a geometria enraizada na obra:
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A geometria enraizada na obra: concepção e resolução Cínthya Maria Rodrigues Álvares Isquierdo - São Paulo, 2012
UNIVERSIDADE SÃO JUDAS TADEU
Pós-Graduação Stricto Sensu
Mestrado em Arquitetura e Urbanismo
Cínthya Maria Rodrigues Álvares Isquierdo
A geometria enraizada na obra: concepção e resolução
Dissertação apresentada ao programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Arquitetura e Urbanismo da Universidade São Judas Tadeu, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo, sob orientação da Professora Doutora Kátia Azevedo Teixeira.
São Paulo 2012
UNIVERSIDADE SÃO JUDAS TADEU
Pós-Graduação Stricto Sensu
Mestrado em Arquitetura e Urbanismo
Cínthya Maria Rodrigues Álvares Isquierdo
A geometria enraizada na obra: concepção e resolução
Dissertação apresentada ao programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Arquitetura e Urbanismo da Universidade São Judas Tadeu, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.
Orientadora: Profa. Dra. Kátia Azevedo Teixeira
São Paulo 2012
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da Universidade São Judas Tadeu – USJT
Bibliotecário: Ricardo de Lima – CRB 8/7464
Isquierdo, Cínthya Mª. Rodrigues Álvares.
185g A geometria enraizada na obra: concepção e resolução / Cínthya Maria Rodrigues Álvares Isquierdo. – São Paulo, 2012. 136 f.: il.; 30 cm.
Orientador: Kátia Azevedo Teixeira Dissertação (mestrado) – Universidade São Judas Tadeu, São Paulo, 2012.
1. Desenho geométrico. 2. Raciocínio. 3. Razão e proporção. I. Teixeira, Kátia Azevedo. II. Universidade São Judas Tadeu, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Arquitetura e Urbanismo. III. Título.
CDD – 720.1
Dedico este trabalho à minha família:
Mauro, Álvaro e Aurélio
– razões da minha existência e dedicação;
e também aos meus alunos,
por me motivarem a sempre continuar nesta
missão de educar e auxiliar na formação do ser.
Agradeço aos meus pais – Rubens e Yvone –
pelo amor, carinho e cuidado sempre;
a todos os meus mestres - em especial ao
Prof. Arnaldo de Souza Cardoso e
Profª. Marina S. Marques de Oliveira Cardoso -
por me orientarem, acreditando em meu potencial;
à minha família pela cumplicidade e compreensão;
à Universidade São Judas Tadeu pelas oportunidades,
e à minha orientadora Profª. Drª. Kátia Azevedo Teixeira
pelo interesse, pela paciência e dedicação
demonstrados no desenvolvimento desta pesquisa.
Resumo
A Arquitetura, o Design e a Arte de um modo geral se beneficiam da
ciência da geometria em seus sistemas de representação, não só através do
desenvolvimento do desenho, mas também na visão e raciocínio espacial,
disciplinando a elaboração e a construção da forma.
Durante vinte anos, observou-se a dificuldade dos alunos ingressantes
aos cursos superiores de Arquitetura, Design e Engenharia em lidar com as
questões pertinentes ao conteúdo de geometria - o que acabou por originar
tal pesquisa - em especial os alunos de Arquitetura e Design, por serem as
áreas consideradas ainda mais vulneráveis ao problema da ausência do
ensino adequado de geometria, estipulando-as, portanto, como foco desse
estudo.
A busca da funcionalidade no ensino de matemática - e
consequentemente de geometria, tornando-a desimportante e apenas servil
ao ato de desenhar -, o crescente interesse e a real necessidade dos alunos e
profissionais em utilizar softwares específicos e apropriados às áreas em
questão – mascarando e iludindo o usuário quanto à substituição do
raciocínio geométrico e espacial -, são argumentos compositivos de um
cenário que compartilha uma fase de incertezas sobre a maneira de agir e
pensar em geometria.
Tais questões são consideradas nessa pesquisa procurando, como
objetivo, elucidar o valor do conhecimento de geometria no que concerne ao
equilíbrio entre pensamento, conhecimento e ação visando à concepção e a
resolução da obra. Para tanto, o processo metodológico adotado conta com
uma fundamentação composta por um levantamento bibliográfico onde se
considera principalmente teóricos como Manfredo Massironi, Mário Lívio,
Jorge Sainz, Ana Leonor M. Madeira Rodrigues, Philip J. Davis, dentre
outros, além de um estudo de casos – investigação da incidência de
elementos geométricos em cartazes de autores diversos que compõem uma
homenagem à cidade de São Paulo, e similar estudo considerando os
desenhos do projeto da Fundação Iberê Camargo do arquiteto Álvaro Siza -
procurando demonstrar a geometria enraizada na obra considerando as
possibilidades envolvidas nas etapas de concepção e resolução dos trabalhos.
Quatro capítulos dissertam sobre o tema, dispondo assuntos como a
importância e a maneira de abordar a geometria ao longo dos tempos; a
ligação do raciocínio geométrico às áreas diversas como a literatura, a ciência
e a educação; o comprometimento do raciocínio geométrico com a constante
preocupação em relacionar forma e proporção e ainda o envolvimento do
raciocínio geométrico à concepção e resolução através da representação
gráfica da forma e do espaço.
Nesse sentido, a pesquisa almeja verificar se as etapas envolvidas na
elaboração de um projeto - desde a concepção até a sua resolução – estão em
prejuízo por não se beneficiar adequadamente do amplo conhecimento teórico
e conceitual da geometria, o qual permite o desenvolvimento e o
aperfeiçoamento do raciocínio geométrico, indispensável à raiz do
pensamento.
Palavras chave: Geometria. Desenho. Raciocínio geométrico.
Abstract
Architecture, Design and Art are commonly benefited from geometry
and its systems of representation, not only because of the use of drawing
development, but also in the spatial vision and thinking, regulating the
elaboration and construction of form.
For twenty years, it has been observed the problems of first-year
students when entering Architecture, Design and Engineering courses in
dealing with problems linked to the geometry content – this is the origin of
this research – mainly Architecture and Design students, as these two areas
are the most vulnerable in receiving adequate geometry knowledge.
The search for functionality in the teaching of Mathematics – and
consequently geometry, makes geometry unimportant and only a servile
instrument in the art of drawing – the growing interest and the real
necessity of students and professionals in using specific softwares
appropriated to the mentioned areas –mask and deceive the user in relation
to replacing spatial and geometric thinking. These are compositional
arguments in a scenery which shares an uncertain phase about the right
way to think and act using geometry.
These issues are considered in this study having the objective of
clarifying the value of the knowledge of geometry, with the intention of
creating a balance among knowledge, thought and action, when the greater
goal is the conception and solution of the work. For that, the adopted
methodology discusses authors like Manfredo Massironi, Mário Lívio, Jorge
Sainz, Ana Leonor M. Madeira Rodrigues, Philip J. Davis, among others.
There is also the presentation of a case study which investigates the
appearance of geometric elements in billboards created by several artists,
where the idea was to pay tribute to the city of São Paulo, and a similar
study considering the drawings of the project from Fundação Iberê Camargo,
made by the architect Álvaro Siza – trying to show geometry presented in
the work, considering the possibilities involved on the steps of the conception
and solution of these works.
There are four chapters to discuss the theme, topics like the
importance and manner of approaching geometry through time; the linking
between geometric concept and fields like literature, science, education, the
commitment of the geometric concept with the constant worry in relating
form and proportion. Yet the involvement of the geometric thinking with the
conception and solution using graphic representation in form and space.
This way, this study intends to check if the steps involved in the
elaboration of a project – since the conception until the solution- have losses
as it does not take advantage adequately of the wide theoretical and
conceptual knowledge of geometry, the one which allows the development
and improving of the geometric concept, indispensable to the roots of
knowledge,
Keywords: Geometry, Drawing, Geometric Thinking
Sumário
11 Lista de ilustrações
17 Introdução
Capítulo 1
25 Pressupostos
Capítulo 2
38 Ponto de partida, ordenamento do pensamento e criação
Capítulo 3
50 Concepção e resolução: forma e proporção no Design
3.1 - Geometria|concepção e resolução, 51
3.2 - Geometria | proporção e identidade visual, 52
3.3 - Geometria | proporção e concepção de cartazes, 66
Capítulo 4
88 Concepção e resolução: a forma na Arquitetura
4.1 - Concepção | forma, 89
4.2 - Análise geométrica | Fundação Iberê Camargo, 99
4.2.1. Implantação|Térreo, 100
4.2.2. Segundo Piso, 109
4.2.3. Terceiro Piso, 113
4.2.4. Quarto Piso, 117
4.2.5. Elevações, 118
121 Considerações finais
127 Referências bibliográficas
- Dissertações, teses e artigos, 134
Lista de ilustrações
Capa: Fig. esquerda - Detalhe da Fundação Iberê Camargo. Fonte: <http://ivanmattos-maratonacultural.blogspot.com/2010/04/museus-do-mundo-museu-ibere-camargo.html> Acesso: 18/12/2011. Fig. direita - Cartaz participante da 2ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – (In)sustentabilidade Urbana ”, produzido por Fábio Prata e Flávia Nalon, 2009.
Fig. 1 – Representação da estrutura dos vórtices, Descartes. Fonte: MASSIRONI, Manfredo. Ver pelo desenho - aspectos técnicos, cognitivos, comunicativos. Lisboa: Edições 70, 1996, p. 127.
Fig. 2 – Representação do adensamento e refração sobre a mesma superfície. Fonte: MUNARI, Bruno. Design e comunicação visual. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p. 106.
Fig. 3 – Planta da creche projetada pelo arquiteto Alberto Campo Baeza para o QG da marca Benetton, em Ponzano. Fonte:<http://rseefo.com.br/?cat=3&paged=2>. Acesso: 18/08/2010.
Fig. 4 – Muro redondo circundando a creche da Benetton. Fonte: <http://rseefo.com.br/?cat=3&paged=2>. Acesso: 18/08/2010
Fig. 5 - Proporções de templo grego segundo Vitruvius, comparadas a exemplos concretos. Doczi, Gyorgy. O poder dos limites – harmonias e proporções na natureza, arte e arquitetura. São Paulo: Mercuryo, 1990.
Fig. 6 - Texto constituído por hieróglifos da escrita Maia. Fonte: <http://ekso.tripod.com/hist1/3-pre-col.htm>. Acesso: 01/02/2011.
Fig. 7 – Ilustração detalhada da estrutura corpórea de um escorpião. Fonte: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1676-06032005000200018>. Acesso: 01/02/2011.
Fig. 8 - Seqüência de desenhos demonstrando a busca de soluções das formas mais simples às formas extremamente complexas. Fonte: HSUAN-AN, Tai. Desenho e organização bi e tridimensional da forma. Goiânia: Editora UCG, 1997, p.44 e 45.
Fig. 9 – Projeto conceitual e inovador do designer Dzmitry Samal.
Fonte: http://www.samaldesign.com/pages/dzmitry_samal9.html. Acesso: 18/08/2010.
Fig. 10, 11, 12, 13, 14 e 15 – Demonstrações de uma forma orgânica – associações da geometrização a um grid. Desenhos realizados pela autora.
Fig. 16 – Desenho da geometrização da marca Eucatex, reproduzido pela autora. Fonte: STOLARSKI, André. Alexandre Wollner e a formação do design moderno no Brasil: depoimentos sobre o design visual brasileiro. São Paulo: Cosac Naify, 2005.
Fig. 17 – Ilustração do traçado do retângulo áureo, reproduzida pela autora.
Fig. 18 – Ilustração da subdivisão do retângulo áureo, reproduzida pela autora.
Fig. 19 – Ilustração do traçado da elipse áurea, reproduzida pela autora.
Fig. 20 – Cartaz participante da 1ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – poluição visual urbana”, produzido por Visca, 2008.
Fig. 21 – Cartaz participante da 4ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – a cidade e sua memória”, produzido por Henrique Nardi, 2011.
Fig. 22 – Cartaz participante da 3ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – diversidade cultural da metrópole”, produzido por Gustavo Maffei, 2010.
Fig. 23 – Cartaz participante da 2ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – (In)sustentabilidade Urbana ”, produzido por Marcos Cartum, 2009.
Fig. 24 – Cartaz participante da 2ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – (In)sustentabilidade Urbana ”, produzido por Vinícius Marson, 2009.
Fig. 25 – Cartaz participante da 4ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – a cidade e sua memória”, produzido por Alécio Rossi, 2011.
Fig. 26 – Grade do retângulo áureo sobreposta ao cartaz participante da 1ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – poluição visual urbana”, produzido por Visca, 2008.
Fig. 27 – Grade do retângulo áureo sobreposta ao cartaz participante da 4ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – a cidade e sua memória”, produzido por Henrique Nardi, 2011.
Fig. 28 – Grade do retângulo áureo sobreposta ao cartaz participante da 3ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – diversidade cultural da metrópole”, produzido por Gustavo Maffei, 2010.
Fig. 29 – Grade do retângulo áureo sobreposta ao cartaz participante da 2ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – (In)sustentabilidade Urbana ”, produzido por Marcos Cartum, 2009.
Fig. 30 – Grade do retângulo áureo sobreposta ao cartaz participante da 2ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – (In)sustentabilidade Urbana ”, produzido por Vinícius Marson, 2009.
Fig. 31 – Grade do retângulo áureo sobreposta ao cartaz participante da 4ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – a cidade e sua memória”, produzido por Alécio Rossi, 2011.
Fig. 32 - Cartaz participante da 2ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – (In)sustentabilidade Urbana ”, produzido por Daniel Innarelli, 2009.
Fig. 33 - Cartaz participante da 2ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – (In)sustentabilidade Urbana ”, produzido por Milton Cipis, 2009.
Fig. 34 - Cartaz participante da 3ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – diversidade cultural da metrópole”, produzido por Isidro Ferrer, 2010.
Fig. 35 - Cartaz participante da 3ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – diversidade cultural da metrópole”, produzido por Guma, 2010.
Fig. 36 - Cartaz participante da 3ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – diversidade cultural da metrópole”, produzido por Ronald Kapaz, 2010.
Fig. 37 - Cartaz participante da 3ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – diversidade cultural da metrópole”, produzido por Hélio de Almeida, 2010.
Fig. 38 - Grade da espiral áurea sobreposta ao cartaz participante da 2ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – (In)sustentabilidade Urbana ”, produzido por Daniel Innarelli, 2009.
Fig. 39 - Grade da espiral áurea sobreposta ao cartaz participante da 2ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – (In)sustentabilidade Urbana ”, produzido por Milton Cipis, 2009.
Fig. 40 - Grade da espiral áurea sobreposta ao cartaz participante da 3ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – diversidade cultural da metrópole”, produzido por Isidro Ferrer, 2010.
Fig. 41 - Grade da espiral áurea sobreposta ao cartaz participante da 3ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – diversidade cultural da metrópole”, produzido por Guma, 2010.
Fig. 42 - Grade da espiral áurea sobreposta ao cartaz participante da 3ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – diversidade cultural da metrópole”, produzido por Ronald Kapaz, 2010.
Fig. 43 - Grade da espiral áurea sobreposta ao cartaz participante da 3ª edição da exposição “Um cartaz para São Paulo – diversidade cultural da metrópole”, produzido por Hélio de Almeida, 2010.
Fig. 44 – Croquis de concepção da Fundação Iberê Camargo, arquiteto Álvaro Siza. Fonte: <http://www.teiaportuguesa.com/lusografo/sisavieira2012.htm > Acesso em: 02/06/2012.
Fig. 45 – Sede da Fundação Iberê Camargo. Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924 > Acesso: 26/09/2011.
Fig. 46 – Croquis de concepção da Fundação Iberê Camargo, Arquiteto Álvaro Siza. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 47 - Aparatos mecânicos desenvolvidos por Alberto Dürer para representar a perspectiva. Fonte: PEDOE, Dan. La geometría en el arte. Barcelona: Gustavo Gili, 1979.
Fig. 48 - Estudo de proporções associando a figura humana a uma projeção (elevação). Francesco di Giogio Martini, entre 1470 a 1480. Fonte: < http://dedsign.wordpress.com/textos/o-corpo-e-o-modelo/3-as-ideologias-de-um-corpo-completo-mas-fragmentado/> Acesso: 20/08/2011.
Fig. 49 – Desenho da Fundação Iberê Camargo. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924>
Acesso: 26/09/2011.
Fig. 50 – Maquete da Fundação Iberê Camargo. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 51 – Fundação Iberê Camargo – vista geral. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 52 - Fundação Iberê Camargo. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 53 - Fundação Iberê Camargo – vista aérea. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 54 – Desenho do 1º piso da Fundação Iberê Camargo. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 55 a 57 - Desenhos do 1º piso da Fundação Iberê Camargo sobrepostos aos traçados geométricos realizados pela autora.
Fig. 58 – Grid de 8 x 4 módulos (proporção 2 x 1) desenhado pela autora.
Fig. 59 e 60 – Sobreposição do grid de 8 x 4 módulos ao desenho da Fundação Iberê Camargo.
Fig. 61 - Grid de 5 x 3 módulos desenhado pela autora.
Fig. 62 a 67 - Desenhos do 1º piso da Fundação Iberê Camargo sobrepostos aos traçados geométricos realizados pela autora.
Fig. 68 - Desenho do 2º piso da Fundação Iberê Camargo. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 69 a 74 - Desenhos do 2º piso da Fundação Iberê Camargo sobrepostos aos traçados geométricos realizados pela autora.
Fig. 75 - Desenho do 3º piso da Fundação Iberê Camargo. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 76a e 76b - Desenhos do 3º piso da Fundação Iberê Camargo sobrepostos aos traçados geométricos realizados pela autora.
Fig. 77 – Grid de 5 x 3 módulos desenhado pela autora.
Fig. 78 - Sobreposição do grid de 5 x 3 módulos ao desenho do 3º piso da Fundação Iberê Camargo.
Fig. 79 a 81 - Desenhos do 3º piso da Fundação Iberê Camargo sobrepostos aos traçados geométricos realizados pela autora.
Fig. 82 - Desenho do 4º piso da Fundação Iberê Camargo. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 83a e 83b - Desenhos do 4º piso da Fundação Iberê Camargo sobrepostos aos traçados geométricos realizados pela autora.
Fig. 84 – Desenho da elevação norte da Fundação Iberê Camargo. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 85 – Desenho da elevação leste da Fundação Iberê Camargo. Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 86 - Desenho da elevação norte da Fundação Iberê Camargo sobreposto ao traçado geométrico realizado pela autora.
Fig. 87 - Desenho da elevação leste da Fundação Iberê Camargo sobreposto ao traçado geométrico realizado pela autora.
17
Introdução
Considerada um ramo antiquíssimo da matemática que estuda as
figuras e os corpos geométricos – definição mais comum a esta ciência1 – mas
constituindo-se, acima de tudo uma filosofia2, a geometria permite a
apreensão e compreensão de problemas gerais pertinentes ao espaço, por
meio do desenvolvimento do raciocínio3, da visão espacial, da capacidade de
abstração, e da ideia de disciplina e de processo na elaboração e construção
da forma.
