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Outubro de 2012
Joaquim Miguel Mendes Martins
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Os profissionais de Reconhecimento e Validação de Competências: análise crítica de um processo de profissionalização
Dissertação de Mestrado Mestrado em Ciências da EducaçãoÁrea de Especialização em Educação de Adultos
Trabalho realizado sob a orientação do
Doutor Manuel António Ferreira da Silva
Universidade do MinhoInstituto de Educação
Outubro de 2012
Joaquim Miguel Mendes Martins
Os profissionais de Reconhecimento e Validação de Competências: análise crítica de um processo de profissionalização
ii
Declaração
Nome: Joaquim Miguel Mendes Martins
Endereço eletrónico: miguelxlmartins@gmail.com
Telefone: 966807384
Número do Cartão do Cidadão: 11401295
Título da tese: Os profissionais de Reconhecimento e Validação de Competências: análise
crítica de um processo de profissionalização.
Orientador: Doutor Manuel António Ferreira Silva
Ano de conclusão: 2012
Designação do Mestrado: Ciências da Educação. Área de especialização em Educação de
Adultos
É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTA DISSERTAÇÃO APENAS PARA EFEITOS DE
INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE
COMPROMETE.
Universidade do Minho, ___/10/2012
Assinatura: ________________________________________________
iii
Os profissionais de Reconhecimento e Validação de Competências: análise crítica
de um processo de profissionalização
Resumo
Nesta dissertação examinou-se o processo de profissionalização dos profissionais de
Reconhecimento e Validação de Competências (RVC), uma das ocupações enquadradas no
Aconselhamento e Orientação, uma área de crescente relevância no campo da Educação e
Formação de Adultos (EFA). Essa ocupação profissional surge com a implementação do Sistema
Nacional de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC) em 2001.
Considerou-se este processo de profissionalização como a obtenção e desenvolvimento de
saberes e competências específicos com dois propósitos: o incremento do profissionalismo, valor
normativo referido ao desempenho profissional, e a construção de identidades profissionais, ou
seja, modos particulares de identificação e de apresentação.
Na análise desse processo consideraram-se as práticas dos profissionais de RVC nas
articulações entre: a) as transformações no mundo de trabalho e os contextos de aprendizagem
dos indivíduos; b) as especificidades institucionais do campo da EFA e os discursos institucionais
relativos ao desenvolvimento profissional dos trabalhadores desse campo; c) a valorização social
e económica das aprendizagens experienciais, a emergência dos sistemas de RVCC e o
desenvolvimento de atividades profissionais relacionadas com o Aconselhamento e Orientação.
No desenvolvimento destas práticas profissionais específicas foram determinantes as
aprendizagens realizadas por «ajustamentos sucessivos» no âmbito do contexto de trabalho e
em função de atributos, estratégias e conveniências individuais. Os saberes específicos assim
desenvolvidos complexificam a sua sistematização e condicionam a distintividade e
reprodutibilidade dos mesmos. Outros espaços de aprendizagem foram considerados na sua
complementaridade com as aprendizagens obtidas em contexto de trabalho.
Também se verificou que as identidades profissionais são plurais. Existe uma diversidade de
matrizes identitárias com múltiplas referências resultantes dos processos de socialização (como
assimilação de hábitos e procedimentos comuns a grupos, organizações ou instituições
específicas) e das estruturas de oportunidade, ou seja, as formas como cada indivíduo
perceciona o seu «horizonte de expectativas» face à avaliação do seu «espaço de experiência».
iv
Counsellors of Recognition and Validation of Competences: critical analysis of a
professionalization process
Abstract
This dissertation examined the professionalization process in Counselors of Recognition and
Validation of Competences (RVC), one occupation inscribed in Counseling and Guidance, a
practice of growing significance in the field of Adult Education. This practitioner emerged with the
implementation of the National System of Recognition, Validation and Certification of
Competences (RVCC) in 2001.
We approached this process of professionalization as a procedure to obtain and increase specific
skills and knowledge with two main purposes: the development of professionalism, a normative
value referred to professional performance, and of professional identities, i.e., particular modes
of identification and presentation.
In the analysis of that process we considered the Counselors of RVC practices in the relation
between: a) the changes in the world of work and personal learning environments, b) the
institutional specificities of the field of Adult Education and the institutional discourses related to
professional development within that field, c) the social and economic value of experiential
learning, the emergence of systems of RVC and the expansion of professional activities related to
Counseling and Guidance.
In the improvement of counseling practices it was influential a mode of learning by «successive
adjustments» considering the individual attributes and strategies as well the plurality of personal
conveniences within the workplace. The specific knowledge thus developed implicates a complex
systematization affecting its own distinctiveness and reproducibility. We also considered other
learning spaces in its complementarity with workplace learning.
It was also demonstrated the plurality of professional identities. There is a diversity of identities
with multiple references resulting from the socialization processes (as assimilation practices and
procedures common to groups, organizations or institutions) and from the structures of
opportunity, i.e., the ways in which each individual perceive the «horizon of expectations» in
relation with his own assessment of their «space of experience».
v
Índice
Índice de Figuras ...................................................................................................................... vi
Índice de Quadros .................................................................................................................... vi
Lista de Abreviaturas ............................................................................................................... vii
Pontos de partida: do que se pretende dar conta ........................................................................1
Do estado da coisa: configurações da mudança .....................................................................4
Definindo o tema: um processo de profissionalização .............................................................6
I. Opções e estratégias de investigação ................................................................................... 12
A entrevista biográfica semiestruturada: possibilidades e constrangimentos ......................... 17
O distanciamento crítico: especificidades e obstáculos ..................................................... 19
Apontamento: as entrevistas e os entrevistados ............................................................... 23
II. Desenvolvimento profissional dos agentes EFA .................................................................... 25
Agentes e profissionais no campo da EFA: uma resenha ..................................................... 32
Articulação com outros agentes sociais e sectores da sociedade ...................................... 36
Condições laborais, de remuneração e estatuto profissional ............................................. 38
Formação inicial e contínua – a sua valorização .............................................................. 39
Aprendizagem ao Longo da Vida e o discurso da Qualidade ............................................. 43
Processos de profissionalização e o profissionalismo ....................................................... 54
III. Os profissionais de RVC: um processo de profissionalização ............................................... 62
O Sistema Nacional de RVCC .............................................................................................. 63
Da ANEFA à DGFV: um pouco de história… ..................................................................... 65
A Iniciativa Novas Oportunidades e a ANQ ....................................................................... 70
Apontamento: a ANQEP .................................................................................................. 79
Profissionais de RVC: emergência e centralidade ................................................................. 82
Aconselhamento e Orientação: um campo de práticas emergentes .................................. 85
Práticas profissionais e práticas reflexivas ........................................................................ 91
Configurações e definições das práticas .......................................................................... 94
Tecnicização da prática: administração, monitorização e auditabilidade ......................... 104
Identidades profissionais ............................................................................................... 108
Espaços e processos de aprendizagem: o contexto da profissionalização ....................... 113
Formação inicial e contínua ........................................................................................... 114
Conclusões: do que se deu conta .......................................................................................... 124
Bibliografia ........................................................................................................................... 132
vi
Índice de Figuras
Figura 1 - Evolução da Rede de Centros (RVCC e Novas Oportunidades) .................................. 73
Figura 2 - Fluxograma das Etapas de Intervenção dos Centros Novas Oportunidades ............... 79
Índice de Quadros
Quadro 1 - Tipologia dos Centros Novas Oportunidades ......................................................... 105
vii
Lista de Abreviaturas
AEA – Aprendizagem e Educação de Adultos
ANEFA – Agência Nacional para a Educação e Formação Profissional
ANQ – Agência Nacional para as Qualificações
ANQEP – Agência Nacional para as Qualificações e Ensino Profissional
CNE – Conselho Nacional de Educação
CNO – Centro Novas Oportunidades
CONFINTEA – Conferência Internacional de Educação de Adultos
CQEP – Centro de Qualificação e Ensino Profissional
CRVCC – Centro de Reconhecimento, Validação e certificação de Competências
DGFV – Direção Geral de Formação Vocacional
EFA – Educação e Formação de Adultos
INO – Iniciativa Novas Oportunidades
OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
POPH – Programa Operacional Potencial Humano
RVC – Reconhecimento e Validação de Competências
RVCC – Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências
SIGO – Sistema Integrado de Informação e Gestão de Oferta
SNRVCC – Sistema Nacional de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências
TDE – Técnico de Diagnóstico e Encaminhamento
UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura
1
Pontos de partida: do que se pretende dar conta
A importância de os trabalhadores desenvolverem os seus saberes de forma contínua e
adaptarem-se, em termos pessoais e profissionais, às constantes mudanças que ocorrem nas
sociedades e economias, tornou-se um truísmo amplamente consensualizado.
Ainda que aprender e ensinar seja um predicado dos seres humanos (Illeris, 2003; Freire
P., 2007), frequentemente, encaram-se essas capacidades na sua vertente mais instrumental e
adaptativa. Neste sentido particular, aprender «ao longo e ao largo» da vida é percecionado,
mais do que uma possibilidade, como um imperativo (Lima, 2010). Porventura os trabalhadores
mais expeditos consigam reagir diligentemente e enfrentar estrategicamente o conjunto de
mudanças que ocorrem nos diversos campos do social (na economia, na política, na cultura, na
educação, etc.) e que se repercutem, claro está, no seu quotidiano e contexto de trabalho. Como
refere Robert Lindley,
“no cenário actual, existe um crescente número de áreas do mapa das ocupações em que se pede às
pessoas que assumam responsabilidades cada vez maiores pelas respectivas situações de trabalho:
pede-se que obtenham os conhecimentos e as competências necessários ao seu trabalho, em primeiro
lugar, e que os actualizam de maneira adequada, que se assegurem de que possuem a informação
necessária à execução das tarefas próprias do seu emprego, que reajam com criatividade às exigências
da mudança e que tomem a iniciativa sempre que identificarem oportunidades de desenvolvimento que
beneficiem a organização. Por sua vez, a organização deve facilitar este processo, ou seja, “capacitar”
cada pessoa e grupo de trabalho para desempenharem este papel (Lindley, 2000, p. 50).
No reforço da «empregabilidade», os processos de aprendizagem e a aquisição de
melhores padrões de qualificação são assumidos como a obtenção de «vantagens competitivas»
por parte dos indivíduos e passam pelo desenvolvimento de “condições de controlo de
vulnerabilidade do próprio mercado de trabalho” (Ferreira & Costa, 1998, p. 159).
Nem que seja discursivamente, sustenta-se que através das atividades de educação,
formação e aprendizagem, ao longo da vida, numa lógica de «pedagogização» da sociedade e
dos problemas sociais e económicos (Correia, 2001, p. 26; Silva, 2006, p. 242; Lima, 2010, p.
51), além de se desenvolverem diferentes saberes e de se facilitar a integração no mercado de
trabalho também se permitiria uma maior segurança e adaptação a contextos sociais e
económicos de grande imprevisibilidade e turbulência (Edwards, 1997, pp. 26-27; Kovács,
2002, pp. 13-41).
Articulam-se, portanto, posturas de antecipação, preventividade e reatividade: os
indivíduos gerem o desenvolvimento da sua trajetória profissional - «não-linear», «turbulenta» e
2
«disruptiva» (Pais, 2003, pp. 9, 87, 105) - através da ponderação e reflexividade individuais,
relativamente às mudanças e necessidades futuras.
Como refere Jean-Pierre Boutinet (1996, pp. 104-113), o projeto vocacional do adulto, um
processo racionalmente elaborado e referido a objetivos e aspirações individuais, considerado
enquanto uma «realização de si», assentaria em três dimensões da vida de trabalho: a
possibilidade de emprego, as condições de exercício da atividade e a mobilidade profissional.
Notamos, tal como Boutinet, que ter ou não ter emprego faz toda a diferença! Considere-
se a limitação de ofertas de emprego, a precariedade laboral e as taxas de desemprego
crescentes e pondere-se nas suas consequências, tanto em termos individuais como em termos
sociais. Além desta possibilidade objetiva, associe-se também o que pode ser designado por
“desemprego subjetivo” (ou «subemprego»), ou seja, a tendência para que, aumentando o nível
de qualificação escolar, aumente o desconforto em relação a labores percecionados como
repetitivos e desqualificantes (Boutinet, 1996, p. 110).
Similarmente, as condições de exercício da atividade profissional, numa dimensão
individual e particular, a aplicação de saberes específicos no cumprimento de um ofício ou de
uma profissão, influem no referido projeto vocacional. Este torna-se possível na articulação da
vivência e experiência de uma identidade profissional específica e envolve, sempre que possível,
a mobilização de capacidades de escolha e decisão e a expressão da sua autonomia.
Ao mesmo tempo, numa lógica de desenvolvimento profissional que contribua para a
definição da sua identidade profissional - aqui entendida como o reconhecimento de si (por si
mesmo e pelos outros) - o indivíduo, ao possuir a “impressão de se realizar, ao defrontar-se
[com] tarefas, ou responsabilidades, cada vez mais complexas” (Boutinet, 1996, p. 111),
procurará o aumento dos seus saberes e competências técnicas que o tornem, gradualmente,
um «perito» na sua atividade profissional.
Porém, impõe-se a questão de saber se esse processo de evolução (de responsabilidades
e competências) é considerado como um processo contínuo em termos cognitivos e temporais.
Nesta época de hegemonia da «melhoria contínua» (o sistema Kaizen), quais serão as condições
ou fatores para que o trabalhador considere que existe uma possibilidade de progressão ou, por
outro lado, um «ponto de saturação» relativamente aos saberes e competências necessários
para o desempenho das suas funções?
A terceira dimensão com influência na definição de um projeto de carreira relaciona-se
com a possibilidade de dispor de uma relativa mobilidade profissional. Nessa mobilidade
3
implicar-se-ão distintos atributos e condicionantes que poderão coibir ou impulsionar esse desejo
de mudança. Entre outros possíveis, destacamos, por exemplo, a cultura de referência, a família
e idade de cada indivíduo e até a sua rede de relações.
Nos seus quotidianos, os indivíduos confrontam-se, frequentemente, com uma complexa e
tensa relação entre riscos e oportunidades que os impele a diferenciar as contingências
individuais (e sociais) e a decidir concordantemente. Ponderar as mudanças parece implicar um
questionamento permanente das prioridades a estabelecer, mediante a perceção que se tem do
valor e sentido das próprias mudanças, bem como das suas características, das suas
possibilidades e das implicações previstas e não previstas (Giddens, 2000b; Beck, 2001).
No entanto, acrescendo a essa suposta possibilidade de controlo e de direcionamento,
numa espécie de «determinação racionalizante», suscitadas por essa reflexividade, Boutinet
refere uma outra possibilidade, a que confronta desejo de mudança e a redução da capacidade
decisória e controlo da ação, advinda de sobredeterminações: “o adulto deseja operar rupturas,
muitas vezes por intermédio de crises que não permitem uma restruturação e planificação de
uma nova etapa” (Boutinet, 1996, p. 112).
Por isso, do ponto de vista dessa capacidade reflexiva resulta que, para os indivíduos, os
contextos (pessoais, económicos e políticos, por exemplo) possam não ser propícios e, assim,
em determinados momentos das suas vidas, senão na maior parte, o grande objetivo do projeto
de carreira passe por conservar o próprio posto de trabalho pelo maior tempo possível.
José Machado Pais revela as duas éticas que se «entrelaçam» no quotidiano profissional,
em função de diversas circunstâncias de vida, e que resultam em diferentes e ambivalentes
dilemas e confrontos: a ética tradicional do trabalho, marcada pelo desejo de segurança e pelo
desejo de correspondência e a ética de aventura, marcada pelo desejo de novas experiências e
pelo desejo de reconhecimento (Pais, 2003, p. 21).
No rescaldo dos confrontos, muitas vezes, adia-se, indefinidamente, a possibilidade de
mobilidade vertical, ou seja, a obtenção de ‘melhores’ empregos, e ponderam-se possibilidades
de mobilidade lateral que implicam reconversões profissionais forçadas, face ao risco de
desemprego ou desejadas, como forma de concretizar a mudança. Pretende-se, acima de tudo,
evitar as situações percecionadas como de retrocesso: o desemprego ou o emprego encarado
como de menor qualidade.
4
Do estado da coisa: configurações da mudança
As circunstâncias de vida são compostas por nós e configuradas no mundo em que nos
situamos1, um mundo que, de acordo com Zygmunt Bauman, é caracterizado pela
«fragmentação», pela «descontinuidade» e pela «inconsequência». Numa observação que sugere
como se constituem as diversas trajetórias individuais e que, nas suas diversas implicações,
poderia ser tomada por pessimista ou fatalista, o sociólogo alerta:
“Num mundo assim é avisado e prudente não fazermos planos a longo prazo ou investirmos no futuro
distante (nunca podemos saber de antemão em que se vão tornar amanhã a atracção dos fins hoje
sedutores ou o valor dos trunfos presentes); não nos agarrarmos demasiado a um lugar, grupo de
pessoas, causa ou sequer auto-imagem particular, deixarmo-nos ir não só sem lançarmos âncora e à
deriva, mas sem âncora sequer; guiarmo-nos nas escolhas presentes não pelo desejo de controlar o
futuro, mas pela relutância que sentimos em hipotecá-lo. Por outras palavras, «sermos previdentes»
significa hoje na maior dos casos evitarmos o empenhamento. Estarmos livres de movimentos quando
uma ocasião bate à porta. Estarmos livres de partir quando deixa de bater” (Bauman, 2007, p. 269).
Neste tal mundo onde nos achamos, os espaços e contextos laborais resultam, entre
outros possíveis, da combinação de três fenómenos que originaram múltiplas implicações nas
maneiras como as identidades, trajetórias e possibilidades profissionais são definidas e
experienciadas. São eles: 1) as reestruturações setoriais e ocupacionais; 2) a emergência e
consolidação de formas atípicas de trabalho; e 3) o desenvolvimento de lógicas de flexibilização
laboral.
Num processo de décadas, mais notoriamente a partir da década de 1970, verificaram-se
diferentes reestruturações sectoriais e ocupacionais que passaram principalmente pela
terciarização da economia, com a verificação da predominância de emprego no sector dos
serviços2 e com a concomitante diminuição de emprego nos primeiros e segundos sectores
1 Nas palavras de Karl Marx: "Os homens fazem a sua própria história mas não a fazem arbitrariamente, nas condições escolhidas por eles, mas antes sob as condições directamente herdadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações passadas pesa inexoravelmente sobre a consciência dos vivos. E mesmo quando parecem ocupados em transformar-se, a eles e às coisas, em criar algo de absolutamente novo, é precisamente nessas épocas de crise revolucionária que se evocam respeitosamente os espíritos do passado, tomando-lhes de empréstimo os nomes, as palavras de ordem, as roupagens, para surgir no novo palco da história sob esse respeitável disfarce e com essa linguagem emprestada" (Marx, 1975, p. 13). 2 Crescem as ocupações profissionais em cinco grupos principais: 1) atividades relacionadas com a prestação de serviços principalmente no sector da alimentação e das tarefas domésticas (empregados de limpeza, pessoal doméstico, pessoal de manutenção e reparação, etc.); 2) atividades de gestão administrativa alta e intermédia (executivos, assessores legais, rececionistas); 3) atividades relacionadas com o cuidado e a atenção física pessoal (enfermeiros, fisioterapeutas, etc.); 4) atividades relacionadas com as ocupações no sector eletrónico (engenheiros, programadores e especialistas de apoio, etc.) e 5) as tarefas relacionadas com as novas necessidades sociais e o entretenimento - trabalhadores sociais, peritos em educação especial, professores, assistentes educativos e de apoio escolar, etc. (Tezanos, 2001, pp. 100-101).
5
(Castells, 2005, pp. 266-290). A crescente feminização3 do mercado de trabalho, concebida
enquanto a participação de mulheres empregadas no sector terciário, foi um outro aspeto dessas
reestruturações (Casaca, 2005, pp. 56-60).
Paralelamente, constatou-se a emergência e consolidação de formas atípicas de trabalho e
a consequente diversificação de modelos laborais e vínculos contratuais (alguns dos quais
precários ou precarizantes). Atualmente, coexistem diferentes modalidades (laborais e
contratuais) que revelam uma diversificação do entendimento jurídico e social da relação de
trabalho e que afetam os relacionamentos laborais a vários níveis: trabalho a tempo inteiro e
parcial; trabalho por turnos; contratos de duração determinada; trabalho temporário;
subcontratação/outsourcing; empregos de inserção (contratos de emprego-formação, estágios,
formações em alternância, contratos de emprego/solidariedade); e até teletrabalho (Cerdeira,
2000, pp. 35-40; Kovács, 2005, pp. 22-46).
Também o desenvolvimento de lógicas de flexibilização laboral, a nível individual e
organizacional, concorreu para a configuração do mercado de trabalho atual. A flexibilidade e a
flexibilização são encaradas como soluções preferenciais para a crescente competitividade
global. Tornou-se conceito, política e discurso determinantes na problemática das mudanças
organizacionais, da gestão do processo produtivo e na configuração do relacionamento laboral
(sobretudo em termos de tempos de trabalho; de estabilidade no emprego; da localização física
da organização e na dissolução do «contrato social» entre empregador e empregado (Castells,
2005, p. 348).
Há uma certa ambiguidade na abordagem da flexibilização. Se, num certo sentido, remete
para algo desejável concebendo-se enquanto a «eliminação da rigidez», num outro sentido mais
«material», traduz-se em algo adverso que passa sobretudo pela desregulação legislativa e
laboral, pelo aligeiramento do peso fiscal sobre empresas e indivíduos e pelo enfraquecimento
dos relacionamentos que, tradicionalmente, se estabeleciam no mercado de trabalho e que
implicavam noções de segurança laboral. Percebida no seu sentido mais prejudicial, seja em
termos pessoais ou em termos sociais, a flexibilidade traduz-se em
“uma maior facilidade na aceitação do despedimento, possibilidade de aumentar e diminuir os salários,
expansão dos empregos a tempo parcial e a prazo, mudança mais frequente de trabalho, de empresas e de
lugar” (Dahrendorf, 1996, pp. 23-24).
3 Devido ao desenvolvimento de atividades tidas como femininas, ou seja, que “requerem atributos socialmente reconhecidos às mulheres, designadamente competências emotivas e relacionais”, que dependendo da perspetiva poderá corresponder a uma integração e participação no mercado de trabalho e/ou a fenómenos de “diferenciação e segregação” de género (Casaca, 2005, p. 57).
6
São as alterações na subordinação económica e jurídica e nas suas implicações (a
precarização laboral e a insegurança no emprego, a retração da retribuição salarial, a
intensificação e transformação dos tempos de trabalho, a perda de diversos benefícios sociais,
etc.) suscitadas pelas referidas reestruturações sectoriais e ocupacionais, pelas transformações
no relacionamento e na regulação laboral e pelo lema da flexibilidade, que parecem justificar
cada vez mais o desenvolvimento de lógicas ideologicamente específicas para a aprendizagem
ao longo da vida (Kovács, 2002, pp. 14-25; Griffin, 1999a).
Neste contexto sociopolítico e económico, é essa subordinação e instrumentalização dos
diversos saberes e competências técnicas, profissionais e sociais resultantes dos processos de
aprendizagem, em múltiplos espaços e contextos, que se valoriza (Lima, 2004). Parece ser
através da amplificação dos espaços e processos de aprendizagem e da própria constituição da
experiência no «mundo da vida» como fonte de aprendizagem que se permitirá a adaptação às
diversas mudanças socioculturais, tecnológicas e organizativas. É nessas articulações e
interdependências que se devem contextualizar a análise das relações da educação, formação e
o trabalho. Como convenientemente sintetiza João Freire:
“A mensagem que se procura fazer passar, nomeadamente para as novas gerações, associa o
aprender e o trabalhar como duas dimensões de um mesmo problema, cuja responsabilidade principal
repousa nas mãos de cada indivíduo. A ele cabe adquirir e pôr em prática competências próprias, seja
como assalariado, como independente ou como responsável de uma iniciativa empresarial. Devendo a
sociedade (e os poderes públicos) compreender e apoiar estas dinâmicas, do próprio dependerá contudo
o seu melhor ou pior sucesso.
Neste sentido, tal discurso não deixa de legitimar a economia de mercado concorrencial actual,
bem como o processo de individualização em curso – uma das características fundamentais, de resto,
da modernização social. Resta saber se, nesta individualização, a competição exacerbada não tolherá o
passo às vertentes da autonomia e da responsabilidade que também estão presentes no exercício da
Profissionalidade” (Freire, 2002, p. 318).
Definindo o tema: um processo de profissionalização
Como temos examinado, construiu-se todo um discurso que sugere que a aquisição
permanente de qualificações e competências, considerando os constrangimentos e
características dos mercados de trabalho em transformação, é relevante para a construção das
identidades individuais e para a definição das diversas trajetórias profissionais.
São inúmeras e multidimensionais as possibilidades de análise e discussão relativas, por
exemplo: ao questionamento da «centralidade do trabalho» (Estanque, 2007; Maar, 2006); às
7
metamorfoses na natureza do trabalho e na estrutura de emprego (Kovács, 2002, pp. 63-79);
aos fenómenos de polarização da estrutura ocupacional (Castells, 2005, pp. 287-289); aos
múltiplos fenómenos de precarização, tais como a pluriatividade, a intensificação de trabalho, a
retração salarial e horários antissociais, etc. (Hespanha, et al., 2001, pp. 29-36).
Nessa complexidade também se pode considerar os diversos relacionamentos entre
educação, formação e trabalho (Santos B. S., 1999, pp. 168-178; Kovács, 2002, pp. 63-94;
Correia, 2003, pp. 13-41), designadamente, a relação entre educação e desenvolvimento
económico (Lopes, 2010, pp. 70-92), a relação entre a escola e o mercado de trabalho (Saúde,
2010, pp. 103-132), as desigualdades escolares e a seletividade económica (Mendes, 2011, pp.
81-91), entre outros.
Referindo o ponto de vista da nossa análise, inevitavelmente fragmentário, pretendemos
direcionar a nossa atenção para dois aspetos que conceberemos nas suas articulações: como
são produzidas e contrastadas “racionalidades e oportunidades alternativas para a acção dentro
de campos profissionais e periciais específicos” (Beck, 2001, p. 48); e os modos como os
diversos saberes e os seus processos de desenvolvimento são compreendidos na configuração
de uma profissionalidade específica, ou seja, pretendemos perspetivar como se procede à
“articulação de saberes heterogéneos e a sua transformação em competências operatórias”
(Correia, 2003, p. 31).
Considerando a amplitude do campo da Educação e Formação de Adultos (EFA),
direcionamos a nossa investigação para a emergência e configuração de uma ocupação e
atividade profissional específica: os profissionais de Reconhecimento e Validação de
Competências (RVC).
Pretendemos abordar as condições de desenvolvimento profissional dessa ocupação,
considerando as suas especificidades, através da análise das condições, espaços e tempos em
que se ampliam os diversos saberes que configuram esse novo perfil profissional.
Designaremos por processo de profissionalização a obtenção e desenvolvimento de
habilidades, competências e conhecimentos e, em alguns casos, qualificações ou credenciais
específicas, visando dois grandes propósitos: o desenvolvimento do profissionalismo, valor
normativo que fundamenta disposições e noções particulares relativas a um desempenho
profissional que se pretende «eficiente e de qualidade» (Evetts, 2011), e a construção de
identidades profissionais mutuamente identificáveis pela partilha de uma linguagem específica,
8
de um referencial comum de conduta e de um corpo de conhecimentos coletivos (Santos,
2011).
Como sustenta António Nóvoa, deve-se analisar o processo de profissionalização em torno
dos dois eixos em que este se manifesta: na definição do «corpo de saberes e saberes-fazer» e
no «conjunto de normas e de valores» (Nóvoa, 1995, p. 9).
Nos processos de profissionalização implicam-se outros fatores que enquadram a
configuração das identidades profissionais, do desenvolvimento do profissionalismo e dos
diferentes processos de aprendizagem. Um desses aspetos é relativo às condições de trabalho
que influem diferentemente nos processos de aquisição de saberes e competências.
Os diversos trabalhadores do campo da Educação e Formação de Adultos são
confrontados na sua prática profissional com as diversas alterações que vão ocorrendo no
mundo de trabalho. Devido às especificidades desse campo (capítulo II), essas alterações
afetam, de formas distintas, as atividades e ocupações profissionais do campo da Educação e
Formação de Adultos, sobretudo em função das diferentes condições de trabalho. Constatam-se
diferentes lógicas de precaridade laboral (Research voor Beleid; PLATO, 2008), que suscitam
diferentes contradições, dilemas e perturbações que derivam dos contextos e características
específicas do campo de práticas profissionais e influenciam os seus trabalhadores, profissionais
de RVC incluídos, a diversos níveis pessoais, familiares e sociais.
Além de serem agentes difusores da relevância da aprendizagem no mundo
contemporâneo, uma mensagem com reconhecida importância simbólica na forma como o seu
discurso profissional é constituído, também recai sobre eles essa mesma «imperatividade».
Também parece ser o agente de EFA condicionado a crer em discursos específicos da
aprendizagem - tomados como «operadores ideológicos de legitimação» (Correia, 2001) - como
possibilidade e necessidade adaptativa para o enfrentamento de um mundo em mudança.
Também a ele é solicitado o desenvolvimento contínuo dos seus saberes e competências, não só
para aumentar a qualidade do seu desempenho profissional mas também para aumentar a sua
empregabilidade.
No entanto, pelas lições da própria prática, verifica-se que as relações entre os processos
de qualificação e o desenvolvimento de competências nem sempre são harmoniosas. A
qualidade dessa relação dependerá também da situação de emprego em termos de estabilidade
e da configuração do próprio trabalho. Como Ilona Kóvacs, também consideramos que
“quando os indivíduos se encontram em condições de insegurança existencial, de falta de perspectivas e
de confiança quanto à melhoria da sua situação profissional, não estão reunidas as condições mínimas
9
para poder responsabilizá-los pela renovação das suas competências. Esta responsabilização apenas é
possível quando o indivíduo se encontra numa situação de trabalho e de vida em geral, numa posição no
mercado de trabalho interno e externo, que lhe confere confiança, o estimula a pensar em projectos de
futuro e, ao mesmo tempo, lhe confere a possibilidade, o interesse e a capacidade de auto-
aprendizagem. Propor a responsabilização individual pela renovação constante das suas competências
nas actuais condições de desemprego, de emprego periférico e precário, revela tanta ignorância quanto
às condições sociais mínimas dessa responsabilização, como insensibilidade social e irresponsabilidade
política” (Kovács, 2002, p. 74).
A estas particularidades associa-se a crescente articulação entre a configuração específica
do campo da Educação e Formação de Adultos e o assomar em termos de visibilidade social de
determinados subcampos específicos, por exemplo, o Reconhecimento, Validação e Certificação
de Competências, e a invisibilidade crescente de outros subcampos da Educação e Formação de
Adultos (Lima, 2008; Cavaco, 2009; Guimarães, 2010a; CNE, 2011). Neste sentido, e por
inferência, as ocupações e atividades contextualizadas nesse campo profissional específico
possuem interesse analítico, pois apresentam algumas particularidades que têm vindo
gradualmente a ser estudadas (capítulo II): é uma ocupação de emergência e relevância
recentes; a sua configuração funcional é concomitante com a crescente valorização em termos
educativos, sociais e económicos dos saberes experienciais; essa valorização concretiza-se no
apoio e incentivo, em termos de definição de políticas, orientações e financiamento, por parte de
diferentes instituições, tanto em termos nacionais como por intermédio de organizações
internacionais como, por exemplo, a União Europeia, a UNESCO e a OCDE (capítulo II).
Desde o início da década de 2000, mas sobretudo a partir de 2006, foi crescendo em
relevância o número de pessoas a trabalhar enquanto profissionais de RVC. Paula Guimarães
(2010a) refere seis aspetos associados a uma «entrada massiva» de agentes de EFA a trabalhar
nos Centros Novas Oportunidades, que revelou um “forte cariz extensionista” e que
apresentaram diferentes implicações no campo das práticas profissionais: 1) a variedade de
formações iniciais (sobretudo no domínio das ciências sociais); 2) uma maior exigência em
termos de formação contínua; 3) o rejuvenescimento e a feminização dos agentes de EFA; 4) a
orientação e regulação normativa por parte da tutela institucional (ANQ) em relação às tarefas a
desempenhar e ao trabalho a desenvolver; 5) a alteração das tarefas práticas pedagógicas; 6) a
re-inclusão dos professores do ensino regular no grupo dos profissionais de Educação e
Formação de Adultos.
Sustenta a referida investigadora:
“Os profissionais que implementavam a política de educação e formação de adultos sugeriam a
existência de um novo profissionalismo atravessado por tendências políticas e perfis profissionais
10
diferenciados. Ainda, como resultado destes cruzamentos, emergiam identidades em mudança,
atravessadas por tensões muito distintas, entre a tradição escolar e uma abordagem educativa mais
inovadora, atribuíveis a dimensões de políticas de educação para a conformidade e para a
competitividade” (Guimarães, 2010a, p. 787).
No entanto, se esta profissionalidade, concebida enquanto a configuração e combinação
específica de saberes, desempenhos e identidades profissionais (Evans, 2008) é de emergência
recente, e mesmo que atualmente se vivam períodos conturbados e de indefinição, resultado das
reorientações político-partidárias, saliente-se que as temáticas relacionadas com o
desenvolvimento profissional daqueles que trabalham, de forma assalariada ou voluntariamente,
a tempo total ou parcial, no campo da EFA, não o são.
Como desenvolveremos no capítulo II, pelo menos desde a segunda Conferência
Internacional de Educação de Adultos (UNESCO, 1960) se vem destacando a relevância do
desenvolvimento profissional dos agentes de educação de adultos. No entanto, na atualidade
vem-se utilizando de forma mais gradual e recorrente o conceito de profissionalização para
sumariar essa necessidade. Tem-se considerado esse processo de
profissionalização/desenvolvimento profissional dos agentes de EFA como determinante no
crescimento da qualidade do campo da EFA e da participação e aprendizagem dos adultos
envolvidos. De facto, em múltiplos documentos institucionais refere-se a “falta de oportunidade
de profissionalização e de formação […] e o impacto negativo na qualidade da oferta de
aprendizagem e educação de adultos” (UNESCO, 2010b, p. 21) e o desenvolvimento profissional
como “uma das medidas vitais para melhorar a qualidade da aprendizagem” (Buiskool, Brook,
van Lakerveldal, Zarifis, & Osborne, 2010, p. 9).
O nosso interesse aumenta na medida em que, aprofundando-se esta problemática, se
reconhece que o conceito de profissionalização, e o que ele representa, possui uma pluralidade
de conotações e suscita diversas conflitualidades e tensões teóricas, políticas e ideológicas nos
debates que se desenvolvem no contexto do campo da EFA.
Essas diferentes características implicam que a operacionalização e a investigação de
problemáticas associadas à profissionalização dos agentes de Educação e Formação de Adultos
seja um desafio. Como refere Bernard Charlot numa entrevista concedida em 2010: “o trabalho
específico do pesquisador em ciências humanas é identificar e pensar sobre contradições”
(Charlot, 2010, p. 155), latentes e/ou manifestas.
Consideramos também que a investigação dos diferentes processos de profissionalização
possibilitará a perspetivação das alterações que estão a influenciar o campo da Educação e
11
Formação de Adultos, nomeadamente, nas suas tradições e ontologias. Ian Martin refere, por
exemplo, que a profissionalização, em termos de discurso e de processo, é um dos grandes
desafios que «desradicalizam» a Educação de Adultos (Martin, 2008).
De acordo com as diferentes abordagens do processo de profissionalização permitir-se-á
perspetivar como são enfatizadas e articuladas diferentes dimensões: as regras de orientação da
e para a ação; os debates sobre a capacitação ou credencialização da atividade profissional; a
definição de perfis de competências; a configuração do treino e preparação dos agentes de EFA;
a reflexão sobre o corpo especializado de conhecimento que lhe estão subjacentes; os diferentes
e divergentes quadros institucionais, organizacionais e legislativos que implicam a definição e
alterações das condições laborais, em termos de condições de trabalho e remuneração,
incentivo ou desincentivo da formação e atualização dos conhecimentos.
Julgamos ser necessário desenvolver reflexões, investigações, «mapas cognitivos» e
grelhas interpretativas que permitam a compreensão empírica dos processos de
profissionalização dos Educadores e Formadores de Adultos, em contextos organizacionais
diferenciados, nas suas motivações e na configuração das suas identidades profissionais
específicas:
“O que pode ajudar é o desenvolvimento da compreensão empírica dos processos de profissionalização
em situações onde estes não são formalmente dirigidos. É evidente que as pessoas agem com valores e
propósitos e desenvolvem conhecimento do que fazem quando ensinam adultos. No entanto, sabemos
pouco sobre essas motivações e processos. O profissionalismo pode não depender da obtenção de
qualificações formais. Diferentes formas, completas, incompletas ou semi-, podem emergir muito
diferentemente em diferentes contextos; os indivíduos são influenciados no desenvolvimento dos seus
sentidos de profissionalismo pelos contextos sociais e institucionais em que estão situados. Existem,
portanto, questões sobre o que aquelas possam ser. Quais as formas para uma identidade profissional
surgir e ser expressada?” (Jütte, Nicoll, & Olesen, 2011, p. 14).
12
I. Opções e estratégias de investigação
Quando se desenvolve uma atividade de investigação é curial revelar como se procedeu à
sua sistematização e também quais os «hábitos intelectuais» do investigador. Cumpre
especificar como foi desenvolvida a pesquisa nas suas diversas vertentes: desde as
considerações metodológicas e epistemológicas4 aos métodos e técnicas utilizadas.
De uma forma geral, na prática científica, sustenta-se que ao longo das atividades de
investigação devem-se desenvolver mecanismos de controlo e de «vigilância epistemológica»
sobre as diversas condutas implicadas (Bourdieu, Chamboredon & Passeron, 1999, pp. 11-22).
Devemos, portanto, abordar e refletir sobre as condições, formas e momentos da análise e,
igualmente, sobre as determinações exteriores ao processo de produção de conhecimentos que
se implicam nas práticas de investigação.
Não menos importante é especificar as lógicas internas («reconstruídas, normativas e
críticas») do processo de investigação, isto é, avaliando a metodologia utilizada, referir como se
procedeu à “organização crítica das práticas de investigação” (Almeida & Pinto, 1995, p. 92).
Para isso, expõem-se as razões para a escolha dos diversos métodos e técnicas de investigação
e abordam-se as formas como elas se relacionam, ou seja, explicita-se como se formalizou o
raciocínio de investigação.
As nossas opções no desenho e desenvolvimento da investigação passaram por analisar,
primordialmente, a articulação entre o desenvolvimento e a reconstrução de saberes contextuais
no exercício de uma prática profissional particular.
Importou-nos compreender como se formam e (re)configuram as disposições
(estruturas cognitivas que guiam os indivíduos ou determinam as suas ações num determinado
contexto), considerando quais as condições e modalidades de formação (Lahire, 2005). Num
momento inicial, serviram-nos algumas questões que Bernard Lahire já germinara:
“Será que essas disposições se podem ir apagando progressivamente, ou podem mesmo desaparecer
completamente, por falta de actualização? […] Poderemos avaliar os graus de constituição e de reforço
das disposições, segundo, nomeadamente, a frequência e a intensidade do treino seguido, distinguindo
assim as disposições fracas (crenças passageiras e friáveis, hábitos efémeros ou desajeitados) das
disposições fortes? Como é que as múltiplas disposições incorporadas, que não formam
4 Para João Ferreira de Almeida e José Madureira Pinto, “tanto a epistemologia como a metodologia abordam criticamente as práticas concretas de investigação à medida que estas se desenrolam, mas fazem-no a níveis diversos. A metodologia não pode, por um lado, ceder à tentação de iludir a relação de interioridade que mantém com essas práticas, nem furtar-se, por outro lado, aos controlos que sobre ela própria exerce a epistemologia. O que nem uma nem outra podem ser é um conjunto de receitas normativas e a-históricas destinado a promover garantias de cientificidade” (Almeida & Pinto, 1995, p. 98).
13
necessariamente um “sistema” coerente e harmonioso, se organizam ou se articulam?” (Lahire, 2005,
p. 17).
Considerando estas questões, incidimos a nossa análise nas trajetórias profissionais dos
profissionais de RVC, considerando a sua relação com a trajetória das aprendizagens individuais
e que na ótica do sujeito, e da nossa própria, apresentem significado no contexto da sua prática
profissional5.
Considerar este nível de análise – o das práticas profissionais – apresenta algumas
potencialidades que permite desafios de análise a um investigador que se posicione no âmbito
de uma estratégia de investigação qualitativa (Albarello, et al., 1997 , pp. 235-244).
Neste trilho de investigação, distintamente pluridisciplinar, investigar as práticas
profissionais possibilita analisar a forma como se aplicam os diversos conhecimentos e saberes -
os «saberes teóricos», os «saberes processuais», os «saberes práticos» e os «saberes-fazer»
(Malglaive, 1995, pp. 69-83), mobilizados no exercício de uma função e permitindo verificar
como é que os sujeitos, na pluralidade das suas disposições e experiências, orientam e
organizam a sua ação e se envolvem na resolução de problemas práticos (Lahire, 2005;
Walmsley, 2004).
Importou-nos refletir sobre como se relacionam as escolhas educativas e formativas e as
formas como se organiza e orienta o trabalho e a ação profissional. Pretendeu-se examinar como
os indivíduos processam as suas escolhas em termos de educação e formação e também como
estruturam os seus discursos, relativamente aos seus processos de aprendizagem.
Para captarmos essas diversas subjetividades e vivências educativas, passadas e
presentes, e considerarmos os projetos dos sujeitos, desenvolvemos uma abordagem
compreensiva que privilegiou o aprofundamento da análise, preocupando-nos em analisar, nos
discursos particulares dos sujeitos, as «gramáticas» que os organizam (Harvey, 1996, pp. 83-
84). Na linha deste autor consideramos que
“os discursos expressam o pensamento humano, fantasias e desejos. Eles também são alicerçados
institucionalmente, materialmente constrangidos, manifestações das relações sociais e de poder
experiencialmente fundamentados” (Harvey, 1996, p. 80).
5 Considerando o conteúdo, organização e estruturação do trabalho e também, por exemplo, as dimensões relacionais – com os adultos e com os colegas.
14
Dessa citação decorre que os discursos não podem ser perspetivados isoladamente e
abstraídos dos contextos em que são configurados. Enquanto manifestações da articulação de
diversos momentos do processo social, devem ser compreendidos nas suas diversas relações.
Portanto, nessa análise, orientamo-nos por uma “grelha analítica básica” desenvolvida por
David Harvey (1996, p. 78) e que se presta a funcionar como um “mapa cognitivo”. Esse
«mapa» estrutura a análise dos processos sociais nas suas diferentes relações, em torno de seis
momentos: a linguagem/discurso; o poder; as crenças/valores/desejos; a construção de
instituições; as práticas materiais e as relações sociais.
As relações internas estabelecidas entre os diversos momentos são constituídas de uma
forma dialética, isto é, através das suas relações internas, envolvendo atividades de «tradução»
entre os vários momentos. No entanto, essas diversas atividades de tradução são mais do que
uma réplica ou «internalização» imediata. Como refere Harvey, cada momento internaliza de
forma heterogénea os «fluxos» advindos dos outros momentos. Por exemplo, apesar de na
análise do discurso pessoal se poder verificar a defesa da ‘aprendizagem ao longo da vida’
relacionando-a com a «vocação ontológica» da humanidade para o «ser mais», ao mesmo tempo
pode-se verificar que essa opinião ou crença pessoal pode ser sustentada e referida a um
conjunto de valores heterogéneos (ou mesmo divergentes) em relação, por exemplo, à conceção
da «natureza» humana, às formas de organização da produção económica e de divisão do
trabalho mais propícias ao papel do Estado, na definição e financiamento das políticas públicas e
mesmo às diversas «finalidades» que se concebem para a educação dos seres humanos.
Parece-nos, tal como a David Harvey, que uma “heterogeneidade de crenças e formas
incoerentes de desejar e valorizar podem ser encontradas em qualquer um de nós” (Harvey,
1996, p. 81).
Enunciemos agora o que significa cada um dos referidos momentos, visando a
perspetivação das formas como se procedem às citadas articulações (as «traduções»).
O momento da linguagem/discurso é revelador dos códigos e formas de como falamos,
escrevemos e representamos o mundo. É através do ato comunicativo subjacente à
linguagem/discurso que se possibilita a compreensão das diversas formas de conhecimento, de
classificação e de categorização do mundo. Também por isso, como refere o autor, “os
discursos são manifestações de poder” (Harvey, 1996, p. 78).
O poder, por sua vez, apesar da sua complexidade e heterogeneidade internas, incorpora
diversas relações e manifestações. Fala-se frequentemente de formas e manifestações de poder
15
distintos: o político, o económico, o simbólico, o militar, etc. Torna-se necessário compreender
como se concretizam essas formas de poder e como ajudam a configurar os processos sociais
(Harvey, 1996, p. 78).
