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Outubro de 2012 Joaquim Miguel Mendes Martins UMinho|2012 Joaquim Miguel Mendes Martins Universidade do Minho Instituto de Educação Os profissionais de Reconhecimento e Validação de Competências: análise crítica de um processo de profissionalização Os profissionais de Reconhecimento e Validação de Competências: análise crítica de um processo de profissionalização

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Outubro de 2012

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Os profissionais de Reconhecimento e Validação de Competências: análise crítica de um processo de profissionalização

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Dissertação de Mestrado Mestrado em Ciências da EducaçãoÁrea de Especialização em Educação de Adultos

Trabalho realizado sob a orientação do

Doutor Manuel António Ferreira da Silva

Universidade do MinhoInstituto de Educação

Outubro de 2012

Joaquim Miguel Mendes Martins

Os profissionais de Reconhecimento e Validação de Competências: análise crítica de um processo de profissionalização

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ii

Declaração

Nome: Joaquim Miguel Mendes Martins

Endereço eletrónico: [email protected]

Telefone: 966807384

Número do Cartão do Cidadão: 11401295

Título da tese: Os profissionais de Reconhecimento e Validação de Competências: análise

crítica de um processo de profissionalização.

Orientador: Doutor Manuel António Ferreira Silva

Ano de conclusão: 2012

Designação do Mestrado: Ciências da Educação. Área de especialização em Educação de

Adultos

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTA DISSERTAÇÃO APENAS PARA EFEITOS DE

INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE

COMPROMETE.

Universidade do Minho, ___/10/2012

Assinatura: ________________________________________________

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iii

Os profissionais de Reconhecimento e Validação de Competências: análise crítica

de um processo de profissionalização

Resumo

Nesta dissertação examinou-se o processo de profissionalização dos profissionais de

Reconhecimento e Validação de Competências (RVC), uma das ocupações enquadradas no

Aconselhamento e Orientação, uma área de crescente relevância no campo da Educação e

Formação de Adultos (EFA). Essa ocupação profissional surge com a implementação do Sistema

Nacional de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC) em 2001.

Considerou-se este processo de profissionalização como a obtenção e desenvolvimento de

saberes e competências específicos com dois propósitos: o incremento do profissionalismo, valor

normativo referido ao desempenho profissional, e a construção de identidades profissionais, ou

seja, modos particulares de identificação e de apresentação.

Na análise desse processo consideraram-se as práticas dos profissionais de RVC nas

articulações entre: a) as transformações no mundo de trabalho e os contextos de aprendizagem

dos indivíduos; b) as especificidades institucionais do campo da EFA e os discursos institucionais

relativos ao desenvolvimento profissional dos trabalhadores desse campo; c) a valorização social

e económica das aprendizagens experienciais, a emergência dos sistemas de RVCC e o

desenvolvimento de atividades profissionais relacionadas com o Aconselhamento e Orientação.

No desenvolvimento destas práticas profissionais específicas foram determinantes as

aprendizagens realizadas por «ajustamentos sucessivos» no âmbito do contexto de trabalho e

em função de atributos, estratégias e conveniências individuais. Os saberes específicos assim

desenvolvidos complexificam a sua sistematização e condicionam a distintividade e

reprodutibilidade dos mesmos. Outros espaços de aprendizagem foram considerados na sua

complementaridade com as aprendizagens obtidas em contexto de trabalho.

Também se verificou que as identidades profissionais são plurais. Existe uma diversidade de

matrizes identitárias com múltiplas referências resultantes dos processos de socialização (como

assimilação de hábitos e procedimentos comuns a grupos, organizações ou instituições

específicas) e das estruturas de oportunidade, ou seja, as formas como cada indivíduo

perceciona o seu «horizonte de expectativas» face à avaliação do seu «espaço de experiência».

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iv

Counsellors of Recognition and Validation of Competences: critical analysis of a

professionalization process

Abstract

This dissertation examined the professionalization process in Counselors of Recognition and

Validation of Competences (RVC), one occupation inscribed in Counseling and Guidance, a

practice of growing significance in the field of Adult Education. This practitioner emerged with the

implementation of the National System of Recognition, Validation and Certification of

Competences (RVCC) in 2001.

We approached this process of professionalization as a procedure to obtain and increase specific

skills and knowledge with two main purposes: the development of professionalism, a normative

value referred to professional performance, and of professional identities, i.e., particular modes

of identification and presentation.

In the analysis of that process we considered the Counselors of RVC practices in the relation

between: a) the changes in the world of work and personal learning environments, b) the

institutional specificities of the field of Adult Education and the institutional discourses related to

professional development within that field, c) the social and economic value of experiential

learning, the emergence of systems of RVC and the expansion of professional activities related to

Counseling and Guidance.

In the improvement of counseling practices it was influential a mode of learning by «successive

adjustments» considering the individual attributes and strategies as well the plurality of personal

conveniences within the workplace. The specific knowledge thus developed implicates a complex

systematization affecting its own distinctiveness and reproducibility. We also considered other

learning spaces in its complementarity with workplace learning.

It was also demonstrated the plurality of professional identities. There is a diversity of identities

with multiple references resulting from the socialization processes (as assimilation practices and

procedures common to groups, organizations or institutions) and from the structures of

opportunity, i.e., the ways in which each individual perceive the «horizon of expectations» in

relation with his own assessment of their «space of experience».

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v

Índice

Índice de Figuras ...................................................................................................................... vi

Índice de Quadros .................................................................................................................... vi

Lista de Abreviaturas ............................................................................................................... vii

Pontos de partida: do que se pretende dar conta ........................................................................1

Do estado da coisa: configurações da mudança .....................................................................4

Definindo o tema: um processo de profissionalização .............................................................6

I. Opções e estratégias de investigação ................................................................................... 12

A entrevista biográfica semiestruturada: possibilidades e constrangimentos ......................... 17

O distanciamento crítico: especificidades e obstáculos ..................................................... 19

Apontamento: as entrevistas e os entrevistados ............................................................... 23

II. Desenvolvimento profissional dos agentes EFA .................................................................... 25

Agentes e profissionais no campo da EFA: uma resenha ..................................................... 32

Articulação com outros agentes sociais e sectores da sociedade ...................................... 36

Condições laborais, de remuneração e estatuto profissional ............................................. 38

Formação inicial e contínua – a sua valorização .............................................................. 39

Aprendizagem ao Longo da Vida e o discurso da Qualidade ............................................. 43

Processos de profissionalização e o profissionalismo ....................................................... 54

III. Os profissionais de RVC: um processo de profissionalização ............................................... 62

O Sistema Nacional de RVCC .............................................................................................. 63

Da ANEFA à DGFV: um pouco de história… ..................................................................... 65

A Iniciativa Novas Oportunidades e a ANQ ....................................................................... 70

Apontamento: a ANQEP .................................................................................................. 79

Profissionais de RVC: emergência e centralidade ................................................................. 82

Aconselhamento e Orientação: um campo de práticas emergentes .................................. 85

Práticas profissionais e práticas reflexivas ........................................................................ 91

Configurações e definições das práticas .......................................................................... 94

Tecnicização da prática: administração, monitorização e auditabilidade ......................... 104

Identidades profissionais ............................................................................................... 108

Espaços e processos de aprendizagem: o contexto da profissionalização ....................... 113

Formação inicial e contínua ........................................................................................... 114

Conclusões: do que se deu conta .......................................................................................... 124

Bibliografia ........................................................................................................................... 132

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vi

Índice de Figuras

Figura 1 - Evolução da Rede de Centros (RVCC e Novas Oportunidades) .................................. 73

Figura 2 - Fluxograma das Etapas de Intervenção dos Centros Novas Oportunidades ............... 79

Índice de Quadros

Quadro 1 - Tipologia dos Centros Novas Oportunidades ......................................................... 105

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vii

Lista de Abreviaturas

AEA – Aprendizagem e Educação de Adultos

ANEFA – Agência Nacional para a Educação e Formação Profissional

ANQ – Agência Nacional para as Qualificações

ANQEP – Agência Nacional para as Qualificações e Ensino Profissional

CNE – Conselho Nacional de Educação

CNO – Centro Novas Oportunidades

CONFINTEA – Conferência Internacional de Educação de Adultos

CQEP – Centro de Qualificação e Ensino Profissional

CRVCC – Centro de Reconhecimento, Validação e certificação de Competências

DGFV – Direção Geral de Formação Vocacional

EFA – Educação e Formação de Adultos

INO – Iniciativa Novas Oportunidades

OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico

POPH – Programa Operacional Potencial Humano

RVC – Reconhecimento e Validação de Competências

RVCC – Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências

SIGO – Sistema Integrado de Informação e Gestão de Oferta

SNRVCC – Sistema Nacional de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências

TDE – Técnico de Diagnóstico e Encaminhamento

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura

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1

Pontos de partida: do que se pretende dar conta

A importância de os trabalhadores desenvolverem os seus saberes de forma contínua e

adaptarem-se, em termos pessoais e profissionais, às constantes mudanças que ocorrem nas

sociedades e economias, tornou-se um truísmo amplamente consensualizado.

Ainda que aprender e ensinar seja um predicado dos seres humanos (Illeris, 2003; Freire

P., 2007), frequentemente, encaram-se essas capacidades na sua vertente mais instrumental e

adaptativa. Neste sentido particular, aprender «ao longo e ao largo» da vida é percecionado,

mais do que uma possibilidade, como um imperativo (Lima, 2010). Porventura os trabalhadores

mais expeditos consigam reagir diligentemente e enfrentar estrategicamente o conjunto de

mudanças que ocorrem nos diversos campos do social (na economia, na política, na cultura, na

educação, etc.) e que se repercutem, claro está, no seu quotidiano e contexto de trabalho. Como

refere Robert Lindley,

“no cenário actual, existe um crescente número de áreas do mapa das ocupações em que se pede às

pessoas que assumam responsabilidades cada vez maiores pelas respectivas situações de trabalho:

pede-se que obtenham os conhecimentos e as competências necessários ao seu trabalho, em primeiro

lugar, e que os actualizam de maneira adequada, que se assegurem de que possuem a informação

necessária à execução das tarefas próprias do seu emprego, que reajam com criatividade às exigências

da mudança e que tomem a iniciativa sempre que identificarem oportunidades de desenvolvimento que

beneficiem a organização. Por sua vez, a organização deve facilitar este processo, ou seja, “capacitar”

cada pessoa e grupo de trabalho para desempenharem este papel (Lindley, 2000, p. 50).

No reforço da «empregabilidade», os processos de aprendizagem e a aquisição de

melhores padrões de qualificação são assumidos como a obtenção de «vantagens competitivas»

por parte dos indivíduos e passam pelo desenvolvimento de “condições de controlo de

vulnerabilidade do próprio mercado de trabalho” (Ferreira & Costa, 1998, p. 159).

Nem que seja discursivamente, sustenta-se que através das atividades de educação,

formação e aprendizagem, ao longo da vida, numa lógica de «pedagogização» da sociedade e

dos problemas sociais e económicos (Correia, 2001, p. 26; Silva, 2006, p. 242; Lima, 2010, p.

51), além de se desenvolverem diferentes saberes e de se facilitar a integração no mercado de

trabalho também se permitiria uma maior segurança e adaptação a contextos sociais e

económicos de grande imprevisibilidade e turbulência (Edwards, 1997, pp. 26-27; Kovács,

2002, pp. 13-41).

Articulam-se, portanto, posturas de antecipação, preventividade e reatividade: os

indivíduos gerem o desenvolvimento da sua trajetória profissional - «não-linear», «turbulenta» e

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2

«disruptiva» (Pais, 2003, pp. 9, 87, 105) - através da ponderação e reflexividade individuais,

relativamente às mudanças e necessidades futuras.

Como refere Jean-Pierre Boutinet (1996, pp. 104-113), o projeto vocacional do adulto, um

processo racionalmente elaborado e referido a objetivos e aspirações individuais, considerado

enquanto uma «realização de si», assentaria em três dimensões da vida de trabalho: a

possibilidade de emprego, as condições de exercício da atividade e a mobilidade profissional.

Notamos, tal como Boutinet, que ter ou não ter emprego faz toda a diferença! Considere-

se a limitação de ofertas de emprego, a precariedade laboral e as taxas de desemprego

crescentes e pondere-se nas suas consequências, tanto em termos individuais como em termos

sociais. Além desta possibilidade objetiva, associe-se também o que pode ser designado por

“desemprego subjetivo” (ou «subemprego»), ou seja, a tendência para que, aumentando o nível

de qualificação escolar, aumente o desconforto em relação a labores percecionados como

repetitivos e desqualificantes (Boutinet, 1996, p. 110).

Similarmente, as condições de exercício da atividade profissional, numa dimensão

individual e particular, a aplicação de saberes específicos no cumprimento de um ofício ou de

uma profissão, influem no referido projeto vocacional. Este torna-se possível na articulação da

vivência e experiência de uma identidade profissional específica e envolve, sempre que possível,

a mobilização de capacidades de escolha e decisão e a expressão da sua autonomia.

Ao mesmo tempo, numa lógica de desenvolvimento profissional que contribua para a

definição da sua identidade profissional - aqui entendida como o reconhecimento de si (por si

mesmo e pelos outros) - o indivíduo, ao possuir a “impressão de se realizar, ao defrontar-se

[com] tarefas, ou responsabilidades, cada vez mais complexas” (Boutinet, 1996, p. 111),

procurará o aumento dos seus saberes e competências técnicas que o tornem, gradualmente,

um «perito» na sua atividade profissional.

Porém, impõe-se a questão de saber se esse processo de evolução (de responsabilidades

e competências) é considerado como um processo contínuo em termos cognitivos e temporais.

Nesta época de hegemonia da «melhoria contínua» (o sistema Kaizen), quais serão as condições

ou fatores para que o trabalhador considere que existe uma possibilidade de progressão ou, por

outro lado, um «ponto de saturação» relativamente aos saberes e competências necessários

para o desempenho das suas funções?

A terceira dimensão com influência na definição de um projeto de carreira relaciona-se

com a possibilidade de dispor de uma relativa mobilidade profissional. Nessa mobilidade

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implicar-se-ão distintos atributos e condicionantes que poderão coibir ou impulsionar esse desejo

de mudança. Entre outros possíveis, destacamos, por exemplo, a cultura de referência, a família

e idade de cada indivíduo e até a sua rede de relações.

Nos seus quotidianos, os indivíduos confrontam-se, frequentemente, com uma complexa e

tensa relação entre riscos e oportunidades que os impele a diferenciar as contingências

individuais (e sociais) e a decidir concordantemente. Ponderar as mudanças parece implicar um

questionamento permanente das prioridades a estabelecer, mediante a perceção que se tem do

valor e sentido das próprias mudanças, bem como das suas características, das suas

possibilidades e das implicações previstas e não previstas (Giddens, 2000b; Beck, 2001).

No entanto, acrescendo a essa suposta possibilidade de controlo e de direcionamento,

numa espécie de «determinação racionalizante», suscitadas por essa reflexividade, Boutinet

refere uma outra possibilidade, a que confronta desejo de mudança e a redução da capacidade

decisória e controlo da ação, advinda de sobredeterminações: “o adulto deseja operar rupturas,

muitas vezes por intermédio de crises que não permitem uma restruturação e planificação de

uma nova etapa” (Boutinet, 1996, p. 112).

Por isso, do ponto de vista dessa capacidade reflexiva resulta que, para os indivíduos, os

contextos (pessoais, económicos e políticos, por exemplo) possam não ser propícios e, assim,

em determinados momentos das suas vidas, senão na maior parte, o grande objetivo do projeto

de carreira passe por conservar o próprio posto de trabalho pelo maior tempo possível.

José Machado Pais revela as duas éticas que se «entrelaçam» no quotidiano profissional,

em função de diversas circunstâncias de vida, e que resultam em diferentes e ambivalentes

dilemas e confrontos: a ética tradicional do trabalho, marcada pelo desejo de segurança e pelo

desejo de correspondência e a ética de aventura, marcada pelo desejo de novas experiências e

pelo desejo de reconhecimento (Pais, 2003, p. 21).

No rescaldo dos confrontos, muitas vezes, adia-se, indefinidamente, a possibilidade de

mobilidade vertical, ou seja, a obtenção de ‘melhores’ empregos, e ponderam-se possibilidades

de mobilidade lateral que implicam reconversões profissionais forçadas, face ao risco de

desemprego ou desejadas, como forma de concretizar a mudança. Pretende-se, acima de tudo,

evitar as situações percecionadas como de retrocesso: o desemprego ou o emprego encarado

como de menor qualidade.

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4

Do estado da coisa: configurações da mudança

As circunstâncias de vida são compostas por nós e configuradas no mundo em que nos

situamos1, um mundo que, de acordo com Zygmunt Bauman, é caracterizado pela

«fragmentação», pela «descontinuidade» e pela «inconsequência». Numa observação que sugere

como se constituem as diversas trajetórias individuais e que, nas suas diversas implicações,

poderia ser tomada por pessimista ou fatalista, o sociólogo alerta:

“Num mundo assim é avisado e prudente não fazermos planos a longo prazo ou investirmos no futuro

distante (nunca podemos saber de antemão em que se vão tornar amanhã a atracção dos fins hoje

sedutores ou o valor dos trunfos presentes); não nos agarrarmos demasiado a um lugar, grupo de

pessoas, causa ou sequer auto-imagem particular, deixarmo-nos ir não só sem lançarmos âncora e à

deriva, mas sem âncora sequer; guiarmo-nos nas escolhas presentes não pelo desejo de controlar o

futuro, mas pela relutância que sentimos em hipotecá-lo. Por outras palavras, «sermos previdentes»

significa hoje na maior dos casos evitarmos o empenhamento. Estarmos livres de movimentos quando

uma ocasião bate à porta. Estarmos livres de partir quando deixa de bater” (Bauman, 2007, p. 269).

Neste tal mundo onde nos achamos, os espaços e contextos laborais resultam, entre

outros possíveis, da combinação de três fenómenos que originaram múltiplas implicações nas

maneiras como as identidades, trajetórias e possibilidades profissionais são definidas e

experienciadas. São eles: 1) as reestruturações setoriais e ocupacionais; 2) a emergência e

consolidação de formas atípicas de trabalho; e 3) o desenvolvimento de lógicas de flexibilização

laboral.

Num processo de décadas, mais notoriamente a partir da década de 1970, verificaram-se

diferentes reestruturações sectoriais e ocupacionais que passaram principalmente pela

terciarização da economia, com a verificação da predominância de emprego no sector dos

serviços2 e com a concomitante diminuição de emprego nos primeiros e segundos sectores

1 Nas palavras de Karl Marx: "Os homens fazem a sua própria história mas não a fazem arbitrariamente, nas condições escolhidas por eles, mas antes sob as condições directamente herdadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações passadas pesa inexoravelmente sobre a consciência dos vivos. E mesmo quando parecem ocupados em transformar-se, a eles e às coisas, em criar algo de absolutamente novo, é precisamente nessas épocas de crise revolucionária que se evocam respeitosamente os espíritos do passado, tomando-lhes de empréstimo os nomes, as palavras de ordem, as roupagens, para surgir no novo palco da história sob esse respeitável disfarce e com essa linguagem emprestada" (Marx, 1975, p. 13). 2 Crescem as ocupações profissionais em cinco grupos principais: 1) atividades relacionadas com a prestação de serviços principalmente no sector da alimentação e das tarefas domésticas (empregados de limpeza, pessoal doméstico, pessoal de manutenção e reparação, etc.); 2) atividades de gestão administrativa alta e intermédia (executivos, assessores legais, rececionistas); 3) atividades relacionadas com o cuidado e a atenção física pessoal (enfermeiros, fisioterapeutas, etc.); 4) atividades relacionadas com as ocupações no sector eletrónico (engenheiros, programadores e especialistas de apoio, etc.) e 5) as tarefas relacionadas com as novas necessidades sociais e o entretenimento - trabalhadores sociais, peritos em educação especial, professores, assistentes educativos e de apoio escolar, etc. (Tezanos, 2001, pp. 100-101).

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5

(Castells, 2005, pp. 266-290). A crescente feminização3 do mercado de trabalho, concebida

enquanto a participação de mulheres empregadas no sector terciário, foi um outro aspeto dessas

reestruturações (Casaca, 2005, pp. 56-60).

Paralelamente, constatou-se a emergência e consolidação de formas atípicas de trabalho e

a consequente diversificação de modelos laborais e vínculos contratuais (alguns dos quais

precários ou precarizantes). Atualmente, coexistem diferentes modalidades (laborais e

contratuais) que revelam uma diversificação do entendimento jurídico e social da relação de

trabalho e que afetam os relacionamentos laborais a vários níveis: trabalho a tempo inteiro e

parcial; trabalho por turnos; contratos de duração determinada; trabalho temporário;

subcontratação/outsourcing; empregos de inserção (contratos de emprego-formação, estágios,

formações em alternância, contratos de emprego/solidariedade); e até teletrabalho (Cerdeira,

2000, pp. 35-40; Kovács, 2005, pp. 22-46).

Também o desenvolvimento de lógicas de flexibilização laboral, a nível individual e

organizacional, concorreu para a configuração do mercado de trabalho atual. A flexibilidade e a

flexibilização são encaradas como soluções preferenciais para a crescente competitividade

global. Tornou-se conceito, política e discurso determinantes na problemática das mudanças

organizacionais, da gestão do processo produtivo e na configuração do relacionamento laboral

(sobretudo em termos de tempos de trabalho; de estabilidade no emprego; da localização física

da organização e na dissolução do «contrato social» entre empregador e empregado (Castells,

2005, p. 348).

Há uma certa ambiguidade na abordagem da flexibilização. Se, num certo sentido, remete

para algo desejável concebendo-se enquanto a «eliminação da rigidez», num outro sentido mais

«material», traduz-se em algo adverso que passa sobretudo pela desregulação legislativa e

laboral, pelo aligeiramento do peso fiscal sobre empresas e indivíduos e pelo enfraquecimento

dos relacionamentos que, tradicionalmente, se estabeleciam no mercado de trabalho e que

implicavam noções de segurança laboral. Percebida no seu sentido mais prejudicial, seja em

termos pessoais ou em termos sociais, a flexibilidade traduz-se em

“uma maior facilidade na aceitação do despedimento, possibilidade de aumentar e diminuir os salários,

expansão dos empregos a tempo parcial e a prazo, mudança mais frequente de trabalho, de empresas e de

lugar” (Dahrendorf, 1996, pp. 23-24).

3 Devido ao desenvolvimento de atividades tidas como femininas, ou seja, que “requerem atributos socialmente reconhecidos às mulheres, designadamente competências emotivas e relacionais”, que dependendo da perspetiva poderá corresponder a uma integração e participação no mercado de trabalho e/ou a fenómenos de “diferenciação e segregação” de género (Casaca, 2005, p. 57).

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6

São as alterações na subordinação económica e jurídica e nas suas implicações (a

precarização laboral e a insegurança no emprego, a retração da retribuição salarial, a

intensificação e transformação dos tempos de trabalho, a perda de diversos benefícios sociais,

etc.) suscitadas pelas referidas reestruturações sectoriais e ocupacionais, pelas transformações

no relacionamento e na regulação laboral e pelo lema da flexibilidade, que parecem justificar

cada vez mais o desenvolvimento de lógicas ideologicamente específicas para a aprendizagem

ao longo da vida (Kovács, 2002, pp. 14-25; Griffin, 1999a).

Neste contexto sociopolítico e económico, é essa subordinação e instrumentalização dos

diversos saberes e competências técnicas, profissionais e sociais resultantes dos processos de

aprendizagem, em múltiplos espaços e contextos, que se valoriza (Lima, 2004). Parece ser

através da amplificação dos espaços e processos de aprendizagem e da própria constituição da

experiência no «mundo da vida» como fonte de aprendizagem que se permitirá a adaptação às

diversas mudanças socioculturais, tecnológicas e organizativas. É nessas articulações e

interdependências que se devem contextualizar a análise das relações da educação, formação e

o trabalho. Como convenientemente sintetiza João Freire:

“A mensagem que se procura fazer passar, nomeadamente para as novas gerações, associa o

aprender e o trabalhar como duas dimensões de um mesmo problema, cuja responsabilidade principal

repousa nas mãos de cada indivíduo. A ele cabe adquirir e pôr em prática competências próprias, seja

como assalariado, como independente ou como responsável de uma iniciativa empresarial. Devendo a

sociedade (e os poderes públicos) compreender e apoiar estas dinâmicas, do próprio dependerá contudo

o seu melhor ou pior sucesso.

Neste sentido, tal discurso não deixa de legitimar a economia de mercado concorrencial actual,

bem como o processo de individualização em curso – uma das características fundamentais, de resto,

da modernização social. Resta saber se, nesta individualização, a competição exacerbada não tolherá o

passo às vertentes da autonomia e da responsabilidade que também estão presentes no exercício da

Profissionalidade” (Freire, 2002, p. 318).

Definindo o tema: um processo de profissionalização

Como temos examinado, construiu-se todo um discurso que sugere que a aquisição

permanente de qualificações e competências, considerando os constrangimentos e

características dos mercados de trabalho em transformação, é relevante para a construção das

identidades individuais e para a definição das diversas trajetórias profissionais.

São inúmeras e multidimensionais as possibilidades de análise e discussão relativas, por

exemplo: ao questionamento da «centralidade do trabalho» (Estanque, 2007; Maar, 2006); às

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metamorfoses na natureza do trabalho e na estrutura de emprego (Kovács, 2002, pp. 63-79);

aos fenómenos de polarização da estrutura ocupacional (Castells, 2005, pp. 287-289); aos

múltiplos fenómenos de precarização, tais como a pluriatividade, a intensificação de trabalho, a

retração salarial e horários antissociais, etc. (Hespanha, et al., 2001, pp. 29-36).

Nessa complexidade também se pode considerar os diversos relacionamentos entre

educação, formação e trabalho (Santos B. S., 1999, pp. 168-178; Kovács, 2002, pp. 63-94;

Correia, 2003, pp. 13-41), designadamente, a relação entre educação e desenvolvimento

económico (Lopes, 2010, pp. 70-92), a relação entre a escola e o mercado de trabalho (Saúde,

2010, pp. 103-132), as desigualdades escolares e a seletividade económica (Mendes, 2011, pp.

81-91), entre outros.

Referindo o ponto de vista da nossa análise, inevitavelmente fragmentário, pretendemos

direcionar a nossa atenção para dois aspetos que conceberemos nas suas articulações: como

são produzidas e contrastadas “racionalidades e oportunidades alternativas para a acção dentro

de campos profissionais e periciais específicos” (Beck, 2001, p. 48); e os modos como os

diversos saberes e os seus processos de desenvolvimento são compreendidos na configuração

de uma profissionalidade específica, ou seja, pretendemos perspetivar como se procede à

“articulação de saberes heterogéneos e a sua transformação em competências operatórias”

(Correia, 2003, p. 31).

Considerando a amplitude do campo da Educação e Formação de Adultos (EFA),

direcionamos a nossa investigação para a emergência e configuração de uma ocupação e

atividade profissional específica: os profissionais de Reconhecimento e Validação de

Competências (RVC).

Pretendemos abordar as condições de desenvolvimento profissional dessa ocupação,

considerando as suas especificidades, através da análise das condições, espaços e tempos em

que se ampliam os diversos saberes que configuram esse novo perfil profissional.

Designaremos por processo de profissionalização a obtenção e desenvolvimento de

habilidades, competências e conhecimentos e, em alguns casos, qualificações ou credenciais

específicas, visando dois grandes propósitos: o desenvolvimento do profissionalismo, valor

normativo que fundamenta disposições e noções particulares relativas a um desempenho

profissional que se pretende «eficiente e de qualidade» (Evetts, 2011), e a construção de

identidades profissionais mutuamente identificáveis pela partilha de uma linguagem específica,

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de um referencial comum de conduta e de um corpo de conhecimentos coletivos (Santos,

2011).

Como sustenta António Nóvoa, deve-se analisar o processo de profissionalização em torno

dos dois eixos em que este se manifesta: na definição do «corpo de saberes e saberes-fazer» e

no «conjunto de normas e de valores» (Nóvoa, 1995, p. 9).

Nos processos de profissionalização implicam-se outros fatores que enquadram a

configuração das identidades profissionais, do desenvolvimento do profissionalismo e dos

diferentes processos de aprendizagem. Um desses aspetos é relativo às condições de trabalho

que influem diferentemente nos processos de aquisição de saberes e competências.

Os diversos trabalhadores do campo da Educação e Formação de Adultos são

confrontados na sua prática profissional com as diversas alterações que vão ocorrendo no

mundo de trabalho. Devido às especificidades desse campo (capítulo II), essas alterações

afetam, de formas distintas, as atividades e ocupações profissionais do campo da Educação e

Formação de Adultos, sobretudo em função das diferentes condições de trabalho. Constatam-se

diferentes lógicas de precaridade laboral (Research voor Beleid; PLATO, 2008), que suscitam

diferentes contradições, dilemas e perturbações que derivam dos contextos e características

específicas do campo de práticas profissionais e influenciam os seus trabalhadores, profissionais

de RVC incluídos, a diversos níveis pessoais, familiares e sociais.

Além de serem agentes difusores da relevância da aprendizagem no mundo

contemporâneo, uma mensagem com reconhecida importância simbólica na forma como o seu

discurso profissional é constituído, também recai sobre eles essa mesma «imperatividade».

Também parece ser o agente de EFA condicionado a crer em discursos específicos da

aprendizagem - tomados como «operadores ideológicos de legitimação» (Correia, 2001) - como

possibilidade e necessidade adaptativa para o enfrentamento de um mundo em mudança.

Também a ele é solicitado o desenvolvimento contínuo dos seus saberes e competências, não só

para aumentar a qualidade do seu desempenho profissional mas também para aumentar a sua

empregabilidade.

No entanto, pelas lições da própria prática, verifica-se que as relações entre os processos

de qualificação e o desenvolvimento de competências nem sempre são harmoniosas. A

qualidade dessa relação dependerá também da situação de emprego em termos de estabilidade

e da configuração do próprio trabalho. Como Ilona Kóvacs, também consideramos que

“quando os indivíduos se encontram em condições de insegurança existencial, de falta de perspectivas e

de confiança quanto à melhoria da sua situação profissional, não estão reunidas as condições mínimas

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para poder responsabilizá-los pela renovação das suas competências. Esta responsabilização apenas é

possível quando o indivíduo se encontra numa situação de trabalho e de vida em geral, numa posição no

mercado de trabalho interno e externo, que lhe confere confiança, o estimula a pensar em projectos de

futuro e, ao mesmo tempo, lhe confere a possibilidade, o interesse e a capacidade de auto-

aprendizagem. Propor a responsabilização individual pela renovação constante das suas competências

nas actuais condições de desemprego, de emprego periférico e precário, revela tanta ignorância quanto

às condições sociais mínimas dessa responsabilização, como insensibilidade social e irresponsabilidade

política” (Kovács, 2002, p. 74).

A estas particularidades associa-se a crescente articulação entre a configuração específica

do campo da Educação e Formação de Adultos e o assomar em termos de visibilidade social de

determinados subcampos específicos, por exemplo, o Reconhecimento, Validação e Certificação

de Competências, e a invisibilidade crescente de outros subcampos da Educação e Formação de

Adultos (Lima, 2008; Cavaco, 2009; Guimarães, 2010a; CNE, 2011). Neste sentido, e por

inferência, as ocupações e atividades contextualizadas nesse campo profissional específico

possuem interesse analítico, pois apresentam algumas particularidades que têm vindo

gradualmente a ser estudadas (capítulo II): é uma ocupação de emergência e relevância

recentes; a sua configuração funcional é concomitante com a crescente valorização em termos

educativos, sociais e económicos dos saberes experienciais; essa valorização concretiza-se no

apoio e incentivo, em termos de definição de políticas, orientações e financiamento, por parte de

diferentes instituições, tanto em termos nacionais como por intermédio de organizações

internacionais como, por exemplo, a União Europeia, a UNESCO e a OCDE (capítulo II).

Desde o início da década de 2000, mas sobretudo a partir de 2006, foi crescendo em

relevância o número de pessoas a trabalhar enquanto profissionais de RVC. Paula Guimarães

(2010a) refere seis aspetos associados a uma «entrada massiva» de agentes de EFA a trabalhar

nos Centros Novas Oportunidades, que revelou um “forte cariz extensionista” e que

apresentaram diferentes implicações no campo das práticas profissionais: 1) a variedade de

formações iniciais (sobretudo no domínio das ciências sociais); 2) uma maior exigência em

termos de formação contínua; 3) o rejuvenescimento e a feminização dos agentes de EFA; 4) a

orientação e regulação normativa por parte da tutela institucional (ANQ) em relação às tarefas a

desempenhar e ao trabalho a desenvolver; 5) a alteração das tarefas práticas pedagógicas; 6) a

re-inclusão dos professores do ensino regular no grupo dos profissionais de Educação e

Formação de Adultos.

Sustenta a referida investigadora:

“Os profissionais que implementavam a política de educação e formação de adultos sugeriam a

existência de um novo profissionalismo atravessado por tendências políticas e perfis profissionais

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diferenciados. Ainda, como resultado destes cruzamentos, emergiam identidades em mudança,

atravessadas por tensões muito distintas, entre a tradição escolar e uma abordagem educativa mais

inovadora, atribuíveis a dimensões de políticas de educação para a conformidade e para a

competitividade” (Guimarães, 2010a, p. 787).

No entanto, se esta profissionalidade, concebida enquanto a configuração e combinação

específica de saberes, desempenhos e identidades profissionais (Evans, 2008) é de emergência

recente, e mesmo que atualmente se vivam períodos conturbados e de indefinição, resultado das

reorientações político-partidárias, saliente-se que as temáticas relacionadas com o

desenvolvimento profissional daqueles que trabalham, de forma assalariada ou voluntariamente,

a tempo total ou parcial, no campo da EFA, não o são.

Como desenvolveremos no capítulo II, pelo menos desde a segunda Conferência

Internacional de Educação de Adultos (UNESCO, 1960) se vem destacando a relevância do

desenvolvimento profissional dos agentes de educação de adultos. No entanto, na atualidade

vem-se utilizando de forma mais gradual e recorrente o conceito de profissionalização para

sumariar essa necessidade. Tem-se considerado esse processo de

profissionalização/desenvolvimento profissional dos agentes de EFA como determinante no

crescimento da qualidade do campo da EFA e da participação e aprendizagem dos adultos

envolvidos. De facto, em múltiplos documentos institucionais refere-se a “falta de oportunidade

de profissionalização e de formação […] e o impacto negativo na qualidade da oferta de

aprendizagem e educação de adultos” (UNESCO, 2010b, p. 21) e o desenvolvimento profissional

como “uma das medidas vitais para melhorar a qualidade da aprendizagem” (Buiskool, Brook,

van Lakerveldal, Zarifis, & Osborne, 2010, p. 9).

O nosso interesse aumenta na medida em que, aprofundando-se esta problemática, se

reconhece que o conceito de profissionalização, e o que ele representa, possui uma pluralidade

de conotações e suscita diversas conflitualidades e tensões teóricas, políticas e ideológicas nos

debates que se desenvolvem no contexto do campo da EFA.

Essas diferentes características implicam que a operacionalização e a investigação de

problemáticas associadas à profissionalização dos agentes de Educação e Formação de Adultos

seja um desafio. Como refere Bernard Charlot numa entrevista concedida em 2010: “o trabalho

específico do pesquisador em ciências humanas é identificar e pensar sobre contradições”

(Charlot, 2010, p. 155), latentes e/ou manifestas.

Consideramos também que a investigação dos diferentes processos de profissionalização

possibilitará a perspetivação das alterações que estão a influenciar o campo da Educação e

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Formação de Adultos, nomeadamente, nas suas tradições e ontologias. Ian Martin refere, por

exemplo, que a profissionalização, em termos de discurso e de processo, é um dos grandes

desafios que «desradicalizam» a Educação de Adultos (Martin, 2008).

De acordo com as diferentes abordagens do processo de profissionalização permitir-se-á

perspetivar como são enfatizadas e articuladas diferentes dimensões: as regras de orientação da

e para a ação; os debates sobre a capacitação ou credencialização da atividade profissional; a

definição de perfis de competências; a configuração do treino e preparação dos agentes de EFA;

a reflexão sobre o corpo especializado de conhecimento que lhe estão subjacentes; os diferentes

e divergentes quadros institucionais, organizacionais e legislativos que implicam a definição e

alterações das condições laborais, em termos de condições de trabalho e remuneração,

incentivo ou desincentivo da formação e atualização dos conhecimentos.

Julgamos ser necessário desenvolver reflexões, investigações, «mapas cognitivos» e

grelhas interpretativas que permitam a compreensão empírica dos processos de

profissionalização dos Educadores e Formadores de Adultos, em contextos organizacionais

diferenciados, nas suas motivações e na configuração das suas identidades profissionais

específicas:

“O que pode ajudar é o desenvolvimento da compreensão empírica dos processos de profissionalização

em situações onde estes não são formalmente dirigidos. É evidente que as pessoas agem com valores e

propósitos e desenvolvem conhecimento do que fazem quando ensinam adultos. No entanto, sabemos

pouco sobre essas motivações e processos. O profissionalismo pode não depender da obtenção de

qualificações formais. Diferentes formas, completas, incompletas ou semi-, podem emergir muito

diferentemente em diferentes contextos; os indivíduos são influenciados no desenvolvimento dos seus

sentidos de profissionalismo pelos contextos sociais e institucionais em que estão situados. Existem,

portanto, questões sobre o que aquelas possam ser. Quais as formas para uma identidade profissional

surgir e ser expressada?” (Jütte, Nicoll, & Olesen, 2011, p. 14).

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I. Opções e estratégias de investigação

Quando se desenvolve uma atividade de investigação é curial revelar como se procedeu à

sua sistematização e também quais os «hábitos intelectuais» do investigador. Cumpre

especificar como foi desenvolvida a pesquisa nas suas diversas vertentes: desde as

considerações metodológicas e epistemológicas4 aos métodos e técnicas utilizadas.

De uma forma geral, na prática científica, sustenta-se que ao longo das atividades de

investigação devem-se desenvolver mecanismos de controlo e de «vigilância epistemológica»

sobre as diversas condutas implicadas (Bourdieu, Chamboredon & Passeron, 1999, pp. 11-22).

Devemos, portanto, abordar e refletir sobre as condições, formas e momentos da análise e,

igualmente, sobre as determinações exteriores ao processo de produção de conhecimentos que

se implicam nas práticas de investigação.

Não menos importante é especificar as lógicas internas («reconstruídas, normativas e

críticas») do processo de investigação, isto é, avaliando a metodologia utilizada, referir como se

procedeu à “organização crítica das práticas de investigação” (Almeida & Pinto, 1995, p. 92).

Para isso, expõem-se as razões para a escolha dos diversos métodos e técnicas de investigação

e abordam-se as formas como elas se relacionam, ou seja, explicita-se como se formalizou o

raciocínio de investigação.

As nossas opções no desenho e desenvolvimento da investigação passaram por analisar,

primordialmente, a articulação entre o desenvolvimento e a reconstrução de saberes contextuais

no exercício de uma prática profissional particular.

Importou-nos compreender como se formam e (re)configuram as disposições

(estruturas cognitivas que guiam os indivíduos ou determinam as suas ações num determinado

contexto), considerando quais as condições e modalidades de formação (Lahire, 2005). Num

momento inicial, serviram-nos algumas questões que Bernard Lahire já germinara:

“Será que essas disposições se podem ir apagando progressivamente, ou podem mesmo desaparecer

completamente, por falta de actualização? […] Poderemos avaliar os graus de constituição e de reforço

das disposições, segundo, nomeadamente, a frequência e a intensidade do treino seguido, distinguindo

assim as disposições fracas (crenças passageiras e friáveis, hábitos efémeros ou desajeitados) das

disposições fortes? Como é que as múltiplas disposições incorporadas, que não formam

4 Para João Ferreira de Almeida e José Madureira Pinto, “tanto a epistemologia como a metodologia abordam criticamente as práticas concretas de investigação à medida que estas se desenrolam, mas fazem-no a níveis diversos. A metodologia não pode, por um lado, ceder à tentação de iludir a relação de interioridade que mantém com essas práticas, nem furtar-se, por outro lado, aos controlos que sobre ela própria exerce a epistemologia. O que nem uma nem outra podem ser é um conjunto de receitas normativas e a-históricas destinado a promover garantias de cientificidade” (Almeida & Pinto, 1995, p. 98).

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necessariamente um “sistema” coerente e harmonioso, se organizam ou se articulam?” (Lahire, 2005,

p. 17).

Considerando estas questões, incidimos a nossa análise nas trajetórias profissionais dos

profissionais de RVC, considerando a sua relação com a trajetória das aprendizagens individuais

e que na ótica do sujeito, e da nossa própria, apresentem significado no contexto da sua prática

profissional5.

Considerar este nível de análise – o das práticas profissionais – apresenta algumas

potencialidades que permite desafios de análise a um investigador que se posicione no âmbito

de uma estratégia de investigação qualitativa (Albarello, et al., 1997 , pp. 235-244).

Neste trilho de investigação, distintamente pluridisciplinar, investigar as práticas

profissionais possibilita analisar a forma como se aplicam os diversos conhecimentos e saberes -

os «saberes teóricos», os «saberes processuais», os «saberes práticos» e os «saberes-fazer»

(Malglaive, 1995, pp. 69-83), mobilizados no exercício de uma função e permitindo verificar

como é que os sujeitos, na pluralidade das suas disposições e experiências, orientam e

organizam a sua ação e se envolvem na resolução de problemas práticos (Lahire, 2005;

Walmsley, 2004).

Importou-nos refletir sobre como se relacionam as escolhas educativas e formativas e as

formas como se organiza e orienta o trabalho e a ação profissional. Pretendeu-se examinar como

os indivíduos processam as suas escolhas em termos de educação e formação e também como

estruturam os seus discursos, relativamente aos seus processos de aprendizagem.

Para captarmos essas diversas subjetividades e vivências educativas, passadas e

presentes, e considerarmos os projetos dos sujeitos, desenvolvemos uma abordagem

compreensiva que privilegiou o aprofundamento da análise, preocupando-nos em analisar, nos

discursos particulares dos sujeitos, as «gramáticas» que os organizam (Harvey, 1996, pp. 83-

84). Na linha deste autor consideramos que

“os discursos expressam o pensamento humano, fantasias e desejos. Eles também são alicerçados

institucionalmente, materialmente constrangidos, manifestações das relações sociais e de poder

experiencialmente fundamentados” (Harvey, 1996, p. 80).

5 Considerando o conteúdo, organização e estruturação do trabalho e também, por exemplo, as dimensões relacionais – com os adultos e com os colegas.

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Dessa citação decorre que os discursos não podem ser perspetivados isoladamente e

abstraídos dos contextos em que são configurados. Enquanto manifestações da articulação de

diversos momentos do processo social, devem ser compreendidos nas suas diversas relações.

Portanto, nessa análise, orientamo-nos por uma “grelha analítica básica” desenvolvida por

David Harvey (1996, p. 78) e que se presta a funcionar como um “mapa cognitivo”. Esse

«mapa» estrutura a análise dos processos sociais nas suas diferentes relações, em torno de seis

momentos: a linguagem/discurso; o poder; as crenças/valores/desejos; a construção de

instituições; as práticas materiais e as relações sociais.

As relações internas estabelecidas entre os diversos momentos são constituídas de uma

forma dialética, isto é, através das suas relações internas, envolvendo atividades de «tradução»

entre os vários momentos. No entanto, essas diversas atividades de tradução são mais do que

uma réplica ou «internalização» imediata. Como refere Harvey, cada momento internaliza de

forma heterogénea os «fluxos» advindos dos outros momentos. Por exemplo, apesar de na

análise do discurso pessoal se poder verificar a defesa da ‘aprendizagem ao longo da vida’

relacionando-a com a «vocação ontológica» da humanidade para o «ser mais», ao mesmo tempo

pode-se verificar que essa opinião ou crença pessoal pode ser sustentada e referida a um

conjunto de valores heterogéneos (ou mesmo divergentes) em relação, por exemplo, à conceção

da «natureza» humana, às formas de organização da produção económica e de divisão do

trabalho mais propícias ao papel do Estado, na definição e financiamento das políticas públicas e

mesmo às diversas «finalidades» que se concebem para a educação dos seres humanos.

Parece-nos, tal como a David Harvey, que uma “heterogeneidade de crenças e formas

incoerentes de desejar e valorizar podem ser encontradas em qualquer um de nós” (Harvey,

1996, p. 81).

Enunciemos agora o que significa cada um dos referidos momentos, visando a

perspetivação das formas como se procedem às citadas articulações (as «traduções»).

O momento da linguagem/discurso é revelador dos códigos e formas de como falamos,

escrevemos e representamos o mundo. É através do ato comunicativo subjacente à

linguagem/discurso que se possibilita a compreensão das diversas formas de conhecimento, de

classificação e de categorização do mundo. Também por isso, como refere o autor, “os

discursos são manifestações de poder” (Harvey, 1996, p. 78).

O poder, por sua vez, apesar da sua complexidade e heterogeneidade internas, incorpora

diversas relações e manifestações. Fala-se frequentemente de formas e manifestações de poder

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distintos: o político, o económico, o simbólico, o militar, etc. Torna-se necessário compreender

como se concretizam essas formas de poder e como ajudam a configurar os processos sociais

(Harvey, 1996, p. 78).

