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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
PRÓ REITORIA DE ENSINO
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
CURSO DE PSICOLOGIA – BIGUAÇU
MURILO DOMINGUES DE AZEVEDO
ANOREXIA E BULIMIA NERVOSA:
Implicações para as relações afetivas e familiares
Biguaçu
2009
1
MURILO DOMINGUES DE AZEVEDO
ANOREXIA E BULIMIA NERVOSA:
Implicações para as relações afetivas e familiares
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Psicologia da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências da Saúde, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Psicologia. Orientadora: Professora Mestre Ilma Borges.
Biguaçu
2009
2
MURILO DOMINGUES DE AZEVEDO
ANOREXIA E BULIMIA NERVOSA:
Implicações para as relações afetivas e familiares
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi considerado aprovado, atendendo os requisitos
parciais para obter o título de Bacharel em Psicologia na Universidade do Vale do Itajaí no
Curso de Psicologia.
Biguaçu (SC), 24 de Novembro de 2009.
Profª Mestre Ilma Borges
Orientadora
Profª Mestre Ivânia Jann Luna
Membro
Profº Mestre Paulo César Nascimento
Membro
3
DEDICATÓRIA
Aos meus avôs, João Brasil de Azevedo
e Ciro Fontes Domingues.
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço, primeiramente e especialmente, aos meus pais, Hermes e Liliane, pelo
fulcro familiar e financeiro, fazendo com que nunca faltasse nada para o sucesso de minha
carreira acadêmica.
Às amigas de classe, Ana, Laís, Luisa e Monique, pelo companheirismo construído
durante a nossa jornada acadêmica.
À Francy, por dispor de seu tempo e me auxiliar na construção da apresentação da
presente pesquisa.
Ao amigo e, atualmente chefe, Matheus, pela compreensão para com os meus
estudos, sendo paciente e flexível com os meus horários de trabalho.
Agradeço também a todos os meus amigos que, de um modo direto ou indireto,
contribuíram para a construção desta pesquisa.
Aos professores Paulo Cesar Nascimento e Ivânia Jann Luna, por aceitar
generosamente o convite de participar da banca e, com isso, enriquecer meu trabalho.
Por fim, e não menos importante, à minha ilustre orientadora Profª Ilma Borges, pela
dedicação e comprometimento para comigo e com a presente pesquisa, onde não mediu
esforços, fazendo com que cada orientação abrisse novos caminhos e olhares para o
desenvolvimento deste trabalho.
5
A mensagem hoje carregada de grande poder de persuasão
pelos mais ubiquamente eficazes meios de comunicação cultural [...] é
uma mensagem de indeterminação e maleabilidade do mundo: neste
mundo, tudo pode acontecer e tudo pode ser feito, mas nada pode ser
feito de uma vez por todas [...].
Zygmunt Bauman (O Mal-Estar da Pós-Modernidade, 1998)
6
RESUMO AZEVEDO, Murilo Domingues de. Anorexia e bulimia nervosa: implicações para as relações afetivas e familiares. 2009. Trabalho de conclusão de curso (graduação em Psicologia) – Universidade do Vale do Itajaí, Biguaçu, 2009. A presente pesquisa discute a anorexia nervosa e a bulimia nervosa como transtornos alimentares e que, por natureza, estão acompanhados de várias complicações clínicas, relacionadas ao comprometimento do estado nutricional e às práticas compensatórias inadequadas para o controle do peso. Todavia, estão envolvidas nestes transtornos predisposições genéticas, vulnerabilidades biológicas, psicológicas e ainda fatores socioculturais, o que torna o diagnóstico, bem como o tratamento, complexo. O objetivo geral consistiu em analisar como as relações afetivas e familiares são afetadas pela anorexia e bulimia nervosa e quais as implicações que estes transtornos podem causar em tais contextos, sejam eles sociais ou psicológicos, pois o transtorno alimentar, entre os seus fatores de risco para a saúde, pode incidir sobre a estabilidade emocional, tanto do sujeito como os pares a sua volta. Já os objetivos específicos foram: estabelecer um levantamento histórico sobre a forma como a sociedade tem concebido as relações afetivas e familiares; investigar quais os fatores sociais que estão presentes na anorexia e bulimia nervosa e suas consequências nas relações afetivas e familiares, no contexto existencial abordado no filme “Por Amor a Nancy”; identificar quais os fatores psicológicos que estão presentes na anorexia e bulimia nervosa e suas conseqüências nas relações afetivas e familiares, no contexto do filme “Por Amor a Nancy”; caracterizar como o cotidiano existencial afetivo e familiar é afetado pela ação da anorexia e bulimia nervosa no filme “Por Amor a Nancy”. Trata-se de uma pesquisa exploratória de ordem qualitativa no âmbito da abordagem sócio-histórica em que, utilizou-se o filme “Por Amor a Nancy” para se compreender a dinâmica entre o adoecimento, os transtornos alimentares e as implicações destes para as relações afetivas e familiares. Foram transcritas narrativas do filme contendo diálogos e possíveis contrapontos com aspectos conceituais, entre eles: a função social da família, a adolescência e a contemporaneidade, o transtorno alimentar e as noções de sujeito e identidade. Concluiu-se através da análise do filme que o contexto familiar, o meio social representado pelas amizades, a escola/universidade e o estado emocional/psíquico, foram determinantes para o surgimento do transtorno alimentar na personagem principal. Palavras chave: transtorno alimentar; anorexia nervosa; bulimia nervosa; família; relações afetivas; adolescência.
7
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................8
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.....................................................................................11
2.1 ANOREXIA NERVOSA, BULIMIA NERVOSA E O CORPO – UM PARALELO CONCEITUAL.........................................................................................................................11
2.2 AS RELAÇÕES AMOROSAS E FAMILIARES AFETADAS PELO ADOECER.........18
3. METODOLOGIA DA PESQUISA ...................................................................................24
4. SÍNTESE DO FILME POR AMOR A NANCY ................................................................27
5. ANÁLISE FÍLMICA..........................................................................................................28
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................42
REFERÊNCIAS .....................................................................................................................44
8
1 INTRODUÇÃO
Esta é uma pesquisa de conclusão de curso que, em sua justificativa, teve como
finalidade buscar uma reflexão acerca dos transtornos alimentares, mais especificamente da
anorexia e bulimia nervosa. Foi abordado na presente pesquisa concomitante com os
transtornos, o contexto familiar, a adolescência, bem como os sentimentos e afetos implicados
nestes contextos. Na continuidade do trabalho, foi inserido o filme Por Amor a Nancy, de
forma que foi realizada uma análise para melhor compreensão dos transtornos alimentares e
suas constantes.
Falar sobre transtorno alimentar nos remete a um desconhecido e funesto transtorno.
E, nesse caso, tanto faz se é desconhecido por ser funesto ou vice e versa, o fato é que ele
corrompe pessoas (principalmente mulheres) e ruína famílias. A escolha por este tema não é
casual e, na verdade, deve-se a uma preocupação do pesquisador tendo em vista que o mesmo
teve a oportunidade em seus relacionamentos sociais de conviver com pessoas acometidas
pelo transtorno aqui proposto como estudo. Da convivência, surgiu o interesse de investigar
sobre os transtornos alimentares, uma vez que estes despertam novos sentimentos e novos
olhares para o mundo em que vivemos atualmente, sobretudo, a busca incessante pela
perfeição estética do corpo. A pretensão é que a pesquisa científica qualifique o pesquisador
enquanto futuro profissional da Psicologia para atuar com os transtornos alimentares numa
perspectiva sócio-cultural.
Como citado anteriormente, o transtorno alimentar de fato é pouco conhecido. E o é
por diversos fatores, que vão desde o desconhecimento ignorante ao desconhecimento velado,
sendo este último, o grande causador do primeiro. Sabe-se que, falar abertamente sobre esta
enfermidade é uma situação muito constrangedora tanto para a pessoa que sofre quanto para a
família, pois, a sociedade desinformada não está pronta para conviver com a significação e
sua representação cultural, por isso, trata os acometidos por anorexia nervosa e por bulimia
nervosa com muito preconceito. Dito isto, vemos a extrema importância de estudos nesta área
para ampliar o saber do público e, com isso, mudar sua compreensão sobre este transtorno e
suas conseqüências.
Por tratar-se de um transtorno considerado como Bio-psico-social, ou seja, com
predisposições genéticas, vulnerabilidades biológicas, psicológicas e fatores socioculturais,
tem importante relevância para o mundo acadêmico, sobretudo, para a Psicologia, já que
dentre os sintomas destacam-se a distorção da auto-imagem corporal, comprometimento do
9
estado nutricional, enfraquecimento de laços afetivos, ou seja, situações críticas e que em
casos mais sérios podem, inclusive, levar à morte. Enfim, todos os sintomas referentes e
ligados à área da Psicologia e que, portanto, entende-se que deva aprofundar o assunto
criando cada vez mais informações e transmitir conhecimentos acerca deste singular
transtorno.
A problemática da presente pesquisa entende que, na análise de Morgan, Vecchiatti e
Negrão (2002), que a etiologia dos transtornos alimentares é compreendida, principalmente, a
partir de uma visão sócio-cultural, o que neste caso, nos leva a um só e único caminho: uma
doença determinada por diversos fatores que interagem entre si. Interação essa que se dá de
modo complexo e não só na sua produção, mas também na perpetuação da enfermidade.
Dentre os diversos possíveis focos sobre os transtornos alimentares, o abordado na
presente pesquisa dará ênfase às relações afetivas e familiares, pois o transtorno alimentar,
entre os seus fatores de risco para a saúde, pode incidir sobre a estabilidade emocional, tanto
do sujeito como os pares a sua volta. Nesta perspectiva, os mais próximos, ou seja, a família,
o (a) namorado (a) ou o (a) esposo (a), são os mais afetados, uma vez que, são esses que
convivem cotidianamente e afetivamente com aquele que apresenta o transtorno.
Lane e Camargo (1995), no capítulo “Contribuição de Vygotsky para o Estudo das
Emoções” do livro “Novas Veredas da Psicologia Social”, afirmam que, várias pesquisas
apontaram para a importância das emoções como mediação entre as categorias que constituem
o psiquismo humano, sendo a afetividade, uma das categorias essenciais para esta
constituição. Essencial, também é a condição sócio-histórica na constituição desse psiquismo,
que segundo Rey (2000), se objetiva nas ações que executamos em conjunto com as demais
pessoas com as quais interagimos e sobrevivemos desde o nascimento.
As emoções (sentimentos ou afetividade) possuem uma função de significação do
real, que aparece sobre a base das necessidades dos sujeitos que acompanham suas ações e as
contradições entre essas necessidades e as novas que surjam no curso de suas ações (REY,
2000). Ainda nessa perspectiva, Sartre (1987, p. 29 apud REY, 2000, p. 37) afirma que “a
emoção significa à sua maneira o todo da consciência [...], possui a sua essência, suas
estruturas particulares, suas leis de manifestação, sua significação”.
Levando-se o acima em consideração, considera-se que as relações afetivas e
familiares são afetadas pela anorexia e bulimia nervosa, sendo tal afirmação a pergunta de
pesquisa ora discutida.
Como objetivo geral, buscou-se analisar como as relações afetivas e familiares são
afetadas pela anorexia e bulimia nervosa e quais as implicações que estes transtornos podem
10
causar em tais contextos. Já os objetivos específicos foram: estabelecer um levantamento
histórico sobre a forma como a sociedade tem concebido as relações afetivas e familiares;
investigar quais os fatores sociais que estão presentes na Anorexia e Bulimia Nervosa e suas
consequências nas relações afetivas e familiares, no contexto existencial abordado no filme
“Por Amor a Nancy”; identificar quais os fatores psicológicos que estão presentes na
Anorexia e Bulimia Nervosa e suas conseqüências nas relações afetivas e familiares, no
contexto existencial abordado no filme “Por Amor a Nancy”; caracterizar como o cotidiano
existencial, afetivo e familiar é afetado pela ação da Anorexia e Bulimia Nervosa no filme
“Por Amor a Nancy”.