Relevante para o desenvolvimento desta análise é a implicação de um outro momento: o
«imaginário», ou seja, o nosso sistema de crenças, fantasias, valores e desejos que nos ajuda a
enquadrar e a explicar a nossa ação e presença no mundo. Como escreve David Harvey:
“todos nós possuímos crenças, fantasias, valores e desejos relativamente a como o mundo é
(ontologias), que melhores entendimentos do mundo podem ser alcançados (as epistemologias) e de
como Eu/Nós queremos ‘Ser’ no mundo” (Harvey, 1996, p. 79).
Um dos outros momentos relaciona-se com a construção de instituições. Refere-se à
organização de relações sociais e políticas entre os indivíduos de uma forma mais ou menos
durável. Estas podem ser os pensamentos e desejos humanos reificados como ritos culturais
(por exemplo, a religião, a autoridade e a deferência) ou as instituições sociais relativamente
permanentes: o Estado, o Mercado, a Ciência, a Educação, a Lei, as Profissões, entre outras
(Harvey, 1996, p. 79).
Não menos importantes são as práticas materiais, isto é, a forma como experienciamos o
mundo e como se definem e se alteram as nossas perceções e impressões através do nosso
corpo e das tecnologias e das formas espaciais/ambientais a que estamos condicionados
(Harvey, 1996, p. 79).
O sexto momento é relativo às relações sociais, ou seja, ao modo como os seres humanos
se relacionam. Há que considerar, por exemplo, a forma como se vive, como se produz, como se
educa e como se comunica. Para isso dever-se-ão perspetivar as formas de divisão do trabalho,
as hierarquias sociais de classe, de idade, de género, o acesso individual ou de grupo ao poder
social ou às atividades simbólicas e materiais (Harvey, 1996, p. 79).
Nas nossas opções e estratégias de investigação, evidenciaremos o discurso explicitado
pelos entrevistados mas, na sua análise, não os consideraremos por si só “suficiente para
entender a totalidade do processo social” (Harvey, 1996, p. 80). Tentaremos, simultaneamente,
perspetivar as relações internas entre os diversos momentos de que os discursos dão conta,
tanto na sua «fluidez» (as relações de tradução entre os diversos momentos) como nas suas
«permanências» (ou seja, a reificação dessa «fluidez» entre os processos). Portanto,
observaremos como essas articulações e relações fluídas entre os diversos momentos (tanto em
termos «inter-momentos» como em termos «intra-momentos») são convertidas em
16
permanências que se revelam, por exemplo, nas formas de organizar o trabalho, nos discursos
institucionalmente construídos, nas identidades profissionais e até nas disposições individuais
(Harvey, 1996, pp. 80-81).
Neste sentido, optou-se por uma abordagem biográfica que foi desenvolvida com recurso a
uma entrevista biográfica. O recurso a este método de recolha de informação (a entrevista
biográfica) permite, como referem Cornelia Maier-Gutheil e Christiane Hof, que dessa forma o
educador de adultos seja
“capaz de falar acerca das suas condições e requisitos de trabalho, dos seus problemas pessoais, das
suas expectativas e esperanças. Tal como a aprendizagem é concebida como um processo individual
que envolve interação e comunicação com os outros, está ligado com o conceito de aprendizagem
biográfica […] Numa perspetiva biográfica é possível analisar as oportunidades sociais (instituições,
movimentos societais, discursos pedagógicos) em que processos de aprendizagem individual estão
inseridos e também da mudança dessas oportunidades ao longo do tempo” (Maier-Gutheil & Hof, 2011,
pp. 77-78).
Encaramos a «história de vida» como ilustrativa das mudanças que se vão verificando no
mundo do trabalho e nas diferentes perceções dos atores sociais. Ao mesmo tempo,
consideramos que a relação entre o indivíduo e a sociedade se torna visível na biografia do
indivíduo (Albarello, et al., 1997, pp. 207-209).
Através dessa abordagem, podemos “reconstruir as decisões e as estratégias do indivíduo
e as oportunidades sociais específicas que as governam”, nomeadamente, em termos de como
estes desenvolvem o seu profissionalismo, através do seu discurso sobre aquilo que sabem e
como o sabem (Maier-Gutheil & Hof, 2011, p. 77).
A abordagem biográfica permite-nos verificar, com gradual detalhe, as formas como as
trajetórias (profissionais e de aprendizagem) são configuradas e reconfiguradas. Permite
também, e de forma mais relevante, que cada sujeito explicite os principais momentos que
determinaram o seu percurso, fornecendo informações sobre a forma como conduzem o
trabalho e as formas como desenvolveram, desenvolvem e pensam desenvolver as suas
aprendizagens. Como refere Françoise Digneffe, o método biográfico “permite captar as
«subjectividades», compreender de que modo a conduta é continuamente remodelada, de modo
a ter em conta as expectativas dos outros” (Albarello, et al., 1997, p. 208).
No nosso caso, como referimos, focou-se exclusivamente na realidade profissional dos
entrevistados, procurando nesse fragmento da sua «história de vida», selecionado e relatado
pelo próprio agente social, as suas disposições particulares. No recurso à abordagem biográfica
não se tem de incidir sobre toda a história de vida, e podemos direcionar o «olhar» para
17
dimensões específicas da vida, nomeadamente, a profissional (Giddens, 1996a, pp. 696-697;
Bogdan & Biklen, 2000, p. 93).
Ressalve-se, no entanto, o seguinte: consideramos as noções de «história de vida» e de
«trajetória profissional» como construções e representações abstratas que se ordenam
analiticamente em torno de um eixo temporal, mas que, simultaneamente, não se devem
conceber como percursos contínuos ou lineares, constituídas por sucessivas etapas de sentido
ascendente. Para nós, as trajetórias de vida podem assumir variadas continuidades e
descontinuidades, progressões e retrocessos, tanto na dimensão profissional como nas
dimensões educativas e formativas. Consideramos a configuração das trajetórias como
«construções» retrospetivas, coletâneas de momentos e episódios, que devem ser analisadas
com referência ao momento e às disposições presentes. Recorrendo às palavras de José
Machado Pais:
"O uso tradicional do método biográfico tem valorizado, sobretudo, a linearidade. Essa busca é facilitada
pelo facto de a biografia corresponder a um processo de transformação retrospectiva. Na biografia, os
acontecimentos de vida são procurados e avaliados com um olhar do presente dirigido ao passado. Este
olhar, por sua natureza retrospectiva, transforma o biografado. Os acontecimentos enfileiram-se numa
sequência de linearidade, na busca de uma história que só ganha sentido pelos factos que ela consegue
enfileirar. É certo que os biografados partem da inevitabilidade do que aconteceu. Mas os relatos
biográficos são criativos, na medida em que, partindo de uma multiplicidade de factos conservados pela
memória, acabam por construir uma linha de sucessão que se dirige para um “ponto de chegada. Este
ponto de chegada é ponto de conexão linear de nexos de causa e efeito pseudo-convincentes que
orientam a vida para uma meta que, na realidade, lhe pode escapar” (Pais, 2003, pp. 86-87).
A entrevista biográfica semiestruturada: possibilidades e constrangimentos
Pelos motivos atrás aludidos e por considerarmos que, no nosso caso específico, a
unidade de observação e análise mais pertinente se revelar o sujeito, achamos apropriado,
heurística e metodologicamente, o recurso à entrevista biográfica de forma a possibilitar o
aprofundamento das temáticas em questão.
Tomou-se a entrevista semiestruturada como o tipo de inquérito mais apropriado, tendo
em conta o problema colocado. Com esse tipo de entrevista, organizada em torno de um guião
temático (em anexo), podemos articular uma perspetivação longitudinal e uma perspetiva
transversal.
Delineamos alguns tópicos orientadores, de acordo com os nossos conhecimentos e
referências prévias, que gostaríamos de ver abordados e aprofundados e ao mesmo tempo
18
foram elaboradas algumas perguntas prévias que facilitariam a recolha de informação (Ghiglione
& Matalon, 2005). No entanto, mesmo que houvesse uma preparação prévia das perguntas a
colocar, abriu-se espaço a que outras perguntas surgissem por intermédio da constituição dessa
relação dialógica entre entrevistador e entrevistado.
Por um lado, com a entrevista procurava-se suscitar a organização temporal dos
«momentos determinantes» e dos turning points, ou seja, dos “pontos de inflexão que dão novos
rumos à vida” (Pais, 2003, p. 104). Destacava-se o início da atividade enquanto profissional de
RVC (ou como «educador ou formador de adultos») e procurava-se elucidar a trajetória
profissional de cada um dos entrevistados.
Por outro lado, também se tentou desencadear, durante a entrevista, a abordagem e o
aprofundamento dos referidos tópicos de análise que, por exemplo, se relacionavam com os
mecanismos de socialização profissional, com a definição de identidades específicas e com as
noções de profissionalismo ‘embutidas’ no exercício da função.
Nessa interação social que a situação de entrevista proporciona, as características
individuais do entrevistador e entrevistado, o contexto em que são realizadas e as problemáticas
que implicam, nomeadamente as influências múltiplas na produção do discurso, marcam
também o ritmo e a configuração da entrevista. Caberá ao entrevistador direcionar a atenção e
conversa para temáticas específicas já que neste caso possui um quadro de referência
específico. Saliente-se que no caso das entrevistas semiestruturas,
“o indivíduo é convidado a responder de forma exaustiva, pelas suas próprias palavras e com o seu
próprio quadro de referência, a uma questão geral (tema) caracterizada pela sua ambiguidade. Mas se
não abordar espontaneamente um dos subtemas que o entrevistador conhece, este coloca uma nova
questão (o subtema), cuja característica já não é a ambiguidade, para que o indivíduo possa produzir
um discurso sobre esta parte do quadro de referência do investigador” (Ghiglione & Matalon, 2005, p.
88).
No nosso caso particular, o referido «quadro de referência específico» não derivou
somente das questões iniciais, das atividades de exploração (leituras dos diferentes livros e
artigos que abordavam direta e indiretamente o nosso tema e da triangulação das diversas
informações recolhidas), da elaboração do estado da questão e da problemática e da construção
do plano de investigação (Quivy & Campenhoudt, 2008). De facto, uma das especificidades
desta investigação relaciona-se com a própria biografia do investigador. Esta influenciou,
obviamente, o desenvolvimento do seu «olhar» e conceção da problemática específica: também
ele é profissional de RVC.
19
Esta particularidade implicou cuidados específicos no desenrolar de toda a investigação. O
processo de investigação e a entrevista apresentaram algumas especificidades e também a
superação de outros obstáculos que, mesmo que se coloquem genericamente a todos aqueles
que se envolvem em atividades de investigação, se colocaram com particularidades nesta. De
uma forma geral, tentou-se implicar um exigente e cauteloso processo de distanciamento crítico
“em relação ao tipo de conhecimento anteriormente construído sobre o objecto, sujeito à
irrupção fácil de preconceitos e de falsas evidências” (Azevedo, 2000, p. 17).
O distanciamento crítico: especificidades e obstáculos
Robert Bogdan e Sari Biklen, no famoso manual para a investigação qualitativa em
Educação, avisam para que, ao desenhar-se o plano de investigação e escolher um tema
específico, não se escolha um assunto em que se estivesse pessoalmente envolvido (Bogdan &
Biklen, 2000, pp. 86-87). Para eles, a proximidade individual e cognitiva com pessoas e
assuntos poderia derivar numa redução da objetividade e em outros constrangimentos (coibição
e/ou controlo das informações prestadas e dos comentários efetuados), mas principalmente, na
familiaridade excessiva com o tema em questão:
“as pessoas intimamente envolvidas num ambiente têm dificuldade em distanciar-se, quer de
preocupações pessoais, quer do conhecimento prévio que possuem das situações. Para estas, muito
frequentemente, as suas opiniões são mais do «definições da situação», constituem a verdade” (Bogdan
& Biklen, 2000, p. 86).
De facto, partilhar-se o mesmo espaço de práticas profissionais (ser profissional de RVC) e
desenvolver uma investigação sobre essa mesma ocupação implica a possibilidade de algumas
das problemáticas associadas aparecerem com uma certa «ilusão de transparência» (Bourdieu,
Chamboredon & Passeron, 1999, p. 25) ou com a «ilusão do saber imediato» (Bourdieu,
Chamboredon & Passeron, 1999, p. 23) ou implicar outras condicionantes interpretativas.
Muitas vezes, a respeito da atividade de pesquisa científica, fala-se da necessidade de
«rutura epistemológica» (nestes ou noutros termos) como a necessidade de desconstrução das
pressuposições espontâneas que, por vezes, se impõem como evidências, visando uma
distanciação do código de leitura do real derivado do senso comum. Sem debatermos as
minudências destes aspetos, tentaremos refletir sobre como no quadro de uma investigação
20
particular se tentou articular a crítica do «enraizamento cultural» (neste caso profissional) do
investigador e a necessidade de um maior rigor analítico e interpretativo.
Considere-se a seguinte reflexão:
“Estamos de acordo em que todos os estudiosos, sem excepção, se acham enraizados num meio social
concreto, e que por isso é inevitável que utilizem pressupostos e preconceitos que interferem nas suas
percepções e interpretações da realidade social. Neste sentido, é-lhes impossível ser neutros. Estamos
também de acordo quanto à impossibilidade de uma representação quase-fotográfica da realidade
social. Os dados da investigação são sempre selecções da realidade, baseadas em mundividências ou
nos modelos teóricos do seu tempo e filtradas pelas perspetivas de certos grupos específicos de cada
época. Neste sentido, as bases em que a selecção é feita são historicamente construídas, sendo
inevitável que se vão alterando à medida que o próprio mundo se for transformando. Se o que se
entende por objectividade é termos estudiosos perfeitamente distanciados, entregues à tarefa de
reproduzir um mundo social que lhes é de todo exterior e alheio, então não acreditamos que um tal
fenómeno possa existir” (Comissão Gulbenkian, 2002, pp. 127-128).
Na linha da Comissão Gulbenkian sobre a Reestruturação das Ciências Sociais,
consideramos a impossibilidade da «neutralidade axiológica» ou de uma representação
«objetivista», mas consideramos também que se podem e devem fazer esforços em termos da
procura de uma maior objetividade. Esta deve ser entendida como uma meta desejável pela
investigação sistemática e que se relaciona intrinsecamente com a crescente validade do
conhecimento (Comissão Gulbenkian, 2002, p. 128).
Os prolegómenos epistemológicos e metodológicos podem ser entendidos como uma
tentativa de direcionar o olhar dos leitores e, ao revelar os pressupostos, convencer
relativamente às interpretações individuais do investigador. Uma das formas de proceder a esse
‘convencimento’ passa por demonstrar a crescente objetividade: ao revelar os métodos e a
forma de recolha dos dados e diferentes informações; no realçar sistematicamente a «coerência
e utilidade» da investigação; e sujeitar o seu olhar específico aos «juízos intersubjetivos» de
todos aqueles que investigam ou refletem sistematicamente os temas e problemáticas em
questão (Comissão Gulbenkian, 2002, p. 128 e ss). É possível conciliar as exigências de
pertinência e de demonstração da validade dos conhecimentos sem ‘amputar’ as vivências e
convicções próprias (Wieviorka, 2010, pp. 83-94).
No entanto, mais do que fazer genéricas declarações em relação à objetividade e ao
distanciamento crítico, é necessário observar e considerar como por vezes se articulam diversas
situações de enviesamento interpretativo que implicam uma grande vigilância crítica.
21
Apesar de se pensar as entrevistas como um campo de relação específico, suscetível de
produzir determinados efeitos, muitos dos possíveis enviesamentos estão relacionados com as
dimensões relacionais previamente estabelecidas entre entrevistador e entrevistado.
Havia já relações previamente constituídas entre o entrevistador e os entrevistados, tanto
em termos pessoais como em termos profissionais, com maior ou menor grau de confiança e
intimidade. Esse conhecimento mútuo fazia com que cada um ocupasse um lugar específico
nessa relação e não somente naquelas relações constituídas pela situação de entrevista.
Por um lado, com essa circunstância, não se verificou a necessidade de uma descoberta
mútua, de uma avaliação ou de uma adaptação interpessoal, o que facilitou, por exemplo, a
marcação e o desenvolvimento da própria entrevista. Caso contrário, considera-se que as
abordagens previamente e durante a entrevista seriam mais titubeantes.
Esse relacionamento prévio permitia até uma certa identificação, uma compreensão e
mesmo formas diversas de influência mútua em relação às diversas temáticas em análise.
Nessa «história de vida» comum e partilhada e já houvera lugar para a troca e defesa de
opiniões, para a tomada de posições (algumas delas antagónicas e outras coincidentes) e para a
exposição de críticas diversas, em variados momentos e circunstâncias, no âmbito profissional,
em espaços de formação e em termos pessoais e sociais.
Esse (re)conhecimento mútuo implica uma compreensão partilhada do contexto, das
linguagens e situações específicas que se revelaram, por exemplo, em algumas posturas e
comentários ao longo da entrevista. Por vezes, assumindo-se uma postura de uma certa
cumplicidade (o humor ao longo da entrevistas e alguns dos comentários), na linguagem
utilizada (por vezes coloquial), concretizava-se sobretudo pela ‘introdução’ de referências
partilhadas, uma espécie de mecanismo de identificação: “…como sabes…” (E3.41, p. 51); “tu,
na altura, numa reunião também disseste isso…” (E5.101, p. 99);“…as pessoas, como eu, como
tu, como outras que…” (E4.75, p. 74); “ó Miguel” (E5.99, p.98) e “…ó Miguel, tu sabes!” (E2.40,
p. 33); “…acho que aprendo muito contigo…” (E2.22, p. 31); “Acho que até foi contigo que
comentei isso…” (E3.72, p. 57);“Tu também, às vezes, falas de mais…” (E1.96, p. 18).
Por vezes, também parecia existir um certo registo de ansiedade associado a um princípio
de correspondência, eventualmente comum a outras entrevistas, que revela uma situação de
solicitude e de agradabilidade ou mesmo de resistência: “Não sei se fui ao encontro daquilo que
querias?” (E2.95, p. 41); “Eu acho é que não te respondi aquilo que tu querias que eu
respondesse” (E5.97, p. 98).
22
No entanto, esta situação assumida e declarada, mais do que um ‘empecilho’
interpretativo ou uma manifestação de parcialidade, revela potencialidades. Desde que se
verifique a referida vigilância, a partilha de um código comunicacional, a partilha de referências
comuns e a familiaridade permitiu abordar temas que porventura, numa outra situação, não se
poderia ter feito.
Na linha de Bourdieu, Chamboredon e Passeron (1999, pp. 55-63) consideramos que não
há perguntas totalmente neutras e não exclusivamente no nosso caso. Há que constatar que as
perguntas efetuadas incorporam sempre considerações implícitas daquele que investiga. Como
sustentam os referidos autores é necessário questionar as significações específicas das
perguntas, sendo que essa significação é sempre avaliada, não apenas em termos de conteúdos
mas também em termos de formas de questionar. Esses autores referem que não nos devemos
limitar a avaliar as problemáticas implicadas nas respostas e também considerar as
problemáticas implicadas nas perguntas:
“Sempre que o sociólogo for inconsciente em relação à problemática implicada em suas perguntas,
privar-se-á de compreender a problemática que os sujeitos implicam em suas respostas: nesse caso,
estão preenchidas as condições para que passe desapercebido o equívoco que leva a descrever, em
termos de ausência, determinadas realidades dissimuladas pelos próprios instrumento da observação e
pela intenção, socialmente condicionada, do utilizador do instrumento” (Bourdieu, Chamboredon &
Passeron, 1999, p. 57).
É importante especificar que há inclusões e exclusões interrogativas nas entrevistas
efetuadas, não só em termos conscientes mas também a níveis inconscientes. Além das
perguntas excluídas por não serem consideradas pertinentes ou justificáveis, há outras
perguntas que não são feitas de forma assumida, tendo em conta os objetivos específicos ou as
regras específicas de convivência social, por exemplo no abordar de tópicos que impliquem uma
explicitação da intimidade. Considerando as seleções a fazer é necessário considerar aquilo que
uma entrevista pode e não pode fazer.
Um outro aspeto refere-se à assunção demasiado imediata relativamente à partilha de
vocabulário, de conceitos e de referências teóricas e metodológicas ser mais comum do que
efetivamente é. Nessa questão implica-se o ato de presumir determinadas informações e
pormenores e por isso mesmo, no tal raciocínio de pertinência ou de economia do discurso, não
se elaborarem questões, o que pode fazer grande diferença em termos interpretativos. Ao
mesmo tempo, como referido pelos autores que temos vindo a citar assinale-se também que as
perguntas tendencialmente mais objetivas, aquelas que incidem sobre as condutas, “limitam-se
23
a coletar o resultado da observação efetuada pelo sujeito sobre suas próprias condutas”
(Bourdieu, Chamboredon & Passeron, 1999, p. 59).
Em relação a estes tópicos refira-se a seguinte ideia que sintetiza algumas destas
questões. Recorrendo às palavras de Michel Wieviorka:
“o facto de realizar uma investigação nunca deixa o investigador indemne, transforma-o
necessariamente, por meio das realidades que ele descobre ou de que toma consciência, pelas ideias
novas que o assaltam, pelas alterações que é levado a introduzir nas suas hipóteses por causa do
encontro com o terreno” (Wieviorka, 2010, p. 90).
Apontamento: as entrevistas e os entrevistados
Foram realizadas cinco entrevistas (4 mulheres e 1 homem) a profissionais de RVC que
trabalhavam em três Centros Novas Oportunidades localizados na cidade de Braga, entre os dias
13/06/2012 e 04/07/2012. Contactaram-se outros profissionais de RVC que, por diversas
razões, não apresentaram disponibilidade para ser entrevistados.
Cada um dos selecionados constituiu uma unidade de observação, um depósito de
informação, de opinião e de conhecimentos relativamente ao que estava a ser investigado: “o
processo de profissionalização”.
Os objetivos e os temas a serem desenvolvidos foram comunicados com o pedido de
entrevista durante a também previamente relembrados imediatamente antes da realização da
mesma (ver Anexo 1). Também se solicitou autorização para se gravar a entrevista.
As transcrições da entrevista foram efetuadas pelo investigador nos dias subsequentes à
sua realização. Foram estabelecidas duas transcrições, uma textual com as referências a nomes
e instituições e uma outra depurada, sem referências específicas, aquela que se apresenta em
Anexo 3 (McLellan, MacQueen & Neidig, 2003).
Para se permitir a identificação dos excertos transcritos atribuiu-se um código a cada
entrevistado, indicando o Código E1 que se trata do entrevistado 1. Em combinação com esse
código específico, o excerto é passível de ser identificado com a referência à pergunta efetuada e
também pela página da respetiva transcrição. Assim, o código E4.57, p.95 representa o extrato
da resposta do entrevistado 4 à questão 57 podendo ser encontrada a totalidade da resposta na
página 95 do volume de anexos.
Após a transcrição, cada uma das entrevistas foi analisada isolada e
pormenorizadamente. Procedeu-se a diversas leituras que pretendiam sistematizar os temas e
24
conteúdos presentes em cada um dos discursos para posteriormente se fixarem categorias e
unidades de análise (Almeida & Pinto, 1995, pp. 104-105).
Depois da leitura inicial das entrevistas, «impressionista» e “flutuante” (Bardin, 2011, p.
122), com cada nova leitura, conseguiu-se definir com maior detalhe o “fio condutor da análise
e, simultaneamente, forjar os meios através dos quais o material recolhido poderá ser reduzido
de forma pertinente” (Albarello, et al., 1997, p. 128).
Para a constituição da grelha de análise específica, com o aprofundamento das leituras
foram identificadas, registadas e questionadas as perspetivas e significações particulares de
cada um dos entrevistados através, designadamente, da seleção e comparação dos conceitos e
perceções individuais (Albarello, et al., 1997, pp. 128-134).
Nessa análise de conteúdo temática, o tema, a "unidade de significação” e de «recorte de
sentido» que se “liberta naturalmente de um texto analisado” (Bardin, 2011, p. 131), foi
escolhido enquanto uma unidade de registo de tipo semântico (Bardin, 2011, p. 145; Ghiglione
& Matalon, 2005, p. 191) tendo sido complementado com as diversas unidades de contexto,
sendo estas “o mais estreito segmento de conteúdo necessário para compreender a unidade de
registo (Ghiglione & Matalon, 2005, p. 192).
A construção das categorias resultou de uma combinação de procedimentos semi-
indutivos que combinavam o quadro teórico e conceptual da investigação, a problemática, e as
observações resultantes do material recolhido, isto é, da sistematização da informação das
próprias entrevistas (Bardin, 2011, p. 145; Vala, 1986, p. 111; Albarello, et al., 1997, p. 127).
Nesse aperfeiçoamento da grelha de análise, as categorias temáticas constituíram-se
como “códigos de definição da situação” (Bogdan & Biklen, 2000, p. 223), que permitiam a
indução ou inferência de atitudes, valores, convicções, representações e disposições. Como
refere Laurence Bardin, “a análise de conteúdo constitui um bom instrumento de indução para
se investigarem as causas (variáveis inferidas) a partir dos efeitos (variáveis de inferência ou
indicadores; referências no texto)” (Bardin, 2011, p. 167).
Nestes sentidos assinalados, consideraram-se três categorias fundamentais que serviram
para analisar as diversas entrevistas: 1) as práticas profissionais; 2) as identidades profissionais;
3) os espaços e processos de aprendizagem. Refira-se também que cada uma dessas categorias
se subdividia em diferentes subcategorias como se pode verificar no Anexo 3.
25
II. Desenvolvimento profissional dos agentes EFA
O campo da Educação e Formação de Adultos pode ser examinado como tendo uma
grande diferenciação interna em termos de história, propósitos e tradições. Nunca foi, saliente-
se, quer em termos de práticas, quer em termos de discurso, “um campo intelectualmente
coerente e unificado” (Finger & Asún, 2003, p. 14). Refira-se ainda que, contrastando, por
exemplo, com as instituições dos ensinos básico, secundário e superior, “não possui uma
estrutura institucionalmente delimitada com o seu próprio racional ou dinâmica interna” (Lattke
& Nuissl, 2008, p. 11).
Devido a essas particularidades, por vezes, questiona-se a utilidade de considerar o
campo da EFA como um campo unitário e indecomponível ou, diferenciadamente, como uma
agregação de subcampos relativamente autónomos, cada qual a necessitar do seu próprio
enquadramento legislativo e estruturas específicas de suporte (Research voor Beleid; PLATO,
2008, p. 67).
A complexidade e a heterogeneidade desse campo podem ser observadas a vários níveis:
relativamente às práticas educativas, sobretudo em termos da diversidade de orientações e de
modelos didáticos considerados; nas finalidades do processo educativo e de aprendizagem (que
podem ser deliberadas ou não; que podem derivar da atividade principal ou secundária); na
diversidade de instituições com ação educativa e na multiplicidade de agentes e profissionais
envolvidos, direta ou indiretamente, em processos de educação, formação e aprendizagem dos
adultos. Considerando este último plano observamos que os agentes e profissionais têm
diferentes designações, papéis e perfis e não apenas aquelas identificadas e atribuíveis à figura
do professor como o único educador profissional (Edwards, 1997, pp. 67-79; Canário, 2008;
Jütte, Nicoll & Olesen, 2011, p. 10).
Para analisarmos a configuração específica do campo da EFA6 julgamos estar implicados
variados fatores. Comecemos por considerar uma das definições mais comummente utilizadas
de Educação de Adultos7:
6 A Educação e Formação de Adultos também se pode considerar como um campo específico de investigação, ou seja, um espaço disciplinar específico em que são desenvolvidas práticas sistematizadas de organização de dados e informações, de reflexão e produção de conhecimentos. Saliente-se também que na configuração desse campo se implicam diferentes perspetivações ontológicas, epistemológicas e metodológicas. Considera-se portanto, como um “campo de forças, cuja necessidade se impõe aos agentes que nele se encontram cometidos e como um campo de lutas no interior do qual os agentes de enfrentam, com meios e fins diferenciados segundo a sua posição na estrutura do campo de forças, contribuindo assim para conservar ou para transformar a sua estrutura (Bourdieu, 1997, p. 32).
26
“Por educação de adultos entende-se o conjunto de processos de aprendizagem, formal ou não, graças
ao qual as pessoas consideradas adultos pela sociedade a que pertencem desenvolvem as suas
capacidades, enriquecem os seus conhecimentos, e melhoram as suas qualificações técnicas e
profissionais ou as reorientam de modo a satisfazer as suas próprias necessidades e as da sociedade. A
educação de adultos compreende a educação formal e a educação permanente, a educação não formal
e toda a gama de oportunidades de educação informal e ocasional existentes numa sociedade educativa
multicultural, em que são reconhecidas as abordagens teóricas e baseadas na prática” (UNESCO, 1999,
pp. 15-16).
Uma das primeiras constatações que permitem a ilustração do nosso argumento é a
abrangência que está implícita nesta definição e a consequente dificuldade na delimitação das
fronteiras do campo da EFA. Um dos traços distintivos que sobressai dessa definição relaciona-
se com a assunção do adulto como um sujeito aprendente e que o ‘adulto’, enquanto
categorização de um Sujeito enquadrado em processos de educação e aprendizagem, se
perspetivará em função dos diversos contextos sociais e culturais (Edwards, 1997, p. 75).
Esta conceção da especificidade do adulto implicará modalidades específicas do
relacionamento educativo com um percurso autónomo e característico (Finger & Asún, 2003;
Jarvis, 2010). Neste sentido, muitas vezes se observa a emergência e a identificação das raízes
históricas da Educação de Adultos com movimentos sociais ou organizações com finalidades
sociais, missão e compromissos políticos específicos (Fernández, 2006; Canário, 2008; Lima,
2008).
Um outro aspeto que se infere daquela definição relaciona-se com o propósito inequívoco
das atividades de educação e formação de adultos servirem como uma forma de desenvolver
conhecimentos, habilidades e saberes. As possibilidades para o fazer são múltiplas, tanto em
termos espaciais como em termos temporais, isto é, são variados os espaços e os momentos
para esse desenvolvimento, com o recurso a diferentes agentes, atividades e instituições.
Nos processos educativos e formativos implicam-se obviamente diferentes processos e
níveis de aprendizagem. Além dos momentos e espaços mais formalizados, também se
7 Uma outra definição similar foi divulgada na Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura realizada em Nairobi, em 1976: “A educação de adultos denota todo o corpo de processos educativos organizados, qualquer que seja o conteúdo, o nível ou o método, quer sejam formais ou não, quer prolonguem ou substituam a educação inicial em escolas e universidades ou na aprendizagem profissional, em que pessoas consideradas como adultas pela sociedade a que pertencem desenvolvem as suas habilidades/capacidades, enriquecem o seu conhecimento, melhoram as suas qualificações técnicas ou profissionais ou as redirecionam e provocam mudanças nas suas atitudes ou comportamentos numa dupla perspetiva de desenvolvimento pessoal e participação no desenvolvimento social, económico e cultural equilibrado e independente (UNESCO, 1976).
27
evidenciam muitas vezes a existência de fenómenos educativos e de aprendizagem de tipo não-
formal e informal.
A aprendizagem8 apresenta-se portanto como um processo complexo que envolve
processos psicológicos (de aquisição e elaboração interna) e sociais (resultantes da interação
externa entre o aprendente e o seu ambiente social, cultural ou material) e, como Knud Illeris,
consideramos que “toda a aprendizagem é situada e as situações específicas de aprendizagem
tornam-se uma parte integrada dos processos e resultados de aprendizagem” (Illeris, 2009, p.
139).
As aprendizagens desenvolvem-se em torno de quatro9 espaços: aprendizagens escolares
e educacionais, ou seja, as aprendizagens intencionadas ocorridas no sistema educativo
(«formais, racionais e externamente direcionadas»); as aprendizagens em contexto de trabalho,
as aprendizagens incidentais que têm lugar neste contexto e as aprendizagens mais
formalizadas relacionadas com a prática profissional ou que tomam lugar no trabalho; as
aprendizagens quotidianas, informais e múltiplas, que ocorrem à medida que vamos vivendo (e
não pela participação em atividades intencionalmente definidas) e que estão relacionadas com
as culturas e subculturas em que a pessoa está integrada; as aprendizagens baseadas em
interesses, que tomam lugar em diferentes atividades comunitárias e associativas e que estão
relacionadas com os interesses e convicções pessoais. Pode ser encarada como um tipo de
aprendizagem quotidiana direcionada a um objetivo específico, com motivação e resolução
específicas.
Na sua análise também considera os quatro níveis de aprendizagem, todos eles
“necessários para construir as capacidades e competências de um indivíduo” (Illeris, 2009, p.
144): a aprendizagem cumulativa (ou mecânica) – consistindo na obtenção de algo
completamente novo sem nenhum contexto de significado ou importância pessoal; a
aprendizagem assimilativa – implicando a obtenção e ligação de novos elementos a padrões
previamente estabelecidos; a aprendizagem acomodativa – ocorrendo em situações em que seja
dificultado o relacionamento dos novos elementos (considerados revelantes) com os padrões ou
8 Para Knud Illeris a aprendizagem engloba todos os processos que levam a “mudanças de capacidade, tenham um caráter motor, cognitivo, psicodinâmico (i.e. emocional, motivacional ou atitudinal) ou social, e que não sejam devidos a maturação genético-biológica” (Illeris, 2003, p. 397). 9 Knud Illeris refere um quinto espaço: o da aprendizagem baseada na rede, um espaço de aprendizagem de crescimento crescente e com características específicas – a flexibilidade em termos espaço-tempo; o condicionamento comunicacional do aprendente – este tem de perceber as opiniões e argumentos e construir as suas próprias opiniões e argumentos; falta de contacto direto. No entanto, na própria opinião de Illeris se encara a possibilidade de este espaço não ser considerado separadamente dos referidos quatro (Illeris, 2009, p. 141). Nós assim o entendemos.
28
esquemas existentes; e a aprendizagem transformativa que passa pelas aprendizagens surgidas
em situação de crise que implicam mudanças de personalidade e se caracteriza por reestruturar
simultaneamente as dimensões cognitivas, emocionais e sociais/societais (Illeris, 2003, pp. 402-
404).
Cada um desses níveis é diferente em termos de âmbito e natureza, ocorrendo em
diferentes situações e conexões. Knud Illeris também elabora sobre as situações de não-
aprendizagem, da «consciência quotidiana10» e das resistências mentais (intencionais ou não) às
aprendizagens resultantes dos mecanismos de defesa. Para Knud Illeris as questões de
aprendizagem relacionam-se com aquilo que pode ou consegue ‘entrar’ no indivíduo, tendo em
conta as diversas condições e as resistências existentes (Illeris, 2003, pp. 404-405).
Na análise da aprendizagem implicam-se portanto diferentes espaços, processos e níveis
a que se associa um crescente reconhecimento individual, social, económico e educativo (e
também gnosiológico) da relevância dos resultados das aprendizagens advindos dos diferentes
espaços experienciais (Pires, 2007).
Conjuntamente com esse gradual e transversal reconhecimento não se pode deixar de
mencionar a crescente pluralização e visibilidade de diferentes instituições com ação educativa.
São múltiplas as entidades envolvidas em processos de educação e aprendizagem no campo da
EFA, tanto em termos formais como em termos não formais, e que contribuem para essa
crescente perceção: de escolas a hospitais, de centros de formação a outros centros de
endoutrinação (diferentes igrejas e comunidades religiosas), de unidades museológicas a
entidades comerciais, passando por associações políticas, de desenvolvimento local e
recreativas11.
Para estruturar a análise dessa diversidade institucional, há quem proponha a
conveniência em ultrapassar a simples dicotomia baseada na diferenciação entre instituições
educativas e instituições não educativas. Rui Canário sugere, por exemplo, que essa distinção
10 Everyday consciousness, conceito desenvolvido por Thomas Leithäuser. 11 Repare-se que relativamente à EFA formal assinalam-se, por exemplo: as instituições escolares para jovens e adultos (públicas e privadas); diversas organizações não-governamentais e entidades comerciais (empresas de formação profissional, por exemplo) e comunitárias. Relativamente à EFA não-formal, verifica-se uma multiplicidade de sítios desde as instituições educativas formais, a organizações não-governamentais e não-lucrativas. Podem-se referir, entre outras: as instituições educativas (escolas de todos os níveis de ensino, institutos politécnicos, universidades); associações educativas, universidades populares; universidades da terceira idade; entidades ligadas a Igrejas e grupos religiosos; sindicatos e partidos políticos; instituições ligadas a associações empresariais, industriais e comerciais, associações profissionais (do patronato ou de trabalhadores), entidades e empresas educativas e/ou de formação; entidades ligadas a diferentes organizações da sociedade civil; espaços culturais públicos ou privados (museus, bibliotecas, livrarias, etc.) e a diferentes associações/centros recreativos, desportivos, culturais, de lazer. Pode também ser efetuado através de educação a distância, através de diferentes media - rádio, televisão, internet, etc. (Research voor Beleid; PLATO, 2008, p. 67).
29
poderá ser fundamentada na forma como se estabelece a prossecução de finalidades
educativas. Nessa distinção, importará estipular se as finalidades são deliberadas e se resultam
da atividade principal da instituição, ou se, por outro lado, os processos educativos e de
aprendizagem são secundarizados em relação à ação primordial da mesma (Canário, 2008, p.
17).
Destacamos a ideia de que a pluralidade de configurações institucionais e organizacionais
e a diversidade de atividades, práticas educativas e lógicas de educação e formação de adultos,
tende a complexificar a delimitação deste campo, já que não se verifica uma correspondência
unívoca entre a matriz e pertença institucional e o tipo de finalidades prosseguidas que
facilitavam a delimitação das fronteiras do campo de EFA. Na linha de Richard Edwards
observamos que, ao se constituírem progressiva e potencialmente todas as experiências dos
adultos como ‘aprendizagem’, se verifica, concomitantemente, que as próprias fronteiras do
campo estejam em permanente expansão, compreendendo e incorporando
fenomenologicamente todas aquelas instituições que possibilitem essa mesma
experiência/aprendizagem (Edwards, 1997, p. 84) como inferimos também da tipologia de Knud
Illeris, anteriormente exposta.
Na relação estabelecida entre aqueles dois aspetos, matriz institucional e finalidades,
associam-se também as lógicas de funcionamento e os modos de organização específicos que
traduziam e organizavam analiticamente a variedade das práticas e atividades educativas, em
termos nacionais e internacionais. Essas dimensões foram sistematizadas em diferentes
tipologias que permitem auxiliar na circunscrição e perceção analítica deste campo (entre outros,
Loureiro, 2006; Canário, 2008; Research voor Beleid; PLATO, 2008; Cavaco, 2009).
Considerando a sua pertinência heurística, na categorização estipulada por Theo Van
Dellen e Max Van Der Kamp foram definidos quatro domínios principais de trabalho no campo da
Educação e Formação de Adultos: a) Educação profissional/vocacional; b) Educação funcional e
corporativa; c) Educação Social e Moral; e d) Educação artística e cultural (Dellen & Kamp,
2008).
Nesses domínios distinguem-se os conteúdos educacionais, os dispositivos de educação e
formação e as influências contextuais de cada um desses domínios12. Ressalve-se que entre cada
12 Saliente-se que são transversais aos referidos planos de atividades e práticas o uso de diferentes formas e métodos educativos e outros dispositivos pedagógicos: por exemplo, diferentes modalidades de educação a distância (combinadas ou não com atividades de educação em sala); grupos de discussão; grupos de estudo; círculos de estudo, entre outros.
30
um desses domínios se podem verificar, em alguns aspetos, determinadas convergências ou
hibridismos em termos de orientação.
A Educação profissional/vocacional está orientada para processos de qualificação e
requalificação da mão-de-obra, dos recursos humanos e do mercado de trabalho que
correspondem a modalidades de formação inicial, formação especializada e/ou de reconversão
profissional.
São duas as lógicas prevalecentes: a qualificação individual, orientada sobretudo para a
prevenção do desemprego e promoção da empregabilidade; e o desenvolvimento organizacional,
entendido como um instrumento estratégico de recursos humanos ao serviço do
desenvolvimento de projetos organizacionais. Assim, pretende-se a garantia de estabilidade ou
segurança profissional, a preparação para desafios provenientes das diversas mudanças
económicas e laborais ou mesmo a redefinição de áreas de interesse profissional. A gestão de
carreira, o aconselhamento e orientação está a tornar-se uma parte fundamental do trabalho
educativo, principalmente com públicos com menores níveis de qualificação (Dellen & Kamp,
2008, p. 65; Cavaco, 2009, pp. 740-746).
Já a Educação Funcional está orientada para a providência de competências básicas de
literacia e numeracia não diretamente relacionadas com o mercado de trabalho. É considerada
como uma oferta educativa de «segunda oportunidade», ou seja, assume um carácter
compensatório ou supletivo. A lógica prevalecente é a da “ortopedia social” (Cavaco, 2009) e
visa a minimização de problemas socioeconómicos de públicos considerados desfavorecidos (em
situação de desemprego ou em risco de exclusão social, por exemplo). Muitas vezes essas
formações são conotadas com políticas ativas de emprego, sendo estruturadas, selecionadas e
financiadas em função de metas políticas por estruturas governamentais nacionais e/ou da
União Europeia. Essa oferta pode ser assumida pelo sistema formal de ensino ou por outro tipo
de instituições, em diversos níveis de qualificação (Canário, 2008, pp. 14-15; Loureiro, 2006).
Também é enquadrada dentro deste domínio a educação corporativa (corporate
education), uma área em crescimento ainda que dependente do crescimento económico e que
se refere ao campo do Desenvolvimento dos Recursos Humanos e ao Desenvolvimento
Organizacional. A formação e o desenvolvimento e, em menor grau, a consultoria são centrais na
identificação dos educadores de adultos que trabalham nessa área, ainda que “uma parte
significativa dos profissionais a trabalhar nesse campo estejam a fazer aconselhamento ou
31
coaching, ou estejam envolvidos com o planeamento de carreira e o desenvolvimento de
adultos” (Dellen & Kamp, 2008, p. 66).
O terceiro domínio refere-se à Educação Cultural e Artística, uma área ampla com
múltiplos conteúdos, finalidades e modos de organização. Podemos reconhecer traços comuns
relacionados com a orientação para o desenvolvimento de saberes em termos de arte e cultura,
nos seus múltiplos sentidos: enquanto produção e consumo artístico e cultural ou, por outro
lado, enquanto padrões integrados e representativos de conhecimentos, práticas e
especificidades humanas. Nestas duas dimensões incluir-se-ão, portanto, o desenvolvimento de
temas e conhecimentos genéricos ou específicos (históricos, sociopolíticos, etc.) e diferentes
habilidades e competências artísticas, gastronómicas, desportivas, linguísticas, artesanais,
tecnológicas, entre outras. Refira-se também que pela diversidade de entidades implicadas e de
ênfase em tópicos ou campos de estudo específicos estão implicadas neste domínio, pelo
menos, três lógicas orientadoras distintas: a animação/ocupação de tempos livres; o
desenvolvimento de dimensões estéticas e artísticas; a orientação para o trabalho comunitário
ou para a coesão social. Refira-se também que uma outra possibilidade é a integração das
anteriores vertentes (Dellen & Kamp, 2008).
Finalmente, o último domínio é relativo à Educação Social e Moral que se encontra
orientada para o aumento da «coesão social» e da «cidadania ativa». As suas principais
finalidades relacionam-se com o desenvolvimento ou transformação de características
sociopsicológicas (personalidade, atitudes, valores, mentalidades, etc.) visando a
consciencialização dos indivíduos, o aumento da sua participação (em termos sociais, culturais,
políticos e económicos) e, eventualmente, o incremento do seu pensamento crítico e a
transformação do seu contexto social (Dellen & Kamp, 2008). A lógica é a da intervenção
comunitária e está orientada para o desenvolvimento e participação social globalizado, integrado,
endógeno e ecológico. Superam, em alguns aspetos, a mera adaptação individual que visa a
empregabilidade e a competitividade. Pode-se também perspetivar em torno de ações de
desenvolvimento comunitário ou local, sendo encarado, nesse sentido, como “momentos de
síntese” de diferentes modalidades de educação de adultos (Canário, 2008, pp. 14-15; Cavaco,
2009, pp. 751-755).
32
Agentes e profissionais no campo da EFA: uma resenha
Como aludimos, a complexidade do campo da Educação e Formação de Adultos observa-
se, portanto, na intrincada relação entre a diversidade de instituições com ação educativa e a
pluralidade de finalidades, lógicas de funcionamento e modos de organização que cada uma
delas pode incorporar. Saliente-se que todos estes fatores não facilitam a delimitação clara das
estruturas institucionais nem a determinação de dinâmicas e racionais unívocos.
É necessário examinar como as referidas características do campo da Educação e
Formação de Adultos e as supramencionadas ‘particularidades’ não facilitam a definição de um
perfil e de uma identidade profissional estável relativamente a quem são ou o que são os
‘educadores de adultos’ (Lattke & Nuissl, 2008, p. 11).
