laurinha à procura de novas amigas! - mapas mt · à procura de novas amigas! 2 capítulo 1...
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Laurinha
à procura de
novas amigas!
2
Capítulo 1
Laurinha era uma menina muito alegre.
Morava em uma casa com sua família.
A casa em que
moravam era bem grande
com portas e janelas amplas
e um quintal enorme, cheio
de plantas e árvores
frutíferas. Tinha manga,
cajá-manga, acerola, lima,
caju, pitanga, coco, mexerica, laranjinha Kinkan, coco de buriti,
limão, banana e jaca.
No quintal tinha uma
laranja tão grande, mas tão
grande, que era maior do que
um melão. Laranja que não
se usava para chupar, mas
para fazer doce.
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E a avó de Laurinha fazia um doce delicioso desta
laranja e ainda dava laranja para todos os vizinhos fazerem seus
doces.
Tinha uma fruteira que era especial e que ela adorava:
um pé de jaca que fora plantada pelo seu bisavô. Contam que
quando sua avó nasceu ele plantou o pé de jaca.
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A fruteira já estava bem velhinha, assim como sua avó,
mas ainda dava umas frutas enormes que sempre caiam de
maduras porque ninguém as alcançava. O pé crescera muitas,
muitas vezes mais que sua avó. Era enorme. Laurinha achava
que um dia ele ainda alcançaria o céu, assim como o pé de feijão
de João.
O sonho de Laurinha era construir no alto do pé de jaca,
uma casinha, com uma escada enorme, porque aí subiria e
brincaria com suas amigas em um lugar só delas, e quem sabe
não poderiam também chegar até o céu e encontrar um gigante
bonzinho.
Sua mãe havia lhe dito que só se vai para o céu depois
que se morre. Então ela e suas amigas poderiam ir ao céu sem
precisar morrer primeiro.
Nos fundos da casa de Laurinha tinha um rio, cujas águas
eram transparentes, onde se podia ver os peixinhos. Laurinha
gostava muito de ir com sua prima e todas as suas cachorras
tomar banho nele. Tinha águas geladas, mas mesmo assim ela
achava delicioso. Aprendera a nadar
tinha uns quatro anos mais ou menos,
não se lembrava bem. Só sabe que já
fazia “muiiiiito” tempo que sabia
nadar. Desde quando sua prima lhe
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dissera que se engolisse alguns lambaris, dos pequeninhos,
vivos, ela aprenderia a nadar. Dito e feito. Após engolir algumas
dezenas de lambarizinhos e muito se esforçar para aprender,
quando viu, já estava nadando até a outra margem do rio.
O rio que antes lhe parecera imenso e profundo, agora
lhe parecia pequeno e raso. Já conseguia atravessá-lo, nadando,
claro. Ainda não “lhe dava pé”.
Laurinha tinha vários animais: três gatos, todos que
foram aparecendo e ela foi cuidando. O Mingau era um gatinho
lindo, branquinho, que desde o
primeiro dia se mostrou
mansinho. Era o seu bichinho
de estimação. Ele adorava um
colo. Ficava ronronando
sempre que Laurinha estava lhe
fazendo carinho.
O Negresco que era tão pretinho que quando estava no
escuro “enegrava” de vez. Laurinha achava que ele gostava de
ficar invisível. Não deixava que ninguém o pegasse, mas estava
sempre por perto, vendo tudo que acontecia; e por fim tinha o
Rajado. Gatinho bravo, muito bravo e arisco. Andava
sorrateiramente, e quando percebia que alguém o estava vendo,
saia numa carreira só. Na verdade Laurinha acreditava que ele
era uma oncinha disfarçada de gato.
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Laurinha gostava de todos, cada um era especial, com
seu jeito de ser.
Tinha também as cachorras.
A primeira foi a Sofia. Uma
rottweiler linda e doce. Foi comprada
bem pequenina e já veio com o rabo
cortado.
Sofia era muito amiga de
Laurinha porque praticamente
cresceram juntas. Sofia gostava muito de brincar de puxa-puxa.
Laurinha sempre perdia porque Sofia era a mais forte de todas as
cachorras que Laurinha conhecia. Sofia era também a sua
confidente. Só a ela contava seu segredo. Sim, Laurinha tinha
um segredo que não gostava de falar com suas amigas, e só
falava dele com Sofia.
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E Sofia teve uma filha. Potira. Cresceu e ficou enorme.
Como não lhe cortaram o rabo, sua avó a chamava de “a
rabuda”. Ela era meio destrambelhada. Todos achavam. Muito
atrapalhada. Ela era muito gulosa, mamou e comeu mais que
todos os seus irmãos. Por isso cresceu tanto. Ficou bem maior
que Sofia, sua mãe. Ela não gostava de ser contrariada. Era só
não fazerem como ela queria, que logo ficava enfurecida.
Pegava tudo que via pelo chão para morder e rasgar. Laurinha
não sabe quantas mãos e pés de suas bonecas ela já havia
comido.
Quando Potira mordia, mordia devagar, sem machucar.
Era só mesmo
para avisar que
não estava
gostando de
alguma coisa. E
sempre tinha
alguma coisa
que não estava
gostando. Laurinha não tinha medo. Vivia com os braços meio
mordidos.
Certo dia Laurinha viu que Potira havia pegado uma de
suas bonecas. Laurinha foi tentar tomar, ela rosnou feio, mas
Laurinha não se deixou intimidar. Foi enfiar a mão na boca dela
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para tomar. Esta soltou a boneca com a intenção de morder em
Laurinha. E desta vez, Laurinha sentiu medo.
Viu que Potira estava mesmo muito brava. Sofia, que
estava só observando, viu quando Potira ia morder pra valer em
Laurinha. Então rapidamente, mas tão rapidamente que Laurinha
não conseguiu acompanhar o movimento dela. Sofia deu um
pulo e deu uma surra, mas uma surra tão grande em Potira, que
esta nunca mais avançou em Laurinha. Nunca mais. Laurinha
olhou agradecida para Sofia e lhe disse:
- Muito bem Sofia, educou a sua filha. Todos riram,
refeitos do susto.
