carneiro silva jardins de burle marx nordeste
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O Laboratório da Paisagem, núcleo do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFPE, desenvolve atividades de pesquisa, ensino e projeto no ãmbito da conservação da paisagem, dos jardins históricos l' dos espaços públicos. Reúne professores, arquitetos e alunos de graduação e do Programa de Pósgraduação em Desenvolvimento Urbano (MDU) da Lff PE e integra rede nacional de pesquisa sobre "Sistema de Espaços Livres" e "Jardins de Burle Marx'; esta também no âmbito internacional.
Lançou sua primeira publicação. "Espaços Livres do Rccik''. cm 2000, cm parceria com a Prefeitura do Recife. Em 2001, iniciou os estudos sobre os jardins do paisagista, culminando no restauro de três deles entre 2003 t' 2008. Posteriormente, publicou "Os jardins de Burle Marx no Recife" (2009), cartilha em comemor<H;üo ao cenlt'núrio desse artista; "Jardins l listóricos Brasileiros l' Ivkxicanos" (2009); "Parque e Paisagem: um olhar sobre o Recili:" (2010) e "Jardins do Rl'<ife: uma histúria do paisagismo no Brasil, 1872- 1937" (2010).
JARDINS DE BURLE MARX NO NORDESTE DO BRASIL
••
JARDINS DE BURLE MARX NO NORDESTE DO BRASIL
Ana Rita Sá Carneiro
Aline de Figueirôa Silva
Joelmir Marques da Silva
ORGANIZADORES
Editora ~ UniversltáriWUFPE
RECIFE 1 2013
\ /11IH 1•ld 1ulc l'~Mrol d~ 11tr1111111l>l1<.0
ltcllor 1'1111 , A11l,le1 llrn<llcir(I de l'rc ila• Dour,1do.
Vice ltcllor \1111f. Sllvio Romero Marques.
J)lrctora do fülllorn Uf PE: Prof• Maria josé de Matos Luna.
ComlssAo F.dlt<>rial
P residente: Prof• Maria José de Matos Luna.
T itularca: Ana Maria de Barros, Alberto Galvão de Moura f ilho, Alice Mirian Happ Boúer, Antonio Motta,
Helena Lúcia Augusto Chaves, Liana Cristina da Costa Cirne Lins, Ricardo Bastos Cavalcante Prudêncio,
Rogélia Hcrc ulan<> Pinto, Rogério Luiz Covaleski, Sônia Souza Melo Cavalcanti de Albuquerque, Vera Lúcia
Menezes Lima.
Suplentes: Alexsandro da Silva, Arnaldo Manoel Pereira Carneiro, Ed igleide Maria Figueiroa Barretto,
Eduardo Antônio Guimarães Tavares, Ester Calland de Souza Rosa, Gemido Antônio Simões Galindo,
Maria do Carmo de Barros P ime ntel, Marlos de Barros Pessoa, Raul da Mota Silveira Neto, Silvia Helena
l.ima Schwambom, Suzana Cavani Rosas.
Editores Executivos: Afon so Henrique Sobreira de O liveira e Suzana Cavani Rosas.
Capa: Bruno Faria e Lúcia Veras.
Projeto gráfico: lldemberg ue Leite.
Revisão do texto: Aline de Figueirôa Silva e Maríza Pontes.
Revisão botânica: foelmir Marques da Silva.
Tradução: Aline de Fíg ueirôa Silva.
Revisão da t radução: James Dubeux Raffety.
Impressão e acabamento: Ed itora Universitária da UFPE.
\ Catalogação na fonte
Bibliotecária Kalina Ligia França da Silva, CRB4-1408
f37 Jardins de Burle Mau no Nordeste do Brasil I Ana Rita Sá Carneiro, Aline
Realização
Lnboratório dopelaagom
"' ,.
de Figueirôa Silva, Joelmír Marques da Silva. Organi1.adores. - Recife :
Ed. Universitária da UFPE, 2013.
251 p. : íl,
Vários autores.
Inclui referências bibliográficas.
ISBN 978-85-415·0224-5 (broch.)
1. Marx, Roberto Burle, 1909-1994. 2. Arquitetura paisagblica - Brasil,
Nordeste. 3. Jardins histó ricos - Brasil, Ncrdestc. 4. Jardm; Projetos -
Brasil, Nordeste. I. Sá Carneiro, Ana Rita (Org.). li. Silva, Aline de Figueirôa
(Org.). III. Silva, Joelmir Marques da (Org.). IV. Titulo.
712 CDD (23.ed.) UFPE (BC20 13-065)
Apoio m BURLE MARX & CIA LTDA
---
- u · =< ~u -= --= x ==i..a
EDITORA ASSOCIADA Ã
llMAIUO
7
t)
11
37
57
89
107
Prefácio
Prcfacc
Snnia lk1·j1111111
Introdu\i\o
lntroduct ion
Ana Rita s,\ Carneiro
Aline de Figucirôn Silva
Joelmir Marques <la Si lva
Praça Arlnr Oscar no Recife: a modernidade no Jardim de Burle Marx
Fátima Maria Alves da Silva Mafra
O Jardim da Capela da Jaqueira: um monumento preservado por Burle Marx no Recife
Ana Rita Sá Carneiro
Aline de Figueirôa Silva
Joelmir Marques da Silva
Burle Marx em Salvador: o_ Jardim do Terreiro de Jesus
Paulo Costa Kali!
Um Jardim de Burle Marx em João Pessoa: Residência Cassiano Ribeiro Coutinho
Heignne Jardim
Paula Dieb
l '.17
159
187 \ -,
213
241
247
l'nládo dos Leões: 11111 Jurdim de Burle Marx em São Luís
Barbara [rene Wasinski Prado
Jardins de Burle Marx para o Theatro José de Alencar em Fortaleza
Ricardo Figueiredo Bezerra
Pernanda Cláudia Lacerda Rocha
Temístocles Anastácio de Oliveira
Antônio Sérgio Farias Castro
Burle Marx em Teresina: a Praça Monumento Da Costa e Silva
Wilza Gomes Reis Lopes
Karenina Cardoso Matos
José Hamilton Lopes Leal Júnior
Roseli Farias Melo de Barros
Jardins de Burle Marx em Natal
Paulo José Lisboa Nobre
Marizo Vitor Pereira
Isaías da Silva Ribeiro
Apêndice: Projetos de Burle Marx no Nordeste
Os Autores
< ~rn110 ci<lranjera amante dei Brasil, los nombres del Terrero
ili• lc'~úi. cn Salvador, dei Jardín del Palacio de los Leones en São
l 1d11 o t•I Jardín del Teatro Alencar en Fortaleza -para mencionar
11111 s111lo a Lres de los ejemplos estudiados en este volurnen- son
p.1rndlgmMicos del patrimonio cultural del país con rango
1111111dial, y por ello algunos están incluidos en la lista del
11.11 rimonio de la Humanidad de la UNESCO como componentes
1 I<' l l'lll ros históricos de valor singular y universal.
C :omo turista frecuente que ha gozado de varias visitas a esos
l11g.1rcs, me pregunto por qué razón nunca me informaron que
cslos sitios únicos tan visitados habían contado, en su desarrollo,
1 011 intcrvenciones de Roberto Burle Marx.
Como profesional dei paisaje, considero a este brillante
hrnsile.õo el mayor paisajista dei siglo XX en el mundo occidental y
lamento que todavía no haya logrado la trascendencia que su obra
lll t:rcce, debido sobre todo al desconocimiento cabal y científico
de ésta, aún en círculos profesionales.
Como colega, celebro y aplaudo la labor que desde hace afíos
l lcva adelante el grupo dei Laboratorio dei Paisaje de la Universidad
J hleral de Pernambuco con el trabajo líder y pionero de la Dra.
Ana Rita Sá Carneiro y sus cada día más y más integrantes -hoy
ya son 20 especialistas- que se han propuesto develar los orígenes
y estados actuales de las obras de Burle Marx en el Nordeste del
Brasil.
/n r,lins ele Burle Marx no Nordeste do Brasil 7
Como leuora, dcbo dcjar constancia dei placcr que me han
prod ucido eslos textos y sus imágenes pues, además de su aporte
científico, han sido amenos e ilustrativos. El inventario total de
los jardines de Burle Marx, así como su restauración, es una
tarea ineludible y perentoria. Ha sido iniciado por Ana Rita en
2005 y de forma más que humilde. Su enorme capacidad, tesón
y compromiso a través de los anos están produciendo sus frutos,
cada vez más grandes y sabrosos.
Espero que el círculo (tanto de ejemplos como de geografias
y de participantes) se siga ampliando y que en un futuro no muy
lejano contemos con un más que necesario corpus de esos oasis
de naturaleza creados a lo largo de su existencia por un artista sin
igual que han ayudado en tanto a mejorar la calidad de vida de
infinitas personas, en su país natal, en Argentina, en Venezuela,
en Estados Unidos y en otros sitios.
Coronaría de modo supremo esta ardua tarea la nominación
por parte de la UNESCO de un "itinerario de los jardines de Burle
Marx': Y... como la vida profesional de Burle Marx nació en
Pernambuco ... no <ludo de que esa iniciativa y esa tarea también
se llevarán a cabo en esa región y por el extraordinario equipo
que hoy presenta este libra imprescindible para la historia de los jardines del mundo.
Dra. Sonia Berjman. Miembro de Honor.
o
Comité Científico Internacional Paisajes Culturales.
International Council of Monuments and Sites.
Buenos Aires, enero de 2013.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
/\s a foreigner who laves Brazil, the namcs of Jesus Yard in
S.ilvador, Lions Palace Garden in São Luís, and José de Alencar
' l heatcr Garden in Fortaleza, mentioning only three garckns
studicd in this edition, are paradigmatic of the cultural herilagc
oi" this world-ranging country. That is why some of them are
i ncluded on the list of the World Heritage Sites of UNESCO as
historie centers with outstanding universal value.
As a usual tourist who has enjoyed many visits to the cit ícs
mcntioned above, 1 ask myself why I was never told that Lhosc
wideJyvisited places had counted on Roberto Burle Marx's design.
As a landscape professional, I consider this brilliant Brazilían
Lhe greatest landscape designer of the 2Qth century in the western
world. I regret thathis workhas not achieved the acknowledgement
[t deserves due to the lack of a broad scientific knowledge, even Ln
professional circles.
As a colleague, 1 celebrate and acclaim the labor that thc
researchers of the Landscape Laboratory of the Federal Universi t y
of Pernambuco have developed for years under the leadership
and the pioneer work of Professor Ana Rita Sá Carneiro and her
collaborators. Today, there are twenty specialists that aim to revcal
the origins and the current situation of Burle Marx's gardens ín
the northeast region of Brazil.
As a reader, 1 must leave evident the pleasure 1 felt through 1 hc
reading of those texts and their images since they are pleasant and
Jardins de Burle Marx n o Nordeste do Brasil ')
/
J illuslni ll ve, in add itio n lo thci r scicnli ítc conlribut ion. 'l he whole
invenlory or Burle Marx's gardens as well as their restoration is an
u navoidable and urgent task. Although the process started in 2005
by Ana Rita in a very humble way, her great capacity, tenacity, and
rnmmitment throughout the years are now bearing richer fruits
f rom her labor.
1 hope the circle of examples, geographies, and participants
continues its growth and that in the near future we can count on
more than simply the necessary corpus of those oases created by
an incomparable artist who helped improve the quality of life of
many people in his native country, Argentina, Venezuela, United
States of America, and other places.
The nomination of an "Itinerary of Burle Marx's gardens" by
UNESCO would crown this hard work in a supreme way. And ...
as Burle Marx's professional life started in Pernambuco ... I have
no doubt this initiative and task will also be carried out in that
region by the extraordinary team who presents now such an
essential book to garden history in the world.
10
Dra. Sonia Berjman. Honor Member.
International Scientific Committee ofCultural Landscapes.
International Council oíMonuments and Sites.
Buenos Aires, January, 2013.
Ja rdins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
<) Nordeste brasileiro é um a região diversificada, que abrange
dn111l11ios llorístico-vegetacionais representados pela Floresta
AI ln 11 1 ica e ecossistemas associados (rest inga e manguezal), pela
• nntinga e pelo cerrado, bem como uma pluralidade de traços
llllmanos e culturais, p orém historicamente associada à seca e à
l 1 ad ição, entre outros enunciados forjados pelas mais diferentes
l'Slralégias políticas, institucionais e intelectuais.
Por ter a maior extensão de caatinga, sua paisagem, nas
representações predominantes, transmite aridez pelas formas
duras, mas que adquire, como num passe de mágica, um aspecto
viçoso e verdejante após uma chuva esperada.
Nessa região de fortes contrastes, o paisagista Roberto Burle
Marx (1909- 1994) realizou seus primeiros jardins públicos,
plantando os princípios do paisagismo moderno brasileiro,
contemplando as paisagens nordestinas do interior - algumas
experiências por ele denominadas de verdadeiro espetáculo
e configurando paisagens urbanas. Disse Burle Marx em
pronunciamento no "Seminário de Tropicologia" de 1985, a
convite de Gilberto Freyre:
Se meu conhecimento a respeito de plantas é muito
maior, se passei a denunciar, com todas as minhas forças,
os crimes contra a natureza, se viajei sistematicamente
pelo interior do País coletando plantas potenci almente
utilizáveis em jardins, se organizei uma das mais
jardins de Burle Marx no No rdeste do Brasi l 11
1 J
l111port anll'S cok~oc~ dt.: plan1as cm nosso l'als, nao Lenho
d liviJas que cm Pernambuco começou Ludo.1
A partir de 1935, Burle Marx realizou seus primeiros projetos
110 Recife, dirigindo o Setor de Parques e Jardins da Diretoria de
A rquilctura e Construção do Governo do Estado de Pernambuco.
Dada a proximidade, no final da década de 1930, iniciou projetos
cm João Pessoa e, em seguida, na cidade de Salvador, nos anos
1940. Atuou em Fortaleza e em São Luís no final dos anos 1960 e
cm Teresina, Maceió e Natal na década de 1970.
Se o Recife está na origem de sua atividade paisagística,
também cristalizou o debate propulsor da presente coletânea,
por ocasião do Encontro Regional "Paisagem na história:
jardins e Burle Marx no Norte e Nordeste': que ocorreu em
junho de 2007 e reuniu pesquisadores, técnicos e profissionais
liberais predominantemente oriundos das capitais dos estados
nordestinos, havendo ausência de representação nortista.2 A
produção científica do evento está compilada nos anais do
Encontro, que abrange comunicações sobre a obra de Burle Marx
na Bahia, no Ceará, no Maranhão, em Pernambuco, no Piauí e
no Rio Grande do Norte, ausentando-se os estados de Alagoas,
Paraíba e Sergipe.3
Ainda em 2007, como resultado do Encontro, foi formalizado
no Diretório de Grupos de Pesquisa do Conselho Nacional de
1 MARX, Roberto Burle. Minha experiência em Pernambuco. l n: MIRANDA, Maria do Carmo Tavares de (Org.). A11ais do Seminário de Tropicologia " l lomem, Terra e Trópico~ Recife: Massangana, 1992, p. 73.
2 Evento promovido pelo Laboratório da Paisagem/UFPE e coordenado pelas professoras Ana
Ili ta Sá Carneiro e Vera Mayrinck.
' ENCONTRO REG IONAL PAISAGEM NA HrSTÓRJ/\ : JAllDJNS E BURLE MARX NO
NORTE E NORDESTE, l , 2007, Recife. Anais ... Recife: UFPE; Olinda: CECI. 2007. 1 CD-ROM.
12 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
l lt•141•11volvl11w11lo C:k11tlli rn L' 'l 't·rnológl rn (CNPq) o grupo
d1 r1tl11do ")nnlins de Burle Marx·~ liderado pelo Laboratório
ilu l'l" ""HL'lll do lkpart;1111cnlo de /\rqu ilctura e Urbanismo da I
l J11IH 1 ... 1d:1<.k Federal de Pernambuco ( U FPE) e pelo Laboratório
il l' 1 tudos cm Arquitetura e Urhanismo (LEAU) da Universidade
1 1•d1'1.il do Ceará (UFC).
1 ksdc então, uma sondagem realizada pelo grupo aponta a
q1111111 llirnção e a distribuição dos projetos elaborados por Burle
M11rx 11:1 região Nordeste e a sua predominância em Pernambuco,
1 11111 \111l total de 58, entre 1935e1990. Na Bahia, estão registrados
, 1 11rojclos. No Ceará, 19, até o ano de 1994, seguido pelo estado
d.1 l'.1raíba, com 13 projetos. E, finalmente, os estados que tiveram
11111.1 produção mais reduzida: Rio Grande do Norte, com quatro,
1· Piauí, Maranhão e Alagoas, cada um com três projetos.
<) Nordeste brasileiro sempre esteve na trajetória de Burle
Marx, seja no início de sua carreira, criando ou reformando
divl'rsas praças no Recife, de 1935 a 1937, seja ao final de sua
111tcnsa vida profissional, quando concebeu, entre 1992 e 1994,
11111 de seus últimos projetos, o Jardim Botânico de Fortaleza,
porém não executado. Ou, ainda, com a construção póstuma do
1.1rdim interno da Oficina Cerâmica Francisco Brennand (atual
Praça Burle Marx), projetado em 1984 e inaugurado em 1994, ano
t• m que o paisagista faleceu.
A lista de projetos apresentada no Apêndice sumariza o que
está registrado em publicações sobre o paisagista4 e indicado pelo
l ~scritório Burle Marx & Cia. Ltda. No entanto, está atualizada
l' l11 relação à sua quantidade, entre planos, estudos preliminares e
,1 MOITA, Flávio. Roberto Burle Marx e a nova visão d<t paisagem. São Paulo: Nobel, 1983; l.E ENHARDT, Jacques (Org.). Nos jardins de Burle Marx. São Paulo: Perspectiva, 2000.
J.ll'lli ns de Burle Marx no Nordeste d o Brasil 13
I i
prnjt•tos l'XL'Cll t ivos, c, sempre que possível, contém informações
sobre dalas e se foram implemenlados, posto que decorre do
l'Sforço de pesquisa empreendido pelo grupo.
Dianle de um significativo número de projetos na região
aproximadamente 124 -, não seria possível abranger toda a
produção de Burle Marx no Nordeste num livro desta natureza,
que não se propõe a ser um panorama. Por outro lado, procurou
sc alcançar a maior extensão possível dessa geografia, na medida
cm que comparecem no livro sete dos nove atuais estados
nordestinos, todos existentes à época de cada um dos projetos
esludados (Mapa 1).
Mapa 1. Região Nordeste do Brasil, onde Burle Marx desenvolveu cerca
<k 124 projetos, desenho de Juan David Strada Rincón, 2013. Fonte: l ,;1horatór io da Paisagem/UFPE.
14 Jardins d e Burle Marx no Nordeste do Brasil
1 ~"" '''' \ l ,.,, 1 ,,,
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1 1111.,1 ·- \••~'L "',
Nt•'i tt• M'11 lido, .u1~t·n t 11111 Sl' d.1 prt'SL' tll t• t0ktn11ea os e:-i l ado~
ili !11·1gqH'. Sl'lll rt·gistrns da passagem de Burle Marx, e de
\l111tº•'"· onde o paisagista deixou ao menos três obras - os jardins
1111 l1.1111uo do Governador (1974), da Residência Emílio Maya
1 11111%1 ( 1976) e do Ministério da Fazenda (1979) - que, espera-se,
1 111~~11111 ser aglutinados ao grupo na medida de sua consolidação.
Alguns autores aprofundaram o conteúdo apresentado no
1°111 011lrn de 2007, consolidando o estágio atual de suas pesquisas.
1 h 1t1 os preferiram investigar um jardim específico que promovesse
11111 dl·bale, por exemplo, sobre o patrimônio moderno.
A seleção dos jardins, ainda que tenha privilegiado uma
pt·quena amostra, em comparação com o amplo conjunto de
pr oposlas elaboradas para as capitais estudadas, revela o arco
dt· atuação de Burle Marx, já conhecido na sua obra e agora
dt•monstrado na geografia do Nordeste do Brasil. E contempla
dikrcntes esferas, escalas, objetos e paisagens: projetos públicos,
d.1 praça ao parque, e privados, no âmbito residencial ou
inslilucional, projetos inteiramente novos ou reformas de jardins
preexistentes, lúdicos, solenes, domésticos e palacianos.
O Recife abre a coletânea, não apenas por ter sediado o
i:.ncontro que deu origem ao grupo, mas também por ser o berço
dn obra paisagística de Burle Marx e ter a maior representatividade
de projetos em termos numéricos. A capital pernambucana reúne,
.1inda, o maior número de pesquisadores e trabalhos sobre a
obra de Burle Marx no Nordeste do Brasil, levados a cabo pelo
l .aboratório da Paisagem/UFPE, cuja produção científica pêrfaz
mais de uma década. A seguir, sucedem-se os projetos nas outras
capitais nordestinas em ordem cronológica. No Recife, são
/.1rdi11 s de Burle Marx no Nordeste do Brasil
/ I
lrnt ados clols jardins rclalivos a pcdodos dislinlos da presença do
paisagista em Pernambuco.
Em 1936, a concepção da Praça Artur Oscar valorizou sua
condição de espaço público numa área comercial da cidade, tendo
um piso de lajes locais rejuntadas com grama e um canteiro central
de plantas herbáceas e arbustivas, em sua maioria da rest inga.
Nesse jardim, Burle Marx quis dar notoriedade ao arranjo e
distribuição de plantas com texturas e colorações variadas para
ser apreciado pelos recifenses e viajantes que chegavam pelo
porto. Por tais características, é o passo que antecede a definição
do traçado do Jardim do Ministério da Educação e Saúde no Rio
de Janeiro.
Nas intervenções pelas quais passou a Praça Artur Oscar,
espécies vegetais e elementos do mobiliário foram acrescidos,
desconsiderando o projeto de Burle Marx. Hoje, a praça guarda
de sua concepção original apenas a cortina de vegetação arbórea
que a circunda.
O Jardim da Capela da Jaqueira, concebido por volta de 1951,
é trazido a público num dos únicos, se não no primeiro estudo
monográfico que lhe foi inteiramente dedicado. A pedido da
então Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(DPHAN), Burle Marx elaborou um projeto paisagístico para o
entorno da Capela de Nossa Senhora da Conceição da Jaqueira,
essencialmente composto de plantas herbáceas das mais variadas
tonalidades de cores e palmeiras-reais (Roystonea regia), com
vistas à preservação do monumento.
A proposta ainda abarcou uma significativa área para a
recreação da população, com campo de espor tes, brinquedos
e substantiva cobertura vegetal arbórea. Esse trecho do projeto,
16 Jardins de Burle Ma rx no Nordeste do Brasil
11111.! 1 qw• p1·ovuv(.•lml'll l(1 11: o rt:alll'.ndo, lnaugun1vt\ u11111 11ovt1
1 11111t'I'~110 de pa n.Jtic pú b l lco J1U cidade do Rccifo em u m t1 t\rea jt\
111lll:iiHla pnrn pnllicas esportivas, impulsionando o alL1al Parque .1
tl11 Jnqlldrn , hoje bastante frequentado pelos recifenses.
() t•st w.lo dessa obra aponta a envergadura do projeto à época,
('ti programa inovador e a associação a uma edificação histórica
lt11 lih1.:at iva para a cidade, considerando o valor simbólico
11.1 rnpcla e do parque que lhes foi imputado pela população
1111.1lmcnte, sobretudo pelos moradores do entorno do bairro da
J11qt1eira.
Em Salvador, o Terreiro de Jesus foi selecionado entre as obras
dl· l)urle Marx na Bahia por sua localização no sítio histórico,
dd'ronte ao Colégio e à Capela dos Jesuítas, por ser o primeiro
t•spaço público projetado pelo paisagista na cidade, pelo seu
desenho inovador e por sua repercussão à época.
No século 19, o terreiro era o centro de comunicação da cidade
t dispunha de um chafariz em bronze para abastecimento d'água.
O projeto de Burle Marx, idealizado a part ir de 1948, explorou a
potencialidade do espaço para o convívio do público, em que o
chafariz como ponto focal relacionava-se com um único canteiro
ílorido, ao passo que o coreto móvel preservava a visibi~idade para
o conjunto religioso. A manutenção do chafariz e os materiais de
revestimento do piso, como a pedra portuguesa, os seixos e as
conchas da região, reforçavam o caráter do sítio histórico.
Hoje, o Terreiro de Jesus encontra-se descaracteriza~o face à
substituição de espécies vegetais, bancos e materiais construtivos,
mas é ocupado por grupos de capoeira, vendedores ambulantes e
baianas de acaraj é.
Jardins de Burle Marx no No rdeste do Brasil 'l 7
( O capítulo sobre João Pessoa elege como objeto de estudo o
Jardim da Residência Cassiano Ribeiro Coutinho, de 1957, devido
à riqueza do projeto paisagístico, considerando sua extensão,
diversidade florística, presença de elementos escultóricos e
zoneamento prevendo diferentes usos. Mas também, por se tratar,
juntamente com a edificação na qual está inserido, de um bem
tombado corno patrimônio paraibano. Do projeto participaram
Fernando Tábora, Julio Cesar Pessolani, John Stoddart e Maurício
Monte, que mantiveram sociedade com Burle Marx até 1965.
A vegetação existente no terreno foi mantida, sugerindo linhas
do traçado e contrastes entre espécies arbustivas e herbáceas.
Monólitos e bancos de granito, seixos e pedras portuguesas,
espelhos d'água, gaiolas e playground indicam a diversidade
de materiais, usos e recintos do jardim. Destacam-se, ainda, a
indicação de 73 espécies vegetais e a previsão de um horto, no
fundo do lote, para a produção e reposição de plantas.
A residência, projetada pelo arquiteto Acácio Gil Borsoi,
constitui a primeira obra moderna de João Pessoa reconhecida
oficialmente como patrimônio histórico e artístico da Paraíba. Um
símbolo da modernidade pessoense que, em meados do século 20,
passou a modificar a paisagem e o cotidiano da cidade.
No texto de São Luís, o Jardim do Palácio dos Leões foi o objeto
do estudo porque seus usos, derivados de colonização variada,
culminaram num jardim brasileiro segundo projeto paisagístico
de Burle Marx, iniciado em 1968 e retomado em 1973. Como um
espaço simbólico da administração política e mirante da história
maranhense, esse jardim cristaliza a passagem do tempo e as
transformações sociais, culturais e econômicas experimentadas
pela capital São Luís em quatrocentos anos.
18 Ja rdins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
ll11tl 1• Mnl'x 11H111kvc tis palmeiras Imperiais (lfoys to11ca
11/1•1r111•1 1), ~·xis l L' lll<.'s ao menos desde a década d.e 1950, criou
, 1 11 11;10~ d\\gua e lanqucs para plantas aqu<lticas. Também utilizou
ltllllJ 11~ 1~·s de malcriais inertes (seixos de cor clara, pisos em pedra
l i!i':-1 L l't'11micas) e ele vegetais (com cores e alturas diferentes).
Nn l id11dc de Fortaleza, os Jardins do Theatro José de Alencar
1 .. 1i1n .1ssociaclos ao caráter público e à importância histórica
, 111 q11 ltetô11ica dessa t radicional casa de espetáculos. Teatro e
1111 dl11s sílo catalisadores da vida social e cultural fortalezense,
M1•11do visi tados por moradores e turistas. Num lapso de quase 20
11 1111 ."1, l'lll rc 1973 e 1990, os jardins foram objeto de dois projetos
li 1 1·, 1 ~1 1 1t c distintos, elaborados pelo Escritório Burle Marx & Cia.
1 1d.1.
No projeto de 1973, assinado também pelos arquitetos
l l,11 uyoshi Ono e José Tabacow, um grande espelho d'água com
1111w fonlc luminosa domina toda a composição, abrigando várias
1"q ,él,:ics de plantas aquáticas. No de 1990, em parceria com
11.11 uyoshi Ono e Leonardo de Almeida, uma extensa superfície
1 11t11 desenho regular valoriza a edificação do teatro.
Até então, o primeiro projeto encontrava-se ausente da
história escrita sobre a cidade e oculto na oralidade dos que o
vive nciaram. O texto sinaliza, portanto, a relevância do estudo
para Ltma futura restauração dos jardins.
No artigo de Teresina, a escolha recaiu sobre a Praça
Momunento Da Costa e Silva por se tratar do único espaço público
projetado por Burle Marx na cidade, entre 1975 e 1976, tendo
1·m mente a importância das praças como locais de integração e
l11zcr da comunidade. Mais uma obra concebida em parceria com
J.11.l l11s de Burle Marx no Nordeste do Brasil 19
(
1
\ o arquiteto Acácio Gil Borsoi, que projetou o monumento cm
homenagem ao "poeta das águas': Antonio Francisco da Costa e
Silva.
O desenho marcante do espelho d'água, de linhas irregulares,
parece lançar um diálogo com as águas do Rio Parnaíba, ao passo
que a carnaúba (Copernicia prunifera), símbolo dos estados
do Piauí e do Ceará, tem presença destacada no projeto. A
descaracterização da concepção original está relacionada à retirada
de espécies vegetais especificadas por Burle Marx, bem como
ao plantio de novas espécies. O traçado foi pouco modificado,
permanecendo quase inalterado, enquanto caminhos com piso de
concreto foram acrescidos seguindo as linhas de desejo existentes.
Em Natal, são conhecidos quatro jardins projetados por Burle
Marx, nenhum dos quais foi executado. Até o presente momento,
estão mais documentados o Parque das Dunas - Via Costeira,
jardim à beira-mar cujas especificações botânicas e detalhamento
são desconhecidos, e o Pátio Interno da Biblioteca Central da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), de
1976. Este projeto teve a colaboração dos arquitetos Haruyoshi
Ono e José Tabacow e foi enfatizado no último capítulo, uma vez
que estão disponíveis os detalhes construtivos e a especificação
botânica.
A configuração projetual permite a observação tanto do
pavimento inferior quanto do superior, de modo que o jardim
se apresenta a partir de diferentes perspectivas. Destacam-se as
"esculturas de xaxim" ou esculturas vegetais de espécies herbáceas
da flora tropical, tanto pela variedade de cores, como pelas
diferenças de altura dos volumes criados, ao passo que canteiros
20 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
1111111d1111•• t· st·ixos 1 oludos sao elementos do rep1.•rt <'>rio do
I' 11 H~l ~ lu .
) 1 111h111.1 degcndo um jardim especifi co como objeto de estudo,
llu.1111 .111 ton:~ o relacionaram com out ros projetos de Burle Marx
111111up1 Íll Lida<lc ou em diferentes locais, na tentativa de articu lt\-
111 11011 p1 lndpios de concepção do paisagista, estratégia ulilizadu
d1 111mlo manifesto em Pernambuco, na Bahia, na Paraíba e no
Uh1 e ;1nndc do Norte.
( :c11110 resultado de um grupo de pesquisa constituído hó
1 1111 o .1nos e do trabalho acumulado pelos autores em estudos e
I ''li 11 icnçê>es anteriores, os textos, em seu conjunto, compartilharn os
.q1,11inlcs procedimentos metodológicos: levantamento de fontes
1 lt >l 11 mentais - plantas, desenhos, fotos, jornais, ofícios, pareceres
, visitas e observações em campo, entrevistas, identificação da
\'t'gl'l ação original e/ ou atual, recurso às simulações e confrontação
e· 11t1 e os dados, consubstanciando a análise de cada projeto.
Consideradas as diferenças temporais entre os projetos, a
1 ondição de terem sido realizados (parcial ou totalmente) ou não
11nplantados, o estágio de pesquisa em cada estado e a diversidade
ou a escassez de registros, os artigos perseguiram uma estrutura
g<: ral comum, procurando relatar a origem de cada jardim, sua
1 l·a lização, transformações e perspectivas atuais relativas à sua
I' rcservação.
Este livro deve-se ainda ao apoio de muitas instituições e
pessoas, a quem os organizadores dirigem seus agradecimentos:
;1 Sonia Berjman, pelo constante incentivo ao estudo da obra
de Burle Marx e por assinar o prefácio; ao Escritório Burle
Marx & Cia. Ltda., no Rio de Janeiro, especialmente Haruyoshi
e Isabela Ono, pelas fotos, plantas e informações gentilmente
Jardin s de Burle Marx no Nordeste do Brasil 21
cedidas; ao CNPq e demais agtncias de fomento, pelo suporte
financeiro em diferentes períodos desde a constituição do
grupo; à Superintendência do IPHAN em Pernambuco, pela
disponibilização da documentação oficial do Jardim da Capela da
Jaqueira; aos bolsistas fuan David Strada Rincón e Luísa Acioli
dos Santos e à Profa Lúcia Veras do Laboratório da Paisagem/
UFPE; a todos os estudantes, profissionais, técnicos e gestores
que contribuíram com a produção dos artigos através da cessão
de documentos, relatos e auxílio nos levantamentos de campo e
arquivo em cada estado do Nordeste.
Além do esforço de documentar a obra de Burle Marx no
Nordeste do Brasil, os autores não renunciaram à questão da
preservação, ao buscarem registrar o estado atual dos jardins e
ventilarem ora sua restauração, ora a realização dos projetos não implantados.
Os jardins de Burle Marx aqui retratados guardam uma
profunda relação com a paisagem natural e seus ecossistemas
específicos, como a restinga, o manguezal, a caatinga e o cerrado,
e com a paisagem urbana de cidades consolidadas, marcada por
monumentos coloniais, barrocos, neoclássicos e ecléticos.
Ora nasceram da relação com a cidade tradicional, como a
Praça Artur Oscar, no Recife, e o Terreiro de Jesus, em Salvador, ou
em complementaridade a monumentos arquitetônicos já alçados
à condição de patrimônio pelos órgãos oficiais de preservação, a
exemplo dos jardins da Capela da Jaqueira, no Recife, do Palácio
dos Leões, em São Luís, e do Theatro José de Alencar, em Fortaleza.
Ora surgiram a partir da própria invenção do monumento
moderno, seja na criação arquitetônica, como no caso dos jardins
da Biblioteca Central da UFRN, em Natal, e da Residência
22 Jardins de Burl e Marx no Nordeste do Brasil
1 1Nll l 111n l~ll1t• l10 C o 11li11ho , \.' 111 )mio l't:-;:-oa, scj :1 11<1 dclini~·ao do
r I ''' '• " 111 h .1110, ,1 t• xcmplo da !' raça Monumcnlo Da Costa e Silva ,
1 111 ' l '1{11·-. i11,1, l'~l <.:s dois últimos at ravés da parceria com o mestre 1
1 '" 1 ~ 1 1 i il Bor~oi. A prn1,ósito, Burle Marx elaborou projetos paisagísticos
11u111 ,., l'di fi caçõcs palacianas onde funciona a administração
d11 g11vl' r 11 0 de Pernambuco (Palácio do Campo das Princesas,
H1•1 111·, i.'111 1936), da Paraíba (Palácio da Redenção, João Pessoa,
1•111 1 t) \9), elo Maranhão (Palácio dos Leões, São Luís, em 1968
1• 1 'r/ !), do Piauí (Palácio de Karnak, Teresina, em 1972) e de
1\ l.1goas (Palácio Marechal Floriano Peixoto, em 1974).
l'or seu interesse ecológico e histórico, os jardins de Burle
M.11 x na região Nordeste devem ser conduzidos à condição
1k 111onumentos vivos, conforme os dispositivos e instituições
prl'scrvacionistas em nível nacional e mundial.
O conhecimento sobre sua obra consubstancia o
<" 11 frcntamento de dois desafios imputados à cidade e à sociedade
l onlemporâneas: o condicionamento ecológico global e a
preservação do patrimônio histórico local, cujo debate este livro
se propõe a fomentar.
Ana Rita Sá Carneiro.
Aline de Figueirôa Silva.
Joelmir Marques da Silva.
Organizadores.
Recife, janeiro de 2013.
ja rdins de Burle Marx n o Nordeste do Brasil 2:1
I í 1
INTltODUCTlON
The northeast of Brazil is a region that consists of different
ecosystems as well as a plurality of human and cultural features.
However, it is historically associated to the dry season and to
traditional knowledge among other concepts shaped by different
political, institutional, and intellectual strategies.
Dueto the large extension of dry soil andxerophytic vegetation,
its landscape usually passes on the idea of aridity through its
hard shapes, which acquire a lush and green appearance after an
awaited rain as if it were magic.
ln that region of such strong contrasts, the landscape designer
Roberto Burle Marx (1909-1994) made his first public gardens
by planting the principies of the Brazilian Modem Movement
based on the inland northeastern landscapes - an experience he
described as a true sight - and shaping urban landscapes. Invited
by the great anthropologist Gilberto Freyre, Burle Marx gave a
speech in the Tropicology Seminar in 1985 and said:
If my knowledge on plants is much bigger, if I started
denunciating with my whole strength the crimes against
nature, if I systematically travelled through the inland of
Brazil collecting plants potentially useful to gardens, if I
organized one of the most important plant collections of
our country, 1 am sure it all started in Pernambuco.
From 1935, Burle Marx made his first projects in Recife when
he directed the Section of Parks and Gardens of the Board of
Jardins de Bu rle Marx no Nordeste do Brasil
\ An.hit t l.lurc and Co11structi o11 of Lhe (;ovcrnmcnl of Lhe SLatc
of' Pernambuco. Duc Lo Lhe proximily, al tbe end of thc J 930s be
starlcd dcsigning gardens in João Pessoa and then in Salvador ln
lhe 1940s. He worked in Fortaleza and São Luís during the late
l 960s and in Teresina, Maceió, and Natal in the 1970s.
The city of Recife also boosted the debate that brought about
Lhis book as it hosted the Seminar "Landscape in history: gardens
and Burle Marx in the north and northeast of Brazil" in 2007.
'111e event brought together researchers, technicians of Recife's
City Council, and self-employed professionals, who mainly carne
from the northeastern states, missing northern participants. The
presented papers were compiled in the annals of the seminar,
edited by Professors Ana Rita Sá Carneiro and Vera Mayrinck.
Some of them <leal with the work of Burle Marx in the states of
Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco, Piauí, and Rio Grande do
Norte, missing the states of Alagoas, Paraíba, and Sergipe.
As a result of the seminar, the study group "Gardens of Burle
Marx" was registered at the Directory of Research Groups of the
National Council of Scientific and Technological Development
in 2007 under the leadership of the Landscape Laboratory of the
Federal University of Pernambuco, coordinated by Professor Ana
Rita Sá Carneiro, and the Laboratory of Studies on Architecture
and Urbanism of the Federal University of Ceará, coordinated by
Professor Ricardo Figueiredo Bezerra.
Since then, a survey made by the team showed the quantity
and distribution of the projects developed by Burle Marx in the
northeast of Brazil and its predominance in Pernambuco, where
he designed fifty-eight gardens between 1935 and 1990. He
conceived twenty-one projects in Bahia, nineteen in Ceará from
26 Jardins de Burle Marx no Nord este do Brasil
1•Jc.H 111 l 'J'J1I, a11d thi t ll'Cll ln P.1rulb.1. ln Rio Crandc do Nmk,
tl 1c•tt• ;ll'l· four projc<.I~ dcs igncd by hitn and nine in thc slalcs or l' l.11 tf; Maranhfo, and /\lagoas, Lhrcc in each.
·( hc northcast region of Brazil was parl of the wbole trajcclory
ui Bu rlc Marx whether at the beginning of his career ar at the end
oi his intense professional life. Firstly, he created or redesigned
111any squares in Recife from 1935 to 1937. ln the early 1990s,
lil' conceived one of his last projects, the Botanical Garden of
i:ortaleza, which was not built. Also in Recife, the Francisco
Brcnnand Ceramic Factory Garden (currently known as Burle
Marx Square) was a posthumous tribute. It had been designed in
1 984 but was opened in 1994, the year the great landscape artist
passed away. The list of projects presented in the Appendix points out the
gardens conceived by Burle Marx in the northeast of Brazil, in
accordance with the main publications on his work and the official
information given by the Burle Marx & Co. Office. However,
the collaborative effort has updated it with regard to the total
quantity of projects in that region, about 124, which include both
preliminary studies and detailed studies, their dates and whether
they were built or not. Thus, it would not be possible to include all these gardens
in this edition, which is not supposed to be a panorama but an
effort of combining an overview of Burle Marx's work with the
monographic approach. This book tried to reach the biggcst
extension of the current nine northeastern states as possible sincc
it encampasses seven of them. The state ofSergipe is omitted from
the study because the information available at present suggcst:-.
that Burle Marx has never been there. Alagoas is also omittcd
jardins de Burle Marx n o Nordeste do Brasil 'J.7
although he left at least three gardens thcrc, whicb may hopcfully
be added to the study as time goes by and the group solidifies.
Some authors deepened the content presented in the seminar
in 2007 and consolidated the current stage of their research
whereas others preferred to look into specific gardens in order to
discuss the modem heritage.
On one hand, the gardens chosen by the authors surely
compose a small sample in comparison to the wide set of proposals
conceived by Burle Marx in the northeast of Brazil. On the other
hand, they reveal the largeness of his work, already known in other
places and now shown in the northeastern states. They also consist
of public and private projects, residential and institutional ones,
new gardens or others that were redesigned, whether domestic,
playful, solemn or palatial with different features and scales.
The city of Recife begins this edition due to four reasons.
Firstly, it represents the origin of Burle Marx's work. Secondly, it
hosted the seminar that brought about the study group "Gardens
of Burle Marx'~ Thirdly, the maj ority ofhis projects in the northeast
region of Brazil are located there. Fourthly, it counts on the greatest
nurnber of studies in this region that have been carried out by the
researchers of the Landscape Laboratory since 2001. Then, the
gardens of the other cities are chronologically presented.
ln 1936, the creation of the Artur Oscar Square emphasized
its character as a public space in Recife's historie downtown.
Its floor comprised of local stone slabs was connected by grass
with a central flower-bed with herbaceous and shrubby plants,
mostly from the coastal ecosystem. Burle Marx highlighted the
set and distribution of plants with different colors and textures
to be enjoyed by the local population and the travelers dueto the
28 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
p1oxl111l1y lo lhe lrn1bnr. 'lhc.·sc reatures fon:wc.·1111 hc.· l11yo111 oi llw
wrll known gardcn of thc Minist ry of Educal iou nnd 1 ln dlh ln
lli!1 de Janeiro. 1
Ovcr Lhe lasl dccades, some actions changcd Burk Mll rx's
dc.•s ign of Lhe Artur Oscar Square concern ing thc layoul, lhe.·
original plant speciesand theurban fumiture. Today,a pcrimctricnl
t. urluin of trees is ali that remains ofhis original proposal.
'J hc Jaqueira Chapei Garden is the target of thc sccond
chaptcr, which is the first monographic study on this mallcr.
ln 1951, Burle Marx designed a garden in the surrou ndings of
Lhe Our Lady of the lmmaculate Conception Chapei in Lhe so
called district of Jaqueira requested by the National Historie and
Artistic Heritage Direction. The garden was mainly composed by
herbaceous colored plants and palm trees aiming to preserve Lhe
religious historie monument. The proposal included an area for leisure with spor ts ficld,
playground equipment, and a great amount of trees, but it was
not probably built. ln spite of that, it embodied new concepls
regarding the design of public parks in Recife and boosted lhe
Jaqueira Park, which is widely used by the population cu rrenlly.
ln fact, the park was built in a large lot already used for sports
activities and was opened in 1985.