Relevante para o desenvolvimento desta análise é a implicação de um outro momento: o

«imaginário», ou seja, o nosso sistema de crenças, fantasias, valores e desejos que nos ajuda a

enquadrar e a explicar a nossa ação e presença no mundo. Como escreve David Harvey:

“todos nós possuímos crenças, fantasias, valores e desejos relativamente a como o mundo é

(ontologias), que melhores entendimentos do mundo podem ser alcançados (as epistemologias) e de

como Eu/Nós queremos ‘Ser’ no mundo” (Harvey, 1996, p. 79).

Um dos outros momentos relaciona-se com a construção de instituições. Refere-se à

organização de relações sociais e políticas entre os indivíduos de uma forma mais ou menos

durável. Estas podem ser os pensamentos e desejos humanos reificados como ritos culturais

(por exemplo, a religião, a autoridade e a deferência) ou as instituições sociais relativamente

permanentes: o Estado, o Mercado, a Ciência, a Educação, a Lei, as Profissões, entre outras

(Harvey, 1996, p. 79).

Não menos importantes são as práticas materiais, isto é, a forma como experienciamos o

mundo e como se definem e se alteram as nossas perceções e impressões através do nosso

corpo e das tecnologias e das formas espaciais/ambientais a que estamos condicionados

(Harvey, 1996, p. 79).

O sexto momento é relativo às relações sociais, ou seja, ao modo como os seres humanos

se relacionam. Há que considerar, por exemplo, a forma como se vive, como se produz, como se

educa e como se comunica. Para isso dever-se-ão perspetivar as formas de divisão do trabalho,

as hierarquias sociais de classe, de idade, de género, o acesso individual ou de grupo ao poder

social ou às atividades simbólicas e materiais (Harvey, 1996, p. 79).

Nas nossas opções e estratégias de investigação, evidenciaremos o discurso explicitado

pelos entrevistados mas, na sua análise, não os consideraremos por si só “suficiente para

entender a totalidade do processo social” (Harvey, 1996, p. 80). Tentaremos, simultaneamente,

perspetivar as relações internas entre os diversos momentos de que os discursos dão conta,

tanto na sua «fluidez» (as relações de tradução entre os diversos momentos) como nas suas

«permanências» (ou seja, a reificação dessa «fluidez» entre os processos). Portanto,

observaremos como essas articulações e relações fluídas entre os diversos momentos (tanto em

termos «inter-momentos» como em termos «intra-momentos») são convertidas em

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permanências que se revelam, por exemplo, nas formas de organizar o trabalho, nos discursos

institucionalmente construídos, nas identidades profissionais e até nas disposições individuais

(Harvey, 1996, pp. 80-81).

Neste sentido, optou-se por uma abordagem biográfica que foi desenvolvida com recurso a

uma entrevista biográfica. O recurso a este método de recolha de informação (a entrevista

biográfica) permite, como referem Cornelia Maier-Gutheil e Christiane Hof, que dessa forma o

educador de adultos seja

“capaz de falar acerca das suas condições e requisitos de trabalho, dos seus problemas pessoais, das

suas expectativas e esperanças. Tal como a aprendizagem é concebida como um processo individual

que envolve interação e comunicação com os outros, está ligado com o conceito de aprendizagem

biográfica […] Numa perspetiva biográfica é possível analisar as oportunidades sociais (instituições,

movimentos societais, discursos pedagógicos) em que processos de aprendizagem individual estão

inseridos e também da mudança dessas oportunidades ao longo do tempo” (Maier-Gutheil & Hof, 2011,

pp. 77-78).

Encaramos a «história de vida» como ilustrativa das mudanças que se vão verificando no

mundo do trabalho e nas diferentes perceções dos atores sociais. Ao mesmo tempo,

consideramos que a relação entre o indivíduo e a sociedade se torna visível na biografia do

indivíduo (Albarello, et al., 1997, pp. 207-209).

Através dessa abordagem, podemos “reconstruir as decisões e as estratégias do indivíduo

e as oportunidades sociais específicas que as governam”, nomeadamente, em termos de como

estes desenvolvem o seu profissionalismo, através do seu discurso sobre aquilo que sabem e

como o sabem (Maier-Gutheil & Hof, 2011, p. 77).

A abordagem biográfica permite-nos verificar, com gradual detalhe, as formas como as

trajetórias (profissionais e de aprendizagem) são configuradas e reconfiguradas. Permite

também, e de forma mais relevante, que cada sujeito explicite os principais momentos que

determinaram o seu percurso, fornecendo informações sobre a forma como conduzem o

trabalho e as formas como desenvolveram, desenvolvem e pensam desenvolver as suas

aprendizagens. Como refere Françoise Digneffe, o método biográfico “permite captar as

«subjectividades», compreender de que modo a conduta é continuamente remodelada, de modo

a ter em conta as expectativas dos outros” (Albarello, et al., 1997, p. 208).

No nosso caso, como referimos, focou-se exclusivamente na realidade profissional dos

entrevistados, procurando nesse fragmento da sua «história de vida», selecionado e relatado

pelo próprio agente social, as suas disposições particulares. No recurso à abordagem biográfica

não se tem de incidir sobre toda a história de vida, e podemos direcionar o «olhar» para

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dimensões específicas da vida, nomeadamente, a profissional (Giddens, 1996a, pp. 696-697;

Bogdan & Biklen, 2000, p. 93).

Ressalve-se, no entanto, o seguinte: consideramos as noções de «história de vida» e de

«trajetória profissional» como construções e representações abstratas que se ordenam

analiticamente em torno de um eixo temporal, mas que, simultaneamente, não se devem

conceber como percursos contínuos ou lineares, constituídas por sucessivas etapas de sentido

ascendente. Para nós, as trajetórias de vida podem assumir variadas continuidades e

descontinuidades, progressões e retrocessos, tanto na dimensão profissional como nas

dimensões educativas e formativas. Consideramos a configuração das trajetórias como

«construções» retrospetivas, coletâneas de momentos e episódios, que devem ser analisadas

com referência ao momento e às disposições presentes. Recorrendo às palavras de José

Machado Pais:

"O uso tradicional do método biográfico tem valorizado, sobretudo, a linearidade. Essa busca é facilitada

pelo facto de a biografia corresponder a um processo de transformação retrospectiva. Na biografia, os

acontecimentos de vida são procurados e avaliados com um olhar do presente dirigido ao passado. Este

olhar, por sua natureza retrospectiva, transforma o biografado. Os acontecimentos enfileiram-se numa

sequência de linearidade, na busca de uma história que só ganha sentido pelos factos que ela consegue

enfileirar. É certo que os biografados partem da inevitabilidade do que aconteceu. Mas os relatos

biográficos são criativos, na medida em que, partindo de uma multiplicidade de factos conservados pela

memória, acabam por construir uma linha de sucessão que se dirige para um “ponto de chegada. Este

ponto de chegada é ponto de conexão linear de nexos de causa e efeito pseudo-convincentes que

orientam a vida para uma meta que, na realidade, lhe pode escapar” (Pais, 2003, pp. 86-87).

A entrevista biográfica semiestruturada: possibilidades e constrangimentos

Pelos motivos atrás aludidos e por considerarmos que, no nosso caso específico, a

unidade de observação e análise mais pertinente se revelar o sujeito, achamos apropriado,

heurística e metodologicamente, o recurso à entrevista biográfica de forma a possibilitar o

aprofundamento das temáticas em questão.

Tomou-se a entrevista semiestruturada como o tipo de inquérito mais apropriado, tendo

em conta o problema colocado. Com esse tipo de entrevista, organizada em torno de um guião

temático (em anexo), podemos articular uma perspetivação longitudinal e uma perspetiva

transversal.

Delineamos alguns tópicos orientadores, de acordo com os nossos conhecimentos e

referências prévias, que gostaríamos de ver abordados e aprofundados e ao mesmo tempo

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foram elaboradas algumas perguntas prévias que facilitariam a recolha de informação (Ghiglione

& Matalon, 2005). No entanto, mesmo que houvesse uma preparação prévia das perguntas a

colocar, abriu-se espaço a que outras perguntas surgissem por intermédio da constituição dessa

relação dialógica entre entrevistador e entrevistado.

Por um lado, com a entrevista procurava-se suscitar a organização temporal dos

«momentos determinantes» e dos turning points, ou seja, dos “pontos de inflexão que dão novos

rumos à vida” (Pais, 2003, p. 104). Destacava-se o início da atividade enquanto profissional de

RVC (ou como «educador ou formador de adultos») e procurava-se elucidar a trajetória

profissional de cada um dos entrevistados.

Por outro lado, também se tentou desencadear, durante a entrevista, a abordagem e o

aprofundamento dos referidos tópicos de análise que, por exemplo, se relacionavam com os

mecanismos de socialização profissional, com a definição de identidades específicas e com as

noções de profissionalismo ‘embutidas’ no exercício da função.

Nessa interação social que a situação de entrevista proporciona, as características

individuais do entrevistador e entrevistado, o contexto em que são realizadas e as problemáticas

que implicam, nomeadamente as influências múltiplas na produção do discurso, marcam

também o ritmo e a configuração da entrevista. Caberá ao entrevistador direcionar a atenção e

conversa para temáticas específicas já que neste caso possui um quadro de referência

específico. Saliente-se que no caso das entrevistas semiestruturas,

“o indivíduo é convidado a responder de forma exaustiva, pelas suas próprias palavras e com o seu

próprio quadro de referência, a uma questão geral (tema) caracterizada pela sua ambiguidade. Mas se

não abordar espontaneamente um dos subtemas que o entrevistador conhece, este coloca uma nova

questão (o subtema), cuja característica já não é a ambiguidade, para que o indivíduo possa produzir

um discurso sobre esta parte do quadro de referência do investigador” (Ghiglione & Matalon, 2005, p.

88).

No nosso caso particular, o referido «quadro de referência específico» não derivou

somente das questões iniciais, das atividades de exploração (leituras dos diferentes livros e

artigos que abordavam direta e indiretamente o nosso tema e da triangulação das diversas

informações recolhidas), da elaboração do estado da questão e da problemática e da construção

do plano de investigação (Quivy & Campenhoudt, 2008). De facto, uma das especificidades

desta investigação relaciona-se com a própria biografia do investigador. Esta influenciou,

obviamente, o desenvolvimento do seu «olhar» e conceção da problemática específica: também

ele é profissional de RVC.

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Esta particularidade implicou cuidados específicos no desenrolar de toda a investigação. O

processo de investigação e a entrevista apresentaram algumas especificidades e também a

superação de outros obstáculos que, mesmo que se coloquem genericamente a todos aqueles

que se envolvem em atividades de investigação, se colocaram com particularidades nesta. De

uma forma geral, tentou-se implicar um exigente e cauteloso processo de distanciamento crítico

“em relação ao tipo de conhecimento anteriormente construído sobre o objecto, sujeito à

irrupção fácil de preconceitos e de falsas evidências” (Azevedo, 2000, p. 17).

O distanciamento crítico: especificidades e obstáculos

Robert Bogdan e Sari Biklen, no famoso manual para a investigação qualitativa em

Educação, avisam para que, ao desenhar-se o plano de investigação e escolher um tema

específico, não se escolha um assunto em que se estivesse pessoalmente envolvido (Bogdan &

Biklen, 2000, pp. 86-87). Para eles, a proximidade individual e cognitiva com pessoas e

assuntos poderia derivar numa redução da objetividade e em outros constrangimentos (coibição

e/ou controlo das informações prestadas e dos comentários efetuados), mas principalmente, na

familiaridade excessiva com o tema em questão:

“as pessoas intimamente envolvidas num ambiente têm dificuldade em distanciar-se, quer de

preocupações pessoais, quer do conhecimento prévio que possuem das situações. Para estas, muito

frequentemente, as suas opiniões são mais do «definições da situação», constituem a verdade” (Bogdan

& Biklen, 2000, p. 86).

De facto, partilhar-se o mesmo espaço de práticas profissionais (ser profissional de RVC) e

desenvolver uma investigação sobre essa mesma ocupação implica a possibilidade de algumas

das problemáticas associadas aparecerem com uma certa «ilusão de transparência» (Bourdieu,

Chamboredon & Passeron, 1999, p. 25) ou com a «ilusão do saber imediato» (Bourdieu,

Chamboredon & Passeron, 1999, p. 23) ou implicar outras condicionantes interpretativas.

Muitas vezes, a respeito da atividade de pesquisa científica, fala-se da necessidade de

«rutura epistemológica» (nestes ou noutros termos) como a necessidade de desconstrução das

pressuposições espontâneas que, por vezes, se impõem como evidências, visando uma

distanciação do código de leitura do real derivado do senso comum. Sem debatermos as

minudências destes aspetos, tentaremos refletir sobre como no quadro de uma investigação

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particular se tentou articular a crítica do «enraizamento cultural» (neste caso profissional) do

investigador e a necessidade de um maior rigor analítico e interpretativo.

Considere-se a seguinte reflexão:

“Estamos de acordo em que todos os estudiosos, sem excepção, se acham enraizados num meio social

concreto, e que por isso é inevitável que utilizem pressupostos e preconceitos que interferem nas suas

percepções e interpretações da realidade social. Neste sentido, é-lhes impossível ser neutros. Estamos

também de acordo quanto à impossibilidade de uma representação quase-fotográfica da realidade

social. Os dados da investigação são sempre selecções da realidade, baseadas em mundividências ou

nos modelos teóricos do seu tempo e filtradas pelas perspetivas de certos grupos específicos de cada

época. Neste sentido, as bases em que a selecção é feita são historicamente construídas, sendo

inevitável que se vão alterando à medida que o próprio mundo se for transformando. Se o que se

entende por objectividade é termos estudiosos perfeitamente distanciados, entregues à tarefa de

reproduzir um mundo social que lhes é de todo exterior e alheio, então não acreditamos que um tal

fenómeno possa existir” (Comissão Gulbenkian, 2002, pp. 127-128).

Na linha da Comissão Gulbenkian sobre a Reestruturação das Ciências Sociais,

consideramos a impossibilidade da «neutralidade axiológica» ou de uma representação

«objetivista», mas consideramos também que se podem e devem fazer esforços em termos da

procura de uma maior objetividade. Esta deve ser entendida como uma meta desejável pela

investigação sistemática e que se relaciona intrinsecamente com a crescente validade do

conhecimento (Comissão Gulbenkian, 2002, p. 128).

Os prolegómenos epistemológicos e metodológicos podem ser entendidos como uma

tentativa de direcionar o olhar dos leitores e, ao revelar os pressupostos, convencer

relativamente às interpretações individuais do investigador. Uma das formas de proceder a esse

‘convencimento’ passa por demonstrar a crescente objetividade: ao revelar os métodos e a

forma de recolha dos dados e diferentes informações; no realçar sistematicamente a «coerência

e utilidade» da investigação; e sujeitar o seu olhar específico aos «juízos intersubjetivos» de

todos aqueles que investigam ou refletem sistematicamente os temas e problemáticas em

questão (Comissão Gulbenkian, 2002, p. 128 e ss). É possível conciliar as exigências de

pertinência e de demonstração da validade dos conhecimentos sem ‘amputar’ as vivências e

convicções próprias (Wieviorka, 2010, pp. 83-94).

No entanto, mais do que fazer genéricas declarações em relação à objetividade e ao

distanciamento crítico, é necessário observar e considerar como por vezes se articulam diversas

situações de enviesamento interpretativo que implicam uma grande vigilância crítica.

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Apesar de se pensar as entrevistas como um campo de relação específico, suscetível de

produzir determinados efeitos, muitos dos possíveis enviesamentos estão relacionados com as

dimensões relacionais previamente estabelecidas entre entrevistador e entrevistado.

Havia já relações previamente constituídas entre o entrevistador e os entrevistados, tanto

em termos pessoais como em termos profissionais, com maior ou menor grau de confiança e

intimidade. Esse conhecimento mútuo fazia com que cada um ocupasse um lugar específico

nessa relação e não somente naquelas relações constituídas pela situação de entrevista.

Por um lado, com essa circunstância, não se verificou a necessidade de uma descoberta

mútua, de uma avaliação ou de uma adaptação interpessoal, o que facilitou, por exemplo, a

marcação e o desenvolvimento da própria entrevista. Caso contrário, considera-se que as

abordagens previamente e durante a entrevista seriam mais titubeantes.

Esse relacionamento prévio permitia até uma certa identificação, uma compreensão e

mesmo formas diversas de influência mútua em relação às diversas temáticas em análise.

Nessa «história de vida» comum e partilhada e já houvera lugar para a troca e defesa de

opiniões, para a tomada de posições (algumas delas antagónicas e outras coincidentes) e para a

exposição de críticas diversas, em variados momentos e circunstâncias, no âmbito profissional,

em espaços de formação e em termos pessoais e sociais.

Esse (re)conhecimento mútuo implica uma compreensão partilhada do contexto, das

linguagens e situações específicas que se revelaram, por exemplo, em algumas posturas e

comentários ao longo da entrevista. Por vezes, assumindo-se uma postura de uma certa

cumplicidade (o humor ao longo da entrevistas e alguns dos comentários), na linguagem

utilizada (por vezes coloquial), concretizava-se sobretudo pela ‘introdução’ de referências

partilhadas, uma espécie de mecanismo de identificação: “…como sabes…” (E3.41, p. 51); “tu,

na altura, numa reunião também disseste isso…” (E5.101, p. 99);“…as pessoas, como eu, como

tu, como outras que…” (E4.75, p. 74); “ó Miguel” (E5.99, p.98) e “…ó Miguel, tu sabes!” (E2.40,

p. 33); “…acho que aprendo muito contigo…” (E2.22, p. 31); “Acho que até foi contigo que

comentei isso…” (E3.72, p. 57);“Tu também, às vezes, falas de mais…” (E1.96, p. 18).

Por vezes, também parecia existir um certo registo de ansiedade associado a um princípio

de correspondência, eventualmente comum a outras entrevistas, que revela uma situação de

solicitude e de agradabilidade ou mesmo de resistência: “Não sei se fui ao encontro daquilo que

querias?” (E2.95, p. 41); “Eu acho é que não te respondi aquilo que tu querias que eu

respondesse” (E5.97, p. 98).

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No entanto, esta situação assumida e declarada, mais do que um ‘empecilho’

interpretativo ou uma manifestação de parcialidade, revela potencialidades. Desde que se

verifique a referida vigilância, a partilha de um código comunicacional, a partilha de referências

comuns e a familiaridade permitiu abordar temas que porventura, numa outra situação, não se

poderia ter feito.

Na linha de Bourdieu, Chamboredon e Passeron (1999, pp. 55-63) consideramos que não

há perguntas totalmente neutras e não exclusivamente no nosso caso. Há que constatar que as

perguntas efetuadas incorporam sempre considerações implícitas daquele que investiga. Como

sustentam os referidos autores é necessário questionar as significações específicas das

perguntas, sendo que essa significação é sempre avaliada, não apenas em termos de conteúdos

mas também em termos de formas de questionar. Esses autores referem que não nos devemos

limitar a avaliar as problemáticas implicadas nas respostas e também considerar as

problemáticas implicadas nas perguntas:

“Sempre que o sociólogo for inconsciente em relação à problemática implicada em suas perguntas,

privar-se-á de compreender a problemática que os sujeitos implicam em suas respostas: nesse caso,

estão preenchidas as condições para que passe desapercebido o equívoco que leva a descrever, em

termos de ausência, determinadas realidades dissimuladas pelos próprios instrumento da observação e

pela intenção, socialmente condicionada, do utilizador do instrumento” (Bourdieu, Chamboredon &

Passeron, 1999, p. 57).

É importante especificar que há inclusões e exclusões interrogativas nas entrevistas

efetuadas, não só em termos conscientes mas também a níveis inconscientes. Além das

perguntas excluídas por não serem consideradas pertinentes ou justificáveis, há outras

perguntas que não são feitas de forma assumida, tendo em conta os objetivos específicos ou as

regras específicas de convivência social, por exemplo no abordar de tópicos que impliquem uma

explicitação da intimidade. Considerando as seleções a fazer é necessário considerar aquilo que

uma entrevista pode e não pode fazer.

Um outro aspeto refere-se à assunção demasiado imediata relativamente à partilha de

vocabulário, de conceitos e de referências teóricas e metodológicas ser mais comum do que

efetivamente é. Nessa questão implica-se o ato de presumir determinadas informações e

pormenores e por isso mesmo, no tal raciocínio de pertinência ou de economia do discurso, não

se elaborarem questões, o que pode fazer grande diferença em termos interpretativos. Ao

mesmo tempo, como referido pelos autores que temos vindo a citar assinale-se também que as

perguntas tendencialmente mais objetivas, aquelas que incidem sobre as condutas, “limitam-se

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a coletar o resultado da observação efetuada pelo sujeito sobre suas próprias condutas”

(Bourdieu, Chamboredon & Passeron, 1999, p. 59).

Em relação a estes tópicos refira-se a seguinte ideia que sintetiza algumas destas

questões. Recorrendo às palavras de Michel Wieviorka:

“o facto de realizar uma investigação nunca deixa o investigador indemne, transforma-o

necessariamente, por meio das realidades que ele descobre ou de que toma consciência, pelas ideias

novas que o assaltam, pelas alterações que é levado a introduzir nas suas hipóteses por causa do

encontro com o terreno” (Wieviorka, 2010, p. 90).

Apontamento: as entrevistas e os entrevistados

Foram realizadas cinco entrevistas (4 mulheres e 1 homem) a profissionais de RVC que

trabalhavam em três Centros Novas Oportunidades localizados na cidade de Braga, entre os dias

13/06/2012 e 04/07/2012. Contactaram-se outros profissionais de RVC que, por diversas

razões, não apresentaram disponibilidade para ser entrevistados.

Cada um dos selecionados constituiu uma unidade de observação, um depósito de

informação, de opinião e de conhecimentos relativamente ao que estava a ser investigado: “o

processo de profissionalização”.

Os objetivos e os temas a serem desenvolvidos foram comunicados com o pedido de

entrevista durante a também previamente relembrados imediatamente antes da realização da

mesma (ver Anexo 1). Também se solicitou autorização para se gravar a entrevista.

As transcrições da entrevista foram efetuadas pelo investigador nos dias subsequentes à

sua realização. Foram estabelecidas duas transcrições, uma textual com as referências a nomes

e instituições e uma outra depurada, sem referências específicas, aquela que se apresenta em

Anexo 3 (McLellan, MacQueen & Neidig, 2003).

Para se permitir a identificação dos excertos transcritos atribuiu-se um código a cada

entrevistado, indicando o Código E1 que se trata do entrevistado 1. Em combinação com esse

código específico, o excerto é passível de ser identificado com a referência à pergunta efetuada e

também pela página da respetiva transcrição. Assim, o código E4.57, p.95 representa o extrato

da resposta do entrevistado 4 à questão 57 podendo ser encontrada a totalidade da resposta na

página 95 do volume de anexos.

Após a transcrição, cada uma das entrevistas foi analisada isolada e

pormenorizadamente. Procedeu-se a diversas leituras que pretendiam sistematizar os temas e

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conteúdos presentes em cada um dos discursos para posteriormente se fixarem categorias e

unidades de análise (Almeida & Pinto, 1995, pp. 104-105).

Depois da leitura inicial das entrevistas, «impressionista» e “flutuante” (Bardin, 2011, p.

122), com cada nova leitura, conseguiu-se definir com maior detalhe o “fio condutor da análise

e, simultaneamente, forjar os meios através dos quais o material recolhido poderá ser reduzido

de forma pertinente” (Albarello, et al., 1997, p. 128).

Para a constituição da grelha de análise específica, com o aprofundamento das leituras

foram identificadas, registadas e questionadas as perspetivas e significações particulares de

cada um dos entrevistados através, designadamente, da seleção e comparação dos conceitos e

perceções individuais (Albarello, et al., 1997, pp. 128-134).

Nessa análise de conteúdo temática, o tema, a "unidade de significação” e de «recorte de

sentido» que se “liberta naturalmente de um texto analisado” (Bardin, 2011, p. 131), foi

escolhido enquanto uma unidade de registo de tipo semântico (Bardin, 2011, p. 145; Ghiglione

& Matalon, 2005, p. 191) tendo sido complementado com as diversas unidades de contexto,

sendo estas “o mais estreito segmento de conteúdo necessário para compreender a unidade de

registo (Ghiglione & Matalon, 2005, p. 192).

A construção das categorias resultou de uma combinação de procedimentos semi-

indutivos que combinavam o quadro teórico e conceptual da investigação, a problemática, e as

observações resultantes do material recolhido, isto é, da sistematização da informação das

próprias entrevistas (Bardin, 2011, p. 145; Vala, 1986, p. 111; Albarello, et al., 1997, p. 127).

Nesse aperfeiçoamento da grelha de análise, as categorias temáticas constituíram-se

como “códigos de definição da situação” (Bogdan & Biklen, 2000, p. 223), que permitiam a

indução ou inferência de atitudes, valores, convicções, representações e disposições. Como

refere Laurence Bardin, “a análise de conteúdo constitui um bom instrumento de indução para

se investigarem as causas (variáveis inferidas) a partir dos efeitos (variáveis de inferência ou

indicadores; referências no texto)” (Bardin, 2011, p. 167).

Nestes sentidos assinalados, consideraram-se três categorias fundamentais que serviram

para analisar as diversas entrevistas: 1) as práticas profissionais; 2) as identidades profissionais;

3) os espaços e processos de aprendizagem. Refira-se também que cada uma dessas categorias

se subdividia em diferentes subcategorias como se pode verificar no Anexo 3.

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II. Desenvolvimento profissional dos agentes EFA

O campo da Educação e Formação de Adultos pode ser examinado como tendo uma

grande diferenciação interna em termos de história, propósitos e tradições. Nunca foi, saliente-

se, quer em termos de práticas, quer em termos de discurso, “um campo intelectualmente

coerente e unificado” (Finger & Asún, 2003, p. 14). Refira-se ainda que, contrastando, por

exemplo, com as instituições dos ensinos básico, secundário e superior, “não possui uma

estrutura institucionalmente delimitada com o seu próprio racional ou dinâmica interna” (Lattke

& Nuissl, 2008, p. 11).

Devido a essas particularidades, por vezes, questiona-se a utilidade de considerar o

campo da EFA como um campo unitário e indecomponível ou, diferenciadamente, como uma

agregação de subcampos relativamente autónomos, cada qual a necessitar do seu próprio

enquadramento legislativo e estruturas específicas de suporte (Research voor Beleid; PLATO,

2008, p. 67).

A complexidade e a heterogeneidade desse campo podem ser observadas a vários níveis:

relativamente às práticas educativas, sobretudo em termos da diversidade de orientações e de

modelos didáticos considerados; nas finalidades do processo educativo e de aprendizagem (que

podem ser deliberadas ou não; que podem derivar da atividade principal ou secundária); na

diversidade de instituições com ação educativa e na multiplicidade de agentes e profissionais

envolvidos, direta ou indiretamente, em processos de educação, formação e aprendizagem dos

adultos. Considerando este último plano observamos que os agentes e profissionais têm

diferentes designações, papéis e perfis e não apenas aquelas identificadas e atribuíveis à figura

do professor como o único educador profissional (Edwards, 1997, pp. 67-79; Canário, 2008;

Jütte, Nicoll & Olesen, 2011, p. 10).

Para analisarmos a configuração específica do campo da EFA6 julgamos estar implicados

variados fatores. Comecemos por considerar uma das definições mais comummente utilizadas

de Educação de Adultos7:

6 A Educação e Formação de Adultos também se pode considerar como um campo específico de investigação, ou seja, um espaço disciplinar específico em que são desenvolvidas práticas sistematizadas de organização de dados e informações, de reflexão e produção de conhecimentos. Saliente-se também que na configuração desse campo se implicam diferentes perspetivações ontológicas, epistemológicas e metodológicas. Considera-se portanto, como um “campo de forças, cuja necessidade se impõe aos agentes que nele se encontram cometidos e como um campo de lutas no interior do qual os agentes de enfrentam, com meios e fins diferenciados segundo a sua posição na estrutura do campo de forças, contribuindo assim para conservar ou para transformar a sua estrutura (Bourdieu, 1997, p. 32).

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“Por educação de adultos entende-se o conjunto de processos de aprendizagem, formal ou não, graças

ao qual as pessoas consideradas adultos pela sociedade a que pertencem desenvolvem as suas

capacidades, enriquecem os seus conhecimentos, e melhoram as suas qualificações técnicas e

profissionais ou as reorientam de modo a satisfazer as suas próprias necessidades e as da sociedade. A

educação de adultos compreende a educação formal e a educação permanente, a educação não formal

e toda a gama de oportunidades de educação informal e ocasional existentes numa sociedade educativa

multicultural, em que são reconhecidas as abordagens teóricas e baseadas na prática” (UNESCO, 1999,

pp. 15-16).

Uma das primeiras constatações que permitem a ilustração do nosso argumento é a

abrangência que está implícita nesta definição e a consequente dificuldade na delimitação das

fronteiras do campo da EFA. Um dos traços distintivos que sobressai dessa definição relaciona-

se com a assunção do adulto como um sujeito aprendente e que o ‘adulto’, enquanto

categorização de um Sujeito enquadrado em processos de educação e aprendizagem, se

perspetivará em função dos diversos contextos sociais e culturais (Edwards, 1997, p. 75).

Esta conceção da especificidade do adulto implicará modalidades específicas do

relacionamento educativo com um percurso autónomo e característico (Finger & Asún, 2003;

Jarvis, 2010). Neste sentido, muitas vezes se observa a emergência e a identificação das raízes

históricas da Educação de Adultos com movimentos sociais ou organizações com finalidades

sociais, missão e compromissos políticos específicos (Fernández, 2006; Canário, 2008; Lima,

2008).

Um outro aspeto que se infere daquela definição relaciona-se com o propósito inequívoco

das atividades de educação e formação de adultos servirem como uma forma de desenvolver

conhecimentos, habilidades e saberes. As possibilidades para o fazer são múltiplas, tanto em

termos espaciais como em termos temporais, isto é, são variados os espaços e os momentos

para esse desenvolvimento, com o recurso a diferentes agentes, atividades e instituições.

Nos processos educativos e formativos implicam-se obviamente diferentes processos e

níveis de aprendizagem. Além dos momentos e espaços mais formalizados, também se

7 Uma outra definição similar foi divulgada na Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura realizada em Nairobi, em 1976: “A educação de adultos denota todo o corpo de processos educativos organizados, qualquer que seja o conteúdo, o nível ou o método, quer sejam formais ou não, quer prolonguem ou substituam a educação inicial em escolas e universidades ou na aprendizagem profissional, em que pessoas consideradas como adultas pela sociedade a que pertencem desenvolvem as suas habilidades/capacidades, enriquecem o seu conhecimento, melhoram as suas qualificações técnicas ou profissionais ou as redirecionam e provocam mudanças nas suas atitudes ou comportamentos numa dupla perspetiva de desenvolvimento pessoal e participação no desenvolvimento social, económico e cultural equilibrado e independente (UNESCO, 1976).

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evidenciam muitas vezes a existência de fenómenos educativos e de aprendizagem de tipo não-

formal e informal.

A aprendizagem8 apresenta-se portanto como um processo complexo que envolve

processos psicológicos (de aquisição e elaboração interna) e sociais (resultantes da interação

externa entre o aprendente e o seu ambiente social, cultural ou material) e, como Knud Illeris,

consideramos que “toda a aprendizagem é situada e as situações específicas de aprendizagem

tornam-se uma parte integrada dos processos e resultados de aprendizagem” (Illeris, 2009, p.

139).

As aprendizagens desenvolvem-se em torno de quatro9 espaços: aprendizagens escolares

e educacionais, ou seja, as aprendizagens intencionadas ocorridas no sistema educativo

(«formais, racionais e externamente direcionadas»); as aprendizagens em contexto de trabalho,

as aprendizagens incidentais que têm lugar neste contexto e as aprendizagens mais

formalizadas relacionadas com a prática profissional ou que tomam lugar no trabalho; as

aprendizagens quotidianas, informais e múltiplas, que ocorrem à medida que vamos vivendo (e

não pela participação em atividades intencionalmente definidas) e que estão relacionadas com

as culturas e subculturas em que a pessoa está integrada; as aprendizagens baseadas em

interesses, que tomam lugar em diferentes atividades comunitárias e associativas e que estão

relacionadas com os interesses e convicções pessoais. Pode ser encarada como um tipo de

aprendizagem quotidiana direcionada a um objetivo específico, com motivação e resolução

específicas.

Na sua análise também considera os quatro níveis de aprendizagem, todos eles

“necessários para construir as capacidades e competências de um indivíduo” (Illeris, 2009, p.

144): a aprendizagem cumulativa (ou mecânica) – consistindo na obtenção de algo

completamente novo sem nenhum contexto de significado ou importância pessoal; a

aprendizagem assimilativa – implicando a obtenção e ligação de novos elementos a padrões

previamente estabelecidos; a aprendizagem acomodativa – ocorrendo em situações em que seja

dificultado o relacionamento dos novos elementos (considerados revelantes) com os padrões ou

8 Para Knud Illeris a aprendizagem engloba todos os processos que levam a “mudanças de capacidade, tenham um caráter motor, cognitivo, psicodinâmico (i.e. emocional, motivacional ou atitudinal) ou social, e que não sejam devidos a maturação genético-biológica” (Illeris, 2003, p. 397). 9 Knud Illeris refere um quinto espaço: o da aprendizagem baseada na rede, um espaço de aprendizagem de crescimento crescente e com características específicas – a flexibilidade em termos espaço-tempo; o condicionamento comunicacional do aprendente – este tem de perceber as opiniões e argumentos e construir as suas próprias opiniões e argumentos; falta de contacto direto. No entanto, na própria opinião de Illeris se encara a possibilidade de este espaço não ser considerado separadamente dos referidos quatro (Illeris, 2009, p. 141). Nós assim o entendemos.

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esquemas existentes; e a aprendizagem transformativa que passa pelas aprendizagens surgidas

em situação de crise que implicam mudanças de personalidade e se caracteriza por reestruturar

simultaneamente as dimensões cognitivas, emocionais e sociais/societais (Illeris, 2003, pp. 402-

404).

Cada um desses níveis é diferente em termos de âmbito e natureza, ocorrendo em

diferentes situações e conexões. Knud Illeris também elabora sobre as situações de não-

aprendizagem, da «consciência quotidiana10» e das resistências mentais (intencionais ou não) às

aprendizagens resultantes dos mecanismos de defesa. Para Knud Illeris as questões de

aprendizagem relacionam-se com aquilo que pode ou consegue ‘entrar’ no indivíduo, tendo em

conta as diversas condições e as resistências existentes (Illeris, 2003, pp. 404-405).

Na análise da aprendizagem implicam-se portanto diferentes espaços, processos e níveis

a que se associa um crescente reconhecimento individual, social, económico e educativo (e

também gnosiológico) da relevância dos resultados das aprendizagens advindos dos diferentes

espaços experienciais (Pires, 2007).

Conjuntamente com esse gradual e transversal reconhecimento não se pode deixar de

mencionar a crescente pluralização e visibilidade de diferentes instituições com ação educativa.

São múltiplas as entidades envolvidas em processos de educação e aprendizagem no campo da

EFA, tanto em termos formais como em termos não formais, e que contribuem para essa

crescente perceção: de escolas a hospitais, de centros de formação a outros centros de

endoutrinação (diferentes igrejas e comunidades religiosas), de unidades museológicas a

entidades comerciais, passando por associações políticas, de desenvolvimento local e

recreativas11.

Para estruturar a análise dessa diversidade institucional, há quem proponha a

conveniência em ultrapassar a simples dicotomia baseada na diferenciação entre instituições

educativas e instituições não educativas. Rui Canário sugere, por exemplo, que essa distinção

10 Everyday consciousness, conceito desenvolvido por Thomas Leithäuser. 11 Repare-se que relativamente à EFA formal assinalam-se, por exemplo: as instituições escolares para jovens e adultos (públicas e privadas); diversas organizações não-governamentais e entidades comerciais (empresas de formação profissional, por exemplo) e comunitárias. Relativamente à EFA não-formal, verifica-se uma multiplicidade de sítios desde as instituições educativas formais, a organizações não-governamentais e não-lucrativas. Podem-se referir, entre outras: as instituições educativas (escolas de todos os níveis de ensino, institutos politécnicos, universidades); associações educativas, universidades populares; universidades da terceira idade; entidades ligadas a Igrejas e grupos religiosos; sindicatos e partidos políticos; instituições ligadas a associações empresariais, industriais e comerciais, associações profissionais (do patronato ou de trabalhadores), entidades e empresas educativas e/ou de formação; entidades ligadas a diferentes organizações da sociedade civil; espaços culturais públicos ou privados (museus, bibliotecas, livrarias, etc.) e a diferentes associações/centros recreativos, desportivos, culturais, de lazer. Pode também ser efetuado através de educação a distância, através de diferentes media - rádio, televisão, internet, etc. (Research voor Beleid; PLATO, 2008, p. 67).

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poderá ser fundamentada na forma como se estabelece a prossecução de finalidades

educativas. Nessa distinção, importará estipular se as finalidades são deliberadas e se resultam

da atividade principal da instituição, ou se, por outro lado, os processos educativos e de

aprendizagem são secundarizados em relação à ação primordial da mesma (Canário, 2008, p.

17).

Destacamos a ideia de que a pluralidade de configurações institucionais e organizacionais

e a diversidade de atividades, práticas educativas e lógicas de educação e formação de adultos,

tende a complexificar a delimitação deste campo, já que não se verifica uma correspondência

unívoca entre a matriz e pertença institucional e o tipo de finalidades prosseguidas que

facilitavam a delimitação das fronteiras do campo de EFA. Na linha de Richard Edwards

observamos que, ao se constituírem progressiva e potencialmente todas as experiências dos

adultos como ‘aprendizagem’, se verifica, concomitantemente, que as próprias fronteiras do

campo estejam em permanente expansão, compreendendo e incorporando

fenomenologicamente todas aquelas instituições que possibilitem essa mesma

experiência/aprendizagem (Edwards, 1997, p. 84) como inferimos também da tipologia de Knud

Illeris, anteriormente exposta.

Na relação estabelecida entre aqueles dois aspetos, matriz institucional e finalidades,

associam-se também as lógicas de funcionamento e os modos de organização específicos que

traduziam e organizavam analiticamente a variedade das práticas e atividades educativas, em

termos nacionais e internacionais. Essas dimensões foram sistematizadas em diferentes

tipologias que permitem auxiliar na circunscrição e perceção analítica deste campo (entre outros,

Loureiro, 2006; Canário, 2008; Research voor Beleid; PLATO, 2008; Cavaco, 2009).

Considerando a sua pertinência heurística, na categorização estipulada por Theo Van

Dellen e Max Van Der Kamp foram definidos quatro domínios principais de trabalho no campo da

Educação e Formação de Adultos: a) Educação profissional/vocacional; b) Educação funcional e

corporativa; c) Educação Social e Moral; e d) Educação artística e cultural (Dellen & Kamp,

2008).

Nesses domínios distinguem-se os conteúdos educacionais, os dispositivos de educação e

formação e as influências contextuais de cada um desses domínios12. Ressalve-se que entre cada

12 Saliente-se que são transversais aos referidos planos de atividades e práticas o uso de diferentes formas e métodos educativos e outros dispositivos pedagógicos: por exemplo, diferentes modalidades de educação a distância (combinadas ou não com atividades de educação em sala); grupos de discussão; grupos de estudo; círculos de estudo, entre outros.

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um desses domínios se podem verificar, em alguns aspetos, determinadas convergências ou

hibridismos em termos de orientação.

A Educação profissional/vocacional está orientada para processos de qualificação e

requalificação da mão-de-obra, dos recursos humanos e do mercado de trabalho que

correspondem a modalidades de formação inicial, formação especializada e/ou de reconversão

profissional.

São duas as lógicas prevalecentes: a qualificação individual, orientada sobretudo para a

prevenção do desemprego e promoção da empregabilidade; e o desenvolvimento organizacional,

entendido como um instrumento estratégico de recursos humanos ao serviço do

desenvolvimento de projetos organizacionais. Assim, pretende-se a garantia de estabilidade ou

segurança profissional, a preparação para desafios provenientes das diversas mudanças

económicas e laborais ou mesmo a redefinição de áreas de interesse profissional. A gestão de

carreira, o aconselhamento e orientação está a tornar-se uma parte fundamental do trabalho

educativo, principalmente com públicos com menores níveis de qualificação (Dellen & Kamp,

2008, p. 65; Cavaco, 2009, pp. 740-746).

Já a Educação Funcional está orientada para a providência de competências básicas de

literacia e numeracia não diretamente relacionadas com o mercado de trabalho. É considerada

como uma oferta educativa de «segunda oportunidade», ou seja, assume um carácter

compensatório ou supletivo. A lógica prevalecente é a da “ortopedia social” (Cavaco, 2009) e

visa a minimização de problemas socioeconómicos de públicos considerados desfavorecidos (em

situação de desemprego ou em risco de exclusão social, por exemplo). Muitas vezes essas

formações são conotadas com políticas ativas de emprego, sendo estruturadas, selecionadas e

financiadas em função de metas políticas por estruturas governamentais nacionais e/ou da

União Europeia. Essa oferta pode ser assumida pelo sistema formal de ensino ou por outro tipo

de instituições, em diversos níveis de qualificação (Canário, 2008, pp. 14-15; Loureiro, 2006).

Também é enquadrada dentro deste domínio a educação corporativa (corporate

education), uma área em crescimento ainda que dependente do crescimento económico e que

se refere ao campo do Desenvolvimento dos Recursos Humanos e ao Desenvolvimento

Organizacional. A formação e o desenvolvimento e, em menor grau, a consultoria são centrais na

identificação dos educadores de adultos que trabalham nessa área, ainda que “uma parte

significativa dos profissionais a trabalhar nesse campo estejam a fazer aconselhamento ou

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coaching, ou estejam envolvidos com o planeamento de carreira e o desenvolvimento de

adultos” (Dellen & Kamp, 2008, p. 66).

O terceiro domínio refere-se à Educação Cultural e Artística, uma área ampla com

múltiplos conteúdos, finalidades e modos de organização. Podemos reconhecer traços comuns

relacionados com a orientação para o desenvolvimento de saberes em termos de arte e cultura,

nos seus múltiplos sentidos: enquanto produção e consumo artístico e cultural ou, por outro

lado, enquanto padrões integrados e representativos de conhecimentos, práticas e

especificidades humanas. Nestas duas dimensões incluir-se-ão, portanto, o desenvolvimento de

temas e conhecimentos genéricos ou específicos (históricos, sociopolíticos, etc.) e diferentes

habilidades e competências artísticas, gastronómicas, desportivas, linguísticas, artesanais,

tecnológicas, entre outras. Refira-se também que pela diversidade de entidades implicadas e de

ênfase em tópicos ou campos de estudo específicos estão implicadas neste domínio, pelo

menos, três lógicas orientadoras distintas: a animação/ocupação de tempos livres; o

desenvolvimento de dimensões estéticas e artísticas; a orientação para o trabalho comunitário

ou para a coesão social. Refira-se também que uma outra possibilidade é a integração das

anteriores vertentes (Dellen & Kamp, 2008).

Finalmente, o último domínio é relativo à Educação Social e Moral que se encontra

orientada para o aumento da «coesão social» e da «cidadania ativa». As suas principais

finalidades relacionam-se com o desenvolvimento ou transformação de características

sociopsicológicas (personalidade, atitudes, valores, mentalidades, etc.) visando a

consciencialização dos indivíduos, o aumento da sua participação (em termos sociais, culturais,

políticos e económicos) e, eventualmente, o incremento do seu pensamento crítico e a

transformação do seu contexto social (Dellen & Kamp, 2008). A lógica é a da intervenção

comunitária e está orientada para o desenvolvimento e participação social globalizado, integrado,

endógeno e ecológico. Superam, em alguns aspetos, a mera adaptação individual que visa a

empregabilidade e a competitividade. Pode-se também perspetivar em torno de ações de

desenvolvimento comunitário ou local, sendo encarado, nesse sentido, como “momentos de

síntese” de diferentes modalidades de educação de adultos (Canário, 2008, pp. 14-15; Cavaco,

2009, pp. 751-755).

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Agentes e profissionais no campo da EFA: uma resenha

Como aludimos, a complexidade do campo da Educação e Formação de Adultos observa-

se, portanto, na intrincada relação entre a diversidade de instituições com ação educativa e a

pluralidade de finalidades, lógicas de funcionamento e modos de organização que cada uma

delas pode incorporar. Saliente-se que todos estes fatores não facilitam a delimitação clara das

estruturas institucionais nem a determinação de dinâmicas e racionais unívocos.

É necessário examinar como as referidas características do campo da Educação e

Formação de Adultos e as supramencionadas ‘particularidades’ não facilitam a definição de um

perfil e de uma identidade profissional estável relativamente a quem são ou o que são os

‘educadores de adultos’ (Lattke & Nuissl, 2008, p. 11).

