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Universidade Estadual de Maringá 02 a 04 de Dezembro de 2015
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A REGIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NA AMÉRICA LATINA:
PONTOS, CONTRAPONTOS E UM TERCEIRO OLHAR ENTRE
COMPETÊNCIAS E FORMAÇÃO PARA A CIDADANIA
OLIVEIRA, Lilian T. Candia de
CECÍLIO, Maria Aparecida
Introdução
O processo educativo e os sistemas de educação de cada país embora concebidos
a partir dos arranjos do Estado-nação, nas últimas décadas são impactados por reformas
e adoção de modelos regionais de educação. Embora se tenha como norteamento as
peculiaridades da idéia de educação nacional, não se pode deixar de constatar o esforço
supranacional e sua correspondente adesão por distintos países e blocos da consonância
de interesses explícitos e implícitos na lógica da instituição de determinada tipologia de
qualidada para a educação superior ao redor do mundo. Como afirma Dale (2009, p.
873): “[...] Não se trata de um processo ‘passivo’. Existem provas claras de esforços
para desenvolver novas formas e modelos de ‘educação’ supranacionais que buscam
conscientemente solapar e reconfigurar as formas nacionais de educacao existentes”.
Um exemplo dessas reformas ocorreu na Europa, no final da década de 1990,
por ocasião da celebração dos 800 anos da Universidade de Sorbonne, na qual foi
proposto um processo de europeizaçao dos sistemas de educação superior do continente,
uma vez que, as universidades européias registravam vagas ociosoas devido ao
insuficiente financiamento por parte do Estado e, de acordo com as lideranças políticas
da União Européia, por não corresponder as demandas sociais dos jovens (HORTALE e
MORA, 2004), o que os levava a continuar sua formação universitária em países de
economia mais estabilizada e com perfis profissionais correspondentes à demandas
competitivas de mercado.
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Desse modo foi inaugurado o Processo de Bolonha, que por meio de estratégias
políticas e medidas organizacionais, consolidou um Espaço Europeu de Ensino Superior
(EEES) transnacional que harmonizou os sistemas de educação superior europeu,
tornando-os coerentes e compatíveis entre si, com currículos e diplomas convergentes
centrados em expectativas e correspondentes competências a serem desenvolvidas no
percurso formativo dos acadêmicos. Um dos objetivos era o de fortalecer o
reconhecimento de qualificações, de modo que essas instituições fossem mais
competitivas internacionalmente e atraissem estudantes de outros países e continentes
para as universidades europeias (PORTUGAL, 2009; DIAS SOBRINHO, 2009;
HORTALE, MORA, 2004).
Percebemos até o momento um movimento significativo de reformas nas
universidades adotando-se os modelos regionais de educação, com ênfase nas
competências e atendimento as demandas de mercado, porém, de acordo com Dale
(2009) para além de simples reformas, trata-se de um novo modelo de governança
global, em que se adota o regionalismo como estratégia política, mas sempre na lógica
de atendimento as demandas de mercado.
A concepção de educação nos últimos 50 anos foi norteada como sendo o
pesadelo destrutivo da relação mercado e moralidade. Essa concepção mobilizava as
populações contra os perigos do mercado, as advertiam e protegiam por meio de um
conjunto de valores contra as características destrutivas do mercado. Contudo, “Hoje em
dia, essa orientação para o significado da educação está nitidamente ameaçada em
vários lugares [...] que se situam incontestavelmente na versão do sonho liberal da
relação entre mercados e moralidade, em razão de seus pressupostos neoliberais”
(DALE, 2009, p. 875 grifos do autor).
Sobre o contexto de uma interregionalização por adesão e ao mesmo tempo
induzida por conta de abertura de novos mercados e eixos ideológicos, a presente
pesquisa propicia, a partir da literatura especializada e documentos referenciais, uma
problematização sobre os impactos do apoio da União Europeia quanto à Educação
Superior, mais precisamente por conta do Projeto Alfa Tuning América Latina e a
possibilidade de um terceiro olhar para a compreensão e encaminhamentos dessa
discussão, recortando-se as categorias competências e cidadania como dimensões
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recorrentes, inclusive na realidade da universidade brasileira. Para tanto levantamos o
seguinte questionamento: entre pontos e contrapontos, que terceiro olhar é possível para
a compreensão e problematização de impactos da europeização da educação superior na
América Latina em relação ao desenvolvimento profissional por competências e a
formação para a cidadania? Nesse sentido, o objetivo da pesquisa em andamento é
analisar os impactos que a europeização da educação superior na América Latina tem
desencadeado quanto ao desenvolvimento profissional por competência e a formação
para a cidadania para além dos pontos e contrapontos identificados na literatura nacional
e internacional.
