diogo barros gonçalves estudo do efeito do envelhecimento … · 2017. 7. 20. · universidade do...
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Universidade do Minho Escola de Ciências
Diogo Barros Gonçalves
Estudo do efeito do envelhecimento forçado na evolução de off-flavours em cerveja
Relatório do Projeto Individual Licenciatura em Química
Trabalho efetuado sob orientação de Professor Doutor Pier Parpot Professor Doutor José Maria Oliveira
Julho 2017
ii
Agradecimentos
Existe um leque de pessoas sem as quais a realização deste trabalho não teria sido possível.
Inicialmente, gostaria de agradecer aos meus orientadores, Professor Doutor Pier Parpot e Professor
Doutor José Maria Oliveira, por terem possibilitado desenvolver o projeto que lhes propus, pelo
conhecimento transmitido e por toda a liberdade que me deram, o que me permitiu crescer enquanto
cientista e pessoa.
Ao Professor Doutor Carlos Silva, pelos os inúmeros conhecimentos científicos transmitidos ao longo da
minha licenciatura e pelo apoio ao longo do desenvolvimento deste e doutros trabalhos com ele
desenvolvidos, o meu obrigado.
À Dra. Marta Ferreira, a minha Mini Boss, pelo apoio no trabalho laboratorial e pela inesgotável paciência
ao longo do trabalho.
Ao Eng. Eduardo Coelho, pelo apoio no trabalho laboratorial e pela boa camaradagem prestada.
À Fizzlab, nas pessoas do Eng. Tito Santos e Eng. João Durães, pelas análises sensoriais efetuadas e
pelo entusiasmo demonstrado pelo projeto.
A um nível mais pessoal, não poderia deixar de agradecer a toda a minha família, por todo o carinho e
entusiasmo demonstrado ao longo do meu percurso académico, este trabalho também é vosso.
À malta do Criar Asas, por todos os momentos e pelo crescimento enquanto pessoa.
Ao Carlos, Fábio, Cíntia e João Pedro, porque o desenvolvimento deste trabalho só fez sentido convosco.
Aos meus colegas, Vânia, Salete e Artem, obrigado pelo carinho e paciência e pelo apoio ao longo destes
3 anos.
À Mariana, por ser a pessoa que é e por aquilo que significa para mim.
A todos, o meu mais sincero obrigado.
iii
Índice
Lista de abreviaturas e siglas ..................................................................... vii
Capítulo 1 – Introdução .............................................................................. 1
1.1. – Cerveja e a Sociedade ................................................................... 1
1.2. – Processo de fabrico de cerveja ...................................................... 2
1.2.1. – Matérias-primas utilizadas no fabrico de cerveja ...................................... 2
1.2.2. – Etapas no processo de fabrico de cerveja ................................................ 3
1.3. – Estabilidade organolética da cerveja ............................................. 6
1.3.1. – A influência de certos fatores na estabilidade da cerveja .......................... 6
1.3.2. – Caracterização organolética da cerveja .................................................... 7
1.4. – Compostos químicos indesejados estudados – off-flavours ............ 9
1.4.1. – (E)-2-nonenal .......................................................................................... 9
1.4.2. – Ácido acético ........................................................................................ 10
1.4.3. – Furfural ................................................................................................ 11
1.4.4. – 4-vinilguaiacol ....................................................................................... 12
1.5. – Envelhecimento forçado de cerveja ............................................. 13
1.6. – Técnicas de preparação de amostra ............................................ 14
1.6.1. – Destilação por arraste de vapor ............................................................. 14
1.6.2. – Extração líquido-líquido ......................................................................... 14
1.6.3. – Extração em fase sólida (SPE) ............................................................... 15
1.7. – Técnicas analíticas – cromatografia ............................................ 15
1.7.1. – Cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) ..................................... 15
1.7.2. – Cromatografia gasosa (GC) ................................................................... 17
1.7.3. – Técnicas cromatográficas acopladas a espetroscopia de massa ............. 20
Capítulo 2 – Parte experimental ............................................................... 21
2.1. – Reagentes ................................................................................... 21
iv
2.2. – Instrumentação ........................................................................... 21
2.3. – Regimes de envelhecimento das amostras ................................... 22
2.4. – Análise da variação de cor ........................................................... 23
2.5. – Análise dos compostos de interesse ............................................. 24
2.5. – Análise de avaliação sensorial ..................................................... 25
Capítulo 3 – Apresentação e discussão dos resultados experimentais ....... 26
3.1. Discussão dos resultados obtidos relativos à evolução da
concentração de (E)-2-nonenal .............................................................. 26
3.2. – Discussão dos resultados obtidos relativos à evolução da
concentração de ácido acético .............................................................. 29
3.3. – Discussão dos resultados obtidos relativos à evolução da
concentração de furfural ....................................................................... 32
3.4. – Discussão dos resultados obtidos relativos à evolução da
concentração de 4-vinilguaiacol ............................................................ 34
3.5. – Discussão dos resultados obtidos pela análise sensorial das
amostras ............................................................................................... 37
3.6. – Discussão dos resultados obtidos para os envelhecimentos a 60 ºC
............................................................................................................. 37
3.7. – Discussão dos resultados obtidos para a análise de variação de cor
............................................................................................................. 38
Capítulo 4 – Considerações finais e propostas de trabalho futuro ............. 39
Bibliografia ................................................................................................. vi
v
Resumo
A cerveja é uma das bebidas alcoólicas mais complexas onde existem, reconhecidos, mais de 100
estilos. Em alguns destes, o envelhecimento da cerveja leva ao aparecimento de características
organoléticas associadas à formação de compostos químicos que enaltecem o produto final,
aumentando assim o valor comercial do mesmo.
A conservação da cerveja a temperaturas baixas atrasa o desenvolvimento das reações químicas
responsáveis pelo envelhecimento da cerveja. Por outro lado, a exposição a temperaturas mais elevadas
aumenta, significativamente, a evolução de compostos que têm um impacto negativo nas características
organoléticas da cerveja, denominados off-flavours.
O objetivo deste trabalho focou-se no estudo comparativo entre cervejas envelhecidas por diferentes
processos de envelhecimento forçado baseados na exposição a temperaturas elevadas, de forma a
estudar um leque de parâmetros relevantes que as amostras exibem quando sujeitas a este regime de
envelhecimento.
Neste sentido, as amostras de cerveja foram submetidas a uma série de regimes de envelhecimento
onde foi efetuada uma monitorização da evolução de alguns off-flavours através das técnicas de análise
cromatográfica de forma a perceber o impacto do envelhecimento forçado na composição química da
cerveja.
De seguida, as amostras foram sujeitas a uma avaliação sensorial por parte de um painel de juízes
especializados, tendo como objetivo avaliar qual o impacto do envelhecimento forçado na perceção
sensorial e correlacionar estes valores com os obtidos pelas análises químicas.
Por fim, foi efetuada uma análise à variação da cor por forma a compreender qual a tendência verificada
na cor das amostras.
vi
Abstract
Beer is one of the most complex beverages where existed, recognized, more than 100 styles. In some of
these, beer aging develops organoleptic characteristics often associated with the formation of chemical
compounds which have a positive impact in the final product, increasing its commercial value.
Conservation at low temperatures slows the development of chemical reactions responsible for beer
aging. On the other hand, exposure to high temperatures increases, significantly, the evolution of
compounds which have a negative impact on the organoleptic characteristics of beer, the so called off-
flavours.
The aim of this work was the comparative study between the same beer brand aged by different
processes of forced ageing based on the exposure to high temperatures, in order to study a range of
relevant parameters that the samples show when exposed to this ageing regime.
In this sense, beer samples were submitted to a series of ageing regimens where the monitoring of the
evolution of a list of off-flavours was done by chromatographic techniques to understand the impact of
forced ageing in the chemical composition of beer.
Samples were also subjected to a sensory evaluation by a panel of specialized judges, aiming to evaluate
the impact of forced ageing in the sensory perception and to correlate these values with those obtained
by the chemical analyses.
Finally, it was done a study on the colour variation in order to understand the trend observed in the colour
of the samples.
vii
Lista de abreviaturas e siglas
Abreviatura Significado 4-VG 4-vinilguaiacol
A Área
BJCP Beer Judge Certification Program
Conc. Concentração
c.d.o. Comprimento de onda
d Diâmetro
GC Gas chromatography
GC-MS Gas chromatography – mass spectrometry
GLC Gas-Liquid chromatography
GSC Gas-Solid chromatography
HPLC High performance liquid chromatography
HPLC-UV High performance liquid chromatography – ultra violet
i. e. LOD
Id est Limite de deteção
LLE Liquid-liquid extraction
MBT 3-metil-2-buteno-1-tiol
n.q. Não quantificável
ppb Parte por bilião
p. ex. Por exemplo
ppm Parte por milhão
ppt Parte por trilião
PTV Programmed Temperature Vaporized
RI Refraction index
RP Reverse phase
Rpm Rotações por minuto
RT Retention Time
SIM Selected Ion Monitoring
SPE Solid Phase Extraction
UV-Vis Ultra Violet – Visible
1
Capítulo 1 – Introdução
1.1. – Cerveja e a Sociedade
Benjamin Franklin, cientista, inventor, ativista cívico e um dos pais fundadores dos EUA proferira: “A
cerveja é a prova que Deus existe e que nos quer ver felizes”.
Na realidade, a cerveja é a bebida alcoólica com um dos mais antigos registos históricos e ainda a mais
consumida no mundo (1,2).
A sua origem é desconhecida, contudo, já os Sumérios e os Egípcios produziam cerveja, há mais de
5000 a. C. e cerca de 2000 anos depois já os Babilónios fabricavam mais de dezasseis tipos de cerveja.
A nível legal, o código de leis de Hamurabi na Babilónia, o mais antigo código conhecido, datado de
1800 a. C., impunha a pena de morte para quem vendesse cerveja diluída.
A nível europeu, a cerveja era comummente consumida durante a Idade Média pelos povos do norte e
este da Europa, onde o cultivo de uvas era difícil. A sua produção era de natureza fundamentalmente
doméstica sendo que, no final da Idade Média, a produção desta aumentou para escalas maiores onde
mosteiros e tavernas começaram a produzir a sua própria cerveja, tornando-a assim de mais fácil acesso
ao consumo massificado.
O consumo de cerveja per capita em Portugal ronda os 46 L, enquanto que a Republica Checa ocupa a
primeira posição onde cada checo bebe, em média, 144 L de cerveja por ano. Por outro lado, Portugal
é o país europeu com o maior consumo on-trade: por cada 100 L de cerveja produzida, 64 L são
destinados para consumo no próprio país (3).
Em 1516, foi instaurado, pelo duque da Bavaria, a Reinheitsgebot (do alemão Lei da Pureza), a qual
estabelecia que a cerveja apenas poderia contemplar 3 ingredientes na sua composição: água, cevada
e lúpulo. Só em 1857, com a descoberta de Louis Pasteur, é que a levedura fora adicionada a esta lista.
Atualmente, a cerveja é uma das bebidas alcoólicas mais complexas, sendo que existem reconhecidos
cerca de 150 estilos.
