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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULOFUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS – FIPE
ALEXANDRE REGATTIERI BESSA
Arte como investimento, a formação de preçose os agentes atuantes no mercado de arte contemporânea.
São Paulo2010
ALEXANDRE REGATTIERI BESSA
Arte como investimento, a formação de preçose os agentes atuantes no mercado de arte contemporânea.
Monografia apresentada na Fundação Instituto dePesquisas Econômicas – FIPE, para conclusão docurso de MBA em Economia Internacional, turmaIII.
Área de Concentração: Microeconomia.Orientador: Professor Alexandre de Campos.
São Paulo2010
AGRADECIMENTOS
Ao Henrique Luz, pelas conversas memoráveis sobre legitimação.
Ao Baixo Ribeiro, pelo tempo dedicado e pelas explicações detalhadas de seu trabalho.
Ao Beto Atílio, que foi meu cicerone durante minha visita à SP-Arte 2010.
À Patrícia Sampaio, ao Marcelo Rocha, ao Chip Gasser, ao Otavio Bierrenbach, ao
À Professora Dra. Diva Benevides Pinho, que dedicou parte de seu tempo para orientar
essa monografia com leituras recomendadas e indicações que enriqueceram esse
material que estão prestes a ler.
me ensinaram a gostar dos “parangolés” de Lígia Clark e da lucidez de Louise Bourgeois.
À Ana Ramos, Gabriel Zellmeister e Heloísa Alquéres que, entre várias outras coisas,
Maurício Daumberg, ao Walter Donat e ao Welder Pinto: amigos cujo apoio foi
fundamental para o término desse trabalho.
EPÍGRAFE
Being good in business is the most fascinating kind of art. During the hippie era people
put down the idea of business—they’d say, ‘Money is bad,’ and ‘Working is bad,’ but
making money is art and working is art and good business is the best art. – Andy
Warhol (1975)
Ser bom nos negócios é o tipo mais fascinante de arte. Durante a era hippie, as pessoas
criticaram a idéia de fazer negócios. Elas diziam que “Dinheiro é ruim” e que
“Trabalhar é ruim”, mas fazer dinheiro é uma arte e trabalhar com arte fazendo bons
negócios é a melhor arte de todas. – Andy Warhol (1975)
RESUMO
BESSA, A. R. Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes
no mercado de arte contemporânea. 2010. Monografia (MBA) – Fundação Instituto
de Pesquisas Econômicas – Fipe, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.
A produção de arte é vista como investimento através do estudo dos agentes do mercado
de arte na cadeia de valorização e legitimação de obras. A teoria é montada usando
autores internacionais, documentários e, sobretudo, a bibliografia da principal estudiosa
do mercado brasileiro de artes: Professora Diva Benevides Pinho. Junto a isso tudo
estão aplicadas teorias de comportamento de consumo baseados em Microeconomia. O
levantamento de hipóteses é então verificado na prática em visitas a feiras, exposições e
galerias de arte. A teoria é então complementada por meio de entrevistas com agentes
do mercado brasileiro para montar um panorama atualizado das pesquisas da Professora
Diva.
Palavras-chave: Mercado de arte. Microeconomia. Comportamento de Consumo.
Legitimação de produtos abstratos.
ABSTRACT
BESSA, A. R. Art as investment, pricing and the agents acting in the contemporary art
market. 2010. Monograph (MBA) – Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas –
Fipe, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.
The process of art production is analyzed as an investment through the study of art
market players in the chain of value production and legitimacy of works. The theory is
built using international authors, documentaries, and especially the bibliography of the
principal scholar of the Brazilian arts: Diva Benevides Pinho. In order to understand
market objectives as a whole, theories of consumer behavior based on microeconomics
are applied. The hypotheses are verified in practice on visits to fairs, exhibitions and art
galleries. The whole theory is then supplemented by interviews with representatives of
the Brazilian Art Market to assemble an updated overview of the research started by
Professora Diva Benevides Pinho in 1989.
Keywords: art market. Microeconomics. Consumer Behavior. Value of abstract
products.
LISTA DE FIGURAS E TABELAS
Figura 1 – Tendência de preços de artistas selecionados: Jeff Koons, Francis Bacon,
Andy Warhol e Damien Hirst. Base: 1988=100............................................................... 2
Figura 2 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009.
Fonte: Artprice. Base 100 = valores comercializados em janeiro de 1998. ..................... 4
Figura 3 - Diagrama da hierarquia dos agentes da demanda do mercado de arte
contemporânea................................................................................................................ 10
Figura 4 - Valores de venda em leilões públicos filtrados por Andy Warhol e Picasso.
Fonte: Artnet................................................................................................................... 12
Figura 5 – Hipótese de aquisição de credibilidade a partir do reconhecimento dos
agentes do mercado de arte na formação de “Blue Chips”............................................. 23
Tabela 1 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009.
Fonte: Artprice. (http://www.artprice.com)...................................................................... 8
Tabela 2 - Os maiores preços de leilão atingidos por artistas contemporâneos entre julho
de 2008 e junho de 2009. Fonte: Artprice. (http://www.artprice.com) .......................... 13
Tabela 3 – Critérios para avaliação de uma obra de arte. Fonte: Bolsa de Arte do Rio de
janeiro. (http://www.bolsadearte.com.br)....................................................................... 18
Tabela 4 - Resumo de seis anos de SP-ARTE. Fonte Isto é Online (ISTO É)............... 36
SUMÁRIO
1 – INTRODUÇÃO.......................................................................................................................1
2 – DESENVOLVIMENTO TEÓRICO........................................................................................2
2.1 – EM BUSCA DO NOVO PICASSO .................................................................................2
2.2 – OS AGENTES DO MERCADO DE ARTE.....................................................................5
2.2.1 – Artistas.......................................................................................................................5
2.2.2 – Galeristas ...................................................................................................................6
2.2.3 – Museus e Instituições.................................................................................................6
2.2.4 – Grandes Colecionadores ............................................................................................7
2.2.5 – As feiras de arte .........................................................................................................7
2.2.6 – As casas de leilão.......................................................................................................7
2.3 – A BUSCA DA DEMANDA POR EXCLUSIVIDADE E ESTÉTICA............................8
2.3.1 – O mercado de arte primário .......................................................................................9
2.3.2 – O mercado de arte secundário..................................................................................11
2.4 – ARTE COMO INVESTIMENTO ..................................................................................12
2.4.1 – Mercado de arte e tecnologia da informação ...........................................................14
2.4.2 – Razões para considerar arte como investimento......................................................15
2.5 – ATRIBUIÇÃO DE VALOR...........................................................................................17
2.5.1 – Valores intrínsecos...................................................................................................18
2.5.2 – Valores extrínsecos..................................................................................................20
3 – PARTE PRÁTICA.................................................................................................................25
3.1 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS ......................................................................................25
3.2 – RESUMOS .....................................................................................................................26
3.2.1 – Ana Carolina Rocha, colecionadora ........................................................................26
3.2.2 – Henrique Luz. Estudioso, crítico, colecionador e representante do MASP.............28
3.2.3 – Baixo Ribeiro. Fundador da Galeria Choque Cultural.............................................30
3.2.4 – Beto Atílio, colecionador e proprietário de loja de antiguidades.............................33
3.2.5 – Visita a sexta edição da SP Arte (Abril/Maio de 2010)...........................................35
3.2.6 – Professora Dra. Diva Benevides Pinho, economista e estudiosa das artes. .............41
3.2.7 – Rafael Rocha Andrade, empresário e colecionador iniciante. .................................44
4 – CONCLUSÕES .....................................................................................................................47
4.1 – O valor da arte versus a demanda por arte......................................................................47
4.2 – Sobre as hipóteses do aumento da demanda por arte......................................................48
4.3 – Sobre o processo de legitimação do mercado de arte mundial e brasileiro ....................49
4.4 – Fechamento.....................................................................................................................50
5 – BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................51
5.1 – Livros..............................................................................................................................51
5.2 – Documentários................................................................................................................52
5.3 – Sites de períodicos na Internet ........................................................................................52
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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1 – INTRODUÇÃO
O mercado de arte contemporânea possui agentes próprios que influenciam na definição
do valor de uma obra de arte a partir de um mercado restrito, meticuloso e com regras
próprias. Os artistas podem ser observados como marcas que desenvolvem séries de
produtos com ciclos de vida determinados pela demanda e valores definidos pela
escassez que gera exclusividade.
O projeto de monografia surgiu de uma paixão pessoal pelo mercado das artes e pelo
desejo de conhecimento do comportamento do consumidor sofisticado numa estrutura
de mercado no qual a precificação é algo subjetivo. O mercado de arte brasileiro está em
ascensão internacional, o que pode ser comprovado pelas diversas publicações em
jornais e pelo prestígio alcançado por alguns artistas no mercado global. O exemplo
mais concreto desse crescimento é a formação de feiras como a SP-Arte, que em 2010
está em sua sexta edição, movimentando todos os agentes que atuam no mercado para
uma arena comum de negociações, reconhecimento e legitimação.
De onde vem o valor da arte? Como se dá o processo de reconhecimento de uma peça
física cujo preço ultrapassa diversas vezes o valor dos materiais e do trabalho que a
compõe? Nesta monografia será usada a teoria de formação de preço de produto e a
teoria de ciclo de vida de produto para conceituar artistas e sua produção, enxergando-
os como produtos possíveis de comparação e de precificação. O objetivo principal é
mapear uma hipótese estrutural para a formação de preços das obras de arte no mercado
mundial e posteriormente, por meio de entrevistas, confirmar essa estrutura dentro do
mercado de arte brasileiro. Também faz parte do escopo desta monografia elencar
hipóteses para descobrir as razões para o aumento da demanda mundial por arte e a
conseqüente disparada de preços do mercado de arte contemporânea.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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2 – DESENVOLVIMENTO TEÓRICO
2.1 – EM BUSCA DO NOVO PICASSO
Não existe um consenso generalizado sobre a definição da abrangência cronológica de
arte contemporânea. A principal razão é que se trata de um assunto recente que alguns
teóricos e as principais casas de leilões divergem entre si quanto à precisão da época
correspondente. Para este estudo, serão consideradas as artes plásticas produzidas após a
segunda guerra e que foram valorizadas a partir do final da década de 1980.
O gráfico da figura 1 mostra os valores aplicados em obras dos quatro produtores mais
reconhecidos pelo mercado de arte: Andy Warhol, Francis Bacon, Damien Hirst e Jeff
Koons.
Figura 1 – Tendência de preços de artistas selecionados: Jeff Koons, Francis Bacon, Andy Warhol eDamien Hirst. Base: 1988=100. Fonte: Artnet. (http://www.artnet.com)
De acordo com PINHO (2009) e THORNTON (2009), a arte contemporânea possui
uma infinidade de suportes e linhas de pensamento, com rupturas agressivas e
questionadoras a cada nova teoria ou proposta apresentada. Há então vários momentos
de experimentação, como as obras do casal Christo e Jean-Claude, caracterizadas por
intervenções em grande escala, fora do ambiente de galerias e museus. O produto final,
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que transita entre os agentes do mercado de arte, não é a obra em si, mas os esboços,
fotografias e maquetes de suas montagens.
Esta análise é focada na produção de bens de natureza artística comercializáveis,
possíveis de serem transportadas e instaladas sem perder seu valor de troca. Instalações
temporárias e performances artísticas não serão consideradas, salvo o subproduto criado
durante a apresentação artística. O importante é que mesmo sendo efêmero e fixado no
tempo, haja um subproduto que possa ser valorado, transportado e legitimado pelos
agentes econômicos do mercado de arte.