A abrangência institucional implica a diversificação de tarefas e a multiplicidade e variação

significativa de designações e denominações que se encontram nesse campo. Por exemplo,

Peter Jarvis elenca 18 papéis13 relacionados com a educação e formação de adultos, sugerindo

que neste campo se verifica uma “amálgama avulsa de papéis” entre aqueles que ensinam

adultos. Com o desenvolvimento dos diversos processos de educação e aprendizagem dos

adultos, as diversas atividades profissionais vão-se subdividindo em novas ocupações com

atribuições funcionais e formativas específicas. Essa crescente especialização estimula que cada

uma dessas ocupações comece a desenvolver regras específicas de acesso ao desempenho

profissional (Jarvis, 2010, p. 276). Como escreve Peter Jarvis:

“Educar adultos pode ser conceptualizado como uma ocupação que está continuamente em processo

de profissionalização. Contudo, o papel nunca foi um «todo» único e homogéneo; pelo contrário, foi uma

variedade de papéis diferentes que foram mantidos juntos num momento na história. À medida que as

exigências do papel foram sendo maiores tornou-se impossível para os segmentos manterem-se juntos,

assim testemunhamos a segmentação, a criação de novas ocupações e a geração de uma multitude de

oportunidades para a preparação e desenvolvimento profissional dos educadores em todas as novas

ocupações formadas.

[…] Contudo, o que continua a ser central para um serviço educacional de qualidade para os adultos é

um conjunto de profissionais suficientemente financiados para serem capazes de responder às

necessidades de aprendizagens de todas as pessoas que desejem aumentar as suas aprendizagens ao

longo das suas vidas” (Jarvis, 2010, p. 290).

13 São eles: 1) professor/facilitador; 2) assistente de ensino; 3) supervisor; 4) formador/instrutor; 5) mentor; 6) conselheiro/orientador; 7) administrador; 8) avaliador; 9) investigador; 10) formador de professores/formadores; 11) autor de materiais de aprendizagem; 12) planeador de programas/de currículos; 13) legislador educacional; 14) administrador de programa; 15) pessoal técnico de programa; 16) consultor e avaliador; 17) retalhista/comerciante; 18) gestor.

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Essa pluralidade de papéis, ocupações e práticas associadas, implica também uma

reapropriação permanente (em termos teórico-conceptuais, simbólicos e ideológicos) do que

significa ser um agente de EFA, numa época de «aprendizagem ao longo da vida». Como

escreve Richard Edwards,

“estas mudanças de papéis, práticas e identidades tanto trazem a necessidade de definir, como

emergem dos diferentes discursos sobre o que é ser um trabalhador com adultos. Neste sentido, a

própria noção de "educador de adultos" – ela própria investida de uma variedade de sentidos nos

discursos do campo - é em si mesma problematizada na charneca (moorland) da aprendizagem ao

longo da vida” (Edwards, 1997, p. 149).

Será importante considerar o agente de EFA em campos de atuação específicos e no

âmbito de organizações particulares e verificar como se desenvolvem e configuram os processos

de construção do seu papel, perfil e identidade profissional, nomeadamente, através da

obtenção de competências e saberes específicos.

A multiplicidade de identidades está relacionada com o sentimento de pertença a

diferentes grupos e instituições; com a utilização de métodos específicos; com as temáticas

abordadas e com a ligação estabelecida à educação e formação de adultos como campo de

prática e/ou profissão (Edwards, 1997; Bron & Jarvis, 2008, p. 40):

“as diferenças entre instituições, orientações, objetivos educacionais e modelos didáticos são muito

alargadas. Como resultado não há distintos cargos (educador de adultos, formador, professor, leitor,

gestor educacional, orientador, etc.) e formas aceites de abordar o trabalho implicado. Diversas

histórias, propósitos e tradições deixam um legado de tensões entre as aspirações dos educadores de

adultos e o estatuto relativo dos saberes, abordagens e modelos que circulam nesses locais” (Jütte,

Nicoll, & Olesen, 2011, p. 10).

Tendo em conta as diferentes configurações e significações profissionais, poderão ser

perspetivados outros fatores, entre os quais: os mecanismos de socialização profissional

específicos a cada papel ocupacional e cada instituição; a (in)visibilidade de algumas ocupações

profissionais em detrimento de outras; a diversidade da formação e da estruturação do treino e

preparação teórico-conceptual e metodológica (a sua educação de base) daqueles que intervêm

nesse campo e as diversas tensões (teóricas, pedagógicas e ideológicas) em torno dos seus

objetivos e do corpo especializado de conhecimentos subjacentes a esses treino e preparação.

Além da diversidade e complexidade institucional existentes também é relevante verificar a

variedade em termos de condição e estatuto profissional dos agentes e profissionais de EFA.

Saliente-se que apenas uma minoria trabalha exclusivamente e a tempo inteiro no campo da EFA

e que se verifica a permanência de formas atípicas de trabalho, algumas das quais precárias

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(Lattke & Nuissl, 2008, p. 11). No contexto europeu, verifica-se a coexistência de diferentes

modalidades contratuais e condições de emprego: trabalho a tempo inteiro/permanente e a

tempo parcial e/ou trabalho temporário; com contratos de duração determinada; com maior ou

menor segurança laboral; em regime de voluntariado ou em outro tipo de empregos de inserção

(tais como estágios); ou em diferentes modalidades de teletrabalho (Research voor Beleid;

PLATO, 2008). Como enunciamos, essas diversas modalidades contratuais produzem efeitos

nas formas de relacionamento e regulação laboral e vêm reconfigurando a identidade do

trabalhador e o seu bem-estar

A preparação teórica e educativa, o papel e relevância social e as condições laborais dos

diferentes agentes EFA têm sido determinantes, direta e indiretamente, para a própria

configuração do campo e para o desenvolvimento profissional daqueles que nele trabalham. O

desenvolvimento profissional pode ser entendido de uma forma ampla, referindo-se ao

desenvolvimento do estatuto de uma profissão e ao desenvolvimento dos conhecimentos,

habilidades e práticas profissionais. O desenvolvimento profissional pode ser definido como o

“processo pelo qual a profissionalidade e/ou o profissionalismo pode ser considerado de ser

melhorado” (Evans, 2008, p. 30).

O continuado interesse nestas temáticas infere-se, entre outras fontes, pela análise dos

diversos documentos que têm sido preparados, por exemplo, no âmbito da Organização das

Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) ou da União Europeia. Alguns

desses documentos produzidos, patrocinados ou publicados por aquelas instituições permitem-

nos percecionar as diferentes formas como se considera, em termos históricos e discursivos, o

desenvolvimento profissional dos diversos agentes de EFA.

Examinem-se, por exemplo, as recomendações dos diversos relatórios das Conferências

Internacionais de Educação de Adultos (CONFINTEA), e verifique-se a recorrência de um

conjunto de tópicos com níveis de relevância diferenciados, mas que são significativos na

perspetivação do desenvolvimento profissional dos agentes de EFA.

Na nossa leitura e análise serão consideradas três enfoques principais relativamente aos

agentes e profissionais de EFA: 1) a formação inicial e contínua e o entendimento particular da

profissionalização como desenvolvimento de conhecimentos e competências. Insere-se nesta

dimensão a importância da evolução do conhecimento científico relativo à área da educação,

formação e aprendizagem dos adultos que permite uma intervenção e uma prática educativa

mais relevante e adequada; 2) a melhoria das condições laborais, de remuneração e estatuto

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profissional e a sua relação com a pertinência da ação e o desenvolvimento do campo da EFA.

Considera-se ao mesmo tempo o papel e responsabilidade do Estado na definição, na

implementação e no financiamento de políticas educativas que permitam a concretização da

missão e objetivos da EFA; e 3) a articulação com outros agentes e instituições sociais,

sugerindo-se a complementaridade de ação de vários setores da sociedade, inclusivamente com

os meios de comunicação social. Anteriormente, como ainda nos dias de hoje, pretendia-se uma

maior visibilidade e apelabilidade da ação educativa o que beneficiaria, direta e indiretamente, o

desenvolvimento deste campo e, consequentemente, dos agentes que nele desenvolvem as suas

ações.

Analisaremos as formas como os discursos político e institucional e as diversas propostas

de ação que são incluídas nos diversos relatórios das CONFINTEA foram e são permeáveis às

diversas temáticas, teorias e conceitos que vão sendo utilizados para promover e/ou explicar as

diversas mudanças sociais ao nível político, económico, cultural e educativo.

Na nossa análise consideraremos como a partir da década de 70, principalmente nas

sociedades ocidentais, liberais e capitalistas, se começaram a tornar visíveis grandes

transformações na cultura e na estruturação social, mais visivelmente na organização da

estrutura económica e na reestruturação dos seus modos de produção e de desenvolvimento

que afetaram todos os campos do social, inclusive o campo educativo (Castells, 2005, p. 201).

Abordaremos, ainda que não detalhando todas as suas implicações, a articulação dos

diversos fatores implicados nessas mudanças sociais que também influenciaram

determinantemente o campo da EFA: os desenvolvimentos nas tecnologias de informação e

comunicação e nos sistemas de transportes; as crises e as reestruturações do modelo de

desenvolvimento (industrialismo) e dos seus modos de produção associados (o capitalismo e o

estatismo) e a influência de movimentos sociais e culturais orientados para a liberdade (Castells,

2005).

Repararemos, também, que a partir da década de 90, se passou a recorrer à noção de

«Aprendizagem ao Longo da Vida» como expressão determinante e orientadora para a ação

educativa no campo de Educação e Formação de Adultos. Seria interessante questionar, em

maior detalhe do que aquele que poderemos fazer, como e por que conseguiu esta expressão

acumular diferentes sentidos ao longo do tempo e refletir sobre como essas diferentes

conotações condicionaram a possibilidade de pensamento e de ação. Essa seria a perspetiva da

história conceptual, ou seja,

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“em vez de começar por uma definição de um dado conceito, a história conceptual interessa-se por

aquilo que as práticas de definição e uso fazem a um conceito, e por aquilo que um conceito, por outro

lado, faz ao mundo em que está inscrito. Exposto de uma forma diferente, a história conceptual

interessa-se tanto pelo que significa um conceito dentro de um determinado contexto como por aquilo

que um conceito faz a um determinado contexto” (Bartelson, 2000, p. 181).

Ao mesmo tempo procuraremos destacar a importância conferida a discursos particulares

relacionados com o papel da Qualidade nos processos educativos e também a sua interligação

com o incentivo à profissionalização da Educação e Formação de Adultos.

As continuidades e evoluções temáticas que sinalizaremos são reveladoras de dois

aspetos que consideramos significativos. Por um lado, o reconhecimento contínuo e sistemático

da centralidade do desenvolvimento profissional dos diferentes agentes de educação e formação

de adultos é importante para a evolução do campo da EFA. Porém, simultaneamente, a

consideração que essa mesma necessidade de conferir uma visibilidade temática e programática

aos diversos tópicos relacionados com o desenvolvimento profissional dos mesmos agentes

indicia a permanência de uma certa precariedade no que diz respeito, por exemplo, à formação

inicial e contínua dos ‘educadores de adultos’, às suas condições laborais e às articulações com

os variados setores da sociedade. Mostra também que há mais de 50 anos o campo da

Educação e Formação de Adultos se depara com circunstâncias similares que se traduzem em

recomendações análogas.

Articulação com outros agentes sociais e sectores da sociedade

Temos vindo a evidenciar que uma das matérias que tem sido tratada conjuntamente com

o desenvolvimento profissional dos agentes de educação e formação de adultos tem sido a

articulação entre estes e os diversos agentes sociais e sectores da sociedade. Numa lógica de

cooperação como uma forma de potenciar a própria ação educativa e de lhe conferir uma maior

amplitude social e eventualmente uma maior receção por parte dos diferentes públicos. Há,

portanto, uma certa noção da importância da divulgação das atividades relacionadas com a

educação de adultos pelos diversos setores sociais como uma forma de conferir maior relevância

e abrangência social da ação educativa, conferindo-lhe um maior destaque e visibilidade social

com o intuito de incentivar a participação dos adultos.

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Desde 1960, no relatório final da segunda CONFINTEA, se assinalam diversas

recomendações dirigidas àqueles que desenvolviam a sua atividade profissional no campo da

Educação de Adultos. Numa lógica de abertura, sugeria-se que estes se deveriam articular com

outros agentes sociais e sectores da sociedade. Salientava-se e apelava-se, por exemplo, às

responsabilidades dos intelectuais e dos artistas na Educação dos Adultos.

Ao mesmo tempo, assinalava-se a importância da articulação dos agentes e organizações

do campo da Educação de Adultos com os meios de comunicação social e outras entidades da

cultura popular (Cinema, Televisão e Rádio). Concebida enquanto estratégia, foi feita uma

recomendação aos educadores de adultos para que estabelecessem “contactos amigáveis” com

aqueles que controlam os media de entretenimento popular de forma a facilitar a ‘troca de

ideias’ entre os dois. Esses contactos amigáveis seriam entendidos como um trabalho preliminar

para o desenvolvimento de ações e sugestões específicas que visassem a produção de novos

tipos de programas de entretenimento que enriquecessem o “pensamento e o modo de vida do

homem comum” (UNESCO, 1960), mantendo uma apelabilidade popular.

Passados doze anos, no relatório final da terceira CONFINTEA, continuava-se a incentivar

essa articulação e estabelecimento de relações de trabalho entre os profissionais da Educação

de Adultos e aqueles que são responsáveis pelo planeamento de outros media e instituições não

formais (rádio, televisão e filmes) para a programação coordenada com fins educacionais e

culturais (UNESCO, 1972, p. 52).

Refira-se que essa estratégia comunicacional passaria também por adequar a intervenção

às características dos adultos. Pretendia-se acima de tudo apelar a uma participação localizada

no “ambiente natural” dos indivíduos, o que possibilitaria que se sentissem seguros e

genuinamente motivados, além de também se poderem constituir como parte ativa no

planeamento, na gestão e na condução dos seus próprios estudos (UNESCO, 1972, p. 18).

Mais tarde, numa lógica de difusão das boas práticas, em 1985, com a CONFINTEA

realizada em Paris, destacou-se o interesse, a importância e os ganhos concretos de se proceder

à partilha internacional de experiências bem-sucedidas entre educadores de adultos que

trabalhassem tanto no sector governamental como em organizações não-governamentais

(UNESCO, 1985, p. 60).

Esse interesse na relação entre o sector governamental e as organizações não-

governamentais também continuou na quinta CONFINTEA, a primeira em que as ONG

participaram ativamente, ainda que sem direito a voto. De facto, nessa linha, recomendava-se a

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articulação do papel do Estado com os diferentes parceiros sociais, nomeadamente pela

recomendação que visava o reconhecimento das responsabilidades mútuas para o

estabelecimento de quadros de suporte legal para o estabelecimento de mecanismos de

coordenação e monitorização e para a criação dos diferentes

“suportes financeiros, administrativos e de gestão, pelo reforço dos mecanismos de articulação

intersectorial e interdepartamental, e pela garantia da participação das organizações da sociedade civil

para complementar a resposta dos governos, providenciando-lhes o financiamento adequado para apoiar

as suas atividades” (UNESCO, 1997, p. 15).

A partir desta conferência começa-se a promover, de forma ativa e em termos de discurso

institucional, a transferência de responsabilidades e funções que eram principalmente do Estado

a esses novos agentes sociais. Dessa forma, patrocinam-se lógicas relacionadas com a

constituição de parcerias, com a territorialização da intervenção e com a descentralização

(UNESCO, 1997; Afonso, 2001, p. 37). Pode-se considerar que promovendo estas dinâmicas, o

Estado reduziria e dispersaria a pressão social a que estaria sujeito (quando assumia essas

funções em regime de exclusividade), pelos novos atores coletivos não-estatais, que constituindo-

se como parceiros também se responsabilizam pela prossecução dos objetivos públicos (Afonso,

2001, p. 39).

Condições laborais, de remuneração e estatuto profissional

Um outro tópico sempre presente nas diversas recomendações das CONFINTEA e que

ainda continua a apresentar a maior importância para o desenvolvimento profissional dos

agentes de educação de adultos relaciona-se com as condições laborais daqueles que

desenvolvem atividades profissionais no campo da EFA.

Por exemplo, em 1960, no relatório da segunda CONFINTEA, recomendava-se que os

diversos governos teriam a responsabilidade de criar condições financeiras e administrativas

para a implementação e desenvolvimento de políticas de Educação de Adultos adequadas ao

nível de desenvolvimento nacional. Uma possibilidade era explicitamente salvaguardada: mesmo

que houvesse espaço para ações de voluntariado, deveriam ser providenciadas as condições

necessárias, através de pagamento de salários, despesas de viagem e de subsistência, àqueles

que trabalham na Educação Vocacional, Cívica, Social e Cultural (tanto em tempo parcial como a

tempo inteiro; tanto em organismos públicos como em outros voluntários).

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Também no encontro de Nairobi, em 1976, foi destacada a importância da criação de

boas condições laborais dos educadores de adultos para o desenvolvimento do campo da

Educação de Adultos. Defenderam-se algumas medidas específicas e ainda hoje prementes: o

emprego a tempo inteiro de profissionais; a comparabilidade em termos de condições de

trabalho e de remuneração dos trabalhadores a tempo inteiro com trabalhadores em lugares

educativos similares; a regulação daqueles trabalhadores que trabalhassem a tempo parcial; o

investimento nas diversas estruturas em termos de instalações e equipamentos tecnológicos; o

investimento em formação e desenvolvimento profissional dos vários intervenientes no campo da

Educação de Adultos, planeadores, administradores, formadores de educadores, formadores e

administrativos, e outros que concebam estratégias e métodos educativos adequados (UNESCO,

1976, p. 9).

Na quarta e na quinta CONFINTEA, este tópico foi, como temos vindo a referir, tratado

numa certa lógica de continuidade visando a qualidade e a sustentabilidade das diferentes

atividades e programas de Educação de Adultos. Sintetizando, as diversas recomendações

preocupavam-se com a adoção de diferentes medidas e a elaboração de políticas que visassem

a melhoria das condições de trabalho, de remuneração e de estatuto profissional dos

educadores de adultos.

Formação inicial e contínua – a sua valorização

Um dos temas que mais destacaríamos pela sua recorrência e relevância nas diversas

recomendações mas também por incorporar aspetos dos dois pontos anteriormente referidos é a

focagem na formação inicial e contínua dos agentes de EFA, tendo em atenção as suas variadas

vertentes e implicações.

Desde a segunda CONFINTEA (1960) que se explicita a importância da articulação do

conhecimento científico com as práticas profissionais para o desenvolvimento das mesmas.

Distinguiam-se duas formas de articulação: por um lado, reconhecia-se que os trabalhadores da

Educação de Adultos necessitariam da assistência da investigação científica e que, por outro, os

especialistas da Educação de Adultos deveriam ter acesso a um “sistema de informação efetivo”

(com os resultados dos estudos económicos, sociológicos, psicológicos e educacionais) que

contribuíssem para a definição das “necessidades, aspirações, objetivos/finalidades, programas,

métodos e dos equipamentos da educação de adultos”.

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Constata-se que desde cedo se incentivou a interação com especialistas multidisciplinares

e Institutos de Investigação, que permitisse desenvolver investigação específica (de acordo com

cada contexto social e nacional) e em temas considerados importantes14. Esta forma de

agenciamento visava dois objetivos: ao mesmo tempo que se almejava providenciar maior

conhecimento e cultura aos adultos também se pretendia possibilitar o estabelecimento de

políticas específicas mais apropriadas às necessidades individuais e sociais.

No entanto, com a terceira CONFINTEA (1972), começa-se a propor uma diferenciação

em termos de acesso ao papel de ‘educador de adultos’ ou a outras ocupações inseridas no

campo da Educação de Adultos (por exemplo, administradores, animadores, líderes voluntários,

entre outros). De uma forma explícita, admitia-se que apenas aqueles que já haviam sido

ensinados poderiam eles próprios ensinar e só assim teriam um papel significativo nos diversos

contextos ocupacionais:

“Conscientes que aqueles que foram já educados podem eles próprios ensinar nos seus próprios contextos e

desempenhar um papel significativo na difusão da educação como administradores, animadores, líderes ou

assistentes voluntários, em cooperação com os educadores profissionais (UNESCO, 1972, p. 57).

Com a finalidade de proceder ao desenvolvimento profissional no campo da Educação de

Adultos, propunha-se a implementação de cursos de formação dos educadores de adultos, que

deveriam incluir pequenos cursos de formação em contexto de trabalho e cursos mais longos

que permitissem a obtenção de certificados, diplomas e graus (UNESCO, 1972, p. 55).

Ao mesmo tempo propunha-se um papel mais interventivo para os educadores de adultos,

que deveria passar por identificar e sugerir diversas reformas (sociais, económicas, culturais ou

políticas) consonantes com os novos objetivos educativos derivados das mudanças observadas

na sociedade e nos sistemas de educação15.

Nessa estratégia, que visava uma maior relevância e disseminação social da EFA alertava-

se, para diversos fatores que se deveriam considerar no desenvolvimento de sistemas de

formação para o pessoal da educação de adultos: a) a formação dos educadores de adultos

como líderes sociais com “um forte grau de consciência dos aspetos sociais das suas funções e

a capacidade de estimular e mobilizar os recursos humanos comunitários para uma participação

14 Na segunda CONFINTEA os temas considerados relevantes eram: a) lazer e cultura popular; b) desenvolvimento da personalidade entre as pessoas jovens; c) coordenação de trabalho construtivo dos mass media e dos grupos culturais; d) relacionamento entre a elevação dos níveis de vida e a elevação dos níveis culturais. 15 À premissa fundamental das recomendações do relatório da CONFINTEA III, de que a Educação é tanto um produto da Sociedade como tem influência na configuração da Sociedade (UNESCO, 1972, p. 17), não deveriam ser desconhecidas as principais recomendações e conclusões do relatório Aprender a Ser – O Mundo da Educação Hoje e Amanhã, comummente conhecido por Relatório Faure, que havia sido editado pela UNESCO poucos meses antes da conferência realizada em Tóquio.

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responsável na educação de adultos” (UNESCO, 1972, p. 57); b) a necessidade de um esforço

sistemático para “descobrir, recrutar e formar educadores de adultos” entre aqueles que se

apresentem como líderes potenciais e naturais de um determinado local (apesar de lhes poder

faltar formação específica); e c) formar educadores de adultos para que estes possam

desenvolver materiais e métodos nos seus programas de educação de adultos que sejam

adaptados e relevantes às tradições e costumes locais (UNESCO, 1972, p. 57).

Passados quatro anos, através da recomendação resultante do encontro de 1976, em

Nairobi, e aprovada pela Conferência Geral da UNESCO também nesse ano, com o compromisso

dos Estados-Membro em promover a Educação de Adultos como parte integrante do sistema

educativo, observam-se alguns desenvolvimentos programáticos dos tópicos relacionados com o

desenvolvimento profissional, fundamentalmente em termos de formação e estatuto das pessoas

que trabalham na Educação de Adultos.

Um dos seus princípios base, já destacados previamente, relacionava-se com o

reconhecimento de que todos aqueles que estivessem envolvidos na provisão de atividades de

educação de adultos, a qualquer título e para qualquer finalidade, deveriam possuir

competências, conhecimentos e atitudes específicas.

Seria necessário, portanto, que fossem cuidadosamente recrutados de acordo com as

suas funções particulares. Deveriam também receber formação inicial e formação em contexto

de trabalho de acordo com as suas necessidades e com as necessidades daqueles com quem

estariam profissionalmente envolvidos.

Ao mesmo tempo, dever-se-ia encetar contactos com diversos especialistas em Educação

de Adultos e implementar processos de partilha de experiências e de compilação e disseminação

de informações sobre as estratégias, estruturas, conteúdos, métodos e resultados (tanto

quantitativos quanto qualitativos) da educação de adultos (UNESCO, 1976, p. 8).

Paralelamente, numa lógica de abertura social, propunha-se a ação no campo da

Educação de Adultos de todos aqueles que se revelassem capazes de contribuir, regular ou

ocasionalmente, remunerados ou de forma voluntária, para a educação de adultos. Defendia-se,

portanto, uma crescente participação social e o envolvimento voluntário de pessoas com todo o

tipo de competências.

A partir da IV CONFINTEA, em 1985, começa-se a utilizar o conceito de profissionalização

para conceber e sistematizar a problemática e necessidade do desenvolvimento profissional no

campo da Educação e Formação de Adultos. Indiciando a sua importância, considerava-se a

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profissionalização “tão necessária no campo da educação de adultos como em outras atividades

da vida humana” (UNESCO, 1985, p. 55). Realce-se, porém, que no relatório resultante da

mencionada CONFINTEA, essa profissionalização é concebida sobretudo numa lógica de

desenvolvimento dos conhecimentos e competências. Nesse sentido, relacionava-se

fundamentalmente com as diversas configurações institucionais que possibilitavam a formação

inicial e contínua dos educadores de adultos e visavam o incremento da qualidade da educação.

Assumia-se, pois, que a necessidade da profissionalização derivaria da seguinte

fundamentação: sem formação para os educadores de adultos, as realizações neste campo

educacional seriam limitadas. Por isso, uma das recomendações relaciona-se com “reconhecer

plenamente a influência direta dos trabalhadores da educação de adultos no desenvolvimento e

na qualidade da educação” (UNESCO, 1985, p. 55).

Numa certa lógica de descrição funcional, abordam-se também os conhecimentos e as

competências que o educador de adultos deveria possuir: deveria ter pelo menos conhecimentos

básicos da psicologia adulta, da psicologia da aprendizagem e dos métodos e técnicas

educacionais e deveria ser instruído de forma a facilitar o processo de aprendizagem do adulto

com qualquer nível de educação e de qualquer grupo ou ambiente.

Assim, era recomendado aos Estados-Membro que se assegurassem que as universidades

e outras instituições providenciassem programas educativos e de graduação específicos na área

da educação de adultos, e não somente como uma especialização de outras áreas.

Estes diferentes programas deveriam ter também em consideração a contribuição de

organizações não-governamentais para o treino de pessoal voluntário ou em part-time,

estabelecendo programas de formação específicos para este público. Deveriam também

considerar o valor da diversidade de experiências e de formação que poderiam levar ao

reconhecimento do estatuto de tal pessoal.

À própria UNESCO foi feita a recomendação de que prestasse uma maior atenção à

formação dos trabalhadores de educação de adultos nos seus programas e orçamentos. Sugeria-

se que essa organização deveria ajudar os Estados-Membro através de projetos concretos que

permitissem um melhor entendimento da importância de formar os trabalhadores de educação

de adultos e na melhoria do seu estatuto social (UNESCO, 1985, pp. 55-56).

Passados doze anos, na CONFINTEA que teve lugar em Hamburgo, em 1997, algumas

das recomendações também se relacionavam com o recrutamento, a formação inicial e a

formação em serviço. A premência da educação e formação contínua dos educadores de adultos

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também se relacionava com as diferentes inovações nos métodos de ensino e de educação,

nomeadamente no crescente recurso às novas tecnologias de informação e na relação com os

media.

Numa linha de continuidade, continuava-se a sugerir que deveria ser providenciada

formação aos educadores e os trabalhadores culturais que encorajasse o desenvolvimento e

aplicação de recursos apropriados e disponíveis para a Educação de Adultos.

Em síntese, enfatizava-se a necessidade de melhorar as condições e a qualidade da

aprendizagem dos adultos e essas seriam concretizadas com o desenvolvimento profissional dos

educadores de adultos. Desde a segunda CONFINTEA e até Hamburgo ainda continua a questão

da formação dos educadores de adultos no topo da agenda e, ao que parece, sem grandes

evoluções. Aliás, ela chega até aos nossos dias e com as mesmas características implicando-se,

no entanto, outras questões, tais como a afirmação da aprendizagem ao longo da vida e o

discurso da qualidade.

Aprendizagem ao Longo da Vida e o discurso da Qualidade

A partir de meados da década de 90, começa-se a destacar no discurso público e

institucional, de uma forma mais explícita, a noção de Aprendizagem ao Longo da Vida. Desde

essa altura, esse conceito tem ocupado um lugar central na agenda política relativa à educação

e formação da União Europeia, da OCDE e também da própria UNESCO.

Com a publicação pela Comissão Europeia, em 1995, do Livro Branco Teaching and

Learning – Towards the Learning Society concebe-se a Aprendizagem ao Longo da Vida como

um desafio resultante das diversas transformações demográficas e sociais (por exemplo, o

aumento da esperança de vida e a feminização do mercado de trabalho), da evolução científica e

tecnológica, do advento da sociedade da informação e da globalização da economia. Essa noção

é perspetivada como uma resposta que induziria a atualização e aperfeiçoamento permanente

dos conhecimentos e das competências técnicas, profissionais e sociais, tornando-se assim um

requisito e uma condição determinante para a consolidação da dita Sociedade da Aprendizagem.

De facto, parece subjacente à emergência do conceito e política de Aprendizagem ao

Longo da Vida a sua subordinação às transformações económicas (que afetam a sociedade, o

campo do trabalho, do emprego e da educação) e aos modos de organização, produção e

consumo (Edwards, 1997; Canário, 2003). Parece visar, entre outros aspetos, o incremento da

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capacidade adaptativa dos indivíduos, ou seja, a sua empregabilidade, a uma realidade cada vez

mais exigente em termos cognitivos e laborais.

Com esse Livro Branco também se lançou o Ano Europeu da Aprendizagem ao Longo da

Vida, que durante todo o ano de 1996 pretendeu perspetivar as diferentes ações que deveriam

ser desenvolvidas aos diversos níveis (a nível europeu e aos níveis local e nacional) e também as

formas de estruturação das diversas atividades de cooperação que visariam o desenvolvimento

da Aprendizagem ao Longo da Vida e da Sociedade de Aprendizagem. Sugere-se que com a

comemoração desse evento intensificou-se a importância, o perfil e esta conceção particular da

Aprendizagem ao Longo da Vida (Dale, 2008).

Nesse mesmo ano, a OCDE prestou uma especial atenção a esse entendimento da

Aprendizagem ao Longo da Vida através da organização de um encontro internacional dos

ministros da educação dos países-membro e com a edição do relatório Lifelong Learning for All

(Istance, 2011). A Aprendizagem ao Longo da Vida foi concebida como uma necessidade

derivada da crescente competitividade global e das diversas mudanças resultantes dos

desenvolvimentos científicos e das novas tecnologias.

Desta forma, enquadra-se frequentemente a emergência dessa política e conceito de

Aprendizagem ao Longo da Vida dentro de um quadro de reformulações profundas nas tipologias

institucionais, políticas e económicas que se vêm concretizando como uma estratégia de

renovação das instituições capitalistas e liberais (Lima, 2003).

Sistematicamente, a Aprendizagem ao Longo da Vida (como noção, conceito, política, ou

mesmo jargão) vem sendo incorporada nos discursos e políticas a nível nacional e internacional,

numa agenda globalmente estruturada de educação, com diferentes repercussões nas agendas

educativas nacionais (Dale, 2004). É promovida por diferentes instituições, implicando um

consenso diligentemente fabricado através da naturalização de factos, ideologias e discursos

que, de acordo com as diversas prioridades políticas e económicas, poderão ocultar ou revelar

visões muito diversas em relação à implementação de políticas nacionais (Antunes, 2001; Lima,

2008; Cavaco, 2009).

Para Collin Griffin, a Aprendizagem ao Longo da Vida poderá ser concebida como uma

estratégia de ação que, funcionando como uma «cortina de fumo», pretende dissimular o

‘desmantelamento’ do Estado-Providência e provocar uma disrupção na manutenção dos

sistemas educativos estatais através de políticas públicas. Verifica-se, portanto, uma alteração

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nas lógicas subjacentes à conceção de políticas relacionadas com a educação e aprendizagem

ao longo da vida (Griffin, 1999a; Griffin, 1999b).

Essa emergente noção da Aprendizagem ao Longo da Vida, a ser meramente entendida

como atributo, função do estilo de vida ou do consumo individual (determinado em termos de

procura de sentido e ação), seria distinta de uma provisão educativa, desenvolvida dentro de um

quadro institucional e sistémico. Ou seja, seria entendida fundamentalmente como uma função

da estrutura social, sem necessidade de direção e controlo do Estado. Nesse sentido, o Estado,

na sua ação e funções, passaria da formulação e implementação de políticas públicas para a

simples conceção de estratégias que visassem aqueles fins (Griffin, 1999b, p. 447). Essa

mudança de orientação não é inócua nem casual. O recentrar da ação política e de governação

num discurso de Aprendizagem ao Longo da Vida, corresponderia a uma reforma de cariz

neoliberal do papel do Estado. Como sustenta Collin Griffin,

“a razão porque eles não fazem não é unicamente por causa da impossibilidade de formular a

aprendizagem como um objeto de política pública, mas porque a escolha política é não o fazer. A

estratégia de governação é criar as condições em que as pessoas, famílias, comunidades e organizações

sejam mais propícias a aprender por elas próprias, dessa forma obviando a necessidade para uma

política educacional no sentido tradicional. Esta é uma característica de governação nas condições pós-

Providência” (Griffin, 1999b, p. 440).

Repare-se que estas implicações são coincidentes com aquilo que Nikolas Rose (1997,

pp. 25-40) define como os três traços característicos do neoliberalismo. Partindo do princípio

que o neoliberalismo não abandona a vontade de governar, mas apenas inventa novas

estratégias de governo, o autor refere as suas três características principais que, como

analisaremos em maior detalhe, influenciam muitos dos discursos sobre o papel do

desenvolvimento profissional dos agentes de EFA e da crescente relevância da Qualidade no

campo da EFA.

A primeira característica assinalada relaciona-se com uma «nova relação entre os peritos e

a política», que implicaria um controlo crítico dos sistemas periciais perspetivados em nome de

uma ‘verdade’ monetarista e gestionária, implementada através de técnicas contabilísticas e de

lógicas de auditoria. Estas são entendidas como mecanismos essenciais para a gestão do risco,

para a governação a distância e para implementação de estruturas autorreguladoras: para as

organizações serem auditadas têm de se tornar auditáveis.

A introdução de novas tecnologias de regulação baseadas em formas de governação

conformadas a poderes e vontades de entidades autónomas (empresas, organizações,

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comunidades, profissionais e indivíduos, por exemplo) que significam uma

“desgovernamentalização do Estado e uma desestatização do governo” corresponderia

genericamente à segunda característica: uma «nova pluralização das tecnologias sociais». Nesse

sentido, o crescimento de organizações não-governamentais quase autónomas que assumiriam

diferentes funções implicariam o crescimento da competitividade e da qualidade dos serviços.

Essas funções seriam reguladoras (por exemplo, com a constituição de ordens e associações

profissionais); de planificação (com a ascensão de novas entidades de governação para proceder

à regeneração das cidades); educativas (com o crescimento de escolas profissionais privadas e

outras entidades desse sector), de provisão de serviços públicos (através, por exemplo, da

privatização dos sectores da água, do gás, da eletricidade e mesmo da segurança).

Desta forma, verifica-se uma subversão do controlo democrático pela aceitação acrítica de

que essas entidades funcionam com base num projeto apolítico, com uma certa margem de

poder e autonomia regulada (controlável à distância por contratos, objetivos, indicadores e

medição, monitorização e avaliação de resultados) e supostamente representativa da

comunidade (já que tendencialmente incorporam na sua administração representantes de vários

sectores tais como empresas, residentes locais, organizações voluntárias, municípios, etc.).

A terceira característica relaciona-se com uma «nova especificação do sujeito de governo».

Nas palavras de Nikolas Rose, cada vez mais se verifica

“a entronização dos poderes do cliente como consumidor – consumidor de serviços de saúde, de

educação, de formação, de transportes – define os sujeitos de governo de uma nova forma: como

indivíduos ativos que procuram «realizar-se a si mesmo», maximizar a sua qualidade de vida mediante

atos de escolha, conferindo a suas vidas um sentido e um valor na medida em que podem ser

racionalizadas como o resultado de escolhas feitas ou de opções por toma. A razão política deve agora

justificar-se e organizar-se a si mesma argumentando mediante pactos que se adequam à existência de

pessoas definidas, em sua essência, como criaturas livres e autónomas. No interior de este novo regime

que supõe um eu inteiramente responsável, os indivíduos têm de cumprir as suas obrigações cidadãs

não através de mútuas relações de dependência e obrigação de uns com os outros, senão procurando

realizarem-se a si próprios no seio de âmbitos micro-morais ou «comunidades»: famílias, lugares de

trabalho, escolas, associações de ócio, vizinhanças. O problema consiste, portanto, em encontrar os

meios através dos quais os indivíduos se fazem responsáveis mediante opções individuais que adotam

para si mesmos e para aqueles a quem devem lealdade, formando um estilo de vida de acordo com

gramáticas de vida que têm sido amplamente disseminadas, que já não dependem de cálculos nem de

estratégias políticas para a sua lógica de funcionamento nem para as técnicas que implicam” (Rose,

1997, p. 37).

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Profissionalização como incremento da Qualidade

Na Agenda para o Futuro, um documento divulgado em 1997 por ocasião da V

CONFINTEA realizada em Hamburgo, perguntava-se:

“que tipo de medidas e reformas devem ser levadas a cabo para se conseguir maior acessibilidade,

relevância, qualidade, respeito pela diversidade e reconhecimento do ensino anterior?” (UNESCO, 1999,

p. 33).

Além de determinadas ações eminentemente simbólicas (celebração de dias

comemorativos específicos e do movimento ‘uma hora por dia para estudar’), propunha-se criar

condições legislativas, serviços de informação e aconselhamento públicos e o desenvolvimento

de métodos que permitissem a validação das experiências e aprendizagens anteriores. Ou seja,

pretendia-se facilitar a procura de aprendizagem por parte das pessoas, garantindo ao mesmo

tempo o acesso e a participação dos adultos em diversas atividades de aprendizagem.

A abertura das diversas instituições educativas (escolas, faculdades e universidades) aos

estudantes adultos era também um compromisso assumido acrescido às diversas propostas que

vinham a ser reiteradas: a continuidade de uma lógica de educação permanente, sem barreiras

entre a educação não formal e a educação formal, numa lógica de continuidade temporal que

superasse a mera escolaridade obrigatória; a promoção da investigação académica e da

divulgação do conhecimento e estudos nacionais e transnacionais sobre a educação e formação

de adultos; a assunção das responsabilidades dos estados na criação do “apoio financeiro,

administrativo e de gestão, reforçando os mecanismos de ligação intersectorial e interministerial”

(UNESCO, 1999, p. 37) e também no apoio aos novos parceiros sociais “com o estabelecimento

de quadros regulamentadores de apoio […] e na criação de mecanismos de acompanhamento e

coordenação” (UNESCO, 1999, p. 37).

O último tópico que nos importa destacar relaciona a melhoria da qualidade da educação

e aprendizagem dos adultos com a melhoria das condições de formação profissional dos

“educadores e monitores de adultos”. Além do compromisso para se desenvolver e inovar nos

métodos de ensino e aprendizagem (incluindo todas as potencialidades das novas tecnologias)

sugeria-se que a qualidade da educação de adultos se efetivaria

“estabelecendo políticas e adoptando medidas para melhorar o recrutamento, a formação inicial e o

emprego, as condições de trabalho e a remuneração do pessoal envolvido nos programas e actividades

de educação de jovens e adultos, de modo a assegurar a respectiva qualidade e estabilidade, incluindo

os conteúdos e metodologia de formação” (UNESCO, 1999, p. 36).

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A partir da segunda metade da década de 90, o discurso da «Qualidade» começa a

apresentar uma crescente relevância que se denota, entre outros aspetos, na atenção à

perspetivação da qualidade na provisão da Educação de Adultos e na sua articulação com os

processos de formação inicial e contínua dos agentes de educação e formação de adultos. Como

refere um estudo relativo à gestão da qualidade na educação de adultos na Europa, publicado

pela Associação de Educação de Adultos da Letónia:

“Desde os anos 90 os desenvolvimentos na gestão da qualidade no sector industrial influenciam

também as discussões no sector dos serviços, onde a Educação de Adultos pode ser incluída.

Inicialmente o foco do desenvolvimento da qualidade no sector industrial era relativa ao produto. Na

Educação de Adultos este conceito era e ainda é muito rejeitado pelo argumento de que a educação não

é um produto. O próprio aprendente com as suas expectativas, precondições e interesse está muito

envolvido em produzir o “produto de aprendizagem”. Portanto, qualquer desenvolvimento na qualidade

terá de se concentrar nas condições que levam a uma melhor aprendizagem. Por outras palavras: às

condições organizacionais. Com a filosofia da Total Quality Management o foco mudou de uma

orientação para o produto para os processos de uma organização e com isto o interesse na aplicação da

gestão na qualidade na educação de adultos aumentou (Latvian Adult Education Association, 2006, p.

4).

Refira-se que essa articulação se apresenta em diferentes documentos produzidos ou

apoiados por diversos organismos da União Europeia que incidiam na questão da qualidade na

educação. Constata-se um fio condutor que revela as orientações políticas e estratégias

relativamente às configurações dos sistemas educativos.

A título de exemplo, já em 2000, no Memorando sobre Aprendizagem ao Longo da Vida,

refere-se a centralidade da qualidade na relação educativa e do envolvimento dos profissionais

da área:

“A qualidade da experiência e dos resultados da aprendizagem são os elementos fundamentais,

nomeadamente aos olhos dos próprios aprendentes. No entanto, poucas mudanças e inovações

efectivas poderão ocorrer sem o envolvimento activo dos profissionais da área, que estão mais próximos

do cidadão enquanto aprendente e mais familiarizados com a diversidade de necessidades e processos

de aprendizagem” (Comissão das Comunidades Europeias, 2000, p. 15).

Por exemplo, o documento Adults Education Trends and Issues in Europe, elaborado pela

Associação Europeia para a Educação de Adultos (European Association for the Education of

Adults) refere que os principais objetivos da garantia de qualidade passam por: a) assegurar que

os resultados de aprendizagem sejam relevantes e apropriados às necessidades das pessoas; b)

garantir a sua eficiência em termos da organização e do processo de aprendizagem; c)

possibilitar a transparência da provisão educacional e dos resultados de aprendizagem. d)

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desenvolver a atratividade, o incremento da motivação, a garantia de participação e um acesso

igualitário particularmente para grupos desfavorecidos (EAEA, 2006).

A Comissão Europeia tem sublinhado o papel da qualidade encarando-a como um

conceito orientador das suas políticas setoriais e considera-se a profissionalização dos

educadores de adultos como um dos pilares da «cultura de qualidade».

Na comunicação “Educação de adultos: nunca é tarde para aprender”, de 2006, são

referidas as diversas formas associadas à qualidade16:

“informação e orientação; análise das necessidades; conteúdo pertinente, que corresponda às

necessidades e à procura reais; oferta; apoio à aprendizagem; abordagens em matéria de avaliação; e

reconhecimento, validação e certificação de competências” (Comissão Europeia, 2006, p. 7).

Reconhece-se, no entanto, que se deve prestar especial atenção a quatro tópicos

principais: 1) aos métodos de ensino; 2) à qualidade do pessoal; 3) à qualidade dos prestadores;

4) à qualidade da oferta (Comissão Europeia, 2006, p. 7).

No Plano de Acção para a Educação de Adultos, intitulado “Nunca é Tarde para Aprender”

(Comissão Europeia, 2007, pp. 5-6), a qualidade dos serviços de educação de adultos é

entendida como dependente das políticas, dos recursos e das instalações. Porém, não podendo

ser perspetivada isoladamente, seriam também consideradas a eficiência e a eficácia, a

relevância e a responsabilização (accountability) como determinantes para as estruturas

organizacionais e para as políticas do sistema de educação de adultos.

Prosseguindo uma lógica de «boa gestão», as organizações que providenciam serviços de

educação de adultos devem: a) focar no educando adulto; b) fazer abordagens inovadoras da

aprendizagem; c) analisar eficazmente as necessidades; d) desenvolver sistemas de

administração eficientes e proceder à afetação apropriada de recursos; e) investir em pessoal

qualificado; f) criar diferentes mecanismos de garantia de qualidade das entidades prestadoras

de educação de adultos; g) desenvolver sistemas de monitorização e avaliação (fundamentados

em indicadores sólidos) dentro de quadros de referências nacionais; h) criar relações próximas

com outras áreas e entidades educativas, designadamente associações de alunos, associações

sectoriais e subsectoriais e entidades empregadoras (Comissão Europeia, 2007, pp. 5-6).

Concretizando algumas sugestões anteriormente referidas da Agenda para o Futuro, e de

forma a potenciar a qualidade da oferta e dos métodos de ensino, é sugerido que para se

16 Ligeiramente diferentes são os critérios relativos à garantia de qualidade da educação, segundo o documento de trabalho “A Educação de Adultos na Europa. Formação não-profissional”: “Os critérios relativos à garantia de qualidade da educação e respetivos domínios de aplicação incluem: capacidade institucional; eficácia educativa; estratégias e procedimentos para a garantia da qualidade; acessibilidade e adequabilidade dos recursos de aprendizagem” (Eurydice, 2007a, p. 50).

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aumentar a participação e a eficácia na educação de adultos, dever-se-ia implementar, a nível

local, serviços de informação, aconselhamento e orientação. Potenciando a sua atratividade,

estes deveriam ser secundados por programas ajustados e tendencialmente flexíveis, com

métodos e materiais didáticos adaptáveis às necessidades e características dos adultos e,

paralelamente, com estruturas de apoio que permitam o acolhimento de crianças.