11
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 ANOREXIA NERVOSA, BULIMIA NERVOSA E O CORPO – UM PARALELO
CONCEITUAL
“Nunca se falou tanto do corpo como hoje, nunca se falará tanto dele amanhã” (Codo & Senne, 1985)1.
No tocante a transtornos alimentares, de acordo com a visão sócio-cultural
pretendida no presente trabalho, Saccol, Grisotti e Trindade (2008, p. 3) afirmam que “a
cultura pode ser considerada como um mapa que orienta o comportamento dos indivíduos em
sua vida social, e viver em sociedade, é viver sob a dominação dessa lógica, se comportando
segundo suas exigências, mesmo não tendo consciência disso”. Nesse sentido, compreende-se
que a constante busca do corpo perfeito e da imagem de beleza assume, na sociedade
contemporânea, uma lei de veneração ao corpo.
Para Neto (1996 apud SANTOS, 2008, p. 1) “o corpo é a base da percepção e
organização da vida humana nos sentidos biológico, antropológico, psicológico e social”, já
para Santos (2008, p. 1), “o corpo é socialmente construído, ou seja, um fenômeno cultural, o
que nos leva a compreendê-lo como um dado cultural e interpretá-lo de acordo com cada
cultura”. Vygotsky (1997, p. 106 apud PINO, 2000, p. 54) vem concluir e definir cultura
como “um produto, ao mesmo tempo, da vida social e da atividade social do homem”. Sendo
assim, conclui-se que o corpo não expressa uma individualidade, mas a forma como a própria
sociedade o cria, o reconhece e o utiliza (IDA e SILVA, 2007, p. 423).
Para Michel Foucault (1981 apud RODRIGUES, 2003), o corpo é sempre uma
interpretação que depende de um olhar, que pode ter diferentes valores dependendo de quem o
olha e do lugar de onde é olhado. Ou seja, o corpo não tem valor em si mesmo, mas sim, um
valor dependente do lugar em que se encontra. Conforme conclui Rodrigues (2003, p. 122),
1 Citado no artigo: “Corpo: o retrato da cultura: a preocupação com a estética na sociedade contemporânea” (Érica Fernandes dos Santos, 2008).
12
Não possuímos uma visão “pura” do nosso próprio corpo, mas somente uma “interpretação” acerca dele, bem como dos outros corpos. Esta interpretação não é resultado de uma razão ou vontade independente e individual, mas de uma “estrutura” complexa de relações mútuas entre as pessoas e as instituições. Esta estrutura é formada por uma malha de micro-poderes2, que atravessam nossos corpos, fazendo com que tenhamos determinados desejos, sentimentos e dores.
Atualmente, o corpo vem produzindo uma forma de relação com o mundo no qual,
preconceitos relativos à beleza, concomitante com a preocupação excessiva com a aparência e
com a saúde, predominam na cultura. Meurer e Gesser (2008 apud THOMPSON, 1995)
consideram a mídia caso central na disseminação das representações sobre a imagem do
sujeito, manipulando escolhas e comportamentos, inclusive, nas formas de pensar, sentir e
agir no mundo. O padrão de beleza fortemente veiculado na mídia e, por conseguinte, no
convívio social, parece exercer um efeito expressivo no que se refere ao corpo magro e
esbelto, que é equivocadamente compreendido como saudável e, veemente valorizado e
desejado, acabando por se transformar em um símbolo de felicidade e fundamental para o
sujeito ser admitido socialmente (MEURER e GESSER, 2008; VASCONCELOS, SUDO e
SUDO, 2004). Todavia, essa infundada realidade criada e veiculada fortemente na mídia, qual
seja, conforme observa Del Priore (2000), o estereótipo do esbelto, elegante, fino, raro, enfim,
faz com que mulheres com seus corpos ‘naturais’ percam prestígio e tendem ao afastamento
do convívio social.
Gonzaga e Weinberg (2005) em seu artigo “Transtornos Alimentares: uma questão
cultural?” citando autores que discutem o tema, fazem um paralelo entre riqueza e Transtorno
Alimentar, de forma que, frequentemente, estudos mencionam uma incidência, quase que
exclusiva, de distúrbios alimentares em classes sociais mais altas. Alguns pesquisadores
chegam a excluir o transtorno alimentar do terceiro mundo3 fazendo uma correlação entre
transtorno alimentar e abundância, ou seja, uma pessoa só poderia se sujeitar a um rigoroso
jejum quando o alimento for abundante.
Com as afirmações acima, objetivou-se determinar o quão importante é o impacto
que as demandas sociais e a mídia exercem sobre o indivíduo, criando um arranjo psíquico
favorável ao surgimento de doenças e transtornos, como por exemplo, os transtornos
alimentares. Helman (1994, p. 236 apud MUNSON, 1998, p. 31) completa: doenças ligadas à
cultura “só podem ser compreendidas se observarmos o contexto em que aparecem. Em
2 Foucault (1979, p. XII) considera que o poder não é algo que se possui, mas algo exercido pelas pessoas em suas relações cotidianas, em níveis variados e em pontos diferentes da rede social, portanto, exercido na forma de micro-poder (ou sub-poder). 3 Terceiro mundo enquanto nivelados por sua economia, ou seja, países economicamente pobres e com escassez de alimento.
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alguns casos, esse contexto pode incluir, em grande parte, os aspectos políticos, econômicos e
sociais da sociedade [...]”.
Todavia, não se pode negligenciar a necessidade de se compreender os transtornos
alimentares também por uma leitura médica. É uma perspectiva que pode contribuir para se
ter um contraponto com os argumentos de ordem social, cultural, política, entre outros.
Sendo assim, é preciso considerar que embora tenha crescido consideravelmente o
número de estudos relacionados a transtornos alimentares nas últimas três décadas, esta
enfermidade tem seu lado obscuro no que se refere a sua etiopatogenia4. E é justamente pelo
desconhecimento preciso da sua origem e forma de desenvolvimento, que estas síndromes
comportamentais são descritas como “transtornos”, e não “doenças” (BORGES e
CLAUDINO, 2002). Segundo Assumpção e Cabral (2002), “os transtornos alimentares são
acompanhados de várias complicações clínicas relacionadas ao comprometimento do estado
nutricional e às práticas compensatórias inadequadas para o controle do peso”, onde a
morbidade e a mortalidade associadas aos referidos transtornos são significativas.
Atualmente, os transtornos alimentares amplamente divulgados são: Anorexia
Nervosa, Bulimia Nervosa, Vigorexia5, Ortorexia6, Transtorno de Compulsão Alimentar
Periódica7. No presente trabalho, dar-se-á ênfase aos dois primeiros transtornos citados
acima, já que são as mais recorrentes e, quiçá, as mais cruéis. Vale ressaltar também que são
os únicos transtornos alimentares a ser referido nos atuais manuais psiquiátricos
classificatórios de transtornos mentais: o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos
Mentais, em sua quarta edição (DSM-IV), e a Classificação Internacional de Doenças (CID-
10).
Nos últimos anos a anorexia nervosa tem sido escopo de preocupações e polêmicas
no mundo todo. Isso não quer dizer que a bulimia nervosa seja menos importante, mas
tamanha preocupação talvez se deva ao fato de a anorexia nervosa surpreender por levar à
4 Etiopatogenia – “Estudo das causas das lesões ou doenças” (Dicionário de Termos Técnicos de Medicina e Saúde, 2003, p. 349). 5 A Vigorexia é caracterizada, assim como a anorexia nervosa, pela distorção da imagem corporal. Indivíduos acometidos pela doença se preocupam de maneira anormal com sua massa muscular, enquanto que apresentariam musculatura desenvolvida em níveis acima da média da população masculina (Disponível em http://pepsic.bvs-psi.org.br/pdf/rbpe/v2n1/v1n2a03.pdf). 6 Indivíduos acometidos por esse transtorno têm preocupação excessiva com a pureza dos alimentos consumidos (Idem nota 5). 7 Transtorno semelhante à bulimia nervosa. Porém, pessoas acometidas por Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica não apelam a mecanismos de compensação extremos como tentativa de controlar o peso, como acontece na bulimia. A base do diagnóstico envolve duas características principais: o excesso alimentar e a perda de controle (CLAUDINO e BORGES, 2002).
14
caquexia8, de forma que o corpo anoréxico, comumente, fica em estado cadavérico. Munson
(1998, p. 22) também considera que tal destaque se deu a partir da morte de personalidades
importantes como Karen Carpenter, da famosa dupla norte americana “The Carpenters”, por
complicações de anorexia nervosa, e Diana, a “Princesa de Gales”, que declarou sofrer de
bulimia nervosa desde a adolescência.
Etimologicamente, o termo “anorexia” deriva do grego “anorexis”, onde “an”
significa deficiência ou ausência de, e “orexis”, apetite. Todavia, não se trata absolutamente
de uma ausência de apetite, mas sim, de uma recusa consciente e deliberada do indivíduo em
alimentar-se com o intuito de emagrecer ou por medo de engordar (GIORDANI, 2006). Os
relatos iniciais de um sofrimento auto-imposto por meio da limitação alimentar datam do
século XIII e, durante esse período, as práticas de jejum foram compreendidas como estados
de possessão demoníaca ou milagres divinos, de forma que, neste último, tal prática estava
relacionada a um comportamento religioso de privação. Weinberg, Cordás e Munoz (2005, p.
51) analisando as santas e beatas da idade média afirmam que, com seus jejuns auto-impostos,
perseguiam um ideal de ascese9 e de comunhão com Deus e não de beleza. O jejum auto-
imposto podia também trazer certas vantagens, como os que Liles e Woods (1999 apud
WEINBERG, CORDÁS e MUNOZ, 2005, p. 52) relatam:
Uma mulher podia usar o desjejum religioso para negligenciar seus deveres e/ou exercer controle sobre outros, barganhar por abstinência sexual com seu marido, rejeitar um casamento indesejado ou rogar por membros da família. Santas jejuadoras podiam até passar por cima da autoridade dos homens da Igreja com suas práticas religiosas austeras, criticar o poder secular ou as autoridades religiosas e assumir o papel de professoras, conselheiras ou reformadoras das regras da Igreja em seu benefício.
Neste contexto, relatam Weinberg, Cordás e Munoz (2005), entre as santas com
suposto transtorno alimentar estariam Santa Liduina, que durante anos alimentou-se somente
de um pedaço de maçã por dia, Santa Wilgefortis, que rejeitava os alimentos oferecidos, fazia
jejuns e vomitava o que era obrigada a ingerir, deixando-se praticamente morrer de fome,
Santa Colomba de Rieti, que morreu por desnutrição severa auto-imposta, Santa Verônica,
que não ingeria alimento algum e, somente às sextas-feiras, mastigava cinco sementes de
8 Caquexia – “Estado de desnutrição profunda e progressiva, determinado por causas diversas [...]” (Dicionário de Termos Técnicos de Medicina e Saúde, 2003, p.136). 9 Ascese – “Na Filosofia Grega, conjunto de práticas e disciplinas caracterizadas pela austeridade e autocontrole do corpo e do espírito, que acompanham e fortalecem a especulação teórica em busca da verdade; No Cristianismo e, em todas as grandes religiões, conjunto de práticas austeras, comportamentos disciplinados e evitações morais prescritos aos fiéis, tendo em vista a realização de desígnios divinos e leis sagradas” (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2001, p. 313).