The study of this project shows its relevance due to its
innovative design proposal and its relationship with a hislor i<..
monument at the time as well as the current symbolic va]ue of thc
chapel and the park assigned by the neighboring population.
ln Salvador, the Jesus Yard was chosen as a case sludy
among other Burle Marx's gardens in Bahia because it is lhe fil'st
public space designed by him as well as its innovative laym11 a111l
Jard ins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
1:011sl rucl ion materiais, ils localion i n lhe historie downtown,
righl in fronl of lhe Jesuits Chapei, and aJso in consideration of
lhe discussion it motivated at the time.
ln lhe 191" century, the garden was the center of the social
lifc and its popularity increased when a bronze fountain was built
lo supply water. From 1948 to 1950, Burle Marx emphasized its
polential as a public space by creating a single flower-bed and
a moveable bandstand to ensure the visibility of the religious monument.
The preservation of the fountain and the use of local surface
materials, such as pebble stones and shells, highlighted the
character of the historie site. Today, the garden is mischaracterized
as the original plant species, benches, and construction materials
were replaced, but it continues to be used by popular performers,
sellers, and residents.
The fourth chapter looks at the Cassiano Ribeiro Coutinho
Residence Garden in João Pessoa as a case study due to the
richness of the design concerning its extension, zoning, sculptural
elements, and the diversity of the vegetation. The study also takes
into account the importance of the residence and the garden as
part of the modem heritage in the state of Paraíba. Both are a
symbol of the local modernity and became landmarks in the mid-201" century.
The residence was designed by the Brazilian architect Acácio
Gil Borsoi whereas Burle Marx's team involved in the garden
design included Fernando Tábora, Julio Cesar Pessolani, John
Stoddart, and Maurício Monte.
They made use of the original vegetation on the lot since it
suggcsted footpaths and contrasts between the shrubby species
30 Ja rd ins de Burle Marx no Nordeste do Bras il
111.t 1 IH· la·rh;1H·ous 01ws ,111d l ll'll l cd a nursery i11 order lo prodL1ce
111.I H'pln((.' thc planls. Monolilhs anti gran ilc bcnchcs, pcbblc
1,101H1<>, waler mirrors, cagcs, playground equipmcnt, and 73 plant I
'•l'l'l H'S i ndicalc thc diversity of materiais, uses, and features of the
g.utkn.
'I hc fiflh essay <leais with the Lions Palace Garden in São Luís
ht'l a use il is a result of a multicultural colonization and it embodies
t he social, cultural, and economic changes that the city underwent
during four centuries. The palace and its garden have hosted the
ild 111 inistration of the government of the state of Maranhão since
l hcy were built.
Dueto the significance of the garden, Burle Marx was invited
lo redesign it in 1968 but only conduded the project in 1973.
l lc kept the palm trees supposedly remaining from the 1950s
and added water mirrors, and ponds for herbaceous plants. ln
addition, he exploited contrasting materials, like white pebble
stones and ceramic slabs, and vegetation with different colors and
heights.
ln Fortaleza, the José de Alencar Theater is among the main
cultural assets of the early 2011i century in Brazil dueto its historical
and architectural importance. The building and its garden are
rooted in the social and cultural life of the city and are often visited
by residents and tourists. The garden was conceived in 1973 and
redesigned in 1990 by Burle Marx and his partners.
ln the first project, Burle Marx, Haruyoshi Ono, and José
Tabacow created a monumental water mirrar With a luminous
fountain for aquatic plants. In the second project, also developed
by Leonardo de Almeida, the sobriety of the design highlighted
the vegetation and the edectic features of the building through
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 31
an orthogonal tloor, cuncrctc bcnchcs, and abscncc of sculptural clcmcnls.
1he first design was unknown in the historical literature of
the city and was kept alive in the memories of those people who
visited the theater in the l 970s. Therefore, this study is relevant to
discuss the garden restoration in the future.
The Da Costa e Silva Monument Square was the only public
space designed by Burle Marx in Teresina. It was built to honor
the poet Antonio Francisco da Costa e Silva, known as the "water
poet': as a result of the partnership with the architect Acácio Gil
Borsoi from 1975 to 1976. lts main attributes show a deep respect
to the natural resources because the irregular layout of the water
mirrar dialogues with the Paraíba River and the carnauba palm
tree is the symbol of the local ecosystem.
Today, the original vegetation is mischaracterized because
new species replaced those specified by Burle Marx but the layout
remains almost unchanged, except for the addition of concrete
footpaths in response to new uses.
ln the city of Natal, Burle Marx developed four projects but
nane of them were built. At present, there is documentation
available concerning the Sand Dunes Park - Coastal Route and
the UFRN Central Library Garden, which is the main subject of
the last chapter.
ln 1976, Burle Marx and his partners, architects Haruyoshi
Ono and José Tabacow, designed a garden for the Central Library
of the Federal University of Rio Grande do Norte, which was a
two-floor modem building.
The plant sculptures made by herbaceous species of the
l ropical flora showed a variety of colors, textures, and heights that
32 Jardins de Burle Ma rx no Nordeste do Brasil
11111 ld ht· upprc.·dakd lro111 both i11kr1or and ~n1 pl!rior lloors. 'lhe
Ir nwil 11r layoul oi' thc !lowcr-bcds and thc pchblc stoncs are parl
111 11111 k Marx's design principies alrcady experienced in many
11llll'; g.mlens.
·1 hus, cach author chose a specific garden as a case study but
1á11nl il lo other projects in order to broaden the understanding
011 Burle Marx's artistic and botanical background. That was
,, methodological strategy mainly used by the authors from
P(:rnambuco, Bahia, Paraíba, and Rio Grande do Norte based on
thci r prcvious publications.
Moreover, the researchers followed these methodological
slcps: documental survey (by collecting historical sources such as
pictures, drawings, newspapers, and reports, among others), field
survey, interviews, botanical survey regarding the original and
the current plant species, the use of hypothetical sketches, and
comparison of the bibliography with the field and archive data.
They also dealt with some specificities concerning the gardens
in the northeastern states. Firstly, the chronological difference
among the projects. Secondly, the current research stage in each
state. Thirdly, the diversity or unavailability of primary sources
and information. Finally, some gardens were only partially built
whereas others were not.
This book is dueto the support of many institutions and people,
to whom the editors are grateful: Sonia Berjman, for signing the
preface; the Burle Marx & Co. Office in Rio de Janeiro, specially
the architects Haruyoshi and Isabela Ono for the photos, drawings
and information ldndly donated; the National Council of Scientific
and Technological Development and other local sponsors, for thc
financial support; the National Historie and Artistic Herilagc
Jardi ns de Burle 'Marx no Nordeste do Brasil
Institute, which owns the official documcnlalion of thc Jaq uc.:ira
Chapel Garden; the seholars Luísa Acioli dos Santos and Juan
David Strada Rincón and Professor Lúcia Veras of the Landscape
Laboratory of the Federal University of Pernambuco; all the
students who eoped with the field survey and the data eollection;
__ _ / the professionals and the technicians who were interviewed and
contributed for the production of the articles.
Besides the effort of documenting Burle Marx's work in the
northeast of Brazil, the authors dealt with its preservation by
registering the current stage of the gardens and discussing their
restoration or the development of the non-built projects. Burle
Marx's gardens dialogue with the natural landscape and its specific
ecosystems as well as the historie urban landscape eharacterized
by colonial, baroque, neoclassical, and eclectic monuments.
In other words, Burle Marx's gardens dialogue with the
traditional urban fabric in the Artur Oscar Square in Recife and
the Jesus Yard in Salvador and the historie buildings such as the
Jaqueira Chapel in Recife, the Lions Palace in São Luís, and the
José de Alencar Theater in Fortaleza. Or, in contrast, they shape
the idea of modem heritage itself whether related to the Cassiano
Ribeiro Coutinho Residence in João Pessoa and the UFRN Central
Library in Natal or in the Da Costa e Silva Monument Square in
Teresina.
In addition, Burle Marx redesigned the gardens of the palatial
buildings of the government of Pernambuco (Princesses Field
Palace, Recife, 1936), Paraíba (Redemption Palace, João Pessoa,
1939), Maranhão (Lions Palace, São Luís, between 1968 and 1973),
Piauí (Karnak Palace, Teresina, 1972) and Alagoas (Marechal
Floriano Peixoto Palace, 1974).
34 jardins de Burle Marx no Nordes te do Brasil
1>11t• 1 o I hdr crnlogkal and historiu1l sign lfiL ;111l L\ lh1 rk M.11 x 's
H•ll d1·11 s i11 lhe northc.:asl rc.:gion oí Brazi l :-; hould bc a..:knowkdgl·tl
Ili l1:v111g monumcnls in accordancc wilh Lhe worl<lwidc hcr il ag1.•
11w;1 l.11 ions, chartcrs, and institulions.
' I hc knowledge on thcm embodies Lhe discussion on l wo
ll' llll i remcnts of thc conlemporary society, that is, thc global
1 ·~ ological management and the local historie preservation, which
1 li is book highlights.
Ana Rita Sá Carneiro.
Aline de Figueirôa Silva.
Joelmir Marques da Silva.
Editors.
Recife, January, 2013.
Jardins de 13 urle Marx no Nordeste do Brasil
j
l'IV\ÇJ\ ARTUR OSCJ\lt NO RECIFE: /\MODERNIDADE NO JARDIM DE BURLE MARX
11,11l111ü M;tria Alves da Silva Mafra
Introdução
A Praça Artur Oscar localiza-se no Bairro do Recife, centro
histórico da cidade, resultado de aterros de áreas alagadas. Ainda
110 século 19, era uma área descampada, onde existia o Arco do
Bom Jesus, que demarcava a entrada da antiga cidade (BRAGA,
2000) e estava localizado no fim da Rua do Bom Jesus ou Rua dos
Judeus. No entorno e aproveitando o material de sua demolição,
ocorrida em 10 de maio de 1850 (ARLEGO, 1987), foi erguida
a Torre do Arsenal da Marinha, atual Torre Malakoff, que,
juntamente com o casario, dá forma ao espaço da praça (SILVA,
20 10).
A sua construção se deveu à comemoração do término da
Guerra do Paraguai (1865-1870), pois lá se formou o Batalhão dos
Voluntários da Pátria e, por esse motivo, recebeu o nome inicial de
Praça dos Voluntários da Pátria. Anos mais tarde, foi renomeada
de Praça Artur Oscar para homenagear o general Artur Oscar
Andrade Guimarães, que derrotou o movimento revolucionário
de Canudos (1893-1897), como ressaltam Braga (2000) e Silva
(2010). Contudo, dada a presença do edifício do Arsenal da
Marinha, a praça passou a ser também conhecida como Praça do
Arsenal da Marinha.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil :n
O Bairro do Recife, no inicio <lo século 20, passou por unrn
gra nde reforma urbana, cujo objetivo foi modernizar o centro,
implantando melhorias de infraestrutura. Por ocasião das obras
de reaparelhamento do porto, modificaram-se o traçado urbano e /
o casario existente. As obras foram iniciadas em 1909 e só foram
concluídas em 1926 (ZANCHETI; LACERDA e MARINHO,
1998).
A reforma do Bairro do Recife contribuiu para a valorização
dos edifícios e lotes e instalação de grandes companhias financeiras,
firmas de comércio exportador e importador, escritórios, bancos
e confeitarias (MOREIRA apud SILVA, 2005) . A foto a seguir
captura esse momento de transformação (Fig. 1).
Apesar de não mostrar a praça por inteiro, a figura notifica um
desenho de influência francesa e revela a presença de um obelisco.
Chamado de Monumento Sete de Setembro, foi, segundo Silva
Fig. 1. Praça Artur Oscar, provavelmente durante as obras de reforma do Bairro do
Recife, início do século 20. Edifício do Arsenal da Marinha à esquerda e, ao centro, em
obras, o edifício da firma Western Telegraph. Fonte: Fundação Joaquim Nabuco.
38 Ja rdins de Burle Marx no Nordes te do Brasil
()O 1 O), l 11 n11gu rado no governo de Sigism u ndo Gonçalves ( l 904-
1'>0H).110 mesmo tempo cm que a praça foi ajardinada.
1 ·:m ou tras fotografias verificou-se que a vegetação implantada 1
1111·nl'IL' rizava-sc por uma cobertura arbustiva, como a taioba
(Alomsia sp.), e rasteira, compondo os canteiros, e por uma
1 orti11n de árvores, a exemplo do oiti-da-praia (Licania tomentosa)
1· do coração-de-negro (Terminalia catappa), amplamente usadas
1rn ;1rborização da época, contornando o espaço.
O aspecto inicial de área de campina foi substituído no início
do século 20 por um projeto com traçado retilíneo, apresentando
caminhos axiais que dividiam a praça em quatro canteiros de
forma triangular, conduzindo os transeuntes para o centro, onde
estava localizado o obelisco.
É possível dizer que a Praça Artur Oscar, nas primeiras
décadas daquele século, encerrava em seu aspecto físico um
projetar que tinha corno horizonte os espaços públicos europeus
e a prática de erguer neles monumentos em homenagem a heróis
e feitos nacionais.
Década de 1930: o moderno na Praça Artur Oscar
No início dos anos 1930, a cidade passou por novas
transformações e, perseguindo o objetivo de modernização do
Recife, o governador Carlos de Lima Cavalcanti ( 1935-1937) criou
a Diretoria de Arquitetura e Construção da Secretaria de Viação
e Obras Públicas. Sua equipe multidisciplinar era composta por
engenheiros, urbanistas e arquitetos, além do artista Roberto Burle
Marx, que assumiu a chefia do Setor de Parques e Jardins, tendo,
entre suas atrlbuições, a reforma de praças, largos e projetos para
nov9s)ardins.
Dentre os jardins concebidos pelo paisagista figuravam o da
Praça de Casa Forte e o da Praça Euclides da Cunha ou Cactário
da Madalena, além do jardim da Praça Artur Oscar. Pesquisas
e estudos realizados pelo Laboratório da Paisagem/UFPE em
torno da obra paisagística inicial de Roberto Burle Marx revelam
que os três projetos guardam entre si princípios de composição
semelhantes, pontuados ao longo do texto.
Para o paisagista, o jardim deveria semear a alma brasileira e,
assim, cumpriria um papel na história da humanidade. O crítico
de arte Mário Pedrosa revela no texto "A arquitetura paisagística
no Brasil" a preferência pelos "jardins já inscritos nos livros" e
comenta que as flores nativas eram ignoradas e tidas "como mato
brabo" (PEDROSA e AMARAL, 1981, pp. 281-283). Para figurar
nos jardins era preciso observar "uma hierarquia vegetal segundo
as origens das flores e plantas" (PEDROSA e AMARAL, 1981, p.
282). Em seguida, depois de tecer considerações sobre a herança
portuguesa do medo de florestas, observa a originalidade do
jovem paisagista:
Foi então que chegou Burle Marx( ... ) e acabou com todos
os preconceitos. ( ... ) as plantas nacionais plebeias, como,
por exemplo, os crótons nativos de que temos mais de uma
dúzia de variedades, nos tons mais belos e transparentes,
obtiveram carta de entrada nos novos jardins (PEDROSA
e AMARAL, 1981, p. 283).
Retirando as plantas nativas do ostracismo, Burle Marx
projeta seus três primeiros jardins públicos, destinando, a cada
um, espécies de diferentes regiões fitogeográficas. O jardim
40 Ja rdins de Burle Marx no l\'ordeste do Brasil
d11 l'r.1~.1 At tur Osc.1r ll'V{' 11111 rndtc1 mais i111 i111i s111 • nhdgo11
l''ll1't'•1 ll-11 lornb, cm sua maioria da restinga, enqunnlo o J11nl lni dn
11111\•I Lu~ lides da Cunha acolheu espécies da caatinga. Casn Jt'orh' 1
lc vi· .1 missao de abrigar a flora de diferenlcs regiões nacionais
i: i11lt•rn,1donais: as plantas aquáticas das íloreslas tropicais,
lm l11i11do espécies da Mata Atlântica, d a Floresta Amazônico l'
C'X(11 it as.
Seguindo os ensinamentos da arquitetura moderna, o
po isagista declara que as praças ou os jardins, como foram
designados à época, destinavam-se a cumprir funções na cidade:
proporcionar higiene, educação e arte. Os espaços públicos
L 11mpriam a função higienizadora, pois, quando bem arborizados,
ofereciam sombra para o descanso e o lazer e amenizavam as
alias temperaturas, à medida que equilibravam com sua massa
arbórea a relação entre área construída e espaços vegetados. As
novas espécies vegetais introduzidas nestes três jardins tinham a
finalidade de informar à população sobre a riqueza e diversidade
e.la flora brasileira, cumprindo a função educativa.
Relatos colhidos nos jornais de época indicavam que o uso
da vegetação nos espaços urbanos era feito de forma tímida e
homogênea. Os relatos fazem referência, também, ao uso dos
espaços públicos para a colocação de monumentos comemorativos
e bustos em homenagem aos heróis da pátria brasileira.
Tratando o jardim como obra de arte, Burle Marx ofereceu
à sociedade a possibilidade de apreciá-los, por justaposição de
diferentes espécies vegetais, cores, texturas, contrastes, além de
introduzir obras do escultor Celso Antônio.
As esculturas especificadas para compor os espaços foram
obras projetadas dentro do tema de cada jardim e não introdu:dd<is
Jardins de Burle ;v1arx no Nordeste do Brasil
para homenagear um fe ito histó rico ou retratar um herói (SILVA,
2010). Assim, para o lago central da Praça de Casa Forte, ded icado
às espécies aquáticas tropicais, Burle Marx especificou uma índia
a se banhar num espelho d'água com ninfeias (Ninphaea sp.) e
a vitória-régia (Victoria amazonica) e, para a Praça Euclides da
Cunha, com vegetação da caatinga, indicou a escultura de um
-hómem de tanga, que retratava um tipo nordestino.
Os princípios de higiene, educação e arte considerados por
Burle Marx ao projetar os jardins eram oriundos do pensamento
que regia a arquitetura moderna (de cunho racionalista e
funcionalista) da escola corbusiana, ao passo que o resgate da
identidade provinha do movimento de arte moderna nacional,
deflagrado com a Semana de Arte Moderna de 1922. O artista
moderno no Brasil tinha um papel "prometeico" de difundir a
consciência de nação, tendo como mote a identidade brasileira
(GONÇALVES, 2007, pp. 17-32), que era cunhada considerando
se as culturas indígena e africana, além da europeia.
Burle Marx e os intelectuais da época abraçaram essa causa
e, por isso, a flora autóctone e as esculturas de tipos humanos
brasileiros tiveram lugar de destaque nas praças e jardins,
resgatando e valorizando as origens nacionais.
A Praça Artur Oscar, dada a sua localização, funcionava
como uma espécie de antessala para os viajantes que chegavam
ao Recife pelo porto. Em 1936, Burle Marx recebeu do prefeito
João Pereira Borges (1934-1937) a solicitação para reformá-la e
projetou um espaço de convivência e contemplação, estruturado
com uma cortina de vegetação arbórea de grande porte nas
bordas, cujo objetivo era criar sombra, sob as quais dispôs bancos
para descanso (SILVA, 2005).
42 Jardins d e Bur le Marx n o Nordeste d o Brasil
1 l ru gi .1ntk piso pl.1110 de lajol,1s l'l'ju111.1dus urn1 gr 1111111
M' t'"ilt·1Hli;1 por loda a úrea da prnça, parn tjUC ns pt'SM>.1.,
p11d)L's1w111 circula r li vremente (SlLVJ\ , 2005). A grande lhca
.1ht·1
1'l.I , tlcl imila<la somente pela cortina de <Í rvorcs da pcriforln,
I'' 0111ovt•u a integração de todo o entorno (Pigs. 2 a '1) . Para o
l l'lll ro, lh1rlc Marx projetou um grande canteiro circular com 10 111et ros <le diâmetro, destinado a abrigar espécies vegetais de
diversos estratos (Figs. 2 a 4) .
Fig. 2. Praça Artur Oscar, 19 de junho de 1942, foto
de JCRC (José Césio Rigueira Costa). Fonte: Museu da
Cidade do Recife.
Jardins de Burle Mar x no Nordeste do Brasil
I
/
Analisando os desenhos de Burle Marx (Figs. 4 e 5) e seus
pronunciamentos publicados nos jornais "Diario da Manhã" e
"Diario da Tarde", é possível afirmar que o paisagista adotou os
mesmos princípios de composição que embasaram os projetos
das praças de Casa Forte e Euclides da Cunha (SILVA, 2005;
MAFRA, 2007). Os espaços dos três jardins são circundados por
uma cortina de vegetação de porte arbóreo e o centro ocupado
com vegetação arbustiva e rasteira.
Com esses três projetos, Burle Marx proporcionou à população
a oportunidade de vivenciar sensações antes desconhecidas
perante arranjos vegetais. Houve quem reprovasse e quem
aplaudisse. Causou espanto e admiração a ousadia de um artista
que, vendo mais longe, propôs uma mudança no paisagismo
brasileiro, dando ênfase à vegetação autóctone.
44
Fig. 3. Praça Artur Oscar, detalhe do canteiro central
com as árvores do entorno, foto de Alexandre Berzin.
Fonte: Museu da Cidade do Recife.
jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Apt•s,11 dt' lh11 ll· M.11 x l11dil.1r a vcgl'hl\,IO pa1.1 oi. jardl11i.; cll•
e '.1s.1 Fo1 lc e l\l1didcs da e :unha, 11ao h;\ registros da wgl·l.t\110
l'~u1lhida para a Praça Artur Oscar. Contudo, segundo Jodml1 I
Silv.1 1, biólogo e pesquisador e.lo Laboratório da Paisagcm/UFl'E,
unn base no desenho em perspectiva deixado pelo paisagista l '
cm algumas fotografias, foi possível verificar que Burle M.11 x
LOIKcnlrou esforços na implantação do canteiro cenlral, ao passo
que, para o perímetro externo do jardim, ele aproveitou as árvort•,-.
existentes, acrescentando outras de mesma tip ologia.
Fig. 4. Desenho de Burle Marx para a Praça Artur Oscar, 1935.
Fonte: Escritório Burle Marx & Cia. Ltda.
No canteiro da Praça Artur Oscar, Burle Marx empregou
espécies "arbustivas e herbáceas que faziam parte do ambiente
da restinga e/ou suportavam a salinidade do ar'', destaca Jocl111i1
l Entrevista realizada em 8 de maio de 2012.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
) Sllv.1. E esdnn:cc oindu que, diante dos deLalhcs cfo n10rfologi<1
t'xterna da vegetação, muito bem detalhada nos seus <lcscnbos,
se pode alcançar "a classificação taxonômica dos espécimes" que
compuseram o canteiro central (Tabela 1). Complementando a
análise, Joelmir Silva diz que a vegetação proposta pelo paisagista
Lhama mais atenção pela:
Morfologia externa das folhas (dos mais variados tons
de verde), dos caules e das inflorescências. As flores
destacavam-se na composição por se apresentarem
formando pendões e não pela diversidade de cores, onde
havia a predominância do branco.
Para o pesquisador, "a vegetação se assemelha a de dois outros
projetos do paisagista análogos à Praça Artur Oscar, o jardim da
Praça Dezessete e o do Largo das Cinco Pontas", localizados na
mesma área da cidade.
Tabela 1: Composição florística da Praça Artur Oscar
identificada a partir do desenho de Burle Marx, 1935.
Nome científico Nome popular
J\gave attenuata Salm -Dyck Agave-dragão
!\loe barbadensis Mill. Alo e
!\loe vera (L.) Burm. f. Alo e-vera
Caladium sp. Caládio
Cf usia fiuminensis Plan ch. & Triana Clúsia
Sansevieria trifasciata Prain Espada-de-são-jorge
Yucca elephantipes var. ghiesbreghtii Molon Yuca
l'onte: )oelrnir Marques da Silva, 2012.
Jardins d e [{urle Marx no Nordeste do Brasil
< >11 dl'Sl'l1hos ddxt11Jo11 1m1 Hul'le Marx indicam que o Lrnçado
dn Pr.1~·a /\rllir Oscar é o passo que antecede a elaboração de
11111 l!os 111ais rcpresenlali.vos projetos do paisagista, o Jardim
do Ministério da Educação e Saúde (MES), no final da década
d1.• 1930 (MAFRA, 2007). Tal constatação pode ser percebida ao
Sl' observarem cuidadosa e paralelamente as Figuras 5 e 6. Na
Pigura 5, as hachuras indicando o arranjo das espécies vegetais do
canteiro central projetado para a Praça Artur Oscar se espraiam
e ganham o espaço no jardim suspenso do MES, como mostra a
Figura 6.
Ressalta-se que a atuação de Burle Marx no Recife promove
uma reflexão sobre os princípios que regem a criação de um
jardim e o contexto artístico nacional e internacional que influem
e
Fig. 5. Canteiro central da Praça Artur Oscar (hachura). Fonte: Mafra,
2007, a partir do projeto original de Burle Marx pertencente ao
Escritó r io Burle Marx & Cia. Ltda.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Fig. 6. Jardim do MES, atual Palácio Gustavo Capancma. O visitante
anda entre os arranjos de plantas, dispostos em canteiros de formato
ameboide. Fonte: Flcming, 1996.
na manifestação paisagística. Ele também dá início a uma
sistematização de procedimentos para a criação e manutenção
de jardins urbanos. O projeto da Praça de Casa Forte deixa
isso bem claro, à medida que traz a relação das plantas a serem
utilizadas, cortes do perfil da vegetação e detalhes arquitetônicos
dos canteiros e espelhos d'água.
Além da sistematização de procedimentos, Burle Marx
instituiu outra prática, que Dourado (2009, p. 208) aponta como a
mais árdua: a coleta de espécies vegetais nas regiões próximas, já
que "os viveiristas não se interessavam por essas plantas': Apesar
de tantos avanços, o jardim da Praça Artur Oscar, concluído em
1936, se manteve somente até o final da década seguinte. Em 1948,
a Marinha Brasileira homenageou o seu patrono retirando toda a
vegetação do canteiro central e colocando em seu lugar o busto
do almirante Joaquim Marques Lisboa (Fig. 7), o Marquês de
Tamandaré, herói da Guerra do Paraguai (BRAGA, 2000).
48 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Fig. 7. Praça Artur Oscar, 1951. À esquerda, em segundo plano, vê-se o
busto do almirante Joaquim Marques Lisboa, o Marquês de Tamandaré.
Fonte: Museu da Cidade do Recife.
Da década de 1960 aos dias atuais
Como foi dito anteriormente, a reforma do Bairro do Recife,
realizada no início do século 20, trouxe comércio e serviços
voltados para consumidores de alto poder aquisitivo, práticas que
não se consolidaram. Ao mesmo tempo, as atividades do porto e
a população de trabalhadores ligados à carga e descarga geravam
demanda de comércio e serviços para o consumo de baixo poder
aquisitivo.
As atividades portuárias se consolidaram na década de 1960
com a construção de grandes armazéns, do terminal açucareiro
e do parque de tancagem. À época, ruas foram incorporadas ao
pátio de manobra dos caminhões e trens. O bairro perdeu prestígio
jardins de Burle Marx no Nordeste do Bras il
e imóveis ociosos foram ocu.pados por cortiços, prnslfbu los e
bares. Na década de 1970, repartições públicas se instalaram
numa área de aterro que foi destinada a um parque metropolitano
(ZANCHETI, LACERDA e MARINHO, 1998).
No ano de 1975, a Praça Artur Oscar, palco de tantas
comemorações, encontrava-se abandonada. A área que Burle
Marx havia destinado ao convívio e à contemplação quatro décadas
atrás era ocupada pelos automóveis, servindo de estacionamento
para funcionários de órgãos militares das imediações. Os bancos
desenhados pelo paisagista, que emolduravam os troncos d as
árvores, foram retirados e o canteiro central, ponto focal da
composição e ocupado em 1948 com o busto do Marquês de
Tamandaré, servia de abrigo para cachorros. Ante tal degradação,
o espaço foi reformado pela Prefeitura do Recife na gestão de
Augusto Lucena (1971-1975), que instalou, em 1973, a Empresa
de Urbanização do Recife (URB).
Em 1975, com o objetivo de reparar a praça, a Prefeitura
Municipal realizou uma intervenção. Um dos elementos do
projeto foi um grande banco de concreto, que circundava toda a
praça com a intenção de impedir o acesso de automóveis. 2 Partindo
do banco, em aclive, criou-se uma área gramada, com grade,
que elevou a cota de todo o interior da praça. No canteiro com
vegetação de restinga, projetado por Burle Marx, foi colocado um
piso de pedra e foram plantadas palmeiras-imperiais (Roystonea
oleracea), dispostas em círculo, delimitando uma área destinada
ao estar que poderia ser alcançada por um único acesso.
2 Relato obtido em entrevista realizada em 6 de março de 2012 com a arquiteta Inês Mendonça de Oliveira.
50 far<lins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
\
A.~ p.illlll'irns iinpt• r 111111 lm.11 11 l'Srnlhidus porq lll', l'l11 s111
l.1M' .u.lu lta, se dcsl;1tari;im pelo l ontrnste com a allu l'll tl.1
v{w·1 a ~ ao arbórea já existente e con!Cririam ao espaço aspet lo dt•
1111po11ência, à semelhança de outros jardins da cidade.
Além das palmeiras, foi criado um bosque de casua1 i11;1s
( ( :a .... wir;na littorea) com mudas de grande porte, encontradas
l' lll abundância na sementeira da Prefeitura. A vegctaçüo do
perímetro, composta por oiti-da-praia (Licania tome11losr1) l'
coração-de-negro (Terminalia catappa), foi recuperada e arranjos
de primavera (Bougainvillea spectabilis) complementavam o
projeto, conferindo cor ao conjunto.
Com esta configuração que visou ocupar o interior da pra, a
com gramados e outras espécies, a integração visual e física do
entorno, presente no projeto de Burle Marx, foi alterada. 1 ~ o
centro, apesar de ser marcado por palmeiras-imperiais e expor
o busto do Marquês de Tamandaré, deixou de ser o pon to de
convergência dos transeuntes, à medida que os percursos e os
espaços de convívio foram concentrados ao longo do perímetro.
Desde a década de 1980, a praça é palco de eventos musicais
e festas populares, principalmente durante o carnaval, sendo
frequentada nos finais de semana p or causa do funcionamento da
feira de artesanato da Rua do Bom Jesus. Em 1988, foi acrescen lado
um acesso ao centro e ao longo do perímetro dispuseram se
bancos de estilo veneziano e jarros acompanhando a linha ck
palmeiras-imperiais (Fig. 8).
No início da década de 1990, foi elaborado o Plano de
Revitalização do Bairro do Recife, que teve como meta principal
"aumentar a oferta de serviços de interesse turístico" com o apoio
do Governo do Estado de Pernambuco (ZANCHETI, LACERI )/\
Ja rd ins d e Burle Marx no Nordeste do Brasil 51
e MARINHO, 1998). Desde enlão, cm períodos de pouca ou
muita efervescência, bares, restaurantes e equipamentos culturais
foram aos poucos instalados no bairro.
Fig. 8. Praça Artur Oscar, planta baixa do projeto de intervenção, 1988.
Fonte: Acervo de Inês Mendonça de Oliveira.
Entre 2001 e 2002, durante a primeira gestão do prefeito João
Paulo Lima e Silva (2001-2004), investiu-se na instalação de fontes
ou esguichos em alguns espaços públicos da cidade: o Açude de
Apipucos, a Praça Dr. Lula Cabral de Melo ou do Parnamirim, a
Praça Parque Amorim e também a Praça Artur Oscar. O modelo
escolhido para a Praça Artur Oscar ocupou a área central e,
por suas características de forma, altura e diâmetro, acabou
eliminando a área de convívio criada em 1988 com os ajustes ao
projeto de 1975. Com a colocação da fonte, o busto do Marquês
52 Ja rd ins de Bu rle Marx no Nordeste do Brasil
ili• T1 111 1. 1111l11rt· f(1i ~il-s lorndo pnrn um dos rn11los tio nn111111do 1
p1• 111 ~· 11 di:<.;l tltJll<.'.
Considerações finais
No in ício do século 20, por ocasião das reformas e mdhorius
j,•11as no Bairro do Recife, a Praça Artur Oscar, palco de
1l l 0111l'cimentos e homenagens, foi ajardinada e seu projeto seguiu
os moldes de jardins europeus.
/\ mudança ocorreu com a chegada de Burle Marx ao Recife.o . qm• inovou defendendo a relevância do jardim e do seu papel como
l':-.paço público, com o propósito de difundir a origem brasileira
l'lll ações atreladas a um contexto de efervescência cultura l. 1\,
.li nda, chamou atenção para o uso, sistematizou procedimentos
de elaboração e conservação de espaços vegetados. Contudo,
o projeto implantado em 1975 procurou atuar no controle cio
uso do espaço público e as questões levantadas por Burle Marx,
desconhecidas, não foram resgatadas à época.
A trajetória da Praça Artur Oscar está diretamente ligada :'t
história da arte do paisagismo no Brasil. Com a atuação de Burle
Marx no Recife, os ideais modernistas de retorno às origens e
afirmação da identidade nacional foram elaborados e revelados
por meio dos jardins. Num gesto de ousadia e compromisso com
valores da época, Burle Marx expôs à sociedade os variados lipos,
formas, cores e texturas dos vegetais. As plantas, principalmcnll'
as autóctones, assumiram lugar de destaque e figuravam como
elemento principal dos jardins. E a modernidade do jardim
brasileiro iniciou-se com a criação das praças de Casa Forte l'
Euclides da Cunha, juntamente com a Praça Artur Oscar.
Jard in s de Burle Marx no Nordes te d o Brasil
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54 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
/\f:11·:aclcclmc11los
l · 1111d 1 1c_~w Jonqu im Nab uco ( l;UNDAJ) e Museu da Cidade do Recife.
l1mli11s de Burle Marx: no Nordeste do Brasil
- -...........
O JAIU>IM OI\ CAPEI.A DA JAQUEIRA: IJ M MONUMENTO PRESERVADO PO 1\ BURLE MARX NO RECIFE
J\11.i Rita Sá Carne iro
l\llru· de Figueirôa Silva
Jo1•l111ir Marques da Silva
Introdução
O Jardim da Capela da Jaqueira é um jardim de contemplação
de um monumento arquitetônico1, atualmente localizado dentro
de um parque urbano, portanto, ligado às necessidades recreativas
dos usuár ios. Na década de 1950, a Capela da Jaqueira encontrava
se em estado de abandono e deterioração, motivo pelo qual a
então Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(DPHAN), hoje IPHAN2, solicitou ao paisagista Roberto Burle
Marx um projeto para a construção de um jardim no entorno do
pequeno templo, de modo a preservá-lo e valorizá-lo.
Sua implantação ocorreu provavelmente em 1953, em uma
área de 14.000 m 2, conforme a planta baixa do projeto original.
1 A Capela ou Igreja de Nossa Sen hora da Conceição da Jaqueira é um m onumento nacional, segundo inscrição nº 160 no Livro de Tombo das Belas Artes, fol ha 28, em 7 de julho de 1938, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
2 Serviço do Patrimônio Histórico e Ar tístico Nacional (SPHAN), d e L937 a 1946; Diretoria do Patrin1ônio Histórico e Artístico Nacional ( DPHAN), de 1946 a 1970; Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), de 1970 a 1979; Secretaria do Patrimônio H istórico e Artístico Nacional (SPHAN), de 1979 a 1990; Instituto Brasileiro do Patri mônio Culturn l (IBPC), de 1990 a 1994; Instituto do Património Hi stó rico e Artístico Nacional {IPHAN), 11
p artir de 1994 (PESSÔA. 2004, p. 11).
Ja rdins de Burl e M arx no Nordeste do Brasil
Mas, hoje, encontra-se inserido no Parque da JaqLtcira, que, ao
todo, dispõe de 70.000 m2 e está localizado no bairro homônimo,
na zona norte do Recife.
O projeto de Burle Marx concretizou o que foi almejado
pelo arquiteto Lúcio Costa em 1951, à época chefe da Divisão de
Estudos e Tomb~ntos (DET) da DPHAN, isto é, a utilização
da vegetação para enaltecer a capela. Já em 1956, este projeto
foi mencionado pelo historiador Henrique Mindlin como obra
relevante da arquitetura moderna no Brasil. Na década de 1980,
compareceu em Motta ( 1983, p. 84), ao afirmar que "a simplicidade
de um jardim transformou um terreno baldio em local aprazível",
e, segundo Laurence Fleming ( 1996), foi um dos mais gratificantes
projetos para o paisagista.
Embora referido na bibliografia especializada como "Garden
for Jaqueira Chapei" (MINDLIN, 1956), "Garden of Jaquera
Chapei" (BARDI, 1964), ''Adro ajardinado da Capela da Conceição
da Jaqueira" (GONÇALVES, 1997) ou "Praça Nossa Senhora da
Conceição da Jaqueira" (LEENHARDT, 2000), o projeto assinado
por Burle Marx compreende um jardim no entorno da capela
e um extenso parque para a recreação da população do Recife.3
Àquela época, a capital pernambucana ultrapassava meio milhão
de habitantes e dispunha unicamente do Parque 13 de Maio,
planejado desde o século 19 e apenas concretizado em 1939.
O projeto de Burle Marx para a Jaqueira é possivelmente um
dos primeiros parques urbanos projetados segundo princípios
do modernismo brasileiro, inaugurando uma nova concepção
3 O projeto de Burle Marx, intitulado Jardim para a Capela da )aqueira, em escala 1:200, pertence ao acervo da Superintendência do IPHAN em Pernambuco, com sede no Recife.
58 fardins de Burle Marx no No rd este do Brasil
de• p.ll'<llll' púhlko nn e id.HIL· do Recife cm uma :\n•a ljllC j~\ c1 a
ui il1z,1da para campeonatos de fu tebol e, portanlo, propensa às
p1 .\t itas recreativas. Esta proposta adquire relevo na história do I
p<ll!-.ilgismo de Pernambuco e do Nordeste por contemplar um
novo programa de recreação urbana na perspectiva dos usuários
do espaço verde e público e, ao mesmo tempo, um jardim
umtcmplativo de dimensões modestas visando à preservação de
um monumento colonial.
Por volta de 1936, como chefe do Setor de Parques e Jardins
do Departamento de Arquitetura e Urbanismo do Governo de
Pernambuco, Burle Marx já havia projetado a reforma da Praça
Pinto Damaso, no bairro da Várzea, prevendo "uma grande área
pavimentada, um coreto, um pergolado, um lago central com
fonte, dois playgrounds (parques infantis), arborização e bancos
de granito sem encosto, com o aproveitamento de árvores e
palmeiras já crescidas" (SILVA, 2010, pp. 192-193). Este projeto,
caso tivesse sido realizado, teria dotado o tradicional subúrbio
da Várzea de um dos primeiros jardins públicos com área para
recreação infantil no Recife.
Tais preocupações recuam à década de 1920, quando o
Governo de Pernambuco desenvolveu, em 1923, um amplo
projeto, não implantado, para o Parque 13 de Maio no Recife, com
área para prática de esportes, recreação infantil, quadra de tênis e
rinque de patinação (SÁ CARNEIRO, 2010, pp. 90-92). O Parque
13 de Maio, inaugurado em 1939, privilegiou fontes nos lagos e
espaços de contemplação.
A implantação de playgrounds ou parques infantis em praças
e colégios do Recife sinaliza a ênfase na recreação infantil durante
a gestão de Pelópidas Silveira, que chefiou a Prefeitura do Recife
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 59
enlrc 1955 e 1959 (PONTUAL, 2001). A propósito, no furnl da
década de 1950, dois projetos paisagísticos foram concebidos
por Roberto Burle Marx a convite do prefeito Pelópidas Silveira:
a Praça Ministro Salgado Filho (1957) - jardim de entrada da
estação de passageiros do Aeroporto dos Guararapes - e a Praça
Faria Neves (1958), no bairro suburbano de Dois Irmãos.
Neste sentido, embora não tenha sido inteiramente
implantado, o projeto de Burle Marx para o entorno da Capela
da Jaqueira cristaliza demandas sociais pretéritas e vincula
se a realizações futuras. Por um lado, representa a retomada
de princípios paisagísticos moldados desde meados da década
de 1930. E, por outro, em razão do seu caráter contemplativo e
recreativo, antecipa-se a práticas urbanísticas do final da década
de 1950 na história da cidade do Recife. Articula dois períodos
significativos da produção de jardins públicos em Pernambuco e,
apesar dos lapsos temporais, coloca-se como uma mediação da
atuação do paisagista na capital pernambucana.
A origem do jardim
As origens do bairro da Jaqueira remontam ao século 17,
quando, em 1633, suas terras foram palco de um combate entre
as forças comandadas por Felipe Camarão e os holandeses, na
sua tentativa frustrada de tomar o Forte do Arraial do Bom Jesus,
em Casa Amarela. Em 1766, o capitão Henrique Martins, então
proprietário do sítio, construiu uma capela sob a invocação de
Nossa Senhora da Conceição de Ponte d'Uchôa (SÁ CARNEIRO
e MESQUITA, 2000). Seu nome foi mudado pela população, que
60 Jardins de Burle Marx n o Nordeste do Brasil
pw;i;ou ,, lhl' chamar de C<1pt:lt1 de Nossa Senhora da Conceição da
)111 111t•irn cm alusão às frondosas árvores que a circundavam.
Antes de ser jardim e, posteriormente, parque, esse espaço
~ 0tl li t·c..eu um período de abandono que ameaçou a permanência
d.t capela. Durante vários anos, sediou o Campeonato
11<.· rnambucano de Futebol e a Feira do Comércio e Indústria de
Pernambuco (FECIN), um dos maiores eventos anuais da cidade
(SÁ CARNEIRO e MESQUITA, 2000).
A capela está entre os primeiros tombamentos efetuados pelo
então SPHAN em 1938, quando da seleção dos monumentos que
iriam compor os bens do patrimônio histórico e artístico nacional,
condição imputada a cidades remanescentes do período colonial e
a diversas edificações de cunho religioso, priorizadas, sobretudo,
por seu valor artístico.
Na década de 1940, a capela foi alvo de saques e arrombamentos,
como sinaliza a correspondência entre o diretor geral da DPHAN,
Rodrigo Melo Franco de Andrade, e o engenheiro Ayrton
Carvalho, então chefe do 1 ° Distrito da instituição. Consta no
Ofício nº 122/51, expedido pelo chefe do 1° Distrito em 22 de
maio de 1951 e intitulado "Ainda sobre o assunto da Jaqueira":
Snr. Diretor Geral, encaminhamos a Va. Sa., anexo ao
presente, um recorte do "Diário da Noite'; reportagem
do jornalista Dias da Silva, sobre o saque da Capela da
Jaqueira. Queremos comunicar ainda que conseguimos
com o nosso amigo Edgar Amorim, agora à frente
da Diretoria de Obras Municipais fosse efetuada a
capinagem em tôrno da Capela, o que está sendo
realizado. Outrossim, temos a promessa, do referido
Diretor de Obras, da execução do ajardinamento da
área circundante, na condição da DPHAN projet ar e
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil <> l
executar o j.1rd i rn. Nl·st.1 oporl 11111dildl', 111for111.111 H>s, 1•,\ (,\
sendo feito o plano de ajard inamento pdo t'Sludant c dl·
arquitetura Adricn Kiss, ora entre nós e que se mosl'"
interessado pelo assunto. Logo esteja concluido o projeto.
teremos a satisfação de encaminhá -lo a Va. Sa., para o
devido julgamento, antes de entregá-lo à Municipalidade
para a sua realização. Atenciosamente, Ayrton Carvalho,
Chefe do 1° Distº. da D.P.H.A.N.
Portanto, em 1951, devido aos atos de vandalismo praticados
contra a Capela da Jaqueira, a DPHAN decidiu implantar um
jardim em seu entorno, que, conforme entendimentos mantidos
com a Municipalidade, seria projetado e executado pela Diretoria
~- -- de Patrimônio. Como relata o referido ofício, o estudante de
arquitetura Adrien Kiss estava desenvolvendo um projeto
paisagístico a título de colaboração com a DPHAN.
