intertextualidade autraniana: relaÇÕes entre … · maria de souza (1996, p. 30), o autor diz:...
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G r a d u a n d o , F e i r a d e S a n t a n a , v . 7 , n . 1 0 , p . 1 7 7 - 1 9 1 , 2 0 1 6
I S S N 2 2 3 6 - 3 3 3 5
I N T E R T EX T UA L I DA DE AU TR AN I A NA :
R E LA ÇÕE S E N T R E L U CAS P RO C ÓP IO E
M A D AME B OV AR Y
L a r a d a S i l v a C a r d o s o
U n i v e r s i d a d e E s t a d u a l d e F e i r a d e S a n t a n a ( U E F S )
L i c e n c i a t u r a e m L e t r a s V e r n á c u l a s
l a r a c a r d o o s o @ h o t m a i l . c o m
P r o f a . M a . A n d r é i a S i l v a d e A r a ú j o
U n i v e r s i d a d e E s t a d u a l d e F e i r a d e S a n t a n a ( U E F S )
D e p a r t a m e n t o d e L e t r a s e A r t e s ( D L A )
a n d r e i a . c o m . a c e n t o @ gm a i l . c o m
R esumo : Esc r i t o r m i n e i r o , Au t r a n Do u ra do ( 1 9 26 - 20 1 2 ) f o i um
defensor da ‚cu l t u ra l e t rada ‛ . Au tor consc i en t e de sua cr i ação
e d e s uas t é cn i ca s l i t e r á r i a s : us and o como r e f e r ê nc i a l i v r o s
c o n s a g r a d o s d a l i t e r a t u r a u n i v e r s a l , s u a s o b r a s s ã o
ca r r egadas de i n t er tex t ua l i dade . Mu i t as das suas personagens ,
i n c l u s i v e , po r s e r em ass í duas l e i t o r a s de ob r a s c l á s s i ca s , a s
mesmas têm uma impor tan te refe rênc i a na compos i ção de suas
persona l i dades . Baseado nes t e un ive rso pa r t i cu l a r da l i t era tura
au t r a n i a na , o t r a ba l ho r ea l i z a do t em como ob j e t i v o ana l i s a r a
i n f l u ê n c i a d a l e i t u r a d e Ma d am e B ov a r y n a c o n s t r u ç ã o d a
i d e n t i d a d e d e I s a l t i n a , uma d as p e r so na g en s d o l i v r o Lu ca s P r o c ó p i o ( 2 0 0 2 ) e d e m o n s t r a r q u e a i n t e r t e x t u a l i d a d e
a u t r a n i a na s e f a z p r e s en t e n as a çõ e s e p e r s o na l i d a d es d a
p ro t a g on i s t a do l i v r o es t u dado . A me t o do l o g i a u t i l i z a da pa r a
a l cança r o p r opós i t o f o i o es t ud o b i b l i o g r á f i co , com base na
o b r a de D ou ra d o i n a ug u r ad a em 1 9 8 5 , n a d e F l a u b e r t q u e a
an t ecedeu nos anos de 1857 e na pesqu i sa e nas noções de
c am po s d e t e ó r i c o s c om o S o u z a ( 1 9 9 6 ) , B r a n d ã o ( 2 0 0 6 ) e
Hossne (2000 ) .
Pa l a v r as - chave : L i t e r a t u r a . Au t r a n Dou rado . Madame Bova ry .
In ter tex tua l i dade .
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1 I N T RO D U Ç Ã O
Aut ran Dourado ( 1 926 -2012 ) , m ine i ro , nasc i do na c i dade de
Pa tos , fo i um escr i t o r bras i l e i ro de reconhec imento i n ternac i o -
na l com obras t raduz i das para o f rancês, espanho l e a l emão , e
vencedor de grandes prêm ios , i nc l u i ndo o prêm io Camões
( 2000 ) . Embora a l guns aspectos l i t erá r i os s e jam comuns a
out ros autores pós -modernos , como Gu imarães Rosa e C l a r i ce
L i spector (SOUZA, 1 996 , p . 20 ) , o escr i t o r m ine i ro t em suas
par t i cu l a r i dades . Seus l i v ros são f ru tos de uma i nvenção
f i cc i ona l baseada no ret ra to da soc i edade bras i l e i ra , na deca -
dênc i a de M inas Gera i s , i nc l u i ndo uma tendênc i a a t razer m i t os
e l endas para suas obras , e na nar ra t iva i n t im i s ta com um teor
ps i co l óg i co . As personagens de suas obras l i dam com a l oucu -
ra , a so l i dão e o enc l ausuramento de forma repet i t i va , conden -
sando sua escr i t a em uma ‚ teor i a c í c l i ca ‛ (BOSI , 1 999 , p. 22 ) .
