a formaÇÃo de professores de matemÁtica da universidade federal de mato grosso do sul: um olhar...
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Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
Campus de Campo Grande
Tiaki Cintia Togura Faoro
A FORMAO DE PROFESSORES DE MATEMTICA DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL: UM OLHAR SOBRE OS
ANOS INICIAIS DA LICENCIATURA EM DOURADOS
Dissertao apresentada banca examinadora,
como requisito parcial para obteno do ttulo de
mestre em Educao Matemtica, pela
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul UFMS.
Orientadora: Profa. Dra. Luzia Ap. de Souza
Campo Grande (MS)
2014
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Tiaki Cintia Togura Faoro
A FORMAO DE PROFESSORES DE MATEMTICA EM MATO GROSSO
DO SUL: UM OLHAR SOBRE OS ANOS INICIAIS DA LICENCIATURA DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL EM DOURADOS
Dissertao apresentada banca examinadora,
como requisito parcial para obteno do ttulo de
mestre em Educao Matemtica, pela
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul UFMS.
Comisso examinadora
______________________________________
Profa. Dra. Luzia Aparecida de Souza
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
______________________________________
Profa. Dra. Maria Ednia Martins-Salandim
Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho
______________________________________
Prof. Dr. Jos Luiz Magalhes de Freitas
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
Campo Grande - MS
2014
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AGRADEO....
Ao grupo HEMEP e IC-HEMEP pelas contribuies e discusses que aconteciam em grupo
sobre temas que me fizeram refletir e produzir esta pesquisa.
minha pequena e grandiosa orientadora Luzia Aparecida de Souza, que muitas vezes me
apoiou nos momentos difceis que encontrei durante o mestrado, alm, claro, pelas timas
orientaes em todas as etapas desta pesquisa.
Aos professores depoentes: Abramo Loro Neto, Ana Maria Sampaio Domingues, Edmir
Ribeiro Terra, Luiz Gonzaga Manzine, Odival Faccenda, Sidnei Azevedo, Valdir Brasil do
Nascimento Junior e Luiz Antonio da Silva, pela colaborao e pela confiana em mim
depositada.
Aos meus colegas de mestrado e, em especial, s minha amigas Cintia Melo e Edinalva
Sakai que sempre me apoiaram em todos os momentos desses dois ltimos anos.
E em especial minha famlia, aos meus pais Takeshi Togura e Tereza Hemico Togura, aos
meus queridos avs Yoshimichi Togura (in memria) e Mamoe Kushida Togura e minhas
queridas irms Emi, Tiemi, Mieko e Miyuki.
Ao meu grande amor Caio Takeshi Togura Faoro, meu filho amado e companheiro. E ao
meu esposo Rogrio e minha sogra e amiga Bety, que sempre estiveram ao meu lado.
Obrigada a todos...
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Venho para somar. Somar ideias esforos. Recursos e dedicaes. Para multiplicar as oportunidades de trabalho. Os bens e os empreendimentos. Para dividir as riquezas
produzidas. Os benefcios colhidos. A glria e o sucesso das realizaes. Pedro Pedrossian (Governador do estado em 1971)
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Resumo
Neste trabalho buscamos caracterizar o primeiro curso de formao de professores de
Matemtica da cidade de Dourados, de modo a caracterizar as movimentaes que levaram
criao, implantao e estruturao do curso, os perfis do corpo docente e a estrutura
fsica da Instituio. Utilizamos alm das fontes escritas, entrevistas cedidas pelos
primeiros professores do curso de habilitao e licenciatura em Matemtica, com o objetivo
de compreender o processo de implantao e do desenvolvimento do curso sob o olhar de
cada entrevistado. Nos baseamos na metodologia da Histria Oral, que proporciona, por
meio das entrevistas, a criao intencional de fontes que so fundamentais investigao,
sem desprezar nenhum outro tipo de fonte. A anlise evidenciou trs categorias: espaos e
carncias, corpo docente e organizao curricular, que auxiliaram na compreenso do curso
e apontaram para o movimento migratrio como elemento articulador de polticas e
educao na regio da Grande Dourados.
Palavras-chave: Histria da Educao Matemtica. Histria Oral. Formao de
Professores de Matemtica. Dourados / MS.
