desafios da mortalidade infantil e na infância - apsredes.org · introdução o brasil registrou...
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Desafios da mortalidade infantil
e na infncia
1 Consultora Independente 2 Organizao Pan-Americana da Sade/Organizao Mundial da Sade
Maria de Lourdes Magalhes1, Juan Cortez-Escalante2, Lucimar Rodrigues Coser Cannon2,
Tatiana Selbmann Coimbra2, Haydee Padilla2
Introduo
O Brasil registrou nas ltimas trs dcadas considerveis progressos na reduo da mortalidade
infantil (menores de um ano) e na infncia (menores de cinco anos), com resultados incontestveis.
Essas conquistas da sade pblica so atribudas, em grande medida, criao do Sistema nico
de Sade (SUS), com as decorrentes polticas de preveno de doenas e agravos, de promoo e
de assistncia e de cuidados bsicos, com a criao da Estratgia Sade da Famlia.
As razes por trs dessas conquistas esto rela-
cionadas, tambm, ao crescimento econmico;
reduo das disparidades de renda; urbani-
zao; melhoria da educao das mulheres;
diminuio das taxas de fertilidade; aos pro-
gramas de transferncia de renda, a exemplo
do Programa Bolsa Famlia, bem como s me-
lhorias no saneamento bsico e o tratamento
da gua1, 2, 3.
No entanto, tais avanos esto atualmente sob
ameaa, considerando a persistncia da cri-
se financeira que o pas est experimentando
desde 2015, e os efeitos das medidas de austeri-
dade fiscal. Um dos sinais de alerta o registro
de aumento na taxa de mortalidade infantil e
da infncia em 2016, segundo dados do prprio
Ministrio da Sade4.
Alm disso, outros desafios permanecem, a
exemplo da prematuridade, do baixo peso ao
nascer, das infeces perinatais e neonatais,
das malformaes congnitas e das altas taxas
de cesarianas. Novos desafios surgiram rela-
cionados com doenas transmitidas por veto-
res, como dengue, Zika, Chikungunya e Febre
Amarela, que constituem srios problemas
para a sade pblica.
Este captulo tem como objetivo descrever a re-
duo da mortalidade infantil e na infncia, nos
ltimos 30 anos, alm de refletir sobre as princi-
pais iniciativas como pactos, polticas e progra-
mas no mbito do SUS. Por fim, visa identificar
lacunas, ameaas e emitir recomendaes, a
partir das lies aprendidas, contribuindo para
a efetividade e sustentabilidade das polticas
pblicas, frente aos desafios da Agenda 2030.
Assim, o contedo aqui exposto resulta da an-
lise de dados secundrios, produzidos a partir
de informaes sobre estatsticas vitais, dispo-
nveis nos sistemas de informaes de sade,
no censo populacional, na Pesquisa Nacional
de Demografia e Sade, bem como em artigos
publicados sobre mortalidade infantil e na in-
fncia em mbito nacional, relatrios oficiais do
governo, e atos normativos e administrativos
(leis, decretos e portarias).
76 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
Compromisso social com a sade materno-infantil
Os programas de Sade da Criana sempre estiveram na agenda de prioridades dos governos, des-
de a criao do Ministrio da Sade, em 1953. Muitos desses foram pioneiros, como por exemplo,
o Programa de Vacinao, uma das mais relevantes intervenes de sade pblica para prevenir
doenas e salvar vidas. Esse programa se tornou contnuo desde ento, obtendo xitos na erradi-
cao de vrias doenas5, como varola, poliomielite, ttano, difteria, sarampo, hepatite b, rubola,
entre outras.
Considerado um dos mais importantes marcos
da sade pblica, a Declarao de Alma Ata
(1978), que completou 40 anos em 2018, ratif i-
cou a importncia de cuidados bsicos sade
materno-infantil, os quais foram contemplados,
em parte, na Conveno sobre os Direitos da
Criana, de 1989.
O movimento sanitrio brasileiro, na dcada
de 80, protagonizou um novo captulo da sa-
de pblica no pas, atuando em defesa da uni-
versalizao da sade pblica e dos direitos
da criana, apoiado por organizaes interna-
cionais, rgos e entidades da sociedade civil,
instituies de ensino e pesquisas entre outros,
em processo concomitante com a criao do
Sistema nico de Sade SUS.
No Brasil, a partir de 1984, o Ministrio da Sade
implementou um conjunto de aes voltadas
para a sade da criana e da mulher (ver qua-
dro 1), como as estratgias de promoo ao
aleitamento materno, de controle de infeco
respiratrias, de doenas diarreicas e o acom-
panhamento do crescimento e desenvolvimen-
to, alm de aes para a qualif icao do parto
e nascimento, incluindo alojamento conjunto e
parto domiciliar por parteiras tradicionais5.
Com o advento da Constituio Federal, de 1988,
a criana passa a ser reconhecida como pes-
soa em condio peculiar de desenvolvimen-
to, com direitos proteo integral e absoluta
prioridade nas polticas pblicas. Esses direitos
foram reafirmados no Estatuto da Criana e do
Adolescente (ECA), Lei n 8.069, de 13 de julho
de 1990, destacado no Capitulo I, do Direito
Vida e Sade, como princpios e diretrizes de
atribuio da rea de sade6, 7.
A criao do SUS, em 1988, e a promulgao
de suas Leis Orgnicas (Lei n 8.080, de 19 de
setembro de 1990 e Lei n 8.142, de 28 de de-
zembro de 1990) promoveram uma profunda
transformao na sade da populao brasilei-
ra, dadas suas caractersticas de ser um sistema
de sade ambicioso, ancorado nos princpios
organizativos da universalizao do acesso, da
equidade e da integralidade, alm da partici-
pao da sociedade. Assim, o sistema de sa-
de brasileiro que atendia apenas uma parcela
da populao, passou a cobrir 170 milhes de
77Desafios da mortalidade infantil e na infncia
brasileiros, total da populao do pas naquela
ocasio8.
Ao longo das trs dcadas de implementao
do SUS, sob gesto compartilhada entre as trs
esferas de governo (federal, estadual e munici-
pal), importantes medidas legislativas e admi-
nistrativas ocorreram, essenciais para a efetiva-
o de polticas pblicas de sade no campo
materno e infantil, alm de ancoradas na ga-
rantia de direitos.
A entrada em cena dos Agentes Comunitrios
de Sade (ACS), no ano de 1992, e da Estratgia
Sade da Famlia (ESF), no ano de 1994, a reor-
ganizao da ateno sade, bem como a
ampliao de programas de alcance nacional,
foram iniciativas essenciais para salvar vidas e
melhorar a qualidade da ateno sade da
criana (Quadro 1).
Em 1995, o Ministrio da Sade assumiu a lide-
rana de um movimento nacional com o Projeto
de Reduo da Mortalidade Infantil (PRMI), que
tinha o objetivo de intensificar esforos em fa-
vor da infncia, ao reunir variados programas e
instituies, oferecendo um conjunto de aes
de saneamento bsico, imunizao, promoo
ao aleitamento materno, e do pr-natal, com-
bate s doenas infecciosas e desnutrio9.
A partir de 1994 a transferncia regular e auto-
mtica de recursos financeiros aos municpios
passou a ocorrer com maior celeridade, alcan-
ando incialmente os municpios com maior
prevalncia de mortalidade infantil. Nos anos
seguintes, o papel dos ACS foi decisivo para re-
duo da mortalidade, com a ampliao das vi-
sitas domiciliares.
Apesar dos esforos, o Brasil ingressou no scu-
lo XXI, ainda com elevada taxa de mortalidade
infantil e elevada razo de mortalidade mater-
na. As causas foram atribudas a uma srie de
fatores, tanto biolgicos quanto socioecon-
micos e assistenciais9, 10. Vrias iniciativas foram
adotadas para o enfrentamento de afeces
perinatais, malformaes congnitas e afec-
es de origem gentica que se constituam,
na ocasio, como principais causas de bito
infantil. No decorrer do perodo, a reduo da
mortalidade infantil foi observada no compo-
nente ps-neonatal (de 28 a 364 dias) mas a
mortalidade neonatal (zero a 27 dias de vida)
permaneceu um desafio9, 11 (Quadro 1).