Para a área educacional esse estudo desencadeia o aprofundamento da validade
ou não de simetrias inter-regionais, as fragilidades centradas no dedutivíssimo, no
sincretismo e até processos de alienação, ao mesmo tempo, propiciará elementos para
maior reflexão epistemológica de realidades e necessidades concretas da educação
superior na América Latina e em particular da brasileira.
Assim, para os limites deste estudo, inicialmente discutimos a implementação do
Processo de Bolonha, bem como, a organização e desenvolvimento do Projeto Alpha
Tuning na América Latina e, num segundo momento, problematizamos a formação para
a cidadania nesse contexto de reformas da universidade brasileira. Por último,
apresentamos as considerações finais.
Processo de Bolonha, Projeto Alpha Tuning e América Latina: primeiras
aproximações
Na implantação do Processo de Bolonha algumas instituições dos países
signatários, acordaram e elaboraram uma estratégia para a redefinição dos currílos a
partir de um ponto comum, baseada em competências, que ficou denominado Projeto
Tuning. Universidades da America-latina acompanhando o norteamento do Tuning
europeu ao final da década de 1990 e mais enfaticamente a partir de 2004 aderem à tal
organização espontaneamente e orientados pela União Européia desenvolvem um
correspondete ao Tuning Europeu, denominado Projeto Alpha Tuning America-Latina
com o mesmo propóstito de atendimento as demandas de mercado no contexto de
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blocos econômicos, que foi apresentado ao bloco europeu no intuito de alinhar as
propostas e ideias de trabalho com o Europeu (EIRÓ; CATANI, 2011). Estava nesse
sentido patenteado a incursão interregional da inculcação do modelo europeu e
financiado pela União Européia em proposta de contrapartida.
Assim, neste item propomos problematizar a implementação do Projeto Alfa
Tuning América Latina com destaque para o Brasil, entendendo, de acordo com Dale
(2004, p. 436) que “a globalização é um conjunto de dispositivos político-econômicos
para a organização da economia global, conduzido pela necessidade de manter o sistema
capitalista, mais do que qualquer outro conjunto de valores”. Para esse autor, a adesão
ao processo globalizado “é veiculada através da pressão econômica e da percepção do
interesse nacional próprio” (ibid. idem).
Nesse sentido, países latino-americanos representados por ministros da educação
e interlocutores, signatários do Relatório Final do Projeto Alfa-Tuning delineado para as
universidades Latino-americanas (2004-2007), cujo desdobramento fora financiado pela
União Europeia, tinham por certo que a adesão ao mesmo, à luz do que vinha
acontecendo com o Espaço Europeu de Educação Superior (EEES), se configuraria
como “[...] um instrumento a favor da equivalência de diplomação e da facilitação da
mobilidade estudantil e profissional”. (EIRÓ; CATANI, 2011, p. 117). A questão que
se segue a essa é como isso seria possível, considerando a distinção de realidades e o
ausentamento de um Espaço Latinoamericano de Educação Superior? Como formação
centrada em expectativas e competências, no âmbito da América Latina seria
correspondente ou aproximativa do Projeto Tuning Europeu?
Beneitone et. al. (2007) destaca que na Europa, o Projeto Tuning determinou
referenciais comuns quanto ao escopo das competências genéricas e específicas de base
disciplinar centrados em áreas temáticas, destacando-se as de Matemáticas, Geologia,
Empresariais, Enfermaria, Estudos Europeus, História, Ciências da Educação, Física e
Química. Essa orientação foi desenvolvida por uma metodologia de trabalho,
organizada em quatro eixos, por meio da colaboração de distintas equipes dos países
representados na U.E.: a) competências genéricas, b) competências disciplinarias
específicas, c) o papel do sistema ECTS (Sistema Europeu de Transferência de
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Créditos) como sistema de acumulação, d) função da aprendizagem, docência, avaliação
e rendimento em relação à garantia da qualidade.