Foi muito triste quando Sofia adoeceu. Ficou muitos dias
doente. Pneumonia, disse o veterinário. Por mais que tivessem
tentado, não teve jeito, ela se foi para sempre, foi para a cidade
dos anjos dos cachorros, lhe disse sua avó. Ela já estava bem
velhinha, porque cachorro envelhece muito depressa, explicou a
irmã de Laurinha, ainda com os olhos cheios de lágrimas.
Fizeram o enterro de Sofia e colocaram muitas flores em seu
túmulo.
Um mês depois, quando Laurinha se levantou e foi ao
quintal, viu Potira estendida no chão. Gritou sua mãe e esta
chegando comprovou que Potira estava morta. Ninguém nunca
soube do que ela morreu. Laurinha achava que tinha sido de
tristeza pela perda da mãe. Já a irmã de Laurinha, que morava
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em outra cidade, e estava passando férias em sua casa, achava
que Potira havia sido envenenada. Ficaram todos no “achismo”
e nunca se soube realmente a verdadeira causa da morte.
Logo depois da morte das duas cachorras Laurinha
ganhou a Lola, que era da raça labrador. Esta fora doada pelo
primo, que ficou com pena de Laurinha que andava muito triste
desde que perdera suas cachorras.
Laurinha se apaixonou logo pela Lola apesar de não
gostar do nome, que não combinava em nada com ela. Mas
como Lola já era Lola, Lola ficou. Lola era uma cachorra “morta
de fome” como dizia a mãe de Laurinha. Comia tudo que lhe
davam. E o que não lhe davam também. Estava sempre à
espreita, vendo se alguém, distraidamente esquecia alguma
guloseima fácil de ser alcançada. Lola adorava doce de qualquer
espécie. Não podia ver o barulho
de alguém desenrolando uma
bala que vinha correndo e se
sentava esperando a sua. E
quando não lhe davam, chorava
até que não aguentando mais o
barulho, davam-lhe o doce.
E tinha também a Lili,
uma cachorrinha pequena e
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feiosa – Laurinha dizia que só sua mãe a achava feiosa.
Laurinha a achava linda e muito engraçada. Era pequena, branca
e tinha umas orelhas enormes. Tinha o rabo quebrado, por isso
cresceu todo torto. Já chegou, na verdade, apareceu na casa de
Laurinha com esse rabo quebrado. Já não doía mais. E Laurinha
se afeiçoou a ela e imediatamente a adotou. Ela chegou com
uma barriga enorme e o resto do corpo magro. Alguém deve tê-
la abandonado ali. A mãe de Laurinha deu remédio contra
vermes e logo Lili estava boa. Laurinha brincava muito com as
cachorras. Agora sim estava mais feliz e já até não chorava mais
pela morte de Sofia e Potira.
Laurinha, além dos animais que eram seus amigos, tinha
muitas amigas meninas, com quem brincava. Gostava de brincar
de pular corda, de chocolate inglês, de pega-pega e cola-cola,
entre outras brincadeiras.
Tinha também muitas primas: a prima Liane, que era
mais velha. Mas se davam muito bem. Liane morava com a avó.
(a avó de Liane era sua tia).
Liane morava na casa ao lado da sua. A casa delas ficava
no mesmo terreno, que era enorme e chamavam de chácara.
Liane, apesar de ser mais velha nove anos, gostava de brincar e
Laurinha se divertia muito com ela. As duas gostavam de
animais, gostavam de tomar banho no rio, e de uma porção de
brincadeiras. Mas tinha dias que Liane acordava meio brava e
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Laurinha ficava com um
medinho que logo passava. O
que Laurinha mais gostava
mesmo era quando Liane lhe
ensinava artes marciais.
Aprendeu muitos golpes.
Laurinha ficava se achando a
mais forte porque nenhuma de
suas coleguinhas de escola sabia artes marciais. Liane também
lhe ensinou o nome de todos os ossos que tinha a mão humana.
E até fez um desenho para lhe mostrar.
Laurinha achou muito feia a
imagem, mas aprendeu direitinho os
nomes de alguns ossinhos. De todos
era impossível. Somente sua prima
mesmo que sabia. Mas quando queria
saber se alguma de suas amigas era
inteligente, sempre lhe perguntava se
sabia o nome dos ossinhos da mão.
Não saber era para ela, sinal de ignorância. Claro que ela não
aprendera todos, mas sabia o suficiente para se achar muito
sábia. Então, orgulhosamente lhes dizia: os ossos da nossa mão
estão divididos em CARPO, METACARPO E DEDOS.
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E orgulhosamente citava uns 4 que eram mais fáceis de
aprender:
_ TRAPÉZIO - que lhe lembrava uma as escaladas nas
árvores do quintal.
_ RÁDIO – lembrava o radinho vermelho que sua ficava
ouvindo o dia inteiro.
_ PIRAMIDAL – que lembrava as pirâmides que via nos
filmes.
_ FALANGE E FALANGINHA. Dois nominhos muito
bonitinhos e que lembrava o grilo falante.
E saber estes já era uma enorme vantagem em relação às
colegas.
Certo dia Laurinha resolveu testar a inteligência da
professora e lhe perguntou se sabia os nomes dos ossinhos da
mão.
Laurinha percebeu que a professora não sabia. Esta olhou
Laurinha com aquela raiva de quem é pego em flagrante e
rispidamente lhe disse que este não era o assunto da aula,
mandando-a se sentar imediatamente. O que Laurinha
prontamente obedeceu com medo de ganhar uma punição afinal,
havia descoberto que a professora não sabia tanto assim.
Contou para a professora que sabia os nomes dos
ossinhos, mas não podia dizer que ela e sua prima sabiam mais
do que ela, que era professora.
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Laurinha tinha também a
amiguinha Clara.
Era uma grande amiga.
Brincavam juntas e nunca
brigavam. Tinha ainda muitas outras amigas na escola. E não
tinha nem uma inimiga. Todas brincavam juntas. Mas a
nenhuma Laurinha contava seu segredo. Somente sua prima
sabia, mas não falavam sobre isso. Não havia necessidade.
A vida de Laurinha era sempre muito alegre, mas quando
sua avó ficou doente a alegria de Laurinha diminuiu.