15
laranja (em nome das cinco feridas de Jesus), Santa Catarina de Siena, ascética10 rígida, só
ingeria um molho feito a base de ervas e, quando alimentada a força, recorria aos vômitos,
Santa Maria Madalena de Pazzi que, dizendo-se orientada por Deus, se limitou a uma dieta a
base de pão e água e, só aos domingos, comia apenas alguns restos de comida deixados na
refeição pelas outras irmãs e, Santa Rosa de Lima, primeira santa latino-americana a ser
canonizada (1671), aos 15 anos fez a promessa de não comer mais carne e passar a vida toda a
pão e água. Depois de ler sobre a vida de Santa Catarina de Siena, Rosa de Lima tomou-a
fielmente por modelo, começou a jejuar três vezes por semana e, posteriormente, permanecia
dias seguidos sem provar qualquer alimento, afora um pouco de mel adicionado a ervas
amargas. Entre outras santas citadas na literatura, possivelmente com transtornos alimentares,
estariam Santa Catarina de Gênova e Santa Clara de Assis (WEINBERG, CORDÁS e
MUNOZ, 2005; WEINBERG e CORDÁS, 2002).
Cordás e Claudino (2002) em seu artigo “Transtornos Alimentares: fundamentos
históricos” confirmam que é a partir de 1873, com o médico inglês William Gull, que a
denominação “anorexia nervosa” é especificada, referindo-se a ela como uma “forma peculiar
de doença que afeta principalmente mulheres jovens e caracteriza-se por emagrecimento
extremo [...]” cuja “falta de apetite é [...] decorrente de um estado mental mórbido e não a
qualquer disfunção gástrica [...]”. Ressalta-se que, embora sem maiores priorizações em sua
descrição, além de se voltar para achados clínicos decorrentes da inanição prolongada, tais
como caquexia, amenorréia, perda de apetite, enfim, Gull, como argumenta Cordás e
Claudino (2002), aponta também o componente psicológico e é um dos primeiros a relatar um
caso de anorexia nervosa em um paciente masculino (MELIN e ARAÚJO, 2002).
Coincidentemente no mesmo ano e quase que simultâneo, um psiquiatra francês, de
sobrenome Lasègue, publica o artigo “Del’anorexie hystérique”, onde insiste na causa
psiquiátrica da doença e ressalta uma possível origem psíquica do transtorno e a contribuição
familiar para a manutenção dos sintomas. O psiquiatra francês é o responsável pelo avanço no
conhecimento no que se refere às distorções da imagem corporal1112, bem como a negação da
gravidade do estado anoréxico em que se apresenta o indivíduo (CORDÁS e CLAUDINO,
2002; GIORDANI, 2006). Segundo Giordani (2006, p. 81 apud BIDAUD, 1998), Lasègue 10 Ascético – “Que ou aquele que se volta para a vida espiritual, mística; místico, contemplativo; que ou aquele que é sisudo, austero, incorruptível” (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2001, p. 313). 11 Para Saikali, Soubhia, Scalfaro e Cordás (2004, p. 164 apud SCHILDER, 1994), “a imagem corporal é a figura de nosso próprio corpo que formamos em nossa mente, ou seja, o modo pelo qual o corpo se nos apresenta”. 12 Nancy Scheper-Hughes e Margaret Lock (1990, p. 59 apud MUNSON, 1998, p. 16) se referem à imagem corporal como “representações coletivas e idiossincráticas que um indivíduo faz do seu corpo em relação ao meio, incluindo percepções externas, memórias, efeitos, cognições e ações”.
16
observou que “há uma condescendência verdadeiramente patológica da anoréxica com relação
ao seu estado cadavérico, pois a anoréxica não deseja a cura, como também se regozija nas
restrições que sua conduta lhe impõe”.
Para Giordani (2006) na medida em que o sujeito anoréxico perde peso, aumenta
ainda mais o seu medo de tornar-se “gordo” novamente, ou seja, o incessante medo de
engordar não é aliviado pelo emagrecimento. O seu projeto continua sendo emagrecer,
eximir-se de qualquer gordura mesmo conhecendo os riscos, que desconsidera
completamente. Por fim, Cecil Helman, em seu livro Cultura, Saúde e Doença (1994),
observa que a anorexia nervosa é “uma forma patológica extrema de insatisfação com a
imagem corporal, numa sociedade que valoriza e recompensa a esbelteza feminina e, portanto,
só pode ser compreendida dentro do contexto de certos valores culturais” (HELMAN, 1994,
p. 32).
Na continuidade deste paralelo conceitual tem-se a bulimia nervosa. Sendo assim,
esta se apresenta como o segundo transtorno a ser devidamente conceituado.
O termo bulimia nervosa foi designado por Gerald Russell, em 1979, quando este fez
a união dos termos gregos boul (boi) ou bou (grande quantidade) com lemos (fome),
designando uma fome tão grande que seria possível a um homem devorar um boi. Já antes de
Cristo, Hipócrates empregava o termo “boulimos” para designar uma fome mórbida, diferente
da fome fisiológica (CORDÁS, 2004, p. 155).
Segundo Cordás e Claudino (2002), o crescimento do conhecimento sobre bulimia
nervosa, tem-se ampliado com o aumento de grupos de pesquisa na área de transtornos
alimentares e, este aumento, deve-se ao fato da importância clínica e epidemiológica que a
bulimia nervosa vem demonstrando atualmente, chegando a superar em número de
publicações o interesse clínico e científico pela anorexia nervosa.
Cordás e Claudino (2002) compreendem que, em sua forma típica, bulimia nervosa
caracteriza-se pela ingestão compulsiva e impetuosa de grande quantidade de alimento, com
pouco ou nenhum prazer, seguida de comportamentos e métodos compensatórios inadequados
para evitar o ganho de peso, isso tudo combinado com o medo mórbido de engordar. Dentre
os métodos, estão os purgativos, ou seja, vômitos auto-induzidos e uso de medicamentos
(diuréticos, inibidores de apetite, laxantes, entre outros) e os não purgativos, isto é, períodos
de restrição alimentar severa, jejuns, exercícios físicos, etc. Isto visando não apenas saciar
uma possível fome exagerada, a bulimia atende a uma série de estados emocionais ou
situações estressantes (CLAUDINO e BORGES, 2002, p. 9).
17
Para efeito de registro, é interessante lembrar que o vômito auto-induzido, além de
ser extremamente comum, sendo encontrado em 95% dos pacientes com bulimia, é um
comportamento muito antigo, encontrado na história de diferentes povos da antiguidade. Os
egípcios, segundo Heródoto, na crença de que todas as doenças dos homens são oriundas da
comida, vomitavam e usavam purgativos por três dias consecutivos todo mês. Já na medicina
grega, com Hipócrates, como um método para precaver diferentes doenças, este recomendava
a indução de vômitos por dois dias consecutivos, todo mês. Os romanos com seus fartos
banquetes criaram o vomitorium, o que lhes permitia comer em excesso e vomitar em local
reservado. E na idade média, por muitos anos, os purgantes e os eméticos13, dominaram o rol
terapêutico (CORDÁS e CLAUDINO, 2002, p. 5).
Conforme Romaro e Itokazu (2002, p. 407 apud BEHAR, 1994), o sujeito que
desenvolve bulimia nervosa, em geral,
Valoriza muito a forma do corpo e o peso, possuindo uma percepção física distorcida e dificuldade em identificar as emoções. Apresenta uma baixa auto-estima, um nível elevado de ansiedade, um baixo limiar à frustração e um prejuízo no controle dos impulsos. Em sua insegurança, elege padrões de beleza muito altos, praticamente inatingíveis, na tentativa de corresponder à tendência da sociedade em eleger a magreza como símbolo de sucesso e beleza. Ao perceber que não atingiu suas metas, sente-se deprimida, fracassada e retorna à compulsão, com conseqüente culpa e depressão.
As autoras supracitadas ressaltam também que bulímicos sentem vergonha do seu
transtorno e, por isso, primeiramente negam e, depois, ocultam, dissimulam os sintomas. A
bulimia acaba passando, muitas vezes, despercebida em meio às diversas estratégias que os
enfermos adotam para acobertar seus atos controladores do corpo e, também, por estes não se
verem ou mesmo se imaginarem doentes (MUNSON, 1998). Os acometidos por bulimia
nervosa podem ainda, apresentar propensão ao perfeccionismo, dificuldade em assumir
compromissos e responsabilidades e, tornando-se realidade, a perda de peso mínima, ou
ausente, caracteriza-se como os piores medos dos pacientes acometidos pela bulimia nervosa
(ROMARO e ITOKAZU, 2002, p. 408).
13 Emético – “Relacionado com ou produzindo vômito; Substância ou medicamento que provoca o vômito” (Dicionário de Termos Técnicos de Medicina e Saúde, 2003, p. 296).
18
2.2 AS RELAÇÕES AFETIVAS E FAMILIARES AFETADAS PELO ADOECER
“É absurdo querer viver sem paixões. Elas são naturais e o sábio apenas pretende saber como viver com elas, o que fazer com elas e não contra elas” (Espinosa, Filósofo Holandês, 1632-1677)14.
Atualmente, para Sawaia (2004), há uma vasta diversidade no uso dos conceitos de
emoção, sentimento e afetividade sendo, por vezes, consideradas como sinônimos. Ressalta-se
que, conforme Molon (1999), estas se encontram na dimensão da subjetividade. Abaixo,
tentar-se-á conceituar emoção, sentimento e afetividade separadamente, fazendo ao final, uma
correlação com o tema transtorno alimentar, mais especificamente, anorexia e bulimia
nervosa.
A emoção é o afeto que surge na relação imediata e é breve, “centrada em objetos ou
imagens que interrompem o fluxo normal da conduta de alguém, provocando modificações
corpóreas e comportamentais, facilmente constatáveis” (SAWAIA, 2004, p. 15). Para Lane e
Camargo (1995 apud Vygotsky, 1990), a emoção só poderia ser estudada através das relações
que estabelece com as outras funções psíquicas (sentimento, memória, percepção,
imaginação, entre outras) formando um conjunto dinâmico de organismo em atividade, em
desenvolvimento e transformação. As emoções, conclui Rey (2000, p. 44), possuem uma
função de significação do real, “que aparece em seus próprios termos, sobre a base das
necessidades dos sujeitos que acompanham suas ações e das contradições entre essas
necessidades e as novas necessidades que surgem no curso de suas ações”.
Por sua vez, “sentimento é a emoção sem prazo e com longa duração, que não se
refere a coisas (objetos ou idéias) específicas. É o tom emocional que caracteriza a forma
como me coloco no mundo” (SAWAIA, 2004, p. 15). Segundo Lane (1994, p. 58) “os
sentimentos significam que uma pessoa está implicada com algo ou alguém e este fato pode se
constituir desde emoções até os sentimentos mais complexos que caracterizam a própria
personalidade do indivíduo”. Greenberg, Rice e Elliot (1996 apud REY, 2000, p. 44)
ressaltam que os sentimentos são “o lugar de encontro entre a mente, o corpo, o meio, a
cultura e a conduta”.
14 Citado no artigo: “A emoção como locus de produção do conhecimento – Uma reflexão inspirada em Vygotsky e no seu diálogo com Espinosa” (Bader Burihan Sawaia, 2004).
