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ficados os gestos das autoridades das Coreias na contramão da escalada do conflito: primeiro um movimento que parte do Sul; depois uma mensagem vinda do Norte, em época festiva e de vibrações positivas, expressando intenção de enviar uma delegação a um evento espor-tivo de alcance internacional; por fim, o local escolhido para ocorrerem as conversações – Panmunjom, onde foi assinado o armistício da Guerra da Coreia e que se tornou zona desmilitarizada. Entretanto todo o cuidado é pouco para compreender a situação em seu todo, interpretando gestos que podem ser ar-tificiais e carregados de distorções.

Certamente a questão mais substancial cor-responde à segurança internacional, e o primei-

D epois que Moon Jae-in, presidente sul--coreano desde maio de 2017, manifes-

tou intenção de dialogar com as autoridades norte-coreanas dirigidas por Kim Jong-un, e este respondeu por meio de uma mensagem de passagem de ano destacando o desejo de enviar uma delegação às Olimpíadas de In-verno de PyeongChang (Coreia do Sul), um novo capítulo na história das relações bilaterais entre os dois países teve início.

O dia 9 de janeiro de 2018 foi marcado por uma reunião entre as respectivas autoridades depois das tensões provocadas pelos exercí-cios nucleares ordenados por Kim Jong-un em resposta à ampliação das sanções pela ONU dirigidas ao país. Poderiam ser cheios de signi-

ro encontro resultou em compromisso mútuo de se levar adiante as conversações sobre a redução das tensões militares e do pronto res-tabelecimento da comunicação direta entre as forças armadas dos respectivos países – inter-rompida no início de 2016 – com o objetivo de evitar conflito acidental. Note-se que a Coreia do Norte historicamente participou das com-petições olímpicas, exceto nas Olimpíadas de Los Angeles (1984) e nas Olimpíadas de Seul (1988), por decisão unilateral [i]. No caso das Olimpíadas de Seul, depois do fracasso das negociações bilaterais sobre os termos e con-dições da estada da delegação norte-coreana durante os jogos, houve um ataque a bomba a uma aeronave da companhia aérea Korean Air, em 1987, causando a morte das 115 pes-soas que estavam a bordo [ii].

Os resultados contabilizados por ora são bastante significativos diante não só do dra-ma experimentado no contexto das Olimpía-das de Seul, em 1988, mas também da grave deterioração das relações bilaterais após um ano marcado por lançamento de mísseis, teste nuclear e ameaças de alvejar a Coreia do Sul. E muito dos tais resultados deve ser creditado na conta de Moon Jae-in, que realmente pa-rece disposto a fazer do evento esportivo uma oportunidade singular para desenhar um novo curso nas relações diplomáticas do país com os vizinhos, especialmente a Coreia do Norte, mas também com China e Japão.

Enquanto Kim Jong-un compete com Do-nald Trump, presidente dos Estados Unidos, com base nas regras do Chicken Game, [iii] Moon está disposto a manter o equilíbrio e tentar desescalar o conflito, um desafio inco-mensurável. No mesmo discurso de Ano Novo em que propôs o diálogo com a Coreia do Sul para discutir a participação de seu país nas Olimpíadas de PyeongChang, Kim Jong-un afirmou ter incrementado seu arsenal nucle-ar, adquirindo inclusive mísseis balísticos in-tercontinentais que poderiam ser lançados na direção dos Estados Unidos com um toque no “botão nuclear”. Na sequência, Donald Trump respondeu via rede social, especificamente no

Twitter: “Eu também tenho um Botão Nucle-ar, mas é muito maior e mais potente do que o dele, e meu Botão funciona” [iv].

Moon, filho de refugiados norte-coreanos, ex-líder estudantil, ativista contra a ditadura de Park Chung-hee e advogado em favor dos direitos humanos, especialmente das cláusulas trabalhistas, parece realmente compreender que a política de sanções e ameaças dos Estados Unidos fracassou. Entretanto, ele não pode e não deseja provocar as autoridades norte-ame-ricanas. Pelo contrário, no contexto dramático em que se encontra, ele está optando por livrar a cara de Donald Trump, ou seja, excluí-lo de uma situação difícil. Está tentando fazer que Trump se sinta parte da solução e não do pro-blema. A frase de Moon – “Eu acho que o pre-sidente Trump merece um grande crédito por promover as conversas intercoreanas.” – dita na esteira das provocações de Trump, acusando-o de “apaziguador”, [v] sugere isso. Certamente ele tem em conta que os Estados Unidos são o aliado militar mais importante da Coreia do Sul e em última instância têm que estar ali-nhados com o país sobre como responder às ameaças que Pyongyang representa.

Na outra ponta, ele investe substancialmente no diálogo com Kim Jong-un, que pode causar uma grande guerra na península. Ao dizer “O propósito disso [da reunião do dia 9] não deve ser uma conversa para o bem das conversas.”[vi], Moon demonstra que pretende reservar a Kim Jong-un papel central nas negociações. Ele indica que quer ser capaz de fazer que o ou-tro venha por sua própria vontade e para isso oferece-lhe uma vantagem, acenando com a possibilidade de conceder alívio financeiro em forma de ajuda humanitária, o que parece na-tural dadas as suas credenciais, ou seja, o seu senso de integridade moral, e não uma oferta humilhante para o vizinho.

Com isso Moon parece estar construindo “pontes douradas” para que os belicosos Do-nald Trump e Kim Jong-un possam recuar sem se sentirem constrangidos. No caso acima, a intenção realista não é exatamente conduzir à paz, mas sim administrar os conflitos.

TEXTO ENFOCA DESAFIOS DOS PRESIDENTES DAS COREIAS

As Olimpíadas de Inverno e a tensão na península coreana

Na foto da página anterior, Cerimônia da chama olímpica para os Jogos Olímpicos de inverno. A chama olímpica foi entregue aos organizadores dos Jogos Olímpicos de Inverno de PyeongChang (Coreia do Sul). A cerimônia foi realizada em Panathenaic Kallimarmaro Stadium.

UnespCIênCIA | mArçO 2018

NEuSA MARIA P. BOjIkIAN

mArçO 2018 | UnespCIênCIA

Neusa Maria P. Bojikian é doutora em Relações Internacionais pelo Programa de Pós--graduação San Tiago Dantas (Unesp, Unicamp e PUC-SP) e pesquisadora e pós-doutoranda do INCT-INEU com apoio Capes.

reFerênCIAs[i] Disponível em: <goo.gl/NrZ4zR>.

[ii] Disponível em: <goo.gl/6dERqi>.

[iii] Disponível em: <goo.gl/6ACW4s>.

[iv] Disponível em: <goo.gl/cCWhvn>.

[v] Disponível em: <goo.gl/mNLM7P>.

[vi] Disponível em: <goo.gl/p266B1>.

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