reportagemcostasantoandré

Post on 09-Aug-2015

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da orla costeira que entraram em vigor no passadomês de Fevereiro deste ano. Indecisa entre desejosurbanos e sentimentos rurais, melancólica quando olhapara atrás e ansiosa pelo que vê à sua frente, a Costaespera o seu destino. Espera-se que seja um futuroresponsável. Um crescimento turístico equilibrado naforma e no conteúdo. Ou, como gostam de dizerpolíticos e ecologistas encartados, ambienta lmentesustentado. Começar pela questão da arquitectura

frente ao mar será um bom princípio. Para não seterminar num muro de lamentações à semelhança deQuarteira, para recuperar um exemplo lamentável doAlgarve.

Esta não é apenas mais uma língua de areia alentejanafrente ao mar do sul. È a sua praia. Mesmo que, volta emeia, se esqueça dela, trocando-a por uma São Torpesaquecida ou um Porto Covo entoado em três tons. Éesta, a sua praia. Mesmo que seja preciso um forasteiroa lembrar-lhe isso. É aqui que , metros adiante , sedescobrem a lguns cent íme t ros de pe le . Não va iencontrar o Burt Lancaster a beijar a Deborah Kerraté à eternidade, cobertos pela fúria das ondas maspode apaixonar-se, outra vez. Esta é a sua praia. Nãose esqueça disso. Não a perca de vista. Volte. Ela esperapor si. E sim, continua a terbandeira azul, a pedido dosma is fanát icos europe ístas.Do azul, a Mar ia Labaredahavia de gostar. Azul Marinho.A cor dos o lhos que nãoabandona o pensamen to ,mesmo quando ele se refugiano pôr-do-sol.

COSTA DE SANTO ANDRÉ Do princípio da areia ao fim do mar

REPORTAGEM Junho de 2 0 0 8

João Car los Mart insjornalista e invest igador

Na minha juventude antes de ter saídoda casa dos meus pais disposto a viajareu conhecia já o rebentar do mardas páginas dos livros que já t inha lido

E TUDO ERA POSSÍVELObra Poét ica de Ruy Belo, vol.1Edições Presença# 1 9 8 1

Existem praias grandes, a perder de vista na vastidãodo a r ea l e ou t r as , pequenas l ínguas de a r e iaencravadas nas rochas onde estendemos a toa lha.Existem locais que são de mera passagem. Chegamos,pousamos as malas, qualquer coisa corre mal e quandodamos por ela, ela já se veio embora e nós atrás dela.Ele há outros sítios onde depois de pousar as malas,apetece ficar.

A Costa de Santo André é um desses sítios. A areia é amesma doutras praias ao longo da costa, a água é domesmo oceano e o sol nasce igual para todos mas,quando desce em profund idade no mar , parecedemas iado ir rea l . Apenas quando o agarramos ,impresso em papel fotográfico, é que acreditamos.Corpo na cadeira. No princípio da areia, no Bar do Fim.Não era preciso, pés enterrados na areia fria da manhã,ouvir pela orla, pela beira, pela areia afora, a tardeinteira. A Adriana Calcanhotto a acompanhar a quedano precipício solar. Não se pretende um cruzamentochic entre o Carva lha l e a Comporta mas a juda amelhorar um café revigorante, um sumo de laranjasuperlativo e um serviço adormecido. Bem que se quisdepois de tudo ainda ser feliz dizia a Marisa Monte.

E devem ter sido felizes. Quando chegaram do Norte,de Estarreja, da Murtosa e Torreira, os precursoresda Costa assentaram arraiais nas primeiras dunas, nazona onde hoje se abre a lagoa ao mar. Entre Mana fa ias , V inagres , Dom ingos e depois Can iços ,Mercant istas e Labaredas, cresceram gerações etradições. Uma foi a da ca lde irada e ensopado deenguias da taberna da Ti Padeira. Maria do RosárioSimão Labareda era a responsável. Aproveitava o peixedurante os meses em que ele cria (Maio e Setembro)e na altura em que a lagoa abre ao mar, acontecimentoeternizado no sagrado mês de Março. Ou uns dias maistarde. Este ano, aconteceu nos primeiros dias de Abril.Venha assistir à abertura da lagoa ao mar e perceba autilização sacral do mês, antes da areia encerrar acomunicação com o mar . Quando já não se vê orompimento do cordão dunar por força de homens eanimais para que a lagoa se entregue ao mar, comoacontecia no século passado. Uma época em que obúz io chamava os pescadores à sa fra , as vezesprecisas também para puxar as redes. Homens emulheres, lado a lado.

Anos mais tarde, a Costa sofria a sua transformaçãoinicia l, entre o exercíc io pisca tór io e a temporadaba lnear , quando se vislumbrava o dec línio da ar texávega e das companhas, entre a escassa captura depeixe fresco e novos pescadores. As novas invasõesfrancesas t inham entrado pra ia adentro, segundoDaniel Constant. Numa terra de Luíses, Luís Manafaiafoi o primeiro anfitrião na Fragateira, quando todos seacotove lavam em compor as finanças domést icasatravés do aluguer de quartos e casas. Numa vertigementre o azul do mar e o azul do franco na velha colóniade pescadores da Beira Litoral.

Pescadores que confessavam amores no Baile de SãoRomão, quando o Verão elevava as hormonas a 9 de

Agosto. No outro dia de manhã, chegavam-se à beira-mar e ajustavam a temperatura corporal à água domar, entre calças pelos joelhos e saias arregaçadas.Os que tinham feito o melhor negócio da vida - casar - eaque les que o con t inuavam a ad ia r . Os queregressavam a casa . Sozinhos . Sem pr inc ipio denamoro nem ajuste de casamento. Com o calor que jácomeçava a pesar nas ruas.

Um calor que vem das tépidas águas da Lagoa que fazparte do maior sistema lagunar da Costa Alentejana, apar da Lagoa de Melides e da Lagoa da Sancha, que sepensa ter sido a sa ída ao mar da vila romana deMiróbriga. Uma saída intempestiva de um mar bravio,onde se deve respeitar a profundidade, à semelhançadas pra ias vizinhas das Are ias Brancas, Fonte doCortiço e Monte Velho.

quer ia de t i um país de bondade e brumaquer ia de t i o mar de uma rosa de espuma

Már io Cesariny

Aqui, o tempo passa lentamente, como se o ar setivesse tornado um líquido espesso que se cola àspalmas das mãos suadas. Existem outros sítios ondeas pedras da rua transpiram de dia e respiram à noite.Ou pela manhã, antes do almoço mais fresco que asredes de Bruxelas permitem, uma eficaz aliança entretecnologia e natureza na B iblioteca It inerante, comacesso a todas as janelas do mundo, a partir destepedaço de areia. Por lá, também continuam os velhosamigos de lombadas determinadas perante qualquerventania quando já não há pac iênc ia para dobrarresmas de meio quilo de papel, ao sábado de manhã.

No meio de patos, maçaricos, garças e mergulhões,resta descobrir para onde caminha a Costa de SantoAndré, depois dos planos de pormenor e ordenamento

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