A abrangência institucional implica a diversificação de tarefas e a multiplicidade e variação
significativa de designações e denominações que se encontram nesse campo. Por exemplo,
Peter Jarvis elenca 18 papéis13 relacionados com a educação e formação de adultos, sugerindo
que neste campo se verifica uma “amálgama avulsa de papéis” entre aqueles que ensinam
adultos. Com o desenvolvimento dos diversos processos de educação e aprendizagem dos
adultos, as diversas atividades profissionais vão-se subdividindo em novas ocupações com
atribuições funcionais e formativas específicas. Essa crescente especialização estimula que cada
uma dessas ocupações comece a desenvolver regras específicas de acesso ao desempenho
profissional (Jarvis, 2010, p. 276). Como escreve Peter Jarvis:
“Educar adultos pode ser conceptualizado como uma ocupação que está continuamente em processo
de profissionalização. Contudo, o papel nunca foi um «todo» único e homogéneo; pelo contrário, foi uma
variedade de papéis diferentes que foram mantidos juntos num momento na história. À medida que as
exigências do papel foram sendo maiores tornou-se impossível para os segmentos manterem-se juntos,
assim testemunhamos a segmentação, a criação de novas ocupações e a geração de uma multitude de
oportunidades para a preparação e desenvolvimento profissional dos educadores em todas as novas
ocupações formadas.
[…] Contudo, o que continua a ser central para um serviço educacional de qualidade para os adultos é
um conjunto de profissionais suficientemente financiados para serem capazes de responder às
necessidades de aprendizagens de todas as pessoas que desejem aumentar as suas aprendizagens ao
longo das suas vidas” (Jarvis, 2010, p. 290).
13 São eles: 1) professor/facilitador; 2) assistente de ensino; 3) supervisor; 4) formador/instrutor; 5) mentor; 6) conselheiro/orientador; 7) administrador; 8) avaliador; 9) investigador; 10) formador de professores/formadores; 11) autor de materiais de aprendizagem; 12) planeador de programas/de currículos; 13) legislador educacional; 14) administrador de programa; 15) pessoal técnico de programa; 16) consultor e avaliador; 17) retalhista/comerciante; 18) gestor.
33
Essa pluralidade de papéis, ocupações e práticas associadas, implica também uma
reapropriação permanente (em termos teórico-conceptuais, simbólicos e ideológicos) do que
significa ser um agente de EFA, numa época de «aprendizagem ao longo da vida». Como
escreve Richard Edwards,
“estas mudanças de papéis, práticas e identidades tanto trazem a necessidade de definir, como
emergem dos diferentes discursos sobre o que é ser um trabalhador com adultos. Neste sentido, a
própria noção de "educador de adultos" – ela própria investida de uma variedade de sentidos nos
discursos do campo - é em si mesma problematizada na charneca (moorland) da aprendizagem ao
longo da vida” (Edwards, 1997, p. 149).
Será importante considerar o agente de EFA em campos de atuação específicos e no
âmbito de organizações particulares e verificar como se desenvolvem e configuram os processos
de construção do seu papel, perfil e identidade profissional, nomeadamente, através da
obtenção de competências e saberes específicos.
A multiplicidade de identidades está relacionada com o sentimento de pertença a
diferentes grupos e instituições; com a utilização de métodos específicos; com as temáticas
abordadas e com a ligação estabelecida à educação e formação de adultos como campo de
prática e/ou profissão (Edwards, 1997; Bron & Jarvis, 2008, p. 40):
“as diferenças entre instituições, orientações, objetivos educacionais e modelos didáticos são muito
alargadas. Como resultado não há distintos cargos (educador de adultos, formador, professor, leitor,
gestor educacional, orientador, etc.) e formas aceites de abordar o trabalho implicado. Diversas
histórias, propósitos e tradições deixam um legado de tensões entre as aspirações dos educadores de
adultos e o estatuto relativo dos saberes, abordagens e modelos que circulam nesses locais” (Jütte,
Nicoll, & Olesen, 2011, p. 10).
Tendo em conta as diferentes configurações e significações profissionais, poderão ser
perspetivados outros fatores, entre os quais: os mecanismos de socialização profissional
específicos a cada papel ocupacional e cada instituição; a (in)visibilidade de algumas ocupações
profissionais em detrimento de outras; a diversidade da formação e da estruturação do treino e
preparação teórico-conceptual e metodológica (a sua educação de base) daqueles que intervêm
nesse campo e as diversas tensões (teóricas, pedagógicas e ideológicas) em torno dos seus
objetivos e do corpo especializado de conhecimentos subjacentes a esses treino e preparação.
Além da diversidade e complexidade institucional existentes também é relevante verificar a
variedade em termos de condição e estatuto profissional dos agentes e profissionais de EFA.
Saliente-se que apenas uma minoria trabalha exclusivamente e a tempo inteiro no campo da EFA
e que se verifica a permanência de formas atípicas de trabalho, algumas das quais precárias
34
(Lattke & Nuissl, 2008, p. 11). No contexto europeu, verifica-se a coexistência de diferentes
modalidades contratuais e condições de emprego: trabalho a tempo inteiro/permanente e a
tempo parcial e/ou trabalho temporário; com contratos de duração determinada; com maior ou
menor segurança laboral; em regime de voluntariado ou em outro tipo de empregos de inserção
(tais como estágios); ou em diferentes modalidades de teletrabalho (Research voor Beleid;
PLATO, 2008). Como enunciamos, essas diversas modalidades contratuais produzem efeitos
nas formas de relacionamento e regulação laboral e vêm reconfigurando a identidade do
trabalhador e o seu bem-estar
A preparação teórica e educativa, o papel e relevância social e as condições laborais dos
diferentes agentes EFA têm sido determinantes, direta e indiretamente, para a própria
configuração do campo e para o desenvolvimento profissional daqueles que nele trabalham. O
desenvolvimento profissional pode ser entendido de uma forma ampla, referindo-se ao
desenvolvimento do estatuto de uma profissão e ao desenvolvimento dos conhecimentos,
habilidades e práticas profissionais. O desenvolvimento profissional pode ser definido como o
“processo pelo qual a profissionalidade e/ou o profissionalismo pode ser considerado de ser
melhorado” (Evans, 2008, p. 30).
O continuado interesse nestas temáticas infere-se, entre outras fontes, pela análise dos
diversos documentos que têm sido preparados, por exemplo, no âmbito da Organização das
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) ou da União Europeia. Alguns
desses documentos produzidos, patrocinados ou publicados por aquelas instituições permitem-
nos percecionar as diferentes formas como se considera, em termos históricos e discursivos, o
desenvolvimento profissional dos diversos agentes de EFA.
Examinem-se, por exemplo, as recomendações dos diversos relatórios das Conferências
Internacionais de Educação de Adultos (CONFINTEA), e verifique-se a recorrência de um
conjunto de tópicos com níveis de relevância diferenciados, mas que são significativos na
perspetivação do desenvolvimento profissional dos agentes de EFA.
Na nossa leitura e análise serão consideradas três enfoques principais relativamente aos
agentes e profissionais de EFA: 1) a formação inicial e contínua e o entendimento particular da
profissionalização como desenvolvimento de conhecimentos e competências. Insere-se nesta
dimensão a importância da evolução do conhecimento científico relativo à área da educação,
formação e aprendizagem dos adultos que permite uma intervenção e uma prática educativa
mais relevante e adequada; 2) a melhoria das condições laborais, de remuneração e estatuto
35
profissional e a sua relação com a pertinência da ação e o desenvolvimento do campo da EFA.
Considera-se ao mesmo tempo o papel e responsabilidade do Estado na definição, na
implementação e no financiamento de políticas educativas que permitam a concretização da
missão e objetivos da EFA; e 3) a articulação com outros agentes e instituições sociais,
sugerindo-se a complementaridade de ação de vários setores da sociedade, inclusivamente com
os meios de comunicação social. Anteriormente, como ainda nos dias de hoje, pretendia-se uma
maior visibilidade e apelabilidade da ação educativa o que beneficiaria, direta e indiretamente, o
desenvolvimento deste campo e, consequentemente, dos agentes que nele desenvolvem as suas
ações.
Analisaremos as formas como os discursos político e institucional e as diversas propostas
de ação que são incluídas nos diversos relatórios das CONFINTEA foram e são permeáveis às
diversas temáticas, teorias e conceitos que vão sendo utilizados para promover e/ou explicar as
diversas mudanças sociais ao nível político, económico, cultural e educativo.
Na nossa análise consideraremos como a partir da década de 70, principalmente nas
sociedades ocidentais, liberais e capitalistas, se começaram a tornar visíveis grandes
transformações na cultura e na estruturação social, mais visivelmente na organização da
estrutura económica e na reestruturação dos seus modos de produção e de desenvolvimento
que afetaram todos os campos do social, inclusive o campo educativo (Castells, 2005, p. 201).
Abordaremos, ainda que não detalhando todas as suas implicações, a articulação dos
diversos fatores implicados nessas mudanças sociais que também influenciaram
determinantemente o campo da EFA: os desenvolvimentos nas tecnologias de informação e
comunicação e nos sistemas de transportes; as crises e as reestruturações do modelo de
desenvolvimento (industrialismo) e dos seus modos de produção associados (o capitalismo e o
estatismo) e a influência de movimentos sociais e culturais orientados para a liberdade (Castells,
2005).
Repararemos, também, que a partir da década de 90, se passou a recorrer à noção de
«Aprendizagem ao Longo da Vida» como expressão determinante e orientadora para a ação
educativa no campo de Educação e Formação de Adultos. Seria interessante questionar, em
maior detalhe do que aquele que poderemos fazer, como e por que conseguiu esta expressão
acumular diferentes sentidos ao longo do tempo e refletir sobre como essas diferentes
conotações condicionaram a possibilidade de pensamento e de ação. Essa seria a perspetiva da
história conceptual, ou seja,
36
“em vez de começar por uma definição de um dado conceito, a história conceptual interessa-se por
aquilo que as práticas de definição e uso fazem a um conceito, e por aquilo que um conceito, por outro
lado, faz ao mundo em que está inscrito. Exposto de uma forma diferente, a história conceptual
interessa-se tanto pelo que significa um conceito dentro de um determinado contexto como por aquilo
que um conceito faz a um determinado contexto” (Bartelson, 2000, p. 181).
Ao mesmo tempo procuraremos destacar a importância conferida a discursos particulares
relacionados com o papel da Qualidade nos processos educativos e também a sua interligação
com o incentivo à profissionalização da Educação e Formação de Adultos.
As continuidades e evoluções temáticas que sinalizaremos são reveladoras de dois
aspetos que consideramos significativos. Por um lado, o reconhecimento contínuo e sistemático
da centralidade do desenvolvimento profissional dos diferentes agentes de educação e formação
de adultos é importante para a evolução do campo da EFA. Porém, simultaneamente, a
consideração que essa mesma necessidade de conferir uma visibilidade temática e programática
aos diversos tópicos relacionados com o desenvolvimento profissional dos mesmos agentes
indicia a permanência de uma certa precariedade no que diz respeito, por exemplo, à formação
inicial e contínua dos ‘educadores de adultos’, às suas condições laborais e às articulações com
os variados setores da sociedade. Mostra também que há mais de 50 anos o campo da
Educação e Formação de Adultos se depara com circunstâncias similares que se traduzem em
recomendações análogas.
Articulação com outros agentes sociais e sectores da sociedade
Temos vindo a evidenciar que uma das matérias que tem sido tratada conjuntamente com
o desenvolvimento profissional dos agentes de educação e formação de adultos tem sido a
articulação entre estes e os diversos agentes sociais e sectores da sociedade. Numa lógica de
cooperação como uma forma de potenciar a própria ação educativa e de lhe conferir uma maior
amplitude social e eventualmente uma maior receção por parte dos diferentes públicos. Há,
portanto, uma certa noção da importância da divulgação das atividades relacionadas com a
educação de adultos pelos diversos setores sociais como uma forma de conferir maior relevância
e abrangência social da ação educativa, conferindo-lhe um maior destaque e visibilidade social
com o intuito de incentivar a participação dos adultos.
37
Desde 1960, no relatório final da segunda CONFINTEA, se assinalam diversas
recomendações dirigidas àqueles que desenvolviam a sua atividade profissional no campo da
Educação de Adultos. Numa lógica de abertura, sugeria-se que estes se deveriam articular com
outros agentes sociais e sectores da sociedade. Salientava-se e apelava-se, por exemplo, às
responsabilidades dos intelectuais e dos artistas na Educação dos Adultos.
Ao mesmo tempo, assinalava-se a importância da articulação dos agentes e organizações
do campo da Educação de Adultos com os meios de comunicação social e outras entidades da
cultura popular (Cinema, Televisão e Rádio). Concebida enquanto estratégia, foi feita uma
recomendação aos educadores de adultos para que estabelecessem “contactos amigáveis” com
aqueles que controlam os media de entretenimento popular de forma a facilitar a ‘troca de
ideias’ entre os dois. Esses contactos amigáveis seriam entendidos como um trabalho preliminar
para o desenvolvimento de ações e sugestões específicas que visassem a produção de novos
tipos de programas de entretenimento que enriquecessem o “pensamento e o modo de vida do
homem comum” (UNESCO, 1960), mantendo uma apelabilidade popular.
Passados doze anos, no relatório final da terceira CONFINTEA, continuava-se a incentivar
essa articulação e estabelecimento de relações de trabalho entre os profissionais da Educação
de Adultos e aqueles que são responsáveis pelo planeamento de outros media e instituições não
formais (rádio, televisão e filmes) para a programação coordenada com fins educacionais e
culturais (UNESCO, 1972, p. 52).
Refira-se que essa estratégia comunicacional passaria também por adequar a intervenção
às características dos adultos. Pretendia-se acima de tudo apelar a uma participação localizada
no “ambiente natural” dos indivíduos, o que possibilitaria que se sentissem seguros e
genuinamente motivados, além de também se poderem constituir como parte ativa no
planeamento, na gestão e na condução dos seus próprios estudos (UNESCO, 1972, p. 18).
Mais tarde, numa lógica de difusão das boas práticas, em 1985, com a CONFINTEA
realizada em Paris, destacou-se o interesse, a importância e os ganhos concretos de se proceder
à partilha internacional de experiências bem-sucedidas entre educadores de adultos que
trabalhassem tanto no sector governamental como em organizações não-governamentais
(UNESCO, 1985, p. 60).
Esse interesse na relação entre o sector governamental e as organizações não-
governamentais também continuou na quinta CONFINTEA, a primeira em que as ONG
participaram ativamente, ainda que sem direito a voto. De facto, nessa linha, recomendava-se a
38
articulação do papel do Estado com os diferentes parceiros sociais, nomeadamente pela
recomendação que visava o reconhecimento das responsabilidades mútuas para o
estabelecimento de quadros de suporte legal para o estabelecimento de mecanismos de
coordenação e monitorização e para a criação dos diferentes
“suportes financeiros, administrativos e de gestão, pelo reforço dos mecanismos de articulação
intersectorial e interdepartamental, e pela garantia da participação das organizações da sociedade civil
para complementar a resposta dos governos, providenciando-lhes o financiamento adequado para apoiar
as suas atividades” (UNESCO, 1997, p. 15).
A partir desta conferência começa-se a promover, de forma ativa e em termos de discurso
institucional, a transferência de responsabilidades e funções que eram principalmente do Estado
a esses novos agentes sociais. Dessa forma, patrocinam-se lógicas relacionadas com a
constituição de parcerias, com a territorialização da intervenção e com a descentralização
(UNESCO, 1997; Afonso, 2001, p. 37). Pode-se considerar que promovendo estas dinâmicas, o
Estado reduziria e dispersaria a pressão social a que estaria sujeito (quando assumia essas
funções em regime de exclusividade), pelos novos atores coletivos não-estatais, que constituindo-
se como parceiros também se responsabilizam pela prossecução dos objetivos públicos (Afonso,
2001, p. 39).
Condições laborais, de remuneração e estatuto profissional
Um outro tópico sempre presente nas diversas recomendações das CONFINTEA e que
ainda continua a apresentar a maior importância para o desenvolvimento profissional dos
agentes de educação de adultos relaciona-se com as condições laborais daqueles que
desenvolvem atividades profissionais no campo da EFA.
Por exemplo, em 1960, no relatório da segunda CONFINTEA, recomendava-se que os
diversos governos teriam a responsabilidade de criar condições financeiras e administrativas
para a implementação e desenvolvimento de políticas de Educação de Adultos adequadas ao
nível de desenvolvimento nacional. Uma possibilidade era explicitamente salvaguardada: mesmo
que houvesse espaço para ações de voluntariado, deveriam ser providenciadas as condições
necessárias, através de pagamento de salários, despesas de viagem e de subsistência, àqueles
que trabalham na Educação Vocacional, Cívica, Social e Cultural (tanto em tempo parcial como a
tempo inteiro; tanto em organismos públicos como em outros voluntários).
39
Também no encontro de Nairobi, em 1976, foi destacada a importância da criação de
boas condições laborais dos educadores de adultos para o desenvolvimento do campo da
Educação de Adultos. Defenderam-se algumas medidas específicas e ainda hoje prementes: o
emprego a tempo inteiro de profissionais; a comparabilidade em termos de condições de
trabalho e de remuneração dos trabalhadores a tempo inteiro com trabalhadores em lugares
educativos similares; a regulação daqueles trabalhadores que trabalhassem a tempo parcial; o
investimento nas diversas estruturas em termos de instalações e equipamentos tecnológicos; o
investimento em formação e desenvolvimento profissional dos vários intervenientes no campo da
Educação de Adultos, planeadores, administradores, formadores de educadores, formadores e
administrativos, e outros que concebam estratégias e métodos educativos adequados (UNESCO,
1976, p. 9).
Na quarta e na quinta CONFINTEA, este tópico foi, como temos vindo a referir, tratado
numa certa lógica de continuidade visando a qualidade e a sustentabilidade das diferentes
atividades e programas de Educação de Adultos. Sintetizando, as diversas recomendações
preocupavam-se com a adoção de diferentes medidas e a elaboração de políticas que visassem
a melhoria das condições de trabalho, de remuneração e de estatuto profissional dos
educadores de adultos.
Formação inicial e contínua – a sua valorização
Um dos temas que mais destacaríamos pela sua recorrência e relevância nas diversas
recomendações mas também por incorporar aspetos dos dois pontos anteriormente referidos é a
focagem na formação inicial e contínua dos agentes de EFA, tendo em atenção as suas variadas
vertentes e implicações.
Desde a segunda CONFINTEA (1960) que se explicita a importância da articulação do
conhecimento científico com as práticas profissionais para o desenvolvimento das mesmas.
Distinguiam-se duas formas de articulação: por um lado, reconhecia-se que os trabalhadores da
Educação de Adultos necessitariam da assistência da investigação científica e que, por outro, os
especialistas da Educação de Adultos deveriam ter acesso a um “sistema de informação efetivo”
(com os resultados dos estudos económicos, sociológicos, psicológicos e educacionais) que
contribuíssem para a definição das “necessidades, aspirações, objetivos/finalidades, programas,
métodos e dos equipamentos da educação de adultos”.
40
Constata-se que desde cedo se incentivou a interação com especialistas multidisciplinares
e Institutos de Investigação, que permitisse desenvolver investigação específica (de acordo com
cada contexto social e nacional) e em temas considerados importantes14. Esta forma de
agenciamento visava dois objetivos: ao mesmo tempo que se almejava providenciar maior
conhecimento e cultura aos adultos também se pretendia possibilitar o estabelecimento de
políticas específicas mais apropriadas às necessidades individuais e sociais.
No entanto, com a terceira CONFINTEA (1972), começa-se a propor uma diferenciação
em termos de acesso ao papel de ‘educador de adultos’ ou a outras ocupações inseridas no
campo da Educação de Adultos (por exemplo, administradores, animadores, líderes voluntários,
entre outros). De uma forma explícita, admitia-se que apenas aqueles que já haviam sido
ensinados poderiam eles próprios ensinar e só assim teriam um papel significativo nos diversos
contextos ocupacionais:
“Conscientes que aqueles que foram já educados podem eles próprios ensinar nos seus próprios contextos e
desempenhar um papel significativo na difusão da educação como administradores, animadores, líderes ou
assistentes voluntários, em cooperação com os educadores profissionais (UNESCO, 1972, p. 57).
Com a finalidade de proceder ao desenvolvimento profissional no campo da Educação de
Adultos, propunha-se a implementação de cursos de formação dos educadores de adultos, que
deveriam incluir pequenos cursos de formação em contexto de trabalho e cursos mais longos
que permitissem a obtenção de certificados, diplomas e graus (UNESCO, 1972, p. 55).
Ao mesmo tempo propunha-se um papel mais interventivo para os educadores de adultos,
que deveria passar por identificar e sugerir diversas reformas (sociais, económicas, culturais ou
políticas) consonantes com os novos objetivos educativos derivados das mudanças observadas
na sociedade e nos sistemas de educação15.
Nessa estratégia, que visava uma maior relevância e disseminação social da EFA alertava-
se, para diversos fatores que se deveriam considerar no desenvolvimento de sistemas de
formação para o pessoal da educação de adultos: a) a formação dos educadores de adultos
como líderes sociais com “um forte grau de consciência dos aspetos sociais das suas funções e
a capacidade de estimular e mobilizar os recursos humanos comunitários para uma participação
14 Na segunda CONFINTEA os temas considerados relevantes eram: a) lazer e cultura popular; b) desenvolvimento da personalidade entre as pessoas jovens; c) coordenação de trabalho construtivo dos mass media e dos grupos culturais; d) relacionamento entre a elevação dos níveis de vida e a elevação dos níveis culturais. 15 À premissa fundamental das recomendações do relatório da CONFINTEA III, de que a Educação é tanto um produto da Sociedade como tem influência na configuração da Sociedade (UNESCO, 1972, p. 17), não deveriam ser desconhecidas as principais recomendações e conclusões do relatório Aprender a Ser – O Mundo da Educação Hoje e Amanhã, comummente conhecido por Relatório Faure, que havia sido editado pela UNESCO poucos meses antes da conferência realizada em Tóquio.
41
responsável na educação de adultos” (UNESCO, 1972, p. 57); b) a necessidade de um esforço
sistemático para “descobrir, recrutar e formar educadores de adultos” entre aqueles que se
apresentem como líderes potenciais e naturais de um determinado local (apesar de lhes poder
faltar formação específica); e c) formar educadores de adultos para que estes possam
desenvolver materiais e métodos nos seus programas de educação de adultos que sejam
adaptados e relevantes às tradições e costumes locais (UNESCO, 1972, p. 57).
Passados quatro anos, através da recomendação resultante do encontro de 1976, em
Nairobi, e aprovada pela Conferência Geral da UNESCO também nesse ano, com o compromisso
dos Estados-Membro em promover a Educação de Adultos como parte integrante do sistema
educativo, observam-se alguns desenvolvimentos programáticos dos tópicos relacionados com o
desenvolvimento profissional, fundamentalmente em termos de formação e estatuto das pessoas
que trabalham na Educação de Adultos.
Um dos seus princípios base, já destacados previamente, relacionava-se com o
reconhecimento de que todos aqueles que estivessem envolvidos na provisão de atividades de
educação de adultos, a qualquer título e para qualquer finalidade, deveriam possuir
competências, conhecimentos e atitudes específicas.
Seria necessário, portanto, que fossem cuidadosamente recrutados de acordo com as
suas funções particulares. Deveriam também receber formação inicial e formação em contexto
de trabalho de acordo com as suas necessidades e com as necessidades daqueles com quem
estariam profissionalmente envolvidos.
Ao mesmo tempo, dever-se-ia encetar contactos com diversos especialistas em Educação
de Adultos e implementar processos de partilha de experiências e de compilação e disseminação
de informações sobre as estratégias, estruturas, conteúdos, métodos e resultados (tanto
quantitativos quanto qualitativos) da educação de adultos (UNESCO, 1976, p. 8).
Paralelamente, numa lógica de abertura social, propunha-se a ação no campo da
Educação de Adultos de todos aqueles que se revelassem capazes de contribuir, regular ou
ocasionalmente, remunerados ou de forma voluntária, para a educação de adultos. Defendia-se,
portanto, uma crescente participação social e o envolvimento voluntário de pessoas com todo o
tipo de competências.
A partir da IV CONFINTEA, em 1985, começa-se a utilizar o conceito de profissionalização
para conceber e sistematizar a problemática e necessidade do desenvolvimento profissional no
campo da Educação e Formação de Adultos. Indiciando a sua importância, considerava-se a
42
profissionalização “tão necessária no campo da educação de adultos como em outras atividades
da vida humana” (UNESCO, 1985, p. 55). Realce-se, porém, que no relatório resultante da
mencionada CONFINTEA, essa profissionalização é concebida sobretudo numa lógica de
desenvolvimento dos conhecimentos e competências. Nesse sentido, relacionava-se
fundamentalmente com as diversas configurações institucionais que possibilitavam a formação
inicial e contínua dos educadores de adultos e visavam o incremento da qualidade da educação.
Assumia-se, pois, que a necessidade da profissionalização derivaria da seguinte
fundamentação: sem formação para os educadores de adultos, as realizações neste campo
educacional seriam limitadas. Por isso, uma das recomendações relaciona-se com “reconhecer
plenamente a influência direta dos trabalhadores da educação de adultos no desenvolvimento e
na qualidade da educação” (UNESCO, 1985, p. 55).
Numa certa lógica de descrição funcional, abordam-se também os conhecimentos e as
competências que o educador de adultos deveria possuir: deveria ter pelo menos conhecimentos
básicos da psicologia adulta, da psicologia da aprendizagem e dos métodos e técnicas
educacionais e deveria ser instruído de forma a facilitar o processo de aprendizagem do adulto
com qualquer nível de educação e de qualquer grupo ou ambiente.
Assim, era recomendado aos Estados-Membro que se assegurassem que as universidades
e outras instituições providenciassem programas educativos e de graduação específicos na área
da educação de adultos, e não somente como uma especialização de outras áreas.
Estes diferentes programas deveriam ter também em consideração a contribuição de
organizações não-governamentais para o treino de pessoal voluntário ou em part-time,
estabelecendo programas de formação específicos para este público. Deveriam também
considerar o valor da diversidade de experiências e de formação que poderiam levar ao
reconhecimento do estatuto de tal pessoal.
À própria UNESCO foi feita a recomendação de que prestasse uma maior atenção à
formação dos trabalhadores de educação de adultos nos seus programas e orçamentos. Sugeria-
se que essa organização deveria ajudar os Estados-Membro através de projetos concretos que
permitissem um melhor entendimento da importância de formar os trabalhadores de educação
de adultos e na melhoria do seu estatuto social (UNESCO, 1985, pp. 55-56).
Passados doze anos, na CONFINTEA que teve lugar em Hamburgo, em 1997, algumas
das recomendações também se relacionavam com o recrutamento, a formação inicial e a
formação em serviço. A premência da educação e formação contínua dos educadores de adultos
43
também se relacionava com as diferentes inovações nos métodos de ensino e de educação,
nomeadamente no crescente recurso às novas tecnologias de informação e na relação com os
media.
Numa linha de continuidade, continuava-se a sugerir que deveria ser providenciada
formação aos educadores e os trabalhadores culturais que encorajasse o desenvolvimento e
aplicação de recursos apropriados e disponíveis para a Educação de Adultos.
Em síntese, enfatizava-se a necessidade de melhorar as condições e a qualidade da
aprendizagem dos adultos e essas seriam concretizadas com o desenvolvimento profissional dos
educadores de adultos. Desde a segunda CONFINTEA e até Hamburgo ainda continua a questão
da formação dos educadores de adultos no topo da agenda e, ao que parece, sem grandes
evoluções. Aliás, ela chega até aos nossos dias e com as mesmas características implicando-se,
no entanto, outras questões, tais como a afirmação da aprendizagem ao longo da vida e o
discurso da qualidade.
Aprendizagem ao Longo da Vida e o discurso da Qualidade
A partir de meados da década de 90, começa-se a destacar no discurso público e
institucional, de uma forma mais explícita, a noção de Aprendizagem ao Longo da Vida. Desde
essa altura, esse conceito tem ocupado um lugar central na agenda política relativa à educação
e formação da União Europeia, da OCDE e também da própria UNESCO.
Com a publicação pela Comissão Europeia, em 1995, do Livro Branco Teaching and
Learning – Towards the Learning Society concebe-se a Aprendizagem ao Longo da Vida como
um desafio resultante das diversas transformações demográficas e sociais (por exemplo, o
aumento da esperança de vida e a feminização do mercado de trabalho), da evolução científica e
tecnológica, do advento da sociedade da informação e da globalização da economia. Essa noção
é perspetivada como uma resposta que induziria a atualização e aperfeiçoamento permanente
dos conhecimentos e das competências técnicas, profissionais e sociais, tornando-se assim um
requisito e uma condição determinante para a consolidação da dita Sociedade da Aprendizagem.
De facto, parece subjacente à emergência do conceito e política de Aprendizagem ao
Longo da Vida a sua subordinação às transformações económicas (que afetam a sociedade, o
campo do trabalho, do emprego e da educação) e aos modos de organização, produção e
consumo (Edwards, 1997; Canário, 2003). Parece visar, entre outros aspetos, o incremento da
44
capacidade adaptativa dos indivíduos, ou seja, a sua empregabilidade, a uma realidade cada vez
mais exigente em termos cognitivos e laborais.
Com esse Livro Branco também se lançou o Ano Europeu da Aprendizagem ao Longo da
Vida, que durante todo o ano de 1996 pretendeu perspetivar as diferentes ações que deveriam
ser desenvolvidas aos diversos níveis (a nível europeu e aos níveis local e nacional) e também as
formas de estruturação das diversas atividades de cooperação que visariam o desenvolvimento
da Aprendizagem ao Longo da Vida e da Sociedade de Aprendizagem. Sugere-se que com a
comemoração desse evento intensificou-se a importância, o perfil e esta conceção particular da
Aprendizagem ao Longo da Vida (Dale, 2008).
Nesse mesmo ano, a OCDE prestou uma especial atenção a esse entendimento da
Aprendizagem ao Longo da Vida através da organização de um encontro internacional dos
ministros da educação dos países-membro e com a edição do relatório Lifelong Learning for All
(Istance, 2011). A Aprendizagem ao Longo da Vida foi concebida como uma necessidade
derivada da crescente competitividade global e das diversas mudanças resultantes dos
desenvolvimentos científicos e das novas tecnologias.
Desta forma, enquadra-se frequentemente a emergência dessa política e conceito de
Aprendizagem ao Longo da Vida dentro de um quadro de reformulações profundas nas tipologias
institucionais, políticas e económicas que se vêm concretizando como uma estratégia de
renovação das instituições capitalistas e liberais (Lima, 2003).
Sistematicamente, a Aprendizagem ao Longo da Vida (como noção, conceito, política, ou
mesmo jargão) vem sendo incorporada nos discursos e políticas a nível nacional e internacional,
numa agenda globalmente estruturada de educação, com diferentes repercussões nas agendas
educativas nacionais (Dale, 2004). É promovida por diferentes instituições, implicando um
consenso diligentemente fabricado através da naturalização de factos, ideologias e discursos
que, de acordo com as diversas prioridades políticas e económicas, poderão ocultar ou revelar
visões muito diversas em relação à implementação de políticas nacionais (Antunes, 2001; Lima,
2008; Cavaco, 2009).
Para Collin Griffin, a Aprendizagem ao Longo da Vida poderá ser concebida como uma
estratégia de ação que, funcionando como uma «cortina de fumo», pretende dissimular o
‘desmantelamento’ do Estado-Providência e provocar uma disrupção na manutenção dos
sistemas educativos estatais através de políticas públicas. Verifica-se, portanto, uma alteração
45
nas lógicas subjacentes à conceção de políticas relacionadas com a educação e aprendizagem
ao longo da vida (Griffin, 1999a; Griffin, 1999b).
Essa emergente noção da Aprendizagem ao Longo da Vida, a ser meramente entendida
como atributo, função do estilo de vida ou do consumo individual (determinado em termos de
procura de sentido e ação), seria distinta de uma provisão educativa, desenvolvida dentro de um
quadro institucional e sistémico. Ou seja, seria entendida fundamentalmente como uma função
da estrutura social, sem necessidade de direção e controlo do Estado. Nesse sentido, o Estado,
na sua ação e funções, passaria da formulação e implementação de políticas públicas para a
simples conceção de estratégias que visassem aqueles fins (Griffin, 1999b, p. 447). Essa
mudança de orientação não é inócua nem casual. O recentrar da ação política e de governação
num discurso de Aprendizagem ao Longo da Vida, corresponderia a uma reforma de cariz
neoliberal do papel do Estado. Como sustenta Collin Griffin,
“a razão porque eles não fazem não é unicamente por causa da impossibilidade de formular a
aprendizagem como um objeto de política pública, mas porque a escolha política é não o fazer. A
estratégia de governação é criar as condições em que as pessoas, famílias, comunidades e organizações
sejam mais propícias a aprender por elas próprias, dessa forma obviando a necessidade para uma
política educacional no sentido tradicional. Esta é uma característica de governação nas condições pós-
Providência” (Griffin, 1999b, p. 440).
Repare-se que estas implicações são coincidentes com aquilo que Nikolas Rose (1997,
pp. 25-40) define como os três traços característicos do neoliberalismo. Partindo do princípio
que o neoliberalismo não abandona a vontade de governar, mas apenas inventa novas
estratégias de governo, o autor refere as suas três características principais que, como
analisaremos em maior detalhe, influenciam muitos dos discursos sobre o papel do
desenvolvimento profissional dos agentes de EFA e da crescente relevância da Qualidade no
campo da EFA.
A primeira característica assinalada relaciona-se com uma «nova relação entre os peritos e
a política», que implicaria um controlo crítico dos sistemas periciais perspetivados em nome de
uma ‘verdade’ monetarista e gestionária, implementada através de técnicas contabilísticas e de
lógicas de auditoria. Estas são entendidas como mecanismos essenciais para a gestão do risco,
para a governação a distância e para implementação de estruturas autorreguladoras: para as
organizações serem auditadas têm de se tornar auditáveis.
A introdução de novas tecnologias de regulação baseadas em formas de governação
conformadas a poderes e vontades de entidades autónomas (empresas, organizações,
46
comunidades, profissionais e indivíduos, por exemplo) que significam uma
“desgovernamentalização do Estado e uma desestatização do governo” corresponderia
genericamente à segunda característica: uma «nova pluralização das tecnologias sociais». Nesse
sentido, o crescimento de organizações não-governamentais quase autónomas que assumiriam
diferentes funções implicariam o crescimento da competitividade e da qualidade dos serviços.
Essas funções seriam reguladoras (por exemplo, com a constituição de ordens e associações
profissionais); de planificação (com a ascensão de novas entidades de governação para proceder
à regeneração das cidades); educativas (com o crescimento de escolas profissionais privadas e
outras entidades desse sector), de provisão de serviços públicos (através, por exemplo, da
privatização dos sectores da água, do gás, da eletricidade e mesmo da segurança).
Desta forma, verifica-se uma subversão do controlo democrático pela aceitação acrítica de
que essas entidades funcionam com base num projeto apolítico, com uma certa margem de
poder e autonomia regulada (controlável à distância por contratos, objetivos, indicadores e
medição, monitorização e avaliação de resultados) e supostamente representativa da
comunidade (já que tendencialmente incorporam na sua administração representantes de vários
sectores tais como empresas, residentes locais, organizações voluntárias, municípios, etc.).
A terceira característica relaciona-se com uma «nova especificação do sujeito de governo».
Nas palavras de Nikolas Rose, cada vez mais se verifica
“a entronização dos poderes do cliente como consumidor – consumidor de serviços de saúde, de
educação, de formação, de transportes – define os sujeitos de governo de uma nova forma: como
indivíduos ativos que procuram «realizar-se a si mesmo», maximizar a sua qualidade de vida mediante
atos de escolha, conferindo a suas vidas um sentido e um valor na medida em que podem ser
racionalizadas como o resultado de escolhas feitas ou de opções por toma. A razão política deve agora
justificar-se e organizar-se a si mesma argumentando mediante pactos que se adequam à existência de
pessoas definidas, em sua essência, como criaturas livres e autónomas. No interior de este novo regime
que supõe um eu inteiramente responsável, os indivíduos têm de cumprir as suas obrigações cidadãs
não através de mútuas relações de dependência e obrigação de uns com os outros, senão procurando
realizarem-se a si próprios no seio de âmbitos micro-morais ou «comunidades»: famílias, lugares de
trabalho, escolas, associações de ócio, vizinhanças. O problema consiste, portanto, em encontrar os
meios através dos quais os indivíduos se fazem responsáveis mediante opções individuais que adotam
para si mesmos e para aqueles a quem devem lealdade, formando um estilo de vida de acordo com
gramáticas de vida que têm sido amplamente disseminadas, que já não dependem de cálculos nem de
estratégias políticas para a sua lógica de funcionamento nem para as técnicas que implicam” (Rose,
1997, p. 37).
47
Profissionalização como incremento da Qualidade
Na Agenda para o Futuro, um documento divulgado em 1997 por ocasião da V
CONFINTEA realizada em Hamburgo, perguntava-se:
“que tipo de medidas e reformas devem ser levadas a cabo para se conseguir maior acessibilidade,
relevância, qualidade, respeito pela diversidade e reconhecimento do ensino anterior?” (UNESCO, 1999,
p. 33).
Além de determinadas ações eminentemente simbólicas (celebração de dias
comemorativos específicos e do movimento ‘uma hora por dia para estudar’), propunha-se criar
condições legislativas, serviços de informação e aconselhamento públicos e o desenvolvimento
de métodos que permitissem a validação das experiências e aprendizagens anteriores. Ou seja,
pretendia-se facilitar a procura de aprendizagem por parte das pessoas, garantindo ao mesmo
tempo o acesso e a participação dos adultos em diversas atividades de aprendizagem.
A abertura das diversas instituições educativas (escolas, faculdades e universidades) aos
estudantes adultos era também um compromisso assumido acrescido às diversas propostas que
vinham a ser reiteradas: a continuidade de uma lógica de educação permanente, sem barreiras
entre a educação não formal e a educação formal, numa lógica de continuidade temporal que
superasse a mera escolaridade obrigatória; a promoção da investigação académica e da
divulgação do conhecimento e estudos nacionais e transnacionais sobre a educação e formação
de adultos; a assunção das responsabilidades dos estados na criação do “apoio financeiro,
administrativo e de gestão, reforçando os mecanismos de ligação intersectorial e interministerial”
(UNESCO, 1999, p. 37) e também no apoio aos novos parceiros sociais “com o estabelecimento
de quadros regulamentadores de apoio […] e na criação de mecanismos de acompanhamento e
coordenação” (UNESCO, 1999, p. 37).
O último tópico que nos importa destacar relaciona a melhoria da qualidade da educação
e aprendizagem dos adultos com a melhoria das condições de formação profissional dos
“educadores e monitores de adultos”. Além do compromisso para se desenvolver e inovar nos
métodos de ensino e aprendizagem (incluindo todas as potencialidades das novas tecnologias)
sugeria-se que a qualidade da educação de adultos se efetivaria
“estabelecendo políticas e adoptando medidas para melhorar o recrutamento, a formação inicial e o
emprego, as condições de trabalho e a remuneração do pessoal envolvido nos programas e actividades
de educação de jovens e adultos, de modo a assegurar a respectiva qualidade e estabilidade, incluindo
os conteúdos e metodologia de formação” (UNESCO, 1999, p. 36).
48
A partir da segunda metade da década de 90, o discurso da «Qualidade» começa a
apresentar uma crescente relevância que se denota, entre outros aspetos, na atenção à
perspetivação da qualidade na provisão da Educação de Adultos e na sua articulação com os
processos de formação inicial e contínua dos agentes de educação e formação de adultos. Como
refere um estudo relativo à gestão da qualidade na educação de adultos na Europa, publicado
pela Associação de Educação de Adultos da Letónia:
“Desde os anos 90 os desenvolvimentos na gestão da qualidade no sector industrial influenciam
também as discussões no sector dos serviços, onde a Educação de Adultos pode ser incluída.
Inicialmente o foco do desenvolvimento da qualidade no sector industrial era relativa ao produto. Na
Educação de Adultos este conceito era e ainda é muito rejeitado pelo argumento de que a educação não
é um produto. O próprio aprendente com as suas expectativas, precondições e interesse está muito
envolvido em produzir o “produto de aprendizagem”. Portanto, qualquer desenvolvimento na qualidade
terá de se concentrar nas condições que levam a uma melhor aprendizagem. Por outras palavras: às
condições organizacionais. Com a filosofia da Total Quality Management o foco mudou de uma
orientação para o produto para os processos de uma organização e com isto o interesse na aplicação da
gestão na qualidade na educação de adultos aumentou (Latvian Adult Education Association, 2006, p.
4).
Refira-se que essa articulação se apresenta em diferentes documentos produzidos ou
apoiados por diversos organismos da União Europeia que incidiam na questão da qualidade na
educação. Constata-se um fio condutor que revela as orientações políticas e estratégias
relativamente às configurações dos sistemas educativos.
A título de exemplo, já em 2000, no Memorando sobre Aprendizagem ao Longo da Vida,
refere-se a centralidade da qualidade na relação educativa e do envolvimento dos profissionais
da área:
“A qualidade da experiência e dos resultados da aprendizagem são os elementos fundamentais,
nomeadamente aos olhos dos próprios aprendentes. No entanto, poucas mudanças e inovações
efectivas poderão ocorrer sem o envolvimento activo dos profissionais da área, que estão mais próximos
do cidadão enquanto aprendente e mais familiarizados com a diversidade de necessidades e processos
de aprendizagem” (Comissão das Comunidades Europeias, 2000, p. 15).
Por exemplo, o documento Adults Education Trends and Issues in Europe, elaborado pela
Associação Europeia para a Educação de Adultos (European Association for the Education of
Adults) refere que os principais objetivos da garantia de qualidade passam por: a) assegurar que
os resultados de aprendizagem sejam relevantes e apropriados às necessidades das pessoas; b)
garantir a sua eficiência em termos da organização e do processo de aprendizagem; c)
possibilitar a transparência da provisão educacional e dos resultados de aprendizagem. d)
49
desenvolver a atratividade, o incremento da motivação, a garantia de participação e um acesso
igualitário particularmente para grupos desfavorecidos (EAEA, 2006).
A Comissão Europeia tem sublinhado o papel da qualidade encarando-a como um
conceito orientador das suas políticas setoriais e considera-se a profissionalização dos
educadores de adultos como um dos pilares da «cultura de qualidade».
Na comunicação “Educação de adultos: nunca é tarde para aprender”, de 2006, são
referidas as diversas formas associadas à qualidade16:
“informação e orientação; análise das necessidades; conteúdo pertinente, que corresponda às
necessidades e à procura reais; oferta; apoio à aprendizagem; abordagens em matéria de avaliação; e
reconhecimento, validação e certificação de competências” (Comissão Europeia, 2006, p. 7).
Reconhece-se, no entanto, que se deve prestar especial atenção a quatro tópicos
principais: 1) aos métodos de ensino; 2) à qualidade do pessoal; 3) à qualidade dos prestadores;
4) à qualidade da oferta (Comissão Europeia, 2006, p. 7).
No Plano de Acção para a Educação de Adultos, intitulado “Nunca é Tarde para Aprender”
(Comissão Europeia, 2007, pp. 5-6), a qualidade dos serviços de educação de adultos é
entendida como dependente das políticas, dos recursos e das instalações. Porém, não podendo
ser perspetivada isoladamente, seriam também consideradas a eficiência e a eficácia, a
relevância e a responsabilização (accountability) como determinantes para as estruturas
organizacionais e para as políticas do sistema de educação de adultos.
Prosseguindo uma lógica de «boa gestão», as organizações que providenciam serviços de
educação de adultos devem: a) focar no educando adulto; b) fazer abordagens inovadoras da
aprendizagem; c) analisar eficazmente as necessidades; d) desenvolver sistemas de
administração eficientes e proceder à afetação apropriada de recursos; e) investir em pessoal
qualificado; f) criar diferentes mecanismos de garantia de qualidade das entidades prestadoras
de educação de adultos; g) desenvolver sistemas de monitorização e avaliação (fundamentados
em indicadores sólidos) dentro de quadros de referências nacionais; h) criar relações próximas
com outras áreas e entidades educativas, designadamente associações de alunos, associações
sectoriais e subsectoriais e entidades empregadoras (Comissão Europeia, 2007, pp. 5-6).
Concretizando algumas sugestões anteriormente referidas da Agenda para o Futuro, e de
forma a potenciar a qualidade da oferta e dos métodos de ensino, é sugerido que para se
16 Ligeiramente diferentes são os critérios relativos à garantia de qualidade da educação, segundo o documento de trabalho “A Educação de Adultos na Europa. Formação não-profissional”: “Os critérios relativos à garantia de qualidade da educação e respetivos domínios de aplicação incluem: capacidade institucional; eficácia educativa; estratégias e procedimentos para a garantia da qualidade; acessibilidade e adequabilidade dos recursos de aprendizagem” (Eurydice, 2007a, p. 50).
50
aumentar a participação e a eficácia na educação de adultos, dever-se-ia implementar, a nível
local, serviços de informação, aconselhamento e orientação. Potenciando a sua atratividade,
estes deveriam ser secundados por programas ajustados e tendencialmente flexíveis, com
métodos e materiais didáticos adaptáveis às necessidades e características dos adultos e,
paralelamente, com estruturas de apoio que permitam o acolhimento de crianças.
A qualidade dos prestadores desses serviços educativos seria implementada e assegurada
numa vertente de regulação. Os governos teriam, fundamentalmente, em colaboração com
outros interessados, a tarefa de estabelecer os quadros normativos e os mecanismos de
acreditação, a definição das normas de qualidade, dos mecanismos de monitorização (em
termos de controlo interno e externo) e implementação de processos de avaliação dos resultados
do ensino e de aprendizagem que garantissem o cumprimento das normas17.