19
Afetividade é o nome outorgado à capacidade humana de “elevar seus instintos à
altura da consciência por meio dos significados, de mediar à afecção15 pelos signos16 sociais
aumentando ou diminuindo nossa potencia de ação”, portanto, “o afeto é algo que a afecção
envolve, é a transição vivida do estado precedente ao atual e do atual ao seguinte” (SAWAIA,
2004, p. 14-15). Para Espinosa (apud SAWAIA, 2004, p. 13) “afetos são afecções
instantâneas de uma imagem de coisas em mim nas relações que estabeleço com outros
corpos”, ou seja, “o afeto é assim um núcleo constituinte do Self, estabelecendo vínculos entre
o Self e o ambiente e organizando a experiência” (GREENBERG, RICE e ELLIOT, 1996
apud REY, 2000, p. 43). A afetividade, onde aqui se inclui a emoção e o sentimento,
É um universo particular de estudo e de ação social transformadora que supera a cisão universal/particular e mente e corpo. Ela é a dimensão particular de uma ação política: encontrar um meio de entrar no que há de mais singular da vida social e coletiva, em sua singularidade, para promover a transformação social (SAWAIA, 2004, p. 22).
Segundo Galano (1995) são os afetos e as emoções que estabelecem e reforçam os
núcleos de significados das ações e das relações, pontuando no interjogo grupal uniões,
adversidades, lealdades, desconfianças. A organização grupal está imbuída de toda uma
produção afetivo-emocional que guia o clima das relações entre os membros, assim como
também entre os membros e a tarefa a ser cumprida (GALANO, 1995). Para Rey (2000, p.
44), é o caráter plurideterminado das emoções e dos sentimentos que leva a identificar esses
processos como constituintes na subjetividade humana e, portanto, aparece independente de
qualquer avaliação voltada para lhes dar sentido.
Para Molon (1999), subjetividade significa uma constante constituição do sujeito17
através do reconhecimento do outro e do eu, de forma que, subjetividade e sujeito “são
compreendidos na realidade social e na vida social”, ou seja, “só existem como objetos
psicológicos quando apanhados na sua natureza social” (MOLON, 1999, p. 142). Molon
(1999, p. 143-144) observa também que,
15 A Afecção é um processo instantâneo que, de acordo com Sawaia (2004, p. 14), “é o efeito imediato de uma imagem de coisa sobre mim, o momento presente da percepção e envolve um passo ou uma transição vivida do estado precedente ao atual”. 16 Vygotsky compreende Signo como uma expressão cultural criadora de relações indiretas e mediadas para com o organismo em relação ao meio. De modo que são criados pelo homem, os signos “se interpõem entre o sujeito e o objeto da sua ação; mas, diferentemente deles, agem não sobre as coisas, mas sobre as pessoas, sobre os outros e sobre si mesmos” (PINO, 2000, p. 57) 17 Conforme Petraglia (1995, p. 58), “sujeito é o ‘eu’ que se coloca no centro do mundo, ocupando seu próprio espaço. Sua concepção é complexa, por isto o ‘eu’ precisa da relação com o ‘tu’ e ambos pertencem ao mundo”.
20
A subjetividade manifesta-se, revela-se, converte-se, materializa-se e objetiva-se no sujeito. Ela é processo que não se cristaliza, não se torna condição nem estado estático e nem existe como algo em si, abstrato e imutável. É permanentemente constituinte e constituída. Está na interface do psicológico e das relações sociais.
De acordo com Lane (2000), a condição sócio-histórica assume caráter essencial na
constituição da subjetividade humana, a qual se objetiva nas ações realizadas em conjunto
com as pessoas com as quais convivemos desde o nosso nascimento e ao longo da vida. Vê-
se, portanto que, “os modos de determinação social e histórico conformam a constituição do
sujeito e da subjetividade, os quais se transformam juntamente com as transformações
sociais” (MOLON, 1999, p. 142).
De forma que “pode-se considerar o mundo como o lugar de constituição de
subjetividade, um mundo físico, biológico e, também, imaginário, simbólico e social”
(MOLON, 1999, p. 145), no que se refere à subjetividade moderna, conforme Féres-Carneiro
e Magalhães (2003), esta deriva de um lento processo de interioração do indivíduo, no qual a
autonomia, a singularidade e a intimidade constituem valores centrais. O “eu” moderno volta-
se para o interno, de forma que, considerando seu projeto auto-reflexivo, a valorização da
busca da auto-identidade associada ao campo das relações íntimas, “tende-se a atribuir ao
parceiro à função de confirmação e manutenção da identidade do outro, transformando-o em
instrumento de legitimação do ‘eu’” (FÉRES-CARNEIRO e MAGALHÃES, 2003, p. 9).
Giddens (1993) ao analisar as transformações da intimidade na modernidade, destaca
a função da relação amorosa na busca de identidade do sujeito, onde, a busca do parceiro ideal
é justamente a busca da auto-identidade que é validada na descoberta do outro. De forma que
a intimidade trata da proximidade-limite entre o eu e o outro, este sentimento passa a ser alvo
de atenções na medida em que favorece o surgimento do clima emocional adequado para a
junção das individualidades dos parceiros, fundando, assim, o campo da conjugalidade.
(FÉRES-CARNEIRO e MAGALHÃES, 2003).
Sendo a conjugalidade o início de um laço familiar, Petrini, Alcântara e Moreira [ ]
exaltam o tema “família” como um desafio às investigações das Ciências Humanas, onde
segundo os autores, tal questão, ao longo dos tempos, está entre as que mais têm causado
polêmica. Porém, não deixam de evidenciar “o papel central da família em processos
humanos, como a formação dos vínculos afetivos com os pais (filiação), com os irmãos
(fraternidade), avós e tios, cônjuges, etc.”, os quais possuem extrema importância para o
desenvolvimento da personalidade (PETRINI, ALCÂNTARA e MOREIRA, [ ], p. 1). Na
análise de Sales e Vasconcelos [ ], no decorrer dos anos a família veio enfrentando um
21
processo de grandes transformações, onde fatores econômicos, sociais e culturais,
contribuíram de forma decisiva para as alterações na estrutura familiar. Logo, de modo que a
família participa dos dinamismos das relações sociais, esta pode padecer perante as
influências do contexto econômico, político e cultural no qual está inserida (PETRINI,
ALCÂNTARA e MOREIRA, [ ]).
A família, segundo Rey (2004), é o grupo social na qual o indivíduo mais expressa
sua intimidade, posto que, como grupo, esta dispõe de uma grande liberdade para definir suas
próprias normas, estilo de vida, etc. No tocante ao tema “família contemporânea”, conforme
Petrini, Alcântara e Moreira ([ ], p. 1), esta passa por diversas mudanças, especialmente nas
relações intergeracionais e de intimidade, “caracterizadas pela maior expressão dos afetos e
busca de autonomia dos seus membros, a embasar a construção subjetiva individual”. Sales e
Vasconcelos [ ] afirmam que ela é inovadora, democrática e igualitária.
A família conjugal que tem como centro o casal, tal qual conhecemos hoje, é um
fenômeno da modernidade e, segundo Féres-Carneiro e Magalhães (2003), é considerada
locus de afetividade. Conforme completam as autoras supracitadas
Isto se coloca em virtude da sua nuclearização e da sobrecarga de exigências e expectativas que, anteriormente, são imputadas ao Estado ou à comunidade de maneira geral. A família tem seu papel hipertrofiado em termos de sociabilidade, enquanto a comunidade restringe-se. Cabe à família conjugal preencher um vazio e responder às necessidades afetivas e sociais dos indivíduos (FÉRES-CARNEIRO e MAGALHÃES, 2003, p. 3).
Na Europa pré-moderna, a maior parte dos casamentos não era assumida sobre a
atração sexual recíproca senão pela situação econômica. Entre os pobres da época, por
exemplo, o casamento era um meio de ordenar o trabalho no campo, de forma que era
improvável que uma vida caracterizada de áspero trabalho conduzisse à paixão sexual. Entre
os camponeses da França e da Alemanha do século XVII, qualquer forma de afeição era rara
entre os casais casados (GIDDENS, 1993).
Diante do exposto acima, pode-se questionar as implicações nas relações afetivas e
familiares quando afetadas pelo adoecimento de um de seus membros e quais as repercussões
se tem neste contexto existencial. Segundo Lisboa (2006, p. 31), “adoecer implica a ausência
de saúde, ou ainda a falta de condições para o enfretamento de manifestações contrárias ao
organismo”, onde, “esta concepção demanda uma mudança na relação do sujeito com o
cotidiano”. Já Sawaia (1995, p. 162), condensa o adoecer como “a diminuição da potência de
agir numa concepção”.
22
Sawaia (1995), no capítulo Dimensão ético-afetiva do adoecer da classe
trabalhadora, do livro Novas Veredas da Psicologia Social, discorre sobre 2 conceitos
considerados, neste caso, importantes para a condução desta pesquisa. Tais conceitos são:
tempo de morrer e tempo de viver. De acordo com Sawaia (1995, p. 159), o “tempo de
morrer” é caracterizado pela ausência de “recursos emocionais, de força para agir e pensar e
pelo desânimo em relação à própria competência. É um auto-abandono aos próprios recursos
internos, e a consciência de que nada se pode fazer para melhorar seu estado”. No “tempo de
morrer”, completa a autora supracitada, “o sofrimento é a vivência depressiva que condensa
os sentimentos de indignidade, inutilidade e desqualificação” (SAWAIA, 1995, p. 159).
Em contrapartida, “tempo de viver”, conforme Sawaia (1995, p. 159), “é o tempo de
agir com mais coragem e audácia, é tempo em que se despertam as emoções, quer sejam elas
positivas ou negativas”. Conforme completa Sawaia (1995), “tempo de viver” não é o mesmo
que viver bem,
Ele é um tempo de convite à vida, mesmo sendo uma vida sofrida. E o momento da transformação das relações objetivas que aprisionam as emoções, a aprendizagem, a humanidade e a sensação de impotência se transformam em energia a força para lutar. Tempo de viver não é o tempo do desaparecimento da angústia, aliás, nunca se chega a isto. Trata-se de tornar possível a luta contra ela, para resolvê-la, ir em direção a outra angústia (SAWAIA, 1995, p. 159 apud DEJOURS, 1986).
Neste sentido conclui-se que, a partir do momento em que o sujeito é compreendido
como pertencente ao mundo e que se constitui a partir das relações que estabelece com os
outros e consigo mesmo, tem-se que toda doença acarretará em mudanças nestas relações,
sendo que, conforme Lisboa (2006), uma doença nunca será a mesma para os sujeitos, pois,
ela é única em sua manifestação e provoca reações singulares em cada paciente. Sawaia
(1995), não obstante, salienta que é imensamente importante colocar a idéia de humanidade
no que se refere ao adoecer. Além disso, deve-se considerar
O indivíduo e a maneira pela qual ele se relaciona consigo mesmo e com o mundo social a que pertence (grupos, família, comunidade, sociedade mais ampla), compreendendo: como ser de razão que trabalha, como ser ético que compartilha e se comunica, como ser afetivo que experimenta e gera prazer e como ser biológico que se abriga, se alimenta e se reproduz, com um corpo que, além de ser determinado pelo universalismo do biológico, é antes uma realidade simbólica (SAWAIA, 1995, p. 157).
Levando-se em conta que, para Lisboa (2006) o adoecer traz em si vestígio da
própria contemporaneidade e, considerando que a pessoa adoecida também está inserida em
um contexto sócio histórico, apresenta-se os transtornos alimentares como doenças
23
constituídas e originadas a partir desse encadeamento. Logo, entendendo-se que os transtornos
alimentares são doenças por vezes mais derivadas de manifestações sociais do que das
diversidades subjetivas, tem-se que, a união de fatores físicos e psíquicos num ambiente
familiar e, por sua vez, em uma relação amorosa, mostra-se grande promotor de
adoecimentos, de forma que “os fatores ambientais, econômicos e sociais colaboram com tais
somatizações à medida que podem dificultar as representações e os investimentos afetivos do
sujeito diante da vida” (LISBOA e FÉRES-CARNEIRO, 2008, p. 83).
