de
conhecimento da atividade mental desenvolvido pelos indivíduos e pelos grupos
para fixar suas posições em relação a situações, eventos, objetos e comunicações
que lhes concernem" (p. 190).
Dessa forma, conforme Moscovici (1994), o indivíduo foi, e em grande medida
ainda é, a única possibilidade de referência para noções como atitude, atribuição,
esquemas e assim por diante. Ou é, em outros termos, segundo Xavier (2003), "a
representação, [...] uma reflexão cognitiva, vinculada tão somente à experiência
individual da consciência no seu 'despertar' para o mundo, ou seja, o momento em
que a consciência se torna 'sujeito cognoscente'; aqui, a subjetividade individual é a
'fonte', por assim dizer, da representação" (p. 20).
Para Moscovici (1994), no entanto, a sociedade precisa agir com cautela ao
tentar fazer relações entre o indivíduo e a sociedade. “Devemos estar atentos à
maneira como colocamos o problema indivíduo-sociedade, pois, sem nos darmos
conta, corremos o risco de o transformarmos não apenas em um problema difícil,
mas principalmente em um problema que se revele impossível de ser tratado no
plano científico” (p. 7).
Assim, entende-se que, ao analisar a situação dos presos, é importante
estabelecer parâmetros científicos que não fiquem tão tangenciais, a fim de garantir
a mínima coesão entre o indivíduo, o objeto, e a representação social projetada.
Pois, conforme Vilas Boas (2002), "o indivíduo não é um ser único cuja psique pode
62
ser separada como fenômeno individual. O indivíduo é também um ser social e
coletivo" (p. 125).
Segundo Bacelar (2004), "Moscovici acabou por demonstrar que as
representações não derivam de uma única sociedade, ultrapassando-a, como
insistiu Durkheim, mas das diversas sociedades que existem no interior da
sociedade maior, e, portanto, não podem ultrapassá-la" (p. 184).
Moscovici (1994) afirma que a representação social é uma modalidade
particular do conhecimento, abrangendo a comunicação entre os indivíduos, e assim
ela integra os grupos sociais com base na relação cotidiana. “As representações
sociais são fruto não apenas de concepções históricas, mas do aqui e agora; são
construções que situam o indivíduo, dando-lhe identidade social” (LESCURA,
201256). Assim, o autor entende que as representações sociais fazem parte de um
conjunto de conhecimentos nos quais o indivíduo acha-se capaz de entender a
realidade social que ele integra. “Spink (1995) acrescenta ainda que as
representações sociais podem ser entendidas como uma espécie de saber prático,
porque se inserem, nesse sentido, nas correntes que estudam o conhecimento do
senso comum” (LESCURA, 201257). Portanto, pode-se considerar a teoria das
representações sociais como a mais conveniente para sustentar os argumentos
desta pesquisa, seja pela contextualização do corpo social, seja pelo entendimento
de que existem as mais variadas nuances ao analisar o indivíduo.
Na preocupação em discutir as relações entre indivíduo e sociedade, e como
elas se constroem, Guareschi e Jovchelovitch (1994) consideram que parte da teoria
das representações sociais busca recuperar a conexão problemática de "uma
sociedade sem sujeitos ou sujeitos sem uma história social" (p. 63). Segundo os
autores, "é através da ação de sujeitos sociais agindo no espaço que é comum a
todos, que a esfera pública58 aparece como o lugar em que uma comunidade pode
desenvolver e sustentar saberes sobre si própria - ou seja, representações sociais"
(id, p. 71). 56
LESCURA, Carolina et al (Org.). Representações sociais sobre as relações de parentesco: estudo de caso em um grupo empresarial familiar. Revista de Administração Contemporânea. Curitiba, PR, v. 16, n. 1, jan-fev. 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1415-65552012000100007&script=sci_arttext. Acesso em: 20/05/2012. 57
Idem ao 56. 58
Guareschi e Jovchelovitch (1994) interpretam esfera pública, parafraseando Habermas, como um espaço em que os cidadãos se encontram e falam uns com os outros de forma que garanta acesso a todos os envolvidos.
63
Para Guareschi e Jovchelovitch (1994), "a teoria das representações sociais
se constrói sobre uma teoria de símbolos" (p. 71), e assim "o símbolo59 se constrói
apenas como máscara de estruturas sociais desiguais" (id, p. 64), em que a teoria
das representações mostraria que "o ser humano desenvolve uma identidade, cria
símbolos e se abre para a diversidade de um mundo de Outros" (ibid, p. 65). Sem o
propósito de desviar o foco das teorias empregadas, mas com o objetivo de elucidar
eventuais ambiguidades relacionadas à definição do termo 'identidade', considerou-
se o conceito de Elichirigoity (2008), que defende que "é preciso ver a identidade de
uma coisa não como algo solitariamente isolado de todas as outras categorias, mas
como uma variável contrastante de todas as outras que poderiam, sob condições
diferentes, preencher a mesma posição na existência” (p. 183).
Na concepção de Guareschi e Jovchelovitch (1994), "o social geralmente tem
sido as condições concretas da vida, que envolvem desde relações sociais de
produção até mecanismos institucionais de várias ordens" (p. 66). Portanto, segundo
Peterson (2012), há muitos contextos "nos quais uma pessoa é diferente da norma
(raça, gênero, religião, identidade sexual, características físicas, etc.). Porém, como
explica Landowski, o que está em jogo não é a diferença. Ou seja, é a atribuição de
características (ou marcas) semânticas à diferença que produz alteridade60" (p. 16).
Pode-se relacionar a teoria das representações sociais à comunicação social,
área pela qual se pretende desenvolver o livro-reportagem com os relatos dos
presos, na forma com que Guareschi e Jovchelovitch (1994) veem a interação do
indivíduo com a esfera pública e a forma como este a transcende. Segundo os
autores, a imortalidade do indivíduo "envolve sua capacidade para produzir, manter
e transformar uma história que permanece nos artefatos e narrativas humanas" (p.
68). Nesse sentido, os autores propõem que a relação de um indivíduo num mundo
comum a todos os seres humanos "depende do esforço de uns em direção aos
outros, de um processo de ação e discurso que contenha tanto as diferenças como
as similaridades entre pessoas - isto é, diálogo" (id, p. 68). Aí, portanto, aplica-se e
justifica-se o uso do livro-reportagem, no qual, conforme Pereira (2007), “o jornalista
59
Para Malanga (2004), de um modo geral, o termo símbolo é entendido como um signo ou um grupo de signos que adquiriram uma amplitude e uma quantidade de significados muito acima do padrão normal.
60
Para Peterson (2012), a alteridade implica em um processo cognitivo e, por vezes ideológico, que se manifesta dentro do sujeito e, consequentemente, dentro da sociedade.
64
pode expressar toda sua subjetividade, ou – usando um termo da Análise do
Discurso de linha francesa (doravante AD) – sua(s) ideologia(s)” (p. 1.195).
Daí, a fim de evitar repetir os estereótipos – que Diniz (1997) afirma tratar-se
“de uma opinião pronta, uma ideia ou expressão muito utilizada, desgastada,
banalizada, um lugar-comum ou clichê" (p. 137) –, do jornalismo convencional –
prática na qual, de acordo com Pena (2006), "os repórteres sempre procuram os
personagens que já estão legitimados neste círculo vicioso” (p. 8), e muitas vezes,
como define Silva (2008), de forma subjetiva, "pode-se observar esses estereótipos
presentes na literatura, na música, nos jornais, ou seja, nos mais variados meios de
comunicação de massa" (p. 4) -, procurou-se mostrar a individualidade dos presos
com base na concepção social, dentro de uma psicologia sociológica, com Moscovici
e a teoria das representações sociais, como forma mais conveniente de embasar
cientificamente esta pesquisa.
5.2 JORNALISMO LITERÁRIO E O NEW JOURNALISM
Ao estabelecer a forma de escrita a ser adotada para compor os relatos dos
presos na presente pesquisa, optou-se por utilizar o jornalismo literário porque,
segundo Pena (2006), a modalidade é uma forma de "potencializar os recursos do
jornalismo, ultrapassar os limites dos acontecimentos cotidianos, proporcionar visões
amplas da realidade, exercer plenamente a cidadania, e romper as correntes
burocráticas do lide" (p. 6). O autor defende que do jornalismo literário derivaram
vários subgêneros como o romance-reportagem, a biografia, o New Journalism
americano, o jornalismo gonzo e a ficção jornalística, de modo que “tais subgêneros
foram se estabelecendo ao longo do século XX e, embora diferentes, têm
características comuns que podem dar subsídios para uma conceituação ampla do
jornalismo literário” (id).
Na concepção de Pena (ibid), o gênero "atraiu uma série de talentos que
ousaram ultrapassar os limites da redação" (p. 10). Dentre os profissionais que
ganharam notoriedade ao usarem recursos literários nos textos ou por compor livros-
reportagem, pode-se citar Gay Talese, Tom Wolfe, Joseph Mitchell, John Hersey, o
romancista Truman Capote (que foi considerado o precursor do Novo Jornalismo
com a obra A Sangue Frio), Janet Malcolm, Hunter Thompson, Jon Krakauer,
Ryszard Kapuscinski, Joan Didion, Joseph Roth, Gabriel García Márquez; no Brasil,
65
Fernando Morais, Zuenir Ventura, Joel Silveira, Ruy Castro, Nelson Motta, Eduardo
Galeano, Washington Novaes, Ignácio de Loyola Brandão, Caco Barcelos, Eliane
Brum e outros mais. De forma que "Balzac, Victor Hugo, Stendhal e outros [...]
escritores podem [...] ser considerados como os precursores do jornalismo literário,
se classificarmos como tal um gênero que se caracteriza pela publicação de
literatura nas páginas de jornais" (ibid, p. 6).
Conforme Lima (2004), o jornalista americano Tom Wolfe foi um dos porta-
vozes do New Journalism e praticou "uma literatura da realidade" (p. 180). Segundo
o autor, haveria um embrião do que se poderia chamar de "reprodução do cotidiano
social" (id). A partir de então e seguido do que fizera o escritor Daniel Defoe, no
denominado realismo social, os romancistas passaram a conquistar o "seu lugar ao
sol como gênero literário de prestígio [...] os romancistas do realismo social
realizavam, na visão de Wolfe, um verdadeiro trabalho de captação do real, como se
fossem repórteres do seu tempo" (ibid, p. 181). Portanto, o autor defende que "é de
se compreender que o romance do realismo social da época exercia um papel de
reprodução do real algo à semelhança do que faria a reportagem mais tarde" (ibid, p.
182).
Wolfe (apud Martins, 2009) é quem explica que, “ao começar os anos
sessenta, um novo e curioso conceito, vivo bastante para inflamar os egos, havia
começado a invadir os confins da esfera profissional da reportagem. Esse
descobrimento, a princípio modesto e humilde, poderíamos dizer, consistia em tornar
possível um jornalismo que [...] pudesse ser lido igual a um conto” (p. 1). Segundo
Lima (2004), "é de fato a vertente do realismo social o que irá impulsionar
sobremaneira o jornalismo literário" (p. 184). Para o autor, "a chance que o
jornalismo poderia ter para se igualar, em qualidade narrativa, à literatura, seria
aperfeiçoando meios sem, porém, jamais perder sua especificidade" (id, p. 191). Isto
é, teria de sofisticar seu "instrumental de expressão, de um lado, elevar seu
potencial de captação do real, de outro” (ibid, p. 192).
Para Kramer (2007), "o narrador em Jornalismo Literário tem uma
personalidade, é uma pessoa complexa, profunda, franca, irônica, oblíqua, confusa,
judicativa e até autoirônica – qualidades que os acadêmicos e repórteres do dia a
dia evitam com veemência como se tais posturas fossem antiprofissionais e não-
66
objetivas"61. Wolfe (2005) afirma que existem pontos cruciais que tornam o New
Journalism importante. Primeiro, porque existem "recursos específicos, todos
realistas, subjacentes à qualidade de envolvimento emocional dos mais potentes
textos em prosa, sejam eles ficção ou não ficção” (p. 7). E o segundo ponto,
conforme o autor, seria o fato de que “o realismo não é meramente outra postura ou
atitude literária” (id). Dessa forma, abrindo mais a discussão, Pena (2006) ressalta
que “o jornalista literário não ignora o que aprendeu no jornalismo diário. Nem joga
suas técnicas narrativas no lixo” (p. 7). Com isso, "os profissionais que passaram a
produzir nessa corrente - que Tom Wolfe se recusava a chamar de movimento -
abririam uma porta de possibilidades vastas, primeiro em publicações periódicas e
depois no livro-reportagem" (Lima, 2004, p. 192).
A preocupação do jornalismo literário, conforme Pena (2006), “é
contextualizar a informação da forma mais abrangente possível, o que seria muito
mais difícil no exíguo espaço de um jornal" (p. 7). Mas, para isso, segundo o autor,
"é preciso mastigar as informações, relacioná-las com outros fatos, compará-las com
diferentes abordagens e, novamente, localizá-las em um espaço temporal de longa
duração” (id).
Vilas Boas (2003) explica que "em O reino e o poder: uma história do New
York Times, Gay Talese, um dos expoentes do New Journalism nos anos 1960, nos
lembra de que o modo distante com que os jornalistas em geral observam o mundo
lhes rouba aquela experiência mais profunda que brota do envolvimento" (p. 14).
Para o autor, "transmitir uma compreensão - ainda que abreviada e efêmera – sobre
alguém é delicado. Não basta embaralhar fatos biográficos ou aspear frases do
personagem" (id). Dessa forma, na concepção de Lima (2004), "o New Journalism
resgataria [...] a tradição do jornalismo literário e conduzi-lo-ia a uma cirurgia plástica
renovadora sem precedentes" (p. 192).
Por outro lado, no que tange o jornalismo convencional, defende Henn (1996),
as relações com o meio ambiente andam ‘numa via de mão dupla’. "O meio se força
sobre o sistema jornalístico, e o jornalismo, por sua vez, interfere no meio. [...] e
reduz essa complexidade à relação de inputs e outputs, os primeiros classificados
como os acontecimentos que entram no sistema e, os segundos, traduzidos nas
61
KRAMER, Mark. Regras Rompíveis do Jornalismo Literário. Tradução de Fred Linardi. Preparação e revisão de Sérgio Vilas Boas. Jaraguá, SP, 2007. Disponível em: http://www.textovivo.com.br/seminario/nota07.htm. Acesso em: 24/05/2012.
67
notícias que o sistema transmite". Dessa forma, segundo o autor, "o funcionamento
de um jornal como sistema congrega elementos necessários à sua caracterização
como tal" (p. 65).
O sistema jornalístico absorve o indeterminismo do meio ambiente, desenvolvendo-o de forma narrativa e hierarquizada. Mas também impõe certos acasos que alteram a vida no ecossistema. Nessa parte também se trata dos códigos que entram em jogo na definição do que é noticiável e, consequentemente, na seleção dos acontecimentos através da pauta. (id, p. 16)
Segundo o autor, "o que diferencia de fato o jornalismo de outras atividades é
o desempenho da tarefa informativa e orientativa" (ibid, p. 65). Assim, é de se notar
a importância do jornalismo convencional e o papel social que representa, e, de
forma equivalente, o jornalismo literário e suas vertentes também têm igual
importância - e não deixa de ser criticado.