A geometria é, pois, responsável por “atitudes mentais próximas do
pensamento imagético” (RODRIGUES, 2000, p. 100), imprescindíveis ao
desenvolvimento intelectual adequado para diversas áreas, em particular
para aquelas que dependem do raciocínio espacial e/ou imagético e que têm o
desenho como instrumento de criação artística4, de projeto e como sistema de
representação, a exemplo da Arquitetura, do Design, e das Artes de um modo
geral.
1 Pedoe (1979, p. 13) afirma que a explicação para a origem da palavra geometria é verossímil e a aceitamos, tanto por esta razão como por não dispor de nenhuma outra.
2 Não se refere aqui apenas ao estudo de geometria associado à prática, como por exemplo, sua aplicação através do desenho geométrico, mas no que é análogo aos princípios da filosofia, adquirindo “um caráter mais geral, mais abstrato, mais reflexivo, no sentido da busca dos princípios que tornam possível o próprio saber.” (JAPIASSU, 1990, p. 100).
3 O termo raciocínio é aqui entendido como um “procedimento racional de argumentação ou de justificação de uma hipótese” (JAPIASSU, 1990, p. 208).
4“Produção original do ‘gênio’ nas belas-artes. A ideia de criação artística se opõe à noção de produção, à noção de fabricação e à ideia de reprodução, mas ela não é uma criação ex nihilo, pois a obra é nova e parte de elementos pré existentes.” (JAPIASSU, p. 61-62)
18
No entanto, essa realidade vem sendo gradual e constantemente
confrontada com uma constatação: no decorrer de vinte anos de atividade
acadêmica como docente, ministrando aulas das disciplinas de Desenho
Geométrico, Desenho Técnico e Geometria Descritiva, em cursos superiores
de graduação, foi possível a esta pesquisadora observar o crescente número
de ingressantes aos cursos de Arquitetura e Urbanismo, Design e
Engenharias (Civil, Mecânica, Produção, Elétrica e Computação) sem
qualquer instrução básica de geometria e, consequentemente, com
dificuldades em desenvolver e utilizar a percepção espacial. Em sendo os
cursos de Engenharia bastante embasados no pensamento lógico-matemático
e menos dependentes do uso constante das representações gráficas
destinadas ao projeto, a inquietação se ameniza, em parte, pelo fato dos
estudantes nele desenvolverem a capacidade de abstração com o uso de
outras abordagens matemáticas - como o cálculo e a álgebra. Mas tal feito
não ocorre, com a mesma ênfase, nos cursos superiores de Arquitetura5 e de
Design.
Essa percepção, naturalmente, não é individual e exclusiva.
Pavanello (1989), por exemplo, em trabalho que investiga o ensino de
geometria ao longo dos anos, no Brasil, aponta as dificuldades que os alunos
apresentam - nos diversos níveis de ensino, relativamente ao emprego de
representações geométricas para visualização de conceitos e à compreensão
de processos de demonstração. Enfatiza, principalmente, as perdas que
ocorrem em relação ao desenvolvimento do raciocínio hipotético-dedutivo, da
capacidade de abstrair e de generalizar.
5 Questões dessa ordem podem ser verificadas em trabalhos que abordam a formação nos cursos de Arquitetutar a e Urbanismo no Brasil, entre os quais TEIXEIRA, Kátia Azevedo: Ensino de projeto: Integração de conteúdos. São Paulo, 2006. Tese (doutorado). Universidade De São Paulo, faculdade de Arquitetura e Urbanismo.
19
Essa circunstância não se desvincula de um conjunto de escolhas e de
critérios internos a um contexto mais amplo, subordinado à orientação do
ensino no país. Uma das constatações importantes é que:
Esta problemática se desenrola quando a escola pública se expande
no Brasil, permitindo o ingresso de uma quantidade muito maior de
alunos. Propõe-se, desta forma, aos professores um novo desafio:
trabalhar com uma população muito diferente daquela com a qual
estavam acostumados a lidar, sob novas (e piores) condições de
trabalho – e de remuneração - e sob a pressão do Estado, que a toda
hora lhes lembra o custo econômico de manter, anualmente, cada
aluno na escola. (PAVANELLO,1989, p.165-166).
Outra questão, ainda segundo a autora, imbricada com a anterior, é
a atual defesa do caráter prático e intuitivo do ensino nos primeiros níveis,
privilegiando aquele que é considerado mais utilitário. Registro que é
corroborado por Maia6 (1997) ao afirmar que “(...) a funcionalidade buscada
pelos professores brasileiros se dirige, quase que exclusivamente, para a
utilização da matemática na resolução de problemas da vida quotidiana”,
para em seguida comparar tal procedimento com o dos professores franceses,
para os quais a “(...) funcionalidade se exprime, ainda, pela eficiência do
pensamento matemático, no sentido de formação da mente”, questão que
costuma ser considerada pelos docentes brasileiros como específica da
matemática abstrata.
Esse quadro de menor atenção à importância formadora da disciplina
deriva para situações mais graves, ainda de acordo com Pavanello (1989),
que constata a quase inexistência, muitas vezes, de um trabalho com
6 Analisando a aula de matemática: um estudo a partir das representações sociais da geometria. Disponível em: < ww.anped.org.br/reunioes/25/licialeaomaiat19.rtf > Acesso: 27/02/2011.
20
geometria nas escolas públicas de 1º e 2º graus. A autora registra, a partir de
relato de alunos, casos em que mesmo as noções elementares de geometria
foram ignoradas, inexistindo na fase escolar básica7, condição que
compromete de modo perverso a formação integral do próprio estudante.
A ausência de tais conteúdos ou mesmo de conteúdos mal elaborados
e/ou mal apresentados, nos níveis de ensino anteriores, implica em maiores
dificuldades a serem enfrentadas pelos alunos ingressantes em cursos
superiores que contemplam a geometria em seus currículos como
Arquitetura e Urbanismo, e Design. Essas dificuldades podem transformar-
se até mesmo na impossibilidade de acompanhar tal estudo e em aplicá-lo,
com alguma autonomia, nas soluções de projeto, fato que se estende e se
reflete muitas vezes na vida profissional 8.
Outro fator, na atualidade, também incide sobre a mesma questão: é
a apropriação, com menor competência, dos softwares específicos para
Arquitetura e Design. Instrumento de extraordinária importância para tais
áreas, é utilizado pelos estudantes menos preparados com a convicção de que
a computação gráfica, por si só, pode resolver problemas da ordem do
raciocínio.
E, no entanto, como sabemos, quando se trata do processo criativo de
projeto, os conhecimentos geométricos são imprescindíveis à elaboração da
7 No artigo Por que ensinar/aprender geometria?, Pavanello relata o problema do abandono do conteúdo de geometria nas aulas de matemática no Estado de São Paulo desde o início da década de 80. Disponível em: < http://www.sbempaulista.org.br/epem/anais/mesas_redondas/mr21-Regina.doc > Acesso: 24/02/2011.
8 Curiosamente, Martino (2001) discorre sobre o completo abandono do ensino de geometria nas academias militares do Exército Brasileiro – onde o currículo era destinado à formação de engenheiros – afirmando que disciplinas como Topografia e Geometria Descritiva (ambas extintas do currículo) poderiam contribuir à formação cultural e preparação técnica dos oficiais do Exército, se devidamente conduzidas por professores adequadamente preparados.
21
ideia: “desenhar e pensar são processos próximos e semelhantes,
independentemente das desmultiplicações possíveis que códigos, estilos ou
tecnologias possam fazer parecer diversos” (RODRIGUES, op.cit. p. 119).
Desenho e pensamento instruído são interdependentes, e utilizam a
computação gráfica como um ferramental auxiliar9 valioso que permite, pela
agilidade proporcionada, investigar possibilidades e experimentá-las.
Esses fatores, em conjunto, colaboram para que esta pesquisa esteja
direcionada justamente à Arquitetura e Urbanismo e ao Design,
indiscutivelmente áreas mais vulneráveis à ausência do ensino adequado de
geometria. Tem, como principal objetivo, investigar a contribuição do
conhecimento da geometria no que concerne às relações entre concepção e
resolução, em particular o suporte que a disciplina representa para o
desenvolvimento do raciocínio hipotético-dedutivo e para a capacidade de
abstrair e de projetar.
A pesquisa articula dois percursos complementares. Um, de cunho
teórico, procura fundamentação através de bibliografia que contempla
trabalhos de René Descartes, Manfredo Massironi, Ana Leonor M. Madeira
Rodrigues, Jorge Sainz, Philip J. Davis, Mário Lívio, György Doczi, Henri
Focillon, Dan Pedoe. Outro busca identificar e demonstrar, por meio de
estudos de caso, alguns vínculos particulares entre a geometria e as áreas de
Design e de Arquitetura, tanto no aspecto da formação do raciocínio espacial,
quanto em relação à construção, ao aprimoramento e ao domínio da
representação formal. 9 Em geometria, o computador é um instrumento de desenho de muito maior poder do que as articulações e os moldes e padrões das salas de desenho tradicionais. Gráficos de computador mostram desenhos, lindamente sombreados e coloridos, de “objetos” que existem somente como definições matemáticas ou no programa utilizado. O observador seria capaz de jurar que estas imagens são fotografias projetadas de objetos reais. Mas estaria errado; os “objetos” retratados não tem existência no “mundo real”. Em alguns casos, não poderia de maneira alguma ter uma tal existência. (DAVIS, 1986, p. 41).
22
Ao Design interessaram os cartazes que compõem uma homenagem
gráfica10 aos aniversários da cidade de São Paulo, desde 2008, ano de sua
criação, a 2011, dos quais 12 integram este estudo O recorte estabelecido é
duplamente pertinente:
- participaram da concepção dos cartazes novos profissionais, questão
relevante por incentivar e atrair jovens designers, constituindo um conjunto
com diversidade de formação, de propostas e de qualidade dos trabalhos;
- caracteriza o conjunto da produção encaminhada à exposição a
expressão gráfica contemporânea, o que, por isso mesmo, desperta forte
interesse e estabelece maior proximidade com os anseios dos estudantes.
O estudo de caso de obra de arquitetura focaliza o projeto da
Fundação Iberê Camargo, primeira obra do arquiteto português Álvaro Siza
no Brasil, implantada em Porto Alegre e inaugurada em 2008. O projeto
atende a dois critérios considerados relevantes para a pesquisa:
- a conveniência de a obra ser visitada, registrada fotograficamente e
percebida in loco circunscreve as possibilidades ao Brasil, e é uma condição
chave para o próprio pesquisador na aproximação que faz com arquitetura, a
partir de sua formação em Educação Artística e a docência na área de
Design.
- maior complexidade e dinamismo na configuração espacial dessa
obra, de modo a permitir que a investigação e o registro dos recursos
geométricos utilizados sejam mais ricos, para o interesse da pesquisa,
relativamente aos projetos de arquitetura baseados em formas geométricas
10 O projeto é uma parceria da USP – Maria Antônia e Senac São Paulo, sob curadoria de Alécio Rossi e Paulo Moretto (concepção) e ocorre anualmente, desde 2008. Em 2012 a parceria ocorreu entre o Senac São Paulo e a Biblioteca Mário de Andrade.
23
puras11 (sem juízo de mérito), que caracterizam a maior parte da produção
arquitetônica brasileira.
Estruturada em quatro capítulos, a pesquisa aborda no primeiro
alguns conceitos relacionados ao desenvolvimento e à importância do
raciocínio geométrico-matemático, em períodos de relevância na história,
sem o intuito de traçar um panorama cronológico categórico. Envolve
questões que articulam geometria e cálculo, realizadas por Descartes e
conceitos de Massironi, dentre outros.
A vinculação entre o pensamento lógico - abstrato oriundo dessa
disciplina, com outros campos de atuação que dele se beneficiam, é enfocado
no segundo capítulo. Expõe-se a intimidade existente entre tal raciocínio e
aquele da literatura, visando a sugestão de imagem; na educação, pela
necessidade de um sistema lógico, estruturador, que permite a exposição do
pensamento puro, abstrato, para a fala e para a escrita; na ciência, através
do papel das imagens descritivas, quando assumem função substitutiva dos
próprios objetos que representam.
No terceiro capítulo aborda-se a área de Design, em estudos
centrados no material iconográfico dos cartazes selecionados, que procuram
registrar - por meio de desenhos de análise e de demonstração - os
conhecimentos e procedimentos geométricos que contribuem para a
composição e refinamento da forma – em particular critérios de proporção,
equilíbrio, simetria, etc..
11 A partir da revolução industrial, os inúmeros e bons exemplos de arquitetura moderna baseiam-se em formas geométricas puras – cubo, prisma, cilindro - com o objetivo tanto de facilitar a produção em escala como o de traduzir as ideias de racionalidade com um caráter universal. “O empirismo e os livros de modelos, que haviam servido tão admiravelmente até ao período georgiano, foram geralmente descartados como excessivamente simples e ‘inartísticos’.” (GOMBRICH, 1988, p. 395).
24
Do mesmo modo procede-se, no quarto capítulo, à análise do
raciocínio geométrico que subsidia a criação de espaços, expressa através de
desenhos que constituem o sistema de representação da área de arquitetura.
Identificação e verificação dos conceitos apoiam-se, novamente, em material
iconográfico – plantas, cortes e imagens - do projeto selecionado.
A guisa de conclusão, o último capítulo aponta algumas
recomendações que se julgou pertinentes para recuperar a contribuição ao
desenvolvimento do pensamento cognitivo propiciado pela geometria.
25
1 – Pressupostos
Um saber que não estabelece o seu fundamento de acordo com a sua essência e que, ao fazê-lo, não se
limita a si mesmo, não é um saber, mas um opinar.
Martin Heidegger (1987, p. 82)
As origens da geometria12 respondem às necessidades fundamentais
do cotidiano: dividir as terras férteis às margens dos rios, construir casas,
prever os movimentos dos astros com relação à Terra. Pode-se dizer que há
uma associação direta à agrimensura realizada no Egito antigo, pelos
conhecimentos necessários à reconstituição das marcações de terrenos
destruídas pelas enchentes do Nilo e, certamente, para a construção das
pirâmides.
Indícios de que outras culturas já possuíam algum saber relacionado
à matemática sempre ocorrera, resultado de distintas necessidades que
levavam os homens a criar, ao sabor do próprio fazer, as bases da geometria:
“(...) o conhecimento matemático tanto egípcio quanto o babilônico (...) tinha
a experiência como critério de verdade” (BICUDO apud EUCLIDES, 2009, p.
77), mesmo independente da compilação de registros sistemáticos sobre
essas culturas: “afirmações sobre a origem da matemática, seja da
aritmética, seja da geometria, são necessariamente arriscadas, pois os
primórdios do assunto são mais antigos que a arte de escrever”, como,
prudente, previne Boyer (1996, p. 4). Este pensamento é complementado por
Pedoe (1976) ao lembrar a existência de lacunas que a humanidade tem
12 Do grego geo ‘terra’, que se documenta em vários compostos já formados no próprio grego: geometria, medir a terra. (CUNHA, 2010).
26
sobre seu próprio passado, tantas são as obras que não sobreviveram para
serem traduzidas ou, quando conservadas, muitas delas passaram por
interpretações provavelmente aquém dos originais, abrindo espaço para
dúvidas e inseguranças quanto ao verdadeiro significado de palavras e frases
empregadas por gregos e romanos em seus escritos.
O certo é que, apesar de não termos condições de identificar
categoricamente a data de origem da geometria, por volta do século IV ela é
considerada uma das sete artes liberais que compõem a combinação do
trivium e do quadrivium13, responsáveis por condensar o saber do período.
É na Grécia que grandes matemáticos dão a forma definitiva à
geometria, à aritmética, à astronomia e à música, e a matemática ganha
características de uma ciência dedutiva. Pensadores primeiros mais notáveis, nos
séculos anteriores a Cristo, construíram raciocínios extraordinários que
vigoram e que seguem sendo suporte para o desenvolvimento constante da
ciência: Tales de Mileto com a demonstração da altura da pirâmide, dando
origem à geometria dedutiva; Pitágoras e o teorema que leva seu nome e
relaciona três lados de um triângulo retângulo, além dos estudos com a
geometria espacial centrados no cubo, tetraedro, octaedro e esfera; Platão e o
“Timeu”, obra que aborda a origem do universo considerando cinco figuras
cósmicas perfeitas; Euclides e “Os elementos”, vasto trabalho reunido em
treze volumes, que expõe um método consistente que apresenta postulados
(axiomas), proposições (teoremas e construções), e provas matemáticas das
proposições14, capaz de contribuir há mais de vinte séculos para o
13 O trivium era composto pela gramática, pela retórica e pela dialética, e o quadrivium pela aritmética, geometria, astronomia e a música. (PEDOE, 1976, p. 9 – tradução nossa).
14 O sistema axiomático parte de conceitos e proposições admitidos sem demonstração e que são base para a construção lógica dos raciocínios subseqüentes. Para a Geometria euclidiana, são três os conceitos fundamentais: o ponto, a reta e o círculo, e cinco postulados
27
desenvolvimento da ciência. Exemplos importantes capazes de ilustrar um
cenário histórico muito mais amplo, que contém o percurso e os registros
referentes à filosofia da geometria e sua influência decisiva à compreensão
do espaço e aos sistemas de representação.
Já no século XVII, Descartes (1596 – 1650), considerado o fundador
da arché filosófica moderna, o Cogito, e da evidência do pensamento
reflexivo, expõe no Discurso do método (1637) as regras gerais para que se
encontre o conhecimento verdadeiro, livre de pressupostos religiosos e dos
enganos das aparências, válido para qualquer saber, pois “(...) todas as coisas
com possibilidades de serem conhecidas pelos homens seguem-se umas às
outras da mesma maneira” (Descartes, 2006, p. 21).
Meticulosamente, orienta procedimentos como a divisão das
dificuldades em parcelas possíveis e necessárias para a obtenção de melhores
soluções; a condução precisa e ordenada do pensamento, do mais simples aos
mais complexos; e, ainda, o cuidado com enumerações gerais e as revisões
completas, de modo a nada ser omitido. Transparece, no método que defende,
a inspiração advinda do trabalho dos geômetras, os quais utilizam longas
séries de razões para demonstrar as mais difíceis situações, na crença de que
a estrutura matemática é a chave para a compreensão do universo. A síntese
de CAPRA (2006, p. 53) capta perfeitamente a gênese do trabalho de
Descartes: “A certeza cartesiana é matemática em sua natureza essencial.”