A qualidade dos prestadores desses serviços educativos seria implementada e assegurada

numa vertente de regulação. Os governos teriam, fundamentalmente, em colaboração com

outros interessados, a tarefa de estabelecer os quadros normativos e os mecanismos de

acreditação, a definição das normas de qualidade, dos mecanismos de monitorização (em

termos de controlo interno e externo) e implementação de processos de avaliação dos resultados

do ensino e de aprendizagem que garantissem o cumprimento das normas17.

No mesmo sentido, como observam Egetenmeyer e Käpplinger (2011), essa gestão da

qualidade é um conceito que, internamente, incide sobretudo na estandardização e controlo dos

processos e dos produtos e, externamente, na construção de uma imagem específica. Assim,

“esses processos e produtos são definidos formalmente de acordo com critérios ou normas standard.

Assim, a qualidade parece ser um termo neutral, que pode ser usado em diferentes sentidos

dependendo do contexto. A característica central da garantia de qualidade ou do desenvolvimento da

qualidade é a formalização de processos organizacionais. As ações individuais deverão ser guiadas por

procedimentos ou estruturas formais, que são frequentemente definidos por orientações escritas,

códigos de missão ou objetivos fixados. Pessoas, interesses, a paixão profissional ou objetivos individuais

não são aparentes, e o fator individual é regulado pelo formalismo. As consequências negativas da

gestão da qualidade muito rigorosa pode ser a autorreferencialidade, a homogeneidade, o hierarquismo

e o burocratismo, que refreiam a inovação” (Egetenmeyer & Käpplinger, 2011, p. 26).

Salienta-se que o fator-chave para a qualidade da provisão de atividades de Educação de

Adultos é o desenvolvimento profissional das pessoas que trabalham nessa área. Assim, mais do

que as políticas, os recursos ou as instalações associadas à Educação e Aprendizagem dos

17 Podemos assim verificar como, na União Europeia, são promovidas e induzidas as diversas lógicas de ação que se esperam concretizadas nas políticas a nível nacional e local. A ‘nova’ forma de governação, o «método de coordenação aberta» (intermediando a integração europeia, a harmonização de política e a cooperação transnacional), apresenta um cariz pouco imperativo e concretiza-se através de alguns princípios de ação: «unidade pela subsidiariedade», «coesão pela isenção», «governação através de recomendações», «convergência», «pareceres de peritos», «explicação e consulta», «gestão por objectivos», «governação pela escolha», «administração por país», «abordagem integrada» e «homogeneidade pela difusão (Hespanha & Valadas, 2001, pp. 128-129). Como argumenta Licínio Lima (2010, p. 46), esse «método de coordenação aberta» repercute-se na formulação de políticas sociais que na prática implicam um conjunto de aspetos que podem, em alguma medida, apresentar alguns desajustamentos a determinadas realidades nacionais já que “evidencia poderosos instrumentos de convergência e de isomorfismo, baseados em múltiplos instrumentos, entre os quais a emulação e a competição, induzidas pela definição de benchmarks, por variados processos de monitorização, pilotagem e avaliação. Sem esquecer o efeito político dos rankings, formais ou informais, que comparam países, destacam «boas práticas» ou, ao invés, disponibilizam dados que podem ser explorados pelas forças políticas e sociais de oposição aos governos dos estados-membros”.

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Adultos, o referido Plano de Ação reconhece a importância do desenvolvimento profissional dos

agentes EFA para o incentivo à participação (Comissão Europeia, 2007, p. 9).

Nesse plano de ação consideram-se alguns dos aspetos que influem nesse mesmo

desenvolvimento. São referidas: a) a pouca atenção prestada à definição do conteúdo e

processos de formação inicial e contínua; b) as múltiplas formas de acesso, em termos

educativos e profissionais, para o desempenho de funções nessa área (além de professores e

formadores, pessoal de gestão, de orientação e aconselhamento e administrativo); c) o défice de

estatuto, remuneração e reconhecimento profissional no quadro de estruturas de carreira

formais; d) a existência de formas atípicas de trabalho (trabalho a tempo parcial, com

pagamento à hora e voluntariado) que podem não providenciar perspetivas de carreira

(Comissão Europeia, 2006; Comissão Europeia, 2007).

Todas estas preocupações, num padrão de influências discursivas mútuas, constatam-se

nas semelhanças dos diversos discursos emanados da União Europeia, no Relatório Global sobre

a Aprendizagem e Educação de Adultos (UNESCO, 2010c) e nos relatórios nacionais e regionais

que lhe deram origem e no próprio relatório final da CONFINTEA VI (2009).

No relatório final da sexta CONFINTEA considera-se novamente a profissionalização dos

educadores de adultos como uma das dimensões18 do incentivo de uma “cultura de qualidade”

na educação de adultos. A qualidade é tomada com um conceito orientador e com uma

centralidade inequívoca no próprio discurso emanado dessa CONFINTEA. De facto, os

participantes nessa conferência comprometeram-se a:

“a) desenvolver critérios de qualidade para os currículos, materiais de aprendizagem e metodologias de

ensino, tendo em conta os resultados e medidas de impacto; b) reconhecimento da diversidade e

pluralidade de fornecedores; c) melhorar a formação, capacitação, condições de emprego e a

profissionalização da educação de adultos, por exemplo, através do estabelecimento de parcerias com

instituições de ensino superior, associações de professores e organizações da sociedade civil; d) a

elaboração de critérios para avaliar os resultados de aprendizagem de adultos em vários níveis; e) a

definição de indicadores de qualidade precisos; f) maior apoio de crédito à investigação interdisciplinar

sistemático na educação de adultos, complementada por sistemas de gestão de conhecimento para a

recolha, análise e disseminação de dados e de boas práticas” (UNESCO, 2010b, pp. 40-42).

É referido explicitamente que tanto o empobrecimento dos ambientes de aprendizagem,

no respeitante a equipamentos, materiais e currículos como

“a falta de oportunidades de profissionalização e de formação para os formadores tem um impacto

negativo sobre a qualidade da oferta de aprendizagem e educação de adultos” (UNESCO, 2010b, p. 45).

18 De acordo com o referido relatório as outras dimensões da cultura de qualidade são: conteúdos relevantes e modos de entrega; avaliação das necessidades centrada no aprendente; aquisição de competências e conhecimentos múltiplos; o enriquecimento dos ambientes de aprendizagem e o empoderamento dos indivíduos e das comunidades.

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Além destes dois fatores, outros influem na qualidade da oferta: no processo de

planeamento, a escassez de avaliação de necessidades e pesquisas sistemáticas (nos

conteúdos, pedagogia, modos de provisão e infraestrutura de apoio adequadas); a inconstância e

a pouca sofisticação dos processos de monitorização, avaliação e mecanismos de feedback e a

tensão do equilíbrio entre a qualidade e a quantidade das ofertas educativas (UNESCO, 2010b,

p. 45)

Nesse relatório final apela-se, portanto, a que se verifique uma aprovação imediata de

«padrões de qualidade» comprovados e de medidas de qualidade indicativas e mensuráveis

como possíveis opções para os Estados-Membros. Pretende-se também que se desenvolva um

melhor conhecimento de políticas e práticas exemplares relativas à profissionalização dos

educadores de adultos e que se verifique uma maior recetividade para a introdução de sistemas

nacionais de monitorização que assegurem qualidade e enformem as políticas.

Antecedendo essas recomendações, foi apresentado, nessa sexta CONFINTEA, o Relatório

Global sobre a Aprendizagem e Educação de Adultos. Esse documento foi elaborado com base

nos Relatórios Nacionais de 154 Estados-Membros e nos cinco Relatórios Síntese regionais19.

Nesse documento pretendia-se analisar tendências, identificar os principais desafios e as

melhores práticas e direcionar as ações para a melhoria da aprendizagem e educação de

adultos, almejando a tradução dessas recomendações em políticas e programas específicos.

No referido relatório encara-se o investimento em recursos humanos (em termos

quantitativos e qualitativos) como “provavelmente o indicador mais importante da qualidade na

educação de adultos já que são estes a chave para a qualidade da educação de adultos. Deve

ser o ponto focal da qualidade nas políticas educacionais” (UNESCO, 2010a, p. 93).

É também reconhecido que conjuntamente com a escassez dos recursos aplicados se

verifica uma baixa profissionalização do sector da educação de adultos que parece afetar o

desempenho dos profissionais e influi na dita qualidade das experiências nesse campo. Essa

baixa profissionalização traduz-se em várias dimensões: 1) profissionais com formação

especializada mínima ou poucas qualificações reconhecidas; 2) modalidade de reconhecimento

e certificação das aprendizagens e experiências anteriores ainda pouco desenvolvidas; 3)

condições de trabalho precárias; 4) pouca retenção de profissionais experientes e competentes;

19 Foram cinco os relatórios-síntese regionais: 1) África; 2) Estados Árabes; 3) Europa; 4) América do Norte e Israel e 5) América do Norte e Caraíbas.

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5) fragmentação do corpo de profissionais e consequente pouca capacidade de pressão e poder

(lobbying) para melhor formação e aumento de investimento; 6) falta de instituições fortes para a

defesa dos interesses; 7) dispersão e diversidade dos atores implicados na aprendizagem e

educação de adultos (inibição de colaborações mais eficazes com outros que partilhem agendas

semelhantes); 8) pouco reconhecimento, valorização e aproveitamento das diferentes

contribuições da sociedade civil, do sector privado e de outros intervenientes, ainda que seja

assumido que a principal responsabilidade pela oferta educativa seja do Estado (UNESCO,

2010a, p. 25).

Também no Relatório Síntese Regional que analisa o estado e o desenvolvimento da

Aprendizagem e Educação de Adultos (AEA) na Europa, na América do Norte e Israel (38 países),

se reflete a noção de que o desenvolvimento profissional do pessoal é um componente essencial

da garantia de qualidade neste campo. Nas suas conclusões também se sustenta que é dada

pouca atenção à definição dos processos e conteúdos da formação inicial daqueles que

trabalham na AEA Formal e ainda menos atenção prestada aqueles que trabalham na AEA não-

formal.

Nesta região é mais prevalecente o Desenvolvimento Profissional Contínuo do que a

Formação Profissional Inicial, mas que, no entanto, permanece ad hoc e remendado. Na maioria

dos países desta região não se verifica uma visão clara sobre as competências padrão ou

habilidades necessárias para cumprir as tarefas profissionais na AEA, em parte devido à

diversidade do campo, embora num pequeno número de países tenha desenvolvido perfis de

competência para os profissionais. Verifica-se que em certos países se está a avançar da noção

de ‘perfil’ e de ‘profissão’ no campo da educação de adultos para a ideia de ‘profissionalização20’

e o desenvolvimento do profissionalismo (Keogh, 2009, p. 56).

Por exemplo, um dos Relatórios Nacionais que mais reflete sobre a profissionalização da

Educação de Adultos é o da Alemanha. Na Alemanha, não se verifica uma profissão específica,

nem se verifica a discussão relativa ao estabelecimento da profissão de Educador de Adultos

com perfil ocupacional específico e com regras no acesso à atividade profissional e nas

qualificações requeridas. Os perfis daqueles que trabalham nessa área são heterogéneos e

caracterizados por um largo número de diferentes intervenientes e instituições.

20 A título de curiosidade, os conceitos de profissionalização e de profissionalismo estão enunciados nos relatórios nacionais dos seguintes países: Áustria; Bélgica (Comunidade Flamenga e Francesa); Bulgária; República Checa; Estónia; França; Alemanha; Países Baixos, Roménia, Sérvia, Suíça e Macedónia.

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A diversidade também se reflete nas diferentes designações profissionais. Também não se

verifica um curso superior específico que permita o acesso a essa ocupação e o que existe são

diferentes especializações que são pertinentes para a Educação de Adultos. A discussão tende a

focar-se na profissionalização no contexto do desenvolvimento da qualidade, entendida como o

desenvolvimento do profissionalismo na Educação de Adultos (Lattke & Hossbach, 2008, pp. 75-

79).

Uma outra perspetiva é revelada no Relatório da Áustria que, em 2007, fez uma

substancial contribuição para a profissionalização e garantia de qualidade no pessoal da AEA

através da criação de uma instituição, a Weiterbildungsakademie (Academia para a Educação

Contínua), que consiste num sistema de qualificação e reconhecimento/acreditação dos

educadores de adultos e no estabelecimento de padrões e no fortalecimento da

profissionalização da Educação de Adultos austríaca.

De acordo com esse relatório seria vital,

“a aceleração do desenvolvimento de políticas, estruturas e medidas que permitissem resolver questões

de qualidade e garantir resultados de qualidade, incluindo o desenvolvimento de perfis de competências

para o pessoal da AEA, e uma abordagem sistemática do desenvolvimento profissional e contínuo do

pessoal da AEA para facilitar a ‘profissionalização’ da provisão da AEA” (Keogh, 2009, p. 57).

Processos de profissionalização e o profissionalismo

Temos vindo a utilizar de uma forma vaga o conceito de profissionalização e

profissionalismo dos trabalhadores e agentes que atuam no campo da Educação e Formação de

Adultos. Neste campo, esses conceitos e os fenómenos a que se referem apresentam

convergências e ambiguidades, outros dilemas e contradições e diversas aceções e dimensões.

As análises relativas ao processo de profissionalização e ao profissionalismo implicam inúmeras

divergências e controvérsias relacionadas com as considerações teóricas e políticas sobre as

missões, as práticas e as características da Educação e Formação de Adultos.

Como o conceito de desenvolvimento profissional, também a utilização dos conceitos de

profissionalização e de profissionalismo possui uma certa amplitude, referindo-se

indiferentemente ao desenvolvimento de uma profissão (em termos de estatuto, de

reconhecimento social e em termos de condições de trabalho) e também no respeitante ao

desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e práticas.

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Saliente-se que a profissionalização e o profissionalismo não são conceitos nem

problemáticas de reflexão ou discussão recentes. No entanto, parece verificar-se um

recrudescimento do interesse em torno daquelas temáticas em múltiplas áreas e campos

disciplinares, e não somente na Educação e Formação de Adultos.

Esse interesse pluridisciplinar denota-se na investigação de diferentes grupos ocupacionais

e profissionais que têm características similares (entre outras, a sua emergência recente), em

que se abordam os processos de profissionalização e o profissionalismo de formas similares:

nas associações do terceiro sector (Rego, 2010, pp. 153-178); nos profissionais da gestão dos

recursos humanos (Almeida, 2012, pp. 97-108); no campo da saúde, relativamente aos técnicos

de cardiopneumologia (Tavares, 2008, pp. 35-44) e aos acupuntores e homeopatas (Almeida, J.,

2012, pp. 109-130); no campo da assistência social (Passarinho, 2008, pp. 21-33);

relativamente aos arquitetos e ao campo da arquitetura (Cabral & Borges, 2006); em

organizações femininas (Markowitz & Tice, 2002); nos trabalhadores de unidades agrícolas

(González & Benito, 2001), entre outros.

De uma forma geral, a profissionalização refere-se à estratégia ou ao processo pelo qual

uma ocupação profissional é promovida e/ou se torna uma profissão reconhecida. Procura-se

potenciar e desenvolver determinadas ocupações e práticas profissionais, ou mesmo regular e

restringir o acesso, através da definição e obtenção de conhecimentos e saberes específicos

(Rodrigues, 1997; Freire, 2002; Gonçalves, 2007).

Através do processo de profissionalização poder-se-á verificar, direta ou indiretamente,

uma vontade de «proteger da competição» e obter a exclusividade de uma prática profissional,

aqueles que são treinados e possuidores de saberes e competências específicas. Além da

definição de perfis de práticas e competências, associa-se também a esse processo a

implementação de códigos legais e éticos, bem como de organizações específicas

configuradoras da identidade e da socialização profissional (Rodrigues, 1997, pp. 20-22, 62-69).

Os processos de profissionalização podem assumir características específicas: podem ser

percecionados como de evolução interna («from within» ou «bottom-up») quando as ocupações

profissionais e os seus desenvolvimentos são o resultado de atividades espontâneas dos grupos

profissionais ou dos seus elementos ou de evolução externa («from above» ou «top-down»)

quando o estado tem um papel intervencionista no início e na administração das ocupações e

dos grupos profissionais (Evetts, 2011, p. 398).

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Abordagens taxinómicas encaram a profissionalização como um processo pelo qual

determinadas ocupações vão atingindo os critérios definidores do tipo-ideal de uma profissão,

por uma sucessão de etapas, para isso recorrendo normalmente aos modelos estipulados pela

análise das profissões liberais: médicos, advogados, engenheiros, etc. (Jarvis, 1995; Gonçalves,

2007, p. 31). Apesar de existirem várias tipologias e critérios definidores de uma profissão,

referimos a que João Freire sintetizou:

“uma formação escolar (pós-básica) prolongada e exigente; uma especialização aprofundada do

conhecimento e o domínio técnico da sua aplicabilidade prática; a noção de um serviço benéfico

prestado à colectividade; a faculdade de julgamento individual sobre os actos técnicos específicos da

profissão e correspondente responsabilização legal; um acesso restrito e controlado ao exercício da

profissão; um controlo colegial dos profissionais sobre esse acesso e sobre as condições do seu

exercício; e, finalmente, um reconhecimento oficial, público, da profissão” (Freire, 2002, pp. 320-321).

Outras análises mais específicas e referidas ao campo da Educação e Formação de

Adultos, desvinculando-se da profissionalização concebida como o processo de desenvolvimento

de uma profissão21 por uma sucessão de etapas, entendem o processo de profissionalização de

uma forma mais contextual e relacionada intrinsecamente com o desenvolvimento do

profissionalismo das pessoas que trabalham neste campo específico:

“Profissionalismo neste sentido significa compreender a situação em que a ação profissional toma lugar.

Significa um entendimento holístico dos profissionais que têm de agir com base na combinação das

suas atitudes, habilidades e conhecimentos. Assim a profissionalização significa educar as pessoas que

trabalham em educação de adultos. O objetivo da profissionalização é apoiar o profissionalismo das

pessoas que trabalham na educação de adultos. Com esse profissionalismo um desenvolvimento

contínuo da educação de adultos pode ser alcançado pelos profissionais. Onde o termo

‘profissionalização’ é usado, significa um processo em direção ao profissionalismo” (Egetenmeyer &

Käpplinger, 2011, p. 25).

A profissionalização pode ser entendida como um processo multidimensional em que: a)

um grupo profissional específico (e cada um dos elementos que o constituem) procura

estandardizar e melhorar as respostas profissionais designadamente com b) o desenvolvimento

e atualização de saberes competências (através de diversas atividades de educação, de

formação e de aprendizagem) que permita que c) os ‘profissionais’ possam melhorar as suas

respostas e desempenhar as suas funções com maior profissionalismo para d) que se possam

adaptar às mudanças e desafios dos seus contextos profissional e social e desenvolver a sua

21 De acordo com o conceito de Julia Evetts, as profissões “são encaradas como um grupo genérico de ocupações baseadas no conhecimento tanto técnico como tácito” (Evetts, 2003, p. 397).

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prática profissional (Shanahan, Meehan & Mogge, 1994; Parke, 2000; Cort, Härkönen &

Volmari, 2004, p. 9; Rego, 2010, pp. 154-155).

No entanto, ao associar-se o conceito de profissionalização ao de profissionalismo outras

questões se determinam devido à polissemia destoutro conceito22. De acordo com Julia Evetts há

duas formas principais de conceber o profissionalismo: a) enquanto um sistema de valores que

implica uma ordem social normativa, determinando-se como um “motivador ou um facilitador da

mudança ocupacional (Evetts, 2003, p. 396); e b) como um «sistema de crenças hegemónicas»,

isto é, uma ideologia que controla as organizações ao nível macro (nos estados, sociedades e

mercados), meso (nas diversas organizações e instituições) e micro (relativamente aos grupos e

atores profissionais) que resultam num mecanismo de controlo social para os trabalhadores

(Evetts, 2003, p. 399).

De acordo com Julia Evetts (2003, pp. 400-403), os trabalhadores de diferentes

ocupações preferem fundamentar e conceber a sua prática «profissional» e o seu

profissionalismo utilizando as suas referências de «discurso normativo» e não enquanto uma

ideologia específica com implicações nas suas próprias práticas.

O profissionalismo concebido no seu primeiro sentido revela-se atrativo para diferentes

agentes e grupos profissionais já que permite pensar as diversas implicações nas práticas

profissionais, na definição das identidades ocupacionais e na própria relação com os clientes nas

seguintes dimensões:

“[n]a propriedade exclusiva de uma área de perícia e conhecimento, [n]o poder de definir a natureza dos

problemas nessa área, bem como [n]o controlo do acesso a soluções potenciais. Também inclui uma

imagem de relações de trabalho colegiais de assistência e suporte mútuos em vez de um controlo

hierárquico, competitivo e gestionário” (Evetts, 2003, p. 407).

Porém, o profissionalismo torna-se também um mecanismo disciplinar mesmo que

referido a um sistema de valores normativos. Ao relacionar-se como o desenvolvimento

profissional, manifesta-se muitas vezes na configuração de trabalhadores «autogeridos e

automotivados», com a expressão da sua autonomia limitada ao que a organização ou instituição

define como apropriado (Evetts, 2003, p. 408). Por isso, implementa-se a accountability e outros

22 Diversos autores perspetivam ainda as diferenças entre as lógicas de desenvolvimento organizacional e as lógicas do profissionalismo nos processos de profissionalização: “as lógicas do desenvolvimento organizacional e do profissionalismo são diferentes. Que lógica leva e melhora as ações quotidianas dos profissionais? Será, por um lado, a lógica do profissionalismo, ou será, por outro a lógica do desenvolvimento organizacional? A este respeito está-nos a faltar investigação empírica atualizada além das entrevistas de diretores ou gestores de qualidade, que muitas vezes contam narrativas legitimadoras acerca do sucesso da gestão de qualidade […]. Por exemplo, seria interessante investigar processos educacionais reais e as consequências para as diferentes partes implicadas antes e depois da introdução de sistemas de gestão de qualidade” (Jütte, Nicoll & Olesen, 2011, p. 27).

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indicadores de performance como manifestações do profissionalismo. Neste sentido, o

profissionalismo revela-se também na auditabilidade (Evetts, 2003, p. 408).

Especificidades e contradições na EFA

No campo da Educação e Formação de Adultos as considerações em torno da

profissionalização assumem múltiplos sentidos e outras tantas especificidades que se

relacionam com as tensões entre duas lógicas divergentes. Cada uma dessas lógicas

fundamenta-se em estruturas teóricas e ideológicas diferentes, relativas à missão dos agentes e

do trabalho desenvolvido neste campo (Kerka, 1996; Lauzon, 1998). Richard Edwards situa o

espaço dessas contradições:

“o trabalhador com adultos tem-se deparado com pressões crescentes para um maior profissionalismo e

uma maior responsabilização (accountability) em relação aos financiadores e gestores, em vez de para

eles mesmos ou pelo interesse ligado à ação social. Será notado que a pressão para ser construída

como uma profissão também advém parcialmente daqueles que trabalham no terreno, como parte de

uma estratégia de ganhar um maior estatuto, reconhecimento e, com isso, melhores pagamentos e

condições. Contudo, uma crescente responsabilização (accountability) e profissionalização também

suscitam uma maior governança da charneca (moorland) e daqueles que poderão ser considerados

trabalhadores legítimos e, assim, competentes” (Edwards, 1997, pp. 158-159).

Por um lado, com a profissionalização dos agentes e instituições de Educação e Formação

de Adultos, poderia apresentar-se como uma possibilidade para o desenvolvimento do próprio

campo. Refere-se que os principais benefícios da crescente profissionalização poderiam passar

por melhores salários e mais emprego; um maior estatuto e prestígio social e profissional; um

crescente reconhecimento social e uma maior credibilização dos profissionais que trabalham

nessa área. Correspondentemente, estes fatores traduzir-se-iam numa maior valorização da

própria Educação e Formação de Adultos que, em alguns casos, se considera ter tido uma

existência periférica (Galbraith & Gilley, 1986; Parke, 2000; Knox & Fleming, 2010).

Com a profissionalização pretende-se melhorar a atratividade das diversas ocupações

profissionais inseridas num campo, nomeadamente por aqueles com uma maior preparação

académica. Ao mesmo tempo, com a profissionalização, podia-se convencer aqueles que já

trabalham na área a permanecerem nesse campo de práticas (Mcintosh, 2008, pp. 35-52).

A profissionalização induziria a melhoria dos mecanismos de educação e formação inicial

e contínua fortalecendo gradualmente o corpo de conhecimento e aumentando as diversas

conexões entre o mundo académico e o mundo da prática profissional. O aprofundamento desse

relacionamento possibilitaria a reconfigurações dos conteúdos dos programas de graduação; das

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prioridades da Universidade e da aplicação de recursos. Estas mudanças implicariam

consequências não só nos corpos ‘profissionalizados’ mas também naqueles que trabalham em

part-time ou em regime de voluntariado e que não visam necessariamente possuir certificados

profissionais (Knox & Fleming, 2010).

Neste sentido, poderia superar-se uma situação que frequentemente é traduzida na

seguinte observação (ou em alguma variação): constata-se a pouca preparação teórica e o

relativo descomprometimento com as diversas tradições da EFA entre os trabalhadores do

campo. Desta forma, a profissionalização poderia induzir um maior compromisso individual com

as diversas tradições teóricas, com as comunidades locais e com as comunidades de prática.

Possibilitaria também uma melhor compreensão e aplicação dos conceitos, teorias e

abordagens, através de uma reflexão sobre a história e tendências passadas e das possíveis

direções futuras.

Outra das possíveis vantagens dos processos de profissionalização relaciona-se com a

implementação e adesão generalizada a códigos e padrões éticos. A existência de tais códigos,

com ou sem formas e sistemas de sanção, poderão promover uma cultura de «transparência e

de responsabilização» da educação de adultos, protegendo os educandos adultos de

incompetentes ou más práticas e condutas profissionais, elevando as expectativas sociais em

relação aos profissionais.

Além dessa autorregulação, a existência de códigos e padrões éticos poderia proporcionar

o desenvolvimento de outros mecanismos de regulação que poderiam ajudar a melhorar a

qualidade das práticas profissionais, além de contribuírem para a promoção de uma identidade

comum e mais coerente (Mcintosh, 2008). Assim, além da proteção dos

adultos/utentes/clientes, refere-se também um outro efeito relacionado com a proteção de

intervenções exteriores e com o desenvolvimento da autonomia profissional.

Com a profissionalização possibilitar-se-ia a criação de diferentes redes e relações

colaborativas, de organizações associativas e mesmo a criação e disseminação de diferentes

ações e regulações legislativas que poderiam ser benéficas para os próprios agentes

profissionalizados. Com melhores mecanismos de comunicação e com uma maior

estandardização das práticas aos níveis local e nacional, poder-se-ia estimular uma maior

atenção para os principais temas relacionados com a educação e aprendizagem dos adultos e

ajudar no agenda-setting junto da opinião pública e da comunicação social (Knox & Fleming,

2010).

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Por outro lado, há quem rebata cada uma dessas auspiciosas possibilidades. Contesta-se

a profissionalização da Educação e Formação de Adultos como um dos últimos redutos na

defesa de uma ação da educação de adultos mais «radical», mais socialmente consciente e

visando uma ordem social diferente.

Algumas dessas contestações enquadram-se numa crítica mais global aos modelos

socioeconómicos e científicos vigentes e à difusão das suas ideologias específicas. Os processos

de profissionalização implicados na Educação e Formação de Adultos seriam, portanto, uma

ameaça a uma das suas tradições, a radical, baseada na comunidade e ativista (Finger & Asún,

2003; Martin, 2008).

A educação e formação de adultos poderia tornar-se não reflexiva e, dessa forma, perder o

seu potencial criativo. A profissionalização tende a apresentar uma prática profissional de uma

forma apolítica e o conhecimento subjacente com um valor neutral. A articulação da educação

com a economia é concebida exclusivamente em termos de preparação para um emprego ou

para a reconversão profissionais (Lauzon, 1998).

De uma forma geral, as dinâmicas de profissionalização seriam um dos caminhos para o

desenvolvimento da hegemonia «neoliberal», tecnológica e pericial numa sociedade capitalista. O

discurso da profissionalização assentaria “naquilo que funciona” (Dale, 2003), ou seja, em

critérios economicistas de eficácia, e pode ser concebido como estando sustentado no culto do

profissionalismo e da eficiência (Collins, 1991) em detrimento do discurso que almeja a justiça

social. A racionalidade técnica subjacente parece tornar-se proeminente em relação a todas as

formas de pensamento e discurso humano. Verifica-se uma certa tecnicização dos agentes e das

organizações de EFA.

Os processos de profissionalização, implicando uma maior regulação e estandardização

das práticas a nível local e nacional, poderiam implicar também uma perda de uma variedade de

diferentes tipos de conhecimento e experiências. Simultaneamente, poder-se-ia reduzir ou perder

a possibilidade de organizar as diferentes atividades de educação de adultos de acordo com a

necessidade dos participantes locais e de movimentos sociais relevantes.

Com a profissionalização também se poderá reduzir o campo de possibilidades na ação

educativa e profissional e poderá traduzir-se numa perda da vocação, do espírito de militância e

do compromisso pessoal já que se tornaria simplesmente mais uma ocupação profissional ou

um emprego.

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Ao mesmo tempo, o exercício da autonomia profissional ficaria dificultado: as pressões

para a profissionalização e para a institucionalização poderiam derivar em diferentes

acomodações e cooptações de agendas organizacionais. Algumas dessas agendas encaram a

educação e formação de adultos numa dimensão instrumental e adaptativa às determinações da

economia e dos mercados de trabalho ou das preferências de consumo individuais, fazendo com

que a educação e a formação se torne mais uma «mercadoria» (commodity) e o educando como

mais um cliente.

Neste sentido, a profissionalização dos agentes da educação de adultos contribuiria para a

manutenção do status quo, através da disseminação de práticas, conhecimentos e competências

consideradas necessárias à prática da educação de adultos. Sendo os próprios educadores de

adultos beneficiários da «meritocracia educacional», teriam interesse em manter o estado das

coisas, que poderia afetar a sua aproximação e a sua responsabilidade para aqueles que se

colocam fora do mainstream (Kerka, 1996). Num sentido muito próximo, Ian Martin (2000)

encara a profissionalização como uma forma de respeitabilização, associada a uma cultura de

hierarquia e deferência (relacionado com o estado e ancianidade).

Mathias Finger e José Asún (2003, p. 129) sustentam que a “aprendizagem da nossa

saída”, expressão genérica para designar o retomar da tradição da educação de adultos de ação

e mudança social, passaria pela rejeição da “institucionalização das necessidades de educação

de adultos” e do “processo de profissionalização”, na medida em que se deveria contrariar a

existência de peritos e do seu conhecimento legitimados pela ciência e pela racionalidade

instrumental. A existência de agentes e sistemas periciais colocaria em perspetiva uma relação

de poder e controlo do acesso à profissão e também da produção do conhecimento considerado

válido e legítimo (e das formas sancionadas de aquisição), na medida em que esses agentes têm

tendência a controlarem normativamente o trabalho e a criar diversas barreiras institucionais

(Illich, 1977, pp. 15-27). Desta forma, para contrariar estas tendências dever-se-ia proceder à

desprofissionalização das diversas relações sociais, inclusivamente as educativas. Analisando a

crítica de Ivan Illich aos especialistas e à especíalização, Mathias Finger e José Asún escrevem o

seguinte:

“De facto, os agentes da institucionalização são os especialistas, os tecnocratas, e os profissionais.

Especialistas e cultura de especialização atraem cada vez mais especialistas. Além disso, os especialistas

têm tendência a cartelizar-se, criando “barricadas institucionais” – por exemplo, autoproclamando-se

guardiões e auto-seleccionando-se. E, por fim, controlam a produção de conhecimento, decidem sobre a sua

validade e legitimidade, além de sancionarem a sua aquisição” (Finger & Asún, 2003, pp. 20-21).

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III. Os profissionais de RVC: um processo de profissionalização

A designação «profissional de RVC» corresponde a uma atividade profissional que é

desempenhada no âmbito do Sistema Nacional de Reconhecimento, Validação e Certificação de

Competências (RVCC), designadamente nos Centros Novas Oportunidades23.

Essa ocupação profissional é de emergência recente24 (desde 2000) e concretiza-se na

organização, orientação e aconselhamento de candidatos/adultos em processos de

reconhecimento, validação e certificação de competências.

Genericamente, o profissional de RVC acompanha os candidatos a certificação no

processo de identificação dos seus saberes e na validação das competências manifestadas

através da combinação de diferentes métodos de avaliação, tais como entrevistas em

profundidade, debates e o uso de portefólios.

No desenvolvimento das suas atividades, o profissional de RVC promove e dinamiza

diferentes sessões em que, através de entrevistas, conversas e debates (individuais ou grupais),

recolhe ou aprofunda diferentes informações relativas, por exemplo, às situações, expectativas e

objetivos pessoais.

Nessas sessões também orienta a elaboração do portefólio onde cada um dos candidatos

evidenciará as suas competências. Refira-se que esse documento será avaliado pelos

formadores e por um elemento externo ao CNO, o Avaliador Externo, que confirmará (ou não) a

validação prévia efetuada pela equipa (constituída pelo próprio e pelos diversos formadores) e a

certificação através de uma apresentação do candidato num júri público.

Além do esclarecimento de diferentes dúvidas, através do acompanhamento das referidas

atividades também são promovidas diversas situações e momentos de autoavaliação e de

reflexão individual, diferentes estratégias de motivação e aconselhamento individual.

23 São diferentes os contextos institucionais em que os profissionais de RVC desenvolvem as suas funções. De uma forma geral pode-se afirmar que os CNO podem ser promovidos por entidades formadoras, públicas e privadas (lucrativas ou do terceiro sector). Inicialmente as entidades promotoras de Centros de RVCC eram principalmente entidades privadas e associativas. A partir de 2006, com a Iniciativa Novas Oportunidades, começou-se a inverter essa distribuição. De acordo com os dados da ANQ (relativos a 31 de julho de 2011), a predominância era de entidades na esfera da Administração Pública (tanto da administração central do Estado como da Administração Regional e Local do Estado). A 31 de Julho de 2011 mais de metade dos CNO eram promovidos por entidades públicas. 24 Dados de 2010 revelados no relatório Estado da Educação 2011. A Qualificação dos Portugueses editado pelo CNE (2011) referem que os profissionais de RVC constituem 19% dos elementos das equipas técnico-pedagógicas. Sem especificar outros dados relativos aos profissionais de RVC, revela-se também que o total de elementos das equipas é de 11611. Portanto, fazendo uma simples conta percebe-se que os profissionais de RVC seriam cerca de 2206. No entanto, parece-nos que esses dados não são fidedignos já que considerando 459 CNO existentes nesse mesmo ano, representariam uma média de 4,8 profissionais de RVC por centro, número que é inverosímil já que a grande parte dos CNO terão no máximo quatro profissionais. De acordo com o nosso raciocínio e considerando, na melhor das circunstâncias, que serão 4 profissionais de RVC por CNO isso representaria 1836 profissionais de RVC, número que mesmo assim consideramos excessivo.

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No desempenho das suas funções o profissional de RVC combina distintas teorias e

referências metodológicas (da educação de adultos, da orientação vocacional, da gestão de

recursos humanos, etc.) e outros saberes e competências (pessoais e interpessoais,

instrumentais) tais como aqueles referidos ao balanço de competências e às abordagens

autobiográficas: diferentes técnicas de comunicação; métodos de tutoria apropriados às

características pessoais; dinâmicas de grupo; entre outros.

Para melhor enquadrarmos o processo de profissionalização dos profissionais de RVC

torna-se necessário abordarmos como se estruturou e ainda se estrutura o Sistema Nacional de

RVCC. Posteriormente, examinaremos a inclusão da referida atividade e ocupação profissional

num campo específico de práticas, o Aconselhamento e a Orientação, para depois incidirmos

sobre como se realiza o desenvolvimento profissional nas suas diversas dimensões: em termos

de espaços e processos de aprendizagens; das suas referências educativas e identidades

profissionais; no perfil de competências e na regulação da atividade.

O Sistema Nacional de RVCC

O Sistema Nacional de RVCC é configurado pelo conjunto de serviços através dos quais se

reconhecem, validam e certificam os saberes e os conhecimentos adquiridos ao longo da vida,

em diferentes espaços de aprendizagem: nos contextos escolares e formativos, na vida

quotidiana (relacionados com os diferentes interesses individuais) e também no contexto do

trabalho (Pires, 2002, pp. 476-478; CNE, 2011, p. 134).

Esse sistema é enquadrado por diversos dispositivos normativos e é formado pela Rede de

CNO (anteriormente designados por Centros de RVCC), estruturas promovidas por entendidas

públicas e privadas e que possuem uma equipa constituída por diversos elementos com funções

e responsabilidades diferenciadas: diretor, coordenador, administrativos; técnicos de diagnóstico

e encaminhamento, profissionais de RVC e formadores.

Os CNO são encarados como a “porta de entrada” (Gomes & Simões, 2007, p. 10) para

as diversas ofertas educativas e formativas direcionadas aos cidadãos com mais de 18 anos que

pretendam iniciar ou continuar percursos de qualificação.

A configuração institucional e organizacional dos CNO e as diversas atividades aí

desenvolvidas (diagnóstico e encaminhamento e processos de RVC) pretendem induzir o

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“reconhecimento individual da capacidade de aprender, o que constitui o principal mote para a

adoção de posturas pró-ativas face à procura de novas qualificações” (Eurydice, 2007b, p. 53).

Após os candidatos serem encaminhados para os processos de RVCC – uma das

possibilidades dos inscritos nos CNO – são utilizadas metodologias e instrumentos específicos

(abordagens autobiográficas, balanços de competência e portefólios reflexivos de aprendizagem,

entre outros) que permitem que cada um dos «candidatos» reconheça, demonstre e especifique

as suas competências (ou seja, os saberes em ação) e os recursos associados a essas

competências (ou seja, os conhecimentos, as capacidades e os saberes-fazer).

As competências e recursos manifestados pelo candidato são avaliados (pelo próprio e

pela equipa que o acompanha – profissional de RVC e formadores) na sua conformidade a um

padrão específico designado por Referencial de Competências-Chave (de nível Básico e

Secundário). Após essa avaliação e através de um júri de certificação25 são possibilitados dois

tipos de certificação (parcial ou total), em quatro níveis diferentes (B1, B2, B3 e Secundário)

equivalentes a quatro níveis de qualificação escolar: 4º, 6º, 9º e 12º anos, respetivamente.

Na implementação desse sistema foram referidas três grandes objetivos: 1) a elevação

dos níveis de qualificação da população portuguesa e a convergência gradual com os padrões

médios europeus. Desejava-se, dessa forma, tentar corrigir as debilidades estruturais que

afetavam (e afetam) a competitividade, a qualidade do emprego e a sustentabilidade da

economia portuguesa. Pressupunha-se que o modelo de desenvolvimento da sociedade e da

economia portuguesa se daria pela ampliação e ajustamento da oferta educativa aos diferentes

perfis individuais; 2) a facilitação do reconhecimento, validação e certificação das competências

dos diferentes indivíduos que o desejassem. Invocavam-se razões de «justiça social» que

visavam a diminuição das discriminações sociais relacionadas com as desigualdades e

diferenciais de qualificação; 3) o desenvolvimento de um sistema articulado de educação e

formação numa perspetiva de aprendizagem ao longo da vida que permitisse o acesso

generalizado das populações adultas a atividades que permitissem a “progressão educativa,

tecnológica, cultural e profissional” (Portaria n.º 1082-A/2001, de 5 de Setembro).

Como sustentado no relatório que sintetizava o Debate Nacional sobre a Educação

realizado em 2007, e que enformava essa retórica:

25 O júri de certificação é uma sessão pública onde o candidato apresenta o trabalho desenvolvido no desenvolvimento do seu portefólio reflexivo de aprendizagens. Essa apresentação é feita perante um grupo de jurados constituídos pela equipa que o acompanhou (profissional de RVC e formadores) e um outro elemento, o Avaliador externo, uma figura externa ao CNO e que tem a função de confirmar (ou infirmar) a validação efetuada pela equipa e legitimar a certificação do candidato (Gaspar, Milagre & Lima, 2009).

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“a adopção do paradigma da aprendizagem ao longo da vida trará profundas alterações às políticas

educativas do país, desde a sua concepção à sua execução. Este paradigma requer desde logo uma

grande disponibilidade das instituições educativas para acolher todos os cidadãos, independentemente

da sua condição, idade e estatuto social. A aprendizagem ao longo da vida deve ser entendida por toda a

sociedade como uma condição de cidadania activa e como um longo percurso de apoio a cada cidadão,

especialmente aos jovens e adultos que vivem em condições sociais mais desfavorecidas e que se

encontrem em situações de maior vulnerabilidade” (CNE, 2007, p. 161).

A implementação do Sistema Nacional de RVCC apresentou algumas particularidades:

privilegiou a procura educativa e formativa e descentrou-se da capacidade de oferta; permitiu o

desenvolvimento de novas metodologias e tecnologias educativas e de aprendizagem; considerou

as características sociais e económicas (o declínio demográfico, as «novas» necessidades de

qualificação e a ineficiência de outras respostas, por exemplo, o ensino recorrente); e foi

implementado por iniciativa política, através de diferentes reformas e de regulamentação legal

(Pires, 2002; Ávila, 2005).

Até ao ano de 2012 foram quatro as entidades governamentais que desenvolveram,

regularam e supervisionaram o Sistema Nacional de RVCC e a rede de Centros: a Agência

Nacional de Educação e Formação de Adultos (ANEFA); a Direcção-Geral de Formação

Vocacional (DGFV); a Agência Nacional para as Qualificações (ANQ) e a Agência Nacional para as

Qualificações e Ensino Profissional (ANQEP).

Não se pretendendo proceder a uma análise exaustiva dessas mesmas instituições, é

necessário fazer um pequeno enquadramento das suas especificidades para melhor se

compreender as alterações do Sistema Nacional de RVCC.

Da ANEFA à DGFV: um pouco de história…

Os Centros de RVCC surgiram no âmbito da ANEFA, uma agência governamental

formalmente criada a 28 de Setembro de 1999, no fim do mandato do primeiro governo liderado

por António Guterres, do Partido Socialista26. Entre outras atribuições, a ANEFA responsabilizava-

se pela construção gradual de um sistema de reconhecimento e validação das aprendizagens

informais dos adultos, visando a certificação escolar e profissional.

26 A ANEFA foi formalmente criada através do Decreto-Lei 387/1999 de 28 de Setembro, na sequência da constituição, em 1998, do Grupo de Missão para o Desenvolvimento da Educação e da Formação de Adultos (pela resolução do Conselho de Ministros nº92/1998, de 14 de Julho). Refira-se também que foi criada no XIII Governo Constitucional vigente entre 28/10/1995 a 25/10/1999.

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Em Novembro de 2000 constituiu-se uma rede de seis Centros de RVCC, promovidos por

diversas entidades de várias regiões do país27. Na sua fase de instalação pretendia-se que

estivessem articulados para conjuntamente adequarem, reformularem e implementarem o

modelo de intervenção e os diversos instrumentos a utilizar nos processos de RVCC (Nico, 2011,

pp. 83-85).

No ano seguinte, em 2001, foi criada e implementada a rede nacional de Centros de

RVCC a partir da qual se operacionalizava o Sistema Nacional de RVCC28. Enquadrado dentro da

Estratégia Europeia para o Emprego e do Plano Nacional de Emprego, a missão deste sistema

era dar

“a oportunidade a todos os cidadãos, e em particular aos adultos menos escolarizados e aos activos

empregados e desempregados, de verem reconhecidos, validados e certificados os conhecimentos e as

competências que foram adquirindo por via não formal ou informal, em diferentes contextos de vida e de

trabalho, e, ainda, em inúmeras acções de formação realizadas nos mais diversos domínios e com as

mais diversas durações” (do Preâmbulo da Portaria nº 1082-A/2001, de 5 de Setembro).

Os Centros de RVCC passaram a ter a atribuição de acolher e orientar para o processo de

RVCC os adultos maiores de 18 anos que não possuíssem o 9º ano de escolaridade. Pretendia-

se o aumento dos níveis de certificação escolar e de qualificação profissional e a mobilização

para a continuidade de processos de formação contínua.

As entidades promotoras dos Centros de RVCC poderiam ser entidades públicas ou

privadas com significativa implantação local, regional ou nacional, que se constituiriam por sua

própria iniciativa e não diretamente emanadas das estruturas centrais do Estado.