Sua avó
era uma pessoa
muito dinâmica.
Ela havia
comprado um
fusquinha verde.
Sua avó ficou
conhecida como a
“veinha” doidinha do fusquinha verde. Ela comprou o fusquinha
e aprendera a dirigir sozinha. Bem, a mãe de Laurinha sempre
dizia que ela na verdade sua avó nunca aprendeu a dirigir,
porque nunca tirou carteira de motorista. Mesmo assim dirigia e
gostava de passear com suas amigas, que eram velhinhas como
ela.
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Laurinha não gostava de ver sua avó sofrendo. Sempre vira
sua avó alegre e sorridente. Agora ela sentia fortes dores e
Laurinha se entristecia por não poder ajudá-la a sentir menos
dor.
Sua avó havia perdido toda a alegria e ficava sempre
muito triste. Certo dia sua avó lhe chamou e lhe disse que em
breve iria morar lá no céu. Laurinha não gostou nem um pouco
desta ideia de sua avó viajar para tão longe. Mas disse para sua
avó que caso ela fosse mesmo, ela iria visitá-la, quando o pé de
jaca alcançasse o céu.
Até que um dia sua mãe lhe disse que sua avó havia ido
morar com os anjos do céu. Laurinha ficou muito abatida porque
amava muito sua avó, mas tinha a certeza que logo, logo, iria
visitá-la lá no céu.
Logo depois desta notícia triste, a mãe lhe deu outra
notícia, que também era muito triste: teriam que se mudar para
uma outra cidade, que ficava
muito distante de onde sempre
viveram, Laurinha ficou mesmo
muito abatida.
Teria que deixar tudo: sua
casa, seu quartinho tão querido,
sua prima, sua tia, suas amigas,
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seus animais, e seus parentes que sempre se juntavam nos finais
de semana.
Tudo iria mudar. Teria que enfrentar uma nova escola,
fazer novas amigas e ficar longe de sua casa, da família e de
todos os seus animais.
Laurinha, apesar de ser uma menina muito alegre, nestes
dias ficou realmente muito triste.
Mas a mudança foi inevitável. Aconteceu apesar de sua
vontade de ficar. E não puderam levar nem um de seus animais.
Alguns tiveram que ser doados. Outros ficaram com sua tia e
sua prima.
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Capítulo 2
A nova cidade era bem pequena. A casa em que foram
morar era bem menor e tinha um “quintalzinho” insignificante:
minúsculo e nem uma plantinha sequer. Nem “umazinha”, se
entristecia Laurinha.
Sua mãe comprou uma rottweiler filhote e sua irmã deu a
ela o nome de Mulan.
Laurinha não
gostou muito do nome,
mas Mulan ficou.
Sua mãe
ganhou uma outra
cachorrinha, de raça
pequena, vira-lata. A
esta Laurinha deu o
nome de Livi. E tinha
um orgulho danado ao
dizer que a raça de sua
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cachorra era vira-lata.
Mulan foi criada, nos primeiros meses, no apartamento
de sua irmã, que era casada e morava em outra cidade.
Mulan foi muito mimada. Tornou-se uma cachorra
manhosa e estressada. Não gostava de ficar para o lado de fora
da casa, porque assim fora criada até os seis meses. Ela queria
estar o tempo todo junto com as pessoas. Laurinha até achava
que Mulan não se sentia cachorra e sim gente.
Livi era boazinha e não se importava em ficar na
varanda. Ela nunca aprendeu a latir. Quando tentava latir gritava
como se estivesse apanhando.
Laurinha gostava de ver Livi bocejando. Fazia
igualzinho a uma pessoa. Ela achava muito engraçado.
Assim que se mudaram, Laurinha logo descobriu que na
rua em que moravam não morava nem uma menina. Só
meninos: uns 10. Mas Laurinha não gostava de brincar com
meninos. E também não gostava muito de brincar sozinha.
A escola em que sua mãe lhe matriculou era particular.
Teria que pagar para estudar. Sempre estudara em escola
pública, mas sua mãe preferiu esta porque lhe disseram que era
boa. Além do mais já estavam em outubro, pertinho de terminar
o ano letivo.
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Era uma
escola bem
bonitinha, com
poucos alunos.
Em sua sala de
aula, apenas oito
alunos. Cinco meninos e três meninas. Agora com ela seriam
quatro meninas.
Logo no primeiro dia de aula conheceu e aprendeu o
nome de todos. Mas estava mesmo interessada era em brincar
com as meninas, em fazer novas amigas.
Ana era moreninha, baixinha e tinha
uma cara de brava. Olhava para Laurinha
com uma cara de pouco amiga. Mas
Laurinha achou melhor não julgá-la. Sua
mãe havia lhe ensinado que não se deve
julgar as pessoas antes de conhecê-las. E
ainda dizia que mesmo depois de conhecê-las deveria tentar
entender os motivos pelos quais as pessoas agiam desta ou
daquela maneira. Tudo isso ia lhe passando pela cabeça
enquanto observava suas colegas de sala.
Dora era loirinha, olhos verdes e tinha uma cara de
menina mimada. Ai, meu Deus, já estava fazendo julgamentos
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novamente. Laurinha pensou:
“não tenho jeito mesmo” e
esboçou um sorriso imaginando
o sermão que sua mãe lhe faria.
Maria era sapeca, alegre
e muito animada. Foi a primeira
a se aproximar. Foi logo
dizendo:
- Oi Laurinha. Que bom
que você veio para nossa sala.
Deu-lhe um abraço bem amistoso. Sentou-se ao seu lado e quis
saber tudo. De onde vinha, como era a outra escola, onde
morava, o que fazia nos finais de semana. E logo já a convidou
para passar a tarde de domingo em sua casa. No que Laurinha
aceitou imediatamente. Era nova na cidade e não tinha nenhuma
amiga.
Eram apenas ela e a mãe, que era professora de filosofia
na universidade. Laurinha não sabia bem o que era filosofia,
mas um dia entenderia, lhe dizia a mãe. O que importava mesmo
é que sua mãe era amorosa e muito sua amiga.