78 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
QUADRO 1Polticas, pactos, programas e estratgias para a sade da crina e da mulher (1970-2015)
1970/73 1977 1981 1982/84 1984/86
Programa Nacional de Imunizaes, formalizado em 1975 (Lei n 6.259/75).
Programa Nacional de Imunizao (PNI) e o Calendrio para menores de 1 ano.
Programa Nacional de Incentivo ao Aleitamento Materno (PNIAN).
Alojamento conjunto obrigatrio (Me e Criana), Programa de Assistncia Sade da Mulher (PAISM).
Programa de Assistncia Sade da Criana (PAISC) e o Carto de Sade da Criana.
1992 1994 1995 1997 2000
Programa Agentes Comunitrios de Sade(PACS)
Programa Sade da Famlia (PSF)
Projeto de Reduo da Mortalidade Infantil (PRMI)
Ateno Integral s Doenas Prevalentes na Infncia (AIDPI)
Ateno Humanizada ao Recm-Nascido Mtodo Canguru
2004 2004 2006 2006 2009
Agenda de Compromissos: Sade Integral da Criana e Reduo da Mortalidade Infantil.
Pacto de Reduo de Mortalidade Materna e Neonatal.
Pactos pela Sade: Poltica Nacional de Promoo da Sade (Pacto pela Vida).
Poltica Nacional da Ateno Bsica, atualizada em (2011) e em 2017.
Pacto de Reduo de Mortalidade Materna e Neonatal, na Regio Nordeste e Amaznia Legal.
2010 2011 2012/13 2014 2015
Rede de Ateno Sade (PT 4.279).
Regulamentao do SUS (Dec. 7.508).
Rede Materno Infantil, Rede Cegonha (PT 1.459) ; Rede de Urgncia e Emergncia (PT 1.600 e 2.395)
Estratgia Amamenta e Alimenta Brasil (EAAB) (PT 1.920).
Define diretrizes para habilitao de leitos neonatais (PT 930)
Redefine os critrios da Iniciativa Hospital Amigo da Criana (PT 1.153). Rede de Ateno s Pessoas com Doenas Crnicas (PT 483).
Poltica Nacional de Ateno Integral Sade da Criana (PNAISC) (PT 1.130). Regulamenta a comercializao de alimentos para lactantes e crianas (Dec. 8.552).
Em 2006, ocorreu formalizao Pactos pela
Sade, que estabeleceram as diretrizes opera-
cionais nos Pactos pela Vida, em Defesa do SUS
e de Gesto. Eles constituem pactos federativos
que vieram a fortalecer a gesto compartilhada,
solidria e colaborativa no SUS, abrangendo e
comprometendo a Unio, os estados e os mu-
nicpios12. Os avanos alcanados contriburam
para a construo de um novo modelo de finan-
ciamento e controle social. Neste mesmo ano
de 2006, duas importantes polticas pblicas a
Poltica Nacional de Promoo da Sade (PNPS)
e a Poltica Nacional de Ateno Bsica (PNAB)
foram publicadas, fortalecendo as estratgias
para a reduo da mortalidade infantil.
Considerando o compromisso do Pacto pela
Vida de reduzir a mortalidade infantil em 5% ao
79Desafios da mortalidade infantil e na infncia
ano, com nfase no componente neonatal, foi
f irmado um acordo com os estados da regio
Nordeste e da Amaznia Legal (2009 e 2010),
para acelerar a reduo das desigualdades re-
gionais no pas e favorecer o alcance das metas
de Objetivos de Desenvolvimento do Milnio
ODM. Parcerias foram estabelecidas com ou-
tras instituies governamentais para erradicar
o ndice de sub registro civil de nascimento; am-
pliar a oferta e efetividade dos cursos de alfabe-
tizao de jovens, adultos e idosos; e ampliar a
prestao de servios de assistncia tcnica e
extenso rural para a agricultura familiar 9, 10, 12.
No ano seguinte, em 2011, as estratgias do
Pacto foram incorporadas chamada Rede
Cegonha, tendo como objetivos fomentar a
implementao do novo modelo de ateno
sade da mulher e da criana e reduzir a mor-
talidade materna e infantil com nfase no com-
ponente neonatal13.
Ainda em 2011, houve a publicao do Decreto
n 7.508, de 28 de junho de 2011, que regula-
mentou o SUS e permitiu o aprimoramento de
servios, avanando na reorganizao da Rede
de Ateno Sade (RAS), e das redes temti-
cas14, tais como a Rede Materno Infantil (Rede
Cegonha), a Rede de Urgncia e Emergncia, a
Rede de Cuidados da Pessoa com Deficincia,
a Rede de Ateno s Pessoas com Doenas
Crnicas, e a Rede de Ateno Psicossocial, re-
forando o papel da Ateno Primria Sade
(APS) como ordenadora do cuidado.
a Nascem em torno de 3 milhes de crianas ao ano no Pas, conforme os dados do Sistema de Informaes sobre Nascidos Vivos (SINASC, 2016)17. A populao residente de crianas de 0 a 4 anos de mais de 11 milhes, o que representa 38% da populao de crianas de 0 a 9 anos, (IBGE, 2010) 18.
Aps 25 anos do estabelecimento do Estatuto
da Criana e do Adolescente (ECA), em 2015, a
Poltica Nacional de Ateno Integral Sade
da Criana (PNAISC), foi instituda depois de
amplo debate e aprovao pelas instncias
deliberativas e consultivas do SUS15. No ano se-
guinte, o Congresso Nacional aprovou o Marco
Legal da Primeira Infncia, atravs de lei espe-
cfica em 2016, com o objetivo de atualizar os
dispositivos do ECA e ampliar as polticas de
promoo, proteo e defesa do direito ao de-
senvolvimento integral da primeira infncia16.
Assim, os investimentos em polticas, progra-
mas e na organizao dos servios foram de-
terminantes para salvar milhares de vidas, nas
duas ltimas dcadas. O Brasil reduziu mais
da metade de bitos de crianas menores de
cinco anosa, por causas evitveis, passando de
70.572 bitos em 1996 para 29.126 bitos em
2016, uma reduo de 59% no perodo. No mes-
mo perodo, a taxa de mortalidade infantil por
causas evitveis caiu de 30,5 para 11,7 bitos por
1000 NV, uma reduo de 65%, observando-se
maior queda nas doenas do trato respiratrio
do perodo neonatal (82,0%). Ocorreu tambm
queda no grupo de causas como a pneumonia
(80,4%), doenas bacterianas (81,6%), doenas
infeciosas intestinais (92,1%), entre outras, que
mostraram quedas menos acentuadas. Por ou-
tro lado, vm aumentando as causas relaciona-
das gestao, ao parto, aos agravos ao feto e
recm-nascidos, especialmente no que refere
s afeces maternas, que mostraram incre-
mento de 224,1%. No mesmo perodo, a sf ilis
80 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
congnita apresentou um aumento de 48,0%.
No entanto, houve reduo de causas externas,
especialmente dos acidentes de transporte
(55,0%) e afogamentos (45,2%), no mesmo pe-
rodo. A reduo mais significativa foi obser-
b A investigao a etapa que propicia a identificao de bitos no declarados e/ou no registrados, a correo dos dados pessoais e socioeconmicos do(a) falecido(a) e da causa bsica dos bitos registrados, classificao de casos, determinantes e fatores de risco e as condies que originaram a morte 20.
vada nas causas mal definidas, que passaram
de 12.986 bitos, em 1996, para 1.659 em 201619,
o que pode estar relacionado com a melhoria
da qualidade do Sistema de Informaes sobre
Mortalidade SIM (ver Quadro 2).
QUADRO 2bitos por causas evitveis em menores de 5 anos. Brasil, 1996 a 2016
Principias causas com maior reduo
Principais causas com queda me-nos acentuadas
Principiais causas que apresenta-ram aumento no perodo
Transtorno respiratrios especficos perodo neonatal.
Sndrome da angstia respiratria recm-nascido.
Pneumonia. Doenas infecciosas intestinais. Desnutrio e outras deficincias nutricionais.
Meningite (exceto por Haemophilus).
Transtornos da gestao, curta durao e peso baixo ao nascer.
Hipxia intrauterina e asfixia ao nascer.
Sndrome aspirao neonatal exceto leite alimento regurgitado.
Infeco perodo neonatal exc SRC e hepatite viral congnita.
Afeces originados no perodo perinatal no especifico.