Conhec i do por de fender uma formação cu l t u ra l e i n te l ec -
t ua l dos escr i t o res , suas obras são rep l e t as de i n ter tex tua l i da -
de . Pa ra e l e , um bom escr i t o r deve possu i r t écn i cas , re ferên -
c i as e ter consc i ênc i a de sua cr i ação l i t erá r i a . Em um dos seus
l i v ros de ensa i os sobre teor i a da l i t era tura , Aut ran Dourado
escreve :
[ . . . ] Só ace i t e o p i n i ão d e qu em sab e f az e r b em e j á
f e z um bom t ex t o l i t e r á r i o . O r e s t o é ma i s p a l p i t e d e
q uem d esconhece o assu n to . N ão l h e d ê o uv i dos e
so b re t udo só l e i a o s compe t en t e s au t o re s , q u e sabem
e j á mos t r a r am como se esc r eve b em , o s ch amado s
d ono s d a p a l av r a e sc r i t a [ . . . ] . ( DOURADO , 2 009 , p . 8 ) .
As referênc i as l i t e rá r i as de Aut ran ora aparecem d i re ta -
mente re l ac i onadas a e l e , como em seus l i v ros de ensa i os l i t e -
rá r i os , ora aparecem a par t i r da cons t rução i dent i t á r i a de suas
personagens . No depo imento reg i s t rado no l i v ro de Ene i da
Mar ia de Souza ( 1 996 , p . 30 ) , o autor d i z : ‚Uma co i sa é cer ta :
t odos esses l i v ros nar ram a m inha h i s tór i a pessoa l , suas
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personagens são eu mesmo, mesmo as fem in i nas . ‛ A compos i -
ção i n te l ectua l fe i t a pe l as suas personagens são , de fa to , r efe -
rênc i as às l e i t u ras do própr i o escr i t o r . Mu i t os de seus pro ta -
gon i s tas car regam essa i n ter tex tua l i dade de f orma exp l í c i t a ,
sendo escr i t o res e/ou l e i t o res .
É a par t i r da personagem Isa l t i na , do l i v ro Lucas Procóp i o ( 1 985 ) , que a i n ter tex tua l i dade aut ran i ana será aqu i es tudada . A
abordagem da pesqu isa é fe i t a a t ravés da i n f l uênc i a da l e i t u ra
de Madame Bovary na cons t rução da persona l i dade de Isa l t i na ,
focando nas re lações exp l í c i t as e imp l í c i t as ent re as obras .
2 GU S T A V E F L A U B E R T E A U T RA N D O U R A D O :
R E F E R Ê N C I A S L I T E RÁ R I A S
As re l ações ent re a escr i t a de Aut ran e a de F l auber t j á
foram notadas pe l os es tud i osos da obra de Aut ran Dourado .
Souza ( 1 996 , p . 1 6 ) aponta F l auber t como um mes t re da forma -
ção l i t erá r i a , a qua l é evocada pe l o escr i t or m ine i ro em seus
tex tos de teor i a da l i t era tura . Ce l so Leopo ldo Pagnan (20 15 , p .
53 ) a f i rma que “Aut ran Dourado demons t ra ter uma preocupa -
ção cons tan te com o própr i o processo de cr i ação l i t erá r i a . É
bem verdade que se vo l t a para sua produção ou para obras e
autores que l he deram mot ivo f i cc i ona l , como F l auber t ‛ .
O escr i t o r de Lucas Procóp i o , em depo imento aos a l unos
da Facu l dade de Let ras da UFMG (SOUZA, 1 996 , p . 40 ) ao c i t a r
au tores i n ternac i ona is de impor tante va l i a pa ra sua i dent i dade
l i t erá r i a , c i t a F l auber t . Ao fa l a r da apropr i ação das suas perso -
nagens , Aut ran Dourado d i z , t ambém, no depo imento que ‚A
f rase de F l auber t 'Madame Bovary c ' est mo i ' é per fe i -
t a ‛ (SOUZA, 1 996 , p . 30 ) . O e l o ent re os do i s escr i t o res j á c i t a -
dos se mos t ra presente durante toda obra de Aut ran , mas
vem a se forma l i za r i n te i ramente em Lucas Procóp i o , quando a
personagem l ê e se apa i xona por Madame Bovary : “ [ . . . ] Nunca
porém o coração de Isa l t i na ba teu tão for te como quando l eu
o romance de F l auber t . Quantas horas marav i l hosas , quantas
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emoções sub l imes . Chorou como poucas vezes com a i n fe l i c i -
dade de Emma Bovary , sof reu com e l a pr ecocemente as dores
do amor ma l cont ra r i ado . ‛ (DOURADO, 2002, p. 104 ) .