O New Journalism não pode ser considerado unanimidade no meio jornalístico e na comunidade acadêmica, tendo sido questionado por quem nele enxerga uma deturpação do fazer jornalístico pela ficção literária. Porém, é inegável sua contribuição para o aprimoramento da reportagem e do olhar jornalístico sobre a realidade, tanto que seus frutos e ecos não se renderam à América do Norte nem cessaram no momento histórico de ebulição da contracultura. No Brasil, um exemplo claramente influenciado
pela tendência norte-americana foi a revista Realidade62
, cujo período "de ouro" situado entre 1966 e 1968 (Pessa, 2009, p. 5-6).
Dessa forma, o jornalismo literário, com seus subgêneros, entre eles o Novo
Jornalismo, não deixou de lado as prerrogativas do jornalismo convencional.
Conforme Pena (2006), “os velhos e bons princípios da redação continuam
extremamente importantes, como, por exemplo, a apuração rigorosa, a observação
atenta, a abordagem ética e a capacidade de se expressar claramente, entre outras
coisas” (id, p. 7).
‘Novo jornalismo’ foi a expressão que acabou pegando. Não era nenhum 'movimento'. Não havia manifestos, clubes, salões, nenhuma panelinha; nem mesmo um bar onde se reunissem os fiéis, visto que não era nenhuma fé, nenhum credo. Na época, meados dos anos 60, o que aconteceu foi que, de repente, sabia-se que havia uma espécie de excitação artística no jornalismo, e isso em si já era uma novidade (Wolfe, 2005, p. 40-41).
62
Conforme Faro (1999), "o entendimento do código proposto pelo New Journalism é fundamental para que se compreenda toda a abrangência de sua proposta editorial. A narrativa da grande reportagem no jornalismo brasileiro surgia alterada e inovadora com a revista da Editora Abril" (p. 55).
68
Assim, "Tom Wolfe [...] explica que o Novo Jornalismo não quer abafar
ninguém. Quer mostrar que faz reportagem também – mas não só. Ele acredita que
esse formato tradicional de contar histórias pode perseguir formas mais imaginativas
do que o aborrecido tom bege dos relatórios. Pode ser mais subjetivo. Pode ter valor
estético" (Santos, 2005, p. 238-239).
A matéria de Capote, contando a vida e a morte de dois vagabundos que estouraram as cabeças de uma rica família rural em Kansas, foi publicada em capítulos na The New Yorker, no outono de 1965, e saiu em forma de livro em fevereiro de 66. Foi uma sensação - e um baque terrível para todos os que esperavam que o maldito Novo Jornalismo ou Parajornalismo se esgotasse como uma moda. Afinal, ali estava não um jornalista obscuro, nem algum escritor freelance, mas um romancista de longa data... cuja carreira estava meio parada... e, de repente, de um só golpe, com aquela virada para a maldita forma nova de jornalismo, não só ressuscitava sua reputação, mas a elevaria mais alto que nunca antes... e, em troca, tornava-se uma celebridade da mais incrível magnitude. Pessoas de todo tipo leram A Sangue Frio, pessoas de todos os níveis de gosto. Todo mundo foi absorvido por aquilo. O próprio Capote não chama seu livro de jornalismo; longe disso; dizia que tinha inventado um novo gênero literário, 'o romance de não ficção'. Porém, seu sucesso atribuiu uma força esmagadora àquilo que logo viria a ser chamado de Novo Jornalismo (Wolfe, 2005, p. 45-46).
Faro (1999) – ao analisar a obra A Sangue Frio, de Truman Capote, e
referindo-se à importância que o noticiário policial teve na construção dos códigos do
New Journalism –, cita, em seu artigo, a declaração de Marcos Faerman63: "o Novo
Jornalismo tira as histórias policiais de um território de ingenuidade e pequenas
charadas em que elas são confinadas ao longo de todo o século XX" (p. 54). Aí,
ainda parafraseando Faerman, Faro (id) aponta que "se o crime é também a história
de angústias e horrores, como a sombra de um patíbulo avistado das galerias de um
presídio, é em umas poucas obras escritas com as técnicas da reportagem literária
que sua verdade terrível vai ser resgatada" (p. 54).
Pena (2006) sugere que, ao escolher um tema, o jornalista "deve pensar em
como sua abordagem pode contribuir para a formação do cidadão, para o bem
comum, para a solidariedade". (p. 8). Nessa linha, o autor defende que o profissional
deve escapar das armadilhas do jornalismo convencional e do lide, ou seja, ele
acredita que "é preciso [...] fugir dessa fórmula e aplicar técnicas literárias de
construção narrativa” (id). Afinal, para ele, além de evitar os definidores primários,
63
Conforme Faro (1999),a declaração foi retirada da seguinte referência: "Da arte dos belos crimes. Revista Shalon, ano 29, nº 303, janeiro/fevereiro/março de 1995".
69
"eles são os famosos entrevistados de plantão, aqueles sujeitos que ocupam algum
cargo público ou função específica e sempre aparecem na imprensa" (ibid).
Conforme Pessa (2011) é necessário ressaltar que nem todo jornalismo sobre
literatura ou publicado em livro pode ser considerado Jornalismo Literário.
"Jornalismo com toques de ficção ou ficção com recursos de jornalismo também são
formato diferentes, que não se encaixam no conceito" (p. 6).
Para Souza e Luíndia (2010), “quando se fala em Jornalismo Literário, a
definição é uníssona, pois a chamada Literatura não-ficcional nos permite um
casamento entre um e outro, uma junção quase simbiótica entre a forma de fazer
jornalística e a forma de expressar literária”. (p. 3). E é com esses conceitos que a
presente pesquisa pretende, com o uso de uma de suas formas, o livro-reportagem,
escrever os relatos dos presos. Pois, conforme Heller (2005), "se concordarmos com
a ideia de que o livro, enquanto suporte, pode ser perecível, mas não as ideias que
ele contém, estamos começando a nos aproximar de uma ideia que pode ajudar a
esclarecer a diferença entre o texto que contém um fato histórico, como o
jornalístico, e o literário, que potencialmente cria enredos a partir dele" (p. 17).
Assim, também, decidiu-se compor o livro-reportagem e adotar como
subgênero o New Journalism. Dessa forma, e como os relatos dos presos não serão
muito extensos a ponto de serem considerados biografias, considerar-se-á o texto
apresentado no livro como mais próximo ao que Vilas Boas (2003) denomina de
perfil e, embora não o seja totalmente, usar-se-á elementos desse tipo de texto no
produto, já que, segundo o autor, "os perfis cumprem um papel importante que é
exatamente gerar empatias. Empatia é a preocupação com a experiência do outro, a
tendência a tentar sentir o que sentiria se estivesse nas mesmas situações e
circunstâncias experimentadas pelo personagem" (p. 14).
Portanto, para Vilas Boas (id), perfilar alguém "significa compartilhar as
alegrias e tristezas de seu semelhante, imaginar situações do ponto de vista do
interlocutor” (p. 14). Segundo o autor, seria a empatia o elemento essencial
necessário para viabilizar o autoconhecimento de quem escreve e de quem lê.
5.3 LIVRO-REPORTAGEM
Tal como define Vilas Boas (2002), o livro-reportagem se constitui numa das
modalidades do jornalismo capazes de ajudar os leitores a compreender o passado,
70
visto que "cobre amplas faixas de tempo, interage com várias áreas do
conhecimento (a História e a Sociologia incluídas) e possui mecanismos sofisticados
de captação da realidade distante e imediata e de estruturação e redação de texto"
(p. 20). Segundo o autor, o livro-reportagem é uma prática jornalística e literária que
tem enfoque humano pela via da escrita impressa, embora possua elementos
jornalísticos, como o compromisso com os fatos (passado) e com a clareza
(acessibilidade).
Como se considera o texto pretendido para o livro-reportagem como mais
próximo ao que Vilas Boas (2003) denomina perfil, aplicar-se-á na pesquisa outro
conceito que vai ao encontro desse último, ou seja, a definição de Sodré e Ferrari
(1986) para o termo, na qual, em jornalismo, perfil definiria o material focado na
pessoa – seja ela uma celebridade ou um tipo popular, mas sempre o focalizado é
protagonista de uma história: sua própria vida. "Diante desse herói (ou anti-herói) o
repórter tem, geralmente, dois tipos de comportamento: ou mantém-se distante,
deixando que o focalizado se pronuncie, ou compartilha com ele um determinado
momento e passa ao leitor essa experiência" (id, p. 14). Segundo Vilas Boas (2003),
no Brasil, alguns repórteres se notabilizaram ao escreverem perfis, caso de Luiz
Fernando Mercadante, Carlos Azevedo, Oriana Fallaci, e Roberto Freire.
Mas, para se contar a história de modo que a narrativa traduza o
conhecimento objetivo e subjetivo do mundo, é necessário antecipar, de acordo com
Motta (2007), que "o reconhecimento das personagens e de sua dinâmica funcional
ocorre concomitantemente com a identificação dos episódios, porque as
personagens são atores que realizam coisas (funções) na progressão da história" (p.
7). Para Lima (2004), "o livro-reportagem [...] cobre os vazios deixados pela
imprensa, e amplia, para o leitor, a compreensão da realidade" (p. 61). A realidade
essencial do livro-reportagem "é determinada a partir das características e dos
princípios que regem o jornalismo como um todo" (id, p. 11).
Segundo o autor, existem 13 tipos diferentes de classificação de livros-
reportagem64. Dentre eles, escolheu-se, como o mais próximo para atender os
objetivos desta pesquisa, o tipo livro-reportagem-perfil, que, conforme Lima (ibid) se
64
Conforme a classificação de Lima (2004), as variedades são: livro-reportagem-perfil, livro-reportagem-depoimento, livro-reportagem-retrato, livro-reportagem-ciência livro-reportagem-ambiente, livro-reportagem-história, livro-reportagem-nova consciência, livro-reportagem-instantâneo, livro-reportagem-atualidade, livro-reportagem-antologia, livro-reportagem-denúncia, livro-reportagem-ensaio, livro-reportagem-viagem.
71
define em uma "obra que procura evidenciar o lado humano de uma personalidade
pública ou de uma personagem anônima que, por algum motivo, torna-se de
interesse" (p. 51-52). Segundo o autor, "uma variante desta modalidade é o livro-
reportagem-biografia – quando um jornalista, na qualidade de ghost writer ou não,
centra suas baterias mais em torno da vida, do passado, da carreira da pessoa em
foco, normalmente dando menos destaque ao presente" (ibid, p. 52).
De acordo com o que noticia Morais (2004), no Observatório da Imprensa, foi
das redações da revista Realidade e do Jornal da Tarde que saíram jornalistas para
confeccionar livros-reportagem. Como aponta a autora, Fernando Morais, por
exemplo, escreveu na década de 1970 o detalhado relato sobre Cuba denominado A
Ilha (reeditado recentemente com a inserção de algumas atualizações feitas pelo
próprio autor) e outros nomes como Ruy Castro e Zuenir Ventura, que alcançaram
igual reconhecimento produzindo livros como Chega de Saudade e 1968 – o ano
que não terminou.
O livro-reportagem serve a distintas finalidades que se desdobram dos objetivos básicos de informar, orientar e explicar, enveredando pelos diversos gêneros jornalísticos existentes: jornalismo informativo arredondado (aprofundamento apenas extensivo), jornalismo interpretativo (aprofundamentos extensivo e intensivo), jornalismo opinativo (postura unilateral para defender um conjunto de princípios), jornalismo investigativo (tom de denúncia) e jornalismo diversional (voltado para o lazer) (Pessa, 2009, p. 2).
Para Pessa (id), portanto, o livro-reportagem deve sua existência à
reportagem, unidade que o formata conforme é desenvolvida. Reportagem "é uma
extensão da notícia e, por excelência, a forma-narrativa do veiculo impresso" (Sodré
apud ibid, p. 1). Segundo o autor, se a notícia é o relato de um fato de interesse
jornalístico, a reportagem é a narrativa que aborda as origens, implicações e
desdobramentos do fato, e também apresenta os personagens envolvidos nele,
tornando-os mais complexos.
5.4 CONCEITOS DE REPORTAGEM
Para Lima (2004), "a reportagem é um dos gêneros jornalísticos e estes são
entendidos por Juan Gargurevich como 'formas que busca o jornalista para se
expressar'. Portanto, a reportagem, como gênero, pressupõe o exame o estilo com
72
que o jornalista articula sua mensagem" (p. 24). Segundo Kindermann (2003), "Sua
constituição como gênero, contudo, não é clara, de modo que as definições
constantes nos manuais jornalísticos acadêmicos e de redação e estilo variam
bastante, principalmente quanto às suas especificidades estruturais e funcionais" (p.
11). E, embora os teóricos acadêmicos que tratam do gênero jornalístico não o
estabeleçam explicitamente, “pode ser caracterizada em duas linhas gerais: (a)
como uma notícia ampliada e (b) como um gênero autônomo” (id, p. 38).
Em relação às características, "Muniz Sodré e Maria Helena Ferrari apontam
a 'predominância da forma narrativa', a 'humanização do relato', o 'texto de natureza
impressionista' e a 'objetividade dos fatos narrados'" (Lima, 2004, p. 24). Portanto,
conforme o autor, a reportagem é entendida "como a ampliação da notícia [...], o
livro-reportagem é o veículo de comunicação impressa não-periódico que apresenta
reportagens em grau de amplitude superior ao tratamento costumeiro nos meios de
comunicação jornalística periódicos" (id, p. 26).
Citando Bahia, Kindermann (2003) defende que “o salto da notícia para a
reportagem se dá no momento em que é preciso ir além da notificação – em que a
notícia deixa de ser sinônimo de nota – e se situa no detalhamento, no
questionamento de causa e efeito, na interpretação e no impacto, adquirindo uma
nova dimensão narrativa e ética” (p.039).
Toda reportagem, segundo Lage (2003), “pressupõe investigação e
interpretação" (p. 136). Para o qual no jornalismo investigativo, de acordo com o
autor, é definido como "forma extremada de reportagem, pois se trata de dedicar
tempo e esforço ao levantamento de um tema pela qual o repórter, em geral, se
apaixona" (id, p. 138). Assim, o jornalismo interpretativo "consiste, grosso modo, em
um tipo de informação em que se evidenciam consequências ou implicações dos
dados [...] e objetiva oferecer ao leitor fatos que permitem estabelecer conclusões –
sem fechar essas conclusões" (ibid, p. 136).
Para Pessa (2009), ela visa a atender a necessidade de ampliar os fatos para
uma dimensão contextual e colocar para o receptor uma compreensão de maior
alcance, “objetivo melhor atingido na prática da grande-reportagem, que possibilita
um mergulho de fôlego nos fatos e em seu contexto e oferece ao seu autor uma
dose ponderável de liberdade para superar os padrões e fórmulas convencionais do
tratamento da notícia” (p. 1).
73
O desdobramento das clássicas perguntas a que a notícia pretende responder (que, o que, como, quando, onde, por que) constituirá de pleno direito uma narrativa, não mais regida pelo imaginário, como na literatura de ficção, mas pela realidade factual do dia-a-dia, pelos pontos rítmicos do cotidiano que, discursivamente trabalhados, tornam-se reportagem. Esta é uma extensão da notícia e, por excelência, a forma-narrativa do veículo impresso (embora a entrevista, sobretudo o perfil, possa também, às vezes, assumir uma forma narrativa). A reportagem constitui, assim, basicamente, um dos gêneros jornalísticos (Sodré e Ferrari, 1986, p. 2-3).
Segundo Sodré e Ferrari (id), as principais características de uma reportagem
são a predominância da forma narrativa; a humanização do relato; o texto de
natureza impressionista e; a objetividade dos fatos narrados. "Conforme o assunto
ou o objeto em torno do qual gira a reportagem, algumas dessas características
poderão aparecer com maior destaque. Mas será sempre necessário que a narrativa
(ainda que de forma variada) esteja presente numa reportagem. Ou não será
reportagem" (ibid, p. 5-6).