24
3 METODOLOGIA DA PESQUISA
“Ao se estudar o homem é necessário compreendê-lo a partir da interação dialética dessas duas linhas de desenvolvimento: a natural e a cultural. [...] Os estudos que focalizam o ser humano, buscando compreendê-lo, não podem ser examinados fora dessa relação com o social e nem de uma forma estática” (Freitas, 2002).
Os processos de construção de conhecimento assentados em interações verbais,
segundo Simão (2004), compõem a base de boa parte das atividades humanas, dando
continuidade ao movimento de manutenção e renovação da cultura, “quer pensemos na
cultura popular, quer na acadêmica, na ciência ou na tecnologia” (SIMÃO, 2004, p. 29). E a
Psicologia, não obstante, vem se constituindo nesse cenário como campo de saberes e fazeres.
De forma que o presente trabalho de conclusão de curso está pautado em uma
pesquisa exploratória de ordem qualitativa no âmbito da abordagem sócio-histórica, “o
processo de pesquisar envolve um compromisso aberto e declarado com uma visão de
homem” (OZELLA, 2003, p. 114), de modo que, segundo Ozella (2003), a formação de um
pesquisador não se dá unicamente no tocante da epistemologia ou da metodologia, ou seja,
mais do que aprender como se pesquisa, o aprendiz deve fazer pesquisa.
Para Gil (2008, p. 27), as pesquisas exploratórias têm como objetivo principal
“desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e idéias [...] e habitualmente envolvem
levantamento bibliográfico e documental [...]. São desenvolvidas com o objetivo de
proporcionar visão geral, de tipo aproximativo, acerca de determinado fato”. A abordagem
qualitativa, conforme Chizzotti (2006, p. 79),
Parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. O conhecimento não se reduz a um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa; o sujeito-observador é parte integrante do processo do conhecimento e interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes um significado. O objeto não é um dado inerte e neutro; está possuído de significados e relações que sujeitos concretos criam em suas ações.
Logo, ressalta Ozella (2003), é apenas no ato de refletir sobre um problema, de
definir estratégias e realizá-las, de mergulhar na análise de forma crítica, é que o pesquisador
25
estará se constituindo como tal e produzindo conhecimento. Freitas (2002, p. 28) destaca que,
numa abordagem sócio-histórica, trabalhar com a pesquisa qualitativa, “consiste numa
preocupação de compreender os eventos investigados, descrevendo-os e procurando as suas
possíveis relações, integrando o individual com o social”. Nesse sentido, o autor supracitado
observa o processo de pesquisa como um trabalho de educação e desenvolvimento para com o
pesquisador, pois, este, durante o processo de pesquisa, “é alguém que está em processo de
aprendizagem, de transformações” (FREITAS, 2002, p. 26).
Entende-se, portanto que, os estudos qualitativos com o olhar da perspectiva sócio-
histórica, segundo Freitas (2002, p. 26), “devem focalizar o particular como instância da
totalidade social, procurando compreender os sujeitos envolvidos e, por seu intermédio,
compreender também o contexto” visto que, “as ciências humanas estudam o homem em sua
especificidade humana, isto é, em processo de contínua expressão e criação” (FREITAS,
2002, p. 24).
O trabalho de conclusão de curso aqui proposto teve como recorte de análise um
filme. Sendo assim, faz-se necessário uma compreensão de como um filme pode ser utilizado
como suporte à pesquisa.
Neste sentido, Passarelli (2000) pergunta: “O que pode um Psicólogo Social fazer
dentro do cinema?”. E ele próprio responde: “Entre outras coisas, assistir ao filme que está
sendo exibido, claro”. Segundo Passarelli (2000), assistir a um filme sempre será um diálogo,
de modo que, “essa ação pressupõe a capacidade do espectador/analista em deixar-se
transportar para a tela, suportar ver sua imagem refletida, viver aquela outra realidade e
depois sair da sala escura, e poder falar, nem que seja para si mesmo, sobre o que passou”
(PASSARELLI, 2000, p. 282). Todavia, para Vanoye e Goliot-Lété (2008, p. 11), “ver,
examinar um filme tecnicamente nem sempre é fácil [...], analisar um filme implica
evidentemente que se veja e reveja o filme”.
O primeiro contato com o filme traz uma grande quantidade de impressões, emoções
e intuições, sendo que não é possível elaborar uma análise apenas com base nestas primeiras
impressões. A análise vem justamente contra isso, ela se apresenta para relativizar imagens
espontâneas da criação e da recepção cinematográfica. Portanto, para Vanoye & Goliot-Lété
(2008, p. 15), “analisar um filme [...], é despedaçar, descosturar, desunir, extrair, separar,
destacar e denominar materiais que não se percebem isoladamente a ‘olho nu’”. Conforme
concluem os autores supracitados,
26
Analisar um filme não é mais vê-lo, é revê-lo e, mais ainda, examiná-lo tecnicamente. Trata-se de uma outra atitude com relação ao objeto-filme, que, aliás, pode trazer prazeres específicos: desmontar um filme é, de fato, estender seu registro perceptivo e, com isso, se o filme for realmente rico, usufruí-lo melhor (VANOYE e GOLIOT-LÉTÉ, 2008, p. 12).
Passarelli (2000), no livro Práticas Discursivas e Produção de Sentidos no
Cotidiano: Aproximações Teóricas e Metodológicas descreve a cena de um filme em que,
usando o exemplo de que uma gota de água somada a outra sempre formará outra gota e não
duas, um homem fala a outro de uma unidade a ser atingida, a busca de um princípio
unificador que garanta ao ser humano uma forma integral de estar no mundo. De forma que o
discurso e a linguagem são sempre construções sociais, “um discurso e sua interpretação ou
análise deve levar em consideração todos os atores que participam de seu processo de
criação/construção” (PASSARELLI, 2000, p. 274). Dito isto, segundo Passarelli (2000, p.
274), pode-se dizer que
Um filme não é a soma das cenas ou diálogos que o constituem, mas a resultante de um processo que envolve sua produção, sua direção, sua materialidade (sons, diálogo, atores, cenas [...]), sua recepção (o espectador, público e crítica), todo o conjunto da obra do diretor que realiza o filme e mesmo outros filmes de outros diretores com os quais um determinado filme dialoga.
Dessa forma, tanto o que a tela delimita como aquilo que entorna, tudo isto somado,
constitui o que Passarelli chama de objeto fílmico, que é “composto de sons e imagens em
movimento, ordenados em planos18 e sequencias” (PASSARELLI, 2000, p. 276).
O filme, conforme resume Vanoye e Goliot-Lété (2008), além de ser um produto
cultural assentado em um determinado contexto sócio histórico, deve ser o ponto de partida e
o ponto de chegada da análise.
18 Conforme cita Passarelli (2000, p. 276) “Por plano, entende-se a imagem delimitada pelo enquadramento fornecido pela tela”.
27
4 SÍNTESE DO FILME POR AMOR A NANCY
Baseado em fatos reais, o filme Por Amor a Nancy (1994), dirigido por Paul
Schneider e protagonizado por Tracey Gold no papel de Nancy, conta a história de uma
menina anoréxica com os seus 18 anos, saída da escola e prestes a entrar para a universidade.
Filha do meio em uma família de 3 irmãos (sendo ela a única mulher) o filme traz uma família
de classe alta e em plena relação harmoniosa, que mais tarde iria ser atravancada por uma
doença impiedosa. Sally e Thomas Walsh (Jill Clayburgh e William Devane,
respectivamente) se apresentam como um ótimo casal, cuidadosos e atenciosos em relação aos
seus filhos, de modo que, demasiada atenção e controle dado, principalmente, por Sally, a
mãe, pode ter contribuído para o desenvolvimento da anorexia nervosa em Nancy. Tal doença
veio se acentuar com sua saída da escola e entrada na universidade, porém, indícios do
desenvolvimento da enfermidade já vinham mostrando-se presente antes, mas que se tornou
inobservável por seus pais, já que Nancy usufruía de truques para esconder sua comida e seu
corpo magérrimo.
No decorrer do filme, o estado de Nancy agrava-se de um modo que mesmo
internada em uma clínica especial, sendo inclusive, alimentada por soro, esta ainda recusa-se
a melhora de sua saúde, evitando comer de qualquer forma e continuando com seu exercício
físico para emagrecer ainda mais, mesmo dentro da clínica. Perante a imagem esquelética de
Nancy e, com medo de que ela viesse a morrer por complicações da anorexia nervosa, como
única saída, já que a menina recusava-se a voltar pro internamento, o médico responsável pela
clínica auxilia os pais a entrarem na justiça com o pedido de que Nancy seja considerada
incapaz de cuidar da sua saúde.
Por Amor a Nancy, traz, portanto, uma história significativa por mostrar que o
adoecer pode reconfigurar as relações afetivas e familiares, trazendo a tona sentimentos
contraditórios que podem favorecer ou impedir o desenvolvimento saudável do contexto
existencial que abrange tais relações.
28
5 ANÁLISE FÍLMICA
A partir deste momento, será feito a correlação entre teoria, os objetivos e o contexto
do filme. Para tanto, foram transcritos narrativas do filme contendo diálogos e possíveis
contrapontos com aspectos conceituais, entre eles: a função social da família, a adolescência e
a contemporaneidade, o transtorno alimentar e as noções de sujeito e identidade.
Embora não relatado o cenário, ano e local em que se passa o filme “Por Amor a
Nancy”, este parece se ambientar na década de ‘80 e numa cidade aparentemente tradicional
dos Estados Unidos. Casas sem cercados, lindos gramados no jardim, calçadas largas, ruas
familiares bem cuidadas e não movimentadas. O filme conta a história de Nancy e sua família,
constituída por seus pais e dois irmãos. Aparentemente, uma família harmoniosa onde Sally, a
mãe, se apresenta como uma pessoa muito cuidadosa e protetora dos filhos, especialmente de
Nancy, sua filha caçula. Tem-se aqui um modelo de família aos moldes tradicionais, com os
papéis definidos e com um perfil culturalmente aceito em praticamente todas as sociedades.
Desde a antiguidade a família corresponde a um grupo social, uma organização
complexa e inserida em um contexto social mais amplo com o qual mantém constante
interação (PRATTA e SANTOS, 2007, p. 248 apud BIASOLI-ALVES, 2004). Segundo
Pratta e Santos (2007, p. 248 apud OSÓRIO, 1996), a família é um modelo cultural
apresentado de diversas formas nas sociedades existentes e sofre transformações no
transcorrer do processo histórico-cultural. Dessa forma, portanto, compreende-se que a
estruturação da família - neste caso, a família de Nancy - está ligada com o momento
histórico, “uma vez que os diferentes tipos de composições familiares são determinados por
um conjunto significativo de variáveis ambientais, sociais, econômicas, culturais, políticas,
religiosas e históricas” (PRATTA e SANTOS, 2007, p. 248).
Estima-se que Nancy esteja por volta dos 18 anos, já que, ao chegar a casa, logo após
o seu exercício físico (o Cooper), sua mãe informa que seu vestido de formatura havia
chegado. Ela se alegra por isso e logo vai para o seu quarto prová-lo. Em frente ao espelho,
ela fica se observando aparentemente feliz, até que sua mãe chega ao quarto e há um diálogo
entre as duas:
Sally: Que lindo! Mas é vermelho! Eu me lembro que, na loja, decidimos comprar o
preto. Se mandaram o vestido errado...