No mesmo sentido, como observam Egetenmeyer e Käpplinger (2011), essa gestão da
qualidade é um conceito que, internamente, incide sobretudo na estandardização e controlo dos
processos e dos produtos e, externamente, na construção de uma imagem específica. Assim,
“esses processos e produtos são definidos formalmente de acordo com critérios ou normas standard.
Assim, a qualidade parece ser um termo neutral, que pode ser usado em diferentes sentidos
dependendo do contexto. A característica central da garantia de qualidade ou do desenvolvimento da
qualidade é a formalização de processos organizacionais. As ações individuais deverão ser guiadas por
procedimentos ou estruturas formais, que são frequentemente definidos por orientações escritas,
códigos de missão ou objetivos fixados. Pessoas, interesses, a paixão profissional ou objetivos individuais
não são aparentes, e o fator individual é regulado pelo formalismo. As consequências negativas da
gestão da qualidade muito rigorosa pode ser a autorreferencialidade, a homogeneidade, o hierarquismo
e o burocratismo, que refreiam a inovação” (Egetenmeyer & Käpplinger, 2011, p. 26).
Salienta-se que o fator-chave para a qualidade da provisão de atividades de Educação de
Adultos é o desenvolvimento profissional das pessoas que trabalham nessa área. Assim, mais do
que as políticas, os recursos ou as instalações associadas à Educação e Aprendizagem dos
17 Podemos assim verificar como, na União Europeia, são promovidas e induzidas as diversas lógicas de ação que se esperam concretizadas nas políticas a nível nacional e local. A ‘nova’ forma de governação, o «método de coordenação aberta» (intermediando a integração europeia, a harmonização de política e a cooperação transnacional), apresenta um cariz pouco imperativo e concretiza-se através de alguns princípios de ação: «unidade pela subsidiariedade», «coesão pela isenção», «governação através de recomendações», «convergência», «pareceres de peritos», «explicação e consulta», «gestão por objectivos», «governação pela escolha», «administração por país», «abordagem integrada» e «homogeneidade pela difusão (Hespanha & Valadas, 2001, pp. 128-129). Como argumenta Licínio Lima (2010, p. 46), esse «método de coordenação aberta» repercute-se na formulação de políticas sociais que na prática implicam um conjunto de aspetos que podem, em alguma medida, apresentar alguns desajustamentos a determinadas realidades nacionais já que “evidencia poderosos instrumentos de convergência e de isomorfismo, baseados em múltiplos instrumentos, entre os quais a emulação e a competição, induzidas pela definição de benchmarks, por variados processos de monitorização, pilotagem e avaliação. Sem esquecer o efeito político dos rankings, formais ou informais, que comparam países, destacam «boas práticas» ou, ao invés, disponibilizam dados que podem ser explorados pelas forças políticas e sociais de oposição aos governos dos estados-membros”.
51
Adultos, o referido Plano de Ação reconhece a importância do desenvolvimento profissional dos
agentes EFA para o incentivo à participação (Comissão Europeia, 2007, p. 9).
Nesse plano de ação consideram-se alguns dos aspetos que influem nesse mesmo
desenvolvimento. São referidas: a) a pouca atenção prestada à definição do conteúdo e
processos de formação inicial e contínua; b) as múltiplas formas de acesso, em termos
educativos e profissionais, para o desempenho de funções nessa área (além de professores e
formadores, pessoal de gestão, de orientação e aconselhamento e administrativo); c) o défice de
estatuto, remuneração e reconhecimento profissional no quadro de estruturas de carreira
formais; d) a existência de formas atípicas de trabalho (trabalho a tempo parcial, com
pagamento à hora e voluntariado) que podem não providenciar perspetivas de carreira
(Comissão Europeia, 2006; Comissão Europeia, 2007).
Todas estas preocupações, num padrão de influências discursivas mútuas, constatam-se
nas semelhanças dos diversos discursos emanados da União Europeia, no Relatório Global sobre
a Aprendizagem e Educação de Adultos (UNESCO, 2010c) e nos relatórios nacionais e regionais
que lhe deram origem e no próprio relatório final da CONFINTEA VI (2009).
No relatório final da sexta CONFINTEA considera-se novamente a profissionalização dos
educadores de adultos como uma das dimensões18 do incentivo de uma “cultura de qualidade”
na educação de adultos. A qualidade é tomada com um conceito orientador e com uma
centralidade inequívoca no próprio discurso emanado dessa CONFINTEA. De facto, os
participantes nessa conferência comprometeram-se a:
“a) desenvolver critérios de qualidade para os currículos, materiais de aprendizagem e metodologias de
ensino, tendo em conta os resultados e medidas de impacto; b) reconhecimento da diversidade e
pluralidade de fornecedores; c) melhorar a formação, capacitação, condições de emprego e a
profissionalização da educação de adultos, por exemplo, através do estabelecimento de parcerias com
instituições de ensino superior, associações de professores e organizações da sociedade civil; d) a
elaboração de critérios para avaliar os resultados de aprendizagem de adultos em vários níveis; e) a
definição de indicadores de qualidade precisos; f) maior apoio de crédito à investigação interdisciplinar
sistemático na educação de adultos, complementada por sistemas de gestão de conhecimento para a
recolha, análise e disseminação de dados e de boas práticas” (UNESCO, 2010b, pp. 40-42).
É referido explicitamente que tanto o empobrecimento dos ambientes de aprendizagem,
no respeitante a equipamentos, materiais e currículos como
“a falta de oportunidades de profissionalização e de formação para os formadores tem um impacto
negativo sobre a qualidade da oferta de aprendizagem e educação de adultos” (UNESCO, 2010b, p. 45).
18 De acordo com o referido relatório as outras dimensões da cultura de qualidade são: conteúdos relevantes e modos de entrega; avaliação das necessidades centrada no aprendente; aquisição de competências e conhecimentos múltiplos; o enriquecimento dos ambientes de aprendizagem e o empoderamento dos indivíduos e das comunidades.
52
Além destes dois fatores, outros influem na qualidade da oferta: no processo de
planeamento, a escassez de avaliação de necessidades e pesquisas sistemáticas (nos
conteúdos, pedagogia, modos de provisão e infraestrutura de apoio adequadas); a inconstância e
a pouca sofisticação dos processos de monitorização, avaliação e mecanismos de feedback e a
tensão do equilíbrio entre a qualidade e a quantidade das ofertas educativas (UNESCO, 2010b,
p. 45)
Nesse relatório final apela-se, portanto, a que se verifique uma aprovação imediata de
«padrões de qualidade» comprovados e de medidas de qualidade indicativas e mensuráveis
como possíveis opções para os Estados-Membros. Pretende-se também que se desenvolva um
melhor conhecimento de políticas e práticas exemplares relativas à profissionalização dos
educadores de adultos e que se verifique uma maior recetividade para a introdução de sistemas
nacionais de monitorização que assegurem qualidade e enformem as políticas.
Antecedendo essas recomendações, foi apresentado, nessa sexta CONFINTEA, o Relatório
Global sobre a Aprendizagem e Educação de Adultos. Esse documento foi elaborado com base
nos Relatórios Nacionais de 154 Estados-Membros e nos cinco Relatórios Síntese regionais19.
Nesse documento pretendia-se analisar tendências, identificar os principais desafios e as
melhores práticas e direcionar as ações para a melhoria da aprendizagem e educação de
adultos, almejando a tradução dessas recomendações em políticas e programas específicos.
No referido relatório encara-se o investimento em recursos humanos (em termos
quantitativos e qualitativos) como “provavelmente o indicador mais importante da qualidade na
educação de adultos já que são estes a chave para a qualidade da educação de adultos. Deve
ser o ponto focal da qualidade nas políticas educacionais” (UNESCO, 2010a, p. 93).
É também reconhecido que conjuntamente com a escassez dos recursos aplicados se
verifica uma baixa profissionalização do sector da educação de adultos que parece afetar o
desempenho dos profissionais e influi na dita qualidade das experiências nesse campo. Essa
baixa profissionalização traduz-se em várias dimensões: 1) profissionais com formação
especializada mínima ou poucas qualificações reconhecidas; 2) modalidade de reconhecimento
e certificação das aprendizagens e experiências anteriores ainda pouco desenvolvidas; 3)
condições de trabalho precárias; 4) pouca retenção de profissionais experientes e competentes;
19 Foram cinco os relatórios-síntese regionais: 1) África; 2) Estados Árabes; 3) Europa; 4) América do Norte e Israel e 5) América do Norte e Caraíbas.
53
5) fragmentação do corpo de profissionais e consequente pouca capacidade de pressão e poder
(lobbying) para melhor formação e aumento de investimento; 6) falta de instituições fortes para a
defesa dos interesses; 7) dispersão e diversidade dos atores implicados na aprendizagem e
educação de adultos (inibição de colaborações mais eficazes com outros que partilhem agendas
semelhantes); 8) pouco reconhecimento, valorização e aproveitamento das diferentes
contribuições da sociedade civil, do sector privado e de outros intervenientes, ainda que seja
assumido que a principal responsabilidade pela oferta educativa seja do Estado (UNESCO,
2010a, p. 25).
Também no Relatório Síntese Regional que analisa o estado e o desenvolvimento da
Aprendizagem e Educação de Adultos (AEA) na Europa, na América do Norte e Israel (38 países),
se reflete a noção de que o desenvolvimento profissional do pessoal é um componente essencial
da garantia de qualidade neste campo. Nas suas conclusões também se sustenta que é dada
pouca atenção à definição dos processos e conteúdos da formação inicial daqueles que
trabalham na AEA Formal e ainda menos atenção prestada aqueles que trabalham na AEA não-
formal.
Nesta região é mais prevalecente o Desenvolvimento Profissional Contínuo do que a
Formação Profissional Inicial, mas que, no entanto, permanece ad hoc e remendado. Na maioria
dos países desta região não se verifica uma visão clara sobre as competências padrão ou
habilidades necessárias para cumprir as tarefas profissionais na AEA, em parte devido à
diversidade do campo, embora num pequeno número de países tenha desenvolvido perfis de
competência para os profissionais. Verifica-se que em certos países se está a avançar da noção
de ‘perfil’ e de ‘profissão’ no campo da educação de adultos para a ideia de ‘profissionalização20’
e o desenvolvimento do profissionalismo (Keogh, 2009, p. 56).
Por exemplo, um dos Relatórios Nacionais que mais reflete sobre a profissionalização da
Educação de Adultos é o da Alemanha. Na Alemanha, não se verifica uma profissão específica,
nem se verifica a discussão relativa ao estabelecimento da profissão de Educador de Adultos
com perfil ocupacional específico e com regras no acesso à atividade profissional e nas
qualificações requeridas. Os perfis daqueles que trabalham nessa área são heterogéneos e
caracterizados por um largo número de diferentes intervenientes e instituições.
20 A título de curiosidade, os conceitos de profissionalização e de profissionalismo estão enunciados nos relatórios nacionais dos seguintes países: Áustria; Bélgica (Comunidade Flamenga e Francesa); Bulgária; República Checa; Estónia; França; Alemanha; Países Baixos, Roménia, Sérvia, Suíça e Macedónia.
54
A diversidade também se reflete nas diferentes designações profissionais. Também não se
verifica um curso superior específico que permita o acesso a essa ocupação e o que existe são
diferentes especializações que são pertinentes para a Educação de Adultos. A discussão tende a
focar-se na profissionalização no contexto do desenvolvimento da qualidade, entendida como o
desenvolvimento do profissionalismo na Educação de Adultos (Lattke & Hossbach, 2008, pp. 75-
79).
Uma outra perspetiva é revelada no Relatório da Áustria que, em 2007, fez uma
substancial contribuição para a profissionalização e garantia de qualidade no pessoal da AEA
através da criação de uma instituição, a Weiterbildungsakademie (Academia para a Educação
Contínua), que consiste num sistema de qualificação e reconhecimento/acreditação dos
educadores de adultos e no estabelecimento de padrões e no fortalecimento da
profissionalização da Educação de Adultos austríaca.
De acordo com esse relatório seria vital,
“a aceleração do desenvolvimento de políticas, estruturas e medidas que permitissem resolver questões
de qualidade e garantir resultados de qualidade, incluindo o desenvolvimento de perfis de competências
para o pessoal da AEA, e uma abordagem sistemática do desenvolvimento profissional e contínuo do
pessoal da AEA para facilitar a ‘profissionalização’ da provisão da AEA” (Keogh, 2009, p. 57).
Processos de profissionalização e o profissionalismo
Temos vindo a utilizar de uma forma vaga o conceito de profissionalização e
profissionalismo dos trabalhadores e agentes que atuam no campo da Educação e Formação de
Adultos. Neste campo, esses conceitos e os fenómenos a que se referem apresentam
convergências e ambiguidades, outros dilemas e contradições e diversas aceções e dimensões.
As análises relativas ao processo de profissionalização e ao profissionalismo implicam inúmeras
divergências e controvérsias relacionadas com as considerações teóricas e políticas sobre as
missões, as práticas e as características da Educação e Formação de Adultos.
Como o conceito de desenvolvimento profissional, também a utilização dos conceitos de
profissionalização e de profissionalismo possui uma certa amplitude, referindo-se
indiferentemente ao desenvolvimento de uma profissão (em termos de estatuto, de
reconhecimento social e em termos de condições de trabalho) e também no respeitante ao
desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e práticas.
55
Saliente-se que a profissionalização e o profissionalismo não são conceitos nem
problemáticas de reflexão ou discussão recentes. No entanto, parece verificar-se um
recrudescimento do interesse em torno daquelas temáticas em múltiplas áreas e campos
disciplinares, e não somente na Educação e Formação de Adultos.
Esse interesse pluridisciplinar denota-se na investigação de diferentes grupos ocupacionais
e profissionais que têm características similares (entre outras, a sua emergência recente), em
que se abordam os processos de profissionalização e o profissionalismo de formas similares:
nas associações do terceiro sector (Rego, 2010, pp. 153-178); nos profissionais da gestão dos
recursos humanos (Almeida, 2012, pp. 97-108); no campo da saúde, relativamente aos técnicos
de cardiopneumologia (Tavares, 2008, pp. 35-44) e aos acupuntores e homeopatas (Almeida, J.,
2012, pp. 109-130); no campo da assistência social (Passarinho, 2008, pp. 21-33);
relativamente aos arquitetos e ao campo da arquitetura (Cabral & Borges, 2006); em
organizações femininas (Markowitz & Tice, 2002); nos trabalhadores de unidades agrícolas
(González & Benito, 2001), entre outros.
De uma forma geral, a profissionalização refere-se à estratégia ou ao processo pelo qual
uma ocupação profissional é promovida e/ou se torna uma profissão reconhecida. Procura-se
potenciar e desenvolver determinadas ocupações e práticas profissionais, ou mesmo regular e
restringir o acesso, através da definição e obtenção de conhecimentos e saberes específicos
(Rodrigues, 1997; Freire, 2002; Gonçalves, 2007).
Através do processo de profissionalização poder-se-á verificar, direta ou indiretamente,
uma vontade de «proteger da competição» e obter a exclusividade de uma prática profissional,
aqueles que são treinados e possuidores de saberes e competências específicas. Além da
definição de perfis de práticas e competências, associa-se também a esse processo a
implementação de códigos legais e éticos, bem como de organizações específicas
configuradoras da identidade e da socialização profissional (Rodrigues, 1997, pp. 20-22, 62-69).
Os processos de profissionalização podem assumir características específicas: podem ser
percecionados como de evolução interna («from within» ou «bottom-up») quando as ocupações
profissionais e os seus desenvolvimentos são o resultado de atividades espontâneas dos grupos
profissionais ou dos seus elementos ou de evolução externa («from above» ou «top-down»)
quando o estado tem um papel intervencionista no início e na administração das ocupações e
dos grupos profissionais (Evetts, 2011, p. 398).
56
Abordagens taxinómicas encaram a profissionalização como um processo pelo qual
determinadas ocupações vão atingindo os critérios definidores do tipo-ideal de uma profissão,
por uma sucessão de etapas, para isso recorrendo normalmente aos modelos estipulados pela
análise das profissões liberais: médicos, advogados, engenheiros, etc. (Jarvis, 1995; Gonçalves,
2007, p. 31). Apesar de existirem várias tipologias e critérios definidores de uma profissão,
referimos a que João Freire sintetizou:
“uma formação escolar (pós-básica) prolongada e exigente; uma especialização aprofundada do
conhecimento e o domínio técnico da sua aplicabilidade prática; a noção de um serviço benéfico
prestado à colectividade; a faculdade de julgamento individual sobre os actos técnicos específicos da
profissão e correspondente responsabilização legal; um acesso restrito e controlado ao exercício da
profissão; um controlo colegial dos profissionais sobre esse acesso e sobre as condições do seu
exercício; e, finalmente, um reconhecimento oficial, público, da profissão” (Freire, 2002, pp. 320-321).
Outras análises mais específicas e referidas ao campo da Educação e Formação de
Adultos, desvinculando-se da profissionalização concebida como o processo de desenvolvimento
de uma profissão21 por uma sucessão de etapas, entendem o processo de profissionalização de
uma forma mais contextual e relacionada intrinsecamente com o desenvolvimento do
profissionalismo das pessoas que trabalham neste campo específico:
“Profissionalismo neste sentido significa compreender a situação em que a ação profissional toma lugar.
Significa um entendimento holístico dos profissionais que têm de agir com base na combinação das
suas atitudes, habilidades e conhecimentos. Assim a profissionalização significa educar as pessoas que
trabalham em educação de adultos. O objetivo da profissionalização é apoiar o profissionalismo das
pessoas que trabalham na educação de adultos. Com esse profissionalismo um desenvolvimento
contínuo da educação de adultos pode ser alcançado pelos profissionais. Onde o termo
‘profissionalização’ é usado, significa um processo em direção ao profissionalismo” (Egetenmeyer &
Käpplinger, 2011, p. 25).
A profissionalização pode ser entendida como um processo multidimensional em que: a)
um grupo profissional específico (e cada um dos elementos que o constituem) procura
estandardizar e melhorar as respostas profissionais designadamente com b) o desenvolvimento
e atualização de saberes competências (através de diversas atividades de educação, de
formação e de aprendizagem) que permita que c) os ‘profissionais’ possam melhorar as suas
respostas e desempenhar as suas funções com maior profissionalismo para d) que se possam
adaptar às mudanças e desafios dos seus contextos profissional e social e desenvolver a sua
21 De acordo com o conceito de Julia Evetts, as profissões “são encaradas como um grupo genérico de ocupações baseadas no conhecimento tanto técnico como tácito” (Evetts, 2003, p. 397).
57
prática profissional (Shanahan, Meehan & Mogge, 1994; Parke, 2000; Cort, Härkönen &
Volmari, 2004, p. 9; Rego, 2010, pp. 154-155).
No entanto, ao associar-se o conceito de profissionalização ao de profissionalismo outras
questões se determinam devido à polissemia destoutro conceito22. De acordo com Julia Evetts há
duas formas principais de conceber o profissionalismo: a) enquanto um sistema de valores que
implica uma ordem social normativa, determinando-se como um “motivador ou um facilitador da
mudança ocupacional (Evetts, 2003, p. 396); e b) como um «sistema de crenças hegemónicas»,
isto é, uma ideologia que controla as organizações ao nível macro (nos estados, sociedades e
mercados), meso (nas diversas organizações e instituições) e micro (relativamente aos grupos e
atores profissionais) que resultam num mecanismo de controlo social para os trabalhadores
(Evetts, 2003, p. 399).
De acordo com Julia Evetts (2003, pp. 400-403), os trabalhadores de diferentes
ocupações preferem fundamentar e conceber a sua prática «profissional» e o seu
profissionalismo utilizando as suas referências de «discurso normativo» e não enquanto uma
ideologia específica com implicações nas suas próprias práticas.
O profissionalismo concebido no seu primeiro sentido revela-se atrativo para diferentes
agentes e grupos profissionais já que permite pensar as diversas implicações nas práticas
profissionais, na definição das identidades ocupacionais e na própria relação com os clientes nas
seguintes dimensões:
“[n]a propriedade exclusiva de uma área de perícia e conhecimento, [n]o poder de definir a natureza dos
problemas nessa área, bem como [n]o controlo do acesso a soluções potenciais. Também inclui uma
imagem de relações de trabalho colegiais de assistência e suporte mútuos em vez de um controlo
hierárquico, competitivo e gestionário” (Evetts, 2003, p. 407).
Porém, o profissionalismo torna-se também um mecanismo disciplinar mesmo que
referido a um sistema de valores normativos. Ao relacionar-se como o desenvolvimento
profissional, manifesta-se muitas vezes na configuração de trabalhadores «autogeridos e
automotivados», com a expressão da sua autonomia limitada ao que a organização ou instituição
define como apropriado (Evetts, 2003, p. 408). Por isso, implementa-se a accountability e outros
22 Diversos autores perspetivam ainda as diferenças entre as lógicas de desenvolvimento organizacional e as lógicas do profissionalismo nos processos de profissionalização: “as lógicas do desenvolvimento organizacional e do profissionalismo são diferentes. Que lógica leva e melhora as ações quotidianas dos profissionais? Será, por um lado, a lógica do profissionalismo, ou será, por outro a lógica do desenvolvimento organizacional? A este respeito está-nos a faltar investigação empírica atualizada além das entrevistas de diretores ou gestores de qualidade, que muitas vezes contam narrativas legitimadoras acerca do sucesso da gestão de qualidade […]. Por exemplo, seria interessante investigar processos educacionais reais e as consequências para as diferentes partes implicadas antes e depois da introdução de sistemas de gestão de qualidade” (Jütte, Nicoll & Olesen, 2011, p. 27).
58
indicadores de performance como manifestações do profissionalismo. Neste sentido, o
profissionalismo revela-se também na auditabilidade (Evetts, 2003, p. 408).
Especificidades e contradições na EFA
No campo da Educação e Formação de Adultos as considerações em torno da
profissionalização assumem múltiplos sentidos e outras tantas especificidades que se
relacionam com as tensões entre duas lógicas divergentes. Cada uma dessas lógicas
fundamenta-se em estruturas teóricas e ideológicas diferentes, relativas à missão dos agentes e
do trabalho desenvolvido neste campo (Kerka, 1996; Lauzon, 1998). Richard Edwards situa o
espaço dessas contradições:
“o trabalhador com adultos tem-se deparado com pressões crescentes para um maior profissionalismo e
uma maior responsabilização (accountability) em relação aos financiadores e gestores, em vez de para
eles mesmos ou pelo interesse ligado à ação social. Será notado que a pressão para ser construída
como uma profissão também advém parcialmente daqueles que trabalham no terreno, como parte de
uma estratégia de ganhar um maior estatuto, reconhecimento e, com isso, melhores pagamentos e
condições. Contudo, uma crescente responsabilização (accountability) e profissionalização também
suscitam uma maior governança da charneca (moorland) e daqueles que poderão ser considerados
trabalhadores legítimos e, assim, competentes” (Edwards, 1997, pp. 158-159).
Por um lado, com a profissionalização dos agentes e instituições de Educação e Formação
de Adultos, poderia apresentar-se como uma possibilidade para o desenvolvimento do próprio
campo. Refere-se que os principais benefícios da crescente profissionalização poderiam passar
por melhores salários e mais emprego; um maior estatuto e prestígio social e profissional; um
crescente reconhecimento social e uma maior credibilização dos profissionais que trabalham
nessa área. Correspondentemente, estes fatores traduzir-se-iam numa maior valorização da
própria Educação e Formação de Adultos que, em alguns casos, se considera ter tido uma
existência periférica (Galbraith & Gilley, 1986; Parke, 2000; Knox & Fleming, 2010).
Com a profissionalização pretende-se melhorar a atratividade das diversas ocupações
profissionais inseridas num campo, nomeadamente por aqueles com uma maior preparação
académica. Ao mesmo tempo, com a profissionalização, podia-se convencer aqueles que já
trabalham na área a permanecerem nesse campo de práticas (Mcintosh, 2008, pp. 35-52).
A profissionalização induziria a melhoria dos mecanismos de educação e formação inicial
e contínua fortalecendo gradualmente o corpo de conhecimento e aumentando as diversas
conexões entre o mundo académico e o mundo da prática profissional. O aprofundamento desse
relacionamento possibilitaria a reconfigurações dos conteúdos dos programas de graduação; das
59
prioridades da Universidade e da aplicação de recursos. Estas mudanças implicariam
consequências não só nos corpos ‘profissionalizados’ mas também naqueles que trabalham em
part-time ou em regime de voluntariado e que não visam necessariamente possuir certificados
profissionais (Knox & Fleming, 2010).
Neste sentido, poderia superar-se uma situação que frequentemente é traduzida na
seguinte observação (ou em alguma variação): constata-se a pouca preparação teórica e o
relativo descomprometimento com as diversas tradições da EFA entre os trabalhadores do
campo. Desta forma, a profissionalização poderia induzir um maior compromisso individual com
as diversas tradições teóricas, com as comunidades locais e com as comunidades de prática.
Possibilitaria também uma melhor compreensão e aplicação dos conceitos, teorias e
abordagens, através de uma reflexão sobre a história e tendências passadas e das possíveis
direções futuras.
Outra das possíveis vantagens dos processos de profissionalização relaciona-se com a
implementação e adesão generalizada a códigos e padrões éticos. A existência de tais códigos,
com ou sem formas e sistemas de sanção, poderão promover uma cultura de «transparência e
de responsabilização» da educação de adultos, protegendo os educandos adultos de
incompetentes ou más práticas e condutas profissionais, elevando as expectativas sociais em
relação aos profissionais.
Além dessa autorregulação, a existência de códigos e padrões éticos poderia proporcionar
o desenvolvimento de outros mecanismos de regulação que poderiam ajudar a melhorar a
qualidade das práticas profissionais, além de contribuírem para a promoção de uma identidade
comum e mais coerente (Mcintosh, 2008). Assim, além da proteção dos
adultos/utentes/clientes, refere-se também um outro efeito relacionado com a proteção de
intervenções exteriores e com o desenvolvimento da autonomia profissional.
Com a profissionalização possibilitar-se-ia a criação de diferentes redes e relações
colaborativas, de organizações associativas e mesmo a criação e disseminação de diferentes
ações e regulações legislativas que poderiam ser benéficas para os próprios agentes
profissionalizados. Com melhores mecanismos de comunicação e com uma maior
estandardização das práticas aos níveis local e nacional, poder-se-ia estimular uma maior
atenção para os principais temas relacionados com a educação e aprendizagem dos adultos e
ajudar no agenda-setting junto da opinião pública e da comunicação social (Knox & Fleming,
2010).
60
Por outro lado, há quem rebata cada uma dessas auspiciosas possibilidades. Contesta-se
a profissionalização da Educação e Formação de Adultos como um dos últimos redutos na
defesa de uma ação da educação de adultos mais «radical», mais socialmente consciente e
visando uma ordem social diferente.
Algumas dessas contestações enquadram-se numa crítica mais global aos modelos
socioeconómicos e científicos vigentes e à difusão das suas ideologias específicas. Os processos
de profissionalização implicados na Educação e Formação de Adultos seriam, portanto, uma
ameaça a uma das suas tradições, a radical, baseada na comunidade e ativista (Finger & Asún,
2003; Martin, 2008).
A educação e formação de adultos poderia tornar-se não reflexiva e, dessa forma, perder o
seu potencial criativo. A profissionalização tende a apresentar uma prática profissional de uma
forma apolítica e o conhecimento subjacente com um valor neutral. A articulação da educação
com a economia é concebida exclusivamente em termos de preparação para um emprego ou
para a reconversão profissionais (Lauzon, 1998).
De uma forma geral, as dinâmicas de profissionalização seriam um dos caminhos para o
desenvolvimento da hegemonia «neoliberal», tecnológica e pericial numa sociedade capitalista. O
discurso da profissionalização assentaria “naquilo que funciona” (Dale, 2003), ou seja, em
critérios economicistas de eficácia, e pode ser concebido como estando sustentado no culto do
profissionalismo e da eficiência (Collins, 1991) em detrimento do discurso que almeja a justiça
social. A racionalidade técnica subjacente parece tornar-se proeminente em relação a todas as
formas de pensamento e discurso humano. Verifica-se uma certa tecnicização dos agentes e das
organizações de EFA.
Os processos de profissionalização, implicando uma maior regulação e estandardização
das práticas a nível local e nacional, poderiam implicar também uma perda de uma variedade de
diferentes tipos de conhecimento e experiências. Simultaneamente, poder-se-ia reduzir ou perder
a possibilidade de organizar as diferentes atividades de educação de adultos de acordo com a
necessidade dos participantes locais e de movimentos sociais relevantes.
Com a profissionalização também se poderá reduzir o campo de possibilidades na ação
educativa e profissional e poderá traduzir-se numa perda da vocação, do espírito de militância e
do compromisso pessoal já que se tornaria simplesmente mais uma ocupação profissional ou
um emprego.
61
Ao mesmo tempo, o exercício da autonomia profissional ficaria dificultado: as pressões
para a profissionalização e para a institucionalização poderiam derivar em diferentes
acomodações e cooptações de agendas organizacionais. Algumas dessas agendas encaram a
educação e formação de adultos numa dimensão instrumental e adaptativa às determinações da
economia e dos mercados de trabalho ou das preferências de consumo individuais, fazendo com
que a educação e a formação se torne mais uma «mercadoria» (commodity) e o educando como
mais um cliente.
Neste sentido, a profissionalização dos agentes da educação de adultos contribuiria para a
manutenção do status quo, através da disseminação de práticas, conhecimentos e competências
consideradas necessárias à prática da educação de adultos. Sendo os próprios educadores de
adultos beneficiários da «meritocracia educacional», teriam interesse em manter o estado das
coisas, que poderia afetar a sua aproximação e a sua responsabilidade para aqueles que se
colocam fora do mainstream (Kerka, 1996). Num sentido muito próximo, Ian Martin (2000)
encara a profissionalização como uma forma de respeitabilização, associada a uma cultura de
hierarquia e deferência (relacionado com o estado e ancianidade).
Mathias Finger e José Asún (2003, p. 129) sustentam que a “aprendizagem da nossa
saída”, expressão genérica para designar o retomar da tradição da educação de adultos de ação
e mudança social, passaria pela rejeição da “institucionalização das necessidades de educação
de adultos” e do “processo de profissionalização”, na medida em que se deveria contrariar a
existência de peritos e do seu conhecimento legitimados pela ciência e pela racionalidade
instrumental. A existência de agentes e sistemas periciais colocaria em perspetiva uma relação
de poder e controlo do acesso à profissão e também da produção do conhecimento considerado
válido e legítimo (e das formas sancionadas de aquisição), na medida em que esses agentes têm
tendência a controlarem normativamente o trabalho e a criar diversas barreiras institucionais
(Illich, 1977, pp. 15-27). Desta forma, para contrariar estas tendências dever-se-ia proceder à
desprofissionalização das diversas relações sociais, inclusivamente as educativas. Analisando a
crítica de Ivan Illich aos especialistas e à especíalização, Mathias Finger e José Asún escrevem o
seguinte:
“De facto, os agentes da institucionalização são os especialistas, os tecnocratas, e os profissionais.
Especialistas e cultura de especialização atraem cada vez mais especialistas. Além disso, os especialistas
têm tendência a cartelizar-se, criando “barricadas institucionais” – por exemplo, autoproclamando-se
guardiões e auto-seleccionando-se. E, por fim, controlam a produção de conhecimento, decidem sobre a sua
validade e legitimidade, além de sancionarem a sua aquisição” (Finger & Asún, 2003, pp. 20-21).
62
III. Os profissionais de RVC: um processo de profissionalização
A designação «profissional de RVC» corresponde a uma atividade profissional que é
desempenhada no âmbito do Sistema Nacional de Reconhecimento, Validação e Certificação de
Competências (RVCC), designadamente nos Centros Novas Oportunidades23.
Essa ocupação profissional é de emergência recente24 (desde 2000) e concretiza-se na
organização, orientação e aconselhamento de candidatos/adultos em processos de
reconhecimento, validação e certificação de competências.
Genericamente, o profissional de RVC acompanha os candidatos a certificação no
processo de identificação dos seus saberes e na validação das competências manifestadas
através da combinação de diferentes métodos de avaliação, tais como entrevistas em
profundidade, debates e o uso de portefólios.
No desenvolvimento das suas atividades, o profissional de RVC promove e dinamiza
diferentes sessões em que, através de entrevistas, conversas e debates (individuais ou grupais),
recolhe ou aprofunda diferentes informações relativas, por exemplo, às situações, expectativas e
objetivos pessoais.
Nessas sessões também orienta a elaboração do portefólio onde cada um dos candidatos
evidenciará as suas competências. Refira-se que esse documento será avaliado pelos
formadores e por um elemento externo ao CNO, o Avaliador Externo, que confirmará (ou não) a
validação prévia efetuada pela equipa (constituída pelo próprio e pelos diversos formadores) e a
certificação através de uma apresentação do candidato num júri público.
Além do esclarecimento de diferentes dúvidas, através do acompanhamento das referidas
atividades também são promovidas diversas situações e momentos de autoavaliação e de
reflexão individual, diferentes estratégias de motivação e aconselhamento individual.
23 São diferentes os contextos institucionais em que os profissionais de RVC desenvolvem as suas funções. De uma forma geral pode-se afirmar que os CNO podem ser promovidos por entidades formadoras, públicas e privadas (lucrativas ou do terceiro sector). Inicialmente as entidades promotoras de Centros de RVCC eram principalmente entidades privadas e associativas. A partir de 2006, com a Iniciativa Novas Oportunidades, começou-se a inverter essa distribuição. De acordo com os dados da ANQ (relativos a 31 de julho de 2011), a predominância era de entidades na esfera da Administração Pública (tanto da administração central do Estado como da Administração Regional e Local do Estado). A 31 de Julho de 2011 mais de metade dos CNO eram promovidos por entidades públicas. 24 Dados de 2010 revelados no relatório Estado da Educação 2011. A Qualificação dos Portugueses editado pelo CNE (2011) referem que os profissionais de RVC constituem 19% dos elementos das equipas técnico-pedagógicas. Sem especificar outros dados relativos aos profissionais de RVC, revela-se também que o total de elementos das equipas é de 11611. Portanto, fazendo uma simples conta percebe-se que os profissionais de RVC seriam cerca de 2206. No entanto, parece-nos que esses dados não são fidedignos já que considerando 459 CNO existentes nesse mesmo ano, representariam uma média de 4,8 profissionais de RVC por centro, número que é inverosímil já que a grande parte dos CNO terão no máximo quatro profissionais. De acordo com o nosso raciocínio e considerando, na melhor das circunstâncias, que serão 4 profissionais de RVC por CNO isso representaria 1836 profissionais de RVC, número que mesmo assim consideramos excessivo.
63
No desempenho das suas funções o profissional de RVC combina distintas teorias e
referências metodológicas (da educação de adultos, da orientação vocacional, da gestão de
recursos humanos, etc.) e outros saberes e competências (pessoais e interpessoais,
instrumentais) tais como aqueles referidos ao balanço de competências e às abordagens
autobiográficas: diferentes técnicas de comunicação; métodos de tutoria apropriados às
características pessoais; dinâmicas de grupo; entre outros.
Para melhor enquadrarmos o processo de profissionalização dos profissionais de RVC
torna-se necessário abordarmos como se estruturou e ainda se estrutura o Sistema Nacional de
RVCC. Posteriormente, examinaremos a inclusão da referida atividade e ocupação profissional
num campo específico de práticas, o Aconselhamento e a Orientação, para depois incidirmos
sobre como se realiza o desenvolvimento profissional nas suas diversas dimensões: em termos
de espaços e processos de aprendizagens; das suas referências educativas e identidades
profissionais; no perfil de competências e na regulação da atividade.
O Sistema Nacional de RVCC
O Sistema Nacional de RVCC é configurado pelo conjunto de serviços através dos quais se
reconhecem, validam e certificam os saberes e os conhecimentos adquiridos ao longo da vida,
em diferentes espaços de aprendizagem: nos contextos escolares e formativos, na vida
quotidiana (relacionados com os diferentes interesses individuais) e também no contexto do
trabalho (Pires, 2002, pp. 476-478; CNE, 2011, p. 134).
Esse sistema é enquadrado por diversos dispositivos normativos e é formado pela Rede de
CNO (anteriormente designados por Centros de RVCC), estruturas promovidas por entendidas
públicas e privadas e que possuem uma equipa constituída por diversos elementos com funções
e responsabilidades diferenciadas: diretor, coordenador, administrativos; técnicos de diagnóstico
e encaminhamento, profissionais de RVC e formadores.
Os CNO são encarados como a “porta de entrada” (Gomes & Simões, 2007, p. 10) para
as diversas ofertas educativas e formativas direcionadas aos cidadãos com mais de 18 anos que
pretendam iniciar ou continuar percursos de qualificação.
A configuração institucional e organizacional dos CNO e as diversas atividades aí
desenvolvidas (diagnóstico e encaminhamento e processos de RVC) pretendem induzir o
64
“reconhecimento individual da capacidade de aprender, o que constitui o principal mote para a
adoção de posturas pró-ativas face à procura de novas qualificações” (Eurydice, 2007b, p. 53).
Após os candidatos serem encaminhados para os processos de RVCC – uma das
possibilidades dos inscritos nos CNO – são utilizadas metodologias e instrumentos específicos
(abordagens autobiográficas, balanços de competência e portefólios reflexivos de aprendizagem,
entre outros) que permitem que cada um dos «candidatos» reconheça, demonstre e especifique
as suas competências (ou seja, os saberes em ação) e os recursos associados a essas
competências (ou seja, os conhecimentos, as capacidades e os saberes-fazer).
As competências e recursos manifestados pelo candidato são avaliados (pelo próprio e
pela equipa que o acompanha – profissional de RVC e formadores) na sua conformidade a um
padrão específico designado por Referencial de Competências-Chave (de nível Básico e
Secundário). Após essa avaliação e através de um júri de certificação25 são possibilitados dois
tipos de certificação (parcial ou total), em quatro níveis diferentes (B1, B2, B3 e Secundário)
equivalentes a quatro níveis de qualificação escolar: 4º, 6º, 9º e 12º anos, respetivamente.
Na implementação desse sistema foram referidas três grandes objetivos: 1) a elevação
dos níveis de qualificação da população portuguesa e a convergência gradual com os padrões
médios europeus. Desejava-se, dessa forma, tentar corrigir as debilidades estruturais que
afetavam (e afetam) a competitividade, a qualidade do emprego e a sustentabilidade da
economia portuguesa. Pressupunha-se que o modelo de desenvolvimento da sociedade e da
economia portuguesa se daria pela ampliação e ajustamento da oferta educativa aos diferentes
perfis individuais; 2) a facilitação do reconhecimento, validação e certificação das competências
dos diferentes indivíduos que o desejassem. Invocavam-se razões de «justiça social» que
visavam a diminuição das discriminações sociais relacionadas com as desigualdades e
diferenciais de qualificação; 3) o desenvolvimento de um sistema articulado de educação e
formação numa perspetiva de aprendizagem ao longo da vida que permitisse o acesso
generalizado das populações adultas a atividades que permitissem a “progressão educativa,
tecnológica, cultural e profissional” (Portaria n.º 1082-A/2001, de 5 de Setembro).
Como sustentado no relatório que sintetizava o Debate Nacional sobre a Educação
realizado em 2007, e que enformava essa retórica:
25 O júri de certificação é uma sessão pública onde o candidato apresenta o trabalho desenvolvido no desenvolvimento do seu portefólio reflexivo de aprendizagens. Essa apresentação é feita perante um grupo de jurados constituídos pela equipa que o acompanhou (profissional de RVC e formadores) e um outro elemento, o Avaliador externo, uma figura externa ao CNO e que tem a função de confirmar (ou infirmar) a validação efetuada pela equipa e legitimar a certificação do candidato (Gaspar, Milagre & Lima, 2009).
65
“a adopção do paradigma da aprendizagem ao longo da vida trará profundas alterações às políticas
educativas do país, desde a sua concepção à sua execução. Este paradigma requer desde logo uma
grande disponibilidade das instituições educativas para acolher todos os cidadãos, independentemente
da sua condição, idade e estatuto social. A aprendizagem ao longo da vida deve ser entendida por toda a
sociedade como uma condição de cidadania activa e como um longo percurso de apoio a cada cidadão,
especialmente aos jovens e adultos que vivem em condições sociais mais desfavorecidas e que se
encontrem em situações de maior vulnerabilidade” (CNE, 2007, p. 161).
A implementação do Sistema Nacional de RVCC apresentou algumas particularidades:
privilegiou a procura educativa e formativa e descentrou-se da capacidade de oferta; permitiu o
desenvolvimento de novas metodologias e tecnologias educativas e de aprendizagem; considerou
as características sociais e económicas (o declínio demográfico, as «novas» necessidades de
qualificação e a ineficiência de outras respostas, por exemplo, o ensino recorrente); e foi
implementado por iniciativa política, através de diferentes reformas e de regulamentação legal
(Pires, 2002; Ávila, 2005).
Até ao ano de 2012 foram quatro as entidades governamentais que desenvolveram,
regularam e supervisionaram o Sistema Nacional de RVCC e a rede de Centros: a Agência
Nacional de Educação e Formação de Adultos (ANEFA); a Direcção-Geral de Formação
Vocacional (DGFV); a Agência Nacional para as Qualificações (ANQ) e a Agência Nacional para as
Qualificações e Ensino Profissional (ANQEP).
Não se pretendendo proceder a uma análise exaustiva dessas mesmas instituições, é
necessário fazer um pequeno enquadramento das suas especificidades para melhor se
compreender as alterações do Sistema Nacional de RVCC.
Da ANEFA à DGFV: um pouco de história…
Os Centros de RVCC surgiram no âmbito da ANEFA, uma agência governamental
formalmente criada a 28 de Setembro de 1999, no fim do mandato do primeiro governo liderado
por António Guterres, do Partido Socialista26. Entre outras atribuições, a ANEFA responsabilizava-
se pela construção gradual de um sistema de reconhecimento e validação das aprendizagens
informais dos adultos, visando a certificação escolar e profissional.
26 A ANEFA foi formalmente criada através do Decreto-Lei 387/1999 de 28 de Setembro, na sequência da constituição, em 1998, do Grupo de Missão para o Desenvolvimento da Educação e da Formação de Adultos (pela resolução do Conselho de Ministros nº92/1998, de 14 de Julho). Refira-se também que foi criada no XIII Governo Constitucional vigente entre 28/10/1995 a 25/10/1999.
66
Em Novembro de 2000 constituiu-se uma rede de seis Centros de RVCC, promovidos por
diversas entidades de várias regiões do país27. Na sua fase de instalação pretendia-se que
estivessem articulados para conjuntamente adequarem, reformularem e implementarem o
modelo de intervenção e os diversos instrumentos a utilizar nos processos de RVCC (Nico, 2011,
pp. 83-85).
No ano seguinte, em 2001, foi criada e implementada a rede nacional de Centros de
RVCC a partir da qual se operacionalizava o Sistema Nacional de RVCC28. Enquadrado dentro da
Estratégia Europeia para o Emprego e do Plano Nacional de Emprego, a missão deste sistema
era dar
“a oportunidade a todos os cidadãos, e em particular aos adultos menos escolarizados e aos activos
empregados e desempregados, de verem reconhecidos, validados e certificados os conhecimentos e as
competências que foram adquirindo por via não formal ou informal, em diferentes contextos de vida e de
trabalho, e, ainda, em inúmeras acções de formação realizadas nos mais diversos domínios e com as
mais diversas durações” (do Preâmbulo da Portaria nº 1082-A/2001, de 5 de Setembro).
Os Centros de RVCC passaram a ter a atribuição de acolher e orientar para o processo de
RVCC os adultos maiores de 18 anos que não possuíssem o 9º ano de escolaridade. Pretendia-
se o aumento dos níveis de certificação escolar e de qualificação profissional e a mobilização
para a continuidade de processos de formação contínua.
As entidades promotoras dos Centros de RVCC poderiam ser entidades públicas ou
privadas com significativa implantação local, regional ou nacional, que se constituiriam por sua
própria iniciativa e não diretamente emanadas das estruturas centrais do Estado.