Lucas Procóp i o , segundo l i v ro da t r i l og i a a rca i ca do Bras i l ,
apresenta a h i s tór i a da personagem que car rega o nome da
obra . O tex to é d iv i d i do em duas par tes : Pessoa , em que a
h i s tór i a é nar rada sob a pe rspect iva da v i da de Lucas e
Persona, em que se t ra ta da v i da de Isa l t i na e a re l ação de l a
com Procóp io . O autor , como a f i rmara em tes temunho, t em uma
i den t i f i cação ma ior com o sexo fem in i no , po i s , pa ra e l e ‚as
mu lheres [ . . . ] dão me lhores personagens‛ (SOUZA, 1 996 , p . 52 ) ,
sendo i n tenc i ona l a d iv i são do tex to a par t i r da perspect i va de
gêneros d i feren tes na nar ração .
2 . 1 O V Í N C U L O E N T R E M A D A M E B O V A RY E L U C A S P RO C Ó P I O
Há nas pr ime i ras pág i nas em Persona , cap í t u l o I I de
Lucas Procóp i o , em que se nar ra a h i s tór i a de Isa l t i na , t rechos
que fazem a l usão à obra bovar i ana . Isa l t i na t i nha um sonho de
dançar va lsa com um pr í nc i pe : não tendo esse dese jo concre -
t i zado , contentou-se em dançar com um v i sconde :
No en t an to , f o i p a r co n s t an te d o V i sco nd e d e B aur u ,
d i sp u t ado p o r t od as , p e l o p o r t e , man e i r a e r i qu ez a .
[ . . . ] . E l a e o V i sco nd e p rome t e r am amo r e t e rn o . A t é a
mo r t e e s t a r emos d e mão s d ad as , d i z i a e l a . [ . . . ] . T r oca -
r am ca r t as e m a i s c a r t as , c a r t as b e l í s s imas , ap a i xon a -
d as , a r d en t e s , mo l h ad as d e l ág r imas . ( DOURADO , 2 002 ,
p . 1 0 5 ) .
O t r echo descr i t o ac ima parece r efer i r -se à obra Madame Bovary . I sa l t i na , ass im como Emma, personagem pr i nc i pa l da
obra de F l auber t , era uma ass í dua l e i t o ra de romances e
sonhava ter exper i ênc i as de v i da seme lhante às nar radas
pe l os l i v ros que l eu , v ivendo a l e i t u ra de f orma i n tensa e ,
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mu i t as vezes , cr i ando na própr i a imag i nação cenas parec i das
as das obras l i t e rá r i as . Bovary também consegu iu o l ha res e
a tenção de um v isconde , o qua l a gu i ou para uma dança :
Nes t e momen t o , um d o s q u e v a l sav am , ch amado co l o -
qu i a lmen t e d e v i scond e [ . . . ] v e i o p e l a segund a vez
conv i d ar a Bova r y p a r a d an ça r , asseg ur ando - l h e q ue
a g u i a r i a e q u e e l a se sa i r i a b em . ( F LAUBERT , 2 008 , p .
60 ) .
A va l sa , dese jada por Emma e Isa l t i na , t orna -se o s ímbo lo
do amor i dea l , pr esente nos l i v ros românt icos que l eram. O
amor para e l as de i xa de ser apenas i n ter i o r i zado e passa a ter
a necess i dade da demons t ração a t ravés de ges tos , pa l av ras e
ações seme lhantes aos dos pro tagon i st as das obras romanes -
cas . As personagens ana l i sadas impor tavam -se ma i s com a
representação do amor do que com o sent imento propr i amente
d i t o . Emma, durante seu casamento , despreza o amor do espo -
so , po i s ‚a pa i xão de Char l es não t i nha ma is nada de exorb i -
t an te‛ ( FLAUBERT, 2008 , p . 5 1 ) . E Isa l t i na , a i nda so l t e i ra , possu -
í a uma a lma românt i ca , chorando e sof rendo exageradamente
suas des i l usões amorosas : ‚andava i nconso láve l pe l os cantos ,
chorou amargamente‛ (DOURADO, 2002 , p . 105 ) ao de i xa r de
receber car tas do v i sconde .
3 A C O N C E P Ç Ã O D E A M O R : I N F L U Ê N C I A D A
L I T E RA T U RA RO M A N E S C A
A concepção de amor que Isa l t i na adqu i r i u durante sua
v i da fo i u l t ra r românt i ca . A l ém da prefer ênc i a dos romances , as
mús i cas que ma i s l he apetec i am eram as ba l adas e sonatas ,
peças de Mozar t e Schumann , com um t eor românt i co . Seu
l oca l de v i s i t a pre fer i do era casa da Ch i ca da S i l va , persona -
gem h i s tór i ca da ant i ga D i amant i na , po i s ‚era a aura de sonho
e l enda , o m i to , o u l t ra r romant i smo de um amor imposs íve l ,
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ma lv i s to e condenado . ‛ (DOURADO, 2002 , p 1 10 ) . As mús i cas
que ma i s gos tava de ouv i r em l ua res , quando a i nda so l t e i ra ,
eram, ent re out ras , É a t i e F l o r do Céu , por desper ta rem l ágr i -
mas e sent imenta l i smos exacerbados .