Acidentes de transporte.
Feto e recm-nascido afetados por complicaes da placenta, do cordo umbilical e das membranas.
Feto e recm-nascido afetados por afeces maternas.
Feto e recm-nascido afetados por complicaes maternas durante a gravidez.
Sfilis congnita.
Fonte: SIM CGIAE/SVS/MS
No perodo de 2009 a 2016, houve um aumento
significativo na proporo de bitos de mulhe-
res em idade frtil, maternos, infantis e fetais
investigadosb. O aumento de casos de bitos
infantis e fetais investigados foi decorrncia
de um conjunto de medidas adotadas pelo
Ministrio da Sade, a partir de 2008, entre as
quais se destaca a descentralizao das aes
de vigilncia de bitos para os estados e mu-
nicpios, sob a coordenao das Secretarias de
Sade, com atuao integrada e articulada da
vigilncia em sade e da assistncia nas trs
instncias de gesto do SUS20. Assim, dados
preliminares de 2017 apresentam percentual
de investigao acima de 75% no campo infan-
til e 85% no materno21, 22.
A vigilncia de bitos , portanto, uma estrat-
gia importante para o fortalecimento da ges-
to e favorece acesso mais prximo realidade
em dados captados pelo SIM. Isso permite aos
gestores do SUS conhecer o real risco de morte
nos primeiros anos de vida, alm de monitorar
e avaliar o impacto das polticas pblicas vigen-
tes, favorecendo assim a tomada de decises
oportunas para mortes evitveis.
81Desafios da mortalidade infantil e na infncia
Mortalidade infantil e na infncia: tendncias
Esto em foco aqui as tendncias relativas taxa de mortalidade infantil (TMI) e mortalidade neo-
natal (TMI-Neo), com seus componentes neonatal (tardio e precoce), bem como da mortalidade na
infncia (TMIN), nas dcadas seguintes implementao do SUS, no perodo de 1990 2016c.
Mortalidade Infantil (menores de um ano)
c As fontes de dados de coletada para a formulao dos indicadores so obtidas atravs do: Sistema de Informaes sobre Nascidos Vivos (SINASC), implantado oficialmente em 1990, e o Sistema de Informaes sobre Mortalidade (SIM), criado des-de 1979 23, sob constante aperfeioamento da base de dados e qualificao das informaes. A TMI utilizada, representa uma combinao de dados diretos de 8 Estados (Espirito Santo, Rio de Janeiro, So Paulo, Paran, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal) com informaes consideradas adequadas (cobertura 100%) e de dados indiretos de 19 Estados com informaes consideradas inadequadas23.
d A TMI inclui trs perodos: o neonatal precoce (0 a 6 dias), neonatal tardio (7 a 27 dias) e ps-neonatal (28 a 364 dias). A TM Neonatal compreende os perodos neonatal precoce e o tardio24. Esses indicadores so formulados de acordo com a meto-dologia da Rede Interagencial de Informaes para a Sade (RIPSA), criada em 1996.
A TMId representa um indicador sensvel, am-
plamente utilizado para medir o estado de sa-
de, as condies de vida de uma populao e
a eficcia dos servios de sade2. Ele permite o
desenvolvimento de estratgias de preveno
de fatores de risco de morte, por meio de polti-
cas pblicas voltadas sade das crianas.
A TMI passou de 47,1 para 14,0 bitos por mil
nascidos vivos (NV), entre 1990 e 2016, confi-
gurando uma reduo de 70,0% no perodo
(Figura 1). A mdia de reduo nacional foi de
6% ao ano na dcada de 1990, diminuindo para
4,5% na dcada de 2000, e para 3,4% entre 2011
e 2015. Em 2016 houve aumento de 4,8%, com-
parado com o ano anterior. (Quadro 3).
At 2015, a tendncia observada foi consisten-
te em todas as regies do pas, embora tenha
ocorrido desacelerao em anos mais recentes.
A Regio Nordeste teve a maior queda no pe-
rodo, passando de 75,8 bitos por 1.000 NV em
1990, para 15,2 em 2015. Isso mostra um avan-
o importante em todo o SUS, embora o de-
safio permanea, pois ainda possvel reduzir
as mortes consideradas evitveis para alcan-
ar taxas similares s dos pases desenvolvidos
(4/1.000 NV), ou mesmo s de outros pases em
desenvolvimento da Regio, como Chile (11),
Argentina (7), Uruguai (14)1.
No entanto, observou-se, em 2016, um aumen-
to da TMI nas diversas regies brasileiras, com
exceo da Regio Sul, que apresentou um va-
lor inferior a 10 bitos por 1.000 NV.
82 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Norte 19 22 20 21 21 22 22 23 22 22 21 21 19 19 18 17 18 17 15 15 14 13 13 12 12 11 12
Nordeste 29 27 23 21 22 24 25 24 21 22 21 20 19 18 18 17 17 16 15 14 14 13 12 12 12 11 12
Sudeste 19 20 18 17 16 16 16 16 15 15 14 13 13 12 12 11 10 10 10 10 09 09 09 09 09 08 08
Sul 15 15 14 13 13 13 12 12 11 12 11 11 11 10 10 10 09 09 09 08 08 08 08 07 08 07 07
Centro-Oeste 18 18 18 17 17 17 17 16 16 16 15 15 14 14 13 13 12 12 11 11 11 11 11 11 10 10 10
Brasi l 23 23 21 20 19 20 19 19 18 18 17 16 15 15 14 14 13 13 12 12 11 11 10 10 10 09 10
00
05
10
15
20
25
30
35
FIGURA 1.Taxa de mortalidade infantil. Brasil e regies, 1990 a 2016
Mortalidade Neonatal (0 a 27 dias)
A TMI-Neo passou de 23,1 bitos, por 1.000 NV,
em 1990 para 9,6 em 2016 (Figura 2). No perodo,
a reduo mdia nacional foi de 58,3%. At 2015,
houve uma variao de queda consistente em
todas as regies do pas. Em 2016, observou-se
um aumento em todas as regies, com exce-
o da Regio Sul. Entre 2000 e 2015, a Regio
Nordeste e a Amaznia Legal apresentaram
uma consistente queda de 5% ao ano (quadro
3), atingindo assim a meta estabelecida pelo
governo federal para as mesmas em 2009, con-
tribuindo para o alcance da meta de reduo da
mortalidade dos Objetivos de Desenvolvimento
do Milnio.