Ao combinar geometria e cálculo, Descartes desenvolve
filosoficamente questões que então formula relativas a essa área,
confirmando o potencial da mesma na integração de atitudes cognitivas e na
ampliação do entendimento do mundo. Para MASSIRONI (2010,p.148)
a eles referentes. Existem geometrias não-euclidianas, com base em postulados diferentes daqueles utilizados por Euclides. (BOYER, 1996)
28
“Descartes descobriu que a geometria ocupava uma região intermediária
entre o sensível e o abstrato e que, por essa razão, ela podia representar o
filtro através do qual se deveriam fazer passar os dados da pesquisa
empírica, com o fim de construir um saber unitário.” É uma teoria do
conhecimento que se vai eleborando, caracterizada pela razão, que encontra
na matemática e na geometria o apoio de uma rigorosa lógica dedutiva, que
permite compreender, descrever e representar, de forma organizada, todo o
mundo em que se vive (Fig. 1 e 2).
Fig. 1 (esquerda) – Representação da estrutura dos vórtices, Descartes, 1644 – criação artística exercendo conexões entre pensamento e percepção visiva. Fonte: MASSIRONI, Manfredo. Ver pelo desenho - aspectos técnicos, cognitivos, comunicativos. Lisboa: Edições 70, 1996, p. 127. Fig. 2 (direita) – Representação do adensamento e refração sobre a mesma superfície – percepção visiva, sensibilidade e abstração que sugerem formas similares às concebidas por Descartes. Fonte: MUNARI, Bruno. Design e comunicação visual. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p. 106.
29
Outra abordagem filosófica importante acerca de geometria
envolvendo processos que elaboram o conhecimento é selecionada e
apresentada por Nicola em sua Antologia de Filosofia (2005), sobre a tese
tratada por Nicolau de Cusa (1401 – 1464):
Conhecer, afirma Nicolau de Cusa, é estabelecer uma proporção
entre o conhecido e o desconhecido, entre o que já se conhece e o que
se vai conhecer. Consequentemente, o processo de acréscimo deve ser
lento e gradual; os objetivos de qualquer investigação cognitiva não
podem ultrapassar muito o nível atual de conhecimento. Podemos
nos acercar da verdade somente por aproximações sucessivas, como
os geômetras quando tentam calcular a área de um círculo
calculando a área de um polígono inscrito com maior número
possível de lados. Mas como esse polígono, apesar de facetado em
grande número de lados, não chegará nunca a coincidir com a
circunferência, assim também a mente humana não possuirá jamais
a verdade. Por um lado, resulta confirmada a incognoscibilidade de
Deus, que escapa por definição a qualquer proporção humana; por
outro lado, pela primeira vez na época moderna enfatiza-se a
importância da matemática, a ciência das proporções que Nicolau
de Cusa identifica com o próprio pensamento. (NICOLA, 2005, p.
162)
É ressaltada aqui, como se depreende claramente do texto, a relação
existente entre o raciocínio matemático e as fases de aquisição de
conhecimento no momento da investigação, ou seja, no momento em que se
utiliza o método de pesquisa. Durante estas etapas emprega-se a ideia de
proporção, ou seja, investiga-se através de um caráter comparativo. Esse
raciocínio estabelece uma analogia com o pensamento de Descartes – teórico
também abordado por Nicola - onde basicamente “método é o conjunto de
regras e de prescrições capazes de evitar o erro e garantir a validade do
resultado.” (op. cit., p. 222).
30
O método de pesquisa inspirado na geometria não foi de interesse e
preocupação exclusiva só dos filósofos. No que tange à área de Arquitetura,
deve-se considerar o Tratado de Arquitetura de Vitrúvio (~70-25a.C.), onde
constam afirmações que organizam conhecimentos fundamentais à
arquitetura e à sua prática, tratando, entre outras coisas, também sobre
geometria.
A ordenação do conhecimento inspirada nos preceitos da matemática
e da geometria já está presente no Tratado de Arquitetura (De Architectura)
de Marco Vitruvio Polião (~70-25a.C.) um dos primeiros pensadores a
compreender que a realidade do modelo operatório de análise é pertinente às
diversas expressões do conhecimento, em particular ao exercício da
arquitetura. O trabalho15 que realiza, ao longo dos dez volumes do Tratado,
expressa essa condição pela racionalidade com que conduz tanto a
abordagem como a organização dos saberes fundamentais à arquitetura e à
sua prática.
Quando Vitruvio, em seu texto, expõe questões relacionadas à
ciência, à teoria e à prática do arquiteto, pode-se destacar, relativamente a
15 “Vitrúvio esclarece em diversas ocasiões que o tratado De architectura compreende o corpus da disciplina. A afirmação possui um sentido inequívoco. Em seus Dez Livros o autor conduz uma reflexão sobre a arquitetura, considerando não apenas âmbitos diferenciados ou gêneros singulares de edificação, mas o conjunto unitário das partes. Tal coordenação entre partes e todo permite estabelecer os preceitos comuns e as diferenças qualitativas, precisando os limites de cada gênero, e alcançando, enfim, uma doutrina orgânica e completa da arquitetura. Aí reside a maior diferença entre o De architectura e os demais escritos. Comentários sobre edifícios isolados, tratados sobre symmetríai de templos dóricos, jônicos ou coríntios, sobre as espécies de representação, permanecem sempre "partículas desconexas". Mesmo os autores que se propuseram escrever sobre a disciplina em si, como Varrão ou P. Sétimo, não alcançaram, na opinião do autor, pleno êxito.” (D’AGOSTINO, Mário Henrique Simão. A obscuridade do arquiteto vitrúvio e a redação de os dez livros de architetura. Disponível em: <http://www.revistasusp.sibi.usp.br/scielo.php?pid=S1518-95542003000200003&script=sci_arttext> Acesso em: 02/06/2012.)
31
esta pesquisa, o trecho que aborda os conhecimentos de literatura, desenho,
aritmética e geometria:
Convém que o arquiteto conheça a arte literária, para que possa
deixar uma marca mais forte através dos seus escritos. Também
deverá ser instruído na ciência do desenho, a fim de que disponha
da capacidade de mais facilmente representar a forma que deseja
para suas obras, através de modelos pintados. A geometria, por seu
lado, proporciona à arquitetura muitos recursos. (...) através da
aritmética, se calculam as despesas dos edifícios, se define a lógica
das medidas e se encontram soluções para as difíceis questões da
comensurabilidade através da lógica e métodos geométricos.
(VITRUVIO, 2007, p.31)
Vitruvio, ao longo do texto, intensifica a relação existente e
necessária entre a arquitetura e as outras ciências citando um paralelismo
entre os astrônomos, os músicos e os geômetras16 - no que diz respeito à
harmonia – complementando que os arquitetos passariam a ser matemáticos
se obtivessem os conhecimentos profundos referentes às áreas citadas, pois
estariam “armados com os dardos de muitos saberes”, mas adverte que
“todavia, estas pessoas encontram-se raramente”. (op. cit., p. 36).
Heidegger (1889 - 1976) (1987, p. 82), dois mil anos após Vitruvio, e
200 anos após Descartes, considera que “o traço fundamental da ciência
moderna é o matemático”, entendendo o termo ‘matemático’ com dois
sentidos absolutamente complementares: aquele que “(...) se pode aprender
de modo já referido e somente desse modo, (...) e o modo do próprio aprender
e do proceder.” (op. cit., p. 81). Assim como os demais autores anteriormente
16 Apenas quando trata sobre o tema dos ventos em seus Dez Livros é que menciona a geometria pela primeira vez, pois se interessava muito pelas questões de saúde e comodidade, pretendendo que as direções das ruas captassem os ventos através de seus vãos. (PEDOE, 1976 – tradução nossa).
32
citados, Heidegger refere-se à natureza da disciplina e à lógica de aquisição e
desenvolvimento de saberes dela derivada: dos conhecimentos de base até
aqueles de topo, promovendo o processo de assimilação através de uma
determinada ordem: o entendimento da próxima etapa rigorosamente
apoiado e dependente da compreensão da anterior e assim sucessivamente,
segundo a estrutura ordenada da disciplina. Para Heidegger, “o matemático,
no sentido originário do aprender-a-conhecer aquilo que já se conhece, é o
pressuposto fundamental do trabalho ‘acadêmico’ (...), o pressuposto
fundamental do saber acerca das coisas” (op cit., p. 82). É, portanto o
ordenamento crescente e lógico que subsidia e se faz presente no processo de
aquisição de conhecimento, mesmo não sendo a matemática aquela a ser
trabalhada, que deve ser observado.
E, valendo-se da vigorosa frase colocada por Platão no acesso à
Academia - ‘ninguém pode ter aqui entrada, se não tiver compreendido o
matemático’17 - Heidegger afirma a relevância dos fundamentos, para todas
as áreas, dos preceitos sobre os quais o conhecimento é construído:
(...) as condições-de-fundo para o poder-saber adequado e para o
saber são o saber dos pressupostos fundamentais de todo o saber e
da atitude suportada por um tal saber. (...) (a frase à entrada da
Academia) contém nada mais nada menos que uma rigorosa
condição de trabalho e uma clara delimitação do trabalho. Ambos
tiveram por conseqüência que nós, ainda hoje, dois mil anos mais
tarde, não o realizamos totalmente, nem o conseguiremos fazer
enquanto não nos tomarmos a sério. (HEIDEGGER, 1987, p. 82).
A crítica de Heidegger reafirma a importância do conhecimento em
geometria ser fundamental na construção do pensamento formal, mas
17 Há outras traduções para a frase da entrada da Academia de Platão. Lívio (2008, p. 80) transcreve: “Que pessoa alguma destituída de geometria entre por essa porta.”
33
levanta também uma questão essencial em relação à aquisição deste
conhecimento. Apesar da estreita ligação da geometria com as questões
filosóficas e, portanto, possibilitando reflexões sobre o espaço e as formas
inseridas no mesmo, ela está presente de maneira bastante explicita no que
se referem à configuração gráfica da mesma, mais precisamente através do
desenho geométrico, cujos elementos primordiais são o ponto, a linha e o
plano, apresentados em Os Elementos18 de Euclides (~300 a.C.), obra que
está dividida em treze livros ou capítulos tratando não apenas de
geometria, mas também de teoria dos números e álgebra elementar. A
morfologia geométrica apresentada na obra de Euclides permite o estudo e a
compreensão das formas gerais da natureza, a partir de analogias às formas
classificáveis de distintos grupos, conhecidas como formas geométricas
‘padrões’. (CARVALHO, 1958, p.11).
A apreensão dos conhecimentos de geometria, auxiliada pelo
desenho, possibilita a comunicação de ideias mesmo elementares - mas já
com o ganho de estarem perfeitamente estruturadas e organizadas - ainda
que não apresentem graficamente, nesta etapa, elaboradas sob o rigor obtido
com o uso de instrumentos de precisão. Essa condição e os procedimentos
aderentes a ela constituem um sistema construtivo de ideias formais no qual,
segundo Kandinsky (1997, [prefácio] p. XXIII), a “lógica do aparecimento das
formas estaria ligada à capacidade de estabelecer formas simples. Tudo se dá
entre a horizontal, a vertical, a diagonal e o círculo”. para Kandinsky (1997,
[prefácio] p. XXIII), (Fig. 3 e 4).
18 A obra Os Elementos de Euclides assemelha-se a um livro-texto que apresenta em ordem lógica todos os assuntos básicos da matemática elementar, e não pode ser considerado um compêndio de todo o conhecimento geométrico. (BOYER, 1996).
34
Fig. 3 (esquerda) – Planta da creche projetada pelo arquiteto Alberto Campo Baeza para o QG da marca Benetton, em Ponzano.– desenho absolutamente geométrico, com base nas formas circular e quadrangular. Fonte:<http://rseefo.com.br/?cat=3&paged=2.> Acesso: 18/08/2010. Fig. 4 (direita) – Circundando a creche da Benetton e criando um forte contraste geométrico, um muro redondo de cerca de dois metros de espessura reserva diferentes surpresas para as crianças – redução às formas mais puras da inteligibilidade. Fonte:<http://rseefo.com.br/?cat=3&paged=2.> Acesso: 18/08/2010
É a sequência do raciocínio sistemático que estabelece a organização
necessária à construção da forma, elaborada a partir de uma abordagem
intelectual, processo este que pressupõe a ação (mesmo que subjetiva) da
geometria. Focillon (2001, p. 21) também alega não haver “nada mais
tentador – e, em certos casos, mais razoável – do que apresentar as formas
submetidas a uma lógica interna que as organiza.” Complementa, ao
mencionar o ornamento (mas a ideia se aplica perfeitamente a outros
exemplos) que a essência do mesmo “(...) consiste em poder reduzir-se às
formas mais puras da inteligibilidade, e que o raciocínio geométrico se aplica
sem defeito à análise das relações entre as partes.” (op. cit., 2001, p. 21).
Finalmente, vale lembrar que a relação entre formas puras e
raciocínio espacial acompanha, de há muito e de modo persistente, os textos
35
relacionados à geometria sagrada19, na procura dos elementos que possam
significar e expressar a ambicionada união entre a matéria e o espírito e que
possam, intuitiva ou conscientemente, serem “sentidos” ou aprendidos pelo
homem.
Para Lawlor, os órgãos de percepção do homem e o mundo dos
fenômenos que são percebidos por ele podem ser mais bem compreendidos
tanto mais se confrontam com esquemas puros ou com estruturas
geométricas de forma e proporção: “A geometria trata da forma pura, e a
geometria filosófica reconstrói o desenvolvimento de cada forma a partir de
outra anterior. É uma maneira de tornar visível o mistério criativo
essencial”. (LAWLOR, 1996, p. 10).
Por isso mesmo são constantes, nos estudos sagrados, as ligações
entre a geometria, a arquitetura, a arte sacra e a música, demonstradas
pelas relações comuns que fundamentam e que permeiam tais áreas, em
especial as de harmonia e de proporção (Fig. 5). A beleza geométrica que
pode ser criada, a partir de um sistema de formas simples que permite
incontáveis derivações de novas formas e relações, torna mais próximo -
quase visível - a própria presença de Deus.
19 Geometria sagrada é a denominação usual para os estudos das ligações entre as proporções e formas contidas no micro e no macrocosmo, com o propósito de compreender a Unidade que permeia toda a Vida. Entre os conceitos dos antigos filósofos, que têm caráter sagrado, e os modernos, puramente racionais, há uma diferença fundamental: os antigos viam a matemática e a geometria como uma meditação sobre o Um Metafísico, como um esforço em contemplar e visualizar a ordem pura e simétrica que brota da Unidade. (LAWLOR, 1996).
36
De qualquer modo, na escala do templo ou mesmo da habitação,
desde a arte clássica até o inicio da modernidade, o homem procura uma
relação de reciprocidade entre a melhor arquitetura que concebe e o próprio
Fig. 5 - Proporções de templo grego segundo Vitruvius, comparadas a exemplos concretos e também às harmonias musicais fundamentais correspondentes. Fonte: Doczi, Gyorgy. O poder dos limites – harmonias e proporções na natureza, arte e arquitetura. São Paulo: Mercuryo, 1990.
37
universo, entre o micro e o macro-cosmos, condição sistematicamente
procurada e experimentada pela prática da geometria.
Esclarece ainda o autor:
A geometria trata da forma pura, e a geometria filosófica reconstrói
o desenvolvimento de cada forma a partir de outra anterior. É uma
maneira de tornar visível o mistério criativo essencial. A passagem
da criação à procriação, da idéia pura, formal e não manifestada
para o ‘aqui em baixo’, o mundo que surge desse ato original divino
pode ser tratado mediante a geometria, e ser experimentado através
da prática da geometria. (LAWLOR, 1996, p. 10).
Tais considerações estão longe de demonstrar a ampla riqueza da
geometria, bem como sua influência nos sistemas de representação e apenas
ilustram e auxiliam a evocação referente ao tema dessa pesquisa. Sendo a
geometria uma filosofia que auxilia na formação da mente estruturando o
pensamento, julgou-se interessante explicitar no próximo capítulo sua
associação direta às áreas que, normalmente, não explicitam uma associação
direta à filosofia da geometria, demonstrando que se há a importância e a
utilidade do raciocínio geométrico em outros campos de atuação, na
arquitetura e no design esse saber é imprescindível ao raciocínio espacial e,
consequentemente, aos seus sistemas de representação.
38
2 – Ponto de partida, ordenamento do pensamento e criação.
(...) a matemática tem invenções bastante sutis que podem servir muito, tanto para contentar os curiosos
quanto para facilitar todas as artes e diminuir o trabalho dos homens (...)
René Descartes (2006, p. 12)
Na área acadêmica – em qualquer momento, mas especialmente nas
etapas iniciais – o ensino de geometria corresponde a questões práticas e ao
sistema de representação possibilitado pelo desenho, conteúdos pertinentes à
disciplina Desenho Geométrico. Embora, em uma compreensão mais
aprofundada a geometria seja entendida como ciência fundamental à
formação da mente, como exposto em diversos momentos do primeiro
capítulo, é mais raro, no cotidiano, que seja percebida associada a campos de
atuação que não utilizem a linguagem gráfica como veículo de documentação
e de comunicação.
No entanto, o raciocínio geométrico, enquanto fundamento de um
sistema ordenador, está presente desde as mais corriqueiras atividades até
as consideradas especiais e superiores em áreas distintas das que,
normalmente, a geometria está vinculada. Um exemplo, na área da
literatura, é dado por Calvino, quando versa sobre o conceito de exatidão, em
texto tanto claro quanto preciso. Para o autor, a ideia de exatidão contém
principalmente três significados: “(...) um projeto de obra bem definido e
calculado; a evocação de imagens visuais nítidas, incisivas, memoráveis; e
uma linguagem que seja a mais precisa possível como léxico e em sua
capacidade de traduzir as nuanças do pensamento e da imaginação.”
(CALVINO, 1990, p.71-72). Se mesmo para a literatura consideram-se estas
39
ideias, não é difícil imaginar a necessidade das mesmas em áreas que
trabalham com um sistema de representação almejando a demonstração da
forma, a qual, muitas vezes, apresentar-se-á de maneira inédita e, portanto,
precisa ser rigorosamente elaborada.
Em outro momento da mesma obra, ao se referir ao trabalho do poeta
Leopardi20 na composição de imagens meticulosas e minuciosamente
descritas de objetos, de iluminação e da própria atmosfera que quer criar,
Calvino pondera sobre a necessidade da atenção rigorosa, disposta a
reconhecer pormenores, nuances e relações sutis, e do raciocínio ordenado,
que permitem vislumbrar a qualidade desejada na obra, para a obtenção
quer do equilíbrio, quer do desequilíbrio da mesma.