Dentre os tipos de reportagem indicadas por Sodré e Ferrari (ibid), a
reportagem-conto particulariza a ação, escolhendo um personagem para ilustrar o
tema que pretende desenvolver; a reportagem-crônica se detém mais em situações
fortuitas e flagrantes do cotidiano, conduzindo a narrativa de forma impressionista,
por meio de um narrador colocado em posição observadora ou reflexiva, de caráter
mais circunstancial e ambiental; e o livro-reportagem é uma compilação de textos já
publicados em jornais ou trabalho feito para livro, mas concebido a partir de textos
jornalísticos. Dessas variantes, pretende-se, a priori, mesclar os dois tipos iniciais de
reportagem, no formato de livro-reportagem, usando, ainda, elementos do Novo
Jornalismo, haja vista que, bem como definem os autores, na reportagem pode-se:
Omitir um elemento que, como nas histórias policiais, só seja revelado no final. Nesses casos, o real é engendrado para produzir determinado efeito, mas a partir de dados fornecidos pelo próprio real; essa forma ficcional atende ao tema e sua problemática. Ainda assim, uma diferença se impõe entre literatura e jornalismo: na primeira, predomina o imaginário; no segundo, deve predominar a realidade dos fatos narrados. Além da verossimilhança, portanto, a reportagem não pode esquecer seu compromisso com a verdade - que poderíamos chamar de autenticidade do fato (ibid, p. 13-14).
Contudo, como afirma Faro (1999), "talvez seja [...] da própria natureza do
processo de comunicação e, portanto, de qualquer narrativa, essa impossibilidade
de apreensão da realidade global” (p. 20). Assim, conforme o autor, a reportagem,
na sua pretensão globalizadora, "estaria permanentemente condicionada a ser uma
74
atividade vinculada à análise sociológica e à estética literária, já que estas, pela
liberdade de especulação que as caracterizam, respectivamente como ciência e
como arte, oferecem ao repórter os elementos que o referencial informativo
convencional não tem" (id, p. 20). Ainda seguindo as ideias de Faro (ibid), o exemplo
concreto vem do elenco de 'regras' adotado pelo New Journalism, que, segundo ele,
é a 'escola' que mais se aproxima da compreensão da amplitude da reportagem e
uma codificação daquilo que a própria necessidade gerou no jornalismo.
5.5 TÉCNICAS DE ENTREVISTA
De acordo com Lage (2003), numa entrevista, a estrela é o entrevistado. No
caso desta pesquisa, o preso será a estrela e, sendo assim, procurar-se-á adotar as
melhores formas de uso desse recurso tão utilizado na temática jornalístico.
Segundo Boni e Quaresma (2005), a entrevista é "definida por Haguette
(1997) como um processo de interação social entre duas pessoas na qual uma
delas, o entrevistador, tem por objetivo a obtenção de informações por parte do
outro, o entrevistado” (p. 72). Para os autores, é por meio dela que os pesquisadores
buscam obter informações, ou seja, coletar dados objetivos e subjetivos. “Os dados
objetivos podem ser obtidos também através de fontes secundárias tais como:
censos, estatísticas, etc. Já os dados subjetivos só poderão ser obtidos através da
entrevista, pois que, eles se relacionam com os valores, às atitudes e às opiniões
dos sujeitos entrevistados” (id, p. 72).
Lage (2003) aponta que "a entrevista é o processo clássico de apuração de
informações em jornalismo. É uma expansão da consulta às fontes, objetivando,
geralmente, a coleta de interpretações e a reconstituição de fatos" (p. 73). Conforme
Boni e Quaresma (2005), para se obter uma narrativa natural muitas vezes não é
interessante fazer uma pergunta direta, mas sim fazer com que o pesquisado
relembre parte de sua vida. Para tanto o pesquisador pode muito bem ir suscitando
a memória do pesquisado (Bourdieu apud ibid, p. 72).
As pessoas (...) têm duas possibilidades de expor uma ideia ou narrar uma história e, em geral, tendem a optar sistematicamente por uma delas: ou são holísticos (consideram o todo e daí partem para analisar algum ponto) ou detalhistas, que agem analiticamente item por item. No primeiro caso, pode-se ter um relato muito geral ou interpretativo; no segundo, uma sequência tediosa de detalhes insignificantes. O problema pode ser
75
contornado, até certo ponto, por intervenções de correção de rumo, em que se pede ao detalhista uma abordagem mais geral ou ao generalista que especifique algum aspecto (Lage, 2003, p. 81).
Dessa forma, como afirma Lage (id), é engano imaginar que a preparação
prévia de um questionário viabiliza uma boa entrevista porque segundo o autor ela
depende muito da maneira como é conduzida.
Segundo Boni e Quaresma (2005), as formas de entrevistas mais utilizadas
em Ciências Sociais são a entrevista estruturada65, a semiestruturada66, a aberta67,
a entrevista com grupos focais68, a história de vida e também a entrevista projetiva69,
e a entrevista aberta. E dentre esses tipos, o mais interessante para a presente
pesquisa é a técnica de entrevista semiestruturada, na qual o entrevistador fica
atento para dirigir, no momento que achar oportuno, "a discussão para o assunto
que o interessa fazendo perguntas adicionais para elucidar questões que não
ficaram claras ou ajudar a recompor o contexto da entrevista, caso o informante
tenha 'fugido' ao tema ou tenha dificuldades com ele" (id, p. 75).
Além dessas formas de entrevista, os autores definem ainda a história de vida
como uma entrevista em profundidade, na qual o pesquisador constantemente
interage com o informante. "Sua principal função é retratar as experiências
vivenciadas por pessoas, grupos ou organizações" (ibid, p. 73). Segundo os
estudiosos, existem dois tipos diferentes de histórias de vida: a completa, "que
retrata todo o conjunto da experiência vivida; e a tópica, que focaliza uma etapa ou
um determinado setor da experiência em questão (Minayo, 1993)" (p. 73).
65
Para Boni e Quaresma (2005), as entrevistas estruturadas são elaboradas mediante questionário totalmente estruturado, ou seja, é aquela onde as perguntas são previamente formuladas e tem-se o cuidado de não fugir a elas. 66
As entrevistas semiestruturadas combinam perguntas abertas e fechadas, onde o informante tem a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto. O pesquisador deve seguir um conjunto de questões previamente definidas, mas ele o faz em um contexto muito semelhante ao de uma conversa informal (id). 67
Segundo Boni e Quaresma (ibid), a entrevista aberta é utilizada quando o pesquisador deseja obter o maior número possível de informações sobre determinado tema, segundo a visão do entrevistado, e também para obter um maior detalhamento do assunto em questão. Ela é utilizada geralmente “na descrição de casos individuais, na compreensão de especificidades culturais para determinados grupos e para comparabilidade de diversos casos (Minayo, 1993)” (p. 74). 68
As entrevistas com grupos focais é uma técnica de coleta de dados cujo objetivo principal é estimular os participantes a discutir sobre um assunto de interesse comum, ela se apresenta como um debate aberto sobre um tema (Boni; Quaresma, 2005). 69
A entrevista projetiva é aquela centrada em técnicas visuais, isto é, a utilização de recursos visuais onde o entrevistador pode mostrar: cartões, fotos, filmes, etc ao informante (id).
76
A HV tem como ponto principal permitir que o informante retome sua vivência de forma retrospectiva. Muitas vezes durante a entrevista acontece a liberação de pensamentos reprimidos que chegam ao entrevistador em tom de confidência. Esses relatos fornecem um material extremamente rico para análise. Neles se encontram o reflexo da dimensão coletiva a partir da visão individual (Boni; Quaresma, 2005, p. 73).
Conforme Vilas Boas (2003), "um personagem desconhecido, por mais
iluminador que seja, simplesmente não existe para o jornalismo convencional.
Exceção para os grotescos, os pitorescos, os vitimados ou os loucos de pedra" (p.
24). E o autor também cita a chamada história de vida:
Uma expressão mais abrangente e aberta, nascida do contexto das pesquisas qualitativas em Ciências Sociais (Sociologia, Antropologia, História, Psicologia): Histórias de vida. Essa modalidade dá atenção total ou parcial às narrativas sobre as vidas de indivíduos ou de grupos sociais, visando a humanizar um tema, um fato ou uma situação contemporânea. Na sua versão mais abreviada, a história de vida examina episódios específicos da trajetória do protagonista (id, p. 17-18).
Segundo Bourdieu (apud Boni; Quaresma, 2005), "os pesquisados mais
carentes geralmente aproveitam essa situação para se fazer ouvir, levar para os
outros sua experiência e muitas vezes é até uma ocasião para eles se explicarem,
isto é, construírem seu próprio ponto de vista sobre eles mesmos e sobre o mundo”
(p. 77). Desse modo, segundo Lage (2003), no jornalismo impresso "podem-se
substituir palavras e expressões, desde que não estejam entre aspas, mantendo o
sentido da fala do entrevistado" (p. 84).
Os autores também citam a observação de Bordieu quanto à transcrição da
entrevista que é parte integrante da metodologia do trabalho de pesquisa. "Uma
transcrição de entrevista não é só aquele ato mecânico de passar para o papel o
discurso gravado do informante, pois, de alguma forma o pesquisador tem que
apresentar os silêncios, os gestos, os risos, a entonação de voz do informante
durante a entrevista" (Bourdieu apud Boni; Quaresma, 2005, p. 78). Para Lage
(2003), "relutância inesperada cortando o fluxo de uma exposição, silêncios,
denominações vagas, particularmente quando coincidem com desvios de olhar e
certos movimentos das mãos, indicam que se tangenciam questões sensíveis, por
algum motivo" (p. 80).
77
Assim, Boni e Quaresma (2005) entendem que "esses ‘sentimentos’, que não
passam pela fita do gravador, são muito importantes na hora da análise, eles
mostram muita coisa do informante. O pesquisador tem o dever de ser fiel, ter
fidelidade quando transcrever tudo o que o pesquisado falou e sentiu durante a
entrevista” (p. 78). Para os autores, "o pesquisador não pode esquecer que cada um
dos pesquisados faz parte de uma singularidade, cada um deles têm uma história de
vida diferente, têm uma existência singular" (id, p. 77). E, ainda segundo os
estudiosos, "durante todo o processo da pesquisa o pesquisador terá que ler nas
entrelinhas, ou seja, ele tem que ser capaz de reconhecer as estruturas invisíveis
que organizam o discurso do entrevistado" (ibid).
Com o objetivo de colocar em prática os conceitos referenciados
anteriormente, pretende-se – portanto – aplicar as teorias estudadas no livro-
reportagem, aliadas a várias outras técnicas de desenvolvimento nesse sentido.
Inclusive ao que Lage (2003), define como entrevista em profundidade, na qual "o
objetivo [...] não é um tema particular ou um acontecimento específico, mas a figura
do entrevistado, a representação de mundo que ele constrói, uma atividade que
desenvolve ou um viés de sua maneira de ser, geralmente relacionada com outros
aspectos de sua vida" (id). Segundo o autor, ao usar esse ponto de vista, "procura-
se construir uma novela ou um ensaio sobre o personagem, a partir de seus próprios
depoimentos ou e impressões" (ibid).
Por fim, Vilas Boas (2003), sugere algumas opções, caso a entrevista não
saia como se espera. Elas consistem em saídas úteis caso a entrevista, ao seu final,
resulte demasiadamente dispersiva: ou o entrevistador desiste da matéria, ou tenta
marcar um novo encontro, ou aproveita o material obtido e tenta produzir algo
proveitoso assim mesmo.
5.6 HISTÓRIA ORAL
Dentre as estratégias de entrevista, procurou-se utilizar a teoria da História
Oral porque, conforme Alberti (2007), "diante do tema e das questões que o
pesquisador se coloca, é possível estudar as versões que os entrevistados fornecem
acerca do objeto de análise" (p.30). Segundo a autora, "empregar a metodologia de
história oral é dirigir o foco de interesse não para aquilo que os documentos escritos
podem dizer sobre a trajetória [...], e sim para as versões que aqueles que
78
participaram de, ou testemunharam, tal trajetória podem fornecer sobre o assunto"
(id). Para Alberti, isso já pressupõe que o estudo de tais versões seja relevante para
o objetivo da pesquisa.
A moderna História Oral surgiu na década de 1940, após a segunda Guerra Mundial, com os sociólogos da Escola de Chicago, e a partir de então várias tendências se delinearam: a primeira constituída por entrevistas com elites políticas (a história de cima). Depois, com Paul Thompson, a história dos excluídos, (a história de baixo) A Voz do Passado. Embora a segunda tenha surgido para contrabalançar a influência da primeira, ambas podem e devem estabelecer relações e interações na valorização dos diferentes e heterogêneos depoimentos, assim como na sistematização de novas áreas temáticas (ROSA, 2007, p.2).
Contudo, como afirma Alberti (2007), "fazer história oral não é simplesmente
sair com um gravador em punho, algumas perguntas na cabeça, entrevistar aqueles
que cruzam nosso caminho dispostos a falar um pouco sobre suas vidas" (p.30).
Além disso, também existe apuração. "Empregar a História Oral significa voltar a
atenção para as versões dos entrevistados, isso não quer dizer que se possa
prescindir de consultar as fontes já existentes sobre o tema escolhido” (id, p. 5).
Conforme Ferreira (2002), "a história oral, um instrumento privilegiado para
recuperar memórias e resgatar experiências de histórias vividas" (p. 326), e também
"o uso da História Oral, bem como das narrativas que dela se originam, estimulam a
escrita de uma história que não é uma representação exata do que existiu, mas que
se esforça em propor uma inteligibilidade" (SILVEIRA, 2007, p. 41).
Conforme Alberti (2007), urna pesquisa de História Oral segue critérios
qualitativos, e não quantitativos; assim, "convém selecionar os entrevistados entre
aqueles que participaram, viveram, presenciaram ou se inteiraram de ocorrências ou
situações ligadas ao tema e que possam fornecer depoimentos significativos" (p.31-
32). Portanto, como afirma Ferreira (2002), a História Oral é capaz de apresentar
relatos que, se não eliminam a subjetividade, possuem instrumentos para controlá-
la.
79
6 METODOLOGIA DE PESQUISA
O simples fato de se falar no desenvolvimento de um produto jornalístico –
neste caso, um livro-reportagem – já acarreta certos procedimentos inerentes à
prática da comunicação social. Como exemplo específico é possível apontar a
necessidade de métodos e técnicas para o levantamento das informações, bem
como as formas de apuração dos dados coletados, de modo a garantir que eles
reflitam com fidelidade ao menos parte da realidade retratada.
Partindo desse princípio, o presente estudo se funda em dois formatos
metodológicos distintos, a saber: a pesquisa bibliográfica, com a seleção de autores
e obras úteis à construção da base teórica que norteiam a presente discussão; e a
pesquisa de campo, realizada através da análise de reportagens jornalísticas e do
desenvolvimento da técnica de grupo focal.
6.1 MÉTODOS UTILIZADOS NA PESQUISA BIBLIOGRÁFICA
Baseada nos conceito de Estudos Exploratórios defendido por Triviños (2007)
e Fonseca (2006) 70, essa fase foi composta da escolha das teorias que ajudaram na
construção do assunto em foco, de modo a orientar o entendimento sobre o que é
crime, prisão, e liberdade, assim como sobre o funcionamento do sistema penal
brasileiro e paranaense e a forma como se estruturam as instituições punitivas em
Piraquara, na Grande Curitiba, entre outros assuntos. Nessa etapa, pensadores
como Foucault (2009), Rousseau (1999), Durkheim (2001), Constant (1985) e
Montesquieu (2000) foram fundamentais, assim como Noronha (2001), Urbanski
(2010), Misse (2010), Silva (2004), Gaio e Bordignon (2011) e Sormanny e Sousa
(2009) e tantos outros.