Foi localizada no acervo da Superintendência do IPHAN
em Pernambuco uma planta, em escala 1:200, denominada
''.Ajardinamento em torno da Capela da Taqueira': sem data e
assinatura. É bastante provável que esse projeto seja de autoria
do estudante de arquitetura Adrien Kiss, segundo confrontação
com a correspondência interna da DPHAN de 1951. Através do
Ofício nº 137/51, de 7 de junho de 1951, remetido a Rodrigo
Melo Franco de Andrade, Ayrton Carvalho submete o projeto do
estudante Adrien Kiss à apreciação superior.
62
Com o nosso Of. nº 122/S l , de 22/05/51, comunicávamos
a Va. Sa. que havíamos tido a promessa da Diretoria de
Obras Municipais do Recife, de fazer o ajardinamento
das áreas circundantes da Igreja de N. Sa. da Conceição
das Barreiras (sic), caso nos comprometêssemos a
projetar e executar o jardim. Aproveitando a estada no
Jardins de Burle Mar x no Nordeste do Brasil
llt ,1 11 111do1·~t11d,111(1 • d1 ,11q11lkl111.1 J\d iltll l\i'.'•' n 'i l i!
i111l' H'%t' dt' t<>l,lhCll ,11 tOl l0,10 110 .l'\llll(O, IOl l li\'f\ llillHl h
qul' hn''M' o prOJl'lo de ·•J.11d111.1 111l'11l11 q111· 111 .1 1 \ (,111111
1 l·nwt;:ndo ,1 essa l)i rcc,ao < ;l'1,il, P•ll a ljlll' .,1111 .1, '"'~
~t·cçocs téuiicas o meretido estudo l' rt'll"h<l , dq1111s, 1111
nao, a aprovaçao exigida. () referido prn1cto (• 11111111111>"º
e poderá servir-nos bem. Caso aprovado, cr11..cl.11 1·1110'
de novo os cnlcndimcnlos da (sic) Diretoria de Olir.1\
Municipais, para a sua breve execução. Üsle J >isl 111 0,
nesta oportun idade, sente-se obrigado a elogiar o l'spfr ito
de trabalho e de colaboração do Snr. Adricn, a cuja lw;1
vontade e capacidade profissional, devemos o Lr;1 \l;ill10
técnico agora remetido. Sem outro assunto no rnomcn lo,
aguardando a deliberação superior sôbre o assunto.
firmamo- nos. Anexo: l Projeto de ajardinamcnlo d.1
area em tôrno da Capela da Jaqueira, no Rccifr. 1'1·
Atenciosamente, Ayrton Carvalho, Chefe <lo 1° Disl". d.1
D.P.H.A.N.
Apesar de seu destacado espírito de cooperação, o projeto de
ajardinamento do estudante Adrien Kiss não foi aprovado. Por
isso, na Informação nº 124, de 22 de junho de 1951, o arquit:clo
José Souza Reis, chefe da Secção de Projetos, sugeriu uma consulta
ao paisagista Roberto Burle Marx e submeteu seu curto parecer
ao responsável pela Diretoria de Conservação e Restauro (DCR),
Renato Soeiro, que, por sua vez, o encaminhou ao arquiteto Lúcio
Costa, o qual emitiu o seguinte juízo:
Capela da Jaqueira (ajardinamento): Estou inteiramenll'
de acôrdo com o parecer do arquiteto José Souza Rci11.
1° Porque a intenção de compor um jardim elahor;1do
segundo os principias pictoricos e plasticos apli Ladm
com exito à jardinagem pelo pintor Roberto Burle Mnr x,
resultou apenas, no caso em apreço, em manifcsta,.10
Ja rdins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
de falso modern ismo, ou seja, 110 arrcr ncdo, sem prl' vlo
aprendizado e assimilação das leis que dão si.:nl ido c
coerência formal, da arte paizagistica tal como passou a ser
compreendida e praticada depois da fecunda intervenção
do pintor Burle Marx, que pode ser considerado, sem
favor, o Le Notre do século XX. Ora, é indispensável o
artista identificar-se, primeiro, com a técnica de compor
dos pintores e escultores da velha-guarda contemporanea,
para então poder aplicar com proveito a lição desses
mestres ao material vivo de flora, sem o que se perderá
no emaranhado de curvas e contra-curvas artificiais,
dispostas arbitrariamente e destituídas de unidade
plastica e significação. 2° Porque semelhante concepção,
visando de preferência a composição de conjuntos de
sentido deliberadamente ornamental, não se deve aplicar
no caso, senão na forma parcial ou complementar, com
a finalidade de guarnecer determinadas partes da area
interessada, tais, por exemplo, o oitão desaigetado da
capela e a sua empena posterior, ou de um modo geral,
alguns dos setores do amplo perímetro ajardinado; no mais
deveria prevalecer o proposito de agrupar arborisaçâo de
porte, disposta com naturalidade e visando sabiamente
a criação de zonas densas de sombra, entremeadas de
areas peneiradas de luz e clareiras de sol, sobre chão de
terra-batida com gramado contínuo - grama para pisar
- com bancos simples de encosto resguardados ou não,
conforme o caso, por vegetação de menor porte e variada
floração. Lucio Costa.
É possível perceberasensibilidade de Lúcio Costa interpretando
o projeto em questão como um simples traçado artificial sem
expressão artística, comparado à precisão dos "princípios
pictóricos e plásticos" que o artista Burle Marx já incorporava
na arte do paisagismo. O arquitelo descreveu como deveria ser o
64 Jnrdi11s de Burl e Marx no Nordeste do Brasil
I'' 11lt'lo 1111 1'1\ l 'SSL' J u1 dl111 , 11 11 ~ 1 11.11 n Yl'gl'in~·i o n:ssn l1:1ria 11 11411111.iN
vl'l tm• 1' 11 l11·hmi:.wçüo dl..' porlc L'SLal"ill \ lisposln com 1rn l11 rn lld11tk':
111j ~ t·jo, 1)rivi lcgíando zonas de sombra e luz sobre um grn m11 do
1 1;111f1H10. Sua scnsibil ldade é tamanha que menciona dctnl lH's
111 Nt' 1·dcrir aos bancos de en costo tendo ao lado "vcgclaç:10 dL'
111t'1H>1 porte e variada floração''. A tais observações Burle Marx
p.1n'í. L' ler respondido com seu projeto. Após emissão do pal'L'U'I'
dt• Lúcio Costa, Rodrigo Melo Franco de Andrade expôs a Ayrton
< :.1rva lho no Ofício nº 917/51, de 29 de junho de 1951, que:
Embora sensibilizado com a desinteressad;i e r\ ll1l\Vl' I
colaboração do Sr. Adrien Kiss, deliberei arquivn r o
referido projeto e solicitar um substitutivo ao paisagi sl.1
Roberto Burle Marx, de acôrdo com o pronuncialll L' lllo
daquelas Divisões. Atenciosos cumprimentos. Rodrigo
M. F. de Andrade. Diretor.
Portanto, é provável que o desenvolvimento do projeto
de Roberto Burle Marx tenha ocorrido em 1951, apesar da
d ivergência de datas apontadas por alguns autores, como Mindlin
( 1956) e Bardi (1964), que sugerem o ano de 1954, e Motta (1983),
Gonçalves (1997) e Leenhardt (2000), que indicam 1951. As obras
de execução, segundo o Ofício nº 113/53, de 12 de junho de 1953,
leriam ocorrido nesse ano.
Temos a grata satisfação de comunicar a Va. Sa. que 11
Municipalidade do Recife já deu início aos trabalho~ tk
ajardinamento do terreno circundante da Capelh1 hn da
Jaqueira, nesta Capital. O projeto de ajardinamento é de
autoria de Roberto Burle Max (sic), que, a pedido dcss:1
Diretoria o elaborou. Permita-nos Va. Sa. afirmar-lhe qut·
fazemos essa comunicação com muita alegria, pelo foto dt·
vermos, agora, quase concretizada, velha aspiração Mslt'
Jardins d e Burle 1\.farx no Nordeste do Bras il
____ /
Distrito, qual scj <1 a d1: cons1: rvar mu i~ vigliíd11 e ll ll'lhul'
protegida, dos seus inimigos crimi nosos, a lincl:i CapcJi 11 llll .
Sem outro assunto, firmamo-nos, atenciosamente, Ayrlo11
Carvalho, Chefe do 1° Distº. da D.PH.A.N.
Considerando a escassez de registros documentais, é difícil
indicar até que ponto este projeto, mais mencionado do que
suficientemente estudado, foi executado, bem como afirmar com
precisão o ano de conclusão das obras.4 A iconografia disponível
mostra o banco ondulado, as palmeiras-reais (Roystonea regia)
indicadas no projeto e as árvores existentes atendendo à orientação
do paisagista.
O governador de Pernambuco entre 12 de dezembro de 1952
e 31 de janeiro de 1955, Etelvino Lins de Albuquerque, destacou,
na seção "Parques e Jardins" do discurso de encerramento de sua
administração, a criação da "Praça da Jaqueirá: referindo-se ao
jardim no entorno da capela:
Cujo interêsse e importância artística e histórica são de
todos conhecidos. O jardim da Jaqueira, cujo projeto foi
uma gentileza do famoso arquiteto Burle Marx, através do
engenheiro Airton Carvalho, do serviço do Patrimônio
Artístico e Histórico Nacional, aí está, valorizando 0
antigo e pitoresco templo, admirado de todos, louvado pela
originalidade de seu desenho e apreciado pelo equilíbrio
de seus elementos intrigantes, desde as massas de árvores
aos originais bancos ali construídos (LINS, 1955, p. 134).
4 Foram consultados os jornais "Diario de Pernambuco" (fevereiro a maio de 1953 e setem~ro a outubro de 1953) e "Jornal do Commercio" (agosto a outubro de 1953), mas nao foram encontrados registros sobre o projeto nem referência à inauguração da obra.
66 Jardins de Burle Ma rx no Nordeste do Brasil
) 10·0Jolo de Hurlc Marx
A t•x 1wrl~t1dt1 <.k Burle Marx no Recife, de J 935 <1 1937, foi
d1•1 l~1v,1 par:1 a criação do jardim artíst ico moderno como um
1111v11 gw•to que parte da paisagem existente. Esse gesto vem <fr 1111.11 u1 iosidaclc no campo da botânica, escolhendo a planta como
111l1 h 1 p:ll elemento e ponto de partida do projeto paisagístico l'
ldrntlfinmclo aquelas mais representativas das regiões Norte e
Noi <kste elo Brasil. Assim, ele expressou essa primeira fase d.e sua
111rrc.·ira. Sua atuação no Recife o levou a elaborar projetos para o
vl1.i11ho estado da Paraíba, ao mesmo tempo em que se fixava no
11.in de Janeiro.
Em 1940, após o projeto do Jardim do Ministério da Educação
,. Saúde, elaborou os jardins do complexo da Pampulha em Belo
1 lorizonte, à beira de um lago artificial, unindo uma capela com
painéis de Portinari, um iate clube, um cassino e um restaurante,
concebidos pelo arquiteto Oscar Niemeyer (FLEMING, 1996). De
uma paisagem de características físicas especiais nasceram jardins
coloridos de formas curvas e irregulares, permeados por espécies
arbóreas nativas para emoldurar a arquitetura moderna.
É um período, portanto, de grande efusão na criação de
jardins, no propósito de trazer o embelezamento, o saneamento e
a recreação urbana. Por essa época, Burle Marx preparava-se para
formalizar a sociedade com os arquitetos John Stoddart, Fernando
Tábora, Maurício Monte e Julio Cesar Pessolani em Caracas.
No início da década de 1950, a Capela de Nossa Senhora da
Conceição da Jaqueira, situada numa área bastante arborizada,
quase margeando o Rio Capibaribe, encontrava-se em estado de
conservação precário, praticamente inativa e pouco valorizada
Ja rdins de B LLrle Marx no Nordeste do Bras il 67
na paisagem. O espaço livre que se cs lcndia além do seu entorno
compreendia aproximadamente 70.000 m2, era utilizado para a
prática de futebol, contendo mais de um campo instalado pelos
próprios frequentadores, e sediava feiras e campeonatos.
O projeto "Jardim para a Capela da Jaqueira': elaborado por
Burle Marx, não contém data e corresponde à planta baixa com a
lista de vegetação que seria utilizada e a legenda de um playground,
detalhes construtivos do banco e da rampa de concreto (Fig. 1).
A intenção principal de Burle Marx foi focar o monumento
histórico em primeiro plano e oferecer equipamentos para
/ atividades recreativas, que, juntos, foram denominados pelo
próprio paisagista de playground, revelando o caráter esportivo
do local. Na sua concepção, as duas partes propostas estão
interligadas por um banco de concreto com curvas regulares como
uma serpentina, que se apresenta logo após a superfície gramada
de caráter contemplativo. O banco ondulado se relaciona com o
desenho barroco da capela, combinado com o plantio de vegetação
arbórea. Flávio Motta {1983) assim se reporta à integração entre a
intervenção de Burle Marx e o monumento colonial:
Junto a um exemplar significativo da arquitetura religiosa
brasileira do século XVIII, um grande banco, de moderno
despojamento, sem ornato, de cor, material e textura
semelhante à igreja, desenha sobre o gramado, com novas
grandezas, a sinuosidade comum a um passado barroco
(MOTTA, 1983, p. 84).
O mesmo desenho de banco também aparece logo a seguir
no projeto marcadamente regular da Praça da Independência
(1955) em João Pessoa. As curvas do banco ainda são mantidas
68 Ja rdins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
N
©
Fig. 1. Jardim para a Capela da Jaqueira, projeto de Roberto Burle Marx,
Esc. 1:200, cerca de 1951, digitalizado a partir do original pertencente
ao IPHAN-PE. desenho de Luísa Acioli dos Santos, 2013. Segundo a
legenda: A - capela; B - Adro; C - banco; D - voleibol; E - basquetebol; F
- barra e paralela; G - pórtico (escadas e cordas); H - escada horizontal;
I - armação de tubos; J - tubos coloridos de concreto; K- escorregador;
L - caixa de areia; M - gramado para jogos coletivos; N - plataforma
rampa; O - trave de equilíbrio; P - placas coloridas de concreto; Q
monólitos. Fonte: Laboratório da Paisagem/UFPE.
Jardins de Burle Mar x no Nordeste d o Brasil
nos projetos da Praça Salgado Filho ( 1957) e <la Pra~·a de Dois Irmãos (1958) no Recife.
Tendo como moldura fileiras de palmeiras- reais (Roystoneo
regia), a capela se impõe sobre um amplo gramado onde ficam
assentados mais dois bancos de concreto, um de cada lado,
além de dois indivíduos de mulungu (Erythrina glauca), que
provavelmente já existiam. Junto ao banco ondulado intercalado
por sete abricós-de-macaco (Couroupita guianensis), segundo
sua indicação, as palmeiras-reais arrematam o espaço dedicado
à capela, acentuando sua imponência e sobriedade. Pedras
irregulares definem um acesso ao monumento, interligando-o ao banco mais próximo.
Canteiros de espécies herbáceas e arbustivas, como, por
__/ exemplo, espada-de-iansã (Tradescantia discolor), vedélia (Wedelia
paludosa var. vialis), sino-amarelo (Allamanda nobilis) e nuvem
(Plumbago capensis), com flores e folhagem de cores marcantes,
embelezam um dos lados de cada banco de concreto.
A ideia do paisagista parece antever o destino daquele espaço
livre, que, em 1985, adquiriu a condição de parque urbano com
área ampliada. A quadra de esportes e os tipos de brinquedos
foram sugeridos em reposta à função recreativa como oferta do
poder público a uma população urbana crescente e praticamente
desprovida de tais recursos.
A área do playground, como ele se refere, corresponde a cerca
de um terço do terreno e compreende espaços para a prática de
voleibol e basquetebol por grupos de jovens e adultos. As barras
e paralelas, a trave de equilíbrio e os tubos servem para exercícios
físicos e brincadeiras das crianças, além da rampa para exercitar
o equilíbrio sobre uma superfície de areia. O escorregador sugere
70 Jard ins de Burl e Marx no Nordeste do Brasil
, ...... \ 1 ~ \lll 1
1'1
111111.1 .1( 1vld.1d c.· '-'o gl'll1 n .1do pnl'n jogmi (.:olel lvos, po1 s u11 Vl''I., 111 111
111111m 11su;\l'ios parti a rcaliza\·üo de pnHlcas mais dc.•sc:o 111 11dd ui
('Ili~~· J.). ( )bscrva se que várias atividades podem ser dcs '1wolvld,1'l
; p.11t 1r dos di(ercnlcs tipos c.lc mobiliário de modo a ongrt•g,11
u111 l'Xprcssivo e diversificado público.
S;IO equipamentos típicos de um pequeno parque dt•
v11l11hança, proposto pela primeira vez como conjunto t'
1 l'l.1l ivnmente à escala da cidade. Pela leitura do projeto, a intcnç, o
loi proporcionar um espaço recreativo para a população, Lendo
1 omo foco a contemplação do monumento, e oferecer atividadcH
para as crianças e jovens permanecerem desfrutando o cspn ~·o
llvre e vegetado.
D
N
GJ (b
E Gr-L--f
Fig. 2. Jardim para a Capela da Jaqueira, detalhe do projeto de Roberto Buril· M111 ~ .
Esc. 1:200, cerca de 1951, digitalizado a partir do original pertencente ao IPI l/\N 111 1,
desenho de Luísa Acioli dos Santos, 2013. Fonte: Laboratório da Paisagem/VFPll,,
jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 7 1
Destacam-se, na extremidade ocslc do playgro1111d, duas
fileiras de cássia-grande (Cassia grandis) servindo para delimilar
o lote e resguardar os usuários durante as atividades recreativas.
Sob sua sombra, um espaço lúdico é formado por placas coloridas
de concreto e dois grupos de monólitos ligados por um passeio
de seixos. Tal combinação estaria presente alguns anos depois no
Jardim da Residência Cassiano Ribeiro Coutinho (1957) em João Pessoa.
Pesquisas anteriores mostram que a ideia do playground (área
para brinquedos infantis) foi propalada por Burle Marx no Recife
no projeto da Praça Pinto Damaso, aproximadamente em 1936
(SILVA, 2010), urna das preocupações do paisagista ao criar jardins
nos bairros residenciais. Ou seja, considerando as necessidades
dos futuros usuários e também a função educativa de informar
às crianças sobre a flora brasileira, estimulando-as a usufruir
"" um espaço público para trocas sociais. Nas palavras da escritora,
antropóloga e crítica de arte Lélia Coelho Frota (in GONÇALVES,
1997, p. 15), estes são traços da obra de Burle Marx:
Comprometida com a comunicação democrática da
natureza e da cultura existentes nos jardins construídos,
que significavam para ele uma experiência educativa e
aprazível, que propicia o encontro do indivíduo com o
outro, com o diferente, com o igual, ou consigo mesmo:
cabeça e corpo.
O projeto paisagístico proposto para o Jardim da Capela
da Jaqueira acentua a ideia geral de estética perseguida pelo
paisagista. A planta baixa permite identificar a intensidade de
vegetação que se distribui por toda a extensão da área, em diálogo
com o monumento, com um passeio sinuoso de pedras e o
72 jard ins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
1 ~lr11•g1111111tl. E111 nola regi si rnd .1 11a planln, lh1l'k Mal'x ('XJll <':, 111
' 1'11d,1~ ,\s ;1 1 von.·s existentes devemo ser mantidas''. ·1:11 pt ,\f lt .1
\L' '•' 1111111 constante em o utros projetos, a exemplo d.is prn~ 11'i 1 1
do 1 k 1 by, República e Pinto Damaso. J\ informaçao <.k ~111<' j.\
1· hlr.1111 tfrvorcs de grande porte no local também consta 11Cl
11·f l'rido parecer do arquiteto José Souza Reis, do Rio de J:111t•i 1 o,
d1· > 2 de junho de 1951, a respeito do projeto do estudante Atltil•11
l\l -:s, 110 qual se lê:
Examinamos as fotografias da Capela e freamos L0111
a impressão de que o tratamento mais adequado nm
terrenos que a envolvem, que já contam com i 111po1w11k
vegetação, será o de maior simplicidade, lptaSL' q11 1•
somente na forma de amplos gramados. Entrclanlo, ~1·
for considerada a necessidade de um traçado geral 1k
ajardinamento, sugerimos uma consulta ao paizagl,1.1
Roberto Burle Marx que aliás conhece o local por j;\ 11·1
trabalhado durante muito tempo em Pernambuco. joM\
Souza Reis.
Como uma das grandes preocupações de Burle Marx era u
in terpretação da paisagem local, é possível afirmar que no )ardi 111
da Capela da Jaqueira ele organizou a vegetação de modo a rnanlvr
o caráter da paisagem urbana, indicando espécies arbóreas t'
palmeiras, empregadas, por exemplo, nas praças de Casa Forl<'
(1935), do Derby (1937) e da República (1937), portanto, parte do
seu repertório botânico. No entanto, introduziu espécies herbácea-:
que não aparecem nem em projetos anteriores nem posteriores 1rn cidade do Recife (Tabela 1).
A partir da capela, a ondulação do caminho de pedras suge1 ~·
um passeio atraente ao visitante, conduzindo-o a um bnnrn
emoldurado com vegetação herbácea de floração e folhugrn.'I
jardi ns de Burle Marx no Nordeste do Brasil
coloridas, que compõem diforcntcs ccn<frios. A con1posi~·:lo procura manter a simetria de projetos anleriorcs, porém, ao
mesmo tempo, insere no entorno do monumento vegetação
rasteira e palmeiras-reais, de modo a sugerir possibilidades de
percepção da paisagem e destacar a edificação no jardim.
A simetria e a monumentalidade da composição foram
acentuadas por quatro renques de palmeiras-reais, três atrás
da capela e um usado para separar a área de culto da área de
recreação, delimitando um espaço eminentemente religioso e um
espaço essencialmente laico. Sua disposição, como pano de fundo
do jardim, prolonga o verde da área do playground. Do mesmo
modo, palmeiras-imperiais foram utilizadas nas praças do Derby
e da República na década de 1930.
Esta composição também foi usada no Terreiro de Jesus, em
Salvador, em cuja planta baixa Burle Marx ressaltou o uso das
palmeiras-imperiais nos jardins do século 19, por tanto, realçando
o caráter de sítios e monumentos históricos.
Nº
2
3
4
74
Tabela l: Especificação da vegetação por Burle Marx
para o Jardim da Capela da Jaqueira, cerca de 1951.
Especifü:a~ão por Nome científico Nome popular Estrato Burle Marx atualizado
Roystonea regia Roystonea regia (Kunth) O.F. Cook
Palmeira-real Palmeira
Parkia pendula Parkia pendida Visgueiro Arbóreo 13enth. (Willd.) Bentl1. ex Walp.
Couroupita * Abricó-de-macaco Arbóreo guianensis Aubl.
Cassia grandis L.F. Cassia gra11dis 1 .. f. Cássia-grande Arbóreo
Ja rdi ns de Burle Marx Jlo No rdeste do Brasil
N"
,,
H
1)
10
11
12
13
14
15
16
17
fl. ~ 11!' ( lli1li\110 1101·
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l 1•1 111111 1 l11•/ili1/1f rylla ( V« ll) M,11·1.
/ r l'lli ri 1111.~/i111rn Willd.
l o/>111111/em f11d1•scc11s Duckc
Sclrede<i osrnanlha 11. lt.
1'/11111bago capensis ' lhunb
Codiaeum variegatum !31ume.
Lagerstroemia indica L.
Cordyline terminalis Kunth
Iresine herbstii Hook
Wedelia paludosa D.C. var. vialis DC.
Rhoeo discolor Hance
Allamanda nobilis T.Moore
Stenotaphrum americanum Sch rank
Noi111· 1:k111l li~ 11
11t1111 ll:tndo
'liilll'l111it1
illlfJCliJiillOSll (Marl. ex DC.) St;111dl.
Loplimrtlrera facl escens Ducke
Scheelea osmantha Barb. Rodr.
Plumbago capensis Thunb.
Codiaeum variegatum (L.) Rumph. ex A. Juss.
*
Cordyline termina/is (L.) Kunth
!resine herbstii Hook.
Wedelia paludosa var. vialis DC.
Tradescantia discolor L'Hér.
*
(*) Sem alteração de nomenclatura.
Noml' pop11l111 1 1 ~111110
ip0 IOXO 1\ 1 hn 11·11
Mulungu 1\1 h611·11
Lanterneira A1hú11·11
Ataleia J>ainwlru
Nuvem l lc1 h;\u·11
Cróton Arbu,t1vo
Felício A1·b6n:u
Dracena-vermelha Arbustlv11
Coração-de-maria Arb11,t ivo
Vedélia Herh~Cl'O
Espada-de iansã Hcrb;\c\:o
Sino-amarelo Herbáceo
Grama-inglesa Herbáceo
Na área do playground, Burle Marx usou fileiras duplas de
vegetação arbórea com a finalidade de proporei onar sombreament o
e fechamento, a exemplo das praças de Casa Forte e Euclides da
Cunha. Espécies como visgueiro (Parkia pendula), lanterneira
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 75
(Lophantera Lactescens), ipê-roxo (1abeúuia impeliginosu), abricó
de-macaco e cássia-grande até então somente tinham sido usadas
pelo paisagista no projeto da Praça de Casa Forte.
As ilustrações identificadas em arquivos públicos do Recife
não permitem revelar até que ponto o projeto de Burle Marx foi
implantado. Ao se cotejar o desenho do paisagista com o espaço
atualmente, detecta-se que, do programa proposto, os bancos
foram construídos, alguns em locais não coincidentes com o projeto original.
Além disso, o único vestígio da vegetação proposta pelo
paisagista aparece justamente com o renque de palmeiras-reais
separando a capela da área recreativa e, ainda assim, mesclada
a indivíduos de macaibeira (Acrocomia inturnescens) (Fig.
3). O abricó-de-macaco proposto para compor com o banco
Fig. 3. Jardim da Capela da Jaqueira, década de 1950, foto de Marcel Gautherot. Fonte: Motta, 1983.
76 J:irdins d e Hurle Marx no Nordeste do Brasil
11111hd,1do foi suhsl i!ufdo por llamhoya11! (/ k/c111/\ 1 1·.~/11 ) (11111 .
•I) A substituic;ão foi relatada por l.;wrcncc Fkmi11g ( 19%), .in
: 11 w111.ionnr (]llC:
Um de seus mais grntihca ntcs pn>Jt'IO~ d.1 ~p111 1 1 1111
o jardim da capela da Jaqucira cm Rclik , 1101.1vd p1•l11
soberbo banco de concreto que serpent eava po1 l' 11l11
fileiras de flam boyant, uma árvore de florei; l 'Sl.11 h1l 1' \ d1
Madagascar, a Poinciana regia ( FLEMI NG, 19%, ll, '/O).
Percebe-se ainda que o maciço arbóreo por trás d(I l"Hpd11
permaneceu até os dias atuais. Possivelmente, a ideia de Burle M.11·x
seria a de que, na medida em que a vegetação fosse morrendo, n
projeto se concretizasse aos poucos (Figs. 3 e 4), já que, por s11 ,1
própria sugestão, as espécies existentes deveriam ser preservada ~ .
Entretanto, não se pode assegurar que outros equipamentos 11.111
Fig. 4. Banco em forma de serpentina projetado por
Burle Marx. Fonte: Bardi, 1964.
Jardins de Burle Marx no Nordesle do Brasil 77
.j
foram implantados, pois, decorridas seis décadas da proposla de
Burle Marx, alguns aspectos podem ter sido descaraclerizados.
A inclusão do Jardim da Capela da Jaqueira em alguns
importantes títulos sobre a obra de Roberto Burle Marx ou
referentes à produção do modernismo brasileiro sinaliza a
relevância atribuída por alguns autores a este projeto. É notável 0
fato de comparecer numa das obras mais emblemáticas relativas à
difusão da arquitetura moderna brasileira, "Modern Architecture
in Brazil", seção "Transportation, City Planning, Landscape
Architecture", de Henrique Mindlin, publicada em 1956. Nesta
seção, Mindlin inclui nove projetos, sendo seis de Burle Marx, dos
quais quatro eram no Rio de Janeiro e dois no Recife: 0 croqui da
Praça Artur Oscar e o Jardim da Capela da Jaqueira.
78
Uma capela do século XVIII em Pernambuco, restaurada
pelo SPHAN, exigiu a mais simples moldura para realçar
seus contornos barrocos. Em vez do jardim francês
primeiramente sugerido, Burle Marx plantou wn discreto
e rústico gramado através do qual um caminho de
pedras desiguais conduz à porta da capela. Na época das
navegações, tais pedras foram trazidas de Portugal como
lastro dos porões vazios das embarcações. Ko gramado,
bancos em concreto em forma de "S" com flamboyants
plantados na parte mais profunda da curva permitem
uma excelente visão da capela sob a sombra de árvores
íloridas. O planejamento consciente para o efeito artístico
global é regra-guin de Bllrle Marx; nada é deixado ao
;1caso e ele csl(> rça-se para conciliar o próprio jardim com
o esti lo arquitetônico, com os materiais construtivos, 0
meio ambiente e as exigências da função e da manutenção.
No caso deste lugar sagrado e histórico, a solução repousa
n<.1 correlação, não no contraste. Os poucos canteiros de
Jardins de Bur le Marx no Nordest e do Brasil
llo1l'S l k 11111 l.1do dH l1\lll'I.\ \1 >1 11h 1 l· .1dll~ p111 111111111111•1111 ,
l' ,1 gi.1111;1 rlistit.1 L1dlil .11 11 .1 ll\1llH1il' ll <, .lll lks i l' p 1 q1 w1111
j:1rdi 111 pl1bli i.:o (M I NDl.I N, 11"1Cl, l1\1llu1, .ln 11ms.1)
As palavras do historiador ena ltecem a linguagem do pmjl•to,
q1H', uimbinando de forma artística a arquitetura e os dc1m·nto•.
11,1l11rais, prioriza a fácil manutenção para a conscrva~·no do
J.11dirn do monumento histórico, a simplicidade na eswlh.i
d;1 vegetação e dos materiais construtivos. Já naquela épm .1,
Mindli n (1956) referia-se aos flamboyants entrelaçando o ba11LO,
que, quatro décadas depois, seriam mencionados por I.aurcllll'
Fll'ming (1996) , consubstanciando a hipótese sugerida de tjlll'
os abricós-de-macaco indicados por Burle Marx nunca fo r \1 11 1
plan tados. Curiosamente, ao afirmar que "em vez do jardi111
f'rancês primeiramente sugerido, Burle Marx plantou um d iscrel o
e rústico gramado': Mindlin (1956) leva a crer que es lava st•
referindo ao projeto atribuído ao estudante Adrien Kiss, segundo
confrontação com a planta baixa localizada no acervo do IPT 1 A N
e a documentação escrita.
Por uma conservação do Jardim da Capela da Jaqueira
O Jardim da Capela da Jaqueira integra o atual Parque dn
Jaqueira (Fig. 5), inaugurado em 1985 na gestão do prefe ito
Joaquim Francisco (1983-1985), consolidando a voc<1çno
recreativa do local. O projeto foi elaborado por Carlos Bellaudi,
técnico da Prefeitura do Recife, que procurou arborizar e equipar
o parque com playgrounds para diferentes faixas etárias, pista tk
caminhada, pista de ciclismo, gramado para piquenique e <Ín.'.1
para apresentações comunitárias. Mas o caráter da paisagem do
Jardi ns de Burle Marx no Nordeste do Brasil
novo espaço não priorizo u a continuidade da área bislórica da
capela (SÁ CARNEIRO, 2010).
O Parque da Jaqueira se transformou em um dos espaços
livres mais populares da cidade do Recife, considerando a sua
localização em bairro de classe média alta, o que garante maior
visibilidade e conservação. Outro fator muito positivo se deveu à
participação intensa dos usuários durante sua construção, o que
implicou a criação da Sociedade Defensora do Parque da Jaqueira (SÁ CARNEIRO, 2010).
/ (
! ( /
, Praça J 1 \ ', Fleming j j
1 ' / \ / I
:\ // // \....'
-----·--.
Fig. 5. Parque da Jaqucira (incluindo o jardim no entorno da capela). Fonte: Sá Carneiro e Mesquita, 2000.
-, __ "'
. ---'--~ - ~ .... __
80 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
( > J.udlm da Capela da Jaqucirn foi reduzido devido à abcrlurn
d1• 1111111 n10 interna e modificado ao longo do tempo, visto que
,u lqui riu prestígio como local de celebração de casamentos, o que 1
d1':-.l,\rnclcrizou a transparência da paisagem então concebida
prn Burle Marx de modo a privilegiar o monumento histórico.
AlL1nlmcnte, esse jardim também desempenha o papel de palco
p.irn apresentações de orquestras e outras manifestações artísticas
l' culturais.
A composição florística atual do Jardim da Capela da Jaqueira
l'Slá representada por um total de 22 espécies pertencentes a 20
gC:neros e 15 famílias botânicas (Tabela 2). Contudo, espécies
t:omo a mangueira (Mangifera indica), a macaibeira, o jatobá
(Hymenaea courbaril), o coqueiro (Cocos nucifera), a azeitoneira
(Syzygium malaccense) e o sapotizeiro (Manilkara zapota),
presentes principalmente por trás da capela, remontam a uma
época anterior à proposta de Burle Marx. E o local onde hoje
existem coqueiros segue a indicação do paisagista para o plantio
da ataleia (Scheelea osmantha).
Tabela 2: Composição florística do Jardim
da Capela da Jaqueira> 2012.
Nome Científico
Hypoestes sp.
Mangifera indica L.
Catharanthus roseus var. a/bus G.Don
Catharanthus roseus var. roseus (L.) G. Don
Cocos nucifera L.
Roystonea oleracea (Jacq.) 0.F. Cook
Roystonea regia (Kunth) O.E Cook
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Nome popular Estrato
Cr6ton Herbáceo
Mangueira Arbóreo
Bom-dia Herbáceo
Boa-noite Herbáceo
Coqueiro Palmeira
Palmeira-imperial Palmeira
Palmei ra-real Palmeira
81
Noml' Cientifico N omc 1 >o ~Ili 1:11· Eslrulo
Acroco111i11 i11t11111!:.m:11s Drudc Macníba P:ilnwira
Livis/01111 chinensis (Jacq.) R. Br. ex Mart. Palmeira-leque-da-eh i na Palmeira
Tabebuia impetiginosa (Mart. ex DC.) lpê-roxo Arbóreo Standl.
]acaranda mimosifolia D. Don Jacarandá Arbóreo
Pachira aquatica Aubl. Carolina Arbóreo
Adansonia digitata L. Baobá Arbóreo
Hymenaea courbaril L. Jatobá Arbóreo
Spathodea campanulata P. Beauv. Espatódea Arbóreo
Artocarpus heterophyllus Lam. Jaqueira Arbóreo
Syzygium malaccense (L.) Merr. & L.M. Azeitoneira Arbóreo Perry
lxora macrothyrsa Teijsm. & Binn. Ixória Herbáceo
Manilkara. zapola (L.) P. Royen Sapotizeiro Arbóreo
Duranta repens L. Pingo-de-ouro Herbáceo
Thuja sp. Tui a Arbustivo
Híbiscus tiliaceus L. Algodoeiro-da-praia Arbustivo
Ao confrontar a vegetação atual com a do projeto original,
constata-se que só a palmeira-real está presente e, ainda assim,
disposta em locais diferentes do que foi indicado pelo paisagista.
A introdução de plantas arbóreas, arbustivas e herbáceas
inadequadas, a exemplo do baobá (Adansonia digitata), da tuia
(1huja sp.), do jacarandá-mimoso (Jacaranda mimosifolia) e do
algodoeiro-da-praia (Hibiscus tiliaceus) , em torno da capela,
concorre para alterar o aspecto bucólico da paisagem, que deveria
configurar uma área dedicada a um grande gramado, como propôs
o paisagista. Algumas dessas espécies em sua maturidade irão
constituir uma barreira, impedindo a visibilidade do monumento,
que deixará de ser o ponto focal (Figs. 6 e 7) .
82 Jard ins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Fig. 6. Vista frontal da Capela da Jaqueira, 2012. Fonte: Laboratório da
Paisagem/UFPE.
Fig. 7. Vista lateral da Capela da Jaqueira, onde as espécies arbóreas
impedem a sua visibilidade, 2012. Fonte: Laboratório da Paisagem/
UFPE.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Por estar situado dentro de um parque, o Jardim da Capela
da faqueira está razoavelmente protegido. Há uma relação de
continuidade da paisagem, que une o monumento ao Cais da
f aqueira e atrai grande número de pessoas nos finais de semana
(Fig. 8). A presença de edifícios de mais de 30 pavimentos não
interfere diretamente na área específica do jardim, mas configura
um limite vertical que se contrapõe à morfologia horizontal da
paisagem do parque. Segundo Burle Marx:
A defesa da paisagem faz parte da proteção dos
monumentos históricos e artísticos, assim como está
na lei, e jamais na prática, nem na consciência dos
governantes e das autoridades de inumeráveis municípios
brasileiros (TABACOW, 2004, p. 113).
Fig. 8. Parque da Jaqueira no entorno da capela, mostrando o cais e a
verticalização ao longo do Rio Capibaribe, 2007. Fonte: Laboratório da
Paisagem/UFPE.
84 Jard in s de Burle Marx no Nordeste do Brasil
c:onsldcraçõcs finais
()projeto de Burle Marx para o Jard im da Capela cfa Jaq\1t•l1· 1
; l \ por extensão, para o Parque da Jaquei ra, conci lia pri11dplo11
<trlfsticos e ecológicos moldados desde suas primeiras rcaliznçüc•t.
paisagísticas no Recife - entre as quais as praças de Casa Fmk t
fatcl ides da Cunha são as mais conhecidas, mas não as Linlrn~.
Mas também, aproxima dois temas que se tornariam presentei..,
se não recorrentes, em seus pronunciamentos: a importância dot<
parques e dos espaços verdes em áreas urbanas e a preservação d~·
monumentos históricos. Uma ilustração das "complexas parccrl;1s
que o artista manteve com a natureza e o urbano em qutUH'
sete décadas que sua criação abrange" e da fusão, no campo do
paisagismo, entre a arte e a ciência, como sintetiza Lélia Coelho
Frota (in GONÇALVES, 1997, pp. 9-11).
Se um pequeno templo histórico foi propulsor do projeto do
Parque da Jaqueira, comprometido com a vanguarda moderna,
com a convivência entre natureza e cultura, com a experiênclu
lúdica e educativa, imagina-se que o conhecimento, cada vi:z
maior, dos jardins de Burle Marx possa, em última - ou primeira
instância, reabilitar a capacidade de preservar os recursos natu rnis
e o patrimônio de arte e história que eles encerram.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil nr.
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OFÍCIO nº 122/51, de 22 de maio de 1951, do Chefe do 1° Distrito Airton Carvalho ao Diretor Geral da DPHAN Rodrigo M. F. de Andrade.
OFÍCIO nº 137/51, de 7 de junho de 1951 , do Chefe do 1° Distrito Airton Carvalho ao Diretor Geral da DPHAN Rodrigo M. F. de Andrade.
86 Jardins el e 13urle Marx no Nordeste do Brasil
1 H•IC Hl ll" 111/'d, d l• t ' dl' .1goslu 1k l'J'il, do C:ht·il' do I" 1 > 1~ 111111
1\1 11011 < ,,11 vallw ao I >irdur (;cra l d.11 >PI IAN l~od1 'Kº M , F dl• Amli ,1il1
(? I · I< 10 n" 8 \ ')/SJ, de 2J de sl'letnbro lk J l)') ' ·do Di H'lrn do P,111111111111< 1 1·'11.,1011rn e Artístico Nacional Rodrigo M. F. de J\mk1dt• .H> !'ll·1d1111
e lwll' do I" Distrito Airlon Carva lho.
<li :f <.10 nº 917 /5 1, de 29 de junho de 195 1, do IJirctor do P;1lr111H)11111
l listórico e Artístico Nacional Rod rigo M. F. de Andrade no Sc11li111
e hde do J 0 Distrito Airton Carvalho.
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Ja rdins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 117
nu IU.E MARX EM SAl.VAOOH.: O J.l\HDIM DO TERREIRO DE JESUS
; l1,1ulo Cosln l<alil
Introdução
Trazido pela primeira vez à Bahia pelo arquiteto Paulo Ant u 1ws
Ribeiro, Roberto Burle Marx é convidado, em 1946, para projl' l.11
os jardins da cobertura do Edifício Caramuru, como pertcnccnk 11
u 111 grupo de prestígio que está pensando a arquitetura brasiki1 .1,
a escola carioca. Projeto de Antunes, o edifício está situado ;\
Avenida das Nações, no bairro do Comércio. Esse terraço-jardi111
é o quinto projeto de Burle Marx desse tipo e o primeiro rora do
Rio de Janeiro. Anteriormente, ele já havia realizado experiências
semelhantes, como os jardins da residência Alfredo Schwartz, dn
Associação Brasileira de Imprensa, do Instituto de Resseg uros do
Brasil e do Ministério da Educação e Saúde.
O Edifício Caramuru, um dos principais representantes da
arquitetura moderna em Salvador, foi premiado na Prim<.:irn
Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo, de 1951, além
de inspirar artigos publicados em revistas internacionais, como
a francesa "I:Architecture daujourd'hui", em 1952, a ila li n11,1
"Domus" e a inglesa "Architectural Review'', em 1954.
Em 1948, na gestão do prefeito José Wanderley de Aral1Jo
Pinho (1947-1951), a Comissão do Plano de Urbanismo da Cidade
Jard ins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
do Sa lvador (CPUCS), coordcnacfa pelo arquilclo Diógenes
Rebouças, solicita ao diretor geral da Diretoria do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (DPHAN), Rodrigo Melo Franco
de Andrade, a presença de Roberto Burle Marx na elaboração de
projetos para praças e jardins de Salvador. 1 Matérias publicadas
nos jornais "Diário de Noticias" e "A Tarde" davam conta da
passagem do paisagista pela Bahia.
A convite do prefe ito da Capital, engenheiro Wanderley
de Pinho se encarregará da criação dos jardins de cinco
praças naquela capital, o arquiteto, pintor e paisagista
Roberto Burle Marx ( ... ) procuramos ouvi-lo sobre os
seus projetos e conhecer as suas impressões daquela
terra que agora visitou pela primeira vez (DIÁRIO DE
NOTICIAS, 28 de julho de 1948, p. 8; A TARDE, 30 de julho de 1948, p. 2).
Sua primeira visita a Salvador, de acordo com publicação na
imprensa local, ocorreu em 1932. Não há registro de sua vinda
para projetar o Edifício Caramuru, que foi construído de 1946 a
1949. E, quando esteve na capital baiana em 1978 para presidir o
XVI Congresso Internacional de Paisagismo, manifestando a sua
insatisfação com a descaracterização da cidade, declarou:
Quando eu estive pela primeira vez na Bahia, em 1932,
disse o arquiteto -fiquei impressionado com o "eldorado"
que era Salvador, decididamenle a cidade mais estupenda
do Brasil. Hoje, a vegetação eslá rareando, à proporção em
que se torna maior a especulação imobiliária (TRIBUNA
DA BAHIA, 26 de setembro de 1978, p. 3).
1 Representante elo modernismo na Bahia, Diógenes Rebouças é o arquiteto de maior import<lncia no estado no período ele 1950 a 1970 e responsável por grandes transformações na cidade.