Os dias que se seguiram à sua chegada na escola não
foram fáceis. Por mais que tentasse se enturmar, Ana não lhe
dava trégua. Comandava o trio das meninas e poucas vezes
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permitia que ela participasse das brincadeiras. Dizia que tinham
um clube fechado e que ninguém mais entraria.
Maria muitas vezes deixou de brincar com elas e veio
brincar com Laurinha. Passou a gostar muito de Maria, até foi
passar o domingo em sua casa. Gostou muito porque brincaram
bastante. E logo marcaram outros finais de semana juntas.
Mas na escola ainda se sentia triste por não se sentir
aceita principalmente por Ana. Dora era completamente
dominada por Ana. Fazia tudo que Ana lhe dizia para fazer.
A professora era maravilhosa. Dava-lhe toda atenção do
mundo. Laurinha até chegou a achar que passara a ser a sua
aluna preferida. Era sempre elogiada pela professora. E ficava
feliz quando esta lhe dizia que ela era uma excelente aluna,
afinal gostava muito de estudar. Mas percebia que todas as vezes
que a professora a elogiava, Ana ficava com cara de brava.
Muitas vezes Laurinha
procurou brincar com as meninas
menores da escola, mas não via muita
graça uma vez que elas eram mais
novas e não brincavam do que ela
gostava.
Laurinha chegava em casa
triste e cabisbaixa. Sua mãe já andava
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preocupada e procurava animá-la. Dizia que logo ela seria
aceita, que isso seria apenas no começo. Provavelmente Ana
sentia ciúmes e tinha medo de perder as amigas, mas isso
passaria, “não se preocupe minha filha”, ela sempre dizia.
Vendo que estava demorando muito a passar, a mãe de
Laurinha resolveu ir conversar com a professora. Esta lhe disse
que Ana era complicada mesmo, que desde o primeiro ano
estudavam as três na mesma sala. Que Ana sempre fora assim,
possessiva com Dora e Maria. Que nunca aceitou outras
meninas entre elas.
A professora disse que já havia percebido o que estavam
fazendo com Laurinha e que estava procurando fazer com que
estas se dessem bem, mas que não havia tido grandes
progressos. Prometeu tomar medidas mais drásticas.
Vendo que a exclusão continuava, a professora fez uma
reunião com as quatro e falou que estava muito indignada com o
que estavam fazendo e que se não mudassem de atitude, iriam
sofrer penalidades severas.
Neste dia Laurinha chegou em casa animada. Disse que
elas a haviam aceitado no clube e que haviam prometido que
seriam suas amigas.
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Belo engano
de Laurinha. No dia
seguinte Ana a
acusou de fofoqueira
e disse que agora a
professora havia se
voltado contra ela.
Que Laurinha era a
única culpada. E
ainda acrescentou: -
você vai se
arrepender.
Agora, além de triste, Laurinha também ficou
amedrontada porque nunca havia vivido uma situação
semelhante. Será que Ana se vingaria mesmo?
A mãe de Laurinha resolveu convidar as três pra irem
passar a tarde de
domingo em sua casa.
Ligou passa as mães e
combinou de buscá-
las. Fez brigadeiro,
pipoca e sanduiche
natural com suco de
laranja para esperá-las.
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Quando chegaram, chamou as quatro e disse que queria
conversar com elas. Falou da exclusão que Laurinha vinha
sofrendo. Que Laurinha sofria muito com isso, que elas
deveriam encará-la como mais uma amiguinha que iria somar
com elas, e ainda disse mais um monte de coisas que os adultos
sempre dizem.
Todas ficaram muito sem graça, negaram a exclusão e
prometeram que Laurinha seria muito bem tratada. Brincaram
bastante durante
todo o resto do dia.
A mãe de Laurinha
sempre observando,
não notou nada de
anormal.
Brincaram de pega-pega, de boneca, de desfile, de
escorregar na varanda já que na casa de Laurinha não tinha
piscina, mas a diversão foi a mesma.
Brincaram até o final do dia quando a mãe de Laurinha
as levou para suas casas. Todas haviam se comportaram muito
bem e se divertido muito.
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No dia seguinte Laurinha levou
amendoim cri-cri para o lanche de todas
elas. O dia foi bom e as brincadeiras
também. Laurinha estava feliz como
nunca estivera. Pela primeira vez não
estava triste por ter saído de sua antiga
cidade. Chegou até a pensar em lhes
contar seu segredo, mas resolveu que
ainda não podia confiar plenamente.
E assim se passou uma semana
sem que fosse excluída, mesmo notando que Ana ainda se sentia
incomodada com sua presença no grupo.
Laurinha tinha cabelos negros, nem curtos nem muito
longos. Usava uma franja e todas a chamavam de branca de
neve. Tinha a pele
branquinha e os
cabelos negros, o que
fazia um belo
contraste. Os olhos
eram grandes e tinham
cor de mel. Ela sempre
tinha um sorriso nos
lábios.
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Ana tinha os cabelos cacheados e bonitos, mas estava
com eles sempre presos.
Ana começou a implicar com os cabelos de Laurinha,
sempre lhe dizendo que deveria cortá-los ou prendê-los. Maria e
Dora também usavam os cabelos sempre presos. Laurinha não
sabia se era por imposição de Ana ou porque gostavam mesmo.
Laurinha dizia que não iria cortar e nem prender seus
cabelos. Gostava deles exatamente como estavam.
Um dia, estavam brincando de pega-pega e Ana ao pegar
Laurinha, deu um forte tapa em sua cabeça. Laurinha tomou um
susto e gritou:
- Ai Ana, não precisa me dar um tapa deste tamanho.
Ana saiu dando sonoras gargalhadas.
Maria se aproximou da Laurinha e percebeu algo
grudado em seus cabelos.
- LAURINHA, VC ESTÁ COM CHICLETE
GRUDADO EM SEU CABELO!
Laurinha passou a mão e percebeu bem no lugar do tapa
que Ana havia lhe dado, um bolo de chicletes e cabelo.
Foi correndo ao banheiro para se olhar no espelho. Lá
estava Ana se acabando de dar risadas. Eu não lhe disse que
você me pagaria? Agora experimenta contar para a professora
que você se arrependerá muito mais.
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Ana não sabia o que fazer. Decidiu não contar à
professora. Contaria somente a sua mãe.