Para qualquer ato de criação, sugere que se procure, no conjunto por
vezes emaranhado ou nebuloso de ideias, o dado compreensível tal como um
ponto de partida, as porções que tendem para uma forma e nas quais é
possível antever um desenho - uma “zona de ordem”, afinal - como referência
essencial a partir da qual a obra é derivada, desenvolvida e construída:
A obra literária é uma dessas mínimas porções nas quais o existente
se cristaliza numa forma, adquire um sentido, que não é nem fixo,
nem definido, nem enrijecido numa imobilidade mineral, mas tão
vivo quanto um organismo. (...) É nesse quadro que se inscreve a
revalorização dos processos lógico-geométrico-metafísicos que se
impôs nas artes figurativas dos primeiros decênios do século, antes
de atingir a literatura. (CALVINO, 1990, p. 84).
No prosseguimento, o autor refere-se aos dois tipos de conhecimento
divergentes que instruem a sua própria escrita, de modo que ora ela está
20 Giacomo Leopardi (1798 – 1837) - poeta, ensaísta e filósofo italiano.
40
situada no espaço mental, racionalizado, possível de ser conjugada como
linhas, pontos, projeções, vetores de forças e formas abstratas - isto é,
possível de ser articulada e expressa através de um processo lógico – ora
entre objetos que se movem num espaço, abstrações que demandam esforço
de adequação para criar um ‘equivalente verbal’ do não- escrito com o
escrito, do mundo interior com o exterior.
É interessante observar a clara similitude existente entre a
referência de Calvino sobre porções existentes que tendem para uma forma e
aquilo que se obtém com o raciocínio geométrico-matemático, já que o mesmo
organiza e estrutura componentes abstratos do pensamento, permitindo
justamente o ordenamento, a exposição e a apresentação do conteúdo,
tornando-o legível e cristalizando-o graficamente. Esse é o potencial
ordenador que introduz, desencadeia o processo criativo na área de
literatura.
Clarisse Lispector21 (1999, p. 278) ilustra esse mesmo percurso, em
um exemplo extraordinário: “Não, não estou falando em procurar escrever
bem: isso vem por si mesmo. Estou falando em procurar em si próprio a
nebulosa que aos poucos se condensa, aos poucos se concretiza, aos poucos
sobe à tona – até vir como num parto a primeira palavra que a exprima”.
Como se constata, a literatura trabalha o entrechoque entre
significantes – que são as imagens - e os significados, isto é, as
representações e conceitos, como Calvino explicita, acima. Utiliza, pois, a
criatividade nesse processo de transposição do pensamento abstrato para o
registro e conseqüente desenvolvimento ordenado da ideia, que o próprio ato
de registrar alavanca, através da utilização da escrita, com seus códigos e
21 LISPECTOR, Clarice. A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.
41
recursos de gramática22, tal qual aqueles pertinentes ao raciocínio
geométrico.
Arte da utilização estética da linguagem, especialmente a escrita23, a
literatura é estudada e investigada na área de Educação, visando
principalmente os ciclos escolares iniciais. Para Vygotsky24 o mecanismo de
associação de ideias remete à necessidade de rascunhar, pois
(...) a evolução do rascunho para a cópia reflete nosso processo
mental. O planejamento tem um papel importante na escrita, mesmo
quando não fazemos um verdadeiro rascunho. (...) esse rascunho
mental é uma fala interior. (VYGOTSKY, 1989, p. 124).
Nesse entendimento, a fala interior é uma função em si própria, uma
expressão de significados puros, cuja verdadeira natureza e encadeamento
lógico são alcançados após o exame do plano do pensamento, onde então é
criada uma conexão entre tais significados ou entre esses e outros, seguindo
uma estrutura própria do pensamento, que afinal é explicitado,
equacionando uma questão ou um problema.
O termo ‘planejamento’ assim como as expressões ‘significados puros’
‘criar uma conexão’, ‘resolver um problema’ e ‘estrutura própria do
pensamento’ remetem à existência de um sistema básico e ordenador, que
estrutura e permite a transposição do pensamento puro, abstrato, para a fala
e para a escrita, novamente como aquele aderente ao raciocínio geométrico.
(Fig. 6). 22 O termo é entendido como o modo como numa língua particular estão organizados os princípios gerais da linguagem humana; estudo ou tratado que explica a estrutura de uma língua. (CUNHA, 2010). 23 Dicionário Houaiss. Rio de Janeiro, 2004.
24 Lev S. Vygotsky (1896 – 1934), professor e pesquisador Russo, dedicou-se nos campos da pedagogia e psicologia.
42
Fig. 6 - Texto constituído por hieróglifos da escrita Maia. Utilização da linguagem-código que se vale de desenhos ordenados para expressar pensamento e ideia. Fonte: http://ekso.tripod.com/hist1/3-pre-col.htm. Acesso: 01/02/2011.
Quando se considera as duas gramáticas, a do desenho e a da escrita,
segundo Massironi (1996), níveis de conhecimento distintos se fundem, são
intercambiados e podem ser expressados e transmitidos pelas anotações
gráficas por um lado e, por outro, pela linguagem-escrita.
O autor ressalta uma diferença fundamental entre as duas
linguagens. Na linguagem escrita as regras permanecem as mesmas e são
suficientes para todo e qualquer conteúdo, portanto são independentes desse,
o que significa que a estrutura da linguagem escrita apresenta pouca
alteração, é mais estável no tempo, fazendo com que sejam “(...) os novos
43
conteúdos que se adaptam ao instrumento que os comunica e não vice-versa”.
(MASSIRONI, 1996, p. 108). Por outro lado, é relativo o peso da
aprendizagem específica para a capacidade de leitura de uma peça gráfica,
ou seja, não há uma estrita dependência entre leitura e execução do desenho,
sendo perfeitamente possível ler sem que exista a capacidade desenvolvida
de execução gráfica.
De um modo geral, contrastando com a maior possibilidade de leitura
de um desenho, executar uma ideia graficamente supõe vários níveis de
aprendizado e de dificuldade, com variados graus de suficiência em
comunicação: do bem simples que dispensa a aquisição sistemática de
códigos, àquele mais complexo, impossível de ser adquirido sem uma
aprendizagem apropriada.
Justamente pela facilidade de compreensão que oferece, a utilização
da linguagem do desenho associada à escrita é extremamente rica enquanto
instrumento de pesquisa e de informação científica, pela carga informativa e
poder de síntese que é capaz de conter.
Nesse sentido, Mondolfo (1967, p.18-19) ilustra a vinculação entre
arte e ciência, através dos procedimentos utilizados por Leonardo da Vinci,
que demonstram a necessidade de reconhecer não somente os elementos e
formas da realidade natural, mas de identificar as leis matemáticas que lhe
são intrínsecas: “Leonardo reserva ao desenho uma parte importante nos
seus manuscritos científicos, pois nele vê tanto a linguagem da ciência
geométrica e a condição necessária de seu desenvolvimento, como o meio
indispensável para fixar e transformar de momentâneas em permanentes as
conquistas das observações anatômicas realizadas (...)”.
44
Fundamental no desenvolvimento da ciência, a utilização precisa do
desenho possibilita não só a demonstração de algo novo, inexistente, mas o
estudo e o registro de elementos e partes da anatomia humana, das
paisagens naturais e, nesses casos, como alega Assunção (2006),
A representação era feita com rigor e por isso a objetividade estava
próxima do cientificismo. (...) Numa sociedade (brasileira) que
convivia há séculos com o analfabetismo, as imagens eram o meio
eficaz e poderoso de construção das representações da nação, onde a
natureza emergia do passado glorioso da conquista. (ASSUNÇÂO,
2006, p.59-61).
Zoologia e botânica são outras áreas do conhecimento às quais a
contribuição da representação gráfica é absolutamente indispensável, tanto
exigindo conhecimento específico para sua execução, como dispensando
aprendizado particular para sua leitura, como acima referido por Massironi.
Procura-se registrar e estudar as espécies relacionadas, desde os períodos
das grandes navegações, na descoberta dos Novos Mundos, por exemplo,
onde foram encontradas outras terras repletas de novidades (Fig. 7).
Fig. 7 – Ilustração detalhada da estrutura corpórea de um escorpião – objetividade próxima do cientificismo. Fonte:<www.scielo.br/scielo.php> Acesso: 01/02/2011.
45
É o início do paradigma25 olhar-ver: “(...) porque as características da
natureza inesperada e da escala diferente requisitavam vários desafios, foi
notória a exigência de uma série de adaptações culturais, oculares no
imediato e sempre difíceis de descrever.” (JANEIRA, 2006, p. 140). A
importância do desenho se dá justamente por ser visual a modalidade de
análise em questão, enfatizada em particular na área da botânica e
assumindo papel crescente na epistemologia dos séculos XVII e XVIII,
quando
(...) toma então forma, tácita mas concordemente, um modo de
representar os objetos da natureza e particularmente as plantas, que
segue percursos constantes e estáveis, o que é tanto verdade que
ainda hoje são usados para fins análogos, sem variações de relevo.
(MASSIRONI, 1996, p. 59).
Uma vez que importam a investigação e os registros dos traços
significativos das estruturas vegetais, dos animais, das aves e dos insetos, a
representação com função taxonômica26 orienta-se por um conjunto de regras
onde prepondera o uso do plano frontal, o ponto de vista fixo e a retirada do
fundo – para evitar a visão perturbada dada pela perspectiva do desenho -
com o intuito de expor, com pormenores, os elementos e atributos visíveis
que podem servir de base para um descrição morfológica ordenada e
sistematizada.
25 O termo paradigma aqui empregado pode ser entendido como arquétipos, modelos perfeitos, eternos imutáveis dos objetos existentes no mundo natural que são cópias desses modelos, e que de algum modo participam deles, segundo Japiassu (1990); ou ainda, como complementado por Kuhn (2009, p.44), “(...) na ciência, um paradigma raramente é suscetível de reprodução. Tal como uma decisão judicial aceita no direito costumeiro, o paradigma é um objeto a ser melhor articulado e precisado em condições novas e mais rigorosas.”
26 Função classificatória.
46
Nesse processo de registro, a descrição de um indivíduo é válida para
toda a espécie à qual pertence, por isso as características e os traços
pertinentes são evidenciados através do desenho, procedimento que
prevalece ainda hoje em detrimento da fotografia justamente porque esta, ao
registrar um indivíduo, não permite a exclusão daqueles traços singulares
que não são generalizáveis (MASSIRONI, 1996).
Na imensa produção gráfica que acompanha os textos sobre história
natural as imagens assumem, portanto, uma função substitutiva dos objetos
que representam, demandando por isso observação aguda e precisa, capaz de
condensar no exemplar individual registrado, as características de seu
coletivo, da espécie. Esse objetivo
(...) determinava metodologias e uma disciplina mental fortemente
servidas pela competência para o desenho, (...) que poderia ser
usada para o estabelecimento de diferenças e semelhanças,
fundamentais para o método comparativo, nomeadamente na
determinação cuidada dos especímenes.(...) (JANEIRA, 2006, p.
144-145).
Como se apreende do exposto acima, os registros através do desenho
demandam a utilização do raciocínio geométrico, em particular a ideia de
rigor e precisão, do todo e de suas partes, as noções de proporcionalidade e a
identificação das figuras geométricas de base, disciplina e conhecimento
necessários à capacidade de observação, de análise e de síntese para o
desenho. (Fig. 8).
47
A propósito de tais questões, Dreyfus e Hadas27 mencionam, dentre
as estratégias para superar as dificuldades de alunos norte americanos de
uma high school28, dois princípios que merecem atenção particular. O
primeiro - Mesmo afirmações óbvias têm de ser provadas – enfatiza a
importância formadora do raciocínio dedutivo, considerando que a
27 Tommy Dreyfus e Nurit Hadas, autores do artigo “Euclides deve permanecer – e até ser ensinado”, in: LINDQUIST, Mary M.; SHULTE, Albert P. (organizadores) Aprendendo e ensinando geometria. São Paulo: Editora Atual, 1994.
28 Equivalente, no Brasil, ao ensino fundamental II.
Fig. 8 - Seqüência de desenhos em etapas até a solução final.: das formas mais simples às formas extremamente complexas – poder de análise e síntese. Fonte: HSUAN-AN, Tai. Desenho e organização bi e tridimensional da forma. Goiânia: Editora UCG, 1997, p.44 e 45.
48
visualização e a medição são estratégias primeiras e vitais para a descoberta
de propriedades geométricas, e que nada exclui a necessidade de provar toda
afirmação. O segundo, Figuras complexas são constituídas por componentes
básicos, aponta a dificuldade, bastante generalizada entre estudantes, de
reconhecimento dos elementos básicos, quando os mesmos ou aparecem de
modo menos usual ou integram uma composição um pouco mais complexa,
como ilustra a figura 9, com composição de triângulos isósceles cujas bases
não se encontram na posição horizontal, ou de triângulos congruentes,
quando os lados correspondentes não estão paralelos.
Fig. 9 – Reinvenção da geometria nas latinhas da Coca-Cola. Projeto conceitual e inovador do designer Dzmitry Samal: múltiplas áreas facetadas no lugar de um cilindro regular. Fonte: http://www.samaldesign.com/pages/dzmitry_samal9.html. Acesso em: 18/08/2010.
49
Estes exemplos retirados de pesquisas da área de educação em
matemática – assim como todos os outros dos vários campos de atuação -
mostram claramente o grau de dificuldade enfrentado para a abordagem das
questões associadas à geometria de um modo geral. Em um de seus
desdobramentos, minimizar ou “abolir Euclides” da vida acadêmica, nos
níveis intermediários de ensino, compromete de modo grave e perverso a
formação geral e, indiscutivelmente, nos cursos superiores em que tal
conhecimento alicerça a atividade profissional. Nas áreas de Arquitetura,
Design e áreas avizinhadas, certamente deve haver uma redução
considerável no potencial criativo, interferindo, portanto, nas possibilidades
de um trabalho de qualidade e inovador.
50
3 – Concepção e resolução: forma e proporção no Design
E foi por meio da música, da física quântica e da matemática que começamos a conhecer as relações das coisas da natureza, no ambiente urbano, nas estrelas. Conhecemos Fibonacci e ficamos sabendo que tanto a economia quanto a
música cabiam nas suas teorias, o que é incrível. Mas até algum tempo atrás, não se podia falar a respeito, porque
ninguém conhecia. As escolas não ensinavam isso.
Alexandre Wolner (Stolarski, 2005, p.43)
Arquitetura e Design possuem processos metodológicos destinados ao
desenvolvimento do projeto que podem variar em determinados momentos as
que, guardadas as diferenças de escala do objeto, percorrem no geral um
caminho semelhante, das ideias ou concepções iniciais ao desenvolvimento e
detalhamento do projeto.
Através de estudos de caso pertinentes à área de Design, a pesquisa
procura identificar a contribuição da geometria, considerando as relações de
proporção, de duas maneiras distintas: pelo auxílio à resolução de problemas
gráficos, e pelo conhecimento explícito ou implícito que instrui a percepção e
o raciocínio espacial. A eleição das relações de proporção como fio condutor
da verificação explica-se por ser a condição de proporcionalidade um atributo
constante de todo ideal de beleza, presente nas diversas teorias
desenvolvidas no decorrer da história29, e sempre vinculada a um sentido de
harmonia entre os elementos de uma mesma composição.
29 Ordens Clássicas, Teorias Renascentistas, Modulor, Antopometria. Ver PEDOE, 1979.
51
Geometria |concepção e resolução
A contribuição do raciocínio geométrico é constante desde a etapa
inicial da elaboração de um projeto, quando surgem as primeiras ideias ou,
como costumeiramente se diz, quando há o insight 30, a percepção de algo
novo, inusitado. Nesse momento, segundo Massironi, a percepção
(...) dirige e insere complexa atividade de elaboração, compreensão,
transformação, complementação, adaptação a exigências
individuais, atribuições de qualidade, etc., geradas por estímulos
externos (ou também internos no indivíduo) que, através destas
passagens, são compreendidos e dão origem à visão do receptor.
(MASSIRONI, 1996, p. 150).
No desenvolvimento do trabalho de criação, o designer – bem como o
arquiteto – dispõe dessa complexa atividade envolvendo as várias passagens
citadas acima e ainda que não organize através de códigos formalizados tais
conhecimentos, os mesmos já influenciam seu potencial criativo,
manifestando-se de alguma maneira. Ocorrem então as anotações iniciais, os
primeiros desenhos executados explícita ou implicitamente a partir do
suporte cognitivo do autor: conceitos e práticas incorporados que irão definir
resultados com maior ou menor apropriação de conhecimento, com maior ou
menor precisão. Dito de outro modo, o conhecimento internalizado, em
qualquer grau, instrui a percepção do indivíduo atuando, em decorrência,
nos sistemas de pensamento e de comunicação.
30 Insight pode ser definido como a compreensão repentina de alguma coisa. Quanto maior for nossa capacidade de encarar problemas de um ângulo diferente do habitual mais será possível se beneficiar dessa habilidade. (...) Um insight muitas vezes nos ajuda a resolver problemas cotidianos, mas não há como forçá-los a aparecer. (Artigo: Súbita percepção, de Günther Knoblich e Michael Öllinger, Revista Mente&Cérebro – edição especial nº 8, p.55)
52
Ampliando esse raciocínio, Battisti (2002) explica que a “prova”, ou a
solução de um problema, encontra-se no interior do mesmo e vai sendo
descoberta com o exame de suas configurações, de suas proposições, em meio
aos elementos fornecidos pelo próprio problema, não podendo ser
subordinada a algo exterior.
O mesmo se dá no caso da construção de uma forma: alavancado pelo
grau de conhecimento internalizado do indivíduo, esse processo de percepção,
de desvendamento e de organização dos elementos constituintes da imagem
está presente seja de modo consciente ou não, de modo explícito ou implícito.
Geometria | proporção e identidade visual
É comum ao designer gráfico, como se sabe, atuar na criação de uma
nova marca, assim como também o é trabalhar com símbolos e logotipos que
já se encontram no mercado os quais, portanto, são compostos por formas
existentes e reconhecíveis enquanto tal (e, neste caso, um desenho pré-
existente já deve apresentar tal objeto de estudo).
Relacionada à programação visual das empresas, há um conjunto de
documentos técnicos usualmente denominados por ‘manual de identidade
visual’31. Um dos tópicos que compõem tal material deve explicar a lógica
construtiva da marca, registro preciso que deve garantir a reprodução
31 Manual de identidade visual, também conhecido como Manual de identidade visual corporativa ou simplesmente por Manual de marca é um documento técnico, normalmente concebido por designers gráficos, contendo um conjunto de recomendações, especificações e normas essenciais para a utilização de uma determinada marca, com o objetivo de preservar suas propriedades visuais e facilitar a correta propagação, percepção, identificação e memorização da marca. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org>. Acesso em: 20/05/ 2010. O manual de identidade visual não é um documento obrigatório e, portanto, não é uma prática comum às empresas, a não ser as de grande porte, onde suas marcas já estão consolidadas no mercado exigindo um cuidado maior por envolver questões relacionadas ao Marketing, por exemplo.