Emma possu í a uma v i são de amor parec i da . Comp le tamen -
t e i n f l uenc i ada pe l as l e i t u ras romanescas , buscava i ncessante -
mente um amor i gua l aos tex tos l i t erá r i os . Sem encont rá - lo
es tando so l t e i ra , buscava no casamento então ‚ [ . . . ] saber o que
s i gn i f i cam exa tamente , na v ida , as pa l av ras f e l i c i dade , pa i xão ,
embr i aguez , que tão be l as l hes pareceram nos
l i v ros . ‛ ( FLAUBERT, 2008 , p . 42 ) . Ao se tornar uma Bovary ,
Emma fa r i a de tudo para que seu amor fosse o mesmo que
i dea l i zou , en t re tan to , d i versas s i t uações f i zeram com que i sso
não se rea l i zasse .
A pa i xão que Isa l t i na sent i u pe l o v i sconde antes de se
casar teve a mesma força emoc iona l das pa i xões que Bovary
sent i u depo i s do ma t r imôn io . Mot ivadas por i números romances ,
t i veram sua sent imenta l i dade cons t ru í da a par t i r das emoções
das personagens que conhec i am nos romances . Isa l t i na , a
par t i r do amor não cor respond ido do V i sconde de Bauru ,
sent i u , desde cedo , ‚a saudade do l or i da , a hora da so l i t ude , as
no i t es do cão . ‛ (DOURADO, 2002 , p . 106 ) . Emma Bovary exper i -
mentou a mesma emoção antes mesmo de encont ra r -se com
um homem: na mor te de sua mãe , Emma f i cou ‚ [ . . . ] i n t imamente
sa t is fe i t a por t er obt i do na pr ime i ra ten ta t i va aque l e ra ro i dea l
das ex i s tênc ias pá l i das , aonde os corações med íocres nunca
conseguem chegar . ‛ ( FLAUBERT, 2008, p . 47 ) . O nar rador de
Lucas Procóp i o , i nc l us i ve chega a fa l a r das l ágr imas pe l o amor
i na l cançado de Isa l t i na como uma ‚ formação sent imenta l ‛ ,
dando a entender que sua concepção de amor es tava pautada
a sof rer ass im como o des t i no da personagem Bovary que
tan to e la se i dent i f i ca ra .
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4 A N E C E S S I D A D E D A L E I T U RA RO M Â N T I C A N A V I D A
I N T E R I O RA N A
Tanto Bovary quanto Isa l t i na não gos tavam da v i da i n ter i -
orana . O téd i o , as mesm ices de sempre , os mesmos eventos e
pessoas sempre fazendo as mesmas co i sas as enfurec i am .
Isa l t i na , an tes de casar , por sua fam í l i a t er empobrec i do , t eve
que i r pa ra o i n ter i o r : ‚E então tudo de be l o e l um inoso sub i do
acabou . O pa i vo l t ou com a fam í l i a pa ra a p rov í n -
c i a ‛ (DOURADO, 2002 , p . 108 ) . Depo i s do casamento , a saudade
de sua c i dade na ta l era f requente , ‚ [ . . . ] não t i nha quase nada a
fazer no casarão enorme. ‛ (DOURADO, 2002 , p . 1 32 ) o que
a judava a aumenta r a saudade da v i da urbana: ‚ [ . . . ] aque l e
mato , aque l e i so l amento i n fe l i z na Fazenda do Encantado a
es tavam matando . ‛ (DOURADO, 2002 , p . 142 ) . Madame Bovary ,
mesmo ten tando cu i da r dos negóc i os do mar i do, sent i a sua
v ida , a l i no i n ter i o r , f r i a ‚ [ . . . ] como um ce l e i ro cu ja l uca rna é
vo l tada para o nor te , e o téd i o , a ranha s i l enc i osa , t ec i a sua
te l a na sombra , em todos os cantos de seu cora -
ção . ‛ ( FLAUBERT, 2008 , p . 52 ) . O que ma i s dava desgos to às
duas mu lheres era a so l i dão : t ão bem educadas , cr i adas para
v iver j un to com as dema i s pessoas na cor te , agora se encon -
t ravam no i n ter i o r onde só ex i s t i am pessoas da mesma c l asse
rud imenta r de seus pares , que pouco acrescentavam às suas
conversas i n te l ectua i s .