Pretendia-se um modelo de intervenção descentralizada e territorializada. Para cumprirem
esse desígnio os Centros deveriam assegurar um modelo de itinerância29, ou outros apropriados,
27 Na região Norte, a Associação Industrial do Minho e a Associação Comercial de Braga; na região de Lisboa e Vale do Tejo, Escola Nacional de Bombeiros e Instituto de Emprego e Formação Profissional – Centro de Formação Profissional do Seixal; na região do Alentejo, a Agência para o Desenvolvimento Local do Alentejo Sudoeste (Nico, 2011, p. 84). 28 Os CRVCC e o SNRVCC foram criados pela Portaria nº 1082-A/2001, de 5 de Setembro (revogada pelas Portarias nº 286-A/02, de 15 de Março, e nº 86/2007, de 12 de Janeiro). Esta portaria referia também o número de novos Centros de RVCC a abrir: até ao ano de 2006 mais 78% de centros. Anualmente seriam criados 14 novos centros, com a exceção do ano de 2001 em que seriam criados 22 centros. O SNRVCC e os CRVCC estavam enquadrados pelo terceiro Programa Operacional da Educação (PRODEP III), vigente entre os anos de 2000 e 2006, aprovado pela Comissão Europeia a 13 de Julho de 2000 que admitia a necessidade de se “instituir um Sistema de Acreditação de Conhecimentos e Competências adquiridas fora do sistema escolar”. Esse sistema, sob o signo de “estimular a Educação e a Formação ao Longo da vida (como medida potenciadora da capacidade competitiva do país)” e a melhoria das condições de empregabilidade, cumpriria, na sua idealização, um triplo objetivo: 1) apoiar, orientar e estimular a procura de educação/formação (facilitando a construção do percurso educativo dos indivíduos e a procura de ações de formação posteriores); 2) processar a informação necessária para a organização das ofertas formativas adequadas pelo sistema educativo; 3) estimular a flexibilização e modulização das novas ofertas escolares. 29 A itinerância consiste no desenvolvimento das atividades em instalações mais próximas dos interessados. Implica portanto a deslocação das equipas e não o inverso.
67
de forma a permitir uma maior proximidade e, consequentemente, um maior acesso de todos os
candidatos selecionáveis aos seus serviços.
De acordo com a referida Portaria, ambicionava-se que os Centros cumprissem seis
funções essenciais que sustentassem e consolidassem os seus princípios de intervenção: 1)
animação local; 2) informação; 3) aconselhamento; 4) acompanhamento; 5) formações
complementares e 6) provedoria.
Cada Centro deveria também integrar um Clube S@ber +, um dispositivo de animação
local, que desempenhasse as funções de informação e aconselhamento e assegurasse, direta ou
indiretamente (através de parcerias), a oferta permanente de cursos de Educação e Formação
de Adultos (EFA).
Na definição do seu campo de ação os centros de RVCC teriam de delinear um «plano
estratégico de intervenção», um documento em que se definia o contexto de intervenção, as
diferentes ações projetadas e a sua programação temporal. Esse plano deveria também
contemplar a dinamização das parcerias e da sua rede local de funcionamento; especificar as
ações de informação e divulgação que se pretendiam desenvolver e enunciar os indicadores de
verificação que permitiam a avaliação do cumprimento das metas estabelecidas30.
O acompanhamento e a monitorização das atividades dos Centros era da
responsabilidade da ANEFA. Além da verificação do plano anteriormente referido promover-se-ia
o cumprimento da Carta de Qualidade, um documento onde estavam estipulados os valores,
princípios e compromissos que deveriam orientar e balizar as atividades do Centro, numa
perspetiva de «melhoria contínua da qualidade» dos serviços prestados.
Desde o início do Sistema Nacional de RVCC começa-se a destacar um dos seus traços
distintivos: a contratualização de um serviço público de educação (mesmo em entidades do
Estado) e formas de controlo administrativos e estruturados em torno da obtenção de resultados.
Como sustenta Fátima Antunes:
“Esta assimilação de base contratualista permite ao Estado desenhar a política e promover o serviço,
distanciando-se expeditamente de requisitos, normas ou práticas associadas aos sistemas públicos e
que pretende suprimir (por exemplo, o estatuto, vínculos, condições laborais, direitos e organizações
sindicais dos agentes estatais), enquanto simultaneamente se reserva um amplo espaço para regular e
controlar a rede de provisão como se de um sistema estritamente estatal se tratasse. O alcance
estratégico desta particular indistinção entre público e privado revela-se no forte dispositivo de controlo
administrativo que vincula os fornecedores do serviço à agência central de tutela” (Antunes, 2011, p.
19).
30 Definidas pela ANEFA e também, ainda que indiretamente, pelo PRODEP III – 2000-2006, o programa financiador.
68
O trabalho desenvolvido nos Centros de RVCC organizava-se a partir do Referencial de
Competências-Chave para a Educação e Formação de Adultos. Esse referencial havia sido criado
por uma equipa multidisciplinar31 e pretendia cumprir uma tripla função: servir de “quadro
orientador” para o RVCC; ser o fundamento do “desenho curricular assente em competências-
chave”; e servir de “guia para a concepção da formação de agentes de EFA” (Alonso, et al.,
2002, p. 12).
Nesse referencial foram estipuladas quatro áreas de competências-chave: Cidadania e
Empregabilidade; Linguagem e Comunicação; Matemática para a Vida e Tecnologias de
Informação e Comunicação.
As três últimas áreas de competência referidas possuíam um carácter mais «instrumental
e operatório», que se relacionavam com competências básicas de literacia (incluindo a literacia
digital) e numeracia. Já a área de Cidadania e Empregabilidade, com uma feição mais
«transversal e abrangente», relacionava-se com as competências pessoais, interpessoais e
sociais. Cada uma dessas áreas tem três níveis de complexidade crescente correspondente a
três níveis de qualificação escolar: Básico 1 (4º ano); Básico 2 (6º ano) e Básico 3 (9º ano).
Desde o início dos Centros de RVCC que se pretende que o Referencial seja abordado de
uma «forma articulada, integrada e flexível», isto é, que se considerem as possibilidades de
articulação entre as diversas competências de cada área de competência-chave para que se
adeque o trabalho e a demonstração das competências às características dos indivíduos ou
grupos:
“Entendido assim como um quadro estruturador e orientador, o referencial deve ser o suficientemente
aberto de forma a permitir a sua adaptabilidade à diversidade de grupos sociais e profissionais, em vez de
serem estes a terem que se adaptar ao referencial. Isto implica que, a partir de um conjunto de
competências-chave definidas a nível nacional, se incentive a construção local de projectos de formação e de
validação de competências, numa concepção descentralizada do processo.
[…] Para isso, torna-se prioritário a preparação de equipas de profissionais capacitados para fazerem a
mediação entre o referencial e os contextos diversos e plurais, através da construção de dispositivos
técnicos e de materiais curriculares que possam vir a completar, reconstruir e enriquecer o referencial.
Neste sentido, parece desejável a disponibilização de dispositivos de investigação-acção e acompanhamento
que permitam testar, experimentar e validar no terreno a proposta apresentada, antes de proceder à sua
progressiva disseminação (Alonso, et al., 2002, p. 13).
Saliente-se que esta abordagem apresentou algumas originalidades. De acordo com
Patrícia Ávila uma das principais inovações na implementação do Sistema Nacional de RVCC foi
o desenvolvimento de um modelo curricular estruturado em torno de um conjunto de
31 Constituída por Luísa Alonso, Luís Imaginário, Justino Magalhães, Guilhermina Barros, José Manuel Castro, António Osório e Fátima Sequeira
69
competências que haviam sido definidas considerando a sua adequação às principais exigências
das sociedades contemporâneas:
Um dos pontos de maior inovação, comum a ambas as acções (cursos EFA e CRVCC), é o
desenvolvimento de um modelo curricular/sistema de reconhecimento, validação e certificação guiados,
não por programas disciplinares, mas por um Referencial de Competências-Chave […] o instrumento de
base fundamental que sustenta (e orienta) o desenvolvimento, quer dos cursos EFA, quer dos processos
de RVCC (Ávila, 2005, p. 324).
Com a utilização desse modelo pretendia-se romper com a lógica de programa disciplinar
associado ao modelo escolar e, ao mesmo tempo, organizar e orientar operacionalmente os
processos de RVCC e os cursos EFA. Para Patrícia Ávila, o Referencial de Competências-Chave
constitui um instrumento
“que conjuga, pelo menos, uma dupla função: orienta o reconhecimento das competências previamente
adquiridas e constitui a principal base de trabalho para as etapas seguintes dirigidas explicitamente à
aquisição e desenvolvimento das competências em falta” (Ávila, 2005, p. 328).
Em 2002, na sequência de uma mudança de Governo e uma reorientação de políticas
educativas a ANEFA foi formalmente extinta32. Todas as suas atribuições foram transferidas para
a comissão instaladora da Direcção-Geral de Formação Vocacional (DGFV), entidade criada no
início do mandato do XV Governo Constitucional33.
Apesar das alterações verificadas com as diversas mudanças governativas, a configuração
e os objetivos do Sistema Nacional de RVCC e os Centros de RVCC não foram transformados.
Aliás, durante o período de existência da DGFV, a rede de Centros continuou a crescer e
procedeu-se à acreditação de novos avaliadores externos e de novas entidades promotoras de
Centros de RVCC. Foi também aprovado um novo regulamento34 que definia o regime de acesso
aos apoios concedidos no âmbito do terceiro Quadro Comunitário de Apoio.
32 Pelo Decreto-Lei 208/2002 de 17 de Outubro, que aprovava a nova orgânica do Ministério da Educação. 33 Esse Governo (06/05/2002 a 17/07/2004) foi liderado por José Manuel Durão Barroso, do Partido Social Democrata). A DGFV foi mantida durante o período de existência do Governo seguinte (17/07/2004 a 12/03/2005), resultante de um acordo de incidência parlamentar entre o PSD e o CDS-PP (tal como no governo anterior) e liderado por Pedro Santana Lopes, do PSD. 34 Despacho conjunto n.º 24/2005 de 10 de Janeiro de 2005, que revogava o Despacho conjunto nº 262/2001, de 12 de Fevereiro). Nesse despacho referia-se possibilidade dos avaliadores externos (e outros intervenientes no processo de RVCC) serem abrangidos para a implementação de ações de formação e outras alterações sem particular relevância relacionadas, por exemplo, com a titularidade dos direitos de autor produzidos no âmbito do cofinanciamento, que deveriam ser transmitidos à DGFV, e com a fixação dos montantes máximos elegíveis das tabelas remuneratórias do pessoal interno.
70
A Iniciativa Novas Oportunidades e a ANQ
Com nova mudança de governo verificaram-se reestruturações nas políticas e nas
entidades que orientavam e supervisionavam o Sistema Nacional de RVCC e a rede de Centros
de RVCC.
Em 2005, logo no início do mandato do governo liderado por José Sócrates35, no
documento designado por «Grandes Opções do Plano para 2005-200936», foi enunciado o
objetivo de “alargar as oportunidades de aprendizagem ao longo da vida”. Enunciava-se um
conjunto de medidas que iriam ser tomadas que permitissem “dar um novo impulso à educação
de adultos”, objetivo já contemplado nas Bases Programáticas do Partido Socialista para as
Eleições Legislativas de 200537.
Entre outras medidas relativas à Educação de Adultos, encontra-se a referência à melhoria
do sistema de reconhecimento, validação e certificação de competências, por três vias que se
complementariam. Primeiramente proceder-se-ia à ampliação da rede de Centros de RVCC,
fundamentalmente em Centros de Formação Profissional e em sedes de agrupamentos de
escolas. Permitir-se-ia também o processo de RVCC até o nível secundário, constituindo-se uma
“segunda oportunidade de certificação para os cerca de 400 mil activos que, na última década,
passaram por este nível de ensino e não o completaram”. Também se incrementaria a eficiência
do sistema, para que se quadruplicasse, até ao final da legislatura, o número de diplomas
atribuídos.
Passados alguns meses, numa das resoluções do Conselho de Ministros que aprovava o
«Programa Nacional de Acção para o Crescimento e o Emprego 2005-200838», surge a
referência à Iniciativa Novas Oportunidades. Segundo esse programa, pretendia-se
“fazer do 12.º ano o referencial mínimo de formação para todos os jovens, apostando, no caso dos
jovens, no reforço do ensino profissionalizante de dupla certificação e, nos adultos, na expansão da
oferta de cursos de educação e formação e no alargamento do sistema de RVCC”.
35 XVII Governo Constitucional - 12/03/2005 a 26/10/2009; liderado por José Sócrates, do Partido Socialista. 36 Lei n.º 52/2005, de 31 de Agosto. 37 Nesse documento considera-se o seguinte: “Em matéria de educação de adultos, é necessário recuperar o impulso perdido desde a liquidação da Agência Nacional de Educação e Formação de Adultos, que havia sido lançada pelo PS. É o que faremos, de modo a aumentar o investimento público e induzir a participação da sociedade civil na formação académica e profissional relevante para mulheres e homens adultos. E estenderemos progressivamente ao nível do ensino secundário os processos de reconhecimento, validação e certificação das competências adquiridas e os cursos de educação-formação que tão bons resultados já demonstraram ter ao nível da educação básica. A rede de escolas secundárias e profissionais constitui, a este respeito, um recurso não negligenciável”(PS, 2005, p. 50). 38 Resolução do Conselho de Ministros n.º 183/2005, de 28 de Novembro.
71
Passados poucos dias, uma outra resolução aprovava o «Plano Tecnológico39 - Uma
estratégia de crescimento com base no conhecimento, na tecnologia e na inovação».
Reafirmavam-se os objetivos anteriormente referidos e sustentava-se que o Sistema de RVCC
“deve ser encarado como via estratégica para envolver adultos em percursos qualificantes na justa
medida em que permite reconhecer as competências adquiridas pela experiência, ao mesmo tempo que
propõe itinerários formativos diversificados”.
No ano seguinte, em 2006, a Direcção-Geral de Formação Vocacional é objeto de
reestruturação e passa a designar-se Agência Nacional para a Qualificação, passando a integrar
a administração indireta do Estado40. Realce-se, no entanto, que só em 2007 é formalmente41
criada e aprovada a estrutura orgânica da ANQ, organismo de tutela ministerial conjunta entre o
Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e o Ministério da Educação, que passa a ter por
missão a coordenação e execução das políticas de educação e de formação profissionais de
jovens e adultos e também o desenvolvimento e a gestão do sistema de RVCC.
As atribuições da ANQ relativamente ao Sistema de RVCC passam por participar na
definição da orientação estratégica, das opções políticas e do regime legal; pelo desenvolvimento
e gestão do sistema, assegurando a coordenação da Rede de Centros; pela operacionalização,
acompanhamento, monitorização e avaliação do sistema; pela participação no desenvolvimento
de referenciais de formação inicial e contínua dos profissionais envolvidos na oferta de EFA; pela
dinamização da investigação e a inovação nos currículos, nas metodologias e recursos
pedagógicos e pela participação em redes e parcerias de informação, experimentação e
transferência de conhecimento.
O ano de 2006 foi um ano de outras transformações: foi aprovado e editado o
«Referencial de Competências-Chave - Nível Secundário» (a ser utilizado nos Cursos EFA e nos
processos de RVCC), que abriu caminho aos processos de RVCC de Nível Secundário. Este
referencial é estruturado por três áreas de competências-chave: Sociedade, Tecnologia e Ciência;
Cultura, Língua, Comunicação e Cidadania e Profissionalidade.
No entanto, a maior transformação relacionou-se com o aumento abrupto do número de
Centros de RVCC que iniciaram atividades. De 98 Centros de RVCC em funcionamento em 2005
39 Resolução do Conselho de Ministros n.º 190/2005, de 16 de Dezembro. 40 Através do Decreto-Lei n.º 213/2006 de 27 de Outubro (lei orgânica do Ministério da Educação). 41 Através do Decreto-Lei n.º276-C/2007 de 31 de Julho. Saliente-se que nesse mesmo ano o Governo, depois do acordo com os parceiros sociais, decidiu aprovar a Reforma da Formação Profissional (Resolução do Conselho de Ministros nº 173/2007, de 7 de Novembro), o Sistema Nacional de Qualificações (Decreto-Lei nº 396/07, de 31 de Dezembro), integrando o Quadro Nacional de Qualificações, o Catálogo Nacional de Qualificações e a Caderneta Individual de Competências, e o Sistema de Regulação de Acesso a Profissões.
72
passou-se para 274 em 2006 (significando uma subida de 179,6%). O objetivo seria que em
2010 estivessem em funcionamento 500 centros. Passados dois anos continuou-se a observar a
tendência de crescimento acelerado da Rede de Centros. Do ano de 2007 (271 Centros) para o
seguinte (2008 - 463 centros) a Rede de Centros cresceu 70,8%42.
Alargava-se a cobertura territorial para se tentar concretizar as ambiciosas metas
estipuladas nos anteriormente referidos «Plano Tecnológico» e o «Plano Nacional de Acção para
o Crescimento e Emprego 2005-2008». Este último estipulava que, no respeitante ao Eixo
Adultos, se pretendia qualificar 1.000.000 de ativos até 2010; alargar o referencial de
competências chave aplicado no sistema de reconhecimento, validação e certificação de
competências (RVCC) ao 12.º ano; triplicar a oferta de cursos técnicos e profissionais para a
educação e formação de adultos, atingindo em 2010, 107.000 vagas (65.000 ao nível do 12.º
ano e 42.000 do 9.º ano) e cerca de 350.000 adultos; criação de 400 novos Centros de RVCC
até 2010, abrangendo cerca de 650.000 ativos.
Complementarmente, esse governo ainda procedeu à reforma e reorganização da
estrutura institucional do sistema de formação profissional. No último dia do ano de 2007 foi
formalmente criado o Sistema Nacional de Qualificações43. Esse sistema assume os objetivos e
princípios já afirmados com a implementação da Iniciativa Novas Oportunidades44 e acordados
com os diversos parceiros sociais. Nesse sistema é promovida a criação dos instrumentos
necessários à sua execução (Catálogo Nacional de Qualificações; Quadro Nacional de
Qualificações45 e Caderneta Individual de Competências), e a articulação com os instrumentos
financeiros disponíveis (Quadro de Referência Estratégico Nacional 2007-2013), almejando a
42 Esta nova abertura estava já enquadrada dentro do Quadro de Referência Estratégica Nacional 2007-2013 (aprovado em 2007 pelo Decreto-Lei n.º312/2007 de 17 de Setembro) que, através do Programa Operacional Potencial Humano, nomeadamente na sua Tipologia de Intervenção 2.1 – Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências assume grande parte do financiamento necessário ao SNRVCC. 43 Com a publicação do Decreto-Lei 396/2007 de 31 de Dezembro, referindo-se aos trabalhos desenvolvidos pela implementação do quadro europeu de qualificações para a Aprendizagem ao Longo da Vida (European Qualifications Framework). A coordenação do Sistema Nacional de Qualificações é assumida pelos membros do governo com responsabilidades nas áreas da formação profissional e da educação (na altura, Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e Ministério da Educação) e conta com a participação dos diversos parceiros sociais através do Conselho Nacional da Formação Profissional, do Conselho Geral da ANQ e da comissão de acompanhamento do sistema de certificação de qualidade das entidades formadoras. 44 Diminuir o défice de qualificações da população portuguesa por razões de justiça social e de desenvolvimento pessoal e económico, apostando numa dupla certificação (escolar e profissional); promover a generalização do nível secundário como qualificação mínima da população e novas oportunidades de qualificação. 45 O Catálogo Nacional de Qualificações foi criado pela Portaria nº 781/2009 de 23 de Julho. Foi concebido como um “instrumento de gestão estratégica das qualificações de nível não superior, contendo o conjunto de referenciais essenciais para a competitividade e modernização das empresas e da economia, bem como para o desenvolvimento pessoal e social dos cidadãos”; O Quadro Nacional de Qualificações, criado pela Portaria nº 782/2009 de 23 de Julho e implementado a partir de Outubro de 2010, define a estrutura e os descritores dos níveis de qualificação, baseando-se no Quadro Europeu de Qualificações.
73
integração dos diversos sectores e sistemas de qualificação. Como destacado no Preâmbulo
desse decreto-lei:
“A estratégia fundamental passa por assegurar a relevância da formação e das aprendizagens para o
desenvolvimento pessoal e para a modernização das empresas e da economia, assegurando ao mesmo
tempo que todo o esforço nacional em formação é efectivamente valorizado para efeitos de progressão
escolar e profissional dos cidadãos, quer de forma direta, através da formação de dupla certificação
inserida no Catálogo Nacional de Qualificações, quer de forma indireta, através dos centros novas
oportunidades e do processo de reconhecimento, validação e certificação de competências”.
Figura 1 - Evolução da Rede de Centros (RVCC e Novas Oportunidades)
Reorientação da intervenção dos Centros Novas Oportunidades
Relativamente ao Sistema Nacional de RVCC e à rede de Centros tem-se verificado uma
linha de continuidade apesar das mudanças governativas, políticas e organizacionais. Aliás, com
a Iniciativa Novas Oportunidades verifica-se uma grande expansão dos CNO e uma certa
centralidade dos mesmos na política pública relativa à Educação e Formação de Adultos.
74
Algumas das mudanças ocorridas passaram pela clarificação de procedimentos e
alteração de designações, verificando-se outras, no entanto, que assumiram um carácter mais
estruturante. Realcemos algumas das mais relevantes que implicaram diversas alterações na
ação dos Centros e dos agentes e equipas que aí desenvolvem as suas atividades profissionais.
No ano de 2007 adotaram-se outras resoluções46 que pretendiam a “flexibilização,
desburocratização e desconcentração administrativa” do Sistema Nacional de RVCC através da
supressão do concurso de acreditação das entidades promotoras. Entre outras mudanças,
concretizaram-se: o alargamento do campo de ação dos Centros de RVCC, através do
encaminhamento para diferentes percursos educativos e formativos adequados aos indivíduos; a
alteração na designação dos Centros de RVCC que passam a ser denominados por Centros
Novas Oportunidades; o condicionamento do acesso a processos de RVCC de nível secundário
aos adultos com mais de 18 anos e 3 anos de experiência profissional; a possibilidade de
extinção dos Centros Novas Oportunidades, por incumprimento das orientações legislativas ou
por avaliação negativa das estruturas de acompanhamento (leia-se ANQ); o abandono dos
Clubes S@ber+; a distinção das equipas em termos de “permanente e não permanente” e a
possibilidade dos candidatos se proporem autonomamente a validação em sessão de júri.
Porém, as mudanças mais significativas ocorrem a partir de 2008, com a publicação da
Portaria nº 370/08, de 21 de Maio, que clarifica os princípios e procedimentos mais
estruturantes e cria formalmente novas funções profissionais. A partir desse momento, os CNO
reorientam a sua ação para passarem a assumir mais explicitamente a função de diagnóstico de
necessidades educativas e formativas e a definição de perfis individuais, previamente à entrada
em processos de RVCC. Assim, a orientação e aconselhamento individuais e o encaminhamento
para diferentes ofertas de educação e formação que se adequassem ao “perfil, necessidades,
motivações e expectativas de cada adulto”, tornam-se assim mais particularmente relevantes na
ação dos CNO.
O reconhecimento, validação e certificação de competências adquiridas ao longo da vida,
passa a cumprir uma dupla função: 1) o posicionamento dos adultos em percursos de
qualificação e 2) a obtenção de um nível de escolaridade e de qualificação. Como está definido
no preâmbulo da Portaria n.º 370/2008 de 21 de Maio), a
“actividade dos Centros Novas Oportunidades dirige-se a adultos sem qualificação ou com uma
qualificação desajustada ou insuficiente face às necessidades dos indivíduos e do mercado de trabalho,
assegurando o encaminhamento dos mesmos para a resposta mais adequada e, quando se justifique,
46 Com a Portaria nº 86/2007 de 12 de Janeiro.
75
procedendo ao desenvolvimento de processos de reconhecimento, validação e certificação das
aprendizagens obtidas por via da experiência adquirida e de formações não certificadas, que podem ser
completadas através de acções de formação de duração variável, em função das necessidades
diagnosticadas”.
Em termos de equipa, os CNO continuam a ser dirigidos e coordenados por duas figuras,
o Director e o Coordenador.
O Diretor é o representante institucional do CNO, sendo essa função exercida pelo
responsável máximo da entidade promotora (ou por algum seu delegado). Tem por atribuições:
nomear o presidente de júri de certificação e homologar as decisões resultantes deste através da
promoção e controlo da emissão de diplomas e certificados. Também pode acumular as funções
de coordenador.
Sob a orientação do diretor, o Coordenador assegura a dinamização das diferentes etapas
de intervenção do CNO bem como a sua gestão pedagógica, organizacional e financeira.
Também lhe compete promover a formação contínua dos diferentes elementos da equipa,
elaborar o Plano Estratégico de Intervenção47; o relatório de atividades do CNO (considerando a
organização, concretização e avaliação das diferentes etapas de intervenção) e assegurar a
autoavaliação permanente do CNO. Também deve proceder ao diagnóstico da realidade local, à
conceção e a implementação de ações de divulgação e à constituição de parcerias. Para poder
desempenhar essas funções deve possuir habilitações de nível superior.
Como referimos, uma das mudanças mais expressivas foi a clarificação e reformulação
das etapas de intervenção. Esta mudança conjugando-se com as novas orientações e com um
significativo acréscimo de volume de candidatos, determinou o aparecimento de uma nova
figura profissional na constituição da equipa dos CNO.
O Técnico de Diagnóstico e Encaminhamento
A nova função e perfil profissional foi designado por Técnico de Diagnóstico e
Encaminhamento (TDE), que assume funções que anteriormente eram da responsabilidade dos
47 O Plano Estratégico de Intervenção define o âmbito de intervenção do CNO e deve conter, designadamente: a) a fundamentação dos objetivos propostos; b) a estratégia a adotar; c) a área de intervenção territorial, designadamente o regime de itinerância proposto, quando aplicável; d) as áreas de educação e formação e saídas profissionais em que o CNO pretende desenvolver processos de reconhecimento, validação e certificação de competências para efeitos profissionais; e) o modelo de organização e funcionamento do centro; f) as parcerias e ações de dinamização local previstas; g) a constituição da equipa; h) os resultados anuais a atingir; i) os modelos de formação e de autoavaliação. Se o CNO estiver integrado em estabelecimento de ensino, esse plano deverá ser enquadrado no respetivo projeto educativo. No caso de estar integrado noutras entidades ou Centros de Formação Profissional do IEFP, ou outras entidades formadoras certificadas ou reconhecidas, já deve ser enquadrado no respetivo plano de atividades.
76
profissionais de RVC: o desenvolvimento das actividades de diagnóstico e definição do perfil dos
candidatos e o seu encaminhamento para as ofertas formativas e educativas ajustadas ao seu
perfil individual. O TDE torna-se o responsável por três novas etapas que se encontram
interligadas: o Acolhimento; o Diagnóstico e o Encaminhamento.
O acolhimento consiste no atendimento e na inscrição dos candidatos no CNO, através do
registo numa plataforma informática denominada Sistema Integrado de Informação e Gestão de
Oferta (SIGO), normalmente pelo Técnico Administrativo (cujo trabalho é coordenado pelo TDE).
Este momento assume um papel relevante já que as informações fornecidas possibilitarão uma
melhor «gestão das expectativas» dos candidatos.
Na sessão de esclarecimento, já com a presença do TDE, são solicitados os documentos
oficiais48 do candidato e são fornecidas diferentes informações aos adultos. Aconselha-se que os
candidatos sejam informados da missão do Centro, do planeamento e calendarização das
diversas fases e das possibilidades de encaminhamento (Gomes & Simões, 2007, pp. 12-13;
Almeida, Candeias et al., 2008, pp. 21-23).
O Diagnóstico passa pela definição do perfil do candidato através de diversas actividades e
instrumentos: sessões de esclarecimento; análises curriculares; entrevistas individuais e
colectivas. Também se procede à identificação das melhores ofertas formativas e educativas
disponíveis.
Sucede-se o encaminhamento, que pretende direcionar o candidato para a resposta e
modalidade mais adequada às suas características e experiência de vida, às suas motivações, às
suas necessidades e expectativas, ou seja, ao perfil que vem sendo construído nas fases
anteriores (Gomes & Simões, 2007, pp. 13-14; Almeida, Candeias et al., 2008, pp. 25-35).
Associado ao seu trabalho, o TDE obtem e actualiza informação sobre as diversas
dinâmicas territoriais em termos de parcerias, de entidades formadoras e ofertas formativas.
Esse trabalho de organização da informação e de articulação com as diferentes entidades e
serviços educativos/formativos visa aumentar o campo de intervenção do próprio Centro
(Almeida, Candeias et al., 2008, pp. 42-45).
Genericamente, em termos de aptidões para cumprir todas essas determinações, o TDE
deve ser detentor de habilitação académica de nível superior, possuir conhecimentos sobre as
48 São necessários os seguintes documentos: Cartão de Cidadão ou Bilhete de identidade e Cartão de Contribuinte e também o(s) certificado(s) de habilitações. No caso de cidadãos estrangeiros além do passaporte e da autorização de residência também o Cartão de Contribuinte e, se possível, os certificados de habilitações.
77
técnicas e estratégias de diagnóstico avaliativo e de orientação e revelar conhecimento sobre as
diferentes ofertas de educação e formação.
No processo de RVCC…
Sendo o candidato encaminhado para o processo de RVCC terá de se deparar com mais
três etapas: a) reconhecimento de competências; b) validação de competências; c) certificação
de competências.
Com o Reconhecimento49 pretende-se que o adulto identifique os saberes e as
competências que adquiriu ao longo da sua vida, através de aprendizagens informais, não-
formais e mesmo formais. Essas aprendizagens são avaliadas com o recurso a metodologias e
instrumentos inspirados no Balanço de Competências e em outras Abordagens Autobiográficas.
O processo de RVCC deve ser apresentando nos seus conceitos e metodologias (nomeadamente,
distinguindo-o de outros percursos de educação/formação) e das suas características específicas
(intervenientes, duração e planificação das sessões, tipo de sessões – individuais e/ou coletivas,
referenciais de avaliação utilizados).
A partir desse momento o candidato inicia a elaboração do seu Portefólio Reflexivo de
Aprendizagens, que consiste no instrumento através do qual o candidato explicita e organiza as
evidências e diversas reflexões relativas à manifestação dos seus saberes e competências. O
portefólio é o instrumento que será analisado e avaliado de acordo com os diferentes referenciais
constantes do Catálogo Nacional de Qualificações (Gomes, 2006; Gomes & Simões, 2007, pp.
15-16).
A etapa de Validação consiste na avaliação das competências adquiridas ao longo da vida
e na verificação da sua correspondência aos referenciais integrantes do Catálogo Nacional de
Qualificações. Essa avaliação compreende duas dimensões: uma autoavaliação do portefólio
pelo adulto e uma avaliação por parte dos profissionais de RVC, dos formadores das respetivas
áreas de competências e, em alguns casos, pelo avaliador externo.
A sessão de validação (ou sessões) é o momento em que podem ser diagnosticadas
necessidades de formação. Considerando-se que essas mesmas necessidades podem ser
49 Da primeira formulação desta etapa (Artigo 8º da Portaria n.º 1082-A/2001 de 5 de Setembro), anteriormente designada por eixo, para a sua nova formulação (Artigo 17º da Portaria n.º 370/2008 de 21 de Maio e restantes reformulações) notam-se algumas alterações: introduz-se a designação «Portefólio Reflexivo de Aprendizagens» como o instrumento de demonstração e avaliação de competências; abandona-se a possibilidade do adulto ser dispensado da etapa de reconhecimento e autonomamente ser validado; também deixa de ser explicitamente referido que esta etapa não tem um tempo previamente determinado, já que anteriormente se referia que a temporização desta etapa estaria associada à situação concreta de cada adulto ou grupo de adultos.
78
colmatadas com ações de formação até 50 horas de duração, o próprio Centro Novas
Oportunidades poderá realizá-las, designando-as de formação complementar. Se, por outro lado,
forem consideradas necessárias mais do que as 50 horas de formação, o adulto será
encaminhado para júri de certificação onde será certificado nas competências validadas, tendo
posteriormente de desenvolver a formação necessária para completar o seu percurso de
qualificação (definidas num documento designado por Plano Pessoal de Qualificação).
Os formadores integrados nas equipas dos CNO têm responsabilidades e atribuições
diferentes dos restantes formadores de outras ofertas formativas. Têm de apoiar o processo de
reconhecimento de competências e devem orientar a construção do portefólio reflexivo de
aprendizagens no âmbito da sua área de competência.
Em articulação com o profissional de RVC, devem participar na validação dessas mesmas
competências e, caso necessário, no encaminhamento para outras ofertas formativas (internas
ou externas) ao processo. Sendo necessário que o adulto tenha formação complementar, são os
formadores a organizá-la e desenvolvê-la, de acordo com os referenciais constantes do Catálogo
Nacional de Qualificações. Também deverão participar no júri de certificação.
Os formadores das áreas de competências chave devem possuir habilitação para a
docência em função da área de competências-chave, de acordo com regulação específica, e
deverão também, sempre que possível, revelar experiência profissional no âmbito da educação e
formação de adultos.
A Certificação50 de competências é a etapa final do processo de RVCC e exige a
apresentação do adulto (e do trabalho desenvolvido) perante um júri de certificação, numa
sessão oficial e pública, em que se procederá à confirmação formal e oficial da validação
anterior. Constituem o júri: o Profissional de RVC, os Formadores de cada uma das áreas de
competências e o Avaliador Externo, que assegura, preferencialmente, a presidência do mesmo
(tendo voto de qualidade). Constata-se uma distinção entre o papel da equipa técnico-pedagógica
e o do avaliador externo. Apesar de se verificar um trabalho prévio e conjunto em termos de
50 É nestas duas últimas etapas que se verificaram as mais significativas alterações e a maior clarificação que este diploma legal introduziu em relação ao anterior. Na Portaria n.º 1082-A/2001 de 5 de Setembro (Artigo 8º), a etapa que era designada por “Validação de Competências” assemelhava-se àquilo que passou a ser denominado por “Certificação de competências” (Artigo 20º da Portaria n.º 370/2008 de 21 de Maio). O eixo Certificação de Competências, na anterior portaria, era considerado apenas um momento formal, considerado “o processo que confirma as competências adquiridas em contextos formais, não formais e informais e que constitui o acto oficial de registo das competências” numa carteira pessoal de competências, incorporando o júri de validação esses dois momentos (Artigo 8º da Portaria n.º 1082-A/2001 de 5 de Setembro). Esta tipificação prestava-se a algumas confusões e verificava-se alguma dissonância entre a legislação e a prática.
79
análise e de avaliação do portefólio do candidato, ao avaliador compete também a aferição e
afirmação social do processo de RVCC desenvolvido (Gaspar, Milagre & Lima, 2009, p. 15).
Com o júri o candidato obterá uma certificação (parcial ou total) consoante a
conformidade com os critérios de avaliação definidos pelos diferentes referenciais. Na sequência
do júri será atribuído ao candidato um diploma de qualificação (no caso da certificação total) e
um certificado de qualificações, com o registo das unidades de competência certificadas.
No caso da certificação parcial, a equipa do CNO elaborará um plano pessoal de
qualificação, tendo em conta as competências evidenciadas, validadas e certificadas e as
restantes necessidades de formação do adulto. Saliente-se, portanto, que o encaminhamento
além da etapa previamente estipulada, poderá ter este outro momento (Gomes & Simões, 2007,
pp. 17-18).
Figura 2 - Fluxograma das Etapas de Intervenção dos Centros Novas Oportunidades
Apontamento: a ANQEP
Durante a campanha para as eleições legislativas de 5 de junho de 2011, a Iniciativa
Novas Oportunidades foi um dos principais temas de discussão. Sem se pretender fazer a
história desse período, refira-se que eram escambadas diferentes acusações entre os líderes dos
dois maiores partidos concorrentes a essas eleições: José Sócrates, do Partido Socialista, e
Pedro Passos Coelho, do Partido Social Democrata.
80
Por um lado, Pedro Passos Coelho acusava a Iniciativa Novas Oportunidades de ser um
“escândalo” e uma “credenciação à ignorância” (LUSA, 2011), uma manifestação de
«facilitismo», uma «maquilhagem estatística», reproduzindo um conjunto de ideias muito
difundido. No seu programa eleitoral51, manifestando o desejo de “educação e formação com
qualidade e empregabilidade” (PSD, 2011, p. 177) propunha que se procedesse a uma
avaliação externa da Iniciativa Novas Oportunidades, já que se pressupunha que a avaliação teria
sido capciosa:
“deverá ainda ser realizada uma avaliação externa e uma reestruturação do Programa Novas
Oportunidades, com vista à sua credibilização perante a sociedade civil e à sua melhoria em termos de
valorização do capital humano dos Portugueses (PSD, 2011, p. 196).
Por outro lado, José Sócrates enaltecia a «justiça social» e restantes «grandes conquistas»
possibilitadas pela Iniciativa Novas Oportunidades. No programa eleitoral52 do Partido Socialista a
essas eleições considerava-se o seu sucesso:
“O programa Novas Oportunidades é a demonstração prática cabal de que era necessário e era possível
criar um verdadeiro movimento social de formação: mais de milhão e meio de inscritos, mais de meio
milhão de certificados, entre 2006 e 2010 – e, sobretudo, uma nova via de desenvolvimento pessoal e
de mobilidade social aberta a muitos Portugueses que haviam sido privados de prosseguir estudos na
idade própria. O programa continuará, aperfeiçoando os seus instrumentos de reconhecimento e
validação de competências e os seus contextos e métodos de formação, mas permanecendo fiel ao seu
espírito de garantir oportunidades de formação e aperfeiçoamento a todos quantos se encontram hoje
no mercado de trabalho (PS, 2011, p. 15).
No dia 21 de junho de 2011, o XIX Governo Constitucional tomou posse. Pedro Passo
Coelho tornou-se o Primeiro-ministro. A proposta que fizera no seu programa eleitoral foi vertida
no programa de governo53. Pretendia-se fazer a
“Reestruturação do Programa Novas Oportunidades com vista à sua melhoria em termos de valorização
do capital humano dos Portugueses e à sua credibilização perante a sociedade civil (Presidência do
Conselho de Ministros, 2011, p. 115).
Uma das primeiras medidas anunciava a reestruturação da Iniciativa Novas Oportunidades
após uma avaliação que incidisse sobre a empregabilidade dos adultos envolvidos. Ao mesmo
tempo divulgava-se uma ideia genérica de revalorização do Ensino Profissional.
51 “Recuperar a Credibilidade e Desenvolver Portugal”. Programa Eleitoral do Partido Social Democrata – Eleições Legislativas 2011. 52 “Defender Portugal, Construir o Futuro” 2011-2015. Programa Eleitoral do Partido Socialista. Abril de 2011. 53 Programa do XIX Governo Constitucional.
81
Uma das decisões mais concretas relacionava-se com o redimensionamento da rede de
CNO que se considerada sobredimensionada relativamente à procura.
No segundo semestre de 2011 foram tomadas diversas medidas avulsas. Sem
preocupação de exaustividade referimos: a substituição do presidente da ANQ; a cessação de
contratos dos profissionais de RVC e TDE (em CNO promovidos por entidades públicas como,
por exemplo, nas escolas); abertura de concursos para os anteriores (fundamentada numa
decisão do Ministro das Finanças do governo anterior); abertura de candidaturas ao POPH que
possibilitariam o financiamento a 70% dos CNO existentes em 2011 (448 CNO) até Agosto de
2012; no fim do ano de 2011 o início do encerramento dos CNO, entre outras54.
A 15 de fevereiro de 2012 foi criada e aprovada a orgânica da Agência Nacional para as
Qualificações e Ensino Profissional (ANQEP) através da publicação do Decreto-Lei nº 36/2012, o
organismo que sucede em termos de atribuições, direitos e obrigações a ANQ com as mesmas
atribuições da anterior. Tal como a antecessora, a ANQEP tinha como missão e atribuição,
respetivamente:
“assegurar o desenvolvimento e a gestão do sistema de reconhecimento, validação e certificação de
competências, visa, assim, melhorar a relevância e a qualidade da educação e da formação profissional,
contribuindo para a competitividade nacional e para o aumento da empregabilidade” (do preâmbulo)
“Desenvolver e gerir o sistema de reconhecimento, validação e certificação de competências, de âmbito
escolar e profissional, assegurando a coordenação da correspondente rede de estruturas, bem como o
acompanhamento, a monitorização, a avaliação e a regulação do sistema, em estreita colaboração com
as demais entidades que integram o Sistema Nacional de Qualificações; (Artigo 3.º, ponto 2)
Num comunicado datado de 15 de maio de 2012, a ANQEP informou que a rede de
centros era constituída por 302 CNO. Desde 2011 (considerando o número máximo de CNO
nesse ano) e até essa data fecharam 146 CNO.
A 18 de Maio de 2012 é apresentada a Avaliação da Iniciativa Novas Oportunidades –
Eixo Adultos e divulgado o estudo coordenado por Francisco Lima denominado Os Processos de
Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências e o Desempenho no Mercado de
Trabalho (Lima F., 2012) que considerava as dimensões «empregabilidade» e «remunerações».
Nessa apresentação da Avaliação da INO foram feitas duas comunicações: uma, intitulada
Ensino e Formação de Adultos. Uma aposta na qualificação real, apresentada pela Secretária de
Estado do Ensino Básico e Secundário (Leite, 2012) e uma outra denominada Programa Vida
54 Neste período também foram criadas duas associações – primeiro a Aprendências, Associação Portuguesa de Educação e Formação de Adultos (APEFA) e depois a Associação Nacional de Profissionais de Educação e Formação de Adultos (ANPEFA).
82
Ativa do Secretário de Estado do Emprego (Martins, 2012) em que se especificavam, entre
outras, as principais ideias para os CNO e para os processos de RVC:
1. Reformulação do processo de RVC - deverá passar a ser considerado o ponto de
partida para diferentes processos de formação e educação. Também se encara a
possibilidade de um processo de RVC “dual” (desenvolvidos em contextos diferentes –
centros, escolas, empresas e outras entidades empregadoras). A certificação escolar
será feita exclusivamente por escolas do sistema de ensino;
2. Renomeação dos CNO. Os CNO passarão a ser designados por Centros de
Qualificação e Ensino Profissional (CQEP);
3. Reestruturação da rede de centros. Na abertura dos CQEP ter-se-á em
consideração dois indicadores - os adultos com baixas qualificações e o número de
jovens com ensino básico concluído de cada NUT III);
4. Redefinição de funções dos centros. Os CQEP passarão a incluir uma dimensão
de orientação e aconselhamento de jovens e adultos focando no ensino profissional.
A 13 de Agosto de 2012, a ANQEP divulgou o seguinte comunicado:
“No âmbito do processo de reestruturação da Iniciativa Novas Oportunidades e considerando que se
encontra para breve a publicação de novos normativos legais enquadradores das estruturas que
asseguram as respostas de qualificação da população adulta, a Agência Nacional para a Qualificação e o
Ensino Profissional (ANQEP) procedeu hoje à emissão de uma orientação junto dos Centros Novas
Oportunidades atualmente em funcionamento.
Assim, até à existência de novo enquadramento legislativo e financeiro e no sentido de se assegurar a
resposta ao público que pretende aumentar as suas qualificações, a título excecional, os Centros Novas
Oportunidades poderão prosseguir com a sua atividade até 31 de dezembro de 2012.
Esta orientação abrange a totalidade dos Centros Novas Oportunidades que se encontram atualmente
em funcionamento, quer sejam Centros Novas Oportunidades com financiamento POPH aprovado para
o período de 1 de janeiro a 31 de agosto de 2012, Centros Novas Oportunidades em regime de
autofinanciamento ou Centros Novas Oportunidades financiados pelo orçamento das respetivas
tutelas/Orçamento de Estado. Durante o prolongamento do período de funcionamento dos atuais
projetos serão concluídos os trabalhos para a criação dos Centros de Qualificação e Ensino Profissional”
(ANQEP, 2012).
Profissionais de RVC: emergência e centralidade
Relembremos: o profissional de RVC é um dos elementos da equipa que trabalha nos
CNO; na sua prática profissional acompanha e orienta o candidato adulto na evidenciação e
83
avaliação dos saberes e competências que permitam uma certificação escolar ou profissional;
também tem de organizar e gerir o processo de RVCC a diferentes níveis.
A atividade, funções e responsabilidades dos Profissionais de RVC estão estipuladas num
normativo legal55 que define as condições necessárias para o exercício profissional, em termos de
habilitações, experiência e conhecimento de metodologias específicas, e enquadra as suas
responsabilidades.
As atribuições e responsabilidades dos Profissionais de RVC são consideradas em duas
dimensões distintas mas que se inter-relacionam: uma dimensão técnico-pedagógica (relativa ao
acompanhamento, orientação e aconselhamento) e uma dimensão organizativa e de gestão
processual.
Genericamente, e de acordo com a legislação, a dimensão técnico-pedagógica daquela
prática profissional consiste em “acompanhar e apoiar os adultos na construção de portefólios
reflexivos de aprendizagens” através do recurso a “metodologias biográficas especializadas”
(balanço de competências e histórias de vida).
Já em termos de organização e gestão processual, o profissional de RVC deverá: a) em
articulação com a TDE, participar nas etapas de diagnóstico e encaminhamento56, caso
necessário; b) “dinamizar o trabalho dos formadores” e em articulação com estes, proceder à
identificação das necessidades de formação; c) em conjunto com a restante equipa, organizar e
participar nos júris de certificação; d) encaminhar os adultos certificados (parcial ou totalmente)
para outras ofertas formativas.
A designação «profissional de RVC» surge com a implementação do Sistema Nacional de
RVCC em 2001 mas não é plenamente consensual nem invariável. Além de profissional de RVC -
a designação que preferimos - é frequente encontrar-se na legislação, em outros documentos
orientadores e também no campo das práticas profissionais, as seguintes variações:
«profissional de RVCC» (Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências) e «técnico
de RVC» (com a variação «Técnico de RVCC»).