53
fidedigna da mesma. Esta prática, porém, vem se limitando ao uso de uma
malha gráfica quadriculada onde a marca ou logomarca é sobreposta,
permitindo estabelecer relações proporcionais entre os elementos
construtivos bem como suas relações de disposição, indicando assim o
posicionamento de cada elemento dentro da composição. Em alguns casos,
associa-se a esse processo o termo “geometrização da marca” ou “construção
geométrica da marca”, porém são raros os profissionais que se preocupam em
demonstrar efetivamente a geometria envolvida na construção da forma,
limitando-se apenas a demonstrar suas relações proporcionais de um modo
geral.
Na opinião de Strunck32 (2001, p. 100), “as construções geométricas
das identidades visuais servem como referência para a marcação de
superampliações, dos seus elementos para a pintura em grandes superfícies
(...) e como base para o posicionamento relativo entre os vários caracteres de
um logotipo ou partes de símbolos.” Por serem técnicos, os desenhos
geometrizados importam fundamentalmente para o detalhamento do projeto
e menos para a visualização, em si, da imagem. O autor destaca, ainda, dois
itens importantes sobre este assunto:
1- Pode haver mais de uma construção geométrica. Isso acontece
toda vez que seja necessário alguma correção ótica para que os
elementos, uma vez aplicados, tenham sempre a mesma
visualização. Superampliações ou reduções, aliadas a processos de
produção como estampagem em metal, silcagem e outros, podem
32 Gilberto Strunck é um designer gráfico brasileiro, sócio-fundador da agência DIA Comunicação, e autor de livros sobre design gráfico. Tem trabalhos publicados em livros e revistas especializadas e vários projetos premiados. É formado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro em engenharia civil e em design pela Escola Superior de Desenho Insdustrial, a ESDI. Gilberto também é Mestre pela Escola de Comunicação.
54
aconselhar mais de uma construção geométrica ou espacejamentos
diferentes entre letras e formas.
2– Para alguns desenhos de logotipos e símbolos, é praticamente
impossível fazer uma construção geométrica que possa ser reduzida.
Nesses casos, convém relacioná-los a uma malha que irá servir como
base para a sua ampliação, redução ou posicionamentos relativos
entre símbolos e logotipo. (Strunck, 2001, p. 100).
O ponto fundamental é que a geometria está presente, como
substrato, em qualquer forma, ainda que seja praticamente impossível de ser
reduzida, como alega Strunck. O que se pode observar na prática dos
designers, em muitos casos, é que a malha gráfica quadriculada acaba por
ser o único modo de expor a construção de uma marca, mesmo naquelas
ocasiões em que outros recursos de geometrização permitiriam a exposição
com o rigor e o cuidado que formas mais complexas exigem.
A malha gráfica, também conhecida por grid33, é utilizada como
sistema organizador que mapeia um plano para todo o projeto, uma
ferramenta essencial que funciona como “um território para a informação e
uma maneira de ordenar e manter a ordem.” (TONDREAU, 2009, p. 8).
Existem vários tipos de grids, mas interessam a esta pesquisa os grids
modulares que, também segundo a autora, “são melhor(es) para controlar o
tipo de informação mais complexa encontrada em jornais, calendários,
gráficos e tabelas. Combinam colunas verticais e horizontais, as quais
organizam a estrutura em porções menores de espaço.” (op. cit., p.11). Este é
o tipo de malha usado para demonstrar o desenho construtivo de marcas,
símbolos e logotipos, e normalmente se apresenta com módulos quadrados,
também conhecido por quadrícula.
33 A palavra grid é de versão inglesa, podendo ser traduzida por grade ou grelha, porém seu uso normalmente se mantém na versão original.
55
Exemplifica-se a seguir, com uma sequência de imagens, a utilização
do grid associado a uma forma qualquer ilustrativa, em procedimento
análogo ao realizado quando se demonstra informações de uma marca:
Fig. 10
Neste primeiro registro, a forma é apresentada em sua configuração
estabelecida, sem informações sobre seu sistema construtivo e tampouco
sobre os elementos que a compõem. Pode-se dizer, para classificá-la, que se
trata de uma forma orgânica34 (fig. 10).
34 Wong (1998, p.172) afirma ser o formato orgânico formado por curvas que fluem suavemente com transições; já Munari (1997, p.50) usa um rio para exemplificar uma forma orgânica natural, dizendo não ser “estruturável segundo as estruturas com as quais temos procurado compreender outras formas da natureza”.
56
Na imagem seguinte, a forma está inserida em uma malha gráfica
quadriculada, o que já sugere uma ordenação de posicionamento e de
proporções, embora não haja informações sobre seu sistema construtivo e
tampouco sobre os elementos que a compõem (fig. 11).
Fig. 11
57
A demonstração de alguns componentes essenciais à construção da
forma já se faz presente com a marcação dos centros dos arcos, mas ainda
não há conformidade entre todos os elementos e o grid, pois dois dos centros
(A e B) se encontram “soltos” dentro da quadrícula, estando, portanto, sem
referências suficientes para reprodução e documentação precisa. (fig. 12).
Fig. 12
A
B B
A
58
Na próxima etapa já se podem verificar outros procedimentos: a
preocupação em ajustar os centros dos arcos às intersecções das linhas da
malha gráfica (que constituem pontos definidos), além da subdivisão de
alguns módulos para ampliar as referências de precisão às informações
desvinculadas dos cruzamentos das linhas que determinam o grid.
Demonstram-se as formas circulares essenciais que compõem a forma final e
as relações entre as mesmas através dos pontos de concordância. Esta
organização possibilita a reprodução da forma com maior rigor, mas ainda há
a necessidade de uma observação cuidadosa com algumas informações de
proporções que localizam os pontos fundamentais (fig. 13).
Fig. 13
59
Ampliam-se os recursos para a integração entre a geometria e a
malha gráfica. Todos os elementos essenciais à construção, à leitura e à
reprodução da forma estão estrategicamente dispostos e vinculados ao grid,
agora com nova organização que inclui a supressão de algumas linhas
auxiliares para explicitar as dimensões, permitindo maior clareza e agilidade
à leitura, de maneira que não haja dúvidas sobre a essência da forma (fig.
14).
Fig. 14
60
A malha gráfica, agora, vem acompanhada de uma régua que
possibilita a identificação mais imediata das proporções da forma e das
relações entre os elementos que a compõem. Tais indicações se dão, neste
caso, através da leitura do sistema de proporções, composto por módulos
quadrados, não necessariamente relacionadas a qualquer unidade específica
de medida, mas perfeitamente associáveis a qualquer uma delas, se
necessário (fig. 15).
Fig. 15
61
Como se constata, o processo de identificação e aprimoramento da
forma exposta na sequência de imagens anteriores foi obtido por meio do
acréscimo de “(...) linhas adicionais, que na escola elementar são
freqüentemente chamadas de ‘linhas de construção’ [que] complicam a
figura, mas formam uma parte essencial do processo dedutivo, [pois] (...)
reorganizam a figura em subfiguras e o processo de raciocínio se efetua
exatamente nesse subnível.” (DAVIS, 1986, p. 181).
No entanto, este tipo de organização integrando a malha gráfica à
geometria da marca ou forma – apesar de expressar maior clareza e dar
precisão ao trabalho - não é prática comum, como já mencionado, pois não há
normas específicas que definam o uso do grid na área de Design. Essa
ausência implica em alguns desdobramentos também na área de educação.
Tanto importa que o aluno conheça os melhores exemplos de criação na área
como o desenvolvimento do projeto através de seus desenhos técnicos. No
entanto, é mais raro encontrar as peças gráficas de objetos com um nível
maior de detalhamento da geometrização, seja pela falta de acesso à
documentação das empresas, seja pela ausência de registro de um trabalho
técnico mais apurado. As publicações existentes, com raras exceções, tratam
do assunto brevemente, por vezes sem nenhuma ilustração da integração da
malha à geometria da forma e, quando o fazem, é de modo ligeiro,
superficial, atendo-se aos raciocínios apenas iniciais, similar às etapas
demonstradas nas figuras 11 e 12.
À exceção da regra, um material bastante significativo, que pode ser
apreciado, encontra-se disponível em algumas publicações sobre o trabalho
do designer Alexandre Wollner 35. Trata-se de um dos pioneiros do Design
35 Designer gráfico. Inicia seus estudos no curso de design visual do Instituto de Arte Contemporânea - IAC, criado no Masp. Em 1953 é selecionado por Max Bill para estudar na Hochschule für Gestaltung (Escola Superior da Forma) em Ulm, Alemanha, onde permanece
62
brasileiro, cuja importância advém da qualidade de sua intensa produção e
do modo de projetar, que enfatiza a exposição das questões relacionadas à
construção da forma, o que o destaca entre a maioria dos profissionais da
área. Seu trabalho pode ser classificado como “geométrico” mais pela
utilização de razões harmônicas e pelo uso do sistema de modulação
proporcional, do que pelo uso de axiomas:
Pode-se dizer que os sistemas utilizados por ele estruturam seus
programas de identidade e até mesmo de visão de mundo, mas eles
não servem para dizer como suas marcas são criadas nem quais as
suas maiores qualidades. (...) (suas marcas) não surgem de idéias
visuais pré-concebidas, mas por meio da atribuição de qualidades
perceptivas, semânticas e geométricas à seleção de formas quase
aleatórias desenhadas à mão. Noutras palavras, suas marcas são
mais encontradas que intuídas e muito mais desenhadas que
pensadas. (STOLARSKI, 1995, p.11- 12)
O autor sugere que Wolner utiliza o desenho – ou seja, a prática –
como um modo de raciocínio próprio a esse sistema de representação
amparado por sua percepção e conhecimentos acumulados que interagem, os
quais lhe permitem atribuir qualidade aos projetos, desenvolvendo uma
complexa atividade de elaboração, compreensão e transformação –
características descritas por Massironi e citadas anteriormente. Importa
ressaltar que na formação de Alexandre Wolner esteve presente o rigor
entre 1954 e 1958. Ao retornar ao Brasil, inaugura, com Geraldo de Barros (1923 - 1998), entre outros, o Form-Inform, o primeiro escritório de design do país. Em 1963, participa da estruturação e criação da Escola Superior de Desenho Industrial - ESDI, no Rio de Janeiro, a primeira instituição de design de nível superior no país. Na década de 1960, abre o próprio escritório de programação visual, onde desenvolve logotipos para grandes empresas. Participou de diversos concursos e exposições e é autor do livro Design Visual 50 Anos. Disponível em: <http://www.itaucultural.org.br> Acesso em: 27/05/2010.
63
alemão da escola de Ulm 36. Assim, no desenvolvimento do trabalho, mesmo
quando não parte de geometrias pré-concebidas e se apoia em figuras e
composições espontâneas – ou aleatórias - esse designer procura identificar,
documentar e demonstrar a essência de cada forma que compõe as marcas
por ele criadas (fig. 16).
36 Conhecida como Escola Superior da Forma, a Escola de Ulm, na Alemanha, é um centro de ensino e pesquisa de design e criação industrial, concebida em 1947 e fundada em 1952, por Inge Aicher-Scholl (1917 - 1998) e Otl Aicher (1922 - 1991), professores da já existente Escola Popular Superior da Forma de Ulm, e por Max Bill (1908 - 1994), antigo aluno da Bauhaus. Trata-se de um empreendimento privado de caráter interdisciplinar, que reúne arquitetos, designers, cineastas, pintores, músicos, cientistas e outros. A ideia da escola é formar profissionais com sólida base artística e técnica para atuarem na concepção de ampla gama de objetos produzidos em escala industrial, de uso cotidiano ou científico, relacionados à construção e aos suportes modernos de informação, às mídias e à publicidade. O modelo de Ulm retoma as relações entre arte e ofícios, arte e indústria, arte e vida cotidiana presentes nas experiências anteriores do arts and crafts, do art nouveau e do art déco, todos esses movimentos comprometidos com a superação das distâncias entre belas-artes e artes aplicadas. De modo mais direto, o centro de Ulm inspira-se na experiência da Bauhaus, sobretudo na fase da escola em Dessau, Alemanha em1925, quando a articulação entre arte e indústria se torna mais nítida. As relações de proximidade e distância com o projeto da Bauhaus marcam as diversas fases da Escola de Ulm, sendo responsáveis por discordâncias entre seus integrantes mais afeitos às artes e ao design, sob a inspiração de Walter Gropius (1883 - 1969), e os que enfatizam a primazia da ciência e da técnica. Disponível em: <http://www.itaucultural.org.br> Acesso em: 29/05/2012.
64
Fig. 16 – Geometrização da marca Eucatex, do designer brasileiro Alexandre Wolner. F: STOLARSKI, André. Alexandre Wollner e a formação do design moderno no Brasil: depoimentos sobre o design visual brasileiro. São Paulo: Cosac Naify, 2005.
O comprometimento com a demonstração de uma ideia, além de
atender simultaneamente a vários fins, tem um mérito essencial: permitir
que a mesma esteja sujeita a um processo constante de crítica e revalidação:
Erros, ambigüidades e incompreensões são dissipados devido à
exposição constante. Uma demonstração significa respeitabilidade.
Uma demonstração é o sinete da autoridade.
65
Uma demonstração, no melhor dos casos, aumenta o entendimento,
mostrando o que é essencial no assunto. (...) Finalmente, as
demonstrações são um ritual, e uma celebração do poder da razão
pura. Um tal exercício de reafirmação pode ser muito necessário,
levando em conta todas as confusões em que o pensamento claro
claramente nos mete. (DAVIS, 1986, p.182)
No caso do Design, a demonstração do processo de construção
viabilizado pela associação da geometria com o grid confere ao projeto uma
ordem de desenvolvimento, garantindo precisão não só na documentação,
mas também na leitura do mesmo. Além disso, como expressou Davis, a
constituição do raciocínio é privilegiada, pois possibilita argumentações e
revisões lógicas, cujo enfrentamento dependerá do grau de conhecimento de
cada indivíduo. Supõe-se, nessa área, que o profissional domine conceitos da
geometria euclidiana, e possa justificar a concepção e o registro de qualquer
forma, ainda que seja apenas um objeto de estudo e ainda que tal raciocínio
esteja subjetivamente presentes no desenvolvimento do processo criativo,
inventivo e investigativo.
Vale ressaltar, entretanto, que o uso da malha por si só (fig. 11)
também pode ser responsável por substituir ou mascarar eventuais
problemas associados ao entendimento do próprio raciocínio geométrico, já
que não demonstra alguns dos elementos essenciais à construção e
reprodução da forma. Sistemas de códigos apropriados às representações
gráficas existem e já se tornaram usuais em outras áreas que empregam o
desenho como meio de representação de projeto, como o Desenho Técnico,
normatizado no Brasil pela ABNT (Associação Brasileira de Normas
Técnicas). No caso do Design, a utilização de códigos apropriados e
regulamentados, com o intuito de unificar o sistema de registro e
documentação, pode ser uma alternativa interessante à área.
66
Geometria | proporção e concepção de cartazes
Interessa, aqui, retornar ao pensamento de Massironi (1996) que
expressa a necessidade de se analisar, mais profundamente, o desenho como
um conjunto de codificações particulares. Segundo ele, “toda a manualística
sobre desenho e pintura esteve sempre mais interessada em divulgar regras
práticas para uso dos mágicos instrumentos da figuração do que em indagar
o que sucedia e como funcionava a cadeia comunicativa relativamente a ela.”
(op. cit., p. 90). Ao professar a importância do desenho como instrumento de
clarificação e explicação da ideia - mais do que de representação – retoma a
capacidade de análise e de síntese visuais de que o desenho é portador:
A representação gráfica transmite, sempre e simultaneamente, tanto
os traços figurativos do objeto, como a chave interpretativa, por
intermédio dos quais o objeto foi e deve ser observado. (...) Quando,
mesmo a ( sic) nível de figuração visiva, se passa ao inventário –
apresentação sistematizada de um ou alguns aspectos conectados
entre si, da mesma realidade – verifica-se a necessidade de maior
articulação do instrumento utilizado e, portanto, a instauração de
regras que permitem ao instrumento desenho escolher novos
objetivos. (MASSIRONI, 1996, p.92- 95)
O termo “inventário” acima utilizado pelo autor para designar a
apresentação sistematizada é apropriado a esta pesquisa justamente por ter
o sentido de discriminação, registro, relação e descrição minuciosa de algo,
significados que permitem a associação com os objetivos do manual de
identidade visual. A geometria está presente possibilitando o raciocínio desse
processo de ordenação, ainda que seu uso efetivo no registro e
aperfeiçoamento dessa documentação não se dê com frequência. A ausência
de definição de parâmetros ou normas – como as fornecidas pela ABNT, por
67
exemplo, para a área de design de produtos - acaba por sustentar a
apreensão com a preservação da forma criada, de suas características
autênticas e exclusivas, afinal, da personalidade e identidade visual de uma
marca.
A utilização das relações de proporção na área de Design fica então
vinculada, nesta pesquisa, às questões de registro e documentação de uma
determinada forma, geralmente associada a uma marca, o que difere do
emprego das relações de proporção em outros tipos de trabalho de designers
gráficos.
Elaborar e confeccionar cartazes são atuações comuns ao designer
gráfico e, neste tipo de trabalho, fica evidente a influência e a interferência
das Artes Plásticas. Nem sempre há, portanto, a necessidade do registro
rigoroso, como acontece com um logotipo. A característica evidente dessa
atividade é justamente a expressividade e, pelo menos de modo explícito, não
se recorreria a nenhum outro recurso – como conceitos e conteúdos
associados às utilizações convencionais – presumindo-se muitas vezes que
apenas a inspiração atuou no processo criativo. Para Wolner, essa
contradição reflete “fragmentos do nosso inconsciente e da nossa consciência.
Vivemos isso em algumas épocas e estamos trazendo de volta. Esse
conhecimento, que de alguma maneira aprendemos, estamos constantemente
desenvolvendo na prática.” (WOLNER apud STOLARSKI, 2005, p.47).
Assim é com a noção matemática de proporcionalidade, que “(...) está
literalmente impregnada no cotidiano das pessoas, nas situações que
envolvem (...) mapas, plantas de imóveis, maquetes, fotografias, radiografias,
(...) desenho, esquema gráfico, apreciações estéticas, amostras, (...) dentre
muitas outras.” (VALLADARES, 2003, p.11). Esse conhecimento é usado no
cotidiano justamente porque os significados que se assemelham às noções
68
matemáticas são menos restritivos que as mesmas, permitindo que sejam
compreendidos por uma quantidade maior de pessoas, independentemente
da formação matemática que tenham. Além disso,
(...) histórica e psicologicamente as intuições da geometria são mais
primitivas do que as da aritmética. Em algumas culturas
primitivas, não há palavras para números, exceto um, dois e muitos.