Lucas Procóp io e Char l es Bovary eram desprov idos da
educação de suas companhe i ras , as qua i s os cr i t i cavam e se
desgos tavam cada vez ma i s . Char l es Bovary , a i nda que méd i -
co , ‚usava sempre botas grossas com duas rugas ob l í quas no
cano que i am do pe i t o do pé a té o tornoze l o . [ . . . ] . E l e d i z i a que ,
pa ra o campo , es tava ma i s que bom ‛ ( FLAUBERT, 2008, p . 50 ,
gr i fo nosso ) . Lucas Procóp i o , pe rsonagem de Aut ran Dourado,
possu í a uma ca l i g ra f i a péss ima e ma l sab i a mast i ga r de boca
fechada . Para I sa l t i na ‚ [ . . . ] a i nda fa l t ava mu i to para e l e ter um
m ín imo de po l i mento para f requenta r , não d i z i a um sa l ão , mas
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uma sa l a de v i s i ta . ‛ (DOURADO, 2002 , p . 1 2 1 ) . Or i undas de uma
boa educação e i nsp i radas em t ex tos românt i cos , ambas as
personagens dese ja vam um pr í nc i pe , quando , na verdade ,
encont ra ram homens procedentes de uma educação
rud imenta r , na qua l pouco a l imentava seus dese jos emoc iona is .
A l e i t u ra dos l i v ros romanescos era uma necess i dade
para as personagens f em in i nas , supos tamente desva l or i zadas
por seus mar i dos e fam i l i a res . A mãe de Bovary não gos tava
da impor tânc i a que Emma dava aos l i v ros e do pouco caso
que a mesma faz i a para as ta refas de esposa , a f i rmando que
a nora apenas ocupava-se ‚ [ . . . ] l endo romances , maus l i v ros ,
obras que são cont ra a re l i g i ão e que zombam dos padres
a t ravés de d i scursos t i rados de Vo l t a i re . ‛ ( FLAUBERT, 2008 , p .
1 26 ) . Char l es ten tou imped i r a l e i t u ra de Emma , mas não fo i
bem-suced ido . A obra de Aut ran Dourado possu i t ambém as
caracter í s t i cas fam i l i a res das personagens de opos i ção à l e i t u -
ra romanesca. Isa l t i na fo i ques t i onada da u t i l i dade dos roman -
ces para sua v i da pe l o mar i do : ‚Ara , romance ! Que ut i l i dade
pode ter um romance senão encher de caram inho l as as mu lhe -
res?‛ (DOURADO, 2002 , p . 1 39 ) . O i n teresse dos l i v ros era
apenas das personagens , as qua i s sent i am a imensa fa l t a da
l i t era tura : sem a rea l i zação de um amor verdade i ro , seme lhante
às l e i t u ras que faz i am , res tava - l hes a percepção amorosa
cons t ru í da a par t i r da imag i nação .
5 O C A S A M E N T O E A C R Í T I C A A O PA T R I A RC A D O
Embora o casamento tenha s i do esperado pe l as duas
personagens ana l i sadas a f im de uma rea l i zação pessoa l , os
mar i dos de ambas não t i nham a mesma concepção . Hossne
( 2000 , p . 4 ) faz uma aná l i se sobre a s i gn i f i cação do casamento
para os d i fer en tes gêneros , j us t i f i cando a fa l ta de i n teresse do
homem e o cu i dado ma t r imon ia l da mu lher :
O p e r cu r so f em i n in o , t a l c omo é d e t e c t áve l t an t o n o
âmb i t o r omanesco conven c io n a l q u an t o n a ma i o r p a r t e
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do r omance d a b u rgu es i a o i t o cen t i s t a , adm i t e p a r a a
mu l h e r uma ú n i c a p o ss i b i l i d ad e v i áv e l d e r e a l i z ação
p esso a l : o c asamen to , i d en t i f i c ad o ao Amo r , e , seg u i n -
do- se a e l e , a ma t e r n i d ad e . P a r a o h omem , a r e a l i z a -
ção p esso a l p assa p e l a p r o f i s são o u p e l a sa t i s f a t ó r i a
p o sse d e b en s , p e l o p r e s t í g i o so c i a l , a p o l í t i c a , o u ,
e n f im , p e l a p o ss i b i l i d ad e d e a scen são p ro p r i amen t e
d i t a .
O casamento de ambas as personagens , embora tenham
durado horas , não foram l evados tão a sér i o pe l os no ivos . O
casamento de Emma fo i rea l i zado durante a no i t e para 43
conv idados , ao cont rá r i o do dese jo da no iva que e ra casar -se
à l uz de ve l as durante a passagem da no i t e para a manhã . O
ma t r imôn io de Isa l t i na fo i cu i dado ma i s por e l a , que por e l e ,
que esco l heu os padr i nhos ‚ [ . . . ] por l á mesmo , en t re os
companhe i ros de b i l ha r e de borde l ‛ (DOURADO, 2002 , p . 12 1 ) .