Mortalidade na infncia (menores de 5 anos)
No Brasil, a TMIN passou de 53,7 bitos por
1.000 NV em 1990 para 16,4 bitos em 2016, uma
reduo de 69,6% no perodo (quadro 3). A taxa
de reduo nacional acompanhou o mesmo
ritmo de queda da mortalidade infantil, com a
reduo mdia de 6% ao ano, na dcada de 90,
comparando com a mdia de 4,8% de queda
na dcada de 2000. Entre 2011 e 2015, a TMIN
diminuiu em mdia de 3,2% ao ano. Em 2016,
apresentou um aumento de 3,1% comparado
83Desafios da mortalidade infantil e na infncia
QUADRO 3Taxa de Mortalidade Infantil e seus componentes; e na infncia, menores de 5 anos (1990-2016)
UF/Regio
Taxa de Mortalidade
Neonatal Precoce
Taxa de Mortalidade
Neonatal Tardia
Taxa de Mortalidade
Ps-Neonatal
Taxa de Mortalidade
Infantil
Taxa de Mortalidade de 1 a 4 anos
Taxa de Mortalidade, menores de 5
anos1990 2016 1990 2016 1990 2016 1990 2016 1990 2016 1990 2016
Norte 14,1 9,5 4,5 2,5 27,2 6,0 45,9 18,0 7,0 3,7 52,9 21,7Rondnia 16,0 7,8 5,0 2,3 21,7 4,6 42,6 14,6 6,5 2,5 49,2 17,2Acre 19,7 5,8 4,6 2,7 32,2 7,1 56,5 15,6 8,7 3,9 65,1 19,5Amazonas 9,8 9,3 4,5 2,3 30,2 7,0 44,5 18,6 6,8 3,8 51,3 22,4Roraima 10,8 10,0 6,5 2,1 22,3 8,2 39,6 20,4 6,1 5,4 45,7 25,8Par 15,3 10,2 3,9 2,7 27,0 5,4 46,2 18,3 7,1 3,7 53,3 22,0Amap 16,6 11,3 5,7 3,8 15,8 7,6 38,1 22,8 5,8 4,0 43,9 26,8Tocantins 10,5 9,3 5,5 1,9 28,9 4,3 44,9 15,5 6,9 3,5 51,8 19,1Nordeste 19,5 9,0 9,3 2,6 47,0 4,8 75,8 16,4 11,5 2,7 87,3 19,0Maranho 28,7 8,9 6,4 2,3 41,4 5,1 76,6 16,3 11,7 2,8 88,2 19,1Piau 25,3 10,8 5,1 3,4 34,6 5,3 65,0 19,5 9,9 2,9 74,9 22,3Cear 17,3 7,5 8,2 2,4 54,0 4,4 79,5 14,3 12,1 2,5 91,6 16,8Rio Grande do Norte 22,5 7,9 6,9 2,4 46,3 4,9 75,7 15,2 11,5 2,8 87,2 18,0Paraba 14,2 7,9 8,9 2,4 58,8 5,0 81,9 15,2 12,5 2,7 94,4 17,9Pernambuco 19,0 8,3 11,9 2,7 46,1 4,7 77,0 15,7 11,7 2,6 88,7 18,3Alagoas 17,3 8,0 12,6 2,4 72,2 4,9 102,2 15,3 15,6 2,9 117,8 18,2Sergipe 20,5 8,9 7,0 3,5 38,0 4,9 65,5 17,3 10,0 2,6 75,5 19,9Bahia 21,5 10,7 7,2 2,7 37,3 4,6 66,0 18,0 10,1 2,6 76,1 20,5Sudeste 15,1 6,1 3,7 2,2 13,8 3,9 32,6 12,2 4,0 2,0 36,6 14,2Minas Gerais 17,0 7,3 4,3 2,2 17,6 4,2 39,0 13,8 4,8 2,4 43,7 16,1Esprito Santo 12,7 5,8 3,6 2,2 16,9 3,7 33,2 11,7 4,1 2,5 37,3 14,2Rio de Janeiro 14,2 6,6 3,5 2,2 14,7 4,9 32,3 13,6 4,0 2,1 36,3 15,8So Paulo 15,2 5,5 3,6 2,2 12,0 3,4 30,8 11,1 3,8 1,7 34,6 12,8Sul 11,7 5,1 3,4 1,9 13,2 3,0 28,3 10,0 6,9 1,7 35,2 11,7Paran 14,9 5,4 3,9 2,0 16,3 3,2 35,1 10,5 8,6 1,9 43,7 12,4Santa Catarina 12,9 4,8 3,6 1,5 17,0 2,4 33,6 8,8 8,2 1,6 41,8 10,3Rio Grande do Sul 11,0 4,9 3,7 2,1 11,6 3,1 26,2 10,2 6,4 1,6 32,7 11,8Centro-Oeste 14,5 7,7 3,9 2,4 16,0 4,4 34,3 14,4 6,7 2,7 41,0 17,1Mato Grosso do Sul 13,4 6,3 3,7 2,0 15,3 4,7 32,3 12,9 6,3 3,0 38,6 15,9Mato Grosso 12,2 8,9 3,6 2,5 21,7 5,6 37,5 17,1 7,3 4,1 44,8 21,2Gois 14,9 8,3 4,6 2,7 15,6 4,3 35,1 15,4 6,8 2,3 41,9 17,8Distrito Federal 14,5 6,0 2,7 1,8 11,7 2,5 28,9 10,3 5,6 1,5 34,5 11,9Brasil 17,7 7,3 5,4 2,3 24,0 4,3 47,1 14,0 6,6 2,4 53,7 16,4
Fonte: MS/SVS/CGIAE SIM/SNASC
84 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
com o ano anterior. Entre as regies, o Nordeste
foi a que alcanou a maior reduo, com a TMNI
passando de 87,3 bitos por 1.000 NV em 1990,
para 19,0 em 2016, atingindo 78% de reduo no
perodo. Essa reduo anual foi de 7% na dca-
da de 90, de 6% na dcada de 2000, e 4% en-
tre 2011 e 2015. No entanto, em 2016 aumentou
5,6%, quando comparada com a do ano ante-
rior (Figura 3).
Polticas e estratgias de impacto para a reduo da mortalidade infantil
Poltica Nacional de Ateno Bsica (PNAB)
Evidncias mostraram que em 30 pases de alta
renda (2000-2009), os sistemas de sade com
investimentos robustos na ateno primria
sade tm maior capacidade de apresentar
melhores resultados na sade da populao,
com reduo de hospitalizaes desnecess-
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Norte 53 51 50 48 47 45 44 42 41 40 39 38 35 35 33 32 31 30 27 27 25 24 23 22 21 21 22
Nordeste 87 81 75 70 65 60 56 52 48 44 41 38 36 34 32 30 29 27 25 24 22 21 20 19 19 18 19
Sudeste 37 35 33 32 30 29 28 27 25 24 23 22 21 20 19 19 18 17 17 16 16 15 15 14 14 14 14
Sul 35 33 31 30 28 26 25 24 22 21 20 19 19 18 18 17 16 15 15 14 13 13 13 13 12 12 12
Centro-Oeste 41 39 37 36 34 33 31 30 28 27 26 25 24 24 23 22 22 21 20 19 19 18 18 18 18 18 17
Brasi l 54 51 48 45 43 40 38 36 34 32 30 29 27 26 25 24 23 22 21 20 19 18 17 17 16 16 16
00
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
FIGURA 2Taxa de mortalidade neonatal. Brasil e regies, 1990 a 2016
85Desafios da mortalidade infantil e na infncia
rias, alm de menores desigualdades em sa-
de25. Assim, a Ateno Bsica, denominao da
Ateno Primria em Sade no Brasil, merece
um captulo parte frente s muitas conquistas
do SUS. O Programa Agentes Comunitrios de
Sade (ACS) e o Programa/Estratgia de Sade
da Famlia (PSF/ESF) estabeleceram alguns dos
pilares de sustentao SUS26.
A PNAB, lanada em 2006, revisada e atualiza-
da em 2011 e 2017, incorpora inovaes variadas
e necessrias qualif icao da ateno bsica
como ordenadora das redes de ateno. Assim,
este nvel de ateno aproxima os servios de
sade com a comunidade, facilitando o atendi-
mento de suas demandas. Objetiva, tambm,
aprimorar conhecimentos e prticas de cuida-
do, no mbito individual e coletivo, de forma a
assegurar uma ateno abrangente, acolhedo-
ra e resolutiva26.
No Brasil, a ateno bsica est presente em
todo territrio nacional, alcanando mais de 130
milhes de cidados. Sua cobertura tem alcan-
ando patamares de 91 a 98% em alguns esta-
dos das regies Norte e Nordeste, maiores que
a mdia nacional nos ltimos 10 anos, que apre-
sentou variaes entre 64,8% em 2008 e 75,4%
em 2017, conforme se demonstra no box a se-
guir (dados do DAB/SAS/Ministrio da Sade,
referentes a 2018).
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Norte 53 51 50 48 47 45 44 42 41 40 39 38 35 35 33 32 31 30 27 27 25 24 23 22 21 21 22
Nordeste 87 81 75 70 65 60 56 52 48 44 41 38 36 34 32 30 29 27 25 24 22 21 20 19 19 18 19
Sudeste 37 35 33 32 30 29 28 27 25 24 23 22 21 20 19 19 18 17 17 16 16 15 15 14 14 14 14
Sul 35 33 31 30 28 26 25 24 22 21 20 19 19 18 18 17 16 15 15 14 13 13 13 13 12 12 12
Centro-Oeste 41 39 37 36 34 33 31 30 28 27 26 25 24 24 23 22 22 21 20 19 19 18 18 18 18 18 17
Brasi l 54 51 48 45 43 40 38 36 34 32 30 29 27 26 25 24 23 22 21 20 19 18 17 17 16 16 16
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FIGURA 3Taxa de mortalidade na infncia. Brasil e regies, 1990 a 2016
86 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
Rede da Ateno Bsica julho, 2018
5. 468 municpios
42.555 equipes de Sade da Famlia (eSF), implantadas
42, 8 mil Unidades Bsicas de Sade (UBS), distribudas no pas.