Mas em qualquer cultura humana que jamais descobriremos, é
importante ir de um lugar a outro, apanhar água ou arrancar
raízes. Assim, os homens foram forçados a descobrir – não uma, mas
muitas e muitas vezes, em cada nova vida humana – o conceito da
reta, de menor distância entre aqui e ali, da atividade de dirigir-se
diretamente a algo. (DAVIS, 1986, p. 189).
Pode-se supor, então, que as noções de proporção apresentadas por
um designer – pela sua formação - sejam mais aguçadas que as da população
em geral, mesmo para aqueles que desconheçam informações mais
aprofundadas sobre o assunto e operem, intuitivamente, seguindo modelos
estéticos pré-estabelecidos pela sociedade ou grupo sociocultural a que
pertencem.
Nesse sentido, a atração que a proporção áurea promove é
sabidamente generalizada e antiga: a “apreciação deste elemento estético faz
com que o assunto se torne vivo de maneira maravilhosa e brilhe mais do
que qualquer outra criação da mente parece fazê-lo.” (DAVIS, 1986, p.200).
Por isso mesmo é frequente a defesa da necessidade desse conhecimento
para os profissionais das áreas de Design. Para Elam (2010) a falta de
entendimento, por parte dos designers, dos princípios visuais da composição
geométrica - entre eles os sistemas clássicos de proporções como a seção
áurea e os retângulos de raiz – impede a utilização de relações visuais
fundamentais que se baseiam em atributos essenciais tanto da vida quanto
69
da matemática. Pensamento que Albrech Dürer compartilha: “(...) o único
motivo pelo qual os pintores (...) não se dão conta de seus próprios erros é o
fato de não terem aprendido a geometria, sem a qual ninguém pode ser, ou
se tornar, um verdadeiro artista”. (DÜRER, apud ELAM, 2010, p.5).
O material a ser aqui apreciado é composto pelas imagens de doze
cartazes de designers brasileiros que participaram do evento comemorativo
do aniversário da cidade de São Paulo. Tal evento ocorre desde o ano de
2008, tendo sido expostos um total de 82 trabalhos: 20 em 2008, 22 em 2009,
em 2010 e também em 2011. Uma característica interessante e, de certo
modo, fator determinante para a escolha desse material, é que não há
repetição de autores nos eventos – com exceção dos dois designers
organizadores, Alécio Rossi e Paulo Moretto (concepção)37, que participaram
com obras em todos os eventos até 2011. O fato de se considerar para o
estudo os trabalhos de autorias distintas faz com que se abarquem somente
os dados e conceitos presentes na verificação do conjunto desse grupo e para
esse fim, mantendo-se apartadas as questões de tendência ou estilo que cada
um possa apresentar, particularmente, em sua produção. Além disso, o
concurso caracteriza-se pela qualidade dos trabalhos e pela expressão gráfica
contemporânea e, por isso mesmo, consegue estabelecer maior proximidade
com os anseios dos estudantes, já que, nos cursos de Design, os alunos
normalmente se identificam mais com trabalhos gráficos do que com
trabalhos relacionados a produtos38.
37 O evento também ocorreu no ano de 2012 (ano da apresentação deste trabalho), mas, considerando-se que esta pesquisa já se encontrava em fase de finalização, não foram considerados estes cartazes.
38 Os estudantes de Design, normalmente, apresentam uma preferência e uma predisposição aos exercícios e propostas associados à área gráfica. Isso ocorre, em hipótese, por ser esta uma área trabalhada, na maioria das vezes, em um plano bidimensional. A área de produto – por estabelecer uma relação direta com as três dimensões – requer maior domínio de conceitos de geometria, como por exemplo, a Geometria Descritiva.
70
Os doze cartazes selecionados serão confrontados – através de
sobreposição – com o traçado geométrico do axioma da proporção áurea.
Consideraram-se todos os desdobramentos permitidos a partir do traçado do
retângulo áureo (fig. 17) como, por exemplo, a interseção entre as diagonais
dos retângulos áureos recíprocos (fig. 18), a espiral áurea (fig. 19), ou ainda a
composição entre esses traçados.
Essa prática de verificação – também utilizada por autores que são
referência para esta pesquisa, como Doczi e Elam – demonstra as relações
existentes entre elementos de composição dos cartazes e os elementos
pertinentes à geometria do retângulo áureo. O intuito é identificar a
influência desse raciocínio no registro da composição - ainda que essa
influência tenha sido subjetiva ou intuitiva por parte dos autores.
Fig. 17 - O traçado do retângulo áureo parte de um quadrado (chamado gnômon). Rebate-se a diagonal MD na base do quadrado, gerando a proporção 1:1,618; ab = lados do retângulo áureo; AC = lados do retângulo áureo recíproco.
71
Fig. 18 – Nos mesmos moldes, a subdivisão do retângulo áureo recíproco gera outros retângulos áureos, e assim sucessivamente. A interseção das diagonais dos retângulos áureos demonstra o “traçado regulador”, utilizado por Le Corbusier.
Fig. 19 – A elipse áurea é construída usando o comprimento dos lados de cada quadrado como raios dos arcos concordantes.
72
Dentre as muitas pesquisas realizadas sobre a questão da
preferência pelo retângulo áureo, a mais famosa delas – realizada em 1860,
mas publicada apenas em 1870 - é a do filósofo alemão Gustav Theodor
Fechner, considerado o pioneiro da psicologia experimental. Durante a
experiência, Fechner orientava cada indivíduo a escolher cuidadosamente -
entre dez retângulos diferentes apresentados - o retângulo que mais lhe fosse
agradável, harmonioso e elegante, e também o menos agradável do grupo.
Lívio relata a experiência:
Os retângulos variavam no quociente entre comprimento e largura
de um quadrado (uma razão de 1,00) até um retângulo alongado
(uma razão de 2,5). Três retângulos eram mais alongados que o
Retângulo Áureo, e seis eram mais próximos de um quadrado. (...)
Na experiência de Fechner, 76% das escolhas se concentraram em
três retângulos que tinham as razões 1,75, 1,62, 1,50, com o pico no
Retângulo Áureo (1,62). Cada um dos outros retângulos foi escolhido
por menos de 10% das pessoas. (LÍVIO, 2008, p. 204).
Como em toda área acadêmica, a pesquisa de Fechner foi defendida
por alguns, e contestada por outros em função dos artifícios metodológicos39
empregados na experiência, mas o que se pode apreender dessa experiência é
o fato de que não somente o retângulo áureo, mas também os seus
avizinhados obtém a preferência visual quando se trata de harmonia.
Esse fator será também observado e considerado no estudo de caso, já
que os cartazes selecionados utilizam um formato retangular de proporções
2:3 (1,5), diferente da relação apresentada pelo retângulo áureo que é de 5:8
39 “Embora ninguém acuse Fechner de alterar os resultados, algumas pessoas especulam que ele pode ter produzido subconscientemente circunstâncias que favoreceram o resultado que ele desejava. (...) Contudo, [alguns] pesquisadores mais cuidadosos (...) acharam que os resultados dependiam, por exemplo, do posicionamento dos retângulos: se estavam posicionados com seu lado comprido horizontalmente ou verticalmente, e do tamanho e da cor dos retângulos, da idade dos voluntários, de diferenças culturais e, principalmente, do método experimental utilizado.” (LÍVIO, 2008, p. 205).
73
(1,6), mas ainda assim, é possível notar semelhanças na disposição dos
elementos da composição em relação aos traçados relativos à proporção
áurea – e a verificação, neste estudo, se dará somente com este objetivo.
O conjunto dos seis primeiros cartazes (fig. 20 a 25) são exemplos de
integração entre a malha construtiva do retângulo áureo e os elementos de
composição dos mesmos.
Fig.20 – Fonte: Visca, 2008 Fig.21 – Fonte: Henrique Nardi, 2011 Fig.22 – Fonte: Gustavo Maffei, 2010
Fig.23 – Fonte: Marcos Cartum, 2009 Fig.24 – Fonte: Vinícius Marson, 2009 Fig.25 – Fonte: Alécio Rossi, 2011
74
No primeiro caso (fig 26), a grade do retângulo áureo (em cor azul) contendo
a demonstração da divisão entre o quadrado e o retângulo áureo recíproco é
sobreposta ao cartaz de Visca, fazendo coincidir o lado menor do retângulo
áureo com a base do cartaz. Ainda que os retângulos tenham proporções
diferentes, como exposto anteriormente, nota-se que a distribuição da massa
de elementos coloridos ocupa a área quadrada (gnômon) enquanto o
retângulo áureo recíproco é ocupado pelo texto inserido num fundo branco. A
combinação entre os elementos compositivos e a grade de proporções áureas
se intensifica pelo contraste de cores entre a massa de figuras e do fundo.
Fig. 26 – Sobreposição do retângulo áureo ao cartaz de Visca, 2008
75
No cartaz realizado por Henrique Nardi (fig. 27), o alinhamento entre a
grade e a imagem, por meio das bases inferiores dos retângulos (assim como
no estudo anterior) permite que os elementos de composição coincidam com
as áreas determinadas pelo retângulo áureo recíproco e os quadrados de
formação de cada retângulo, como a coluna e o bloco de texto; no quadrado
maior, a subdivisão pelas mediatrizes do mesmo ajuda a identificar a
distribuição regular dos elementos da composição, delimitando uma situação
de perspectiva espacial. Nota-se, com isso, que a base do desenho da casa se
justapõe à linha mediatriz de divisão horizontal, assim como o corpo de texto
parece descansar sobre a base do quadrado.
Fig. 27 - Sobreposição do retângulo áureo ao cartaz de Henrique Nardi, 2011
76
No próximo cartaz, de Gustavo Maffei (fig. 30), o alinhamento entre a grade
e a imagem, é feito a partir da coincidência entre a linha horizontal (A) que
delimita o quadrado e uma linha (inexistente, mas identificável) que separa
o corpo formado pelas faixas compositivas inferiores. As faixas estão
dispostas conforme as diagonais do quadrado maior e também das diagonais
dos quadrados menores, obtidos pela subdivisão regular do maior. Essa é
uma composição tipicamente geométrica, mesmo que, por ventura, não tenha
sido programada em função do uso da geometria. Não há dúvida da
interferência de elementos e conceitos geométricos, ainda que usados de
forma inconsciente ou intuitiva.
Fig. 28 - Sobreposição do retângulo áureo ao cartaz de Gustavo Maffei, 2010
A
77
Como no cartaz anterior, a justaposição da grade do retângulo áureo com a
imagem do cartaz de Marcos Cartum (fig. 29) revela a disposição dos
elementos lineares numa mesma direção, acompanhando as diagonais das
subdivisões dos quadrados. A tipografia, apesar de ocupar a região central do
retângulo que limita o cartaz (de proporção 2:3), também se posiciona
proporcionalmente dentro da grade do retângulo áureo, ocupando a faixa
superior de ¼ da medida do quadrado. É de se esperar a regularidade
geométrica neste exemplo, já que o fundo foi elaborado com padrões
modulares que se repetem, apesar de algumas alterações que quebram a
constância da composição.
Fig. 29 - Sobreposição do retângulo áureo ao cartaz de Marcos Cartum, 2009
78
Neste exemplo a grade do retângulo áureo é dupla. Ambas são sobrepostas e
invertidas sobre a imagem do cartaz de Marson (fig. 30), de composição
aparentemente irregular. Encontram-se situações de disposição de elementos
aleatórios, mas assertivos quanto a algumas coincidências. É o caso do
edifício que aparece em primeiro plano ocupando a área delimitada pela
linha azul, e a verde, que delimita a mediatriz do retângulo. Outra
curiosidade é a disposição do corpo de texto sobre a reta mediatriz do
quadrado do retângulo áureo recíproco superior. O edifício que se encontra
no centro tem seu limite de altura coincidente com a linha que divide o
quadrado do retângulo áureo de uma das grades, além de ter sua face frontal
dividida pela linha verde de simetria do retângulo.
Fig. 30 - Sobreposição do retângulo áureo ao cartaz de Vinicius Marson, 2009
79
O cartaz de Alécio Rossi (fig. 31) distribui os elementos compositivos na
mesma área ocupada pelo quadrado do retângulo áureo. A linha mediatriz do
retângulo áureo divide tais elementos simetricamente, na posição vertical.
Horizontalmente, cada grupo se concentra dentro de um dos quatro
quadrados que subdividem o maior. Sabe-se, neste caso específico40, que o
autor costuma utilizar vetores em seus trabalhos, mas de forma quase
mecânica, como uma prática enraizada, e o mesmo admite que os
conhecimentos de geometria o auxiliam muito na composição de suas obras.
Fig. 31 – Sobreposição do retângulo áureo ao cartaz de Alécio Rossi, 2011
40 Alécio Rossi cedeu esta informação, dentre outras, através de mensagens eletrônicas encaminhadas à autora.
80
Seis outros cartazes (fig. 32 até 37) serão demonstrados a partir da
sobreposição da malha construtiva do retângulo áureo, mas agora com o
intuito de verificar a associação da espiral áurea aos elementos compositivos
dos cartazes. Poder-se-á notar que a seleção agora se vincula a temas mais
ligados à abstração e que demonstra, em seus elementos compositivos, uma
aparente desorganização, não permitindo assim, uma associação imediata à
conceitos e traçados geométricos.
Fig.32 – Fonte: Daniel Innarelli, 2009 Fig.33 – Fonte: Milton Cipis, 2009 Fig. 34 – Fonte: Isidro Ferrer, 2010
Fig.35 – Fonte: Guma, 2010 Fig.36 – Fonte: Ronald Kapaz, 2010 Fig.37 – Fonte: Hélio de Almeida, 2010
81
Pode-se verificar com clareza, no cartaz de Daniel Innarelli (fig. 38) uma
divisão geral dos elementos compositivos, em função da diagonal do
retângulo áureo maior, alinhando–se a base deste com a base do cartaz. Todo
o corpo de texto – assim como a linha do horizonte demarcada pelos
contornos de prédios - também acompanha as direções das diagonais dos
retângulos áureos recíprocos. A espiral áurea atua como elemento de
dinamismo entre os elementos compositivos do cartaz e afunila sua
curvatura coincidindo com o bloco de texto em vermelho41.
Fig. 38 – Sobreposição da espiral áurea ao cartaz de Daniel Innarelli, 2009
41 Uma analogia curiosa pode ser feita neste momento quando a espiral afunila sua curvatura no texto que diz: “imagine jogar 1Kg de lixo diário dentro da sua mochila; colocar os 12Kg de CO² que o carro emite em seu quarto; os 200 litros de água que você gasta, em baldes na sua sala...” – é como se ela nos levasse, com esse movimento de estreitamento, a uma busca na inconsciência por elementos passíveis de emergir para a consciência através do direcionamento a um foco (o texto).
82
O alinhamento do retângulo áureo novamente se dá pela base do retângulo
do cartaz de Milton Cipis (fig. 39). As diagonais também parecem dividir os
elementos compositivos como no exemplo anterior – a maior quantidade de
flores se concentra na área delimitada pelas diagonais dos retângulos
áureos. A tipografia concentra-se no segundo retângulo áureo recíproco e,
novamente, a espiral afunila sua curvatura em direção ao texto - foco ou
tema principal do cartaz.
Fig. 39 – Sobreposição da espiral áurea ao cartaz de Milton Cipis, 2009
83
Uma das verificações mais curiosas é a que se apresenta com o cartaz de
Isidro Ferrer (fig. 40). Todos os elementos compositivos parecem estar
colocados de maneira aleatória no campo de trabalho mas, em qualquer
posição que se coloque a espiral áurea, há uma harmonia compositiva. É
como se a organização acontecesse em função da curvatura, esteja ela na
posição em que estiver. Pode-se, inclusive, ter a sensação do movimento de
redemoinho acomodando – ou interferindo – nos elementos compositivos.
Fig. 40 – Sobreposição da espiral áurea ao cartaz de Isidro Ferrer, 2010
84
Composição de análise complexa, semelhante ao exemplo anterior, o cartaz
de Guma (fig. 41) também opta pela colocação aleatória dos elementos
compositivos no campo do cartaz. A espiral áurea é sobreposta novamente
em quatro posições diferentes e, neste caso, também sugere uma harmonia
compositiva em torno da curvatura, em qualquer das posições. O equilíbrio
da figura central (o homem de corpo inclinado, que parece – ironicamente -
se desequilibrar) é mantido segundo uma direção similar às direções das
diagonais do retângulo áureo maior, e o mesmo se destaca como organizador
da casualidade dos elementos compositivos do fundo.
Fig. 41 – Sobreposição da espiral áurea ao cartaz de Guma, 2010
85
A análise do cartaz de Ronald Kapaz (fig. 42) proporciona surpresas
inimagináveis à primeira observação. A acomodação de sobreposição entre a
grade do retângulo áureo e o cartaz se dá pelas bases dos dois retângulos. O
posicionamento da espiral áurea em duas posições distintas indica, de uma
maneira ou de outra, o afunilamento do traçado da espiral coincidindo com
os dois únicos detalhes em destaque na composição (cabeça do Mickey e Liza
Simpson). Os mesmos detalhes também se encontram ancorados na diagonal
do retângulo maior e são coincidentes (ou muito próximos) com os
cruzamentos dessa diagonal com a curva da espiral, e também com a
diagonal do retângulo áureo recíproco. Outro pormenor que pode passar
despercebido ao observador é a concentração da massa de cor vermelha
ajustando-se à área do quadrado (gnômon), demonstrado no último quadro
da fig 42.
Fig. 42 – Sobreposição da espiral áurea ao cartaz de Ronald Kapaz, 2010
86
O último exemplo selecionado, o trabalho de Hélio de Almeida (fig. 43), tem a
base superior coincidindo com a base superior do retângulo áureo. Todos os
elementos compositivos – distribuídos na parte superior do cartaz –
acomodam-se no retângulo áureo recíproco, além de acompanharem a
curvatura da parte mais fechada da espiral áurea. Curiosa também é a linha
representando o caule da árvore que, não estando centralizada, praticamente
intercepta o cruzamento da linha curva da espiral com a linha de base do
cartaz.
Fig. 43 – Sobreposição da espiral áurea ao cartaz de Hélio de Almeida, 2010
87
A análise geométrica desse conjunto de cartazes permite lembrar a
contribuição que alguns conceitos oferecem quando consideradas e aplicadas
ao estudo, viabilizando a ideia e auxiliando o desenvolvimento do projeto,
naquelas áreas que se valem do desenho. Em relação à razão áurea, axioma
que conduziu o estudo realizado sobre alguns trabalhos de designers,
(...) é um produto da geometria inventada pelo homem. No entanto,
os humanos não sabiam para que reino encantado esse produto
estava conduzindo. Se a geometria não tivesse sido inventada, então
nós talvez nunca tivéssemos conhecido a Razão Áurea. Mas então,
quem sabe? Ela poderia ter surgido como o produto de um pequeno
programa de computador. (LIVIO, op. cit., p. 283).