29
Nancy: Não, fui eu. Achei que ficaria melhor (com cara de culpada ao ver a reação
da mãe). Acha que não?
Sally: Bem, sabe como gosto de preto. Pra mim o preto é a cor fundamental. Mas
você vai arrasar! Vamos lá, experimente, vamos ver como fica?
(Nancy se mostra confusa)
Sally: Nancy, se está na dúvida, fale, ainda dá tempo de trocar. Pode escolher outro
modelo.
Nancy: Não é o modelo (mostrando-se um pouco irritada). Não sei, é bobagem
minha, eu estou meio triste.
Sally: E como acha que estou? Minha menina, minha melhor amiga vai sair de casa.
Quem não ficaria triste, hein?
(Nancy vira e continua a se olhar no espelho).
Percebe-se aqui o quanto a perspectiva familiar, a mãe particularmente, na cena
descrita, produz em Nancy um olhar sobre si. Este olhar induz uma concepção que pode
atravessar o seu projeto de vida, o que caracteriza também aspectos de sua subjetividade.
Pratta e Santos (2007, p. 248 apud OSÓRIO, 1996) entendem que a família exerce
uma importante função na vida dos indivíduos, “na determinação e na organização da
personalidade, além de influenciar significativamente no comportamento individual através
das ações medidas e educativas tomadas no âmbito familiar” (PRATTA e SANTOS, 2007, p.
248 apud DRUMMOND & DRUMMOND FILHO, 1998). Desta forma, a família possui uma
função primordial no amadurecimento biopsicossocial dos indivíduos, ou seja, esta apresenta
funções biológicas, psicológicas e sociais (PRATTA e SANTOS, 2007, p. 250 apud
OSÓRIO, 1996).
No que tange a função social da família, para Pratta e Santos (2007, p. 250 apud
AMAZONAS e COLS, 2003; DRUMMOND e DRUMMOND FILHO, 1998; OSÓRIO,
1996; ROMANELLI, 1997 e TALLÓN & COLS, 1999),
O cerne está na transmissão da cultura de uma dada sociedade aos indivíduos, bem como na preparação dos mesmos para o exercício da cidadania. Sendo assim, é a partir do processo socializador que o indivíduo elabora sua identidade e sua subjetividade, adquirindo, no interior da família, os valores, as normas, as crenças, as idéias, os modelos e os padrões de comportamento necessários para a sua atuação na sociedade.
Na cena descrita acima, a mãe tenta influenciar um determinado comportamento em
sua filha, que por sua vez, demonstra relutância, tentando assim, buscar parece, uma auto
30
afirmação quanto a sua imagem, tanto física como psíquica. Isso é retratado na escolha do
vestido.
Sendo Nancy uma adolescente, nos seus 18 anos, é fundamental falar sobre a
adolescência e suas particularidades. Historicamente, a adolescência, do latim ad-olescere ou
“crescer para” (crescer da infância para a fase adulta), passou a “existir” após a Revolução
Industrial (FERRAZ e SIMAAN, 2009). Conforme Ferraz e Simaan (2009, p. 37), “os
avanços científicos, a mudança do comportamento social de homens e mulheres, a vida
produtiva baseada em resultados fizeram com que a visão do homem sobre si mesmo se
modificasse”. É uma fase de passagem em que há crescimento em um sentido amplo, não só
restrito ao plano físico, ou seja, “há desenvolvimento, transformação” (FERRAZ e SIMAAN,
2009, p. 37). Wagner, Falcke, Silveira e Mosmann (2002, p. 75) resumem a adolescência
como uma “fase de emoções intensas, na qual o sujeito está em busca da consolidação da sua
própria identidade”.
No que se refere a sujeito e identidade, de acordo com Rey (2003, p. 235),
A definição de um homem constituído subjetivamente em sua própria história, em que o sentido aparece como registro emocional comprometido com os significados e as necessidades que vão desenvolvendo-se no decorrer de sua história, fazem da categoria sujeito uma peça-chave para entender os complexos processos de constituição subjetiva e de desenvolvimento, tanto dos processos sociais como dos individuais.
Conforme completa Rey (2003, p. 238),
O sujeito é o indivíduo comprometido de forma permanente em uma prática social complexa que o transcende, e diante disso tem de organizar sua expressão pessoal, o que implica a construção de opções pelas quais mantenha seu desenvolvimento e seus espaços pessoais dentro do contexto dessas práticas.
Voltando ao contexto da história de vida de Nancy, tem-se a cena de sua formatura.
Pode-se compreender este momento como um aspecto relevante de sua identidade. Na
formatura, então, Nancy e seus colegas dançam e ela apresenta-se feliz com a festa. Mais
tarde, ao final do baile, Nancy e mais três amigos, entre estes, Debbie, sua melhor amiga, vão
para o parque conversar:
Debbie: Onde acham que estaremos daqui a 10 anos?
Amigo 1: Serei almirante da marinha americana. O mais jovem e o mais bonito.
(todos riem)
Amigo 1: E você? (virando-se para Debbie)
31
Debbie: Eu? Serei advogada. E estarei defendendo você por má conduta,
provavelmente.
Amigo 1: Serei seu outro cliente. Mesma acusação.
(todos riem)
Debbie: Pensando melhor, serei promotora. E você, Nance, qual será seu futuro?
Nancy: Eu? Pra mim o futuro é um branco. A verdade é que nunca pensei nisso.
Acho que... Não haverá nada melhor que nossos 18 anos. E o que gostaria mesmo é que as
coisas ficassem do jeito que estão. Pra sempre.
(todos fazem silêncio)
Quando os jovens discutem o futuro em termos de escolhas profissionais, revelam
um ponto significativo da formação de identidade. Nancy, por sua vez, já demonstra certa
dificuldade no sentido emocional de se projetar dentro deste universo, ou seja, a escolha
profissional. Pratta e Santos (2007, p. 253 apud DRUMMOND e DRUMMOND FILHO,
1998) assinalam o descrito acima:
O indivíduo passa por momentos de desequilíbrios e instabilidades extremas, sentindo-se muitas vezes inseguro, confuso, angustiado, injustiçado, incompreendido por pais e professores, o que pode acarretar problemas para os relacionamentos do adolescente com as pessoas mais próximas do seu convívio social. Entretanto, essa crise desencadeada pela vivência da adolescência é de fundamental importância para o desenvolvimento psicológico dos indivíduos (...).
Isto, no entanto, não caracteriza tais crises como algo natural, mas um aspecto
cultural, presente no desenvolvimento do adolescente. Câmara e Cruz ([ ], publicação sem
numeração de página) ainda observam que, “inquietude física, menos capacidade de
concentração, crescente ambivalência frente aos objetos amorosos, tiques, rituais, mania de
colecionar, evitação de contato físico com os pais, etc.”, podem ou não gerar, mais tarde, um
transtorno que possa comprometer a saúde do mesmo. Os comportamentos citados acima
precisam ser observados pelos pais, para que possam auxiliar seus filhos de forma saudável na
passagem por estes momentos tão conflitivos. Na situação de Nancy, num primeiro momento,
sua família não consegue perceber que tais comportamentos, observados na adolescente,
podem já estar manifestando algum comprometimento no que tange sua saúde psicológica –
aspectos que vão levá-la a desenvolver o transtorno alimentar. Diferenciar momentos
conflitivos típicos do adolescente, de outros que possam estar impedindo seu
desenvolvimento é fator importante no olhar da família.
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Nancy trabalha de garçonete em uma lanchonete, e nesta, teve o seu primeiro
episódio de recusa alimentar. No caso, um cliente havia pedido um lanche, porém, em
seguida, cancelou o pedido. A outra garçonete sugere que as duas repartam, já que se tratava
de um lanche muito grande e que, portanto, daria para ambas. Nancy aparentemente confusa
olha para o lanche, mas recusa, e com insistência de sua colega de trabalho ela diz que não dá
para comer ainda, já que há três semanas atrás tinha arrancado o dente siso. Na cena descrita
acima, temos um episódio importante e decisivo na vida de Nancy, que é a sua primeira
recusa à comida. E, como característica da instauração do transtorno alimentar, tem-se a
utilização de desculpas e mentiras por parte de Nancy para não ter de comer o lanche
oferecido.
Logo após, Nancy está chegando a sua casa e, depara-se com Sally, sua mãe, na
cozinha lendo o que seria uma carta. Há um diálogo entre elas:
Nancy: Oi, chegou cedo hoje.
Sally: Fui até o centro e, por causa do trânsito, vim mais cedo. (...)
Nancy: Já vou subir. Carta pra mim?
Sally: É da faculdade. Vão colocar você num quarto individual.
Nancy: Maravilha! (Nancy se mostra contente)
Sally: Maravilha por quê? Vai querer ficar sozinha num lugar estranho? Vai ficar
deprimida. Porque quer ficar sozinha? Eu não ia querer, não. (Zanga-se a mãe)
(Nancy entristece)
Nancy: Posso mudar se não gostar.
Sally: Pode, mas, para mim, o bom da faculdade é conhecer gente nova, se divertir.
Pense nisso.
(Nancy se retira entristecida)
Aqui, novamente tem-se a mãe, Sally, tentando influenciar o comportamento da
filha, dando a sua perspectiva, deixando Nancy confusa quanto às suas escolhas. Neste
contexto, segundo Ferraz e Simaan (2009, p. 44), “a criança que é bem instruída a fazer
escolhas responsáveis será um adolescente com mais condição de optar”, onde “um cérebro
tumultuado biologicamente, em meio a vivências quase tão confusas, pode passar dificuldades
e as tomadas de decisão podem ser difíceis, dolorosas ou inadequadas”. Mais tarde, em outra
cena, Nancy estava praticando o seu exercício físico, quando Debbie, sua amiga, passa de
carro e a chama:
Debbie: Nancy! Espere! Parece estar precisando de uma carona.
Nancy: Estou fazendo o meu Cooper.
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Debbie: Vamos jogar boliche hoje. Passo pra te pegar?
Nancy: Não estou a fim, mas obrigada.
Debbie: Vamos, Nance, está virando uma eremita sabia?
Nancy: A gente se vê. Eu te ligo. (acelerando a corrida, deixando a amiga pra trás).
Percebe-se que as características dos transtornos alimentares estão cada vez mais se
sobressaindo em Nancy. Pode-se observar isto na cena descrita acima, ou seja, a recusa ao
convite da amiga, e o dizer desta de que Nancy esteja virando uma eremita apresenta-se como
um possível isolamento da adolescente para com o exterior, o que seria mais um aspecto do
transtorno alimentar.
Na manhã do dia em que Nancy iria se mudar para a cidade em que vai cursar a
Universidade, Norris College, ela vai à cozinha e Sally a chama para tomar café da manhã:
Sally: Nance! Sente meu amor.
(Nancy observa a mesa de café)
Nancy: Estou fazendo as malas, mãe.
Sally: Está bem, pode ir.
(Nancy se vira pra ir pro quarto)
Sally: Leve seu café.
(Ao terminar de preparar seu café para levar pro quarto, Nancy continua a
conversa)
Nancy: Mãe. Desculpe pela maneira como venho agindo. Tenho andado meio
nervosa. É estranho pensar em começar uma vida nova.
Sally: Mas conheço você! Vai se sair muito bem.
Nancy: Acha mesmo?
Sally: Claro, tenho certeza.
(as duas sorriem)
Sally: Eu te amo.
Nancy: Eu também, mãe.