Também figuraram entre os alicerces desta pesquisa as informações
disponibilizadas pelo Departamento de Execução Penal do Paraná – Depen-PR, em
sua página na internet; além do sistema Geopresídios (CNJ), ferramenta vinculada
ao Conselho Nacional de Justiça, e dos dados levantados pelo Censo do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.
70
Para os autores, esse tipo de estudo é preliminar e consiste no aprofundamento do pesquisador em determinado assunto, buscando antecedentes e conhecimentos para, em seguida, planejar a parte prática da pesquisa.
80
Outras contribuições importantes foram relativas à teoria das representações
sociais, com autores como Moscovici (1994) e Guareschi e Jovchelovitch (1994). E
de Vilas Boas (2002 e 2003) e Pessa (2009), quanto aos esclarecimentos sobre o
conceito de livro-reportagem, bem como de Pena (2006), Henn (1996), Alberti
(2007), Wolfe (2005) e Lima (2004), em relação à construção das abordagens
literárias no texto jornalístico. Por fim, também foram importantes as discussões
promovidas por Sodré e Ferrari (1986) acerca dos conceitos de reportagem, assim
como as de Lage (2003) e Boni e Quaresma (2005), sobre as técnicas de entrevista.
E esses são apenas alguns dos vários estudiosos cujas pesquisas serviram de base
para a compreensão teórica do tema em foco.
6.2 PESQUISAS DE CAMPO
Além da discussão das teorias, também se faz necessária a abordagem
prática do assunto central deste estudo através de pesquisa de campo. Tal
modalidade define-se, segundo Carnevalli e Miguel (2001), como a fase realizada
depois do estudo bibliográfico, necessária para que o pesquisador tenha um bom
conhecimento sobre o assunto, já que “é nesta etapa que ele vai definir os objetivos
da pesquisa, as hipóteses, definir qual é o meio de coleta de dados, tamanho da
amostra e como os dados serão tabulados e analisados” (p. 1). Fuzzi (2010) entende
que essa modalidade de conhecimento consiste na observação dos fatos e
fenômenos como ocorrem no real, na coleta de dados e, finalmente, na análise e
interpretação desses dados, “com base numa fundamentação teórica consistente,
objetivando compreender e explicar o problema pesquisado” 71.
Assim, com o objetivo de fortalecer o trabalho, foram adotadas duas formas
diferentes de pesquisa de campo: a análise de conteúdo, de modo a oferecer as
bases para a compreensão de como a mídia trata do tema em foco72, e o grupo focal
com os presos, voltado à viabilização de um estreitamento no com a realidade
investigada, com vistas ao entendimento mais fiel sobre as representações sociais
71
FUZZI, Ludmila Pena. O que é a Pesquisa de Campo? Taubaté, SP, 2010. Metodologia científica. Disponível em: http://profludfuzzimetodologia.blogspot.com.br/2010/03/o-que-e-pesquisa-de-campo.html. Acesso em: 29/04/2012. 72
Ver resultado no subtópico ‘Os presos no jornal: como os internos da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná e da Penitenciária Central do Estado são retratados pela imprensa local’, a partir da página 36.
81
dos presos e também à seleção das fontes consultadas para o desenvolvimento do
produto.
6.2.1 Métodos empregados no desenvolvimento da análise de conteúdo
Para entender como os presos da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná e
da Penitenciária Central do Estado aparecem retratados na mídia, optou-se pelo
desenvolvimento de uma pesquisa baseada na análise de conteúdo73 das
reportagens veiculadas nas edições online do jornal Gazeta do Povo74 entre os anos
de 2006 e 2012. Os textos foram selecionados mediante busca combinada por meio
da utilização das palavras-chave: ‘bandido colônia penal agroindustrial Piraquara’ (e
colônia penal agrícola Piraquara), ‘bandido penitenciária central Piraquara’, ‘preso
colônia penal agroindustrial Piraquara’ (e colônia penal agrícola Piraquara), e ‘preso
penitenciária central Piraquara’.
Em relação à modalidade de investigação, a abordagem escolhida foi a
análise de conteúdo por constituir, segundo Triviños (2007), um tipo de pesquisa
viável quando o objeto que se pretende estudar são as comunicações, já que
enfatiza o teor das mensagens veiculadas. Também Sousa (2004b) acredita que
esse é um dos métodos mais eficientes dentre os que permitem trabalhar questões
ligadas à mídia, muito em virtude de já ter surgido em meio às comunicações75, mas
também porque “permite a obtenção de dados [...] que emprestam rigor à pesquisa”
(p. 401).
Bardin (1979) define o termo como “um conjunto de técnicas de análise das
comunicações visando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de
descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que
permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de
produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens” (p. 42). Já Moraes
(1999) entende que a importância da análise de conteúdo reside na abrangência da
73
Os resultados da análise de conteúdo foram apresentados dentro tópico ‘Delimitação do Tema e Problematização’, a partir da página 9, porque os dados obtidos contribuíram para embasar a discussão sobre como os presos das unidades em questão são retratados pela imprensa local. 74
www.gazetadopovo.com.br. 75
Segundo o autor, essa técnica nasceu nos Estados Unidos no início do século XX, como um método quantitativo para analisar o conteúdo de jornais, como por exemplo, a percentagem de notícias de política, desportos, entre outras, em relação à totalidade do veículo.
82
sua abordagem, uma vez que se ela se constitui como uma metodologia usada para
interpretar o conteúdo de toda classe de documentos e textos. Aliás, o autor defende
que, ao conduzir a descrições sistemáticas, qualitativas e/ou quantitativas, a análise
de conteúdo “ajuda a reinterpretar as mensagens e a atingir uma compreensão de
seus significados num nível que vai além de uma leitura comum”76.
A característica híbrida da análise de conteúdo – pode ser vista como um método que reúne elementos quantitativos e qualitativos – coloca-a num gueto metodológico de onde ela sai reforçada e não enfraquecida. [...] Ou seja, não existe método de pesquisa perfeito, mas todo aquele que é bem construído e bem conduzido tem mais chances de responder às hipóteses propostas em estudos científicos do que outros (Herscovitz, 2005, p. 3).
Bardin (1979) divide o método em três etapas: a pré-análise, que consiste na
organização da pesquisa com a formulação dos objetivos gerais, a construção das
hipóteses e a determinação do campo de investigação; a descrição analítica, que
compreende procedimentos como a codificação, a classificação e a categorização
dos materiais; e a interpretação referencial, que remete à obtenção dos resultados e
à reflexão sobre o que eles significam, segundo o objetivo defendido (Triviños,
2007).
Entretanto, Herscovitz (2005) chama a atenção para um detalhe essencial ao
desenvolvimento da análise de conteúdo: a escolha do tema. Segundo a autora, é
imprescindível que o pesquisador defina aquilo que pretende buscar antes mesmo
de iniciar a pesquisa, já que entender a unidade do método (ou unidade de
amostragem) é fundamental para dar o direcionamento correto à investigação.
Nesse sentido, Moraes (1999) apresenta as categorias de objetivos da análise
de conteúdo. São elas: Quem fala? – busca investigar o emissor da mensagem com
relação às suas características como um todo, entendendo a mensagem como a
representação do próprio emissor; Para dizer o quê? – voltada às características da
mensagem propriamente dita, seu valor informativo, palavras, argumentos e ideias;
A quem? – estudo de recepção, voltado às características do público; Como? – a
forma como a comunicação se processa; Com que finalidade? – refere-se aos
objetivos da mensagem, explícitos e implícitos, e aos objetivos que o emissor busca
76
MORAES, Roque. Análise de Conteúdo. Revista Educação. Porto Alegre, RS, v. 22, n. 37, 1999, p. 7-32. Disponível em: http://cliente.argo.com.br/~mgos/analise_de_conteudo_moraes.html. Acesso em: 29/04/2012.
83
ao transmitir a mensagem; e Com que resultados? – relacionada aos resultados
efetivos da comunicação.
Uma vez que o foco desta pesquisa está em avaliar a forma como o jornal
Gazeta do Povo tem abordado os criminosos em suas reportagens, tomando como
base o recorte temporal indicado, opta-se pela categoria Como? – voltada à
compreensão acerca das características de construção da mensagem. “Quando os
objetivos da análise de conteúdo direcionam ao ‘como?’, o pesquisador estará
voltado à forma como a comunicação se processa, seus códigos, seu estilo, a
estrutura da linguagem e outras características do meio pelo qual a mensagem é
transmitida” (id77).
Para Herscovitz (2005), a análise de conteúdo da mídia é uma ferramenta
muito útil quando se busca entender um pouco mais sobre o tráfego comunicacional
e estabelecer parâmetros implícitos sobre a lógica organizacional por trás das
mensagens. Nessa linha, a autora defende que os pesquisadores precisam agir
como investigadores em busca de “pistas que desvendem os significados aparentes
e/ou implícitos dos signos e das narrativas jornalísticas, expondo tendências,
conflitos, interesses, ambiguidades ou ideologias presentes nos materiais” (p. 5).
Assim, a análise de conteúdo aplicada neste trabalho busca identificar as
representações sociais transmitidas através do jornalismo em relação ao tema
discutido. Com isso, a ideia é descobrir o que a mídia diz sobre o assunto e como os
personagens desse meio acabam retratados, de modo a revelar se o
posicionamento das reportagens é favorável ou contrário aos casos tratados, ou
ainda se adotam uma quase neutralidade, ao se inclinarem apenas parcialmente à
qualquer uma das duas direções.
O jornal Gazeta do Povo foi escolhido como cenário para a investigação por
se configurar como um veículo tradicional no estado, já que fundado em 1919
(Gazeta do Povo, 2009), assim como por representar, segundo apontamento de
Quadros, Quadros e Massip (2009), o impresso de maior circulação no Paraná. Tal
condição é confirmada pela Associação Nacional de Jornais (2012), com base na
média de circulação verificada entre os anos de 2010 e 2011, que ultrapassa os
43.500 exemplares vendidos diariamente.
77
MORAES, Roque. Análise de Conteúdo. Revista Educação. Porto Alegre, RS, v. 22, n. 37, 1999, p. 7-32. Disponível em: http://cliente.argo.com.br/~mgos/analise_de_conteudo_moraes.html. Acesso em: 29/04/2012.
84
Com relação à página na internet, um levantamento divulgado em janeiro de
2012 pelo próprio veículo apontou que o site concentra 1,9 milhão de visitantes
únicos por mês, responsáveis por cinco milhões de acessos realizados no mesmo
espaço de tempo78, além dos leitores nas plataformas tablet e eventos (Gazeta do
Povo, 2012). Isso demonstra que também a versão digital do veículo é bastante
abrangente. Entretanto, o fato de a página virtual trazer praticamente os mesmos
conteúdos presentes nas edições impressas – facilitando desse modo o acesso – foi
o fator de maior relevância para a decisão de lançar mão de tal recurso.
Vale lembrar também que, como já dito, o interesse é na investigação sobre
como os criminosos são abordados pela mídia, condição que independe da
plataforma em que a notícia é veiculada. Por consequência, quaisquer outras
características visuais ou de estrutura próprias de uma ou outra mídia não
interessaram à referida análise, e justamente por isso foram ignoradas.
Sobre a pesquisa, ela foi realizada segundo a temática, e não o tempo.
Assim, o período apontado refere-se à faixa temporal entre as datas de publicação
da primeira e última notícias localizadas através da busca combinada. Ou seja, a
quantidade de matérias analisadas neste estudo reflete o volume total de materiais
encontrados. Portanto, trata-se de uma abordagem não aleatória, já que trabalha
mediante a seleção de alguns fatores da pesquisa (Sousa, 2004b), e também
porque aborda uma população menor, condição apontada por Herscovitz (2005),
referindo-se a “algumas edições específicas de publicações que tratam da cobertura
de um tema registrado em período também específico” (p. 8).
Além disso, a pesquisa foi desenvolvida mediante a utilização de palavras-
chave porque esse é um recurso disponível na internet que permite a localização de
determinados termos essenciais à pesquisa de modo cruzado. Segundo o catálogo
online Rede Sirius (2012), vinculado à Universidade do Rio de Janeiro, “a busca por
palavras-chave permite pesquisar registros bibliográficos que contenham uma ou
mais palavras-chave nos campos indexados para pesquisa” 79. Por consequência, tal
ferramenta facilita a obtenção de resultados satisfatórios em um recorte de tempo
78
Em termos de internet, visitantes únicos referem-se aos acessos não duplicados (contados apenas uma vez para cada computador conectado) de determinado site, durante um período específico. Já a contagem geral de acessos está ligada à quantidade de vezes em que uma página foi aberta, independentemente de tal ação ter sido proveniente de um mesmo computador ou de vários. 79
REDE SIRIUS. Ajuda catálogo on-line. Rio de Janeiro: UERJ, [2012]. Disponível em: http://www.rsirius.uerj.br/ajuda_rs.php?titulo_link=Ajuda%20Cat%C3%A1logo%20On-Line. Acesso em: 07/05/2012.
85
muito menor que aquele necessário para desenvolver o mesmo trabalho utilizando
as edições impressas.
Nesse sentido, as palavras-chave utilizadas foram selecionadas de modo a
refletir os núcleos de conteúdo mais úteis a presente investigação, já que compostas
pela combinação dos nomes dos locais onde a pesquisa será desenvolvida com os
termos que definem a condição do aprisionado nesses locais, além da palavra que,
segundo Misse (2010), também é utilizada para retratar os agentes criminosos na
mídia, produzida “pela interpelação da polícia, da moralidade pública e das leis
penais” (p. 17).
O rótulo “bandido” é de tal modo reificado no indivíduo que restam poucos espaços para negociar, manipular ou abandonar a identidade pública estigmatizada (Misse, 2010, p. 23). O significado de “bandido”, embora remeta a “integrante de um bando”, ganhou autonomia individualizante, passou a ser aplicada ao agente cuja sujeição criminal já está em curso ou que se considera consolidada. (p. 28).
Vale ressaltar que, ao se referir à Colônia Penal Agroindustrial do Paraná,
utilizou-se também o nome Colônia Penal Agrícola em virtude da mudança de
nomenclatura ocorrida em setembro de 201180. E sobre os termos que se referem à
Penitenciária Central do Estado, esses tiveram a palavra ‘estado’ suprimida para
evitar resultados alheios à pesquisa. Do mesmo modo, outras combinações mais
simplificadas – todavia, mais abrangentes – foram desconsideradas porque gerariam
resultados demasiadamente amplos, pouco úteis ao desenvolvimento deste
trabalho.
Por fim, a ferramenta escolhida para a fixação da análise foi um formulário de
codificação81 criado no site Google Docs. O recurso foi utilizado por dois motivos:
porque oferece hospedagem online, ou seja, é uma plataforma segura no que se
refere ao armazenamento de dados; e porque disponibiliza cálculos matemáticos
acerca dos dados apurados, já com a inclusão dos gráficos e tabelas sobre os
resultados.
80
Conforme anexo na página 149. 81
Ver detalhamentos junto aos apêndices, da página 134 à 138.
86
E em relação aos tópicos abordados no documento, esses surgiram mediante
a realização de leitura flutuante82, que permitiu a localização dos aspectos e
enfoques explorados durante a análise.