Pretendia-se um modelo de intervenção descentralizada e territorializada. Para cumprirem

esse desígnio os Centros deveriam assegurar um modelo de itinerância29, ou outros apropriados,

27 Na região Norte, a Associação Industrial do Minho e a Associação Comercial de Braga; na região de Lisboa e Vale do Tejo, Escola Nacional de Bombeiros e Instituto de Emprego e Formação Profissional – Centro de Formação Profissional do Seixal; na região do Alentejo, a Agência para o Desenvolvimento Local do Alentejo Sudoeste (Nico, 2011, p. 84). 28 Os CRVCC e o SNRVCC foram criados pela Portaria nº 1082-A/2001, de 5 de Setembro (revogada pelas Portarias nº 286-A/02, de 15 de Março, e nº 86/2007, de 12 de Janeiro). Esta portaria referia também o número de novos Centros de RVCC a abrir: até ao ano de 2006 mais 78% de centros. Anualmente seriam criados 14 novos centros, com a exceção do ano de 2001 em que seriam criados 22 centros. O SNRVCC e os CRVCC estavam enquadrados pelo terceiro Programa Operacional da Educação (PRODEP III), vigente entre os anos de 2000 e 2006, aprovado pela Comissão Europeia a 13 de Julho de 2000 que admitia a necessidade de se “instituir um Sistema de Acreditação de Conhecimentos e Competências adquiridas fora do sistema escolar”. Esse sistema, sob o signo de “estimular a Educação e a Formação ao Longo da vida (como medida potenciadora da capacidade competitiva do país)” e a melhoria das condições de empregabilidade, cumpriria, na sua idealização, um triplo objetivo: 1) apoiar, orientar e estimular a procura de educação/formação (facilitando a construção do percurso educativo dos indivíduos e a procura de ações de formação posteriores); 2) processar a informação necessária para a organização das ofertas formativas adequadas pelo sistema educativo; 3) estimular a flexibilização e modulização das novas ofertas escolares. 29 A itinerância consiste no desenvolvimento das atividades em instalações mais próximas dos interessados. Implica portanto a deslocação das equipas e não o inverso.

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de forma a permitir uma maior proximidade e, consequentemente, um maior acesso de todos os

candidatos selecionáveis aos seus serviços.

De acordo com a referida Portaria, ambicionava-se que os Centros cumprissem seis

funções essenciais que sustentassem e consolidassem os seus princípios de intervenção: 1)

animação local; 2) informação; 3) aconselhamento; 4) acompanhamento; 5) formações

complementares e 6) provedoria.

Cada Centro deveria também integrar um Clube S@ber +, um dispositivo de animação

local, que desempenhasse as funções de informação e aconselhamento e assegurasse, direta ou

indiretamente (através de parcerias), a oferta permanente de cursos de Educação e Formação

de Adultos (EFA).

Na definição do seu campo de ação os centros de RVCC teriam de delinear um «plano

estratégico de intervenção», um documento em que se definia o contexto de intervenção, as

diferentes ações projetadas e a sua programação temporal. Esse plano deveria também

contemplar a dinamização das parcerias e da sua rede local de funcionamento; especificar as

ações de informação e divulgação que se pretendiam desenvolver e enunciar os indicadores de

verificação que permitiam a avaliação do cumprimento das metas estabelecidas30.

O acompanhamento e a monitorização das atividades dos Centros era da

responsabilidade da ANEFA. Além da verificação do plano anteriormente referido promover-se-ia

o cumprimento da Carta de Qualidade, um documento onde estavam estipulados os valores,

princípios e compromissos que deveriam orientar e balizar as atividades do Centro, numa

perspetiva de «melhoria contínua da qualidade» dos serviços prestados.

Desde o início do Sistema Nacional de RVCC começa-se a destacar um dos seus traços

distintivos: a contratualização de um serviço público de educação (mesmo em entidades do

Estado) e formas de controlo administrativos e estruturados em torno da obtenção de resultados.

Como sustenta Fátima Antunes:

“Esta assimilação de base contratualista permite ao Estado desenhar a política e promover o serviço,

distanciando-se expeditamente de requisitos, normas ou práticas associadas aos sistemas públicos e

que pretende suprimir (por exemplo, o estatuto, vínculos, condições laborais, direitos e organizações

sindicais dos agentes estatais), enquanto simultaneamente se reserva um amplo espaço para regular e

controlar a rede de provisão como se de um sistema estritamente estatal se tratasse. O alcance

estratégico desta particular indistinção entre público e privado revela-se no forte dispositivo de controlo

administrativo que vincula os fornecedores do serviço à agência central de tutela” (Antunes, 2011, p.

19).

30 Definidas pela ANEFA e também, ainda que indiretamente, pelo PRODEP III – 2000-2006, o programa financiador.

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O trabalho desenvolvido nos Centros de RVCC organizava-se a partir do Referencial de

Competências-Chave para a Educação e Formação de Adultos. Esse referencial havia sido criado

por uma equipa multidisciplinar31 e pretendia cumprir uma tripla função: servir de “quadro

orientador” para o RVCC; ser o fundamento do “desenho curricular assente em competências-

chave”; e servir de “guia para a concepção da formação de agentes de EFA” (Alonso, et al.,

2002, p. 12).

Nesse referencial foram estipuladas quatro áreas de competências-chave: Cidadania e

Empregabilidade; Linguagem e Comunicação; Matemática para a Vida e Tecnologias de

Informação e Comunicação.

As três últimas áreas de competência referidas possuíam um carácter mais «instrumental

e operatório», que se relacionavam com competências básicas de literacia (incluindo a literacia

digital) e numeracia. Já a área de Cidadania e Empregabilidade, com uma feição mais

«transversal e abrangente», relacionava-se com as competências pessoais, interpessoais e

sociais. Cada uma dessas áreas tem três níveis de complexidade crescente correspondente a

três níveis de qualificação escolar: Básico 1 (4º ano); Básico 2 (6º ano) e Básico 3 (9º ano).

Desde o início dos Centros de RVCC que se pretende que o Referencial seja abordado de

uma «forma articulada, integrada e flexível», isto é, que se considerem as possibilidades de

articulação entre as diversas competências de cada área de competência-chave para que se

adeque o trabalho e a demonstração das competências às características dos indivíduos ou

grupos:

“Entendido assim como um quadro estruturador e orientador, o referencial deve ser o suficientemente

aberto de forma a permitir a sua adaptabilidade à diversidade de grupos sociais e profissionais, em vez de

serem estes a terem que se adaptar ao referencial. Isto implica que, a partir de um conjunto de

competências-chave definidas a nível nacional, se incentive a construção local de projectos de formação e de

validação de competências, numa concepção descentralizada do processo.

[…] Para isso, torna-se prioritário a preparação de equipas de profissionais capacitados para fazerem a

mediação entre o referencial e os contextos diversos e plurais, através da construção de dispositivos

técnicos e de materiais curriculares que possam vir a completar, reconstruir e enriquecer o referencial.

Neste sentido, parece desejável a disponibilização de dispositivos de investigação-acção e acompanhamento

que permitam testar, experimentar e validar no terreno a proposta apresentada, antes de proceder à sua

progressiva disseminação (Alonso, et al., 2002, p. 13).

Saliente-se que esta abordagem apresentou algumas originalidades. De acordo com

Patrícia Ávila uma das principais inovações na implementação do Sistema Nacional de RVCC foi

o desenvolvimento de um modelo curricular estruturado em torno de um conjunto de

31 Constituída por Luísa Alonso, Luís Imaginário, Justino Magalhães, Guilhermina Barros, José Manuel Castro, António Osório e Fátima Sequeira

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competências que haviam sido definidas considerando a sua adequação às principais exigências

das sociedades contemporâneas:

Um dos pontos de maior inovação, comum a ambas as acções (cursos EFA e CRVCC), é o

desenvolvimento de um modelo curricular/sistema de reconhecimento, validação e certificação guiados,

não por programas disciplinares, mas por um Referencial de Competências-Chave […] o instrumento de

base fundamental que sustenta (e orienta) o desenvolvimento, quer dos cursos EFA, quer dos processos

de RVCC (Ávila, 2005, p. 324).

Com a utilização desse modelo pretendia-se romper com a lógica de programa disciplinar

associado ao modelo escolar e, ao mesmo tempo, organizar e orientar operacionalmente os

processos de RVCC e os cursos EFA. Para Patrícia Ávila, o Referencial de Competências-Chave

constitui um instrumento

“que conjuga, pelo menos, uma dupla função: orienta o reconhecimento das competências previamente

adquiridas e constitui a principal base de trabalho para as etapas seguintes dirigidas explicitamente à

aquisição e desenvolvimento das competências em falta” (Ávila, 2005, p. 328).

Em 2002, na sequência de uma mudança de Governo e uma reorientação de políticas

educativas a ANEFA foi formalmente extinta32. Todas as suas atribuições foram transferidas para

a comissão instaladora da Direcção-Geral de Formação Vocacional (DGFV), entidade criada no

início do mandato do XV Governo Constitucional33.

Apesar das alterações verificadas com as diversas mudanças governativas, a configuração

e os objetivos do Sistema Nacional de RVCC e os Centros de RVCC não foram transformados.

Aliás, durante o período de existência da DGFV, a rede de Centros continuou a crescer e

procedeu-se à acreditação de novos avaliadores externos e de novas entidades promotoras de

Centros de RVCC. Foi também aprovado um novo regulamento34 que definia o regime de acesso

aos apoios concedidos no âmbito do terceiro Quadro Comunitário de Apoio.

32 Pelo Decreto-Lei 208/2002 de 17 de Outubro, que aprovava a nova orgânica do Ministério da Educação. 33 Esse Governo (06/05/2002 a 17/07/2004) foi liderado por José Manuel Durão Barroso, do Partido Social Democrata). A DGFV foi mantida durante o período de existência do Governo seguinte (17/07/2004 a 12/03/2005), resultante de um acordo de incidência parlamentar entre o PSD e o CDS-PP (tal como no governo anterior) e liderado por Pedro Santana Lopes, do PSD. 34 Despacho conjunto n.º 24/2005 de 10 de Janeiro de 2005, que revogava o Despacho conjunto nº 262/2001, de 12 de Fevereiro). Nesse despacho referia-se possibilidade dos avaliadores externos (e outros intervenientes no processo de RVCC) serem abrangidos para a implementação de ações de formação e outras alterações sem particular relevância relacionadas, por exemplo, com a titularidade dos direitos de autor produzidos no âmbito do cofinanciamento, que deveriam ser transmitidos à DGFV, e com a fixação dos montantes máximos elegíveis das tabelas remuneratórias do pessoal interno.

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A Iniciativa Novas Oportunidades e a ANQ

Com nova mudança de governo verificaram-se reestruturações nas políticas e nas

entidades que orientavam e supervisionavam o Sistema Nacional de RVCC e a rede de Centros

de RVCC.

Em 2005, logo no início do mandato do governo liderado por José Sócrates35, no

documento designado por «Grandes Opções do Plano para 2005-200936», foi enunciado o

objetivo de “alargar as oportunidades de aprendizagem ao longo da vida”. Enunciava-se um

conjunto de medidas que iriam ser tomadas que permitissem “dar um novo impulso à educação

de adultos”, objetivo já contemplado nas Bases Programáticas do Partido Socialista para as

Eleições Legislativas de 200537.

Entre outras medidas relativas à Educação de Adultos, encontra-se a referência à melhoria

do sistema de reconhecimento, validação e certificação de competências, por três vias que se

complementariam. Primeiramente proceder-se-ia à ampliação da rede de Centros de RVCC,

fundamentalmente em Centros de Formação Profissional e em sedes de agrupamentos de

escolas. Permitir-se-ia também o processo de RVCC até o nível secundário, constituindo-se uma

“segunda oportunidade de certificação para os cerca de 400 mil activos que, na última década,

passaram por este nível de ensino e não o completaram”. Também se incrementaria a eficiência

do sistema, para que se quadruplicasse, até ao final da legislatura, o número de diplomas

atribuídos.

Passados alguns meses, numa das resoluções do Conselho de Ministros que aprovava o

«Programa Nacional de Acção para o Crescimento e o Emprego 2005-200838», surge a

referência à Iniciativa Novas Oportunidades. Segundo esse programa, pretendia-se

“fazer do 12.º ano o referencial mínimo de formação para todos os jovens, apostando, no caso dos

jovens, no reforço do ensino profissionalizante de dupla certificação e, nos adultos, na expansão da

oferta de cursos de educação e formação e no alargamento do sistema de RVCC”.

35 XVII Governo Constitucional - 12/03/2005 a 26/10/2009; liderado por José Sócrates, do Partido Socialista. 36 Lei n.º 52/2005, de 31 de Agosto. 37 Nesse documento considera-se o seguinte: “Em matéria de educação de adultos, é necessário recuperar o impulso perdido desde a liquidação da Agência Nacional de Educação e Formação de Adultos, que havia sido lançada pelo PS. É o que faremos, de modo a aumentar o investimento público e induzir a participação da sociedade civil na formação académica e profissional relevante para mulheres e homens adultos. E estenderemos progressivamente ao nível do ensino secundário os processos de reconhecimento, validação e certificação das competências adquiridas e os cursos de educação-formação que tão bons resultados já demonstraram ter ao nível da educação básica. A rede de escolas secundárias e profissionais constitui, a este respeito, um recurso não negligenciável”(PS, 2005, p. 50). 38 Resolução do Conselho de Ministros n.º 183/2005, de 28 de Novembro.

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Passados poucos dias, uma outra resolução aprovava o «Plano Tecnológico39 - Uma

estratégia de crescimento com base no conhecimento, na tecnologia e na inovação».

Reafirmavam-se os objetivos anteriormente referidos e sustentava-se que o Sistema de RVCC

“deve ser encarado como via estratégica para envolver adultos em percursos qualificantes na justa

medida em que permite reconhecer as competências adquiridas pela experiência, ao mesmo tempo que

propõe itinerários formativos diversificados”.

No ano seguinte, em 2006, a Direcção-Geral de Formação Vocacional é objeto de

reestruturação e passa a designar-se Agência Nacional para a Qualificação, passando a integrar

a administração indireta do Estado40. Realce-se, no entanto, que só em 2007 é formalmente41

criada e aprovada a estrutura orgânica da ANQ, organismo de tutela ministerial conjunta entre o

Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e o Ministério da Educação, que passa a ter por

missão a coordenação e execução das políticas de educação e de formação profissionais de

jovens e adultos e também o desenvolvimento e a gestão do sistema de RVCC.

As atribuições da ANQ relativamente ao Sistema de RVCC passam por participar na

definição da orientação estratégica, das opções políticas e do regime legal; pelo desenvolvimento

e gestão do sistema, assegurando a coordenação da Rede de Centros; pela operacionalização,

acompanhamento, monitorização e avaliação do sistema; pela participação no desenvolvimento

de referenciais de formação inicial e contínua dos profissionais envolvidos na oferta de EFA; pela

dinamização da investigação e a inovação nos currículos, nas metodologias e recursos

pedagógicos e pela participação em redes e parcerias de informação, experimentação e

transferência de conhecimento.

O ano de 2006 foi um ano de outras transformações: foi aprovado e editado o

«Referencial de Competências-Chave - Nível Secundário» (a ser utilizado nos Cursos EFA e nos

processos de RVCC), que abriu caminho aos processos de RVCC de Nível Secundário. Este

referencial é estruturado por três áreas de competências-chave: Sociedade, Tecnologia e Ciência;

Cultura, Língua, Comunicação e Cidadania e Profissionalidade.

No entanto, a maior transformação relacionou-se com o aumento abrupto do número de

Centros de RVCC que iniciaram atividades. De 98 Centros de RVCC em funcionamento em 2005

39 Resolução do Conselho de Ministros n.º 190/2005, de 16 de Dezembro. 40 Através do Decreto-Lei n.º 213/2006 de 27 de Outubro (lei orgânica do Ministério da Educação). 41 Através do Decreto-Lei n.º276-C/2007 de 31 de Julho. Saliente-se que nesse mesmo ano o Governo, depois do acordo com os parceiros sociais, decidiu aprovar a Reforma da Formação Profissional (Resolução do Conselho de Ministros nº 173/2007, de 7 de Novembro), o Sistema Nacional de Qualificações (Decreto-Lei nº 396/07, de 31 de Dezembro), integrando o Quadro Nacional de Qualificações, o Catálogo Nacional de Qualificações e a Caderneta Individual de Competências, e o Sistema de Regulação de Acesso a Profissões.

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passou-se para 274 em 2006 (significando uma subida de 179,6%). O objetivo seria que em

2010 estivessem em funcionamento 500 centros. Passados dois anos continuou-se a observar a

tendência de crescimento acelerado da Rede de Centros. Do ano de 2007 (271 Centros) para o

seguinte (2008 - 463 centros) a Rede de Centros cresceu 70,8%42.

Alargava-se a cobertura territorial para se tentar concretizar as ambiciosas metas

estipuladas nos anteriormente referidos «Plano Tecnológico» e o «Plano Nacional de Acção para

o Crescimento e Emprego 2005-2008». Este último estipulava que, no respeitante ao Eixo

Adultos, se pretendia qualificar 1.000.000 de ativos até 2010; alargar o referencial de

competências chave aplicado no sistema de reconhecimento, validação e certificação de

competências (RVCC) ao 12.º ano; triplicar a oferta de cursos técnicos e profissionais para a

educação e formação de adultos, atingindo em 2010, 107.000 vagas (65.000 ao nível do 12.º

ano e 42.000 do 9.º ano) e cerca de 350.000 adultos; criação de 400 novos Centros de RVCC

até 2010, abrangendo cerca de 650.000 ativos.

Complementarmente, esse governo ainda procedeu à reforma e reorganização da

estrutura institucional do sistema de formação profissional. No último dia do ano de 2007 foi

formalmente criado o Sistema Nacional de Qualificações43. Esse sistema assume os objetivos e

princípios já afirmados com a implementação da Iniciativa Novas Oportunidades44 e acordados

com os diversos parceiros sociais. Nesse sistema é promovida a criação dos instrumentos

necessários à sua execução (Catálogo Nacional de Qualificações; Quadro Nacional de

Qualificações45 e Caderneta Individual de Competências), e a articulação com os instrumentos

financeiros disponíveis (Quadro de Referência Estratégico Nacional 2007-2013), almejando a

42 Esta nova abertura estava já enquadrada dentro do Quadro de Referência Estratégica Nacional 2007-2013 (aprovado em 2007 pelo Decreto-Lei n.º312/2007 de 17 de Setembro) que, através do Programa Operacional Potencial Humano, nomeadamente na sua Tipologia de Intervenção 2.1 – Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências assume grande parte do financiamento necessário ao SNRVCC. 43 Com a publicação do Decreto-Lei 396/2007 de 31 de Dezembro, referindo-se aos trabalhos desenvolvidos pela implementação do quadro europeu de qualificações para a Aprendizagem ao Longo da Vida (European Qualifications Framework). A coordenação do Sistema Nacional de Qualificações é assumida pelos membros do governo com responsabilidades nas áreas da formação profissional e da educação (na altura, Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e Ministério da Educação) e conta com a participação dos diversos parceiros sociais através do Conselho Nacional da Formação Profissional, do Conselho Geral da ANQ e da comissão de acompanhamento do sistema de certificação de qualidade das entidades formadoras. 44 Diminuir o défice de qualificações da população portuguesa por razões de justiça social e de desenvolvimento pessoal e económico, apostando numa dupla certificação (escolar e profissional); promover a generalização do nível secundário como qualificação mínima da população e novas oportunidades de qualificação. 45 O Catálogo Nacional de Qualificações foi criado pela Portaria nº 781/2009 de 23 de Julho. Foi concebido como um “instrumento de gestão estratégica das qualificações de nível não superior, contendo o conjunto de referenciais essenciais para a competitividade e modernização das empresas e da economia, bem como para o desenvolvimento pessoal e social dos cidadãos”; O Quadro Nacional de Qualificações, criado pela Portaria nº 782/2009 de 23 de Julho e implementado a partir de Outubro de 2010, define a estrutura e os descritores dos níveis de qualificação, baseando-se no Quadro Europeu de Qualificações.

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integração dos diversos sectores e sistemas de qualificação. Como destacado no Preâmbulo

desse decreto-lei:

“A estratégia fundamental passa por assegurar a relevância da formação e das aprendizagens para o

desenvolvimento pessoal e para a modernização das empresas e da economia, assegurando ao mesmo

tempo que todo o esforço nacional em formação é efectivamente valorizado para efeitos de progressão

escolar e profissional dos cidadãos, quer de forma direta, através da formação de dupla certificação

inserida no Catálogo Nacional de Qualificações, quer de forma indireta, através dos centros novas

oportunidades e do processo de reconhecimento, validação e certificação de competências”.

Figura 1 - Evolução da Rede de Centros (RVCC e Novas Oportunidades)

Reorientação da intervenção dos Centros Novas Oportunidades

Relativamente ao Sistema Nacional de RVCC e à rede de Centros tem-se verificado uma

linha de continuidade apesar das mudanças governativas, políticas e organizacionais. Aliás, com

a Iniciativa Novas Oportunidades verifica-se uma grande expansão dos CNO e uma certa

centralidade dos mesmos na política pública relativa à Educação e Formação de Adultos.

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Algumas das mudanças ocorridas passaram pela clarificação de procedimentos e

alteração de designações, verificando-se outras, no entanto, que assumiram um carácter mais

estruturante. Realcemos algumas das mais relevantes que implicaram diversas alterações na

ação dos Centros e dos agentes e equipas que aí desenvolvem as suas atividades profissionais.

No ano de 2007 adotaram-se outras resoluções46 que pretendiam a “flexibilização,

desburocratização e desconcentração administrativa” do Sistema Nacional de RVCC através da

supressão do concurso de acreditação das entidades promotoras. Entre outras mudanças,

concretizaram-se: o alargamento do campo de ação dos Centros de RVCC, através do

encaminhamento para diferentes percursos educativos e formativos adequados aos indivíduos; a

alteração na designação dos Centros de RVCC que passam a ser denominados por Centros

Novas Oportunidades; o condicionamento do acesso a processos de RVCC de nível secundário

aos adultos com mais de 18 anos e 3 anos de experiência profissional; a possibilidade de

extinção dos Centros Novas Oportunidades, por incumprimento das orientações legislativas ou

por avaliação negativa das estruturas de acompanhamento (leia-se ANQ); o abandono dos

Clubes S@ber+; a distinção das equipas em termos de “permanente e não permanente” e a

possibilidade dos candidatos se proporem autonomamente a validação em sessão de júri.

Porém, as mudanças mais significativas ocorrem a partir de 2008, com a publicação da

Portaria nº 370/08, de 21 de Maio, que clarifica os princípios e procedimentos mais

estruturantes e cria formalmente novas funções profissionais. A partir desse momento, os CNO

reorientam a sua ação para passarem a assumir mais explicitamente a função de diagnóstico de

necessidades educativas e formativas e a definição de perfis individuais, previamente à entrada

em processos de RVCC. Assim, a orientação e aconselhamento individuais e o encaminhamento

para diferentes ofertas de educação e formação que se adequassem ao “perfil, necessidades,

motivações e expectativas de cada adulto”, tornam-se assim mais particularmente relevantes na

ação dos CNO.

O reconhecimento, validação e certificação de competências adquiridas ao longo da vida,

passa a cumprir uma dupla função: 1) o posicionamento dos adultos em percursos de

qualificação e 2) a obtenção de um nível de escolaridade e de qualificação. Como está definido

no preâmbulo da Portaria n.º 370/2008 de 21 de Maio), a

“actividade dos Centros Novas Oportunidades dirige-se a adultos sem qualificação ou com uma

qualificação desajustada ou insuficiente face às necessidades dos indivíduos e do mercado de trabalho,

assegurando o encaminhamento dos mesmos para a resposta mais adequada e, quando se justifique,

46 Com a Portaria nº 86/2007 de 12 de Janeiro.

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procedendo ao desenvolvimento de processos de reconhecimento, validação e certificação das

aprendizagens obtidas por via da experiência adquirida e de formações não certificadas, que podem ser

completadas através de acções de formação de duração variável, em função das necessidades

diagnosticadas”.

Em termos de equipa, os CNO continuam a ser dirigidos e coordenados por duas figuras,

o Director e o Coordenador.

O Diretor é o representante institucional do CNO, sendo essa função exercida pelo

responsável máximo da entidade promotora (ou por algum seu delegado). Tem por atribuições:

nomear o presidente de júri de certificação e homologar as decisões resultantes deste através da

promoção e controlo da emissão de diplomas e certificados. Também pode acumular as funções

de coordenador.

Sob a orientação do diretor, o Coordenador assegura a dinamização das diferentes etapas

de intervenção do CNO bem como a sua gestão pedagógica, organizacional e financeira.

Também lhe compete promover a formação contínua dos diferentes elementos da equipa,

elaborar o Plano Estratégico de Intervenção47; o relatório de atividades do CNO (considerando a

organização, concretização e avaliação das diferentes etapas de intervenção) e assegurar a

autoavaliação permanente do CNO. Também deve proceder ao diagnóstico da realidade local, à

conceção e a implementação de ações de divulgação e à constituição de parcerias. Para poder

desempenhar essas funções deve possuir habilitações de nível superior.

Como referimos, uma das mudanças mais expressivas foi a clarificação e reformulação

das etapas de intervenção. Esta mudança conjugando-se com as novas orientações e com um

significativo acréscimo de volume de candidatos, determinou o aparecimento de uma nova

figura profissional na constituição da equipa dos CNO.

O Técnico de Diagnóstico e Encaminhamento

A nova função e perfil profissional foi designado por Técnico de Diagnóstico e

Encaminhamento (TDE), que assume funções que anteriormente eram da responsabilidade dos

47 O Plano Estratégico de Intervenção define o âmbito de intervenção do CNO e deve conter, designadamente: a) a fundamentação dos objetivos propostos; b) a estratégia a adotar; c) a área de intervenção territorial, designadamente o regime de itinerância proposto, quando aplicável; d) as áreas de educação e formação e saídas profissionais em que o CNO pretende desenvolver processos de reconhecimento, validação e certificação de competências para efeitos profissionais; e) o modelo de organização e funcionamento do centro; f) as parcerias e ações de dinamização local previstas; g) a constituição da equipa; h) os resultados anuais a atingir; i) os modelos de formação e de autoavaliação. Se o CNO estiver integrado em estabelecimento de ensino, esse plano deverá ser enquadrado no respetivo projeto educativo. No caso de estar integrado noutras entidades ou Centros de Formação Profissional do IEFP, ou outras entidades formadoras certificadas ou reconhecidas, já deve ser enquadrado no respetivo plano de atividades.

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profissionais de RVC: o desenvolvimento das actividades de diagnóstico e definição do perfil dos

candidatos e o seu encaminhamento para as ofertas formativas e educativas ajustadas ao seu

perfil individual. O TDE torna-se o responsável por três novas etapas que se encontram

interligadas: o Acolhimento; o Diagnóstico e o Encaminhamento.

O acolhimento consiste no atendimento e na inscrição dos candidatos no CNO, através do

registo numa plataforma informática denominada Sistema Integrado de Informação e Gestão de

Oferta (SIGO), normalmente pelo Técnico Administrativo (cujo trabalho é coordenado pelo TDE).

Este momento assume um papel relevante já que as informações fornecidas possibilitarão uma

melhor «gestão das expectativas» dos candidatos.

Na sessão de esclarecimento, já com a presença do TDE, são solicitados os documentos

oficiais48 do candidato e são fornecidas diferentes informações aos adultos. Aconselha-se que os

candidatos sejam informados da missão do Centro, do planeamento e calendarização das

diversas fases e das possibilidades de encaminhamento (Gomes & Simões, 2007, pp. 12-13;

Almeida, Candeias et al., 2008, pp. 21-23).

O Diagnóstico passa pela definição do perfil do candidato através de diversas actividades e

instrumentos: sessões de esclarecimento; análises curriculares; entrevistas individuais e

colectivas. Também se procede à identificação das melhores ofertas formativas e educativas

disponíveis.

Sucede-se o encaminhamento, que pretende direcionar o candidato para a resposta e

modalidade mais adequada às suas características e experiência de vida, às suas motivações, às

suas necessidades e expectativas, ou seja, ao perfil que vem sendo construído nas fases

anteriores (Gomes & Simões, 2007, pp. 13-14; Almeida, Candeias et al., 2008, pp. 25-35).

Associado ao seu trabalho, o TDE obtem e actualiza informação sobre as diversas

dinâmicas territoriais em termos de parcerias, de entidades formadoras e ofertas formativas.

Esse trabalho de organização da informação e de articulação com as diferentes entidades e

serviços educativos/formativos visa aumentar o campo de intervenção do próprio Centro

(Almeida, Candeias et al., 2008, pp. 42-45).

Genericamente, em termos de aptidões para cumprir todas essas determinações, o TDE

deve ser detentor de habilitação académica de nível superior, possuir conhecimentos sobre as

48 São necessários os seguintes documentos: Cartão de Cidadão ou Bilhete de identidade e Cartão de Contribuinte e também o(s) certificado(s) de habilitações. No caso de cidadãos estrangeiros além do passaporte e da autorização de residência também o Cartão de Contribuinte e, se possível, os certificados de habilitações.

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técnicas e estratégias de diagnóstico avaliativo e de orientação e revelar conhecimento sobre as

diferentes ofertas de educação e formação.

No processo de RVCC…

Sendo o candidato encaminhado para o processo de RVCC terá de se deparar com mais

três etapas: a) reconhecimento de competências; b) validação de competências; c) certificação

de competências.

Com o Reconhecimento49 pretende-se que o adulto identifique os saberes e as

competências que adquiriu ao longo da sua vida, através de aprendizagens informais, não-

formais e mesmo formais. Essas aprendizagens são avaliadas com o recurso a metodologias e

instrumentos inspirados no Balanço de Competências e em outras Abordagens Autobiográficas.

O processo de RVCC deve ser apresentando nos seus conceitos e metodologias (nomeadamente,

distinguindo-o de outros percursos de educação/formação) e das suas características específicas

(intervenientes, duração e planificação das sessões, tipo de sessões – individuais e/ou coletivas,

referenciais de avaliação utilizados).

A partir desse momento o candidato inicia a elaboração do seu Portefólio Reflexivo de

Aprendizagens, que consiste no instrumento através do qual o candidato explicita e organiza as

evidências e diversas reflexões relativas à manifestação dos seus saberes e competências. O

portefólio é o instrumento que será analisado e avaliado de acordo com os diferentes referenciais

constantes do Catálogo Nacional de Qualificações (Gomes, 2006; Gomes & Simões, 2007, pp.

15-16).

A etapa de Validação consiste na avaliação das competências adquiridas ao longo da vida

e na verificação da sua correspondência aos referenciais integrantes do Catálogo Nacional de

Qualificações. Essa avaliação compreende duas dimensões: uma autoavaliação do portefólio

pelo adulto e uma avaliação por parte dos profissionais de RVC, dos formadores das respetivas

áreas de competências e, em alguns casos, pelo avaliador externo.

A sessão de validação (ou sessões) é o momento em que podem ser diagnosticadas

necessidades de formação. Considerando-se que essas mesmas necessidades podem ser

49 Da primeira formulação desta etapa (Artigo 8º da Portaria n.º 1082-A/2001 de 5 de Setembro), anteriormente designada por eixo, para a sua nova formulação (Artigo 17º da Portaria n.º 370/2008 de 21 de Maio e restantes reformulações) notam-se algumas alterações: introduz-se a designação «Portefólio Reflexivo de Aprendizagens» como o instrumento de demonstração e avaliação de competências; abandona-se a possibilidade do adulto ser dispensado da etapa de reconhecimento e autonomamente ser validado; também deixa de ser explicitamente referido que esta etapa não tem um tempo previamente determinado, já que anteriormente se referia que a temporização desta etapa estaria associada à situação concreta de cada adulto ou grupo de adultos.

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colmatadas com ações de formação até 50 horas de duração, o próprio Centro Novas

Oportunidades poderá realizá-las, designando-as de formação complementar. Se, por outro lado,

forem consideradas necessárias mais do que as 50 horas de formação, o adulto será

encaminhado para júri de certificação onde será certificado nas competências validadas, tendo

posteriormente de desenvolver a formação necessária para completar o seu percurso de

qualificação (definidas num documento designado por Plano Pessoal de Qualificação).

Os formadores integrados nas equipas dos CNO têm responsabilidades e atribuições

diferentes dos restantes formadores de outras ofertas formativas. Têm de apoiar o processo de

reconhecimento de competências e devem orientar a construção do portefólio reflexivo de

aprendizagens no âmbito da sua área de competência.

Em articulação com o profissional de RVC, devem participar na validação dessas mesmas

competências e, caso necessário, no encaminhamento para outras ofertas formativas (internas

ou externas) ao processo. Sendo necessário que o adulto tenha formação complementar, são os

formadores a organizá-la e desenvolvê-la, de acordo com os referenciais constantes do Catálogo

Nacional de Qualificações. Também deverão participar no júri de certificação.

Os formadores das áreas de competências chave devem possuir habilitação para a

docência em função da área de competências-chave, de acordo com regulação específica, e

deverão também, sempre que possível, revelar experiência profissional no âmbito da educação e

formação de adultos.

A Certificação50 de competências é a etapa final do processo de RVCC e exige a

apresentação do adulto (e do trabalho desenvolvido) perante um júri de certificação, numa

sessão oficial e pública, em que se procederá à confirmação formal e oficial da validação

anterior. Constituem o júri: o Profissional de RVC, os Formadores de cada uma das áreas de

competências e o Avaliador Externo, que assegura, preferencialmente, a presidência do mesmo

(tendo voto de qualidade). Constata-se uma distinção entre o papel da equipa técnico-pedagógica

e o do avaliador externo. Apesar de se verificar um trabalho prévio e conjunto em termos de

50 É nestas duas últimas etapas que se verificaram as mais significativas alterações e a maior clarificação que este diploma legal introduziu em relação ao anterior. Na Portaria n.º 1082-A/2001 de 5 de Setembro (Artigo 8º), a etapa que era designada por “Validação de Competências” assemelhava-se àquilo que passou a ser denominado por “Certificação de competências” (Artigo 20º da Portaria n.º 370/2008 de 21 de Maio). O eixo Certificação de Competências, na anterior portaria, era considerado apenas um momento formal, considerado “o processo que confirma as competências adquiridas em contextos formais, não formais e informais e que constitui o acto oficial de registo das competências” numa carteira pessoal de competências, incorporando o júri de validação esses dois momentos (Artigo 8º da Portaria n.º 1082-A/2001 de 5 de Setembro). Esta tipificação prestava-se a algumas confusões e verificava-se alguma dissonância entre a legislação e a prática.

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análise e de avaliação do portefólio do candidato, ao avaliador compete também a aferição e

afirmação social do processo de RVCC desenvolvido (Gaspar, Milagre & Lima, 2009, p. 15).

Com o júri o candidato obterá uma certificação (parcial ou total) consoante a

conformidade com os critérios de avaliação definidos pelos diferentes referenciais. Na sequência

do júri será atribuído ao candidato um diploma de qualificação (no caso da certificação total) e

um certificado de qualificações, com o registo das unidades de competência certificadas.

No caso da certificação parcial, a equipa do CNO elaborará um plano pessoal de

qualificação, tendo em conta as competências evidenciadas, validadas e certificadas e as

restantes necessidades de formação do adulto. Saliente-se, portanto, que o encaminhamento

além da etapa previamente estipulada, poderá ter este outro momento (Gomes & Simões, 2007,

pp. 17-18).

Figura 2 - Fluxograma das Etapas de Intervenção dos Centros Novas Oportunidades

Apontamento: a ANQEP

Durante a campanha para as eleições legislativas de 5 de junho de 2011, a Iniciativa

Novas Oportunidades foi um dos principais temas de discussão. Sem se pretender fazer a

história desse período, refira-se que eram escambadas diferentes acusações entre os líderes dos

dois maiores partidos concorrentes a essas eleições: José Sócrates, do Partido Socialista, e

Pedro Passos Coelho, do Partido Social Democrata.

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Por um lado, Pedro Passos Coelho acusava a Iniciativa Novas Oportunidades de ser um

“escândalo” e uma “credenciação à ignorância” (LUSA, 2011), uma manifestação de

«facilitismo», uma «maquilhagem estatística», reproduzindo um conjunto de ideias muito

difundido. No seu programa eleitoral51, manifestando o desejo de “educação e formação com

qualidade e empregabilidade” (PSD, 2011, p. 177) propunha que se procedesse a uma

avaliação externa da Iniciativa Novas Oportunidades, já que se pressupunha que a avaliação teria

sido capciosa:

“deverá ainda ser realizada uma avaliação externa e uma reestruturação do Programa Novas

Oportunidades, com vista à sua credibilização perante a sociedade civil e à sua melhoria em termos de

valorização do capital humano dos Portugueses (PSD, 2011, p. 196).

Por outro lado, José Sócrates enaltecia a «justiça social» e restantes «grandes conquistas»

possibilitadas pela Iniciativa Novas Oportunidades. No programa eleitoral52 do Partido Socialista a

essas eleições considerava-se o seu sucesso:

“O programa Novas Oportunidades é a demonstração prática cabal de que era necessário e era possível

criar um verdadeiro movimento social de formação: mais de milhão e meio de inscritos, mais de meio

milhão de certificados, entre 2006 e 2010 – e, sobretudo, uma nova via de desenvolvimento pessoal e

de mobilidade social aberta a muitos Portugueses que haviam sido privados de prosseguir estudos na

idade própria. O programa continuará, aperfeiçoando os seus instrumentos de reconhecimento e

validação de competências e os seus contextos e métodos de formação, mas permanecendo fiel ao seu

espírito de garantir oportunidades de formação e aperfeiçoamento a todos quantos se encontram hoje

no mercado de trabalho (PS, 2011, p. 15).

No dia 21 de junho de 2011, o XIX Governo Constitucional tomou posse. Pedro Passo

Coelho tornou-se o Primeiro-ministro. A proposta que fizera no seu programa eleitoral foi vertida

no programa de governo53. Pretendia-se fazer a

“Reestruturação do Programa Novas Oportunidades com vista à sua melhoria em termos de valorização

do capital humano dos Portugueses e à sua credibilização perante a sociedade civil (Presidência do

Conselho de Ministros, 2011, p. 115).

Uma das primeiras medidas anunciava a reestruturação da Iniciativa Novas Oportunidades

após uma avaliação que incidisse sobre a empregabilidade dos adultos envolvidos. Ao mesmo

tempo divulgava-se uma ideia genérica de revalorização do Ensino Profissional.

51 “Recuperar a Credibilidade e Desenvolver Portugal”. Programa Eleitoral do Partido Social Democrata – Eleições Legislativas 2011. 52 “Defender Portugal, Construir o Futuro” 2011-2015. Programa Eleitoral do Partido Socialista. Abril de 2011. 53 Programa do XIX Governo Constitucional.

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Uma das decisões mais concretas relacionava-se com o redimensionamento da rede de

CNO que se considerada sobredimensionada relativamente à procura.

No segundo semestre de 2011 foram tomadas diversas medidas avulsas. Sem

preocupação de exaustividade referimos: a substituição do presidente da ANQ; a cessação de

contratos dos profissionais de RVC e TDE (em CNO promovidos por entidades públicas como,

por exemplo, nas escolas); abertura de concursos para os anteriores (fundamentada numa

decisão do Ministro das Finanças do governo anterior); abertura de candidaturas ao POPH que

possibilitariam o financiamento a 70% dos CNO existentes em 2011 (448 CNO) até Agosto de

2012; no fim do ano de 2011 o início do encerramento dos CNO, entre outras54.

A 15 de fevereiro de 2012 foi criada e aprovada a orgânica da Agência Nacional para as

Qualificações e Ensino Profissional (ANQEP) através da publicação do Decreto-Lei nº 36/2012, o

organismo que sucede em termos de atribuições, direitos e obrigações a ANQ com as mesmas

atribuições da anterior. Tal como a antecessora, a ANQEP tinha como missão e atribuição,

respetivamente:

“assegurar o desenvolvimento e a gestão do sistema de reconhecimento, validação e certificação de

competências, visa, assim, melhorar a relevância e a qualidade da educação e da formação profissional,

contribuindo para a competitividade nacional e para o aumento da empregabilidade” (do preâmbulo)

“Desenvolver e gerir o sistema de reconhecimento, validação e certificação de competências, de âmbito

escolar e profissional, assegurando a coordenação da correspondente rede de estruturas, bem como o

acompanhamento, a monitorização, a avaliação e a regulação do sistema, em estreita colaboração com

as demais entidades que integram o Sistema Nacional de Qualificações; (Artigo 3.º, ponto 2)

Num comunicado datado de 15 de maio de 2012, a ANQEP informou que a rede de

centros era constituída por 302 CNO. Desde 2011 (considerando o número máximo de CNO

nesse ano) e até essa data fecharam 146 CNO.

A 18 de Maio de 2012 é apresentada a Avaliação da Iniciativa Novas Oportunidades –

Eixo Adultos e divulgado o estudo coordenado por Francisco Lima denominado Os Processos de

Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências e o Desempenho no Mercado de

Trabalho (Lima F., 2012) que considerava as dimensões «empregabilidade» e «remunerações».

Nessa apresentação da Avaliação da INO foram feitas duas comunicações: uma, intitulada

Ensino e Formação de Adultos. Uma aposta na qualificação real, apresentada pela Secretária de

Estado do Ensino Básico e Secundário (Leite, 2012) e uma outra denominada Programa Vida

54 Neste período também foram criadas duas associações – primeiro a Aprendências, Associação Portuguesa de Educação e Formação de Adultos (APEFA) e depois a Associação Nacional de Profissionais de Educação e Formação de Adultos (ANPEFA).

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Ativa do Secretário de Estado do Emprego (Martins, 2012) em que se especificavam, entre

outras, as principais ideias para os CNO e para os processos de RVC:

1. Reformulação do processo de RVC - deverá passar a ser considerado o ponto de

partida para diferentes processos de formação e educação. Também se encara a

possibilidade de um processo de RVC “dual” (desenvolvidos em contextos diferentes –

centros, escolas, empresas e outras entidades empregadoras). A certificação escolar

será feita exclusivamente por escolas do sistema de ensino;

2. Renomeação dos CNO. Os CNO passarão a ser designados por Centros de

Qualificação e Ensino Profissional (CQEP);

3. Reestruturação da rede de centros. Na abertura dos CQEP ter-se-á em

consideração dois indicadores - os adultos com baixas qualificações e o número de

jovens com ensino básico concluído de cada NUT III);

4. Redefinição de funções dos centros. Os CQEP passarão a incluir uma dimensão

de orientação e aconselhamento de jovens e adultos focando no ensino profissional.

A 13 de Agosto de 2012, a ANQEP divulgou o seguinte comunicado:

“No âmbito do processo de reestruturação da Iniciativa Novas Oportunidades e considerando que se

encontra para breve a publicação de novos normativos legais enquadradores das estruturas que

asseguram as respostas de qualificação da população adulta, a Agência Nacional para a Qualificação e o

Ensino Profissional (ANQEP) procedeu hoje à emissão de uma orientação junto dos Centros Novas

Oportunidades atualmente em funcionamento.

Assim, até à existência de novo enquadramento legislativo e financeiro e no sentido de se assegurar a

resposta ao público que pretende aumentar as suas qualificações, a título excecional, os Centros Novas

Oportunidades poderão prosseguir com a sua atividade até 31 de dezembro de 2012.

Esta orientação abrange a totalidade dos Centros Novas Oportunidades que se encontram atualmente

em funcionamento, quer sejam Centros Novas Oportunidades com financiamento POPH aprovado para

o período de 1 de janeiro a 31 de agosto de 2012, Centros Novas Oportunidades em regime de

autofinanciamento ou Centros Novas Oportunidades financiados pelo orçamento das respetivas

tutelas/Orçamento de Estado. Durante o prolongamento do período de funcionamento dos atuais

projetos serão concluídos os trabalhos para a criação dos Centros de Qualificação e Ensino Profissional”

(ANQEP, 2012).

Profissionais de RVC: emergência e centralidade

Relembremos: o profissional de RVC é um dos elementos da equipa que trabalha nos

CNO; na sua prática profissional acompanha e orienta o candidato adulto na evidenciação e

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avaliação dos saberes e competências que permitam uma certificação escolar ou profissional;

também tem de organizar e gerir o processo de RVCC a diferentes níveis.

A atividade, funções e responsabilidades dos Profissionais de RVC estão estipuladas num

normativo legal55 que define as condições necessárias para o exercício profissional, em termos de

habilitações, experiência e conhecimento de metodologias específicas, e enquadra as suas

responsabilidades.

As atribuições e responsabilidades dos Profissionais de RVC são consideradas em duas

dimensões distintas mas que se inter-relacionam: uma dimensão técnico-pedagógica (relativa ao

acompanhamento, orientação e aconselhamento) e uma dimensão organizativa e de gestão

processual.

Genericamente, e de acordo com a legislação, a dimensão técnico-pedagógica daquela

prática profissional consiste em “acompanhar e apoiar os adultos na construção de portefólios

reflexivos de aprendizagens” através do recurso a “metodologias biográficas especializadas”

(balanço de competências e histórias de vida).

Já em termos de organização e gestão processual, o profissional de RVC deverá: a) em

articulação com a TDE, participar nas etapas de diagnóstico e encaminhamento56, caso

necessário; b) “dinamizar o trabalho dos formadores” e em articulação com estes, proceder à

identificação das necessidades de formação; c) em conjunto com a restante equipa, organizar e

participar nos júris de certificação; d) encaminhar os adultos certificados (parcial ou totalmente)

para outras ofertas formativas.

A designação «profissional de RVC» surge com a implementação do Sistema Nacional de

RVCC em 2001 mas não é plenamente consensual nem invariável. Além de profissional de RVC -

a designação que preferimos - é frequente encontrar-se na legislação, em outros documentos

orientadores e também no campo das práticas profissionais, as seguintes variações:

«profissional de RVCC» (Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências) e «técnico

de RVC» (com a variação «Técnico de RVCC»).