A escolha pelas obras contemporâneas também possui uma razão econômica
fundamental: elas são um universo em contínua formação de valor e de legitimação. O
conceito de legitimação tem origem político-jurídica e o uso neste trabalho está
vinculado à designação de reconhecimento, pelas instituições detentoras de poder e
segundo articulações discursivas que esse mesmo poder domina. O olhar da economia
sobre esse processo de criação legitimação e valores a partir de conceitos subjetivos é o
objeto de estudo desta monografia. Segundo PINHO (2009) e AAKER (1998), para que
a arte como produto possa existir é necessário haver uma sociedade com excedentes
econômicos intercambiáveis, que reconheça os valores intrínsecos e extrínsecos da
produção artística. Ou seja, é preciso que haja um grupo de pessoas cujas necessidades
básicas já foram atendidas e que possuam recursos que ainda possam ser trocados. E é
preciso que tais pessoas ainda mantenham relações sócio-culturais que promovam a
troca desses recursos excedentes por produção artística, valorizada por aspectos
subjetivos da própria sociedade e estéticos da própria obra em questão.
Ainda de acordo com PINHO (2009) e THORNTON (2009), uma obra de arte é um
bem único, praticamente inelástico, cuja principal característica é a escassez. A teoria de
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equilíbrio de mercado através do modelo da oferta e da demanda indica que a redução
da oferta de determinado produto aumenta seu valor. Quando a escassez tende ao limite
(unitário), a função do valor monetário é de fazer a seleção do consumidor e as
referências de valor dependem da atuação dos agentes do mercado de arte em um
período específico.
De acordo com os registros históricos das casas de leilões Sotheby’s e Christie’s, houve
um aumento significativo da demanda de arte contemporânea nas últimas décadas. Por
conta disso, a produção foi diversificada com o surgimento de novos artistas, galerias,
museus, feiras de arte e bienais. O mercado, que já era sofisticado, cresceu
consideravelmente em todo mundo como pode ser visto na Figura 2, mas
principalmente na Europa Ocidental, nos EUA e Japão, e mais recentemente na China.
Entretanto, mesmo com novos produtores e a intensificação do trabalho dos agentes, a
demanda por arte contemporânea não conseguiu ser atendida, como mostra a escalada
de preços nos últimos 20 anos.
Figura 2 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009. Fonte:Artprice. Base 100 = valores comercializados em janeiro de 1998. (http://www.artprice.com)
Segundo PINHO (2009), a utilidade da arte está na fruição estética e na expectativa de
retorno sobre o investimento. A autora define o mercado de arte “... tal como o mercado
em geral, é um mecanismo por meio do qual compradores e vendedores encontram-se
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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em um local real ou virtual para a troca de bens e serviços, fixando preços e
quantidades”
Já em YENTOB (2009), o crítico de arte propõe uma questão prática das razões pelas
quais colecionar uma obra de arte contemporânea, já que pelo mesmo valor é possível
comprar uma obra consagrada na história da arte e com sua liquidez monetária
garantida. Adam Lindemann, entrevistado nesse documentário, responde a essa questão
apontando razões além do investimento e da fruição estética: “Se eu mostrar um Picasso
em minha parede, você irá pensar 'Oh, ele é rico e tem um Picasso.' Mas se eu lhe
mostrar que tenho o Picasso de amanhã, então você irá perceber que eu tenho algo que
nenhuma outra pessoa pode comprar com dinheiro.” Esse processo de legitimação,
nesse caso do colecionador identificar um bom investimento e acreditar nele, ocorre em
todos os pontos de troca da cadeia de produção e consumo de arte.
2.2 – OS AGENTES DO MERCADO DE ARTE
A análise do comportamento e da função dos agentes do mercado de arte permite
entender como legitimam obras e as transformam em objetos de fruição e investimento.
Cada agente responde a estímulos que convergem para o ganho de valor e a transação
no mercado de arte. Tais agentes são analisados a seguir, a partir dos estudos de PINHO
(2009), LINDEMANN (2006), THORNTON (2009) e THOMPSON (2008): artistas,
galeristas, museus e instituições, grandes colecionadores, feiras de arte e casas de leilão.
2.2.1 – Artistas
São os produtores ou criadores de valor. Se tiverem uma produção contínua,
reconhecida por críticos e com suporte de um ou mais galeristas por trás, os valores de
suas obras tendem a subir de acordo com o número de exposições e mostras que
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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participarem. Quanto mais conhecido e recomendado por especialistas, mais chance de
ser lembrado pelo público comprador.
Há uma relação interessante entre galeristas e artistas que pode ser comparada a relação
de clubes de futebol e seus jogadores. Quanto um artista é novo no mercado, deve
obedecer a todas as regras de sua galeria, vendendo exclusivamente e deixando com que
a galeria fixe os preços. Já quando o artista é famoso, a relação se inverte. Ele trabalha
com duas ou mais galerias e influencia na curadoria de compradores, assim como na
divisão dos lucros entre galeria e artista.
2.2.2 – Galeristas
Os galeristas são os modernos marchands, os primeiros a agregar valor no ciclo do
mercado de produção de obras de arte. O bom trabalho de um galerista consiste na
escolha do melhor comprador para valorizar o conjunto das obras de um determinado
artista. Por isso alguns chegam a financiar artistas que acreditam que sejam promessas
bem aceitas no mercado futuro, em troca de exclusividade de venda.
Galeristas são os representantes do mercado primário. Vendas feitas por artistas
diretamente a colecionadores particulares são desencorajadas, pois o galerista é o agente
reconhecido pelo lado da demanda e sabe transitar por ele. Alguns galeristas
contemporâneos famosos são Charles Saatchi e Larry Gagosian. Para citar alguns
nomes nacionais temos Márcia Fortes e Luísa Strina.
2.2.3 – Museus e Instituições
São agentes de divulgação em massa da produção artística. Quando os curadores e
patrocinadores de um museu (ou qualquer instituição que tenha coleção ou espaço
expositivo) endossam um artista contemporâneo, influenciam indiretamente o valor de
suas obras. Por conta disso, existem colecionadores particulares ávidos por expor parte
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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de sua coleção, convidando curadores a conhecê-la ou mesmo abrindo seus próprios
museus. Também em muitos casos acontecem doações de todo lado da oferta do
mercado de arte (artistas, galeristas, colecionadores) ao acervo do museu. As
instituições mais importantes para o cenário de arte contemporânea são MOMA, em
Nova Iorque, e a Tate Gallery, em Londres.
2.2.4 – Grandes Colecionadores
No acervo de um museu, a obra ganha notoriedade e exposição pública. Já num acervo
particular, ganha o cunho de quem a adquire. Os grandes colecionadores surgem logo
atrás de Museus e Instituições nas preferências de vendas dos galeristas. Nesse caso, são
compradores identificados pelo mercado de arte que não vão jogar a leilão apenas para
realizar lucro em curto prazo. No Brasil se destaca o empresário Bernardo Paz, que
possui parte de seu acervo de arte contemporânea exposto no Instituto Inhotim, em
Minas Gerais.
2.2.5 – As feiras de arte
Desde o início da década, as feiras de arte se multiplicaram em vários países com
excedente econômico intercambiável, incluindo no roteiro várias economias
emergentes. Entre elas China, Brasil e Rússia. As feiras mais famosas são Miami Basel
(nos EUA), Frieze (na Inglaterra), Basel (na Suíça), Arco (na Espanha). No Brasil, a SP-
Arte é realizada duas vezes ao ano, em abril e novembro, esta última dedicada ao
mercado de fotografias.
2.2.6 – As casas de leilão
Sotheby’s e Christie’s são as casas mais famosas. Durante o leilão, acontece a
reclassificação dos objetos de arte. Todo o conjunto de legitimações acumuladas por
uma determinada obra ao longo de sua trajetória é avaliado. E mais do que a
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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determinação do preço de obras de arte, no leilão se determina os direitos de
propriedade de bens artísticos, estabelecendo as identidades sociais dos objetos de arte.
A tabela 1 mostra os maiores valores transacionados nas casas de leilão entre 2008 e
2009. No Brasil, podemos citar como exemplos a Bolsa de Arte do Rio de Janeiro.
Tabela 1 – Crescimento de vendas de arte contemporânea de 1998 até junho de 2009. Fonte:Artprice. (http://www.artprice.com)
2.3 – A BUSCA DA DEMANDA POR EXCLUSIVIDADE E ESTÉTICA
De acordo com PINHO (2009), a arte contemporânea vista em galerias e leilões é
produzida para um grupo específico de consumidores que representa uma parcela
restrita da população mundial. Além de serem detentores de um grande excedente
econômico intercambiável, há outras características comuns a esse público que podem
ser usadas com o fim de entender o comportamento da demanda.
Um comprador de uma obra de mais de um milhão de dólares pertence a uma classe
social diferenciada. Seus gastos são exagerados para a média da população. Entretanto,
é preciso parametrizar os valores para verificar que há coerência. Em 2009, o
proprietário da SAC Capital Advisors, Steve Cohen, arrematou por US$ 12 milhões
“The Physical Impossibility of Death in the Mind of Someone Living”, de Damien
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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Hirst. A obra é um tubarão suspenso num aquário gigante com formaldeído. Em
THOMPSON (2008, página 3) o economista e escritor usa essa compra para justificar
como o estilo de vida dos colecionadores, diante da natureza inelástica da arte
contemporânea, acaba por influenciar o preço final do produto de que são os principais
compradores.
Para colocar o preço de US$ 12 milhões em seu contexto correto é preciso
entender o quão rico [o comprador] é. Assumindo que o Sr. Cohen possui
capital de US$ 4 bilhões juntamente com um lucro líquido anual de U$ 500
milhões antes dos impostos. Considerando um retorno de 10 por cento sobre
o investimento – muito aquém do que seu fundo de investimentos retorna –
ele possui um total de US$ 16 milhões por semana, ou US$ 90 mil a hora. O
tubarão custou a ele cinco dias de trabalho.
Diante desse poderio econômico associado à escassez intrínseca da natureza do produto,
é possível levantar a hipótese de que o público ao qual se destina o mercado de arte
contemporânea é quem, em última instância, define os limites de preço, através de seu
excedente econômico intercambiável. Essa hipótese deverá ser validada durante a fase
de pesquisa desta monografia. Diante da impossibilidade de se contabilizar as trocas e
as vendas diretas entre colecionadores, elas não estão incluídas nesta análise, mas são
consideradas na cadeia de legitimação.
2.3.1 – O mercado de arte primário
Segundo LINDEMANN (2006), há duas classes de consumidores com comportamentos
distintos, que moldam o mercado de arte e são moldados por ele. No chamado mercado
de arte primário, a compra é feita diretamente na galeria que representa o artista em
questão. A escassez e a demanda são tão diametralmente opostas que o principal
trabalho do galerista é escolher para quem será realizada a venda. A tendência é que a
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venda seja feita para quem irá agregar mais valor ao artista, seguindo uma cadeia de
legitimação. Um destaque numa coleção importante valoriza o artista e ajuda a
consolidar seu valor no mercado. Por isso o comprador que atua no mercado primário é
geralmente próximo das galerias, entende como o mercado funciona, é bem relacionado
e atua como investidor em longo prazo no mercado a termo.
De acordo com sua importância, citado em YANTOB (2008), os agentes da demanda do
mercado de arte contemporânea são: museus públicos, fundações e museus particulares,
grandes colecionadores privados, outros colecionadores.
Figura 3 - Diagrama da hierarquia dos agentes da demanda do mercadode arte contemporânea. Fonte: própria.