55 Referimo-nos ao artigo 10º da Portaria n.º 370/2008 de 21 de Maio. 56 De facto, com a introdução da figura de TDE, a participação do profissional de RVC nestas etapas altera-se. Anteriormente era o profissional de RVC que deveria acompanhar o adulto em todo o seu percurso, desde o seu acolhimento até ao momento de certificação. A introdução dessa nova figura, numa lógica de divisão de trabalho, reconfigurou as dinâmicas organizacionais dos CNO, pelo menos em três aspectos. Primeiramente, o contacto inicial dos adultos deixou de ser com o profissional de RVC, o que implicou a redefinição das atribuições e funções dos profissionais de RVC; implicou uma maior sistematicidade na organização das diversas informações relativas aos candidatos e um aumento de procedimentos para o diagnóstico inicial; e alterou as dinâmicas de comunicação internas e externas dos CNO.
84
Com utilização menos frequente, e utilizadas sobretudo para facilitar a descrição e
compreensão do tipo de funções desempenhadas pelo profissional de RVC, encontram-se as
seguintes denominações: «tutor», «mediador», «orientador», «coordenador», «conselheiro»,
«acompanhante», «supervisor», entre outras (Cavaco, 2007; Gomes, 2010, p. 8).
Numa fase anterior à implementação do Sistema Nacional de RVCC, ainda se tentaram
outras designações para funções semelhantes, tal como «profissional/técnico de Balanço de
Competências» (Imaginário, 2001).
São feitas duas observações relativas a estas diferenciações: uma respeitante à utilização
do étimo «profissional» na designação da categoria funcional e uma outra relacionada com a
inclusão ou exclusão do étimo «certificação».
Relativamente à primeira observação, Luís Imaginário e José Manuel Castro referem que a
utilização de «profissional de RVC» remeteria para o “exercício autónomo da função
reconhecimento de competências” enquanto a designação de «técnico de RVC» remeteria para a
mera “aplicação de normativos pré-existentes”. A escolha de cada uma das designações não
seria, por isso, completamente inócua e poderia remeter para conceções alternativas relativas ao
exercício da autonomia na prática profissional. No entanto, como sustentam Imaginário e Castro,
este é um aspeto que não deverá ser particularmente sobrevalorizado pois mesmo a utilização
de profissional “quer-se a mais neutra possível, ou seja, sem nada pressupor acerca de tal
autonomia ou ausência dela” (Imaginário & Castro, 2011, p. 196).
A outra observação relaciona-se com a presença da componente «Certificação», ou seja,
como em o «profissional de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências». Esse
acréscimo na designação implicaria dois aspetos:
“Por um lado, parece claro que o profissional de RVCC, stricto sensu, não tem, nem deve ter,
intervenção directa quer na “validação” quer na “certificação”. Por outro lado, porém, a designação
Profissional de RVCC é também assumida por todos quantos trabalham no CRVCC” (Imaginário &
Castro, 2011, p. 196).
Considerada a variedade de designações, o nosso interesse passa por analisar uma
ocupação profissional cuja prática é considerada estruturante no contexto dos processos de
RVCC.
Diferentes autores qualificam o papel assumido pelos profissionais de RVC como sendo:
um “papel muito importante em todas as fases do processo” (Cavaco, 2007, p. 27); um “papel
fundamental” (Aníbal, 2009, p. 9); um “catalizador da mudança” (Gomes, 2006, p. 48);
“técnicos-chave na dinamização deste processo” (Amorim, 2006, p. 44); uma “figura decisiva
85
em todo o processo e […] um actor de importância crescente no campo da educação e formação
de adultos em Portugal” (Ávila, 2005, p. 334); a “coluna vertebral” da equipa técnica dos
centros (Barros, 2009, p. 645), e a “figura central, e absolutamente estruturante” dos processos
de RVCC (Barros, 2009, p. 646).
A centralidade do Profissional de RVC é evocada pela especificidade do relacionamento
educativo com cada um dos candidatos, e também pelas responsabilidades assumidas ao longo
do processo de RVCC, que implicam riscos associados à sua ação. O espaço de ação dos
Profissionais de RVC implica que estes tenham de proceder à articulação do candidato com toda
a equipa em todas as fases do processo de RVCC. É necessário que os profissionais de RVC
controlem todo o processo, ou seja, precisem de ter um “conhecimento aprofundado dos
quadros de referência, das tarefas e das oportunidades de formação – também devem ter as
competências necessárias para fazerem-no funcionar” (CEDEFOP, 2005, p. 153).
A ação dos profissionais de RVC, pela sua combinação com a restante equipa dos CNO,
poderá ser significativa a diferentes níveis para os candidatos. O relacionamento estabelecido
com cada um dos candidatos assume características particulares, passando por um
acompanhamento de grande proximidade que pode induzir, através de diferentes atividades de
aconselhamento e orientação: o desenvolvimento da reflexividade crítica, mudanças
diversificadas de atitudes e comportamentos; a redefinição de projetos pessoais e profissionais e
a continuidade de percursos qualificantes pós-certificação.
Porém, admitindo-se esses efeitos positivos, também se deverá admitir que a ação (ou
inação) dos profissionais de RVC, também na sua articulação com a restante equipa, e pela
mesma ordem de fatores, poderá não ser significativa e, eventualmente, logrará potenciar
atitudes, comportamentos ou preconceitos perniciosos em termos individuais e sociais.
Aconselhamento e Orientação: um campo de práticas emergentes
As práticas profissionais e os papéis educativos assumidos pelos profissionais de RVC têm
tomado relevância no campo da Educação e Formação de Adultos. Considera-se que esses
papéis e práticas estão compreendidos no Aconselhamento e Orientação, uma das áreas de
atividade profissional57 do campo da EFA (Dellen & Kamp, 2008; Research voor Beleid; PLATO,
57 As outras áreas designadas são: 1) posições de Ensino; 2) posições de Gestão; 3) posições de Aconselhamento e Orientação; 4) posições de Planeamento de Programas; 5) posições de Apoio (técnico, administrativo e organizacional), posições de Media
86
2008) e organizam-se em torno de quatro tarefas principais: na receção de participantes para
avaliação de necessidades e acreditação de aprendizagens prévias; na orientação e
aconselhamento das pessoas relativamente às diferentes temáticas de aprendizagem; no
coaching ou acompanhamento das pessoas visando o desenvolvimento pessoal; e na tutoria,
apoio das pessoas em processos de aprendizagem auto-orientada (Research voor Beleid; PLATO,
2008, pp. 76-77).
Na concretização das referidas tarefas refere-se a articulação de diversas práticas e
atividades, providenciadas por diversas organizações e contextos institucionais (escolas, centros
de formação e de emprego, local de trabalho, comunidades, etc.) “concebidas para ajudar os
indivíduos a tomar decisões educativas, vocacionais ou pessoais e a realizá-las antes e depois de
entrarem no mercado de trabalho” (CEDEFOP, 2011, p. 51).
Podem-se observar um conjunto de atividades, tais como: a) o aconselhamento, visando o
desenvolvimento pessoal ou profissional e a orientação educacional; a avaliação (psicológica, de
desempenho profissional, de competências); a prestação de informações relacionadas com
oportunidades de aprendizagem, com o mercado de trabalho ou com a gestão da carreira; as
atividades de consulta a colegas, familiares ou educadores; a preparação vocacional, com a
identificação de habilidades e competências, atividades de procura de emprego; e os
encaminhamentos para atividades de educação/formação ou para outros especialistas de
aprendizagem ou de carreira (CEDEFOP, 2011, p. 51).
A reconfiguração e abertura do campo da EFA a outros campos de prática, política e teoria
educacionais58, designadamente às atividades de aconselhamento e desenvolvimento pessoal,
correspondem a uma “diáspora dos educadores de adultos” (Martin, 2008) e enquadram-se na
transição de um campo relativamente circunscrito de «Educação de Adultos» para um campo
mais dilatado e difuso da «Aprendizagem ao Longo da Vida» (Edwards, 1997; Usher, Bryant &
Johnston, 1997).
Alguns dos «novos» papéis educativos surgidos neste contexto, como o de profissional de
RVC, situam-se numa zona de confluência de “profissões existentes na educação, no
aconselhamento, na orientação vocacional e na gestão de carreira de recursos humanos” (Salini
& Bednarz, 2010, p. 6) e adquirem relevância como o «movimento da autoaprendizagem» que
(produção e uso de software de ensino, cooperação com peritos das Tecnologias de Informação, Desenvolvimento de oportunidades de ensino e aprendizagem na internet e em outros media interativos, publicidade); Formadores do pessoal da Educação de Adultos (Dellen & Kamp, 2008; Research voor Beleid; PLATO, 2008). 58 Entre outros: a educação superior, práticas genéricas de educação e aprendizagem, o desenvolvimento educacional, garantia de qualidade, desenvolvimento profissional, desenvolvimento de recursos humanos, diferentes atividades literacia e numeracia.
87
promove uma “nova indústria de facilitação e aconselhamento” (Titmus, 1999, p. 352). Essa
nova indústria vem sendo desenvolvida e justificada pelo facto de nesse campo educativo de
múltiplas possibilidades e expansiva amplitude as pessoas necessitarem de direcionar a sua
aprendizagem de formas cada vez mais eficientes.
Discursivamente, a orientação e o aconselhamento concebe-se como uma via para tornar
todo o sistema de educação, incluindo o campo da Educação e Formação de Adultos, mais
«eficiente» e aspirando a um ajustamento progressivo e constante das necessidades individuais
de formação à provisão disponibilizada (Pykett, 2009). Nesse espírito de «facilitação» tenta-se
superar as incertezas e inseguranças resultantes das diversas mudanças sociais, ao mesmo
tempo permitindo aos indivíduos que façam escolhas mais informadas devido à diversidade de
prestadores de serviços e de ofertas de aprendizagem (Edwards, 1997, p. 25; 100).
Com uma certa benevolência, refere-se também que através das atividades de
aconselhamento e orientação e a crescente articulação dos indivíduos com a oferta educativa se
constituiria e desenvolveria processos mais humanos e mais democráticos e que permitem o
empowerment individual:
“o argumento é que quanto mais as pessoas tiverem a oportunidade de compreender as opções
disponíveis e para fazerem as suas escolhas mais ‘autênticas’, i.e., mais poder será dado ao
aprendente, então maior será o grau de desenvolvimento pessoal e de autorrealização a partir da
experiência educacional” (Usher, Bryant & Johnston, 1997, p. 85).
Outras alterações vão incitando essas transformações do campo da Educação e Formação
de Adultos. Além da centralidade do aluno/adulto no processo educativo, a valorização das
aprendizagens experienciais e a crescente implementação de sistemas de reconhecimento e
validação das mesmas tem contribuído para estas configurações específicas.
Seguindo uma lógica de especialização, o desenvolvimento dos diferentes sistemas de
RVCC tem sido indissociável da emergência de diferentes ocupações profissionais59 relacionadas
com o Aconselhamento e a Orientação, nomeadamente os Profissionais de RVC e designados
genericamente como «Conselheiros», os Counsellors (CEDEFOP, 2009). Esta tendência, de
acordo com Rosanna Barros (2009, p. 644) corresponde a uma “nova divisão técnica do
trabalho educativo realizado com adultos”, uma variação da “taylorização especializada” que
59 As European Guidelines for Validating non-formal and informal Learning, resultantes dos inventários de práticas de reconhecimento e validação de aprendizagens realizados a nível europeu, estipulam cinco ocupações profissionais implicadas nessas práticas, a nível internacional. Essas ocupações abrangem as diferentes dimensões do reconhecimento e validação de competências: os Conselheiros (Counsellors); os Avaliadores (Assessors); os Gestores de Processo (Process Managers); os Observadores Externos (External Observers); e outros interessados (Interested Stakeholders) (CEDEFOP, 2009)
88
seria, no seu entender, “pouco compatível com a lógica de trabalho político-pedagógico que
tradicionalmente caracteriza a educação de adultos”.
Os agentes profissionais que providenciam aconselhamento, informação e orientação (no
caso português e no contexto dos CNO, uma tarefa partilhada pelos TDE e os profissionais de
RVC) são considerados cruciais nas diversas atividades de reconhecimento e validação de
competências, designadamente no “mapeamento de competências” (CEDEFOP, 2009, p. 67),
isto é, na avaliação da amplitude e profundidade das evidências de aprendizagem em relação a
diferentes critérios ou padrões de avaliação.
Para alcançar esses objetivos implicam-se diferentes ações que exigem dos agentes: um
conhecimento rigoroso do sistema educativo e dos processos de avaliação; a preparação dos
candidatos para aquela avaliação; os esclarecimentos relativos aos procedimentos de
evidenciação de aprendizagens; atividades de esclarecimento que visem a definição de padrões
de comportamento, a enunciação de resultados possíveis e a gestão de expectativas resposta
(CEDEFOP, 2009, p. 67).
Porém, não se trata apenas de providenciar informações mas também de desenvolver
atividades que permitam eliciar as aprendizagens resultantes das experiências identificadas
como relevantes e induzir a reflexão individual (CEDEFOP, 2007, p. 25). Para o desenvolvimento
do Aconselhamento e Orientação é necessário que os profissionais de RVC desenvolvam os seus
conhecimentos de metodologias e domínios de intervenção relevantes ao exercício das suas
funções, designadamente:
“histórias de vida (abordagens biográficas); orientação vocacional (processo de exploração das relações
de investimento do adulto com as diversas dimensões do mundo do trabalho); balanço de competências
(intervenção indutora da exploração e avaliação das competências, capacidades e interesses dos
adultos); avaliação (formas de apreciação das competências identificadas pelos adultos que podem
conduzir à sua validação e certificação). Neste processo as aprendizagens adquiridas pelo adulto ao
longo do seu percurso de vida são valorizadas independentemente do local e da forma como se
processaram” (Eurydice, 2007c, p. 175).
Sugere-se que uma das formas de melhorar a qualidade do trabalho desenvolvido pelos
Conselheiros, vulgo profissionais de RVC, seja através do desenvolvimento das capacidades para
inspirar confiança e criar nos candidatos uma “configuração psicológica apropriada” (CEDEFOP,
2009, p. 68).
A análise crítica das ações educativas que passem por «apropriadamente» configurar e
transformar as estruturas psicológicas dos indivíduos é o que fundamenta a observação de
89
alguns autores de que as diversas atividades de Aconselhamento e Orientação podem ser
referidas a práticas educativas «confessionais»:
“a confissão funciona na base de que há alguma coisa a ser confessada, uma verdade profunda dentro
dos sujeitos que, uma vez descoberta, conduziria ao empoderamento. A orientação e o aconselhamento
são formas de confissão cujos sentidos atribuídos ao Self são já efeitos de poder – por outras palavras,
as pessoas precisam de já haver aceitado a legitimidade e a verdade da confissão e os sentidos que esta
evoca […]. Assim, embora a orientação e o aconselhamento ajudem as pessoas a fazerem decisões
‘realistas’, elas devem realinhar a sua subjetividade dentro das decisões psicológicas e educativas
apropriadas a fim de tomar essas mesmas decisões. É no próprio processo de confessar que as pessoas
são constituídas sujeitos ‘ativos’ ainda que ao mesmo tempo se envolvam no poder à medida que se
tornam sujeitas aos discursos confessionais e, portanto, locais de intervenção” (Usher, Bryant &
Johnston, 1997, pp. 85-86).
Poder-se-ia considerar que através dos processos de RVCC, ao especificar-se o indivíduo
como um objeto de conhecimento, visa-se a descoberta do conjunto de atributos e
aprendizagens do seu Eu, com a ajuda de guia ou conselheiros. Simultaneamente, poder-se-ia
questionar a possibilidade de se encontrar (ou mesmo de existir) uma identidade «autónoma e
estável», o que levaria a um debate que não teremos oportunidade de desenvolver sobre as
formas e possibilidades como são configuradas as disposições individuais e a «personalidade».
Refiramos apenas que, de acordo com Mark Tennant, em diversas formulações teóricas
(derivadas da modernidade), o Self e o seu desenvolvimento consideram-se com uma certa
«estabilidade, unidade, coerência e continuidade», ainda que múltiplo e sujeito a mudanças. Já
nas conceções pós-modernas, o Self seria entendido como em «sobressalto», permanentemente
em mudança, fragmentado, múltiplo e instável (Tennant, 1998).
No mesmo sentido, sugere-se que a apologia e o incentivo das diferentes atividades e
espaços de Aconselhamento e a Orientação corresponderia a uma tendência da mudança de
formas de «poder disciplinar» para outras formas mais veladas de «poder pastoral»60. Estas
seriam concretizadas pela convergência de diversas técnicas, racionalidades e práticas cujas
finalidades continuariam a passar por orientar a conduta dos indivíduos.
Argumenta-se que as formas de manifestação desse «poder confessional» consolidam-se
com a emergência, reconfiguração e pluralização das «tecnologias da gestão do eu» (de cariz
social e educativo) e que podem ser observadas na pluralidade de práticas educativas que
induzem a confissão. Constata-se esta realidade em diversas dimensões: nos diversos serviços
60 Recorrendo a conceitos de uma «grelha analítica foucaltiana», considera-se o poder pastoral como um poder tornado central nas sociedades contemporâneas e que é exercido pela confissão, “através da qual o Eu é constituído como um objeto de conhecimento, autorregulação, autoaperfeiçoamento e autodesenvolvimento”. Substitui uma disciplina imposta externamente pela “autodisciplina de uma subjetividade autónoma (Edwards, 1997, pp. 8-9).
90
de orientação e aconselhamento; nos processos de reconhecimento e validação de
competências (utilizando metodologias relacionadas com as abordagens autobiográficas e com o
balanço de competências); a relevância dada aos portefólios reflexivos como demonstradores
das aprendizagens (com a documentação e registo detalhado das várias dimensões das suas
vidas); no incentivo à autoanálise e autoavaliação; e na apologia da responsabilização individual
pelo planeamento da sua vida, pelo seu autodesenvolvimento e pela sua realização pessoal:
“A significância do poder pastoral para a aprendizagem ao longo da vida pode ser ilustrada com uma
ampla variedade de práticas em que a confissão é central, por exemplo, a orientação e aconselhamento,
planeamento da ação, a acreditação de aprendizagens prévias, avaliação baseada em portefólios,
contratos de aprendizagem, registos de aproveitamento, avaliação contínua…” (Edwards, 1997, p. 10).
Esta situação impõe um desafio e consequentemente a possibilidade de uma análise
crítica relativamente aos efeitos que essas práticas de Aconselhamento e Orientação podem
produzir na Educação e na Formação e nos próprios adultos, designadamente nas possibilidades
de redução da autonomia e da autodeterminação individual, ou seja o «desempoderamento».
Como refere Mark Tennant, estas possibilidades constituem um
“desafio para aquelas tecnologias da educação de adultos que convidam ao autoexame e à
autotransformação, tanto coletiva como individualmente, em ordem a se oporem e resistirem à
dominação e domesticação” (Tennant, 1998, pp. 364-376).
Como referem Per Andersson e Andrea Fejes, num estimulante artigo que encara o
reconhecimento das aprendizagens prévias como uma técnica de «fabricar o aprendente
adulto»,
“a avaliação, incluindo a validação, é uma técnica que coloniza o humano como um sujeito cognoscente;
ele é criado como um sujeito por ser um objeto da produção do conhecimento. Uma forma de
argumentar acerca desta colonização de todo o sujeito é o objetivo do conhecimento. Conhecimento
formal tem sido, e é, uma forma de controlar o sujeito. A documentação é em si mesmo uma
objetificação (objectification) do sujeito e é o ponto de partida de onde as técnicas de governo são
acionadas. O conhecimento acerca do sujeito a ser governado é a base de toda a governança (Foucault,
1991) e, portanto, ainda não tem sido dada a mesma atenção ao conhecimento informal. O que vemos
agora é uma tendência onde as competências/conhecimentos não-formais e informais devem ser
transformadas em conhecimento formal. Consequentemente, este conhecimento também será o
alicerce do governo e controlo. Tudo o que fazemos, ao longo e ao largo da vida, constitui experiências
que são parte da construção do adulto competente. O sujeito a ser governado é construído como um
sujeito diferente do que fora previamente o caso (Andersson & Fejes, 2005, p. 610).
91
Práticas profissionais e práticas reflexivas
Como já referimos, o trabalho do profissional de RVC passa pela orientação e
aconselhamento do candidato a certificação ao longo do processo de RVCC. Ao desempenhar
funções de enquadramento, integração e acompanhamento, apoia o adulto na reconstrução de
um itinerário formativo/educativo que poderá resultar na reconfiguração dos seus projetos
profissionais.
O acompanhamento desenvolvido pelo profissional de RVC compõe-se em duas vertentes
que são indissociáveis: uma dimensão operativa, relativa às informações e esclarecimentos
sobre os procedimentos e características do processo de RVCC; e uma dimensão educativa em
que se procura apoiar cada indivíduo no seu desenvolvimento psicossocial e valorização pessoal.
Como escreve Carmen Cavaco, o trabalho dos profissionais de RVC consiste genericamente,
“no esclarecimento da lógica do processo, na identificação, rememoração e selecção da informação; na
construção do discurso escrito; no envolvimento, motivação e implicação no processo; no
autoreconhecimento e heteroreconhecimento; no reforço da auto-estima; na mobilização para a
formação complementar, quando é necessária; na identificação, explicitação e concretização de alguns
projetos de vida” (Cavaco, 2009, pp. 770-771).
A dimensão operativa consiste na transmissão de diferentes informações ao candidato
que possibilitem a compreensão das características do processo de RVCC, nos seus múltiplos
aspetos: relativamente às suas etapas e tempos; às abordagens, metodologias e instrumentos
utilizados; às formas e critérios de avaliação; às regras e procedimentos específicos de cada
entidade.
Nos momentos iniciais de acompanhamento presencial pretende-se identificar as
características e capacidades físicas, intelectuais, emocionais e sociais de cada um dos
candidatos para, de acordo com as possibilidades e características do profissional de RVC e da
organização que este integra, se adaptar o dispositivo de reconhecimento (metodologias e
instrumentos) a essas especificidades pessoais. Ao pretender-se aprofundar o conhecimento das
características individuais e proceder ao apoio individualizado, esse acompanhamento alude a
processos de «orientação escolar, formativa e profissional» (OCDE, 2004).
A recolha e organização de informações que complementem o perfil definido durante as
fases de Diagnóstico e Encaminhamento são determinantes para o profissional de RVC. Este
assume o papel de «elemento de ligação» entre cada um dos candidatos e o «sistema» (Gomes,
2006, p. 95) e tem a função de articular, ao longo do processo e de uma forma transversal, as
92
diversas partes (adultos, formadores, avaliadores externos, etc.). O profissional de RVC revela por
isso “funções de coordenação das equipas” (Barros, 2009, p. 365).
Através desses momentos de acompanhamento, quer sejam individuais ou em grupo,
procede-se ao esclarecimento de dúvidas que os candidatos tenham relativamente a temas
específicos: formas e possibilidades de desenvolvimento do portefólio (bem como dimensões
médias em termos de páginas); formas, critérios e exigência na avaliação do portefólio;
momentos específicos do processo de RVCC (por exemplo, «formação complementar» ou
«sessões de júri»); prazos e tempos médios para a conclusão do processo de RVCC, entre
outros. Na maior parte dos casos, as dúvidas iniciais são sobretudo em relação às formas de
demonstrar e não aos conteúdos a demonstrar (Barros, 2009, p. 646).
Se com as «sessões» individuais se proporcionam oportunidades de aconselhamento e
orientação ajustados às dúvidas e particularidades de cada indivíduo, com as «sessões» grupais
promovem-se dinâmicas de grupo, em sala ou fora dela, que visam objetivos diversificados além
dos momentos de informação e comunicação genéricos: incentivar o conhecimento mútuo, o
«espírito de grupo» e a entreajuda; orientar a discussão de temas específicos; realizar atividades
culturais; dinamizar espaços e tempos de trabalho. Nesse sentido, o profissional de RVC
assumirá a função de «animador» (Cavaco, 2009, p. 691).
Com as sessões individuais e coletivas61 também se possibilita que cada um dos
candidatos comece a observar as características pessoais (em termos de postura e
personalidade) e a forma como estrutura as suas práticas profissionais (em termos de
abordagens, referências e objetivos educativos) dos próprios profissionais de RVC.
Nesse processo de identificação e entrosamento mútuos começa-se a configurar os
diversos espaços relacionais (entre profissional de RVC e candidato(s) e entre candidatos).
Desenvolvem-se vínculos interpessoais que possibilitam o aumento dos níveis de empatia, de
confiança e de segurança mútuos que sustentem essa relação estabelecida entre profissional de
RVC e candidatos/adultos (Amorim, 2006).
Uma das dimensões consideradas essenciais e das mais distintivas do trabalho do
Profissional de RVC traduz-se na capacidade de «facilitar» a identificação e o reconhecimento
das competências por parte de cada um dos indivíduos e, por isso, proporcionar a valorização
61 Refira-se também que as sessões são organizadas de acordo com os procedimentos de cada Centro, com as características de cada grupo e com as formas como cada profissional de RVC desenvolve as suas funções. No entanto, existem parâmetros estipulados na Carta de Qualidade que limitam o número de horas para sessões e o rácio entre sessões individuais e coletivas (Gomes & Simões, 2007).
93
pessoal (Barros, 2011a, p. 628). Incentivam-se formas diversificadas de autoavaliação que
passam pela implicação do Sujeito na atribuição de sentido e significado às experiências da sua
própria vida. Essa atribuição de sentido passa pela seleção, narração e reflexão que o próprio
candidato faz do seu percurso e história de vida. Escreve Carmen Cavaco:
“O reconhecimento pessoal (“por si” e/ou “para si”) inscreve‑se numa lógica formativa, de auto-
avaliação, de tomada de consciência e apropriação pessoal dos saberes. Esta tomada de consciência
pode permitir um melhor posicionamento e progressão da pessoa, tanto no sistema escolar/formação,
como no mundo profissional, como ainda na sociedade em geral. A partir da explicitação e da
identificação das potencialidades e das intencionalidades da pessoa, permite a elaboração de projectos
(pessoais, educativos, profissionais), e contribui para a (re)construção das identidades — como
defendemos, o resultado do reconhecimento toca profundamente na dimensão identitária do adulto”
(Cavaco, 2007, p. 12).
Nessa «tomada de consciência» individual estará implicado o profissional de RVC que a
auxilia (Imaginário, 2001, p. 70). É através de um «confronto indagador» que o profissional de
RVC suscita a reflexividade individual: “O que faz e como faz? Porque faz dessa forma? O que
gostava de fazer mais ou de forma diferente? Qual o resultado?” (Valente, Carvalho & Carvalho,
2009, p. 67). Essa abordagem dialógica e indagadora possibilita que o profissional de RVC
desenvolva a sua atividade de «tradução» e «retroversão» do explicitado:
“é preciso um trabalho, que é esta passagem do induzível para o deduzível, do implícito para o explícito,
este é o verdadeiro trabalho de um mediador que muitas vezes empresta aos adultos uma linguagem
que não é a desses adultos. Ele tem de ser capaz de mediar os saberes adquiridos que muitas vezes
não são sequer nomeados pelo próprio, e ele tem muitas vezes de apoiar este trabalho de explicitação,
de nomeação. E isto, para o próprio, não se faz sem um processo de tomada de consciência. Eu tenho
de tomar consciência que possuo estes saberes e isto é um trabalho muito importante que o mediador
tem de saber desenvolver e apoiar. Daí que não é a técnica, não é o instrumento, não é o portfólio em si
que vai fazer esta explicitação, é o trabalho que o mediador vai fazer junto do outro, de escuta, de
apropriação, de identificação” (Pires, 2010b, p. 11).
Porém, mesmo que não sejam os métodos, as técnicas e os instrumentos a fazer esse
trabalho de explicitação estes podem ser considerados uma «ferramenta» importante no trabalho
desenvolvido pelos profissionais de RVC.
Na sua prática profissional os profissionais de RVC utilizam diversas metodologias
(enquanto articulação de teorias, métodos e instrumentos) que se vão hibridizando e
reconfigurando em funções da adequação, dos desenvolvimentos e das alterações das práticas
(Cavaco, 2007; Aníbal, 2009; Pires, 2010a).
Desde o início da implementação do Sistema Nacional de RVCC que as metodologias
utilizadas se referem ou inspiram nas Abordagens Autobiográficas e no Balanço de
94
Competências e utilizam o Portefólio como documento organizador. Parecem ser as filosofias e
as finalidades subjacentes aos processos de RVCC que o estabelecem (Imaginário & Castro,
2011; Nico, 2011).
A utilização dessas metodologias permite a identificação, a análise e a avaliação das
competências pessoais, sociais e profissionais. Também possibilita a identificação das aptidões e
motivações de cada sujeito (Gomes, 2006, p. 33). Assim, o reconhecimento institucional das
competências (com a certificação), a reativação de percursos educativos e formativos e o apoio
na redefinição de projetos pessoais e profissionais podem ser concretizados.
Relacionam-se duas dimensões temporais que definem um arco temporal (passado,
presente, futuro): uma retrospetiva, quando se fundamenta na avaliação e reconhecimento de
saberes e conhecimentos adquiridos por experiência; e uma outra, prospetiva, quando se
pretende constituir como uma intervenção indutora de projetos pessoais, profissionais,
identitários, educativos, etc., «concretizáveis» (Imaginário, 2001).
Em síntese, com a utilização dessas metodologias, além das finalidades referidas,
pretende-se que se implementem comportamentos introspetivos e reflexivos, no sentido da
autodescoberta e autoavaliação e que vise a valorização pessoal. Com a problematização das
experiências (e dos saberes implicados) resultantes do «mundo da vida» e não somente a sua
sinalização, o acompanhamento pretende suscitar “inquietações e interferências nos seus
mapas de leitura do mundo” (Barros, 2009, p. 647).
Configurações e definições das práticas
O tipo de relacionamento educativo e didático estabelecido entre o profissional de RVC e o
candidato adulto apresenta algumas características particulares. Esse relacionamento é
construído de acordo com as estratégias relacionais e comunicacionais (e com as suas múltiplas
influências teóricas) e fundamenta-se nas formas como cada profissional de RVC organiza e
pensa as suas práticas profissionais.
As práticas profissionais no campo da Educação e Formação de Adultos podem ser
consideradas como uma zona de confluência de diferentes teorias de aprendizagem, de
inúmeros saberes tácitos e de variadas posturas e formas de desenvolver o trabalho educativo
que apresentam, em alguns casos certas diferenças, particularidades e ambivalências (Canário,
2000; Castro, Guimarães & Sancho, 2007, pp. 75-77; Quintas, 2008, p. 46).
95
Através da prática do profissional de RVC e da sua ação na construção desse
«relacionamento» educativo, os adultos têm de desconstruir as suas referências mais usuais, em
que se conotam os papéis educativos a um modelo ideal-típico do professor. Ao mesmo tempo,
o profissional de RVC tem de se situar “neste novo tipo de relação social” construindo e
ajustando “as suas funções e atitudes no decurso da actividade e no contacto com os seus
colegas” (Cavaco, 2009, p. 695) e com os próprios candidatos.
Um dos entrevistados que trabalha num CNO promovido por uma escola refere como é
encarado e quais as suas estratégias para configurar o relacionamento, que passa inicialmente
pela aproximação:
Muito deles, muitas vezes, veem-me como coordenador. Escrevem mesmo isso. Outra grande parte,
tratam-me como professor. A figura de profissional ou de técnico de RVCC não é algo que lhes entra
muito bem na sua forma de ver as coisas. (E3.42, p. 52)
Eu começo por tratar as pessoas por ‘tu’ muito rapidamente e começo por tocar nas pessoas muito
rapidamente; ou dar um ‘palmada’ [nas ‘costas’ subentenda-se] se ele for homem, ou fazer um elogio
se ela for mulher. Uso muito o humor! Brinco muito com eles precisamente para que se esbatam as
diferenças que eles sentem muito: o respeito que eles sentem perante a instituição escola ou a figura do
professor. (E3.28, p. 47)
No relacionamento a estabelecer deseja-se uma maior aproximação. Podemos inferir que
há uma certa distinção entre a figura de profissional de RVC e a dos formadores (no caso
referido, também professores):
…não sei se por preparação minha ou por alguma sensibilidade para…, tendo a ter ótimas relações com
os adultos e relações mais próximas com eles do que aquela que eles criam com a restante equipa
formativa, portanto, os formadores. Estou a falar de uma equipa de formadores com uma idade já. Não
são propriamente novos e que, portanto, e apesar de já estarem alguns deles a trabalhar nisto há algum
tempo, continuam a sentir alguma dificuldade - porventura, acham que não é esse o papel deles - em
chegar-se para… portanto, são muito diretivos muitas vezes… Enfim, tendem a não olhar para as
condições socioeconómicas o capital cultural, os acontecimentos que fizeram com que as pessoas
fossem o que são hoje. Portanto, eu sinto da parte deles [dos adultos] uma grande proximidade! (E3.42,
p. 52)
Muitas vezes, mais do que se ir verificando essa adaptação aos vários modelos
relacionais, há profissionais de RVC e Centros que optam por uma abordagem mais explícita:
Nós temos uma folha que diz ‘Termos Incorretos’, na brincadeira. Não é escola, é Centro Novas
Oportunidades; Não são aulas, são sessões. Não sou professor, sou técnico. Chamam-me E5, ou Dr.ª
E5. Quer dizer… (E5.20, p. 84)
Vários fatores se implicam na estruturação desse acompanhamento: as características
psicossociológicas do candidato e do profissional de RVC; as dinâmicas geradas através da
96
relação estabelecida entre profissional de RVC e candidato; e as características e a cultura
organizacional.
Referiu-se que o acompanhamento do Profissional de RVC é considerado determinante no
apoio ao candidato durante o processo de RVCC, sendo este aquele que esclarece diversas
dúvidas dos candidatos, os apoia nas suas diferentes solicitações e coordena as várias inter-
relações. Para a configuração da relação e da sua relevância uma das entrevistadas considera o
seguinte:
…nós temos de ser capazes de ajudar o adulto a interligar tudo e temos de estar por dentro de tudo o
que acontece desde o início até ao fim. Desde o momento em que é encaminhado (e temos de saber
mais ou menos o perfil) até ao momento em que sai e vai a júri. (E2.27, p. 32)
…até acaba por ser a nós que atribuem mais responsabilidade e muitos [os adultos] até acham que nós
é que somos os coordenadores. Nós é que temos de gerir tudo. Gerimos os formadores, gerimos o
trabalho deles, portanto, ficam com uma perceção bastante positiva do nosso trabalho. (E2.48, p. 35)
Essa dimensão relacional é determinante na configuração do acompanhamento, como
refere uma outra das profissionais de RVC entrevistadas:
…quanto à parte relacional eu acho que tem mesmo… É como na vida: cada um está a ensinar ao outro
como se relacionar. Não é escrito! É sentido, por isso… (E4.51, p. 70)
É na interação entre profissional de RVC e candidato que se ajuda a estruturar o processo
de RVC. Implicam-se, portanto, as características e atributos pessoais do próprio profissional de
RVC, não só aqueles a mobilizar mas também aqueles a evitar, que advenham da autoanálise e
da aprendizagem pessoal acerca de si, da maneira como se desenvolveram as suas
competências interpessoais e da sua respetiva transformação pessoal e profissional:
Talvez seja uma pessoa compreensiva… tolerante… Portanto, acho que aceito a diferença. Não sei se
pode ser por aí! Tenho um campo… um bocado, se calhar, abrangente das coisas… Não sei se passa
um bocado por isso… pela tolerância… pela compreensão... (E1.22, p. 9)
Depois também tem a ver com características pessoais porque eu sou uma pessoa insegura por
natureza. (E2.17, p. 30)
Acho que, às vezes, sou muito agitada e não sei até que ponto transmito essa agitação para os adultos e
depois começo a dar muita informação. Às vezes sinto isso nas sessões iniciais! É tudo novo para eles e
eu vou e… [simulação de disparos numa queima-roupa de informação] Se calhar devia deixá-los
assimilar as coisas com mais calma. É uma coisa que acaba por ser bom e acaba por ser mau. Eu sou
muito stressada e isso às vezes faz com que eu seja impulsiva. Sou impulsiva e reajo sem pensar. Por
outro lado, também me dá aquela energia para pôr as coisas todas e agilizar. Mas pronto, às vezes
também sou um bocadinho precipitada. (E2.57, p. 36)
97
Até porque eu tenho, em termos estritamente pessoais, handicaps, ou teria e tenho menos agora, algum
acanhamento, alguma dificuldade em ser… Estabelecer relações empáticas. Ao início isso custou-me um
pouco. Tive de me ir munindo de algumas estratégias, de alguma flexibilidade que me aproximasse do
Outro. Essa fase, esses anos de trabalho em formação, quer com os miúdos quer com os menos
miúdos, me foi servindo e foi sem dúvida muito útil. (E3.5, p. 44)
Um outro fator relaciona-se com as formas como as «questões de vida» se implicam na
prática profissional. Por um lado, a experiência de vida possibilita uma maior aproximação ou
um maior afastamento dos adultos (e até dos formadores), o desenvolvimento de diferentes
saberes tácitos e até a própria maturidade pessoal parecem determinantes nas formas como se
organiza o trabalho:
Em termos de relacionamento também acho que houve diferenças, por uma questão de vida, acho eu,
também me permitiu maior aproximação com os adultos. (E4.29, p. 66)
Agora, eu diria, talvez, que o traquejo me tornou menos passível de ser aldrabado. Dito de outra forma:
sou hoje mais seguro naquilo que faço; percebo muito mais rapidamente; distingo mais rapidamente;
tipifico mais rapidamente os adultos que tenho à frente e isso ajuda-me a ser mais rápido na minha
resposta, mais assertivo, mais incisivo, mais, por vezes, mais duro, outras vezes nem tanto, não é
necessário. Mais uma vez, foi a experiência, é o traquejo que me ajuda a realizar estas mudanças.
(E3.22, p. 47)
Dás prioridade à questão relacional? Sim, pode-se dizer até porque não venho das Engenharias e
não tenho 25 anos. E fui amadurecendo várias questões, quer por via do estudo, quer por via indireta,
que me habilitem, de certa forma, hoje quase naturalmente a exercer a atividade. (E3.59, p. 55)
No nosso trabalho é muito importante a relação que nós criamos e o saber lidar com pessoas, isso é o
fundamental e estarmos preparados para nos adaptar às idiossincrasias de cada um. Quando vou para
um grupo já não me sinto com receio, sinto-me capaz de lidar seja com pessoas mais refilonas, mais
brutas, mais… (E2.22, p. 31)
Além dessa prática e perfil de acompanhamento e de coordenação/gestão de processo
(utilizando uma linguagem mais gestionária: gestor de uma «carteira de clientes»), uma das
outras dimensões do processo passa pela motivação dos participantes durante o processo de
RVCC.
A dimensão motivacional constitui-se um pilar estruturante no desenvolvimento do
processo de RVCC e pode-se perspetivar em, pelo menos, duas vertentes: uma que é pela
indução da capacidade de ‘persistir’ no processo de RVCC, pelas dificuldades apresentadas
pelos adultos para conseguirem combinar as diferentes responsabilidades da sua vida e reduzir
a suspensão ou a desistência dos processos de RVCC. A outra faceta do trabalho de motivação
relaciona-se com a atividade de aconselhamento anteriormente especificada, que passa pela
«motivação para aprender» ou para «delinear autonomamente projetos de vida» específicos,
98
num momento pós-processo. É por isso que o profissional de RVC, na opinião de uma das
entrevistadas, deverá ter alguns atributos:
Eu acho que tem de ser uma pessoa informada, tem de ser uma pessoa culta, tem de ser uma pessoa
capaz de dar resposta, ou de assumir: “eu trago-lhe a resposta” e trazer. Tem que ser correta; tem que
ser honesta; tem que ser capaz de claramente explicar, explanar as coisas aos adultos e eu acho que ao
mesmo tempo tem de ser um incentivador, um motivador, um bocadinho maternal, assim um
bocadinho mãezinha. Porque, de facto, aquilo que é feito neste momento, eles têm mesmo de trabalhar
e bastante. E muitas vezes precisam mesmo daquele amparo para ganharem fôlego para continuar e ir
por aí fora. Mas essas características não sei se são específicas do profissional de RVC, se calhar não
são, se calhar podem-se aplicar a muitas profissões. (E4.81, p. 75)
No trabalho de aconselhamento e orientação implica-se, portanto: o reconhecimento e o
incremento das próprias capacidades; a redefinição de uma identidade pessoal e social; o
desenvolvimento da autoestima e da autoconfiança, que se espera que se reverta na própria
capacidade para «progredir» através dos processos de aprendizagem e desenvolver as
competências. Como refere uma das profissionais de RVC, esse trabalho de motivação e
valorização que vise o desenvolvimento da autoestima é determinante:
É importantíssima! Se uma pessoa não acredita nela própria, nas suas capacidades e no que é capaz de
fazer, não vai ter capacidade de empreendedorismo. Portanto, eu acho que se bem que seja,
aparentemente, um ganho subjetivo, que não é subjetivo, porque ele depois pode-se aplicar na prática.
Obviamente que uma pessoa que não gosta dela, se não gosta dela, não acredita nela, não se vai
arriscar a nada! Quando uma pessoa aumenta sua autoestima tem uma capacidade de relacionamento
com os outros melhor. Porque também se gosta mais dela também é capaz de gostar mais dos outros.
Portanto, em relação a isso, acho que ainda não está muito bem visto o ganho que é o aumento da
autoestima, a melhoria do relacionamento familiar, tudo isso vai ter implicações sociais e na
empregabilidade que tanto se fala. (E4.46, p. 69)
Espera-se que esse acompanhamento que se concretiza na motivação tenha uma vertente
transformadora que se desenvolverá também através da valorização pessoal dos indivíduos
(Cavaco, 2007; Barros, 2009, p. 625).
As diversas metodologias utilizadas, a forma como são configuradas e as finalidades pelas
quais se orientam, parece que proporcionam uma «nova perspetivação» da trajetória pessoal. Ao
considerar-se que os indivíduos são deficitários em termos de qualificações e que têm
dificuldades de, em termos autónomos, configurar os seus projetos de vida, pode-se implicar
uma certa psicologização do processo de RVCC (Amorim, 2006, pp. 45-47), uma espécie de
«cultura terapêutica» apesar de se explicitar que o processo de RVCC não se pode encarar como
uma situação de «preenchimento» de lacunas cognitivas e emocionais (Gomes, 2006, p. 36).
99
Com o desenvolvimento das práticas também parece haver uma transformação nas
formas como se encara o candidato no processo de RVC que passam por transformar a imagem
que se tem dos «adultos»:
Acho que com o tempo tornei-me mais exigente, no bom sentido. Antes sofria daquele mal de ver os
adultos como uns coitadinhos e de amparar sempre. Agora não! Acho que são adultos, ok. Nem todos
os adultos são carentes ou têm… e se calhar eu, à partida, pensava isso, ou abandonaram a escola por
motivos frágeis, ou… Não, nem todos! Muitos deles até, ao voltarem à escola a estudar, foi importante e
é importante! Acho que evoluí nesse sentido. Porque no princípio acho que lhes ‘amparava muito o
jogo’, não é ser ‘compreensiva’ de mais, mas era até… Faziam um bocadinho e até achava que já
estava e até eu não puxava mais por eles, porque pronto… coitados… agora não, já os posiciono como
deve ser. Acho que estava errada e evoluí. (E1.32, p. 10)
Acho que, inicialmente era muito maternalista com os adultos e isso depois fazia com que eles não
fossem tão autónomos. Às vezes, até confundia um bocado as coisas em termos relacionais e
aproximava-me demais e isso faz com que, em determinadas situações, não esteja a ser… pronto…
facilite mais as coisas… Não está certo! Mas de uma forma geral tenho uma relação boa com os
adultos! (E2.42, p. 34)
Parecem coexistir diversas formas de organizar o trabalho e de considerar a relevância do
relacionamento pessoal no processo de RVCC. A aproximação entre o profissional de RVC e o
candidato, que o tipo de acompanhamento permite, implica a criação de diversos níveis de
empatia e de identificação interpessoal mas também cria alguns constrangimentos.
Estas características relacionam-se obviamente com os perfis de desempenho e com as
características idiossincráticas dos diversos profissionais de RVCC e que se manifestam de
formas diferenciadas. Seria pertinente considerar se as questões em torno do papel da
motivação e do aumento da autoestima correspondem a uma estratégia específica, a uma
finalidade do processo de RVC ou a uma consequência do trabalho de acompanhamento
desenvolvido (ou mesmo a uma combinação destes três aspetos).
A ação de acompanhamento do profissional de RVC passa por criar as condições
motivacionais para o desenvolvimento do processo de RVC (e das suas metodologias e
instrumentos) através de diversos espaços e momentos que proporcionem formas diversificadas
de auto e heteroavaliação. No entanto, há diversas implicações que advêm dos próprios
processos de avaliação de competências e saberes pessoais. Há duas implicações principais que
implicam uma abordagem diferenciada por parte dos profissionais de RVC e que podem implicar
diversas consequências: a subavaliação ou mesmo a sobreavaliação das competências e
saberes próprios.
100
Nos processos de RVCC considera-se, na maior parte das vezes, as questões relacionadas
com a subavaliação das próprias competências, relacionando-as com a existência e permanência
de formas de autoimagem negativa e mesmo de formas diversificadas de estigmatização social.