Passados os trâmites iniciais, no ano de 1999, a Declaração de Bolonha foi
finalizada e diversos países (inclusive fora do continente europeu) tornaram-se
signatários (27 países europeus: Alemanha, Áustria, Bélgica, Bulgária, Chipre,
Dinamarca, Eslovênia, Eslováquia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Grécia,
Holanda, Hungria, Inglaterra, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta,
Polônia, Portugal, República Tcheca, Romênia, Suécia. E vinte e dois países não
pertencentes à União Europeia - Albânia, Andorra, Armênia, Azerbaijão, Bósnia-
Herzegovina, Cazaquistão, Croácia, Federação Russa, Geórgia, Islândia, Liechenstein,
Macedônia, Moldávia, Montenegro, Noruega, República da Macedônia, Santa Sé,
Sérvia-Montenegro, Suíça, Turquia, Ucrânia, Vaticano). Tal adesão deu origem ao
Processo de Bolonha, cujos referenciais centrado nos quatro eixos anteriormente citados
deveriam ser observados e avaliados a cada dois anos num espaço de um decênio. Dias
Sobrinho (2005, p. 186) destaca que, introjetada à dimensão ideológica, estava posta a
ideia ou ideário de que cidadania europeia deveria ser ampliada, isto é, “[...] de que
todos os europeus compartilham valores e pertencem a espaços culturais e sociais
comuns (...)”.
Tais valores e espaços passaram a ser de interesse de países latino-americanos,
dentre eles o Brasil, que se tornou signatário e partícipes do Relatório Final do Projeto
Alfa-Tuning América Latina (Beneitone et. al., 2007). Os países latinoamericanos que
participaram dessa elaboração foram Argentina, Brasil, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa
Rica, Cuba, Equador, El Salvador,, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Panamá,
Paraguai, Peru, República Dominicana, Uruguai e Venezuela. Estes propuseram no
Projeto competências desejáveis na formação do universitário para a universidade na
AL e que foram incorporadas ao Relatório:
• Competências Instrumentais: habilidades de desempenho relacionadas
com as capacidades cognitivas, metodológicas, tecnológicas;
• Competências Interpessoais: habilidades de desempenho relacionadas com
a capacidade de um bom relacionamento social e cooperação;
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• Competências Sistêmicas: habilidades de desempenho relacionadas à visão
de conjunto e à capacidade de gerir um projeto na sua totalidade;
• Competências Específicas: habilidades vinculadas a uma titulação, o que
requer identidade e consistência social e profissional ao perfil formativo
(BENEITONE et. al., 2007).
No Projeto Tuning, é perceptível o vínculo entre as demandas do processo
produtivo e a formação profissional em nível superior. Assim, a universidade estrutura-
se no intuito de alcançar os resultados por meio da competitividade, no atendimento a
lógica empresarial, de mercado e seus clientes, ao que Catani e Oliveira (2002, p. 24)
expõem que o trabalho acadêmico e a própria universidade atuam sob a égide da
racionalidade econômica, fazendo com que somente tenham “[...] relevância econômica
e social quando formam profissionais aptos às necessidades atuais do mercado de
trabalho e quando pesquisam, geram ou potencializam os conhecimentos, as técnicas e
os instrumentos de produção e serviços que possibilitam a ampliação do capital”.
Nesse sentido, o Tuning “propõe-se a elaborar currículos baseados em
competências e a determinar pontos de referência para as competências genéricas e
específicas de cada disciplina de cada curso universitário” (EIRÓ; CATANI, 2011, p.
111). O objetivo é reestruturar e revitalizar os currículos, para tornar o estudante parte
integrante e ativa de uma tipologia de aprendizado, a partir da Pedagogia por
Competências com parâmetros comuns de equivalência e objetivos, que se tornam
referência, mas que permite flexibilidade e autonomia, para a elaboração e avaliação dos
planos de estudo.
O projeto Tuning é desenvolvido em quatro Linhas articuladas: a) definição das
competências acadêmicas genéricas para todas as graduações; b) definição das
competências específicas para cada graduação; c) utilização do sistema europeu de
créditos (ECTS) como estratégia de acumulação e transferência; e d) definição dos
métodos de ensino, aprendizagem e avaliação. A competência, por sua vez é dividida
em: Competências Instrumentais (capacidade cognitiva, metodológica, tecnológica);
Interpessoal (capacidade de bom relacionamento social e cooperação); Sistêmica (visão
de conjunto/ gerir projeto); Específica (vinculada a titulação profissional). Assim,
propõem-se pontos comuns para as competências genéricas e específicas para cada
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disciplina da graduação e mestrado em: administração, educação, geologia, história,
matemática, física e química (EIRÓ; CATANI, 2011).