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Abstract
In this work we describe the first training course for Mathematicss teachers of the
Dourados city, in order to characterize the changes that led to the creation, implementation
and structuring the course, faculty profiles and the physical structure of the institution. We
use beyond the written sources, interviews granted by the first teachers of the course and
qualification degree in mathematics, with the goal of understanding the process of
implantation and development of the course from the perspective of each respondent. We
are based on the methodology of oral history, which provides, through interviews, the
intentional creation of sources that are critical to the investigation, without neglecting any
other type of source. Thus, through the analysis of categories, we observe the notes of each
interview, as well as the reasons for the creation of courses and faculty. The analysis
revealed three categories: spaces and needs, faculty and curriculum organization, which
helped in understanding the course and pointed to the migratory movement as articulating
element of education and policies in the Grande Dourados region.
Key words: History of Mathematics Education. Oral History. Teachers Training.
Dourados city.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Presidente Ernesto Geisel assina a Lei da diviso de Mato Grosso em Braslia,
em 11 de outubro de 1977 .................................................................................................... 19
Figura 2 - Comemorao no centro de Campo Grande, aps a assinatura da lei que dividiu o
Estado de Mato Grosso uno .................................................................................................. 20
Figura 3 - Mato Grosso Uno ................................................................................................ 21
Figura 4 - Mato Grosso (verde) e Mato Grosso do Sul (amarelo) ........................................ 21
Figura 5 - Localizao dos municpios pertencentes regio da Grande Dourados ............ 32
Figura 6 - Inaugurao do prdio do CPD, em 20 de dezembro de 1971 ......................... 139
Figura 7 - Ligaes de influncia entre os municpios de MS - 1987 ................................ 144
Figura 8 - Deslocamento dos professores das regies marginais para o centro ................. 152
Figura 9 Estados e pases de origem dos migrantes para o estado de MS ....................... 155
Figura 10 - Distribuio dos Centros Pedaggicos no estado de MS ................................. 157
Figura 11 - Localizao geogrfica dos estados de origem dos professores ...................... 158
Figura 12 - Mapeamento dos cursos de Formao de professores de Matemtica nas
dcadas de 1970 e 1980. ..................................................................................................... 165
Figura 13 - Migrao interna no Brasil 1940/1950 ............................................................ 181
Figura 14 - Migrao interna no Brasil 1950/1960 ............................................................ 181
Figura 15 - Migrao interna no Brasil 1970/1980 ............................................................ 182
Figura 16 - Principais Fluxos de Migrao Intraestadual em Mato Grosso do Sul 1980/1991
............................................................................................................................................ 183
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Lista de Tabelas
Tabela 1 - Tipo de arranjo familiar no estado de Mato Grosso do Sul 1970/1996 .............. 24
Tabela 2 - Escolaridade dos Chefes de famlia migrantes das microrregies de MS - 1970 /
1996 ...................................................................................................................................... 24
Tabela 3 - Quantidade de professores atuantes na cidade de Dourados em 1966 ............... 27
Tabela 4 - Quantidade de professores atuantes na cidade de Ponta Por e Ftima do Sul em
1966 ...................................................................................................................................... 28
Tabela 5 - Quantidade de professore atuantes em algumas cidades da regio da Grande
(Itapor, Caarap, Rio Brilhante, Navira e Maracaj) Dourados em 1966 ........................ 28
Tabela 6 - Cursos de Licenciatura de Curta 1 Grau/ 1978 ............................................... 29
Tabela 7 - Professores que se dispuseram a realizar a entrevista ......................................... 50
Tabela 8 - Professores em exerccio na regio da Grande Dourados - 1971 ...................... 140
Tabela 9 - Populao e Taxa de Crescimento Demogrfico por Regio de Mato Grosso do
Sul 1970/1990 ..................................................................................................................... 156
Tabela 10 - Primeira grade curricular do curso de Cincias com Habilitao em Matemtica
............................................................................................................................................ 166
Tabela 11- Primeira grade curricular do curso de Licenciatura em Matemtica ................ 172
Tabela 12 - Lista das Disciplinas Optativas ....................................................................... 173
Tabela 13 A Primeira grade com disciplinas semestrais ................................................. 175
Tabela 14 - Grade Curricular utilizada a parti de 1993 ...................................................... 177
Tabela 15 - Evoluo do nmero de migrantes no Brasil 1940/1980 ................................ 180
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Lista de Grficos:
Grfico 1 - Pirmide da faixa etria da populao migrante no estado de Mato Grosso do