A chegada de um f i l ho fo i um fa to dec i s i vo para a
ruptura da harmon ia da re l ação con juga l das personagens e a
i n f l uênc i a para o adu l t ér i o . Char l es , ao descobr i r a grav i dez da
mu lher , se tornou ma i s ca r i nhoso e Emma fo i l ogo i n f l uenc i ada
por e l e . O seu dese jo era ter um men ino :
Dese j av a um f i l h o ; se r i a f o r t e e mo reno , se ch amar i a
Geo rg es ; e e ssa i d e i a d e t e r um f i l ho homem e r a como
a r ev an ch e d e t o d as su as i m po t ên c i as p a ssad as . Um
homem ao meno s é l i v r e ; p od e p e r co r re r as p a i xõ es e
o s p a í se s . [ . . . ] Ao mesmo t empo i n e r t e e f l e x í v e l , a
mu l h e r t em a seu d es f avo r a s f r aq uez as d a c a r ne e
as d ep end ên c i as d a l e i . ( FLAUBERT , 2 008 , p . 92 ) .
Para Isa l t i na e Lucas , a esperança era , t ambém, de se t er
um bebê do sexo mascu l i no . E l a j á hav i a mos t rado em
cap í t u l os anter i o res , sua i nsa t i s fação nas d i ferenças ent re s er
homem e mu lher : ‚A pos i ção da mu lher , sempre p i o r que a do
homem. F i cam fe i t o ga l o , a r ras tam as asas , as fa l i nhas mansas ,
bobas . Empavonados, che i os de s i . [ . . . ] . Que des t i no t r i s t e ser
mu lher ! susp i rava . ‛ (DOURADO, 2002 , p . 1 17 ) . Pa ra Isa l t i na , a
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chegada de um f i l ho também poder i a ser cons i derada um t raço
de sua persona l i dade , a qua l es ta r i a l i v re das amarras soc i a is
sof r i das pe l a mu lher . A chegada de um f i l ho não ser i a uma
rea l i zação fem in i na , ma i s uma ação que comp le ta o des t i no das
moças que foram ao mundo e se casaram, mas uma forma de
se rebe l a r cont ra e l e , re l ac i onando com as i de i as de Madame
Bovary , po is , como a f i rma Hossne (2000 , p . 5) :
Também é d i gno d e no t a o f a t o d e q u e Emma n ão
enume r a en t re e ssas cond i çõ es su cess i v as a ma t e r n i -
d ade . E s t a n ão ch eg a a se r j ama i s um ob j e t i v o , n ão s e
t o r n a p a r a e l a uma d as g r and es sa t i s f açõ es d a v i d a ,
c omo p r ev i a o p e rcu r so t í p i c o f em i n i no .
O anse i o por um f i l ho não per tenc i a , de fa to , aos sent i -
mentos das personagens ana l i sadas ; representavam uma
cons t rução t rad i c i ona l da mu lher no sécu l o XIX a qua l não era
bem ace i t a por Isa l t i na e Emma . Segundo Ruth S i l v i ano Brandão
( 2006 , p . 1 55 ) “ [ . . . ] p resa de um s i s tema de representações
v i r i s , a mu lher se l ê anunc i ada num d i scurso que se faz
passar pe l o d i scurso de seu dese jo ‛ , j á que ao sexo fem in i no
não cab i a nenhum i n teresse própr i o , t oda sua v i da era
cons t ru í da pe l o dese jo do pa i e ent regue ao mar i do , após o
ma t r imôn io , cabendo a e l a exc l us ivamente o pape l de boa
esposa e boa mãe para seus f i l hos .
Procóp i o , pro tagon i s ta da obra de Aut ran , que j á hav i a
s i do f i e l por um tempo e depo i s , descontente da esposa, a
ter i a t ra í do , sent i u a f e l i c i dade retornar ao casamento com a
chegada do f i l ho : ‚e l e l he a l i sava a bar r i ga aos poucos se
avo lumando [ . . . ] . Que bom f i ca r j un to de l a , ver - l he a mans i dão
do o l ha r ! ‛ (DOURADO, 2002 , p . 1 35 ) . En t re tanto , o des t i no para
Emma e Isa l t i na fo i , novamente , mu i t o d i fer en te dos seus
sonhos . As duas cr i anças nasceram men inas ; a de Isa l t i na
recebeu o nome da avó ma terna , Teresa . Madame Bovary , ao
saber que t rouxe à l uz uma cr i ança do sexo f em in i no , desma i -
ou ; só depo i s l he fo i dado o nome de Ber the .
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6 O A D U L T É R I O
Para Isa l t i na e Emma , o casamento não t rouxe nenhuma
fe l i c i dade . A obr i gação de casar , cu i da r das casas e dos f i l hos ,
ace i t a pe l as mu lheres de seu tempo , l hes causava téd i o e
i nsa t is fação . A concepção de amor desenvolv i da pe l as perso -
nagens a t ravés dos romances que l i am não fo i rea l i zada em
suas v idas con juga i s : a pa i xão só se concret i za r i a pe lo adu l t ér i o .
Hossne (2000 , p . 25 ) a f i rma que ‚ [ . . . ] o amor , subentende -se ,
i den t i f i ca -se ao adu l t ér i o . Não se t ra ta a i nda de uma época em
que a mu lher possa esco l her com to ta l l i berdade o fu turo mar i -
do . [ . . . ] Mas , se nem sempre se esco l h i a o mar i do , e ra poss íve l ,
no entan to , esco l her o (s ) amante (s ) ‛ .