55 Referimo-nos ao artigo 10º da Portaria n.º 370/2008 de 21 de Maio. 56 De facto, com a introdução da figura de TDE, a participação do profissional de RVC nestas etapas altera-se. Anteriormente era o profissional de RVC que deveria acompanhar o adulto em todo o seu percurso, desde o seu acolhimento até ao momento de certificação. A introdução dessa nova figura, numa lógica de divisão de trabalho, reconfigurou as dinâmicas organizacionais dos CNO, pelo menos em três aspectos. Primeiramente, o contacto inicial dos adultos deixou de ser com o profissional de RVC, o que implicou a redefinição das atribuições e funções dos profissionais de RVC; implicou uma maior sistematicidade na organização das diversas informações relativas aos candidatos e um aumento de procedimentos para o diagnóstico inicial; e alterou as dinâmicas de comunicação internas e externas dos CNO.

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Com utilização menos frequente, e utilizadas sobretudo para facilitar a descrição e

compreensão do tipo de funções desempenhadas pelo profissional de RVC, encontram-se as

seguintes denominações: «tutor», «mediador», «orientador», «coordenador», «conselheiro»,

«acompanhante», «supervisor», entre outras (Cavaco, 2007; Gomes, 2010, p. 8).

Numa fase anterior à implementação do Sistema Nacional de RVCC, ainda se tentaram

outras designações para funções semelhantes, tal como «profissional/técnico de Balanço de

Competências» (Imaginário, 2001).

São feitas duas observações relativas a estas diferenciações: uma respeitante à utilização

do étimo «profissional» na designação da categoria funcional e uma outra relacionada com a

inclusão ou exclusão do étimo «certificação».

Relativamente à primeira observação, Luís Imaginário e José Manuel Castro referem que a

utilização de «profissional de RVC» remeteria para o “exercício autónomo da função

reconhecimento de competências” enquanto a designação de «técnico de RVC» remeteria para a

mera “aplicação de normativos pré-existentes”. A escolha de cada uma das designações não

seria, por isso, completamente inócua e poderia remeter para conceções alternativas relativas ao

exercício da autonomia na prática profissional. No entanto, como sustentam Imaginário e Castro,

este é um aspeto que não deverá ser particularmente sobrevalorizado pois mesmo a utilização

de profissional “quer-se a mais neutra possível, ou seja, sem nada pressupor acerca de tal

autonomia ou ausência dela” (Imaginário & Castro, 2011, p. 196).

A outra observação relaciona-se com a presença da componente «Certificação», ou seja,

como em o «profissional de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências». Esse

acréscimo na designação implicaria dois aspetos:

“Por um lado, parece claro que o profissional de RVCC, stricto sensu, não tem, nem deve ter,

intervenção directa quer na “validação” quer na “certificação”. Por outro lado, porém, a designação

Profissional de RVCC é também assumida por todos quantos trabalham no CRVCC” (Imaginário &

Castro, 2011, p. 196).

Considerada a variedade de designações, o nosso interesse passa por analisar uma

ocupação profissional cuja prática é considerada estruturante no contexto dos processos de

RVCC.

Diferentes autores qualificam o papel assumido pelos profissionais de RVC como sendo:

um “papel muito importante em todas as fases do processo” (Cavaco, 2007, p. 27); um “papel

fundamental” (Aníbal, 2009, p. 9); um “catalizador da mudança” (Gomes, 2006, p. 48);

“técnicos-chave na dinamização deste processo” (Amorim, 2006, p. 44); uma “figura decisiva

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em todo o processo e […] um actor de importância crescente no campo da educação e formação

de adultos em Portugal” (Ávila, 2005, p. 334); a “coluna vertebral” da equipa técnica dos

centros (Barros, 2009, p. 645), e a “figura central, e absolutamente estruturante” dos processos

de RVCC (Barros, 2009, p. 646).

A centralidade do Profissional de RVC é evocada pela especificidade do relacionamento

educativo com cada um dos candidatos, e também pelas responsabilidades assumidas ao longo

do processo de RVCC, que implicam riscos associados à sua ação. O espaço de ação dos

Profissionais de RVC implica que estes tenham de proceder à articulação do candidato com toda

a equipa em todas as fases do processo de RVCC. É necessário que os profissionais de RVC

controlem todo o processo, ou seja, precisem de ter um “conhecimento aprofundado dos

quadros de referência, das tarefas e das oportunidades de formação – também devem ter as

competências necessárias para fazerem-no funcionar” (CEDEFOP, 2005, p. 153).

A ação dos profissionais de RVC, pela sua combinação com a restante equipa dos CNO,

poderá ser significativa a diferentes níveis para os candidatos. O relacionamento estabelecido

com cada um dos candidatos assume características particulares, passando por um

acompanhamento de grande proximidade que pode induzir, através de diferentes atividades de

aconselhamento e orientação: o desenvolvimento da reflexividade crítica, mudanças

diversificadas de atitudes e comportamentos; a redefinição de projetos pessoais e profissionais e

a continuidade de percursos qualificantes pós-certificação.

Porém, admitindo-se esses efeitos positivos, também se deverá admitir que a ação (ou

inação) dos profissionais de RVC, também na sua articulação com a restante equipa, e pela

mesma ordem de fatores, poderá não ser significativa e, eventualmente, logrará potenciar

atitudes, comportamentos ou preconceitos perniciosos em termos individuais e sociais.

Aconselhamento e Orientação: um campo de práticas emergentes

As práticas profissionais e os papéis educativos assumidos pelos profissionais de RVC têm

tomado relevância no campo da Educação e Formação de Adultos. Considera-se que esses

papéis e práticas estão compreendidos no Aconselhamento e Orientação, uma das áreas de

atividade profissional57 do campo da EFA (Dellen & Kamp, 2008; Research voor Beleid; PLATO,

57 As outras áreas designadas são: 1) posições de Ensino; 2) posições de Gestão; 3) posições de Aconselhamento e Orientação; 4) posições de Planeamento de Programas; 5) posições de Apoio (técnico, administrativo e organizacional), posições de Media

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2008) e organizam-se em torno de quatro tarefas principais: na receção de participantes para

avaliação de necessidades e acreditação de aprendizagens prévias; na orientação e

aconselhamento das pessoas relativamente às diferentes temáticas de aprendizagem; no

coaching ou acompanhamento das pessoas visando o desenvolvimento pessoal; e na tutoria,

apoio das pessoas em processos de aprendizagem auto-orientada (Research voor Beleid; PLATO,

2008, pp. 76-77).

Na concretização das referidas tarefas refere-se a articulação de diversas práticas e

atividades, providenciadas por diversas organizações e contextos institucionais (escolas, centros

de formação e de emprego, local de trabalho, comunidades, etc.) “concebidas para ajudar os

indivíduos a tomar decisões educativas, vocacionais ou pessoais e a realizá-las antes e depois de

entrarem no mercado de trabalho” (CEDEFOP, 2011, p. 51).

Podem-se observar um conjunto de atividades, tais como: a) o aconselhamento, visando o

desenvolvimento pessoal ou profissional e a orientação educacional; a avaliação (psicológica, de

desempenho profissional, de competências); a prestação de informações relacionadas com

oportunidades de aprendizagem, com o mercado de trabalho ou com a gestão da carreira; as

atividades de consulta a colegas, familiares ou educadores; a preparação vocacional, com a

identificação de habilidades e competências, atividades de procura de emprego; e os

encaminhamentos para atividades de educação/formação ou para outros especialistas de

aprendizagem ou de carreira (CEDEFOP, 2011, p. 51).

A reconfiguração e abertura do campo da EFA a outros campos de prática, política e teoria

educacionais58, designadamente às atividades de aconselhamento e desenvolvimento pessoal,

correspondem a uma “diáspora dos educadores de adultos” (Martin, 2008) e enquadram-se na

transição de um campo relativamente circunscrito de «Educação de Adultos» para um campo

mais dilatado e difuso da «Aprendizagem ao Longo da Vida» (Edwards, 1997; Usher, Bryant &

Johnston, 1997).

Alguns dos «novos» papéis educativos surgidos neste contexto, como o de profissional de

RVC, situam-se numa zona de confluência de “profissões existentes na educação, no

aconselhamento, na orientação vocacional e na gestão de carreira de recursos humanos” (Salini

& Bednarz, 2010, p. 6) e adquirem relevância como o «movimento da autoaprendizagem» que

(produção e uso de software de ensino, cooperação com peritos das Tecnologias de Informação, Desenvolvimento de oportunidades de ensino e aprendizagem na internet e em outros media interativos, publicidade); Formadores do pessoal da Educação de Adultos (Dellen & Kamp, 2008; Research voor Beleid; PLATO, 2008). 58 Entre outros: a educação superior, práticas genéricas de educação e aprendizagem, o desenvolvimento educacional, garantia de qualidade, desenvolvimento profissional, desenvolvimento de recursos humanos, diferentes atividades literacia e numeracia.

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promove uma “nova indústria de facilitação e aconselhamento” (Titmus, 1999, p. 352). Essa

nova indústria vem sendo desenvolvida e justificada pelo facto de nesse campo educativo de

múltiplas possibilidades e expansiva amplitude as pessoas necessitarem de direcionar a sua

aprendizagem de formas cada vez mais eficientes.

Discursivamente, a orientação e o aconselhamento concebe-se como uma via para tornar

todo o sistema de educação, incluindo o campo da Educação e Formação de Adultos, mais

«eficiente» e aspirando a um ajustamento progressivo e constante das necessidades individuais

de formação à provisão disponibilizada (Pykett, 2009). Nesse espírito de «facilitação» tenta-se

superar as incertezas e inseguranças resultantes das diversas mudanças sociais, ao mesmo

tempo permitindo aos indivíduos que façam escolhas mais informadas devido à diversidade de

prestadores de serviços e de ofertas de aprendizagem (Edwards, 1997, p. 25; 100).

Com uma certa benevolência, refere-se também que através das atividades de

aconselhamento e orientação e a crescente articulação dos indivíduos com a oferta educativa se

constituiria e desenvolveria processos mais humanos e mais democráticos e que permitem o

empowerment individual:

“o argumento é que quanto mais as pessoas tiverem a oportunidade de compreender as opções

disponíveis e para fazerem as suas escolhas mais ‘autênticas’, i.e., mais poder será dado ao

aprendente, então maior será o grau de desenvolvimento pessoal e de autorrealização a partir da

experiência educacional” (Usher, Bryant & Johnston, 1997, p. 85).

Outras alterações vão incitando essas transformações do campo da Educação e Formação

de Adultos. Além da centralidade do aluno/adulto no processo educativo, a valorização das

aprendizagens experienciais e a crescente implementação de sistemas de reconhecimento e

validação das mesmas tem contribuído para estas configurações específicas.

Seguindo uma lógica de especialização, o desenvolvimento dos diferentes sistemas de

RVCC tem sido indissociável da emergência de diferentes ocupações profissionais59 relacionadas

com o Aconselhamento e a Orientação, nomeadamente os Profissionais de RVC e designados

genericamente como «Conselheiros», os Counsellors (CEDEFOP, 2009). Esta tendência, de

acordo com Rosanna Barros (2009, p. 644) corresponde a uma “nova divisão técnica do

trabalho educativo realizado com adultos”, uma variação da “taylorização especializada” que

59 As European Guidelines for Validating non-formal and informal Learning, resultantes dos inventários de práticas de reconhecimento e validação de aprendizagens realizados a nível europeu, estipulam cinco ocupações profissionais implicadas nessas práticas, a nível internacional. Essas ocupações abrangem as diferentes dimensões do reconhecimento e validação de competências: os Conselheiros (Counsellors); os Avaliadores (Assessors); os Gestores de Processo (Process Managers); os Observadores Externos (External Observers); e outros interessados (Interested Stakeholders) (CEDEFOP, 2009)

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seria, no seu entender, “pouco compatível com a lógica de trabalho político-pedagógico que

tradicionalmente caracteriza a educação de adultos”.

Os agentes profissionais que providenciam aconselhamento, informação e orientação (no

caso português e no contexto dos CNO, uma tarefa partilhada pelos TDE e os profissionais de

RVC) são considerados cruciais nas diversas atividades de reconhecimento e validação de

competências, designadamente no “mapeamento de competências” (CEDEFOP, 2009, p. 67),

isto é, na avaliação da amplitude e profundidade das evidências de aprendizagem em relação a

diferentes critérios ou padrões de avaliação.

Para alcançar esses objetivos implicam-se diferentes ações que exigem dos agentes: um

conhecimento rigoroso do sistema educativo e dos processos de avaliação; a preparação dos

candidatos para aquela avaliação; os esclarecimentos relativos aos procedimentos de

evidenciação de aprendizagens; atividades de esclarecimento que visem a definição de padrões

de comportamento, a enunciação de resultados possíveis e a gestão de expectativas resposta

(CEDEFOP, 2009, p. 67).

Porém, não se trata apenas de providenciar informações mas também de desenvolver

atividades que permitam eliciar as aprendizagens resultantes das experiências identificadas

como relevantes e induzir a reflexão individual (CEDEFOP, 2007, p. 25). Para o desenvolvimento

do Aconselhamento e Orientação é necessário que os profissionais de RVC desenvolvam os seus

conhecimentos de metodologias e domínios de intervenção relevantes ao exercício das suas

funções, designadamente:

“histórias de vida (abordagens biográficas); orientação vocacional (processo de exploração das relações

de investimento do adulto com as diversas dimensões do mundo do trabalho); balanço de competências

(intervenção indutora da exploração e avaliação das competências, capacidades e interesses dos

adultos); avaliação (formas de apreciação das competências identificadas pelos adultos que podem

conduzir à sua validação e certificação). Neste processo as aprendizagens adquiridas pelo adulto ao

longo do seu percurso de vida são valorizadas independentemente do local e da forma como se

processaram” (Eurydice, 2007c, p. 175).

Sugere-se que uma das formas de melhorar a qualidade do trabalho desenvolvido pelos

Conselheiros, vulgo profissionais de RVC, seja através do desenvolvimento das capacidades para

inspirar confiança e criar nos candidatos uma “configuração psicológica apropriada” (CEDEFOP,

2009, p. 68).

A análise crítica das ações educativas que passem por «apropriadamente» configurar e

transformar as estruturas psicológicas dos indivíduos é o que fundamenta a observação de

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alguns autores de que as diversas atividades de Aconselhamento e Orientação podem ser

referidas a práticas educativas «confessionais»:

“a confissão funciona na base de que há alguma coisa a ser confessada, uma verdade profunda dentro

dos sujeitos que, uma vez descoberta, conduziria ao empoderamento. A orientação e o aconselhamento

são formas de confissão cujos sentidos atribuídos ao Self são já efeitos de poder – por outras palavras,

as pessoas precisam de já haver aceitado a legitimidade e a verdade da confissão e os sentidos que esta

evoca […]. Assim, embora a orientação e o aconselhamento ajudem as pessoas a fazerem decisões

‘realistas’, elas devem realinhar a sua subjetividade dentro das decisões psicológicas e educativas

apropriadas a fim de tomar essas mesmas decisões. É no próprio processo de confessar que as pessoas

são constituídas sujeitos ‘ativos’ ainda que ao mesmo tempo se envolvam no poder à medida que se

tornam sujeitas aos discursos confessionais e, portanto, locais de intervenção” (Usher, Bryant &

Johnston, 1997, pp. 85-86).

Poder-se-ia considerar que através dos processos de RVCC, ao especificar-se o indivíduo

como um objeto de conhecimento, visa-se a descoberta do conjunto de atributos e

aprendizagens do seu Eu, com a ajuda de guia ou conselheiros. Simultaneamente, poder-se-ia

questionar a possibilidade de se encontrar (ou mesmo de existir) uma identidade «autónoma e

estável», o que levaria a um debate que não teremos oportunidade de desenvolver sobre as

formas e possibilidades como são configuradas as disposições individuais e a «personalidade».

Refiramos apenas que, de acordo com Mark Tennant, em diversas formulações teóricas

(derivadas da modernidade), o Self e o seu desenvolvimento consideram-se com uma certa

«estabilidade, unidade, coerência e continuidade», ainda que múltiplo e sujeito a mudanças. Já

nas conceções pós-modernas, o Self seria entendido como em «sobressalto», permanentemente

em mudança, fragmentado, múltiplo e instável (Tennant, 1998).

No mesmo sentido, sugere-se que a apologia e o incentivo das diferentes atividades e

espaços de Aconselhamento e a Orientação corresponderia a uma tendência da mudança de

formas de «poder disciplinar» para outras formas mais veladas de «poder pastoral»60. Estas

seriam concretizadas pela convergência de diversas técnicas, racionalidades e práticas cujas

finalidades continuariam a passar por orientar a conduta dos indivíduos.

Argumenta-se que as formas de manifestação desse «poder confessional» consolidam-se

com a emergência, reconfiguração e pluralização das «tecnologias da gestão do eu» (de cariz

social e educativo) e que podem ser observadas na pluralidade de práticas educativas que

induzem a confissão. Constata-se esta realidade em diversas dimensões: nos diversos serviços

60 Recorrendo a conceitos de uma «grelha analítica foucaltiana», considera-se o poder pastoral como um poder tornado central nas sociedades contemporâneas e que é exercido pela confissão, “através da qual o Eu é constituído como um objeto de conhecimento, autorregulação, autoaperfeiçoamento e autodesenvolvimento”. Substitui uma disciplina imposta externamente pela “autodisciplina de uma subjetividade autónoma (Edwards, 1997, pp. 8-9).

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de orientação e aconselhamento; nos processos de reconhecimento e validação de

competências (utilizando metodologias relacionadas com as abordagens autobiográficas e com o

balanço de competências); a relevância dada aos portefólios reflexivos como demonstradores

das aprendizagens (com a documentação e registo detalhado das várias dimensões das suas

vidas); no incentivo à autoanálise e autoavaliação; e na apologia da responsabilização individual

pelo planeamento da sua vida, pelo seu autodesenvolvimento e pela sua realização pessoal:

“A significância do poder pastoral para a aprendizagem ao longo da vida pode ser ilustrada com uma

ampla variedade de práticas em que a confissão é central, por exemplo, a orientação e aconselhamento,

planeamento da ação, a acreditação de aprendizagens prévias, avaliação baseada em portefólios,

contratos de aprendizagem, registos de aproveitamento, avaliação contínua…” (Edwards, 1997, p. 10).

Esta situação impõe um desafio e consequentemente a possibilidade de uma análise

crítica relativamente aos efeitos que essas práticas de Aconselhamento e Orientação podem

produzir na Educação e na Formação e nos próprios adultos, designadamente nas possibilidades

de redução da autonomia e da autodeterminação individual, ou seja o «desempoderamento».

Como refere Mark Tennant, estas possibilidades constituem um

“desafio para aquelas tecnologias da educação de adultos que convidam ao autoexame e à

autotransformação, tanto coletiva como individualmente, em ordem a se oporem e resistirem à

dominação e domesticação” (Tennant, 1998, pp. 364-376).

Como referem Per Andersson e Andrea Fejes, num estimulante artigo que encara o

reconhecimento das aprendizagens prévias como uma técnica de «fabricar o aprendente

adulto»,

“a avaliação, incluindo a validação, é uma técnica que coloniza o humano como um sujeito cognoscente;

ele é criado como um sujeito por ser um objeto da produção do conhecimento. Uma forma de

argumentar acerca desta colonização de todo o sujeito é o objetivo do conhecimento. Conhecimento

formal tem sido, e é, uma forma de controlar o sujeito. A documentação é em si mesmo uma

objetificação (objectification) do sujeito e é o ponto de partida de onde as técnicas de governo são

acionadas. O conhecimento acerca do sujeito a ser governado é a base de toda a governança (Foucault,

1991) e, portanto, ainda não tem sido dada a mesma atenção ao conhecimento informal. O que vemos

agora é uma tendência onde as competências/conhecimentos não-formais e informais devem ser

transformadas em conhecimento formal. Consequentemente, este conhecimento também será o

alicerce do governo e controlo. Tudo o que fazemos, ao longo e ao largo da vida, constitui experiências

que são parte da construção do adulto competente. O sujeito a ser governado é construído como um

sujeito diferente do que fora previamente o caso (Andersson & Fejes, 2005, p. 610).

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Práticas profissionais e práticas reflexivas

Como já referimos, o trabalho do profissional de RVC passa pela orientação e

aconselhamento do candidato a certificação ao longo do processo de RVCC. Ao desempenhar

funções de enquadramento, integração e acompanhamento, apoia o adulto na reconstrução de

um itinerário formativo/educativo que poderá resultar na reconfiguração dos seus projetos

profissionais.

O acompanhamento desenvolvido pelo profissional de RVC compõe-se em duas vertentes

que são indissociáveis: uma dimensão operativa, relativa às informações e esclarecimentos

sobre os procedimentos e características do processo de RVCC; e uma dimensão educativa em

que se procura apoiar cada indivíduo no seu desenvolvimento psicossocial e valorização pessoal.

Como escreve Carmen Cavaco, o trabalho dos profissionais de RVC consiste genericamente,

“no esclarecimento da lógica do processo, na identificação, rememoração e selecção da informação; na

construção do discurso escrito; no envolvimento, motivação e implicação no processo; no

autoreconhecimento e heteroreconhecimento; no reforço da auto-estima; na mobilização para a

formação complementar, quando é necessária; na identificação, explicitação e concretização de alguns

projetos de vida” (Cavaco, 2009, pp. 770-771).

A dimensão operativa consiste na transmissão de diferentes informações ao candidato

que possibilitem a compreensão das características do processo de RVCC, nos seus múltiplos

aspetos: relativamente às suas etapas e tempos; às abordagens, metodologias e instrumentos

utilizados; às formas e critérios de avaliação; às regras e procedimentos específicos de cada

entidade.

Nos momentos iniciais de acompanhamento presencial pretende-se identificar as

características e capacidades físicas, intelectuais, emocionais e sociais de cada um dos

candidatos para, de acordo com as possibilidades e características do profissional de RVC e da

organização que este integra, se adaptar o dispositivo de reconhecimento (metodologias e

instrumentos) a essas especificidades pessoais. Ao pretender-se aprofundar o conhecimento das

características individuais e proceder ao apoio individualizado, esse acompanhamento alude a

processos de «orientação escolar, formativa e profissional» (OCDE, 2004).

A recolha e organização de informações que complementem o perfil definido durante as

fases de Diagnóstico e Encaminhamento são determinantes para o profissional de RVC. Este

assume o papel de «elemento de ligação» entre cada um dos candidatos e o «sistema» (Gomes,

2006, p. 95) e tem a função de articular, ao longo do processo e de uma forma transversal, as

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diversas partes (adultos, formadores, avaliadores externos, etc.). O profissional de RVC revela por

isso “funções de coordenação das equipas” (Barros, 2009, p. 365).

Através desses momentos de acompanhamento, quer sejam individuais ou em grupo,

procede-se ao esclarecimento de dúvidas que os candidatos tenham relativamente a temas

específicos: formas e possibilidades de desenvolvimento do portefólio (bem como dimensões

médias em termos de páginas); formas, critérios e exigência na avaliação do portefólio;

momentos específicos do processo de RVCC (por exemplo, «formação complementar» ou

«sessões de júri»); prazos e tempos médios para a conclusão do processo de RVCC, entre

outros. Na maior parte dos casos, as dúvidas iniciais são sobretudo em relação às formas de

demonstrar e não aos conteúdos a demonstrar (Barros, 2009, p. 646).

Se com as «sessões» individuais se proporcionam oportunidades de aconselhamento e

orientação ajustados às dúvidas e particularidades de cada indivíduo, com as «sessões» grupais

promovem-se dinâmicas de grupo, em sala ou fora dela, que visam objetivos diversificados além

dos momentos de informação e comunicação genéricos: incentivar o conhecimento mútuo, o

«espírito de grupo» e a entreajuda; orientar a discussão de temas específicos; realizar atividades

culturais; dinamizar espaços e tempos de trabalho. Nesse sentido, o profissional de RVC

assumirá a função de «animador» (Cavaco, 2009, p. 691).

Com as sessões individuais e coletivas61 também se possibilita que cada um dos

candidatos comece a observar as características pessoais (em termos de postura e

personalidade) e a forma como estrutura as suas práticas profissionais (em termos de

abordagens, referências e objetivos educativos) dos próprios profissionais de RVC.

Nesse processo de identificação e entrosamento mútuos começa-se a configurar os

diversos espaços relacionais (entre profissional de RVC e candidato(s) e entre candidatos).

Desenvolvem-se vínculos interpessoais que possibilitam o aumento dos níveis de empatia, de

confiança e de segurança mútuos que sustentem essa relação estabelecida entre profissional de

RVC e candidatos/adultos (Amorim, 2006).

Uma das dimensões consideradas essenciais e das mais distintivas do trabalho do

Profissional de RVC traduz-se na capacidade de «facilitar» a identificação e o reconhecimento

das competências por parte de cada um dos indivíduos e, por isso, proporcionar a valorização

61 Refira-se também que as sessões são organizadas de acordo com os procedimentos de cada Centro, com as características de cada grupo e com as formas como cada profissional de RVC desenvolve as suas funções. No entanto, existem parâmetros estipulados na Carta de Qualidade que limitam o número de horas para sessões e o rácio entre sessões individuais e coletivas (Gomes & Simões, 2007).

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pessoal (Barros, 2011a, p. 628). Incentivam-se formas diversificadas de autoavaliação que

passam pela implicação do Sujeito na atribuição de sentido e significado às experiências da sua

própria vida. Essa atribuição de sentido passa pela seleção, narração e reflexão que o próprio

candidato faz do seu percurso e história de vida. Escreve Carmen Cavaco:

“O reconhecimento pessoal (“por si” e/ou “para si”) inscreve‑se numa lógica formativa, de auto-

avaliação, de tomada de consciência e apropriação pessoal dos saberes. Esta tomada de consciência

pode permitir um melhor posicionamento e progressão da pessoa, tanto no sistema escolar/formação,

como no mundo profissional, como ainda na sociedade em geral. A partir da explicitação e da

identificação das potencialidades e das intencionalidades da pessoa, permite a elaboração de projectos

(pessoais, educativos, profissionais), e contribui para a (re)construção das identidades — como

defendemos, o resultado do reconhecimento toca profundamente na dimensão identitária do adulto”

(Cavaco, 2007, p. 12).

Nessa «tomada de consciência» individual estará implicado o profissional de RVC que a

auxilia (Imaginário, 2001, p. 70). É através de um «confronto indagador» que o profissional de

RVC suscita a reflexividade individual: “O que faz e como faz? Porque faz dessa forma? O que

gostava de fazer mais ou de forma diferente? Qual o resultado?” (Valente, Carvalho & Carvalho,

2009, p. 67). Essa abordagem dialógica e indagadora possibilita que o profissional de RVC

desenvolva a sua atividade de «tradução» e «retroversão» do explicitado:

“é preciso um trabalho, que é esta passagem do induzível para o deduzível, do implícito para o explícito,

este é o verdadeiro trabalho de um mediador que muitas vezes empresta aos adultos uma linguagem

que não é a desses adultos. Ele tem de ser capaz de mediar os saberes adquiridos que muitas vezes

não são sequer nomeados pelo próprio, e ele tem muitas vezes de apoiar este trabalho de explicitação,

de nomeação. E isto, para o próprio, não se faz sem um processo de tomada de consciência. Eu tenho

de tomar consciência que possuo estes saberes e isto é um trabalho muito importante que o mediador

tem de saber desenvolver e apoiar. Daí que não é a técnica, não é o instrumento, não é o portfólio em si

que vai fazer esta explicitação, é o trabalho que o mediador vai fazer junto do outro, de escuta, de

apropriação, de identificação” (Pires, 2010b, p. 11).

Porém, mesmo que não sejam os métodos, as técnicas e os instrumentos a fazer esse

trabalho de explicitação estes podem ser considerados uma «ferramenta» importante no trabalho

desenvolvido pelos profissionais de RVC.

Na sua prática profissional os profissionais de RVC utilizam diversas metodologias

(enquanto articulação de teorias, métodos e instrumentos) que se vão hibridizando e

reconfigurando em funções da adequação, dos desenvolvimentos e das alterações das práticas

(Cavaco, 2007; Aníbal, 2009; Pires, 2010a).

Desde o início da implementação do Sistema Nacional de RVCC que as metodologias

utilizadas se referem ou inspiram nas Abordagens Autobiográficas e no Balanço de

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Competências e utilizam o Portefólio como documento organizador. Parecem ser as filosofias e

as finalidades subjacentes aos processos de RVCC que o estabelecem (Imaginário & Castro,

2011; Nico, 2011).

A utilização dessas metodologias permite a identificação, a análise e a avaliação das

competências pessoais, sociais e profissionais. Também possibilita a identificação das aptidões e

motivações de cada sujeito (Gomes, 2006, p. 33). Assim, o reconhecimento institucional das

competências (com a certificação), a reativação de percursos educativos e formativos e o apoio

na redefinição de projetos pessoais e profissionais podem ser concretizados.

Relacionam-se duas dimensões temporais que definem um arco temporal (passado,

presente, futuro): uma retrospetiva, quando se fundamenta na avaliação e reconhecimento de

saberes e conhecimentos adquiridos por experiência; e uma outra, prospetiva, quando se

pretende constituir como uma intervenção indutora de projetos pessoais, profissionais,

identitários, educativos, etc., «concretizáveis» (Imaginário, 2001).

Em síntese, com a utilização dessas metodologias, além das finalidades referidas,

pretende-se que se implementem comportamentos introspetivos e reflexivos, no sentido da

autodescoberta e autoavaliação e que vise a valorização pessoal. Com a problematização das

experiências (e dos saberes implicados) resultantes do «mundo da vida» e não somente a sua

sinalização, o acompanhamento pretende suscitar “inquietações e interferências nos seus

mapas de leitura do mundo” (Barros, 2009, p. 647).

Configurações e definições das práticas

O tipo de relacionamento educativo e didático estabelecido entre o profissional de RVC e o

candidato adulto apresenta algumas características particulares. Esse relacionamento é

construído de acordo com as estratégias relacionais e comunicacionais (e com as suas múltiplas

influências teóricas) e fundamenta-se nas formas como cada profissional de RVC organiza e

pensa as suas práticas profissionais.

As práticas profissionais no campo da Educação e Formação de Adultos podem ser

consideradas como uma zona de confluência de diferentes teorias de aprendizagem, de

inúmeros saberes tácitos e de variadas posturas e formas de desenvolver o trabalho educativo

que apresentam, em alguns casos certas diferenças, particularidades e ambivalências (Canário,

2000; Castro, Guimarães & Sancho, 2007, pp. 75-77; Quintas, 2008, p. 46).

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Através da prática do profissional de RVC e da sua ação na construção desse

«relacionamento» educativo, os adultos têm de desconstruir as suas referências mais usuais, em

que se conotam os papéis educativos a um modelo ideal-típico do professor. Ao mesmo tempo,

o profissional de RVC tem de se situar “neste novo tipo de relação social” construindo e

ajustando “as suas funções e atitudes no decurso da actividade e no contacto com os seus

colegas” (Cavaco, 2009, p. 695) e com os próprios candidatos.

Um dos entrevistados que trabalha num CNO promovido por uma escola refere como é

encarado e quais as suas estratégias para configurar o relacionamento, que passa inicialmente

pela aproximação:

Muito deles, muitas vezes, veem-me como coordenador. Escrevem mesmo isso. Outra grande parte,

tratam-me como professor. A figura de profissional ou de técnico de RVCC não é algo que lhes entra

muito bem na sua forma de ver as coisas. (E3.42, p. 52)

Eu começo por tratar as pessoas por ‘tu’ muito rapidamente e começo por tocar nas pessoas muito

rapidamente; ou dar um ‘palmada’ [nas ‘costas’ subentenda-se] se ele for homem, ou fazer um elogio

se ela for mulher. Uso muito o humor! Brinco muito com eles precisamente para que se esbatam as

diferenças que eles sentem muito: o respeito que eles sentem perante a instituição escola ou a figura do

professor. (E3.28, p. 47)

No relacionamento a estabelecer deseja-se uma maior aproximação. Podemos inferir que

há uma certa distinção entre a figura de profissional de RVC e a dos formadores (no caso

referido, também professores):

…não sei se por preparação minha ou por alguma sensibilidade para…, tendo a ter ótimas relações com

os adultos e relações mais próximas com eles do que aquela que eles criam com a restante equipa

formativa, portanto, os formadores. Estou a falar de uma equipa de formadores com uma idade já. Não

são propriamente novos e que, portanto, e apesar de já estarem alguns deles a trabalhar nisto há algum

tempo, continuam a sentir alguma dificuldade - porventura, acham que não é esse o papel deles - em

chegar-se para… portanto, são muito diretivos muitas vezes… Enfim, tendem a não olhar para as

condições socioeconómicas o capital cultural, os acontecimentos que fizeram com que as pessoas

fossem o que são hoje. Portanto, eu sinto da parte deles [dos adultos] uma grande proximidade! (E3.42,

p. 52)

Muitas vezes, mais do que se ir verificando essa adaptação aos vários modelos

relacionais, há profissionais de RVC e Centros que optam por uma abordagem mais explícita:

Nós temos uma folha que diz ‘Termos Incorretos’, na brincadeira. Não é escola, é Centro Novas

Oportunidades; Não são aulas, são sessões. Não sou professor, sou técnico. Chamam-me E5, ou Dr.ª

E5. Quer dizer… (E5.20, p. 84)

Vários fatores se implicam na estruturação desse acompanhamento: as características

psicossociológicas do candidato e do profissional de RVC; as dinâmicas geradas através da

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relação estabelecida entre profissional de RVC e candidato; e as características e a cultura

organizacional.

Referiu-se que o acompanhamento do Profissional de RVC é considerado determinante no

apoio ao candidato durante o processo de RVCC, sendo este aquele que esclarece diversas

dúvidas dos candidatos, os apoia nas suas diferentes solicitações e coordena as várias inter-

relações. Para a configuração da relação e da sua relevância uma das entrevistadas considera o

seguinte:

…nós temos de ser capazes de ajudar o adulto a interligar tudo e temos de estar por dentro de tudo o

que acontece desde o início até ao fim. Desde o momento em que é encaminhado (e temos de saber

mais ou menos o perfil) até ao momento em que sai e vai a júri. (E2.27, p. 32)

…até acaba por ser a nós que atribuem mais responsabilidade e muitos [os adultos] até acham que nós

é que somos os coordenadores. Nós é que temos de gerir tudo. Gerimos os formadores, gerimos o

trabalho deles, portanto, ficam com uma perceção bastante positiva do nosso trabalho. (E2.48, p. 35)

Essa dimensão relacional é determinante na configuração do acompanhamento, como

refere uma outra das profissionais de RVC entrevistadas:

…quanto à parte relacional eu acho que tem mesmo… É como na vida: cada um está a ensinar ao outro

como se relacionar. Não é escrito! É sentido, por isso… (E4.51, p. 70)

É na interação entre profissional de RVC e candidato que se ajuda a estruturar o processo

de RVC. Implicam-se, portanto, as características e atributos pessoais do próprio profissional de

RVC, não só aqueles a mobilizar mas também aqueles a evitar, que advenham da autoanálise e

da aprendizagem pessoal acerca de si, da maneira como se desenvolveram as suas

competências interpessoais e da sua respetiva transformação pessoal e profissional:

Talvez seja uma pessoa compreensiva… tolerante… Portanto, acho que aceito a diferença. Não sei se

pode ser por aí! Tenho um campo… um bocado, se calhar, abrangente das coisas… Não sei se passa

um bocado por isso… pela tolerância… pela compreensão... (E1.22, p. 9)

Depois também tem a ver com características pessoais porque eu sou uma pessoa insegura por

natureza. (E2.17, p. 30)

Acho que, às vezes, sou muito agitada e não sei até que ponto transmito essa agitação para os adultos e

depois começo a dar muita informação. Às vezes sinto isso nas sessões iniciais! É tudo novo para eles e

eu vou e… [simulação de disparos numa queima-roupa de informação] Se calhar devia deixá-los

assimilar as coisas com mais calma. É uma coisa que acaba por ser bom e acaba por ser mau. Eu sou

muito stressada e isso às vezes faz com que eu seja impulsiva. Sou impulsiva e reajo sem pensar. Por

outro lado, também me dá aquela energia para pôr as coisas todas e agilizar. Mas pronto, às vezes

também sou um bocadinho precipitada. (E2.57, p. 36)

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Até porque eu tenho, em termos estritamente pessoais, handicaps, ou teria e tenho menos agora, algum

acanhamento, alguma dificuldade em ser… Estabelecer relações empáticas. Ao início isso custou-me um

pouco. Tive de me ir munindo de algumas estratégias, de alguma flexibilidade que me aproximasse do

Outro. Essa fase, esses anos de trabalho em formação, quer com os miúdos quer com os menos

miúdos, me foi servindo e foi sem dúvida muito útil. (E3.5, p. 44)

Um outro fator relaciona-se com as formas como as «questões de vida» se implicam na

prática profissional. Por um lado, a experiência de vida possibilita uma maior aproximação ou

um maior afastamento dos adultos (e até dos formadores), o desenvolvimento de diferentes

saberes tácitos e até a própria maturidade pessoal parecem determinantes nas formas como se

organiza o trabalho:

Em termos de relacionamento também acho que houve diferenças, por uma questão de vida, acho eu,

também me permitiu maior aproximação com os adultos. (E4.29, p. 66)

Agora, eu diria, talvez, que o traquejo me tornou menos passível de ser aldrabado. Dito de outra forma:

sou hoje mais seguro naquilo que faço; percebo muito mais rapidamente; distingo mais rapidamente;

tipifico mais rapidamente os adultos que tenho à frente e isso ajuda-me a ser mais rápido na minha

resposta, mais assertivo, mais incisivo, mais, por vezes, mais duro, outras vezes nem tanto, não é

necessário. Mais uma vez, foi a experiência, é o traquejo que me ajuda a realizar estas mudanças.

(E3.22, p. 47)

Dás prioridade à questão relacional? Sim, pode-se dizer até porque não venho das Engenharias e

não tenho 25 anos. E fui amadurecendo várias questões, quer por via do estudo, quer por via indireta,

que me habilitem, de certa forma, hoje quase naturalmente a exercer a atividade. (E3.59, p. 55)

No nosso trabalho é muito importante a relação que nós criamos e o saber lidar com pessoas, isso é o

fundamental e estarmos preparados para nos adaptar às idiossincrasias de cada um. Quando vou para

um grupo já não me sinto com receio, sinto-me capaz de lidar seja com pessoas mais refilonas, mais

brutas, mais… (E2.22, p. 31)

Além dessa prática e perfil de acompanhamento e de coordenação/gestão de processo

(utilizando uma linguagem mais gestionária: gestor de uma «carteira de clientes»), uma das

outras dimensões do processo passa pela motivação dos participantes durante o processo de

RVCC.

A dimensão motivacional constitui-se um pilar estruturante no desenvolvimento do

processo de RVCC e pode-se perspetivar em, pelo menos, duas vertentes: uma que é pela

indução da capacidade de ‘persistir’ no processo de RVCC, pelas dificuldades apresentadas

pelos adultos para conseguirem combinar as diferentes responsabilidades da sua vida e reduzir

a suspensão ou a desistência dos processos de RVCC. A outra faceta do trabalho de motivação

relaciona-se com a atividade de aconselhamento anteriormente especificada, que passa pela

«motivação para aprender» ou para «delinear autonomamente projetos de vida» específicos,

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num momento pós-processo. É por isso que o profissional de RVC, na opinião de uma das

entrevistadas, deverá ter alguns atributos:

Eu acho que tem de ser uma pessoa informada, tem de ser uma pessoa culta, tem de ser uma pessoa

capaz de dar resposta, ou de assumir: “eu trago-lhe a resposta” e trazer. Tem que ser correta; tem que

ser honesta; tem que ser capaz de claramente explicar, explanar as coisas aos adultos e eu acho que ao

mesmo tempo tem de ser um incentivador, um motivador, um bocadinho maternal, assim um

bocadinho mãezinha. Porque, de facto, aquilo que é feito neste momento, eles têm mesmo de trabalhar

e bastante. E muitas vezes precisam mesmo daquele amparo para ganharem fôlego para continuar e ir

por aí fora. Mas essas características não sei se são específicas do profissional de RVC, se calhar não

são, se calhar podem-se aplicar a muitas profissões. (E4.81, p. 75)

No trabalho de aconselhamento e orientação implica-se, portanto: o reconhecimento e o

incremento das próprias capacidades; a redefinição de uma identidade pessoal e social; o

desenvolvimento da autoestima e da autoconfiança, que se espera que se reverta na própria

capacidade para «progredir» através dos processos de aprendizagem e desenvolver as

competências. Como refere uma das profissionais de RVC, esse trabalho de motivação e

valorização que vise o desenvolvimento da autoestima é determinante:

É importantíssima! Se uma pessoa não acredita nela própria, nas suas capacidades e no que é capaz de

fazer, não vai ter capacidade de empreendedorismo. Portanto, eu acho que se bem que seja,

aparentemente, um ganho subjetivo, que não é subjetivo, porque ele depois pode-se aplicar na prática.

Obviamente que uma pessoa que não gosta dela, se não gosta dela, não acredita nela, não se vai

arriscar a nada! Quando uma pessoa aumenta sua autoestima tem uma capacidade de relacionamento

com os outros melhor. Porque também se gosta mais dela também é capaz de gostar mais dos outros.

Portanto, em relação a isso, acho que ainda não está muito bem visto o ganho que é o aumento da

autoestima, a melhoria do relacionamento familiar, tudo isso vai ter implicações sociais e na

empregabilidade que tanto se fala. (E4.46, p. 69)

Espera-se que esse acompanhamento que se concretiza na motivação tenha uma vertente

transformadora que se desenvolverá também através da valorização pessoal dos indivíduos

(Cavaco, 2007; Barros, 2009, p. 625).

As diversas metodologias utilizadas, a forma como são configuradas e as finalidades pelas

quais se orientam, parece que proporcionam uma «nova perspetivação» da trajetória pessoal. Ao

considerar-se que os indivíduos são deficitários em termos de qualificações e que têm

dificuldades de, em termos autónomos, configurar os seus projetos de vida, pode-se implicar

uma certa psicologização do processo de RVCC (Amorim, 2006, pp. 45-47), uma espécie de

«cultura terapêutica» apesar de se explicitar que o processo de RVCC não se pode encarar como

uma situação de «preenchimento» de lacunas cognitivas e emocionais (Gomes, 2006, p. 36).

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Com o desenvolvimento das práticas também parece haver uma transformação nas

formas como se encara o candidato no processo de RVC que passam por transformar a imagem

que se tem dos «adultos»:

Acho que com o tempo tornei-me mais exigente, no bom sentido. Antes sofria daquele mal de ver os

adultos como uns coitadinhos e de amparar sempre. Agora não! Acho que são adultos, ok. Nem todos

os adultos são carentes ou têm… e se calhar eu, à partida, pensava isso, ou abandonaram a escola por

motivos frágeis, ou… Não, nem todos! Muitos deles até, ao voltarem à escola a estudar, foi importante e

é importante! Acho que evoluí nesse sentido. Porque no princípio acho que lhes ‘amparava muito o

jogo’, não é ser ‘compreensiva’ de mais, mas era até… Faziam um bocadinho e até achava que já

estava e até eu não puxava mais por eles, porque pronto… coitados… agora não, já os posiciono como

deve ser. Acho que estava errada e evoluí. (E1.32, p. 10)

Acho que, inicialmente era muito maternalista com os adultos e isso depois fazia com que eles não

fossem tão autónomos. Às vezes, até confundia um bocado as coisas em termos relacionais e

aproximava-me demais e isso faz com que, em determinadas situações, não esteja a ser… pronto…

facilite mais as coisas… Não está certo! Mas de uma forma geral tenho uma relação boa com os

adultos! (E2.42, p. 34)

Parecem coexistir diversas formas de organizar o trabalho e de considerar a relevância do

relacionamento pessoal no processo de RVCC. A aproximação entre o profissional de RVC e o

candidato, que o tipo de acompanhamento permite, implica a criação de diversos níveis de

empatia e de identificação interpessoal mas também cria alguns constrangimentos.

Estas características relacionam-se obviamente com os perfis de desempenho e com as

características idiossincráticas dos diversos profissionais de RVCC e que se manifestam de

formas diferenciadas. Seria pertinente considerar se as questões em torno do papel da

motivação e do aumento da autoestima correspondem a uma estratégia específica, a uma

finalidade do processo de RVC ou a uma consequência do trabalho de acompanhamento

desenvolvido (ou mesmo a uma combinação destes três aspetos).

A ação de acompanhamento do profissional de RVC passa por criar as condições

motivacionais para o desenvolvimento do processo de RVC (e das suas metodologias e

instrumentos) através de diversos espaços e momentos que proporcionem formas diversificadas

de auto e heteroavaliação. No entanto, há diversas implicações que advêm dos próprios

processos de avaliação de competências e saberes pessoais. Há duas implicações principais que

implicam uma abordagem diferenciada por parte dos profissionais de RVC e que podem implicar

diversas consequências: a subavaliação ou mesmo a sobreavaliação das competências e

saberes próprios.

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100

Nos processos de RVCC considera-se, na maior parte das vezes, as questões relacionadas

com a subavaliação das próprias competências, relacionando-as com a existência e permanência

de formas de autoimagem negativa e mesmo de formas diversificadas de estigmatização social.