Sul 70/80, 81/91 e 91/96.......................................................................................................23
Grfico 2 - Populao de Grande Dourados.....................................................................141
Grfico 3 - Extenso Territorial da Grande Dourados......................................................141
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Sumrio
INTRODUO .................................................................................................................... 12
CAPTULO 1 - O NASCIMENTO DE UM NOVO ESTADO E DESENVOLVIMENTO
DE UMA ANTIGA CIDADE .............................................................................................. 18
1.1 Mato Grosso do Sul: em um novo caminho para o desenvolvimento ............................ 18
1.2 Focando... ....................................................................................................................... 22
CAPTULO 2 FUNDAMENTAO TERICO METODOLGICA:
ARTICULANDO LEITURAS, DELINEANDO UMA PERSPECTIVA ........................... 36
2.1 Histria, Histria da Educao Matemtica e Formao de Professores ....................... 36
2.1 Faces da Histria Oral como ferramenta para a Historiografia ...................................... 41
2.3 Histria Oral como metodologia de pesquisa ................................................................. 45
CAPTULO 3 - ENTRE-VISTAS: OLHARES E OPINIES .......................................... 53
3.1 Luiz Gonzaga Manzine ................................................................................................... 53
3.2 Abramo Loro Neto ......................................................................................................... 58
3.3 Edmir Ribeiro Terra........................................................................................................ 64
3.4 Odival Faccenda ............................................................................................................. 68
3.5 Ana Maria Sampaio Domingues..................................................................................... 77
3.6 Luiz Gonzaga Manzine e Odival Faccenda .................................................................... 83
3.7 Sidnei Azevedo de Souza ............................................................................................. 115
3.8 Luiz Antonio da Silva ................................................................................................... 120
3.9 Waldir Brasil do Nascimento Junior ............................................................................ 131
4. FORMAO DE PROFESSORES DE MATEMTICA EM DOURADOS: UM
PRIMEIRO OLHAR SOBRE A UFMS ............................................................................. 135
4.1 Espaos e Carncias: a urgncia na estruturao do primeiro curso de formao de
professores de matemtica em Dourados ........................................................................... 136
4.2 Corpo Docente: caractersticas, atuao e movimentos ............................................... 153
4.3 Orientaes para uma organizao curricular .............................................................. 163
5. A MIGRAO COMO EIXO CONDUTOR: O NASCIMENTO DE UM CURSO DE
MATEMTICA ................................................................................................................. 180
5. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ........................................................................... 187
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APNDICE ........................................................................................................................ 192
A - Roteiro da entrevista ..................................................................................................... 192
B - Unidades de Significado .............................................................................................. 194
C - Carta de Cesso ........................................................................................................... 201
D - Transcrio da entrevista .............................................................................................. 210
ANEXO .............................................................................................................................. 223
A - Relatrio Organizado pela UEMT. .............................................................................. 223
B Resoluo 074/85 - COEPE ........................................................................................ 234
C A primeira Grade Curricular do Curso de Licenciatura em Matemtica da UFMS
Campo Grande 1981 ........................................................................................................... 235
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12
INTRODUO
Durante a graduao em Licenciatura Plena em Matemtica pela Universidade
Estadual de Mato Grosso do Sul em Dourados, pude desenvolver e apresentar o trabalho de
concluso de curso TCC que envolvia Clculo, Geometria e Biologia, intitulada A
geometria das abelhas que foi defendida em novembro de 2010.
Resolvi fazer a seleo do mestrado em Educao Matemtica pela Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul e, na temtica do TCC, propus uma carta de intenes. Ao
ser aprovada, a professora Luzia Aparecida de Souza sugeriu-me o desenvolvimento de um
trabalho historiogrfico para compreender o processo de criao, implantao e
desenvolvimento do curso formador de professores de Matemtica de Dourados por meio
da metodologia da Histria Oral. Aceitei a proposta devido ao meu interesse pelo tema
sugerido, em buscar compreender o processo de formao de professores de minha cidade
natal, utilizando a metodologia da Histria Oral e suas potencialidades.