2
1.2. – Processo de fabrico de cerveja
1.2.1. – Matérias-primas utilizadas no fabrico de cerveja
Hoje em dia, derivado dos diversos estilos de cerveja existentes, vários ingredientes podem ser
adicionados durante o processo de fabrico de cerveja. Contudo, as matérias-primas usadas no fabrico
de cerveja são essencialmente, água, malte de cevada, lúpulo e levedura. São aqui descritos de forma
sucinta a importância e a principais funções destes componentes.
Água – a água é o principal ingrediente no processo de fabrico de cerveja. De facto, estima-se que,
desde o cultivo das matérias-primas necessárias passando pelo fabrico da cerveja até ao engarrafamento
desta, sejam necessários cerca de 300 L de água por cada litro de cerveja.
As características estruturais da cerveja têm um impacto enorme na qualidade do produto final. Fatores
como o pH, a dureza, o teor de certos iões presentes, entre outros parâmetros composicionais,
interferem diretamente na qualidade do produto final devido à capacidade de deslocar as reações
químicas que ocorrem na cerveja.
Malte de cevada – o malte de cevada é obtido através da interrupção do normal processo de
germinação da cevada o que permite que o grão germine parcialmente, tornando os recursos presentes
na semente disponíveis para o fabrico da cerveja.
É a matéria prima chave, sendo a principal fonte de açúcares para o mosto da cerveja.
Comparativamente com os outros cereais (nomeadamente cereais não-maltados), o malte de cevada
confere à cerveja um sabor único bem como um corpo mais denso. Por outro lado, a cor da cerveja está
também intrinsecamente relacionada com o processo de maltagem da cevada uma vez que, através de
uma torrefação mais extensa é possível obter uma cerveja mais escura.
Lúpulo (4) - o lúpulo nem sempre fez parte da constituição da cerveja, sendo que se sabe que este é
utilizados, pelo menos, desde o séc. IX, tendo substituído o gruit enquanto erva utilizada para conferir
aroma e amargor à cerveja.
O lúpulo é um ingrediente que se reveste de elevada importância, nomeadamente em estilos que
potenciam a presença de aromas intensos bem como de amargores típicos, sendo a lupulina entre
outros óleos essenciais, os principais responsáveis por estas características. Por outro lado, a utilização
3
de lúpulo tem um impacto positivo na estabilização da espuma bem como alguma atividade antissética,
característica importante na estabilidade organolética da cerveja.
Levedura – a levedura é um fungo unicelular que é adicionada à cerveja com o intuito de transformar
os açúcares provenientes do malte em etanol e dióxido de carbono. Existem centenas de espécies de
leveduras caracterizadas destas, é possível protagonizar duas leveduras comummente usadas:
Saccharomyces cerevisiae, utilizada em cervejas do tipo ale (fermentação alta) e a Saccharomyces
pastorianus, utilizadas nas cervejas lager (fermentação baixa). Destacar ainda a Brettanomyces utilizada
nas cervejas lambic. Uma correta escolha da levedura a utilizar tem um impacto direto no paladar e nas
restantes características do produto final.
1.2.2. – Etapas no processo de fabrico de cerveja (5)
Embora existam diversos estilos de cerveja onde, nos quais, possam haver ligeiras diferenças nas
diversas etapas que levam à produção da cerveja, na figura 1.1., encontra-se esquematizado o processo
de fabrico de cerveja utilizado comummente na indústria cervejeira:
- Germinação;
- Interrupção da germinação;
- Torrefação.
- Moagem;
- Adição do malte à água;
- Maceração dos maltes com aquecimento;
- Aquecimento do mosto até ebulição;
- Adição de lúpulo ao longo do tempo da fervura;
- Eliminação do lúpulo.
- Arrefecimento e arejamento;
- Inoculação com leveduras;
- Fermentação;
- Maturação;
- Pasteurização e engarrafamento.
Fermentação e maturação
Fervura
Empastagem
Maltagem
Fig. 1.1. – Etapas do processo de fabrico de cerveja.
Cerveja
4
Após a aquisição das matérias-primas necessárias, o processo de fabrico de cerveja inicia-se com a
maltagem da cevada através da interrupção da germinação assim que o grão tenha dado início ao
processo de criação de uma nova planta.
Nesta fase, o amido presente no grão já se encontrada reduzido a cadeias menores o que, para além
de aumentar a sua solubilidade em água, tornará a atividade enzimática durante a etapa da maceração
mais facilitada. Por outro lado, no interior do grão formam-se várias enzimas e percursores de
substâncias aromáticas fundamentais na contribuição da componente organolética do malte. A
interrupção da germinação da cevada é feita através da submissão controlada a temperaturas elevadas
(80 ºC a 100 ºC) onde, inicialmente ocorre a desidratação do grão e, por fim, a torrefação deste. Esta
etapa permite a formação de maltes com diferentes características, torrefações mais extensas a
temperaturas elevadas formam, por um lado, maltes mais escuros e aromáticos, contudo, este
tratamento destrói uma larga fração de enzimas pelo que maltes obtidos através deste processo são
designados por maltes de especialidade e devem ser usados em pequena quantidade uma vez que terão
um contributo muito baixo para o conteúdo de açúcares disponíveis para as leveduras utilizarem durante
a fermentação.
A etapa seguinte – empastagem – inicia-se com a moagem do malte de forma a expor uma maior
superfície do grão ao contacto com a água, de forma a aumentar a velocidade da conversão de amido
em açúcares fermentescíveis, unidades mais pequenas, passíveis de fermentação pelas leveduras. De
seguida é misturado o grão triturado com a água a uma temperatura variável entre 65 ºC e 70 ºC para
que todo o amido seja convertido em açúcar.
O término desta fase é, normalmente, reconhecido
através da execução do teste do iodo, no qual uma
amostra de líquido é colocada em contacto com iodo.
Quando esta solução se torna azul escura, indica que
ainda existem longas unidades de amido por converter
em unidades mais pequenas. Nestes casos, é formado
um complexo entre o amido e o iodo (mais
propriamente I3-), situação ilustrada na figura 1.2.
Fig. 1.2 – Complexo iodo – amido. (W. H. Freeman
and Co, “Quantitative Chemical Analysis”, 7a edição,
2007)
5
Assim que a solução mosto – iodo se mantiver num tom acastanhado, indicando que todo o amido fora
convertido em açúcares fermentáveis, procede-se à separação do líquido do grão restante.
Após a separação do mosto, este é transferido para uma caldeira de fervura onde a temperatura é
elevada até ao mosto entrar em ebulição, procedendo-se à fase de lupulagem onde são feitas várias
adições de lúpulos em função das características organoléticas que se pretendem evidenciar no produto
final. Esta etapa tem uma duração mínima de uma hora. Nesta etapa são eliminados micróbios
indesejados no mosto e altera as moléculas das resinas dos lúpulos para compostos mais solúveis.
Outro fator importante que ocorre durante a
fervura é a evaporação de off-flavours cujo
ponto de ebulição é inferior a 100 ºC. Na
tabela 1.1 estão patentes compostos
indesejados cuja volatilidade permite que
sejam eliminados durante a fervura.
Embora os compostos mais voláteis sejam
eliminados durante a fervura, muitos deles são encontrados no produto final sendo também indicadores
de envelhecimento. Tal facto induz que estes compostos são de alguma maneira formados em etapas
posteriores, nomeadamente fermentação e maturação, fruto da existência de precursores naturalmente
encontrados nas matérias-primas utilizadas que levam à formação destes compostos.
No fim da fervura o mosto é arrefecido até uma temperatura na qual as leveduras possam ser inoculadas
e, usualmente, o fermentador no qual se encontra o mosto lupulado é selado com uma válvula air locker
a qual apenas permite a saída de gás, não permitindo a entrada de ar. A fermentação pode ser dividida
em 2 fases: fermentação primária e secundária. A fermentação primária tem uma duração variável entre
3 e 7 dias com temperaturas que podem situar-se entre os 5 ºC e os 26 ºC em função do tipo de
fermentação ser baixa (lager) ou alta (ale). Finda esta etapa, é feita uma transferência para um tanque
de maturação onde a fermentação secundária irá ocorrer. Esta etapa tem uma duração muito variável
em função do estilo de cerveja, mas, tipicamente, ocorre a baixas temperaturas e o principal objetivo é
“amadurecer” a cerveja. Esta etapa reveste-se de especial relevância para a química dos off-flavours,
uma vez que muitos destes compostos são dissipados ao longo desta etapa, como o caso do diacetilo
que ao fim de 20 d vê a sua concentração reduzida em cerca de 12 vezes (6).
Composto Ponto de ebulição (ºC)
Acetaldeído 20
Sulfureto de dimetilo 38
Diacetilo 88
(E)-2-nonenal 88 - 90
Tab. 1.1. – Ponto de ebulição de alguns off-flavours voláteis a 1 atm (5).
6
No fim da maturação, o líquido obtido pode finalmente ser considerado cerveja. O tratamento final
consiste, usualmente, numa nova filtração e clarificação de modo a tornar o produto mais limpo. De
seguida procede-se ao engarrafamento e, no fim deste, pasteuriza-se o produto engarrafado. Este
processo ocorre a cerca de 60 ºC e tem como intuito aumentar o tempo de prateleira da cerveja através
da inativação dos microorganismos presentes que eventualmente possa estar a ocorrer.
1.3. – Estabilidade organolética da cerveja
Um dos principais objetivos de uma unidade de produção de cerveja é possuir padrões de qualidade
elevados e de forma constante, de modo a que a cerveja obtida possua características o mais imutáveis
possíveis ao longo do seu tempo de prateleira.
Neste sentido, o processo de envelhecimento reveste-se de especial relevância na compreensão da
estabilidade organolética da cerveja. Nos últimos anos, muita investigação tem sido feita no âmbito desta
temática uma vez que o processo de envelhecimento pode, em certos estilos de cerveja, possuir um
impacto muito positivo, aumentando assim o valor económico da cerveja.
Desta forma, é importante conhecer quais os fatores que possuem maior influência na estabilidade da
cerveja.
1.3.1. – A influência de certos fatores na estabilidade da cerveja Vários fatores podem ser abordados no que diz respeito ao impacto destes na estabilidade da cerveja.
Desses, serão destacados aqueles que exibem maior relevância no âmbito deste projeto individual.
Nível de oxigénio durante o fabrico e ao longo do envelhecimento (7,8) – embora seja
importante arejar o mosto de modo a providenciar uma quantidade suficiente de oxigénio para o
crescimento da levedura, finda esta etapa, todo o oxigénio presente terá um efeito negativo na
estabilidade da cerveja.
De facto, vários estudos apontam o oxigénio como sendo o principal responsável pela degradação das
características organoléticas da cerveja. O oxigénio está habitualmente associado à promoção de
reações radicalares responsáveis pela alteração sensorial da cerveja.