Mas Maria contou para a professora. Esta colocou Ana
de castigo e depois chamou a mãe de Ana na escola e lhe contou
tudo que sua filha estava aprontando. A mãe disse que não
voltaria a acontecer porque tomaria providencias.
Chegando em casa Laurinha contou p sua mãe. Ela teve
que cortar um pouco de seu cabelo, mas mesmo assim Laurinha
continuou linda e se parecendo mais ainda com a branca de
neve. No dia seguinte, quando Ana a viu já foi lhe dizendo que
tomara uma grande surra e que a culpa era dela, que ela iria se
arrepender mais ainda.
Diante da ameaça, a mãe de Laurinha compareceu à
escola para falar com a diretora. Esta disse que tomaria
providências. Mas as providencias não foram tomadas e o
assunto ficou esquecido.
O tempo passava e nada mudava. Ana continuava a
hostilizar Laurinha e sempre que conseguia, aprontava alguma.
Assim se passaram os dias e Laurinha continuou sendo excluída.
Laurinha, que sempre gostara de ir para a escola, não via a hora
de entrarem as férias.
Até que finalmente o ano letivo terminou.
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Capítulo 3
Durante as férias Laurinha viajou muito pouco e brincou
pouco também.
O que a alegrou foi que
ganhou de sua madrinha uma
linda bicicleta de natal e sua
mãe resolveu comprar uma
maior para ela, assim
poderiam passear. E foi o que
fizeram. Andaram muito de
bicicleta.
As férias estavam terminando e Laurinha, que iria para o
quarto ano, queria sair daquela escola, mas sua mãe preferiu
deixá-la na mesma porque o ensino era de muito boa qualidade.
Quem sabe entrariam outras meninas e ela faria amizade com
elas.
Mas a turma era a mesma, não entrara nem saíra
ninguém.
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Logo no primeiro dia Laurinha fora hostilizada por Ana,
que lhe disse assim que a viu:
- Não mudou de escola não? Pensei que esse ano não ia
ver sua cara!
- Não, não mudei. A escola não é sua, respondeu
Laurinha. Ficou triste, mas se consolou porque Maria lhe deu
um caloroso abraço e sua professora a recebeu com muito
carinho.
Logo chegou o
carnaval e a mãe de
Laurinha fez uma fantasia
linda de bruxinha para ela.
A festa era na quadra do
centro da cidade.
Lá ela encontrou as
três coleguinhas. Maria,
assim que a viu ficou logo
animada e a convidou para
brincar com elas. Laurinha
ficou tão animada que não
deu bola para a cara
amarrada de Ana, que
estava sem fantasia – disse que achava brega usar fantasia – e
não gostou nem um pouco de vê-la se juntando a elas.
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A mãe de Laurinha
estava atenta e percebeu a
exclusão de Laurinha feita
por Ana. Como havia se
sentado ao lado da mãe de
Maria, comentou com ela
sobre a exclusão que
Laurinha vinha sofrendo
desde o ano anterior. A mãe de Maria lhe disse que a conhecia
desde pequena, que Ana sempre fora assim: geniosa, e
autoritária.
As duas mães se sentaram para ver as filhas brincarem.
A mãe de Laurinha percebia que Ana sempre procurava
correr puxando Dora e Maria, fazendo questão de deixar
Laurinha para trás. E Laurinha, coitada, corria e as alcançava. A
mãe de Maria chamou as quatro e deu uma bronca, dizendo-lhes
que era para esperarem por Laurinha. Mas Ana ignorou. Não
dava a mínima para a bronca. E continuou agindo como se não
tivessem falado com ela e puxando as duas da mesma maneira.
Em um certo momento Maria chegou correndo e dizendo
que Laurinha havia se machucado. As mães correram e
encontraram Laurinha caída no chão, chorando de dor.
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- Como ela
caiu? Quis saber sua
mãe, mas ninguém
sabia explicar. Então
Laurinha disse: - Ana
colocou o pé para que
eu tropeçasse e caísse.
Ana imediatamente disse ser mentira, e saiu, sem
maiores explicações.
A mãe de Laurinha a levou até o hospital, mas graças a
Deus não havia quebrado nada. Somente os joelhos ainda
sangravam, estavam bem machucados. Foi feito o curativo e
foram para casa.
No dia seguinte, na sala de aula, Ana chegou bem perto
de Laurinha e disse: gostou do tombo que lhe dei. Este foi meu
segundo aviso. Acho melhor você sair desta escola, ou se
arrependerá.
Ao chegar em casa contou para sua mãe o que Ana havia
lhe dito.
A mãe de Laurinha não conseguia entender por que uma
criança agia assim. Geralmente as crianças são puras e ingênuas.
Mas Ana não. Era geniosa e maldosa
A mãe de Laurinha pediu uma reunião com a professora
e com a diretora e comunicou que Laurinha sairia da escola.
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Quando chegou em casa a mãe de Laurinha recebeu um
telefonema da mãe de Ana, que estava bem nervosa, dizendo
que ficara sabendo que tiraria Laurinha da escola por causa de
sua filha. A mãe de Laurinha confirmou que era verdade. A mãe
de Ana ficou furiosa e disse uma porção de coisas. Coisas ruins,
mas que a mãe de Laurinha preferiu não lhe contar.
Laurinha, apesar de sentir vontade de sair daquela escola
ficava um pouco apreensiva. Havia sofrido tanto e tinha medo
de ir para outra escola e acontecer o mesmo. Tinha medo de não
ser aceita pelas meninas da sala, ainda mais porque o ano letivo
já havia iniciado.
Sua mãe estava irredutível. Ela a matricularia em outra
escola. E assim o fez.
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Capítulo 4
A outra
escola escolhida
era uma escola
pública, com 28
alunos na sala.
Sua mãe comprou o uniforme e em seu primeiro dia já foi
uniformizada.
Chegou receosa, cabreira.
A professora a apresentou aos colegas e lhe indicou a
cadeira e a mesinha onde se sentaria.
Ela contou e tinha nove meninas. Com ela dez.