A pesquisa est vinculada ao Grupo Histria da Educao Matemtica em
Pesquisa- HEMEP- e visa contribuir para um mapeamento que, nos ltimos dez anos no
GHOEM Grupo de Histria Oral e Educao Matemtica, objetiva compreender os
movimentos de implantao e efetivao de cursos formadores de professores que ensinam
Matemtica no pas. O Grupo HEMEP coordenado pela professora doutora Luzia
Aparecida de Souza e apresenta uma parceria com o GHOEM no projeto de mapeamento
no Mato Grosso do Sul em projeto aprovado pelo CNPq- Conselho Nacional de Pesquisa.
Esta nossa pesquisa insere-se, assim, no campo da Histria da Educao
Matemtica brasileira, sendo que, neste trabalho, estaremos nos referindo constituio do
curso de formao de professores de Matemtica de Dourados - Mato Grosso do Sul, a
partir de 1980. O objetivo principal deste trabalho compreender o processo de criao e
desenvolvimento do primeiro curso de formao de professores de Matemtica de
Dourados, por meio de documentos escritos e do registro dos depoimentos das pessoas que
se envolveram neste processo.
Em meados da dcada de 1960, a cidade de Dourados passou por grandes
mudanas como, por exemplo, o aumento da populao, o crescimento econmico e a
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13
preocupao com o desenvolvimento educacional da regio. Com o passar do tempo,
aumentou a procura por escolas para as crianas e, com isso, a necessidade de criar novas
escolas. Essa, entretanto, no era uma necessidade simples de se suprir devido falta de
professores, em distintos nveis, na regio.
Com a criao de novas escolas para as crianas, e a escassez de professores para
lecionar nas distintas disciplinas da grade curricular do ensino bsico, o governo resolveu
qualificar1 novos professores. Criaram os centros pedaggicos, inicialmente com os cursos
de Letras e Estudos Sociais, posteriormente, outros cursos foram implantados como
Cincias com Habilitao em Matemtica e Licenciatura em Histria, Geografia,
Matemtica e entre outros, mas a responsabilidade de formar esses futuros professores, de
quem seria?
Neste sentido, buscamos compreender os perfis desses docentes que foram
responsveis pela criao, implantao e desenvolvimento do curso de Matemtica em
Dourados/MS, bem como a estrutura fsica da instituio, a procura pelo curso, grade
curricular e objetivo de sua criao. Assim, foi possvel construir um cenrio em que o
curso de Matemtica estava inserido, apontando indicativos a partir das fontes orais e
escritas, fundamentadas na metodologia da Histria Oral.
No decorrer da pesquisa, desenvolvemos um trabalho na disciplina do mestrado,
Fundamentos Histricos e Epistemolgicos da Matemtica, onde realizamos um breve
estudo sobre o EBRAPEM2, na tentativa de buscar trabalhos que discutissem sobre a
histria da formao de professores. Neste notamos que o Grupo Histria Oral e Educao
Matemtica GHOEM se destacou com suas publicaes no perodo de 2007 a 2011. Vale
salientar que o GHOEM utiliza a metodologia da Histria Oral no desenvolvimento de
projetos ligados ao mapeamento da formao de professores que ensinam Matemtica pelo
Brasil, mas este no seu nico projeto.
Dentro desta perspectiva de realizar o mapeamento da formao de professores de
Matemtica no Brasil, em uma rpida busca pelo significado da palavra mapear no
1 Promover uma formao em nvel superior em reas distintas, em particular, discutiremos a formao de
professores em Matemtica. 2 Encontro Brasileiro de Estudantes de Ps-Graduao em Educao Matemtica. Um evento realizado
anualmente em diferentes instituies pelo Brasil, desde 1997.
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14
dicionrio Michaelis3, temos que mapear distribuir sobre uma superfcie plana os
contornos geogrficos de determinada regio. Dentro do campo da historiografia da
Educao Matemtica, segundo Garnica (2010), realizar um mapeamento da formao de
professores, significa buscar formas para compreender esse processo, afirmando que a ideia
de realizar um mapeamento da formao de professores nos remete a criar um cenrio
plausvel. Desta forma, iremos mapear a formao de professores de Dourados para
compreendermos o processo de criao, implantao e efetivao do primeiro curso de
formao de professores de Matemtica oferecida pela UFMS do campus de Dourados.