No entanto, também a sobreavaliação individual pode implicar diferentes efeitos negativos

no processo de RVCC e no relacionamento com a equipa e mesmo com outros candidatos. Esta

manifesta-se, por exemplo, numa «valorização» própria por comparação e pela menorização de

outros candidatos e também pelas discordâncias em relação à avaliação própria e à avaliação de

outros. Seria interessante verificar como se perspetivam nos adultos em processos de RVC, e

que implicações têm os seus diversos «mecanismos de defesa do ego» e as disposições

individuais.

Saliente-se, porém, que são essas «dissonâncias» que fundamentam a intervenção dos

profissionais de RVCC e a configuração do relacionamento entre o profissional de RVC e o adulto

torna-se por isso determinante para a prática e ação profissional e para a própria definição da

sua profissionalidade e do seu profissionalismo62.

Em qualquer dos casos deve-se sempre desenvolver atitudes de vigilância por parte dos

profissionais de RVC já que nem o relacionamento estabelecido nem o acompanhamento são

neutrais. O profissional de RVC, ao procurar refletir sobre as suas atitudes e mesmo a procurar

junto da equipa em que está integrado a discussão de algumas dessas temáticas relativamente

às melhores formas de desenvolver as suas tarefas, conseguirá considerar as implicações da

sua prática profissional.

Na reflexão sobre as práticas, destaca-se a capacidade de se adaptar às características

dos indivíduos (e dos grupos) e através da desconstrução das suas próprias pré-noções, induzir

62 De acordo com o documento Key competences for adult learning professionals são especificadas três competências indiciadoras de profissionalismo e que “descrevem uma atitude profissional direcionada à própria prática do profissional, ao campo e instituto em que o profissional trabalha”: 1) Ser um aprendente ao longo da vida completamente autónomo; 2) ser um comunicador e um jogador de equipa e 3) Ser responsável pelo desenvolvimento contínuo da aprendizagem do adulto. A primeira das competências, «ser um aprendente autónomo», implica que o profissionalismo se demonstre através da reflexão sistemática sobre as próprias práticas, aprendizagens e desenvolvimento pessoal. Ao mesmo tempo, de acordo com contexto institucional, deverá perspetivar reflexiva e criticamente as possibilidades para o desenvolvimento das práticas profissionais. Também deve saber gerir o seu processo de aprendizagem e organizar o seu tempo e trabalho. O agente de EFA também deve ser «autêntico» e «consistente» nas suas opiniões e interesses. A segunda das competências, «ser um comunicador e um jogador de equipa», passa por saber utilizar as diversas técnicas comunicacionais apropriadamente. Também deve saber trabalhar de forma colaborativa e estabelecer relações de confiança. Revela capacidade de incorporar essas informações para o desenvolvimento da sua prática profissional. O agente de EFA deverá ser íntegro e respeitar os outros, tendo uma atitude positiva nas formas de trabalhar. A terceira das competências, «ser responsável pelo desenvolvimento contínuo da aprendizagem do adulto», deve passar pela capacidade de assumir as responsabilidades relativas ao desenvolvimento das aprendizagens dos adultos, de acordo com os diversos contextos institucionais (Buiskool, Brook, van Lakerveldal, Zarifis, & Osborne, 2010, pp. 90-91). Para mais detalhes relativos às competências-chave para um educador de adultos, ver anexo 4.

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no candidato um gosto por saber mais e mesmo a modificação de determinadas características

individuais e sociais:

Pelo menos a ideia de que é importante atender ao outro, chegar ao outro, compreender a sua lógica de

pensamento e com isto, enfim, flexibilizar um pouco as ideias… a construção própria que se tem e que

tantas vezes inviabiliza relações, aproximações. (E3.30, p. 48)

Porque gosto de trabalhar com pessoas e porque gosto de me relacionar com pessoas. Gosto de

despertar a curiosidade, o conhecimento, o gostar de saber, o querer saber mais nas pessoas, sempre

gostei disto. E passa muito por aí, exatamente, este trabalho enquanto profissional de RVCC. (E4.57, p.

71)

Acho que é importante sabermo-nos relacionar bem com as pessoas, sermos capazes de nos

adaptarmos às diferentes características das pessoas porque tu para uma pessoa com determinadas

características vais ter de ser de uma maneira, com outra vais ter de ser de outra. É preciso termos essa

capacidade de mutação, digamos assim. Pô-los a trabalhar em grupo, é importante saber gerir o grupo,

acho que é muito importante. (E2.59, p. 36)

Deve-se ser rigoroso mas condescendente também. Isto ao longo do processo e quando eu falo em

condescendente estou a pensar em muitas das pessoas que ficam pelo caminho ficam apenas porque

não houve um cuidado em atender a situação particular do adulto naquele momento. Portanto, o rigor!

Depois, e isto por formação, ou por sensibilidade, as questões relacionadas com o desmontar de um

certo o ‘nacional-porreirismo’ em que muitos dos adultos se situam na vida. Este alertar para um brio no

trabalho, na família, na relação com as artes, com a vida, como o país, com o mundo. O profissional

nunca deve estar satisfeito, lá porque o adulto faz uma conclusão de quatro linhas e por isso se cumpre

mais uma etapa. Eu diria que o profissional deve ser um eterno insatisfeito e passar essa sensação ao

adulto. (E3.57, p. 54)

Os profissionais de RVC definem o seu trabalho de múltiplas formas. Além das definições

através das finalidades implicadas no processo de RVCC (uma definição teleológica) também se

recorre a definições através da explicitação do modo como se desenvolve o processo de RVCC

(uma definição processual).

Por exemplo, alguns dos profissionais de RVC definem as suas práticas nessa vertente

mais procedimental: as funções do profissional de RVC passam por apoiar o candidato na

elaboração de uma autobiografia, ou seja, passam por organizar um portefólio reflexivo de

aprendizagens com vista à sua avaliação:

Eu ajudo os adultos, ou oriento os adultos a escreverem uma autobiografia, já por ela que também tem

de ser orientada – isto é redundante, não é? Dou apoio inicial para que os adultos consigam escrever

uma biografia com conteúdos específicos. (E1.44, p. 12)

Uma outra forma para definir a ação e a prática profissionais do profissional de RVC tem a

ver com o que se pode designar por via «substitutiva», ou seja, pela relação entre aquilo que faz

e aquilo que o formador não faz, nomeadamente em termos de proceder a uma maior

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integração e inter-relacionamento dos conteúdos e temas específicos a serem incluídos e

avaliados no portefólio e que sejam relativos a áreas de competências-chave específicas. Duas

das entrevistadas realçam precisamente essas diferenciações e algumas das suas implicações:

Por outro lado, tem que estar por dentro de todos os referenciais, tem de saber, tem de saber como é

que... Até acho que, pelo menos daquilo que eu sei, acho que nós, vamos fazendo mais; vamos

sabendo mais do que os próprios formadores. Nós é que temos de ter o papel! Enquanto o formador de

uma área vai e pega só na área dele, daquela forma, nós temos de ser capazes de ajudar o adulto a

interligar tudo e temos de estar por dentro de tudo o que acontece desde o início até ao fim. Desde o

momento em que é encaminhado e temos de saber mais ou menos o perfil até ao momento em que sai

e vai a júri. (E2.27, p. 32)

…até acaba por ser a nós que atribuem mais responsabilidade e muitos até acham que nós é somos

que somos os coordenadores. Nos é que temos de gerir tudo. Gerimos os formadores, gerimos o

trabalho deles, portanto, ficam com uma perceção bastante positiva do nosso trabalho. (E2.48, p. 35)

Sinto um bocado falta de tempo dos formadores. Não é que eu não goste até de falar um bocadinho de

CLC, ou de STC ou de CP, ou das outras que até gosto. Sempre saio um bocado do ramerrame! Mas

depois é a função de mediadora. Mediar formadores-formandos… Às vezes, até é cansativo ter mediar e

ter de gerir. Porque nós fazemos tudo! Só não marcamos júris. De resto, conseguíamos perfeitamente

levar o Centro para a frente. (E1.143, p.23)

Essa responsabilidade de substituir e de integrar as diversas áreas e ter ainda que mediar

todas as partes pode, em determinada medida, aumentar os níveis de responsabilidade a

aumentar o desgaste físico e psicológico associado a esse desempenho profissional, que vai

sendo compensado com os resultados obtidos com os adultos:

Eu agora não é tentar desresponsabilizar-me mas antes sentia que tinha mais uma carga… Sentia-me

mais sobrecarregada do que agora. Isto é, alguma coisa que corria mal… Nunca pensava que a

responsabilidade poderia ser partilhada pela equipa ou por todos os formadores. Pensava logo que a

responsabilidade seria minha. Agora, felizmente mudei essa minha postura, essa minha forma de

pensar, porque realmente não é! (E1.70, p. 14)

Portanto, como ser humano, acho que aprendi muito e aprendo muito ainda com muitos deles. Às

vezes, até pode ser cansativo e desgastante ainda assim ainda tem um lado com mais coisas boas do

que coisas más. Mais até na relação comigo e com eles. (E1.33, p. 10)

Tendo em conta todo o desgaste que temos… O desgaste psicológico! Trabalhar com pessoas é muito

desgastante e muita gente não têm essa noção. Atendendo às nossas qualificações e tudo isso somos

mal remunerados comparando com outras profissões. Não é que a nossa profissão seja melhor, se

calhar nem é tanto por aí. Já estamos a entrar outro campo. (E2.61, p. 37)

Porque me libertaria de algum cansaço inerente ao trabalho direto com os adultos e permitir-me-ia

pensar nas coisas de uma forma mais abrangente. (E3.73, p. 58)

Refira-se que desde o início do processo de RVC permanece uma certa demarcação entre

as diversas funções (entre profissional de RVC e formadores) e até uma certa diferenciação entre

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os conteúdos a serem avaliados pelos formadores de cada área de competências-chave (Barros,

2009, p. 645).

Apesar de se terem verificado diversas alterações nas práticas de reconhecimento de

competências, resultantes das reflexões das equipas sobre as suas práticas (Cavaco, 2009, p.

615), nos ajustamentos às exigências da tutela e nos diversos modelos de organização do

processo de RVCC, ainda persistem algumas diferenciações em termos de funções.

Em determinados casos verificam-se algumas descontinuidades metodológicas entre os

diversos intervenientes no processo de RVC, mais especificamente entre os profissionais de RVC

e os próprios formadores, procurando os primeiros a reflexão e identificação de competências e

os segundos desenvolvendo exercícios de demonstração (Ávila, 2005; Cavaco, 2007).

Patrícia Ávila (2005: 455-458) reconhece que se verificam diferenças quanto à forma

como se organiza o trabalho dos profissionais de RVC e dos formadores. Na sua análise dos

processos de RVC, estipulou três modelos que representam a forma como se articula a

construção da autobiografia e como se procede ao reconhecimento das competências-chave

considerando as competências especificadas no Referencial: 1) modelo dual ou orientado para a

valorização pessoal; 2) modelo dual em reconversão; 3) modelo integrado, ou orientado para o

reconhecimento de competências.

No primeiro modelo - modelo dual orientado para a valorização pessoal - o profissional de

RVC é encarado como um «profissional de histórias de vida» que procura enfatizar

exclusivamente a dimensão motivacional e a contribuição da história de vida para a valorização

pessoal dos adultos. Verifica-se uma separação entre as histórias de vida (da exclusividade dos

profissionais de RVC) e o reconhecimento das competências-chave adquiridas (da exclusividade

dos formadores). Desta forma, o Referencial de Competências-Chave é encarado como um

instrumento de trabalho do formador e não do profissional de RVC.

No segundo modelo - modelo dual em reconversão - enfatiza-se o contributo das histórias

de vida para a valorização pessoal mas procura-se orientar as mesmas para o reconhecimento

de competências. Verifica-se a necessidade de diminuir a separação entre histórias de vida e

reconhecimento de competências. O referencial de competências-chave é considerado pelo

profissional de RVC um instrumento de trabalho necessário. Também a identificação final das

competências é realizada em sessões orientadas pelo formador e pelo profissional de RVC,

destinando-se à evidenciação ou demonstração de competências que não tenham sido

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manifestadas nos materiais produzidos durante as sessões de desenvolvimento das histórias de

vida.

No terceiro modelo - modelo integrado orientado para o reconhecimento de competências

- procura-se orientar o trabalho para o balanço de competências e para a diferenciação de

competências específicas e competências-chave. Representa, portanto, uma “transição numa

concepção centrada na valorização pessoal dos indivíduos, para uma outra com maior incidência

na análise das competências-chave” (Ávila, 2005, p. 458). Verifica-se a necessidade de articular

o trabalho com os formadores e de perspetivar novas formas de análise das informações

recolhidas para permitir uma identificação das competências-chave. O referencial de

competências-chave é encarado como o principal instrumento de trabalho do profissional de

RVCC, apesar das diversas dificuldades associadas ao mesmo.

Tecnicização da prática: administração, monitorização e auditabilidade

Uma dimensão na prática e ação dos profissionais de RVC que implica diferentes

comentários e questionamentos relaciona-se com o trabalho administrativo implicado no

desenvolvimento dos processos de RVCC e com a organização burocrática dos CNO63.

Desde os primórdios do Sistema Nacional de RVCC que se tentou proceder a uma

uniformização e normalização em termos administrativos (relativamente a formulários e

procedimentos). Os diferentes modelos de gestão e avaliação de resultados foram impostos

centralmente (top-down) com as diversas diretrizes e orientações técnicas e também através das

regras implicadas nas lógicas de candidatura financeira e de gestão centralmente produzidas

que se fundamentavam em dois aspetos: 1) a orientação para resultados e 2) lógicas de

monitorização.

Por um lado, as práticas profissionais e as os Centros eram condicionados por uma

orientação para resultados, as afamadas «metas». A taxa de concretização de candidatos

certificados, por exemplo, tornou-se um dos critérios de avaliação do funcionamento do CNO, da

aprovação das candidaturas e também influia no número de agentes profissionais permitidos,

como podemos verificar no Quadro 1. No caso da Iniciativa Novas Oportunidades essas metas

63 Só se analisará as atividades com relação direta com a atividade profissional dos profissionais de RVC. Não se considerarão os sistemas formalizados de avaliação organizacional (Common Assessment Framework) ou de desempenho profissional, por exemplo o Sistema Integrado de Avaliação de Desempenho da Administração Pública (SIADAP) ou as diferentes aplicações financeiras.

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eram consideradas desajustadas ou mesmo “irrealistas” (Valente, Carvalho, & Carvalho, 2009,

p. 27) e condicionaram de múltiplas formas o trabalho dos profissionais de RVC e dos CNO,

nomeadamente em termos de diminuir a reflexão sobre as práticas:

Às vezes, é o que eu te digo, gostava de ter mais tempo para perder. Por um lado, é importante termos

metas e objetivos. Se as metas não fossem para ‘cortar’, é importante, porque senão um portefólio pode

ser feito eternamente. Haveria sempre alguma coisa que eu lhe pudesse pedir para eles falarem. Então,

nunca mais se sairia do sítio! Ou era possível estarmos sempre a marcar sessões e haver sempre

qualquer coisa. (E1.143, p. 23)

Implicava-se, portanto, uma certa lógica de produtividade individual e organizacional,

aquilo que Licínio Lima designa por paradigma da educação contábil (Lima, 1997), que inclui

entre outros aspetos, uma avaliação institucional que procura prioritariamente a aferição da

eficácia e eficiência nas organizações educativas e o controlo de qualidade.

Quadro 1- Tipologia dos Centros Novas Oportunidades

Níveis Inscritos Em proc. de RVCC Certificados

(total e parcial) Equipa associada

A Bás. 250

500 157

268 149

240 3 profissionais de RVC 5 formadores (tempo inteiro) Sec. 250 101 91

B Bás. 400

800 252

414 239

385 4 profissionais de RVC 5 formadores (tempo inteiro) Sec. 400 162 146

C Bás. 650

1300 410

673 389

626 4 profissionais de RVC 7 formadores(tempo inteiro) Sec. 650 263 237

D Bás. 900

1800 567

932 539

867 5 profissionais de RVC 8 formadores(tempo inteiro) Sec. 900 365 328

De acordo com Despacho n.º 21022/2009 (18/09/2009) e orientações técnicas da ANQ (2009)

Também a implementação de lógicas de monitorização (de auditabilidade) e a

implementação de instrumentos que as facilitem e uniformizem condicionou a ação dos

profissionais. Na gestão dos processos de RVC e do CNO estão implicados diferentes

mecanismos de monitorização e controlo. São comuns a todos os CNO: o SIGO64 (Sistema de

Informação e Gestão da Oferta formativa) e a organização e manutenção de um Dossiê Técnico

Pedagógico65.

Para António Fragoso e Paula Guimarães (2010) a existência desse trabalho

administrativo e o facto de os profissionais de RVC terem de ocupar a maior parte do seu tempo

com os procedimentos técnicos e burocráticos implica - numa relação da causalidade e

64 O SIGO consiste numa plataforma informática que incorpora diferentes dados e informações de todo o SNRVCC e de todos os CNO. Pretende ser uma ferramenta que auxilie na gestão das ofertas de qualificação e na monitorização de todos os candidatos que estejam a frequentar ações no âmbito do SNRVCC. Esta plataforma é mantida com os dados introduzidos pelas diferentes equipas administrativas e pedagógicas dos CNO. 65 Este é um documento que organiza o conjunto de informações e comprovativos referentes à execução de um projeto no âmbito do Quadro de Referência Estratégica Nacional (Decreto Regulamentar nº 84-A/2007, de 10 de Dezembro, artigo 32º).

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generalização questionáveis - que os próprios profissionais de RVC não se possam comprometer

com a “construção da reflexão crítica” e que passem por ser meros «técnicos» acríticos e

apolíticos:

“a eventual emergência de novas profissões no campo da aprendizagem ao longo da vida também

envolverá a definição de uma variedade de perfis técnicos. Devido às características dos processos de

administração e gestão das novas formas de provisão da educação de adultos, a maior parte dos

técnicos ocupam o seu tempo com procedimentos técnicos e burocráticos. Dessa forma, estão muito

longe das intervenções educativas dos intelectuais orgânicos ou de outros educadores contra-

hegemónicos; resumindo, não estão comprometidos com a construção da reflexão crítica – eles são

técnicos de aprendizagem ao longo da vida, especialistas na gestão da autonomia dos adultos de uma

forma apolítica” (Fragoso & Guimarães, 2010, p. 27).

Não nos parece, no entanto, que entre as tarefas técnico-administrativas e as tarefas

educativas se constitua uma antinomia, mas sim, numa perspetivação diferente, uma dicotomia.

A gestão administrativa e financeira associada aos processos de RVCC e aos CNO e aos

processos de RVC implicam o registo de diferentes dados pessoais, o controlo da informação e a

monitorização da intervenção por parte das equipas técnicas, das entidades promotoras e das

entidades tutelares. No entanto, consideramos que a intensificação de atividades técnico-

administrativas66 e de lógicas gestionárias desvia da reflexão e da meditação mais abstrata sobre

as práticas. Nas palavras de Rosanna Barros, a intensificação das práticas técnico-

administrativas passa por

“promover activamente o desvio da reflexão, e meditação mais abstracta, nos pressupostos político-

pedagógicos da acção local dos próprios actores para uma crescente preocupação, mais pragmática,

concentrada em cumprir as metas físicas e os aspectos gestionários, que salvaguardam um certo capital

institucional de candidatura aos necessários financiamentos (Barros, 2009, pp. 611-612).

De acordo com uma das entrevistadas:

Esse trabalho é um trabalho inglório. Inglório no sentido porque rouba muito tempo e pouco dá para o

processo. Acho que se perde muito tempo. Acho que também não há ninguém que não se queixe de

que o trabalho burocrático faz perder muito tempo e fica menos tempo para… Mas pronto tem de ser

feito, tem de ser feito! (E4.84, p. 75)

Manifestando um certo espírito de resistência, um dos outros entrevistados referiu:

Nunca fui muito sensível, ou nunca me subjuguei à normativa que a tutela impõe; à necessidade de

atualizares constantemente o SIGO, nunca faço esse tipo de coisas, quase como se tivesse num limbo

66 Repetindo a informação entre o SIGO e do dossiê técnico-pedagógico, o profissional de RVC tem de criar e/ou organizar os seguintes documentos: originais de instrumentos/documentos produzidos e utilizados no âmbito do processo de RVCC; cronograma das sessões no âmbito das atividades do CNO; sumários das sessões de processos RVCC; atas das reuniões da equipa técnico-pedagógica; atas das sessões de validação; atas das sessões do Júri de Certificação; fichas de inscrição dos candidatos; contratos de participação no processo de RVCC; pedido de certificação; termo das formações complementares; termo de certificação de competências; Plano Pessoal de Qualificação; Plano de Desenvolvimento Pessoal; Certificado de Qualificação; Diploma; avaliação do funcionamento do CNO (pelo adulto), entre outros mais específicos a cada CNO.

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profissional: “Julguem-me! Demitam-me!”. Eu não estou para me chatear com isso! Há outras coisas

para fazer muito mais importantes, e olha… (E3.22, p. 47)

Um dos outros aspetos é a publicação por parte das entidades tutelares

(ANEFA/DGFV/ANQ) de diferentes diretrizes e orientações técnicas que pretendem regular a

maior parte dos momentos e situações do processo de RVC, não permitindo espaços de

criatividade ou adaptação ao contexto. Muitos desses «regulamentos» corresponderam a

solicitações das equipas que pretendiam e valorizavam uma uniformização de procedimento:

…com tantos Centros a abrir, eles tinham de definir alguma coisa, se não cada Centro fazia o que

queria. […] Eu acho que eles acabaram de alguma forma por definir mais o nosso trabalho, em termos

de instrumentos a utilizar, das regras, aqueles caderninhos que eles nos entregaram, os manuais: de

como se deve fazer uma sessão de júri, como o Técnico de Diagnóstico. Inicialmente não havia Técnico

de Diagnóstico e Encaminhamento, aí houve mudanças! O problema aqui é que as mudanças surgiram

e houve uma formalização das coisas, só que aumentaram também o número dos Centros. Se isso

tivesse acontecido logo no início com poucos centros, as coisas ficariam mais bem estruturadas – o tal

feedback – e uma coisa ajuda a outra. (E5.9, p. 81)

Toda esta normatividade pode implicar diversas consequências negativas. Uma que foi

assinalada por diversos entrevistados relaciona-se com uma certa ‘tecnicização’ da prática

profissional que é criticada pelos próprios «técnicos da aprendizagem ao longo da vida»:

Eu acho que é essencial não se ser um técnico! Isto é, eu acho que é essencial ver-se para além de,

estar-se para além dos procedimentos inscritos numa determinada diretriz. Quem não tenha a cultura, a

sensibilidade, o gosto por interferir positivamente em trajetos… Em pessoas que querem ser ajudadas,

querem progredir, querem avançar… Quem não tem este gosto especial, quem esteja a olhar para o

relógio para sair às 6 da tarde não está a prestar um bom serviço. (E3.39, p. 50)

Ora bem, entendidos à letra pelos tais técnicos que eu há pouco criticava, muito de ‘funcionalismo

público’ (entendido aqui negativamente), não são transformacionais. Muitas vezes são apenas o

aproveitamento, claro está, com o beneplácito dos tais técnicos, são o aproveitamento de uma

oportunidade ou de uma construção que não traduz necessariamente melhorias significativas na

formação das pessoas. Daí eu achar que é importante complementar a nossa ação com o rigor

humanístico-qualquer coisa que deixe as pessoas um pouco conscientes das suas lacunas. (E3.41, p.

51)

Por exemplo, tenho uma colega minha que é Técnica e ao falar com ela, com essa minha amiga, eu sei

que ela é só Técnica. Ela tem os grupos e ela faz aquele trabalhinho. Nós na associação não somos

assim! Como já estamos desde o início nós percebemos daquilo! E então, quando há uma coisa para

resolver, mesmo quando nos ligam da ANQ e tudo, é a nós que nos vão ligar, porque nós sabemos das

coisas. (E5.26, p. 85)

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Identidades profissionais

Na configuração das identidades profissionais estão implicados diferentes processos de

“construção de um significado” que se baseiam na consideração de conjuntos de atributos

específicos que pretendem prevalecer sobre “outras formas de significado” (Castells, 2003, p.

3). Nesses processos de construção de significado são implicados os valores, normas e crenças

específicos e as trajetórias biográficas e de aprendizagem, as trajetórias e as condições

profissionais e as diferentes relações sociais estabelecidas. As identidades profissionais

desenvolvem-se, portanto, em interações e contextos específicos e relacionam-se também com o

próprio reconhecimento e visibilidade social (Santos, 2011, pp. 65-73).

Se entendermos a identidade profissional como um «modo de apresentação do Eu» no

espaço público que traduz aquilo que cada profissional pensa sobre si próprio, consideramos

que os profissionais de RVC entrevistados possuem diversas referências identitárias e, de acordo

com as suas próprias disposições ou interesses específicos, utilizam-nos diferentemente na

definição e apresentação da sua identidade pessoal.

Por um lado, verifica-se uma identificação comum no campo profissional, uma

manifestação de uma identidade própria e generalizada que passa pela criação de “um código

interno criado através da interação social entre todos os actores do campo profissional” que é

estruturado em torno de uma linguagem específica ao campo profissional; um referencial

comum de conduta (individual e profissional); um corpo de conhecimentos e de procedimentos

coletivos (Santos, 2011, pp. 55-56). No entanto, verificam-se outras identidades profissionais a

que se recorre tendo em conta as considerações individuais em torno da adequabilidade e

distinção profissional ou social, em termos inclusivamente de capital simbólico67, que cada um

das identidades possibilita.

Acede-se a cada uma das configurações identitárias de acordo com a perceção e

valorização pessoal de «adequação» profissional ou social de cada uma dessas identidades de

referência. De acordo com cada contexto específico parece que se envolve uma situação de

“suspensão/acção ou de inibição/activação” (Lahire, 2005, p. 25) da pluralidade das

disposições individuais.

Num sentido essa ativação/inibição parece relacionar-se com o «expectável» em termos

de desempenho profissional, o que do ponto de vista do «Outro» parece suscitar alguma

67 De acordo com Pierre Bourdieu: “o capital simbólico pode ser qualquer propriedade (qualquer espécie de capital, físico, económico, cultural, social) que seja percebida por agentes sociais cujas categorias de percepção são tais que eles são capazes de a conhecer (de se aperceberem dela) e de a reconhecer concedendo-lhe valor” (Bourdieu, 1997, p. 80).

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dificuldade na diferenciação de papéis. Simultaneamente, a delimitação dessas «fronteiras» que

segregam as identidades específicas vão-se reconfigurando ao longo do tempo:

Acaba sempre por aparecer alguém com um problema específico, com uma situação específica, que

inclusivamente acabam por dizer: “a doutora é psicóloga!”; “Mas eu não estou aqui como psicóloga!”.

Mas certo é que depois… Depois não se pode fugir. (E4.8, p. 62)

Enquanto profissional [de RVC] podes fazer isso. Enquanto psicólogo, tu não deves fazer isso, enquanto

psicólogo clínico, não deves fazer isso. (E4.54, p. 70)

Eu diria que digo que sou profissional de RVC e estou ali para ajudar os adultos a verem, a descobrirem

os seus conhecimentos e as suas aprendizagens. Mas acaba sempre por também vir: mas sou

psicóloga! Eu acho que… Tem graça! Pensando agora, eu lembro-me perfeitamente, de início: “eu sou

psicóloga e estou a trabalhar como profissional de RVC na Escola Secundária Z”. Ultimamente e talvez

até por estarem a ser mais atacadas e ser preciso defendê-las, explicá-las, porque as pessoas não

sabem o que é, eu digo: “trabalho nas Novas Oportunidades. Muitas vezes eu digo trabalho nas Novas

Oportunidades e pronto! Novas Oportunidades. (E4.33, p. 67)

Dois outros fatores parecem implicar-se nessa inibição/ativação de disposições: a imagem

pública definida que a Iniciativa Novas Oportunidades vai revelando (justa ou injustamente) e

aquela que os profissionais de RVC não possuem.

De uma forma geral e de acordo com algumas perceções, essa imagem social e mediática

deriva de diversas condicionantes: do desconhecimento e desconfiança (e consequentes

mecanismos de resistência social e mediática) relacionadas com as características dos

processos de RVC (a «novidade» e a «complexidade» das metodologias utilizadas e a diversidade

de agentes profissionais e instituições envolvidos); uma certa ideia de «facilitismo» (amplificados

pela Comunicação Social) sobretudo pela comparação com outros modelos e formas de

avaliação utilizados para os mesmos níveis de qualificação (os exames, etc.), entre outros (Liz,

Machado, & Burnay, 2009). Estas implicações não têm apenas implicações no espaço mediático

mas também ao nível individual:

São pessoas que não aderem mesmo às Novas Oportunidades. Eu conheço pessoas que foram

obrigados a inscreverem-se enquanto desempregados e depois não foram. Discordam das Novas

Oportunidades! Dizem que não está certo, que não está correto. Acham que as pessoas não aprendem

nada e, portanto, as pessoas não têm nada o 9º ano, ou o 6º ano ou o 12º ano. E que não é correto

para os outros que andam a estudar três anos e por aí fora. Mas a maior parte das vezes eu acho que é

por desconhecimento. Não sabem como funciona por dentro. Também, como funciona por dentro, nós

sabemos por nós, não sabemos o que se passa nos outros. Se calhar há muita gente que sabe como

funcionam os outros [Centros]: foram buscar os diplomas… (E4.35, p. 67)

Os profissionais de RVC são uma ocupação profissional relativamente desconhecida.

Diferentes fatores podem estar implicados nesse desconhecimento social: a pluralidade de

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designações, que não facilita uma identificação consensual; ser uma ocupação profissional sem

‘lastro histórico’; por efeito dos profissionais de RVC não se apresentarem como tal, por à partida

não ser reconhecida:

…sei que quando digo que sou profissional de RVC. Primeiro digo que sou profissional de RVC e… “Ah!

O que é isso?” E depois quando digo que trabalho num CNO, levo sempre ou muitas vezes com aquela

cara feia, tipo… derivado à má informação que se vai veiculando. (E2.47, p. 35)

Não há necessariamente muitas convergências, ou haverá algumas entre a ação do Profissional e dos

adultos mas a um nível da perceção da sociedade, desde sempre que há muitos pontos de interrogação

– e alguns serão legítimos -, muitas dúvidas, muitas críticas. (E3.41, p. 51)

Em termos de visibilidade ou de aceitação pública – como até já te disse – às vezes custa-me dizer que

sou profissional de RVC, as pessoas nem sabem o que isso é: Reconhecimento de Competências das

Novas Oportunidades… (E3.44, p. 52)

Portanto, num certo sentido de precaução e por causa da desconfiança social prefere-se

utilizar uma identidade profissional menos problemática, mais consensual e socialmente

valorizada. Não se refere que se trabalha nas ‘Novas Oportunidades’ ou como profissional de

RVC para que não se implique na comunicação uma explicação ou explicitação adicional, uma

justificação ou uma defesa da (pretensa) validade, pertinência e interesse social dos processos

de RVCC. A distinção social também tem um fator significativo neste sentido:

Claro. Sou psicóloga. Trabalho com adultos! Se as pessoas me perguntam indiretamente, eu digo:

“trabalho num CNO”. Se me perguntam, falo! Normalmente se estás com alguém que já sabe disto

normalmente há uma conversa que não interessa nem a gregos nem a troianos, não interessa nada ter

a conversa. É só por isso! Mas se eu tiver que dizer digo, caramba! Não tenho, não tenho… Até porque

eu defendo este trabalho. Agora já me canso de defender o trabalho. (E5.39, p. 87)

Acrescendo à imagem social, implicam-se outros fatores com influência na constituição

das identidades profissionais, entre os quais a ‘desvalorização’ de algumas das organizações e

atualmente dos próprios poderes públicos e da tutela.

Em termos de reconhecimento organizacional, implica-se por vezes um sentimento de

pouca valorização. Por exemplo, um dos entrevistados que trabalha num CNO de uma escola

pública referiu que a organização Escola não conseguiu ainda enquadrar a ação do profissional

de RVC como um agente educativo, já que considerará ainda o “monopólio do professor como

educador profissional” (Canário, 2008, p. 18):

A escola, o meio, não olha para mim, para este ator educativo da mesma forma, claro! Está muito

desfasada do que é isto da Educação de Adultos, da metodologia, das particularidades que esta ação

exige. Portanto, o meu estatuto na escola é algo que andará entre estas duas imagens: o tipo formado

em Sociologia que trabalha lá no CNO; e o senhor professor […], que é um tipo extraordinário e muito

amigo e impecável, e isto e aquilo e aqueloutro. (E3.42, p. 52)

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Na configuração de uma identidade profissional específica resta portanto o trabalho com

os próprios adultos e as consequências resultantes das práticas, quase que como uma forma de

resistência contra a desvalorização por parte dos outros educadores, da sociedade e dos poderes

públicos considerados na tutela (a ANQEP)

…eu sinto-me importante no que faço por quase dos meus adultos, mais nada, ponto final. De alguns

adultos… E mais nada, ponto final. Não tenho o reconhecimento da tutela! A tutela não acha que aquilo

que eu faço é importante; os pares também não. A sociedade no seu todo também não. (E3.62, p. 55)

Por um lado há questão dos mitos todos que se vão criando lá fora e as pessoas ficam sempre um

bocadinho de pé atrás, olham com estranheza. Mas eu explico, explico que… e até pergunto à pessoa,

por exemplo, se não sente que ao longo da vida se vai aprendendo e todos os dias se nós estivermos

com os canais abertos somos capazes de aprender. O que eu explico é que aqui é feito um

reconhecimento dessas aprendizagens que não são feitas em contexto necessariamente formativo,

formal. Falo dos diferentes contextos e depois dou exemplos específicos e digo que realmente o nosso

trabalho é muito complicado porque não é como um professor. Isso é uma das grandes dificuldades que

eu sinto e acho que os formadores têm a vida mais facilitada nesse sentido é que se nós tivéssemos

uma matéria para dar… Hoje vou dar isto, isto e isto. Nós aqui temos de ajudar as pessoas a refletir,

temos de pôr as pessoas a refletir. Isso é uma coisa que é muito difícil. Nós próprios sentimos

dificuldade em refletir. Saber refletir não é… Agora estou a mudar um bocado de assunto. Mas esse é

um dos grandes desafios que a nossa profissão tem. É realmente levar o adulto a… Ele pode ter

efetivamente as competências mas nem está consciente que as tem e ser capaz de refletir acerca delas.

Por isso eu explico que o nosso trabalho é complicado. (E2.24, p. 31)

Porque há uma carga negativa, pejorativa relativamente a esta nomenclatura. Porque muito associado a

um determinado partido que levou isto avante. Não é pela aceitação pública, pela visibilidade pública

que eu estou nisto. Não é pelo salário, não é pelo horário de trabalho: trazemos muito trabalho para

casa, muitas vezes, como sabes. É, sobretudo, como há pouco tentei dizer, a oportunidade de, de facto,

conhecer pessoas; histórias de vida absolutamente fantásticas e, portanto, eu sinto, que… Um dia,

comentei isto com o meu primo, foi algo do género: a geografia e a topografia humana desta região, eu

hoje sinto que a conheço muito melhor, do que conhecia há cinco anos atrás. Conheço muito melhor a

minha região e os que nela habitam, do que há cinco anos atrás! Porque conheço as pessoas! Como

também conhecerás… Isto dá-nos um poder, que é algo que não sei se estás para aí a analisar ou não,

mas que é interessante ver por esta lógica, dá um poder impressionante! Um poder impressionante!

(E3.44, p. 52)

Saliente-se também que em termos identitários não há uma referência comum nem

consensualidade relativamente a considerarem-se «educadores de adultos». Uma das reações

das pessoas face à pergunta: «consideras-te um educador de adultos?», a resposta aparecia em

forma de pergunta: “uma educadora de adultos, não. Não sei o que queres dizer com uma

educadora?” (E1.52, p. 12); “O que é que é educar? (E2.36, p. 33).

Num sentido restrito encarava-se o educador enquanto um transmissor, aquele que

ensina a fazer determinadas atividades e que facilita a aprendizagem de determinado tipo de

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saberes, ou seja, aquele que ao instruir possibilita a aquisição de determinado tipo de

habilidades:

Ensino a mexer no computador; ensino a fazer pesquisas; ensino a pôr imagens; ensino a formatar

textos; ensino, se for preciso, a corrigir um erro. De matemática, se houver alguma dúvida, também

ensino e gosto dessa parte, de lhes ensinar! O que eu noto é que eles gostam que lhes expliquem bem

as coisas. (E1.55, p. 13)

No entanto, há também quem diferencie o processo de RVCC de um processo educativo,

mas que implica aprendizagens:

[reproduzindo um diálogo com os candidatos] “por favor, lembrem-se que vocês não vêm aqui para

aprender. Agora, nós estamos sempre a aprender. E vocês ao fazer este trabalho, vocês vão aprender e

vão aprender sozinhos, o que vai ser ótimo! Agora o objetivo do RVCC não é aprender! O objetivo do

RVCC é reconhecer o que vocês aprenderam. Se vocês acham que têm algumas lacunas, vocês vão ter

de aprender, sozinhos ou com ajuda, mas vão ter de aprender para depois mostrar à equipa que, de

facto, têm os conhecimentos. Mas só o facto de vocês estarem a aprender, nem que seja à pressão, é

uma aprendizagem que vai ser reconhecida e é também a capacidade de conseguirem o tal raciocínio

que vocês já têm e que vos leva a adquirir alguns conhecimentos que a vida não vos obrigou a ter, não

houve necessidade de, mas que vocês conseguem adquirir com alguma rapidez”. (E5.18, p. 84)

Num outro sentido, já mais abrangente, encara-se a educação enquanto uma

possibilidade de desestruturar, de inquietar e, caso haja essa recetividade, de transformar as

estruturas mentais dos próprios candidatos. Contudo, também parece que essa mesma postura

transcende o âmbito das práticas do profissional de RVC:

Eu acho que na educação não depende só do educador, depende também do educando. Por mais que

façamos, se a pessoa não estiver recetiva a… Por mais que façamos não vamos ter um papel

transformativo nessa pessoa. (E2.37, p. 33)

…mexer com as pessoas! Ou melhor: abaná-las - mas isso não é uma finalidade, é um meio - de forma a

que um dia mais tarde, elas sintam que valeu a pena os meses de trabalho que tiveram e que isso, de

alguma forma, contribuiu para serem melhores pessoas, melhores profissionais, melhores cidadãos,

melhores pais, melhores filhos. (E3.25, p. 47)

…o que é um educador senão também aquele que provoca, que estimula, que inquieta? Eu gosto de

achar que sou um pouco isso! Nem sei se sou, espero ser! Gosto de achar que é um pouco isso que me

define. Portanto, uma educação muito mais virada para a cidadania, para a arte, para valores que nos

transcendam de alguma forma do que para esta questão muito em voga, hoje em dia, da

empregabilidade. (E3.26, p. 47)

Eu, na verdade, a forma como eu entendo o processo de RVCC vai para além do processo de RVCC porque ninguém fala em inquietação. (E3.40, p. 50)

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Espaços e processos de aprendizagem: o contexto da profissionalização

Como referimos, desde o início da implementação do Sistema Nacional de RVCC, as

entidades governamentais responsáveis sempre procuraram regular e definir muitas das

dimensões da intervenção desenvolvida no âmbito dos Centros RVCC/Novas Oportunidades e

também definir gradualmente as diversas responsabilidades dos que aí trabalham.

Essa regulação apresentou diferentes formatos, desde orientações para o desenvolvimento

das atividades (tanto em termos qualitativos como em termos quantitativos) materializadas, por

exemplo, nos Referenciais de Competências e Guias de Operacionalização (Gomes, 2006), em

Cartas de Qualidade (Gomes & Simões, 2007), em diferentes Ações de Formação e também

através da legislação regulamentadora das configurações institucionais e perfis profissionais.

De uma forma geral, as condições de acesso, as atribuições e os conteúdos funcionais

relativos aos profissionais de RVC não têm sido sujeitos, na sua essência, a muitas modificações,

ainda que se observem alterações em diversas dimensões do seu trabalho, nomeadamente em

termos de distribuição de tarefas e funções.

Saliente-se, no entanto, que apesar de a regulação ser determinada de uma maneira top-

down, não significa que sejam completamente determinísticas. Ao longo do desenvolvimento do

sistema de RVCC observou-se um desenvolvimento e uma depuração dos processos e

metodologias e também, em muitos casos, eram reclamadas orientações mais específicas que

regulassem as entidades e os profissionais, ou seja os diversos intervenientes no «terreno».

Consideramos que o processo de elaboração e implementação dessas orientações

também foi sujeito a múltiplas influências e determinações. Além das alterações resultantes da

reflexão das equipas sobre as suas práticas e procedimentos e aos consequentes ajustamentos

efetuados pela tutela destacam-se também, e até anteriormente à génese do Sistema Nacional

de RVCC, múltiplas influências: o papel de diversas instituições internacionais – União Europeia,

UNESCO e OCDE e também as influências mútuas em termos de observação de sistemas

similares em outros países e contextos; a produção académica sobre as temáticas implicadas na

constituição do campo (o reconhecimento das aprendizagens experimentais, as novas noções

sobre a aprendizagem, o trabalho educativo por competências, a utilização e a fundamentação

teórica-conceptual de metodologias e instrumentos específicos.

Consideremos algumas das transformações resultantes das orientações emanadas pelas

diferentes entidades reguladoras.

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Formação inicial e contínua

Com a implementação do Sistema Nacional de RVCC procurou-se regular o acesso ao

exercício da função de profissional de RVC. Ainda que de uma forma genérica, foram

estabelecidas determinadas condições e um perfil de entrada. Definiram-se três condições68: 1)

formação de nível superior (licenciatura, pelo menos) na área das Ciências Sociais e Humanas;

2) experiência profissional relevante e comprovada em trabalho com adultos e na utilização das

metodologias de Balanço de Competências e Histórias de Vida; 3) ligação efetiva e conhecimento

em termos socioculturais e económicos da realidade local abrangida pelo Centro de RVCC

(Leitão, 2002, p. 38).

Esperava-se de todos aqueles que quisessem trabalhar nos Centros de RVCC que se

comprometessem com a «missão» e garantissem a continuidade efetiva do projeto e que

demonstrassem disponibilidade para «investir» não só em termos profissionais69 mas também

em termos pessoais (Leitão, 2002, p. 40). Essa retórica do «espírito de missão» foi sendo

incorporada pelos diversos agentes. Se, por um lado, corresponde a uma implicação numa

«causa e coisa pública» que constitui um padrão de referência na própria prática da Educação

de Adultos (Collins, 1991, pp. 40-57), por outro, também se pode admitir que é um discurso

utilizado para justificar e compensar algumas condições de precariedade em que alguns agentes

de Educação e Formação de Adultos desenvolviam e desenvolvem as suas funções, como se

pode inferir do comentário de um dos entrevistados:

Muita gente disse, a determinada altura, que trabalhar nesta área, ou só trabalharia nesta área quem

vestisse a camisola, quem tivesse aquele sentido de missão, e eu não estou… Eu penso que é algo

parecido com isto! Como vestir a camisola, pergunto eu hoje, se a tutela a despiu ou está prestes a

despi-la? E é esta angústia existencial que hoje em dia que me atormenta um pouco. (E3.35, p. 49)

Uma outra perspetiva é considerada por Richard Edwards que relaciona essa «missão»

como um exercício do «poder pastoral», ou seja, um sistema internalizado de controlo das

práticas que condiciona a ação dos próprios agentes e profissionais da EFA:

“As pessoas estão a ser encorajadas a trabalharem com mais afinco, a aceitarem maiores

responsabilidades individuais para elas próprias, nas suas contribuições para as organizações e para a

formação social. Com essa responsabilidade cresce o stress. Neste sentido, o poder pastoral torna-se

autorreplicante, criando as condições para a sua própria proliferação, já que as formas de

68 No Roteiro Estruturante (Leitão, 2002), um documento editado pela ANEFA que pretendia orientar o funcionamento dos Centros de RVCC nas suas diversas dimensões. Este documento operacionalizava a clarificava a regulamentação anterior aprovada pela Portaria nº 1082-A/2001, 5 de Setembro. Pretendia também regular a Rede Nacional de CRVCC (promotores do SNRVCC) criado pela mesma portaria. 69 Os profissionais de RVC ainda deveriam demonstrar disponibilidade para exercer as suas funções em regime de itinerância.

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empoderamento engendradas são a base para os problemas que procura resolver. A Confissão é

portanto um sintoma das formas contemporâneas de governamentalidade em vez de ser uma cura para

as suas aflições” (Edwards, 1997, p. 10).

Mais tarde, em 2008, com a publicação de uma norma legal70, observaram-se alterações

nos requisitos para o exercício das funções de profissional de RVC. Continua a ser necessário

possuir conhecimentos das metodologias adequadas, revelar experiência no domínio de

educação e formação de adultos, nomeadamente no desenvolvimento de balanços de

competências e na construção de portefólios reflexivos de aprendizagens. Porém, uma das

mudanças observadas foi a ampliação do tipo de habilitações necessárias: onde se estipulava

uma licenciatura na área das Ciências Sociais e Humanas, passou-se a mencionar apenas uma

habilitação académica de nível superior de qualquer área, não se especificando o ramo

disciplinar. Previamente assumia-se a necessidade de uma preparação teórica e metodológica

no campo das Ciências Sociais e Humanas. Pressupunha-se que o desenvolvimento de

competências analíticas, reflexivas e operatórias, além das pressupostas afinidades com as

temáticas e problemáticas das várias áreas disciplinares (Sociologia, Psicologia, Ciências da

Educação, Filosofia, Educação Social, etc.), seria mais adequado para o desempenho das

funções de Profissional de RVC. Presentemente é da responsabilidade de cada CNO (ou sua

entidade promotora) a manifestação de preferência relativamente a licenciaturas que consideram

mais adequadas para o exercício das funções de profissional de RVCC. Essa escolha será

efetuada em função dos interesses específicos de cada organização e das opiniões específicas

relativas à adequabilidade teórica e metodológica de cada uma das qualificações.