6.2.2 Métodos empregados no desenvolvimento dos grupos focais
Além da análise de conteúdo já realizada, também se percebeu a
necessidade de um contato mais estreito com o tema em foco, isto é, da inserção na
realidade dos presos. Para isso, optou-se pelo desenvolvimento de grupos focais
com os internos das duas instituições indicadas para a presente pesquisa: a Colônia
Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI) e na Penitenciária Central do Estado (PCE),
respectivamente.
Partindo dos resultados obtidos com a análise de conteúdo, portanto, o
desenvolvimento da técnica de grupo focal foi importante por três motivos: ajudou os
pesquisadores a compreenderem, na prática, as representações sociais dos internos
do sistema penal de Piraquara; permitiu testar as formas de abordagem aos presos
e alguns dos temas centrais a serem trabalhados no produto; e auxiliou na
identificação dos internos que se tornaram personagens no livro-reportagem.
Segundo Zimmermann e Martins (2008), os grupos focais fazem parte de uma
técnica qualitativa que “integra, discute, avalia o tema proposto, sendo flexível e
dinâmico, pois, na primeira etapa dos trabalhos são realizadas atividades de
descontração, cujo comportamento pode envolver o grupo durante a reunião” (p.
12.117). As autoras defendem que esse tipo de método, além de estar cada vez
mais presente nas abordagens qualitativas em pesquisa social, também é
interessante por criar um ambiente mais livre para os entrevistados, levando a uma
participação mais efetiva. É delas a definição de que “grupo focal é uma das
principais técnicas de investigação, que se apropriou da dinâmica de grupo,
permitindo a um pequeno número de participantes ser guiado por um moderador
qualificado, procurando alcançar níveis crescentes de compreensão e
aprofundamento de um tema em estudo” (id).
82
Para Bardin (1979), a leitura flutuante integra a etapa da pré-análise da pesquisa e é um dos primeiros contatos com os documentos, que viabiliza o surgimento das hipóteses e noções centrais para o trabalho ao transformar a repetição de determinados temas em índices para o registro dos dados.
87
Desse modo, a adoção desse método buscou produzir um debate entre os
presos, de modo a criar condições mais confortáveis para o contato entre os
pesquisadores e os pesquisados, mas acima de tudo identificar – por meio da
exposição das representações sociais que os entrevistados possuem de suas
próprias trajetórias de vida – os relatos que de fato vieram a integrar o produto final.
Entretanto, tendo em vista a amplitude do universo pesquisado (quantidade de
presos nas duas instituições), fez-se necessária uma espécie de triagem.
Assim, a primeira seleção consistiu na indicação administrativa dos
participantes que integrariam o grupo em cada uma das duas unidades prisionais em
que a pesquisa foi desenvolvida. O número de selecionados para os encontros ficou
preliminarmente estabelecido em 12 pessoas, com base em Chiesa e Ciampone
(apud ASCHIDAMINI; SAUPE, 2004), cujos estudos indicam que o ideal é que o
número de participantes oscile entre seis e 12 pessoas. Nesse sentido, optou-se
pela quantidade máxima estabelecida tendo em vista o alcance da maior variedade
possível de entrevistados.
Sobre os critérios de seleção administrativa dos participantes em cada uma
das unidades, esses seguiram o seguinte roteiro: possibilidade de o interno
participar da pesquisa, vontade do interno em integrar a iniciativa e a natureza do
crime cometido.
O respeito à possibilidade de o preso participar da pesquisa fundou-se em
determinações restritas à administração de cada unidade em relação à
disponibilidade do interno para integrar a iniciativa, considerando as hipóteses em
que o detento fica impedido de manter qualquer contato com o público externo à
unidade (por conta de seu comportamento, por questões de doença, etc), ou quando
o contato entre os presos oferece riscos à segurança dos próprios internos (nos
casos de conflitos internos), entre outras coisas.
Em relação à vontade do interno, ela foi imprescindível porque a ideia sempre
foi obter relatos espontâneos e detalhados, condição alcançada quando o indivíduo
se sente à vontade em participar de uma iniciativa, qualquer que seja ela. “A decisão
de participar de um grupo focal deve ser individual e livre de qualquer coação, daí a
importância de uma cuidadosa seleção das pessoas a serem convidadas, bem como
a necessidade de clareza quanto à explicitação do projeto e dos cuidados éticos
incluídos no processo e informados aos selecionados” (ASCHIDAMINI; SAUPE,
2004, p. 10).
88
Sobre a natureza do delito cometido pelos participantes, ela foi fator
importante por emprestar maior diversidade à pesquisa, já que por meio de
diferentes modalidades de crimes, as chances de encontrar perfis e históricos
variados eram maiores. Entretanto, a gravidade dos delitos dos presos não foi
detalhe preponderante, já que o principal foco da pesquisa era na história de vida de
cada entrevistado e no encadeamento de acontecimentos que o levou à prisão, e
não na intensidade da falta cometida por ele.
Os encontros foram registrados através de anotações e da gravação das
conversas em áudio, de modo a garantir um melhor aproveitamento dos dados
colhidos. “O gravador possui a vantagem de evitar perdas de informação, minimizar
distorções, facilitar a condução da entrevista, permitindo fazer anotações sobre
aspectos não verbalizados” (ibid, p. 77). O uso de câmeras de vídeo durante a
realização dos grupos focais foi descartado por recomendação da administração das
unidades, sob a justificativa de que os presos ficariam inibidos na presença do
equipamento.
6.2.2.1 Grupo focal da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná
O encontro com os presos da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI)
foi realizado no dia 2 de agosto de 2012, em duas etapas diferentes: manhã e tarde.
Tal divisão, segundo a direção da unidade, foi necessária por conta dos problemas
inerentes a conflitos entre os próprios internos, considerando o fato de que
determinados crimes relegam ao seu autor um isolamento ainda maior, mesmo em
meio à comunidade carcerária. Tal separação, portanto, foi determinada para evitar
retaliações entre os detentos.
A sala onde as reuniões foram realizadas fica nas dependências da unidade e
é usualmente destinada às atividades do setor de Psicologia. O local foi indicado
pela administração da CPAI por conta da proximidade com a direção de disciplina,
de modo a preservar a segurança dos pesquisadores, mas também por dispor do
espaço físico necessário para acomodar todos os participantes e oferecer um
ambiente mais silencioso, importante para que todos se fizessem entender com
facilidade. Para garantir mais privacidade aos participantes durante o encontro, e por
89
se tratar de internos do regime semiaberto83, nenhum agente penitenciário ou
autoridade policial ficou presente no interior da sala, não havendo, do mesmo modo,
um monitoramento ostensivo do evento, mesmo fora das dependências do
ambiente.
O contato com os presos selecionados para participar do grupo focal foi único
e durou cerca de duas horas em cada etapa.
Refletindo sobre o tempo de duração das sessões em grupo focal os autores pesquisados, Westphal, Bogus e Faria (1996), Debus (1997), Dall’agnol e Trench (1999), Iervolino e Pelicione (2001) e Meier e Kudlowiez (2003) sugerem de uma a duas horas para que o cansaço dos participantes e as condições desconfortáveis não venham a interferir nos objetivos da discussão em prejuízo dos resultados (ibid, p. 12).
Participaram da primeira reunião, realizada pela manhã, um total de nove
presos. À tarde, o encontro contou com a presença de três internos. Junto dos
pesquisadores, os 12 convidados ficaram dispostos em círculo, de modo que podiam
se olhar uns aos outros confortavelmente e, com isso, ficar mais à vontade para
integrar da conversa.
A disposição dos assentos em círculo foi adotada por Ressel, Gualda e Gonzales (2002, p.6) salientando que em cada encontro o moderador e o observador mudavam de lugar, evitando sentarem-se um ao lado do outro para não dar idéia de centralização. Para os autores “o arranjo dos assentos é importante, devendo promover a participação de todos, a interação face a face [...] com distâncias iguais entre todos, e dentro do mesmo campo de visão” (ibid).
Os presos reunidos durante as duas etapas do desenvolvimento do grupo
focal na unidade se identificaram com seus nomes reais, informação comprovada
posteriormente junto à direção da CPAI. Para conferir mais tranquilidade aos
internos e criar um ambiente em que eles pudessem expressar suas opiniões, em
momento algum os pesquisadores fizeram questionamentos sobre os crimes
cometidos ou a motivação para tais feitos, o que não impediu que alguns deles
falassem superficialmente sobre o assunto.
Para fins desta pesquisa, entretanto, e tendo em vista a abrangência
acadêmica que a presente investigação pode atingir, os participantes dos encontros
83
Regime de pena em que o detento fica condicionado a um estado de semiliberdade, sendo-lhe permitido sair da unidade sem acompanhamento policial em ocasiões específicas, como finais de semana, feriados e para participar de cursos de qualificação, por exemplo.
90
serão aqui apresentados apenas pelo primeiro nome, idade, cidade e estado de
origem. O motivo para tal preocupação funda-se no fato de que esse primeiro
contato foi realizado a título de apresentação da proposta e interação inicial entre
pesquisadores e pesquisados, sem intenção de qualquer tipo de exposição neste
momento. Ademais, a proposta deste trabalho é trazer à luz as histórias de vida dos
detentos, o que independe da forma com que os entrevistados são identificados.
Nesse sentido, participaram do primeiro encontro:
1) Celso, 26 anos, Curitiba/PR;
2) Edison, 41 anos, São Paulo/SP;
3) Edson, 40 anos, Assis Chateaubriand/PR;
4) Edson, 42 anos, São Paulo/SP;
5) Jamir, 38 anos, Ilópolis/RS;
6) Luiz, 34 anos, Bandeirantes/PR;
7) Paulo, 46 anos, Londrina/PR;
8) Pedro, 55 anos, Ibaiti/PR;
9) Wilson, 33 anos, Curitiba/PR.
Integraram o segundo encontro:
1) Antônio, 36 anos, Palmas/MG;
2) Elvis, 41 anos, Nova Esperança/PR;
3) Valdecir, 32 anos, Araucária/PR.
Durante as duas reuniões, os pesquisadores buscaram perfis diferenciados
de modo que os presos selecionados representassem um cenário intenso e
diversificado. Todavia, é de se considerar que, de algum modo, esses internos
também apresentavam semelhanças entre si, já que partilham de uma mesma
realidade, refletida na condição de privação parcial de liberdade em que se
encontram.
A definição dos membros que farão parte do grupo focal é considerada tarefa relevante, uma vez que implica na capacidade de contribuição com os objetivos da pesquisa. A amostra é intencional e os critérios (sexo, idade, escolaridade, diferenças culturais, estado civil e outros) podem variar, devendo, todavia, ter pelo menos um traço comum importante para o estudo
91
proposto (WESTPHAL, BOGUS e FARIA apud Aschidamini e Saupe, 2004, p. 10).
Em relação aos pesquisadores, ambos se posicionaram em meio aos presos,
de modo a promover uma melhor integração no ambiente, e trabalharam de modo
diferenciado durante o encontro, complementando-se no desenvolvimento da
pesquisa. Segundo Aschidamini e Saupe (id), tal divisão é importante para garantir
um melhor rendimento desse tipo de evento, já que delega de tarefas específicas
aos organizadores da reunião. “O moderador é um facilitador do debate (...) e deve
(...) cultivar a empatia, [ter] aptidão para escutar, entusiasmo para conduzir o grupo
às discussões e controle do grupo focal. Cabe a ele (...) proporcionar ambiente
adequado para que diferentes percepções e pontos de vista venham à tona” (p. 12),
enquanto “o observador deve cultivar a atenção, auxiliar o moderador na condução
do grupo, tomar nota das principais impressões verbais e não verbais, estar atento à
aparelhagem audiovisual” (id). Assim, mesmo sendo o primeiro contato prático com
o ambiente da pesquisa, os encontros transcorreram de modo descontraído e
agradável e resultaram em conversas bastantes produtivas.
6.2.2.2 Grupo focal da Penitenciária Central do Estado
O encontro com os presos da Penitenciária Central do Estado (PCE) foi
realizado no dia 10 de agosto de 2012, no período da tarde. A sala onde a reunião
foi realizada fica nas dependências da unidade e é usualmente destinada às
atividades de ensino dos internos, sendo dividida por uma grade de ferro na
proporção de 1/3 do espaço para o professor ou visitante, e 2/3 para os alunos
(presos).
Assim como verificado na CPAI, o local utilizado foi indicado pela
administração da instituição por conta do espaço físico necessário para acomodar
todos os participantes e também por oferecer um ambiente mais tranquilo e
silencioso, além de já ser conhecido e frequentado pelos pesquisados. Para garantir
mais privacidade aos participantes durante o encontro, nenhum agente penitenciário
ou autoridade policial ficou presente no interior do recinto. Entretanto, o encontro foi
integralmente monitorado pelo lado de fora, do corredor do pavilhão.
O contato com os presos selecionados para participar do grupo focal durou
cerca de duas horas. O tempo foi suficiente para que o objetivo da proposta fosse
92
cumprido. Em respeito às normas internas da penitenciária e por questão de
segurança, os presos selecionados e os pesquisadores mantiveram contato apenas
através da grade, de modo que não foi possível aplicar a técnica da disposição dos
assentos em círculo, como realizado na CPAI.
Participaram da reunião um total de 12 presos, conforme solicitado à
administração da unidade segundo os critérios metodológicos já expostos84. Assim
como nos encontros anteriores, os presos da PCE se identificaram com seus nomes
reais e completos, informação comprovada posteriormente junto à direção da
instituição, quando também os pesquisadores tiveram acesso aos dados do
prontuário criminal dos entrevistados. Mesmo sem serem questionados sobre seus
delitos, alguns internos falaram sobre o assunto, ainda que de modo raso.
Seguindo o padrão utilizado para apresentar os presos da CPAI – a outra
unidade prisional pesquisada para esta iniciativa – os participantes do grupo focal na
PCE serão aqui identificados apenas pelo primeiro nome, idade, cidade e estado de
origem. São eles:
1) Acir, 42 anos, São Paulo/SP;
2) Adriano, 29 anos, Doutor Camargo/PR;
3) Celso, 37 anos, Salto do Lontra/PR;
4) Elias, 36 anos, Guarapuava/PR;
5) Gilberto, 54 anos, Coronel Vivida/PR;
6) Glacil, 67 anos, Guarapuava/PR;
7) José, 56 anos, Roncador/PR;
8) José, 53 anos, Rio Negro/PR;
9) Marcelo, 39 anos, Curitiba/PR;
10) Mário, 47 anos, Curitiba/PR;
11) Rivail, 31 anos, Cascavel/PR;
12) Tiago, 26 anos, Curitiba/PR.
Apesar do ambiente pouco acolhedor e de certa resistência por parte dos
presos nos momentos iniciais da abordagem, o encontro transcorreu de forma
84
Os detalhamentos do processo podem ser verificados no tópico ‘Metodologia de Pesquisa’, a partir da página 79.
93
tranquila e resultou em uma importante etapa desta pesquisa, cujas conclusões
estão expostas a seguir.
6.2.2.3 Resultados dos grupos focais: CPAI e PCE
Os dois encontros realizados com os presos da Colônia Penal Agroindustrial
do Paraná (CPAI) e a reunião com os internos da Penitenciária Central do Estado
(PCE) começaram do mesmo modo: com a apresentação dos pesquisadores e dos
pesquisados e com uma breve explanação sobre a natureza do trabalho a ser
desenvolvido junto à unidade, esclarecendo algumas dúvidas a esse respeito. Os
organizadores de ambos os eventos procuraram ressaltar que a intenção da
pesquisa não seria promover julgamentos acerca dos crimes cometidos pelos
convidados, mas apresentá-los à sociedade por meio do relato de suas histórias de
vida – característica que, como se viu na análise de conteúdo, não é explorada pelos
veículos de comunicação.