Condições de armazenamento da cerveja (9–11) – as condições de armazenamento da cerveja
constituem um fator de peso no que diz respeito à degradação das características organoléticas da
cerveja. Intuitivamente, a cerveja deve ser conservada em vasilhames opacos de modo a prevenir a
7
ocorrência de reações fotoquímicas capazes de formar off-flavours tais como o 3-metil-but-2-eno-1-tiol
(MBT) associado ao desenvolvimento de aromas/gostos desagradáveis. De facto, algumas cervejeiras
do movimento artesanal têm vindo a substituir as garrafas de vidro opaco por latas. Embora este tipo de
vasilhame crie alguma resistência à aquisição por parte do consumidor final, a verdade é que estudos
recentes demonstram que, quando expostos a provas cegas, os consumidores não conseguem distinguir
diferença alguma a nível sensorial.
Outro fator importante a nível das condições de armazenamento, no qual este trabalho se focará, é a
temperatura na qual a cerveja é conservada. A conservação da cerveja a temperaturas baixas (T < 4 ºC)
atrasa o desenvolvimento das reações químicas responsáveis pelo envelhecimento da cerveja.
1.3.2. – Caracterização organolética da cerveja (12,13)
Atendendo que a cerveja é uma bebida bastante complexa onde existem reconhecidos mais de 100
estilos de cerveja, com diversificadas características resultado das diferentes matérias-primas utilizadas
ou de pontuais diferenças nos processos de fabrico, foi necessário criar um conjunto de descrições
sensoriais que englobem todos esses estilos. O conjunto de descrições sensoriais aqui descrito foi
compilado por Morten Meilgaard nos anos 70 numa roda de aromas e sabores – figura 1.3. – hoje em
dia adotada por várias organismos regulativos do universo da cerveja.
Fig. 1.3. – The Wheel of Flavour – a roda
dos aromas e sabores, amplamente
aplicada por painéis de avaliação
sensorial enquanto ferramenta de
caracterização do conjunto de
sensações gustativas e
olfativas.
Agrupa os vários conjuntos de
sensações de forma hierárquica
na qual, à medida que se afasta
do centro da roda, a
característica torna-se mais
específica, focando diferentes
referências organoléticas, desde frutos
até compostos químicos.
(http://www.beerflavorwheel.com acedido em
junho de 2017)
Spicy
Vinous
Alcoholic
Plastics
Can-liner
Laquer-like
Solvent-like
Isoamyl acetate
Ethyl hexanoate
Ethyl acetate
Estery
Citrus
Apple
Banana
Black currant
Melony
PearRaspberry
Strawberry
Fruity
Acetaldehyde2-Phenylethanol
Geraniol
Perfumy
Floral
Kettle-hopD
ry-hopH
op oilH
oppy
Aromatic, Fragrant, F
ruity,
Floral
Piney
Woody
Resinous
Walnut
Coconut
Beany
Alm
ond
Nutty
Freshly cut grass
Straw-like
Grassy
Vegetal
Husky
Corn grits
Mealy
Grainy
Malty W
orty
Cereal
Molasses
Licorice
Caramel
Bread crustRoast barley
Smoky
Burnt
Maillard
TarryBakelite Carbolic
Chlorophenol IsodoformPhenolic
CaprylicCheesy
Isovaleric
ButyricFatty acid
Diacetyl
Rancid
Vegetable oil
Mineral oil
Oily
Fatty
Striking match
Meaty
Sulfitic
Hydrogen Sulfide
Mercaptan
Garlic
Lightstruck
Autolysed
Burnt rubber
Shrimp-l
ike
Sulfidic
Parsn
ip/Cele
ry
Dimet
hyl s
ulfide
Cook
ed ca
bbag
e
Cook
ed s
weet
cor
n
Cook
ed to
mat
oC
ooke
d on
ion
Cook
ed v
eget
able
Yeas
ty
Sulfury
Cat
tyP
aper
yLe
athe
ryE
arth
y
Mus
tyM
oldy
Stale
Ace
tic
Sou
r
Acidic
Hon
ey
Jam
-like
Vani
lla
Prim
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Syru
py
Ove
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et
Swee
t
SaltyBitte
rAlka
line
Mouthc
oatin
g
MetallicDryi
ngTartPucke
ring
Astringent
PowderyFlatGassy
Carbonation
AlcoholicPiquant
Warming
MouthfeelWatery
CharacterlessSatiating
ThickBody
Fulln
ess
8
Por outro lado, as características organoléticas da cerveja vão-se alterando ao longo do seu
envelhecimento. Neste campo, Dalgliesh procurou representar esquematicamente – figura 1.4. – as
variações típicas a nível organolético que se vão perpetuando ao longo do normal envelhecimento de
uma cerveja.
Através da análise da representação
esquemática, rapidamente se
depreende que a cerveja sofre
diversas variações do seu perfil
aromático ao longo do seu tempo de
envelhecimento.
Estas variações incluem, desde uma
fase inicial, uma diminuição
constante do amargor e, pelo
contrário, um aumento quase
constante de notas a velho/caramelo
torrado e a doce.
O desaparecimento de notas de amargor é suportado pela degradação dos compostos presentes nos
lúpulos responsáveis por esta característica, muito apreciada em alguns estilos de cerveja (14).
Por outro lado, o aparecimento de notas adocicadas em cervejas mais envelhecidas é evidenciado pelos
produtos da reação de Maillard que traduzem características adocicadas no produto final.
Paralelamente, exibe um aparecimento muito rápido de notas a groselha com uma posterior dissipação
deste carácter. Indubitavelmente, a cerveja começa a exibir características envelhecidas com o
surgimento de notas de papel/ cartão tipicamente associadas ao (E)-2-nonenal.
Para que características sejam detetáveis é necessário que a concentração dos compostos químicos
responsáveis pela componente sensorial se encontre acima do limiar de perceção.
Inte
nsid
ade
Fig. 1.4 – Representação esquemática do diagrama de Dalgiesh (12).
9
1.4. – Compostos químicos indesejados estudados – off-flavours
1.4.1. – (E)-2-nonenal
O trans-2-nonenal é um dos compostos químicos considerados responsáveis por um off-flavour, que tem
merecido mais atenção por parte da indústria cervejeira devido à reconhecida influência sobre as
características organoléticas da cerveja. Sob o ponto de vista químico é um aldeído de cadeia longa,
com características predominantemente apolares fruto da sua cauda hidrofóbica. Na tabela 1.5.
encontra-se compilada informação sobre o (E)-2-nonenal.
Possui um ponto de ebulição situado entre 88 ºC e 90 ºC, o que leva a crer, que o (E)-2-nonenal formado
em etapas prévias à fervura dissipar-se-á nesta etapa, fazendo com que o composto encontrado ao longo
do tempo de prateleira esteja correlacionado com a existência da sua formação a partir de percursores.
Em 1990, Wang e Siebert demonstraram que não é necessária a participação sinérgica de outros
compostos para se sentir o aroma/sabor a papel/cartão. Os mesmos autores estabeleceram que, o seu
limiar de perceção está compreendido entre 0,05 µg e 0,1 µg de composto por litro de cerveja (15).
Os mecanismos responsáveis pela formação do (E)-2-nonenal não são ainda totalmente reconhecidos.
Investigação tem sido feita neste sentido uma vez que é de especial interesse para a indústria cervejeira
estabelecer estratégias de minimização do aparecimento deste off-flavour de forma a prolongar o tempo
de prateleira da cerveja, aumentando assim o valor comercial deste produto. Contudo, as vias de
formação de aldeídos mais prováveis englobam oxidação de álcoois superiores, oxidação de iso-α-ácidos,
degradação de Strecker e condensação aldólica (8).
Nome IUPAC Trans-2-nonenal
Fórmula química C9H16O
Ponto de ebulição (°C) 88-90
Limiar de perceção (ppb) 0,05 – 0,1
Aroma/sabor Papel/cartão
Processo de formação Degradação de Strecker, Condensação
aldólica, processos oxidativos
Tab. 1.5. – Características relevantes do (E)-2-nonena (8)l.
10
1.4.2. – Ácido acético
O ácido acético é um composto químico que na maioria dos estilos de cerveja é considerado off-flavour
quando a sua concentração é superior ao limite de perceção, contudo, em alguns estilos, a sua presença
pode não ser considerada uma característica negativa. Sob o ponto de vista químico é um ácido
carboxílico, com polaridade relativamente elevada. Na tabela 1.6. encontram-se sintetizadas as
características relativas ao ácido acético.
O seu ponto de ebulição situa-se entre 118 ºC e 119 ºC, pelo que o normal processo de produção da
cerveja não dissipa algum ácido acético que possa eventualmente estar presente na matriz.
Em 1970, Harrison estabeleceu o limite de perceção na cerveja, associado ao ácido acético na ordem
dos 200 mg de composto por litro de cerveja, contudo, este valor varia com o pH da cerveja (16). A
presença de ácido acético em concentrações superiores ao seu limiar de perceção é demarcada pela
presença de notas avinagradas/acídicas, sendo por vezes confundido com a presença de outros
compostos, como o cítrico, ácido lático ou até acetaldeído.
Em alguns estilos, como quando a levedura utilizada é Brettanomyces, a presença de ácido acético é
uma característica procurada e com impacto positivo, uma vez que esta espécie de leveduras produz o
composto em maior quantidade no decorrer do processo de fermentação.
Um dos processos que leva à formação do ácido acético consiste na oxidação do etanol o qual, na
presença de oxigénio atmosférico em condições favoráveis, forma ácido acético e água como produtos
da reação. Por outro lado, conforme abordado, o ácido acético é também produzido pela levedura
durante a fermentação. Um elevado crescimento de levedura, eventuais contaminações ou a utilização
de estirpes de leveduras selvagem podem resultar na produção de níveis elevados de ácido acético (17).
Nome IUPAC Ácido etanoico
Fórmula química C2H4O2
Ponto de ebulição (°C) 118-119
Limiar de perceção (ppm) 200
Aroma/sabor Vinagre
Processo de formação Fermentação excessiva, oxidação do
etanol
Tab. 1.6. – Características relevantes do ácido acético (8).
O
OH
11
1.4.3. – Furfural
O furfural é um composto heterocíclico considerado como um indicador de idade em todos os estilos de
cerveja sendo, sob o ponto de vista químico, considerado um aldeído. Na tabela 1.7. está sintetizada
informação sobre o furfural.
Possuí um ponto de ebulição na ordem dos 162 ºC o que indica que o composto não se dissipa durante
o normal processo de produção de cerveja, dado o seu ponto de ebulição ser superior às temperaturas
atingidas durante o fabrico da cerveja.
Em 2009, Saison et al. desenvolveram um trabalho no sentido de estabelecer qual o limiar de perceção
do furfural em cervejas lager, tendo estabelecido este limiar na ordem dos 15 mg de composto por litro
de cerveja (18). Quando a concentração de furfural presente numa cerveja é maior que o limite de
perceção, a sua presença é assinalada pelo desenvolvimento de notas a caramelo e a velho (8).