Madame Bovary sempre fo i descontente com seu casa -
mento . Em seus monó logos i n ter i o res , de i xava c l a ro seu
descontentamento com o ma t r imôn io e a i ncessante busca de
um amor : ‚E l a se perguntava se não haver i a um me io , por
out ras comb inações do acaso, de encont ra r out ro homem [ . . . ] .
Af i na l , não e ram todos como aque l e . ‛ ( FLAUBERT, 2008 , p . 52 ) .
Encont ra r um amante t rouxe a Emma uma ress i gn i f i cação v i t a l ,
a rea l i zação de um sonho.
E l a r ep e t i a p a r a s i : ‘ T enh o um aman t e ! Um aman te ! ’ ,
d e l e i t an do - se com essa i d é i a , c omo se f o sse uma
n ova pub e rd ade q ue es t i v e sse l h e aco n tecendo . [ . . . ] .
Começava a l go ma r av i l ho so em que t ud o se r i a p a i xão ,
ê x t ase , d e l í r i o ; uma imen s i d ão azu l ad a a ce r c ava , o s
cumes do sen t imen t o c i n t i l a v am sob seu p en samen t o
e a ex i s t ê n c i a ex t r ao r d i n á r i a n ão ap a r ec i a sen ão ao
l o ng e , l á emba i xo , n a sombr a en t r e o s i n t e rv a l o s
d aqu e l as a l t u r as . ( F LAUBERT , 2 008 , p . 1 60 ) .
A exa l tação de Bovary ao encont ra r um homem capaz de
rea l i za r seus anse i os amorosos é seme lhante à a l egr i a de
I sa l t i na quando se envo lve com o Padre Agos t i nho : ‚ [ . . . ] t enho
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o d i re i t o de ser pe l o menos uma vez na v i da i n te i ramente fe l i z .
A ún i ca vez que conhec i a fe l i c i dade fo i um breve i ns tan -
t e . ‛ (DOURADO, 2002 , p . 172 ) . Embora o adu l t ér i o se j a um peca -
do , i nadm iss íve l para uma cons t rução i dea l de fam í l i a do sécu l o
XIX , para as duas personagens em aná l i se , era o ún i co modo de
consegu i r r ea l i zação pessoa l , de sent i r -se uma mu lher comp le -
t a , v i s to que , segundo Hossne (2000 , p . 33 ) :
O adu l t é r i o é d esv i o , ma s sem ca r á t e r co n t e s t a t ó r io . É
d esv io p a r a en con t r a r a l g o conven c i on a lmen t e a t r i b u í -
do ao p e r cu r so f em i n i no t r ad i c i o n a l – a e xpe r i ê n c i a d o
amor . N ão é a um homem que se j a seu gu i a q u e v a i
b u sca r n o s aman t e s , mas h omens q ue se p a r eçam
ma i s com o i d e a l l i t e r á r i o , c u j a b ase , como j á f o i
o b se r v ado , f u nd amen t a - se n a d es i gu a l d ade , n a supe r i -
o r i d ad e e n a dom i n ação .
O adu l t ér i o deu às personagens cam inhos d i feren tes .
Bovary , end iv idada pe l os a l t os cus tos de se ter um amante ,
envenena-se e morre . Isa l t i na sof re um per í odo de hum i l hação
e o seu casamento é comp le tamente abandonado : seu mar i do
não a perdoa , mas procura esquecer a h i s tór i a , t ra t ando -a
f r i amente . O sof r imento após o descobr imento do adu l t ér i o das
duas personagens fo i grande , t endo impos to a e l as toda hum i -
l hação que uma mu lher no sécu l o X IX sof rer i a ao t ra i r seu
esposo e , consequentemente , sua fam í l i a . A esperança de se
encont ra r um amor seme lhante ao l i do nos romances é , pa ra o
contex to soc i a l das personagens em aná l i se , um desrespe i t o
aos bons modos e à soc i edade . Porém, para e l as , é ma i s que
um s imp l es dese jo ; é uma necess i dade de se v iver baseado
nos i dea i s de amor da l i t era tura romanesca , s endo o adu l t ér i o ,
por tan to , uma evasão à rea l i dade que põe os sent imentos
ac ima dos padrões soc i a i s de compor tamento , sendo que as
re l ações soc i a i s dever i am es ta r ac ima dos sent imentos fem in i -
nos .