Permite ainda, lembrando Scruton (1979), considerar que a procura
de uma harmonia matemática subjacente a cada forma de beleza não é uma
peculiaridade, pois foi a concepção mais popular, dos egípcios a Le Corbusier.
E que é inegável que determinados arranjos de formas parecem mais
adequados e harmoniosos que outros e se designers e arquitetos precisam
articular partes, não é crível que a obtenção de harmonia entre elas seja
adquirida ao acaso.
Nesse sentido, menos que a impor a utilização de determinado
sistema de proporção como princípio fundamental de relações estéticas,
importa transmitir, demonstrar e discutir os parâmetros já utilizados por
tantos indivíduos e por tanto tempo, explicitando o quanto da beleza que
admiramos em diversas obras é mais devedor de um processo de construção
da forma do que resultado de uma inspiração, por si só.
88
4 – Concepção e resolução: a forma na Arquitetura
O desenho pode simular a experiência direta e usar unicamente recursos perceptivos, mas também pode penetrar na estrutura
profunda do objeto para colocar em relevo aspectos que se encontram ocultos aos olhos do espectador.
Jorge Sainz (2005, p.221- tradução nossa)
A Arquitetura e o Design são exemplos de áreas em que se requer a
visualização de um projeto, mas também são áreas cujos projetos –
amparados pelo desenho - nos permitem apreciar com antecedência a ideia,
esteja ela plenamente desenvolvida ou não. A evolução da solução de um
projeto pode ser analisada e avaliada durante o processo de elaboração do
mesmo, através das relações entre os diversos elementos arquitetônicos42.
Tal desenvolvimento - seja enquanto organização de ideias ou já no
processo de estruturação final – pode ocorrer em caráter bidimensional ou
tridimensional 43, ou abarcar as duas possibilidades, já que “Todos estes
sistemas de representação (...) são afinal uma parte importante do desenho
de arquitetura, uma vez que o assunto do trabalho do arquiteto são os
volumes e o espaço e a articulação de uns com outros, modelando (...) os
espaços do espaço.” (RODRIGUES, 2000, p. 98).
42 “Os projetos de edifícios – como todas as representações de objetos que se podem construir – têm uma exigências que se satisfazem plenamente com o uso das projeções ortogonais. Estas possuem uma série de propriedades geométricas que são muito adequadas para a representação (...) (e) supõem uma série de vantagens práticas no uso deste sistema de projeção no desenho de arquitetura.” (SAINZ, 2005, p. 115 e 116 – tradução nossa). 43 Utilizam-se neste estudo os termos ‘bidimensional’ e ‘tridimensional’ no sentido de enfatizar que há a possibilidade de se verificar resultados em projetos não só através de desenhos, mas também pela confecção de maquetes, por exemplo, para a demonstração, ainda que em escala, da forma tridimensional da obra.
89
Concepção | forma
O termo “forma” possui significados que variam segundo teorias e
autores distintos. Para Aristóteles (384-322 a.C.)
Cada objeto do mundo é constituído por uma matéria e uma forma.
Esta não indica o aspecto exterior e visível, mas a estrutura, a
organização interna que faz com que o sujeito seja o que é. A matéria
é passiva, ao passo que a forma coincide com a essência necessária.
A forma de um animal, por exemplo, indica a espécie à qual ele
pertence. (ARISTÓTELES apud NICOLA, 2005, p. 99).
O filósofo, assim, entende o significado de forma como essência, como
inseparável do ser, como atributo intrínseco à própria estrutura do ser.
Nesse sentido, é a forma que faz com que algo chegue a ser o que é.
Em tempos mais recentes, o entendimento de Pinõn guarda essa
ideia de atributo intrínseco ao objeto, mantendo-a quando se refere à
composição da mesma, caracterizada como uma entidade única:
A forma é inclusiva por definição, o que não significa que proceda
por adição: os elementos constitutivos da forma, mesmo quando
conservam sua aparência original, perdem seu sentido inicial em
favor do que adquirem em sua relação com os demais. (PIÑON,
2006, p.52)
Essa unicidade pode ser percebida, no processo de elaboração da
forma já a partir dos traçados iniciais (fig. 44, 45 e 46), que certamente
registram o processo mental, ou as percepções espaciais, ainda que por vezes
incipiente ou mesmo oculto, mas manifestado a partir de determinadas
referências codificadas: Daí, como se sabe, a frequência com que se
90
encontram desenhos carregados de informações sobrepostas, chaves da
solução que se vão derivando umas das outras:
Interessante será ainda notar, nos desenhos de arquitetos, a
liberdade com que certos códigos, por vezes bastante estritos e
rígidos, são usados como que ‘à mão levantada’; quer isto
dizer que alguns esquissos são um desenrolar de
representações várias em que o assunto apresentado se vai
metamorfoseando, das lagartas hesitantes e indecifráveis de
uns arabescos (que muitas vezes só tem mesmo sentido para
quem os desenha) até às mais fantásticas borboletas
axonométricas, e não é impossível que tudo apareça no mesmo
desenho, na mesma folha de papel e sempre com aquela
sobriedade absoluta de ser apenas um meio caminho de um
processo, de existir numa fronteira de pensamento e acção que
tornam tão palpável o processo mental que o provocou.
(RODRIGUES,2000, p. 99).
Fig. 44 - Sede da Fundação Iberê Camargo – Croquis de concepção. Arquiteto Álvaro Siza. Fonte: < http://www.teiaportuguesa.com/lusografo/sisavieira2012.htm > Acesso em: 02/06/2012.
91
Fig. 45 e 46 - Sede da Fundação Iberê Camargo – obra e croquis de concepção. Arquiteto Álvaro Siza. Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Essa representação gráfica tanto contém os traços figurativos do
objeto como a chave para a sua interpretação, e é através de ambos que o
objeto deve ser observado. Nas etapas posteriores, de desenvolvimento
sistematizado da forma e do espaço, e de quaisquer aspectos conectados do
mesmo objeto, esse será passível de um verdadeiro inventário – na expressão
de Massironi (1996, p. 92), e será submetido à divisão das partes, ao registro
de cada uma, à sua descrição minuciosa.
Uma das maneiras possíveis de se reproduzir o espaço graficamente
se dá pelo uso da perspectiva, revelada no Renascimento44 e apresentada na
44 “Diz-se que o arquiteto florentino Filippo Brunelleschi (1377-1446) deu muita atenção a esse problema, mas a primeira exposição formal de alguns problemas foi dada por Leon
92
literatura artística como objeto de teoria e doutrina, sistematizada pela
primeira vez, por Alberti (1992). Pode ser considerada como uma impressão
sensorial imediata ou ainda como uma representação geométrica
aproximada da exatidão, não deixando de ser uma abstração que transforma
o espaço psicofisiológico em espaço matemático (fig. 47). Segundo Panofski
(1999, p. 63), “por um lado, a perspectiva submete o fenômeno artístico a leis
constantes e, até, de uma exatidão matemática (e) por outro, torna esse
fenômeno contingente para os seres humanos e mesmo para o indivíduo.”
Fig. 47 - Aparatos mecânicos desenvolvidos por Alberto Dürer para representar a perspectiva.
Fonte: PEDOE, Dan. La geometría en el arte. Barcelona: Gustavo Gili, 1979.
A perspectiva está ligada à representação de um objeto
tridimensional e de seu espaço circundante sobre um plano, onde se aceita
tudo que se esquiva às leis do espaço em função da autenticidade do manejo
das relações do mesmo e dos objetos que se encontram nele (FOCILLON,
2001, p. 33 – 34). A técnica para excutá-la se apóia em regras obtidas a
Battista Alberti (1404-1472) num tratado de 1435 (impresso em 1511) chamado Della pictura. (...) Outro passo no desenvolvimento da perspectiva foi dado pelo pintor italiano de afrescos, Piero della Francesca (1410?-1492), em De prospectiva pingendi (cerca de 1478).” (BOYER, 1996, p. 203).
93
partir do estudo da geometria, que auxiliam na elaboração do esboço das
relações gráficas lineares utilizadas em seus registros, controlando a
transição gradual dos objetos no espaço. Rodrigues (op. cit., p. 107) defende
como “fundamental ter presente que esta invenção através de convenções e
de esquemas pode tornar palpável e real a irrealidade do infinito”, já que a
geometria e a perspectiva demonstram o infinito como se existisse
acessibilidade a este lugar. A autora complementa afirmando que “no
entanto, é com a sistematização da perspectiva que, subitamente, o espaço
adquire uma ordenação e uma harmonia arquitectônica ideal.” (op. cit., p.
108).
Entretanto, a perspectiva - apesar de possibilitar uma reprodução da
realidade – tem mais a função de ser ilustrativa, já que tem a finalidade de
dispor do ilusório. Não atua, portanto, como recurso mais importante na
representação de um projeto, pois
Como instrumento de trabalho do arquiteto, a perspectiva serviu
frequentemente de intermediário entre os desenhos esquematizados
e cotados de plantas e alçados ou outros registros indecifráveis a
leigos, entre toda essa parafernália gráfica que o especialista usa, e
a possibilidade de apresentar a um olhar menos especializado uma
imagem do resultado possível daquilo que se projeta. Em muitos
casos foi realmente um modo de se mostrar, ao ‘cliente’ ou a quem
encomendou, uma antevisão do resultado final. (RODRIGUES, op.
cit., p. 109).
De qualquer maneira, não deixa de ser uma técnica importante no
desenvolvimento da representação espacial. Mas, ainda que utilize como
método construtivo o sistema de planos de projeção para sua representação,
ela não permite uma análise mais minuciosa de um objeto – não promove um
94
‘inventário’ das coisas - como, por exemplo, cortes ou planificações de faces
dos objetos estudados45.
O que permite então a representação do ‘espaço real’ é a relação
entre o pensamento arquitetônico e a geometria enquanto modo de análise,
com a geometria exercendo um papel intermediário entre o abstrato e o
concreto. Desse modo, é a necessidade de representar de maneira
bidimensional qualquer objeto respeitando suas características tal qual se
apresentam na tridimensionalidade, que fez com que a Geometria Descritiva
tivesse fundamental importância no século XIX46.
Porém, “procedimentos tão abstratos como as projeções ortogonais já
eram utilizados intuitivamente desde a antiguidade na representação de
objetos tridimensionais sobre um plano.” (SAINZ, 2005, p. 112 – tradução
nossa) (fig. 48). Isso porque a necessidade de ordem é o que impele o homem
a formular e encontrar as estruturas das coisas, procedimento constituinte
da maneira de funcionar do nosso pensamento. Ainda que existam outros
modos de ordenação, nos quais a razão seja apenas uma das maneiras de
entender o mundo, e a desordem seja uma forma de ordem que não possa ser
completamente explicável, mas que permite acessar áreas onde as ‘ordens’
não estabelecem uma estruturação.
45 “Alberti aposta claramente na utilização da projeção ortogonal (a planta) nos documentos gráficos específicos de arquitetura, e deixa as representações de caráter visual ou ilusório (as perspectivas) para as produções artísticas de natureza pictórica.” (SAINZ, 2005, p.48, tradução nossa).
46 Ana Luíza Janeira discorre sobre a visão e os outros sentidos até a pós-modernidade, e comenta sobre a diferença na forma de representação da perspectiva entre os flamengos e os italianos, mostrando que o intelectual europeu passara a apresentar maior disposição para a representação espacial, quer por vias marcadamente empíricas ou substancialmente abstractas. (JANEIRA, 2006, p.139 – 147).
95
Fig. 48 - Estudo de proporções associando a figura humana a uma projeção (elevação). Francesco di Giorgio Martini, entre 1470 a 1480. Fonte: < http://dedsign.wordpress.com/textos/o-corpo-e-o-modelo/3-as-ideologias-de-um-corpo-completo-mas-fragmentado/ > Acesso: 20/08/2011.
Apesar de permitir a representação de uma criatividade conceitual, a
abrangência da Geometria Descritiva está na particularidade de representar
e dispor das propriedades métricas dos objetos, acessando características
peculiares referentes à construção, montagem, localização, etc. Além da
representação das sombras e das projeções cotadas, o método mais usual é o
das projeções ortogonais, o qual se desenvolve através de um sistema de
96
projeção cilíndrica ortogonal e descreve objetos com valores dimensionados
considerando-se três eixos que determinam sua altura, largura e
profundidade. Seja através das projeções ou ainda da perspectiva,
(...) encontramo-nos perante códigos fortes e bem estruturados que
permitem veicular múltiplos conteúdos utilizando sistemas de sinais
bem organizados, e que também deixam espaço a uma vasta gama
de execuções estilísticas diversas. (...) Quando nos encontramos
perante um elaborado gráfico com estas características somos
levados a lê-lo como um documento que nos fornece dados úteis
acerca das qualidades dimensionais, das possibilidades operativas,
das conexões entre as várias partes, e o seu funcionamento, etc.
(MASSIRONI, op. cit., p. 101).
Esses sistemas formalizados e codificados, normalmente, surgem das
necessidades e das exigências do processo de comunicação e informação
inerentes às áreas que utilizam o projeto gráfico como recurso parcial (em
alguns casos, recurso principal) de documentação (MASSIRONI, op. cit.).
Como mencionado anteriormente, Sainz nos lembra que “no século XVI já se
utilizavam os três sistemas básicos de projeção geométrica. A axonometria e
as projeções ortogonais ainda não se haviam codificado completamente, mas
eram usadas com bastante rigor.” (op. cit., p. 114 – tradução nossa). E assim
como há evidências do uso das projeções, há também como se verificar o uso
da seção47 e a combinação entre as projeções como, por exemplo, planta e
elevação, planta e seção, elevação e seção48.
47 Seção é um corte imaginário no objeto que permite sua representação e visualização interna.
48 Sainz afirma que as combinações das projeções “já se apresentavam no tratado de Palladio, de 1570, ainda que provavelmente já haviam sido utilizadas anteriormente.” (op. cit., p. 121 – tradução nossa).
97
É apenas no final do século XVIII, mais precisamente em 1789 – após
a Revolução Francesa – que, com a publicação da obra Geometria Descritiva
do matemático Gaspar Monge, todos os sistemas de projeção foram
definitivamente codificados49.
Não é difícil entender o objetivo desse rigor cuja finalidade visava
que as representações fossem facilmente entendidas e com pouca margem de
erro, já que o projeto costuma conter as qualidades não só do futuro objeto,
mas também das soluções espaciais envolvidas no processo de elaboração do
projeto. Tais soluções espaciais referem-se às vivências de algo que – ao que
parece – não existe. Na explicação de Rodrigues (op.cit., p. 112), a vivência do
espaço implica em observação (aqui, alí, etc.), direcionamento (direita,
esquerda, etc.), e também distâncias psicológicas, onde o sujeito é o centro. E
sobre a possibilidade de experimentar a representação do espaço, a autora
ainda discorre afirmando que o espaço experimentado é codificado
construindo a possibilidade de representação gráfica do espaço abstrato.
Assim, o emprego de códigos no desenho de um projeto é outra
maneira de conhecer e pensar e, além de possibilitar o planejamento do
pensamento, fortalece as possibilidades combinatórias entre os elementos
envolvidos na ideia do mesmo. Ainda segundo Rodrigues (op. cit., p. 101) “a
utilidade maior dos códigos é a de desmultiplicação da capacidade do
pensamento (...) é transformar em elementos simples e universais (umas
vezes mais, outras vezes menos universais) ideias referidas a áreas
específicas de pensamento. (...) é um ‘instrumento’ (que) permite comunicar
pensamento”.
49 Ver SAINZ, 2005, p.53, 54 e 115; BOYER, 1996, p. 324 – 328; e RODRIGUES, 2000, p. 161.
98
Mas nem tudo em um projeto é passível de uma leitura clara e
imediata, apesar da constante preocupação em transformar ideias em
elementos legíveis e inteligíveis a outrem. Na arquitetura, Sainz explica que
(...) sem dúvida, fica difícil entender uma planta de um modo
perceptivo. A planta não é fácil de ver, então as pequenas
deformações na implantação de um edifício só são descobertas
quando se levantam os planos a partir das medidas tomadas. O
olho não distingue esses pequenos detalhes iniciais diferenciais.
(SAINZ, 2005, p. 221 – tradução nossa).
Retomando a ideia de unicidade da forma, muitas delas, mais
complexas, possuem uma composição geométrica interna que não é
perceptível de imediato ao leitor, independente de o desenho estar ou não
dentro dos padrões de representação, como as projeções ortográficas, por
exemplo. É essa condição – as formas geométricas e as relações
fundamentais entre elas - que se pretende identificar e demonstrar, por meio
da análise das peças gráficas disponíveis do projeto da Fundação Iberê
Camargo, do arquiteto Álvaro Siza, para quem o desenho, definitivamente, é
expressão do pensamento:
A princípio faço muitos croquis em que se pode perceber a
exploração e a inquietude que me assaltam frente certos problemas.
Uma mostra da dificuldade de um projeto oferece o número de
croquis preliminares que faço até encontrar o caminho adequado. Os
desenhos oferecem possíveis vias de trabalho, mas também o
desassossego na busca da solução precisa. As vezes revejo folhas e
folhas de meus cadernos em busca de alternativas possíveis; é um
trabalho obsessivo até alcançar um ponto de equilíbrio. (SIZA,
revista El Croquis nº 140, p. 12 – tradução nossa)
99
Análise geométrica | Fundação Iberê Camargo
Fig. 49 – Desenho da Fundação Iberê Camargo;
Fig. 50 – Maquete da Fundação Iberê Camargo;
Fig. 51 – Fundação Iberê Camargo – vista geral;
Fig. 52 - Fundação Iberê Camargo – vista aérea;
Fig. 53 - Fundação Iberê Camargo.
Fonte das imagens: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
100
Fig. 54 – 1º piso da Fundação Iberê Camargo Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Implantação|Térreo
Duas figuras geométricas, triângulos associados (A e B), se comportam como
bases gerais de referência para alinhamentos de perímetros das formas que
compõem o projeto - em situação de planta e de elevações. O
desenvolvimento do térreo, na maior parte de sua extensão - até o ponto de
inflexão das linhas retas para as curvas – ocorre internamente aos limites do
triângulo vermelho (fig.55a e 55b). Este acomoda sua hipotenusa respeitando
e acompanhando a linha de finalização da encosta existente ao fundo do
terreno (figuras 49 a 53).
Fig. 55a - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
101
Para compor o conjunto de edificações, dois retângulos (C e D) de proporções
2:1 definem as áreas construídas simultaneamente com a divisão do
programa: no retângulo da direita, os usos específicos do museu e no outro, à
esquerda, as edificações menores e exteriores ao prédio principal (fig.56).
Ambos os retângulos têm as bases coincidentes com a do triângulo vermelho,
seu cateto maior.
Fig. 56 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 55b - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
102
Pode-se constatar, também, que a interseção entre a linha da hipotenusa do
triângulo vermelho e o retângulo da esquerda divide o mesmo em duas
partes exatamente iguais (fig. 57).