Muitos dos compostos heterocíclicos encontrados em cervejas envelhecidas são produtos da reação de
Maillard. As complexas reações entre açúcares redutores e proteínas, péptidos ou aminoácidos
presentes, bem como todas as reações consecutivas são denominadas como reações de Maillard. A
presença de furfural em cervejas envelhecidas foi explicada por Vanderhaegen et al. pela ocorrência
desta reação (8). Os autores acrescentam ainda que o furfural é um composto intermediário cujas
concentrações mais elevadas foram encontradas em cervejas envelhecidas com maior teor alcoólico e
em cervejas mais escuras, nas quais o teor de maltes torrados é mais elevado.
Nome IUPAC Furano-2-carbaldeído
Fórmula química C5H4O2
Ponto de ebulição (°C) 162
Limiar de perceção (ppm) 15
Aroma/sabor Velho, caramelo
Processo de formação Reação de Maillard
Tab. 1.7. – Características relevantes do furfural (8).
O
O
12
1.4.4. – 4-vinilguaiacol
O 4-vinilguaiacol (4-VG) é um fenol monomérico utilizado como agente aromatizante na indústria
alimentar e presente em muitos estilos de cerveja sendo que, em alguns deles, as características
organoléticas que denota na cerveja são consideradas benéficas. Contudo, na maioria dos estilos, a sua
presença imprime notas desagradáveis. Na tabela 1.8. encontra-se compilada informação relativa ao
4-vinil-guaiacol.
Com um ponto de ebulição superior a 200 ºC, todo o 4-VG que possa ser produzido em etapas
antecedentes à ebulição não vai ser dissipado nesta etapa.
Também em 2009, Saison et al. reportaram limiares de perceção para este composto em cervejas
lager na ordem dos 0,3 mg de composto por litro de cerveja. Quando presente na cerveja nesta gama
de concentrações o 4-VG evidencia desagradáveis notas a especiarias – cravinho da Índia – notas
fenólicas e picantes. Em concentrações ainda mais elevadas e em certas condições, pode apresentar
desagradáveis características de elixir (18).
O 4-VG é produzido através da decomposição térmica do ácido ferúlico, composto presente na cerveja
que tem origem no malte da cevada. Através da ação térmica, o ácido ferúlico sofre descarboxilação
levando à formação do 4-VG, reação esta que continua a ocorrer ao longo do envelhecimento do
produto (19). Tem sido feita investigação no sentido de diminuir a formação deste composto, sendo que
os mesmos autores concluíram que ao apostar numa temperatura mais elevada durante a maceração
dos maltes é possível reduzir a libertação deste seu precursor controlando assim o potencial de formação
do 4-VG. Por outro lado, de forma a diminuir ainda mais a produção deste composto, é importante que
as temperaturas de fermentação e armazenamento se mantenham abaixo da casa dos 20 ºC reduzindo
assim a decomposição térmica do ácido ferúlico em 4-VG.
Nome IUPAC 4-etinil-2-metoxifenol
Fórmula química C5H4O2
Ponto de ebulição (°C) 224
Limiar de perceção (ppm) 0,3
Aroma/sabor Fenólico, cravinho da Índia
Processo de formação Descarboxilação do ácido ferúlico
Tab. 1.8. – Características relevantes do 4-vinilguaiacol (8).
13
1.5. – Envelhecimento forçado de cerveja
Sendo a cerveja uma bebida alcoólica que possui diferentes estilos, cada um com uma matriz muito
diferente de outra, nas quais figuram imensos compostos químicos oriundos de diversas fontes, os
mecanismos que regulam o envelhecimento não são ainda totalmente conhecidos.
O envelhecimento de cerveja é um processo complexo que, tendo já sido feita investigação nesta área
desde os anos 60, apenas nos últimos anos tem sido alvo de intensa investigação uma vez que constitui
um fator importante para a indústria cervejeira já que, para satisfazerem as exigências dos
consumidores, as características de uma cerveja devem ser constantes ou, alternativamente, devem
alterar de forma a ir de encontro às preferências do consumidor.
Neste sentido, obter um produto envelhecido num tempo inferior àquele que seria necessário constitui
uma grande vantagem económica para a indústria cervejeira já que o tempo de produção é diminuído,
maximizando os lucros.
O envelhecimento forçado consiste, fundamentalmente, na exposição do produto final a temperaturas
elevadas, de forma a aumentar a velocidade das reações de envelhecimento obtendo assim um produto
com características envelhecidas mais rapidamente.
Em 2015, Li et al., procuraram estabelecer fatores de aceleração das reações de formação de
compostos químicos que, normalmente são encontrados em cervejas lager envelhecidas
naturalmente (11).
Desta forma, Li et al. fizeram avanços no sentido de perceber qual o impacto do aumento da temperatura
na velocidade das reações químicas responsáveis pelo desenvolvimento de compostos químicos
associados às características organoléticas de uma cerveja envelhecida. As conclusões retiradas pelos
autores encontram-se sistematizadas na tabela 1.9.
Assim, segundo os autores, uma cerveja
submetida a um regime de envelhecimento
à temperatura de 50 ºC durante um dia,
desenvolve uma matriz química
semelhante a uma cerveja envelhecida à
temperatura ambiente, durante cerca de
30 dias.
Temperatura de
envelhecimento (°C) Fator de aceleração
15 – 25 1
40 8,2
50 29,9
60 55,9
Tab. 1.9. – Síntese das conclusões do trabalho de Li et al. (2015).
14
1.6. – Técnicas de preparação de amostra
Em quase todos os processos analíticos, antes de se proceder à análise de uma determinada substância
é necessário realizar procedimentos preparativos da amostra de forma a que esta esteja em condições
ótimas para ser introduzida no equipamento analítico.
Nesta secção será feita uma breve abordagem das técnicas preparativas utilizadas no decorrer do
trabalho descrito.
1.6.1. – Destilação por arraste de vapor
A destilação por arraste de vapor
é um tipo de destilação especial
utilizado para substâncias
termicamente sensíveis ou em
casos onde o aquecimento direto
do líquido possa levar à formação
de compostos químicos que,
quando analisados, conduzirão a
resultados incorretos.
Nesta técnica, a amostra é
introduzida num balão no qual é feito incidir vapor de água gerado a partir de uma fonte externa. O vapor
incidente arrasta os compostos mais voláteis sem que a amostra sofra degradação apreciável. De
seguida o vapor atravessa um condensador, com posterior recolha do volume de destilado desejado
num recipiente adequado.
1.6.2. – Extração líquido-líquido
A extração líquido-líquido é um método utilizado para separar compostos baseado nas suas solubilidades
relativas em 2 líquidos imiscíveis diferentes, envolve duas fases: uma fase aquosa e uma fase orgânica.
Consiste na transferência de uma ou mais substâncias de uma fase para outra em função da solubilidade
do(s) composto(s) para com as fases. Enquanto técnica preparativa, quando utlizada em cromatografia,
este processo oferece várias vantagens uma vez que é utilizado para concentrar compostos numa fase
(geralmente orgânica) que, em muitos métodos, permite a injeção direta no cromatógrafo gasoso.
Fig. 1.5 – Representação esquemática da montagem experimental de uma destilação por arraste de vapor.
15
1.6.3. – Extração em fase sólida (SPE)
A extração em fase sólida, SPE, (do inglês Solid Phase Extraction) é
uma técnica habitualmente utilizada com fins preparativos, sendo
uma valiosa ferramenta na análise de matrizes complexas.
Neste trabalho, o objetivo da sua utilização é a extração de espécies
interferentes através da retenção destas na fase estacionária do
cartucho, ou alternativamente, extrair um determinado composto
através da retenção do mesmo na coluna com posterior eluição
através do uso de uma fase móvel adequada.
1.7. – Técnicas analíticas – cromatografia
Após uma correta preparação da amostra, o passo seguinte foca-se na análise dos compostos de
interesse. Para isso, devem ser selecionadas as técnicas analíticas mais adequadas capazes de separar
os compostos de interesse e que possibilitem uma posterior análise quantitativa dos mesmos.
Neste sentido, a cromatografia exibe-se como a técnica mais adequada para a separação dos
compostos, pois viabiliza a separação destes e, adicionalmente, permite a posterior quantificação dos
mesmos. Esta técnica adquire ainda mais versatilidade se for acoplada a espetroscopia de massa, onde
a quantificação das substâncias de interesse é mais vantajosa.
Nesta secção serão abordadas brevemente as técnicas cromatográficas utilizadas no decorrer do
trabalho descrito.
1.7.1. – Cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC)
A cromatografia líquida de alta eficiência envolve duas fases: uma fase estacionária constituída por um
filme fino adsorvido num suporte e uma fase móvel líquida. As partículas que constituem a fase
estacionária possuem um diâmetro interno habitualmente comportado entre 5 µm e 10 µm.
Enquanto que, para uma mesma coluna, a fase estacionária se mantém a mesma, no que diz respeito
à fase móvel – e devido à estabilidade dos materiais que compõe a fase estacionária, o leque de
solventes passíveis de utilização é muito maior. Assim, esta escolha deve ser feita em função das
características da superfície da fase estacionária e da natureza da amostra. Adicionalmente, a eluição
pode ser isocrática – onde o solvente utilizado se mantém o mesmo ao longo de toda a análise – ou,
Fig. 1.6 – Representação esquemática de um cartucho utilizado em SPE.
16
alternativamente, eluição por gradiente – onde a composição da fase móvel varia ao longo do tempo
segunda uma forma pré-programada. Esta forma de operação permite alterar a polaridade do solvente,
sendo de grande vantagem em certas análises uma vez que possibilita a separação de constituintes com
polaridades distintas.
Na figura 1.7. encontra-se ilustrada uma representação esquemática de uma sistema HPLC. De seguida
são descritos os componentes básicos deste sistema:
Bomba de fluxo – a bomba de fluxo deve ser capaz de impulsionar a fase móvel ao longo da coluna
a uma velocidade constante sob elevada pressão (até cerca de 400 MPa);
Injetor – O sistema de injeção é composto por um sistema de válvulas (loop) que assegura um controlo
preciso da reprodutibilidade do volume de amostra que é injetada;
Coluna – A coluna cromatográfica é o local crítico de todo o sistema cromatográfico onde ocorre a
separação dos componentes da amostra em função das diferentes afinidades que os compostos têm
entre as duas fases. Quanto maior as interações entre um determinado composto e a fase estacionária,
maior será a retenção deste. Alguns sistemas podem comportar uma pré-coluna com características
semelhantes às da coluna, cuja função é a de reter impurezas provenientes da amostra que danificariam
a coluna, comprometendo os resultados obtidos;
Detetor – Existem dois tipos básicos: os detetores que
respondem a propriedades da fase móvel e que são
alterados pela presença de solutos (p. ex., índice de
refração) e os detetores que respondem a propriedades do
soluto que a fase móvel não apresenta (p. ex., absorvância).
Idealmente, o detetor deve possuir elevada sensibilidade e
seletividade, deve ter um tempo de resposta curto, uma
linha de base estável e deve fornecer uma resposta linear;
Computador – Este módulo regista a resposta do detetor e, através de software adequado, transforma
essa resposta num sinal mensurável.