No entanto, também a sobreavaliação individual pode implicar diferentes efeitos negativos
no processo de RVCC e no relacionamento com a equipa e mesmo com outros candidatos. Esta
manifesta-se, por exemplo, numa «valorização» própria por comparação e pela menorização de
outros candidatos e também pelas discordâncias em relação à avaliação própria e à avaliação de
outros. Seria interessante verificar como se perspetivam nos adultos em processos de RVC, e
que implicações têm os seus diversos «mecanismos de defesa do ego» e as disposições
individuais.
Saliente-se, porém, que são essas «dissonâncias» que fundamentam a intervenção dos
profissionais de RVCC e a configuração do relacionamento entre o profissional de RVC e o adulto
torna-se por isso determinante para a prática e ação profissional e para a própria definição da
sua profissionalidade e do seu profissionalismo62.
Em qualquer dos casos deve-se sempre desenvolver atitudes de vigilância por parte dos
profissionais de RVC já que nem o relacionamento estabelecido nem o acompanhamento são
neutrais. O profissional de RVC, ao procurar refletir sobre as suas atitudes e mesmo a procurar
junto da equipa em que está integrado a discussão de algumas dessas temáticas relativamente
às melhores formas de desenvolver as suas tarefas, conseguirá considerar as implicações da
sua prática profissional.
Na reflexão sobre as práticas, destaca-se a capacidade de se adaptar às características
dos indivíduos (e dos grupos) e através da desconstrução das suas próprias pré-noções, induzir
62 De acordo com o documento Key competences for adult learning professionals são especificadas três competências indiciadoras de profissionalismo e que “descrevem uma atitude profissional direcionada à própria prática do profissional, ao campo e instituto em que o profissional trabalha”: 1) Ser um aprendente ao longo da vida completamente autónomo; 2) ser um comunicador e um jogador de equipa e 3) Ser responsável pelo desenvolvimento contínuo da aprendizagem do adulto. A primeira das competências, «ser um aprendente autónomo», implica que o profissionalismo se demonstre através da reflexão sistemática sobre as próprias práticas, aprendizagens e desenvolvimento pessoal. Ao mesmo tempo, de acordo com contexto institucional, deverá perspetivar reflexiva e criticamente as possibilidades para o desenvolvimento das práticas profissionais. Também deve saber gerir o seu processo de aprendizagem e organizar o seu tempo e trabalho. O agente de EFA também deve ser «autêntico» e «consistente» nas suas opiniões e interesses. A segunda das competências, «ser um comunicador e um jogador de equipa», passa por saber utilizar as diversas técnicas comunicacionais apropriadamente. Também deve saber trabalhar de forma colaborativa e estabelecer relações de confiança. Revela capacidade de incorporar essas informações para o desenvolvimento da sua prática profissional. O agente de EFA deverá ser íntegro e respeitar os outros, tendo uma atitude positiva nas formas de trabalhar. A terceira das competências, «ser responsável pelo desenvolvimento contínuo da aprendizagem do adulto», deve passar pela capacidade de assumir as responsabilidades relativas ao desenvolvimento das aprendizagens dos adultos, de acordo com os diversos contextos institucionais (Buiskool, Brook, van Lakerveldal, Zarifis, & Osborne, 2010, pp. 90-91). Para mais detalhes relativos às competências-chave para um educador de adultos, ver anexo 4.
101
no candidato um gosto por saber mais e mesmo a modificação de determinadas características
individuais e sociais:
Pelo menos a ideia de que é importante atender ao outro, chegar ao outro, compreender a sua lógica de
pensamento e com isto, enfim, flexibilizar um pouco as ideias… a construção própria que se tem e que
tantas vezes inviabiliza relações, aproximações. (E3.30, p. 48)
Porque gosto de trabalhar com pessoas e porque gosto de me relacionar com pessoas. Gosto de
despertar a curiosidade, o conhecimento, o gostar de saber, o querer saber mais nas pessoas, sempre
gostei disto. E passa muito por aí, exatamente, este trabalho enquanto profissional de RVCC. (E4.57, p.
71)
Acho que é importante sabermo-nos relacionar bem com as pessoas, sermos capazes de nos
adaptarmos às diferentes características das pessoas porque tu para uma pessoa com determinadas
características vais ter de ser de uma maneira, com outra vais ter de ser de outra. É preciso termos essa
capacidade de mutação, digamos assim. Pô-los a trabalhar em grupo, é importante saber gerir o grupo,
acho que é muito importante. (E2.59, p. 36)
Deve-se ser rigoroso mas condescendente também. Isto ao longo do processo e quando eu falo em
condescendente estou a pensar em muitas das pessoas que ficam pelo caminho ficam apenas porque
não houve um cuidado em atender a situação particular do adulto naquele momento. Portanto, o rigor!
Depois, e isto por formação, ou por sensibilidade, as questões relacionadas com o desmontar de um
certo o ‘nacional-porreirismo’ em que muitos dos adultos se situam na vida. Este alertar para um brio no
trabalho, na família, na relação com as artes, com a vida, como o país, com o mundo. O profissional
nunca deve estar satisfeito, lá porque o adulto faz uma conclusão de quatro linhas e por isso se cumpre
mais uma etapa. Eu diria que o profissional deve ser um eterno insatisfeito e passar essa sensação ao
adulto. (E3.57, p. 54)
Os profissionais de RVC definem o seu trabalho de múltiplas formas. Além das definições
através das finalidades implicadas no processo de RVCC (uma definição teleológica) também se
recorre a definições através da explicitação do modo como se desenvolve o processo de RVCC
(uma definição processual).
Por exemplo, alguns dos profissionais de RVC definem as suas práticas nessa vertente
mais procedimental: as funções do profissional de RVC passam por apoiar o candidato na
elaboração de uma autobiografia, ou seja, passam por organizar um portefólio reflexivo de
aprendizagens com vista à sua avaliação:
Eu ajudo os adultos, ou oriento os adultos a escreverem uma autobiografia, já por ela que também tem
de ser orientada – isto é redundante, não é? Dou apoio inicial para que os adultos consigam escrever
uma biografia com conteúdos específicos. (E1.44, p. 12)
Uma outra forma para definir a ação e a prática profissionais do profissional de RVC tem a
ver com o que se pode designar por via «substitutiva», ou seja, pela relação entre aquilo que faz
e aquilo que o formador não faz, nomeadamente em termos de proceder a uma maior
102
integração e inter-relacionamento dos conteúdos e temas específicos a serem incluídos e
avaliados no portefólio e que sejam relativos a áreas de competências-chave específicas. Duas
das entrevistadas realçam precisamente essas diferenciações e algumas das suas implicações:
Por outro lado, tem que estar por dentro de todos os referenciais, tem de saber, tem de saber como é
que... Até acho que, pelo menos daquilo que eu sei, acho que nós, vamos fazendo mais; vamos
sabendo mais do que os próprios formadores. Nós é que temos de ter o papel! Enquanto o formador de
uma área vai e pega só na área dele, daquela forma, nós temos de ser capazes de ajudar o adulto a
interligar tudo e temos de estar por dentro de tudo o que acontece desde o início até ao fim. Desde o
momento em que é encaminhado e temos de saber mais ou menos o perfil até ao momento em que sai
e vai a júri. (E2.27, p. 32)
…até acaba por ser a nós que atribuem mais responsabilidade e muitos até acham que nós é somos
que somos os coordenadores. Nos é que temos de gerir tudo. Gerimos os formadores, gerimos o
trabalho deles, portanto, ficam com uma perceção bastante positiva do nosso trabalho. (E2.48, p. 35)
Sinto um bocado falta de tempo dos formadores. Não é que eu não goste até de falar um bocadinho de
CLC, ou de STC ou de CP, ou das outras que até gosto. Sempre saio um bocado do ramerrame! Mas
depois é a função de mediadora. Mediar formadores-formandos… Às vezes, até é cansativo ter mediar e
ter de gerir. Porque nós fazemos tudo! Só não marcamos júris. De resto, conseguíamos perfeitamente
levar o Centro para a frente. (E1.143, p.23)
Essa responsabilidade de substituir e de integrar as diversas áreas e ter ainda que mediar
todas as partes pode, em determinada medida, aumentar os níveis de responsabilidade a
aumentar o desgaste físico e psicológico associado a esse desempenho profissional, que vai
sendo compensado com os resultados obtidos com os adultos:
Eu agora não é tentar desresponsabilizar-me mas antes sentia que tinha mais uma carga… Sentia-me
mais sobrecarregada do que agora. Isto é, alguma coisa que corria mal… Nunca pensava que a
responsabilidade poderia ser partilhada pela equipa ou por todos os formadores. Pensava logo que a
responsabilidade seria minha. Agora, felizmente mudei essa minha postura, essa minha forma de
pensar, porque realmente não é! (E1.70, p. 14)
Portanto, como ser humano, acho que aprendi muito e aprendo muito ainda com muitos deles. Às
vezes, até pode ser cansativo e desgastante ainda assim ainda tem um lado com mais coisas boas do
que coisas más. Mais até na relação comigo e com eles. (E1.33, p. 10)
Tendo em conta todo o desgaste que temos… O desgaste psicológico! Trabalhar com pessoas é muito
desgastante e muita gente não têm essa noção. Atendendo às nossas qualificações e tudo isso somos
mal remunerados comparando com outras profissões. Não é que a nossa profissão seja melhor, se
calhar nem é tanto por aí. Já estamos a entrar outro campo. (E2.61, p. 37)
Porque me libertaria de algum cansaço inerente ao trabalho direto com os adultos e permitir-me-ia
pensar nas coisas de uma forma mais abrangente. (E3.73, p. 58)
Refira-se que desde o início do processo de RVC permanece uma certa demarcação entre
as diversas funções (entre profissional de RVC e formadores) e até uma certa diferenciação entre
103
os conteúdos a serem avaliados pelos formadores de cada área de competências-chave (Barros,
2009, p. 645).
Apesar de se terem verificado diversas alterações nas práticas de reconhecimento de
competências, resultantes das reflexões das equipas sobre as suas práticas (Cavaco, 2009, p.
615), nos ajustamentos às exigências da tutela e nos diversos modelos de organização do
processo de RVCC, ainda persistem algumas diferenciações em termos de funções.
Em determinados casos verificam-se algumas descontinuidades metodológicas entre os
diversos intervenientes no processo de RVC, mais especificamente entre os profissionais de RVC
e os próprios formadores, procurando os primeiros a reflexão e identificação de competências e
os segundos desenvolvendo exercícios de demonstração (Ávila, 2005; Cavaco, 2007).
Patrícia Ávila (2005: 455-458) reconhece que se verificam diferenças quanto à forma
como se organiza o trabalho dos profissionais de RVC e dos formadores. Na sua análise dos
processos de RVC, estipulou três modelos que representam a forma como se articula a
construção da autobiografia e como se procede ao reconhecimento das competências-chave
considerando as competências especificadas no Referencial: 1) modelo dual ou orientado para a
valorização pessoal; 2) modelo dual em reconversão; 3) modelo integrado, ou orientado para o
reconhecimento de competências.
No primeiro modelo - modelo dual orientado para a valorização pessoal - o profissional de
RVC é encarado como um «profissional de histórias de vida» que procura enfatizar
exclusivamente a dimensão motivacional e a contribuição da história de vida para a valorização
pessoal dos adultos. Verifica-se uma separação entre as histórias de vida (da exclusividade dos
profissionais de RVC) e o reconhecimento das competências-chave adquiridas (da exclusividade
dos formadores). Desta forma, o Referencial de Competências-Chave é encarado como um
instrumento de trabalho do formador e não do profissional de RVC.
No segundo modelo - modelo dual em reconversão - enfatiza-se o contributo das histórias
de vida para a valorização pessoal mas procura-se orientar as mesmas para o reconhecimento
de competências. Verifica-se a necessidade de diminuir a separação entre histórias de vida e
reconhecimento de competências. O referencial de competências-chave é considerado pelo
profissional de RVC um instrumento de trabalho necessário. Também a identificação final das
competências é realizada em sessões orientadas pelo formador e pelo profissional de RVC,
destinando-se à evidenciação ou demonstração de competências que não tenham sido
104
manifestadas nos materiais produzidos durante as sessões de desenvolvimento das histórias de
vida.
No terceiro modelo - modelo integrado orientado para o reconhecimento de competências
- procura-se orientar o trabalho para o balanço de competências e para a diferenciação de
competências específicas e competências-chave. Representa, portanto, uma “transição numa
concepção centrada na valorização pessoal dos indivíduos, para uma outra com maior incidência
na análise das competências-chave” (Ávila, 2005, p. 458). Verifica-se a necessidade de articular
o trabalho com os formadores e de perspetivar novas formas de análise das informações
recolhidas para permitir uma identificação das competências-chave. O referencial de
competências-chave é encarado como o principal instrumento de trabalho do profissional de
RVCC, apesar das diversas dificuldades associadas ao mesmo.
Tecnicização da prática: administração, monitorização e auditabilidade
Uma dimensão na prática e ação dos profissionais de RVC que implica diferentes
comentários e questionamentos relaciona-se com o trabalho administrativo implicado no
desenvolvimento dos processos de RVCC e com a organização burocrática dos CNO63.
Desde os primórdios do Sistema Nacional de RVCC que se tentou proceder a uma
uniformização e normalização em termos administrativos (relativamente a formulários e
procedimentos). Os diferentes modelos de gestão e avaliação de resultados foram impostos
centralmente (top-down) com as diversas diretrizes e orientações técnicas e também através das
regras implicadas nas lógicas de candidatura financeira e de gestão centralmente produzidas
que se fundamentavam em dois aspetos: 1) a orientação para resultados e 2) lógicas de
monitorização.
Por um lado, as práticas profissionais e as os Centros eram condicionados por uma
orientação para resultados, as afamadas «metas». A taxa de concretização de candidatos
certificados, por exemplo, tornou-se um dos critérios de avaliação do funcionamento do CNO, da
aprovação das candidaturas e também influia no número de agentes profissionais permitidos,
como podemos verificar no Quadro 1. No caso da Iniciativa Novas Oportunidades essas metas
63 Só se analisará as atividades com relação direta com a atividade profissional dos profissionais de RVC. Não se considerarão os sistemas formalizados de avaliação organizacional (Common Assessment Framework) ou de desempenho profissional, por exemplo o Sistema Integrado de Avaliação de Desempenho da Administração Pública (SIADAP) ou as diferentes aplicações financeiras.
105
eram consideradas desajustadas ou mesmo “irrealistas” (Valente, Carvalho, & Carvalho, 2009,
p. 27) e condicionaram de múltiplas formas o trabalho dos profissionais de RVC e dos CNO,
nomeadamente em termos de diminuir a reflexão sobre as práticas:
Às vezes, é o que eu te digo, gostava de ter mais tempo para perder. Por um lado, é importante termos
metas e objetivos. Se as metas não fossem para ‘cortar’, é importante, porque senão um portefólio pode
ser feito eternamente. Haveria sempre alguma coisa que eu lhe pudesse pedir para eles falarem. Então,
nunca mais se sairia do sítio! Ou era possível estarmos sempre a marcar sessões e haver sempre
qualquer coisa. (E1.143, p. 23)
Implicava-se, portanto, uma certa lógica de produtividade individual e organizacional,
aquilo que Licínio Lima designa por paradigma da educação contábil (Lima, 1997), que inclui
entre outros aspetos, uma avaliação institucional que procura prioritariamente a aferição da
eficácia e eficiência nas organizações educativas e o controlo de qualidade.
Quadro 1- Tipologia dos Centros Novas Oportunidades
Níveis Inscritos Em proc. de RVCC Certificados
(total e parcial) Equipa associada
A Bás. 250
500 157
268 149
240 3 profissionais de RVC 5 formadores (tempo inteiro) Sec. 250 101 91
B Bás. 400
800 252
414 239
385 4 profissionais de RVC 5 formadores (tempo inteiro) Sec. 400 162 146
C Bás. 650
1300 410
673 389
626 4 profissionais de RVC 7 formadores(tempo inteiro) Sec. 650 263 237
D Bás. 900
1800 567
932 539
867 5 profissionais de RVC 8 formadores(tempo inteiro) Sec. 900 365 328
De acordo com Despacho n.º 21022/2009 (18/09/2009) e orientações técnicas da ANQ (2009)
Também a implementação de lógicas de monitorização (de auditabilidade) e a
implementação de instrumentos que as facilitem e uniformizem condicionou a ação dos
profissionais. Na gestão dos processos de RVC e do CNO estão implicados diferentes
mecanismos de monitorização e controlo. São comuns a todos os CNO: o SIGO64 (Sistema de
Informação e Gestão da Oferta formativa) e a organização e manutenção de um Dossiê Técnico
Pedagógico65.
Para António Fragoso e Paula Guimarães (2010) a existência desse trabalho
administrativo e o facto de os profissionais de RVC terem de ocupar a maior parte do seu tempo
com os procedimentos técnicos e burocráticos implica - numa relação da causalidade e
64 O SIGO consiste numa plataforma informática que incorpora diferentes dados e informações de todo o SNRVCC e de todos os CNO. Pretende ser uma ferramenta que auxilie na gestão das ofertas de qualificação e na monitorização de todos os candidatos que estejam a frequentar ações no âmbito do SNRVCC. Esta plataforma é mantida com os dados introduzidos pelas diferentes equipas administrativas e pedagógicas dos CNO. 65 Este é um documento que organiza o conjunto de informações e comprovativos referentes à execução de um projeto no âmbito do Quadro de Referência Estratégica Nacional (Decreto Regulamentar nº 84-A/2007, de 10 de Dezembro, artigo 32º).
106
generalização questionáveis - que os próprios profissionais de RVC não se possam comprometer
com a “construção da reflexão crítica” e que passem por ser meros «técnicos» acríticos e
apolíticos:
“a eventual emergência de novas profissões no campo da aprendizagem ao longo da vida também
envolverá a definição de uma variedade de perfis técnicos. Devido às características dos processos de
administração e gestão das novas formas de provisão da educação de adultos, a maior parte dos
técnicos ocupam o seu tempo com procedimentos técnicos e burocráticos. Dessa forma, estão muito
longe das intervenções educativas dos intelectuais orgânicos ou de outros educadores contra-
hegemónicos; resumindo, não estão comprometidos com a construção da reflexão crítica – eles são
técnicos de aprendizagem ao longo da vida, especialistas na gestão da autonomia dos adultos de uma
forma apolítica” (Fragoso & Guimarães, 2010, p. 27).
Não nos parece, no entanto, que entre as tarefas técnico-administrativas e as tarefas
educativas se constitua uma antinomia, mas sim, numa perspetivação diferente, uma dicotomia.
A gestão administrativa e financeira associada aos processos de RVCC e aos CNO e aos
processos de RVC implicam o registo de diferentes dados pessoais, o controlo da informação e a
monitorização da intervenção por parte das equipas técnicas, das entidades promotoras e das
entidades tutelares. No entanto, consideramos que a intensificação de atividades técnico-
administrativas66 e de lógicas gestionárias desvia da reflexão e da meditação mais abstrata sobre
as práticas. Nas palavras de Rosanna Barros, a intensificação das práticas técnico-
administrativas passa por
“promover activamente o desvio da reflexão, e meditação mais abstracta, nos pressupostos político-
pedagógicos da acção local dos próprios actores para uma crescente preocupação, mais pragmática,
concentrada em cumprir as metas físicas e os aspectos gestionários, que salvaguardam um certo capital
institucional de candidatura aos necessários financiamentos (Barros, 2009, pp. 611-612).
De acordo com uma das entrevistadas:
Esse trabalho é um trabalho inglório. Inglório no sentido porque rouba muito tempo e pouco dá para o
processo. Acho que se perde muito tempo. Acho que também não há ninguém que não se queixe de
que o trabalho burocrático faz perder muito tempo e fica menos tempo para… Mas pronto tem de ser
feito, tem de ser feito! (E4.84, p. 75)
Manifestando um certo espírito de resistência, um dos outros entrevistados referiu:
Nunca fui muito sensível, ou nunca me subjuguei à normativa que a tutela impõe; à necessidade de
atualizares constantemente o SIGO, nunca faço esse tipo de coisas, quase como se tivesse num limbo
66 Repetindo a informação entre o SIGO e do dossiê técnico-pedagógico, o profissional de RVC tem de criar e/ou organizar os seguintes documentos: originais de instrumentos/documentos produzidos e utilizados no âmbito do processo de RVCC; cronograma das sessões no âmbito das atividades do CNO; sumários das sessões de processos RVCC; atas das reuniões da equipa técnico-pedagógica; atas das sessões de validação; atas das sessões do Júri de Certificação; fichas de inscrição dos candidatos; contratos de participação no processo de RVCC; pedido de certificação; termo das formações complementares; termo de certificação de competências; Plano Pessoal de Qualificação; Plano de Desenvolvimento Pessoal; Certificado de Qualificação; Diploma; avaliação do funcionamento do CNO (pelo adulto), entre outros mais específicos a cada CNO.
107
profissional: “Julguem-me! Demitam-me!”. Eu não estou para me chatear com isso! Há outras coisas
para fazer muito mais importantes, e olha… (E3.22, p. 47)
Um dos outros aspetos é a publicação por parte das entidades tutelares
(ANEFA/DGFV/ANQ) de diferentes diretrizes e orientações técnicas que pretendem regular a
maior parte dos momentos e situações do processo de RVC, não permitindo espaços de
criatividade ou adaptação ao contexto. Muitos desses «regulamentos» corresponderam a
solicitações das equipas que pretendiam e valorizavam uma uniformização de procedimento:
…com tantos Centros a abrir, eles tinham de definir alguma coisa, se não cada Centro fazia o que
queria. […] Eu acho que eles acabaram de alguma forma por definir mais o nosso trabalho, em termos
de instrumentos a utilizar, das regras, aqueles caderninhos que eles nos entregaram, os manuais: de
como se deve fazer uma sessão de júri, como o Técnico de Diagnóstico. Inicialmente não havia Técnico
de Diagnóstico e Encaminhamento, aí houve mudanças! O problema aqui é que as mudanças surgiram
e houve uma formalização das coisas, só que aumentaram também o número dos Centros. Se isso
tivesse acontecido logo no início com poucos centros, as coisas ficariam mais bem estruturadas – o tal
feedback – e uma coisa ajuda a outra. (E5.9, p. 81)
Toda esta normatividade pode implicar diversas consequências negativas. Uma que foi
assinalada por diversos entrevistados relaciona-se com uma certa ‘tecnicização’ da prática
profissional que é criticada pelos próprios «técnicos da aprendizagem ao longo da vida»:
Eu acho que é essencial não se ser um técnico! Isto é, eu acho que é essencial ver-se para além de,
estar-se para além dos procedimentos inscritos numa determinada diretriz. Quem não tenha a cultura, a
sensibilidade, o gosto por interferir positivamente em trajetos… Em pessoas que querem ser ajudadas,
querem progredir, querem avançar… Quem não tem este gosto especial, quem esteja a olhar para o
relógio para sair às 6 da tarde não está a prestar um bom serviço. (E3.39, p. 50)
Ora bem, entendidos à letra pelos tais técnicos que eu há pouco criticava, muito de ‘funcionalismo
público’ (entendido aqui negativamente), não são transformacionais. Muitas vezes são apenas o
aproveitamento, claro está, com o beneplácito dos tais técnicos, são o aproveitamento de uma
oportunidade ou de uma construção que não traduz necessariamente melhorias significativas na
formação das pessoas. Daí eu achar que é importante complementar a nossa ação com o rigor
humanístico-qualquer coisa que deixe as pessoas um pouco conscientes das suas lacunas. (E3.41, p.
51)
Por exemplo, tenho uma colega minha que é Técnica e ao falar com ela, com essa minha amiga, eu sei
que ela é só Técnica. Ela tem os grupos e ela faz aquele trabalhinho. Nós na associação não somos
assim! Como já estamos desde o início nós percebemos daquilo! E então, quando há uma coisa para
resolver, mesmo quando nos ligam da ANQ e tudo, é a nós que nos vão ligar, porque nós sabemos das
coisas. (E5.26, p. 85)
108
Identidades profissionais
Na configuração das identidades profissionais estão implicados diferentes processos de
“construção de um significado” que se baseiam na consideração de conjuntos de atributos
específicos que pretendem prevalecer sobre “outras formas de significado” (Castells, 2003, p.
3). Nesses processos de construção de significado são implicados os valores, normas e crenças
específicos e as trajetórias biográficas e de aprendizagem, as trajetórias e as condições
profissionais e as diferentes relações sociais estabelecidas. As identidades profissionais
desenvolvem-se, portanto, em interações e contextos específicos e relacionam-se também com o
próprio reconhecimento e visibilidade social (Santos, 2011, pp. 65-73).
Se entendermos a identidade profissional como um «modo de apresentação do Eu» no
espaço público que traduz aquilo que cada profissional pensa sobre si próprio, consideramos
que os profissionais de RVC entrevistados possuem diversas referências identitárias e, de acordo
com as suas próprias disposições ou interesses específicos, utilizam-nos diferentemente na
definição e apresentação da sua identidade pessoal.
Por um lado, verifica-se uma identificação comum no campo profissional, uma
manifestação de uma identidade própria e generalizada que passa pela criação de “um código
interno criado através da interação social entre todos os actores do campo profissional” que é
estruturado em torno de uma linguagem específica ao campo profissional; um referencial
comum de conduta (individual e profissional); um corpo de conhecimentos e de procedimentos
coletivos (Santos, 2011, pp. 55-56). No entanto, verificam-se outras identidades profissionais a
que se recorre tendo em conta as considerações individuais em torno da adequabilidade e
distinção profissional ou social, em termos inclusivamente de capital simbólico67, que cada um
das identidades possibilita.
Acede-se a cada uma das configurações identitárias de acordo com a perceção e
valorização pessoal de «adequação» profissional ou social de cada uma dessas identidades de
referência. De acordo com cada contexto específico parece que se envolve uma situação de
“suspensão/acção ou de inibição/activação” (Lahire, 2005, p. 25) da pluralidade das
disposições individuais.
Num sentido essa ativação/inibição parece relacionar-se com o «expectável» em termos
de desempenho profissional, o que do ponto de vista do «Outro» parece suscitar alguma
67 De acordo com Pierre Bourdieu: “o capital simbólico pode ser qualquer propriedade (qualquer espécie de capital, físico, económico, cultural, social) que seja percebida por agentes sociais cujas categorias de percepção são tais que eles são capazes de a conhecer (de se aperceberem dela) e de a reconhecer concedendo-lhe valor” (Bourdieu, 1997, p. 80).
109
dificuldade na diferenciação de papéis. Simultaneamente, a delimitação dessas «fronteiras» que
segregam as identidades específicas vão-se reconfigurando ao longo do tempo:
Acaba sempre por aparecer alguém com um problema específico, com uma situação específica, que
inclusivamente acabam por dizer: “a doutora é psicóloga!”; “Mas eu não estou aqui como psicóloga!”.
Mas certo é que depois… Depois não se pode fugir. (E4.8, p. 62)
Enquanto profissional [de RVC] podes fazer isso. Enquanto psicólogo, tu não deves fazer isso, enquanto
psicólogo clínico, não deves fazer isso. (E4.54, p. 70)
Eu diria que digo que sou profissional de RVC e estou ali para ajudar os adultos a verem, a descobrirem
os seus conhecimentos e as suas aprendizagens. Mas acaba sempre por também vir: mas sou
psicóloga! Eu acho que… Tem graça! Pensando agora, eu lembro-me perfeitamente, de início: “eu sou
psicóloga e estou a trabalhar como profissional de RVC na Escola Secundária Z”. Ultimamente e talvez
até por estarem a ser mais atacadas e ser preciso defendê-las, explicá-las, porque as pessoas não
sabem o que é, eu digo: “trabalho nas Novas Oportunidades. Muitas vezes eu digo trabalho nas Novas
Oportunidades e pronto! Novas Oportunidades. (E4.33, p. 67)
Dois outros fatores parecem implicar-se nessa inibição/ativação de disposições: a imagem
pública definida que a Iniciativa Novas Oportunidades vai revelando (justa ou injustamente) e
aquela que os profissionais de RVC não possuem.
De uma forma geral e de acordo com algumas perceções, essa imagem social e mediática
deriva de diversas condicionantes: do desconhecimento e desconfiança (e consequentes
mecanismos de resistência social e mediática) relacionadas com as características dos
processos de RVC (a «novidade» e a «complexidade» das metodologias utilizadas e a diversidade
de agentes profissionais e instituições envolvidos); uma certa ideia de «facilitismo» (amplificados
pela Comunicação Social) sobretudo pela comparação com outros modelos e formas de
avaliação utilizados para os mesmos níveis de qualificação (os exames, etc.), entre outros (Liz,
Machado, & Burnay, 2009). Estas implicações não têm apenas implicações no espaço mediático
mas também ao nível individual:
São pessoas que não aderem mesmo às Novas Oportunidades. Eu conheço pessoas que foram
obrigados a inscreverem-se enquanto desempregados e depois não foram. Discordam das Novas
Oportunidades! Dizem que não está certo, que não está correto. Acham que as pessoas não aprendem
nada e, portanto, as pessoas não têm nada o 9º ano, ou o 6º ano ou o 12º ano. E que não é correto
para os outros que andam a estudar três anos e por aí fora. Mas a maior parte das vezes eu acho que é
por desconhecimento. Não sabem como funciona por dentro. Também, como funciona por dentro, nós
sabemos por nós, não sabemos o que se passa nos outros. Se calhar há muita gente que sabe como
funcionam os outros [Centros]: foram buscar os diplomas… (E4.35, p. 67)
Os profissionais de RVC são uma ocupação profissional relativamente desconhecida.
Diferentes fatores podem estar implicados nesse desconhecimento social: a pluralidade de
110
designações, que não facilita uma identificação consensual; ser uma ocupação profissional sem
‘lastro histórico’; por efeito dos profissionais de RVC não se apresentarem como tal, por à partida
não ser reconhecida:
…sei que quando digo que sou profissional de RVC. Primeiro digo que sou profissional de RVC e… “Ah!
O que é isso?” E depois quando digo que trabalho num CNO, levo sempre ou muitas vezes com aquela
cara feia, tipo… derivado à má informação que se vai veiculando. (E2.47, p. 35)
Não há necessariamente muitas convergências, ou haverá algumas entre a ação do Profissional e dos
adultos mas a um nível da perceção da sociedade, desde sempre que há muitos pontos de interrogação
– e alguns serão legítimos -, muitas dúvidas, muitas críticas. (E3.41, p. 51)
Em termos de visibilidade ou de aceitação pública – como até já te disse – às vezes custa-me dizer que
sou profissional de RVC, as pessoas nem sabem o que isso é: Reconhecimento de Competências das
Novas Oportunidades… (E3.44, p. 52)
Portanto, num certo sentido de precaução e por causa da desconfiança social prefere-se
utilizar uma identidade profissional menos problemática, mais consensual e socialmente
valorizada. Não se refere que se trabalha nas ‘Novas Oportunidades’ ou como profissional de
RVC para que não se implique na comunicação uma explicação ou explicitação adicional, uma
justificação ou uma defesa da (pretensa) validade, pertinência e interesse social dos processos
de RVCC. A distinção social também tem um fator significativo neste sentido:
Claro. Sou psicóloga. Trabalho com adultos! Se as pessoas me perguntam indiretamente, eu digo:
“trabalho num CNO”. Se me perguntam, falo! Normalmente se estás com alguém que já sabe disto
normalmente há uma conversa que não interessa nem a gregos nem a troianos, não interessa nada ter
a conversa. É só por isso! Mas se eu tiver que dizer digo, caramba! Não tenho, não tenho… Até porque
eu defendo este trabalho. Agora já me canso de defender o trabalho. (E5.39, p. 87)
Acrescendo à imagem social, implicam-se outros fatores com influência na constituição
das identidades profissionais, entre os quais a ‘desvalorização’ de algumas das organizações e
atualmente dos próprios poderes públicos e da tutela.
Em termos de reconhecimento organizacional, implica-se por vezes um sentimento de
pouca valorização. Por exemplo, um dos entrevistados que trabalha num CNO de uma escola
pública referiu que a organização Escola não conseguiu ainda enquadrar a ação do profissional
de RVC como um agente educativo, já que considerará ainda o “monopólio do professor como
educador profissional” (Canário, 2008, p. 18):
A escola, o meio, não olha para mim, para este ator educativo da mesma forma, claro! Está muito
desfasada do que é isto da Educação de Adultos, da metodologia, das particularidades que esta ação
exige. Portanto, o meu estatuto na escola é algo que andará entre estas duas imagens: o tipo formado
em Sociologia que trabalha lá no CNO; e o senhor professor […], que é um tipo extraordinário e muito
amigo e impecável, e isto e aquilo e aqueloutro. (E3.42, p. 52)
111
Na configuração de uma identidade profissional específica resta portanto o trabalho com
os próprios adultos e as consequências resultantes das práticas, quase que como uma forma de
resistência contra a desvalorização por parte dos outros educadores, da sociedade e dos poderes
públicos considerados na tutela (a ANQEP)
…eu sinto-me importante no que faço por quase dos meus adultos, mais nada, ponto final. De alguns
adultos… E mais nada, ponto final. Não tenho o reconhecimento da tutela! A tutela não acha que aquilo
que eu faço é importante; os pares também não. A sociedade no seu todo também não. (E3.62, p. 55)
Por um lado há questão dos mitos todos que se vão criando lá fora e as pessoas ficam sempre um
bocadinho de pé atrás, olham com estranheza. Mas eu explico, explico que… e até pergunto à pessoa,
por exemplo, se não sente que ao longo da vida se vai aprendendo e todos os dias se nós estivermos
com os canais abertos somos capazes de aprender. O que eu explico é que aqui é feito um
reconhecimento dessas aprendizagens que não são feitas em contexto necessariamente formativo,
formal. Falo dos diferentes contextos e depois dou exemplos específicos e digo que realmente o nosso
trabalho é muito complicado porque não é como um professor. Isso é uma das grandes dificuldades que
eu sinto e acho que os formadores têm a vida mais facilitada nesse sentido é que se nós tivéssemos
uma matéria para dar… Hoje vou dar isto, isto e isto. Nós aqui temos de ajudar as pessoas a refletir,
temos de pôr as pessoas a refletir. Isso é uma coisa que é muito difícil. Nós próprios sentimos
dificuldade em refletir. Saber refletir não é… Agora estou a mudar um bocado de assunto. Mas esse é
um dos grandes desafios que a nossa profissão tem. É realmente levar o adulto a… Ele pode ter
efetivamente as competências mas nem está consciente que as tem e ser capaz de refletir acerca delas.
Por isso eu explico que o nosso trabalho é complicado. (E2.24, p. 31)
Porque há uma carga negativa, pejorativa relativamente a esta nomenclatura. Porque muito associado a
um determinado partido que levou isto avante. Não é pela aceitação pública, pela visibilidade pública
que eu estou nisto. Não é pelo salário, não é pelo horário de trabalho: trazemos muito trabalho para
casa, muitas vezes, como sabes. É, sobretudo, como há pouco tentei dizer, a oportunidade de, de facto,
conhecer pessoas; histórias de vida absolutamente fantásticas e, portanto, eu sinto, que… Um dia,
comentei isto com o meu primo, foi algo do género: a geografia e a topografia humana desta região, eu
hoje sinto que a conheço muito melhor, do que conhecia há cinco anos atrás. Conheço muito melhor a
minha região e os que nela habitam, do que há cinco anos atrás! Porque conheço as pessoas! Como
também conhecerás… Isto dá-nos um poder, que é algo que não sei se estás para aí a analisar ou não,
mas que é interessante ver por esta lógica, dá um poder impressionante! Um poder impressionante!
(E3.44, p. 52)
Saliente-se também que em termos identitários não há uma referência comum nem
consensualidade relativamente a considerarem-se «educadores de adultos». Uma das reações
das pessoas face à pergunta: «consideras-te um educador de adultos?», a resposta aparecia em
forma de pergunta: “uma educadora de adultos, não. Não sei o que queres dizer com uma
educadora?” (E1.52, p. 12); “O que é que é educar? (E2.36, p. 33).
Num sentido restrito encarava-se o educador enquanto um transmissor, aquele que
ensina a fazer determinadas atividades e que facilita a aprendizagem de determinado tipo de
112
saberes, ou seja, aquele que ao instruir possibilita a aquisição de determinado tipo de
habilidades:
Ensino a mexer no computador; ensino a fazer pesquisas; ensino a pôr imagens; ensino a formatar
textos; ensino, se for preciso, a corrigir um erro. De matemática, se houver alguma dúvida, também
ensino e gosto dessa parte, de lhes ensinar! O que eu noto é que eles gostam que lhes expliquem bem
as coisas. (E1.55, p. 13)
No entanto, há também quem diferencie o processo de RVCC de um processo educativo,
mas que implica aprendizagens:
[reproduzindo um diálogo com os candidatos] “por favor, lembrem-se que vocês não vêm aqui para
aprender. Agora, nós estamos sempre a aprender. E vocês ao fazer este trabalho, vocês vão aprender e
vão aprender sozinhos, o que vai ser ótimo! Agora o objetivo do RVCC não é aprender! O objetivo do
RVCC é reconhecer o que vocês aprenderam. Se vocês acham que têm algumas lacunas, vocês vão ter
de aprender, sozinhos ou com ajuda, mas vão ter de aprender para depois mostrar à equipa que, de
facto, têm os conhecimentos. Mas só o facto de vocês estarem a aprender, nem que seja à pressão, é
uma aprendizagem que vai ser reconhecida e é também a capacidade de conseguirem o tal raciocínio
que vocês já têm e que vos leva a adquirir alguns conhecimentos que a vida não vos obrigou a ter, não
houve necessidade de, mas que vocês conseguem adquirir com alguma rapidez”. (E5.18, p. 84)
Num outro sentido, já mais abrangente, encara-se a educação enquanto uma
possibilidade de desestruturar, de inquietar e, caso haja essa recetividade, de transformar as
estruturas mentais dos próprios candidatos. Contudo, também parece que essa mesma postura
transcende o âmbito das práticas do profissional de RVC:
Eu acho que na educação não depende só do educador, depende também do educando. Por mais que
façamos, se a pessoa não estiver recetiva a… Por mais que façamos não vamos ter um papel
transformativo nessa pessoa. (E2.37, p. 33)
…mexer com as pessoas! Ou melhor: abaná-las - mas isso não é uma finalidade, é um meio - de forma a
que um dia mais tarde, elas sintam que valeu a pena os meses de trabalho que tiveram e que isso, de
alguma forma, contribuiu para serem melhores pessoas, melhores profissionais, melhores cidadãos,
melhores pais, melhores filhos. (E3.25, p. 47)
…o que é um educador senão também aquele que provoca, que estimula, que inquieta? Eu gosto de
achar que sou um pouco isso! Nem sei se sou, espero ser! Gosto de achar que é um pouco isso que me
define. Portanto, uma educação muito mais virada para a cidadania, para a arte, para valores que nos
transcendam de alguma forma do que para esta questão muito em voga, hoje em dia, da
empregabilidade. (E3.26, p. 47)
Eu, na verdade, a forma como eu entendo o processo de RVCC vai para além do processo de RVCC porque ninguém fala em inquietação. (E3.40, p. 50)
113
Espaços e processos de aprendizagem: o contexto da profissionalização
Como referimos, desde o início da implementação do Sistema Nacional de RVCC, as
entidades governamentais responsáveis sempre procuraram regular e definir muitas das
dimensões da intervenção desenvolvida no âmbito dos Centros RVCC/Novas Oportunidades e
também definir gradualmente as diversas responsabilidades dos que aí trabalham.
Essa regulação apresentou diferentes formatos, desde orientações para o desenvolvimento
das atividades (tanto em termos qualitativos como em termos quantitativos) materializadas, por
exemplo, nos Referenciais de Competências e Guias de Operacionalização (Gomes, 2006), em
Cartas de Qualidade (Gomes & Simões, 2007), em diferentes Ações de Formação e também
através da legislação regulamentadora das configurações institucionais e perfis profissionais.
De uma forma geral, as condições de acesso, as atribuições e os conteúdos funcionais
relativos aos profissionais de RVC não têm sido sujeitos, na sua essência, a muitas modificações,
ainda que se observem alterações em diversas dimensões do seu trabalho, nomeadamente em
termos de distribuição de tarefas e funções.
Saliente-se, no entanto, que apesar de a regulação ser determinada de uma maneira top-
down, não significa que sejam completamente determinísticas. Ao longo do desenvolvimento do
sistema de RVCC observou-se um desenvolvimento e uma depuração dos processos e
metodologias e também, em muitos casos, eram reclamadas orientações mais específicas que
regulassem as entidades e os profissionais, ou seja os diversos intervenientes no «terreno».
Consideramos que o processo de elaboração e implementação dessas orientações
também foi sujeito a múltiplas influências e determinações. Além das alterações resultantes da
reflexão das equipas sobre as suas práticas e procedimentos e aos consequentes ajustamentos
efetuados pela tutela destacam-se também, e até anteriormente à génese do Sistema Nacional
de RVCC, múltiplas influências: o papel de diversas instituições internacionais – União Europeia,
UNESCO e OCDE e também as influências mútuas em termos de observação de sistemas
similares em outros países e contextos; a produção académica sobre as temáticas implicadas na
constituição do campo (o reconhecimento das aprendizagens experimentais, as novas noções
sobre a aprendizagem, o trabalho educativo por competências, a utilização e a fundamentação
teórica-conceptual de metodologias e instrumentos específicos.
Consideremos algumas das transformações resultantes das orientações emanadas pelas
diferentes entidades reguladoras.
114
Formação inicial e contínua
Com a implementação do Sistema Nacional de RVCC procurou-se regular o acesso ao
exercício da função de profissional de RVC. Ainda que de uma forma genérica, foram
estabelecidas determinadas condições e um perfil de entrada. Definiram-se três condições68: 1)
formação de nível superior (licenciatura, pelo menos) na área das Ciências Sociais e Humanas;
2) experiência profissional relevante e comprovada em trabalho com adultos e na utilização das
metodologias de Balanço de Competências e Histórias de Vida; 3) ligação efetiva e conhecimento
em termos socioculturais e económicos da realidade local abrangida pelo Centro de RVCC
(Leitão, 2002, p. 38).
Esperava-se de todos aqueles que quisessem trabalhar nos Centros de RVCC que se
comprometessem com a «missão» e garantissem a continuidade efetiva do projeto e que
demonstrassem disponibilidade para «investir» não só em termos profissionais69 mas também
em termos pessoais (Leitão, 2002, p. 40). Essa retórica do «espírito de missão» foi sendo
incorporada pelos diversos agentes. Se, por um lado, corresponde a uma implicação numa
«causa e coisa pública» que constitui um padrão de referência na própria prática da Educação
de Adultos (Collins, 1991, pp. 40-57), por outro, também se pode admitir que é um discurso
utilizado para justificar e compensar algumas condições de precariedade em que alguns agentes
de Educação e Formação de Adultos desenvolviam e desenvolvem as suas funções, como se
pode inferir do comentário de um dos entrevistados:
Muita gente disse, a determinada altura, que trabalhar nesta área, ou só trabalharia nesta área quem
vestisse a camisola, quem tivesse aquele sentido de missão, e eu não estou… Eu penso que é algo
parecido com isto! Como vestir a camisola, pergunto eu hoje, se a tutela a despiu ou está prestes a
despi-la? E é esta angústia existencial que hoje em dia que me atormenta um pouco. (E3.35, p. 49)
Uma outra perspetiva é considerada por Richard Edwards que relaciona essa «missão»
como um exercício do «poder pastoral», ou seja, um sistema internalizado de controlo das
práticas que condiciona a ação dos próprios agentes e profissionais da EFA:
“As pessoas estão a ser encorajadas a trabalharem com mais afinco, a aceitarem maiores
responsabilidades individuais para elas próprias, nas suas contribuições para as organizações e para a
formação social. Com essa responsabilidade cresce o stress. Neste sentido, o poder pastoral torna-se
autorreplicante, criando as condições para a sua própria proliferação, já que as formas de
68 No Roteiro Estruturante (Leitão, 2002), um documento editado pela ANEFA que pretendia orientar o funcionamento dos Centros de RVCC nas suas diversas dimensões. Este documento operacionalizava a clarificava a regulamentação anterior aprovada pela Portaria nº 1082-A/2001, 5 de Setembro. Pretendia também regular a Rede Nacional de CRVCC (promotores do SNRVCC) criado pela mesma portaria. 69 Os profissionais de RVC ainda deveriam demonstrar disponibilidade para exercer as suas funções em regime de itinerância.
115
empoderamento engendradas são a base para os problemas que procura resolver. A Confissão é
portanto um sintoma das formas contemporâneas de governamentalidade em vez de ser uma cura para
as suas aflições” (Edwards, 1997, p. 10).