90 Jard ins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
A tidade de S:.i lvador, 11nqucla época, dividia sua centralidade
l'lll l t ' a Cidade Baixa e a Cida<lc Alta, Lendo, na primeira, a praia, o
porlq e seus armazéns, e, na segunda, o seu centro administrativo, I
político e religioso, assim como sua área residencial. A Praça
Municipal era o núcleo da Cidade Alta, para onde convergiam
todos os caminhos e onde se concentravam os principais edifícios
públicos, desde sua fundação até meados do século 20.
Mais ao norte, na mesma cumeada, encontrava-se o Terreiro
de Jesus. Ali, estava o antigo prédio do Colégio dos Jesuítas, que,
no século 19, passou a abrigar a Faculdade de Medicina da Bahia.
Era o maior centro de comunicações da cidade, como proclamava
o periódico "O Alabama": "quem quiser saber da vida alheia, vá ao
chafariz do Terreiro" (LIMA, 1988) (Fig. 1).
Fig. 1. Terreiro de Jesus no século 19, foto de Camillo Vedani, 1860
1865 . Fonte: Ferrcz, 1988.
Jard ins de Burle Marx no Nordeste do Brasi 1
O chafariz a que se refere lima (1988) t:. um lrabalho cm
bronze feito na França em 1855. Representa a Deusa Ceres da
Agricultura e faz parte de uma série de chafarizes implantados
em Salvador pela Companhia de Água do Queimado, inaugurado
em 1857. A capital baiana foi a primeira cidade brasileira a ter
uma concessionária de serviços de distribuição de água potável à
população.
Burle Marx e os espaços públicos de Salvador
Dos cinco projetos de espaços públicos contratados a Roberto
Burle Marx por indicação de Diógenes Rebouças em 1948, foram
encontrados apenas três: o da Praça 13 de Maio, conhecida
como Praça da Piedade2, o da Praça 2 de Julho, conhecida como
Campo Grande, ambos não executados, e o do Terreiro de Jesus,
posteriormente denominado Praça 15 de Novembro, cujas obras
foram iniciadas e concluídas em 1950.
O desenho referente ao projeto da Praça do Campo Grande
parece não ter sido finalizado. Nele, o acesso ao lago em placas
não delimita o espaço. Também não se define o material a ser
utilizado. A especificação botânica, com 55 espécies vegetais,
inclusive aquáticas, não se encontra totalmente locada na prancha.
Alguns fatores podem ter contribuído para a não realização
dos projetos das praças da Piedade e do Campo Grande. Um deles
foi a descontinuidade administrativa, com a saída de Wanderley de
Pinho da Prefeitura em 1951. Outro, foi a resistência da sociedade
2 Em 1888, em homenagem à data da assinatura da Lei Aurea, a praça passa a ser denominada de 13 de Maio. No entanto, como a população não conseguia identificála por esse nome, ela volta a ser chamada, em 1967, de Praça da Piedade.
92 Jardins de Burle Marx no No rdeste do Bras il
1111111 11 .1, ;\ t~poca, ao r oncc ilo do novo, do mn<k·rno, prindpn l11 lt'1111'
1111 Imante às áreas aj;rrdinadas da cidade.
O Terreiro de Jesus, que pc rlcncc ao desenho fundnciorrnl d 11
, 1d.1dc, foi escolhido como obje to de estudo dcslc artigo pdo l .110
de IL'I' sid o o primeiro projeto público de Burle Marx rcaliz~H.lo
1rn <.:idade e porque deve ser considerado um jardim hi stó rko,
rL·<.:onhecido como patrimônio por seu valor artístico, ccológiw
e social. Em seu artigo 1°, a Carta de Florença diz que um j<rn.lim
histórico é "uma composição arquitetônica e vegetal que, do ponto
de vista da história ou da arte, apresenta um interesse públirn.
Como tal é considerado monumento" (CURY, 2000, p. 253).
Em sua composição arquitetônica, ele apresenta uma
morfologia diferente daquela usada no período, utilizando no
piso desenhos com mosaicos em pedra portuguesa e seixos qll l'
refletem as mudanças provocadas pelo Movimento Moderno da
década de 1950.
O convite feito a Burle Marx pelo governo baiano partiu
da iniciativa de revitalizar e modernizar os espaços públicos no
estado, tema que vinha sendo debatido nesse período na capital. E,
para fazê-lo, uma referência de sucesso, trazida do Rio de Janeiro,
era Roberto Burle Marx. A presença de um renomado paisagisl;1
para "fazer as praças e parques de Salvador" foi motivo de matér ias
em jornais da cidade, que cobravam os projetos do poder público.
Nesse sentido [a Prefeitura de Salvador] encomendou
vários projetos a Burle Marx, arquiteto paisagist,1
brasileiro, que com seu espirito e a sua arte de vanguarda.
vem realizando obras do melhor gosto e qualidade no sul
do país e no estrangeiro, salientando-se como autoridnd t•
digna de respeito no assunto. ( ... ) Prontos os projt•toN
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Bras il
para os jardins c aproveilarni.:n lo tlc rc<.:a ntos aprai'.ivcls
de Salvador, remeteu-os à prcícilura local. Es ta não ÍCi',
ir além a simpatia in icial demonstrada pela questão.
Arquivou os excelentes projetos de Burle Marx, tem
privado o publico do conhecimento dos mesmos, em
vista do desinteresse pela sua divulgação, dando mais
uma prova da sua inépcia para a solução dos assuntos de
interesse coletivo (DIÁRIO DE NOTICIAS, 12 de maio de 1950,p. 4).
A cobrança da imprensa deve-se ao fato de que Burle Marx
havia sido chamado no início da gestão de Wanderley de Pinho e,
dois anos depois, os projetos ainda não tinham sido executados.
Com a denúncia jornalística, deu-se início às obras do Terreiro de Jesus.
O projeto de Burle Marx para o Terreiro de Jesus
O projeto de reforma do Terreiro de Jesus, idealizado por
Burle Marx a partir de 1948 e iniciado em maio de 1950, propunha
a retirada de todo o piso existente e a incorporação de um novo
desenho, de formas orgânicas, sinuosas, inovadoras para a cidade
e até então pouco conhecidas em projetos de praças no país (Figs.
2 e 3). Cabe, inclusive, revisar a bibliografia existente, que aponta
1952 como o ano de elaboração da proposta.
Em outros projetos dessa época, Burle Marx utiliza os mesmos
princípios, como na Praça de Cataguazes, em Minas Gerais, na
Praça Santos Dumont e Largo do Machado, no Rio de Janeiro,
sendo o Terreiro de Jesus o primeiro no Nordeste.
Os materiais utilizados no piso, como a pedra portuguesa,
os seixos rolados pretos e as conchas da região, assim como a
94 Jardins de l3urle Marx no Nordeste do l3rasil
Fig. 2. Jardim para a Praça lS de Novembro (Te~ reiro de Jesus) , prnjl'lo
de R. Burle Marx, S. Salvado r, Bahia, Esc. 1: LOO, s/dala. Fon te: Escritório
Burle Marx & Cia. Llda.
Fig. 3. Terreiro de Jesus após a conclusão da obra. Fonte: Fundaçno
Gregório de Mattos/PMS.
jardins de Burle Mar x no Nordeste do Brasil 95
11
permanência do chafariz, reforçariam a identidade do lugar. A Sllíl
proposta de um coreto móvel. retirado quando assim se desejasse,
e a criação de apenas um canteiro com plantas potencializariam
o terreiro como espaço de encontro e não apenas como local de
passagem, resguardando a vista para o Colégio dos Jesuítas e sua
capela. Os bancos previstos no projeto seriam dispostos sob as
árvores para aproveitamento da sombra existente.
Consta na especificação e na locação do projeto o plantio
de dez árvores de duas espécies: quatro lofanteras-da-amazônia
(Lophanthera lactescens) e seis sibipirunas ( Caesalpinia
peltophoroides). Não há informações sobre as espécies
preexistentes na praça, mas o que se observa nos registros
fotográficos e no depoimento do arquiteto Assis Reis é que o
número de espécies arbóreas é maior que o especificado e que
elas foram mantidas após a conclusão do projeto.3 A vegetação
especificada por Burle Marx consta na Tabela 1.
Quanto às palmeiras, o paisagista manteve as impena1s
(Roystonea oleracea) existentes e plantou outras. No único
canteiro, colocou cinco espécies de herbáceas e arbustivas, que,
pelas características, davam um colorido especial ao espaço: as
pequenas folhas marrom-avermelhadas e alaranjadas do periquito
(Alternanthera amoena), as variadas formas e cores dos crótons
(Codiaeum variegatum), o vermelho salpicado de branco do
confete (Hypoestes sanguinolenta), a folhagem verde com nervuras
amarelas das sanquésias (Sanchezia nobilis) e a dupla-face verde
escura e roxa do abacaxi-roxo (Tradescantia discolor).
3 O arquiteto Assis Reis trabalhou com Diógenes Rebouças no CPUCS e foi o responsável pelo levantamento topográfico do logradouro. Entrevistado por Paulo Kali! em 22 de julho de 2010.
96 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
'lhhclo 1: l\spt1dfü:11\1 o dn v1.•gd11,·ílo por Buril• M,11·x
pum o Terreiro de Jesus, cerco de 1950.
;N" l1.N1wd Hcnçílo por Burle M11rx
'•
111J1!11111ll1cm ladescens ll11d\l'
< :111•.\1tlpi11ir1 pellopfwroides lknlh.
/\ltl'm1111tliera amoena ltq~d
( :odia.eum variegatum IUume
1 lypoestes sanguinolenta l look.
Sanchezia nobilis r. l-look.
fl.hoeo disco/ar 7
Hance
Oreodoxa oleracea 8
Mart.
( •) Sem alteração de nomenclatura.
Nome cicutifico atualizado
*
Altemanthera arnoena Back. & Sloot.
Codiaeum variegatum (L.) Rumph. ex A. Juss.
No111c po1n1l111·
Lol'anlcrn da-a111az611 ia
Sibipi mna
Periquito
Cróton
Hypoestes sanguinolenta Confete (Van Houtte) Hook. f.
*
Tradescantia disco/ar L'Hér.
Roystonea oleracea (Jacq.) O.F.Cook
Sanquésia
Abacaxiroxo
Palmeiraimperial
l\Nlr'll(ll
Árll61 1•11
Ar·bór''º
1 h:rb:lu·11
J\ rbust Ivo
1 Jcrb;\l ('O
Arhuslivo
l lcr btlct·o
Palmci rn
A Praça 13 de Maio ou Praça da Piedade (Fig. 4), por sua
vez, foi idealizada no mesmo período do Terreiro de Jesus. Os
detalhes construtivos de ambos encontram-se, inclusive, em urna
única prancha (Fig. 5). Assim como o terreiro, existem erros de
referência em relação à Praça 13 de Maio. A planta baixa e as
informações bibliográficas nominam a praça como 3 de Maio e o
seu projeto como sendo de 1954.
Nesse projeto, Burle Marx manteve os mesmos princípios
utilizados no Terreiro de Jesus: um desenho sinuoso e orgânico,
com pavimentação em mosaico de pedras portuguesas prclall t•
jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 97
,,
... 1 J _J - l - j --·--. ···-:::::::..._---=-:--~:: -------·------
:-:.::::.: . .:.:::..--::::_ -==-~:= .. --~'-~~--· .:.~ 'ª'._ ... ,.«
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--:::-:--/, J /~ !/{ ~-:-T\· \ 1 . • 11 .· ·1.· , ·,. \
Fig. 4. Jardim para a Praça 3 de Maio (Praça 13 de Maio ou Praça da
Piedade), projeto de R. Burle Marx, S. Salvador. Bahia, Esc. 1: 200, si data. Fonte: Escritório Burle Marx & Cia. Ltda.
brancas. Diferentemente da praça anterior, ele propunha a criação
de alguns canteiros com vegetação e a manutenção de todas as
árvores existentes, que eram abundantes. Sugeria, ainda, o retorno
do chafariz que havia sido retirado do local em 1931, além de
bancos em granito no entorno das árvores.
98 Tardins de Bu rle Marx no Nordeste cio Brasil
lL
• = .
• IL
,. 1
-:-"-'11. " 1 •
Fig. 5. Detalhes construtivos para as praças 15 de Novembro ('ll't ll' i111
de Jesus) e 3 de Maio (Praça 13 de Maio ou Praça da Piedade), proj1·10'
de R. Burle Marx, S. Salvador, Bahia, s/data. Fonte: Escritório lll11 k
Marx & Cia. Ltda.
Para Burle Marx, a preocupação com a preservação do
patrimônio histórico e cultural e com a manutenção da vegeLaç<fo
existente na elaboração de seus projetos é "também um crilério
que envolve conhecimento e sensibilidade': como afirma Flávio
Motta (1986, p. 100) ao se referir ao projeto para a Praça cio
Largo do Machado, no Rio de Janeiro, de 1954, no qual foram
preservadas e valorizadas as árvores existentes.
O princípio adotado para a especificação botânica foi comum
aos dois projetos: o uso reduzido de arbustivas e de herbáceas em
um total de seis espécies, a repetição de algumas dessas espécies e a
Jard ins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 99
11
formação de um conjunto de cores quase que permanentes, como
dos periquitos, dos abacaxis-roxos, das heras-roxas (llemigraphis
alternata), dos confetes, das acalifas (Acalypha wilkesiana) e dos
pseudoerântemos (Eranthemum reticulatum) (Tabela 2).
Tabela 2: Especificação da vegetação por Burle Marx
para a Praça 13 de Maio, cerca de 1950.
Nº Especificação Nome científico Nome popular Estrato por Burle Marx atualizado
Alternanthera Alternanthera
amoena Regei amoena Back. & Periquito Herbáceo Sloot.
2 Rhoeo discolor Tradescanlia discolor
Abacaxi-roxo Herbáceo Hance L'Hér.
Hemigraphis Hemigraphis 3 alternata (Burm.f) Hera-roxa Herbáceo colorata Hallier
T.Anderson
Hypoestes Hypoestes 4 sanguinolenta (Van Confete Herbáceo sanguinolenta Hook
Houlte) Hook. f.
Acalypha wilkesiana Acalypha wilkesiana 5 Muell. Arg. var. Acalifa Arbustivo
miltoniana Hort. Müll. Arg.
Pseudoeranthemum Eranthemum 6 reticulatum Radlk. reticulatum A. Pseudoerântemo Arbustivo
de Vos
Apesar de ser um renomado paisagista, seu projeto para
o Terreiro de Jesus sofreu severas críticas da imprensa, que
apontava a necessidade de um projeto paisagístico mais adequado
aos elementos clássicos do local, inclusive às características
apresentadas pelo conjunto arquitetônico de seu entorno.
100 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
< ;(l ill 1 dn~ .10 .111 l Jl ll' lol ldto llll l' rn\'.I 1 ' l de• Novc·111lu 11, d11
dllllS u111;1: ou o sr. i\ul'lc M:1rx l l' Vl' os p li11wk h1111tl l111 d11H,
011 cntan cng,1111n1 se lamc 11lavl'lnl l'll lt' 110 q1w ~t' 11111•
aos canteiros do Terreiro de Jesus. /\qul'ln p111,·11 p1•tl h1
realmente um jardim, mas um jnrdim \.Olllpk•tn111c•11t c
dife rente do que foi feito. Logradouro fo111111do prn
um conjunto arquitetônico de gosto ch\ssko, 1111 l 11~lv1•
templos centenários, Lendo ao centro 11111 d111f.1111 ,
também ao gosto da escola tradicional, ped ia um Jn1dl111
que se adaptasse às exigências aluais e não qucbra~sc• d1 maneira alguma a harmonia da praça consti tu{d,1 p111
velhos casarões, por edifícios an tigos que guarda11 1 '"'
sobriedade de suas linhas todas as tradições u rba 11 bt ll.1~
de épocas passadas. ( .. . ) De qualquer forma , seja cstl' 1111
aquele o motivo, é de esperar que fatos como esse 111 11 Nc
repitam, porque do contrário a cidade não passaria lk 11111
gigantesco prato de salada urbanística (A T/\RDI \, 11 dr
novembro de 1950, p. 3).
É possível que a repercussão negativa na imprensa e :t
expectativa frustrada em relação aos resultados do trabnlho
realizado tenham influenciado a opção pela não execução dos
demais projetos. Pode-se afirmar, a partir de notícias de jornais dn
época, que, pouco depois de ser redesenhado com base no projdo
de Burle Marx, o Terreiro de Jesus já havia sido esquecido pelo
poder municipal, convertendo-se em dormitório e local de del i los,
O jardim do Terreiro vive uma de suas p iores f.1sC''l
de sua existência, pois, de um dia para o outro, viu HI'
transformado em albergue, mercado e centro de rc 1111 l1111
de malandros (DJALMA GUEDES in DlÁRIO 1 )H
NOTICIAS, 13 de maio de 1953, p. 5).
Jardins de Burle Ma rx n o Nordeste do Brasil IOI
O Terreiro de Jesus hoje
/\o longo dos anos, o terrei ro vem sofrendo altcraçôcs na
sua <.:onliguração, com substituição do canteiro de p lantas por
piso e remoção dos bancos, fechamento da fonte com gradil e
supressão quase que total de sua vegetação. No decorrer do tempo,
la mbém teve usos e funções modificados, tornando-se um lugar
de passagem, principalmente devido à retirada dos bancos e do
canteiro de plantas e à inexistência de árvores e sombreamento, 0
que dificulta a permanência de pessoas no local (Fig. 6).
1 louve, ainda, a troca de postes de iluminação e a incorporação
de novos equipamentos, como telefones públicos e lixeiras (Fig.
7). Atualmente, o local é usado por transeuntes, em sua maioria
turistas que visitam o centro histórico da cidade e o Colégio dos
Hg. 6. Terreiro de Jesus, 201 O. Fonte: Lucy Kalil.
102 Jardins de Bur le Marx no Nordeste d o Brasil
Fig. 7. Terreiro de Jesus, 2010. Fonte: Lucy Kali!.
Jesuítas, cuja capela denomina-se Catedral Basílica Primacial de
São Salvador, e é ocupado por grupos de capoeira, vendedores
ambulantes e baianas de acarajé.
Considerações finais
Os projetos de Rober to Burle Marx para praças, parques
e jardins foram idealizados e executados segundo conceitos até
hoje inovadores e atuais. Seu pioneirismo pode ser observado
pelo menos em dois elementos utilizados no Terreiro de Jesus: seu
desenho, que o potencializa como local de reunião e não apenas
para circulação de pessoas, e a presença de um pequeno repertório
botânico, o que facilita a aquisição de plantas, reduzindo parte dos
problemas enfrentados pelo poder público em sua implantação.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 10:1
No entanto, o Terreiro de Jesus, a principal obra pública de
Burle Marx na Bahia, demonstra que a manutenção não vem
acontecendo. O piso em mosaico de pedra portuguesa branca
e preta tem sido reparado sem o necessário apuro técnico,
concorrendo para a sua descaracterização. O friso com as conchas
desapareceu e as reposições dos seixos pretos estão sendo feitas
com pedra portuguesa da mesma cor. A vegetação original do
projeto praticamente não existe mais e, a cada dia, vão sendo colocados objetos estranhos ao local.
O estado precário em que se encontra o Terreiro de Jesus
explicita o descaso com que o poder público tem tratado 0 seu
patrimônio, sem perceber a necessidade urgente de empreender
ações de restauração e tombamento de uma obra que é
representativa da passagem do maior paisagista brasileiro pela Bahia.
104· Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Ulhllograffa e Fontes Documcnlais
1\ 1 A Ili >I\. 11., n1111t•111omço1•~ do IV Cc11/c111írio tio /fo/i111 , rn jul. l 1>•1H,
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Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 10ã
IJM JAUDIM DE BUH.l..E MAl~X EM JOÃO PESSOA: HES ID ÊNCIA CASSIANO RIBEIRO COUTINllO i
l IHgnnC' jard im
l\ 111 1,1 Dicb
Introdução
A obra de Burle Marx na Paraíba é marcada pela divcrsidad1.•
de escalas de projeto, abrangendo praças, parques, jardi m,
privados e institucionais. Ao todo, foram elaborados 13 projctoi,
paisagísticos, sendo a maioria deles para a cidade de João Pcsson.
As suas propostas para a Paraíba são relevantes visto que expressa lll
muitos traços característicos da sua obra, como a valorização <.l n
vegetação nativa.
Para João Pessoa, Burle Marx elaborou 11 projetos, dos quais
apenas um - o Jardim da Residência Cassiano Ribeiro Coutinho
- foi executado e, pelos seus atributos culturais, foi tombado pelo
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba
(IPHAEP) no ano de 2008.
Além desses, foram idealizados dois jardins públicos em outras
cidades do estado da Paraíba: o Parque Açude Velho em Campin ,1
Grande (1952) e uma praça para a cidade de Areia (1943- 194 'I) ,
conforme consta no acervo do Escritório Burle Marx & Cia. Llda.
Jardins de Burle Marx no Nordeste d o Brasil I07
Burle Marx em João Pessoa
A Praça Venâncio Neiva, o Parque Arruda Câmara, conhecido
popularmente como Bica, e o Jardim do Palácio da Reden ção
foram os pr imeiros projetos concebidos em João Pessoa em 1939,
período p osterior ao que Burle Marx foi diretor do Setor de
Parques e Jardins do Governo do Estado de Pernambuco.
Em 1940, Burle Marx projetou para o Parque Solon de Lucena
um aparelho esportivo comp osto de escorregador, balanço e
gangorra, segundo consta no acervo do Escritório Burle Marx &
Cia. Ltda., e indicou a criação do bosque de pau d'arco (Tabebuía
chrysotrícha) e de bambuzais, os quais sempre gostava de visitar
quando estava em João Pessoa, conforme se recorda o arquiteto
Mário di Lascio em entrevista concedida em março de 2012.
Durante uma visita à capital, em 1981, em entrevista a um jornal
local, Burle Marx criticou algumas práticas de manutenção
aplicadas à vegetação do referido parque.
Os erros continuam sendo praticados, tanto é que
sou completamente contrário à pintura das árvores e
das palmeiras; acho isso de um aspecto monstruoso e
desnecessário, só para mostrar que essa cidade está sendo
cuidada (JORNAL A UNIÃO, 24 de maio de 1981).
Posteriormente, em 1985, Roberto Burle Marx foi convidado
pelo então prefeito Oswaldo Trigueiro do Valle (1983-1986) para
elaborar um projeto de reordenamento do Parque Solon de Lucena.
Para isso, preparou um relatório no qual elencou melhoramentos
no âmbito paisagístico, infraestrutura] e de iluminação, conforme
ilustra o trecho seguinte:
108 Ja rdins de Burle Marx no Nordeste do Bra sil
Colm ·'\ lltl d l· ;\l'VO l l'~ ( Oll lO l ·11 ,\l1I n:u·ll 111 , ( ''"'I" n111111l111
l' C.1~s i.i ro~.1 , 11a lml'1 1,1 ll.1vrn.tl :1 , V"gt11·1111,, P1d1111• li 11
Com C:1Lo lt'.· e C lt'1si:is 11s:i r pl :1111.1 d(' 1wq11 ,·110 p111 11•
nha ixo d os postes de ilumi1iaç<'ks (siL ) , n· planl•ll 11111IM
Pau brasi l, planta r palmeiras regiona is 1:0 1110 M111 ,lfl111 ,
Pindoba e outras dar uma conti nui{ladl· ~bll' lli.\ l il .I 1111
manutenção do parque; plantar Cassia listola l'lll l 11• 1\l t'
ao cassino da lagoa; disciplinar o plantio da~ d 1 vl·1 ~. 1
espécies, ordenando também as áreas desti nadas p 111 .i
jard ins floridos. Disciplinar o estacionamento, dar u 11 1.1
melhor dimensão à pavimentação, const rução de 1111! 10 ~
estacionamentos. Restaurar a iluminação dcrnrnt iv.1,
instalar mais iluminação efetiva - amplia r a i ns lal n~ ,1o d.1 fonte lum inosa dando uma dimensão proporcion.d ,\ ;\11'.1
da lagoa (O NORTE, 28 de jun ho de 1985, p. 6).
Ainda na década de 1940, foram elaborados dois projctos
paisagísticos para a Praça da Avenida Cruz das Armas e Pra\'-'
1817. Foi durante a década de 1950 que ele desenvolveu dois dos
seus principais projetos para a Paraíba: a Praça da Independê ncia
(1955) e o Jardim da Residência Cassiano Ribeiro Coulinho
(1957).
Seguiram-se os três últimos trabalhos do paisagista em João
Pessoa: o projeto da Praça Cívica da Universidade Federal da
Paraíba {1971), um estudo para o Jardim da Residência Emíl io de
Carvalho Coutinho (1976) e, por fim, o anteprojeto do Parque do
Cabo Branco (1981), conforme pesquisa no Escritório Burle Marx
& Cia. Ltda.
Antes de abordar o Jardim da Residência Cassiano Ribeiro
Coutinho, para seu estudo, destaca-se a Praça da Independência,
Ja rdins de Burle Mar x no Nordeste do Brasil t º''
por ter sido veiculada em alguns livros sobre o paisagista e por ser
até hoje um espaço de referência da cidade de João Pessoa.
A Praça da Independência
Localizada no bairro de Tambiá e com uma área de 70.000
m2
, a Praça da Independência foi construída e inaugurada no
ano de 1922, como um marco comemorativo do Centenário da
Independência do Brasil. O projeto executado, encomendado pelo
então gestor municipal, Walfredo Guedes Pereira (1920-1924), de
autoria do arquiteto Hermenegildo di Lascio, possui um traçado
geométrico, típico das praças francesas (DIEB, 1999).
Antes, no local existiu um sítio de propriedade da família de
Walfredo Guedes Pereira, que doou esta área à municipalidade
com o fim específico de se construir uma praça, havendo uma
cláusula na escritura segundo a qual caso lhe fosse dada outra
destinação, esta seria revertida aos seus legítimos herdeiros (DIEB, 1999).
Na década de 1950, o prefeito Luís de Oliveira Lima (1952-
1955) solicitou a Burle Marx um projeto de melhoramentos
paisagísticos para a Praça da Independência. Na sua concepção,
foi possível identificar uma ordenação geométrica mais precisa,
na qual "os conjuntos de vegetais se definem volumetricamente"
(BARRA, 2011), com a utilização de contrastes de cores, texturas,
massas e intervalos, perspectivas e soluções espaciais imprevistas.
A proposta para a Praça da Independência explora o sutil
contraste entre as aleias de palmeiras, diante das mudanças
de cores de seus estipes. Grandes aleias de palmeira-imperial
(Roystonea oleracea) estão ligadas às de açaí (Euterpe sp.) e
110 farclins ele Burle Marx n o Nordeste cio Brasil
""'' .tlhdrn (Acmco111iu i11/1tl/ll'SCl'llS), COlll SCLI t•sl ip1.· illl h.1d11.
1 >1flon·11t t•s formas são criadas a partir do pau d'an.o e, 1101.•nlrn110
do ' l.igo ;w.ul, alinhadas com o mosa ico de vidro cm st11lldo
pi·r 'pcmlicular, estão as aningas (Montriclrnrdia sp.), pl ll ill i l ~
du.oralivas cujo efeito <lo reflexo na água aumenta duas vezes Slltl
,li1urn (ADAMS, 1991).
o projeto, que não foi executado, também possui áre;1s dt•
LOll lcmplação e convivência, intercaladas por painéis compostos
de elementos como vidrotil, pedras e trepadeiras floridas (Fig. l ).
1\ vegetação existente foi considerada por Burle Marx e adensada
Fig. I. Projeto para a Praça da Independência, 1955. Fonte: Moita, 191! 1,
fardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 111
em forma de grandes maciços vegetados como, por exemplo, n
aleia de abricós-de-macaco (Couroupita guianensis), espécie até hoje existente no local.
A Residência Cassiano Ribeiro Coutinho
Na década de 1950, a cidade de João Pessoa se apresentava
em pleno crescimento populacional e expansão urbana para além
do seu centro tradicional. 1 A crise na produção e comercialização
do algodão, causada pela perda de mercado para os produtores
da região sudeste, fez com que o governo seguisse uma política
desenvolvimentista e industrialista, atuando a favor da expansão
da cidade. Entre as diversas ações empreendidas na época pelo
governo, destaca-se a pavimentação da Avenida Epitácio Pessoa
na década de 1950.
Aberta em 1920 por iniciativa do então governador Camillo
de Holanda (1916-1920), com o objetivo de estabelecer a ligação
entre o centro e o porto que se almejava instalar em Tambaú, a
Avenida Epitácio Pessoa foi alvo de sucessivos investimentos do
poder público a fim de se tornar um grande eixo de circulação e
expansão da cidade nas décadas subsequentes (VIDAL, 2004).
No mez de abril, indo ao encontro de uma Idea
predominante, qual a de se fazer na enseada de Tambaú
o nosso ancoradouro externo, iniciei os trabalhos de uma
avenida de 4862 metros de extensão por 36 de largura
ligando a Capital áquelle ponto do littoral (HOLLANDA, 1918, pp. 39-40).
l Segundo Villaça (2001), os centros tradicionais correspondem às antigas áreas centrais das quais se originaram as cidades brasileiras e também onde há uma maior concentração de atividades de comércio e serviços e diversificação de empregos.
112 fardins de Burl e Marx no Nordeste do Brasil
llll l i.li11wi11L'. at ollll'lL'll 1111H1 sl'· 1 il' dl' t• 111pL'l ililos I'·" ,1 •'
, 111 1t lw.ao d.is obras, Lomo o L'1Ko11tro da nova vi.1 LOlll .1 l ~sl1.1d.1
cli• 'l'.~111 hi {i, a grande inclinaçao da descida do platô p111 .1 ·'
pL111 k ,il· litorânca, a fragilidade da ponte sobre o Rio Jaguariht• 1.· ·'
l 'lt'l .Uiedade dos aterros nas margens do referido rio. Com isso,·'
popula~·ao continuou utilizando a antiga estrada de Tambaú pai·'
.ll l'ssar a praia (COUTINHO, 2004).
Tais empecilhos foram desvencilhados ao longo da dcca<la dl'
l ').)0, com as obras de corte no platô, o aterro das margens do
ll io Jaguaribe e a ligação da avenida à Praça da Independência,
l onfcrindo uma entrada mais imponente à via, atraindo assim a
população para o local.
Apesar de o porto não ter sido implantado em razão de
uma série de fatores, a avenida acabou apresentando novas
runções à medida que suas obras foram sendo concluídas, face ao
crescimento da população e expansão da cidade. Sua ocupação
ocorreu de forma fragmentada e diversa ao longo do último
século. Inicialmente, as áreas ocupadas limitavam-se às suas
extremidades: os bairros de Tambaú e da Torre. Durante este
período, a avenida serviu como ligação do centro tradicional com
a praia de Tambaú, local de veraneio e lazer dos cidadãos da então
Cidade da Parahyba.
De acordo com Coutinho (2004), o período compreendido
entre os anos de 1936 e 1970 foi marcado pela construção de
residências de um ou dois pavimentos, alterando, desta forma, o
seu entorno, ou seja, uma época de transição na paisagem urbana.
Sua ocupação se deu de maneira lenta até a década de 1950,
quando a via foi totalmente pavimentada com paralelepípedos
e ocorreu a implantação de bairros de classe média e alta, como
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 113
Expedicionários, Torre, Estados e Conjunto Pedro Gondim, ondl.'
as residências das famílias mais abastadas situavam-se nos lotes
adjacentes à referida via.
Tal ocupação se deu sob o ideal de vida social burguesa,
difundido a partir do final do século 19 nas cidades brasileiras,
que, de acordo com Rolnik (1988), resultou na redefinição da
noção de espaço público e privado, em que a casa, cercada por
muros, se afasta dos vizinhos e da rua, que passa a ser encarada
como local de passagem de veículos e pedestres.
As residências da elite pessoense, localizadas nas principais
ruas da cidade, passaram a ser símbolo de modernidade e
sofisticação a partir da utilização de novas soluções formais . As
ricas famílias passaram a convidar arquitetos modernistas para
projetar espaços que representassem bem as novas aspirações da
capital da Paraíba. Este é o caso da Residência Cassiano Ribeiro
Coutinho, localizada na Avenida Epitácio Pessoa, no bairro da
Torre, em João Pessoa, projetada por Acácio Gil Borsoi.
O projeto arquitetônico de Acácio Borsoi
Carioca radicado no Recife, Borsoi, assim como outros
arquitetos modernistas, realizou obras na cidade de João Pessoa
durante a segunda metade do século 20, a convite da elite
pessoense. Tais obras compreendem relevantes trabalhos, tanto
para a carreira do arquiteto, quanto para a produção da arquitetura
moderna brasileira.
Contratado por Cassiano Ribeiro Coutinho por indicação do
seu irmão, Odilon Ribeiro Coutinho, que era amigo do arquiteto,
Borsoi iniciou suas atividades na Paraíba através do planejamento
114 Jardi ns de Burle Marx no No rd este do Brasil
I'•" •' 1 Usinn S:\o Joao (Sanln Rita) e a Usi n;i Su nlu 1 kk'lhl ( S,1pt~ ) .
lll'1 lt•11ct•ntes à famil ia Ribeiro Coutinho (PEJrnl Ili\, WOH) .
A R~·sid6ncia Cassiano Ribeiro Couli nbo, de 1956, é um dos
11H1 is relevantes projetos desse arquiteto, não apenas por suas
l 11rnclcríslicas arquitetônicas, mas também por apresentar um,i
proposta paisagística de autoria do seu amigo Roberto Bu1fr
Marx. Borsoi afirmou que:
Essa casa surgiu quando conheci o Odilon lO\w lro
Coutinho, um ótimo amigo. Dei uma assistência na pa ri('
de arquitetura na usina deles. E o irmão dele, Cassiano,
me pediu para fazer a casa. Burle Marx também cm 1m·u
amigo, então eu o indiquei para fazer o jardim (Ff:.LJ X,
2009, p. 49).
Nessa época, o arquiteto paraibano Mário Glauco di Lascioz,
cujo aprendizado prático se deu através de contato direto com as
atividades projetuais e construtivas realizadas pelo seu pai ou por
meio de acompanhamento das obras realizadas por Borsoi em
João Pessoa, quando do seu estudo no Recife, ficou incumbido de
acompanhar a execução da referida residência.
Foi uma correria danada para mim, eu tinha que sair de
Recife, era uma viagem cansativa de 4 horas, com a estrada
cheia de buracos, e ir direto à obra para anotar tudo o
que estava acontecendo e depois entregar o relatório para
Borsoi... ele me perguntava tudo o que eu tinha visto.3
2 Filho do arquiteto Hermenegildo di Lascio, Mário iniciou seus estudos em 1950 1\l\
Mackenzie, que foram interrompidos por problemas de saúde de seu pai e retomado~ no Recife, onde se formou em 1957 na Escola de Belas Artes de Pernambu<.0 (PEREIRA, 2008).
3 Relato obtido em entrevista realizada cm 13 de março de 2012 com o arquiteto M:hlo Glauco di Lascio.
Jardins de Burle _'vlarx no Nordeste do Brasil 115
Jnscrida originalmente cm um lote com 7.tl 7'1 mi de :\rca e
topografia pouco acentuada, apresentando um suave declive cm
direção à Avenida Epitácio Pessoa, a residência foi implantada
com consideráveis recuos em relação aos limites do terreno,
possibilitando uma extensa área livre em seu entorno, utilizada
por Burle Marx.
Nesta edificação, a arquitetura moderna se expressa de forma
completa com a exploração plástica e utilização de grandes vãos,
permitidos pelo uso do concreto armado em sua estrutura.
No que se refere à sua forma, destaca-se o volume suspenso
dos dormitórios sobre o térreo, ocupado de maneira difusa e
transparente, utilizando pilotis (Fig. 2). Tal arranjo é característico
de outras obras do arquiteto na década de 1950.
Fig. 2. Residência Cassiano Ribeiro Cout inho vista a partir da entrada
principal do lote, foto de José Vlolf. Fonte: Wolf, 1999.
116 jardins de 13urlc Marx no Nordeste do Brasil
< l t'XlL'llSO progr;una de IH.'Ll'Ss idadt·s dn rcl<.idt 111 i.1 lo l
11",olvido por Borsoi ao longo de qualrn níveis i11lt•r11H·di,\l'im,
nndL· Jê)rarn distr ibuídos seus ambientes, levando c111 <.onsidern~ 110
lls u,"nd icionantcs topográficos e climáticos <lo terreno, visando
;, 111dhor acomodação da edifi cação no lote e ao conforto dos
usuários. Os ambientes sociais estavam voltados para o sudeslt'
orientação dos ventos predominantes - e os íntimos, t.:onrn
os quartos, salas e áreas de lazer, distribuídos ao longo dos dois
níveis mais altos da edificação, que se comunicavam entre si por
meio de rampas e escadas. Nos outros dois níveis, localizav;-1111 S<.'
a cozinha e a área de serviço, voltadas para o oeste.
Seguindo um conceito da vanguarda moderna, a edificaçiio
era marcada pela integração visual e fluidez dos espaços, tanto
entre os seus diferentes níveis internos, quanto entre o seu
interior e o exterior, por meio da utilização de mezanino, rampas
e escadas, além de extensas esquadrias de vidro. De acordo com
Pereira (2008), a residência não apresentava urna distinção rígida
entre interior e exterior, havendo assim uma ruptura com a ideia
tradicional de casa, tida como um espaço de reclusão, fechado e
delimitado por paredes. A Residência Cassiano Ribeiro Coutinho
originalmente possuía dois acessos, os quais se davam pela
Avenida Epitácio Pessoa e pela Avenida Júlia Freire.
Ao projetar a casa, Borsoi não levou em consideração apenas
os aspectos funcionais, mas também a relação interior/exterior na
filtragem da luz e na vista para o jardim, como pode ser constatado
na sua implantação com afastamentos generosos dos limites do
terreno, dando destaque ao recuo frontal, diferenciando-se das
construções do seu entorno e garantindo continuidade, integração
com a natureza, transparência, iluminação e ventilação naturais.
Ja rdin s de Bur le Marx no Nordeste do Brasil 117
O projeto paisagístico de Burle Marx
O paisagismo presentemente discutido trata-se do primeiro
projeto elaborado por Burle Marx para a Residência Cassiano
Ribeiro Coutinho e data de 1957 (Fig. 3). Dele também participaram
Fernando Tábora, Julie Cesar Pessolani, John Stoddart e Maurício
Monte. Existe nos arquivos do Escritório Burle Marx & Cia. Ltda.
um segundo projeto, prevendo a aquisição de dois lotes vizinhos
ao da residência, quando esta ainda estava em construção, a fim de
aumentar a área do jardim. Contudo, tal ampliação só foi realizada
parcialmente, visto que apenas um dos lotes foi comprado.
118 Jardins d e Burle Marx no Nord este do Brasil
1), posslwl kknl 1 fh. nr, i.:01110 po11 lu 1101 \l'.1dot d 1•1 N1
p1 nj1•10, a inlcnç~o do paisagisla de preservar a wgell11i 11
1·x Is\ en te, adequando sua loca lização no lolc p;Ha a l' hlh01 .1~ .10
do ·1 raça do e procurando valorizar os espaços com grn11d1•.,
11ianLhas contrastantes de espécies arbustivas e hcrbáu.•ni., .
e :omplcmentando as características do perfil natural do lcrn·no,
Burle Marx promoveu, em sua proposta, pequenos movimentos
de terra a fim de cr iar elevações ou depressões em certas árcn11,
principalmente na parte frontal do terreno, onde se enconl rn o
espelho d'água, assegurando sua inserção no entorno (Fig. 4).
I' l
Fig. 3. Projeto de jardim para o Sr. Ca~si,11111
Ribeiro Coutinho, Roberto Burle Marx, M. Monll',
J. Pessolani, J. Stoddart, F. Tábora, Esc. l: 100, l 1l'i 7
Fonte: Acervo de Juliano Carvalho.
Jardins de Bu rle Marx no Nordeste do Brasil t 1 ~
Fig. 4. Residência Cassiano Ribeiro Coutinho, vista da latera l do
jar<lim, 1957. Fonte: Acervo de Juliano Carvalho in Félix, 2009.
Juntamente com o projeto do jardim foram previstos também
o de irrigação automatizada e o luminotécnico, com fotocélulas
que acendiam diariamente às 18 horas, consideradas uma
novidade para a época, o que valorizava ainda mais o paisagismo da residência.
O projeto apresentava traços da fase mineira de Burle Marx,
com espelho d'água em forma ameboide e espaços configurados
por caminhos sinuosos gerando composições formais de harmonia
cromática. O paisagista utilizou 73 espécies de plantas (Tabela
1), sendo seis na área do mezanino, entre as quais predominam
as herbáceas e arbustivas, proporcionando interligação e
complementação dos espaços.
120 Jardins de Bur le Ma rx no Nordeste do Brasil
'Jhhcln J: Espcd lic11~·;'.lo da vcgctaç;\o por Burle M111·x pnn1
o Jard im da Res idência Cassiano Ribe iro Coutinho, 1957.
N" E~pcd fkação Nome cien t ífico Nome popular Estrnlo "º" B111·le Marx at ualizado
C)'/1cms p11pyrus I ,. Papiro A rln1slivo
2 Pmiledcria cordala L. Mururé l lcrb<k<:o
'fl1t1!i11 dc'alhata Fraser Caeté Hcrb<lu:u
,, Nyillphaea arnpla DC. Nymphaea ampla Ninfeia Herbáceo (Salisb.) DC.
5 Nymphaea ampla var. Ninfeia- rosa Herbáceo rosea D C.
6 Nyrnphaea capensis Nymphaea capensis Ninfeia-roxa Herbáceo Thunb. Var. var. zanzibariensis Zmmbariensis Casp. Conard
7 l\'yrnphaea rudgeana Nyrnphaea Aguapé-da- Herbáceo G.F.WJvlay rudgeana G. Mey. meia-noite
8 Codiaeum variegatum Codiaeum variegatum Cróton Arbustivo Blume (L.) Rumph. ex A. Juss.
9 Setcreasea purpurea Sp. Setcreasea Trapoeraba- Herbáceo purpurea Boom roxa
10 Alia manda nobilis Alamanda- Trepadeira T. Moore amarela
11 Heliconia psittacorum Heliconia Paquevira Arbustivo L. psittacorum L. f.
12 Stenotaphrurn Stenotaphntm sp. Grama- Herbáceo arnericanurn Schrank de-santo-var. va riegatum Hort. agostinho
13 Stenotaphrum * Grama- Herbáceo arnericanum Schrank de-santo-
agostinho
14 Plumbago capensis Bela -emília Arbustivo Thunb.
15 Barleria cristata Linn. Barleria cristata L. Barléria Herbáceo
16 Plumiera alba L. Plumeria alba L. jasmim -manga Arbóreo
Jardins de Burle .Y1arx no Nordeste do Brasil 121
N" Especificação Nome científico Nome popular Estl'Oto N·• l '~ 111: 1. llic11ç1\o Nome ele 111 llirn Nome po1,ul11r 11Ntr11to por Burle Marx atualizado 1wr llurlc Marx ntuulbado
17 Pentas lanceolata Pentas lanceolata Show-de- Herbáceo l i ;\nilyplw l1ispida Burm. Acalyp/111 ltispid11 R:1bo de ga lo A1 hu~1 lvo K. Schum. (Forssk.) Deflcrs estrelas . lA. ~.rnJcr i) Bu rm. f . ve rmelho 18 Canna indica L. * Cana-da-índia Herbáceo 1:; 1\er1/yplw wilkesia11n Acalyphn wi/kesia11a Acalifo A rlHl'l ivo 19 Musa Musa sp. Bananeira Ar bustivo Mud. Arg. var. Müll. Arg. Mr.