63.768 mdicos em atuao nas UBS
263.109 Agente Comunitrio de Sade (ACS), implantados.
26.496 equipes Sade Bucal (eSB).
5.330 equipes de Ncleos Ampliado de Sade da Famlia (AB-NASF).
114 ESF para populao ribeirinhas e 10 em UBS fluviais.
Estratgia de Sade da Famlia
As equipes de Sade da Famlia (eSF) foram
criadas para a reorganizao da Ateno Bsica
do SUS. A eSF composta de no mnimo: um
mdico (especialidade medicina de famlia e
comunidade), um enfermeiro (especialista em
sade da famlia); auxiliar e/ou tcnico de en-
fermagem e o ACS, com outras especialidades,
se necessrio, tambm compondo tal equipe26.
A atual PNAB redefiniu a populao adscrita
a cada equipe de Ateno Bsica ou de Sade
da Famlia para 2.000 a 3.500 pessoas, poden-
do existir outros arranjos locais, conforme vul-
nerabilidades, riscos e dinmica comunitria,
assegurando a qualidade do cuidado26. Tal re-
definio visou garantir a coordenao do cui-
dado, ampliando o acesso e a resolutividade
das equipes.
Observa-se reduo de 4,6% na mortalidade in-
fantil para cada 10% de aumento da cobertura
da Estratgia Sade da Famlia (ESF), um im-
pacto mais significativo do que o de outras in-
tervenes, tais como a ampliao do acesso
gua (2,9%) ou ampliao de leitos hospitalares
(1,3%)24. Assim, as evidncias so positivamente
indiscutveis em relao importncia da ex-
panso da ESF, pois ela amplia a cobertura e o
acesso aos servios de sade para a populao,
especialmente para as famlias que mais neces-
sitam. As contribuies associadas da ESF e do
Programa Bolsa Famlia PBF foram significa-
tivas para a reduo da mortalidade infantil e
do nmero de hospitalizaes desnecessrias.
Portanto, a ESF como porta de entrada para
o SUS resultou em ampliao da oferta das
aes de cuidados bsicos sade da criana,
do acesso vacinao, do apoio ao aleitamen-
to materno e do acompanhamento do cresci-
mento e desenvolvimento.
Ao longo do processo de implementao do
SUS, foram incorporadas vrias iniciativas para
a qualif icao da APS na populao infan-
til, tais como a Ateno Integrada s Doenas
Prevalentes na Infncia (AIDPI), a qual associa-
da a um conjunto de aes desenvolvidas pe-
los estados e municpios, tambm contribuiu
para a reduo da mortalidade infantil. Tal es-
tratgia apresentou uma adequada relao
custo/benefcio para diminuir a carga de doen-
as e para melhorar as condies de sade da
87Desafios da mortalidade infantil e na infncia
criana. Por isso, passou tambm a se integrar
ao Subsistema de Ateno Sade Indgena
(SasiSUS), a partir de 2015, contribuindo de for-
ma mais efetiva para a reduo da mortalida-
de de crianas indgenas, que no decorrer da
dcada 2000, apresentava um coeficiente duas
vezes maior que das demais crianas brasileiras.
Da mesma forma, a Estratgia Amamenta e
Alimenta Brasil (EAAB) foi estabelecida para
qualif icar as aes de promoo do aleitamen-
to materno e da alimentao complementar
saudvel para crianas menores de dois anos
de idade, tendo como principal objetivo a for-
mao de profissionais da ateno bsica27.
Assim, entre 1996 a 2016, houve queda acentua-
da da taxa de mortalidade por causas evitveis,
como consequncia das aes de imunizao,
da ateno adequada mulher, do cuidado do
recm-nascido, alm de aes de promoo
sade vinculadas ateno bsica.
Poltica Nacional de Aleitamento Materno
O aleitamento materno recomendado pela
Organizao Mundial de Sade (OMS), por dois
anos ou mais, sendo exclusivo nos primeiros seis
meses de vida. Desde a dcada de 80, entre todas
as estratgias adotadas para a reduo da mor-
talidade infantil, a amamentao foi a que reuniu
o maior nmero de evidncias para salvar vidas
e para o desenvolvimento saudvel da criana.
So vrias as evidncias disponveis de benefcios
positivos do aleitamento materno na preveno
da diarreia, de infeces respiratrias e de otite
mdia, e de doenas infecciosas. A amamenta-
o diminui a mortalidade por causas tais como
a enterocolite necrotizante, a sndrome da morte
sbita na infncia, entre outras, conferindo ainda
proteo contra infeces infantis, m ocluso,
excesso de peso e diabetes, influindo at mesmo
no aumento na inteligncia28.
O incentivo ao aleitamento materno vem se
mantendo ao logo dos anos na agenda de prio-
ridades da gesto nacional do SUS, mediante
um conjunto de estratgias, iniciativas, fomento
s pesquisas, campanhas de mobilizao e boas
prticas. Em 2012, a 56 Assembleia Mundial da
Sade estabeleceu a meta de aumentar pelo
menos em 50% a amamentao exclusiva nos
primeiros 6 meses de vida at 202528.
Entre as medidas sintonizadas esto o Banco
de Leite Humano (BLH) e a Iniciativa Hospital
Amigo da Criana (IHAC), aplicadas aos servi-
os especializados na promoo e no apoio ao
aleitamento materno na primeira hora, alm de
realizarem intervenes oportunas para a aten-
o ao recm-nascido, de baixo peso ao nascer,
grave ou potencialmente grave.
Assim no perodo de 1999 a 2008, houve me-
lhoria importante nos indicadores de aleita-
mento materno no Pas. Dados da II Pesquisa
de Prevalncia do Aleitamento Materno (2008)
revelaram o aumento da prevalncia de aleita-
mento materno exclusivo (AME) em menores
de quatro meses nas capitais brasileiras, de
35,5%, em 1999, para 51,2% em 2008. Ademais,
esses dados mostraram que 67,7% do total de
34.366 crianas estudadas mamaram na pri-
meira hora de vida, com variaes de 58,0% a
83,5% nas capitais29.
88 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
Bancos de Leite Humano
Desde a dcada de 80, os Bancos de Leite
Humano (BLH) vm sendo implementados em
todo o territrio nacional, em estabelecimen-
tos hospitalares e maternidades. O BLH agrega
tecnologias de baixo custo e de grande impac-
to para a sobrevida dos bebs prematuros e de
baixo peso internados nas unidades neonatais
do Brasil, que no conseguem sugar o peito de
suas prprias mes. Diminui, tambm, a des-
nutrio e a mortalidade infantil, eventos asso-
ciados aos efeitos do desmame precoce30, 31. Em
2017, os BLH realizaram 393.625 atendimentos
em grupo; 1.876.724 atendimentos individuais e
279.105 visitas domiciliares. Os Postos de Coleta
atenderam 182.289 doadoras e 197.590 recepto-
ras de leite humano em todo o Pas 32.
Em 2016, dos 220 BLH ativos no Brasil, 91% in-
gressaram no processo de certif icao, dos
quais 93% alcanaram o padro Ouro. Em 2018,
220 BLH e 199 Postos de Coleta continuavam
em funcionamento e 29 deles se constitu-
ram como Centros de Referncias de BLH. Os
BLH de Braslia (Distrito Federal) e de Ribeiro
Preto (So Paulo) foram certificados como
autossuficientes32.
Em nvel global, 25 redes de BLH esto pre-
sentes em 23 pases da Amrica Latina, Caribe
Hispnico, Pennsula Ibrica e pases da frica
de lngua portuguesa realizando aes que
qualif icam a ateno neonatal em termos de
segurana alimentar e nutricional32, 33.
QUADRO 5Dez passos para o sucesso do aleitamento materno
Passo 1 Instituir uma poltica de aleitamento materno escrita disseminada para toda a equipe de cuidados de sade.
Passo 2 Capacitar toda a equipe de cuidados de sade nas prticas necessrias para implementar esta poltica.
Passo 3 Informar todas as gestantes sobre os benefcios e o manejo do aleitamento materno
Passo 4 Ajudar as mes a iniciar o aleitamento materno na primeira meia hora, aps o nascimento (contato pele a pele e medidas para fortalecer o vnculo).
Passo 5 Mostrar s mes como amamentar e como manter a lactao mesmo se vierem a ser separadas dos filhos
Passo 6 No oferecer a recm-nascidos bebida ou alimento que no seja o leite materno, a no ser que haja indicao mdica e/ou de nutricionista.
