cosmos de sagan - universidade de coimbra

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calar algarismos, numa tabela de senosque preparou). O papel dele só não émaior na história da ciência porque, co-locado entre Copérnico e Galileu, con-tinuou a professar as ideias geocêntricasde Ptolomeu, contrariando, tal como aigreja oficial, as ideias novas de Copér-nico, alicerçadas entretanto pelas obser-vações de Galileu.

O calendário gregoriano, preparado porClavius e aprovado por Gregório, é hojepraticamente universal. De m o rou al-gum tempo a ser aceite. Se o papa tivessedecretado a reforma do calendário algunsanos antes, o alcance da mudança teriasido no imediato muito maior. Mas, en-tretanto, tinha havido a reforma da igre-ja (note-se, de passagem, que Lutero tra-tou tão mal Copérnico quanto a igrejaromana!). Assim, só em 1752 a Inglater-ra e as suas colónias na América do Nor-te aceitaram o novo calendário (o buracoinglês teve de ser de onze dias e não dedez, porque o tempo tinha avançado). AAlemanha protestante fez o mesmo deforma completa só em 1755, o ano doterramoto em Lisboa. O Japão em 1873.A Rússia em 1917, na altura da sua revo-lução. Finalmente, a China só aceitou ocalendário gregoriano em 1949, comMao Tse Tung. O calendário só não éu n i versal porque a Ig reja Ort o d ox aOriental tem votado repetidamente arejeição do calendário gregoriano, con-servando o anterior.

O calendário gregoriano manteve-se ealargou-se mas será eterno? Esta é umapergunta a que só o tempo poderá res-ponder...

C. F.

O COSMOS DE SAGAN

"Cosmos",Carl Sagan,versão original (ilustrada),Gradiva,2001.

"As Ligações Cósmicas.Uma PerspectivaExtraterrestre",Carl Sagan,versão original (ilustrada),Gradiva,2001.

Carl Sagan está de volta com reediçõesem português de dois dos seus livrosmais importantes: "Cosmos" e "As Liga-ções Cósmicas: Uma Perspectiva Extra-

terrestre". São duas obras saídas antes doNatal – a época das prendas – na editoraGradiva, de quem Carl Sagan é um autorsímbolo. Parabéns ao editor da Gradiva,Guilherme Valente, o qual, se outrosmotivos não houvesse (e há!), ficará nahistória editorial portuguesa como o ho-mem que publicou Sagan na nossa lín-gua.

Levado por um cancro, Sagan já não estáinfelizmente entre nós. Mas continuaconnosco através dos livros e dos filmesque nos deixou. Um livro é sempre a vozde um autor que perdura. Sagan afirma--o de forma sublime em "Cosmos":

Um livro é feito de uma árvore. É um con-junto de partes lisas e flexíveis (que aindase chamam folhas) impressas em caracteresde pigmentação escura. Dá-se uma vista deolhos e ouve-se a voz de uma outra pessoa– talvez alguém que já tenha morrido hámilhares de anos. Através dos milénios, oautor está a falar, com clareza e em silên-cio, dentro da nossa cabeça, directamentepara nós. (...) Os livros quebram as cadeiasdo tempo, provam que os seres humanos sãocapazes de exercer magia (do capítulo XI,"A persistência da memória").

Pois é de pura magia que se trata quandoo astrofísico norte-americano nos apre-senta o Cosmos, desde a Terra que pi-samos até aos "biliões e biliões" de estre-las a muitos anos-luz de nós. É essa dis-tância enorme entre a Terra e o céu queSagan tenta encurtar, comunicando-nosque somos filhos das estrelas (Devemos anossa obrigação de sobreviver não só a nóspróprios, mas ao Cosmos, vasto e antigo, deonde despontámos, nas palavras finais dolivro) e que somos a maneira que asestrelas "inventaram" para se compreen-derem a si mesmas (Somos a encarnaçãolocal de um Cosmos que toma consciênciade si próprio).

A Terra é decerto um pequeno pontomas nele, devido à inteligência humana,pode tocar-se o infinito. Sagan ensaioudar-nos uma "perspectiva extraterrestre"da Terra e do homem através de expe-riências efectuadas por sondas da NASAno espaço. Assim, para melhor realçar a

LIVROS E MULTIMÉDIA

insignificância no Cosmos do planetaTerra, conseguiu que uma câmara dasonda Voyager, na periferia do sistemasolar, fosse orientada para a Terra. Vistosde longe, não passamos, de facto, de umminúsculo "ponto azul claro". Um pon-to na imensa vastidão do universo... E,para melhor revelar a quase inexpressãocósmica da acção humana na Terra, con-seguiu que as câmaras da sonda Galileo,a caminho de Júpiter, fossem apontadaspara a Terra procurando vida inteligente.Só foram encontrados modestos vestí-gios... Estas duas observações foram di-vulgadas "urbi et orbi" pela comuni-cação social. Por exemplo, o título "Des-cobrerta vida inteligente na Terra" fezfuror.