Nesse sentido, Garnica (2010) julga que o mapeamento possui uma composio rica de
pluralidades, ao qual podemos analisar por meio das narrativas produzidas a partir dos
depoimentos dos (ex) professores, indcios que podem nos ajudar a compreender as
infinitas e profundas entrelinhas dos registros escolares. Contudo, este projeto de
mapeamento complexo e pensado a longo prazo, no havendo uma perspectiva de
encerramento.
Desta forma, estudamos algumas pesquisas j concludas e que realizaram o
mapeamento da formao de professores de Matemtica no Brasil, valendo-se da
metodologia da Histria Oral. Nos aproximamos, nesse sentido, de uma dissertao e trs
teses: Cury4 (2007), Cury (2011)
5, Martins-Salandim
6 (2012) e Fernandes (2011)
7,
respectivamente.
Cury (2007) desenvolveu sua dissertao, intitulada Uma Narrativa sobre a
Formao de Professores de Matemtica em Gois, com o objetivo de contar, por meio de
uma anlise narrativa, uma histria sobre o processo de institucionalizao dos cursos de
nvel superior que formavam professores de Matemtica no estado de Gois. Para
3 Fonte: http://.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=mapear
4 Cury, F.G. Uma Narrativa sobre a Formao de Professores de Matemtica em Gois. Disponvel em:
http://www.ghoem.com/textos/h/dissertacao_cury.pdf. Acessado em: 19 maio de 2012. 5Cury, F.G. Uma Histria de Formao de Professores de Matemtica e das Instituies Formadoras do
Estado do Tocantins. Disponvel em:. http://www.ghoem.com/textos/h/dissertacao_cury.pdf. Acessado em: 17
julho de 2012. 6 Martins-Salandim. M.E. A Interiorizao dos Cursos de Matemtica no Estado de So Paulo: Um Exame da
Dcada de 1960. Disponvel em: http://www.ghoem.com/textos/h/tese_martins_salandim.pdf. Acessado em: 9
de julho de 2012. 7 Fernandes, D.N. Sobre a Formao do Professor de Matemtica no Maranho: Cartas para uma Cartografia
Possvel.Disponvel em: http://www.ghoem.com/textos/h/tese_dea_fernandes.pdf Acessado em: 9 de julho de
2012.
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15
compreender esse processo, usou documentos escritos e, principalmente, depoimentos de
(ex) professores e (ex) alunos que estavam, de uma forma ou outra, ligados ao
desenvolvimento dos cursos. Cury buscou por informaes sobre o processo inicial de
formao dos professores de Matemtica, o perfil docente e discente, as principais
motivaes que geraram a criao do curso, a procura pelo curso e as movimentaes
polticas. Tentando caracterizar um cenrio em que o curso estava inserido, Cury valeu-se
da histria oral enquanto metodologia de pesquisa.
Cury 8 (2011), em sua tese intitulada Uma Histria da formao de professores de
Matemtica e das instituies formadoras do estado de Tocantins, busca esboar e analisar
os primeiros cursos de formao de professores de Matemtica no estado de Tocantins, por
meio de documentos escritos e depoimentos das pessoas que participaram da implantao e
do desenvolvimento dos cursos. Cury levantou informaes acerca do perfil dos discentes e
docentes dos primeiros cursos, da estrutura fsica das instituies de ensino, das questes
polticas que permeavam a regio em meados da dcada de 1980 e tentou identificar
quando surgiram as primeiras discusses sobre a criao dos cursos de formao de
professores de Matemtica e com que objetivos foram criados e implantados no estado de
Tocantins.
Martins-Salandim (2012), em sua tese A Interiorizao dos Cursos de
Matemtica no Estado de So Paulo: Um Exame da Dcada de 1960, buscou analisar o
processo de movimentao para a criao, implantao e desenvolvimento das instituies
que ofereciam os cursos de formao de professores de Matemtica nas cidades interioranas
de So Paulo na dcada de 1960. Para desenvolver a pesquisa, apoiou-se em fontes orais e
escritas. Neste sentido, a autora achou conveniente utilizar como metodologia de pesquisa,
a Histria Oral que lhe permite utilizar as narrativas produzidas a partir das entrevistas, que
foram realizadas com as pessoas que participaram direta ou indiretamente do processo de
movimentao de implantao dos cursos. As anlises dos dados foram realizadas em duas
etapas, por meio das singularidades e da convergncia dos dados que revelaram um
processo de movimentao e de expanso dos cursos de Matemtica pelo interior do estado
de So Paulo complexo e, em seus termos, multifacetado.