Passo 7 Praticar o alojamento conjunto permitir que mes e recm-nascidos permaneam juntos (24 horas por dia).
Passo 8 Incentivar o aleitamento materno sob livre demanda.
Passo 9 No oferecer bicos artif iciais ou chupetas a recm-nascidos e lactentes.
Passo 10 Promover a formao de grupos de apoio amamentao e encaminhar as mulheres mes aos grupos ou outros servios de apoio amamentao, aps a alta, e estimular a formao e a colaborao de grupos ou servios.
Fonte: UNICEF. Situao Mundial da Infncia. 2008. Disponvel em: < http://www.unicef.pt/docs/situacao_mundial_da_infan-cia_2009.pdf > Acesso em 16 fev 2018.
89Desafios da mortalidade infantil e na infncia
Iniciativa Hospital Amigo da Criana IHAC
Em 1992, o Brasil aderiu Iniciativa Hospital
Amigo da Criana (IHAC) com o credenciamen-
to do primeiro hospital pblico; dois anos de-
pois tambm de hospitais privados. Assim, nas
duas ltimas dcadas, a IHAC vem difundindo
os dez passos para o sucesso do aleitamento
materno, conforme mostrado no Quadro 5. Em
2018 j estavam habilitados 324 IHAC em todo o
pas, alm de 49 habilitados no cuidado da mu-
lher. Em 2014, dos quase trs milhes de nas-
cimentos ao ano no Pas, 27,0% ocorreram em
estabelecimentos credenciados IHAC, pblicos
e privados17.
Estudos realizados em capitais e municpios
brasileiros demonstram a contribuio de tal
iniciativa para a melhoria dos indicadores de
aleitamento materno no Pas, e para a conse-
quente reduo dos bitos infantis34.
Rede de Sade Materno Infantil (Rede Cegonha)
A Rede Cegonha foi lanada em 2011 com o
objetivo de aprimorar os cuidados materno-in-
fantis para assegurar o direito ao planejamen-
to reprodutivo, a uma ateno humanizada
gravidez, ao parto, e ao puerprio, bem como
assegurar s crianas o direito ao nascimento
seguro e ao crescimento e desenvolvimento
saudveis13.
A Rede Cegonha tem aes em 5.488 muni-
cpios, entre elas se destacando a os Centros
de Parto Normal (CPP), as Casas da Gestante
da Purpera e do Beb, alm dos leitos para
Gestante de Alto Risco (GAR), que passaram de
74 em 2013 para 1.679 em 2018. Dentro do mes-
mo campo, os leitos neonatais tambm apre-
sentaram um aumento significativo em todas
as modalidades, conforme mostra a Figura 4
(CNES).
As anlises da TMI, entre 1987 e 1997, mostraram
que aproximadamente 60% das mortes infan-
tis no Brasil foram devidas a causas perinatais,
cerca de dez vezes maiores do que nos pases
desenvolvidos35. Essas evidncias mostraram
a importncia do acompanhamento pr-na-
tal para a identificao de problemas e riscos
em tempo oportuno, para realizar intervenes
adequadas e salvar vidas.
Os resultados da Pesquisa Nacional de
Demografia e Sade (PNDS) de 1996 e de 2006,
mostraram que, nesse perodo, a cobertura
pr-natal aumentou em todo pas, passando
de 85,7% para 98,7%, o que representa um indi-
cador importante da ampliao do acesso aos
servios de sade. Este aumento foi mais ex-
pressivo nas regies Norte e Nordeste, onde a
variao foi de 81,4% para 96,1% e de 73,9% para
97,9%, respectivamente. Este estudo tambm
demostrou uma maior proporo de mulheres
iniciando o pr-natal no primeiro trimestre da
gravidez (77,4% em 1996 e 83,6% em 2006) 2.
Nos anos recentes, este indicador monitorado
com os dados do SINASC. No perodo de 2000
a 2015, 63,0% das mulheres receberam sete ou
mais consultas de pr-natal durante suas ges-
90 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
taes, revelando um aumento de 43,0%. Em
2017 este percentual passou para 69,3%, o que
corresponde um aumento de 17% para o pero-
do de 2010-2017.(Figura 5).
A Rede Cegonha incorpora as aes do Pacto
pela Reduo da Mortalidade Infantil no
Nordeste e Amaznia Legal (2009 2010), que
tem por objetivo reduzir desigualdades regio-
nais, intensificar as aes para a reduo da
mortalidade em menores de um ano, e fortale-
cer a ateno sade da mulher e da criana. Os
objetivos de tal Pacto foram convergentes com
os da Rede Cegonha, promovendo mudanas
na gesto e no modelo de ateno ao parto e
nascimento, articulando tambm os pontos de
ateno perinatal, com o incio da linha de cui-
dado na ateno bsica e vinculao aos servi-
os de referncia para os cuidados materno e
infantil (maternidades e casas de parto)9.
Outro problema neste campo a alta frequn-
cia de partos cesreos no pas36. Ele foi enfren-
tado pela Rede Cegonha, mas mesmo com as
medidas de acompanhamento ao pr-natal e
estmulo humanizao do parto e nascimen-
to, continuou em alta, atingindo o maior pico
em 2014 (57%), mantendo-se prximos a este
valor nos anos seguintes (SINASC) (Quadro 4).
2013 2014 2015 2016 2017 2018GAR 74 283 588 627 1252 1679
UCINCO 245 1208 1458 2176 2581 2655UCINCA 82 353 460 633 749 781UTI_NEO II e III 1573 3498 3755 4334 4535 4603
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
3500
4000
4500
5000
FIGURA 4Tipos de Leitos Materno e Infantil, Rede Cegonha, 2013 a 2018
Fonte: CNES, ago 2018.
91Desafios da mortalidade infantil e na infncia
60,60%61,30% 61,70%
62,40%
64,60%
66,50%
67,70%
69,30%
56,00%
58,00%
60,00%
62,00%
64,00%
66,00%
68,00%
70,00%
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017
FIGURA 5Percentual (%) de 7 consultas pr-natais e mais, no perodo de 2010 2017, Brasil
SINASC, 2017/2018 dados preliminares.
Mtodo Canguru
O Mtodo Canguru tem sido uma das principais
estratgias de interveno utilizadas pelo SUS
para a qualif icao da ateno humanizada ao
recm-nascido. O mtodo incorpora tecnolo-
gias simples e prticas humanizadas na unida-
de de terapia intensiva neonatal com finalidade
de garantir a sobrevida de bebs pr-termo ou
gravemente enfermos. Este mtodo teve papel
relevante na reduo da mortalidade infantil no
componente neonatal, tanto tardia como pre-
coce 37.
Em 2012, o Mtodo Canguru ganhou impor-
tante reforo com a organizao da ateno ao
recm-nascido grave ou potencialmente grave,
atravs de seu alinhamento com as aes da
Rede Cegonha e a ampliao e a requalif icao
de leitos de unidade neonatal. Essas unidades
foram dotadas de estruturas assistenciais com
suficientes condies tcnicas para a prestao
de assistncia especializada, com instalaes
fsicas, equipamentos e recursos humanos,
organizados sob a forma de linha de cuidado
para atender s necessidades do recm-nasci-
do e da famlia. Esses leitos foram classificados
em Unidades de Terapia Intensiva Neonatal
(UTIN) e de Cuidado Intermedirio Neonatal
(UCIN). O cuidado intermedirio ofereci-
do nas Unidades de Cuidado Intermedirio
Neonatal Convencional (UCINCo) e de Cuidado
Intermedirio Neonatal Canguru (UCINCa)38.
Os leitos neonatais no Brasil apresentaram
um aumento significativo. Os leitos do Mtodo
Canguru (UCINCa) passaram de 82 para 781, de
2013 para 2018, um aumento de mais de 800%
(CNES, 2018).
92 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
QUADRO 4Tipo de Parto, segundo ano e NV vlidos, Brasil (1996 2017).