O gráfico da figura 3 explicita a relação de ganho de valor para o conjunto da obra do
artista versus o preço de comercialização. O caminho da legitimação de uma obra de
arte pode ser mais rápido ou mais lento de acordo com a notoriedade dos agentes
envolvidos na troca. Uma obra colocada numa instituição pública ou privada é um
atestado de credibilidade que transfere valor para o artista, um certificado emitido pela
curadoria da instituição que o aceita, que terá mais ou menos valor de acordo com sua
notoriedade. Por isso, os preços para estes museus e também outros de menor porte são
inferiores aos praticados para colecionadores. E são mais inferiores ainda se
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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comparados com os valores para aquisição em leilões. Por conta dos dados das vendas
primárias não se tornarem públicos, não é possível representar numericamente as
vantagens de se vender mais barato para essas instituições. Entretanto, a lógica da
negociação baseada na legitimação pode ser empiricamente comprovada no aumento
dos valores de outras obras do mesmo artista, após essa legitimação ter acontecido.
2.3.2 – O mercado de arte secundário
Já o mercado secundário, também conhecido como o mercado público dos leilões, é
onde a legitimação da obra de arte é publicamente avaliada pelo público interessado. Do
ponto de vista da demanda, o mercado secundário é destinado principalmente aos
consumidores mais afoitos que procuram validação instantânea e estão dispostos a pagar
mais por isso. Além entregar uma obra já legitimada, os leilões indiretamente vendem
credibilidade a esses novos colecionadores.
O mercado secundário influencia o valor das próximas produções dos artistas
comercializados no mercado primário e é onde geralmente ocorrem especulações. O
caminho mais fácil para aferir lucros é comprar uma obra de uma galeria de confiança e,
meses depois, levá-la a leilão. Mas se todos os consumidores de arte se tornarem
especuladores, vendendo em curto prazo, os preços irão cair. Diante disso, a escolha de
para quem vender a arte no mercado primário é fundamental. As galerias compartilham
listas negras de compradores com comportamento especulativo.
Outra característica do mercado secundário é que grandes colecionadores tendem a
proteger seus investimentos. Em LEWIS (2008), o empresário José Mugrabi é citado
como um dos maiores colecionadores de Andy Warhol. Ele detém cerca de 800 peças
do artista em seu acervo. Se levarmos em conta que o artista produziu cerca de 8.000
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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peças durante sua vida, a figura 4 mostra que o senhor Mugrabi possui 10% de
participação de um dos investimentos em arte mais lucrativos dos últimos 20 anos.
Figura 4 – Valores de venda em leilões públicos filtrados por Andy Warhol e Picasso. Fonte:Artnet. (http://www.artnet.com)
Em entrevista a Ben Lewis, José Mugrabi fala abertamente que freqüenta todos os
leilões onde há “Warhols” importantes para garantir que o preço de mercado seja
mantido. Ele faz isso interferindo através de lances ou mesmo adquirindo a obra se ela
não atinge o preço mínimo estipulado pela casa de leilão. Uma venda pública que
mostra tendência de queda na demanda de “Warhols” pode representar uma perda
significativa na coleção de José Mugrabi. Mas o mesmo raciocínio ao contrário também
é válido: qualquer novo pico de vendas de “Warhols” o deixa mais rico. A imagem da
figura 4 mostra o pico dos valores de “Warhols” e “Picassos”, considerados pelas casas
de leilões os “papéis” mais facilmente comercializáveis. A queda nos valores ao final de
2009 é um reflexo da crise econômica mundial, do mesmo ano.
2.4 – ARTE COMO INVESTIMENTO
Em THORNTON (2010), na reportagem especial para a publicação inglesa “The
Economist” sobre o mercado de arte e suas perspectivas como investimento, o conceito
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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de “Blue Chips” é aplicado ao mercado de arte. Esse é um termo utilizado nas Bolsas de
Valores para designar as ações mais negociadas, as mais valorizadas pelo público. O
mesmo conceito também é visto em LINDEMANN (2006), com a mesma conotação de
objeto aceito como base do mercado de arte: se seu valor for depreciado, o mercado
como um todo sofrerá as conseqüências; se seu valor for apreciado, todos ganharam
com isso.
É possível usar essa hipótese proposta pelos dois autores para elencar alguns artistas
como “Blue Chips”. Seus valores não sofrem tendência de queda a não ser que o
mercado como um todo esteja em recessão. Dessa forma eles representam, em conjunto,
um possível termômetro sobre as trocas ocorridas no mercado de arte.
Tabela 2 – Os maiores preços de leilão atingidos por artistas contemporâneos entre julho de 2008 ejunho de 2009. Fonte: Artprice. (http://www.artprice.com)
Os artistas novos, ainda com pouca credibilidade no mercado, são investimentos mais
arriscados e de pouca liquidez. Já uma obra de um artista consagrado que tenha marcado
seu processo criativo possui valor histórico e, diante disso, seu potencial de
comercialização é grande por sua escassez intrínseca. Na tabela 2 é possível notar
alguns “Blue Chips” do mundo da arte contemporânea em ação: seu preço em leilões é
disputado e há interesse do mercado em deixá-los assim.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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2.4.1 – Mercado de arte e tecnologia da informação
De acordo com PINHO (2009) e THORNTON (2009), o mercado de arte se
especializou nas últimas décadas aliando-se a tecnologia, usando a tele presença junto
com o armazenamento e processamento de dados. O espaço do mercado tornou-se
global, num processo que começou nos anos 60 e 70 com a aceitação de que
compradores pudessem fazer lances por telefone. As facilidades trazidas pelas conexões
da Internet trouxeram mais compradores e aumentaram ainda mais a velocidade e o
acesso ao mercado. A tecnologia barateia o acesso, facilitando o alcance global a
excedentes econômicos intercambiáveis, uma parte considerável das transações já está
sendo realizada através de lances eletrônicos – uma transição análoga às transações que
ocorriam fisicamente à custa da força dos pulmões dos operadores na bolsa de valores e
agora acontecem atrás de terminais de computadores. Entretanto, os leilões de lotes
mais importantes ainda continuam sendo feitos presencialmente.
Já com o armazenamento e processamento de dados dos computadores interligados é
possível ter acesso rápido aos fatores intrínsecos da obra a ser comercializada, o
histórico do artista, o número de exposições em que ela participou, etc. O mapa da
legitimidade do artista pode ser construído em poucos segundos a partir de buscas em
sites especializados como ArtPrice (http://www.artprice.com) e ArtNet
(http://www.artnet.com). As casas de leilões, as galerias, os marchands e até mesmo os
artistas usam a Internet e seu poder de alcance global através de catálogos virtuais de
seu acervo.
O dado mais próximo de um barômetro do mercado é o índice de confiança no mercado
de arte, desenvolvido pela empresa ArtPrice. Esse índice baseia-se em respostas obtidas
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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com visitantes do site e se propõe a dar, em tempo real, uma leitura de tendências. As
perguntas da ArtPrice neste levantamento são:
Em sua opinião, seria agora o momento oportuno para comprar obras de arte?
[ ] Sim [ ] Não [ ] Talvez
É a sua situação financeira melhor ou pior do que era há três meses?
[ ] Melhor [ ] Pior [ ] Estável
Nos próximos três meses, você espera que o clima econômico seja
[ ] Favoráveis [ ] Desfavoráveis [ ] Idêntico
Nos próximos três meses, o que você espera que aconteça com o preços de arte?
[ ] Aumentem [ ] Caiam [ ] Sejam estabilizados
Apesar de pertencer a uma empresa isenta e respeitada pelos agentes do mercado de
arte, o “Art Market Confidence Index” sofre críticas pela pouca quantidade de
informação e pelo desconhecimento de quem está respondendo a pesquisa. Mesmo
assim, é uma referência que pode ser aprimorada. Para isso, a pesquisa deveria ser
direcionada reconhecendo os agentes do mercado de arte, sua regionalização e
importância dentro desse mercado num dado período de tempo.
2.4.2 – Razões para considerar arte como investimento
PINHO (2009, página 73) comenta que apesar do risco contido no investimento em arte,
a demanda está “... fortemente ligada ao mercado financeiro, a opinião geral tem sido
de que se trata de um bem de luxo escolhido pelo investidor por prazer estético e/ou
como proteção contra flutuações econômicas” Diante dessa análise sintética, a autora
dá quatro razões para se considerar o investimento em arte, descritas a seguir.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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Proteção da poupança contra desvalorização
Em momentos de incerteza monetária, os investimentos em propriedades físicas não
possuem a liquidez de dinheiro vivo, mas certamente são mais difíceis de perderem seu
valor diante de crises. O jornal americano “The Wall Street Journal” publicou em seu
site no dia 5 de janeiro de 2010, uma reportagem analisando uma venda de uma obra do
artista italiano Giacometti, que foi parte do acervo do Banco de Dresden por 30 anos.
A escultura de bronze “Walking Man 1”, leiloada pela Sotheby’s, é considerada
emblemática, a mais representativa de toda a produção artística de Giacometti. Por isso
seu valor atingiu US$ 104.3 milhões em Londres. O comprador anônimo pagou quatro
vezes o valor estimado pela casa de leilões. Essa obra é uma “Blue Chip”. Um
investimento que não irá perder seu valor por sua história, sua representatividade e pelo
fato de Giacometti fazer parte da cultura mundial com peças em acervos públicos e
particulares de bastante credibilidade.
Retorno: prazer estético e/ou ganho financeiro
O risco de colecionar arte é compensado pelo usufruto do prazer estético que a obra
proporciona. O uso desse valor estético não deprecia a obra, observando-se regras de
conservação e guarda. Retornando ao raciocínio de Adam Lindeman, o prazer de
encontrar o novo Picasso e ser reconhecido por seus pares, no caso outros
colecionadores, diz a todos que você possui muito mais do que apenas dinheiro para
comprar arte cara.
Ao falar sobre o retorno financeiro, Larry Gagosian, numa entrevista em THORTHON
(2010), afirma que Andy Warhol é notoriamente o novo Picasso. Suas contribuições
para a história da arte ainda não foram totalmente processadas e seu valor ainda deverá
subir mais. Gagosian, juntamente com Mugrabi, são os maiores detentores particulares
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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de “Warhols” disponíveis no mercado. Esse último dado não deixa a afirmação de
Gagosian totalmente isenta. Entretanto, se ele não acreditasse realmente no que fala não
teria formado um acervo tão grande assim de apenas um artista.
Demanda e oferta de reserva
As grandes variações de valores também afetam o mercado de arte. Em períodos de
desvalorização, os principais vendedores acabam se tornando compradores, visando o
mercado futuro. O mesmo acontece quando há grandes valorizações: pequenos
colecionadores começam a atuar como vendedores.
PINHO (1989, pagina 142), resume de forma clara e coerente esse comportamento dos
consumidores: “... para cada indivíduo há um preço de reserva para uma obra de arte
em particular, abaixo do qual a pessoa se torna um demandador de mais quadros e
acima o qual se torna um fornecedor de quadros.”
Especulação
São as negociações no mercado a termo, que obedecem as regras de compra e venda
como qualquer outro investimento. Comprar a termo significa que o especulador
acredita que obra será valorizada. Vender a termo significa que a crença é inversa, de
uma desvalorização em curto tempo. A oferta inelástica ou quase inelástica é a
responsável pelo lucro da especulação nesse mercado.
2.5 – ATRIBUIÇÃO DE VALOR
Neste item será apresentada uma hipótese de atribuição de valor às obras de arte
contemporâneas baseado em análise de marketing de produto de acordo com AAKER
(1998). Todo produto comercializável possui valores intrínsecos e extrínsecos que
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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influenciam seu valor de troca. Por valores intrínsecos, para este estudo, vamos
considerar o que é inerente da obra de arte contando com as características de seu
suporte e do meio no qual ela foi produzida. Já no caso de valores extrínsecos, serão
pontuados os conceitos subjetivos que existem apenas na mente das pessoas que
reconhecem o valor do produto. As obras contemporâneas serão tratadas como parte de
uma marca, uma grife destinada ao mercado de alto luxo. A grande diferença é que arte
não é um bem de consumo.