111ilto11iana llort. Mifloniana Firedragon 20 Xanthosoma Xanthosoma violaceum Taioba-roxa Arbustivo
\6 l lcmigmphis colorata Hemigraphis colorata Hera-roxa l lcrh<fr1.·o violaceum Schott. Schott l lall ier (Blume) Hallier f.
21 Phaeomeria magnifica Phaeomeria magnifica Bastão-do- Herbáceo .17 Polyscias guilfoylei Polyscias guilfoylei (W. Arália-cortina Arbustivo K. Schum. (Roscoe) K. Schum. imperador
Bailey Buli) L. H . Balley 22 Alpinia nutans Roscoe Alpinia nutans Alpínia- Herbáceo
38 Alocasia macrorrhiza Alocasia macrorrhiza Orelha-de- I-lerbücco (L.) Roscoe zerumbeti Schott. Schott. elefante-
23 Ravenala * Arvore-do- Arbóreo gigante madagascariensis Sonn. viajante
39 Achras zapota Li nn. Manilkara zapota (L.) Sapotizeiro Arbóreo 24 Philodendron Philodendron Guaimbê Arbustivo P. Royen bipinnatifidum Schott. bipinnatifidum
Schott ex Endl. 40 Polyscias fi/icifolia Polyscias fi/icifo/ia ( C. Arália- Arbustivo Bailey Moore ex E. Fourn. ) samambaia 25 Philodendron Philodendron Filodendro- Arbustivo L.H. Bailey speciosum Schott. speciosum Schott imperial
41 Polyscias fruticosa Polyscias fruticosa var. Arvore-da- Arbustivo exEndl. Harms. var. plumata plumata (W. Bull ex W. fortuna 26 Scindapsus aureus Eng!. Scindapsus aureus Jiboia Herbáceo Bailey Richards) L.H. Bailey (Pothos aurea Lind. (Linden &André) Polyscias sambucifolia Polyscias sambucifolia Sabugueiro- Arbustivo et André) Eng!. & K. Krause 42 Hort. (Sieber ex DC.) Harms cinza 27 Ca/athea makoyana Calathea makoyana Maranta-pavão Herbáceo
Alocasia variegata K. Inhame- Herbáceo Nichols E. Morren 43 .<llocasia Schott. var. variegata Hort. Koch & Bouché variegado 28 Wedelia paludos DC. Wede/ia paludosa Vedélia Herbáceo
Papoula Arbustivo var. viafis DC. var. via/is DC. 44 Hibiscus rosa-sinensis L. * 29 Graptophyllum Graptophyllum pictum Graptofilo Arbustivo 45 Braunia grandiceps Brownea Rosa-da- Arbóreo pictum Griff. (L.) Griff. grandiceps Jacq. montanh a 30 Pilea cadierei Gagnep. Pilea cadierei Gagnep. Pileia Herbáceo 46 Anherrtra nobilis Wall. Amherstia nobilis Wall Rainha-das- Arbóreo
& Guillaurnin árvores 31 Zebrina pendula Zebrina pendula Lambari -roxo Herbáceo 47 Couroupita guianensis * Abricó-de- Arbóreo Schnitzlein Schnizl.
Aubl. macaco 32 Acalypha wilkesiana Acalypha wilkesiana Chapéu-de- Arbustivo 48 Calycophyllum Calycophyllum Pau-mulato Arbóreo Muel. Arg. Müll. Arg. couro spruceanum Hook. spruceanum (Benth.) 33 Acalypha wi/kesiana Acalypha wilkesiana Crista -de-peru Arbustivo Hook. f. ex K. Schum.
Muel. Arg. var. Müll. Arg. var. 49 Salix L. Salix sp. Arbóreo musaica Hort. Musaica Firedragon
122 Jardins de Burle lvl arx 11 0 Nordeste do Brasil Jardins de Burle Marx no Nordeste d.o Bras il 123
N° Especificação por Burle Marx
50 Sola11um violaefolium Schott.
51 Persea americana Mill.
52 Philode11dron melobarretoanum Graz. Barr.
53 Philode11dron undulatum Eng!.
54 Tetrapanax papyriferus C. Koch.
55 Philodendron corcovadensis Kunth Enum
56 Musa rosacea Jacq.
57 Cyclanthus bipartitus Poiret.
58 Carludovica palmata R. et P.
59 Sanchezia nobílis Hook.
60 Althernathera amoena Voss
61 Lagerstroemia indica L.
62 Lagerstroemía jlos-reginae Retz.
63 Parkia pendula Benth
64 Euterpe oleracea Mart.
65 Dracaena umbraculifera Jacq.
66 Alocasia metallica Hook. f
124
Nome cientifico atualizado
Lycia11thes asarifolia (Kunth & Bouché) Bilter
Philodendro11 mellobarretoanum R. BurleMarx ex G.M. Barroso
*
Tetrapanax papyrifer (Hook.) K. Koch.
Cyclan thus bipartitus Poit. Ex A. Rich.
Carludovica palmata Ruiz&Pav.
Alternanthera amoena (l.em.) Voss
Nome populul' E~ L1·11to
Solano-violeta J lcrb~lCco
Abacateiro A[bóreo
Guaimbê Arbustivo
Guaimbê-da- Arbustivo folha-ondulada
Árvore-do- Arbustivo papel-de-arroz
Imbé- trepador Arbustivo
Banana-flor Arbustivo
Mapuá
Chapéu-depanamá
Sanquésiaamarela
Periquito
Resedá
Arbustivo
Herbáceo
Arbustivo
Herbáceo
Arbóreo
Resedá-gigante Arbóreo
Parkia pendu/a (Willd.) Visgueiro Benth ex Walp.
Arbóreo
*
Alocasia metallica Schott
Açaí
Dracenagua rda-sol
Taioba
Palmeira
Arbustivo
Herbáceo
Jardins d e Burle Marx no Nordeste do Brasil
N" 1 ~11n lli~11,·1lu pur• ll111'il' Mnrx
" ' O['lil11J10g1111 JllJll>llicllS
j-:1·1 ( ;,1wl.
hX /l,,,n1c•111111rl10n'111..K. H
Nome dcnt lllrn 11lunli:111do
OpliioJ1C1g(l11 j11/1c11111 " ·'
(L. f.) Kcr c;awl.
nrocae1w 11rbarea (Willd.) Link
h'I ('/ii/odc·11 rlro11 meli11011ii Philode11dron nielinonii
Nome popuh11
( 11.1111;1 p 1 l'l .1
Dracc11a /\ rbórca
Filodcndro-da Amazônia
l l1·1li.h1•11
l\rnngn. " Brongn. ex Regei ~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~
'/O /l/1i/ot/e11rlro11 specíosf.lm Philodendron Sd10ll. '' speciosum Scholt ex
Endl
71 f)ieffc11úachia bausei l lort. '*
72 Scl1efflera sp. ••
73 Aglaonema costatum N.E. Br. **
Dieffenbachia bm~sei Rege!
•
( •) Sem alteração de nomenclatura.
(' ') Espécies utilizadas no mezanino.
Filodcndro imperial
Comigo- l lcrhácco ninguém-pode
Cheflera Arbustivo
Café-de-salão l lcrbáccn
Estruturado a partir de espaços setorizados, o jardim possui
setores contemplativo, de lazer ativo e de serviços. O sclor
contemplativo se encontra na parte frontal da edificação, onde
estão localizados o espelho d'água de forma ameboide e canteiros
aquáticos, uma área de estar com banco curvo sombreado por
uma mangueira (Mangifera indica), ainda existente no local, e
três caminhos sinuosos que promovem ligação entre o térreo,
o mezanino e a parte posterior do terreno. Disposto de forma a
convidar o visitante a entrar, o jardim alcança a calçada pública, de
onde pode ser contemplado a partir da Avenida Epitácio Pessoa.
Na intenção de proporcionar a contemplação do jardim,
Burle Marx inseriu um banco de granito apicoado curvo no limilc
do mezanino. Nesse pavimento ainda se encontram a piscina,
jardins de Bu rle Ma rx no Nordeste d o Bras il 125
' 1 •
!
canteiros sombreados dispostos nos pilares <la edificação e uma
parede curva que serve de painel com tijolos aparentes, criando
um ambiente mais reservado.
Um caminho em pedra portuguesa interliga as duas avenidas
que delimitam o terreno. Ao longo do muro lateral que limita o
lote, foi disposto um canteiro contendo coqueiros (Cocos nucifera)
já existentes, formando uma cortina verde. Outros dois canteiros
marcam o acesso principal da edificação, destacando um painel
de cobogós na cor azul, elementos muito explorados em projetos
residenciais na época.
Na parte posterior da residência, encontra-se um pequeno
lago circular com monólitos de granito agrupados para o cultivo
de peixes, onde seixos de rio servem de forração e complementam
o espaço contemplativo, emoldurando a visada para as duas
gaiolas em concreto armado e tela de arame, projetadas para a
criação de pássaros (Fig. 5).
Proporcionando um lazer ativo, foram dispostos dois bancos
curvos de concreto e um espaço para o playground, composto
de brinquedos metálicos - gangorra, balanço e escorregador
- e batentes circulares em concreto com diferentes alturas. Foi
demarcada uma pequena área para o horto, que, localizado no
fundo do lote, é constituído por um espaço separado para a
produção e reposição das plantas existentes no jardim, bem
como por uma edificação de apoio. Tal conjunto é delimitado por
muros, ora lineares, ora sinuosos, com tijolos aparentes dispostos
de forma vazada, promovendo uma visão parcial da Avenida Júlia
Freire.
É possível identificar algumas espécies comuns entre esse
projeto e o Jardim da Capela da Jaqueira no Recife, criado alguns
126 Jardins de Bu rle Marx no Nordeste do Brasil
Fig. 5. Parte posterior do jardim exibindo o pequeno
lago com monólitos de granito. Ao fundo, o playground
e o banco curvo, 1957. Fonte: Haruyoshí Ono.
anos antes, tais como: visgueiro (Parkia pendula), abricó-de
macaco, bela-emília (Plumbago capensis), cróton ( Codiaeum
variegatum), alamanda-amarela (Allamanda nobilis) e grama
santo-agostinho (Stenotaphrum americanum). A parte frontal que ordena os acessos constitui o setor principal
da proposta paisagística elaborada por Burle Marx. O ponto focal
deste cenário é o espelho d'água com canteiros para o cultivo
de espécies aquáticas, tais como a ninfeia (Nymphaea ampla), a
ninfeia-rosa (Nymphaea ampla var. rosea) e o aguapé-da-mcia
Jardins de Bu rle Marx no Nordeste do Brasil 127
noite (Nympltaea rudgecma). 1 lavia organizações cromt\ tic<1s rn1 11
nuances que variavam do verde ao roxo, passando pelo vermelho, amarelo e azul.
Explorando-a em grandes extensões, tanto na parte fronta l,
quanto na parte posterior, Burle Marx utilizou a grama-santo
agostinho como a principal espécie de forração deste jardim. O
paisagista compôs o espaço com o amarelo da alpínia-zerumbeti
(Alpinia nutans), onde se encontravam dois exemplares de
açaí, que, por sua vez, interagia com o vermelho do bastão-do
imperador (Phaeomeria magnifica) e da cana-da-índia (Canna
indica), passando por tonalidades rosadas da espécie show-de
estrelas (Pentas lanceolata), encontrando as belas folhagens da
árvore-do-viajante (Ravenala madagascariensis), tendo como
forração as delicadas flores amarelas da vedélia (Wedelia paludosa
var. vialis).
No entorno do espelho d'água, o paisagista explorou as
tonalidades verde e roxa, passando pelo lilás. O verde-escuro da
grama-santo-agostinho contrasta com nuances roxa da trapoeraba
(Setcreasea purpurea) e lilás da barléria (Barleria cristata).
Em toda a extensão do canteiro que delimita a via interna,
Burle Marx utilizou espécies arbustivas com diferentes colorações
que vão do tom amarelado dos crótons, passando pelo vermelho
das papoulas (Hibiscus rosa-sinensis) e pelos tons de verde
da grama-santo-agostinho e da árvore-do-papel-de-arroz (Tetrapanax papyrifer).
Na outra extremidade, onde se localiza um canteiro separando
a via principal da via privativa, foram especificados dois exemplares
de abricó-de-macaco e forração em diversas tonalidades de
128 Jardins de Bu rle lv!arx no Nordeste do Brasil
1 ow.1, ,. 1 il:iscs com hera 1·oxa ( lf em igmphls colo mi" ), ht1rlfrh1 l'
1't·1 lq11 ito (Alterna11tltera amoena). Subindo a rampa cm din.: ~·õo
110 111c·1.a11ino, encontra-se Lm1a jardineira cm que o paisagísla
v.tlori;ou dive rsas folhagens, como taioba (Alocasia melallica),
d1 aLl' trn -guarda-sol (Dracaena umbraculifera) e orelha-de
t•ldirn tc-gigante (Alocasia m acrorrhiza) , tendo como forração a Jiboia (Scindapsus aureus) .
Em direção à parte posterior do jardim, valorizando o painel
de cobogós azuis, Burle Marx explorou tonalidades de verde com
a fórração verde-escuro da grama-santo-agostinho e a folhagem
l'X uberante da árvore-do-papel-de-arroz.
No mezanino, encontram-se canteiros dispostos em formas
similares às existentes na piscina, com plantas resistentes à
meia-sombra. O paisagista utilizou-se de folhagens exuberantes
com várias tonalidades de verde, tais como as do filodendro
da-amazônia (Philodendron melinonii) e do filodendro-imperial
(Philodendron speciosum). Mas também, o tom roxo do lambari
(Zebrina pendula) como forração para agrupar folhagens de
guaimbê (Ph ilodendron mello-barretoanum) e de dracena-arbórea
(Dracaena arborea). Em outro canteiro, ele propôs uma folhagem
verde-clara com manchas amarelas do comigo-ninguém
pode (Dieffenbachia bausei), associada aos agrupamentos do
filodendro-da-amazônia e do filodendro-imperial. No canteiro
interno, localizado na passagem da residência para a área de
serviço, o paisagista especificou um exemplar de visgueiro a fim de
proporcionar sombreamento e marcar a imponência da paisagem.
Na parte posterior do jardim, onde se localiza o pequeno lago
com monólitos de granito, criou um pequeno espaço protegido
pela sombra de pau-mulato (Calycophyllum spruceanum) , uma
Jardins de Burle Marx n o Nordeste do Brasil 129
Fig. 8. Situação atual do local antes ocupado por um espelho d'água, 2012. Fonte: Heignne Jardim.
monólitos, e algumas espécies vegetais, como jasmim-manga,
paquevira (Heliconia psittacorum), açaí, trapoeraba-roxa e o cróton.
Em entrevista à Revista Artestudio, em 2009, Borsoi lamentou
a situação do espaço projetado por seu amigo Burle Marx,
afirmando de modo veemente que o jardim é mais importante
como patrimônio do que a própria residência (FELIX, 2009).
Considerações finais
Devido às constantes mudanças de uso que o imóvel vinha
sofrendo e à iminente possibilidade de uma futura demolição
para a implantação de outra edificação que permitisse maior
n2 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
iprnvl'il.111H·11lo da ;Írca do lote, o poder plibliw tb :idiu, p01
11 iv1t1dita1;ao da sociedade, preservar este importante exemplar
dt' ,1rq\1itctura moderna, munindo-o de leis e responsáveis pela
111.11wtcnção de sua integridade.
l ·'. rn J J de agosto de 2008, foi aprovado, por unanimidade,
pdo Conselho de Proteção dos Bens Históricos Culturais do
liistiluto do Patrimônio Histórico e Arquitetônico do Estado
da Paraíba (CONPEC) o tombamento da Residência Cassiano
llibeiro Coutinho, abrangendo a edificação e seu jardim. Trata
sc do primeiro imóvel com características modernistas e fora
do perímetro do centro histórico da cidade a ser tombado pelo
IPHAEP.
Classificado como um bem de conservação parcial, o imóvel
deverá ser preservado, podendo ser adaptado a novos tipos de usos,
contanto que sua unidade formal seja mantida. No que se refere
ao jardim, se prevê uma restauração a partir da reconstituição da
vegetação e do traçado proposto por Burle Marx, já que ainda
existe a planta do projeto original.
A importância desse projeto, resultante de uma parceria tão
bem sucedida de dois grandes mestres do movimento moderno
brasileiro, se dá não apenas pelo fato de constituir uma obra
modernista, mas por se tratar de um marco da expansão da cidade
de João Pessoa. A restauração do jardim seria um gesto simbólico
para marcar a produção paisagística de Burle Marx no estado da
Paraíba.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 133
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134 Jardins de Bur le Marx no Nordeste do Brasil
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Ja rdins de Burle Marx no No rdeste do Brasil
PALÁCIO DOS LEÕES: li M JARDIM DE BURLE MARX EM SÃO LUfS
1111i·b,11·a Irene Wasinski Prado
Introdução
O Palácio dos Leões e seu jardim foram construídos sobre o
sítio fundador da cidade de São Luís, no Maranhão. O espaço do
jardim, do palácio e seu entorno se assenta numa falésia às margens
dos rios Anil e Bacanga. De frente para o mar, esse promontórjo
tem uma história de ocupação de mais de 400 anos. Já foi parle
da ocara dos Tupinambás, terreiro do Forte de São Luís, o cimo
do baluarte, a praça de armas do forte que defendeu as posses dos
franceses, portugueses, holandeses e novamente dos portugueses.
Como parte desse conjunto, o Jardim do Palácio dos Leões
guarda aspectos arquitetônicos, paisagísticos e urbanísticos dL·
interesse histórico e cultural, condições essenciais de um jardi 11\
histórico de acordo com os preceitos da Carta de Florença, de
1981. Pode ser considerado um importante jardim histórico no
Brasil, que tem como diferencial as intervenções de Roberto Burle
Marx, um dos maiores paisagistas da modernidade e de destaque
internacional pela concepção e concretização dos seus projetos,
inspirados na flora tropical. Em seus trabalhos, destacavam-se
os aspectos estéticos e ecológicos das plantas nativas, conforme
apontou Leenhardt (1994). Tais características explicam a
jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 137
longevidade de seus jardins e contribuem para o sucesso ccol6gico de seus projetos.
O paisagista nunca pretendeu imitar a natureza, seus
jardins eram "um acontecimento cromático onde os volumes
se ligavam e estabeleciam relações ( ... ) estritamente ordenados
e harmonicamente naturais" (TABACOW, 2004, p. 62). Para
Dourado (1997), sua característica projetual trazia quadros
intercalados formando cheios e vazios a partir das texturas e
brilhos, dos "verdes e azuis ou verdes de todos os tons das plantas.
Nesse jardim as águas refletidas contrastam com o castanho e o
cinza dos pisos': O desenho de Roberto Burle Marx era concebido
buscando no passado a melhor expressão da arte e da adaptação vegetal (GUERRA, 2006).
Dos jardins de Roberto Burle Marx, mesmo onde hoje o acervo
vegetal já pode ter sido descaracterizado ou até desaparecido, há
ainda o acervo arquitetônico-paisagístico que continua a marcar
a sua versão marxiana de um jardim. Ele "prior izava as plantas
brasileiras como tema, de modo que a vegetação nativa era o
elemento principal da linguagem da paisagem" (SÁ CARNEIRO, 2005, p. 59).
Seu desenho, porém, era também singular, marcando uma
forma arquitetônico-artística de jardins que os distingue de
outras expressões paisagísticas. Para Oliveira (2000, p. 2), o que
singulariza o seu jardim é "a ideia de construção de uma forma
contraposta à matriz compositiva do jardim clássico".
Esta arquitetura paisagística inconfundível se aplicou em
inúmeros projetos e obras pelo mundo, alguns no Maranhão,
sendo o mais importante o Jardim do Palácio dos Leões em São
Luís, que chegou a ser construído. Leenhardt (1994) e também
138 Jard ins d e Burle Marx no Nordeste do Brasil
M111alt•10 (2001) rdacionam tr~s i 11lcrwn~rn.·s L'lll S.IO l.ttb do Mi1rn11hao, sendo: o J:.mlim do Palácio dos !.coes L' lll n· 19(18 l
l '>7~1; 0 ]<lrdim da Alcoa Alumínio S.A., elaborado para a c111pn'N.1
dos. arq uilclos Harry Roitman e Reinaldo Marques cm 1982.; 11
Avt·nida Litorânea em 1985. Os projetos de 1982 e 1985 nao fora111
urnslruídos, como explicou o arqui teto Reinaldo Marques l'lll
depoimento dado em 2012.
Destaca-se a intervenção de Roberto Burle Marx no jardi111
do palácio em dois momentos. Em 1968, quando descnvolVl'u
um projeto de paisagismo que alterou a configuração do jardim
eclético existente até então, e, em 1973, quando foi chamado
para concluir o projeto original, conforme o depoimento ela ex
primeira dama do estado do Maranhão, Sra. Eney Santana, cm
2008.
Ambas as intervenções apontam hoje o valor histórico, cultura 1
e paisagístico do monumental Jardim do Palácio dos Leões. Por sua
localização e história, o jardim permanece como um espaço liv rt.·
de notável importância para a arquitetura paisagística brasileira.
Este texto discute os precedentes históricos do Jardim do
Palácio dos Leões e enfatiza a permanência desse espaço livre
durante mais de quatro séculos, apesar das mudanças de uso
ocorridas ao longo do tempo.
Precedentes históricos do Jardim do Palácio dos Leões
A arquitetura da fortaleza reservava, entre a construção dn
sede e os muros, um espaço livre utilizado para a ordem unida,
pátio de munição e as atividades militares (Fig. 1). A sede dos
governos na fortaleza foi demolida em 1766 para dar origem a um
• catÕlJ1·º
'
03<\\l1
" ' \\ote'" Df1'i'. \ \,·~ o-e -jardins de Burle Marx no No rdeste do Brasil
palácio no estilo arquilclônico do Império, por Joaquim de Melo
Povoas (MELLO, 2004). O palácio sofreu inúmeras reformas,
sendo que a de 185 7 alterou a localização da entrada principal. Em
1863, foram implementados a iluminação a gás e o lajeamento do
passeio na testada do edifício com pedra de cantaria portuguesa
(MELLO, 2004). É possível que nesse período, a exemplo de
outras cidades brasileiras, como Rio de Janeiro e São Paulo, tenha
havido o plantio das palmeiras-imperiais (Roystonea oleracea),
considerando-se as pesquisas de D'Elboux (2006) e Nepomuceno (2008).
Fig. 1. Croqui da sobreposicão do traçado de 1640 e localização do
Palácio dos Leões (planta de 1863), primeira cortina de 134 metros
ligando os baluartes, segunda cortina do forte e a terceira cortina que
suporta o Palácio. Fonte: Barbara Prado a partir de levantamento do mapa de 1863 in IPHAN, 2001.
140 Jardins de Bu rle Marx no Nordeste do Brasil
No Rio de Jnncirn, o l'a~·o de S;\o Cristóv,,o l' 11 C. 1 ~., d11
Moeda receberam renques de palmeiras imperiais dcsn·ndt•11l1• fl
d.ij f'o/111r1 Maler, planlada no jardim bolânico da cidade. A a11lig.1
pr~l\él de armas do Palácio dos Leões pode Ler c.la<lo lugnr a 11111
J.irdim , onde teriam sido implantados os renques de P~\lnwi1 .is.
i:.sludos sobre a difusão do uso dessa arecácea em significativa~
conslruções brasileiras e imagens fotográficas do Paládo do1.
I .cões em períodos posteriores às gravuras de Friedrich Hagcdorn,
de 1857, apontam nessa direção.
Em 1896, o palácio recebeu uma grande reformn 1111
administração de Manuel Inácio Belfort Vieira, o que lhe deu 1111\
novo estilo arquitetônico e uma fachada neoclássica (MEU .O,
2004).
Mais tarde, muitas mudanças paisagísticas ocorreram em S;10
Luís. Em 1901, o "Diário do Norte" publicou o "Edital de n" 1J
x: de ordem do diretor da Intendência Municipal da Capital do
Estado do Maranhão, que tratava do projeto de aformoseamcnlo
do "Largo de Palácio", onde os edifícios mais importantes da
cidade se localizavam, e de obras em outras praças.
No edital, apareciam como autores do projeto o engenhci ro
Palmerio de Carvalho Cantanhede e seu substituto Anísio dt
Carvalho Palhano. E determinava ainda para a implantação do
aformoseamento o "jardineiro Manoel Barboza, encarregado
da arborização e tratamento dos jardins de todas ellas, e cuja
proficiência no assunto é geralmente conhecida" (DIÁRIO DO
NORTE, 1901, p. 4).
Essa obra do "Largo de Palácio" foi executada em 1904 e potk
ter tido contribuição do arquiteto Charles Thays em 1900, como
Jardins de Burle M arx no Nordeste do Brasil 141
sugere o projeto publicado por Sonia Bcrjman ( l 998). A proposla
de Charles Thays incluía o projeto da praça, da avenida-bulcvar Pedro II e da beira-mar.
Os estudos de Costa e Prado (2006) e Prado (2007), embora
não confirmem a presença física de Charles Thays no Maranhão,
tampouco a contratação efetiva de seu projeto, conferiram que
houve algumas semelhanças da obra executada em 1904 com
a proposta do arquiteto. Esses estudos também mostraram o
rigor e o cuidado do levantamento feito em 1900, base para o
desenvolvimento da proposta de Charles Thays. E apontaram,
ainda, que a maquete desse projeto foi exposta no Rio de Taneiro,
em 1901, como noticiado na "Gazeta de Notícias" em 19 de julho de 1901.
A partir da revisita ao desenho de Charles Thays, observa
se uma proposta para o Tardim do Palácio dos Leões que busca
integrá-lo à beira-mar através de uma entrada na terceira cortina
e a criação de um novo baluarte entre os de Cosme e de Damião (Fig. 2).
Em 1906,nagestão do governador Benedito Leite (1906-1908),
o palácio foi ampliado, estendendo-se uma ala nos fundos dele,
destinada à residência do governador. Foram adquiridos objetos
de adorno, muitos trazidos da Europa. Em 1911, entretanto, ao
assumir o governo, Luís Domingues, aponta Vieira Filho (1971),
encontrou pouca mobília e muitas salas requerendo reparos.
Nesse período, a fachada do palácio trazia algumas alterações e
um brasão heráldico em azulejo com leões pintados e no pátio
"um jardim zoológico de vida efêmera" (LIMA, 2002, p. 63).
Em uma reforma por volta de 1922, o palácio recebeu um
acréscimo de adornos na fachada neoclássica. Na ocasião, houve
142 Jardins de Bu rl e Marx no Nordeste do Brasil
Fig. 2. Croqui da proposta de Charles Thays para o Jardim do Palácio dos Leões em 1901. Fonte: Barbara
Prado a partir de Berjman, 1998.
ainda uma intervenção na Avenida Pedro II, antigo "Largo de
Palácio", mas muitas destas mudanças na paisagem de São Luís
não foram bem recebidas.
Hoje a avenida Pedro II tem aspecto moderno com luí'
de mercúrio, embora lembre um pátio mourisco pelo
descampado das aléias que sofrem duramente o cáustico
da soalheira inclemente. Foram-se os fícus bejamin
de outrora e mais recuadamente as amendoeiras qul'
juncavam o chão com o vermelho e o amarelo ele s11;1s
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Bras il
folh;is ... l~m seu lugar cn:sccm ou morrem ...• 1rvon::rJ11l111s
raquíticas, fana<las, que n em dão sombra amiga . Os
"lenhadores': ou seja, os destruidores <le árvores das
praças e ruas de que fala Leandro Tocantins no seu
formoso "Santa Maria de Belém do Grão Pará': continuam
impunes fazendo as suas vítimas em São Luís (VIEIRA
FILHO, 197 1, p. 25).
Entre 1926 e 1929, Magalhães de Almeida assumiu o governo
do estado e, durante sua gestão, o prédio recebeu reformas internas
e alterações na fachada, além de "canalização de esgoto, pintura
geral e aquisição de roupa de cama e mesa" (LIMA, 2002, p . 63).
À época, foi alvo de ironias por parte de seus opositores através
de uma comparação feita entre o governo e o seu gabinete com
leões. Conta-se que "Palácio dos Leões" foi o apelido dado, que
se tornou, ao longo do tempo, o nome oficial da sede do governo
(MELLO, 2004).
No decorrer do século 20, outras reformas se sucederam,
criando ampliações de espaços internos e adaptações para
atender às modernidades e ao gosto dos residentes. No ano de
1967, sofreu intervenções que culminaram com a reforma do
jardim por Roberto Burle Marx em 1968. No entanto, nem todos
os elementos do projeto foram implantados nessa ocasião. Anos
mais tarde, em 1973, o paisagista foi chamado para finalizá-lo
conforme sua proposta original. 1
1 Foram colhidos depoimentos da Sra. Eney Santana, que contratou Roberto Burle Marx em 1973; do arquiteto Carlos Alberto dos Santos Pereira, que era diretor de Patrimônio do Estado e chefiou a extinta Superintendência de Obras do Maranhão -SOMAR, fiscalizando na época as 14 empresas envolvidas com a reforma do Palácio, entre 1969 e 1973; e do engenheiro João Pinto Lima, também funcionário da SOMAR, que fiscalizou as obras de restauro do Palácio. Ambos são atualmente professores do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA). Tais depoimentos foram coletados pela bolsista de Iniciação Cientifica da UEMA
144 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
() Conjunto ArquilL' lÔnirn <.' l';iisagfslko d<1 Cidadl' dl' S,\o
l ids somente foi tombado no Livro de ' lbmbo J\ rqucológiLo,
Fl nngr-.llico e Paisagístico cm 1974 pelo Governo Federal alravés
do 1 PI IAN (MARANHÃO, 1987), o que deveria marcar o fim de
t1 1lenH1ôes e descaracterizações nas obras do conjunto. No entanto,
outras obras ocorreram. Entre elas, a grande reforma do paládo
l' ll l 1993. O projeto foi elaborado por Acácio Gil Borsoi em 1992,
que, ao lado de Janete Costa, adaptou seus interiores. Muitas das
alterações feitas permanecem até hoje.
Os vários detalhes acrescidos ao longo dos anos foram
retirados e criamos novas soluções para que tudo ficasse
integrado à ideia original do projeto, de características
clássicas renascentistas (MOURA, 2004, p. 5).
Essa reforma no Palácio dos Leões em 1993, todavia, seguiu
sem 0 auxílio das pesquisas arqueológicas que teriam sido
necessárias (BANDEIRA, 2004). Ela também não foi a última,
mas se pode considerar que as posteriores trouxeram menores
adaptações e descaracterizações, apesar da proteção legal existente
e do significado cultural do conjunto monumental.
No jardim, observa-se a implantação de uma piscina onde
havia um tanque para plantas aquáticas. Houve retirada das
palmeiras-imperiais sem reposição de novos exemplares e de
outras plantas e jardineiras, principalmente após a instituição dos
mecanismos de preservação em 1974 e 1997.
Adriana Sekeff Costa em 2008. Os depoimentos do arquiteto Reinaldo. Marque~, contratante de Roberto Burle Marx cm t 982, e do engenheiro Francisco Luiz .de Ass is Leda sobre as contratações de 1985 para o projeto da Litorânea foram colh1doi; por Barbara Prado em 2012.
Jardins de Bu rle Marx no Nordeste do Bras il 145
Em 4 de dezembro de 1997, o Centro J lislórico de São J .ufs l(>i
agraciado com o título de "Patrimônio Cultural da Humanidade"
na Assembleia Geral do Comitê do Patrimônio Mundial da
UNESCO em Nápoles (ALCÂNTARA e ALCÂNTARA, 1997).
Porém, não consolidou a preservação do conjunto face às
descaraterizações que ainda ocorrem em razão da inadequação de
algumas intervenções.
O Jardim do Palácio dos Leões e as contribuições de Roberto Burle Marx
O Palácio dos Leões passou por muitas reformas ao longo dos
últimos 246 anos. Seu espaço livre foi transformado do uso militar
para o deleite contemplativo e recreativo de seus ocupantes. Além
de estar localizado num sítio histórico e ser parte integrante
da edificação, o jardim é também um espaço livre precedente à
própria cidade de São Luís. Pode se constituir, assim, num dos
mais antigos espaços livres do Brasil, uma vez que forma um
mirante (hoje ajardinado) do qual se contempla a paisagem da
baía de São Marcos há mais de quatro séculos e sua história se
mescla com a história da fortaleza, da cidade e do palácio.
Quanto às reformas do Jardim do Palácio dos Leões, algumas
imagens a partir de meados do século 20 (Fig. 3) possibilitam
compreender as transformações paisagísticas ocorridas nos anos
1960. O jardim, nesse período, é eclético, conforme classificação
das linhas projetuais de Macedo (1999). Apresentava, em 1950,
renques de palmeiras-imperiais, nem todas de mesma altura
(JORGE, 1950). Relacionando o plantio com a construção,
estima-se que tais plantas possuíam cerca de 20 metros de altura
146 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Fig. 3. Croqui do Jardim do Palácio dos Leões nos
anos 1950. Fonte: Barbara Prado a partir de fotografias
constantes em Jorge, 1950.
(relação entre a altura do edifício e a altura das plantas). Isso pode
indicar urna idade entre 70 e 90 anos, levando-se em conta dados
do Jardim Botânico e do Horto Botânico do Rio de Janeiro2 para
essa espécie de palmeira.
Considera-se ter havido 20 palmeiras-imperiais na sua
composição, em função do ritmo de plantio (distância entre as
plantas). Quanto aos arranjos vegetais, esses eram dispersos e
aparentam ser dracenas (Dracaena sp.), entre outras plantas.
Também havia forração gramínea, conforme identificado cm
fotografia de Jorge (1950).
2 Disponível em: www.jbrj.gov.br
Jardins de Burle Marx no No rdeste do Brasil 147
Os caminhos em pedrisco formavam um dcscn ho
característico do jardim eclético do século 19. O jardim era
ladeado por bancos de madeira nas áreas internas junto aos
caminhos e por bancos de alvenaria no mirante (pavimentado)
formado entre a área ajardinada e a terceira cortina. A forma oval
do medalhão central também guardava certa relação com a versão
de Charles Thays. Depois desse jardim dos anos 1950, identificou
se uma intervenção ocorrida durante o governo de José Ribamar
Ferreira Araújo da Costa Sarney, entre 1965 e 1969.
Em 24 de dezembro de 1967, foi publicada no jornal "O
Imparcial" uma relação de diversas obras públicas em andamento,
entre elas a reforma do palácio. No processo de afirmação de
modernidade, o Palácio dos Leões recebeu um projeto de Roberto
Burle Marx em 1968. O jardim passaria por modificações quanto
à forma e ao conteúdo vegetal.
O novo projeto apresentava tanques e alguns espelhos d'água
com profundidades variáveis para receber as plantas aquáticas.
Também havia canteiros onde foi introduzida vegetação gramínea.
O piso teve revestimento de lajotões numa parte e de pedras em outras.
Essa intervenção de Burle Marx foi apontada por Leenhardt
(1994) e Montero (2001) e consta no próprio site do Sítio Burle
Marx. 3
Entretanto, esse jardim não foi implantado totalmente
conforme o projeto original. Também não foram encontrados em
São Luís mais registros dessa intervenção, além de notas de jornal.
3 Disponível cm: V.'1-vw.sitioburlemarx.blogspot.corn.br
14·8 Ja rdins de Bur le Marx no No rdeste do Brasil
1: 1 t17 ~ 11 0 governo de Pl·dro NL·lva dl· S1111tan.1, Rolw1111 ,fll 'J • ,
111 11 lt- Marx: foi convidado pcl:-1 cnlüo primeira dama E1wy Sn 11L111.1
11.11 ;l'wnduir o seu projeto, de acordo com a conccpçfo o1 igin.d
(< :e >STA e PRADO, 2006).
A imagem publicitária do ano de 1975 mostra o jardim
r. d Roberto Burle Marx podendo ser observadas as ti.' orma o por ,
l · ·stentes (Fi·g 4) Algumas delas foram dcslocadns pa mc1ras ex1 · ·
Fig. 4. Croqui da intervenção de Roberto Burle Marx
em 1973 no Jardim do Palácio dos Leões. Fonte: Barbara
Prado a partir da capa do livro comemorativo do
governo estadual in Maranhão, 1975.
Jard ins de Burle Marx n o Nordeste do Brasil 149
e alguns lanqucs foram refo rmados pa n1 receber ns planlus
aquáticas e palustres. Um chafariz de ferro foi levado ao jardi 111 •
Foram aplicadas bordas de seixos de cor clara em contrasle com
pisos de pedra e lajotões de cerâmica.
Os canteiros, observando-se a altura das plantas, 0 jogo
de cores, o tipo de folhagem (com base na fotografia do livro
"Quatro Anos de Governo': de 1975)4, formavam quadros que
contornavam parte do jardim e neles foram plantadas espécies
rasteiras contrastantes entre si. Algo como uma forração roxa
(possivelmente a Tradescantia pallida) em contraste com uma
forração verde (possivelmente a Tradescantia zebrina). Também se
observaram inúmeros jarros inseridos em vários pontos do jardim.
Nas demais áreas, aparece um tipo de grama não identificado.
Nessa segunda intervenção, conforme depoimentos de 2008
do arquiteto Carlos Alberto dos Santos Pereira e do engenheiro
João Pinto Lima, as alterações encontradas por Roberto Burle
Marx teriam sido a baixa profundidade de alguns canteiros
destinados a suportar as árvores de raízes mais profundas e a dos
tanques para plantas aquáticas, especialmente para as vitórias
régias (Victoria amazonica), que teriam sido trazidas de Manaus.
Para o plantio, foram realizadas diversas incursões na ilha )
visitando áreas alagadiças na Vila Maranhão, Maracanã, Maiobinha
e Maioba, extraindo as plantas que seriam utilizadas nos tanques.
O engenheiro João Pinto Lima declarou que acompanhou Roberto
Burle Marx em diversas incursões, conforme depoimento de 2008.
O jardim incluía ainda uma área situada entre a terceira cortina
4 Fot.ografia colorida da capa <lo livro Quatro Anos de Governo, publicado na gestão de Pedro Neiva de S<inlana, entre 1971 e1975 (.MARANHAO, 1975).
150 Jardi ns de Bu rle Marx no Nordeste do Brasil
q11l' 'o llprn 1.1 o l'dlf'fl lo l' i lll'HIJ1 1tlu wrtl1111 de pc:drn. Co1110 ~·s t.1
' " l'· ' l ' rtl cm dcsnlvcl , !oi t rh1dn u mn escudaria de acesso ao pót lo.
Af>> longo do lcmpo, essa imporlanlc contribuição de Roberto
Burle 'Marx foi sendo descaracterizada. O jardim, que teve 13
p.dmciras-imperiais em 1975, apresentava apenas nove em 1977.
() aulor do Plano Diretor de São Luís de 1977, Wit Olaf Prochnick,
,tprcscntou sua proposta para o Viaduto na Praça Pedro II, dando
uma nova concepção ao Jardim do Palácio dos Leões.
As intervenções em meados dos anos 1990, apesar da
descaracterização do projeto de 1973, ainda conservaram alguns
elementos estruturantes do jardim de Burle Marx, corno os
Lanques entrelaçados, alguns caminhos de pedras e de lajotas e,
principalmente, a força de conjunto do desenho. Nota-se que
as descaracterizações mutilaram partes de um conjunto, mas o
desenho global ainda persiste.
A reforma de 1993, de Acácio Gil Borsoi, contratado no
governo de Edison Lobão (1991-1994), também pretendia
realizar alterações no jardim. Alguns tanques foram substituídos
por uma piscina, bem como os pisos no entorno dela (Fig. 5). O
projeto executado adaptava algumas formas do jardim original de
Roberto Burle Marx e pretendia a recomposição de boa parte das
palmeiras-imperiais e seu ritmo de plantio.
O Jardim do Palácio dos Leões é citado nas memórias
arquitetônicas de Acácio Gil Borsoi. Não é, no entanto, registrada
a idealização de Roberto Burle Marx. Em suas memórias, Borsoi
comenta uma solução que pretendia implementar na reforma de
1993: "criar sob a Praça Nobre seus jardins e estacionamentos,
uma área que permita gerar área de expansão funcional da equipe
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Bras il 151
Fig. 5. Vista aérea do Palácio dos Leões, 2002. Fonte: Grupo Tático
Aéreo in Costa e Prado, 2007.
de apoio ao governador e outros serviços" (BORSOI, 2006, pp. 54-
55). Esta solução para o monumento nacional não foi realizada,
evitando-se a descaracterização do sítio.
Considerações finais
Hoje, o desenho geral de Roberto Burle Marx permanece
sobreposto aos resquícios vegetais e arquitetônicos de um mesmo
espaço a cada tempo, como um palimpsesto de concepções
neoclássicas, ecléticas, modernistas e outras ainda por serem
descobertas. O Jardim do Palácio dos Leões tem valor histórico '
artístico, cultural e paisagístico e, por isso, relevância para a
arquitetura da paisagem de São Luís e do Brasil.
152 Jardins de Hurlc Marx no Nordeste do Brasil
S1111 irnport~nda tcrn s ido, tk lCI ta lormu, n.·conhcddll pdo:.
1111v1·111:1nlcs, uma vez que buscaram arquitetos de renome parn
1111! ;\ lo. Ainda assim, os riscos de descaracterização se renovam
,, u1d<í quatro anos. Em parte, porque alguns governantes
dcsl·jam deixar sua marca administrativa e, por outra, por não
l nmprccnderem que este não é apenas mais um espaço livre. É um
monumento nacional e a ele se prestam todos os cuidados para a
preservação da história brasileira.
A contribuição de Roberto Burle Marx, transformando o
Jardim do Palácio dos Leões num jardim moderno, se deu em um
Lcmpoemqueamodernidadetinhaoutraconotação,numBrasilem
outra fase histórica. Em 1968, já havia diversas cartas patrimoniais
e acordos internacionais sobre a preservação dos monumentos,
obras arquitetônicas e sítios histór icos, especialmente a Carta
de Veneza, de 1964. Entretanto, tais recomendações foram
solidariamente ignoradas por autores e governantes, embora os
jardins ainda não recebessem uma devida atenção, o que começou
a ocorrer com a Carta de Florença, de 1981.
As cartas de preservação formam argumentos para a
restauração do projeto original, que não tem sido protegido
rigorosamente, principalmente das adaptações contemporâneas e
dos gostos pessoais dos ocupantes do palácio.
Hoje, no jardim, há ainda oito palmeiras-imperiais das 20
que se estima terem existido nos anos 1950. Seria necessária uma
análise botânica especializada para atribuir a idade e identificar a
origem dessas plantas. Muitas não foram repostas e outras foram
retiradas para facilitar a entrada de carros e até para a realização
de eventos.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Bras il 153
A prospcc~ão arqueológica requer um lc.:vantamenlo uidust ra l
rigoroso da sua arquitetura, assim como da bolânica, não só
quanto à idade e movimentação das palmeiras-imperiais dcnlro
do jardim, mas quanto à sua origem, respondendo se ainda há
espécies que possam ter vindo da Palma Mater do Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
Os projetos de Roberto Burle Marx em São Luís são muito
~ouco divulgados. Não são sequer apontados nos principais
impressos oficiais do Maranhão. O passo fundamental adiante
será avançar para o resgate da obra do paisagista a partir de seu
reconhecimento oficial e efetiva valorização.