8 Fernando Guedes Cury desenvolveu sua tese pela UNESP de Rio Claro disponvel em: www.ghoem.com
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16
Fernandes (2011), por sua vez, buscou em sua tese Sobre a Formao do
Professor de Matemtica no Maranho: Cartas para uma Cartografia Possvel,
implementar uma forma diferenciada, estruturando as discusses em cartas. Sua pesquisa
buscou registrar os acontecimentos histricos que proporcionaram o desenvolvimento do
processo de formao de professores de Matemtica no estado do Maranho, por meio de
uma encenao de dilogos, sendo exposto por trocas de cartas com um personagem
fictcio. Baseou-se tanto em fontes orais quanto escritas, baseada na metodologia da
Histria Oral que permitiu compreender o cenrio em que os cursos de formao de
professores de Matemtica do Maranho estavam inseridos.
Desta forma, a parceria9 tem sido muito produtiva, tanto pela possibilidade de
participao em eventos especficos, quanto pela troca de experincias. Acredito que a
minha pesquisa ir contribuir com o mapeamento dos cursos de formao de professores de
Matemtica do Brasil, com os estudos desenvolvidos no estado de Mato Grosso do Sul,
focando a regio da Grande Dourados10
.
Estruturamos nossa dissertao em quatro captulos, que apresentaremos a seguir,
visando discutir nossa pesquisa articulando a busca por documentos, reviso de literatura,
metodologia utilizada e as anlises sobre as trs temticas que surgiram a partir dos
depoimentos.
No primeiro captulo realizamos um breve estudo histrico da criao do estado de
Mato Grosso do Sul e levantamos algumas informaes sobre o que estava acontecendo na
regio da Grande Dourados em meados da dcada de 1980 de modo a retratar as questes
polticas, econmicas e educacionais daquela populao. Buscamos articular as poucas
informaes que tivemos sobre o processo de criao da Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul e sobre o surgimento da Universidade Federal da Grande Dourados, sendo
esta instituio responsvel pelo atual curso de Matemtica cuja implantao iremos
pesquisar.
9 Me refiro a participao nos grupos de pesquisas e, principalmente, ao curso de ps-graduao em
Educao Matemtica da UFMS. 10
Essa regio compreende os municpios de Dourados, Itapor, Maracaju, Rio Brilhante, Nova Alvorada do
Sul, Douradina, Deodpolis, Glria de Dourados, Ftima do Sul, Vicentina, Caarap, Juti, Jate, Antnio
Joo, Ponta Por, Aral Moreira, Laguna Carap, Amambai, Coronel Sapucaia, Paranhos, Sete Quedas,
Tacuru, Japor, Mundo Novo, Eldorado, Iguatemi, Itaquira, Navira, Ivinhema, Novo Horizonte do Sul,
Taquarussu, Baitapor, Anaurilndia, Bela Vista, Bataguassu, Nova Andradina e Anglica.
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17
No segundo captulo apresentamos algumas reflexes tericas e metodolgicas
que fundamentaram o desenvolvimento de nossa pesquisa. Neste momento, alm de
delinear alguns pressupostos historiogrficos, buscamos justificar nossa escolha pela
metodologia da Histria Oral e apresentar seus procedimentos para a produo intencional
de fontes.
O terceiro captulo apresenta as entrevistas j estruturadas como textualizao.
Trata-se de nove narrativas de professores da instituio envolvida. Estas foram elaboradas
a partir das transcries das entrevistas (apresentadas em anexo)11
e, apesar de j se
constiturem como um documento distinto daquelas, colocam pesquisador e entrevistado
sob as vistas dos leitores desta pesquisa.
No quarto captulo realizamos uma anlise da temtica dessa investigao luz
dos documentos12
mobilizados. Para estruturar essa anlise, nos colocamos em um
exerccio de estudo de cada narrativa para identificar frases, pargrafos ou ideias
significativas ao nosso objetivo. A partir desse movimento, foram indicadas possibilidades
de categorias temticas a partir das quais o curso, aqui em estudo, narrado por esses
professores. Desse modo, pretendemos compreender os processos de criao, implantao e
desenvolvimento do curso de formao de professores de Matemtica em Dourados.