2.5.1 – Valores intrínsecos
A bolsa de arte do Rio de Janeiro (http://www.bolsadearte.com/) possui em seu site uma
forma de avaliação de obras de arte levando em conta suas características físicas. Tais
critérios são reproduzidos na tabela 3:
Tabela 3 – Critérios para avaliação de uma obra de arte. Fonte: Bolsa de Arte do Rio de janeiro.(http://www.bolsadearte.com.br)
CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO. BOLSA DE ARTE DO RIO DE JANEIROAutor Os artistas atingem cotações diversas, mesmo sendo contemporâneos e
com biografias assemelhadas.Técnica A valorização de uma obra obedece a seguinte escala:
óleo e/ou acrílica sobre tela e/ou madeira e cartão; guache ou têmpera sobre cartão ou papel; aquarela, pastel, lápis de cor e ecoline sobre papel; desenhos a nanquim, carvão, sanguínea, sépia e lápis; gravuras (litografia, xilogravura, gravura em metal, serigrafia);
Fase Somente um olhar retrospectivo é que consegue determinar quais as fasesmais valorizadas de um artista que configuram o auge de sua criatividade.Não obedecem necessariamente a uma ordem cronológica.
Dimensão O tamanho influi no valor de uma obra de arte.Conservação O bom estado de conservação é um fator que contribui para sua maior
valorização.Tema Cada artista possui alguns temas que o consagraram. É o que o mercado
define como tipicidade.Origem A procedência conta no valor final de uma obra de arte.Valorhistórico
A participação de uma determinada obra em algum movimento artístico ouexposições.
Bibliografia Obras citadas ou reproduzidas em livros e/ou catálogos.Modismo Existem épocas onde alguns temas e artistas são mais procurados pelo
mercado.Assinatura A falta de assinatura poderá diminuir o valor de uma obra de arte.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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A origem da obra é importante. Ou seja, a lista de ex-proprietários conta. Esse histórico
de compradores funciona como atestado de legitimação e credibilidade do mercado. Por
exemplo, se Charles Saatchi, o grande colecionador britânico, está nesta lista, todo o
aval de seu conhecimento de mercado é transmitido para obra. Isso não é algo
mensurável em porcentagens de valor, mas é um comportamento empírico observado
mesmo em mercados regionais.
Da mesma forma, o valor do contexto histórico da sociedade aumenta a exclusividade e
importância da obra. Se o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (Moma) realiza uma
exposição e pede uma obra emprestada, a legitimidade é criada pela curadoria do
museu. Num caso nacional, basta recordar a valorização da produção da artista Beatriz
Milhazes após a grande retrospectiva feita pelo Instituto Cultural Banco do Brasil no
Rio de Janeiro em 2004 e recentemente na Estação Pinacoteca, em 2009.
Em THEROUX (2008) e XIAOGANG (2009), o modismo, apesar de ser uma
característica intermitente, tem sido determinante nos países emergentes. Rússia, China
e Índia têm procurado resgatar sua cultura valorizando artistas do passado recente e,
sobretudo, aqueles que historicamente influenciaram a atual produção de arte
contemporânea.
Associado a esse fator de busca de passado cultural há um grande excedente econômico
intercambiável nas camadas sociais mais abastadas desses países, favorecendo a
especulação. Mas ao mesmo tempo, também intensificando o resgate de sua identidade
através da arte. Apesar de ser outro momento histórico, diferente da arte
contemporânea, a valorização do produto nacional é feito em conjunto e os artistas
locais contemporâneos são beneficiados. Em THORNTON (2010), é averiguado que
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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obras relacionadas ao período do império chinês estão supervalorizadas e não há
previsão para que a demanda seja estabilizada.
2.5.2 – Valores extrínsecos
Segundo AAKER (1998), os valores extrínsecos de um produto são subjetivos e
determinados por um posicionamento de marca. Através desse posicionamento, é
possível influenciar o público consumidor reafirmando tendências, corrigindo
comportamentos e construindo reputações. No caso do mercado de arte, podemos fazer
uma analogia, colocando as obras como se fossem produtos e o artista criador como a
marca geradora de valor.
Há um caminho longo para que um artista seja legitimado no mercado de arte. Se for
encarado como uma marca, deve adquirir credibilidade de vários agentes, num processo
que levou 50 anos no caso dos impressionistas e apenas 20 anos com os minimalistas
norte-americanos, como é citado em YENTOB (2008). A cada vez que um agente do
mercado faz um movimento em direção a produção de um artista, esse último vai
ganhando notoriedade como se fosse um marca. A recomendação e transferência de
credibilidade num ambiente de variáveis subjetivas é o que influencia a percepção de
valor.
Não existe um roteiro rígido de como ser legitimado. Um bom exemplo de uma exceção
ao caminho esperado é um artista da geração YBA (Young British Artists), que se
tornou sinônimo de mercado na primeira década do século XXI: Damien Hirst. O caso
desse inglês é emblemático, pois subverteu o caminho normal da venda de sua produção
para o mercado primário e fez um leilão massivo com suas obras. Ele usou, no limite, a
qualidade mais preciosa de suas obras: a escassez. Como se não bastasse isso, Hirst
realizou o leilão um dia após a data histórica da concordata do Leman Brothers (15 de
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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setembro de 2008). De acordo com o jornal “The New York Times” de 17 de setembro
de 2009, o leilão de Hirst arrecadou US$ 200.7 milhões com venda de 218 itens. No
auge da crise financeira, o valor de Hirst não só foi mantido como superado em alguns
trabalhos mais iconoclásticos do artista.
É possível esquematizar um caminho de ganho de validação e credibilidade que aos
poucos legitima a produção artística e fortalece o artista como marca de si mesmo. No
próximo capítulo, através de entrevistas com agentes do mercado de arte, esse caminho
será testado e ajustado conforme exemplos empíricos sejam relacionados.
Além de ser criativo, o artista precisa ter uma temática que seja interessante no período
em que atua, sendo reconhecido por seus pares. O passo seguinte é talvez o primeiro
grande desafio: encontrar um galerista que possa se responsabilizar pela distribuição e
comercialização de suas obras. Com um galerista acolhendo sua produção e muitas
vezes comprando toda coleção antes mesmo de ser produzido, o artista consegue
dedicar-se ao trabalho. Em GILL (2005), é descrito um exemplo interessante que
aconteceu nos anos 60 com a galerista Peggy Guggenheim e o artista Jackson Pollock.
Ele recebia mensalmente uma mesada que o libertou para dedicar-se a sua produção.
Pollock também contava com grande defensor público, o crítico de arte Clement
Greenberg, que abraçou a causa dos expressionistas abstratos e o colocou como ícone
do movimento.
Voltando a linha de legitimação e credibilidade, após conseguir um galerista, começa o
trabalho de divulgação e o “product placement”. Neste trabalho será considerado
“product placement” a curadoria dos espaços físicos mais pertinentes, com o objetivo
de que as obras sejam vistas pelo maior número de pessoas influentes que possam
continuar o processo de legitimação. Esse trabalho pode ser feito tanto pelo artista
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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quanto pelo proprietário da galeria, os dois agentes mais interessados no
reconhecimento das obras. É possível definir uma hierarquia de poder de legitimação,
sendo que há pequenas variações em função da credibilidade do agente que interage
com a obra. Por exemplo, uma exposição individual numa galeria do interior de São
Paulo fica aquém do empréstimo de uma obra para uma exposição temporária em
Berlim.
As feiras de arte e bienais também exercem forte poder de legitimação, por serem
espaços de grande atração de compradores e interessados em arte. Isso justifica o
esforço de galeristas em enviar obras, arcando com custos de transporte e do
deslocamento do artista para onde irá ocorrer a feira ou bienal.
Um colecionador que cultiva uma coleção respeitável também é um ótimo exemplo de
espaço pertinente. Entretanto, o topo da cadeia de legitimação são os museus e acervos
de visitação pública. Se os leilões realizam a transformação de objeto mundano em
objeto de valor, da mesma forma quando um museu pede uma obra emprestada ele age
socialmente exercendo sua função de reconhecimento do objeto como arte.
Além de agir como “product placement”, a mídia especializada é o espaço no qual os
críticos de arte, os curadores, os leiloeiros, livreiros e expositores prestam o serviço
informativo ao mercado da arte. A opinião emitida pela mídia pode validar ou arruinar
reputações, ajudando a consolidar um posicionamento de artista como marca ou
alertando o mercado para uma possível queda pelo esgotamento do modelo criativo
adotado pelo artista sendo avaliado. É o efeito legitimador.
O gráfico da figura 5 possui um esboço empírico da organização do mercado de arte,
que será posto à prova durante o próximo capítulo desta monografia.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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Figura 5 – Hipótese de aquisição de credibilidade a partir do reconhecimento dos agentes domercado de arte na formação de “Blue Chips”. Fonte: própria.
2.6 – HIPÓTESES PARA AUMENTO DA DEMANDA
A análise do mercado de arte permitiu levantar algumas hipóteses para o aumento da
demanda que elevou os preços a patamares recordes. Os acontecimentos próximos
ao estouro da bolha de 2008 colocaram em cheque a aposta de que o mercado de arte
sofreu uma bolha e que não se sustentaria por muito tempo. As hipóteses levantadas
abaixo serão validadas e refutadas através de pesquisas de campo, por meio de
entrevistas com profissionais do mercado.
Análise do efeito “Blue Chip”, que identifica as obras mais seguras e cuja
liquidez é garantida;
Novos colecionadores em mercados emergentes surgiram nos últimos anos. Sua
necessidade de comprar credibilidade ocidental, ou seja, arte já legitimada,
ajudou a inflacionar os preços e a descobrir novos agentes produtores locais;
Há excesso monetário no mundo por conta da década de crescimento do PIB
global. Há mais moeda do que boas opões de investimento, com um número
menor de agentes vendendo arte legitimada do que essa nova demanda necessita;
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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Quando colecionadores como Larry Gagosian e José Mugrabi detém grande
parte da produção de um artista e continuam validando-o, tal certificação
legitima a obra pelo contexto dos colecionadores e não pela defesa de ativos
econômicos que ambos são detentores;
A globalização que trouxe o acesso a qualquer galeria, feira, museu e leilão em
tempo real, retirando as fronteiras do mercado. Ao mesmo tempo, a globalização
transformou a arte local em interesse mundial, influenciando os valores que são
baseados pelo mercado exportador.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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3 – PARTE PRÁTICA
3.1 - CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Neste capítulo, as hipóteses serão confrontadas em consultas com especialistas do
mercado de arte. Entre eles há pessoas ligadas a galerias, colecionadores, museus e
artistas. A junção dos pontos de vista dos diferentes agentes do mercado de arte deverá
ser generalizada para refutar ou complementar o estudo teórico da primeira parte desse
trabalho.
Diante do tempo escasso para pesquisa, a decisão mais prática foi recorrer às pessoas
próximas que trabalham no mercado de arte em São Paulo e Rio de Janeiro. Encontros
por telefone, por e-mail e conversas realizadas na Feira de Arte de São Paulo em Abril
de 2010 (SP-ARTE, 6ª. edição) foram os meios para conseguir opiniões e reflexões
sobre a precificação do mercado de arte e a explicação para a escalada de valores
durante a primeira década do século XXI.