154 Ja rdins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Blhllografia e l~ontc.\s 1Jon1111cntajs
i\ 1.< ' i\~ ' l 'ARA, Dora; ALCAN'l'AllA, Pedro. Proposta de luclustro
tio e 'm iro l lislórico de Süo Luís na Lista do Patrimônio Mundial da
1 IN /!SCO: Documento Complementarnº 1 - Apontamentose Indicações lll'lc rcnlcs ao Centro Histórico de São Luís do Maranhão, Brasil, e à lldcvi\ncia Histórica Mundial do Patrimônio Cultural Situado na Zona de 'fombamento Federal e seu Entorno. São Luís: IPHAN, 1997.
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d,1., pl.ant ;1s ashlt irns à beira da lagoa e o desenvolvimento do J'.ud1m
llut.\ 111 ~ 0 , do !tio de janeiro, que vence dois séculos d~ L11:11dade,
1 IH lwnles, transformações da cidade, novos padrões c1enl1fi~os e
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Estadual do Maranhão (UEMA).
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasi l 157
JJ\ltDINS DE BURLE MARX PARA O TllEATH.O JOSf~ DE ALENCAR EM FORTALEZA
ltlr.1nf o Figueiredo Bezerra
l"t•rnanda Cláudia Lacerda Rocha
T<•mf slocles Anastácio de Oliveira
Antônio Sérgio Farias Castro
Introdução
Este trabalho investiga um momento peculiar da vida
profissional de Roberto Burle Marx, entre 1973 e 1990, quando
ele teve a oportunidade de fazer dois projetos para um mesmo
local, o Theatro José de Alencar, num lapso de quase 20 anos; mais
interessante ainda porque são, vis-à-vis, projetos bem distintos em
termos formais e programáticos.
Diversas publicações sobre a obra do paisagista indicam 1973
como o ano do primeiro projeto, embora pranchas existentes no
acervo do teatro sejam datadas de março de 1974.
A escolha desse projeto se justifica, principalmente, por seu
caráter público e sua decorrente visibilidade no ambiente urbano
de Fortaleza, pela importância do equipamento cultural a que
serve, pelo ineditismo em relação às publicações sobre a obra
do paisagista e pela curiosa realização - pelo escritório de Burle
Marx - de dois projetos para o mesmo espaço.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 159
O nascimento de um jardim há muito "prometido"
Em 17 de setembro de 191 O, as portas do Theatro José
de Alencar (TJA) se abriram pela primeira vez·. O prédio era
admirável. Segundo Castro (1993, p. 125), este poderia ser inscrito
como um daqueles de "maior valor nos quadros do ecletismo
brasileiro''. O seu foyer seguiu as tendências afrancesadas da época,
valendo, no entanto, ressaltar a magnífica sala de espetáculos
composta de uma ampla estrutura metálica, grande parte em ferro
fundido, projetada e produzida em Glasgow (Escócia) por Walter
MacFarlane & Co. Afirma Castro (1993, p. 125) que essa estrutura
"mistura elementos compositivos de reminiscências art nouveau
com vocabulário ao gosto da arquitetura vitoriana", configurando,
assim, o eminente caráter ec1ético do edifício.
Apesar de ser chamado de "teatro de jardim" - em razão de
sua destinação descrita em catálogo -, a construção, encaixada
entre os prédios do Quartel da Polícia e da Escola Normal
(posteriormente ocupada pelas faculdades de Medicina e
Farmácia e Odontologia e depois pelo Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional-IPHAN), apresentava apenas uma
pequena área descoberta, sem a presença de qualquer elemento
vegetal entre o Joyer e o corpo principal. Era, portanto, um "teatro
de jardim" sem nenhum jardim, de fato.
Defronte ao prédio, uma extensa praça do centro da cidade,
denominada, à época, Praça Marquês do Herval, fazia as vezes
de jardim para o teatro. Azevedo (1980, p. 70) a descreve como
um "verdadeiro Jardim de Afrodite" repleto de rosas, dálias,
borboletas1 "e mais uma infinidade de flores e crótons''. Além disso,
1 f provável que o autor esteja se referindo à espécie Caw1a x general is.
160 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Bras il
111 11 pnvilh:10, lllll <.Ol'rlo, bancos dl' ferro e matkin1 <.' t nlu11.1 '> t rn11
v11sos t hincscs repiei os de plantas, entre outros, compkmt.•111L1v.1111
,, 1}1.:kza do jardi 111, que, ainda segundo Castro ( 1987, p. 21<>), l' J ,1
111;11luada por cópias da estatuária grega pertencente ao Musru do
Louvre cm Paris. Essa praça, hoje denominada José de l\lc1H .11,
havia sido ajardinada em 1903, como parte de um projeto di'
ajormoseamento da capital.
Da sua inauguração, em 1910, até os dias de hoje, transcorrido
mais de um século, a cidade e o seu teatro, este e sua pra~·n,
passaram por imensas t ransformações. De urna cidade com poul 11
menos de 50 mil habitantes no começo do século 20, Forlak·:,1,,1
se encontra hoje entre as cinco maiores metrópoles brasileira1',
com uma população beirando os 2,5 milhões de habitantes. Essas
transformações vieram. a reboque de um processo de crescimento
urbano desordenado, provocado por diversos condicionantt.•s
políticos, econômicos, culturais e ambientais, reflexo de mudanças
semelhantes ocorridas nacionalmente em outras cidades.
De pacato logradouro, palco de retretas vespertinas e do
passeio t ranquilo de "gente de famílià' até a primeira metade do
século 20, passando por caótico e barulhento terminal de ônibus
urbanos por quase cinco décadas, até 1990, hoje - após uma
reforma modernizadora inconclusa, objeto de concurso em 1999
- a Praça José de Alencar é uma verdadeira arena do circo urbano.
Dessa forma, o TJA e sua praça têm passado por processos
sucessivos de degradação e recuperação. O teatro, ao longo do
tempo, passou por várias restaurações parciais e uma grand<.•
reforma. As primeiras foram em 1918, 1938, 1957, 1973 e a últinw
foi em 1990 (THEATRO JOSÉ DE ALENCAR, 2002, pp. 47-50).
Ja rdins de Burle Marx no Nordeste do Bra sil 161
Nas intervenções de 1973 e l 990, Roberto Burle Marx participou
ativamente da revitalização desse importante patrimônio cultura l
brasileiro, projetando os seus jardins.
Burle Marx e o Theatro José de Alencar
Apesar de o Nordeste, mais especificamente a cidade do
Recife em meados dos anos 1930, estar diretamente ligado ao
início da sua trajetória profissional, Burle Marx só produziu seu
primeiro projeto em Fortaleza em 1968 - a residência Benedito
Macedo, em conjunto com o arquiteto Acácio Gil Borsoi. De
acordo com Diógenes e Paiva (2007), a colaboração entre esses
dois profissionais seria responsável pela "inserção do paisagismo
moderno em Fortaleza''.
Sua trajetória em Fortaleza segue em projetos esparsos,
principalmente para residências, até sua segunda versão para os
jardins do Theatro José de Alencar, em 1990. Entre 1992 e 1994, ele
produz o que seria seu último projeto (não executado) no Ceará
e um dos últimos da sua vida: o desenho para o Jardim Botânico
de Fortaleza, na Fazenda Raposa (BEZERRA e MOURA, 2007).
O primeiro desenho (1973): o jardim-espetáculo
Corria o ano de 1973. A essas alturas, o edifício do TJA
encontrava-se em péssimas condições e o Governo do Estado
resolveu não somente recuperar o prédio, como também demolir
a edificação vizinha, antigo Quartel da Polícia e, posteriormente,
Centro de Saúde, para aí ser criado um jardim para o teatro
(THEATRO JOSÉ DE ALENCAR, 2002). Desse modo, 63 anos
162 J:11·d ins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
.1p1h Sll•\ inaugunH,:ao, o 'J'JA poderia hli'.cr jus;\ su,1 1 l.1i-silll ,1~.111
<k "ll'alro de jardim". E, para criar esse novo espaço,(' tlin111.1tlo
lloh~·rto Burle Marx, por sugestão do arquileto José Lihl'rnl dl' 1
(:astro.
A indicação de Roberto Burle Marx para elaborar o t}Ut.' Sl'I i,1
a primeira versão do projeto dos jardins do TJA, em l 973, seria
natural, já que ele estava, naquela época, desenvolvendo alguns
Lrabalhos para a Prefeitura Municipal de Fortaleza.
O primeiro desenho para os jardins do TJA, cujo projeto e também assinado pelos arquitetos Haruyoshi Ono e José Tabacow,
é bem representativo da linguagem formal criada por Burle Marx :
um equilibrado jogo de linhas retas, paralelas e oblíquas, ligadas
por arcos de circunferência, produzindo uma sensação de planos
superpostos onde se definem canteiros, áreas pavimentadas,
elementos aquáticos e de mobiliário.
Um grande espelho d'água, com uma fonte luminosa, domina
toda a composição. Este elemento, que cobre cerca de um quarto
daquele jardim, divide em dois o espaço disponível para circulação
e convivência, dando-se a ligação através de uma pequena ponlc
sobre o espelho d'água (Figs. 1 a 3).
Percebe-se, igualmente, que esse projeto elaborado em 1973
valoriza, principalmente, o aspecto contemplativo do conjunto:
um verdadeiro espetáculo de plantas e água em movimento.
Apesar de não existir nesse projeto qualquer alusão ao estilo
eclético do edifício a que se presta, conforme Tabacow, cm
entrevista concedida aos autores por telefone no dia 14 abril de
2009, havia uma posição firmada pelo paisagista de criar, em
seus projetos para prédios históricos, um desenho mais simples,
buscando assim valorizar a edificação em si.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 163
Fig. 1. Planta baixa do projeto de 1973. Fonte: Temíslocles Oliveira.
Fig. ~· Desenho simulando o projeto de 1973. fonte: Temístodes
Oliveira. Desenho sobre foto de arquivo do jornal "O Povo" (27 de dezembro de 1986).
__ _J
164 Jardins d e llurl c Ma rx no Nordeste do Brasil
Fig. 3. Desenho simulando o projeto de 1973. Fonte:
Temistocles Oliveira. Desenho sobre foto de arquivo do jornal
"O Povo" (27 de dezembro de 1986).
Após uma busca exaustiva e infrutífera por fotos da fase
logo após a sua implantação, optou-se por essas simulações em
desenho, procurando retratar a exuberância do jardim, expressa
pelos seus elementos dominantes: o grande espelho d'água e sua
fonte.
Este jardim, no entanto, teve vida muito curta, principalmente
devido à sua extensa fonte. Como esse equipamento, dependente
de sistemas hidráulico e elétrico para bombeamento e iluminação,
era acionado muito esporadicamente, cada vez que era preciso usá
lo, havia necessidade de serviços de manutenção. Nesse sentido,
os custos de manutenção estavam além dos recursos disponíveis
e o jardim, em dois ou três anos, entrou em pleno processo de
degradação (O POVO, 27 de dezembro de 1986).
Jardins de Burl e Marx no Nordeste do Brasil 165
O arquilclo .Francisco Veloso, participante das equipes qL1c
trabalharam tanto no projeto de 1973 como no de J 990, lembra
que, em uma das visitas que o paisagista fez a Fortaleza junto com
o arquiteto José Tabacow, foi aventada a possibilidade de integrar
o jardim a ser criado à Praça José de Alencar. Por intervenção de
Liberal de Castro, essa medida não foi adotada, justificando ele
que o espaço estaria, em pouco tempo, indevidamente ocupado
por camelôs, principalmente considerando-se que, àquela época,
funcionava na praça um dos mais movimentados terminais de
ônibus da cidade. Aceita a argumentação, foi adotado um gradil
que permitiu a visualização dos jardins a partir do espaço público,
restringindo, no entanto, o seu acesso através do teatro.
Levando em consideração que o principal elemento focal
do jardim, sua extensa fonte, não mais funcionava e que a área
projetada para convivência era relativamente de difícil acesso, o
espaço perde importância e apressa-se, assim, seu processo de
deterioração. Isso prossegue até que, numa iniciativa do governo
estadual, dá-se início a uma grande reforma do TJA.
O segundo desenho (1990): o jardim utilitário
No final dos anos 1980, uma nova geração de políticos
cearenses, liderada por Tasso Jereissati, havia assumido o
comando do governo estadual após uma sucessão de governantes
ligados ao regime militar. Nessa composição política, é indicada,
então, para a Secretaria de Cultura, Violeta Arraes Gervaiseau.
Esta intelectual, que foi para Paris em exílio imposto pelo governo
militar, em 1964, de família originária do Cariri cearense (irmã
de Miguel Arraes de Alencar), com extensa carreira de militância
166 Jardi ns de Burle MarJ< no Nordeste do Brasil
polfl i\ il, pt•ssm1 dL: l'l'lOllhn:ida lilpalidadl' agiu! in;1do1·,l, idt•. d1:1,:
i· h1111~1 a frente de u111 amplo projeto <.k rcformn do '1 lwa l rn J o~t·
dl' /\km.ar.
b ., .. 1 por notória espccializaçao, (• Para executar a o 'ª c1v1, ,
Método empresa com sede cm Suo sl'kcionada a construtora ' . e d ·ardim é novamente contratado o Paulo, e para a re1orma o J " , . ·' tório de Roberto Burle Marx. O projeto elaborado dessa ~cz
<.:SCI J teto , .. · do além de Burle Marx, por Haruyoshi Ono como argui assina ,
1 b 1 ·
. d d Almeida como paisagista co a orat or associado e Leonar o e . . • . l t do primeiro: é um jardim mtnnsecamcnk d1verge por comp e 0
utilitário (Fig. 4). , 1
da ampla fonte e seu espetáculo de agua e u:.-., Agora, em vez • . . de recorte ortogonal, em tijolo ceranrn:o tem-se um extenso piso,
. d . l de 1990· o J'ardim utilitário formado po1 Fi 4 Planta baixa o proJe o · g. · . . .· l usado para os mais diversos even t o~ . um grande pátio que tem s1c o .
Fonte: Temístocles O liveira.
fardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 167
vcrmcJho e ladrilho bidn\ulko cinza, com discretos detalh<.·s cm
granito cinza (Figs. 4 e 5), o mesmo utiJizado na área descoberta
entre o foyer e o corpo principal, anteriormente referida,
estendendo-se como elemento de identidade formal ao pátio do anexo.
No conjunto formado, sobressai, ao fundo, um palco descoberto
que surgiu como uma feliz e oportuna solução de projeto para
camuflar vários equipamentos técnicos (condicionadores de ar,
cisterna, subestação e quadros elétricos), bem como um camarim.
O projeto desse elemento é do arquiteto Ricardo Rodrigues,
membro da equipe técnica responsável pela reforma.
À frente dele, um grande espaço central livre, praticamente
circundado por extenso banco em concreto, tem servido para
múltiplos fins, principalmente eventos ligados à própria pauta do
Fig. 5. O projeto de 1990: o pátio de múltiplos u~os com seu extenso
piso cm tijolo cerâmico e ladrilho hidráulico. Fonte: Ricardo Bezerra.
168 Jardins de Bu rle Marx n o Nordeste do Bras il
11·11110. Esl<.' cspa<yo verde, cm pleno centro da cidad e, representa
11m 1 d rigério para o caos urbano à sua volta.
Comparado ao projeto anterior, de 1973, contrasta a
si rnplicldade da nova proposta, que não apresenta as características
peculiares da obra de Burle Marx. Excetuando a maestria do plano
de vegetação, nada ali poderia revelar, mesmo a um estudioso do
paisagismo, a mão daquele artista. Não se veem seus magníficos
pisos de mosaico português, nem seus canteiros em desenhos
de sofisticada geometria, tampouco seus costumeiros elementos
ornamentais como painéis, murais e esculturas. Ao contrário, no
conjunto, como um todo, realçam a sobriedade e singeleza de
linhas e volumes.
Desta forma, o projeto destaca dois elementos principais: a
edificação do próprio teatro e a vegetação, que tem hoje, depois
de crescida, o importante atributo de isolar o jardim da rua,
atualmente repleta de bancas de camelôs, mendigos e barulhentos
ônibus.
Esse é um trabalho que, de certa forma, foge aos padrões de
desenho de Burle Marx, mas se sobressai, no conjunto da obra
produzida por seu escritório, pela demonstração de saber adotar
um partido próprio para a situação. Nele, as características
peculiares daquele gênio criador dão lugar a uma solução
consciente da sua adequação, mostrando uma preocupação com
a utilização do espaço, tanto para a realização de grandes eventos,
como para o convívio em áreas sombreadas e, principalmente,
respeito à edificação histórica a que serve.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 169
1 J
O jardim do anexo
Até aqui fez-se uma análise do jardim principal do 'l'JA cm
suas duas versões. No entanto, para que se possa entender os
projetos na sua totalidade, em ambos os casos existe uma parte
de jardim, no lado oeste do teatro, que precisa também ser vista.
Quando o teatro foi construído, no início do século 20, na
sua lateral oeste já se encontrava o prédio da Escola Normal. Esta
edificação, construída entre 1881 e 1884, conforme o Guia dos
Bens Tombados do Estado do Ceará, veio posteriormente a ser
a sede da Escola de Medicina e, em seguida, da Faculdade de
Farmácia e Odontologia. Para servir a estas, foi construído um
anexo na extensão sul do terreno.
Na versão de 1973, Burle Marx propõe derrubar esse prédio
anexo, mantendo a edificação da antiga Escola Normal para
abrigar os serviços administrativos do teatro (Fig. 1). No entanto,
na época da implantação do jardim, nesse anexo ainda funcionava
a referida faculdade, ficando, por esse motivo, postergada a sua
demolição.
Analisando o projeto, nota-se que esse lado não tem maiores
ligações formais com o jardim principal. Os elementos mais
marcantes são as várias áreas de convivência propostas, criadas
sob as copas de árvores, e urna aleia formada por 14 palmeiras
reais (Roystonea regia). Além desses, nota-se um estacionamento
com 12 vagas e um acesso para veículos de serviço. O grande
valor da ideia seria soltar o prédio do teatro, dando espaço para
sua visualização por três das suas fachadas (Fig. 1). No entanto,
devido à rápida deterioração sofrida pelo jardim principal, ficou
170 Ja rd ins de Burle Marx 110 Nordeste do Brasil
lnra d< . .' coglla1;t10 derrubar o pn'.-tlio ,llll'XO, qut• linh.1 t11 1111 ho,1
l ondi~ao <:onstrut iva.
· Alguns anos depo is, a faculdade foi transferida para o rn111/'"'
do ,Porangabussu (onde se concentram os equipamentos da :\ll'•I
de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Cearú) e os doii.
prédios foram desocupados. Então, através de um acordo c:nl 1t'
0 Ministério da Educação e o Ministério da Cultura, a SPI 11\N/
Pró-Memória (Secretaria do Patrimônio Histórico e ArLístiLO
Nacional), hoje IPHAN, passou a utilizar o prédio histórico corn
um projeto de ocupação igualmente do anexo. Com tal silua~· ;\o,
Geou, então, totalmente descartada a implantação do jardim ocslt'
nessa versão de 1973.
Quando Burle Marx elabora o projeto de 1990, nele cst:\
incluído o prédio do anexo, que, após uma extensa reforma, passa
a abrigar os serviços administrativos e de apoio ao teatro. Apcsa I'
de o IPHAN haver chegado a elaborar um projeto para ocupar
esse edifício anexo, a secretária Violeta Arraes, através de acertos
políticos, conquista o espaço para a expansão do Theatro José de
Alencar. Mantido, portanto, esse prédio, que tem características
modernistas, um pátio central que aí existia passa a ser o ponto
focal do pequeno jardim.
Considerando o clima de poucas chuvas e as temperaturas
relativamente elevadas o ano todo, dá-se a esse espaço, numa
escala menor, uma solução semelhante à do jardim principa l,
sendo aí instalado um pequeno palco para a realização de eventos
artísticos. Os materiais de pavimentação de piso e mobiliário
seguem a mesma linguagem do jardim principal (Fig. 6) e no
plano de vegetação destacam-se alguns exemplares de macaubci ra
(Acrocomia intumescens), palmeira nativa do Nordeste.
Jardins de Burle Marx no Nordeste <lo Brasil 17l
Fig. 6. Vista parcial do pátio do anexo, notando-se
o emprego da mesma linguagem formal do jardim
principal. Fonte: Ricardo Bezerra.
Os planos de vegetação para o jardim principal
A descrição e a análise dos planos de vegetação das duas
versões serão feitas conjuntamente. Desta forma, poderemos
compreender como, num espaço de quase 20 anos, modificações
e adaptações foram feitas.
Vale salientar que era bastante comum o paisagista fazer
mudanças na indicação de espécies vegetais nos seus projetos
durante a execução. Essas mudanças - fossem por dificuldade de
aquisição, de adaptação ao local, ou mesmo por considerar que seria
uma melhor solução de desenho - dificilmente eram registradas,
constituindo um sério problema interposto à documentação e
172 Jardins de Burle Marx n o Nordeste do Brasil
pt ('M' rvn~ ,10 da obra de Bu rle Marx, l'O nsi<.krando, ainda, ~1uc
podiam ouHTer mudanças não autorizadas, o que soma, então,
11111 p,rat\ ex tra de difi culdade a essa tarefa (OLIVEIRA, 2008). )
No entanto, antes que sejam analisados os planos de vegetação
propostos nas duas versões do projeto do TJA, é importante
rl'fcrir-se aos velhos oitizeiros que lá estão. Quando da derrubada
do Centro de Saúde para dar lugar ao jardim principal do teatro,
1 rês oitizeiros (Licania tomentosa) foram salvos e incorporados ao
projeto paisagístico. É muito provável que essas árvores de porte
magnífico já existissem desde o tempo do Quartel da Polícia que
ali havia. Aliás, é curioso notar que o uso urbano dessa espécie, em
fortaleza, havia sido recomendado por Pereira Passos - o grande
artífice da reforma urbana do Rio de Janeiro, no início do século 20
- em matéria publicada no jornal "Ceará Ilustrado': em edição de
janeiro de 1925. Na época do primeiro projeto, essas árvores, já de
grande porte, passam a ser um importante elemento no desenho
da vegetação, servindo como fonte de generosa sombra e pano de
fundo para o jardim, por sua localização na parte posterior deste.
Fazendo uma análise comparativa da seleção vegetal para
os dois projetos (Tabelas 1 e 2), nota-se em ambos a mescla de
espécies exóticas e nativas, dispostas harmonicamente lado a
lado, seguindo uma tendência natural do seu trabalho. Ressalte
se aqui que Burle Marx foi responsável pela introdução, inclusive
no Ceará, de várias espécies vegetais exóticas e nativas brasileiras,
principalmente das famílias das bromeliáceas, musáceas,
orquidáceas, marantáceas, velosiáceas e apocináceas (MOTTA,
1983).
jardins de Burle Marx no Nordeste d o Bras il 173
Tabela l: Espedficação da vegetação por Burle Marx 11NIH'dlli:n\llll Nome rknll ltco Nt1lllC l \~lrn l u
para os Jardins do Theatro José de Alencar, 1973. 1u11· 11111 k Mur" ;1tuali:radn po1mlur
( 1lc'\11(/' '""' l'.111 h1.1"I A 1 l m11•11
Especificação Nome científico Nome Estralo ,.. }rJmli•' l .. 1111
por Burle Marx atualizado popular N r/11111/10 1111ci/i-rr1 Cacrtn. Flor Jc 1 krh;\u•o
lótus Pontederia cordata L. ~ Aguapé Herbacco
Limnocharis flava Golfo Herbáceo / lyclmclcys sp. (Bahia) .. ! lcrb:\u:o
(L.) Buchenau Mure ré ! rcrb:\u:o / icJr/WJ 11i11 ll Z /lf('<I
7halia dealbata Fraser * Mimosa Herbáceo (~w.) Kunlh
Cyperus papyrus Linn Cyperus papyrus L Papiro Herbáceo \lic/ori11 cruziona Victoria cruziana Nenufar L lcrbác.:co
Canna indica Canna indica L. Borboleta Arbustivo Orhign A.D.Orb.
L (vermelho) Xant lwsoma sp. (Goiás) .. HcrbúCCl'
Cassia fistula L. Chuva-de- Arbóreo ''(~ran1a- tostãd,**IO;- Dichondra microcalyx Grama- ! lcrbúcco
ouro (Hallier f.) Fabris tostão
Bauhinia Bauhinia x blakeana Dunn Pala-de- Arbóreo Neomarica caerulea * Íris Herbáceo
blakeana Dunn vaca (Ker GawL) Sprague.
Caesalpinia Libidibia ferrea Jucá Arbóreo Heliconia psittacorum L.f. * Pacavira Herbáceo
ferrea Mart. (Mart. ex Tui.) L.P.Queiroz Alam anda Arbustivo Allamanda cathartica L. *
Couroupita * Abricó-de- Arbóreo Herbáceo
guianensis AubL macaco Crinum asialicum L Açucena
Sterculia chicha Sterculia chicha Xi xá Arbóreo Plumbago Phtmbago Mimo-do- Herbáceo
A.St.Hil. A. St.-HiL ex Turpin capensis Thunb. auriculata Lam. céu
Plumeria alba L. " Jasmim- Arbóreo Setcreasea Tradescantia pai/ida (Rose) Manto- Herbáceo
branco purpurea Boom D.R. Hunt sagrado
Roystonea regia Palmeira- Palmeira Lantana camara Lantana camara L. Lantana- Arbustivo
(Kunth) O. F. Cook. real L. (amarela) amarela
Nymphaea ampla " Ninfeia Herbáceo Ctenanthe Ctenanthe Maranta- Herbáceo
(Salisb.) DC. kammeriana Eichl. kummeriana Eichler variegada
Ziziphus joazeiro Mart. Juazeiro Arbóreo Alpinia purpurata * Panamá Herbáceo
Moquilea tomentosa Licania tomentosa Oit izeiro Arbóreo (Vieill.) K. Schum.
Benth . (Benth.) Fritsch Bougainvillea Bougainvil/ea Buganvilia Arbustivo
Tecoma chrysotricha (Marl. Handroanthus chrysotrichus Ipê-arnarelo Arbóreo spectabilis Willd. spectabilis Will d.
ex A. D C.) (Mart. ex A. DC.) Mattos var. parviflora Mart.
facaranda " Jacarandá Vinca major L * Vinca Herbáceo
Arbóreo mimosifolia D. Don Alpinia nutans Rose. Alpinia zerumbet (Pers.) Colônia Herbáceo
Cassia grandis L.f. Cássia-rosa Arbóreo B.L. Buril & R.M. Sm.
174 jardi ns de Burle Marx n o Nordeste do Brasil Ja rdins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
175
Especificação Nome cienl ifico Nome Eslrnlo l '~ 111· 1 llu, .u;1\o IHlr Burle Nmnl' dcnllfico No1111.• 1w1111l111 1'~111110 por Burle Marx atualizado popuhu· M11r1< ulun lizndo 1hunbergia
Trepadeira \/jn11 111 J•111 /11 m 1111 K. i>,111aan;\ 1 h·1h,\1rn grandiflora Roxb. Tumbérgia \, jlll m. Wedelia paludosa Sphagneticola Agrião Herbáceo ·\11/tc/f/111/m si11d11irir111a Afdan<lra A1hu~llv11 DC. var. via/is DC. tri/obata (L.) Pruski N1·t'~
Zebrina Tradescantia Lambari Herbáceo l\ //11111r1111/rr cutlwrlica L. .. Ala ma nda A 1h11~tl v11 pendula Schnizl. zebrina Heynh. ex Bosse
l le/ico11irr psil/acorum .. 11 L• ili.iu·o Pacavira (*) Sem alteração de nomenclatura. 1.. r. (*")Sem atualização em função de indefinição da espfoe na lista original. lxora coccinet:1 L. * Lacre Arhu'>llvu ('**)Espécie originalmente listada apena s por nome popular.
limnthemum nervosum Eranthemurn Filônia A rhusl Ivo (Vahl) R. Br. pulchellum Andrews
Tabela 2: Especificação da vegetação por Burle Marx C:arissa grandif/ora DC. Carissa macrocarpa Laranjinha J\rhu~ti vo (Eckl.) A. DC.
para os Jardins do Theatro José de Alencar, 1990. Monstera deliciosa Liebm. Costela-de- l lcrb;\n ·o adão
Especificação por Burle Nome científico Nome popular Estrato * l lcrhán·o Marx atualizado Crinum asiaticum L. Açucena
Pritcha,.dia pacifica Palmeira-Wedelia paludosa D.C. Sphagneticola trilobata Agrião l lcrb;kco
Seem. & H. Wendl. Palmeira var. vialis DC. (L.) Pruski leque-de-fiji
Cassia grandis L.f. Cássia-rosa Zebrina pendula Schnizl. Tradescantia zebrina Lambari I 1 e rb;\cco
Arbóreo Heynh. ex Bosse Cassia fistula L. Chuva-de-ouro Arbóreo Neomarica caerulea (Ker 1ris Herbáceo Caesalpinia echinata Pau-brasil Arbóreo Gawl.) Sprague. Lam .
Syngonium podophyllum Syngonium Singônio Herbáceo Plumeria rubra L. Plumeria rubra L. Jasmim-branco Arbóreo Schott angustatum Schott (branca)
Scindapsus aureus Eng!. Epipremnum aureum Jiboia Herbáceo Cassia bicapsularis L. Senna bicapsidaris Sena Arbustivo (Linden & André)
(L. ) Roxb. G.S.Bunting
Clusia fluminensis Clúsia Arbustivo Bulbine frutescens (L.) Bulbine frutescens Bulbine Herbáceo Planch. & Triana Willd. (laranja e amarela) (L.) Willd.
Brassaia actinophylla F. Schefflera actinophy/la Guarda-chuva Lantana camara L. (rosa) * Camarazinho Herbáceo Muell (Endl.) Harms
Arbóreo
Schizocentron elegans Heterocentron Quaresmeira- Herbáceo Schejflera arborícola Cheflera Arbustivo Meisn. elegans (Sch ltdl.) rasteira (Hayata) Merr. Kuntze
Philodendron Philodendron Banana-de- Arbustivo Turnera ulmifolia L. Turnera subulata Sm. Chanana Herbáceo
bipinnatifidum Schott bipinnatifidum imbê Plumbago capensis Plurnbago Mimo-do-céu Arbustivo Schott ex Endl.
Thunb. auriculata Lam.
176 Ja rdi ns de Bur le Marx no No rdes te do Brasil Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 177
ENpt•dfü:u\ilo por llul'lc Nome dcntlhco No me pop11lnl' 11.NI l'U IO Morx nlu nllznd o
1\norn111i11 Mawíiba P.1 l111L·li11 l11111111c.1ffll~ 1 >rude.
/!1m111/11 l'('/ll'llS J.. D1mmta crecta L. Duranta Arbustivo
/>0 •1nki11 grr111dijáli11 [ law. Ora-pro-nobis Arbust ivo
ll .1y~t11s i11 g1111getica (L.) * Asistásia Arbust ivo 'I'. A11dcrson (amarela)
1\l/111111111ti11 vio/11ce11 Aliam anda Alamanda-roxa Arbustivo ( ;,,rdn & Ficld . blanchetii A. DC.
'/111111/Jcrgia crecta * Tumbérgia- Arbustivo ( llc11lh.) T. Anderson arbustiva
< '/11111c111orplra fragrans Chonemorpha fragrans Cipó-de-leite Arbustivo (Moon) Alston . (Moon) Alston
I >id10risa11dra Dichorisandra Dicorisandra Herbáceo 1/1yr.>ijlora J.C. Mikan. thyrsiflora J.C. Mikan
l'11d1yslachys Pachystachys Camarão- Herbáceo l111c'11 Nccs. lutea Nees amarelo
( .'111/111mnthus roseus Catharanthus Boa-noite Herbáceo (1 .. ) C. Don. (branca) roseus (L.) G. Do n
'/ Jr 1111/Je1gia grandiflora 1hunbergia Tumbérgia Trepadeira lloxb. (alba) grandiflora Roxb. b ranca
(.) s~111 alteração de nomenclatura.
('·)Sem atualização em função de indefi nição da espécie na lista original.
No que concerne à questão da origem das espécies utilizadas
nos dois projetos, nativas e exóticas se equivalem. A grande
mudança que se pode perceber entre os dois planos de vegetação
ref cre-se ao clima de origem daquelas espécies: tropical seco
e tropical úmido. Tomando como fonte de referência básica
o trabalho do Instituto Plantarum, dirigido pelo engenheiro
agrônomo Harri Lorenzi (1992; 1995; 2003; 2004), nota-se que,
enquanto no primeiro projeto essas categorias se equivalem,
110 segundo projeto - não mais existindo a fonte -, há um forte
178 Jardi ns de Burle Marx no No rdeste do Brasil
11H·dt 1111111io d.is t'Spl•des de cli11w tropical sem. Nl·ssa sl'gund;1
., 1 • 1l·~•IO, das passam a representar cerca de Lrês quartos das espécies
11 11li ~. ;ul.1s 'pcrccbe-sc, nesse caso, uma preocupação na definição
do pl:ino d~ vegetação, com a escolha de espécies mais resistentes
,10
dima local: daí a mudança, que se retlele diretamente no nível
1k manutenção requerido. No projeto de 1990, o grande ponto focal do jardim é uma aleia
de palmeiras-leque-de-fiji (Pritchardia pacifica) que domina toda
;1 parle frontal do espaço, sendo esta, inclusive, bem visualizada a
partir da rua (Fig. 7). No plano de 1973, foram especificadas para
0 local palmeiras-reais (Roystonea regia). Em relação ao desenho
dos canteiros do jardim, nessa versão de 1990, a subdivisão rígida
do desenho de 1973 dá lugar a uma apresentação mais solta das
espécies, com um uso reduzido de delimitadores separando os
Fig. 7. Aleia de palmeiras-leque-de-fiji (Pritchardia pacifica). Fonte:
Ricardo Bezerra.
Jar dins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 179
agrupamen tos de arbustos, J1crbáccas e forraçocs. l·, importantt•
notar, ainda, que três exemplares de jucá (Libidibia ferrca), qw: haviam se desenvolvido a contento no projeto de 1973, foram
mantidos, bem como os velhos oitizeiros que já estavam lá .
O estado do jardim atual merece, aqui, uma ressalva. Algumas
plantas foram introduzidas, alterando a proposta de Roberto
Burle Marx ao longo destes anos, como identificado no inventário
florístico efetuado em 2006. Algumas podem, de certo modo, ser
consideradas como contribuições positivas: a grande touceira
de pândano-amarelo (Pandanus sp.) (Fig. 8), o denso arbusto de
Fig. 8. O grande pândano-amarclo (Pandanus sp.) visto a partir da
calçada da Praça José de Alencar. Fonte: fernanda Rocha.
180 fardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
11 111.1 plt•omclc ({)r11c<1t'1tr1 n'.fll'Xrl) e lr~s 1.•x1.·111pla1cs dl· pa l1 1w11,1
11 i.111gular (Dypsis decary i). J\pcsar de esforços cmprct·11didos,
1.011sit1crnndo a discordância entre as informações obtidas, 11 :10 foi
possí~c l uma definição precisa dessa espécie do gênero P(J11cf,11111s.
Deste modo, julga-se que a estrutura geral do jardim cst:l
manlida, carecendo hoje de uma recuperação para a qual sejam
avaliadas as condições de permanência ou supressão de plantas
introduzidas, o controle de crescimento e a reposição das espécies
significativas existentes na proposta original de 1990, considerando
as preexistências da proposta de 1973. Um dos elementos mais
marcantes do projeto merece destaque: a cascata de tumbérgia. Já no projeto de 1973, foi indicada a implantação de uma trepadeira
(1hunbergia grandiflora) na parede de fundo do jardim principal,
com a :finalidade de camuflar a edificação vizinha que se ergue
colada ao limite do terreno. Essa trepadeira foi implantada de um
em um metro, de forma a subir num alambrado afastado cerca de
dez centímetros do muro, criando, assim, uma cortina verde de
ponta a ponta do plano de fundo do jardim principal (Fig. 9).
Quando da implantação do projeto de 1990, no entanto, o
prédio vizinho teve mais dois pavimentos adicionados, elevando
se 0 muro a uma altura acima de 10 metros. Na época, apesar de não
constar no plano de vegetação de 1990, sugeriu-se complementar
0 alambrado até o topo do muro. Burle Marx, conforme lembra
0 arquiteto Haruyoshi Ono, ficou em dúvida sobre se a planta
conseguiria subir tão alto. Na verdade, ela não só conseguiu, como
é hoje um dos pontos de destaque do jardim.
Jardins de Bu rle Ma rx no Nordeste do Brasil 181
1 1:
!
1 1
1
Fig. 9. A chamada "cascata" de tumbérgia. Fonte:
Ricardo Bezerra.
Considerações finais
Hoje, muitos são os caminhos a trilhar . . ~ na importante
~issao ~e preservar a obra ele Roberto Burle Marx, que alcançou
d1~ensao planetária e é citado, mundo afora, como um dos
art_1stas mais influentes do século 20. Sua obra, em nível nacional
e mternacional, é de grande vulto, incluindo seus trabalhos
produzidos no Nordeste brasileiro. Mesmo considerando as
182 Jardins de Burle i\l arx no Nordeste do Brasil
111.1H 11 11 tes desigualdades rq~ion.lis no Hrn~ il . s~·ui; p111J1·10•, ,d
1 l'ô\ li:tados são Lao irnportanlcs quan to os dcnwis. \ t·:stc estudo, de ccrlo modo, busca resga tar um 111011w11l11 1 ph·dido na rnemória da cidade, o do primeiro jardim do ' ll11:11 l111
José de Alencar, de l973. Esse projeto, que se saiba, jamnls ht1vl11
rnnslado das inúmeras publicações acerca da obra do paisagisl.t l'
hoje já quase se perde na oralidade dos que presenciaram aqut·lt·
magnífico jardim. Por outro lado, este estudo busca també111
faze r uma análise do projeto remanescente de 1990, o qual pndl'
vir a servir de base para um necessário trabalho de restaurn~·t1 0 1
considerando sua inserção num espaço tão afetivamente caro 1\
população cearense. Neste sentido, são fundamentais o registro, a comprccns;w
e, por fim, a preservação desse patrimônio cultural, artíslico,
histórico e ambiental que o Nordeste possui através dos jardins <.k
Burle Marx, para seu usufruto pela geração atual e pelas gcraçfws
vindouras, pois ele retrata a obra de um artista fundamental nn
invenção do Brasil moderno.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 1 u:1
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184 Ja rdins ele Burle Marx no Nordeste do Brasil
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THEATRO JOSÉ DE ALENCAR. Theatro José de Alencar: o teatro e a cidade. Fortaleza: Terra da Luz Editorial, 2002.
Agradecimentos
Arquiteta Ana Rita Sá Carneiro, engenheiro Argos Mesquita,
arquiteto Francisco de Sales Veloso, arquiteto Haruyoshi Ono,
diretora do Theatro José de Alencar Izabel Gurgel, arquiteto José
Tabacow, professor Liberal de Castro, arquiteto Ricardo Rodrigues,
alunos da disciplina de Paisagismo da UNIFOR (turmas 2006.1 e
2006.2), que iniciaram o inventário desses jardins.
jard ins de Burle Marx no Nordest e do Bras il 105
UU llLE MARX EM TERESINA: J\ PRAÇA MONUMENTO DA COSTA E SJLVA
\ Wil z~\ Gomes Re is Lopes
Karcnina Cardoso Matos
josé llamilton Lopes Leal Júnior
Roseli Farias Melo de Barros
Introdução
A preservação do patrimônio histórico e cultural é de
importância fundamental para a sociedade, a fim de que se possa
legar às gerações futuras o conhecimento de aspectos relacionados
à sua ident idade e seus significados. Além dos elementos
construídos, os jardins também fazem parte do patrimônio
cultural das cidades, podendo ser reconhecidos como jardins
históricos.
Na Carta de Florença, jardim histórico é definido como "uma
composição arquitetônica e vegetal que, do ponto de vista da
história ou da arte, apresenta um interesse público. Como tal é
considerado monumento'' (CURY, 2000, p. 253). Na visão de Sá
Carneiro (2009a, p. 212), "jardins históricos são gestos humanos
marcantes de um tempo sobre a paisagem cultural':
Um dos grandes nomes na arte de projetar jardins é Roberto
Burle Marx, um dos mais reconhecidos paisagistas no cenário
nacional e internacional. Na visão de Dourado (2009, p. 25),
"nenhum outro paisagista do século XX teve seu trabalho tão
Jardins de Burle Ma rx no Nordeste do Brasil 187
associado à llorn hr;1sikira': devendo ser lembrado por Sll lt
"obsti nação pelo conhecimento, valorização e defesa das p lantas
au tóctones''. O paisagista associou seus conhecimentos de artes
plásticas aos da vegetação tropical. O entendimento da diversidade
das espécies tropicais só foi possível mediante pesquisas realizadas
cm expedições à Amazônia e a outros ecossistemas. Segundo
Oliveira (2009, p. 197), Burle Marx tinha "amplo conhecimento das
correntes artísticas e paisagísticas internacionais, bem como um
vasto repertório relativo aos costumes, tradições e apropriações locais da flora".
Roberto Burle Marx desenvolveu projetos em vários países
e em diversas cidades brasileiras, nos quais sempre estava
presente sua preocupação com a harmonia, prazer estético e
integração ecossistêmica da paisagem. Uma das características
mais marcantes em seus projetos era o uso extensivo da vegetação
brasileira, enfocando também o conhecimen to das espécies
nativas da região em que seria inserido cada jardim.
Os jardins projetados por Burle Marx em cidades do Nordeste
do Brasil foram criados tendo por base os elementos da paisagem
cultural de cada cidade. Dessa forma, segundo Sá Carneiro
(2009b, p. 55), "as características da paisagem dos jardins
expressavam o tipo de vegetação local, da planta como elemento
da concepção, de modo que as pessoas, os habitantes urbanos
enfim, se identificassem com a paisagem e vice-versa, ou seja, o
jardim desempenhasse uma função memorial''.
Na cidade de Teresina, são encontrados três espaços projetados
por Roberto Burle Marx: os jardins do Palácio de Karnak, sede do
Governo do Estado do Piauí (de caráter semi-público), a Praça
188 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Bras il
Mo1n1rncn lo Da Cosln l.' Si lv01, l ' os j;1rdi11s do l~ío l'oly l loll'I, que
se.· lrnta de um exemplo de cspa\:O privado.
O ~rquiteto Hamyoshi Ono participou dos três projetos
realizados em Teresina, sendo, atualmente, o responsável pelo
Escritório Burle Marx & Cia. Ltda. O projeto dos jardins do Palácio
de Karnak, datado de 1972, e o da Praça Monumento Da Costa
e Silva, iniciado em 1975 e concluído em 1976, tiveram ainda a
participação do arquiteto José Tabacow, enquanto o projeto dos
jardins do Rio Poty Hotel, de 1986, teve Hugo Biagi Filho como
paisagista colaborador. No projeto da praça, a concepção do
monumento ao poeta Antonio Francisco da Costa e Silva ficou
sob a responsabilidade do arquiteto Acácio Gil Borsoi.
Este trabalho aborda a Praça Monumento Da Costa e Silva
por se tratar do único espaço público projetado por Burle Marx
em Teresina e pela importância que as praças representam como
locais de integração e lazer da comunidade. Segundo Gehl e
Gemz0e (2002), o espaço público, mesmo com mudanças durante
a história, era o lugar onde as pessoas se reuniam, circulavam e
comercializavam, lugar de encontro dentro da cidade.
A Cidade de Teresina
Teresina foi criada em 1852, planejada para ser a capital do
Piauí em substituição à cidade de Oeiras. Hoje, o Piauí é o terceiro
maior estado em extensão da região N ardeste, com área de 251.529
km 2 e cujo processo de ocupação se caracterizou pela introdução
da pecuária extensiva no século 17.