O primeiro grupo da CPAI foi recebido antes que os pesquisadores tivessem
acesso ao prontuário criminal, no qual constam os registros dos delitos cometidos,
ao contrário do que ocorreu com o segundo grupo da unidade, cuja reunião
transcorreu após a consulta aos crimes dos convidados. Primando pelo melhor
aproveitamento do evento, entretanto, esse detalhe não foi revelado durante a
conversa.
Na PCE, por sua vez, a consulta aos referidos dados foi realizada somente
após a reunião, do mesmo modo como ocorreu com os primeiros entrevistados da
CPAI, menos por falta de interesse do que pelo melhor aproveitamento do tempo,
principalmente por conta da rotina e horário de reclusão dos presos em suas celas,
por volta das 16 horas. Em todo caso, o conhecimento ou não de tais detalhes não
viria a afetar significativamente o desenvolvimento do método, conforme se pode
verificar quando da realização do segundo encontro com os internos da CPAI,
quando o acesso prévio aos dados do prontuário criminal se mostrou irrelevante.
Em ambas as unidades, os presos se mostraram reservados no início do
encontro, mas aos poucos se integraram à ideia de tal modo que, após alguns
minutos, praticamente todos os convidados já estavam inseridos na conversa e
interagiam entre si e com os pesquisadores. Um a um, todos tiveram a oportunidade
de expor suas opiniões e sentimentos e de discutir assuntos como as suas
94
representações sociais na mídia e junto às pessoas livres, entre outras coisas. As
primeiras perguntas foram sobre a infância e a vida em família – temas comuns a
todos e que, abordados na abertura dos grupos, ajudaram a criar um ambiente
acolhedor para que os convidados estivessem à vontade no momento em que os
assuntos mais relevantes à pesquisa fossem trabalhados, conforme descrito a
seguir.
6.2.2.3.1 Os presos e as representações sociais: estereótipos, mídia e sociedade
Segundo a maioria dos entrevistados, o grande problema de se estar preso,
além da própria privação da liberdade e dos efeitos que tal condição acarreta, é a
imagem que se faz de uma pessoa a partir do momento em que ela é acusada de
um crime. Isso porque, para eles, ainda que o detento cumpra integralmente a sua
pena dentro dos parâmetros legais e administrativos, ela jamais se extinguirá na sua
totalidade por conta de uma espécie de marca, segundo a qual a reintrodução desse
tipo de agente no convívio social jamais passaria despercebida.
Uma vez eu liguei daqui para pedir o favor de uma pessoa para pegar o meu relógio para consertar [...]. Aí eu peguei o telefone [da loja], liguei para a menina e disse: oi, eu sou aqui da colônia aqui, não posso sair, minha portaria é uma vez em cada mês e tal. Tá. Liguei uma, liguei duas e a guria não me atendeu. Aí quando eu saí, cheguei lá me informando [...]. Aí eu falei: eu liguei pra você das outras vezes... e sabe, foi quando ela lembrou que eu era da colônia. Ela estava me atendendo normal, mas quando lembrou ficou assim [paralisada]. Eu falei: calma, tudo bem [...]. Mas deu pra perceber que teve uma alteração nela. Momentânea, mas teve (Edson, 42 anos, CPAI
85).
Tal problema, segundo eles, deve-se ao fato de que as pessoas livres não
conhecem suficientemente a realidade dos detentos, de modo que acabam
construindo uma ideia estereotipada sobre o assunto, conforme o relato de Celso, de
26 anos (CPAI). Durante o desenvolvimento do grupo focal ele relembrou a ocasião
em que foi a uma agência bancária para solicitar a regularização de seu Cadastro de
Pessoa Física (CPF). Com a demora nos atendimentos, e considerando a
preocupação com o horário de retorno para a unidade, ele dirigiu-se a uma das
atendentes e pediu prioridade por conta de sua condição.
85
Todas as falas foram retiradas dos grupos focais realizados na Colônia Penal Agroindustrial do Paraná e na Penitenciária Central do Estado.
95
Ela disse: ah, sim, tudo bem. E nisso um cara ali do lado escutou. Aí ele: puxa, você é preso mesmo, cara? Nossa! Ele ficou abismado [risos]. Aí perguntou: mas como é... você está lá na penitenciária mesmo? E eu disse: sim. E ele: mas e o Beira-mar também vai sair que nem você assim? [...] Me deu vontade de falar assim: pô, meu, vai cuidar da sua vida [...]. Ele estava querendo dizer ali que eu era bandido [risos], mas eu também sou um ser humano, né? [...] Aí falei com a mulher e dali a pouco ele foi lá em uma cadeira, deu uma puxada na outra cadeira e colocou o celular meio virado para o meu lado. Aí eu pensei: esse cara tá de arte, quer tirar foto minha [...]. Já fiquei louco. Aí só dei uma levantada e olhei para a cara dele assim. Ele disfarçou e ficou olhando para o outro lado [...]. Queria tirar foto para quê? Só para mostrar: olha, esse cara aqui é preso (idem).
Também na visão de Wilson (33 anos, CPAI) a representação social do preso
é um grande obstáculo, uma vez que leva as pessoas a fazerem “má imagem” dos
internos, antes mesmo de qualquer oportunidade de contato mais aprofundado, o
que geralmente resulta em medo e provoca as mais variadas reações.
Eu fazia um curso de computação [...] e queria continuar na escola para fazer administração também [...]. Só que ligaram daqui e disseram que eu era preso, aí quando eu terminei as aulas não pude renovar minha matrícula [...]. Perguntei se era porque eu sou preso e me disseram que sim, que era esse o motivo. [...] Já ontem, na autoescola, [...] eu cheguei atrasado. [...]. E quando isso acontece o professor sempre chama a atenção [...]. Pensei assim: nossa, hoje é eu. Cheguei lá e nada. O professor sabe que eu sou preso porque eu contei [...]. Aí, quando ele viu que era eu ele disse: oh, faça o favor, pode se sentar [risos] (idem)
86.
Para Adriano (29 anos, PCE), a situação é mais dramática. Segundo ele, os
presos são invariavelmente considerados verdadeiros “monstros aos olhos das
pessoas”, que julgam o indivíduo sem conhecê-lo. E isso, segundo Wilson (33 anos,
CPAI), deve-se muito ao problema das drogas. “A sociedade fica revoltada [...]
porque na loucura se cometem crimes que deixam até os próprios presos
abismados. [...] Daí você chega e quer fazer um curso aqui ou ali, mas como é
preso, já te olham assim: não, esse daí não vale nada”. Nessa linha, Gilberto (54
anos, PCE) é mais enfático. “Nós somos o tomate podre da caixa, então jogaram a
gente aqui [...]. Mas sempre tem uma saída, porque mesmo um tomate podre, se
você tira a sementinha, seca e planta outra vez, nasce um tomate novo”. Ou seja,
por maior que seja o medo ou a repulsa da sociedade para com o preso, eles
alimentam um desejo verdadeiro de serem aceitos sem preconceitos quando
libertados, embora reconheçam que isso raramente acontece.
86
Todas as falas foram retiradas dos grupos focais realizados na Colônia Penal Agroindustrial do Paraná e na Penitenciária Central do Estado.
96
Sobre os motivos apontados pelos entrevistados para essa realidade, a
influência exercida pelos veículos de comunicação de massa é um dos que obtêm
mais destaque nos discursos. Programas populares como os televisivos 190,
apresentado por Roberto Aciolli, e Brasil Urgente, conduzido por Luiz Carlos Datena,
ou impressos como o jornal Tribuna do Paraná, estão entre as produções que,
segundo os internos, prejudicam muito a reinserção do preso no convívio social.
Tem jornalista que é carniceiro mesmo, que já começa a falar da gente chamando de bandido, sem nem saber direito o que está acontecendo [...]. Em todo o tempo que eu estou preso só teve um jornalista que disse pra
mim: fale a sua versão que eu publico. Ele trabalhava na Gazeta do Povo, e depois, quando eu li o que ele escreveu, vi que ele cumpriu com a palavra. Mas isso é um entre tantos. A maioria não quer nem saber (Celso, 26 anos, CPAI).
Para tanto, os internos esclareceram que se mantêm informados por meio da
televisão (CPAI e PCE), do rádio e de alguns jornais (CPAI) a que têm acesso, além
dos familiares, o que lhes permite discutir assuntos amplamente difundidos como a
obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo, por exemplo, afora os
temas próprios do ambiente prisional, como a chacina que vitimou o ambientalista
Jorge Roberto Carvalho Grando, em abril de 2011, os acusados pelo feito e os
desdobramentos do fato. Tais equipamentos, quando existem, ficam alojados junto
às acomodações dos detentos, seja no cubículo onde passam a noite, seja no
ambiente de trabalho (nos casos daqueles que exercem atividades diárias dentro
das unidades). Em relação aos presos da CPAI, inclusive, o contato com a
informação também é verificado nos momentos em que eles saem para participar de
cursos de qualificação e profissionalização ou quando trabalham fora.
Em relação ao modo como são construídos em obras da literatura e do
cinema, os entrevistados se dividiram em dois grupos de opiniões: parte defendeu
que as produções nada têm de real, sendo demasiadamente fantasiosas, enquanto
alguns concordaram que os trabalhos reproduzem o ambiente, as condições e os
movimentos inerentes à realidade dos presos, mas apenas parcialmente. Nesse
sentido, os pesquisadores citaram algumas referências utilizadas nesta pesquisa,
como o livro Estação Carandiru (VARELLA, 2009) e o filme subsequente, Carandiru
(Babenco, 2002), por exemplo, entre outros que serviram de base para uma
discussão que acabou por revelar a forma como os internos enxergam a própria
condição e o modo como gostariam de ser retratados. “Quem quiser saber como é
97
viver num xadrez87 não precisa ir longe nem ver filme. É só colocar a cama no
banheiro de casa, trancar a porta e quebrar a chave. É essa a sensação, o resto é
imaginação” (Edson, 40 anos, CPAI). Já para Celso, de 37 anos (PCE), esse tipo de
obra é importante justamente por se aproximar da realidade encontrada na cadeia.
“Agora que estamos no pavilhão novo até que ficou bom, está tudo mais limpinho,
mas antes era uma sujeira danada [...]. A gente vivia feito bicho no xis88”, o que,
segundo ele, assemelha-se à ideia transmitida no filme de Babenco (2002).
6.2.2.3.2 Relações com a família
Boa parte dos internos pesquisados tanto na CPAI quanto na PCE declararam
ter crescido sob bases familiares sólidas e bastante ortodoxas, com pai, mãe,
irmãos, etc. Durante o desenvolvimento do grupo focal, Valdecir (32 anos, CPAI)
declarou abertamente que nunca recebeu má influência ou exemplos ruins em casa.
“Quis entrar no crime pra ver qual era, pra conhecer o outro lado mesmo (...). E
assim que nem eu, tem um monte aqui dentro”. Já dentre os casos de presos que
afirmaram pertencer a estruturas familiares comprometidas está Adriano (29 anos,
PCE). “Fui criado pela minha mãe com muita dificuldade e sei que dei muito
desgosto pra ela (...). Quero sair daqui pra poder reparar os meus erros e arrancar
muitos sorrisos do rosto sofrido dela”. Por isso, em sondagem bastante superficial, é
possível avaliar que cerca de metade dos entrevistados declarou pertencer a
famílias tradicionais, sem notícia de outras situações semelhantes.
Durante a reunião também se descobriu que a quantidade de detentos
casados e não casados é equilibrada, e praticamente todos têm filhos. Também
ficou evidente que a maioria dos consultados mantém relação constante e estreita
com a família, mesmo nos casos de longas condenações. Tal situação pode ser
verificada tanto com presos oriundos da capital e região metropolitana quanto entre
aqueles vindos de outras regiões do estado e do país, cuja esposa e filhos, por
exemplo, passaram a residir nas adjacências da unidade, facilitando desse modo o
convívio.
87
A palavra é uma das muitas que designam as celas onde os presos ficam reclusos. 88
Idem ao 87.
98
O contato desses detentos com os familiares é realizado por meio de visitas
às unidades89, geralmente permitidas aos finais de semana, e através de cartas que,
no entanto, nem sempre chegam. Algumas delas, segundo eles, são censuradas e
descartadas pelo setor de triagem de cada unidade. Na CPAI há ainda a
possibilidade de utilização de telefone, mas apenas para a realização de chamadas
– nunca para o recebimento – das 7h30 às 8h, das 11h às 13h, e das 16h às 17h, de
segunda a sexta-feira, e das 7h30 às 17h aos sábados e domingos. Saídas fora dos
períodos determinados pela Vara de Execuções Penais são consentidas apenas em
casos comprovadamente urgentes, mediante análise da administração da unidade e
sob escolta policial.
Ainda sobre a colônia, o órgão oferece também outra opção de interação: as
portarias de saída temporária90. Elas permitem aos presos obter pequenos períodos
de liberdade diferenciada de acordo com a pena que cumprem e do local onde
residem, com prazo mínimo de 45 (quarenta e cinco) dias de intervalo entre uma e
outra.
A presença de detentos naturais de cidades distantes de Piraquara ou de
outros estados brasileiros nas unidades pesquisadas verifica-se tanto por conta do
local da captura quanto em virtude de transferências – seja em decorrência da
necessidade de um local adequado ao cumprimento da pena, por iniciativa dos
setores competentes ou a pedido do próprio preso. Nesses casos, o contato com os
familiares acaba tornando-se mais esporádico pelo fato de o deslocamento semanal
ser inviável, e em se tratando dos internos da CPAI, também pela falta de recursos
para o transporte dos apenados da unidade até suas residências.
Outro fator que prejudica o contato dos detentos com a família, segundo
Gilberto (54 anos, PCE), é a revista. Para ele, o procedimento é por demais
humilhante, principalmente para as mulheres, motivo pelo qual há algum tempo ele
89
As normas para visitação e acesso às unidades obedecem a dispositivos específicos estabelecidos por meio da Portaria nº 244/10 do Departamento de Execução Penal do Paraná, em anexo da página 150 a 163. 90
Segundo a Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Paraná, as Portarias estão fundamentadas na lei de Execução Penal (7.210/84) e permitem ao juiz da Vara de Execuções Penais, em determinadas épocas, editar uma portaria que disciplina os critérios para concessão do benefício da saída temporária e as condições impostas aos apenados, como o retorno ao estabelecimento prisional no dia e hora determinados. O benefício só pode ser concedido aos presos em regime semiaberto e visa a ressocialização de presos por meio do convívio familiar e da atribuição de mecanismos de recompensas e de aferição do senso de responsabilidade e disciplina do interno, tendo prazo não superior a sete dias e podendo ser renovado por mais quatro vezes durante o ano.
99
pediu que as suas visitas cessassem. “É uma situação difícil demais, não quero isso
pra elas”. Questionado sobre a reação dos familiares com relação à sua prisão,
vários anos atrás, ele defende que fez tudo para deixá-los em boas condições
financeiras e que, por isso, existe compreensão. “Eles estão lá e numa boa. O único
problema é que eu fiquei aqui”. Já para Elvis (41 anos, CPAI), a notícia da prisão
junto à família foi mais difícil.