Nas próximas páginas serão relatados resumos das entrevistas. A metodologia adotada
para entrevistas seguiu uma dinâmica própria, mas sempre atento aos seguintes passos:
a) Apresentar o projeto de pesquisa e as expectativas de geração de
conhecimento diante das questões propostas.
b) As entrevistas devem ser pautadas pelas hipóteses, pedindo ao entrevistado
que liste exemplos práticos do mercado toda vez que uma nova informação
entrar no contexto.
c) As entrevistas também devem checar se o comportamento do mercado
globalizado, presente na bibliografia adotada, é aplicável ao mercado local
brasileiro.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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3.2 – RESUMOS
3.2.1 – Ana Carolina Rocha, colecionadora
Ana coleciona arte há mais de vinte anos. Trabalhou como publicitária e nunca deixou a
paixão pelas artes ser algo secundário em sua vida. Estuda bastante arte contemporânea,
já visitou as principais feiras e conhece pessoalmente artistas nacionais e internacionais.
Sua experiência como colecionadora é manifestada em seus questionamentos quando
obras atingem valores além dos suportados pela demanda não especulativa.
O comportamento de um colecionador é como um vício: ele persegue cada nova
aquisição durante um longo tempo e acredita no artista que está comprando. Segundo
Ana, arte é um bom investimento quando você entende e gosta de arte. Do contrário,
pode servir como uma forma nada inteligente de empatar dinheiro apenas como aspecto
decorativo.
Ana explicou que os leilões são arenas onde os mesmos jogadores se encontram sempre.
No mercado brasileiro, há pouquíssimas pessoas que podem vislumbrar a compra de um
objeto de arte e todas se conhecem. O grande segredo, segundo ela, é prestar atenção
nos catálogos naquilo que pode estar avaliada abaixo de seu valor de mercado. Tal
situação acontece várias vezes porque há modismos no mercado que influem no preço,
sem prestar atenção para a essência e o histórico das obras e do artista. Muitas vezes
esse modismo faz com que obras interessantes sejam descartadas no mercado a um
preço convidativo, mas apenas quem tem olho treinado consegue aproveitar tais ofertas.
Por isso, a figura do curador ou do arquiteto especialista em arte é muito comum no
eixo Rio-São Paulo.
Há obras que jamais perderão seu valor, comparáveis às ruínas da civilização greco-
romana que foram descobertas durante o renascimento italiano. O valor representativo
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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irá transparecer mesmo que outras instituições civilizatórias importantes venham a ser
questionadas. O ponto é que arte quando consegue ser separada do modismo, vira uma
representação da humanidade. Esse é o conceito de “Blue Chips”, explicado de uma
forma não econômica pela entrevistada.
Ana também comentou que, em última análise, os compradores é que determinam o
preço das obras. Seja pelo seu relacionamento com os artistas, com as galerias ou
mesmo pela sua habilidade em participar de leilões, os compradores ditam os valores
que individualizam as obras. Atualmente, os preços da arte brasileira estão bem
elevados e há produções e artistas que ultrapassam o caminho da arte para quase caírem
no marketing e na publicidade.
Diante dessa afirmação, Ana começou a relacionar os preços da chamada “Street Art”,
que se encontram inflacionados desde que foram adotados pelas revistas de
comportamento direcionadas para classe A/B. O fenômeno começou no início da década
quando os pichadores ganharam o status de grafiteiros por transformarem o cenário
urbano com seus questionamentos e críticas. Nesse movimento recente, OSGEMEOS
são dois artistas plásticos gêmeos que trabalham juntos desde o começo do movimento
que saiu das ruas e foi parar dentro das galerias. Eles são o ícone de um grupo de
artistas cuja trajetória encontra-se no ápice do mercado, de acordo com os preços
praticados na última SP-ARTE. Ainda segundo Ana, quando um suporte artístico se
sujeita pelo modismo a ser enquadrado em padrões pré-determinados, ele perde sua
originalidade e parte de sua legitimação adquirida ao longo dos anos. Um graffiti não se
tornará arte por estar emoldurado, dentro de uma galeria. Isso, na verdade, é nocivo,
pois retira a obra de seu contexto, que é estar nas ruas. Essa relação delicada, segundo
ela, é que faz com que o “Street Art” esteja no início de seu declínio, sendo arrebatado
principalmente por colecionadores de capitais distantes.
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3.2.2 – Henrique Luz. Estudioso, crítico, colecionador e representante do MASP
Henrique já trabalhou diretamente com artistas e hoje é responsável por parte das
montagens e exposições do MASP. Ele não é curador, mas acaba sendo responsável por
projetos especiais, marketing e pela assessoria de imprensa do museu. Ao saber do
assunto principal e das hipóteses da monografia, ele mencionou um fator importante em
todo o processo de legitimação listado na parte teórica: os relacionamentos entre
pessoas que favorecem a distribuição da legitimidade.
Os artistas contemporâneos vivem sua própria marca e seu desempenho social reflete
seu valor de mercado. Eles devem aparecer e se movimentar, expandindo seu núcleo de
influência para adquirirem reconhecimento. Nesse instante, a proximidade com a classe
social que possui excedente econômico suficiente para comprar arte é fundamental. É a
diferença de vender arte na rua atrás do MASP e de começar com a curadoria na galeria
de um conhecido da família. Esse ponto demonstra um alto custo de entrada no
mercado. É uma restrição que ajuda a manter os preços altos e a exclusividade de
participação. Não basta ser bom e ter uma proposta artística coerente e em voga com o
ambiente que o cerca. É preciso ter os contatos certos para conseguir projeção.
Sobre Instituições que funcionam como bancos centrais de legitimação, o MASP é
citado como exemplo. Sendo um dos principais museus da América Latina, quando o
MASP se curva para uma específica manifestação artística, ele outorga todos seus anos
de curadoria e sábias aquisições de obras para os artistas escolhidos. Assim acontece
com a exposição anual da Coleção Pirelli, que ano após ano ajuda a legitimar a
fotografia e os artistas relacionados. Outro exemplo interessante foi a “Street Art” ter
invadido o pavilhão inferior do MASP no final de 2009. Esse evento ajudou a valorizar
a Galeria Choque Cultural e os artistas que participaram da mostra coletiva.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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Há uma particularidade na arte contemporânea brasileira que se refere aos artistas que
começaram a produzir durante a década de 1980. Os jornalistas culturais cunharam esse
grupo como “Geração 80”. Entre os agentes do mercado de arte, a principal
característica deste grupo é ser legitimado por críticos e curadores, possuindo coerência
em sua produção artística e com várias retrospectivas sobre o conjunto das obras. Tais
artistas são considerados colecionáveis pelo histórico que representam e pela ligação
temática e formal que existe entre eles. “Blue Chips” nacionais, apostáveis como
investimento por quem se identifica com seus expoentes. Os principais representantes
são Alex Flemming, Beatriz Milhazes, Daniel Senise, Leda Catunda, Leonilson, Luis
Ernesto, Luiz Zerbini e Nuno Ramos. Foram estes que foram lembrados durante a
entrevista e são os que relativamente aparecem mais nos catálogos e nos leilões de arte
contemporânea brasileira.
Henrique também fez um comentário que não está descrito no processo de formação de
valor: o artista é detentor da primazia da idéia. Por exemplo, Jeff Koons, Louise
Borgeois e Tomie Othake fazem projetos grandiosos que são executados por mestres de
obras e uma grande variedade de artesãos. Eles controlam uma oficina que muitas vezes
pode estar localizada na China, no caso de Jeff Koons. A produção artística se tornou
um processo especializado, quase industrial, mas que toma todo o cuidado para não
acabar com seu principal valor intrínseco – a escassez.
Henrique finaliza enfatizando que o mercado de arte possui altos e baixos como
qualquer mercado, sempre com alguns agentes interessados em apostar na subida ou na
queda, pois a especulação bem feita gera dinheiro. Para entrar no mercado é preciso
uma boa dose de sangue frio e muito dinheiro disponível.
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3.2.3 – Baixo Ribeiro. Fundador da Galeria Choque Cultural
A galeria Choque Cultural é especializada em novos artistas da geração “Street Art”,
que saiu das ruas para as galerias e se tornaram populares em meados da década. O
espaço expositivo é mutante e cuidado nos mínimos detalhes pelos próprios artistas, que
transformam suas exposições em autênticas instalações, nas quais as obras são imersas.
Segundo Baixo Ribeiro, a galeria teve papel importante na valorização das novas
formas de arte que começaram pelos jovens e que agora se encontram nos holofotes dos
colecionadores.
Cada artista, no processo de inserção no mundo da arte, deve ter seu trabalho
reconhecido em algumas instâncias. A primeira é sempre a dos amigos, colegas e da
escola. Em seguida, vêm os salões e prêmios que são pouco representativos no Brasil.
Um dos caminhos para dar suporte a novos artistas é o intercâmbio e a parceria com
galerias estrangeiras, dando oportunidade de residência dos artistas da Galeria Choque
Cultural em outros países. Em contrapartida, a galeria também convida artistas
estrangeiros para trabalhar no Brasil e assim conhecerem a produção nacional,
influenciarem nossos artistas e, ao mesmo tempo, serem influenciados por eles.
Os museus são órgãos de reconhecimento por sua própria definição. Existe nesse
campo, toda uma escala de importância que depende da hierarquia das instituições, dos
curadores envolvidos e da própria natureza das exposições em questão. O que importa
para o currículo do artista é a qualidade de cada participação e a coerência com a sua
carreira. Outro patamar de reconhecimento importante para o artista plástico é a
literatura em torno dele. Livros bem editados, teses universitárias, ensaios feitos por
críticos importantes são fatores que aumentam a exposição e a legitimidade dos artistas.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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Entrar no mercado de arte e criar uma rede de colecionadores em torno de si é uma
opção para o artista, mas não uma regra. Os artistas podem criar outras formas de
parceria para realização de seus projetos, que independam dos colecionadores. Podemos
citar como exemplos para sair da sombra dos colecionadores o mecenato, as comissões
estatais ou a associação com outros tipos de patrocinadores. Mas o modelo considerado
como melhor ainda é a inserção no mercado através da representação por galerias de
arte. Existem diversos modelos de relacionamento entre artistas e galerias, mas é bom
lembrar que vão desde a galeria-educativa – que forma artistas e colecionadores, como a
Choque – até galerias que praticam a simples comercialização de obras. Já os
colecionadores vão desde os institucionais, que compram para museus e outros acervos
importantes, até o colecionador mais simples, que compra apenas “para decorar a casa”.
Olhando sem preconceito para qualquer categoria intermediária, todos têm o poder de
legitimar um artista.
Há casos em que alguns colecionadores colaboram indiretamente entre si, formando
uma rede de apoio em torno de um determinado artista. Essa comunidade age como um
grupo de fãs que custeiam projetos com pequenas aquisições. Em certos casos,
conseguem viabilizar projetos mais ousados dividindo o risco do investimento e
cobrindo custos de material. Isso acontece não só pela compra de originais, mas também
pela comercialização de múltiplos, que são um número determinado de cópias de uma
obra, geralmente de suporte fotográfico ou computadorizado. Livros e produtos
industrializados com referências iconográficas da produção do artista em questão
também entram como suporte de investimento. Alguns artistas chegam a envolver-se na
divulgação de produtos populares, tendo suas imagens emprestadas para campanhas
publicitárias.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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A fama e popularidade também podem ser consideradas instâncias de reconhecimento
muito importante para alguns artistas, mas não necessariamente de todos. Cada caso é
um caso e a galeria deve projetar o artista de acordo com sua essência.
Há muitos colecionadores estrangeiros acompanhando o trabalho dos artistas
representados pela Galeria Choque Cultural. Com seis anos de existência, há uma
presença constante em algumas praças (Nova Iorque, Londres e Los Angeles), mas a
galeria ainda não freqüenta as feiras internacionais de arte. Isto significa que ainda não
há uma rede regular de compradores estrangeiros.