Diferente de outros estados do Nordeste, sua ocupação se deu
do interior para o litoral. É a única capital nordestina localizada
Jardins d e Burle Marx no Nordeste do Brasi l 189
1; 1
1 i
no interior, não dispondo, dessa fo rma, do csp;1ço dcmocri.\lko
de lazer representado pelas áreas litorâneas e demandando mais
espaços livres de edificação onde possam ser realizadas atividades
recreativas. Embora situada longe do litoral, Teresina é banhada
pelos rios Parnaíba e Poti.
A cidade apresentou rápido crescimento desde os seus tempos
primordiais, pois, após dois anos de fundação, Já contava com 8.000
habitantes (LIMA, 2002). Segundo Cardoso (2006), até a década
de 1940, era conhecida como "entre rios': pois seu perímetro
urbano era praticamente limitado pelos rios Parnaíba e Poti.
Somente a partir da segunda metade do século 20, decorrente de
um processo migratório, a configuração da paisagem de Teresina
se torna mais dinâmica.
Neres e Araújo (2010) afirmam que o Estado foi o principal
agente do processo de urbanização da capital, investindo em
políticas públicas de saúde, educação, energia elétrica, habitação
popular, criação da malha viária, melhorando a estética pública
e a infraestrutura e resultando no crescimento populacional,
sobretudo no contingente de imigrantes.
A década de 1970 foi uma época de desenvolvimento para o
Piauí, que contou com o investimento maciço de recursos federais,
o que possibilitou ao governo estadual a execução e inauguração
de várias obras em Teresina. De acordo com Ferraz ( 1992 ), isso foi
determinante para que o então governador Alberto Tavares Silva
(1971-1975) se tornasse um mito no estado, como o homem das
obras grandiosas. Entre suas realizações no primeiro mandato,
Santos e Kruel (2009) citam a implantação da Universidade Federal
do Piauí, a construção do estádio Albertão e da Maternidade Dona
Evangelina Rosa, a reforma e ampliação do Teatro 4 de Setembro
190 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
,. a rclornrn do J>;1ltki11 de Karnak e dl' Sl'llS j1mli11:-. , projl' l,1do:-. po1
l\urk Marx. Santos e Krucl (2009, p. 400) alirm t11n ainda q11 t• '\• 11 1
1 · ' d 'Mllagre Brasileiro' ( ) Alberto Silva rccstrulttro11 p c n <~ cpoca o . < ...
l. · 0 a adm·1111·stração pública estadual , mudando a cara do ct 1nam1z llc ' ·
Piauí, dentro e fora do Estado". Logo após a gestão de Alberto Silva, o governo piauicnsc foi
·d Di'rceu Mendes Arcoverde (1975-1978), lembrado, assumi o por ainda hoje, pela grande quantidade de obras que realizou
no estado. Segundo Santos e Kruel (2009), foi uma época de
grandes construções no Piauí, beneficiado com o bom momento
• · d Pai's destacando-se o Centro Administrativo, o econom1co o ' Centro de Convenções, o Ginásio de Esportes Dirceu Arcovenk
(o "Verdão"), o Parque de Exposições Agropecuárias e o Hospital
da Polícia Militar. Foi neste período, em pleno "milagre econômico
brasileiro" e ainda na ditadura militar, que foi criada a Praça
Monumento Da Costa e Silva.
A Praça Monumento Da Costa e Silva
O projeto para a Praça Monumento Da Costa e Silva, datado de
1976, surgiu no período em que existia um esforço govername~1tal
f ' sociedade teresinense equipamentos constrmdos puao ere~ra .
1 'mboli'smos capazes de mexer com a autoestima envo tos por s1 , da população. Por isso, grandes avenidas foram abertas, foram
construídos o suntuoso estádio de futebol e o grande Parque
zoobotânico, além de reformas de praças.
Naquele período, a Prefeitura Municipal estava sob o
comando de Wall Ferraz (1975-1979), que ficou conhecido pela
jardins de Burle M arx no Nordeste do Brasil 191
preocupação com a população de menor renda e também pl'l l\
implantação de áreas verdes e parques públicos como opção de
lazer.
O governador do Piauí, Dirceu Arcoverde, convidou o
arquiteto Acácio Gil Borsoi e o paisagista Roberto Burle Marx para
criarem uma praça-monumento, com a intenção de homenagear
um dos mais famosos poetas do estado, autor da letra do Hino do
Piauí, Antonio Francisco da Costa e Silva. Este ilustre piauiense
foi "um dos poetas que ressaltaram o Rio Parnaíba( .. . ) conhecido
corno Da Costa e Silva, ou poeta da Saudade, nasceu em 1885,
na cidade de Amarante-PI, também banhada pelo Parnaíba"
(MATOS et al, 2007, p. 9).
O arquiteto e o paisagista eram profissionais reconhecidos,
tendo desenvolvido vários trabalhos juntos, além de serem muito
amigos. Em entrevista à revista "Projeto Design': afirma Borsoi:
"Janete e eu tínhamos um carinho muito especial por Roberto
Burle Marx e sentimos muita falta dele" (MOURA, 2001, p.
3). Borsoi deixou obras relevantes na capital, como o Fórum
Judiciário de Teresina (1972), a reforma do Palácio de Karnak
(1972) e, posteriormente, o projeto da Assembleia Legislativa
(1982). A construtora responsável pela obra foi a do engenheiro
Lourival Parente, também amigo de Roberto Burle Marx.
A ideia era criar um espaço de lazer que transmitisse o
desenvolvimento e o processo de modernização pelo qual passava
a cidade de Teresina, no momento em que o país também crescia
economicamente com o chamado "milagre econômico brasileiro':
O objetivo era criar um lugar-monumento para homenagear o
poeta que sempre ressaltava o Rio Parnaíba em suas obras. Como
afirmaram Matos et al (2007, p. 7):
192 Jardins de Hurle Marx no Nordeste do Brasil
A~~illl, l i.IS\ li1 11 ,10 ·' ll\' 11 ,1, Ili.li' 11 111,1 111 •l\ll. ll hl~ 1111111
Pr:1<;n Mo lllllll l' lll O u mHl co11vl11 h11 o 1111 11 111•1 1! 11,
nao uma simples ;\rea dt.• b ·1.1.·r, 1 1w ~ 1111111 f\llllldl11~11
referência cul Lural da Lidadc, uma ho11w11,1w·111 1\~
águas, representada pelas fontes. pelos 1.·~pl'll10:. d',\111111 ,
pela cascata, pelas plantas <iqualicas e, solm·tudo 111 111
testemunho elas placas ele aço escovado, que cspelli,w11 111
a beleza, a leveza e a ternura dos poemas do pcwt,1 11 1<11111
das águas cio Parnaíba, o poeta Da Costa e Silva.
O projeto da praça
Para implantação da praça foi escolhido um terreno dl·
forma trapezoidal ao longo da Avenida Maranhão, em frcnt L' ~
Companhia Energética do Piauí (CEPISA), localizado e11 1 ll'
a Avenida José dos Santos e Silva, Rua João Cabral e Rua Sanl.1
Luzia, bairro Centro, às margens do Rio Parnaíba. Trata-se de L1 111
terreno com desnível, onde a parte mais alta corresponde à pari<•
mais larga, na lateral sul, que foi aproveitada para implantação do
monumento com a cascata.
Antes da construção da praça, segundo antigos moradores dn
bairro, existia no local uma grande lagoa, circundada por mult.1
vegetação espontânea, tendo sido necessária a execução de aterro
para dar início às obras, cujo material empregado foi regislrndo
em jornal da cidade.
A Praça Monumento Da Costa e Silva foi constrn fd,1 c•111
uma área de 20 mil metros quadrados e obrigou, dun11111•
a sua construção, um movimento de terra em torno de•
22.000 metros cúbicos, tendo sido empregados HOO
m3 de concreto, 70 toneladas de aço, cinco mil nwllm
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasi l
quadrados de pedra de J>irat uruc1, ah1 ig.111do t•111 Sl'll
espaço um grande lago de 2.000 111 2 (JORNJ\ L O DI J\, J.7
de agosto de 1977, p. 3).
A criação do espaço público na área, então, foi motivo de
júbilo e de aceitação por parte da população do entorno. No local,
existiam ainda algumas habitações populares e outra construção
na parte sul, que foram retiradas (Fig. 1). Não havia vegetação
expressiva no local, mas existiam indivíduos de mamoneira
ou carrapateira (Ricinus com munis) e carnaúba ( Copernicia
prunifera), que foi especificada posteriormente no projeto.
Inicialmente, o bairro Centro era, em sua maior parte,
residencial. O entorno do terreno era constituído basicamente
Fig. 1. Terreno onde foi construída a Praça Monumento Da Costa e
Silva, vendo-se, à esquerda, o Rio Parnaíba, 1975. Fonte: Escritório
Burle Marx & Cia. Ltda.
194· Jardins de Bu rle Marx no Nordeste do Brasil
por· 1·t•s id(l11cias, destacando se, ai11da, IH\ lah:rnl sul. o l·dll (1 111
d11 Cl ~ PISA, aluai Elctrobrós, e, no lado oeste, o Rio Pa111 ,dli11,
elf nwnto bastante presente na paisagem.
· No crogui inicia] do espaço, realizado pelo pai:-;•1glsl l ,
observa-se a definição de piso e da vegetação, destacando Sl' o
grande círculo à esquerda, que possui uma versão moderna do
coreto tradicional, também circular, circundado por bancos, l' o
grande espelho d'água no centro da praça (Fig. 2).
Voltado para o Rio Parnaíba, o espaço foi projetado rn11 1
extensas áreas de saibro, revestidas de grama ou pedra, propkins
para circulação, brincadeiras das crianças e passeios de biciclelo.
Os bancos foram agrupados em quatro locais da praça, t rês c.leks
localizados na calçada voltada para o rio e sombreados por grupos
de árvores, com a intenção de valorizar a visão para o Parnafb,1
(Fig. 3).
Fig. 2. Croq ui do projeto da Praça Monumento Da Costa e Silva, 1975.
Fonte: Escritório Burle Marx & Cia. Lida.
Ja rd ins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 1')5
' 1
'i
\ \
e::===:=====================-==================:::=.: Av. Maranhão
N (/) Legenda:
01 Monumento 02 Espelho d'água 03 Coreto 04 Bancos
Fig. 3. Projeto da Praça Monumento Da Costa e Silva, 1976, digitalizado
a partir do original pertencente ao Escritório Burle Marx & Cia. Ltda. Fonte: Os autores.
Percebe-se, desta forma, a intenção de possibilitar a interação
e integração entre a praça e o rio. Nos dias atuais, já não existe
integração, nem mesmo a valorização visual do Rio Parnaíba, pois
o gradil presente no local e a Ponte José Sarney, construída em
2002, podem ser considerados barreiras visuais.
Segundo Silva (2005, p. 182), em seus projetos no Recife,
Burle Marx buscava "criar em cada jardim um motivo diferente
relacionado à paisagem': seguindo três princípios básicos, que são:
a relação com o entorno, a hierarquia de caminhos e a presença de pontos focais.
196 Jard ins de Burle Marx nu Nordeste du Brasil
NL·sse projeto, pode ser visua l izad.1 a prl'st•n1;a dl'Slt'S prl 11L lplos,
11,1 impl;rnlaçao da cascata , que desce sobre o mollllllll'l1l11 l'
uTsce 110 horizonte, numa referência clara ao "Velho Mo11gL'0
,
denominação que os piauienses dão ao Rio Parnaíba; a hicrnrqui.1
se faz presente, pois os caminhos são mais largos quanto maii.
próximos do coreto e do lago artificial, elementos que podem st·1
considerados como pontos focais do espaço, situados cm lados
opostos, não existindo, portanto, a intenção de concentrar os
usuários em apenas um local.
Do lado direito da praça, foi idealizado o memorial cm
Pelo arquiteto Acácio G i 1 homenagem ao poeta, projetado
Borsoi. Era composto de uma marquise de concreto aparente, cm
balanço, por onde corria a água que alimentava o espelho d'água,
formado por linhas retas e irregulares (Fig. 4), conforme croqu i
do arquiteto, datado de junho de 1975.
Fig. 4. Vista da marquise e dos painéis, 1978. Fonle: Funda\t1o
Monsenhor Chaves.
jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 197
' 11
'i
1
1
Abaixo da marqulse foi colocada uma placa de concrclo, no
piso, contendo resumo da biografia de Da Costa e Silva, e foram
dispostos painéis de acrílico nas paredes, com trechos de suas
poesias. A intenção do arquiteto Borsoi era que no monumento,
embaixo da marquise, fosse guardada a urna com os restos mortais
do poeta. i
Nos painéis estavam gravados trechos de poemas de Da Costa
e Silva, como "Madrigal de um louco", "Saudade'', "A queimada':
"'Ae h t"''Ad bd""'A nc en e , erru a a, moendà', ''Amarante'', "A cantigà',
''A balsa'', "O aboio", "Elêusis" e "Sob outros céus" (JORNAL O
ESTADO, 6 de setembro de 1977).
O espelho d'água foi projetado com linhas retas e irregulares,
contendo vários jatos d'água e canteiros com espécies aquáticas.
Por meio de passeios se caminhava sobre ele, onde também
estavam inseridas estruturas de ferro como apoio às trepadeiras.
Em 5 de setembro de 1977, com muita festa, foi realizada a
inauguração da praça, digna de um "monumento': que ocorreu
aliada às festividades em comemoração à Semana da Pátria na
cidade. Na ocasião, 21 escolas, tanto públicas como particulares,
desfilaram, trazendo, cada uma delas, um tema sobre a obra
do poeta Da Costa e Silva. Cerca de dez mil pessoas estiveram
presentes no local, incluindo políticos e empresários (JORNAL O
DIA, 6 de setembro de 1977).
Após a inauguração, o espaço já era aproveitado por muitas
pessoas de diferentes segmentos sociais, que se divertiam com as
atividades que lá aconteciam, apresentando grande movimentação.
1 Informação dada por Acácio Gil Borsoi em entrevista concedida a Wilza Gomes Reis Lopes, cm outubro de 2007, em Olinda-PE.
198 Ja rd ins de Burl e Marx n o Nordeste do Brasil
1.-•'"'"\ \
1 ,.111••1"'"' \ 1111' 11111
1 "'
/\os súbados c domingos, o lurn l h l.IV\\ 1Tpkto tk ll s11:11111s. /\ IL'• 111
tl 1sso, rn.:orri;1 111 programa~ocs cspcd;1is para o " l >i.1 d;1s ( ' 1 i.111' ,,., .. ,
(~" ! )ia dos Namorados': o "Dia <la Cultura" e outros, prnn10v1d.1
1'1clo poder público. Segundo moradores mais antigos, lt\ ltavl.1
uma felrinha que atendia aos banhistas <la coroa <lo Rio 1'~111\illllll, com venda de comida e pequenos objelos, constílu indo 11111
atrativo durante os fi nais de semana. Em foto de 1978, é possível observar o uso da praça pt·l.1
população, logo após a inauguração (Fig. 5). No primeiro plo 110,
visualizam-se a formação das palmeiras e o coreto e, ao fund o, as
fontes em funcionamento.
Fig. 5. Vista geral ela Praça Monumento Da Costa e Silva, pouco ll' l11JH•
após a inauguração, 1978. Fonte: Fundação Monsenhor Chaves.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil I C)C)
' ' 1
A vegetação da praça
Ao analisar a composição florística da Praça Monumcnlo
Da Costa e Silva (Tabela 1) foi possível perceber a diversidade de
espécies e de estratos empregados por Burle Marx, o que refletiu
no ritmo, na textura e nos volumes das massas vegetais.
Os agrupamentos de indivíduos de mesma espécie, uma
constante nos projetos de Burle Marx, apresentam-se na Praça
Monumento Da Costa e Silva, criando ambientes harmônicos e
valorizando cada espécie por possibilitar a percepção de todos os detalhes estruturais e/ou morfológicos.
Tabela I: Especificação da vegetação por Burle Marx
para a Praça Monumento Da Costa e Silva, 1976.
Especificação por Burle Marx
Mauritia flexuosa, L
Copernica cerifera, Mart
Orbignya martiana, Barb. Rodr
Cenostigma gardnerianum, Tul
Platonia insignis, Mart
Tecoma chrysotricha, Mart
Moquilea tomentosa, Benth
Tecoma heptaphylla, Mart
Couroupita guianensis, Aubl
200
Nome científico atualizado
Mauritia flexuosa L. f.
Copernicia prunifera (MiU.) H. E. Moore
Attalea speciosa Mart. ex Spreng.
Cenostigma gardnerianum Tui.
Platonia insignis Mart.
ffandroanthus chrysotrichus (Mart. ex A. DC.) Mattos
Licania tomentosa (Benth.) Fritsch
Handroanthus heptaphyllus (Vell.) Mattos
Couroupita guianensis Aubl.
Nome popular
Estrato
Buriti Palmeira
Carnaúba Palmeir a
Babaçu Palmeira
Caneleiro Arbóreo
Bacuri Arbóreo
!pê-amarelo Arbóreo
Oiti Arbóreo
[pê-roxo Arbóreo
Abricó-de- Arbóreo macaco
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
F~1•cdliu11r:10 i•rn· lh1rlc Murx
Nome clcntlfü.o alunli:r.a<.lo
( '1u:mlp111i11 ji·rrc11, Marl. C11csolpinio fcrre11 v;1r.
Nome po1111lur
1';111 ferro · J 1 J ceare11sis J Jubcr v;1 r!n·arc11~s1.'.'..s.'...'..'.t'...'..1 1::_· ___ _::.::.:.:__:_ _____ ~----:~~-
1:i ythriua glauw, Willd. Erythrinagla11ca Willd. Mulungu
Caesaiphtia Caesalpinia Sibipiruna ArhÓl<'O
_1~1c~i~lo~p~li~o~ro:id~e~s~, B~e~1~1l~h'__ __ p~e~l~to~p~h~or~o_id_es-:--B_e_n_1h_. __ -:::-~--;---~~-~ Baullt.nia x blakeana Pata-de-vaca Arb61<'0 Bouhinia
blakeana, Dunn. Dunn ~~~~~'.'..'.'._'.:._ ____ =-:::::..::_:_/ ___ t ____ -:G:-r-a-n-1a:--_---~fl;::c::;:rlxkco
Paspalum Paspa um nota um notai um, }'luegge Alain ex Flüggé batatais
Allamanda cathartica, L A/Jamanda cathartica L.
Brunfelsia uniflora, Benth
P/umbago capensis, Thumb.
Lagerstromenia indica, L.
f\'ynphaea ampla, DC.
Nynphaea capensis, Thumb.
Nynphaea caerulea, Auct.
Nynphaea ampla, DC Var.rósea
Victoria regia, Lindl
Hydrocleys sp
Nelumbo nucifera, Gaertn
Limnocharis flava , Buch
Eichhornia crassipes, SolJns
Vinca rosea, L.
Brunfelsia uniflora (Pohl) D. Don
Plumbago capensis Thunb.
Lagerstroemia indica L.
Nymphaea ampla (Salisb.) DC.
Nymphaea capensis Thunb.
Nymphaea caerulea Savigny
Nymphaea ampla (Salisb.) DC.
Victoria amazoriica (Poepp.) T.C. Sowerby
*
NeJumbo nucifera Gaertn.
Limnochads flava (L.) Buchenau
Eichhornia crassipes (Mart.) Solms
Catharanthus roseus (L.) G. Don
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Alamanda
Manacá-decheiro
Bcla-cmília
Extremosa
Ninfeia
Arbustivo
Arbu~tivo
Arbustivo
Arbóreo
Herbáceo
Ninfeia Herbáceo
Ninfeia Herbnceo
Lírio d'água Herbáceo
Vitória-régia Herbáceo
Herbáceo
Flor-de-lótus Herbáceo
Mureré Herbáceo
Aguapé Herbáceo
Boa-noite Arbuslivo
201
hpcdfü íl\ <ICl Nome lknlifü.o Nome !\Ntrnlo por llu rlc Marx ;11 ua lizad o populnr I ft·linmio l le/ico11ia Cactczi nho J\ rhu, I i vo ps1l l11coru 111 , L. psiltawrum L. f. Weclrlia p11/11dosa, Sphagne/ icola Mal-me-quer l lcrbkco DC var. vialis DC trilobata (L.) Pruski
Vi11rn major, Vinca major L. Boa-noite 1 Icrb:ícco 1 •. var.alba hor t.
1\ na/Jidaea Arrabidnea mag11i.fica 111agníjica, Spragu (W Bull) Sprague
ex Steenis
Sariteia Trepadeira
'J lrumbergia 1hunbergia Azulzinha Trepadeira gm1uliflora, Roxb grandiflora Roxb.
Congea tomentosa, Rxb Congea Congeia Trepadeira tomentosa Roxb.
A carnaúba tem presença destacada no projeto, tendo sido
colocada em um renque que envolve parte do espelho d'água e
do coreto e, também, em adensamento no lado direito da praça.
Convém lembrar que a carnaúba é a árvore símbolo dos estados
do Piauí e do Ceará, sendo muito presente na paisagem piauiense;
inclusive, como citado anteriormente, foi encontrada no terreno antes da construção da praça.
A árvore Couroupita guianensis, conhecida como abricó
de- macaco, foi especificada por Roberto Burle Marx, não só na
praça, mas também em seus outros dois projetos na cidade. No
lado direito da praça, indivíduos desta espécie foram reunidos formando um pequeno bosque.
Em levantamento realizado no primeiro semestre de 2010
na Praça Monumento Da Costa e Silva, foram encontradas 17
espécies, distribuídas em 10 famílias, que não foram especificadas
110 projeto de Roberto Burle Marx (Tabela 2).
202 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Tnbcla 2: Vcgclaçao acrcs«.:cnlada ;\ Praça
Monumento Da Cosia e Silva.
Nome clcntífko
1blro11i11111 f ra.>..i11ifoli11m Schott ex Spreng.
C:ryplostegia grandiflora R. Br.
/foyslcmea o/eracea (Jacq.) O.F. Cook
C:rescentia cujete L.
jacaranda sp
Tecoma stans (L.) )uss. ex Kunlh
Pseudobombax sp
Pachira aquatica Aubl.
Capparis flexuosa (L.) L.
Cassia sp
Delonix regia (Bojer ex Hook.) Raf.
Hymenaea courbaril L.
Anadenanthera sp
Enterolobium contorlisiliquum (Vell.) Morong
Pithecellobium diversifolium Benth.
Bougainvillea spectabilis Willd.
Bambusa sp
Nome popular
Gonçalo-alves
Alam anda-roxa
Palmeira-imperial
Cuiuba
Caroba
!pezinho
Paincira
Mamorana
Feijão-bravo
Cássia
Flamboyant
Jatobá
Angico-branco
Orelha-de-negro
Mata-fome
Buganvile
Bambu
Fonte: Profa. Dra. Roseli Farias Melo de Barros e MSc. Fábio José Vieira. 2010.
Estrato
Arbóreo
Arbusti vo
Palmeira
Arbóreo
Arbóreo
Arbustivo
Arbóreo
Arbóreo
Arbustivo
Arbóreo
Arbóreo
Arbóreo
Arbóreo
Arbóreo
Arbóreo
Arbustivo
Atualmente, na praça, há apenas seis espécies das 34
especificadas no projeto original, que são: o ipê-amarelo
(Tabebuia chrysotricha), o oiti (Licania tomentosa), o ipê-roxo
(Handroanthus heptaphyllus), o abricó-de-macaco, a carnaúba e a
alamanda (Allamanda cathartica).
Como observado, não resta nenhuma das espécies herbáceas,
seja aquática ou terrestre, nem trepadeiras indicadas. Pelo porte
desenvolvido de algumas árvores e pela forma como estão
jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 203
plantadas, seguindo o desenho proposto, supôc se que te11ha111 sido colocadas desde a · 1 t - d · É imp an açao o projeto. -:. o caso, por
exemplo, de indivíduos da espécie angico-branco (Anadenanthem
sp ), que foram encontrados no local onde deveria existir a pata
de-vaca (Bauhinia x blakeana).
Algumas espécies podem ter sido introduzidas a partir do
gosto pessoal dos responsáveis pelo local ou nascidas por meio
de outros vetores naturais, como pássaros ou morcegos, mas não
estão integradas ao projeto da praça, como é o caso da palmeira
imperi~l (R?stonea oleracea) e do exemplar de flamboyant (Delomx regia) (Fig. 6).
Fi~. 6. Flamboyant (Delonix regia) e, ao fundo, o coreto, 20 LO. Fonte:
Wdza Gomes Reis Lopes.
204 Jard ins de Burle Ma rx no Nordeste do Bras il
/\ sllua\·ão atual da pl'.t\'•'
~) entorno da prt1\íl, í11il i.d111l'llll' composto de rcsid0m i,1s,
tornou se basicamcnlc comercial, com predomínio de lojas dl'
venda a atacado, que não envolvem grande movimcnla<i-ao dl'
pessoas. Além disso, a sociedade se modificou e pcrc.ku se o
costume da vivência nas calçadas. Dessa forma, as ruas próximas
passam a maior parte do tempo vazias, tornando o lugar insegu rn.
Em 1993, devido ao aniversário de 141 anos da cldadc de.•
Teresina, a praça passou por uma reforma realizada pela Prefci lura.
Nesse período, o espaço foi cercado com gradil de ferro, visando
aumentar a segurança, foi ampliado o número de bancos e foram
recolocadas as poesias no monumento ao poeta. Um jornal da
cidade disse: "Wall Ferraz lembrou que a Praça Da Costa e Silva
estava depredada e que a Prefeitura reconstruiu o logradouro parn
resgatar a história e a memória do poetà' (JORNAL DA MANl li\,
18 de agosto de 1993, p. 8). As placas de acrílico em que estavam
trechos dos poemas foram substituídas por outras de aço escovado,
que também terminaram por ser roubadas, restando hoje apenas
a placa de concreto com resumo da biografia do poeta (Fig. 7).
O traçado original do projeto foi pouco modificado,
permanecendo quase inalterado. Foram acrescidos caminhos com
piso de concreto, seguindo as linhas de desejo existentes. Ainda
foram inseridos alguns bancos, do mesmo padrão dos já existentes,
mas em outros locais, acompanhando a circulação, e foi colocado
um busto do poeta homenageado. O espelho d'água encontra se
desativado e o local do monumento está completamente pichado.
Quem conheceu o espelho d'água e as fontes em pleno
funcionamento sempre destaca a beleza destes equipamcnlos
fardlns de Burle Marx no Nordeste do Brasil 205
Fig. 7. Foto do memorial em 2011, visualizando-se a placa de concreto no piso. Fonte: Wilza Gomes Reis Lopes.
e da praça como um todo. Ela servia de cenário para fotos dos
moradores do entorno e de usuários, registrando momentos
da vida dos habitantes da cidade. Posteriormente, as fontes e o
espelho d'água foram desativados (Figs. 8 e 9).
Durante o final da década de 1990, muitos adolescentes
utilizavam este espaço para andar de bicicleta em grupo, depois
para a prática de patinação. Após o ano de 2000, houve a presença
de soldados do Exército, que usavam o espaço para se exercitarem,
e de grupos de malabaristas realizando ensaios. Foi observada,
ainda, a presença de atletas do Le Parcour e de Kung Fu, usando o
local para a prática destes esportes.
206 Jardins de Burle Mar x no Nordeste do Brasil
Figs. g e 9. Dois momentos distintos do espelho d'água, vendo-se as fon tes 1•11 1
movimento e depois desativadas. Fonte: Acervo particular de moradores do cnto11111
(década de 1970) e Arquivo Público do Piauí (década de 1990).
Apesar da predominância de lojas de comércio atacadist.1
no entorno da praça, esta apresenta, de forma modesta, certa
diversidade e possui algumas residências, escolas de nívd
fundamental e médio, restaurantes, biblioteca e a Casa da Cultura
de Teresina, onde ocorrem aulas de dança, pintura e desenho. As
residências, em sua maioria, diferem totalmente das que existiam
na época da inauguração.
A comunidade deixou de usar a Praça Monumento Da Cosi a
e Silva em determinados horários por causa da marginalização
do espaço, consequência das modificações socioeconômicas que,
ao longo de 30 anos, ocorreram no entorno, e do surgimento <.k
outras opções de lazer, a exemplo dos shoppings centers. Atualmente, durante o dia, a praça é usada por trabalhado res
para descansar em horário de almoço, nos bancos ou no chão.
Eles ocupam, principalmente, o lado direito da praça, onde st•
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 207
silua o monu 11 1cnto, devido à proximidade com a Cl\PISA, poii:i
os usuários são, em sua maioria, funcionários lcrccirizados dcsla empresa.
Ao se analisar o histórico da praça, percebe-se que em ncnhu m
momento o local deixou de ter usuários, embora tenha havido
preferência de certos usos em determinados horários. Trata-se
de um local bem arborizado, com um traçado que tirou partido
do desnível para criação da cascata, resultando num ambiente diferenciado.
Segundo Sá Carneiro (2010, p. 65), na Praça Monumento
Da Costa e Silva, Burle Marx criou um "ambiente contemplativo,
que explora a vegetação local distribuída no entorno do espelho
d'água central ( ... ).O espelho d'água reflete a beleza e os detalhes
da vegetação, atraindo os olhares dos visitantes':
Considerações finais
A Praça Monumento Da Costa e Silva reúne três aspectos
importantes relacionados ao patrimônio cultural da cidade de
Teresina, representados pela ligação do espaço com o Rio Parnaíba,
o espaço como monumento ao poeta mais importante do Piauí e o
único espaço público projetado por Roberto Burle Marx.
A presença de atletas e crianças no local mostra que ainda
existe a possibilidade de revitalização da área. Dessa forma, por se
Lratar de um espaço público que acumula história e significados,
fazendo parte da identidade e do patrimônio cultural da cidade, é
i rnportante que seja revitalizado para cumprir seu papel social e ressaltar seu valor arquitetônico e paisagístico.
200 Ja rdins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
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Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 209
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210 Jardins d e Burle Marx no Nord este do Brasil
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Agradecimentos
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológk o
(CNPq), pelo auxílio financeiro a esta pesquisa.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 211
JARDINS OE BUIU,H M/\UX EM NAT/\t
P,1\ilo josé Lisboa Nohrc '
M<Írizo Vítor Pereira
lsa(as da Silva Ri beiro
Introdução
Os projetos de Roberto Burle Marx e Arquitetos Associados
(Escritório Burle Marx & Cia. Ltda.) realizados para a cidade d~·
Natal integram a fração imaterializada de uma obra grandiosa. As
razões para a não execução dos jardins projetados para a capital
potiguar são diversas, embora não sejam suficientes para explicar
o esquecimento dessa importante contribuição à paisagem
natalense. Como resultado, as marcas do trabalho do mui()l
paisagista brasileiro estão ausentes da cidade e as suas idci<lS
seguem ignoradas pela maioria da população.
Alguns exemplares desse pequeno conjunto de quatro jardins
são citados por importantes pesquisadores da obra de Burle Marx,
embora os registros gráficos desses projetos permaneçam inéditos
na bibliografia sobre o paisagista. Dois deles integram o elenco dos
seus principais projetos, segundo Flávio Motta (1983) e Jacqu •s
Leenhardt (2000). Trata-se da Praça Kennedy (1979) e da Alcalis
do Rio Grande do Norte S.A., Alcanorte (1980).
jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil Z l '1
1 I 1 ;
A Praça Kennedy
A Praça Kennedy está localizada no tradicional "Grande
Ponto" - a esquina da Avenida Rio Branco com a Rua João
Pessoa - no bairro da Cidade Alta, onde se encontra instalado
um monumento em homenagem ao presidente norte-americano
assassinado em 1963.
O pequeno monumento (um busto de Kennedy e um<1
frase de sua autoria) foi erguido na Rua Toão Pessoa no
local então designado, pela mídia, de Praça da Imprensa.
O referido monumento foi inaugurado no dia 1° de maio
de 1965, pelo embaixador norte-americano no Brasil,
o Sr. Lincoln Gordon, em cujo discurso agradeceu, em
nome da família Kennedy, a homenagem que o povo de
Natal lhe prestava naquele momento (SOUZA, 2008, p. 183).
No dia 12 de julho de 1979, o Jornal "Tribuna do Norte" citou
o projeto paisagístico de Burle Marx para essa praça, atestando
que o paisagista havia estado em Natal no dia anterior.
Em ligeiro contato com o Prefeito José Agripino, prometeu
fazer o projeto do bosque da Beira Canal e Capitania dos
Portos, onde a Prefeitura pretende construir um parque,
Praça Augusto Severo e Kennedy, no Centro (TRIBUNA
DO NORTE, 12 de julho de 1979, p. 1).
Nenhum registro desses projetos foi localizado nos arquivos
do Departamento de Paisagismo da Secretaria Municipal de
Serviços Urbanos (SEMSUR), órgão da Prefeitura Municipal de
Natal responsável por administrar as áreas públicas da cidade.
Considerando que o projeto para a Praça Kennedy é citado por
214 Jardins de l3u rle Marx no Nordeste do Brasil
Moll ,1 ( 198 ~) L' l.et:11h,1rd1 (2000) , plldl' se rnnclu ir qu ~· .\p t•1w 11
l'~ l t' loi dcilcnvolvido, t:nl n· aqut·ks aL i ma relacionados.
r ornparando registros folog rc\fiCOS publicados (.! Ili 1979
(ll1g. 1) e outros da mesma época (MIRANDA, 198 1, pp. '19 50)
mm a siluação encontrada em 2002 (DIÁRIO DE NATAL, J 9 <fr setembro de 2002, p. 3), pode-se constatar que, nesse interva lo dl'
tempo, a Praça Kennedy foi objeto de intervenções parciais, como
a substituição do piso, do mobiliário e desenho dos canteiros.
Porém, nada lembra o traço marcante da concepção paisagíslicn
de Burle Marx, menos ainda na conformação atual do espaço,
após passar por uma ampla reforma em 2004.
Fig. 1. Praça Kennedy em 1979. Fonte: Biblioteca Setorial do Curso di·
Arquitetura e Urbanismo da UFRN.
Ja rdins de Burle Marx no Nordeste d o Brasil 215
Em 2002, o roubo do bL1sto e de oulras peças de bronzt•
que compunham o monumento a John Fitzgerald Kennedy foi
denunciado pela imprensa (DIÁRIO DE NATAL, 19 de setembro
de 2002, p. 3). Um ano depois, nenhuma providência havia sido
tomada e a praça se encontrava em estado de abandono, o que
motivou a seguinte declaração do então prefeito:
Essa é uma praça simbólica que guarda a memória de
um grande líder mundial. Além do novo busto, vamos
recuperar a estrutura do local (DIÁRIO DE NATAL, 13
de setembro de 2003, p. S).
A reposição do busto foi marcada para o dia 22 de novembro
daquele mesmo ano, data do assassinato do homenageado, porém
a reinauguração da praça só ocorreu alguns meses depois.
AAlcanorte
Esta praça e o referido monumento foram restaurados e
reinaugurados pelo prefeito Carlos Eduardo Nunes Alves,
em 13 de fevereiro de 2004 (SOUZA, 2008, p. 184).
O segundo projeto atribuído a Burle Marx é o jardim para a
sede da Álcalis do Rio Grande do Norte S.A. - Alcanorte, edifício
de autoria do arquiteto Oscar Niemeyer. Conforme mencionado
anteriormente, a proposta para este jardim não foi publicada, mas
apenas citada por Flávio Motta ( 1983) e Jacques Leenhardt (2000).
Porém, o alto custo dessa construção foi alvo de denúncia da
"Revista Veja" em artigo denominado "Palácio da Seca" (REVISTA
VEJA, n . 640, 1980, p. 136). Tal artigo motivou a seguinte carta do
arquiteto:
216 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
l.l ,, "º'" 'it1h1 1• 11 i\ 11 >1 11111 l t', 1 ujo l h ulo "l 1.tl.h lo .\,1 S1•1 , ,·~
í.· til' 1·vld1·111l' 111 .1 k ( ltEV IS'l'A V E)i\ 11 . MO). O 41111
..:araLlni1.1 11111 p.il.11 io sao n~ gr;111des l'~pa~o:-. l1vn·~ 1· 11•,
acabamentos lu xuosos que lhe düo a impo11<'.'ncí.1 dl'M'J.1d11 .
Ora, a sede da Alcanortc se constitui de dois andares,'º"'
salas de trabalho, a maior - a sala <lo presidente u1111
apenas 6 x 6, isto é, 36 melros quadrados. E os matei ials
adotados são simples e despretensiosos: pintu ra brn11l.I
nas paredes, piso de tapete colado, tetos caiados, etc. As
plantas da Alcanorte estão no meu escritório à disposiçao
dos interessados. É pena que uma revista respo ns~\wl
como Veja leve aos seus leitores informação dessa
natureza (REVISTA VEJA, n. 644, 1981, p. 8).
Essa descrição se refere ao edifício cuja maquete é mostrada a
seguir (Fig. 2). Não obstante a defesa feita por Oscar Niemeycr, a
obra foi suspensa pelo Governo Federal: "Alertado por um artigo
do Jornal do Brasil, o ministro da Indústria e Comércio, Camilo
Penna, decidiu adiar por tempo indeterminado a construção da
suntuosa sede da Alcanorte em Natal" (REVISTA VEJA, n. 642,
1980, p. 71).
Fig. 2. Projeto para a Akanorte, Oscar Niemeyer, 1980.
Fonte: Revista Veja, n. 640, 1980.
jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 217
Assim, a cidade deixou de receber um conjunlo arqui lctónko
e paisagístico idealizado por esses dois renomados profissionais,
que trabalharam juntos em diversos projetos emblemálicos do modernismo brasileiro.
O Parque das Dunas - Via Costeira
Outro jardim projetado para Natal foi destacado por José
Tabacow, arquiteto associado do Escritório Burle Marx & Cia.
Ltda., ao se referir à colaboração entre Burle Marx e os botânicos , no caso Luiz Hemygdio de Mello Filho.
A parceria prolongou·se por toda a vida do paisagista,
concretizando-se em importantes trabalhos, entre os
quais se destacam o Parque do Flamengo, no Rio de
Janeiro, e o Parque das Dunas, em Natal, Rio Grande do
Norte (TABACOW, 2009, p. 108).
A elaboração do projeto paisagístico do Parque das Dunas
- Via Costeira (1981) está registrada na historiografia local pela
sua inserção numa polêmica que marca o avanço do movimento
ambientalista na cidade, na transição entre as décadas de 1970 e
1980. Na época, o arquiteto Luiz Forte Netto foi contratado pelo
Governo do Estado para desenvolver o projeto urbanístico de uma
avenida litorânea de cerca de 1 O quilômetros, ligando as praias de
Areia Preta e Ponta Negra, ao longo das quais seriam dispostas
Unidades Turísticas, conforme descrição:
218
A pista terá uma calçada com quatro metros de largura,
ciclovia com 2,5 metros, canteiro central e uma pista de
rolamento com 12 metros de largura. Percorrendo todo
Jardins de Burle Mar x no No rdeste do Brasil
o l 11\)l' lo do 11111 11, l111Vl' l".I sq.1u11do o l·ngl' ilhl•iro l llo11 w 11
(;onH.' ' So,\l l'' I· .i ~ 11111dadl·s lurb l ii.:ah cm n11mero de l r6:.
('J'RJllUNJ\ DO NOll'l'E, 21 de novembro de 1979 , p. \) .
Por se tratar de uma intervenção em área de dunas dispostas
ao longo de praias quase inacessíveis, num cenário natural
praticamente intocado e com baixíssima ocupação, a sociedade
civil começou a se manifestar temendo a degradação ambiental.
As críticas motivaram contrapartida em defesa do projeto e o
então secretário de Planejamento, Marcos Formiga, teve a ideia
de convidar Burle Marx: "Com toda a polêmica que existia na
época, era preciso a opinião de um especialista, de um ecologista"
(JORNAL DE HOJE, 12 de setembro de 2008, p. 8).
Inicialmente visto como uma orquestração de grupos de
orientação política contrária ao governo, o movimento popular
recebeu o apoio de associações profissionais (arquitetos e
geólogos), professores e estudantes, alcançou grande repercussão
e teve como principal resultado a contratação de Burle Marx pelo
Governo do Estado.
Na véspera de encerrar o seu mandato, no dia 14 de
março de 1979, o Governador Tarcísio Maia contratou,
por Cr$ l milhão e 580 mil cruzeiros, a empresa Burle
Marx & Cia, do Rio de Janeiro, para fazer o projeto
paisagístico do Parque das Dunas, visando, sobretudo,
à preservação daquela área ( ... ). A contratação de Burle
Marx, que era o maior especialista em paisagismo no
Brasil, tinha por objetivo calar a boca dos legítimos e
dos pseudo-ecologistas de Natal. E Conseguiu! {SOUZA,
2008, p. 660).
Jard ins de Burle Marx no Nordeste do Bras il 219
A presen<;a de Burle Marx deu respeitabilidade ;\ in k iuli va
do poder público e a imprensa empenhou-se cm divu lgar·
amplamente sua participação, procurando desqualificar 0 deb::itc
ambientalista, como pode ser constatado nas citações abaixo:
220
A contratação do paisagista Burle Marx, considerado
um dos maiores "experts" no ramo, foi o ultimo ato d o
Governador Tarcísio Maia. Desse modo, os que condenam
a Via Costeira ficam sem poder criticar o projeto, já que
Burle Marx é considerado um dos maiores defensores da
ecologia (TRIBUNA DO NORTE, 18 de março de 1979, p. 8).
Demonstrando claramente a preocupação com o assunto,
assumindo a responsabilidade pela obra, o Governo partiu
para dir imir firmemente as dúvidas e as indagações. E essa
resposta veio na presença, no prestigio e na autoridade do
paisagista Roberto Burle Marx, responsável pelo aspecto,
digamos ecológico, da iniciativa. ( ... ). Burle Marx, que
sobrevoou toda a área e depois percorreu-a para uma
análise inicial, disse a respeito que as polêmicas em torno
do assunto a nada estão levando, a não ser dizemos nós,
ao obscurantismo disfarçado em posição de vanguarda
ecológica, à promoção pessoal de grupos minoritários,
simulando a defesa do interesse coletivo (TRIBUNA DO
NORTE, 13 de julho de 1979, p. 4).
Burle Marx chegou e disse: "a construção da Via Costeira
não vai ocasionar o desequilíbrio ecológico e 0 projeto
do Parque das Dunas preservará toda a flora existente
na área" ( ... ). Está reafirmando o bom senso de quantos,
desde os primeiros instantes, defenderam a construção
da via Costeira contra a fúria dos "ecólogos" de beira de
praia (TRIBUNA DO NORTE, 24 de outubro de 1979, p. 2) .
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
O pnisngisla co11H·dt·11 t•nl n•vtsla ari r111a11do sua preocupa\'10
l om a preservação do meio a111hicntc e corno aspecto educacional,
n illu rah e estético - marcas registradas das suas intervenções. 1
<)uestionado sobre a polêmica em torno do projeto, declarou:
"Aceitamos com muito prazer''. Foi como respondeu à
indagação ( ... ). Eu defendo aquilo que justifica defender.
Vou fazer uma coisa que seja útil para a coletividade,
estamos acima de facções ( ... ) o trabalho tem que ser
unânime, não apenas arquitetos, mas todos os interessados
em dotar a área de um sistema que realmente promova
a preservação (TRIBUNA DO NORTE, 12 de julho de
1979,p. l).