Ano do Nasci -mento
Vaginal Cesrio No infor-mado Ignorado Total
N Total de NV
validos % Per centual
% Cesrea Reduo de Cesrea
1996 1.723.495 1.185.008 10.457 26.465 2.945.425 2.908.503 40,74%
1997 1.792.614 1.205.847 8.766 19.431 3.026.658 2.998.461 40,22% -0,53%
1998 1.923.665 1.200.402 8.725 15.245 3.148.037 3.124.067 38,42% -1,79%
1999 2.026.461 1.201.500 11.493 16.979 3.256.433 3.227.961 37,22% -1,20%
2000 1.974.790 1.211.494 6.344 14.133 3.206.761 3.186.284 38,02% 0,80%
2001 1.910.541 1.186.204 8.369 10.360 3.115.474 3.096.745 38,30% 0,28%
2002 1.867.185 1.182.238 3.816 6.163 3.059.402 3.049.423 38,77% 0,46%
2003 1.814.987 1.213.842 3.100 6.322 3.038.251 3.028.829 40,08% 1,31%
2004 1.756.180 1.263.634 2.646 4.088 3.026.548 3.019.814 41,84% 1,77%
2005 1.717.970 1.311.689 2.610 2.827 3.035.096 3.029.659 43,29% 1,45%
2006 1.613.318 1.325.781 5.298 531 2.944.928 2.939.099 45,11% 1,81%
2007 1.542.359 1.343.733 4.114 1.122 2.891.328 2.886.092 46,56% 1,45%
2008 1.510.879 1.419.745 3.906 298 2.934.828 2.930.624 48,45% 1,89%
2009 1.436.062 1.441.692 3.502 325 2.881.581 2.877.754 50,10% 1,65%
2010 1.362.287 1.496.034 3.479 68 2.861.868 2.858.321 52,34% 2,24%
2011 1.340.324 1.565.564 7.159 113 2.913.160 2.905.888 53,88% 1,54%
2012 1.283.546 1.615.928 6.154 161 2.905.789 2.899.474 55,73% 1,86%
2013 1.253.726 1.644.557 5.612 132 2.904.027 2.898.283 56,74% 1,01%
2014 1.277.175 1.697.954 3.970 160 2.979.259 2.975.129 57,07% 0,33%
2015 1.339.673 1.674.058 3.809 128 3.017.668 3.013.731 55,55% -1,52%
2016 1.272.411 1.582.953 2.344 92 2.857.800 2.855.364 55,44% -0,11%
2017 1.289.029 1.624.115 3.259 149 2.916.552 2.913.144 55,75% 0,31%
Fonte: Sistema de Informaes sobre Nascidos Vivos (SINASC) 2017/2018 Preliminares
93Desafios da mortalidade infantil e na infncia
Programas de Proteo Social: Bolsa Famlia
O Programa Bolsa-Famlia (PBF), considerado
como o maior programa de transferncia de
renda do mundo, permitiu articular iniciativas
entre as reas de educao, sade, desenvolvi-
mento social, e outras, em um nico programa
enfocado nos grupos sociais mais vulnerveis 24.
No incio de 2004, a unificao de programas
sociais, como o Bolsa Escola, Bolsa Alimentao,
Auxlio Gs, entre outros incentivos, favoreceu a
diminuio da pobreza e fomentou a maior uti-
lizao dos servios ofertados s famlias pelo
SUS, desde que atendessem a condicionalida-
des exigidas no programa. As famlias benefi-
ciarias do PBF devem apresentar o carto de
vacinao e do crescimento e desenvolvimen-
to das crianas menores de sete anos atualiza-
dos, as grvidas e os lactantes devem realizar as
consultas de pr-natal e de acompanhamento
de sade da criana, entre outras condicionali-
dades 39.
Desde a instituio do PBF tm sido realizados
um conjunto de estudos com o objetivo de ob-
servar diferentes aspectos e desfechos que po-
dem ser atribudos aos programas de proteo
social. Estudo realizado pelo IPEA24 demonstrou
que o PBF foi responsvel por uma reduo de
21% na desigualdade, entre 1995 e 2004. Houve
uma reduo gradual das desigualdades, em
reas metropolitanas, que pode ser atribuda
aos programas de transferncia de renda e au-
mento do salrio das populaes mais pobres.
Outro estudo, realizado com o objetivo avaliar
o efeito do PBF na incidncia do baixo peso ao
nascer, revelou que a incidncia deste evento
em filhos de mulheres do mesmo extrato de
renda (menor que R$ 70 por ms) e afiliadas ao
PBF foi menor que naqueles de mulheres que
no tinham cobertura do Programa, no mesmo
estrato de renda. Assim, parece que o PBF pode
ter um papel protetor que reduz o risco de bai-
xo peso ao nascer40. Por fim, um estudo do im-
pacto do Programa demonstrou sua contribui-
o na reduo de 20% na taxa de mortalidade
infantil no Brasil entre 2004 e 2009. Nos casos
de bitos por desnutrio e problemas respira-
trios, a queda chegou a 60% em famlias per-
tencentes ao PBF 39.
Apesar de muitos progressos, as inequidades
socioeconmicas e regionais permanecem no
cenrio brasileiro, mostrando que ainda persis-
tem desafios que demandam polticas, estra-
tgias e iniciativas para melhorar as condies
bsicas de vida para parte da populao sob ris-
co41, como indgenas, quilombolas, populaes
ribeirinhas, entre outras.
94 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
Sustentabilidade: sade materna e infantil
Agenda 2030
O compromisso do Estado Brasileiro com a
Sade Pblica est formalizado nos artigos 196
a 200, da Constituio Federal, de 1988, no qual
se registra, a sade direito de todos e dever
do Estado, garantido mediante polticas sociais
e econmicas que visem reduo do risco de
doena e de outros agravos e ao acesso univer-
sal e igualitrio s aes e servios para sua pro-
moo, proteo e recuperao6.
Nesses ltimos trinta anos, o SUS sofreu vrias
crises de financiamento, que dificultaram a
universalizao do acesso aos servios de sa-
de para todos os brasileiros com equidade, com
capacidade tecnolgica e recursos humanos
suficientemente qualif icados para se manter
como um sistema de sade robusto e univer-
salizado, capaz de prover tratamento adequa-
do, prevenir doenas e promover a sade da
populao.
Atualmente, o as medidas de austeridade fis-
cal, propiciadas pela Emenda Constitucional
no.95 de 2016, somadas aos efeitos da Medida
Provisria (MP) n 839, de 2018, podem certa-
mente interferir na oferta de ateno sade
com qualidade, eficcia e equidade, pelo risco
de subtrao de recursos destinados ao SUS e a
programas de proteo social 42, 43, 44.
Tal situao cria incertezas e coloca em risco as
conquistas de reduo da TMI alcanadas em
2015. Os dados de 2016 recentemente divul-
gados pelo Ministrio da Sade revelaram um
aumento na taxa de mortalidade neonatal e do
grupo de 1 a 4 anos de idade4.
Um estudo de simulao de cenrios prospecti-
vos relacionados aos efeitos da austeridade fis-
cal na mortalidade em menores de cinco anos
no Brasil entre 2017 a 2030 refora a preocupa-
o com os dados de mortalidade de 2016. De
acordo com o estudo, a manuteno dos nveis
de proteo social, por meio das coberturas do
PBF e ESF, poderia reduzir a mortalidade em
crianas menores de cinco anos em 8,6%. Em
contrapartida, sob a vigncia das medidas de
austeridade fiscal observou-se um cenrio de
menor reduo da mortalidade neste grupo
etrio45.
Os dados mostram uma preocupao e de-
mandam intervenes prioritrias dos gover-
nos, considerando que a TMI um indicador
sensvel para medir o estado de sade e as con-
dies de vida, alm da eficcia dos servios de
sade. As atuais restries oramentrias so
sabidamente prejudiciais sade e deveriam
passar pela busca de solues para limitar seus
impactos, principalmente sobre crianas de
grupos sociais menos privilegiados.
95Desafios da mortalidade infantil e na infncia
Nesse sentido, aguarda-se a divulgao de da-
dos mais recentes para avaliar se o aumento
da mortalidade infantil em 2016 foi um evento
isolado, atpico ou decorrente das injunes do
financiamento. De qualquer modo, o aumento
desse indicador deve ser analisado com caute-
la, considerando a crise econmica que vem,
desde meados de 2014, ocasionando altas taxas
de desemprego, recuo do PIB, sem acrescen-
tar recursos novos sade pblica, bem como
a situao de emergncia nacional em sade
pblica, estabelecida entre novembro de 2015
a maio de 2017, que pode ter tido influncia no
aumento de bito de crianas menores de um
ano. Alm disso, eventos epidemiolgicos, a
exemplo da epidemia pelo vrus Zika que levou
a uma reduo da natalidade, e a diminuio
dos nveis de proteo social podem estar in-
fluindo no cenrio.