Tipo de Detetor LOD (ng)
UV-Vis 0,1 a 1
RI 100 a 1000
Eletroquímico 0,01 a 1
Fluorescência 0,001 a 0,01
Tab. 1.10. – Tipos de detetores utilizados em HPLC
17
1.7.2. – Cromatografia gasosa (GC)
A cromatografia gasosa é uma técnica recorrentemente utilizada em Química Analítica, devido à
versatilidade que oferece. Existem dois tipos de cromatografia gasosa em função das interfaces
existentes: cromatografia gás-líquido (GLC, cromatografia de partição) e cromatografia de gás-sólido
(GSC, cromatografia de adsorção), esta última menos utilizada comparativamente à primeira.
Em GC, a fase móvel é um gás (designado por gás de arraste), ao passo que a fase estacionária consiste
num líquido não-volátil estabelecido num suporte inerte.
Na figura 1.9. encontra-se ilustrada uma representação esquemática de um sistema GC. De seguida são
descritos os componentes básicos deste sistema:
Cilindro do gás de arraste – Comporta a fase móvel – gás de arraste – pressurizada, a qual deve
ser isenta de água e oxigénio, inerte nas condições de análise utilizadas, e deve exibir elevada pureza;
Manorredutor – Tem como função regular o fluxo do gás de arraste uma vez que este deve ser
mantido controlado e o seu valor conhecido de modo a viabilizar a reprodutibilidade da análise;
Flow-splitter – Este componente tem como objetivo reduzir as interferências associadas ao gás de
arraste que poderiam comprometer os resultados obtidos. Para isso, é feita uma divisão do gás de
Fig. 1.7. – Representação esquemática de um sistema HPLC (D. C. Harris, “Quantitative Chemical Analysis”, 4a edição).
18
arraste, sendo que parte será utilizada como fase móvel e, a restante parte, percorrerá um caminho de
referência até atingir o detetor onde este anulará eventuais contribuições associadas à fase móvel;
Injetor – A amostra é geralmente introduzida com uma seringa, através de um septo. Existem 3 tipos
de injetor: injetor split, no qual apenas uma fração da amostra é injetada; injetor spitless, capaz de
assegurar uma pré-concentração das amostras o que viabiliza a análise de amostras muito diluídas;
injetor PTV (Programmed Temperature Vaporization), onde o injetor se encontra rodeado por um sistema
de aquecimento/arrefecimento rápido.
O volume de injeção varia com o tipo de coluna em questão e, ao contrário do sistema utilizado em
HPLC, o volume é regulado pela capacidade de uma seringa de injeção;
Coluna – Existem dois tipos de colunas
passíveis de utilização em função da análise
pretendida:
As colunas empacotadas apresentam um
diâmetro interno maior comparativamente com
as capilares. Por outro lado, os volumes de
amostra injetados em colunas empacotadas são
substancialmente maiores que em colunas
capilares. Em termos de conceção, as colunas empacotadas contêm um suporte sólido finamente
dividido cuja área superficial é elevada, constituindo a fase estacionária utilizada em GSC. Em GLC, a
fase estacionária é constituída por um filme de líquido muito fino. Por outro lado, nas colunas capilares,
a fase estacionária é constituída por um filme muito fino aderente às paredes da coluna. Dentro destas,
existem ainda outras opções baseadas no tipo de revestimento interno;
Forno – Desempenha a função de regular a temperatura à qual a coluna se encontra. O controlo da
temperatura da coluna é um dos parâmetros mais importantes neste tipo de análise uma vez que os
tempos de retenção estão diretamente dependentes da temperatura da coluna. É possível melhorar a
resolução e diminuir tempos de retenção através dum uso adequado da temperatura do forno, situação
ilustrada na figura 1.8.
Tipo de
Coluna
Amostras
líquidas (µL)
Amostras
gasosas (mL)
Empacotada
(di=3,2 mm) 0,20 – 20 0,1 - 50
Capilar
(di=0,25 mm) 0,001 – 3 0,001 – 0,1
Tab. 1.11. – Comparação entre colunas utilizadas em GC.
19
Detetor – À semelhança do que acontece em HPLC, existem também diversos tipos de detetores,
contudo, o funcionamento é substancialmente semelhante uma vez que todos eles medem uma dada
propriedade física ou química associada à composição e concentração dos constituintes presentes no
gás de arraste, gerando uma resposta proporcional à massa das espécies detetadas.
Um detetor ideal deve apresentar elevada sensibilidade e seletividade, deve possuir um baixo nível de
drift e de ruído, apresentar uma resposta linear num intervalo de concentrações de interesse, ter um
tempo de resposta curto e deve assegurar a reprodutibilidade dos resultados;
Fig. 1.8. – Cromatogramas obtidos através de uma análise isotérmica e de uma análise com rampa de temperatura (D. C. Harris, “Quantitative Chemical Analysis”, 4a edição).
Fig. 1.9. – Representação esquemática dos módulos que compõem o sistema de GC (D. C. Harris,
“Quantitative Chemical Analysis”, 4a edição).
20
1.7.3. – Técnicas cromatográficas acopladas a espetroscopia de massa
As técnicas cromatográficas combinadas com métodos espetroscópicos constituem os métodos
hifenados, sendo uma poderosa ferramenta na área da Química Analítica.
Estas técnicas permitem análises qualitativas e, adicionalmente, análises quantitativas com elevada
resolução: a componente cromatográfica efetua a separação dos componentes de uma amostra e o
espetrómetro de massa realiza a análise quantitativa dos diversos componentes da amostra com uma
elevada resolução (ppt). Existem diversos métodos de ionização cuja aplicação varia com o equipamento
utilizado e as especificações deste.
O fator crítico desta técnica está associado à interface entre o cromatógrafo e o detetor de massa uma
vez que os fluxos utilizados no primeiro são substancialmente elevados e, por outro lado, porque o
espetrómetro de massa requer que a amostra esteja na fase gasosa e o sistema se encontre sobre vácuo
(10-5 torr a 10-6 torr). Desta forma, é importante que a interface cromatógrafo-detetor assegure uma
transferência quantitativa do analito.
O funcionamento do espetrómetro de massa contempla dois modos de operação:
Full scan – No qual são registados sequencialmente as medições de um dado intervalo de
valores de massa. A sensibilidade não é a mais elevada.
Selected Ion Monitoring (SIM) – São registados apenas os dados relativos a valores de m/z
previamente selecionados. Este modo de operação é amplamente empregue em análises quantitativas,
uma vez que a sensibilidade é melhorada.
A identificação do composto através da análise dos fragmentos gerados, em GC-MS, é relativamente
simples uma vez que os sistemas de aquisição e tratamento de dados possuem bibliotecas de espetros
que automaticamente efetua a comparação dos espetros dos fragmentos indicando qual o composto
mais provável.
21
Capítulo 2 – Parte experimental 2.1. – Reagentes
Os diversos reagentes utilizados nas diversas etapas do desenvolvimento deste trabalho encontram-se
indicados na tabela 2.1.
Toda a água utilizada na preparação de soluções bem como na realização das destilações por arraste
de vapor, foi purificada com recurso a um sistema de purificação Millipore Milli-Q Gradient A10.
As amostras de cerveja utilizadas no decorrer da realização deste trabalho foram cedidas pela Unicer
Bebidas, S.A., sendo que todas as amostras pertenciam ao mesmo lote de produção, tendo sido
engarrafadas nas mesmas condições e no mesmo vasilhame e posteriormente sujeitas às mesmas
condições de armazenamento.
2.2. – Instrumentação
Durante a realização do trabalho utilizou-se a seguinte instrumentação na preparação de soluções:
balança analítica Precisa, modelo 40 SM-200A para pesagens rigorosas, banho de ultrassons Struers,
modelo Metason 60, para desgaseificação das soluções.
A medição de volumes inferiores a 1000 µL foi efetuada com micropipeta Thermo, modelo Finnpipette
(capacidade – 0,5 a 20 µL) e micropipetas Bioh, modelo Proline (capacidade – 100 µL a 1000 µL). A
medição de volumes superiores a 1000 µL foi efetuada com material de vidro aferido.
Reagente N.º CAS Marca Especificação /
pureza
4-nonanol 5932-79-6 Merck ³97
Acetonitrilo 200-835-2 Fischer HPLC grade
Ácido acético 64-19-7 Sigma 99,8%
Diclorometano 75-09-2 Merck SupraSolv
Etanol 64-17-5 Chem-Lab p.a.
Trans-2-nonenal 18829-56-6 Sigma 97%
Tab. 2.1. – Reagentes gerais utilizados no desenvolvimento do trabalho experimental.
22
A análise do (E)-2-nonenal foi efetuada num HPLC constituído pelo seguinte conjunto:
Bomba de fluxo – Jasco modelo PU-2080 Plus (sistema isocrático);
Sistema de injeção manual – Injetor Rheodyne, modelo 7725i (volume do loop, 20 µL);
seringa de injeção Hamilton, modelo 705 NR (volume de injeção - 50 µL);
Detetor – Espetrofotométrico de comprimento de onda variável, Shimadzu, modelo SPD-6A;
Software de aquisição de dados – Clarity;, Origin.
Coluna – Coluna Gracesmart RP 18, (250 mm x 4,6 mm).
O condicionamento das amostras em regime de envelhecimento foi realizado num estufa Memmert,
modelo 100-800.
A extração em fase sólida foi efetuada com recurso a colunas de extração em fase sólida do tipo C18,
Phenomenex, modelo Strata SDB-L, cedidas pelo Centro de Engenharia Biológica.
A análise do ácido acético foi efetuada nas mesmas condições, excetuando a coluna e a bomba, sendo
que nesta análise foram utilizadas uma coluna Phenomenex, modelo Rezex ROA – Organic Acids
(300 mm x 7,80 mm), uma bomba Jasco, modelo UV-975 (sistema isocrático) e como fase móvel H2SO4
(0,005 N).
A análise de variação da cor foi realizada num espetrofotómetro de 2 feixes Jasco modelo UV/Vis V-560.
A análise dos restantes compostos de interesse voláteis foi efetuada com recurso a um GC Varian Saturn
2000 com as seguintes características:
Injetor – Injetor 1079, capacidade da seringe de injeção de 1 µL
Coluna – Coluna capilar, Teknokroma Sapiens-Wax MS (30 m x 0,15 mm, espessura do filme
de 0,15 µm).
Gás carrier – O gás de arraste utilizado foi o hélio.
Detetor – Foi utilizado um espetrófotometro de massa (ion-trap) Varian Saturn II.
2.3. – Regimes de envelhecimento das amostras
O envelhecimento forçado de cerveja foi efetuado em regime de temperatura controlada e na ausência
de luz, sendo que foram efetuados ensaios às temperaturas constantes de 40 ºC, 50 ºC e 60 ºC. As
amostras foram envelhecidas em duplicado, deste modo, uma das amostras foi utilizada para efetuar
as diversas análises químicas, enquanto que a amostra duplicada foi sujeita a uma avaliação sensorial
por parte de um painel de juízes especializados. Ao longo do trabalho, as referências às amostras são
23
feitas relativamente ao tempo de envelhecimento forçado atendendo aos fatores de aceleração expressos
na tabela 1.9..
Assim, nas tabelas 2.2 e 2.3. encontra-se sintetizada a correspondência entre o tempo de
envelhecimento forçado e o tempo que as amostras estiveram submetidas ao regime de aquecimento.