(Nancy pega a bandeja com o seu café da manhã e se retira)
No início da conversa acima, percebe-se que Nancy tenta esquivar-se para não ter de
sentar-se à mesa e comer, mas com a insistência da mãe, ela não teve como recusar. Logo em
seguida, Nancy se desculpa pelo comportamento que vem apresentando, uma vez que seu
humor oscila. Talvez pela fase em que se encontra (adolescência), como ela mesma menciona
quando diz “(...) é estranho começar uma vida nova”, ou pela própria condição do transtorno
alimentar. Essa oscilação de humor, inevitavelmente afeta sua relação familiar. Wagner,
34
Falcke, Silveira e Mosmann (2002, p. 76) ressaltam que, a partir do senso comum, nas
interações familiares, oscilam sentimentos de afeição, solidariedade, rivalidade e hostilidade.
Pratta e Santos (2007, p. 250, 251 apud ROMANELLI, 1997), confirmam o que os autores
acima descrevem, relatando que, “a família corresponde a um lugar privilegiado de afeto, no
qual estão inseridos relacionamentos íntimos, expressão de emoções e de sentimentos”, onde
“a expressão de sentimentos, aspirações e emoções é mais livre”. Portanto, continuam Pratta e
Santos, é no meio da família que o sujeito tem seus primeiros relacionamentos interpessoais,
“estabelecendo trocas emocionais que funcionam como um suporte afetivo importante quando
os indivíduos atingem a idade adulta” (PRATTA e SANTOS, 2007, p. 250). Estabelecidas ao
longo da vida, estas trocas emocionais são essenciais para o “desenvolvimento dos indivíduos
e para a aquisição de condições físicas e mentais centrais para cada etapa do desenvolvimento
psicológico” (PRATTA e SANTOS, 2007, p. 250).
Ao acabar a conversa e voltar ao seu quarto, Nancy continua arrumando algumas
coisas pra levar a Universidade, quando um de seus irmãos entra e pega algumas coisas pra
levar ao carro. Antes de sair, ele pára em frente à porta e pergunta se Nancy emagreceu. Ela
diz que não, que continua com seus 60 Kg. Ele, então, diz que ela está bonita, que sentirá
saudades e se retira. Logo após, ela olha para o seu café da manhã que havia trazido a pouco e
joga fora na privada. Em seguida ela se pesa, e o marcador marca 55 Kg, para sua alegria.
Conforme Giordani (2006, p 82), para a anoréxica o peso corporal “é altamente
valorizado, sendo a perda de peso apreciada e julgada como uma extraordinária conquista e
uma formidável demonstração de autocontrole”.
Em outra cena, Sally está na academia com a mãe de Debbie, quando as duas
conversam:
Mãe de Debbie: Ela (Nancy) não tem mais procurado a Debbie.
Sally: Ela anda estudando muito.
Mãe de Debbie: Eu a vi na semana passada correndo na Macopin. Ela está muito
magra, magra demais. A Debbie também notou. (mostrando-se preocupada)
Sally: Essas Meninas. Ou comem tudo o que vêem ou não comem nada. (mostrando-
se tranqüila)
Mãe de Debbie: Escute o que vou dizer. Minha amiga, Scheila, é orientadora
educacional. Descrevi a Nancy pra ela.
Sally: Você o que? (irrita-se Sally)
Mãe de Debbie: Ela disse que ela pode ser Anoréxica.
35
Sally: Anoréxica? Essa sua amiga é louca. A Nancy nunca iria querer morrer de
fome. Pode dizer a ela que, pra mim, ela é louca.
Mãe de Debbie: Devia ir falar com ela.
Sally: A Nancy está bem. Está um pouco estressada, talvez. Está estudando muito e,
não está se alimentando direito. Mas vai voltar pra casa logo, nas férias... E vai relaxar se
alimentar e, pode acreditar, vai voltar a ser minha Nancy.
Mãe de Debbie: Fale com seu médico, então.
Sally: Chega. (e se retira)
Sally se nega a aceitar, ou até mesmo pensar, num possível adoecimento da filha. Isto
se apresenta como um ponto negativo em todo o processo, visto que o não reconhecimento do
transtorno pode retardar o tratamento e, por conseqüência, contribuir para o agravamento do
quadro, “por possibilitar maior cronicidade ou por aumentar o risco de morte em casos
graves” (ESPÍNDOLA e BLAY, 2009, p. 713).
No natal, a família de Nancy se reúne em sua casa. Um clima harmonioso toma conta
do local. Presentes e uma bonita árvore de natal decoram a casa e alegram toda a família.
Porém, quando Sally sobe ao quarto de Nancy para levar um vestido, se assusta com o que vê:
Nancy, magérrima, a se olhar no espelho. Sally, se apavora, fica sem reação, enquanto Nancy
parece não entender o motivo de tamanho desespero. E assim, Nancy desce do seu quarto e
vai até a sala cumprimentar a todos, surpreendendo ao mesmo tempo.
O fato de Nancy aparentemente não entender ou não mostrar algum sentimento
perante o desespero da mãe, demonstra mais uma vez uma característica do transtorno
alimentar. Conforme já relatado na presente pesquisa, Segundo Giordani (2006, p. 81 apud
BIDAUD, 1998), o psiquiatra francês, Lasègue, observou em seu artigo (Del’anorexie
hystérique) que a anoréxica não almeja a cura, como também se contenta e se satisfaz com as
restrições que sua conduta lhe inflige. No que se refere à família, Espíndola e Blay (2009, p.
713) afirmam que
O contato inicial com a doença gera nos pais a ansiedade e o medo. Muitas vezes, eles expressam a incredulidade com relação ao diagnóstico. Essas fases enfrentadas pela família, descritas como as reações iniciais dos pais (choque, incredulidade, confusão, medo, raiva, conflito, tensão) apresentam duração variável e uma negação prolongada e afetam toda a família, impedindo uma adaptação bem sucedida.
Um amigo da família, Tommy, havia dito a Sally que Nancy muito provavelmente
estava com Anorexia Nervosa e que, portanto, ela deveria levar Nancy a um hospital para
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tratar da doença. Ao saber que Tommy havia conversado sobre isso com a mãe, Nancy vai até
ele tirar satisfação:
Nancy: Por que disse que estou doente e tenho que ir para aquele lugar?
Tommy: É verdade, Nancy. Você está doente e precisa ir pra lá.
Nancy: Não estou, estou bem. Ligue pra ela e diga que se enganou.
Tommy: Querida... Está gelada. Vou pegar um café pra você.
Nancy: Não quero café. Ligue pra ela agora!
Tommy: Tome, beba enquanto está quente.
Nancy: Não vou, se não quiser. Tenho mais de 18, então não importa se vai ligar ou
não.
Tommy: Nancy, sabe o que é anorexia nervosa? É uma doença. É muito grave. Uma
mulher que conheço tem, e você e ela agem do mesmo jeito.
Nancy: Não tenho de ouvir isso! (Nancy se afasta)
Tommy: Está assustada. Não está?
Nancy: Não estou! E não irei a nenhum hospital falar sobre o que eu como! Escuto
esse papo 24 horas por dia, todo dia! “Nancy você comeu?”, “Nancy o que você comeu?”,
“Coma!”. (lamenta-se Nancy caindo aos prantos)
Tommy: Nancy... Eu entendo. É difícil. (abraçando Nancy)
Nancy: Eu quero ouvir. É verdade. Mas um lado em mim não quer. É como se
estivesse havendo uma guerra dentro de mim! O tempo todo! E eu não sei como fazer isso
parar!
Conforme Moreira e Oliveira (2008), para pessoas com transtorno alimentar, a
doença é sentida como constituintes de si mesmos, de sua identidade, e não como uma
patologia. Nancy corrobora a visão dos autores quando menciona a guerra dentro de si, como
referência ao transtorno alimentar.
Depois da conversa de Nancy com Tommy, o pai e Sally, a mãe, levam a filha ao
hospital. Ela apresenta-se nervosa, mas parece ter aceitado a idéia do tratamento. Chegam à
sala do Dr. Partana, o especialista no assunto, e este pede para que Nancy os deixe a sós para
uma conversa. Relutante, Nancy se retira. Dr. Partana pede para que os pais se sentem e tem
início a conversa:
Dr. Partana: O que a senhora quer?
Sally: Quero minha vida de volta... Minha filha de volta. Por que ela está fazendo
isso? Eu... Não somos uma família de malucos. (lamenta-se Sally)
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Dr. Partana: Em primeiro lugar, ela não está fazendo isso para a senhora... é pra
ela mesmo.
Sally: E isso resolve tudo? Não acho.
Dr. Partana: Sra. Walsh...
Pai de Nancy: Há 5 meses nossa filha era feliz, sadia. Tinha uma vida normal.
Dr. Partana: Parecia estar bem.
Sally: O que quer dizer?
Dr. Partana: É complicado. A anorexia nervosa é uma doença muito complexa. Não
há respostas fáceis. Mas garanto que o problema existe há mais de 5 meses. Preciso falar
com ela e preciso vê-los com freqüência. Teremos de trabalhar juntos.
Sally: Quanto vai durar o tratamento?
Dr. Partana: Não sei.
Em conformidade com o que o personagem médico do filme relata, Morgan, Negrão
e Vecchiatti (2002, p. 22) ressaltam a importância de lembrar que os transtornos alimentares
Não emergem abruptamente, mas se desenvolvem ao longo de vários anos, a partir de predisposições presentes desde o nascimento do indivíduo, de vulnerabilidades que emergem nas primeiras etapas da vida e de ocorrências mais tardias na sua história.
No que tange a família, os transtornos alimentares impõem variados desafios
adaptativos. Segundo Espíndola e Blay (2009, p. 713), esses transtornos “reorganizam o
sistema familiar como um todo, modificando a sua dinâmica, exigindo adaptações de ordem
emocional, cognitiva e material”. Procedimentos médicos como: consultas, exames,
abordagens terapêutica e, em alguns casos, contato com o ambiente hospitalar, produzem
estas mudanças na rotina da família (ESPÍNDOLA E BLAY, 2009).
Nancy, então, fica internada no hospital para tratamento. Porém, ela não colaborou
muito para o bom andamento deste. Não participou efetivamente da terapia em grupo, não
comia a dieta que serviam no hospital, furava as mangueiras do soro, desrespeitava e era
agressiva com as enfermeiras e demais profissionais.
No que se refere ao tratamento do transtorno alimentar, Cordás (2001, p. 178)
ressalta que, mais do que em outras áreas, “o tratamento exige uma equipe multidisciplinar
em que psiquiatra, endocrinologista, ginecologista, pediatria, terapeutas individual e familiar,
nutricionista, enfermagem e eventualmente outros profissionais podem ser necessários”.
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Quanto à resistência ao tratamento descrito na cena acima, esta é uma constante nos
pacientes com o transtorno. Segundo Moreira e Oliveira (2008, p. 162), “recusa de ingerir a
quantidade de alimentos prescrita pela nutricionista, ‘truques’ na hora que são pesados,
remoção da sonda nasoenteral quando são submetidas à alimentação enteral, exercitarem-se
escondidos, continuar usando laxantes e diuréticos, vomitar”, são algumas formas de burlar o
tratamento.
Posteriormente, em outra cena, Dr. Partana tentando dar uma explicação aos pais de
Nancy sobre o motivo da doença, argumenta: “Ela se sentiu incapaz de controlar sua vida.
Estava saindo de casa, vendo a sua vida familiar sendo destruída. Achou algo que ela podia
controlar. O que ela comia. Controle é a chave da anorexia. Estudos mostram que, embora
seja detonada pela puberdade, separação dos pais, química do corpo, pela biologia, em sua
essência, a anorexia é uma manifestação da dinâmica da família. É um problema familiar.
Precisam entender que não comer não é a doença, é o sintoma. A doença é o que a Nancy
pensa de si mesma”.