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7 C O N C L U S Õ E S
A l i t era tura pós -modern is t a de Aut ran Dourado t rouxe
formas mu l t i f acetadas à l i t era tura , a qua l buscava por novos
es t i l os de nar ra r o cot i d i ano : ‚ [ . . . ] es tão a í as obras que de 30
a 40 e 50 [décadas do sécu l o 20 ] mos t ram à sac i edade que
novas angús t ias e novos pro je tos enformavam o a r t i s t a bras i -
l e i ro e o obr i gavam a de f i n i r -se na t rama do mundo contempo-
râneo . ‛ (BOS I , 1 999 , p . 4 1 1 ) . A i n ter tex tua l idade exp l í c i t a nas
obras de Aut ran Dourado , a par t i r da r eferênc i a d i re ta da l i t e -
ra tura un iversa l , evoca-se aber tamente na cons t rução da
personagem Isa l t i na , educada a t ravés da l e i t u ra de obras
romanescas , t ranspor tando o gos to l i t erá r i o para as suas
ações e seus sent imentos .
As re l ações ent re Isa l t i na e Madame Bovary es tão pauta -
das em vár i os aspectos desde os autora i s , po i s Aut ran Doura -
do re ferenc i a F l auber t como obra de grande i n f l uênc i a em sua
escr i t a ; t ambém os aspectos po l í t i cos se fazem presentes , a
par t i r de uma seme lhança ent re a v i da i n ter i o rana e as perso -
na l i dades rud imenta res dos mar i dos ; soc i a i s , como uma cr í t i ca
ao pa t r i a rcado, ao ma t r imôn io e à i g re j a ; emoc iona i s , po i s as
personagens demons t ram sent imentos parec i dos durante todo
o percurso nar ra t i vo e l i t erá r i o , j á que ambas demonst ram um
grande i n teresse pe l a l e i t u ra romanesca . Hossne (2000, p . 1 94 ) ,
a f i rmou que , após a cons t rução do Bovar ismo , pe l o romance
de F l auber t ,
O q u e ch ama a a t en ção , en t re t an t o , é a v as t a p r o f u -
são d e o b r as qu e se c r i am em t o rno d e um nú c l e o
comum : a r ep r e sen t ação d a l e i t o r a d e r omances como
um se r p r op en so a co n fund i r imag i n ação e r e a l i d ad e ,
con j ug ado a uma c r í t i c a embu t i d a e d e t e rm in ad o s
g ên e ro s d e f i c ç ão , e o l a s t r o so c i a l , e con ôm i co e p o l í -
t i c o qu e se r eve l a p o r me i o d essa a t i v i d ad e e d essa
cond i ç ão .
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O e lo ent re as obras Madame Bovary e Lucas Procóp i o
u l t rapassa os gos tos pessoa i s de l i t era tura do autor e torna -
se o cent ro de i dent i dade das personagens . Pa ra B randão
( 2006 , p . 29 ) , o d i scurso do autor “ [ . . . ] se i nsere em out ro l ugar
e d i a l oga sem cessar com out ros d i scursos , mesmo que i sso
se faça de forma i nconsc i en te‛ . Desse modo, conhecer o i n te -
resse l i t e rá r i o do autor m ine i ro é fundamenta l pa ra , não só
entender seu processo de escr i t a , mas também compreender
as personagens como i dent i dades essenc ia i s ao enredo e
rep l e t as de s i gn i f i cação e i n ter tex tua l i dades .
Ab s t r a c t : M i n e i r o w r i t e r , Au t r a n Do u r a d o ( 1 9 2 6 - 20 1 2 ) w as a
l et tered cul tu re defender , he was an author aware of h is creat ion
and l i t era ry techn i ques : h i s works a re l aden w i th i n t er tex tua l i t y ,
re fer r i ng to un iversa l consecra ted l i t era ture books . Many of h i s
characters a re even ass i duous readers of c lass i c works , wh i ch
has an impor tan t re fer ence i n the i r persona l i t i es . Based on th i s
par t i cu la r un iverse of the ‘Aut ran i an ’ l i t erature, the accomp l ished
a r t i c l e means t o ana l y ze t he r ead i ng ’ s i n f l u e nc e o f t he wo r k
Madame Bovary i n the cons t ruct i on o f Isa l t i na ’ s i dent i t y , one o f
t he characters of the book Lucas Procop i o and to demons t rate
t ha t the au t ra n i an i n t e r t ex t ua l i t y i s p r esent i n t he act i ons and
pe rsona l i t i es of the the s tud i ed book . The methodo logy used to
a ch i ev e t h e pu rpose o f ana l ys i s was a b i b l i o g r aph i ca l s t ud y ,
b a s e d o n t h e w o r k o f D o u r a d o ( 1 9 8 5 ) F l a u b e r t ( 1 8 57 ) a n d
research and not i ons of theoret i ca l f i e l ds such as Souza ( 1996 ) ,
Brandão (2006) and Hossne (2000) .
K e yw o r d s : L i t e r a t u r e . A u t r a n D o u r a d o . M a d a m e B o v a r y .
Intertextua l i ty .
R E F E R Ê N C I A S
BOSI , A l f redo . H i s tór i a conc isa da l i t era tura bras i l e i ra . 36 . ed .
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191
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