Eu morava sozinho e não tinha para quem ligar. Não queria matar meus pais de susto (...). Então falei com o meu cunhado. Depois ele avisou meu pai, que contou à minha mãe, que chegou a passar mal quando recebeu a notícia. Ela sofre dos nervos e precisou ser levada ao hospital. (...) No começo meu pai disse que nem queria saber, mas depois, quando ele viu que o negócio era mais sério, mandou eu ficar tranquilo que se fosse preciso a família gastaria pra me tirar daqui.
O que se pode perceber é que nenhum dos internos entrevistados
demonstrou indiferença em relação à família. De modo geral, bem ou mal
estruturada, essa instituição parece representar uma espécie de alicerce sobre o
qual eles depositam as esperanças para seguir adiante e para enfrentar a rotina de
restrições dentro das unidades. E junto da qual fazem planos para uma nova vida
após o término da pena.
6.2.2.3.3 Perspectivas sobre a prisão e ressocialização
Antes de serem presos pela primeira vez, muitos dos entrevistados não se
imaginavam nessa condição e não sabiam ao certo como funcionava uma
penitenciária, mesmo aqueles que tinham familiares próximos internalizados em
instituições penais, como o caso de Edson, 42 anos (CPAI). Apenas Gilberto (54
anos, PCE) admitiu abertamente que já havia pensado nessa possibilidade. “Quando
eu entrei na vida do crime eu sabia que poderia vir parar aqui. Foi uma opção [...].
Hoje eu me arrependo, mas eu tinha consciência do que estava fazendo e só queria
deixar minha família bem. Eu consegui, mas pra mim foi ruim porque eu fiquei aqui”.
Sobre o ambiente prisional, eles são categóricos em algumas queixas como,
por exemplo, em relação às avaliações psicológicas – realizadas a pedido do juiz
quando da análise de algum pedido de progressão de pena. “Eles fazem quatro ou
cinco perguntas pra gente. Será que só sabendo o nome, o crime, o tipo de contato
com a família, o total da pena e como a gente se sente em relação ao que fizemos, e
100
isso em menos de 10 minutos, é suficiente para alguém decidir a vida do outro? Eu
acho que não”, reclama Adriano (29 anos, PCE). “Eles deviam acompanhar a gente
mês a mês, analisar mesmo, se aprofundar em cada caso, e não chamar um ou
outro só quando o juiz manda”. Nessa linha também Elvis (41 anos, CPAI) é
taxativo. “Eu não tive qualquer acompanhamento durante o meu tempo de cadeia. E
no caso do meu crime isso deveria ser essencial”, explica. “Mas conheço meus
direitos e, assim que sair daqui e voltar pra minha cidade, vou atrás do Ministério
Público expor a situação e pedir um tratamento adequado; do contrário, vou
processar o estado”.
Outros aspectos negativos apresentados pelos entrevistados são a
alimentação e a falta de apoio para uma efetiva reinserção social.
A gente aqui ganha uma comida tão ruim que nem o cachorro come, o estudo é precário e não tem nem professor nem material, e não tem vaga pra todo mundo se ocupar. Então o Estado não profissionaliza, não dá estudo, não dá nada e quer que o preso saia ressocializado. Um cidadão de bem, perfeito. Isso é a coisa mais difícil que existe no sistema. É só pra quem quer realmente sair da vida do crime. Por isso é que eu acho que se essa juventude aí não tiver estudo, religião e trabalho, um apoio, vai sair, ficar um ou dois anos fora e depois voltar pra cá (Edson, 42 anos, CPAI).
Como consequência, tal situação acarretaria no inchaço das prisões e na
“profissionalização” do crime, como argumenta Celso (37 anos, PCE). “Não adianta
jogar um cara 10, 15 ou 20 anos numa penitenciária e não dar nenhuma condição
pra ele melhorar. Porque invés de ele se recuperar, vai é sair daqui ainda mais
escolado do que antes”. Já Wilson (33 anos, CPAI) é mais otimista e admite que a
situação das unidades vem melhorando com o passar do tempo. “Antes nem
oportunidade de curso tinha. Hoje até que tem. Não pra todo mundo, mas tem”. Por
isso, ele ressalta que a ressocialização de fato é uma questão de escolha. “O cara
vem pra cá sabendo um tanto, só que no meio dos outros aprende todo o resto. Aí
vai dele escolher qual futuro quer pra si: se continuar no crime ou voltar pra
sociedade”. Para sustentar seu argumento, Wilson relata o exemplo de um ex-
detento da CPAI que, em tendo encontrado uma oportunidade, mudou de vida.
O Robson era um traficante e tava aqui de bobeira, aí apareceu uma oportunidade de um curso de corte e costura. Ele foi... mais pra se ocupar, né? Não com o objetivo se se tornar um costureiro. Mas foi. Daí quando, uns dois meses atrás, cantou a liberdade, ele foi pra rua, só que como a mente dele tinha mudado, nem foi atrás de fornecedor pra arrumar droga
101
pra vender. Por quê? Porque lá dentro do curso ele conseguiu parcerias pra ajudarem ele a melhorar de vida. Agora ele tá com duas máquinas de costura, abriu um site, fez uma marca, tá fazendo uns rótulos muito bonitos, umas roupas, e agora é dono de firma.
Em termos gerais, os encontros mostraram aos pesquisadores que os presos
consultados, quase que em sua totalidade, não estão satisfeitos com as condições
de vida proporcionadas no sistema penitenciário, embora alguns deles admitam que
o panorama tenha sofrido importantes e significativas alterações com o decurso dos
anos e das administrações e, com isso, melhorado em alguma medida. Contudo, é
unânime o desejo de reconhecimento e de respeito quando eles, de algum modo
buscam novas alternativas de renda que não por meio do crime.
6.2.2.3.4 Relações com os funcionários
Durante os encontros os internos expuseram a delicada relação que existe
entre eles e os agentes penitenciários. Como no caso de Elvis, que se queixou das
revistas sofridas na prisão. “Eles mandam a gente tirar toda a roupa pra olhar se não
tem nada escondido no corpo da gente. É o que a gente aqui chama de peladão. Só
que além de constrangedor, isso é muito desumano. Humilha qualquer um” (Elvis,
41 anos, CPAI). Isso porque, segundo Celso (26 anos, CPAI), o sistema
penitenciário carece de servidores mais preparados que, além de entenderem
melhor a realidade carcerária, também consigam compreender o que rege a
legislação acerca dos direitos dos presos. “Ainda bem que, devagarinho, as coisas
estão mudando. Hoje ainda tem desses que maltratam a gente, mas quem manda
mesmo, os chefes, por exemplo, já são mais esclarecidos, não pensam em deixar os
caras mofando na cadeia. Querem dar oportunidade. Querem ajudar a gente a sair
daqui” (Wilson, 33 anos, CPAI).
Eu já estou percorrendo as penitenciárias há 14 anos e posso dizer. O problema dos funcionários que não têm estudo e nem expectativa de melhora na profissão é o seguinte: a polícia prende, a Justiça condena e os agentes são contratados pra cuidarem da nossa integridade física. Pra quê? Quando o juiz quiser falar com qualquer um de nós, a gente tem que estar com saúde e bem fisicamente pra se apresentar diante dele. Aí quando terminar a nossa pena, ele vai nos devolver à nossa família. E o trabalho dos agentes é cuidar pra que a gente seja bem alimentado, bem cuidado, e pra gente não se matar um ao outro. Só que justamente por isso esses carcereiros se sentem no direito de julgar, condenar e castigar cada preso.
102
E ainda fala ‘você é ladrão, rapaz. Cala a boca’. Ou seja, além de tudo isso ele ainda quer ser um torturador de cadeia (Edson, 40 anos, CPAI).
Mais do que uma rotina diária que se inicia por volta das seis horas da manhã
e vai até o final da tarde, todos os detentos obedecem a normas rígidas de conduta
interna, como define Wilson (33 anos, CPAI). “Nós temos as regras da cadeia, mas
também temos a nossa ética”. Como exemplo, na PCE – dos dois, o regime mais
delicado e complexo, por ser fechado – onde os internos, para garantir o bom uma
espécie de padrão de funcionamento, além de não encararem os visitantes sem a
sua permissão ou dos agentes penitenciários, caminham cabisbaixos com as mãos
atrás do corpo e, quando na presença de alguém externo à unidade, principalmente
mulheres, viram-se para a parede. “Aqui é sim senhor, não senhor, chefe, doutor e
assim por diante”, lembra Gilberto (54 anos, PCE).
Seja na PCE ou na CPAI, o que os pesquisadores puderam concluir foi que,
dentro das unidades (em regime fechado ou semiaberto), os educandos enfrentam
as mesmas condições inerentes à privação de liberdade, o que faz com ele eles
desenvolvam uma espécie de identidade coletiva. Durante as reuniões, cada vez
que algum deles se pronunciava, procurava sempre o olhar do outro, como se para
ratificar a informação revelada sobre aquela realidade compartilhada. Em todos os
momentos, os entrevistados deram mostras de que se sentem parte de um grupo e
que estão unidos pela própria causa e para defenderem seus ideais. Sejam eles
quais forem. Por isso é que, mais do que nunca, o jornalismo pode ser uma
ferramenta útil para redirecionar o olhar das pessoas e ajuda-las a reformular as
representações com a experiência proporcionada por meio do produto sugerido –
um livro-reportagem.
103
7 DELINEAMENTO DO PRODUTO
Para que fosse possível se chegar à elaboração do produto final desta
pesquisa, o livro-reportagem intitulado "Rememórias: a trajetória dos condenados",
foi preciso adotar algumas escolhas como as citadas em cada tópico a seguir.
Assim, procura-se demonstrar a viabilidade do produto, que fala sobre a história de
presos, usando, para tanto, recursos do jornalismo literário.
7.1 FORMATO
O formato escolhido para a concretização deste trabalho foi o livro-
reportagem, por permitir, como já foi dito, a construção de um relato mais amplo do
que aqueles trazidos pelas reportagens cotidianamente publicadas nos veículos de
comunicação periódicos. Assim, o nome do produto "Rememórias: a trajetória dos
condenados" foi definido com base na proposta dos pesquisadores em divulgar o
relato de vida dos presos a partir do ponto de vista dos próprios entrevistados, de
forma que estes, de fato, evocassem as lembranças de toda a trajetória percorrida
por eles até o momento da prisão e, como em alguns casos, para além dela.
O livro tem 253 páginas, possui fonte Geórgia, tamanho 10, na maior parte
dos textos, exceto quando são usados efeitos para simular a reprodução de bilhetes
ou documentos oficiais, em que é empregado a fonte Arial, tamanho 8. Notas de
rodapé utilizaram fonte Arial, tamanho 6. Em outros momentos, no decorrer da
história, usou-se negrito e itálico. O negrito foi utilizado para dar destaque a
determinados subtítulos, divisão de capítulos, e parágrafos, de forma que ficassem
mais visíveis as informações em que ouve o desejo do efeito. Já as partes em itálico
serviram para sinalizar a troca de interlocutor durante as histórias, ou reproduzir
gritos, pensamentos, expressões estrangeiras e citações.
A foto da capa foi tirada pelos próprios autores desta pesquisa e do livro e a
arte foi desenvolvida pela gráfica UP, com base nas orientações prévias dos
pesquisadores. As dimensões do livro seguiram o tamanho que é uma espécie de
padrão utilizado por editoras, o A5 (14,8 cm X 21 cm), por todas as conveniências
que o formato já comumente consumido pela maioria dos leitores proporciona. O
papel utilizado na capa foi o couchê fosco 230g.
104
Em relação às páginas do livro, o material empregado foi papel off white
pólen, com gramaturas de 70g/m², com o objetivo de não provocar cansaço à leitura
– mesma razão pela qual os autores também inseriram uma galeria interna com
fotografias das unidades penais visitadas: primeiro as da Colônia Penal
Agroindustrial do Paraná (CPAI), depois as da Penitenciária Central do Estado
(PCE), ambas localizadas em Piraquara, Paraná. Em todo caso, as imagens
representam, junto ao produto, apenas ilustrações adicionais, de finalidade
complementar, não essenciais ao livro.
Além da capa, os pesquisadores escolheram colocar duas orelhas no livro,
extensões da capa, a primeira, no início, com um breve resumo do que há no livro-
reportagem, e outra, no final, com descrição de quem são os autores.
7.2 PERSONAGENS
Para que fosse possível aos pesquisadores a utilização das técnicas do
jornalismo literário no livro-reportagem elaborado com base nas entrevistas que, por
sua vez, contaram com os recursos inerentes ao método da História Oral, foi
necessário, antes, obter a maior quantidade possível de informação acerca de cada
uma das fontes em potencial. Por isso, o primeiro contato com os presos foi
viabilizado pela realização de três reuniões, ou grupos focais, conforme consta no
tópico Metodologia de Pesquisa91 deste trabalho. A seguir, os pesquisadores
selecionaram os personagens que iriam compor o produto e procederam às
entrevistas individuais.
Para o início das entrevistas, optou-se pelo desenvolvimento de grupos focais
com os internos das duas instituições: PCE e CPAI, cuja participação foi voluntária,
determinada pelo próprio preso – condição imprescindível para se obter mais
qualidade no relato, conforme sustentam Aschidamini e Saupe (2004). O grupo
focal, que faz parte de uma técnica qualitativa conforme define Zimmermann e
Martins (2008), foi importante por três motivos, como já dito: ajudou a entender, na
prática, as representações sociais dos internos do sistema penal de Piraquara;
permitiu testar formas de abordagem em relação aos presos; e auxiliou na escolha
das histórias contadas no livro-reportagem. Depois de se realizar as entrevistas com
os grupos focais, os pesquisadores selecionaram quatro presos de regimes distintos: 91
A partir da página 79.
105
dois do fechado e dois do semiaberto, cuja participação, por parte dos presos, em
integrar a composição do livro-reportagem, foi espontânea.
Com critérios de escolha, os pesquisadores apuraram a natureza do delito
cometido pelos participantes, de forma a tornar as narrativas do livro-reportagem
mais diversificadas, de modo híbrido: parte por conveniência, ou seja, baseada na
viabilidade ou disponibilidade, conforme já esclarecido no tópico Metodologia de
Pesquisa92, e parte por intenção, isto é, “quando o pesquisador faz a seleção por
juízo particular, como conhecimento do tema ou representatividade subjetiva", como
defende Duarte (2005, p. 69).
Dessa forma, os pesquisadores, com conhecimento prévio sobre a temática
abordada, selecionaram aqueles personagens que mais se destacaram entre os
entrevistados.
Escolher essas "unidades qualitativas" entre os integrantes de urna determinada categoria de pessoas requer um conhecimento prévio do objeto de estudo. É preciso conhecer o tema, o papel dos grupos que dele participaram ou que o testemunharam e as pessoas que, nesses grupos, se destacaram, para identificar aqueles que, em princípio, seriam mais representativos em função da questão que se pretende investigar - os atores e/ou testemunhas que, por sua biografia e por sua participação no tema estudado, justifiquem o investimento que os transformará em entrevistados no decorrer da pesquisa (Alberti 2005, p. 34-35).
Portanto, depois da seleção, que acabou deixando de lado outros
participantes com mesmo potencial – não aproveitados em função do tempo
necessário para a conclusão desta pesquisa – os quatro personagens, que tiveram
as histórias escritas foram entrevistados, respectivamente, na ordem apresentada no
livro: Doutor, Cody, Padre e Carlos. Seus nomes foram mantidos sob sigilo,
utilizando-se, em vez disso, pseudônimos indicados pelos próprios presos. Tal
recurso foi empregado para evitar possíveis complicações e/ou a exposição
desnecessária dos detentos, agentes penitenciários e demais pessoas envolvidas no
relato, bem como as próprias vítimas, afinal, o que mais importava era a qualidade
do relato narrado e as histórias em si. Igualmente, o fato de não serem identificados
também trouxe, de certo modo, mais garantias com relação à fidelidade dos
personagens acerca dos fatos narrados.