O Projeto Tuning América Latina contempla os mesmos pontos de referência,
compreensão e confluência acima apresentados, a exceção se dá por conta do
ausentamento no Mercosul de um Espaço Latino-Americano de Educação Superior, a
exemplo do Europeu. O projeto teve início abrangendo 62 universidades, no ano de
2009 esse número sobe para 190 instituições de 19 países da América Latina que se
tornaram partícipes do Projeto (NOBRE, 2009).
Para Eiró e Catani (2011) o Projeto Tuning América Latina tem como eixo
norteador o desencadeamento de reformas educacionais para o atendimento das
demandas de mercado, embora haja o predomínio no discurso ideológico de unificação
do bloco latino-americano. Tal afirmativa, torna possível, nesse sentido, o predomínio
mercadológico no processo educativo universitário.
Para Mészáros (2008, p. 27) “[...] uma mudança educacional radical às margens
corretivas interesseiras do capital significa abandonar de uma só vez, conscientemente
ou não, o objetivo de uma transformação social qualitativa”. O processo emancipatório
na educação, incluso a universidade, somente é possível com a ruptura com a lógica
capitalista que submete o trabalho como atividade humana, contudo não realizadora.
Esse processo emancipatório está diretamente ligado a formação para o exercício da
cidadania, conforme problematizamos a seguir.
Projeto Alfa Tuning e formação para a cidadania na universidade brasileira
Nesse momento, faz-se necessário destacar a relação do Projeto Alfa Tuning
América Latina e a formação para o exercício da cidadania conforme preconizado pela
legislação nacional. Assim, iniciamos nossa reflexão, expondo que a influência de
unificação da universidade Europeia, não se restringiu apenas a América Latina,
inspirou também outros continentes na reorganização da educação superior. O influxo
nas políticas educacionais ocorre porque as regulamentações em nível nacional são de
alguma forma, para mais ou para menos, “moldados e delimitados por forças
supranacionais, assim como por forças político-econômicas nacionais” (DALE, 2004, p.
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441). O fator mercadológico supranacional influencia diretamente os Estados, assim, a
“globalização tem os seus mais óbvios e importantes efeitos sobre os sistemas
educativos nacionais” (Ibid., Idem) como pode perceptível nos seguintes arranjos
educacionais supranacionais já implementados no Brasil:
Propostas de convergência dos sistemas de educação superior da Europa,
América Latina e Caribe estabelecida na Declaração de Florianópolis;
Tratado de Amizade Brasil-Portugal (Decreto n. 3.927, 19/09/2001), que
prevê “Cooperação no Domínio do Ensino e da Pesquisa”, como o
“Reconhecimento de Graus e Títulos Acadêmicos e de Títulos de
Especialização”, obtidos em instituições de ensino superior nos dois
países (BRASIL, Decreto n. 3.927/2001);
As medidas propostas pelo SEM - Setor Educacional do Mercosul
(Mercado Comum do Sul - bloco de integração entre os países Argentina,
Brasil, Paraguai, Uruguai, e Venezuela) no intuito de estabelecer entre os
países signatários o reconhecimento de títulos entre instituições/países, a
mobilidade estudantil e a cooperação interinstitucional (MERCOSUL
EDUCACIONAL, 2009);
O projeto de criação da Universidade Federal da Integração Luso-Afro-
Brasileira (UniLAB) com objetivos semelhantes ao do Processo de
Bolonha;
A Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) a ser
instituída nas regiões fronteiriças “[...] para o intercâmbio acadêmico e a
cooperação solidária com países integrantes do Mercosul e com os
demais países da América Latina” (BRASIL, Lei n. 12.189/2010);
A Universidade Federal da Integração Amazônica (UNIAM) – com sede
em Santarém (PA) localizada na parte central da Amazônia nos arredores
do estado do Amapá, Amazonas e Mato Grosso, na fronteira com Guiana
e Suriname propicia a cooperação internacional nas atividades de
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pesquisa, formação de profissionais e extensão por meio de uma rede
multi-institucional que agrega os estados da Amazônia Brasileira e os
países-membros da Organização do Tratado da Cooperação Amazônica:
Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e
Venezuela. Propõe-se, juntamente com as demais universidades da
região, constituir-se num projeto de integração pan-amazônica (UNIAM,
2009).