Nos ltimos 30 anos as lies aprendidas sobre
a sade das crianas foram inmeras e podem
ser teis para corrigir rumos e obter ganhos
em escala com as medidas adotadas. O lega-
do dos ODM um referencial importante, que
facilita decises para proteger os avanos obti-
dos e alcanar metas no cumpridas, refletidas
nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentvel
(ODS). Por isso, o Brasil precisa manter o rit-
mo de queda de 4,0% ao ano da TMI, para que
possa reduzi-la em 43,4%, no perodo de 2016 a
2030. Esse esforo permitir que o pas alcan-
ce uma TMI de 7,2 por 1.000 NV, em 2030, com
taxas entre 5,5 e 10,1 por 1.000 NV em todas as
unidades da federao46.
Os indicadores acordados nos ODS (Quadro 6)
exigem uma clara prioridade dos governos fe-
deral, estaduais e municipais para implemen-
tar polticas e programas existentes e adotar
novas estratgias para manter o ritmo de que-
da da TMI. O Pas deve investir em programas
intersetoriais, com a finalidade de internalizar,
difundir e dar transparncia ao processo de im-
plementao da Agenda 203047, como mostra-
do nos boxes a seguir.
Metas ODS projetada pelo Brasil
At 2030, prevenir as mortes de recm-nascidos, reduzindo em 40% a mortalidade neonatal por 1.000 nascidos vivos.
At 2030, prevenir as mortes de crianas menores de 5 anos em 45% a mortalidade por 1.000 nascidos vivos46.
Metas ODS Mundial
At 2030, acabar com as mortes evitveis de recm-nascidos, reduzindo a mortalidade neonatal para pelo menos at 12 por 1.000 nascidos vivos.
At 2030, acabar com as mortes evitveis de crianas menores de 5 anos, para pelo menos at 25 por 1.000 nascidos vivos48.
96 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
QUADRO 6Objetivos e Metas dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentvel (ODS) Sade da Criana.
OBJETIVO 2. Acabar com a fome, alcanar a seguran-
a alimentar e melhoria da nutrio e promover a agricultura sustentvel
At 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as pessoas, em particular os pobres e pessoas em situaes vulnerveis, incluindo crianas, a alimentos seguros, nutritivos e suficientes durante todo o ano
At 2030, acabar com todas as formas de desnutrio crnica e desnutrio em crianas menores de cinco anos de idade (meta, at 2025), e atender s necessidades nutricionais de meninas adolescentes, mulheres grvidas e lactantes e pessoas idosas.
OBJETIVO 3. Assegurar uma vida saudvel e promover o bem-estar para todos,
em todas as idades
At 2030, acabar com as mortes evitveis de recm-nascidos, reduzindo a mortalidade neonatal para pelo menos at 12 por 1.000 nascidos vivos
At 2030, acabar com as mortes evitveis de crianas menores de 5 anos, para pelo menos at 25 por 1.000 nascidos vivos.
At 2030, reduzir em um tero a mortalidade prematura por doenas no transmissveis, por meio de preveno e tratamento, e promover a sade mental e o bem-estar.
At 2030, assegurar o acesso universal aos servios de sade sexual e reprodutiva, incluindo o planejamento familiar, informao e educao, bem como a integrao da sade reprodutiva em estratgias e programas nacionais.
OBJETIVO 4. Assegurar a educao inclusiva e
equitativa de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao lon-
go da vida para todos
At 2030, garantir que todas as meninas e meninos completem o ensino primrio e secundrio livre, equitativo e de qualidade, que conduza a resultados de aprendizagem relevantes e eficazes.
At 2030, garantir que todos os meninos e meninas tenham acesso a um desenvolvimento de qualidade na primeira infncia, cuidados e educao pr-escolar, de modo que estejam prontos para o ensino primrio.
Fonte: 70 Anos ONU forte. Um mundo melhor. Objetivos do Desenvolvimento Sustentvel. Disponvel em:< http://www.itamaraty.gov.br/images/ed_desenvsust/ODSportugues12fev2016.pdf.> Acesso 21 fev 2018.
A manuteno e fortalecimento dos programas
de proteo social, como o PBF, o Benefcio de
Prestao Continuada (BPC) e ESF, so extre-
mamente necessrios. Da mesma forma, a im-
plementao de polticas pblicas com aloca-
o suficiente de recursos essencial para se
enfrentar os novos desafios e garantir a susten-
tabilidade ds polticas. Referncia obrigatria
para tanto o Marco da Primeira Infncia, que
prope avanos no Estatuto da Criana e do
Adolescente e nas metas pactuadas e aprova-
das nas instncias consultivas e deliberativas do
SUS. No setor sade, por exemplo, destacam-se
a Poltica Nacional de Ateno Integral Sade
da Criana e seus eixos estratgicos (Quadro 7),
alm de medidas de fortalecimento das Redes
de Ateno em Sade, especialmente da rede
de Ateno Primria em Sade.
97Desafios da mortalidade infantil e na infncia
http://www.itamaraty.gov.br/images/ed_desenvsust/ODSportugues12fev2016.pdfhttp://www.itamaraty.gov.br/images/ed_desenvsust/ODSportugues12fev2016.pdf
QUADRO 7Matriz dos eixos estratgicos: aes, estratgias e iniciativas da Poltica Nacional de Ateno Integral Sade da Criana (PNAISC).
Eixos estratgicos Aes, estratgias e iniciativas
Ateno humanizada e qualif icada gestao, ao parto, ao nascimento e ao recm-nascido; Preveno da transmisso vertical do HIV e da sfilis; Ateno humanizada e qualif icada ao parto e ao recm-nascido Ateno humanizada ao recm-nascido prematuro e de baixo peso, Mtodo Canguru; Qualificao da ateno neonatal, materna, neonatal e infantil, Alta qualif icada do recm-nascido com vinculao Ateno Bsica, Seguimento do recm-nascido de risco ateno especializada e a Ateno Bsica; e Triagens neonatais universais.
Aleitamento materno e alimentao complementar saudvel
EAAB Estratgia Amamenta Alimenta Brasil IHAC Iniciativa Hospital Amigo da Criana BLH Banco de Leite Humano
MTA Mulher Trabalhadora que Amamenta Norma Brasileira de Comercializao de Alimentos para Lactentes, para Crianas de Primeira Infncia, Bicos Chupetas e Mamadeiras (NBCAL);
Mobilizao social em aleitamento materno.
Promoo e acompanhamento do crescimento e do desenvolvimento integral
Caderneta de Sade da Criana Crescimento e DPI pela Ateno Bsica Sade; Comit de Especialistas e de Mobilizao Social da Primeira Infncia, Plano Nacional pela Primeira Infncia.
Ateno integral a crianas com agravos prevalentes na infncia e com doenas crnicas
Ateno Integrada s Doenas Prevalentes na Infncia (AIDPI); Diretrizes de ateno e linhas de cuidado para crianas com doenas crnicas; e
Ateno internao domiciliar.
Ateno integral criana em situao de violncias, preveno de acidentes e promoo da cultura de paz
Organizao e qualif icao dos servios especializados para o atendimento a situaes de violncia sexual
Linhas de cuidado para situaes de violncia Preveno de acidentes, violncias e promoo da cultura de paz; e Protocolos, planos e outros compromissos sobre o enfrentamento s violaes de direitos da criana.
Assim, atravs de dilogo entre o Estado e a
sociedade civil se deve promover reflexes
sobre os direitos sade estabelecidos na
Constituio Federal de 1988, com consequen-
te proteo e fortalecimento do Sistema nico
de Sade. O que j foi alcanado em relao
reduo da mortalidade infantil deve ser um
importante subsdio a tal dilogo.
Agradecimentos. O presente trabalho foi rea-
lizado com o apoio de Haydee Padilla, Tatiana
Coimbra e Renato Tasca.
Julio Sarez e Enrique Vzquez foram os re-
visores deste, de acordo com os preceitos do
Comit Editorial da OPAS/OMS Brasil.
98 Relatrio 30 anos de SUS, que SUS para 2030?
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