As relações geométricas que se referem ao conjunto de edificações menores
(determinadas pelo retângulo C da esquerda, na fig. 55) podem ser
demonstradas por dois exemplos. O primeiro é a malha50 que se forma,
subordinada à proporção 2:1, com subdivisão de 8 x 4 módulos quadrados
(fig. 58), os quais confirmam as justaposições entre a grade e os elementos
formais da planta de uma maneira bastante imediata e didática (fig. 59).
50 A malha de uso recorrente em projetos de arquitetura como elemento de organização intelectual e geométrica equivale ao padrão utilizado em projetos de design, apresentado no capítulo anterior com o uso do grid.
Fig. 57 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
103
Angulações e inclinações que caracterizam formalmente diversos ambientes
estão referenciadas em retas que unem alguns vértices dos módulos da
grade. As linhas curvas, elementos inusitados e ao mesmo tempo
Fig. 58
Fig. 59 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
104
harmoniosos, são definidas por circunferências cujos centros se encontram
nos cruzamentos das linhas da malha. (fig. 60), seja em sua divisão geral ou
ainda em subdivisões dos módulos iniciais.
Outra malha de proporções idênticas - mas com divisões distintas da
apresentada para o retângulo C da esquerda - pode ser identificada como
elemento de suporte de organização para a edificação de maior porte, contida
no retângulo D à direita (fig. 56). A divisão agora resulta em uma grade
modular quadrada de 5 x 2,5 (fig. 61), e são utilizadas também subdivisões
de módulos para definir o traçado de alguns elementos formais (figs. 62 e
63).
Fig. 60 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
105
Fig. 61
Fig. 63
Fig. 62
Fig. 62 e 63 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
106
A segunda investigação - que pode ser considerada mais complexa - expõe
uma lógica possível para os limites (vértices) das formas das edificações
menores, controlados por cruzamentos entre as retas de um conjunto de
quadrados assentados na base do triângulo geral de referência A (vermelho),
e a interseções das mesmas com a hipotenusa do triângulo, determinando
assim as uniões e as inflexões dos diversos vedos (fig. 64).
Na edificação à direita, o grande espaço do térreo é orientado por um
conjunto de relações geométricas: o arco de circunferência centrada em E
(rosa) garante a eqüidistância das paredes localizadas na parte interna
superior e marcam o início da rampa (fig 65). O prosseguimento da definição
desse espaço, à direita, é orientado por outra circunferência centrada em F,
que tangencia tanto dois lados concordantes do retângulo como a base do
triângulo B de referência geral. Trecho de arco desta circunferência
Fig. 64 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
107
determina a curvatura da parede, tangenciando o retângulo D exatamente
em seu quadrante.
Outros elementos curvos podem ser verificados e justificados por
coincidências, concordâncias e tangências entre retas e centros das formas
geométricas já demonstradas (fig 66 e 67). É significativa a tangência entre a
linha reta que define o vedo do acesso principal e a circunferência que
determina a parede curva externa da edificação (fig 68). Esta circunferência
tem seu centro G na reta que une um vértice inferior do maior quadrado da
parte exterior a um vértice oposto do triângulo de base B (verde), formando
também um eixo perpendicular com o vedo do acesso principal, onde se dá o
ponto de tangência.
Fig. 65 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
108
Fig. 67 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 66 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
109
Segundo piso
Para efeito de confirmação, demonstram-se novamente as figuras
triangulares de base do projeto associados ao desenho do segundo piso (fig.
69a e 69b).
Fig. 68 – 2º piso da Fundação Iberê Camargo Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 69b - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 69a - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
110
Podem-se observar também algumas figuras e relações geométricas que são
mantidas entre o primeiro e o segundo piso, como o retângulo de proporção
2:1 que dá forma geral ao edifício, a eqüidistância entre as duas paredes na
parte superior do retângulo (fig. 70).
O ambiente que ocupa o espaço no canto superior direito do retângulo
adquire formato partindo da união da aresta menor do triângulo verde (da
base) e um retângulo similar ao maior, em escala reduzida de 1:2,5 (fig. 71),
enquanto um outro ambiente assume o formato quadrado.
Fig. 70 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 71 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
111
Da união do ambiente quadrado com outro retangular que encerra o espaço à
direita obtém-se um retângulo áureo (fig. 72).
A curva da circunferência que confirma e demonstra o traçado do retângulo
áureo tangencia a reta que une o vértice do triângulo verde de base ao desvio
da estrutura das rampas externas, além de passar pelos vértices dos
retângulos que definem os ambientes internos (fig. 73).
Fig. 72 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 73 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
112
Assim como no primeiro piso, a parede curva demonstra algumas
peculiaridades em sua geometria. O centro da curva que dá forma ao
ambiente principal se situa no ponto médio da reta que sai de um vértice do
quadrado de um dos ambientes e encontra outra reta - de inclinação
aleatória -, mas que tangencia a curva, definindo também uma das paredes
deste ambiente (fig. 74).
Fig. 74 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
113
Terceiro piso
A partir do segundo piso, verifica-se certa repetição de formas e este
procedimento se mantém no terceiro piso, o qual também continua
demonstrando uma associação linear ao triângulo de base verde (fig. 76a e
76b).
Fig. 75 – 3º piso da Fundação Iberê Camargo Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 76a - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 76b - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
114
O formato do 3º piso associa-se a um grid de proporções áureas - 5 x 3 (fig. 77
e 78).
Fig. 77
Fig. 78 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
115
Um retângulo também pode ser traçado como componente formal principal
da edificação, mas agora – ao contrário do que acontece nos dois primeiros
pisos – este está apoiado na base do triângulo verde; e outro retângulo áureo
pode ser encontrado em uma das áreas parcialmente divididas por paredes,
sendo que um vértice do retângulo coincide com o cruzamento da aresta da
hipotenusa do triângulo com a reta da base superior do retângulo (fig. 79).
As relações geométricas das curvas das paredes continuam causando
curiosidade. O centro da curvatura externa da parede encontra-se numa reta
que cruza a base do retângulo áureo e é bissetriz de um ângulo cujo vértice
coincide com um dos vértices do retângulo áureo. Este ângulo também
determina a forma do desenho de uma junção entre uma das rampas de
acesso e o 3º piso e, observa-se também neste exemplo, outra junção entre
rampa de acesso e o 2º piso, que é determinada por duas retas (na cor
vermelha): uma que une a interseção da circunferência com a hipotenusa do
triângulo verde ao vértice do quadrado do retângulo áureo; e outra reta
perpendicular à base do retângulo maior, que também é tangente à
circunferência (fig. 80).
Fig. 79 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
116
Situação similar se dá com a parede curva interna, a qual tem centro
coincidente com o vértice do quadrado áureo – pertencendo assim à reta
citada anteriormente que define outra junção entre rampa e parte interna da
edificação (fig. 81).
Fig. 80 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 81 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
117
Quarto piso
O quarto piso praticamente dispensa análise aprofundada, já que repete um
padrão adquirido nos pisos inferiores – demonstrados anteriormente - e é
muito similar ao 3º piso, como demonstram as figuras 83a e 83b.
Fig. 82 – 4º piso da Fundação Iberê Camargo Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 83a - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 83b - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
118
Fig. 84 - Elevação Norte. Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 85 - Elevação Leste. Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Elevações
Apenas duas das elevações (Norte e Leste – fig. 84 e 85) foram selecionadas
para ilustrar as relações geométricas da parte externa (fachadas), incluindo
as relações de altura às de largura e profundidade já observadas nas plantas
dos pisos da edificação da Fundação Iberê Camargo.
119
O retângulo áureo aparece novamente na elevação Norte e mantém uma
equivalência entre seu lado menor e o cateto menor do triângulo verde
utilizado na base do projeto das plantas. A distância de afastamento entre os
catetos maiores dos triângulos coincide com o pé direito das edificações
exteriores (fig. 86).
Na elevação de face Leste a figura de um quadrado assume o formato geral
da edificação (fig. 87). Esta evidência leva-nos ao desfecho de que o formato
geral da edificação assume características provenientes das relações da
proporção áurea, assim como se pode observar no capítulo anterior com as
demonstrações dos cartazes.
Fig. 86 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
Fig. 87 - Fonte: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/08.093/2924> Acesso: 26/09/2011.
120
Desta análise conclui-se também que toda a base do raciocínio
geométrico formal despendido pelo arquiteto Álvaro Siza neste projeto partiu
da composição dos dois triângulos retângulos (verde e vermelho)
demonstrados desde o primeiro desenho (fig. 55a), os quais, provavelmente,
foram utilizados como uma espécie de matriz à elaboração dos desenhos do
projeto.
Outras tantas relações geométricas podem ser observadas e
poderiam ser verificadas tendo como base os desenhos da Fundação Iberê
Camargo. As aqui apresentadas – ainda que em alguns momentos com certo
grau de aproximação51 (função, também da escala do material iconográfico
disponível) e ainda que o arquiteto não tenha se valido exatamente das
mesmas demonstradas na análise, já possibilitam a consideração de que a
geometria atua como recurso fundamentalmente ordenador do raciocínio
espacial dispensado à concepção e à resolução da forma empregada em um
projeto.
51 Todas as imagens apresentadas contendo as análises das relações geométricas foram realizadas no AutoCAD pela autora desta pesquisa. Os desenhos lineares foram realizados sobrepondo-se às imagens dos desenhos das plantas e das elevações do Instituto Iberê Camargo adquiridas em sítios da internet. Considerando-se que tais imagens do projeto já sofriam relações de redução em escala, bem como questões relativas à qualidade das mesmas, e também que foram empregadas espessuras nas linhas dos desenhos do AutoCAD, pode-se esperar que certa imprecisão aconteça se comparados os resultados de cálculos provenientes dos desenhos com os realizados a partir das medidas originais. Porém, acredita-se que tal possibilidade não anule as investigações realizadas, já que dificilmente haja alterações nas formas gerais mediante tais acertos métricos.
121
5 – Considerações
A nossa busca por verdades mais profundas continua. Nós devemos ser gratos a Euclides e aos gênios que o
seguiram, Descartes, Gauss, Einstein (...) e a todos sobre cujos ombros eles subiram. Eles experimentaram a alegria
da descoberta. Para o resto de nós, eles permitiram uma alegria igual, a alegria da compreensão.
Leonard Mlodinow (2010, p.265)
Desde o advento da Modernidade, a ciência é associada à pesquisa,
justamente pela certeza de que o conhecimento está, sempre, em construção.
Toda a experiência de reflexão parece necessitar de dois pensamentos
simultâneos: de um lado, uma razão que motiva a ação, o pensamento de que
alguma coisa não vai bem; de outro, uma finalidade para a ação, isto é, o
pensamento sobre a necessidade de fazer algo, como lembra Wolff (in
NOVAES (org.), 2010).
Entretanto, à questão de base neste trabalho – o valor e a
necessidade dos conhecimentos que desenvolvem o raciocínio, em particular
o raciocínio geométrico, - que se supõe terem sido demonstradas, permite
desdobramentos para outros trabalhos, principalmente quanto à
investigação do seu ensino, incluindo aí a importância que os docentes –
inclusive na graduação - atribuem à geometria.
Subsídios a uma discussão ampla sobre a incidência ou o uso de
conhecimentos geométricos nos trabalhos dos profissionais das áreas de
Design e Arquitetura não faltam. O que se pode concluir, após as leituras
realizadas, é a constatação da preocupação que diversos autores revelam em
relação à importância do raciocínio lógico instruído no processo criativo,
representativo e demonstrativo de um objeto.
122
A lembrança dos atributos principais do cérebro humano é
recorrente para a ênfase atribuída à questão: o lado esquerdo é considerado o
responsável por comportamentos associados à linguagem e às habilidades
cognitivas analíticas ou lógicas (pertinente à matemática), enquanto o lado
direito responde pelas habilidades espaciais ou visuais (relativas à arte).
São, portanto, ‘lados’ distintos que se completam formando um cérebro
completo (DAVIS, 1986). É dessa completude que se presume atingir o
equilíbrio necessário e perseguido por artistas plásticos, arquitetos e
designers, fato que se pretende ter sido verificado nesta pesquisa, através
dos estudos de caso realizados.
Importa, ainda, recuperar algumas reflexões que constam deste
trabalho, assim como apontar considerações e/ou inquietações decorrentes
dos estudos empreendidos, na crença de que as mesmas possam servir de
ponto de partida para outras pesquisas.
A percepção do menor nível de conhecimento de geometria, ou mesmo
de nenhum, apresentado pelos estudantes ingressantes nos cursos de
graduação (de Design e de Arquitetura e Urbanismo) é confirmada e
explicada pela prioridade atribuída aos níveis anteriores - justamente os
níveis de educação destinados às crianças e aos jovens do país – ao ensino de
caráter prático, mais atento aos conhecimentos reconhecidos como
imediatamente aplicáveis e utilitários ao cotidiano da vida, conforme
atestaram autores como Pavanello (1989) e Maia (1997). Nesse caso, o
critério de funcionalidade parece ser entendido em seu significado mais
primário, desconsiderando ou minimizando a importância do trabalho de
base na educação, formador e estruturador do raciocínio52.
52 Pavanello relata que a geometria é praticamente excluída a partir da introdução da Matemática Moderna e, ao mesmo tempo, a álgebra passa a ter prioridade -
123
É preocupante, portanto, o abandono gradativo que ocorre nos níveis
que antecedem a graduação, particularmente nas escolas públicas, em
relação ao raciocínio estruturado, ordenado e dedutivo, em geral vinculado às
questões conceituais das disciplinas, em favor do aprendizado prático e
funcional. Disciplinas como Desenho Geométrico e Geometria Descritiva (o
raciocínio matemático em geral, mas especialmente o raciocínio espacial),
podem tornar-se cada vez mais “coisas do passado”.
Para as graduações que requerem conhecimentos de geometria como
substrato ao desenvolvimento das atividades - o projeto na escala do objeto
ou do edifício - essa circunstância é bastante perversa uma vez que, a curto
prazo, parece não se vislumbrar alternativas compensatórias ou
substitutivas àquelas perdas na formação. Aparentemente, resta o impasse:
ou a retomada de tais conhecimentos no ensino Médio ou a inclusão dos
mesmos na graduação, de modo mais amplo e sistematizado, provavelmente
com o apoio de novas metodologias.
Uma constatação importante que a pesquisa permite é aquela que se
reporta particularmente à noção de proporcionalidade – apreendida muitas
vezes de modo intuitivo, independente da formação em matemática que o
indivíduo tenha tido e utilizada no cotidiano ou no universo de trabalho das
pessoas, como exposto no terceiro capítulo. Desse modo tal noção, transferida
para o senso estético de modo intuitivo ou instruída por raciocínio
geométrico, mas aplicado sem intenção consciente, pode ser identificada em
trabalhos de menor complexidade, como em alguns dos estudos que aqui se
procedeu.
tanto na pesquisa quanto no ensino de matemática – questão que “acabou por desenvolver somente um tipo de pensamento. É necessário, portanto, restabelecer o equilíbrio, retomando-se o ensino de geometria.” (1989, p. 182)
124
Circunstância, entretanto que não refuta o pensamento de Max Bill
de que é “(...) possível aperfeiçoar uma arte, sobretudo a partir de uma base
matemática de pensamento.” (BILL, apud ELAM, op. cit. p.5). Em relação à
qualidade das produções – às questões estéticas, portanto - a ausência de
maior entendimento dos princípios visuais da composição geométrica - por
parte dos designers e arquitetos, impede a utilização de relações visuais
fundamentais que se baseiam em atributos essenciais tanto da vida quanto
da matemática (ELAM, 2010).
Além disso, especificamente em relação à pratica na área de Design,
vem sendo consagrado, na maior parte das vezes, apenas o uso da malha
gráfica quadriculada como forma única de expor as condições de construção
da marca ou logomarca. Nesse caso, a regulamentação para utilização de
códigos apropriados, com o intuito de unificar o sistema de registro e de
documentação, pode vir a ser uma alternativa interessante à área.
Embora não esteja no escopo desta pesquisa, o vínculo dos programas
de computação com a criação e com o desenvolvimento da criação merece
uma observação, ainda que breve. No que compete à finalização de trabalhos
por meio dos desenhos de projetos, não se ignora os avanços da tecnologia,
com os vários programas disponíveis e o aperfeiçoamento constante dos
mesmos53. Os softwares, cada vez mais completos, fornecem agilidade à
execução e qualidade aos acabamentos de projetos, com a vantagem dos
equipamentos eletrônicos estarem se tornando corriqueiros, disponíveis pelo
menor custo e pela maior facilidade de manuseio. Nesse sentido, ainda
vigora nos cursos de arquitetura e de design, em relação aos projetos, por
53 Certamente tais avanços propiciarão transformações significativas na área da educação, o que já acontece, ainda que de modo incipiente, nas instituições de ensino.
125
exemplo, o uso da computação gráfica limitada ao papel de ferramenta de
desenho, substituindo as técnicas de prancheta.
De todo modo a utilização de tais equipamentos - mais ainda quando
deles se deseja extrair o maior potencial - não substitui as operações que
requerem, além de técnicas de manuseio, o raciocínio lógico, a visão
espacial, o conhecimento de conceitos e de relações pois “(...) o próprio
processo de projetar envolve um diálogo direto com os processos de
representar, diálogo este que deve ser informado pelas técnicas de desenho e
pela geometria, de um lado, e pelo entendimento do edifício que se busca
criar, programaticamente, construtivamente, culturalmente, esteticamente.”
(VINCENT, 2002, p.243).
A contribuição desses conhecimentos, para além daqueles
fundamentais e necessários à elaboração, aprimoramento e harmonização da
forma - como também se quis investigar neste trabalho - está presente na
esfera da própria concepção, como testemunha Álvaro Siza, em entrevista a
Juan Domingo:
Geralmente os arquitetos utilizam a geometria para controlar as
forma do projeto, o que tem dado lugar a arquiteturas muito
autônomas e com problemas de escala. (...) Recordo-me quando
trabalhava no projeto do Museu Iberê Camargo e ao chegar esse
momento de controle da ideia, as formas curvas do edifício surgiram
como resposta à escarpa montanha próxima, com a que são
ligeiramente simétricas. (...) No Brasil havia um estímulo evidente
entre o rio e a montanha, pelo que o controle da forma arquitetônica
dependia da relação que estabelecera com esta paisagem, enquanto
que em outras situações, como na cidade histórica, o controle
procede de questões de escala e continuidade com o existente. Ao
utilizar o termo controle estou me referindo à maneira de produzir
126
uma forma, uma geometria associada a estímulos diferentes.
(Revista El Croquis 2001 – 2008, p. 32 e 34 – tradução nossa).
A geometria é, portanto, indispensável à formação dos profissionais
das áreas de Arquitetura, Design, Engenharias e Artes em geral,
desenvolvendo o raciocínio e a visão espacial necessários a esses campos de
ação.
127
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