Finalizamos a dissertao com algumas consideraes sobre possveis
articulaes das categorias apresentadas anteriormente. Trata-se de um olhar mais
especfico para o movimento migratrio que marca as narrativas sobre a constituio de um
curso de formao de professores de Matemtica de Dourados.
.
11
Esto disponveis em apndice as cartas de cesso, assinadas pelos entrevistados, que autorizam a
mobilizao dos documentos produzidos nessa pesquisa por outros pesquisadores. 12
Estes documentos so oriundos do Centro de Documentao Regional (UFGD), Biblioteca Pblica
Municipal Anna Luiza Prado Bastos (Horto Floresta de Campo Grande), Arquivo Histrico de Campo Grande
(ARCA), Arquivo da pr-reitoria da UFMS de Campo Grande, Arquivo institucional da UFGD e as
textualizaes produzidas a partir das situaes de entrevistas.
-
18
CAPTULO 1 - O NASCIMENTO DE UM NOVO ESTADO E
DESENVOLVIMENTO DE UMA ANTIGA CIDADE
O estado de Mato Grosso uno13
era composto por uma populao migrante advinda
de muitas regies do pas. Por questes polticas e sem a movimentao popular, houve o
desmembramento do estado, dando origem ao estado de Mato Grosso do Sul.
1.1 Mato Grosso do Sul: em um novo caminho para o desenvolvimento
Na dcada de 1970, o estado de Mato Grosso uno, localizado na regio centro-
oeste do pas, possua aproximadamente 1,6 milho de habitantes distribudos em
1.260.482,87 km 2 de terra. Sua populao era composta por uma grande diversidade
cultural, social e econmica, advinda de vrias regies do Brasil e do exterior14
. Segundo
Bittar (2009), a regio sul de Mato Grosso Uno era, em 1970, mais povoada que o restante
do estado e a responsvel por gerar um pouco mais de 70% da arrecadao de todo o
estado. Desta forma, o norte do estado foi sustentado economicamente por muito tempo
pela regio sul.
Segundo Isaac de Barros15
, o norte de Mato Grosso uno foi povoado
principalmente pela populao da regio norte e nordeste do Brasil, que possua uma
cultura baseada na explorao de riquezas naturais. J o sul do estado, povoado por sulistas,
mineiros, goianos e paulistas, possua uma cultura de explorar e produzir nos solos
produtos para subsistncia. Ambas as regies foram povoadas por diferentes pessoas de
distintas culturas, sendo possvel distingui-las por meio de suas caractersticas. Os
migrantes que se instalaram na regio sul produziam muito mais economicamente, mesmo
assim continuavam sendo desprezados politicamente pela regio norte, contribuiu para que
o nimo divisionista aflorasse com grande intensidade por parte do sul do estado.
Foi por uma iniciativa do governo de Ernesto Geisel, ento presidente do Brasil,
que foi criada uma Lei Complementar propondo a criao de um novo estado, com a
13
Essa notao vem sendo comumente mobilizada para diferenciar o atual estado de Mato Grosso do antigo
(UNO) que englobava, at 1977, o atual estado de Mato Grosso do Sul. 14
Paraguaios, bolivianos, europeus, srio-libaneses e japoneses. 15
Isaac de Barros jornalista e advogado na cidade de Dourados/MS e se v como historiador da regio. Este
concedeu-nos uma entrevista sobre essa histria local no dia 13/12/2012 e esta segue anexo a este trabalho.
-
19
justificativa de que seria uma forma para melhorar as questes geogrficas, polticas,
econmicas e administrativas do Estado uno. Em 11 de outubro de 1977, o presidente
Geisel assinou, em uma grande solenidade, a Lei Complementar n 31 de 11 de outubro de
1977, permitindo a criao do estado de Mato Grosso do Sul por meio do
desmembramento do Estado de Mato Grosso uno.
Figura 1 - Presidente Ernesto Geisel assina a Lei da diviso de Mato Grosso
em Braslia, em 11 de outubro de 1977
FONTE: BITTAR, M. Mato Grosso do Sul a construo de um estado: Regionalismo e divisionismo no sul de
Mato Grosso. Campo Grande: UFMS. V.1, p.373, 2009.a.
interessante ressaltar que o desmembramento do estado no se deu por iniciativa
popular, nem ao menos a populao pode opinar sobre o futuro de seu estado, ficando
surpresos com a aprovao do projeto, pois no houve nenhum tipo de divulgao sobre a
criao do novo estado. A populao foi informada sobre a diviso do estado por meio das
movimentaes na Rua 14 de Julho em Campo Grande, onde reuniram-se as pessoas
ligadas ao governo que eram a favor da separao do estado, a fim de realizar uma grande
passeata em comemorao aprovao do projeto.