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Na sala encontrou Eva, filha de uma amiga de sua mãe,
que já havia ido brincar algumas vezes em sua casa. Uma
menina boazinha, que a tratava bem. Uma amiga pelo menos eu
tenho aqui, pensou. E já se sentiu mais confiante.
Na primeira semana tornou-se amiga de todas. Todas
simpáticas e simples. Todas brincavam juntas e ninguém
discriminava ninguém.
Laurinha estava mesmo muito satisfeita em sua nova
escola.
Duas meninas passaram a ser suas melhores amigas:
Vanessa e Franciele.
As três passaram a andar sempre juntas. Mas nunca
discriminavam as outras meninas que ali estudavam. Brincavam
com todas. Nos finais de semana sempre se reuniam na casa de
Vanessa. Era uma casa linda, um sobrado. Tinha um grande
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quintal e na frente uma piscina. Muitas vezes Vanessa
convidava todas as meninas da sala para irem passar a tarde de
domingo em sua casa e todas brincavam muito.
Certo dia, a mãe de Laurinha estava conversando com os
pais de Vanessa, na porta da escola e estes lhe contaram que
antes Vanessa estudara na mesma escola particular e que haviam
sido obrigados a tirá-la de lá porque esta estava sendo excluída,
adivinhem por quem? Isso mesmo: por Ana.
As meninas chegaram à conclusão que o que sentiam em
relação à Ana era uma grande pena. Afinal ela estava perdendo a
chance de ter muitas amigas.
Logo que entrou nesta
escola Laurinha recebeu uma
cartinha que a deixou muito
chateada.
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A cartinha era de um menino. O mais bagunceiro da sala:
o Matias. Este lhe dizia que estava apaixonado. Que se
apaixonara por ela desde o primeiro dia em que a vira. Laurinha
ficou muito brava. A vontade dela era lhe dar uma surra. Eles lá
tinham idade para pensar nessas coisas?
Laurinha se lembrava que sua mãe sempre lhe dizia:
“aproveite sua infância, seja criança e faça o que criança gosta
de fazer. Brinque bastante porque a infância passa muito rápido
e não volta nunca mais.” E era isso que ela queria: aproveitar
sua infância. Brincar.
Matias começou a perturbá-la. Ficava mandando
recados, passava por ela jogava beijos. Saía de sua carteira e ia
até a de Laurinha com a uma desculpa qualquer. Pegar um lápis
emprestado, uma borracha ou coisa assim.
Laurinha o detestava. Não estava na idade de pensar em
namoro. Queria mesmo era se divertir com suas amigas.
Resolveu lhe escrever uma cartinha. Nela ela lhe dizia
que se esquecesse dela. Que ela nunca iria namorar com ele.
Nunca. Que eles eram crianças para pensar nestas coisas de
namoro e que tinha planos para seu futuro, e que ele, Matias,
não fazia parte destes planos.
Como não queria entregar pessoalmente, pediu para um
colega, o Felipe entregar, aproveitando o horário do intervalo.
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Laurinha logo percebeu que não havia sido uma boa
ideia. Assim que recebeu a cartinha, Matias a leu. Depois com a
voz bem alta gritou para os outros colegas: eu e Laurinha
estamos namorando. Acabei de receber uma cartinha dela
dizendo que aceita namorar comigo.
Laurinha ficou vermelhinha de vergonha e de raiva. Na
verdade era um ódio quase incontrolável. Odiou Matias mais
ainda porque viu o quanto ele era mentiroso, e o que fazia para
chamar a atenção dos colegas. A vontade que Laurinha tinha era
de esganá-lo. Saiu correndo e quase chorando foi para a sala de
aula.
Suas amigas correram junto com ela e lhe disseram que
encontrariam uma forma de desmenti-lo. Combinaram de se
encontrar na casa da Vanessa no dia seguinte. Resolveram fazer
um chá da tarde com todas as meninas da escola e aproveitariam
para encontrar uma solução para o caso de Laurinha.
À noite Laurinha ajudou sua mãe a fazer sanduiche
natural para levar no dia seguinte. Cada uma das meninas levaria
um prato pronto.
Laurinha estava ansiosa. Tanto para participar do chá da
tarde que seria com muitas brincadeiras quanto para
encontrarem uma solução para o acontecido na escola.
No dia seguinte, na casa de Vanessa, brincaram muito,
fizeram brincadeiras na piscina, comeram, brincaram
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novamente. Fizeram concurso de canto, fizeram uma gincana e
tantas outras brincadeiras.
Quando anoiteceu os pais buscaram seus filhos. E só
quando chegou em casa Laurinha se lembrou que também iriam
procurar uma solução para o caso “Matias”.
No dia seguinte foi para a sala de aula meio receosa.
Nesse dia Matias não a incomodou. E nos dias seguintes
também não. Laurinha acreditava que ele entendera que tinha
ido longe demais.
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Depois de alguns dias Laurinha ficou sabendo que houve
a intervenção da professora. Ela ficou sabendo, pediu a cartinha
de Laurinha para ver e depois deu um sermão em Matias,
prometendo uma série de castigos caso ele continuasse a
perturbar Laurinha.
Laurinha estava muito feliz. Matias não a perturbava
mais. As meninas da escola todas gostavam dela, e tinha duas
grandes melhores amigas.
Resolveu convidar as três amigas para irem passar o
domingo em sua casa. Não tinha piscina, mas poderiam inventar
um monte de brincadeiras interessantes.
A brincadeira que Laurinha mais gostava era jogar sabão na
varanda e escorregar. Era uma maneira muito legal de se
divertir.
Quando
elas chegaram
adoraram a
brincadeira de
escorregar na
varanda. Foi
uma tarde
muito
divertida.
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Laurinha pensou que finalmente poderia compartilhar
com elas que tinha um segredo.
Sentiu que elas ficaram muito curiosas. Prometeu que
contaria na próxima semana em que se encontrassem.
No final de semana seguinte, reuniram-se na casa de
Francine. Uma casa pequena, mas também muito acolhedora.
Brincaram bastante, mas as duas estavam muito curiosas em
saber seu segredo. Tanto Franciele quanto Vanessa disseram que
também tinham um segredo.
Laurinha havia levado para cada uma delas uma
correntinha de prata com um pingente de um coraçãozinho
vermelho de cristal, que pedira para a mãe comprar.