2.4. – Análise da variação de cor
A análise da variação de cor foi efetuada a partir das coordenadas CIELab. Para a sua determinação,
procedeu-se à medição da absorvância das amostras num espetrofotómetro de duplo feixe. A análise foi
feita de acordo com as condições descritas na tabela 2.4.:
Como referência foi utilizada uma cuvete de quartzo com 1 cm de percurso ótico, com água destilada.
De seguida, foi colocada uma cuvete com água destilada na célula de referência, permanecendo sempre
nesta célula durante toda a análise. Foi feito o auto-zero entre cada medição procedendo-se à medição
das amostras de cerveja. Após a aquisição dos dados de absorvância, procedeu-se à aplicação de um
algoritmo elaborado para o software Matlab, de forma a obter as coordenadas L*, a* e b*. Através da
equação 1 foi calculada a diferença total de cor (∆E*) entre as amostras envelhecidas e a amostra-
padrão, i.e., a amostra não sujeita a envelhecimento.
∆E = √((∆L*)2 + (∆a*)2 + (∆b*)2) (Equação 1)
Tempo em regime de envelhecimento (dias) 4 10 14 21 32 39
Fator de aceleração (11) 8,2
Tempo de envelhecimento equivalente (meses) 1 3 4 6 9 11
Tempo em regime de envelhecimento (dias) 1 5 7 12
Fator de aceleração (11) 29,9
Tempo de envelhecimento equivalente (meses) 1 5 7 12
Gama c.d.o. (780 – 380 ) nm Largura de banda 5 nm
Frequência de leitura 2 nm Velocidade de scan 1000 nm/min
Resposta média Campo de dados 2 nm
Tab. 2.2. – Correspondência entre o regime de envelhecimento a 40 ºC e o tempo de envelhecimento forçado.
Tab. 2.3. – Correspondência entre o tempo em regime de temperatura a 50 ºC e o tempo de envelhecimento forçado
Tab. 2.3. – Condições usadas na análise espetrofotométrica de determinação de cor.
24
2.5. – Análise dos compostos de interesse
Foram utilizadas duas metodologias diferentes em função dos compostos a analisar, sendo que a
metodologia desenvolvida com vista à análise do (E)-2-nonenal compreendeu as seguintes etapas:
Destilação por arraste de vapor – A montagem para
se proceder à destilação por arraste de vapor foi efetuada
com recurso a material de vidro adequado ao propósito,
conforme ilustrado na figura 2.1..
No balão responsável por gerar vapor foram adicionados
250 mL de água ultra-pura. Relativamente à amostra,
foram pipetados 100 mL de cerveja previamente
desgaseificada. A destilação foi interrompida assim que
fossem recolhidos os primeiros 15 mL de destilado.
Extração em fase sólida (SPE) – A extração em fase
sólida foi efetuada com recurso a colunas de extração em
fase sólida do tipo C18, Phenomenex, modelo Strata SDB-
L e um equipamento responsável pela realização de
vácuo, conforme ilustrado na figura 2.2..
O procedimento de SPE consiste no condicionamento da
coluna ao fazer passar 1 mL de acetonitrilo e de seguida
1 mL de água ultra--pura. Após eluir a amostra, foi feita
uma lavagem da coluna com uma solução 5 % acetonitrilo
e, noutro recipiente, passou-se 1 mL de acetonitrilo de forma a recolher o composto de interesse.
Análise por HPLC – Após a amostra ter sido diluída para metade, foi injetada com recurso a uma
seringa de injeção. As condições utilizadas durante o processo de análise encontram-se patentes no
esquema da tabela 2.5.
Fase estacionária Coluna RP C18
Fase móvel Composição do eluente: Água/Acetonitrilo 45:55 (v/v); Fluxo: 0,60 mL/min
C.d.o. de deteção 226 nm
Tab. 2.5. – Condições cromatográficas utilizadas na análise do (E)-2-nonenal em cerveja.
Fig. 2.1. – Montagem da destilação por arraste de vapor
Fig. 2.2. – Montagem do aparato utilizado em SPE.
25
Por outro lado, a metodologia utilizada na análise dos restantes compostos de interesse voláteis teve
como base as seguintes etapas:
Extração líquido-líquido (LLE) – A extração líquido-líquido dos compostos voláteis de interesse foi
efetuada num tubo de pyrex de 10 mL, onde foram adicionados 8 mL de cerveja a 100 µL de padrão
interno (4-nonanol, 300 µg/L) e um magnete. A extração destes compostos foi realizada através da
agitação magnética da amostra com 400 µL de diclorometano durante cerca de 15 min. Após submissão
a temperaturas baixas durante 15 min, o magnete foi removido e a fase orgânica foi isolada através de
centrifugação (7 min, velocidade de de rotação de 2000 min-1) extraindo de seguida a fase orgânica para
um frasco com sulfato de sódio anidro com posterior recolha do extrato para um vial, tornando a amostra
pronta para análise.
Análise por GC – Após a LLE, as amostras foram analisadas, conforme descrito na tabela 2.
2.5. – Análise sensorial
As amostras foram ainda sujeitas a um painel de avaliação sensorial composto pela equipa da Fizzlab,
2 juízes reconhecidos pelo programa BJCP (do inglês, Beer Judge Certification Program).
O painel avaliou sensorialmente 9 parâmetros: papel/cartão, banana/pêra, fenólico, ranço, vinagre,
velho, cortiça, amargor e doce. Os 7 primeiros parâmetros possuem uma correlação direta com a
presença de compostos off-flavour, os últimos 2 parâmetros tiveram como intuito avaliar a extensão do
envelhecimento.
Injetor Temperatura de 250 ºC, injeção de 1 µL em modo splitless (durante 30 s).
Forno
A temperatura foi mantida a 60 ºC durante 2 min, sendo de seguida
aumentada de 60 ºC a 234 ºC, a 3 ºC/min. De seguida, a temperatura foi
aumentada até 260 ºC, a 5 ºC/min, ficando até ao fim da análise (5 min)
Gás carrier Hélio (Praxair) a um caudal constante de 1,3 mL/min
Detetor Modo de impacto eletrónico: 70 eV. Modo de deteção full scan com intervalo
de aquisição de 35 m/z a 300 m/z
Tab. 2.6. – Condições cromatográficas utilizadas na análise dos compostos voláteis.
26
Capítulo 3 – Apresentação e discussão dos resultados experimentais
3.1. Discussão dos resultados obtidos relativos à evolução da concentração de (E)-2-nonenal De seguida, é apresentada uma figura – figura 3.1. – onde é possível visualizar um cromatograma típico
para uma amostra de cerveja sujeita a um regime de envelhecimento de 50 ºC. A tabela 3.1. mostra a
informação relativa ao traçado da curva de calibração, gráfico visível na figura 3.2.
A/(mV.s) = 1,31E+07 [E-2-N]/M + 1,21R² = 0,994
0.0
0.5
1.0
1.5
2.0
2.5
3.0
0.0E+00 2.0E-08 4.0E-08 6.0E-08 8.0E-08 1.0E-07 1.2E-07
Área
(mV.
s)
[E-2-nonenal] (M)
Conc.
(g/L)
RT
(min)
Área
(mV.s)
4,98E-9 7,12 1,24
9,97E-9 7,12 1,35
4,50E-8 7,13 1,86
1,01E-7 7,15 2,50
Tab. 3.1. – Informação relevante relativa à elaboração da curva de calibração do (E)-2-nonenal.
Fig. 3.2. – Gráfico obtido para a curva de calibração do (E)-2-nonenal.
Fig. 3.1. – Cromatograma típico para uma amostra de cerveja, obtido por HPLC, com identificação do pico relativo ao (E)-2-nonenal.
27
Tempo
(40 °C, meses)
RT
(min)
Área
(mV.s)
Conc.
(g/L)
Tempo
(50 °C, meses)
RT
(min)
Área
(mV.s)
Conc.
(g/L)
0 X n.q. X 0 X n.q. X
1 X n.q. X 2 7,12 1,49 1,28E-5
3 7,13 1,91 3,76E-5 5 7,14 2,61 7,52E-5
4 7,12 2,28 5,73E-5 7 7,14 2,53 7,11E-5
6 7,11 2,60 7,25E-5 12 7,12 2,37 6,25E-5
9 7,12 2,48 6,83E-5
11 7,15 2,43 6,57E-5
Tab. 3.2. – Informação relativa às análises ao (E)-2-nonenal em regime de envelhecimento forçado.
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Fig. 3.4. – Análise sensorial relativa à evolução de notas a papel/cartão em regime de envelhecimento a 40 ºC.
0.0E+00
2.0E-05
4.0E-05
6.0E-05
8.0E-05
1.0E-04
0 2 4 6 8 10 12 14
[E-2
-non
enal
] (g
/L)
Tempo (meses)
Envelhecimento a 40ºC Envelhecimento a 50ºC
Fig. 3.3. – Comparação da evolução de (E)-2-nonenal nos dois regimes de envelhecimento forçado estudados.
28
As técnicas de preparação da amostra consistiram na destilação por arraste de vapor e, adicionalmente,
na técnica de extração em fase sólida. O objetivo da utilização destas técnicas teve em vista a redução
da complexidade da matriz da cerveja de forma a possibilitar a identificação e quantificação do (E)-2-
nonenal.
Sob o ponto de vista prático, a utilização da técnica de SPE não se demonstrou adequada na análise
deste composto, pelo que se optou pela análise direta da amostra tendo sido feita uma diluição de cinco
vezes de forma a reduzir a complexidade da matriz. Após uma injeção preliminar verificou-se que o pico
associado ao (E)-2-nonenal, com um tempo de retenção na ordem dos 7 minutos, permitia a análise da
variação da concentração deste pelo que se optou pela análise direta da amostra – figura 3.1..
Sob o ponto de vista de resultados obtidos, verificou-se um aumento da concentração de (E)-2-nonenal
ao longo do tempo de envelhecimento como seria de esperar, contudo, após atingir uma concentração
máxima na faixa dos cinco a seis meses, o aumento da concentração parece estagnar.
Por outro lado, ao contrário do que seria expectável, o regime de envelhecimento forçado mais drástico
– envelhecimento a 50 ºC – não provoca uma evolução mais rápida da concentração de (E)-2-nonenal
tendo, inclusive, verificado o mesmo comportamento que o envelhecimento a 40 ºC uma vez que a
concentração de (E)-2-nonenal aumenta até aos cinco meses, estagnando a partir desse ponto.
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Fig. 3.5. – Análise sensorial relativa à evolução de notas a papel/cartão em regime de envelhecimento a 50 ºC.
29
Os resultados obtidos pela análise sensorial foram, em parte, de encontro aos resultados obtidos pelas
análises químicas. Nas amostras analisadas onde se verificou a existência de (E)-2-nonenal, as
concentrações determinadas foram superiores aos limiares de perceção reportados na literatura.
Nas amostras envelhecidas a 40 ºC, o painel de avaliação verificou a existência de notas a papel/cartão
a partir dos três meses, verificando um aumento desta até aos seis meses e um consequente decréscimo
desta propriedade organolética até ao fim do ensaio de envelhecimento.