Podemos inferir com o exposto, que o processo de globalização ou em nosso
caso regionalização da educação “implica especialmente forças económicas operando
supra e transnacionalmente para romper, ou ultrapassar, as fronteiras nacionais, ao
mesmo tempo que reconstroem as relações entre as nações” (DALE, 2004, p. 426). No
que tange a reconstrução das relações entre as nações, no Brasil, por exemplo, outro tipo
de reforma para as universidades, num prisma mais geral, trata-se da Universidade Nova
que propõe uma estrutura curricular que se assemelhe ao modelo adotado nos Estados
Unidos e ao Processo de Bolonha. Para Arruda (2009) esse modelo propicia uma
formação geral antes da graduação e formação científica antecedendo a pós-graduação1.
Para Dale (2009), nos modelos nacionais de educação existe a predominância da
relação entre Estado e cidadão, já nos modelos regionais, ocorre uma distinção na
concepção de cidadania. Ao recorrer a Jenson (2007 apud DALE, 2009), Dale explica a
complexa relação entre cidadania, Estado, mercado, família e comunidade. Expõe que,
cidadania seria uma resposta do Estado à necessidade de bem-estar, mas que é possível
produzir bem-estar por meio do mercado, dos familiares, da comunidade e Estado, a
partir do princípio de igualdade entre cidadãos. Cidadania, sendo resposta, é também
atendimento a uma determinada demanda, que por sua vez, integrou a agenda e tornou-
1De acordo com Santos e Almeida filho (2008) tal reforma ocorreria, por meio da modalidade intitulada de Bacharelado Interdisciplinar, em que a formação seria possível em três ciclos: a pré-graduação, a graduação e pós-graduação, com duração de seis semestres, totalizando 2.400 horas; e duas etapas primeiro, formação geral que possibilite a aquisição de competências e habilidades para compreensão crítica da realidade natural, social e cultural, e o segundo momento de formação específica, que propicie competências e habilidades sobre um determinado campo teórico ou teórico-prático. Com seiscentas e 1.200 horas, respectivamente (AZEVEDO; CATANI; LIMA, 2008; SANTOS, ALMEIDA FILHO, 2008).
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se política. Obviamente, que sendo resposta derivou-se da iniciativa – provavelmente
veemente - dos cidadãos no requerimento de tal política.
O que está em jogo, para além do mosaico de significados de cidadania – que
retomaremos em seguida - é a produção de bem-estar que deveria ser propiciada pelo
Estado, sendo de forma alternativa suprida por mercado, família ou comunidade. Assim,
se os modelos regionais não estiverem diretamente ligados a produção de bem-estar
Estatal “[...] não é possível nem desejável - pois é potencialmente enganador- vê-los
como relacionados à cidadania [desse modo] não deveriam ser vistas como formas de
cidadania, porém como meios alternativos de produção de bem-estar” (p. 876, grifos do
autor).
O termo meios alternativos pode ser utilizado para identificar os distintos e
antagônicos significados para o termo cidadania. Embora haja a permanência do verbete
cidadania, a sua efetivação, não se revela como tal. Dentre o mosaico de significados,
destacamos cidadania enquanto valor econômico, gnosiológico e ético-político
(OLIVEIRA, 2014). No primeiro caso, tem-se o predomínio do fator mercadológico,
por isso mesmo, o cidadão é tratado como um cliente, um consumidor de serviços
Estatais, com destaque para duas principais características a reificação (tudo que tem
valor sentimental, religioso, ético, etc. se transforma em uma coisa a ser produzida,
comercializada e consumida por um mercado) e o individualismo e delineada pelos
eixos da reestruturação produtiva ou como diz Mészáros (2006, 2008) pelo
sociometabolismo do capital.
Nesse tipo de cidadania, o cidadão por não possuir “[...] outra propriedade senão
sua força de trabalho torna-se necessariamente, em todas as condições sociais e
culturais, um escravo daqueles que se apropriaram das condições objetivas do trabalho”.
(MARX, 2012, p. 24-25). Se o predomínio mercadológico impera, obviamente, o
investimento nas políticas sociais desconsidera o princípio da equidade, o que ocasiona
inevitavelmente a perpetuação da desigualdade. Conforme destacado por Azevedo por
não considerar a desigualdade, os desiguais nos aspectos “sociais, culturais e
econômicas, tiverem menos oportunidades de estudos e de aquisição de conhecimento,
continuarão a receber desigualmente conteúdos e capital cultural, internalizando menos
dispositivos (habitus) relacionados à ciência e ao saber” (AZEVEDO, 2013, p. 140).