92
A partir da página 79.
106
7.3 FOCOS NARRATIVOS
A história dos personagens foi construída a partir de tipos específicos de foco
narrativo, conforme a natureza de cada relato. Na história do Doutor, por exemplo,
foi utilizada a linguagem em primeira pessoa, e o narrador se colocou na maior parte
da história como protagonista da narrativa e simultaneamente ouvinte e narrador
intruso, ou seja, uma forma híbrida de composição: o protagonista é onisciente, o
ouvinte faz perguntas para este interlocutor, em algumas intercalações, usando
discurso direto, e o narrador intruso surge poucas vezes como uma "voz
questionadora" para a versão do protagonista e com efeito em itálico.
Na história do personagem Cody, optou-se por utilizar a linguagem em
terceira pessoa, como um narrador observador, que não participa da história e é
onisciente, a fim de que o recurso diminuísse a atribuição de valores morais à
história, haja vista que envolve um tema polêmico na sociedade: pedofilia. E também
porque a ideia era construir o relato a partir da ótica do próprio personagem, ou seja,
do ponto de vista de terceira pessoa defendido por Wolfe (2005) como uma das
marcas do Novo Jornalismo.
Em vez de chegar como um locutor descrevendo a grande parada, mudava o mais depressa possível para dentro das órbitas oculares das pessoas da história, por assim dizer. Muitas vezes, mudava o ponto de vista no meio de um parágrafo, até 3 no meio de uma frase. (…) Eu sempre mudava de um ponto de vista para outro, às vezes de maneira abrupta, em muitos artigos que escrevi em 1963, 1964 e 1965. Um crítico chegou a me chamar de camaleão (WOLFE, 2005, p.34-35).
Para o personagem Padre, preferiu-se escolher uma forma híbrida de
narração: assim como no caso de Cody, usa-se terceira pessoa para se distanciar
de norteamentos morais para a história, e há a participação dos pesquisadores
como observadores e interlocutores durante a narrativa, apontando impressões
sobre o personagem. A diferença, no entanto, está no fato de que o próprio
narrador-observador não é onisciente e a narrativa é dividida em duas versões,
relatadas pelo personagem como explicações para o fato de ter sido preso.
A narrativa do personagem Carlos é construída com base nas impressões dos
pesquisadores sobre o personagem, narrado em primeira pessoa, como um
narrador-personagem, que participa da história para se construir a narrativa.
107
Para escrever os textos de cada um dos quatro personagens, os
pesquisadores dividiram as histórias, cada um escolheu dois presos para narrar a
história, contudo, como o objetivo era explorar ao máximo os recursos do jornalismo
literário, os autores escreveram as quatro histórias com formas de estilo, linguagem
e interlocutores diferentes. Na primeira, do personagem Doutor, a narrativa se dá em
primeira pessoa, com o autor se colocando no lugar do preso, como se fosse o
próprio. Em alguns momentos, surge na narrativa a figura de um ou dois
interlocutores que, por sua vez, podem ser interpretados de diferentes formas,
dependendo da subjetividade do leitor. Doutor está preso há 26 anos e a liquidação
da pena está prevista para ser encerrada em 2020. Na segunda história, de Cody, a
narrativa é feita em terceira pessoa e vai aos poucos aprofundando o leitor num
tema que é polêmico na sociedade. A proposta foi não aplicar sentidos morais à
história, colocando o caso no ponto de vista do próprio protagonista, que está
recluso ao sistema penitenciário desde o final de 2009. Sua pena é de oito anos, 10
meses e 20 dias. Na terceira narrativa, do preso Padre, devido às incongruências e
divagações do personagem, além do escapismo constante dele sobre as versões
que foram dadas ao seu crime nos meios de comunicação, optou-se por criar uma
narrativa com duas versões diferentes de um mesmo personagem. Ou seja, o leitor
decide com qual quer ficar, caso queira escolher alguma. Padre foi acusado de
cometer um crime hediondo e tem pena prevista de 29 anos de reclusão, dos quais
já cumpriu 19 – associando-se, assim, à ideia do leitor investigador prevista no
jornalismo literário, no qual produz-se o texto que será completado pela experiência
do próprio leitor. Na quarta e última, do personagem Carlos, o texto apresenta
linguagem em primeira pessoa, mas, diferente da história do Doutor, um dos
pesquisadores narra o relato a partir do próprio ponto de vista, mas usando
informações do relato do preso. Recolhido à cadeia pela primeira vez em 1991, ele
ficou foragido e cometeu novos crimes ao longo de sua condenação inicial, de modo
que, mesmo em outubro de 2012, e em decorrência dos novos julgamentos, ele
ainda deve 11 anos de pena à Justiça.
A escolha da foto de capa se deu porque a imagem escolhida, com fundo
branco, foge dos estereótipos que se tem quando o assunto envolve presos,
geralmente se usa temas escuros ou nebulosos, mas, ainda assim, é uma foto
dramática. Além das histórias, em meio ao livro, a galeria de fotos inserida pelos
108
pesquisadores ajuda o leitor a ter uma referência mais detalhada sobre o universo
prisional.
7.4 LINGUAGEM E TÉCNICAS
Quanto à linguagem, os pesquisadores optaram por utilizar o jornalismo
literário por permitir uma maior complexidade dos personagens e de suas falas ao
longo do texto, com a descrição de detalhes, expressões e comportamentos. Dentro
das várias possibilidades desse formato de texto, os pesquisadores se utilizaram das
técnicas oferecidas pelo New Journalism, já que o objetivo dos pesquisadores era
potencializar os recursos inerentes ao jornalismo e, com isso, reconstruir de modo
criativo os relatos dos presos, transformando-os em algo próximo do que se entende
por um perfil jornalístico93, sem pretensão de condená-lo ou redimi-lo.
7.5 PÚBLICO-ALVO E VEICULAÇÃO
Em relação ao público-alvo pretendido, ele é composto por pessoas que não
pertencem ao ambiente prisional e nem têm contato com esse tipo de realidade, mas
que se interessam pelo tema. Entretanto, tendo em vista a amplitude dessa
definição, opta-se pela veiculação entre estudantes e professores universitários do
setor de ciências humanas, já que a academia é um lugar propício para esse tipo de
discussão, contribuindo para a formação de futuros profissionais. Entretanto, a
definição do público-alvo não irá restringir a veiculação entre pessoas de outros
universos diferentes dos propostos pelos pesquisadores.
Para que o público-alvo seja atingido, o objetivo é que o livro-reportagem seja
veiculado entre os estudantes e professores universitários em eventos acadêmicos
que incluam, por exemplo, feiras e exposições de livros. Para tanto, os
pesquisadores pretendem contatar as coordenações de centros universitários de
modo a viabilizar esse tipo de parceria.
Depois de pronto, o livro-reportagem também será inscrito em concursos
acadêmicos e demais eventos que possam ajudar na divulgação de iniciativas do
93
Segundo Vilas Boas (2003), trata-se de uma modalidade de texto em que o autor retrata apenas parte da vida do entrevistado, de modo a criar uma espécie de empatia do público em relação ao perfilado.
109
tipo. O produto poderá ser disponibilizado para os órgãos governamentais ligados ao
tema, como as instituições penais visitadas e a Secretaria da Justiça, Cidadania e
dos Direitos Humanos - SEJU, para que sirva de fonte para outros estudos. Nesse
sentido, também este relatório monográfico será ofertado para incluir os arquivos
digitais da guia de trabalhos acadêmicos Monografias, no site do Departamento
Penitenciário do Paraná – Depen-PR (www.depen.pr.gov.br).
7.6 RECURSOS MATERIAIS E ORÇAMENTO
Os equipamentos necessários à captação dos dados nas entrevistas
(gravadores de voz, câmera filmadora e câmera fotográfica) pertencem aos
pesquisadores, o que reduz os custos de produção. Mas para a concretização do
livro-reportagem foram necessários recursos financeiros para a logística até as
unidades, que, em combustível, chegou a R$ 160; diagramação: R$ 700; e
impressão de cinco cópias do livro: R$ 100,00. Contudo, os pesquisadores
pretendem obter recursos provenientes de leis de incentivo como, por exemplo, a Lei
Rouanet, que estabelece políticas públicas voltadas à cultura nacional como o
Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), que financia projetos do gênero,
para imprimir e distribuir mais tiragens do produto, e também não se descarta a
possibilidade do patrocínio de empresas privadas ou de se conseguir o interesse de
alguma editora que queira publicá-lo.
110
8 CRONOGRAMA DE ATIVIDADES
Descrição da Atividade Mês (relativo ao último ano do curso)
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Revisão da bibliografia X X X
Elaboração do relatório
monográfico X X X
Banca de qualificação X
Desenvolvimento do grupo
focal/mapeamento de fontes X X
Entrevistas X X
Edição e verificação dos dados X X
Elaboração do livro-reportagem X X
Diagramação X
Revisão e impressão X
Apresentação do produto/banca
final X X
111
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho de conclusão de curso teve como principal objetivo construir,
por meio de um livro-reportagem, relatos escritos sobre a história de vida dos
condenados da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI) e da Penitenciária
Central do Estado (PCE), a partir do ponto de vista dos próprios presos. Desse
modo, esta explanação teórica buscou analisar vários conceitos importantes
relacionados ao tema, como o de crime, prisão e liberdade, além das representações
sociais acerca desse gênero social, entre outros. Assim, foi possível aos
pesquisadores avaliarem, de forma prática, a relação entre detento e sociedade e,
por consequência, os aspectos comunicacionais relativos à interseção das duas
esferas.
Com vistas à resolução do problema proposto, os pesquisadores buscaram
resgatar e reproduzir jornalisticamente as histórias de vida dos indivíduos
internalizados nas duas instituições penais, contrapondo o modo como eles acabam
retratados pela mídia e, principalmente, fugindo aos estereótipos correntes. Para
tanto, fez-se necessária a aplicação de estudos que sustentassem tal resultado.
Primeiramente foram identificadas as representações sociais dos presos na mídia a
partir de uma análise de conteúdo das reportagens veiculadas na página virtual do
jornal Gazeta do Povo. A isso, somaram-se os esforços na realização de três grupos
focais (dois na CPAI e um na PCE) com 24 detentos – tudo para que se pudesse
compreender a forma como essas pessoas são vistas pela imprensa, pela sociedade
e por elas mesmas.
Para alcançar o escopo, este estudo contou com alguns questionamentos
dispostos como metas específicas e secundárias. Nessa linha, refletindo sobre a
produção jornalística acerca do tema, e isso com base nas publicações do veículo
de comunicação selecionado, percebeu-se que ela é definida, ao menos em parte,
pelas escolhas dos profissionais da área em relação às fontes, entrevistados,
tratamentos, dados e enfoques. Tais preferências – apesar de aparentemente
simples – são decisivas, já que acabam por influenciar a ideia que se têm desse
ambiente social e seus atores; neste caso, em específico, os presos. Isso porque, ao
passo que os fatos têm a capacidade potencial de transformar as representações
sociais que uma pessoa tem do mundo, o jornalismo, por seu lado, trabalha com
ferramentas capazes de direcionar compreensões e, com isso, de reformular as
112
representações como um todo através da vivência canalizada pela produção da
mídia.
Além disso, também foi possível verificar que há um modo muito parcial de se
definir essa classe de indivíduos na mídia; aspecto refletido durante as entrevistas,
quando se constatou que os internos não apenas reconhecem como reproduzem o
discurso que, segundo Misse (2010), é bastante presente na rotulação dos
criminosos como um todo: “bandido”. Entretanto, conquanto não escapem a essa
espécie de julgamento moral, também ficou claro que esses sujeitos identificam em
si plenas condições para o retorno à vida em sociedade e que desejam ser
reintegrados a esse meio, mas de modo respeitoso, recebendo no processo o
mesmo tratamento dispensado às pessoas comuns, ou seja, não presas; sobretudo
sem preconceitos.
Em relação ao referencial teórico, este trabalho fundou-se prioritariamente na
proposição das representações sociais, uma vez que tal estudo permite
compreender as relações sociais intrínsecas à sociedade e, consequentemente, aos
detentos. Desse modo, observou-se que a realidade fora dos muros da cadeia
traduz, para os presos, um profundo ideal de vida, conquanto sua readmissão nesse
mundo seja, por vezes, temida por boa parte deles. Nesse sentido, outra vez a
comunicação desempenha papel fundamental, uma vez que produz, tanto nos
presidiários como na sociedade, por meio de produtos jornalísticos, um efeito que
pode reforçar os estereótipos a cerca da cadeia e seus internos.
Sobre o produto jornalístico que melhor contemplasse os aspectos da
presente discussão, os pesquisadores optaram por um formato que se apresentasse
na forma de uma ferramenta útil para expor tal problema social às pessoas externas
a essa realidade. Por isso é que, ao final deste trabalho, conclui-se que é possível
dar fruto a um livro-reportagem que, munido das técnicas do jornalismo literário
combinadas com o levantamento, interpretação de dados, pesquisas documentais e
de campo, e contando ainda com o esforço em descontruir os estereótipos comuns
aos presos, revele com fidelidade a trajetória da vida dos condenados da CPAI e
PCE, por meio de suas narrativas pessoais.
Por fim, com base nessas conclusões, fica registrado neste trabalho que há
outras vertentes e possibilidades referentes à visualização e tratamento do tema,
que se apresentam como um convite – ou desafio – para que outras investigações
114
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Roteiro de Perguntas para o desenvolvimento do Grupo focal
1. Vocês se lembram da infância de vocês? Como foi? Aonde cresceram?
2. Quem aqui é casado?
3. Alguém aqui tem filhos?
4. Qual é o nível do contato que vocês têm com a família?
5. Como a família de vocês encara o crime que vocês cometeram e fato de
estarem presos? Isso incomoda?
6. Qual o maior sonho de vocês?
7. Há quanto tempo estão aqui?
8. Já tinham se imaginado presos algum dia na vida?
9. Como vocês imaginavam que era a vida de uma pessoa presa?
10. Depois de presos, essa visão mudou? Por quê?
11. Como vocês se definiriam hoje?
12. Já pensaram em como as pessoas lá fora veem vocês aqui dentro?
13. Para vocês, isso que elas pensam corresponde à verdade? Por quê?
14. Como vocês acham que a mídia fala de vocês?
15. Já leram o livro ou viram o filme Estação Carandiru? Se sim, o que acharam
(corresponde à verdade ou não)?
16. Vocês pensaram ou refletiram sobre a própria história de vocês? Fariam
alguma coisa diferente?
17. Vocês se sentiriam à vontade para falar sobre as suas vidas antes de virem
para cá? Tipo contar como era, um pouquinho da história de vocês, o que
vocês mudariam... Enfim. Gostariam de participar de um trabalho como esse?
18. Qual foi o momento mais importante da vida de vocês (Contar um momento
marcante da vida das entrevistadoras para quebrar o gelo)
19. Como a família de vocês encara o crime que vocês cometeram e fato de
estarem presos? Isso incomoda?
20. Vocês acham que o fato de terem sido presos foi justo ou injusto? Por quê?
21. Vocês acham que a história de vocês pode contribuir com a de outras
pessoas? De que forma?
22. Como é o relacionamento entre vocês (presos)?
23. Como é o relacionamento entre vocês (presos) e os agentes/funcionários?
24. Vocês já têm planos para quando saírem da prisão? Quais são eles?
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