Para as amostras envelhecidas a 50 ºC, o painel verificou um aumento continuo do carácter
papel/cartão a partir dos dois meses até ao fim do ensaio de envelhecimento, indo de contra aos
resultados obtidos nas análises químicas.
3.2. – Discussão dos resultados obtidos relativos à evolução da concentração de ácido acético Nas figuras 3.6 e 3.7. estão expressos cromatogramas obtidos por HPLC-UV e, na figura 3.8. é visível
um cromatograma obtido por GC-MS. Na tabela 3.3 estão descritos os resultados obtidos através da
análise por GC-MS.
Fig. 3.6. – Sobreposição de cromatogramas típicos de uma cerveja envelhecida, obtidos por HPLC-UV. À esquerda, amostra não envelhecida. À direita, amostra com envelhecimento forçado à temperatura de 40 ºC, equivalente a 6 meses de envelhecimento natural.
Fig. 3.7. – Sobreposição de cromatogramas típicos de uma cerveja envelhecida, obtidos por HPLC-UV.
30
Tempo
(40 °C,
meses)
RT
(min)
Área
(Counts .
min)
Conc.
(g/L)
Tempo
(50 °C,
meses)
RT
(min)
Área
(Counts .
min)
Conc.
(g/L)
0 X n.q. X 0 X n.q. X
1 X n.q. X 2 X n.q. X
3 X n.q. X 5 X n.q. X
4 X n.q. X 7 X n.q. X
6 X n.q. X 12 X 2,72E5 2,06E-5
9 12,87 6,63E4 1,04E-5
11 12,83 2,85E5 2,70E-5
Tab. 3.3. – Informação relativa às análises químicas ao ácido acético em regime de envelhecimento forçado.
Fig. 3.8. – Cromatograma típico de uma cerveja envelhecida, obtido por GC-MS com identificação do pico relativo ao ácido acético.
0.0E+00
5.0E-06
1.0E-05
1.5E-05
2.0E-05
2.5E-05
3.0E-05
0 2 4 6 8 10 12 14[Áci
do a
cétic
o] (
g/L)
Tempo (meses)
Envelhecimento a 40 ºC Envelhecimento a 50 ºC
Fig. 3.9. – Comparação da evolução de ácido acético nos dois regimes de envelhecimento forçado estudados.
31
O ácido acético foi analisado através de duas técnicas diferentes. Nas figuras 3.6. e 3.7., os cromatogramas exibidos foram obtidos através da análise por HPLC-UV com recurso a uma coluna de
troca aniónica concebida para a separação de ácidos, conforme descrito no capítulo 2.
Através da análise dos cromatogramas é possível concluir que os resultados obtidos não foram
suficientemente esclarecedores, uma vez que a matriz da amostra continuou a exibir alguma
complexidade, impossibilitando uma quantificação fidedigna do composto.
Deste modo, procedeu-se à análise por GC-MS – figura 3.8. – onde os resultados foram mais
esclarecedores, contudo, apenas nas mais envelhecidas foi possível quantificar o ácido acético presente.
As amostras começaram a apresentar concentrações quantificáveis de ácido acético a partir dos
sete/oito meses de envelhecimento, sendo que as amostras envelhecidas em regime de temperatura
de 40 ºC apresentaram valores de concentração mais elevados que as amostras envelhecidas à
temperatura de 50 ºC.
Sob o ponto de vista organolético, a amostra que exibiu a concentração de ácido acético mais elevada
foi a amostra cujo envelhecimento forçado à temperatura de 40 ºC correspondeu, aproximadamente, a
um envelhecimento natural de onze meses. Contudo, a concentração de ácido acético nesta amostra
(aproximadamente 20 µg/L) foi substancialmente mais baixa que os valores reportados na literatura
para o ácido acético – aproximadamente mil vezes baixas. Deste modo, não foram identificadas, pelo
painel de avaliação sensorial, notas avinagradas características da presença de ácido acético.
32
3.3. – Discussão dos resultados obtidos relativos à evolução da concentração de furfural
O furfural foi analisado através de GC-MS sendo que na figura 3.10. é exibido um cromatograma típico
para uma amostra de cerveja, estando identificado o pico do furfural na ordem dos 13 minutos. A tabela
3.4. traduz os resultados obtidos pela análise cromatográfica. As figuras 3.12. e 3.13. exibem a evolução
de notas avinagradas ao longo do regime de envelhecimento.
Tempo
(40 °C, meses)
RT
(min)
Área
(Counts
. min)
Conc.
(g/L)
Tempo
(50 °C, meses)
RT
(min)
Área
(Counts
. min)
Conc.
(g/L)
0 X n.q. X 0 X n.q. X
1 13,38 9,53E4 1,16E-5 2 13,34 5,15E5 4,87E-5
3 13,38 2,24E5 2,66E-5 5 13,34 5,53E5 8,01E-5
4 13,36 2,84E5 4,12E-5 7 13,30 8,70E5 9,34E-5
6 13,34 3,87E5 4,15E-5 12 13,29 1,14E5 8,61E-5
9 13,34 3,49E5 5,48E-5
11 13,33 7,20E5 6,81E-5
Fig. 3.10. – Cromatograma típico de uma cerveja envelhecida, obtido por GC-MS com identificação do pico relativo ao furfural.
Fig. 3.11. – Comparação da evolução de furfural nos dois regimes de envelhecimento forçado estudados.
0.0E+00
2.0E-05
4.0E-05
6.0E-05
8.0E-05
1.0E-04
0 2 4 6 8 10 12 14
[Fur
fura
l] (g
/L)
Tempo (meses)
Envelhecimento a 40ºC Envelhecimento a 50ºC
Tab. 3.4. – Informação relativa às análises químicas ao furfural em regime de envelhecimento forçado.
33
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Os resultados obtidos para o envelhecimento forçado em regime de temperatura controlada de 40 ºC
exibem um aumento gradual de furfural ao longo do ensaio. A presença de furfural no envelhecimento
em regime de temperatura de 50 ºC demonstra uma maior evolução até aos sete meses
comparativamente com o ensaio efetuado à temperatura de 40 ºC, evidenciando uma estagnação do
aumento da concentração de furfural a partir desse ponto.
Relativamente à análise sensorial, o painel de avaliação encontrou notas características do furfural em
diversas amostras, contudo, a concentração de furfural presente era significativamente mais baixa que
o limiar de perceção reportado na literatura. Ainda assim, o painel verificou a existência de notas a
velho/caramelo nas amostras a partir dos 3 meses. O painel reportou ainda um aumento desta
Fig. 3.13. – Análise sensorial relativa à evolução de notas a velho em regime de envelhecimento a 50 ºC.
Fig. 3.12. – Análise sensorial relativa à evolução de notas a velho em regime de envelhecimento a 40 ºC.
34
característica até à amostra equivalente a 6 meses de envelhecimento normal, evidenciando-se um
decréscimo a partir desse ponto até ao final do ensaio.
A análise sensorial relativa à evolução de furfural em regime de envelhecimento a 50 ºC teve uma
tendência diferente comparativamente com o ensaio realizado a 40 ºC, sendo que o painel notou um
aumento gradual das características sensoriais do furfural a partir dos 2 meses até ao fim do ensaio,
exibindo um perfil diferente dos resultados das análises químicas, nos quais houve uma estagnação
desta característica.
Mais uma vez, as concentrações de furfural reportadas encontraram-se a baixo do limiar de perceção
reportado na literatura.
3.4. – Discussão dos resultados obtidos relativos à evolução da concentração de 4-vinilguaiacol O 4-vinilguaiacol foi analisado através de GC-MS, estando exibido na figura 3.14. um cromatograma
típico de uma amostra de cerveja, onde se encontra identificado também o pico associado a este
composto, com um tempo de retenção por volta dos 37 minutos. Na tabela 3.4. encontram-se os
resultados obtidos através da análise por GC-MS. Na figura 3.15. encontra-se um gráfico com a
comparação da evolução de 4-VG nos dois regimes estudados. Nas figuras 3.16 e 3.17 encontra-se a
variação da evolução das notas fenólicas.
Fig. 3.14. – Cromatograma típico de uma cerveja envelhecida, obtido por GC-MS com identificação do pico relativo ao 4-vinilguaiacol.
35
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0 meses 1 mês 3 meses 4 meses 6 meses 9 meses 11 meses
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0.0E+00
2.0E-05
4.0E-05
6.0E-05
8.0E-05
1.0E-04
1.2E-04
1.4E-04
0 2 4 6 8 10 12 14[4-v
inilg
uaia
col]
(g/L
)
Tempo (meses)
Envelhecimento a 40ºC Envelhecimento a 50ºC
Tempo
(40 °C,
meses)
RT
(min)
Área
(Counts .
min)
Conc.
(g/L)
Tempo
(50 °C,
meses)
RT
(min)
Área
(Counts .
min)
Conc.
(g/L)
0 X n.q. X 0 X n.q. X
1 X n.q. X 2 37,78 7,67E5 7,26E-5
3 X n.q. X 5 37,80 6,32E5 9,16E-5
4 X n.q. X 7 37,78 1,18E6 1,26E-4
6 37,80 6,32E5 6,79E-6 12 37,77 1,26E6 9,51E-5
9 37,81 8,19E5 1,29E-4
11 37,79 1,36E6 1,29E-4
Tab. 3.4. – Informação relativa às análises químicas ao 4-vinilguaiacol em regime de envelhecimento forçado.
Fig. 3.15. – Comparação da evolução de 4-vinilguaiacol nos dois regimes de envelhecimento forçado estudados.
Fig. 3.16. – Análise sensorial relativa à evolução de notas fenólicas, em regime de envelhecimento a 40 ºC.
36
O 4-vinilguaiacol foi analisado através de GC-MS, estando exibido na figura 3.14. um cromatograma
típico de uma amostra de cerveja, onde se encontra identificado também o pico associado a este
composto, com um tempo de retenção por volta dos 37 minutos.
Relativamente aos resultados obtidos, o envelhecimento forçado a regime de temperatura de 40 ºC exibe
o aparecimento de 4-vinilguaiacol em quantidades quantificáveis a partir do ponto equivalente a 4 meses
de envelhecimento normal, sendo que este aumento parece estagnar a partir dos 9 meses.
O envelhecimento forçado a regime de temperatura de 50 ºC manifesta um aumento na formação de 4-
vinilguaiacol, onde logo a partir dos 2 meses de envelhecimento o 4-vinilguaiacol presente na amostra é
passível de quantificação.
O envelhecimento em regime de temperatura de 50 ºC exibe uma maior evolução de 4-vinilguaiacol
quando comparado com a evolução deste composto no ensaio efetuado a 40 ºC.
A nível sensorial, o painel reportou notas a fenólico/cravinho-da-Índia evidenciadas pela presença deste
composto nas amostras mais envelhecidas. Contudo, mais uma vez, as concentrações de 4-vinilguaiacol
presentes nas amostras de cerveja encontram-se abaixo do limiar de perceção.