Burle Marx concebeu o projeto a partir do uso da flora local
e, para tanto, foi necessário executar o inventário florístico do
Parque das Dunas - realizado por equipe local sob a supervisão
do botânico Luiz Hemygdio de Mello Filho. Durante dois anos,
foram desenvolvidos estudos num horto experimental criado na
Via Costeira, visando identificar as espécies vegetais nativas mais
adequadas às condições adversas do local.
O projeto, disse Burle Marx, será desenvolvido
lentamente, "e mais importante ainda é que será
aproveitada toda a flora da região" ( ... ). Sobre o início
do projeto, disse que agora vai depender de como será
desenvolvido, mas confirmou que será montado em
Natal um horto experimental para que sejam acentuadas
a vegetação existente e não trazer de outras regiões.
Bastante entusiasmado, à medida que falava, Burle Marx
fez ver que em certos lugares é necessário o plantio de
árvores, mas em outros "é saber coadunar a arquitetura
para um plantio urbanístico" (TRIBUNA DO NORTE, 12
de julho de 1979, p. 1).
jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 221
A <>~l1p.1~ 1\o p1 l'Vin i11 k i:tl111 L'll ll", .d\'.· 111 Lk til'~ lJnld. tdl'~ 'l'urfstkas com ti11co holéis, :t.ona de t'lfUi punH' lllos tk
lu'l.cr, :\rcas de cumping, bclvcdcrc e 'l.0 11 as lk prnlt\:lo
rigorosa. 1 lavcria também a cri:ição de 11 111 horlo
experimental u ser utilizado na recuperação de p:irlcs
desnududas ao longo do parque ( ... ). O projeto do horto
foi desativado e a comissão interdisciplinar [Comissão
de Acompanhamento Técnico e Negociação do Projeto
Parque das Dunas] constatou o seguinte: "Comparando
se o registro original das unidades turísticas efetuadas em
cartório, observou-se uma total discordância em termos
de configuração geométrica, entre aquele registro original
e os registros das áreas individuais"( ... ). Segundo 0 autor
do projeto, o arquiteto Luiz Forte Netto, foram negociadas
áreas reservadas à preservação, de equipamento de lazer,
estacionamentos e até mesmo o belvedere. Não sabendo
se até o momento que critérios foram usados pela empresa
governamental [EMPROTURN] para as presentes
alterações. Comenta o autor do projeto no seu parecer
que se a atual situação for consolidada será "altamente
prejudicial para a cidade de Natal e desmoralizante para
o Governo" (SOUZA et aJ, 1987, pp. 3-4).
É possível identificar o rebatimento dessas ideias no projeto
paisagístico. Em termos formais e funcionais, os jardins propostos
não apenas oferecem espaços de lazer (esporte, recreação e
contemplação), mas valorizam as características do cenário
rialu ral e integram os equipamentos previstos para as Unidades Turísticas à paisagem (Fig. 3).
A prioridade dada ao uso social pode ser verificada através
da profusão de acessos públicos e espaços de permanência
distribuídos em patamares que se convertem em belvederes,
li gados por escadas, rampas e passeios.
222 Jard ins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
O u>lll rn lo p,1rn o p1 o)l' l<> p.lis.1gísl lrn pr ev1a a arboril'<.t\ no
1.• o ajard inamento da fiH:t' do Parque das Dunas que l<1dcava a
Via Coslci(ª · O projclo prop6s a recomposição das dunas, pois a
construção implicou drásticas modificações na feição natural do
terreno. Como é notório em sua obra, Burle Marx não procurou
copiar a paisagem natural, mas tomou a natureza como referência
para criar uma nova paisagem. Em suas palavras:
Nossos urbanistas também precisam abrir os olhos para
a riqueza dessa flora. Nossas cidades são projetadas de
maneira empírica, com fontes luminosas forradas de
ladrilho de banheiro, hermas inexpressivas, para não falar
na vegetação, na maioria das vezes exótica, arrasando a
vegetação natural existente, numa ambição medíocre de
pastichar a flo ra de caráter internacional ( ... ). B preciso
proteger a natureza como um repositório de beleza,
na esperança de que as árvores floresçam por muitos e
muitos anos. Afinal, é essa esperança que dá um sentido
superior à vida (TRIBUNA DO NORTE, 9 de setembro
de 1979, p. 5).
A proposta original da Via Costeira sofreu diversas alterações.
A diretriz de ocupação do espaço em Unidades Turísticas, em
cujos interstícios se conformava um sistema de espaços livres, foi
sucessivamente modificada, permitindo a ocupação por hotéis em
toda a extensão da orla. Assim, foram inviabilizados os generosos
jardins públicos à beira-mar pensados por Burle Marx. Diante da
m agnitude desse projeto, constata-se que a cidade perdeu uma
oportunidade ímpar e que, em função da falta de interesse político
e da omissão dos gestores públicos, os cidadãos foram privados de
desfrutar um parque singular.
223
flg. 3. Projeto do Parque das IJunas Via C :oslcira, Robc1 to Burle Marx, Haruyoshi Ono, josé 1àbacow, Esc. 1 :500, 1981 . Fonte: Arquivo do Parque das Dunas, IDEMA, Nata l-RN.
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224 Jardins de Bur le Marx no :-.Jordeste do Brasi l
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Jardins de Bu rle Marx no Nordeste do Brasil
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225
O Pátio Interno da Biblioteca Central da U fllN
O quarto jardim de Burle Marx para Natal não está registrado
em sua biografia oficial. É praticamente desconhecido, mesmo
na instituição para a qual foi criado, a Universidade Federal do
Rio Grande do Norte. O projeto paisagístico do Pátio Interno
da Biblioteca Central da UFRN foi elaborado em julho de 1976,
período de plena execução do Campus Universitário, cujas obras haviam sido iniciadas em 1972.
A instalação da UFRN no campus universitário se deu
na década de 70. O projeto do campus, cuja implantação
é iniciada em 1972, durante o reitorado do Prof.
Genário Alves Fonseca (1971-1975), consolida-se na
gestão do Prof. Domingos Gomes de Lima (1975-1979),
espraiando-se por uma área aproximada de 130 hectares.
O Plano Geral do Campus foi elaborado pela equipe do
arquiteto paraense Akyr Meira, responsável, também,
por algumas de suas primeiras edificações {NEWTON JÚNIOR, 2008, p. 27).
No relatório do seu primeiro ano de administração, o reitor
Domingos Gomes de Lima declarou que a primeira medida adotada
com referência ao Campus Universitário foi o redimensionamento
do seu Plano Diretor (LIMA, 1976, p. 42). No Relatório de
Atividades de 1977, o reitor informou o prosseguimento das obras
e, embora não faça qualquer alusão à contratação do Escritório
Burle Marx & Cia. Ltda., relacionou a Biblioteca Central entre as
construções realizadas ou complementadas naquele ano (LIMA, 1977, p. 115) (Fig. 4).
A Biblioteca Central integra o primeiro conjunto de edifícios
composto de obras de feição brutalista construídos no Campus
226 Jardins d e Burle Marx no Nordeste do Brasil
\Jnivcrsittfrio. Nesse sentido,''° d1srnrrcr sobre n arquitclun1 d.1
Universidade Federal do Rio (;rande <lo Norte, Edja Trigueiro
aprcs~nla as seguintes considerações: 1
O conjunto arquitetônico-urbanístico inicial do Campus
da UFRN evidencia, de modo exemplar, as contradiçol'S
embutidas na fase de disseminação internacional
da proposta brutalista, a começar pela implantaç;io,
estruturada segundo rígido zoneamento fun cional, talvez
o alvo maior de crítica por parte das vanguardas dos anos 1950 ( ... ). Na origem do "New Brutalism" estava
também a busca pela adequação às especificidades locais:
aos condicionantes climáticos, às formas preexistentes.
Na maioria dos edifícios inicialmente construídos
Fig. 4. Biblioteca Cent ral da UFRN em construção, 1975, projeto de
Alcyr Meira, de 1973. Fonte: Seção de Coleções Especiais da Bibl ioteca
Central Zila Mamede/UFRN.
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 227
no Campus. ns ma teriais t' clc1 nc11tos dt• vnl11~ 1\11 s1w in leiramenlc inadequados ao cli ma quente t' (unido lornl,
como comprovam estudos de conforto ambil'nlal ll l l
realizados. Concreto, pedra, ftbrocimento, vid ro; janelos
que mesmo abertas barram a entrada do ar, esquecidas
a telha cerâmica e as janelas de grandes aberturas
que acompanharam todas as tendências estilísticas
anteriormente presentes em Natal (TRIGUEIRO, 2008,
pp. 63-64).
Entre os jardins de Burle Marx para Natal, o projeto para
o Pátio Interno da Biblioteca Central da UFRN é 0 que melhor
permite apreciar sua concepção, uma vez que, ao contrário dos
demais, o registro gráfico detalhado da proposta encontra-se
integralmente disponível para consulta.1 Portanto, escolheu-se
esse projeto, ao que tudo indica nunca executado, para 0 estudo
detalhado da paisagem idealizada por Burle Marx em Natal.
A Universidade Federal do Rio Grande do Norte instalava
a Reitoria do Campus Universitário Central, no ano de 1976,
nas dependências do edifício da Biblioteca Central, atualmente
denominada Zila Mamede. Nesse mesmo ano, Roberto Burle
Marx concebia um projeto de ajardinamento do pátio interno
desta edificação, em que se oferece mais uma oportunidade
para que sejam observados os elementos, formas, cores, ritmos
e volumes que registram um momento no seu processo criativo.
Assinado pelo Escritório Burle Marx & Cia. Ltda., tendo como
arquitetos associados José Tabacow e Haruyoshi Ono, 0 jardim foi
idealizado num ano em que predominavam projetos residenciais
1 A U~iversidade Federal do Rio Grande do Norte detém a posse do projeto executivo arqmvado na Superintendência de lnfraeslrulura (SIN/UFRN). '
228 Jardins de Burl e Marx no Nordeste do Brasil
11.1 p1mlw;;\o do p;lisagistll , 1.k ,1, 01do uim n n.•ln~ no ,1p1'<.·1w 11l l1 d t1
por Jticqucs Lccnhardl (2000) . ~çgurH.lo Newton júnior (2008), o cdi fk io <\brigou a rcito1111
,\IL' 1979, quando a administração universitária foi trnnsfcridt1
para seu endereço definitivo. Embora ainda sejam desconhecidas
as motivações para a encomenda desse jardim, o fato de o edifício
comportar a reitoria naquele momento pode justificar o empenho
em qualificar o espaço interno, que, no projeto arquitetônico de
Akyr Meira (1973), está indicado apenas com o um "vazio'~ No interior da biblioteca, o jardim projetado por Burle Marx
surge como um oásis: sombreado e revigorante. A proposta
pode ser apreciada sob alguns aspectos, como o seu traçado e os
materiais indicados (Fig. 5). Situado no térreo da edificação - de linhas retas e concreto
aparente2 - e ocupando uma área de aproximadamente 100 m2
,
o jardim está estruturado em dois retângulos, nos quais são
distribuídas as espécies vegetais que trazem a natureza ao interior
da biblioteca. A proposta, apresentada em duas partes, define uma
única mancha, interrompida por uma passarela. Um caminho
central convida o observador a desfrutar toda a extensão do
jardim, oferecendo um espetáculo visual para os que caminham
no piso térreo e no pavimento superior.
A vegetação revela os canteiros de formas sinuosas e
assimétricas, a exemplo dos traçados ameboides que foram
utilizados no emblemático Jardim do Ministério da Educação
2 O edifício é descrito como um prisma de base retangular e estrutura aparente, ck horizontalidade predominante intensificada pelas vigas, paredes cegas e aberturas
contínuas (VILAR et ai, 2007).
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 229
e Saúde (Rio de Janeiro, l 938), no que diz respeito às mtHlthas
que o compõem e definem seu caráter de conjunto. Esse aspecto
também aponta para o repertório formal do artista através d<1s marcas de experiências anteriores.
O projeto da Biblioteca Central da UFRN proporciona um
visual que revela sua riqueza de texturas, cores e formas. Cada
planta assume seu valor plástico - presença da natureza na
construção. Uma proposta recorrente em projetos posteriores,
'. , __ .( ~> ~-~; .. ·- . ·- -····---
.l .. -+--· + . , --·!'"'"
i 1 ~ ------.. :::::::::.._--::--- - r=-1• --.J-ll•W' ...... lil °'-..... ... - l -
Fig. 5. Projeto para o Pátio Interno da Biblioteca Central da UFRN,
Roberto Burle Marx, Haruyoshi Ono, José Tabacow, 1976. Fonte: Superintendência de Infraestrutura da UFRN.
230 Jardins de Burle Marx n o Nordeste do Brasil
w 1110 o j:mlim i11l l'l'1H> d11 iH'llt• do Ha11rn do Nordcsl L' BNU
(Fortaleza, 198'1) e o 'l'L'a trn Nndonal Claudio Santoro (Urnsfll,1 ,
1981).
No espaço periférico, estão dispostos canteiros de formas
orgânicas e geométricas, para os quais foram especificadas 16
espécies vegetais retiradas do sub-bosque da flora tropicnl,
adequadas às condições de sombreamento observadas nesse
jardim interno. Criando volumes, os elementos verticais, de
í - i ....... - - - .... -
-·--m===11 ----~11
- 111 L
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
'jFi 1 • 1 " 1 1. ••
·----.. 41 _____ -
....... --- .. ---.- ...... .. ---·~--.. ___ ...., ...... .. -~ .... ~
231
alturas variáveis, são inlilulados no projeto como '\:strutu rns dt•
~axi~: Tais e~truturas- montadas sobre um "tubo de ctcrnH': cujo
mtenor contem um sistema de irrigação - conformam 0 suporte
adequado para a vegetação especificada. Um "misto" orgânico
envolve as estruturas cobertas por placas de xaxirn, arrematadas
por uma tela de arame galvanizado. A lista de plantas do jardim é
apresentada na Tabela 1.
Tabela l: Especificação da vegetação por Burle Marx para 0
Pátio Interno da Biblioteca Central da UFRN, 1976.
Especificação Nome científico Nome Estrato por Burle Marx atualizado popular
Alpinia nutans, Rose. Alpinia nulans (L.) Colônia Roscoe
Herbáceo
Alpinia Alpinia purpurata purpurata, K Schu. (Vieill.) K. Schum.
Alpínia Herbáceo
Caladiurn hybridum, Hort.
Caladium sp. Tinhorão Herbáceo
Calathea Calathea ínsignis Maranta-insignis, Hort. Petersen cascavel
Herbáceo
Calathea Calathea lietzei E. lietzei, E. Morr. Morren
Calateia Herbáceo
Calathea Calathea makoyana makoyana, E. Morr. E. Morren
Cal ateia Herbáceo
Calathea Calathea zebrina zebrina, Lindl. (Sims) Lindl.
Cal ateia-zebra Herbáceo
Cordyline Cordyline terminalis Dracena-termina/is Kunth. (L.) Kunth vermelha
Arbustivo
Phaeomeria Phaeomeria magnifica Bastão-do-111agnífica, K. Schum. (Roscoe) K. Schurn. imperador
Herbáceo
Philodendron Philodendron l11rilobum, Schott. /atilobum Schott
Imbé Herbáceo
z:sz Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
11.NIWd li\;11\'1\0 NOllU' .1t111tllk11 Nome P.~ll'llh>
por llurlc M1irx 11 t1ml 1'1.~ul11 popula r
f '/1lf<J1 ft'f11/nn1 l'ill /0</1·111l1(li1 lmhé /\ rhu~l Ivo
11111\·i111i1111 , K. Krn11se. 111axi11111111 K. Krausc
l'hil<lllemiro11 Phi/odendr011 pinnatifidum lmbé l lcrb<lu:o
pi111wtijidu111, Schott. (Willd.) Schott
Philodendron Philodendron Imbé 1 Ic rbáceo
pittieri, Eng/. pittieri Eng!.
Pilea nummularifolia, Pilea nummulariifolia Dinheiro- Hcrbkco
Griseb. (Sw.) Wedd. em-penca
Polypodium Polypodium Samambaia Herbáceo
subauricuiatum, Blume. subauriculatum Blume
Scindapsus Scindapsus aureus (Linden & André) Jiboia Herbáceo
aureus, Engl. Engl. & K. Krause
Os elementos verticais são encobertos pela folhagem e
cumprem a função estrutural dos troncos das árvores, que, na
natureza, hospedam plantas epífitas e escandentes. Diferem de
outros tipos de estruturas similares por não participarem do
jardim através de suas cores e formas visíveis, como é o caso dos
suportes para bromélias existentes no Sítio Roberto Burle Marx,
criados pelo artista a partir de composições que fazem alusão à
pintura neoplasticista de Piet Mondrian e Theo van Doesburg
(SIQUEIRA, 2001, p. 15). Na biblioteca, o resultado que se espera dessas estruturas
verticais é que possam ser vistas como "esculturas vegetais'',
formadas de maneira imprevisível e independente do homem
pela ausência de poda. Pode-se pensar estar diante de um
exercício escultórico de volumes virtuais ou transparência
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 233
construli v~1 , a1 >t111 ·,1s 1 ··1so s, 1 1 .... <. • e esqueça que esses ( cscn w s no
espaço n5o possuem autonomia. Porém, o tempo irá recordar a
lodo o m om ento que se está presenciando o nascimento de um<i
escultura (vegetal), estruturas que "são fatos espaciais concretos e
não vi rtuais, são materiais e não transparentes, são instáveis e não
formas estabelecidas de arranjo plástico livre e qualidade abstrata"
(SIQUEIRA, 2001, p. 27). Os totens cobertos de vegetação - nas
palavras de Burle Marx, um volume lançado no espaço do jardim
- intensificam a dinâmica estabelecida pelas diferenças de altura dos volumes criados.
Os detalhes que integram a proposta dissolvem a monotonia
do plano, valorizando o conjunto, sem, contudo, comprometerem
as características individuais de cada elemento. Contornando 0
plano de forma geométrica, definida por seixos rolados e lajes
de piso, desenvolve-se a circulação interior que possibilita 0
deslocamento e a contemplação do jardim.
A configuração projetual favorece a observação pelo
movimento, tanto no pavimento inferior quanto no superior, a
partir do qual o jardim se apresenta em uma nova perspectiva.
Variedades de cores e tons, indo do verde ao vermelho, passando
pelo cinza e pelo roxo, e totens de alturas diversas preenchidos de vegetação marcam a composição.
Nenhum mobiliário é proposto, nem qualquer artefato que
convide ao descanso e à fruição. A princípio, parece configurar-se
como um jardim de passagem. No entanto, no interior das formas,
os caminhos convidam o usuário a desviar seu itinerário e passear
pelo oásis. Um pequeno e revigorante passeio que faz a ligação
entre o jardim e a arquitetura. Os seixos rolados que forram 0
solo,
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
11 11 porc,. no interior dos canteiros, Lri a111 u111 a c;11m1d<1 inlcrmedi ;fria
l' lllre os caminhos e a vegetação.
Es~c jardim de passagem dialoga com a arquitetura, ao
sugerir' o ritmo do fluxo das pessoas nessa área da construção.
O paisagista isolou a porção que lhe foi oferecida, colaborando
com a arquitetura, acentuando o partido e o programa da
edificação. A planaridade conferida pelas linhas horizontais que
marcam os lados dos retângulos é interrompida pela volumetria
que irrompe por meio dos "objetos-vegetais" e conduz o olhar do
espectador em direção ao "vazio" da construção. A solução amplia
o espaço no qual o jardim está localizado, fazendo pensar que
"Burle Marx queria ativar as relações físicas entre verticalidade e
horizontalidade, entre superfície e profundidade, entre extensão e
limite" (SIQUEIRA, 2001, p. 15).
Considerando a imagem parcial do jardim em 1981 (Fig.
6), pode-se inferir que o projeto de Burle Marx não havia sido
executado até aquela ocasião, embora a identificação de duas
espécies vegetais oriundas da flora tropical, com características
semelhantes àquelas especificadas pelo paisagista, possa sugerir
uma tentativa de execução parcial. São elas: a costela-de-adão
(Monstera deliciosa), em primeiro plano, e a dracena-de
madagascar (Dracaena marginata), ao fundo.
Como pode ser constatado na figura seguinte (Fig.
7), atualmente o jardim perdeu identidade, exuberância e
tropicalidade. Observa-se que, exceto pela existência de um piso
de pedriscos que permite a circulação interior, a configuração
atual em nada se assemelha à proposta de Burle Marx, que pode
ser apreciada em realidade virtual (Fig. 8).
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 235
Fig. 6. Aspecto do jardim em 1981. Fonte: Seção de Coleções Especiais
da Biblioteca Central Zila Maniede/UFRN.
1:ig. 7. Aspecto atual do jardim . .Fonte: Os autores.
Jardins d e Burle Marx no Nordeste do Brasil
Fig. 8. Desenho simulando o projeto de Burle Marx. Fonte: Ana Cláudia
Sousa Lima e Miss Lene Pi:reira.
Considerações finais
O desejo expresso pela atual gestão da Biblioteca Central
Zila Mamede é de executar o projeto original e poder divulgar a
obra nos meios acadêmicos e na cidade, além de oferecer um belo
espaço de convívio aos seus usuários.
Tomando como exemplo as iniciativas de restauração dos
jardins de Burle Marx no Recife, promovidas pelo Laboratório
da Paisagem/UFPE, a realização desta pesquisa é motivada pelo
desejo de resgatar do esquecimento os projetos do paisagista em
Natal.
Espera-se também chamar a atenção da comunidade
universitária para a oportunidade de executar o projeto do jardim
para o Pátio Interno da Biblioteca Central Zila Mamede, legando
para as gerações futuras a marca da passagem do maior paisagista
brasileiro pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
jardins de Burle Marx no No rdeste do Brasil 237
Bibliografia e Fontes Documentais
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z:rn Jard ins de Burle Marx no Nord este do Brasil
N< lBlrn, 11.1ulo: l'l :lll '. l llA, f\. 1111 1111 Vl1 111 N,,, pl'g.1d,1' 1k 11111 ll• M.11 x: ' 11.1
p:1ssagl'111 por Nat ;ll/RN. 111 . l ~ Nl '( >N'l' llO Ili ·'.< ; 10N~ ·I.· t>~ I SA<;t "~ .. ~~ lllS'l'() IU/\: )/\Rl)I NS 1\ IH JIU .I·'. M/\ l\X NO NOH:ll .. I·. NORDl .. S l h,
1 2007, Rbcifc. Anais ... Rcc.:ilt:: u1:PE; Olinda: CECI, 2007. 1 CD-ROM. > 1
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Jardins d e Burle Marx no Nord este do Brasil 239
'f'IU IHJN/\ do No1 te;-. V111 ( '0.1/t'im /"'""''voo 11111/J11•11t1•, 11/i H111/1• fllt111 , 1111 0 .10, n. 90, 12 jul. 1979.
'l'RIBU NA do Norte. Via Costeim voi co111eçnr e IJ11rle Murx 1'.\ f1!
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Agradecimentos
Afonso Martins, Ana Cláudia Sousa Lima, Ana Luiza Silva Freire,
Márcia Monteiro de Carvalho, Miss Lene Pereira e Nilberto Gomes de Souza.
240 Jard ins de Burle Marx no Nord este do Brasil
J\pfüHlicc: Projetos de! Uurlc Marx no Nordeste
A 1.MiOi\S
Não Projeto Cidade Ano Realizado
realizado
Pal:\cio cio Governador Maceió 1974 X
(Palácio Marechal Floriano Peixoto)
Residência Emllio Maya Omena Maceió 1976 X
Ministério da Fazenda Maceió 1979 X
BAHIA
Não Projeto Cidade Ano Realizado
realizado
Edifício Caramurn Salvador 1946 X
Terreiro de Jesus Salvador 1948/1950 X
(Praça 15 de Novembro)
Praça l3 de Maio Salvador 1950 X
Praça 2 de Julho Salvador 1950 X
Hotel da Bahia Salvador 1950 X
Reitoria da Universidade da Bahia Salvador 1952 X
Residência Fernando Goes Salvador 1952 X
Biblioteca Juracy Magalhães Itaparica 1968 X
Plano Patamares Salvador 1971 X
Bahia Othon Palace Hotel Salvador 1972 X
Centro Administrativo da Bahia Salvador 1973 X
Edifício Mansão Alfred Nobel Salvador 1974 X
Metalquímica da Bahia S.A. Salvador 1982 X
(Xerox do Brasil S.A.)
Robson Club Praia do Forte Salvador 1984 X
Feira de 1985 X Parque Feira de Santana
Santana
Condomínio Helena Chaves Salvador 1985 X
Parque São Sebastião Salvador 1986 X
Residência Helenilson jorge Salvador 1986 X
de Almeida Chaves
Jardins d e Burle Marx n o Nordeste do Brasil 241
Edifício Mans:io Cario~ Co~la Pinto Salv.1drn l<JHC> ,\ li 11.1 Ah1111h1l11 S.A 11111)
Co!llpanhia de Mineração Coil iteiro Salvador MiningS.A. 1987
1'111'1
Edifício Maison Bougainvillea Salvador 1989 X PAll1\(llA
CEARÁ Rcnl i7nd u N~o
l'rojcto C idndc Ano rcn ll111<lo
Projeto Cidade Ano Realizado Não realizado
Residência Benedito Dias Macedo Fortaleia 1968 X
Av. Aguanambi Fortaleza 1972 X
l'tm1uc Arruda Câmara João Pessoa 1939 X
!'raça Venâncio Neiva João Pessoa 1939 X
l'alúcio do Governador João Pessoa 1939
(Palácio da Redenção) (•)
Posto de Abastecimento da Petrobrás Fortaleza 1972 X Parque Solon de Lucena João Pessoa 1940 Avenidas Leste-Oeste e José Bastos Fortaleza 1973 X Praça em Areia (•) Areia 1943/1944 Prefeitura Municipal Fortaleza 1973 X Praça 1817 João Pessoa 1943/1944 X
'fheatro José de Alencar Fortaleza 1973/1990 X Praça na Av. Cruz das Armas João Pessoa 1943/1944
Hotel Colonial For taleza 1975 X
Min istério da Fazenda Fortaleza 1975 X
Pan1ue Açude Velho (') Campina
1952 Grande
Residência Denise Pontes Fortaleza 1980 X
Praça da l ndependência João Pessoa 1955 X
Edifício da Tecelagem Vicunha Fortaleza Nordeste S.A. 1983 X
Residência Cassiano Ribeiro Coutinho João Pessoa 1957 X
Praça Cívica da UFPB João Pessoa 1971 X
Banco do Nordeste do Brasil S.A. -Centro Administrativo Fortaleza 1984 X
Residência Emílio de Carvalho João Pessoa 1976 X
Coutinho {aluai Romildo)
Edifício Portal da Enseada For taleza 1985 X Parque do Cabo Branco João Pessoa 1981 X
Tiffanys Sea Flat Hotel Fortaleza 1987 X
Centro Empresarial C lóvis Rolim Ltda. Fortaleza 1988 X
Residência Pio Rodrigues Neto Fortaleza 1988 X
PERNA;\IBUCO
Realizado Não
Projeto Cidade Ano realizado
Caesar Park Hotel Fortaleza 1990 X Praça de Casa Forte Recife 1935 X
Jardim Botânico de Fortaleza -Fazenda Raposa Maracanaú 1992/1994 X
Av. Beira Mar - Trecho Caesar Park Fortaleza 1993 X
Edifício Coast Sea Tower Fortaleza 1994 X
Praça Euclides da Cun l1a Recife 1935 X
Parque Amorim Recife 1935 X
Residência Luis Paulo de Freitas (*) 1935/1937
Praça Lau ra Bandeira (Vila Naval) Olinda 1935/J 937 X
s1ARANHÃO Parque Dois Irmãos (*) Recife 1935/1937
Projeto Cidade Ano Realizado Não realizado
E.~cola Apr endizes Marinh eiros Olinda 1935/1937 X
Parque 13 de Maio (') Recife 193511937 Palácio do Governador (Palácio dos Leões) São Luís 1968/ 1973 X
Palácio do Governador Recife 1936/1937 X
(Palácio do Campo das Princesas)
242 Jard in s de Burle Marx no Nordeste d o Brasil Jardin s de Burle Marx no Nordeste do Brasil
11111111M 111h•l11111 l1d111 ll1'1ll1• Jll.111
lksld~ ll\ hi hnill ( :111.,11<'1 dt• 11111 rns l~ 1·1lk 11)7 \ l 1111111 cl11 l'o11 (. ) ll t'l lft• 11)16
Comp.inhia de Elclnudade 110 Estado llcdfc 1974
--de Pernambuco,- CEJ. PE
1'111111 Co1111110 dt· Jt·sus (l'1111u <:l1rn.1 Mc11 l110) Rcdfc 1936 X
E<li fído Lc Corbusicr Recife 1976 1'1111" do h1111 onc.1111 cn10 Rcciíc 1936 X
1 ndústria e Comércio 1976
111111·:1 /\rt11 r Os,111· Rcciíe 1936 X Sotave Nordeste (')
Edifício Oscar Niemeyer (•) Recife 1976
1'1,11·.1 Pinlo D.1111<1!.<> Recife 1936/1937
X 1'1111 ,1 <· 111 frcnlc ao quar1cl
Centro de Exposições e Convenções Olinda 1977 X
d.1 l(un do l lospício (' ) Recife 1936/1937
do Estado de Pernambuco 1'1.11 .1 Barão de Lucena Recife 1936/1 937
Residência Glauco Carneiro Leão (') 1978 X
l1r,11.1 das Cinco Pontas (*) Recife 1936/1937
Camaragibe 1980 X Bering do Nordeste S.A. 1•1,11,.1 do lkrby
Recife 1937 X
Jaboatão dos 1982 X
1'1.11.1 ela República Recife 1937 X Hotel Sheraton Petribu
Guararapes l'ra1·a Dezessete (*) Recife 1937
Sil 10 São João da Várzea Centro Social Tecanor S.A. 1982 X Recife 1940
Banco Nacional do Norte S.A. (*) Jaboatão dos
1982
( lks1dência Cornélio Brennand) X
Guararapes < :.1pda da jaqueira
Recife 1951 X
Centro Administrativo Banorte -Recife 1982 X
1'1,t\ a Ministro Salgado Filho Recife 1957 X
CENAB 1'1,1\·a Faria Neves
Recife 1982 X Recife 1958
Banco Safra S.A. ( l'r.11·a de Dois Irmãos)
X
Jaboatâo dos X 1983
1 '" lalcza de Pau Amarelo Paulista 1968 X Parque do Curado
Guararapes ll.111.:0 do Desenvolvimento de
Recife 1983 X
1'1•1 nambuco - Bandepe Recife 1969 Mar Hotel X (11.mco Santander)
Residência José Goiana Leal Jaboatão dos
1984 X Guararapes
lksid~ncia José Oliveira Recife 1969 ( ll.111co Santander)
X
Oficina Cerâmica Francisco Brennand Recife 1984 X
h lilTcio MichelangeJo Recife 1969 X
(Praça Burle Marx)
1985 X Petrolina
lks ld~nc ia António Galvão Recife 1970 X Parque Nilo Coelho l'd1fkio Transatlântico Recife 1971 X
Plano Diretor de Urbanização do Arquipélago Fernando de 1986
< .. 1111pus Universitário da UFPE Recife 1972 X
Território de Fernando de Noronha (*) Noronha
S11p1Tintcndência Nacional para o
Parque Memorial Arcoverde Olinda 1986 X
1 lt•,cnvolvirnento do Nordeste - Recife 1972 X SUl>"NE
Marlin Royal Flat Apart Hotel Recife 1986 X lk,idência João Pereira dos Santos Recife 1972 X
Hotel Arrecifes (' ) 1990 t .1•111it ério Parque das Flores Ja boa tão dos 1973
BSE/NE Office (*) 1990 Guara rapes X
:ltf4 Jardin s de Burle Marx no Nordeste do Bras il
Jardins d e Burle Marx no Nord este do Brasil 245
PIAUf
Projeto Ci<l:tdc Ano Jtc:11i11ulo NO o
1<·oll 1111lo
Palácio cio Governador (Palácio de Karnak)
Teresina 1972 X
Praça Monumento Da Costa e Silva Teresina 19í5/1976 X
Rio Poty Hotel Teresina 1986 X
RIO GRANDE DO NORTE
Projeto Cidade Ano Realizado Não
realizado
Pátio Interno da Biblioteca da UFRN Natal 1976 X
Praça Kennedy Natal 1979 X
Álcalis do Rio Grande do Norte S.A. -Alcanorte
Natal 1980 X
Parque das Dunas - Via Costeira Natal 1981 X
Fonte: ~ott~ (1983); Leenhardt (2000); Escritório Burle Marx & Cia. Ltda.; Pesquisadores do
Grupo Jardms de Burle Marx''. Revisão: Ana Rita Sá Carneiro, Aline de Figueirôa Silva, Joel mir
Marques da Silva, 2013.
(') A ser confirmado.
(·)Cidade não identificada.
Observação!: A lista de Motta (1983) compreende o período de 1932 a 1983.
Observação 2: A lista de Leenhardt (2000) compreende o período de 1932 a 1989.
246 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasi l
Os Autores
Aline de Figueirôa Silva
Arquiteta e Urbanista/UFPE. Mestre em Desenvolvimento Urbano/U Pl' l\. Doutoranda em Arquitetura e Urbanismo/USP. Pesquisadora do Laboratório d ,1
Paisagem/UFPE, onde foi bolsista do CNPq (2001-2004; 2008-2010). Coautora de "Os jardins de Burle Marx no Recife" (2009). Autora de "Jardins do Recií<.: : uma história do paisagismo no Brasil (1872-1937)" (2010). (o-organizador•\
de "Crítica de arquitetura: ensaios latino-americanos" (2013). Premiada pcln Getty Foundation para participar da Conferência Anual da Association for Preservation Technology lnternational (APTi), Charleston, Estados Unidos,
2012. Atualmente, é bolsista da FAPESP.
alinefigueiroa@yahoo.com. br
Ana Rita Sá Carneiro
Arquiteta e Urbanista/UFPE. Doutora em Arquitetura/Oxford Brookcs
University. Professora da graduação e pós-graduação do Departamento de Arquitetura e Urbanismo/UFPE. Coordenadora do Laboratório da Paisagem/ UFPE. Líder do grupo de pesquisa "Jardins de Burle Marx''. Membro do Comitê Internacional de Paisagens Culturais, do CECI e da ABAP. Co-organizadora de "Jardins histór icos brasileiros e mexicanos" (2009). Coautora de "Os jardins de Burle Marx no Recife" (2009) e de "Roberto Burle Marx e o Theatro José de Alencar: um projeto em dois tempos" (2012). Autora de "Parque e Paisagem: um olhar sobre o Recife" (201 O). Consultora para a resturação dos jardins de
Burle Marx no Recife. Atualmente, é bolsista de produtividade do CNPq.
anaritacarneiro@hotmail.com
Antônio Sérgio Farias Castro
Engenheiro Agrônomo/UFC. Especialista em Botânica/UFC. Pesquisador sobre a flora nordestina, principalmente do Ceará, desde 1994. Autor do site www.floradoceara.com.br (2006; 2011) e de "Flores da Caatinga" (2011 ).
Fundador do Movimento Pró-Árvore.
floradoceara@gmail.com
Jardins de Burle Marx n o No rd este do Brasil 24·7
IJurhnra Irene W.1sinski Pnulo
/\ rqu ilcta e Urbanisla/FAU !K. Mcst rc cm Dcscnvolvirncnto lir'b,1110/U 11p1 :.
Doutora cm Urban ismo/UFRJ. Professora do Ocpartamcnto til• Arqultc1111 11 1•
Urbanismo/UEMA. Coordenadora do Núcleo da ABAP/M/\.
barbaraiwp@gmail.com
Fátima Maria Alves da SiJva Mafra
Arquiteta e Urbanista/UFPE. Artista Plástica. Especialista em Geslão do
Patrimônio Cultural Integrado ao Planejamento Urbano da América Latina (ITUC/AL)/CECI/UFPE. Mestre em Desenvolvimento Urbano/UFPE. Pesquisadora do Laboratório da Paisagem/UFPE. Coautora de "Os jardins de Burle Marx no Recife" (2009).
fatima.mafra@superig.com. br
Fernanda Cláudia Lacerda Rocha
Arquiteta e Urbanista/UFC. Especialista em Paisagismo/PUC-PR. Especialista
em Arquitetura Paisagística/USP. Mestranda em Geografia/UECE. Professora do Curso de Arquitetura e Urbanismo e da Pós-Graduação em Paisagismo e Coordenadora do Laboratório da Paisagem/UNIFOR. Pesquisadora da "Rede Quapá-Sel"/USP e do grupo de pesquisa "Espaço, Cultura e Educação"/UECE.
Coautora de "Roberto Burle Marx e o Theatro José de Alencar: um projeto em dois tempos" (2012). Desenvolve projetos de arquitetura, arquitetura de interiores e paisagismo.
fernandarocha@unifor.br
Heignne Jardim
Arquiteta e Urbanista/UFPB. Especialista em Paisagismo pela Faculdade
Castelo Branco. Pós-graduada em Master em Arquitetura pelo IPOG. Técnica da Secretaria de Planejamento da Prefeitura Municipal de João Pessoa. Desenvolve projetos de arquitetura, arquitetura de interiores e paisagismo.
heignne@gmaiLcom
Isaías da Silva Ribeii-o
Arquiteto e Urbanista/UFRN. Artista Plást ico. Mestre e Doutorando em Arquitetura e Urbanismo/UFRN. Professor do Departamento de Engenharia Civil/UFRN.
isaias_ribeiro@uol.com. br
248 Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Joclmir Mnrqu cs dn Silvn
Hiólogo/UPE. Mestre e Doutorando cm l>cscnvolvi 111cnlo Urbano/U Fl11\.
Pesquisador cl,o Laboratório da Pnisagem/Ul~PE. Atualmente, é holsisla d.1
CAPES. ! joelmir _marques@hotmail.com
José Hamilton Lopes Leal Júnior
Arquiteto e Urbanista/UFPI. Mestrando em Arquitetura e em Urbanismo/
UFSC. Pesquisador do Laboratório Urbano da Paisagem (LUPA)/UFPJ.
Membro do grupo de pesquisa "Ambiente Construído" do CNPq. Atualmente,
é bolsista da CAPES.
josehamilton.arq@gmail.com
Karenina Cardoso Matos
Arquiteta e Urbanista/UFPE. Especialista em Ciências Ambientais/UFPI.
Mestre em Arquitetura e Urbanismo/UFRN. Doutoranda em Urbanismo/
Universidad Politécnica de Cataluna. Professora do Departamento de
Construção Civil e Arqwtetura/UFPL Coordenadora do Laboratório Urbano
da Paisagem (LUPA)/UFPI.
kareninamatos@hotmail.com
Marizo Vitor Pereira
Arquiteto e Urbanista/UFPE. Mestre e Doutorando em Arquitetura e
Urbanismo/UFRN. Professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo/
UFRN. Filiado ao DOCOMOMO Brasil.
marizovitor@yahoo.com. br
Paula Dieb
Arquiteta e Urbanista/UFPB. Mestranda em Arquitetura e Urbanismo/UFPB.
Técnica da Secretaria de Planejamento da Prefeitura Municipal de João Pessoa.
Pesquisadora do Projeto "Praças de João Pessoa: estudo de impacto'', do qual
resultou o livro "Da Casa à Praça" (2011). Integrante da equipe vencedora do
Concurso Público Nacional de Ideias do Parque Zoobotânico Arruda Câmara,
Prefeitura Municipal de João Pessoa (2008).
diebpaula@gmail.com
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 249
1'111110 Costu l(ulll
A 1 q111klo c li rb.111 isl n/U 1:111\. l \spL'dal isla cn 1 1 kscnvolviirn:nlo ll111 •1I l 11l rw.1do/Cc:nl ro de 1 ksc·nvolvi111c11 lo da Admin isl raç~10 Pliblica. Ml·~I rc• c' lll
A 1q11i1 c1 ura c Urhanismo/U 1;i~A. Professo r da UNlM E. Técnico do l nsl it ulo do Jl11lri111611 io Artfslico e Cultural da Bahia (JPAC/BA).
/lft 11 lc>k11/i/(r!)pauloka/il. com. br
Puulo José Lisboa Nobre
Arc1uilcto e Urbanista/UFRN. Mestre e Doutor em Arquitetura e Urbanismo/ UFRN. Professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo/UFRN. Pesquisador do grupo de pesquisa "História da Cidade, do Território e do Urbanismo" (HCUrb)/UFRN. Pesquisador da "Rede Quapá-Sel"/USP. {lt111/011obre@ufrnet.br
Ricardo Figueiredo Bezerra
Arquiteto e Urbanista/UFC. Mestre em Arquitetura Paisagística/University of' Arizona. Doutor em Planejamento Urbano/ University of Nottingham. i'rofcssor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo/UFC. Pesquisador do l .aboratório de Estudos em Arquitetura e Urbanismo (LEAU)/UFC. Vice-líder do grupo de pesquisa "Jardins de Burle Marx". Coautor de "Roberto Burle Marx L' o 'íl1eatro José de Alencar: um projeto em dois tempos" (2012). Premiado por excelência no estudo de arquitetura paisagística pela American Society of l ,a ndscape Architects ( 1986).
r/Jezerra@arquitetura. ufc. br
Roscli Farias Melo de Barros
llióloga/UFPE. Mestre e Doutora em Botânica/UFRPE. Professora do 1 >cpartamento de Biologia e da Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA)/UFPI. Curadora do Herbário Graziela Barroso (TEPB)/UFPI.
ri 111 rros. ufpi@yahoo.com. br
Tcmístodes Anastácio de Oliveira
Arquiteto e Urbanista/UFC. ·Pesquisador do Laboratório da Paisagem/ U N 1 FOR. Co-organizador de "Catálogo de Espécies Vegetais de Interesse i'aisagístico no Ceará" (2006). Coautor de "Roberto Burle Marx e o Theatro José de Alencar: um projeto em dois tempos" (2012). Desenvolve projetos de .1rquilctura, desenho urbano e paisagismo.
<'1t.f1e@hotmail.com
250 Jardins de Burle Mar x no Nord este do Brasil
Wll:t11 (:omcs ltcls J.01wH
· u I · · t· / ' JFl'F M~·~I H' cm Arq11ilctura e Urbanismo/USP. A rqu 1 I t'I a t' n ,111 1i- .1 ' .. .
1 )oulora , cm Engenha ria Agrlcola/UNICA MP. Professora do Dcparl~ mcnlo
de Consirução Civil e Arquitetura e da Pós-graduação cm Dese1~~~lv1mc.nto e Meio Ambiente (PRODEMA)/UFPI. Coordenadora do Laboratouo Urbano
da Paisagem (LUPA)/UFPI. Membro da Rede Ibero-Ame~ic~n~ ~RO~ERRA.
C · d de "Cerrado Piauiense· uma visão mult1d1sc1phnar (2007) o-orgamza ora · , . d e de "Sustentabilidade do Semiárido" (2009). Atualmente, e bolsista e
produtividade do CNPq.
wilzalopes@hotmail.com
Ja rdins de Burle Marx no Nordeste do Brasil 2!H
Jardins de Burle Marx no Nordeste do Brasil
Formato
15,5 x 22 cm Tipografia
Minion (texto)
Cambria (títulos)
Montado e impresso na oficina gráfica da
Editora ~ UniversitáriWUFPE
Papel
Capa em Triplex 250g/m2
Miolo em Oífset 90glm2
Rua Acadêmico Hélio Ramos, 20 1 Vánea, Recife - PE 1 CEP: 50740-530 Fones: (81) 2126.8397 / 2 126.8930 / Fax: (81) 2126.8395
www.ufpc:.br/edufpe 1 livraria@edufpe.com.br
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