Disse a elas:
- Vamos fazer um pacto de amizade. O que falarmos, que
for segredo, não poderemos contar para ninguém.
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Todas concordaram.
Usariam as correntinhas
para sempre. Não as
tirariam mais. E guardariam
segredo.
Combinaram que cada uma contaria um segredo que
seria guardado pelas outras.
Vanessa se dispôs a revelar seu segredo primeiro: mas
antes fez com que prometessem não o revelar para ninguém.
Todas prometeram
Então Vanessa contou: detestava ser gordinha. Todas
ficaram admiradas. Ela parecia tão “descolada”, tão “de boa”.
Ninguém imaginava
que ela sofria por ser
gordinha.
- Sim, eu
sofro. Afirmou
Vanessa. Mas não
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revelem a ninguém. Porque enquanto pensam que eu não ligo,
não ficam me “zoando”. Sou gordinha desde pequena. Não
como muito, mas não emagreço. E não gosto de ser gorda. Mas
nem minha mãe sabe que sofro em ser gordinha. Portanto, não
contem para ninguém.
Prometeram novamente não contar.
Agora era a vez de Franciele.
Ela revelou que tinha uma paixãozinha pro Rafael. Que
tinha essa paixão desde quando estudaram juntos pela primeira
vez. Todas ficaram admiradas. Nunca nem imaginaram. Afinal
um nem olhava para o outro.
- Finjo não gostar para disfarçar, disse Franciele. Não
quero ninguém me “zoando” também.
E todas juraram manter o segredo de Franciele.
Então Laurinha contou o seu segredo: tinha sido adotada.
Sua mãe a adotou quando ainda era bebezinha. Mas nunca lhe
escondera que não era sua mãe biológica. Era sua mãe do
coração. Ela sabia que sua mãe a amava tanto quanto amava sua
irmã, que era filha biológica. Ela sabia que sua família a amava
muito. Nunca se sentira excluída da família. Era um segredo,
mas que nunca a incomodara. Só não gostava de ficar
comentando porque muitas pessoas eram preconceituosas e não
entendiam que adoção era um gesto muito grande de amor. Mas
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Laurinha entendia muito bem o que era adoção, porque sua mãe
havia lhe explicado direitinho.
Todas juraram não revelar os segredos que ali ouviram.
Seria o segredo delas. O segredo das correntinhas de prata.
Assim resolveram se denominar: “as correntinhas de prata”.
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Capítulo 5
Os dias foram passaram e Laurinha sentia-se muito feliz.
Tinha tudo que uma criança poderia desejar.
Mas um dia, chegando na escola, o Matias, que não a
havia perturbado mais, falou bem alto: a Laurinha é adotada.
Laurinha levou um choque. Não que se importava em ter
sido adotada porque tinha muito orgulho de sua mãe e de sua
família. Todos a amavam e ela amava a todos. Tinha isso bem
resolvido. Mas ouvir assim, de repente, no meio de todos os
colegas, soou como se fosse uma coisa errada, como se fosse um
defeito. Mesmo sabendo que não era, a sensação ao ouvir da
boca de Matias aquela frase, não lhe fez bem.
Resolveu fazer de conta que não ouvira.
Mas no dia
seguinte, praticamente
todos os meninos de
sua sala estavam
chamando-a de
“adotada”.
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Laurinha ficou muito triste porque sua mãe sempre agira
em relação à adoção com naturalidade. Sua mãe lhe dizia todos
os dias e às vezes até mais de uma vez, que a amava muito. E ela
sabia que era verdade.
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Mas o que mais a estava perturbando era o fato de ter
sido traída por uma de suas melhores amigas.
Restava saber qual delas não era sua amiga verdadeira.
Qual não era digna de ser uma “correntinha de prata”.
Chamou as amigas em um canto e perguntou qual delas
havia revelado seu segredo. As duas juraram não ter revelado
nada. Mas Laurinha sabia que a conversa havia saído de uma
delas.
Muito chateada, principalmente por acreditar não poder
mais confiar em suas amigas, resolveu se afastar um pouco das
duas.
As duas juraram que não havia sido nem uma delas. Mas
Laurinha estava irredutível. Não confiava mais. Sentia-se muito
traída.
Apesar disto, não pediu de volta as correntinhas de prata.
Até deu vontade, mas decidiu não pegar de volta porque estas já
não lhe pertenciam mais. Havia dado de presente e presente não
se toma.
Apesar de tudo, todas continuaram usando as
correntinhas de prata, inclusive Laurinha.
Os meninos da escola logo esqueceram e não a
perturbaram mais com o assunto. Mas Matias não. Continuava
chamando-a de “adotada”.
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Laurinha já estava muito irritada com Matias. Então ela o
puxou com força pela camisa e lhe disse muito seriamente:
- Eu realmente fui adotada pela minha mãe. A sua mãe
teve você como filho. Ela não pode escolher se queria você
mesmo como filho. Se eu fosse ela nem tivesse querido se
soubesse que você era assim tão chato.
_ Agora, a minha mãe, ela me escolheu. Ela me escolheu
como filha. E isso para mim é motivo de muito orgulho.
Entendeu agora ou quer que desenhe?
Matias sacudiu a cabeça e saiu correndo.
Nunca mais fez nem um comentário sobre isso.
Laurinha acredita que ele enfim entendera o que
significava ser “adotada”.
Mas Laurinha ainda estava incomodada com o fato de
uma de suas amigas ter revelado seu segredo.
Alguns dias depois Franciele marcou uma reunião em
sua casa. Disse que era muito importante.
Laurinha pensou em não ir. Mas resolveu dar um voto de
confiança a Franciele.
Chegando lá, foram diretamente para o quarto de
Franciele.
Ela disse que havia descoberto o que havia acontecido.
Havia descoberto como o segredo de Laurinha tinha se
espalhado:
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Ela tinha um diário. Um diário trancado, com uma
corrente grossa e um cadeado azul . E neste diário havia escrito
o seu segredo e também o segredo de suas amigas. Havia escrito
o segredo das “correntinhas de prata”.