Para as amostras envelhecidas a 40 ºC, o painel reportou a presença de um carácter fenólico apenas
para a amostra mais envelhecida, ao passo que, para as amostras envelhecidas a 50 ºC, o painel notou
a presença de características fenólicas a partir dos 5 meses.
0
0.5
1
1.5
2
2.5
0 meses 2 meses 5 meses 7 meses 12 meses
Uni
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Fig. 3.17. – Análise sensorial relativa à evolução de notas fenólicas, em regime de envelhecimento a 50 ºC.
37
0
1
2
3
4
5
6
Papel/Cartão Fenólico Velho Amargor Doce0 meses 2 meses 5 meses 7 meses 12 meses
3.5. – Discussão dos resultados obtidos pela análise sensorial das amostras
A análise sensorial elaborada pelo painel de avaliação denota, conforme abordado, variações
significativas consonantes com os resultados analíticos para a maioria dos compostos. Adicionalmente,
foram também avaliadas as variações sensoriais do amargor e do doce. Como esperado, tanto as
amostras envelhecidas num regime de temperatura de 40 ºC como as amostras envelhecidas num
regime de temperatura de 50 ºC exibiram, simultaneamente, uma diminuição do amargor e um aumento
do doce.
3.6. – Discussão dos resultados obtidos para os envelhecimentos a 60 ºC
O ensaio no qual as amostras foram envelhecidas em regime de temperatura a 60 ºC foi suspenso ao
fim de um dia uma vez que a pressão interna em duas das catorze amostras aumentou demasiado,
levando a que a carica fosse projetada do gargalo.
0
0.5
1
1.5
2
2.5
3
3.5
4
4.5
Papel/Cartão Fenólico Velho Amargor Doce0 meses 1 mês 3 meses 4 meses 6 meses 9 meses 11 meses
Fig. 3.18. – Variação da perceção sensorial ao longo do ensaio. Ensaios efetuados em regime de envelhecimento a 40 ºC.
Fig. 3.19. – Variação da perceção sensorial ao longo do ensaio. Ensaios efetuados em regime de envelhecimento a 50 ºC.
38
3.7. – Discussão dos resultados obtidos para a análise de variação de cor
Na tabela 3.5. e a figura 3.20 encontram-se, respetivamente, os dados obtidos através da análise de
variação de cor e o gráfico correspondente a essa análise.
O gráfico relativo à variação da cor mostra que o envelhecimento forçado provoca um aumento da
diferença de cor entre a amostra padrão e as amostras envelhecidas.
É possível observar também que, em comparação com o envelhecimento a 40 ºC, o envelhecimento a
50 ºC leva a um aumento mais rápido da diferença de cor entre a amostra inicial e as amostras
envelhecidas, sendo que a amostra mais envelhecida apresenta uma diferença de cor de quase 3
unidades, sendo por isso passível de perceção por um observador inexperiente (20).
Por outro lado, a amostra mais envelhecida no regime de temperatura de 40 ºC evidenciou uma
diferença de cor de 1,7, o que implica que apenas observadores com experiência fossem capazes de
reparar na diferença de cor entre a amostra padrão e as amostras envelhecidas.
Tempo (40 °C,
meses)
Diferença de cor
(∆E*)
Tempo (50 °C,
meses)
Diferença de cor
(∆E*)
0 0 0 0
1 0,79 2 0,55
4 0,95 7 1,45
6 1,03 12 2,79
11 1,70
Fig. 3.20. – Comparação da variação da cor das amostras nos dois regimes de envelhecimento estudados.
0.0
0.5
1.0
1.5
2.0
2.5
3.0
0 2 4 6 8 10 12 14Dife
renç
a de
cor
(∆
E*)
Tempo (meses)
Envelhecimento a 40 ºC Envelhecimento a 50 ºC
Tab. 3.5. – Informação relativa à análise de variação de cor.
39
Capítulo 4 – Considerações finais e propostas de trabalho futuro A metodologia desenvolvida permitiu um estudo sólido do efeito do envelhecimento forçado na evolução
de off-flavours em cerveja. A combinação de análises químicas tendo em vista a monitorização das
variações dos off-flavours, combinada com a avaliação organolética, aliando a análise da variação de
cor, culminaram na seleção de ferramentas bastante adequadas ao estudo proposto.
A utilização da técnica de SPE não se revelou muito eficaz, possivelmente devido a uma escolha
inadequada dos cartuchos.
Relativamente à evolução de (E)-2-nonenal em ambos os regimes de envelhecimento, a sua
concentração aumentou até cerca dos 6 meses tendo estagnado/decrescido lentamente até ao fim do
ensaio. Tal facto pode dever-se a fenómenos oxidativos onde as condições de envelhecimento
propiciaram a oxidação do (E)-2-nonenal a outos compostos, nomeadamente a ácido nonanoico, levando
assim a uma lenta diminuição da sua concentração. A análise sensorial das amostras envelhecidas a
40 ºC foi de encontro aos resultados obtidos pelas análises químicas, contudo, a mesma análise para
as amostras em regime de temperatura de 50 ºC, demonstrou que o carácter a papel/cartão foi
aumentando ao longo de todo ensaio. Esta observação pode dever-se à formação de outras espécies
cuja expressão organolética seja semelhante à do (E)-2-nonenal, como por exemplo, o aldeído (E,E)-2,4-
decadienal.
Verificou-se que o ácido acético não se formava em extensão suficiente que permitisse a sua perceção
organolética, sendo que apenas as amostras mais envelhecidas permitiram a quantificação deste
composto. Salientar também que o facto do regime de envelhecimento forçado a 40 ºC ter verificado
uma maior evolução de ácido acético quando comparado com o envelhecimento a 50 ºC pode ser
suportado pelas condições de envelhecimento serem mais suaves, potenciando uma maior formação
de precursores deste composto e, consequentemente, uma evolução de ácido acético mais elevada que
no regime de temperatura de 50 ºC.
Os estudos efetuados sobre a evolução de furfural demonstraram uma evolução mais acentuada deste
composto no regime de envelhecimento a 50 ºC, o que evidencia que um envelhecimento forçado em
condições mais drásticas aumenta significativamente a concentração deste composto. Uma vez que o
furfural é um intermediário da reação de Maillard, a explicação poder-se-á dever a uma aceleração desta
reação propiciada pela temperatura mais elevada. Esta proposta é ainda corroborada pela diminuição
40
da concentração de furfural a partir dos 7 meses de envelhecimento o que sugere que, sendo o furfural
um intermediário na reação de Maillard, a partir deste ponto começa a verificar-se a reação de formação
de outro composto no qual o furfural participa como reagente.
A análise sensorial das amostras reconheceu a existência de notas características do furfural nas
amostras envelhecidas em ambos os regimes, ainda que a concentração de furfural presente nas
amostras fosse substancialmente inferior ao limiar de perceção reportado na literatura. Tal facto pode
estar diretamente associado à presença de outras espécies formadas durante o processo de
envelhecimento que possam apresentar efeitos organoléticos sinérgicos, aumentando assim o carácter
a caramelo/velho, característico do furfural. Salientar também que o facto de a análise sensorial reportar
um aumento mais significativo das características organoléticas associadas ao furfural no regime de
envelhecimento a 50 ºC, pode evidenciar que condições de envelhecimento forçado mais drásticas
possam levar a um aumento da velocidade de reação da reação de Maillard, uma vez que os compostos
intermediários possuem características sensoriais semelhantes entre si.
Os resultados obtidos relativos ao 4-vinilguaiacol demonstraram diferentes evoluções deste composto
para os dois regimes de envelhecimentos estudados. O envelhecimento em regime de temperatura de
50 ºC aumenta até aos 7 meses verificando-se uma posterior diminuição até ao fim do ensaio. Uma vez
que a formação do 4-VG tem origem, conforme abordado, na decomposição térmica do ácido ferúlico,
os resultados obtidos podem sugerir que condições de envelhecimento forçado mais drásticas aceleram
a reação de descarboxilação do ácido ferúlico e, consequente, a formação de 4-VG.
A nível sensorial, embora as concentrações de 4-VG encontradas nas amostras fossem inferiores ao
limiar de perceção reportado, o painel identificou notas fenólicas/especiarias características da presença
de 4-VG. Tal constatação pode ser sustentada por uma eventual formação de outros compostos com
expressão organolética semelhante à do 4-VG, traduzindo-se num efeito sinergético desta característica.
Relativamente ao amargor e ao doce, os resultados obtidos pela análise sensorial vão de encontro ao
diagrama de Dalgliesh – figura 1.4. – no sentido em que as notas adocicadas aumentam ao longo do
envelhecimento, evidências que são suportadas pelos produtos da reação de Maillard cujas
características organoléticas denotam traços adocicados, ao passo que o amargor vai diminuindo, o que
é explicado pela natural degradação dos compostos voláteis presentes no lúpulo.
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A análise da variação de cor demonstrou que o envelhecimento forçado tem um impacto direto na
variação da cor das amostras. Ainda assim, a diferença de cor entre a amostra-padrão e as amostras
envelhecidas não é facilmente percecionada por um observador inexperiente.
No que diz respeito ao ensaio de envelhecimento a regime de temperatura de 60 ºC, é possível concluir
que o facto de a pressão interna apenas ter aumentado significativamente em duas das catorze amostras
demonstra que a carbonatação das amostras estudadas não era substancialmente homogénea, caso
contrário todas as amostras teriam evidenciado o mesmo comportamento. Por outro lado, concluir que
a exposição a temperaturas extremamente elevadas, leva a um aumento abrupto da pressão interna.
Em jeito de retrospeção, são apresentadas algumas sugestões para propostas de trabalho futuro de
modo a compreender fenómenos cujas respostas ficaram em aberto:
• Analisar a presença de outros aldeídos de cadeia longa de modo a esclarecer a tendência
percecionada pelo painel de avaliação sensorial relativa ao (E)-2-nonenal;
• Monitorizar a formação de produtos da reação de Maillard de forma a melhor compreender a
evolução de furfural e eventual formação de compostos com características sensoriais
semelhantes;
• Medir parâmetros físicos (p. ex., retenção de espuma, pressão interna, etc.) das amostras de
cerveja ao longo dos ensaios de envelhecimento de forma a complementar o leque de
parâmetros estudados e a verificar a homogeneidade das amostras;
• Efetuar um envelhecimento natural à temperatura ambiente e correlacionar a evolução de off-
flavours neste regime com outros regimes de envelhecimento forçado de forma a poder
estabelecer fatores de aceleração de envelhecimento para os diversos off-flavours;
• Aumentar o leque de variáveis às quais a amostra é sujeita de forma a perceber o impacto de
outros fatores na evolução de off-flavours (p. ex., conteúdo do headspace, exposição à luz);
• Aumentar o número de juízes do painel de avaliação de forma a aumentar a significância
estatística dos resultados sensoriais;
• Idealmente, selecionar um estilo de cerveja no qual o envelhecimento desenvolva características
positivas e otimizar as condições de envelhecimento forçado de forma a obter uma cerveja
envelhecida mais rapidamente, aumentando assim o valor económico do produto final.
vi
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