Os artistas da Galeria Choque Cultural têm valorizado desde o começo da atuação da
galeria, promovendo-os no mercado de arte. Isso concretiza a importância das conexões
da galeria no processo de legitimação do artista e de sua produção. Entretanto arte não é
um bom investimento financeiro. Na galeria, a sugestão é que o colecionador nunca crie
expectativas de valorização rápida de nenhuma obra de qualquer artista. A carreira de
um artista é construída num ritmo diferente para cada um, com características e
processos criativos distintos e que precisam de tempos de maturação próprios.
Baixo Ribeiro comenta que o colecionador deve ter consciência de que, ao comprar uma
obra de arte, ele tornar-se parceiro do artista no conjunto da sua obra. Indo mais fundo,
tornar-se investidor de toda a cena artística que gira em torno da sua coleção. O
colecionador ou o investidor de arte contemporânea terá retorno do seu investimento se
alguns fatores convergirem. O primeiro deles é se a obra adquirida tornar-se relevante
na carreira do artista. O segundo fator é se o artista ficar relevante entre os artistas do
seu tempo. Finalmente, o terceiro e último fator é se o artista pertencer a uma cena que
se torne relevante historicamente. Partimos da obra, contextualizando-a na carreira do
artista e contextualizando o artista em seu meio histórico e social.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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A recomendação para colecionadores iniciantes é saber avaliar e esperar. É preciso um
bom tempo para o colecionador ter retorno sólido do seu investimento. A Galeria
Choque Cultural aconselha seus colecionadores a pensarem que estão construindo um
patrimônio para seus descendentes
3.2.4 – Beto Atílio, colecionador e proprietário de loja de antiguidades.
Tive o prazer de conhecer Beto durante minha visita à sexta edição da SP-Arte. Beto é
um colecionador apaixonado, que faz questão de elencar os artistas que gosta com uma
narrativa para cada peça adquirida. Esse comportamento é comum entre colecionadores:
mostrar sua coleção para quem sabe apreciá-la e contar pormenores do processo de
aquisição, as dúvidas e como as transações foram feitas. Uma narrativa sólida,
romanceada a ponto de quase personificar o objeto de arte.
Durante a visita a feira, Beto apresentou-me alguns artistas, colecionadores e galeristas.
Através de sua rede de contatos foi possível observar que o mercado de arte é pequeno e
todos se conhecem, mesmo com a expressividade internacional que as obras brasileiras
adquiriram nos últimos anos.
É interessante notar que Beto faz o papel intermediário entre os agentes. Em seu
estabelecimento, um misto de antiquário e galeria, ele possui uma coleção de arte junto
com objetos decorativos de produção escassa. Ou seja, após conhecer seu cliente ele o
apresenta ao mercado de arte com sua visão especializada e seu gosto apurado, fazendo
uma seleção de obras interessantes dentro de seu acervo.
Ana Maria Tavares é uma das artistas com a qual Beto se relaciona e ajudou no começo
da carreira. Ele chegou a viajar junto com a artista para representá-la no exterior. Esse
tipo de relacionamento que é próximo ao mecenato é comum entre colecionadores. Ana
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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Ramos, entrevistada anteriormente, afirmou que ela e seu marido ajudam alguns artistas
que ainda não foram descobertos por acreditarem em seu potencial. E essa ajuda não é
necessariamente financeira. Um colecionador possui muitos contatos e, dependendo do
seu grau de importância, um poder de legitimação razoável. Ao abraçar a causa de um
artista novo, ele sinaliza ao mercado que toda sua “expertise” reconhece um novo
talento. Os movimentos no mercado são gradativos, mas ao fazer essa indicação, o
colecionador coloca em evidência para as galerias um elemento novo. Hoje Ana Maria
Tavares é representada pela Galeria Vermelho. Já participou de várias exposições
nacionais e internacionais, tendo obras em acervos importantes. Na quinta edição do
evento, em 2009, as obras de Ana atingiram valores de até U$ 18 mil.
Sobre os valores atingidos pelas obras, Beto comenta que os preços aumentaram
bastante nos últimos tempos. Alguns artistas chegaram a dobrar ou triplicar seu valor
em questão de poucos anos devido ao aumento na demanda. Com a estabilidade
econômica e a projeção de alguns artistas internacionalmente, o mercado de arte
mundial começou a voltar-se para o Brasil. A produção da Geração 80 é a mais concisa
e procurada, pela sua própria cadeia de legitimação. Esse grupo de artistas é um dos
mais valorizados e procurados tanto por colecionadores quanto por fundos de
investimentos, bancos e instituições que apóiam arte e adquirem algumas peças. Ainda
sobre os preços, Beto declarou que em seu estabelecimento não realiza descontos ou
barganhas. Segundo ele, cada peça possui seu preço e isso deve ser respeitado ou a arte
fica banalizada. É a diferença entre preço e valor: o preço diante de uma crise pode ter
que ser reduzido em relação a outros bens, mas o valor de uma obra é aquele atribuído
por críticos, colecionadores, galeristas e toda a cadeia de legitimação de valor do
mercado de arte.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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Beto comentou que geralmente as galerias brasileiras ficam com 20% do valor sobre a
venda de uma peça. Esse percentual é relativamente superior se comparado ao praticado
pelas galerias de Londres e Nova Iorque. Lá se costuma trabalhar com uma margem de
10% sobre o valor final, sem impostos. No caso brasileiro há dois pontos que podem
ajudar a explicar esse comportamento. O primeiro é que o mercado está aquecido e isso
segura os preços em patamares elevados. O segundo é que há um custo para as galerias
nacionais se projetarem internacionalmente. No circuito das artes plásticas, é
imprescindível que a arte contemporânea seja globalizada. É preciso haver
representações nas principais feiras e bienais, é preciso participar de leilões, saber
quando e como realizar doações para museus e instituições. Tudo isso requer recursos
maiores do que para quem está geograficamente inserido no contexto de centro de arte
mundial (Londres e Nova Iorque).
3.2.5 – Visita a sexta edição da SP Arte (Abril/Maio de 2010)
Considerada o maior evento de Arte da América Latina, a SP Arte vem sendo realizada
desde 2005, sempre entre abril e maio. A feira tornou-se parte do calendário da cidade,
seguindo o modelo da inglesa Frieze e da suíça Art Basel. Esses eventos são notórios
por acontecerem em poucos dias, movimentando altos valores e valendo-se de uma
grande concentração dos agentes do mercado de arte interagindo entre si.
O histórico da feira mostra a evolução do mercado de arte brasileiro. Hoje ela pode ser
considerada um termômetro mais acurado que os leilões, servindo para indicar o
tamanho da demanda por arte. Em 2005, em seu início, a feira era tímida diante de um
mercado em que artistas brasileiros precisavam ser reconhecidos internacionalmente
para conseguirem alguma expressividade diante do gosto ainda pouco apurado dos que
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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possuíam os recursos necessários para comprar arte. Ao fazer um estudo dos resultados
das últimas das edições, é possível notar que o volume de negócios cresceu junto com o
número de obras, artistas, galerias e público, como pode ser visto na tabela 4.
Tabela 4 - Resumo de seis anos de SP-ARTE. Fonte Isto é Online (http://www.istoeonline.com.br)
Segundo o Jornal Estado de São Paulo (O ESTADO), o volume de vendas declarado
pela diretora do evento, Fernanda Feitosa, ficou entre R$ 30 e 32 milhões de reais. Um
aumento significativo de 15% se comparado com a edição do ano anterior. Ainda
segundo a mesma reportagem, a Bolsa de Arte do Rio de Janeiro realizou dois leilões
que renderam cerca de R$ 2 milhões cada um, com destaque para tela de Cildo Meireles
(“This Is a Canvas, This Is a Box”, de 1996), que foi arrematada por R$ 400 mil.
A demanda define o formato de apresentação
O primeiro dia da feira é apenas para convidados. Mesmo assim, os colecionadores
possuem um convite especial para calmamente observarem o acervo de cada galeria e as
novidades de seus artistas preferidos antes da abertura oficial para a imprensa e
interessados pela arte. De acordo com vários representantes de galerias, são os
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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colecionadores que movimentam os maiores valores da feira e por isso há esse
tratamento diferenciado. Além de terem tratamento diferenciado na SP-ARTE, os
colecionadores são os mesmos que movimentam os leilões que acontecem na mesma
semana da feira.
Se pensarmos estrategicamente, como nas análises mercadológicas de posicionamento
de marca de AAKER (1998), os colecionadores são o “target” principal de um evento
como esses. Todavia não são os únicos. Além dos agentes já conhecidos e que
movimentam o mercado de arte durante todo o ano, a feira é uma oportunidade de
converter amantes de arte com potencial econômico ativo em novos colecionadores.
Esses últimos podem ser considerados “targets” complementares, cada vez mais
importantes.
Por meio de observação in loco, é possível notar que a feira se organiza para atender a
três tipos de públicos: o colecionador avançado, o colecionador iniciante e o amante de
arte que potencialmente poderá se tornar um colecionador. Nessa última categoria
entram a imprensa especializada, os artistas, os estudantes de arte e toda miríade de
pessoas interessadas ou que trabalham com arte, mas que ainda não despertaram a
necessidade de colecionar. O tratamento é diferenciado para cada “target”, feito de
forma cuidadosa e que de nenhuma maneira exclua potenciais consumidores.
Segundo um representante da Casa Triângulo (importante galeria com sede na cidade de
São Paulo, presente desde a primeira versão da feira), o evento é reconhecido por trazer
sempre o melhor da produção de cada artista. As obras mais conhecidas estão bem
visíveis, ocupando lugares nobres nos stands e constam no catálogo da feira. Elas são as
mais representativas e por isso são mais valorizadas. Nessa sexta edição da feira, a
homenagem feita à artista plástica Maria Martins, a principal representante do
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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movimento surrealista brasileiro, serve como exemplo. Era de sua autoria a peça mais
valiosa exposta na feira: uma escultura estimada em R$ 1,5 milhão. Por representarem o
melhor da produção artística, essas obras atraem um público novo ávido e interessado
em arte, que começa a aprender a colecionar.
Além das obras expressivas e valorizadas, as galerias tem o cuidado de expor trabalhos
mais acessíveis, cujos preços variam em função do suporte, dos materiais, do autor e da
representatividade diante da produção do artista. Essa exposição de obras diversificadas
é racional, feita para criar intencionalmente novos agentes da demanda. Esse “target”
precisa sentir e racionalizar o porquê de adquirir obras de arte. Um evento com muitas
pessoas falando em valores altos e citando obras conhecidas ajuda nesse processo de
familiarização. Um colecionador principiante até pode ter recursos para adquirir uma
dessas obras, mas precisa ser treinado no ato de colecionar para conseguir enxergar
claramente o investimento e a dedicação necessários quando faz uma aquisição. As
obras complementares e mais acessíveis entram então como excelentes opções por
estarem no mesmo contexto curatorial (a galeria) das obras mais conhecidas e
obviamente por serem relativamente mais acessíveis.