Franciele disse que um dia quando chegou em casa, viu
que o cadeado de seu diário estava quebrado e aberto. Tentou
descobrir como isso acontecera, mas nem sua mãe, nem seu pai
e muito menos seu irmão sabiam como isso acontecera. O irmão
de Franciele tinha 11 anos e estudava na mesma escola que elas.
Franciele continuou contando:
- Ontem, eu cheguei em casa e dei uma briga com meu
irmão e ele me jogou na cara que lera meu diário. E ainda rindo
disse:
- apaixonadinha pelo Felipe, aiaiai.
Ele era o responsável pelos segredos espalhados. Ele
quem contara para o Matias.
Franciele pediu desculpas e prometeu que nunca mais
escreveria segredo nenhum em seu diário.
Laurinha ficou aliviada ao ver que suas amigas não
haviam lhe traído. Mesmo tendo tido seu segredo revelado, o
que mais a tinha deixado magoada era a desconfiança que ficara
em relação a suas queridas amigas.
Voltaram a ser grandes amigas e a passar os finais de
semana juntas divertindo-se muito.
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Capítulo 6
Laurinha ainda continuava amiga de Maria e de vez em
quando ia passar uma tarde em sua casa para brincarem e
quando isso acontecia, elas se divertiam pra valer!
Numa destas vezes em que foi passar a tarde com Maria,
esta lhe deu uma notícia que a deixou apreensiva.
Maria lhe disse que Ana iria mudar de escola e
provavelmente iria para a mesma escola que Laurinha estudava.
Para Laurinha, a notícia não poderia ser pior. Não
conseguiu gostar de Ana e tinha lá suas razões.
Mas uma certeza Laurinha tinha: sabia que ali seria
diferente. Ana teria que se adaptar às colegas de sala porque ela
estaria chegando, além do mais não viria com as amigas da outra
escola. Viria sozinha.
Era segunda-feira e mal entrou na sala Laurinha já viu
Ana sentada, com a cara amarrada que quem está muito
insatisfeita com tudo.
Laurinha entrou, foi até a cadeira de Ana e lhe disse oi.
Ana respondeu oi, com uma cara de pouco amiga. E já foi logo
lhe dizendo que gostaria de ter ido para a outra sala e que só não
foi porque não tinha vaga.
Laurinha ficou quieta. Foi para sua cadeira e esperou a
aula ter início.
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Por três dias Ana não saiu da sala na hora do intervalo,
mas também não perturbou ninguém. Ficava com a cara
amarrada e simplesmente não falava com ninguém e não
respondia o que lhe perguntavam.
Depois do terceiro dia, Laurinha, que havia prometido
para si mesma não se envolver com Ana, ficou com dó e
resolveu chamá-la para brincar.
Ana aceitou, mas disse que só brincaria se aceitassem
brincar do que ela gostava. Aceitaram. Brincaram bastante.
Nos dias que se seguiram Ana continuou brincando, mas
começou a revelar seu jeito autoritário. Queria decidir tudo,
implicava com todas as meninas, gritava com elas. Dizia que a
escola que ela estudava era melhor, que as amigas que tinha lá
eram melhores e muitas outras coisas que não agradavam em
nada às meninas da sala.
Tentou ainda, formar um clube com três meninas,
prometendo excluir todas as outras, tentou com várias meninas
da sala, mas nenhuma estava disposta a abrir mão de brincar
com todas as outras.
Aos poucos, uma a uma foi se afastando de Ana.
Ninguém queria mais brincar com ela.
Ana passou a ficar pelos cantos, sozinha. Ninguém sentia
vontade de brincar com ela.
Laurinha sabia que Ana estava sendo excluída
simplesmente porque ela mesma afastara todas as outras
crianças com seu jeito autoritário.
Laurinha percebeu que Ana agora estava sentindo na
pele o que era ser excluída. Não que as crianças a evitassem por
maldade, mas porque não achavam agradável brincar com Ana.
Criança gosta de brincar com quem sabe brincar. E Ana não
sabia brincar.
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Ana aos poucos foi percebendo que sua autoridade ali
não funcionava. Que as meninas não a obedeciam. E sentia
muita raiva por não ser obedecida.
Laurinha se lembrou que Ana sempre fizera com que os
outros perdessem. Agora ela estava perdendo.
Mas Laurinha não se sentiu vitoriosa e nem alegre por
ver Ana passando por tudo isso. Ela havia passado por isso e
sabia o quanto era ruim ser excluído. Não gostava de ver
ninguém sendo excluído, mesmo que fosse Ana.
Ana via como as meninas se divertiam, como ficavam
alegres e aos poucos foi entendendo que ali naquela escola não
tinha uma que mandava nas outras. Que todas ora concordavam
ora discordavam, mas continuavam amigas.
E Ana era criança. E criança gosta de brincar. Criança
sente falta de brincar. Ana morria de vontade de brincar.
Ana percebendo que ninguém mais iria convidá-la para
brincar, chegou até Laurinha e disse:
_ Laurinha, você podia falar com as meninas para me
deixarem brincar também, eu estou muito triste sem brincar.
Laurinha, prontamente conversou com suas amigas e
pediu para aceitarem Ana de volta às brincadeiras. Pediu por
favor, pediu muito e afirmou que Ana não agiria mais daquela
forma mandona, que ela estava arrependida.
Tanto pediu que as meninas resolveram fazer um teste.
Se Ana se mostrasse receptiva, se brincasse “de boa”, então não
se oporiam ao fato de ela brincar com elas.
Ana, que não era boba nem nada, compreendeu que ser a
chata da escola era muito chato. Percebeu que ser excluída era
mesmo muito ruim. Então pediu desculpas a Ana e a Vanessa
pelo que havia feito a elas na outra escola.
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A partir deste dia Ana percebeu que ter muitas amigas é
muito melhor do que ter duas amigas apenas. Aprendeu também
que não há necessidade de mandar e nem de obedecer. Que
quanto mais crianças nas brincadeiras, mais divertidas eram.
Laurinha estava muito feliz por ver que Ana na verdade
não era uma menina má. Que era geniosa, mas que acima de
tudo era uma criança como qualquer uma.
E quando Laurinha fez sua festinha de aniversário
convidou todos os seus colegas, inclusive Ana.
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