Do ponto de vista científico, há a observação de que famílias com filhos com algum
transtorno alimentar parecem ter características de funcionamento parecido. Isto fez com que
o âmbito familiar se tornasse centro de muitas pesquisas que procuraram entender “o papel da
família no desencadeamento, manutenção e remissão do transtorno” (SOUZA e SANTOS,
2006, p. 403). Conforme completa Taylor (1992, apud GRANDO e ROLIM, 2005, p. 990), “o
comportamento de um indivíduo é influenciado por sua família e, por sua vez, quaisquer
alterações em seu comportamento invariavelmente afetarão sua família”.
Segundo Souza, Moura e Nascimento (2007 p. 2), a culpabilização da família pela
instauração do transtorno alimentar é uma das teorias possíveis para o fenômeno. De acordo
com os autores supracitados,
Essa maneira de olhar para a família iniciou-se com os primeiros pesquisadores no assunto, em meados da década de ’70 do século passado, dentre eles Salvador Minuchin, que construíram o modelo das “famílias psicossomáticas”, segundo o qual determinadas características do funcionamento familiar estariam ligadas ao aparecimento de determinadas patologias, no caso, da anorexia nervosa (SOUZA, MOURA e NASCIMENTO, 2007, p. 2).
No hospital, Nancy continua não colaborando. E, querendo esconder a comida
oferecida pela clínica para não ter de comer, corta com uma faca o fundo do armário onde
estava sua roupa e joga toda a comida para trás dele. Em outra cena, Nancy aparece
praticando seu exercício físico, o cooper, dentro do quarto, ao lado da cama e com o soro na
39
veia. Mesmo Nancy fazendo tudo isso para burlar as regras do hospital e não voltar ao seu
peso normal, internada, ela conseguiu engordar 3 kg. Mas isso foi determinante para fazê-la
desistir. E assim, ela parou com o programa de tratamento e voltou pra casa.
A família continua lutando para que Nancy melhore seu estado de saúde, mas, longe
da clínica e de cuidados médicos, fica praticamente impossível. Ela então começa a ficar
debilitada, muito fraca e extremamente magra. Infecções e dores pelo corpo surgem, deixando
seu estado muito crítico e, seus pais, desesperados, já não sabem mais o que fazer.
Sally procura novamente a clínica especializada em Anorexia do Dr. Partana.
Chegando lá, chorando, ela pergunta o que fazer para salvar sua filha. Salienta que faz
qualquer coisa para tê-la como antes. Dr. Partana diz que só há uma coisa a ser feita: que o
pai, visto que a mãe e ela são muito ligadas, terá que procurar um advogado e entrar na justiça
com pedido para tornar Nancy incapaz de cuidar de sua própria saúde. E assim foi feito. Ao
saber disso, Nancy fica brava e não aceita a idéia, alegando que tem 18 anos e pode muito
bem cuidar de si e de sua saúde. Mas mesmo assim, Sally e o marido deram continuidade no
processo, onde arranjaram uma advogada para defender Nancy no tribunal.
Moreira e Oliveira (2008) ao discorrer sobre esse assunto alertam que o internamento
de pacientes com transtorno alimentar por meio da justiça é controverso. Segundo os autores
mencionados acima,
De maneira simplificada, algumas indicações de internamento imediato nos casos de anorexia são: risco de suicídio, síncope, perda rápida de peso, convulsões, bradicardia, distúrbios hidroeletrolíticos, hipoglicemia, ausência de resposta ao tratamento ambulatorial, ambiente familiar muito comprometido (MOREIRA E OLIVEIRA, 2008, p. 163 apud VANDEREYCKEN, 1998).
No julgamento, portanto, a família totalmente abalada pela delicada situação: Nancy
e sua advogada de um lado, defendendo o direito de Nancy cuidar de sua própria saúde e, de
outro, os pais e seu advogado lutando para reter a tutela sobre a saúde da filha, pois, se
continuar como está, levará ela a morte. No decorrer do julgamento, o pai dá o deu
depoimento, alegando compreender toda a responsabilidade que isso lhe trará, e que está apto
para tal. Nancy, após o depoimento do pai fica muito abalada e, chorando, conversa com sua
advogada para que não precise mais dar continuidade no processo, pois concorda com o pai,
de que realmente precisa de uma tutela médica.
O Juiz acata o parecer da advogada e enfatiza a todos os presentes no tribunal que, o
fato de Nancy perder o direito a cuidar de sua própria saúde, não quer dizer que seja uma
pessoa incapaz. Não significa que não possa tomar decisões em outras áreas de sua vida. E
40
assim, encerra a sessão e deseja boa sorte a todos. Ao voltar pra casa, os pais e Nancy,
abalados pela situação, encontram-se com os irmãos extremamente curiosos para saber o que
houve no tribunal. Nancy pede um pão para comer, o que deixa a todos surpreendidos e
felizes ao mesmo tempo.
Passado algum tempo, Nancy aparece aparentemente melhor com sua recuperação,
voltou à clínica do Dr. Partana para dar seu depoimento a outras pessoas com Anorexia:
Nancy: E... Eu acho que aquele foi... O começo da minha recuperação. Mas,
acreditem, foi só um começo. Tive que lutar muito. Isso é que é o estranho numa
recuperação. Aprendi que... Talvez, nunca fique completamente curada. Que essa doença
nem sempre desaparece. Ela fica ali, a espreita. Como meu calcanhar de Aquiles. Mas tudo
bem. Porque sei que sou forte. Sei que posso vencer. Sei que tenho forças para me salvar.
Isso foi a coisa mais importante que aprendi. É a coisa mais importante que qualquer um
pode aprender.
Sendo o transtorno alimentar um motivo e uma experiência de reorganização da
família, segundo Espíndola e Blay (2009, p. 713), esta reorganização “pode não significar
necessariamente uma resolução, no sentido de compreensão e aceitação completa da doença,
mas sim uma organização de modos menos conflituosos de lidar com o fenômeno”. Nesse
sentido, Pratta e Santos (2007, p. 251 apud TALLÓN e COLS, 1999) reforçam que,
A harmonia, a qualidade do relacionamento familiar e a qualidade do relacionamento conjugal são aspectos importantes que exercem influência até mesmo no possível aparecimento de déficits e transtornos psicoafetivos nos indivíduos. Desse modo, pode-se asseverar que as experiências vivenciadas pelo jovem, tanto no contexto familiar quanto nos outros ambientes nos quais ele está inserido, contribuem diretamente para a sua formação enquanto adulto, sendo que, no âmbito familiar, o indivíduo vai passar por uma série de experiências genuínas em termos de afeto, dor, medo, raiva e inúmeras outras emoções, que possibilitarão um aprendizado essencial para a sua atuação futura.
Concluindo a análise do filme “Por Amor a Nancy” como objeto de estudo da
presente pesquisa, ressalta-se a importância da família tanto para a instalação do transtorno
alimentar, bem como para a sua superação. E o filme aborda esses dois momentos na vida da
garota Nancy, quando no início, sua família, especialmente a mãe Sally, parece desesperar-se
em relação ao adoecimento da filha, para posteriormente, dar todo o cuidado e atenção no
tratamento.
Sendo a família uma organização que constitui as variáveis ambientais, culturais e
históricas, nas quais um sujeito constrói sua subjetividade, acredita-se que seja ela também
um dos principais componentes da relação saúde/adoecimento. Neste sentido, o filme “Por
41
Amor a Nancy” traz a família como foco desta relação e caracteriza as diferentes etapas, que
segundo Andrada (2003, apud Carter e McGoldrick, 1995) são divididas sistemicamente em 6
(seis) fases a vida da família: o jovem solteiro; o casamento; famílias com filhos pequenos;
famílias com adolescentes; famílias no meio da vida e famílias no estágio tardio da vida.
Segundo a autora supracitada, “em cada estágio existem processos emocionais implícitos que
exigem mudanças no status da família para que esta prossiga se desenvolvendo”
(ANDRADA, p. 5, 2003). O filme analisado retrata a fase famílias com adolescentes e, assim,
possibilita uma compreensão de como o campo afetivo é fundamental para a superação dos
diferentes momentos e conflitos pertinentes a esta fase.
42
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este Trabalho de Conclusão de Curso apresentou a anorexia e bulimia nervosa como
um transtorno que implica nas relações afetivas e no ambiente familiar no contexto de um
indivíduo adolescente, de modo que estabiliza/desestabiliza todas as relações deste.
Conforme Coutinho, Krawulski e Soares (2007), a contemporaneidade trouxe
consigo, transformações sociais com implicações para os modos de ser dos sujeitos e suas
formas de agir na sociedade. Tais transformações, segundo os autores supracitados, “ao
produzirem um contexto marcado por características como transitoriedade, efemeridade,
descontinuidade e caos” (p. 29) atingem a área das ciências humanas e sociais. E tão logo
temos a Psicologia como campo de saber para trabalhar com as questões sociais, o sujeito e a
subjetividade.
A anorexia e bulimia nervosa são tipos de transtornos alimentares que se
caracterizam pelo comprometimento do estado nutricional e às práticas compensatórias
inadequadas para o controle do peso. Como sugeriu a presente pesquisa, os referidos
transtornos e logo, o sujeito, estão perpassados com as demandas sociais e culturais.
Conforme ressalta Toloi (2007, p.1), “sem dúvida alguma, o individual está incluído no
coletivo, assim como, a subjetividade tem sua origem na matriz da comunidade, dos povos, e
dos grupos”. Por sua vez, o sujeito está também sujeito às influências do contexto familiar
que, quando adoecido, sofre toda uma desestruturação do seu ambiente, afetando todos os
membros da mesma. Como analisado no filme Por Amor a Nancy, pode-se constatar o efeito
das variáveis (família, amigos, escola, sociedade como um todo) relacionadas acima sobre a
personagem principal. Tão logo temos a mãe constantemente se metendo sobre a vida da
filha, não deixando esta ter suas escolhas por si só, o que numa constante, tornou Nancy uma
menina indecisa, sem o poder de tomar decisões, sem controle de sua vida, fazendo com que
ao menos o controle de sua comida pudesse ter.
No que se refere à adolescência/juventude, que segundo Crochík (2009, p. 17), “a
nenhuma outra fase do desenvolvimento humano atribui-se tanto o caráter de provisório”,
ressalta-se os desequilíbrios e as instabilidades do indivíduo. Não obstante, Nancy se encontra
nesta fase e, suas instabilidades emocionais estão exacerbadas, face ao seu transtorno. Ferraz
e Simaan (2009) corroboram a idéia de um possível sofrimento nesta fase, “que começa com a
não identificação da imagem corporal pelo próprio sujeito, deflagrada no início da
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transformação física que se dá ao longo do processo biológico da adolescência”. Em Nancy é
muito perceptível esse sofrimento, uma constante insatisfação para consigo, com seu corpo,
durante a adolescência mostrada no filme. Ou seja, o contexto familiar, o seu meio social
representado pelas suas amizades, a escola/universidade, estado emocional/psíquico foram
determinantes para o surgimento de sua doença.
Levando em consideração as limitações de uma pesquisa acadêmica, os assuntos aqui
levantados não foram trabalhados exaustivamente. Houve uma preocupação em manter o
estudo dentro de uma coerência teórica necessária para um trabalho de conclusão de curso.
Portanto, diante do exposto acima, considera-se que o objetivo principal do trabalho fora
alcançado. Todavia, é preciso colocar a Psicologia a serviço da sociedade e, para tanto, acha-
se necessário um prolongamento de pesquisas no tema proposto, fazendo com que cada vez
mais o assunto aqui abordado atinja o público, informando e conscientizando famílias sobre
os transtornos alimentares.
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