Segundo explicação de um representante da Galeria Vermelho (outro expositor
importante, com sede na cidade de São Paulo e também presente desde a primeira
versão do evento), a “aquisição” é como um contrato que o colecionador faz com o
artista. Um casamento de interesses que ganha importância pelos valores envolvidos. Se
as obras fossem muito acessíveis e produzidas em grande quantidade seriam
descartáveis, tornando-se objetos de desejo puramente decorativos. O valor alto é um
seguro que mantém a seriedade das transações no mercado de arte. E o colecionador
precisa acreditar no que está adquirindo.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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Os altos investimentos são feitos por colecionadores com olhos treinados, ou
assessorados por críticos e curadores que ajudam a criar a expectativa da compra,
valorizando o desejo de consumo e o status que o novo elemento irá determinar ao se
juntar às outras obras da coleção. Em muitas galerias se fala em “namorar a obra antes
de comprá-la”. Essa criação de desejo sustenta os altos valores e transforma o ato da
compra em algo significativo, distante dos acontecimentos do cotidiano. Por isso todos
os agentes evitam falar em “comprar”. No caso de obras de arte o verbo utilizado é
“adquirir”.
De acordo com depoimento do representante do Instituto Moreira Salles, as fotografias
são o suporte ideal para quem está começando a colecionar. As características que
tornam a fotografia um suporte racionalmente recomendado são o seu preço acessível e
seu aspecto de fácil fruição estética – diferente, por exemplo, de uma instalação ou de
uma escultura que necessitam de um apartamento com pé direito de três metros e um
alto investimento. Ainda segundo o mesmo representante, geralmente quem adquire
obras expressivas e valorizadas normalmente faz outras aquisições menores.
Todos os galeristas são prestativos e conseguem em poucas palavras contextualizar as
obras dentro do momento de vida do artista e sua importância na história da arte
brasileira e/ou mundial. O discurso é geralmente parecido, com mais ou menos
envolvimento dependendo do interesse mostrado pelo potencial comprador, mas pode
ser resumido da seguinte forma:
a) O artista é apresentado e reconhecido como marca. Os atributos que definem o
artista e estão presentes na obra em questão são listados e contextualizados para
mostrara unicidade da possível aquisição;
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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b) A partir disso, segue-se uma cadeia de participações da obra em exposições,
salientando o contexto diante de sua significância dentro do mercado de arte;
c) Finalmente, em alguns casos de ex-proprietários notórios, o histórico de
compradores é citado. Mas não gratuitamente: sempre existe uma narrativa que
justifica a unicidade da obra e as razões pelas quais tal artista foi descoberto,
tornando a aquisição quase que um romance único onde o final feliz depende
apenas da paixão do futuro comprador.
A legitimação e o reconhecimento social através da arte.
Entre os vários agentes do mercado de arte entrevistados, dois colecionadores ingleses
casados e que moram há vinte anos no Brasil, foram os que mais contribuíram para
mapear um histórico da criação da demanda por arte no país. Eles salientaram que a arte
está ocupando o lugar no imaginário das classes mais altas. Esse imaginário estava
dominado pela moda, pelos carros e por outros bens de consumo durante a década de
1990. Em pouco tempo, com a massificação de objetos de luxo, perdeu-se a áurea da
exclusividade. Isso, aliado ao acúmulo de capital e ao período de desenvolvimento
econômico do país na última década, favoreceu o florescimento de arte como opção de
investimento e reconhecimento social. Os artistas brasileiros começaram a ser
valorizados, principalmente os do período de ruptura modernista, no qual o Brasil se
inseriu no contexto artístico mundial. Por isso, os representantes do Grupo da Família
Artística Paulista (artistas de imigração européia que trabalhavam em São Paulo no
começo do século XX) são um exemplo de investimentos mais seguro e valorizado no
contexto atual.
O cultivo do gosto pela arte contemporânea tornou-se símbolo de posição social, de
riqueza e, sobretudo, de conhecimento de uma área que requer dedicação e muitos
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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recursos disponíveis. Ser reconhecido como um colecionador é salientar sua
personalidade através da diferenciação vinda do capital cultural e intelectual adquirido.
“Só há prazer em mostrar nossa coleção para quem tem olhos que reconhecem o
investimento monetário e intelectual representado pelo nosso conjunto de obras. De
certa forma, nossas aquisições nos definem”, eles complementaram no final.
3.2.6 – Professora Dra. Diva Benevides Pinho, economista e estudiosa das artes.
A Professora Dra. Diva Pinho é autora de alguns dos livros que serviram para a
construção da base teórica desta monografia. Ela gentilmente cedeu alguns de seus
livros junto com algumas horas de explicação e comentários a respeito das pesquisas
que fez sobre arte como investimento. Professora Diva começou nossa entrevista
comentando que seu interesse por arte começou perto dos cinqüenta anos, quando
procurava outros assuntos para desenvolver seus estudos. Ao pintar seus quadros,
começou a questionar a razão de um Picasso atingir valores milhares de vezes
superiores aos seus. Seu interesse voltou então para a valorização da arte e o processo
de reconhecimento. É preciso complementar que seus quadros até hoje enfeitam as
paredes das salas de professores na Faculdade de Economia da USP.
A arte sempre teve sua representação direcionada pela sociedade e pelos eventos
históricos que marcaram essa sociedade em questão. Algumas vezes servindo a política,
outras vezes servindo a religião, mas sempre gravitando ao redor de eventos importantes
e legitimando-os, determinando-os para a posteridade. Com o desenvolvimento das
cidades italianas no século XIV, surge a figura do Mecenas, com expoente para a
família Medici. Esses agentes, junto com a Igreja e o Estado, foram os principais
formadores da demanda de arte até o surgimento da burguesia. Por conta desses novos
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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entrantes na demanda por arte, o suporte foi diminuído e a arte passou de grandes
murais, tapetes e obras enraizadas na arquitetura espacial para quadros menores e
transportáveis. A arte tomou vida e podia passar de um proprietário para outro. Surge o
mercado de arte e com ele o “marchand”, o conhecedor do mercado que faz a união da
demanda com a oferta.
Ainda existem exemplos de mecenatos e as obras para Igrejas, associações e instituições
públicas continuam até hoje. Nos anos 30, podemos citar o governo americano
financiando artistas que pintavam murais durante o período da grande recessão. Mais
tarde esse grupo caracterizou-se como “muralistas”, influenciados diretamente por
Diego Rivera (mexicano, que visitou os EUA diversas vezes nesse período). Outro
exemplo importante de mecenato, já mencionado nesta monografia, foi Peggy
Guggenheim durante o ápice da segunda grande guerra. Ela emigrou vários artistas
europeus e ajudou o desenvolvimento de um novo tipo de arte, até então desconhecido
nos EUA. Sua influência na sociedade americana permitiu acolher nomes importantes,
como Marcel Duchamp e Max Ernest.
Em nossa época contemporânea podemos pressupor que há um número de amantes das
artes com excedentes econômicos intercambiáveis, o que determina como a produção
artística será feita. Segundo a Professora, mesmo com o receio de magoar a liberdade
artística e a criatividade, quem determina o a direção do mercado é a demanda. Ou seja,
os artistas são famosos porque sua produção foi aceita após um meticuloso julgamento
dos agentes demandantes. Algumas vezes esse julgamento acontece muito tarde, como
no clássico exemplo de Van Gogh, que jamais vendeu um quadro sequer em toda sua
vida e cujas obras são “Blue Chips” do mercado de arte do pós-impressionismo.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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Para quem produzir é uma das perguntas determinantes dentro do mercado de arte, mas
como os discursos de uma demanda fracionada podem ser unidos a ponto de haver
reconhecimentos quase universais dos artistas contemporâneos? Nesse ponto surgem os
influenciadores da demanda, representados pela mídia especializada e pelos galeristas.
A professora exemplifica que um crítico de arte, assim como um crítico gastronômico
ou de qualquer outra atividade, cuja qualidade é determinada através de fatores
subjetivos, tem o poder de ascender ou naufragar a carreira e a produção de um
determinado artista. Quanto mais importante o crítico e o veículo especializado onde ele
manifesta seu julgamento, maior poder de alavancar a credibilidade de um artista ele
possui em suas palavras.
Já os galeristas funcionam como o primeiro filtro, indicando o que pode ser
comercializável ou não, o que pode ser aceito ou não, de acordo com seu conhecimento
das necessidades da demanda. Um exemplo interessante pode ser visto logo após os
acontecimentos de 11 de setembro de 2001. Durante alguns meses, as artes plásticas
embarcaram em representações sóbrias e algumas vezes obscuras. Somente depois da
demanda americana conseguir recuperar certa flexibilidade de julgamento próprio, foi
possível que artistas pudessem comercializar representações questionadoras e
irreverentes do evento.
Com exceção de galeristas famosos como Saatchi e Gagosian, a maioria dos agentes do
mercado primário acabam por voltar-se a mídia especializada e aos críticos como
principal fonte para entender as tendências do mercado e orientar a produção dos
artistas que representam.
A questão da busca pela inovação constante é inerente aos mercados competitivos. Há
evoluções nas formas representativas, pois os artistas devem estar sempre um passo a
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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frente da cultura de massa. Esse comportamento é exacerbado no mercado brasileiro,
pois arte e conhecimento sobre arte, além de legitimação, são usados também como
fator de segmentação entre classes sociais. A profundidade de conhecimento sobre o
meio permite maior ou menor fruição e reconhecimento de uma obra contemporânea.
Sem referências anteriores e refinamento do gosto, não é possível apreciar em sua
totalidade algumas obras mais complexas. Por isso, ao pensar no que a demanda
brasileira da nova classe média que surgiu na estabilidade econômica da última década
procura, a Professora finaliza indicando que flores, paisagens e elementos bucólicos –
praticamente expulsos das representações abstratas modernas – são os pedidos que ela
mais ouve quando alguém lhe pede um quadro de sua autoria.
3.2.7 – Rafael Rocha Andrade, empresário e colecionador iniciante.
Rafael é um jovem advogado que fez fortuna atuando no mercado de capitais durante a
subida dos preços de petróleo no início do século XXI. Ele se define como emergente
que já possui os elementos de diferenciação de consumo de luxo e não vê mais valor
neles porque se esgotam em si próprios. Então, começou a freqüentar galerias e
exposições de arte com o intuito de começar a investir em alguns artistas, assim como
fez com o mercado de commodities. Mas apesar de ter o capital e o conhecimento
necessários para tal empreitada, Rafael sabe que as perdas e ganhos podem ser muito
maiores se o colecionador iniciante não tiver relações fortes com outros agentes do
mercado. Ele identifica que o conhecimento dos novos artistas e a capacidade de
observar as tendências da arte contemporânea são as principais ferramentas que possui
para fazer um bom investimento.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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Ele conta que ainda não fez uma grande aquisição. Entretanto é freqüentador da “SP-
ARTE Foto”, uma feira de arte focada em fotografia cujos organizadores são os mesmos
da SP-ARTE, onde busca fotografias, o suporte que considera ser um bom investimento
para um colecionador iniciante. Já adquiriu obras do Instituto Moreira Salles, com
destaque para fotos de Otto Stupakoff e Thomaz Farkas. Suas mais ousadas aquisições,
em termos de valores investidos, foram Claudia Jaguaribe e Miguel Rio Branco.
Rafael pondera que, independentemente da cadeia de legitimação de um artista, espera-
se que sua produção mostre algo inovador e disruptivo. Não há criação de novo valor
em algo que repete uma fórmula criativa. Por isso, quando o artista novato arrisca, é o
salto em que os colecionadores precisam prestar atenção. Um novo suporte, uma forma
expressiva diferente, um sistema de leitura que impõe novas interpretações a partir de
um contexto social e histórico únicos. Ele cita Ligia Clark e seus “bichos” como uma
ruptura que hoje é valorizada. As esculturas, que são carinhosamente chamadas de
“bichos”, chegam a valer de 150 a 200 mil reais cada uma. Ainda sobre a cadeia de
legitimação, ele complementa dizendo que a real especulação acontece quando um
artista tem apenas uma grande sacada e, por conta de sua atuação, acaba por sucumbir à
mídia, misturando arte com publicidade sobre a arte. É o caso de Jeff Koons e Vik
Muniz, segundo ele. Não que tais artistas não tenham seu valor, mas eles estão
supervalorizados e fora de seu radar para futuras aquisições. Por isso prefere voltar-se
para quem está começando.