Esta situação é mais notória nos concursos dos CNO promovidos por entidades públicas

(escolas e centros de formação profissional, principalmente) já que são as únicas entidades

legalmente condicionadas a publicitar concursos públicos.

Na opinião de alguns dos entrevistados a situação é relativamente ambivalente. Por um

lado, considera-se a adequação das licenciaturas das áreas das Ciências Sociais e Humanas

para o desempenho de profissional de RVC, geralmente justificando com os conhecimentos ou a

adequação advinda das suas próprias licenciaturas. Por outro lado, constata-se que a limitação a

licenciaturas específicas corresponderia mais a formas de facilitar a regulação do mercado de

trabalho, do que à distinção e adequabilidade que uma formação na área das Ciências Sociais e

Humanas possibilitaria em termos de preparação técnica e teórica.

70 Portaria n.º 370/2008 de 21 de Maio.

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Em relação aos profissionais de RVC eu achava um bocado estranho que outros cursos que não de

Ciências Sociais estivessem presentes. Atualmente – obviamente que tem a ver com a experiência que

eu tenho tido com os colegas também – acho que não. Acho que qualquer pessoa pode ajudar. No

fundo, acaba sempre por ser isso, ajudar os adultos a fazer o seu portefólio. (E4.74, p. 74)

…é lógico que um técnico de RVC esteja ligado a áreas das Ciências Sociais e Humanas, mas se calhar

por que tens de definir uma licenciatura. Se não tivesses de definir uma licenciatura, acho que depois

poderias criar um perfil de competências e numa entrevista para esse profissional ver se essa pessoa

teria essas competências/conhecimentos independentemente da sua licenciatura, mas no nosso país

nós trabalhamos muito com uma base: a licenciatura disto, a licenciatura daquilo. (E5.7, p. 80)

Nestas opiniões questiona-se, portanto, a necessidade de uma formação inicial específica

como um fundamento necessário para o exercício profissional nesta área. Parecem mais

relevantes os atributos pessoais de cada profissional de RVC já que, como desenvolvemos

anteriormente, o trabalho dos profissionais de RVC passa pelo acompanhamento,

aconselhamento e orientação no desenvolvimento de tarefas específicas (o portefólio reflexivo de

aprendizagens, por exemplo), revelando-se no ato de «ajudar», uma dimensão de trabalho que

passa por lidar com as emoções suscitadas durante o processo:

Tem uma coisa a ver que é o ‘ajudar’! O ajudar tem um sentido muito lato. Podemos ajudar em termos

emocionais, de problemas patológicos, ou profundos, emocionais, etc. Ou podemos ajudar e o que

acontece não é tão pouco frequente quanto isso, que as histórias de vida mexem com as pessoas. A

mim já me aconteceu várias vezes as pessoas estarem numa sessão individual, estamos a ver a história

de vida e vêm ao de cima os problemas, vêm ao de cima as lágrimas, vêm ao de cima as situações

difíceis que estão a viver. Portanto, quase é um complemento, quase poderia dizer que complementa e

eu sei que essas coisas acontecerem são boas para as pessoas, de alguma forma estão a expurgar ou

estão a pôr cá fora parte do seu mal-estar. Portanto, eu acho que Psicologia completa, complementa ou

pode complementar um profissional de RVC. (E4.38, p. 68)

São valorizados saberes que são trabalhados em determinadas áreas de formação, seja

na licenciatura ou na própria formação obtida aquando do início de funções, e que facilitam o

desempenho profissional a vários níveis:

Trabalhei! Trabalhei ao nível do relacionamento interpessoal, ao nível do contacto com o outro, no

conseguir… Na própria entrevista, para ver se a pessoa tinha ou não tinha perfil para entrar num

processo de RVC, a forma como se conduz uma entrevista, a forma como se percebe algo da pessoa a

partir da linguagem não-verbal dela, a forma como se deixa a pessoa à vontade, a esse nível. Isso são

competências que tu adquires, não competências… São conhecimentos que são trabalhados na área da

Psicologia, nesse contacto com o outro, com o utente, com o paciente, seja como for; na relação que se

estabelece e como se conduz, como se consegue que a pessoa fique mais à vontade; como se conduz a

intervenção da pessoa; como se leva a pessoa a escrever aquilo que nós queremos que se escreva, a tal

narrativa. Por aí, isso era trabalhado na Psicologia e também trabalhado na formação inicial para os

técnicos de RVCC. (E5.6, p. 80)

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Um outro sentido específico para a valorização das aprendizagens efetuadas em contexto

formal universitário relaciona-se com a definição de um «olhar específico» que seria apropriado

ao desempenho profissional.

A Sociologia sempre me atraiu porque, de certa forma, ao ler alguns sociólogos, e não só, na imprensa

escrita sobretudo quando era mais catraio, adolescente, identifiquei-me com uma certa forma de ver o

mundo, uma certa tendência para a ideia de que só a educação, verdadeiramente, é capaz de

transformar as pessoas, de lhes criar oportunidades de sucesso, de reconhecimento, de progressão

social. (E3.7, p. 44)

…essa natural’ sensibilidade, para não deixarmos que o nosso entendimento das coisas seja superficial.

Estou-me a lembrar da velha história da reprodução social e da forma como a escola reproduz

tendencialmente as condições que existem à partida. Sempre fui, desde miúdo, muito sensível a isto.

Sempre fiz amizades com miúdos, com colegas de outras classes sociais, muito mais desfavorecidas.

(E3.8, p. 44)

A necessidade de formação contínua das equipas selecionadas para trabalhar nos Centros

sempre foi um aspeto destacado. Desde o tempo da ANEFA que se sustenta que a

responsabilidade das formações seria do próprio Centro, embora essa Agência se tenha

comprometido a delinear anualmente um plano de formação (Leitão, 2002, p. 40).

As formações deveriam ser «qualificantes» e «não facultativas». Como as metodologias, as

teorias utilizadas e a própria configuração institucional eram recentes, a formação deveria ter

duas componentes: a componente de formação transversal e a componente de formação

específica.

A primeira visava “promover a interiorização da filosofia e do modelo de funcionamento do

Centro” e o desenvolvimento de competências de planeamento, de gestão e avaliação de

projectos; já a segunda, relacionada com as diferentes funções atribuídas a cada elemento,

visava possibilitar “qualificar os participantes no conhecimento, apropriação e utilização dos

princípios e metodologias” de RVC e das atividades dos Centros de RVCC (Leitão, 2002, p. 40).

Uma outra dimensão que se encontra presente nos diversos discursos relaciona-se com

as formações específicas que foram frequentadas para a preparação e desenvolvimento das

funções de RVC71. Para as designar foi utilizada uma idêntica expressão por duas das

entrevistadas: «mais do mesmo», uma expressão que não é particularmente abonatória.

71 Dados relativos aos anos de 2007 e 2008 - até 16 de Julho de 2008 - indicam que 4471 pessoas tiveram formação dada pela ANQ e que outras 1056 pessoas obtiveram formação dada por outras entidades do ensino superior 1056 (ANQ, 2008, pp. 25-26).

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Por um lado, o «mais do mesmo» relacionava-se com a pouca preparação que os

formadores apresentavam. Mesmo que a formação tenha sido facultada num contexto

universitário, a impressão que ficou a uma das entrevistadas foi a impreparação dos formadores:

É um cliché que a formação é sempre importante e que se aprende sempre alguma coisa. Óbvio! Mas

até acho que quem me deu a formação… Estavam também a desbravar caminho e a aprender,

portanto, não foi assim uma… Não acho que isso me tenha preparado de forma diferente, não! Ouvi

muito do mesmo. (E1.15, p. 8)

Num outro sentido, relacionava-se com o reduzido ajustamento às características

específicas das equipas e das próprias organizações. A formação facultada passando por uma

uniformização de conteúdos ou mesmo uma tentativa de doutrinação era sempre a mesma

independentemente dos Centros já estarem em atividade há algum tempo ou não:

Houve uma altura em que era mais do mesmo. Era mais do mesmo porque o que acontece… Tinhas a

formação e começavam a entrar novos Centros. As dúvidas que tu tinhas, iniciais, pelo menos retiraste

ou pelo menos já sabias qual era a resposta. E como entravam novos Centros, esses Centros tinham as

dúvidas que tu tinhas inicialmente e então, às vezes, era mais do mesmo. (E5.30, p. 86)

De acordo com um estudo de Avaliação da INO, também se referia que uma das

perceções em relação à ANQ era que a esta não conseguia proporcionar formação adequada.

Focava-se muito nos Centros em início de função (Liz, Machado & Burnay, 2009, pp. 40-41).

No entanto, são expostas outras opiniões relativamente a essas formações. Considera-se

também que tiveram um efeito positivo. Aliás, algumas das formações eram valorizadas porque

simulavam o que os profissionais de RVC iriam trabalhar. Os ‘novos’ profissionais de RVC, em

alguns casos, tinham poucos conhecimentos das formas e metodologias utilizadas no processo

de RVC, das várias fases do processo e de como desenvolver cada um desses momentos. Afirma

uma das entrevistadas:

…foi um exercício que até fiz numa formação, nós experimentarmos um bocadinho aquilo que depois

vamos fazer com os adultos, ou seja, aqueles instrumentos fazermos como se fossemos nós a fazer

porque conseguimos assim pormo-nos no lado deles e, mais facilmente, depois conseguimos explicar-

lhes e dar-lhes ideias, as estratégias de como eles poderão eventualmente fazer o seu processo. (E2.16,

p. 30)

A formação contínua é considerada fundamental mas parece assumir uma importância

acrescida pelas suas implicações em termos relacionais. Salienta-se muito o contacto com

outros profissionais e com outras formas de trabalhar e não sendo tão valorizada pelos

conteúdos específicos a trabalhar, já que esses derivarão mais do campo das práticas e das

suas configurações específicas.

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Com a formação contínua também se procura uma «reciclagem» de saberes e uma

«adaptação» teórica aos próprios contextos organizacionais e institucionais.

Uma das entrevistadas refere uma outra forma de adaptação: a adaptação teórica a

contextos regionais/territoriais. Esta perspetiva é intelectualmente estimulante, na medida em

que se consideram configurações específicas dos contextos laborais e territoriais (em termos

sociais, económicos e culturais), porventura pela ação que uma entidade específica (neste caso

uma universidade) implicaria em termos da definição de práticas profissionais. Se cada

universidade tem uma tradição/escola específica ela também implicaria mudanças nas próprias

práticas profissionais e formas de abordagem:

…onze anos depois de ter terminado o curso, um bocado para ‘reciclagem’ e para percecionar a

perspetiva de cá de Braga. Eu tirei em Lisboa, portanto… [psicologia] Dinâmica, por isso era uma outra

forma de trabalhar. Achei que era importante atualizar-me… (E4.9, p. 62)

As atividades de formação podem tornar-se uma fonte de frustração, quando não há

correspondência entre as expectativas individuais e aquilo que é disponibilizado pelas entidades

que promovem ou organizam essas mesmas formações. Não são só as formações de carácter

mais esporádico ou com menor tempo, mas também em pós-graduações, como está patente

nas diversas entrevistas.

Por um lado, essa fundamentação pode servir para justificar uma incapacidade em

concluir um processo educativo/formativo, porque o padrão de exigência dos indivíduos que

procuram essas formações é superior àquilo que é disponibilizado nas próprias formações.

Também poderá significar que, considerando que é através da prática profissional que se

desenvolvem a maior parte das competências e saberes-fazer necessários à própria prática

profissional, há uma certa insatisfação relacionada com um certa apreensão de não se

acrescentar nada, de ser «mais do mesmo» ou até uma sensação de grande familiaridade com

os conteúdos facultados.

Portanto, e agora em relação a formações que eu recebi na vertente educacional, eu fiz algumas, não

muitas e muito sinceramente é assim: a minha prática, a minha experiência, foi quem me ensinou.

Quando vou a uma formação é uma frustração porque a maior parte das coisas eu conheço-as, eu

trabalhei-as, eu fi-las, portanto, não gosto muito de formações, de receber formações. Não tenho muita

paciência! (E4.10, p. 62)

Procuram-se atividades de formação por diferentes motivos: porque se quer estudar e é

uma oportunidade de crescimento pessoal; porque se quer desenvolver o currículo; por distração

da vida profissional (como possibilidade de «libertação» cognitiva, ou seja, como uma espaço de

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cognição perspetivado fora da influência direta do contexto ou das necessidades laborais) para

aumentar as possibilidades de reconversão profissional; para a definição de uma identidade

pessoal e profissional. Repare-se nas respostas dos entrevistados:

Porque era uma outra área que eu achei piada e porque queria enveredar também pela [psicologia]

clínica. E porque me poderia surgir outras. E também porque já estava um bocadinho cansada [do

trabalho de profissional]. (E5.32, p. 86)

Eu vou apostar na minha formação. Vou apostar na minha formação em áreas distintas, não tem nada a

ver com isto. Vou apostar em formações que me possam atrair na área clínica, a nível da Psicologia:

Clínica, Saúde e depois vou apostar noutro tipo de formação que não tem nada a ver com isto. Mas isso

primeiro é o que eu quero fazer para depois fazer a tal reconversão profissional. Agora, para agora que

não consigo adquirir essa formação em dois ou três meses. Para agora vou apostar naquilo que existe.

Como eu acho que não vou ficar desempregada, eu vou-me adaptar aquilo que surgir, a esta nova

reconversão dos Centros Novas Oportunidades a estas novas funções. (E5.96, p. 97)

Primeiro porque me apetecia estudar. Estava a sentir falta… Depois pensei… já que estava. […] Achei

importante para o meu currículo, basicamente, e queria aprender. Na altura achei que ia fazer o

mestrado, mas depois dececionei-me um bocadito e parei por ali […] Não acho que tenha modificado

formas de trabalhar. Aprendi algumas coisas teóricas sobre as políticas da educação que me passavam

muito ao lado. (E1.23 e 24, p. 9)

De facto, além dos estudos e formações de base (sublinhe-se que todos os profissionais

de RVC têm níveis de qualificações elevados) e das formações estruturadas para o

desenvolvimento de competências específicas verificam-se também as diferentes aprendizagens

associadas ao contexto de trabalho e à experiência da vida que não se suspende.

Muitas das aprendizagens consideradas como as mais relevantes são desenvolvidas

principalmente por ação dos próprios indivíduos (na expressão de uma direccionalidade e de

uma intencionalidade), e em contexto de trabalho específicos, no exercício das funções,

nomeadamente através das situações de trabalho com os próprios adultos e com a diversidade

de situações que estão implicadas nesta relação. Como refere Ana Luísa Pires, uma das

principais formas de desenvolver as aprendizagens tem sido através da própria experiência:

“Isto remete para a formação das pessoas que estão a fazer este trabalho. Na grande generalidade têm

vindo a aprender com a sua própria experiência, e há saberes que têm vindo a ser constituídos pelas

equipas, nos centros, que são de muito valor e que mereciam ser explicitados e disseminados pelas

outras equipas. Muitos destes saberes que se têm vindo a constituir são valiosíssimos, e é importante

ter noção disto e sistematizá-los, desenvolvê-los, disseminá-los” (Pires, 2010b, p. 11).

Como sempre, o principal responsável pelo processo de aprendizagem parece ser o

próprio indivíduo, por si só ou através dos relacionamentos estabelecidos com os seus colegas

de trabalho, em contexto organizacional:

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Em termos de desconstruir os adultos e ajudá-los não me preparou. Isso é mais a minha própria

preparação e a minha própria personalidade, digamos assim. (E1.11, p. 8)

Era, era um bocado desagradável porque uma pessoa não sabe, não sabe o que fazer, não sabe a quem perguntar, não sabe como fazer. Eu lembro-me de um bocado, meia receosa, meia a medo, perguntar aos colegas: “olha, como se faz isto no SIGO? Como é que não sei quê? Como é que não sei quê?” Mas era desagradável porque acho que tinhas uma lista, uma check-list do que tinha de dizer ou que fazer, mas mais nada. De facto, o apoio acabava por vir das colegas que já trabalhavam cá. Portanto, já tinham aprendido e era por aí que ia aprendendo. (E4.24, p. 65) Quem cá estava, e falo das chefias, ou seja de quem for, deveriam ter pegado nas novas pessoas, o grupo de seis que entramos de uma vez e, no fundo, ‘puxá-las’ a uma sala e vamos aqui e vamos explicar as coisas todas direitinhas para nós sabermos como tínhamos de fazer. Coisa que não foi feita, portanto! Entramos no grupo que já cá estava! Portanto, deveria ter havido, não era em termos de integração e apresentação, era mesmo na parte profissional. Mesmo na parte: “o trabalho é este e faz-se desta maneira!”. Em vez de: “Olhe, está aqui uma check-list. Vem meia hora mais cedo! Prepare as fotocópias…”. Andávamos todos às aranhas! (E4.26, p. 65) Quando vim trabalhar sentia-me um bocado perdida. Não conhecia os referenciais. Fui começando a trabalhar a “pôr as mãos na massa” e fui aprendendo. [em surdina] Posso dizer isto? É uma crítica que eu faço aqui. Cheguei aqui e tive uma reunião numa sexta-feira para começar a receber um grupo na semana seguinte. (E2.12, p. 29)

As aprendizagens em contexto de trabalho desenvolvem-se, portanto, de diferentes

formas: a) aprendizagens autodirigidas e autopromovidas (através de livros e manuais;

conferências, palestras e seminários; recorrendo a tecnologias de comunicação e informação e a

plataformas digitais; no confronto com tarefas desafiantes); b) através de instruções e orientação

inicial; pela participação em redes e espaços colaborativas (workshops, grupos de experiência,

grupos de trabalho, etc.); c) a aprendizagem com os outros (através de conversas e interação

com colegas de trabalho, com as chefias, com os candidatos/clientes/utentes, etc.), entre

outras possibilidades (Illeris, 2004, pp. 91-102).

Implicam-se diferentes dinâmicas, processos e formas de aprendizagem. Além da

aprendizagem pela ação e pelo desenvolvimento de atividades ou tarefas específicas (o que é

referido como «learning by doing») e da criação de canais de partilha informal de informação e

experiências (o «networking» de agentes e estruturas educativas) foram relevantes para o

desenvolvimento das práticas dos profissionais de RVC.

Parece haver uma espécie de necessidade de partilha de informação dentro de uma

«comunidade imaginada de práticas». Essa partilha de informação servirá para calibrar as

diversas práticas organizacionais ou individuais a um padrão médio imaginado (uma espécie de

emulação de práticas): como fazer? Como é que os outros fazem? Que instrumentos têm? Que

informações possuem?

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É por poder partilhar experiências com pessoas que fazem o mesmo que eu… me ajuda a crescer, me

ajuda a olhar para as coisas de forma diferente. É uma forma de me atualizar dentro das minhas

funções. (E2.76, p. 39)

Essa formação por acaso foi interessante porque apanhou as diferentes fases do processo, pude

contactar com pessoas que desempenham diferentes funções e, por acaso, acho que foi uma mais-valia

essa formação. (E2.14, p. 29)

No entanto, como refere Knud Illeris:

“A criação de comunidades de trabalho e aprendizagem depende da extensão com que os trabalhadores

experienciam um significado comum no trabalho e desenvolvem relações pessoais via proximidade e

identificação. Se os trabalhadores tiverem uma atitude instrumental em relação ao trabalho e se não o

encararem com significativo, não há uma base para comunidades de trabalho, mas apenas para uma

comunidade política baseada na procura de um interesse comum tais como melhores salários. Se os

trabalhadores não experienciarem o trabalho como significativo não têm nenhuma razão para se

comprometerem e se envolverem em processos de aprendizagem” (Illeris, 2004, p. 37).

Uma das entrevistadas revela como as comunidades de prática72 profissional (em termos

da configuração do trabalho e da aprendizagem) se vão modificando e vão estabelecendo

ligações instrumentais e se vão desagregando por não se verificar uma estratégia para proceder

aos esforços de proximidade e de identificação:

No início deste trabalho houve sempre a tentativa de assim o fazer [articular com outras equipas] e

recordo-me de, quando os Centros surgiram, terem-nos telefonado para estarem connosco, para terem

reuniões connosco para colocarem dúvidas. Como éramos Centros mais antigos podermos ajudar.

Haver uma partilha e uma disseminação das práticas. Isso foi sempre um dos objetivos da ANEFA.

Agora, com o tempo tu vais acabar por…segues assim um caminho, outra pessoa segue o outro. Depois

há alguns contactos telefónicos com Centros que tu conheces melhor para perguntares: “o que estás a

fazer? Surgiu isto! Estás a fazer desta forma? Olha, por exemplo, eu não estou a ser capaz de submeter

a candidatura. Porquê?” Isso já surgiu e nós entramos em contacto com os Centros que nos são mais

próximos e que nos damos bem. E, no inicialmente, ao nível das práticas isso também aconteceu. Mas

depois ao longo das práticas não. Tu também começas a te formatar numa dada forma de atuar. A

equipa também já é grande e nós também, em reunião e com as formações que vamos tendo, iriamos

mudando as coisas. Aquilo que eu te posso dizer é que inicialmente a gente estava sempre a mudar. A

gente alterava este instrumento, a gente alterava aquele, a gente fazia isto e a gente fazia aquilo.

Passado alguns anos deixamos de o fazer. Tenho que dizer que as coisas… porque se calhar as coisas

também vieram mais bem definidas da ANQ e também, se calhar, aquela motivação inicial vai-se

perdendo um pouco. Mas, no início, nós, não era todos os meses, mas estávamos sempre a fazer

alterações aos instrumentos. Mudávamos isto, mudávamos aquilo, em termos da carga horária, em

termos da gestão da formação. A criação e as competências que eu adquiri na aplicação de um projeto

que era muito embrionário, que era muito teórico, deu-me uma série de competências. Ou aplicar as

coisas no terreno e ver o que é que resulta e o que é que não resulta a este nível. Agora, se eu for só

técnica de RVC, como eu te digo, essa minha amiga é só técnica de RVC, já chegou numa altura que já

72 Na nossa perspetiva as «comunidades de prática» podem ser percecionadas a diversos níveis e escalas. Desde um nível macro, com a constituição de modalidades associativas de âmbito nacional, a um nível meso, com a constituição de redes regionais e/ou locais, e também a um nível micro com a inscrição do trabalhador num nível organizacional e contextos específicos de trabalho.

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estava formado, em que lhe é passado o trabalho, ela está com as pessoas, há competências, há, mas

acho que são menos do que aquelas que eu adquiri. A minha carreira, porque infelizmente, digo isto,

mas não é para estar, digo isto porque gostava de ter feito mais coisas, mas pronto, chega uma altura

em que já não há muito a aprender, vai-se aprendendo aos pouquinhos, vais limando arestas. (E5.86,

pp. 95-96)

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Conclusões: do que se deu conta

“Foi de tudo isto o que eu quis dar conta.”

Henri Bergson (1993, p. 140)

As transformações nos contextos de trabalho e nas formas de relacionamento laboral

induzem uma crescente adaptabilidade dos trabalhadores. Uma das denominações dessa

adaptabilidade é a referida «empregabilidade» que, entre outros fatores, será potenciada pela

aquisição de melhores padrões de qualificação. Considera-se frequentemente que os diferentes

processos e padrões de aprendizagem e qualificação possibilitam a obtenção de vantagens

comparativas (individuais e organizacionais).

Numa lógica de crescente responsabilização individual sugere-se que os trabalhadores

desenvolvam a capacidade de controlarem as diversas circunstâncias da sua vida profissional,

mobilizando as diversas aprendizagens efetuadas através de diversos processos em diferentes

espaços. Procura-se instrumentalizar os conhecimentos e os saberes, potenciando formas

complexas de seletividade social e económica, almejando a aquisição de “competências para

competir” (Lima, 2004, p. 10).

As transformações no campo da Educação e Formação de Adultos têm resultado das

diversas mudanças sociais resultantes, entre outras, dos diferentes desenvolvimentos nas

tecnologias de informação e comunicação, nas ambivalentes reestruturações dos modelos de

desenvolvimento, dos seus modos de produção associados e dos diversos movimentos sociais e

culturais (Edwards, 1997; Castells, 2005).

Também concorrem para essas transformações outros aspetos: a pluralização das

instituições e agentes com intervenção (direta e indireta) na educação, formação e aprendizagem

dos adultos; a enfatização na autodiretividade do aprendente, no sentido de o indivíduo

equacionar reflexivamente as suas necessidades e/ou vontades em termos de aprendizagem; a

crescente valorização social, económica e gnosiológica dos saberes individuais

independentemente do espaço ou contexto de obtenção (Usher, Bryant & Johnston, 1997; EAEA,

2006).

Essas alterações implicaram o surgimento de diversos tipos de atividades profissionais no

campo da Educação e Formação de Adultos que visavam adequar-se a essas diversas mudanças

(Jarvis, 2010).

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No contexto português surgiu, a partir do ano 2000, mas com diversos antecedentes, um

sistema que estruturava institucional e organizacionalmente um conjunto de serviços relativos ao

reconhecimento, validação e certificação de competências.

É nesse enquadramento que surgem diferentes ocupações profissionais, nomeadamente

aquela que examinamos: os profissionais de RVC. Funcionalmente esta ocupação insere-se na

área do Aconselhamento e Orientação, uma área de crescente relevância no âmbito da

Educação e Formação de Adultos em termos de orientações políticas, de enquadramento teórico

e institucional e até de financiamento em termos nacionais e internacionais (referimo-nos ao

contexto europeu). O que se sustenta é que

“os aprendentes adultos precisam de apoio na análise das suas necessidades de aprendizagem e na

procura de ofertas apropriadas. Isto inclui o reconhecimento de aprendizagens experienciais prévias, no

estabelecimento e na atualização de sistemas de informação e de bases de dados, na verificação de

informação das ofertas de aprendizagem, na orientação dos aprendentes ao longo dos seus processos

de aprendizagem, no aconselhamento no caso de dificuldades de aprendizagem, na avaliação das

realizações e na validação das competências individuais” (Research voor Beleid; PLATO, 2008, p. 70).

Quisemos examinar o processo de profissionalização da referida ocupação pelas suas

particularidades. Assim, investigamos a profissionalização no seu sentido processual, ou seja,

relativamente à obtenção e evolução de saberes e competências que visam o desenvolvimento

do profissionalismo, entendido enquanto um valor normativo que fundamenta disposições e

orientações específicas, e a construção de identidades profissionais, ou seja, aos modos de

identificação e de apresentação.

Uma das primeiras constatações é que não há um entendimento consensual na definição

de qualificações de acesso ao desempenho das funções de profissional de RVC.

De 2001 a 2008 a legislação referia a adequabilidade de habilitações de nível superior (no

mínimo, uma licenciatura) na área das Ciências Sociais e Humanas. A partir de 2008 optou-se

por uma maior abrangência e ampliou-se, em termos formais, a possibilidade de acesso de

quaisquer licenciaturas.

Como antes, mas a partir daí sem qualquer tipo de limitação além do nível habilitacional,

foi transferida para as entidades promotoras dos Centros Novas Oportunidades, a competência

de selecionar os critérios e perfis habilitacionais considerados adequados.

Porém, da parte das entidades promotoras e reguladoras do Sistema Nacional de RVCC

(ANEFA, DGFV e ANQ), sempre foi explicitada a premência de implementar diversas formações

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que permitissem um desempenho profissional mais adequado nas diversas atividades dos

Centros.

Essas formações almejavam fundamentalmente a preparação dos diversos agentes de

Educação e Formação de Adultos e a configuração das suas práticas por forma a fazê-las

convergir com modelos teóricos, metodológicos e epistemológicos especificados para os

processos de RVCC.

Uma originalidade a referir relaciona-se com a determinação centralizada dos modelos

teóricos, metodológicos e epistemológicos a utilizar nos processos de RVCC. Os modelos e as

metodologias associadas a esses processos foram centralmente especificados (na legislação

reguladora e nos documentos orientadores do processo de RVCC) limitando a recontextualização

e a reconfiguração das práticas em função de situações específicas.

Parece também ter-se verificado um desajustamento das formações promovidas pelas

entidades tutelares, em conjunto com diversas entidades (entidades do ensino superior, etc.) em

relação às supostas necessidades de formação. De acordo com algumas observações recolhidas

nas entrevistas, sustentava-se que as formações eram estruturadas apenas como uma

preparação inicial para o desempenho das práticas profissionais e não para o desenvolvimento

das práticas dos agentes que vinham já trabalhando nos processos de RVC e nos CNO e que

revelavam já outras necessidades.

Refira-se que as diversas modalidades de formação, mais do que a obtenção de saberes

teóricos, parecem assumir uma maior relevância para os agentes de EFA quando simulam

atividades e práticas específicas.

Um outro fator de atratividade relaciona-se com todos os aspetos relacionais que as

formações potenciam, ou seja, destaca-se como de importância os momentos organizados em

que os agentes EFA/formandos possam partilhar as suas práticas e indagar de outras práticas

para verificar como se vai estruturando o trabalho noutras organizações. A formação aparece

assim como a oportunidade de estar implicado numa ‘rede’ (network) temporária com

espaço/tempo delimitado e sem os demais compromissos de manutenção dessa mesma rede

que não os informais.

As formas de desenvolvimento dos saberes considerados necessários às práticas

profissionais parecem passar pelos processos de aquisição individualizada e em situação de

trabalho. Os profissionais de RVC vão aprendendo por «ajustamentos sucessivos», de acordo

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com os seus próprios atributos e capacidades pessoais, mediante estratégias e conveniências

individuais, pela sua própria ação profissional e com os desafios colocados nesse contexto.

Apesar de assumir uma relevância considerável para os diversos entrevistados (refira-se

que todos os entrevistados são detentores de pós-graduações e alguns deles de mestrados em

áreas diversas), observa-se que a instituição universitária não se tem revelado o ‘motor’ dos

processos de profissionalização, pelo menos no respeitante a este grupo de entrevistados e não

apresenta especial centralidade nos seus discursos.

Aliás, os motivos para encetar ou continuar graduações universitárias ou mesmo outros

tipos de formação de cariz profissional mais do que a adequação ou benefício para a prática

profissional relacionam-se com outros fatores. A formação é entendida como uma possibilidade

de «distração» do quotidiano pessoal e/ou profissional (o conhecimento tem uma «função

recreativa») a que se associa a possibilidade de se integrar ou constituir um novo espaço

relacional (conhecer novas pessoas); também é considerada como uma possibilidade para

«legitimar» uma prática profissional (caso se sinta pouco legitimado); de iniciar um processo de

reconversão profissional; também se refere a vontade de se obterem diferentes estímulos

cognitivos, de se desenharem novas rotinas intelectuais e de se disciplinar o ato de estudar.

Relacionamos esta última observação com a forma como os entrevistados admitem

proceder ao seu desenvolvimento profissional: por ajustamentos sucessivos e individuais, ainda

que com influência dos seus colegas de trabalho, entre outras possibilidades organizacionais.

As modalidades de formação (universitária ou outras) implicam normalmente uma certa

sistematização dos conhecimentos de base científica. Por um lado, os conhecimentos obtidos

em espaços formalizados suscitam diferentes discussões relacionadas com a sua

transferibilidade, ou seja, com a utilização e recontextualização dos saberes obtidos e

desenvolvidos em contexto escolar e formal em outros contextos de ação, nomeadamente, os

contextos de trabalho.

Num outro sentido, os saberes advindos pelos referidos «ajustamentos» em contexto

profissional implicam um acréscimo de dificuldade no ato de os sistematizar, com implicações

óbvias na reprodutibilidade desses próprios saberes.

Nessa sistematização estão implicados vários níveis de reflexão. O primeiro relaciona-se

com a capacidade de se refletir sobre aquilo que se faz no momento em que se faz. É um nível

de reflexão (imediato) que implica considerar as experiências, os sentimentos e os saberes em

uso. Esse nível de reflexão é complementado com um nível de reflexão (mediato) que implica

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uma análise e reconstrução retrospetiva sobre a ação, uma organização e sistematização das

experiências que envolve uma categorização dos desafios e problemas e o ajustamento e

adequação das práticas (Schön, 1987).

É na articulação entre essas duas lógicas de desenvolvimento profissional, em contexto

escolar e contexto de trabalho, que se configuram alguns dilemas relativamente à preparação e

desenvolvimento dos diversos saberes e competências e a sua adequação aos processos de

profissionalização: os dilemas entre a especialização, que implicam uma certa formalização em

termos de abordagens monodisciplinares e a transversalização, enquanto a agregação e

convergência de influências pluridisciplinares.

Podem-se conceber essas tensões entre duas perspetivas dos processos de

profissionalização considerados nas suas diversas escalas (relativos aos profissionais de RVC, à

área de Aconselhamento e Orientação; ou à própria Educação e Formação de Adultos): 1)

direcionar e concentrar para o desenvolvimento de saberes e competências pessoais,

interpessoais, teóricas e instrumentais específicas a cada perfil profissional ou 2) incentivar

lógicas e espaços de desenvolvimento dos saberes e competências técnicas, teóricas e

interpessoais em torno de problemas educativos comuns (Correia, 2003, p. 29).

Essa dupla possibilidade leva-nos a considerar uma série de outras questões: em que

campos de práticas (profissionais e de investigação) se situa essa vasta e plural área do

Aconselhamento e Orientação? Qual é a sua «família» de ocupações e atividades profissionais?

Quais são as suas «tradições» e quais os seus quadros de referência? Como se desenvolvem

profissionalmente? Como são os seus processos de profissionalização? Como se relacionam as

diversas comunidades de prática (profissional e de investigação)? A matriz identitária de

referência corresponde à do campo da Educação e Formação de Adultos? As soluções para

esses ‘novos’ problemas educativos comuns serão passíveis de ser resolvidos exclusivamente

com as matrizes teóricas do campo da Educação e Formação de Adultos?

As práticas desenvolvidas apresentam algumas especificidades. Por um lado, pretende-se

desenvolver os processos de RVCC de forma a possibilitar a certificação de cada candidato.

Simultaneamente, com o processo de RVCC, designadamente com a elaboração do portefólio

reflexivo de aprendizagens, com a utilização das metodologias específicas e com as formas de

acompanhamento desenvolvidas pelos profissionais de RVC induzem-se diversas transformações

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nos adultos em termos de redefinição de projetos pessoais, profissionais e

formativos/educativos.

De acordo com os profissionais de RVC entrevistados não nos pareceu haver uma

particular tensão entre as lógicas de “avaliação humanista/avaliação instrumental” (Cavaco,

2007, p. 31). De facto, podiam-se inferir alguns aspetos relacionados com cada uma dessas

lógicas mas não se constituíam tensões específicas, antes eram vistas nas suas articulações

existentes ou possíveis.

De uma forma geral parece-nos que, no caso português, o processo de RVCC passa

sobretudo pelo reconhecimento de saberes que coincidem com padrões determinados,

designadamente aqueles que estão estipulados nos Referenciais de Competências-Chave.

Através desse referencial são valorizados tipos e formas particulares de agir e pensar

específicos. Com a avaliação de competências efetuada no processo de RVCC induz-se a

convergência cognitiva e comportamental de cada indivíduo aos padrões estipulados, passando

essas convergências sobretudo pelo plano discursivo.

Apesar de no desenvolvimento do portefólio reflexivo se implicarem novas aprendizagens,

estas são colocadas em segundo plano, já que o reconhecimento e validação (isto é, a auto e

heteroavaliação) são colocados em primeiro plano.

No entanto, também nos parece que essa avaliação é facilitada a todos aqueles que estão

na posse de atributos específicos: a capacidade discursiva em termos orais e escritos (que

contribuem para a própria demonstração de competências); maiores níveis de escolarização

(apresentando vantagens em termos de compreensão de objetivos, estilos pedagógicos utilizados

e capacidade de corresponder às expectativas de avaliação).

Desde o início da implementação do processo de RVC que se justificou a sua ação pela

contribuição para uma maior justiça social mas sobretudo pela sua possibilidade de contribuir

para a qualificação de «recursos humanos» (ou seja, as pessoas entendidas sobretudo na sua

dimensão económica) e no contributo para o aumento da competitividade do país.

Neste sentido, através do processo de RVCC e da ação dos seus profissionais de RVC é

possível proceder-se à reinscrição de discursos ideologicamente dominantes e mesmo a uma

acentuação de uma certa despolitização da intervenção educativa.

Como analisamos verifica-se também uma certa ‘psicologização’ do reconhecimento de

competências, por exemplo, a valorização da experiência, a proximidade relacional dos

profissionais de RVC com os candidatos; e a prioridade que se dá à atribuição de sentido numa

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vertente de construção e desenvolvimento individual. Estas situações podem implicar a

manifestação do poder confessional e de implementar ações de uma «governabilidade velada»

que podem ser potenciados até por um certo culto da informalidade, seja em termos relacionais,

seja em termos da valorização das aprendizagens assim obtidas.

Estas características assinaladas dos processos de RVCC fazem-nos considerar que os

seus modelos de referência, pelo menos no caso português, possuem uma similaridade com o

que se designa por modelo Procrustiano73, com determinadas características de Aprendizagem e

Desenvolvimento, utilizando uma tipologia desenvolvida por Judy Harris74 (1999).

Na nossa investigação também observamos uma outra situação: comprovamos a

existência de uma referência identitária comum configurada sobretudo pela forma como se

desenvolvem as práticas profissionais: a centralidade do candidato e do acompanhamento na

configuração da relação educativa/pedagógica; a estruturação do discurso em torno do papel da

valorização emocional e cognitiva do candidato e o direcionamento para a ‘fabricação’ de um

sujeito aprendente (Andersson & Fejes, 2005) tanto em termos retrospetivos como em termos

prospetivos.

No entanto, as identidades profissionais são plurais. Existe uma diversidade de matrizes

identitárias com múltiplas referências resultantes dos processos de socialização (como

assimilação de hábitos e procedimentos comuns a grupos, organizações ou instituições

específicas) e das estruturas de oportunidade, ou seja, as formas como cada indivíduo

perceciona o seu horizonte de expectativas face à avaliação do seu espaço de experiência.

Um fator relevante na análise das identidades profissionais relaciona-se com o momento

específico em que foram realizadas as entrevistas. Nessa altura, Junho/Julho de 2011, as

indefinições relacionadas com a continuidade dos Centros Novas Oportunidades e das suas

equipas eram motivo de ansiedade para todos os profissionais o que pareceu traduzir-se na

continuidade da reconfiguração identitária a que já se vinha dando espaço (pela imagem e

73 A denominação deste modelo refere-se a Procrustes, figura da mitologia grega também designado por Prokoptas ou Damastes. Filho de Poseidon, era um bandido de Ática (mais tarde morto por Teseu) que ficou afamado por ter uma cama de ferro (que na verdade eram duas) que oferecia aos viajantes: quando os viajantes eram pequenos demais para a cama, Procrustes, com requintes de malvadez e cumprindo as boas normas da tortura, esticava-os até os viajantes se ajustarem perfeitamente à cama. O mesmo se passava com aqueles que eram demasiado altos: a esses eram cortadas as partes excedentárias. Ninguém dormia com os pés fora da cama! Mais tarde, Teseu, na sua última aventura, deu-lhe o mesmo tratamento e fê-lo dormir numa dessas suas camas. Moral da história da cama: revela a arbitrariedade do ajuste forçado a padrões pré-estabelecidos. 74 Judy Harris (1999) descreveu quatro modelos de reconhecimento de adquiridos experienciais: Procrustiano, em que o reconhecimento é desenvolvido para corresponder a padrões predeterminados; Aprendizagem e Desenvolvimento, onde o reconhecimento se aproxima de padrões académicos mas suscita o desenvolvimento de competência numa ótica individualizante; Radical, em que o reconhecimento é entendido como uma alternativa às formas dominantes do conhecimento, Cavalo de Troia, em que todo o conhecimento é visto como socialmente construído e valorizável.

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perceção pública que não eram particularmente abonatória) e também ao início de um processo

de «desvinculação».

Saliente-se que neste trabalho não se analisou a precarização laboral e a influência das

condições organizacionais e contextos laborais em reconfiguração. No entanto, também tem de

se assinalar que neste contexto atual o que pode estar em causa é a própria desestruturação da

ocupação e da atividade de profissional de RVC. O momento é de indefinição.

Os profissionais de RVC foram e são uma força de trabalho com condições precárias,

designadamente em termos de segurança laboral, de remuneração, de organização de classe,

na individualização na relação de trabalho e no seu diminuto nível de autonomia. Num certo

sentido poder-se-ia falar de processos de proletarização ou, por outro lado, a um conceito que se

vai prestando atenção pela sua utilidade analítica: a utilização do conceito de «cognitariado» na

análise dos processos de profissionalização dos profissionais de RVC e de outras ocupações

profissionais que utilizem o conhecimento e a fabricação de conhecimento como centrais na

configuração das suas práticas.

Última sugestão. Pela leitura das entrevistas verificam-se muitas das ambivalências que se

implicam, por estas alturas, nestes contextos. Nelas manifesta-se a vontade de uma segurança

profissional, mas também se verifica um certo tédio e um sentimento de estagnação devido às

rotinas de trabalho; reveza-se a indiferença perante o futuro profissional, uma aceitação

pragmática do que se antecipa e o pessimismo e a descrença que é sempre estratégia para

reduzir o impacto dos danos. Enfim, as pessoas esperam!

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Legislação consultada

Decreto-Lei 387/1999, de 28 de Setembro - cria a Agência Nacional de Educação e

Formação de Adultos.

Despacho conjunto n.º 262/2001, de 12 de Fevereiro - aprova o regime de acesso aos

apoios concedidos para a realização do processo de Reconhecimento, Validação e Certificação

de Competências.

Portaria n.º 1082-A/2001, de 5 de Setembro - cria a rede nacional de Centros de

Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências.

Portaria n.º 286-A/2002, de 15 de Março - aprova o Regulamento do Processo de

Acreditação das Entidades Promotoras dos Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação

de Competências.

Decreto-Lei 208/2002, de 17 de Outubro - aprova a orgânica do Ministério da Educação.

Despacho conjunto n.º 24/2005, de 10 de Janeiro - aprova o regulamento que define o

regime de acesso aos apoios concedidos no âmbito da medida n.º 4, ação n.º 4.1,

«Reconhecimento, validação e certificação de conhecimentos e competências adquiridos ao

longo da vida».

Lei n.º 52/2005, de 31 de Agosto - aprova as Grandes Opções do Plano para 2005-2009.

Resolução do Conselho de Ministros n.º 183/2005, de 28 de Novembro - aprova o

Programa Nacional de Acção para o Crescimento e o Emprego 2005-2008.

Resolução do Conselho de Ministros n.º 190/2005, de 16 de Dezembro - Aprova o

Plano Tecnológico.

Decreto-Lei n.º 213/2006, de 27 de Outubro - aprova a Lei Orgânica do Ministério da

Educação.

Portaria n.º 86/2007, de 12 de Janeiro - alteração à Portaria n.º 1082-A/2001, de 5 de

Setembro.

Decreto-Lei n.º276-C/2007, de 31 de Julho - cria e aprova a estrutura orgânica da

Agência Nacional para a Qualificação, I. P.

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Decreto-Lei n.º 312/2007, de 17 de Setembro - define o modelo de governação do

Quadro de Referência Estratégico Nacional 2007 -2013 e dos respetivos programas

operacionais.

Resolução do Conselho de Ministros nº 173/2007, de 7 de Novembro - aprova um

conjunto de medidas de reforma da formação profissional.

Decreto Regulamentar nº 84-A/2007, de 10 de Dezembro - estabelece o regime geral

de aplicação do Fundo Social Europeu.

Decreto-Lei n.º 396/2007, de 31 de Dezembro - estabelece o regime jurídico do Sistema

Nacional de Qualificações e define as estruturas que asseguram o seu funcionamento.

Portaria n.º 370/2008, de 21 de Maio - regula a criação e o funcionamento dos Centros

Novas Oportunidades, incluindo o encaminhamento para formação e o reconhecimento,

validação e certificação de competências.

Portaria n.º 781/2009, de 23 de Julho - estabelece a estrutura e organização do Catálogo

Nacional de Qualificações, bem como o respetivo modelo de evolução para qualificações

baseadas em competências.

Portaria n.º 782/2009, de 23 de Julho - regula o Quadro Nacional de Qualificações e

define os descritores para a caracterização dos níveis de qualificação nacionais.

Despacho n.º 21022/2009, de 18 de Setembro - altera do regulamento específico que

define o regime de acesso aos apoios concedidos no âmbito da tipologia de intervenção n.º 2.1,

«Reconhecimento, validação e certificação de competências», do Programa Operacional

Potencial Humano

Decreto-Lei nº 36/2012 de 15 de fevereiro - cria e aprova a orgânica da Agência Nacional

para a Qualificação e o Ensino Profissional, I. P.