Como poucos cientistas, Sagan conse-guiu fazer chegar a ciência ao público.Foi um astrofísico eminente, com cercade 500 publicações em revistas científi-cas (incluindo 37 na "Science" e 30 na" Na t u re", as duas revistas de maiorprestígio e onde é mais difícil publicar).Foi director científico no programa devárias décadas da NASA dedicado à ex-ploração do sistema solar. Mas, ao mes-mo tempo, conseguiu alcançar "biliões ebiliões" de leitores através da re v i s t a"Parade", um suplemento dominical in-cluído em muitos jornais norte-ameri-canos. Entrou por nossas casas dentroatravés da televisão. Ocupou as nossasbibliotecas com os seus livros, incluindotodos aqueles que a Gradiva publicou emportuguês. Escreveu um romance de fic-ção científica, "Contacto". Conseguiujuntar a NASA e Hollywood para ficarna nossa memória colectiva (quem nãorecorda o filme "Contacto", com JodieFoster?).

Depois de Sagan e por causa de Sagan,para o comum dos cidadãos o mundo jánão é o mesmo. O mundo tornou-semaior e nós tornámo-nos, com isso,também maiores!

C. F.

A FÍSICA DA AREIA

"A Física de um saco de berlindes",um filme com Pierre de Gennes,premiadono Festival "Teleciência" de 2001.

No âmbito da Semana da Cu l t u r aCientífica, uma excelente iniciativa doMinistério da Ciência e Tecnologia daUn i versidade de Coimbra, re a l i zo u - s eum pouco por todo o país o "Teleciên-cia" - Festival de Filme Científico, orga-nizado pela Un i versidade de Trás osMontes e Alto Douro. Os mais recentesfilmes científicos de todo o mundoestiveram à disposição do público, emparticular o mais jovem.

Por exemplo, o moderno anfiteatro daEscola Superior de Educação de Viseurecebeu mais de quatrocentos alunos deescolas secundárias para verem um filmede Física, sobre as propriedades físicas daareia, e outro de Biologia, sobre a origemda vida. O filme de Física intitulava-sesugestivamente "A Física de um saco deberlindes", uma vez que a areia da praiaou do deserto é formada por grãos de vá-rios tamanhos à semelhança de um sacode berlindes infantil. O "actor principal"do filme é o francês Pierre de Gennes,Prémio Nobel da Física de 1991 peloconjunto dos seus trabalhos de Física daMatéria Condensada incluindo os mate-riais granulares como a areia (ou ocimento, o arroz, a farinha, etc.)

De Gennes, como vários outros prémiosNobel, gosta de ir às escolas partilharcom os jovens o seu entusiasmo pela ci-ência. E que fazia ele nas imagensmostradas aos alunos de Viseu? Algoe x t r a o rdinariamente simples: ro d e a d opor um grupo de alunos do secundário(que organizaram na sua escola um Mu-seu da Areia), fazia um monte de areia,tal e qual uma criança que brinca napraia. E que tem a Física a dizer sobre osmontes de areia?

Pode parecer algo de trivial sobre o qualnão há nada a dizer, mas a areia é ummaterial extremamente complexo sobreo qual só recentemente, por meio de ex-periências reais e computacionais (simu-lações), se sabe alguma coisa.

Passam-se coisas estranhas com a areia:por um lado é dura como um sólido(podemos aleijar-nos se cairmos na areia)mas por outro lado, quando cai para for-mar um monte, assemelha-se a um líqui-do e, quando é soprada pelo vento, asse-melha-se a um gás. Não cabe, portanto,nas categorias habituais de classificaçãoda matéria que se ensinam na escola.

Vejamos em mais pormenor o monte deareia. Deixemos cair a areia na vertical,devagarinho, para formar um monte,que terá a forma de um cone. Qual é ainclinação desse cone? Verifica-se queessa inclinação varia entre um ângulomínimo e um ângulo máximo. Quandoa areia atinge o ângulo máximo, dá-seuma avalanche e, de repente, o ângulo fi-ca mínimo. A areia vai caindo, com ainclinação do monte a aumentar, até quese atinja de novo o ângulo máximo. En-tão, basta um pequeno grão de areia edá-se nova avalanche. O monte vai cres-cendo com a areia a cair aos trambo-lhões, por avalanches sucessivas. Parece-nos estranho, não é? Mas não o é para al-gumas formigas da areia, que aproveitamas avalanchas em seu próprio benefício...Escavam um buraco, que tem a forma decone, e escondem-se debaixo da areia nofundo. Uma presa que caia dentro doburaco está perdida, porque bastará umpequeno movimento da areia para ocor-rer uma avalanche e conduzir o pobre

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