Mais tarde, em 2008, com a publicação de uma norma legal70, observaram-se alterações
nos requisitos para o exercício das funções de profissional de RVC. Continua a ser necessário
possuir conhecimentos das metodologias adequadas, revelar experiência no domínio de
educação e formação de adultos, nomeadamente no desenvolvimento de balanços de
competências e na construção de portefólios reflexivos de aprendizagens. Porém, uma das
mudanças observadas foi a ampliação do tipo de habilitações necessárias: onde se estipulava
uma licenciatura na área das Ciências Sociais e Humanas, passou-se a mencionar apenas uma
habilitação académica de nível superior de qualquer área, não se especificando o ramo
disciplinar. Previamente assumia-se a necessidade de uma preparação teórica e metodológica
no campo das Ciências Sociais e Humanas. Pressupunha-se que o desenvolvimento de
competências analíticas, reflexivas e operatórias, além das pressupostas afinidades com as
temáticas e problemáticas das várias áreas disciplinares (Sociologia, Psicologia, Ciências da
Educação, Filosofia, Educação Social, etc.), seria mais adequado para o desempenho das
funções de Profissional de RVC. Presentemente é da responsabilidade de cada CNO (ou sua
entidade promotora) a manifestação de preferência relativamente a licenciaturas que consideram
mais adequadas para o exercício das funções de profissional de RVCC. Essa escolha será
efetuada em função dos interesses específicos de cada organização e das opiniões específicas
relativas à adequabilidade teórica e metodológica de cada uma das qualificações.
Esta situação é mais notória nos concursos dos CNO promovidos por entidades públicas
(escolas e centros de formação profissional, principalmente) já que são as únicas entidades
legalmente condicionadas a publicitar concursos públicos.
Na opinião de alguns dos entrevistados a situação é relativamente ambivalente. Por um
lado, considera-se a adequação das licenciaturas das áreas das Ciências Sociais e Humanas
para o desempenho de profissional de RVC, geralmente justificando com os conhecimentos ou a
adequação advinda das suas próprias licenciaturas. Por outro lado, constata-se que a limitação a
licenciaturas específicas corresponderia mais a formas de facilitar a regulação do mercado de
trabalho, do que à distinção e adequabilidade que uma formação na área das Ciências Sociais e
Humanas possibilitaria em termos de preparação técnica e teórica.
70 Portaria n.º 370/2008 de 21 de Maio.
116
Em relação aos profissionais de RVC eu achava um bocado estranho que outros cursos que não de
Ciências Sociais estivessem presentes. Atualmente – obviamente que tem a ver com a experiência que
eu tenho tido com os colegas também – acho que não. Acho que qualquer pessoa pode ajudar. No
fundo, acaba sempre por ser isso, ajudar os adultos a fazer o seu portefólio. (E4.74, p. 74)
…é lógico que um técnico de RVC esteja ligado a áreas das Ciências Sociais e Humanas, mas se calhar
por que tens de definir uma licenciatura. Se não tivesses de definir uma licenciatura, acho que depois
poderias criar um perfil de competências e numa entrevista para esse profissional ver se essa pessoa
teria essas competências/conhecimentos independentemente da sua licenciatura, mas no nosso país
nós trabalhamos muito com uma base: a licenciatura disto, a licenciatura daquilo. (E5.7, p. 80)
Nestas opiniões questiona-se, portanto, a necessidade de uma formação inicial específica
como um fundamento necessário para o exercício profissional nesta área. Parecem mais
relevantes os atributos pessoais de cada profissional de RVC já que, como desenvolvemos
anteriormente, o trabalho dos profissionais de RVC passa pelo acompanhamento,
aconselhamento e orientação no desenvolvimento de tarefas específicas (o portefólio reflexivo de
aprendizagens, por exemplo), revelando-se no ato de «ajudar», uma dimensão de trabalho que
passa por lidar com as emoções suscitadas durante o processo:
Tem uma coisa a ver que é o ‘ajudar’! O ajudar tem um sentido muito lato. Podemos ajudar em termos
emocionais, de problemas patológicos, ou profundos, emocionais, etc. Ou podemos ajudar e o que
acontece não é tão pouco frequente quanto isso, que as histórias de vida mexem com as pessoas. A
mim já me aconteceu várias vezes as pessoas estarem numa sessão individual, estamos a ver a história
de vida e vêm ao de cima os problemas, vêm ao de cima as lágrimas, vêm ao de cima as situações
difíceis que estão a viver. Portanto, quase é um complemento, quase poderia dizer que complementa e
eu sei que essas coisas acontecerem são boas para as pessoas, de alguma forma estão a expurgar ou
estão a pôr cá fora parte do seu mal-estar. Portanto, eu acho que Psicologia completa, complementa ou
pode complementar um profissional de RVC. (E4.38, p. 68)
São valorizados saberes que são trabalhados em determinadas áreas de formação, seja
na licenciatura ou na própria formação obtida aquando do início de funções, e que facilitam o
desempenho profissional a vários níveis:
Trabalhei! Trabalhei ao nível do relacionamento interpessoal, ao nível do contacto com o outro, no
conseguir… Na própria entrevista, para ver se a pessoa tinha ou não tinha perfil para entrar num
processo de RVC, a forma como se conduz uma entrevista, a forma como se percebe algo da pessoa a
partir da linguagem não-verbal dela, a forma como se deixa a pessoa à vontade, a esse nível. Isso são
competências que tu adquires, não competências… São conhecimentos que são trabalhados na área da
Psicologia, nesse contacto com o outro, com o utente, com o paciente, seja como for; na relação que se
estabelece e como se conduz, como se consegue que a pessoa fique mais à vontade; como se conduz a
intervenção da pessoa; como se leva a pessoa a escrever aquilo que nós queremos que se escreva, a tal
narrativa. Por aí, isso era trabalhado na Psicologia e também trabalhado na formação inicial para os
técnicos de RVCC. (E5.6, p. 80)
117
Um outro sentido específico para a valorização das aprendizagens efetuadas em contexto
formal universitário relaciona-se com a definição de um «olhar específico» que seria apropriado
ao desempenho profissional.
A Sociologia sempre me atraiu porque, de certa forma, ao ler alguns sociólogos, e não só, na imprensa
escrita sobretudo quando era mais catraio, adolescente, identifiquei-me com uma certa forma de ver o
mundo, uma certa tendência para a ideia de que só a educação, verdadeiramente, é capaz de
transformar as pessoas, de lhes criar oportunidades de sucesso, de reconhecimento, de progressão
social. (E3.7, p. 44)
…essa natural’ sensibilidade, para não deixarmos que o nosso entendimento das coisas seja superficial.
Estou-me a lembrar da velha história da reprodução social e da forma como a escola reproduz
tendencialmente as condições que existem à partida. Sempre fui, desde miúdo, muito sensível a isto.
Sempre fiz amizades com miúdos, com colegas de outras classes sociais, muito mais desfavorecidas.
(E3.8, p. 44)
A necessidade de formação contínua das equipas selecionadas para trabalhar nos Centros
sempre foi um aspeto destacado. Desde o tempo da ANEFA que se sustenta que a
responsabilidade das formações seria do próprio Centro, embora essa Agência se tenha
comprometido a delinear anualmente um plano de formação (Leitão, 2002, p. 40).
As formações deveriam ser «qualificantes» e «não facultativas». Como as metodologias, as
teorias utilizadas e a própria configuração institucional eram recentes, a formação deveria ter
duas componentes: a componente de formação transversal e a componente de formação
específica.
A primeira visava “promover a interiorização da filosofia e do modelo de funcionamento do
Centro” e o desenvolvimento de competências de planeamento, de gestão e avaliação de
projectos; já a segunda, relacionada com as diferentes funções atribuídas a cada elemento,
visava possibilitar “qualificar os participantes no conhecimento, apropriação e utilização dos
princípios e metodologias” de RVC e das atividades dos Centros de RVCC (Leitão, 2002, p. 40).
Uma outra dimensão que se encontra presente nos diversos discursos relaciona-se com
as formações específicas que foram frequentadas para a preparação e desenvolvimento das
funções de RVC71. Para as designar foi utilizada uma idêntica expressão por duas das
entrevistadas: «mais do mesmo», uma expressão que não é particularmente abonatória.
71 Dados relativos aos anos de 2007 e 2008 - até 16 de Julho de 2008 - indicam que 4471 pessoas tiveram formação dada pela ANQ e que outras 1056 pessoas obtiveram formação dada por outras entidades do ensino superior 1056 (ANQ, 2008, pp. 25-26).
118
Por um lado, o «mais do mesmo» relacionava-se com a pouca preparação que os
formadores apresentavam. Mesmo que a formação tenha sido facultada num contexto
universitário, a impressão que ficou a uma das entrevistadas foi a impreparação dos formadores:
É um cliché que a formação é sempre importante e que se aprende sempre alguma coisa. Óbvio! Mas
até acho que quem me deu a formação… Estavam também a desbravar caminho e a aprender,
portanto, não foi assim uma… Não acho que isso me tenha preparado de forma diferente, não! Ouvi
muito do mesmo. (E1.15, p. 8)
Num outro sentido, relacionava-se com o reduzido ajustamento às características
específicas das equipas e das próprias organizações. A formação facultada passando por uma
uniformização de conteúdos ou mesmo uma tentativa de doutrinação era sempre a mesma
independentemente dos Centros já estarem em atividade há algum tempo ou não:
Houve uma altura em que era mais do mesmo. Era mais do mesmo porque o que acontece… Tinhas a
formação e começavam a entrar novos Centros. As dúvidas que tu tinhas, iniciais, pelo menos retiraste
ou pelo menos já sabias qual era a resposta. E como entravam novos Centros, esses Centros tinham as
dúvidas que tu tinhas inicialmente e então, às vezes, era mais do mesmo. (E5.30, p. 86)
De acordo com um estudo de Avaliação da INO, também se referia que uma das
perceções em relação à ANQ era que a esta não conseguia proporcionar formação adequada.
Focava-se muito nos Centros em início de função (Liz, Machado & Burnay, 2009, pp. 40-41).
No entanto, são expostas outras opiniões relativamente a essas formações. Considera-se
também que tiveram um efeito positivo. Aliás, algumas das formações eram valorizadas porque
simulavam o que os profissionais de RVC iriam trabalhar. Os ‘novos’ profissionais de RVC, em
alguns casos, tinham poucos conhecimentos das formas e metodologias utilizadas no processo
de RVC, das várias fases do processo e de como desenvolver cada um desses momentos. Afirma
uma das entrevistadas:
…foi um exercício que até fiz numa formação, nós experimentarmos um bocadinho aquilo que depois
vamos fazer com os adultos, ou seja, aqueles instrumentos fazermos como se fossemos nós a fazer
porque conseguimos assim pormo-nos no lado deles e, mais facilmente, depois conseguimos explicar-
lhes e dar-lhes ideias, as estratégias de como eles poderão eventualmente fazer o seu processo. (E2.16,
p. 30)
A formação contínua é considerada fundamental mas parece assumir uma importância
acrescida pelas suas implicações em termos relacionais. Salienta-se muito o contacto com
outros profissionais e com outras formas de trabalhar e não sendo tão valorizada pelos
conteúdos específicos a trabalhar, já que esses derivarão mais do campo das práticas e das
suas configurações específicas.
119
Com a formação contínua também se procura uma «reciclagem» de saberes e uma
«adaptação» teórica aos próprios contextos organizacionais e institucionais.
Uma das entrevistadas refere uma outra forma de adaptação: a adaptação teórica a
contextos regionais/territoriais. Esta perspetiva é intelectualmente estimulante, na medida em
que se consideram configurações específicas dos contextos laborais e territoriais (em termos
sociais, económicos e culturais), porventura pela ação que uma entidade específica (neste caso
uma universidade) implicaria em termos da definição de práticas profissionais. Se cada
universidade tem uma tradição/escola específica ela também implicaria mudanças nas próprias
práticas profissionais e formas de abordagem:
…onze anos depois de ter terminado o curso, um bocado para ‘reciclagem’ e para percecionar a
perspetiva de cá de Braga. Eu tirei em Lisboa, portanto… [psicologia] Dinâmica, por isso era uma outra
forma de trabalhar. Achei que era importante atualizar-me… (E4.9, p. 62)
As atividades de formação podem tornar-se uma fonte de frustração, quando não há
correspondência entre as expectativas individuais e aquilo que é disponibilizado pelas entidades
que promovem ou organizam essas mesmas formações. Não são só as formações de carácter
mais esporádico ou com menor tempo, mas também em pós-graduações, como está patente
nas diversas entrevistas.
Por um lado, essa fundamentação pode servir para justificar uma incapacidade em
concluir um processo educativo/formativo, porque o padrão de exigência dos indivíduos que
procuram essas formações é superior àquilo que é disponibilizado nas próprias formações.
Também poderá significar que, considerando que é através da prática profissional que se
desenvolvem a maior parte das competências e saberes-fazer necessários à própria prática
profissional, há uma certa insatisfação relacionada com um certa apreensão de não se
acrescentar nada, de ser «mais do mesmo» ou até uma sensação de grande familiaridade com
os conteúdos facultados.
Portanto, e agora em relação a formações que eu recebi na vertente educacional, eu fiz algumas, não
muitas e muito sinceramente é assim: a minha prática, a minha experiência, foi quem me ensinou.
Quando vou a uma formação é uma frustração porque a maior parte das coisas eu conheço-as, eu
trabalhei-as, eu fi-las, portanto, não gosto muito de formações, de receber formações. Não tenho muita
paciência! (E4.10, p. 62)
Procuram-se atividades de formação por diferentes motivos: porque se quer estudar e é
uma oportunidade de crescimento pessoal; porque se quer desenvolver o currículo; por distração
da vida profissional (como possibilidade de «libertação» cognitiva, ou seja, como uma espaço de
120
cognição perspetivado fora da influência direta do contexto ou das necessidades laborais) para
aumentar as possibilidades de reconversão profissional; para a definição de uma identidade
pessoal e profissional. Repare-se nas respostas dos entrevistados:
Porque era uma outra área que eu achei piada e porque queria enveredar também pela [psicologia]
clínica. E porque me poderia surgir outras. E também porque já estava um bocadinho cansada [do
trabalho de profissional]. (E5.32, p. 86)
Eu vou apostar na minha formação. Vou apostar na minha formação em áreas distintas, não tem nada a
ver com isto. Vou apostar em formações que me possam atrair na área clínica, a nível da Psicologia:
Clínica, Saúde e depois vou apostar noutro tipo de formação que não tem nada a ver com isto. Mas isso
primeiro é o que eu quero fazer para depois fazer a tal reconversão profissional. Agora, para agora que
não consigo adquirir essa formação em dois ou três meses. Para agora vou apostar naquilo que existe.
Como eu acho que não vou ficar desempregada, eu vou-me adaptar aquilo que surgir, a esta nova
reconversão dos Centros Novas Oportunidades a estas novas funções. (E5.96, p. 97)
Primeiro porque me apetecia estudar. Estava a sentir falta… Depois pensei… já que estava. […] Achei
importante para o meu currículo, basicamente, e queria aprender. Na altura achei que ia fazer o
mestrado, mas depois dececionei-me um bocadito e parei por ali […] Não acho que tenha modificado
formas de trabalhar. Aprendi algumas coisas teóricas sobre as políticas da educação que me passavam
muito ao lado. (E1.23 e 24, p. 9)
De facto, além dos estudos e formações de base (sublinhe-se que todos os profissionais
de RVC têm níveis de qualificações elevados) e das formações estruturadas para o
desenvolvimento de competências específicas verificam-se também as diferentes aprendizagens
associadas ao contexto de trabalho e à experiência da vida que não se suspende.
Muitas das aprendizagens consideradas como as mais relevantes são desenvolvidas
principalmente por ação dos próprios indivíduos (na expressão de uma direccionalidade e de
uma intencionalidade), e em contexto de trabalho específicos, no exercício das funções,
nomeadamente através das situações de trabalho com os próprios adultos e com a diversidade
de situações que estão implicadas nesta relação. Como refere Ana Luísa Pires, uma das
principais formas de desenvolver as aprendizagens tem sido através da própria experiência:
“Isto remete para a formação das pessoas que estão a fazer este trabalho. Na grande generalidade têm
vindo a aprender com a sua própria experiência, e há saberes que têm vindo a ser constituídos pelas
equipas, nos centros, que são de muito valor e que mereciam ser explicitados e disseminados pelas
outras equipas. Muitos destes saberes que se têm vindo a constituir são valiosíssimos, e é importante
ter noção disto e sistematizá-los, desenvolvê-los, disseminá-los” (Pires, 2010b, p. 11).
Como sempre, o principal responsável pelo processo de aprendizagem parece ser o
próprio indivíduo, por si só ou através dos relacionamentos estabelecidos com os seus colegas
de trabalho, em contexto organizacional:
121
Em termos de desconstruir os adultos e ajudá-los não me preparou. Isso é mais a minha própria
preparação e a minha própria personalidade, digamos assim. (E1.11, p. 8)
Era, era um bocado desagradável porque uma pessoa não sabe, não sabe o que fazer, não sabe a quem perguntar, não sabe como fazer. Eu lembro-me de um bocado, meia receosa, meia a medo, perguntar aos colegas: “olha, como se faz isto no SIGO? Como é que não sei quê? Como é que não sei quê?” Mas era desagradável porque acho que tinhas uma lista, uma check-list do que tinha de dizer ou que fazer, mas mais nada. De facto, o apoio acabava por vir das colegas que já trabalhavam cá. Portanto, já tinham aprendido e era por aí que ia aprendendo. (E4.24, p. 65) Quem cá estava, e falo das chefias, ou seja de quem for, deveriam ter pegado nas novas pessoas, o grupo de seis que entramos de uma vez e, no fundo, ‘puxá-las’ a uma sala e vamos aqui e vamos explicar as coisas todas direitinhas para nós sabermos como tínhamos de fazer. Coisa que não foi feita, portanto! Entramos no grupo que já cá estava! Portanto, deveria ter havido, não era em termos de integração e apresentação, era mesmo na parte profissional. Mesmo na parte: “o trabalho é este e faz-se desta maneira!”. Em vez de: “Olhe, está aqui uma check-list. Vem meia hora mais cedo! Prepare as fotocópias…”. Andávamos todos às aranhas! (E4.26, p. 65) Quando vim trabalhar sentia-me um bocado perdida. Não conhecia os referenciais. Fui começando a trabalhar a “pôr as mãos na massa” e fui aprendendo. [em surdina] Posso dizer isto? É uma crítica que eu faço aqui. Cheguei aqui e tive uma reunião numa sexta-feira para começar a receber um grupo na semana seguinte. (E2.12, p. 29)
As aprendizagens em contexto de trabalho desenvolvem-se, portanto, de diferentes
formas: a) aprendizagens autodirigidas e autopromovidas (através de livros e manuais;
conferências, palestras e seminários; recorrendo a tecnologias de comunicação e informação e a
plataformas digitais; no confronto com tarefas desafiantes); b) através de instruções e orientação
inicial; pela participação em redes e espaços colaborativas (workshops, grupos de experiência,
grupos de trabalho, etc.); c) a aprendizagem com os outros (através de conversas e interação
com colegas de trabalho, com as chefias, com os candidatos/clientes/utentes, etc.), entre
outras possibilidades (Illeris, 2004, pp. 91-102).
Implicam-se diferentes dinâmicas, processos e formas de aprendizagem. Além da
aprendizagem pela ação e pelo desenvolvimento de atividades ou tarefas específicas (o que é
referido como «learning by doing») e da criação de canais de partilha informal de informação e
experiências (o «networking» de agentes e estruturas educativas) foram relevantes para o
desenvolvimento das práticas dos profissionais de RVC.
Parece haver uma espécie de necessidade de partilha de informação dentro de uma
«comunidade imaginada de práticas». Essa partilha de informação servirá para calibrar as
diversas práticas organizacionais ou individuais a um padrão médio imaginado (uma espécie de
emulação de práticas): como fazer? Como é que os outros fazem? Que instrumentos têm? Que
informações possuem?
122
É por poder partilhar experiências com pessoas que fazem o mesmo que eu… me ajuda a crescer, me
ajuda a olhar para as coisas de forma diferente. É uma forma de me atualizar dentro das minhas
funções. (E2.76, p. 39)
Essa formação por acaso foi interessante porque apanhou as diferentes fases do processo, pude
contactar com pessoas que desempenham diferentes funções e, por acaso, acho que foi uma mais-valia
essa formação. (E2.14, p. 29)
No entanto, como refere Knud Illeris:
“A criação de comunidades de trabalho e aprendizagem depende da extensão com que os trabalhadores
experienciam um significado comum no trabalho e desenvolvem relações pessoais via proximidade e
identificação. Se os trabalhadores tiverem uma atitude instrumental em relação ao trabalho e se não o
encararem com significativo, não há uma base para comunidades de trabalho, mas apenas para uma
comunidade política baseada na procura de um interesse comum tais como melhores salários. Se os
trabalhadores não experienciarem o trabalho como significativo não têm nenhuma razão para se
comprometerem e se envolverem em processos de aprendizagem” (Illeris, 2004, p. 37).
Uma das entrevistadas revela como as comunidades de prática72 profissional (em termos
da configuração do trabalho e da aprendizagem) se vão modificando e vão estabelecendo
ligações instrumentais e se vão desagregando por não se verificar uma estratégia para proceder
aos esforços de proximidade e de identificação:
No início deste trabalho houve sempre a tentativa de assim o fazer [articular com outras equipas] e
recordo-me de, quando os Centros surgiram, terem-nos telefonado para estarem connosco, para terem
reuniões connosco para colocarem dúvidas. Como éramos Centros mais antigos podermos ajudar.
Haver uma partilha e uma disseminação das práticas. Isso foi sempre um dos objetivos da ANEFA.
Agora, com o tempo tu vais acabar por…segues assim um caminho, outra pessoa segue o outro. Depois
há alguns contactos telefónicos com Centros que tu conheces melhor para perguntares: “o que estás a
fazer? Surgiu isto! Estás a fazer desta forma? Olha, por exemplo, eu não estou a ser capaz de submeter
a candidatura. Porquê?” Isso já surgiu e nós entramos em contacto com os Centros que nos são mais
próximos e que nos damos bem. E, no inicialmente, ao nível das práticas isso também aconteceu. Mas
depois ao longo das práticas não. Tu também começas a te formatar numa dada forma de atuar. A
equipa também já é grande e nós também, em reunião e com as formações que vamos tendo, iriamos
mudando as coisas. Aquilo que eu te posso dizer é que inicialmente a gente estava sempre a mudar. A
gente alterava este instrumento, a gente alterava aquele, a gente fazia isto e a gente fazia aquilo.
Passado alguns anos deixamos de o fazer. Tenho que dizer que as coisas… porque se calhar as coisas
também vieram mais bem definidas da ANQ e também, se calhar, aquela motivação inicial vai-se
perdendo um pouco. Mas, no início, nós, não era todos os meses, mas estávamos sempre a fazer
alterações aos instrumentos. Mudávamos isto, mudávamos aquilo, em termos da carga horária, em
termos da gestão da formação. A criação e as competências que eu adquiri na aplicação de um projeto
que era muito embrionário, que era muito teórico, deu-me uma série de competências. Ou aplicar as
coisas no terreno e ver o que é que resulta e o que é que não resulta a este nível. Agora, se eu for só
técnica de RVC, como eu te digo, essa minha amiga é só técnica de RVC, já chegou numa altura que já
72 Na nossa perspetiva as «comunidades de prática» podem ser percecionadas a diversos níveis e escalas. Desde um nível macro, com a constituição de modalidades associativas de âmbito nacional, a um nível meso, com a constituição de redes regionais e/ou locais, e também a um nível micro com a inscrição do trabalhador num nível organizacional e contextos específicos de trabalho.
123
estava formado, em que lhe é passado o trabalho, ela está com as pessoas, há competências, há, mas
acho que são menos do que aquelas que eu adquiri. A minha carreira, porque infelizmente, digo isto,
mas não é para estar, digo isto porque gostava de ter feito mais coisas, mas pronto, chega uma altura
em que já não há muito a aprender, vai-se aprendendo aos pouquinhos, vais limando arestas. (E5.86,
pp. 95-96)
124
Conclusões: do que se deu conta
“Foi de tudo isto o que eu quis dar conta.”
Henri Bergson (1993, p. 140)
As transformações nos contextos de trabalho e nas formas de relacionamento laboral
induzem uma crescente adaptabilidade dos trabalhadores. Uma das denominações dessa
adaptabilidade é a referida «empregabilidade» que, entre outros fatores, será potenciada pela
aquisição de melhores padrões de qualificação. Considera-se frequentemente que os diferentes
processos e padrões de aprendizagem e qualificação possibilitam a obtenção de vantagens
comparativas (individuais e organizacionais).
Numa lógica de crescente responsabilização individual sugere-se que os trabalhadores
desenvolvam a capacidade de controlarem as diversas circunstâncias da sua vida profissional,
mobilizando as diversas aprendizagens efetuadas através de diversos processos em diferentes
espaços. Procura-se instrumentalizar os conhecimentos e os saberes, potenciando formas
complexas de seletividade social e económica, almejando a aquisição de “competências para
competir” (Lima, 2004, p. 10).
As transformações no campo da Educação e Formação de Adultos têm resultado das
diversas mudanças sociais resultantes, entre outras, dos diferentes desenvolvimentos nas
tecnologias de informação e comunicação, nas ambivalentes reestruturações dos modelos de
desenvolvimento, dos seus modos de produção associados e dos diversos movimentos sociais e
culturais (Edwards, 1997; Castells, 2005).
Também concorrem para essas transformações outros aspetos: a pluralização das
instituições e agentes com intervenção (direta e indireta) na educação, formação e aprendizagem
dos adultos; a enfatização na autodiretividade do aprendente, no sentido de o indivíduo
equacionar reflexivamente as suas necessidades e/ou vontades em termos de aprendizagem; a
crescente valorização social, económica e gnosiológica dos saberes individuais
independentemente do espaço ou contexto de obtenção (Usher, Bryant & Johnston, 1997; EAEA,
2006).
Essas alterações implicaram o surgimento de diversos tipos de atividades profissionais no
campo da Educação e Formação de Adultos que visavam adequar-se a essas diversas mudanças
(Jarvis, 2010).
125
No contexto português surgiu, a partir do ano 2000, mas com diversos antecedentes, um
sistema que estruturava institucional e organizacionalmente um conjunto de serviços relativos ao
reconhecimento, validação e certificação de competências.
É nesse enquadramento que surgem diferentes ocupações profissionais, nomeadamente
aquela que examinamos: os profissionais de RVC. Funcionalmente esta ocupação insere-se na
área do Aconselhamento e Orientação, uma área de crescente relevância no âmbito da
Educação e Formação de Adultos em termos de orientações políticas, de enquadramento teórico
e institucional e até de financiamento em termos nacionais e internacionais (referimo-nos ao
contexto europeu). O que se sustenta é que
“os aprendentes adultos precisam de apoio na análise das suas necessidades de aprendizagem e na
procura de ofertas apropriadas. Isto inclui o reconhecimento de aprendizagens experienciais prévias, no
estabelecimento e na atualização de sistemas de informação e de bases de dados, na verificação de
informação das ofertas de aprendizagem, na orientação dos aprendentes ao longo dos seus processos
de aprendizagem, no aconselhamento no caso de dificuldades de aprendizagem, na avaliação das
realizações e na validação das competências individuais” (Research voor Beleid; PLATO, 2008, p. 70).
Quisemos examinar o processo de profissionalização da referida ocupação pelas suas
particularidades. Assim, investigamos a profissionalização no seu sentido processual, ou seja,
relativamente à obtenção e evolução de saberes e competências que visam o desenvolvimento
do profissionalismo, entendido enquanto um valor normativo que fundamenta disposições e
orientações específicas, e a construção de identidades profissionais, ou seja, aos modos de
identificação e de apresentação.
Uma das primeiras constatações é que não há um entendimento consensual na definição
de qualificações de acesso ao desempenho das funções de profissional de RVC.
De 2001 a 2008 a legislação referia a adequabilidade de habilitações de nível superior (no
mínimo, uma licenciatura) na área das Ciências Sociais e Humanas. A partir de 2008 optou-se
por uma maior abrangência e ampliou-se, em termos formais, a possibilidade de acesso de
quaisquer licenciaturas.
Como antes, mas a partir daí sem qualquer tipo de limitação além do nível habilitacional,
foi transferida para as entidades promotoras dos Centros Novas Oportunidades, a competência
de selecionar os critérios e perfis habilitacionais considerados adequados.
Porém, da parte das entidades promotoras e reguladoras do Sistema Nacional de RVCC
(ANEFA, DGFV e ANQ), sempre foi explicitada a premência de implementar diversas formações
126
que permitissem um desempenho profissional mais adequado nas diversas atividades dos
Centros.
Essas formações almejavam fundamentalmente a preparação dos diversos agentes de
Educação e Formação de Adultos e a configuração das suas práticas por forma a fazê-las
convergir com modelos teóricos, metodológicos e epistemológicos especificados para os
processos de RVCC.
Uma originalidade a referir relaciona-se com a determinação centralizada dos modelos
teóricos, metodológicos e epistemológicos a utilizar nos processos de RVCC. Os modelos e as
metodologias associadas a esses processos foram centralmente especificados (na legislação
reguladora e nos documentos orientadores do processo de RVCC) limitando a recontextualização
e a reconfiguração das práticas em função de situações específicas.
Parece também ter-se verificado um desajustamento das formações promovidas pelas
entidades tutelares, em conjunto com diversas entidades (entidades do ensino superior, etc.) em
relação às supostas necessidades de formação. De acordo com algumas observações recolhidas
nas entrevistas, sustentava-se que as formações eram estruturadas apenas como uma
preparação inicial para o desempenho das práticas profissionais e não para o desenvolvimento
das práticas dos agentes que vinham já trabalhando nos processos de RVC e nos CNO e que
revelavam já outras necessidades.
Refira-se que as diversas modalidades de formação, mais do que a obtenção de saberes
teóricos, parecem assumir uma maior relevância para os agentes de EFA quando simulam
atividades e práticas específicas.
Um outro fator de atratividade relaciona-se com todos os aspetos relacionais que as
formações potenciam, ou seja, destaca-se como de importância os momentos organizados em
que os agentes EFA/formandos possam partilhar as suas práticas e indagar de outras práticas
para verificar como se vai estruturando o trabalho noutras organizações. A formação aparece
assim como a oportunidade de estar implicado numa ‘rede’ (network) temporária com
espaço/tempo delimitado e sem os demais compromissos de manutenção dessa mesma rede
que não os informais.
As formas de desenvolvimento dos saberes considerados necessários às práticas
profissionais parecem passar pelos processos de aquisição individualizada e em situação de
trabalho. Os profissionais de RVC vão aprendendo por «ajustamentos sucessivos», de acordo
127
com os seus próprios atributos e capacidades pessoais, mediante estratégias e conveniências
individuais, pela sua própria ação profissional e com os desafios colocados nesse contexto.
Apesar de assumir uma relevância considerável para os diversos entrevistados (refira-se
que todos os entrevistados são detentores de pós-graduações e alguns deles de mestrados em
áreas diversas), observa-se que a instituição universitária não se tem revelado o ‘motor’ dos
processos de profissionalização, pelo menos no respeitante a este grupo de entrevistados e não
apresenta especial centralidade nos seus discursos.
Aliás, os motivos para encetar ou continuar graduações universitárias ou mesmo outros
tipos de formação de cariz profissional mais do que a adequação ou benefício para a prática
profissional relacionam-se com outros fatores. A formação é entendida como uma possibilidade
de «distração» do quotidiano pessoal e/ou profissional (o conhecimento tem uma «função
recreativa») a que se associa a possibilidade de se integrar ou constituir um novo espaço
relacional (conhecer novas pessoas); também é considerada como uma possibilidade para
«legitimar» uma prática profissional (caso se sinta pouco legitimado); de iniciar um processo de
reconversão profissional; também se refere a vontade de se obterem diferentes estímulos
cognitivos, de se desenharem novas rotinas intelectuais e de se disciplinar o ato de estudar.
Relacionamos esta última observação com a forma como os entrevistados admitem
proceder ao seu desenvolvimento profissional: por ajustamentos sucessivos e individuais, ainda
que com influência dos seus colegas de trabalho, entre outras possibilidades organizacionais.
As modalidades de formação (universitária ou outras) implicam normalmente uma certa
sistematização dos conhecimentos de base científica. Por um lado, os conhecimentos obtidos
em espaços formalizados suscitam diferentes discussões relacionadas com a sua
transferibilidade, ou seja, com a utilização e recontextualização dos saberes obtidos e
desenvolvidos em contexto escolar e formal em outros contextos de ação, nomeadamente, os
contextos de trabalho.
Num outro sentido, os saberes advindos pelos referidos «ajustamentos» em contexto
profissional implicam um acréscimo de dificuldade no ato de os sistematizar, com implicações
óbvias na reprodutibilidade desses próprios saberes.
Nessa sistematização estão implicados vários níveis de reflexão. O primeiro relaciona-se
com a capacidade de se refletir sobre aquilo que se faz no momento em que se faz. É um nível
de reflexão (imediato) que implica considerar as experiências, os sentimentos e os saberes em
uso. Esse nível de reflexão é complementado com um nível de reflexão (mediato) que implica
128
uma análise e reconstrução retrospetiva sobre a ação, uma organização e sistematização das
experiências que envolve uma categorização dos desafios e problemas e o ajustamento e
adequação das práticas (Schön, 1987).
É na articulação entre essas duas lógicas de desenvolvimento profissional, em contexto
escolar e contexto de trabalho, que se configuram alguns dilemas relativamente à preparação e
desenvolvimento dos diversos saberes e competências e a sua adequação aos processos de
profissionalização: os dilemas entre a especialização, que implicam uma certa formalização em
termos de abordagens monodisciplinares e a transversalização, enquanto a agregação e
convergência de influências pluridisciplinares.
Podem-se conceber essas tensões entre duas perspetivas dos processos de
profissionalização considerados nas suas diversas escalas (relativos aos profissionais de RVC, à
área de Aconselhamento e Orientação; ou à própria Educação e Formação de Adultos): 1)
direcionar e concentrar para o desenvolvimento de saberes e competências pessoais,
interpessoais, teóricas e instrumentais específicas a cada perfil profissional ou 2) incentivar
lógicas e espaços de desenvolvimento dos saberes e competências técnicas, teóricas e
interpessoais em torno de problemas educativos comuns (Correia, 2003, p. 29).
Essa dupla possibilidade leva-nos a considerar uma série de outras questões: em que
campos de práticas (profissionais e de investigação) se situa essa vasta e plural área do
Aconselhamento e Orientação? Qual é a sua «família» de ocupações e atividades profissionais?
Quais são as suas «tradições» e quais os seus quadros de referência? Como se desenvolvem
profissionalmente? Como são os seus processos de profissionalização? Como se relacionam as
diversas comunidades de prática (profissional e de investigação)? A matriz identitária de
referência corresponde à do campo da Educação e Formação de Adultos? As soluções para
esses ‘novos’ problemas educativos comuns serão passíveis de ser resolvidos exclusivamente
com as matrizes teóricas do campo da Educação e Formação de Adultos?
As práticas desenvolvidas apresentam algumas especificidades. Por um lado, pretende-se
desenvolver os processos de RVCC de forma a possibilitar a certificação de cada candidato.
Simultaneamente, com o processo de RVCC, designadamente com a elaboração do portefólio
reflexivo de aprendizagens, com a utilização das metodologias específicas e com as formas de
acompanhamento desenvolvidas pelos profissionais de RVC induzem-se diversas transformações
129
nos adultos em termos de redefinição de projetos pessoais, profissionais e
formativos/educativos.
De acordo com os profissionais de RVC entrevistados não nos pareceu haver uma
particular tensão entre as lógicas de “avaliação humanista/avaliação instrumental” (Cavaco,
2007, p. 31). De facto, podiam-se inferir alguns aspetos relacionados com cada uma dessas
lógicas mas não se constituíam tensões específicas, antes eram vistas nas suas articulações
existentes ou possíveis.
De uma forma geral parece-nos que, no caso português, o processo de RVCC passa
sobretudo pelo reconhecimento de saberes que coincidem com padrões determinados,
designadamente aqueles que estão estipulados nos Referenciais de Competências-Chave.
Através desse referencial são valorizados tipos e formas particulares de agir e pensar
específicos. Com a avaliação de competências efetuada no processo de RVCC induz-se a
convergência cognitiva e comportamental de cada indivíduo aos padrões estipulados, passando
essas convergências sobretudo pelo plano discursivo.
Apesar de no desenvolvimento do portefólio reflexivo se implicarem novas aprendizagens,
estas são colocadas em segundo plano, já que o reconhecimento e validação (isto é, a auto e
heteroavaliação) são colocados em primeiro plano.
No entanto, também nos parece que essa avaliação é facilitada a todos aqueles que estão
na posse de atributos específicos: a capacidade discursiva em termos orais e escritos (que
contribuem para a própria demonstração de competências); maiores níveis de escolarização
(apresentando vantagens em termos de compreensão de objetivos, estilos pedagógicos utilizados
e capacidade de corresponder às expectativas de avaliação).
Desde o início da implementação do processo de RVC que se justificou a sua ação pela
contribuição para uma maior justiça social mas sobretudo pela sua possibilidade de contribuir
para a qualificação de «recursos humanos» (ou seja, as pessoas entendidas sobretudo na sua
dimensão económica) e no contributo para o aumento da competitividade do país.
Neste sentido, através do processo de RVCC e da ação dos seus profissionais de RVC é
possível proceder-se à reinscrição de discursos ideologicamente dominantes e mesmo a uma
acentuação de uma certa despolitização da intervenção educativa.
Como analisamos verifica-se também uma certa ‘psicologização’ do reconhecimento de
competências, por exemplo, a valorização da experiência, a proximidade relacional dos
profissionais de RVC com os candidatos; e a prioridade que se dá à atribuição de sentido numa
130
vertente de construção e desenvolvimento individual. Estas situações podem implicar a
manifestação do poder confessional e de implementar ações de uma «governabilidade velada»
que podem ser potenciados até por um certo culto da informalidade, seja em termos relacionais,
seja em termos da valorização das aprendizagens assim obtidas.
Estas características assinaladas dos processos de RVCC fazem-nos considerar que os
seus modelos de referência, pelo menos no caso português, possuem uma similaridade com o
que se designa por modelo Procrustiano73, com determinadas características de Aprendizagem e
Desenvolvimento, utilizando uma tipologia desenvolvida por Judy Harris74 (1999).
Na nossa investigação também observamos uma outra situação: comprovamos a
existência de uma referência identitária comum configurada sobretudo pela forma como se
desenvolvem as práticas profissionais: a centralidade do candidato e do acompanhamento na
configuração da relação educativa/pedagógica; a estruturação do discurso em torno do papel da
valorização emocional e cognitiva do candidato e o direcionamento para a ‘fabricação’ de um
sujeito aprendente (Andersson & Fejes, 2005) tanto em termos retrospetivos como em termos
prospetivos.
No entanto, as identidades profissionais são plurais. Existe uma diversidade de matrizes
identitárias com múltiplas referências resultantes dos processos de socialização (como
assimilação de hábitos e procedimentos comuns a grupos, organizações ou instituições
específicas) e das estruturas de oportunidade, ou seja, as formas como cada indivíduo
perceciona o seu horizonte de expectativas face à avaliação do seu espaço de experiência.
Um fator relevante na análise das identidades profissionais relaciona-se com o momento
específico em que foram realizadas as entrevistas. Nessa altura, Junho/Julho de 2011, as
indefinições relacionadas com a continuidade dos Centros Novas Oportunidades e das suas
equipas eram motivo de ansiedade para todos os profissionais o que pareceu traduzir-se na
continuidade da reconfiguração identitária a que já se vinha dando espaço (pela imagem e
73 A denominação deste modelo refere-se a Procrustes, figura da mitologia grega também designado por Prokoptas ou Damastes. Filho de Poseidon, era um bandido de Ática (mais tarde morto por Teseu) que ficou afamado por ter uma cama de ferro (que na verdade eram duas) que oferecia aos viajantes: quando os viajantes eram pequenos demais para a cama, Procrustes, com requintes de malvadez e cumprindo as boas normas da tortura, esticava-os até os viajantes se ajustarem perfeitamente à cama. O mesmo se passava com aqueles que eram demasiado altos: a esses eram cortadas as partes excedentárias. Ninguém dormia com os pés fora da cama! Mais tarde, Teseu, na sua última aventura, deu-lhe o mesmo tratamento e fê-lo dormir numa dessas suas camas. Moral da história da cama: revela a arbitrariedade do ajuste forçado a padrões pré-estabelecidos. 74 Judy Harris (1999) descreveu quatro modelos de reconhecimento de adquiridos experienciais: Procrustiano, em que o reconhecimento é desenvolvido para corresponder a padrões predeterminados; Aprendizagem e Desenvolvimento, onde o reconhecimento se aproxima de padrões académicos mas suscita o desenvolvimento de competência numa ótica individualizante; Radical, em que o reconhecimento é entendido como uma alternativa às formas dominantes do conhecimento, Cavalo de Troia, em que todo o conhecimento é visto como socialmente construído e valorizável.
131
perceção pública que não eram particularmente abonatória) e também ao início de um processo
de «desvinculação».
Saliente-se que neste trabalho não se analisou a precarização laboral e a influência das
condições organizacionais e contextos laborais em reconfiguração. No entanto, também tem de
se assinalar que neste contexto atual o que pode estar em causa é a própria desestruturação da
ocupação e da atividade de profissional de RVC. O momento é de indefinição.
Os profissionais de RVC foram e são uma força de trabalho com condições precárias,
designadamente em termos de segurança laboral, de remuneração, de organização de classe,
na individualização na relação de trabalho e no seu diminuto nível de autonomia. Num certo
sentido poder-se-ia falar de processos de proletarização ou, por outro lado, a um conceito que se
vai prestando atenção pela sua utilidade analítica: a utilização do conceito de «cognitariado» na
análise dos processos de profissionalização dos profissionais de RVC e de outras ocupações
profissionais que utilizem o conhecimento e a fabricação de conhecimento como centrais na
configuração das suas práticas.
Última sugestão. Pela leitura das entrevistas verificam-se muitas das ambivalências que se
implicam, por estas alturas, nestes contextos. Nelas manifesta-se a vontade de uma segurança
profissional, mas também se verifica um certo tédio e um sentimento de estagnação devido às
rotinas de trabalho; reveza-se a indiferença perante o futuro profissional, uma aceitação
pragmática do que se antecipa e o pessimismo e a descrença que é sempre estratégia para
reduzir o impacto dos danos. Enfim, as pessoas esperam!
132
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apoios concedidos para a realização do processo de Reconhecimento, Validação e Certificação
de Competências.
Portaria n.º 1082-A/2001, de 5 de Setembro - cria a rede nacional de Centros de
Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências.
Portaria n.º 286-A/2002, de 15 de Março - aprova o Regulamento do Processo de
Acreditação das Entidades Promotoras dos Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação
de Competências.
Decreto-Lei 208/2002, de 17 de Outubro - aprova a orgânica do Ministério da Educação.
Despacho conjunto n.º 24/2005, de 10 de Janeiro - aprova o regulamento que define o
regime de acesso aos apoios concedidos no âmbito da medida n.º 4, ação n.º 4.1,
«Reconhecimento, validação e certificação de conhecimentos e competências adquiridos ao
longo da vida».
Lei n.º 52/2005, de 31 de Agosto - aprova as Grandes Opções do Plano para 2005-2009.
Resolução do Conselho de Ministros n.º 183/2005, de 28 de Novembro - aprova o
Programa Nacional de Acção para o Crescimento e o Emprego 2005-2008.
Resolução do Conselho de Ministros n.º 190/2005, de 16 de Dezembro - Aprova o
Plano Tecnológico.
Decreto-Lei n.º 213/2006, de 27 de Outubro - aprova a Lei Orgânica do Ministério da
Educação.
Portaria n.º 86/2007, de 12 de Janeiro - alteração à Portaria n.º 1082-A/2001, de 5 de
Setembro.
Decreto-Lei n.º276-C/2007, de 31 de Julho - cria e aprova a estrutura orgânica da
Agência Nacional para a Qualificação, I. P.
153
Decreto-Lei n.º 312/2007, de 17 de Setembro - define o modelo de governação do
Quadro de Referência Estratégico Nacional 2007 -2013 e dos respetivos programas
operacionais.
Resolução do Conselho de Ministros nº 173/2007, de 7 de Novembro - aprova um
conjunto de medidas de reforma da formação profissional.
Decreto Regulamentar nº 84-A/2007, de 10 de Dezembro - estabelece o regime geral
de aplicação do Fundo Social Europeu.
Decreto-Lei n.º 396/2007, de 31 de Dezembro - estabelece o regime jurídico do Sistema
Nacional de Qualificações e define as estruturas que asseguram o seu funcionamento.
Portaria n.º 370/2008, de 21 de Maio - regula a criação e o funcionamento dos Centros
Novas Oportunidades, incluindo o encaminhamento para formação e o reconhecimento,
validação e certificação de competências.
Portaria n.º 781/2009, de 23 de Julho - estabelece a estrutura e organização do Catálogo
Nacional de Qualificações, bem como o respetivo modelo de evolução para qualificações
baseadas em competências.
Portaria n.º 782/2009, de 23 de Julho - regula o Quadro Nacional de Qualificações e
define os descritores para a caracterização dos níveis de qualificação nacionais.
Despacho n.º 21022/2009, de 18 de Setembro - altera do regulamento específico que
define o regime de acesso aos apoios concedidos no âmbito da tipologia de intervenção n.º 2.1,
«Reconhecimento, validação e certificação de competências», do Programa Operacional
Potencial Humano
Decreto-Lei nº 36/2012 de 15 de fevereiro - cria e aprova a orgânica da Agência Nacional
para a Qualificação e o Ensino Profissional, I. P.
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