De certa forma, ele pondera, o artista precisa atender aos desejos da demanda. Por isso,
acredita que um investidor bem sucedido deve observar tanto os artistas quanto todos os
outros agentes do mercado para tirar as conclusões da viabilidade de tal artista como
investimento. Ao especializar-se num segmento bem definido, como fotografia
contemporânea, ele pode diminuir os riscos de seu investimento. E define que seu
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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processo de busca é aberto, primeiro gostando do objeto de arte para depois procurar as
referências que possam atestar o valor ou a possibilidade de investimento para
valorização posterior. Assim, ele espera treinar seu olhar antes de falar de valores. Nos
vernissages que freqüenta, ele já sabe o que será exposto antes da abertura. Então, no
dia de abertura do evento, ele conversa com os agentes do mercado com conhecimento
prévio, buscando o parecer de cada um deles sobre o impacto da exposição na carreira
do artista.
Rafael cita que qualquer um pode ser um colecionador, mesmo com recursos escassos,
dando como exemplo o casal de classe média nova-iorquina que acumulou mais de
quatro mil obras num pequeno apartamento em Manhattan. A vida desses
colecionadores tornou-se um filme chamado “Herb e Dorothy”, SASAKI (2009). Nesse
documentário, o casal é reconhecido por diretores de museus, artistas e outros
conhecedores de arte como os maiores colecionadores de arte minimalista americana.
Herbert e Dorothy Voguel não eram milionários, ele trabalhava como funcionário dos
correios e ela como bibliotecária. Ambos, com a mesma paixão pela arte, começaram a
colecionar com o salário dele enquanto ela pagava as despesas gerais em uma Nova
Iorque da década de 1960. Segundo Rafael, eles identificaram o ponto de virada de um
novo movimento e começaram a entender e colecionar os artistas minimalistas no
momento em que eles ainda não eram reconhecidos pela mídia. Alguns exemplos de
artistas que foram descobertos e reconhecidos pelos Voguel são Robert Mangold, Lucio
Pozzi e James Siena, Todos bastante valorizados no mercado de arte contemporânea por
sua contribuição ao movimento Minimalista. Rafael conclui que está educando seu
olhar para um dia ter propriedade suficiente para conseguir identificar expoentes de um
movimento novo e disruptivo como fizeram o casal retratado nesse documentário.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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4 – CONCLUSÕES
4.1 – O valor da arte versus a demanda por arte.
Arte contemporânea é um assunto que possui interpretações divergentes, pois sua
função está em constante transformação, assim como a sociedade para qual ela é
produzida. Mesmo assim, há uma unidade quando se olha para quem a arte é produzida.
A primeira conclusão que salta aos olhos após o cruzamento das entrevistas com os
estudos teóricos é que não importa o suporte, os questionamentos filosóficos ou a
necessidade ou não de ruptura com o passado versus a continuidade: em última
instância, quem determina o que será produzido é a demanda.
Apesar de ser uma afirmação limitadora, que coloca o artista em segundo plano, ela não
tira a criatividade e o fator de inovação e expressão pessoal necessários a qualquer tipo
de arte. A demanda legitima a arte que lhe interessa, podendo ser algo inovador ou
apenas mais uma necessidade de representação que logo será esquecida. Os preços
realizados em leilões apenas refletem o gosto sacramentado da demanda, mas não o
valor artístico produzido para uma sociedade. Não é porque o preço é caro que o artigo
será realmente um ícone dentro da história da arte. Outro argumento plausível: muitas
vezes o que é realmente bom não é absorvido imediatamente pela demanda. Há
exemplos clássicos, como o caso dos impressionistas no final do século XIX, ou mesmo
as vanguardas européias do início do século XX.
HUGUES (2008) e LEWIS (2009) separam claramente a arte como representação,
síntese de um posicionamento filosófico e cultural, da arte como produto, que apenas
responde à expansão de uma demanda não atendida pela escassez inerente à natureza
desse produto. Através desses dois críticos, olhando a produção artística após o estouro
da bolha especulativa em 2009, é possível ver como a especulação está enraizada no
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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mercado de arte. Há algumas décadas, a função da arte contemporânea era tocar
algumas feridas da sociedade, questionando a representação do belo e dos padrões de
suporte reconhecidos. Então, os questionamentos giravam em torno da ousadia dos
produtores e da forma como sintetizavam narrativas complexas em torno de objetos
mundanos transformados em algo novo, passível de interpretações diversas. A arte vivia
até então no mundo das idéias e era julgada explicitamente por isso. A arte
contemporânea e a de vanguarda eram designações similares numa busca por
legitimação de posicionamentos subjetivos. Entretanto, com o desenvolvimento do
mercado de arte, o que passou a ser importante foi o valor atingido pela obra no
mercado. Como se uma grande consciência coletiva pudesse montar um ranking
comparativo entre obras e artistas através da expressão dos preços alcançados em
leilões. Por exemplo, não se fala mais nos desafios representativos que um “Parangolé”
de Lígia Clark propõe, mas sim no absurdo valor atingido pelas obras por conta de
representarem esse momento.
4.2 – Sobre as hipóteses do aumento da demanda por arte
LEWIS (2009) continua em seu processo investigativo da bolha do mercado de arte e o
relaciona diretamente a bolha dos mercados especulativos. Com excedentes monetários
à disposição e a necessidade de auto-afirmação para ascensão social, o mercado de arte
explodiu. Mas como toda bolha especulativa, quem chega por último acaba pagando
pelos excessos cometidos ao longo dos tempos de bonança. Foi o que aconteceu logo
após o histórico evento, quando Damien Hirst fez um leilão de suas obras. Segundo
LEWIS (2009), esse foi o estertor da bolha especulativa dos mercados de arte
ocidentais. Os leilões seguintes tiveram queda ainda mais acentuada que os índices dos
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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mercados financeiros. As cotações das ações das principais casas de leilão também
tiveram perdas significativas.
No Brasil, logo após a sexta edição da SP-ARTE, a mídia começou a divulgar o mesmo
comportamento especulativo. Uma obra de Adriana Varejão foi arrematada em leilão
por R$ 551 mil reais (Folha de São Paulo, 04 de maio de 2010). Segundo a mesma
reportagem, em dez anos, obras de Adriana Varejão, Cildo Meireles, Vik Muniz e
Beatriz Milhazes chegaram a se valorizar até 5.000%. A reportagem também fala da
criação de um fundo de investimentos em arte brasileira, gerenciado pela consultoria
Plural Capital, com R$ 40 milhões disponíveis para aquisição de obras ainda no
primeiro semestre de 2010.
Tudo indica que a espiral especulativa dentro dos mercados emergentes terá o mesmo
fim que no eixo Londres – Nova Iorque: a arte boa irá ficar, mas até então muitos
investidores irão perder e ganhar dinheiro valorizando modismos temporários.
4.3 – Sobre o processo de legitimação do mercado de arte mundial e brasileiro
Em todas as entrevistas ficou claro que a legitimação é o processo pelo qual é agregado
valor ao objeto de arte. A complexidade de tal processo varia de mercado para mercado,
mas as relações sociais entre os agentes da demanda é que definem o preço final para
circulação dos produtos. A mídia especializada mostrou-se um elemento de forte
legitimação, principalmente para aqueles que vivem fora dos grandes centros onde
acontecem os investimentos em arte.
Legitimação anda junto com fidelidade, conhecimento do artista e do contexto no qual
ele está inserido. Todo os colecionador é apaixonado por sua coleção e por conta disso
foi possível notar certo elemento de psicologia de consumo no comportamento da
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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demanda de arte contemporânea, que pode ser explorado em estudos posteriores. Os
colecionadores estão num nível econômico no qual já realizaram quase todos os sonhos
de consumo, estão no último degrau da pirâmide de Maslow. A busca por arte é a única
coisa que os faz esperar, que romantiza a compra, tanto pela escassez dos bens quanto
pelos valores que acompanham essa escassez.
4.4 – Fechamento
Arte é um bom investimento especulativo para quem está dentro do mercado e conhece
os agentes legitimadores. Com conhecimento do mercado é possível prever movimentos
e antecipar apostas, apesar do risco envolvido.
Arte é um bom investimento como poupança para o futuro. Se o colecionador ou
investidor apostar em arte legitimada, mesmo com oscilações no mercado e catástrofes
financeiras, o valor abstrato será mantido e revertido em valores financeiros de acordo
com a possibilidade de sustentação do mercado.
“Blue Chips” existem em qualquer mercado e no Brasil estão bem representados pelas
obras produzidas pelos artistas da chamada Geração 80. O aumento na demanda e dos
preços praticados pelo mercado aconteceram, sobretudo, por causa dos excedentes
econômicos acumulados nos últimos anos.
Também são causadores da escalada de preços os novos agentes que surgiram em
mercados emergentes, e a possibilidade de expansão da ação dos artistas e galeristas,
alcançando mercados globais.
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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5 – BIBLIOGRAFIA
5.1 – Livros
AAKER, DAVID A. “Marcas. Brand Equity. Gerenciando o Valor da Marca.”, Ed.
Negócio Editora (1998).
GILL, ANTON. “Peggy Guggenheim – A Vida de uma Viciada em Arte”, Ed. Globo
(2005).
GROSENICK, UTA. “Art Now. The new directory to 136 international contemporary
artists”, Ed Taschen (2005).
GROSENICK, UTA; RIEMSCHENEIDER, BURKHARD. “Art Now. 81 Artistis at the
Rise of the New Millennium.” Ed Taschen (2002).
LINDEMANN, ADAM. “Collecting Contemporary”, Editora Taschen (2006).
PINDYCK, ROBERT S. RUBINFELD; DANIEL L. “Microeconomia”, 5ª Edição,
Editora Prentice Hall (2006).
PINHO, DIVA BENEVIDES. “A Arte como Investimento”, Editora Nobel/Edusp
(1989)
PINHO, DIVA BENEVIDES. “Ensaio sobre o Mercado de Arte”, Editora ESETec
(2009).
THOMPSON, DON. “The $12 Million Stuffed Shark: The Curious Economics of
Contemporary Art”, Ed. Palgrave Macmillan (2008).
THORNTON, SARAH. “Seven Days in the Art World”, Editora Norton (2009).
BESSA, A. R. - Arte como investimento, a formação de preços e os agentes atuantes no mercado de artecontemporânea.
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5.2 – Documentários
HUGHES, ROBERT. “The Mona Lisa Curse”, 60 minutes, Channel Four, 2008.
LEWIS, BEN. “The Great Contemporary Art Bubble”, 60 minutes, BBC Four, 2009.
LEWIS, BEN. “Art Safari”, 60 minutes, BBC Four, 2008.
SASAKI, MEGUMI. “Herb and Dorothy. You don’t have to be a Rockefeller to collect
art”, 89 minutes. Fine Line Media, Inc. and the Independent Television Service (ITVS),
2009.
THEROUX, MARCEL. “The Great Russian Art Invasion”, 60 minutes, Channel Four,
2008.
XIAOGANG, ZHANG. “The Great Chinese Art Revolution”, 60 minutes. Channel
Four, 2009.
YENTOB, ALAN. “How To Get On In The Art World”, 60 minutes. Channel Four,
2009.
5.3 – Sites de periódicos na Internet
http://www.artmarketinsight.com
http://www.artprice.com
http://www.bolsadearte.com.br
http://www.christies.com
http://www.estado.com.br
http://www.istoeonline.com
http://www.sothebys.com
http://www.theeconomist.com
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