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Já na cidadania enquanto valor gnosiológico o objetivo é a disseminação de
conhecimentos com a adoção da passividade acrítica, ou seja, refere-se a um tipo de
formação que não possibilita o questionamento sobre os limites do movimento
socioeconômico e cultural delineado no cotidiano capitalista. Enquanto valor ético-
político, a cidadania traz intrínseca a participação crítica e o cidadão como sujeito capaz
de, a partir de sua intervenção consciente, forjar seu destino histórico. Na atualidade
tem-se legalmente preconizado a possibilidade de participação, por meio dos direitos
que garantem a liberdade civil, política e social, porém, na concretude das relações
sociais, essa possibilidade de participação nem sempre pode ser efetivada, pois, “[...] Só
tem acesso efetivamente àquilo que está expresso nas leis [...] uma minoria que, pelo
privilégio econômico que dispõe, consegue efetivar aquilo que as determinações legais
garantem abstratamente” (MARTINS, 2000, p. 11).
Para superar a situação abstrata de existência dos direitos, que não se materializam
efetivamente, tem-se a necessidade de disseminação de conhecimentos de formas de
intervenção na vida social e do acesso aos mecanismos institucionais que possibilitam a
efetiva participação e a consequente efetivação dos direitos. Desse modo o conceito de
cidadania “[...] não é um estado psíquico e mental de um indivíduo que conhece seus
direitos e deveres e nem, muito menos, uma relação particular do indivíduo que
consome serviços do Estado” (MARTINS, 2000, p. 13). A cidadania perpassa os
direitos civis, políticos e sociais articulados com a posse dos bens materiais, simbólicos
e sociais, que está diretamente ligado ao princípio de equidade e justiça social destacado
por Azevedo (2013).
Esses muitos significados da cidadania nos remetem novamente a afirmação de
Dale: nos modelos regionais de educação ocorre uma mutação na concepção de
cidadania por não haver a relação Estado/cidadão. Desde a Constituição Federal (1988)
e a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96) e
demais normativas dela decorrentes, cabe a política educacional o preparo dos cidadãos
para o exercício da cidadania, o que nos remete a um terceiro olhar possível
considerando a adesão do Brasil e países da América Latina à organização da União
Europeia, materializado pelo Projeto Alfa Tuning América Latina que estabelece uma
educação por meio de competências e indução à uma tipologia desejada de cidadania.
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Para Krawczyk (2008, p. 44), existe é uma tênue tentativa de integração universitária
latino-americana “de cima para baixo” para uma também tentativa de adequação ao
modelo europeu. Aponta Pena-Veja (2009) que as dimensões do diálogo e cooperação
serão elementos determinantes para a efetividade de integração da educação superior
latino-americana, o que ainda está por se constituir, e nessa integração há que se pensar
a formação para a cidadania.
Considerações finais
Esse estudo intentou discutir a implementação do Projeto Alfa Tuning America
Latina - com destaque para o Brasil - relacionando-o à formação para a cidadania, a
partir da análise dos pontos e contrapontos identificados na literatura nacional e
internacional que problematizam a adesão ao Projeto mencionado, uma vez que o
processo de educação superior supranacional ou regional influi diretamente na
distribuição da política educacional formal, considerando-a como parte integrante do
processo de formação para a cidadania. A política de educação de acordo com a
normativa legal brasileira tem como objetivo a formação para um tipo determinado de
cidadania, contudo, a mesma é diretamente influenciada em todas as etapas (definição,
formulação, transmissão e avaliação) pelo poderio supranacional. A questão do
financiamento e regulação do Projeto de reformas nas universidades pela União
Europeia nos leva a questionar como isso afeta a formação do cidadão, por meio do
processo educativo, de indivíduos e coletividades.
Já é possível perceber um movimento no terreno das reformas nas universidades
no sentido de integração regional. Se a integração configura-se no plano abstrato, o
movimento e as reformas são tangíveis o que afeta diretamente a formação do cidadão
que deve ser delineada a partir das prerrogativas legais, ou seja, a formação para a
cidadania enquanto valor ético político, que pressupõe participação direta dos cidadão
em todas as instâncias decisórias no processo democrático, contudo, até o momento a
formação para a cidadania predominante na implementação do Projeto Alfa Tuning
América Latina, conforme destacado pela literatura, refere-se a cidadania enquanto
valor econômico.
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Referências
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