-
20
Figura 2 - Comemorao no centro de Campo Grande, aps a assinatura da
lei que dividiu o Estado de Mato Grosso uno
FONTE: BITTAR, M. Mato Grosso do Sul a construo de um estado: Regionalismo e divisionismo no sul de
Mato Grosso. Campo grande: UFMS.V.1, p.374, 2009.a
Com a publicao do decreto de criao do estado de Mato Grosso do Sul em
197716
, os municpios pertencentes ao estado de Mato Grosso uno foram divididos de
acordo com sua localizao. A regio que agora denominamos estado de Mato Grosso ficou
com 38 municpios e aproximadamente 900.000 habitantes distribudos em uma rea total
de 903.357,908 km 2 e o estado de Mato Grosso do Sul com 60 municpios possua
aproximadamente 1.400.000 habitantes distribudos em 357.124,962 km 2 .
16
A lei complementar que possibilitou o desmembramento do estado de Mato Grosso uno foi assinada em 1977, mas somente em 1979 que efetivamente o estado foi desmembrado e as reparties pblicas divididas.
-
21
Figura 3 - Mato Grosso Uno
Figura 4 - Mato Grosso (verde)
e Mato Grosso do Sul (amarelo)
As fotos acima apresentam os estados de Mato Grosso uno na fig. 3 e na fig.4 o
estado aps a diviso. A cidade de Dourados est localizada no estado de Mato Grosso do
Sul, sendo a segunda maior cidade do estado, possui uma grande importncia a regio,
atualmente.
Iremos relatar brevemente algumas questes sociais, polticas e econmicas da
regio da Grande Dourados de modo a estruturar um primeiro cenrio no qual se insere a
instituio em estudo neste trabalho, qual seja a atual UFGD- Universidade Federal da
Grande Dourados. A constituio desse cenrio, segundo pensamos, fornece elementos
tanto para a compreenso da criao de cursos especficos, quanto de sua manuteno ao
longo das ltimas dcadas. O perodo aqui estudado engloba a fase em que a UFGD era
ainda um campus da UFMS- Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
FONTE: http://cleomardiesel.blogspot.com.br/2011_01_01_archive.html
-
22
1.2 Focando...
Na dcada de 1960 houve um crescimento econmico no estado de Mato Grosso
uno, principalmente na regio sul, devido migrao dos sulistas e paulistas para o estado.
Essa populao buscava por melhores condies de sobrevivncia e no possuam, em sua
maioria, nem o ensino primrio. Eram trabalhadores braais que se dedicavam ao cultivo e
a criao de animais durantes vrios anos, proporcionando ao estado o desenvolvimento e
o progresso econmico da regio, tornando-se uma opo de destaque no mercado17
de
terras.
Considerando os estudos realizados pelo Departamento de Geografia e Estatstica
do governo do estado de Mato Grosso em 1978, As migraes internas e o trabalho rural
em Mato Grosso, entre os perodos de 1940 a 1950 aumentaram a populao em 20,7% na
dcada de 1950 e em 74,4% na dcada de 1960. Esses dados apontam um crescimento
populacional considervel no estado de Mato Grosso uno. Com os dados deste documento,
Mato Grosso apud Carli (2008), afirma que a migrao proporcionou ao sul do estado
possibilidade de se desenvolver.
No campo especfico de Mato Grosso, este ritmo de crescimento reflete
tanto o componente a que denominamos aumento natural (vegetativo),
quanto e principalmente a influncia das correntes migratrias, visto Mato
Grosso situar-se muito mais como rea de atrao do que de expulso de
populao. [...] Algumas micro-regies destacam-se pelo crescimento
populacional mais acelerado. Verificou-se as frentes de colonizao
apresentando ndices mais rpidos de crescimento do que as mdias da
micro-regio ou do Estado. [...] Exemplo tpico podem ser identificados
na regio da Grande Dourados. (p.122-123)
Este fluxo migratrio possibilitou um aumento populacional predominantemente
rural, devido faixa de idade, tipo de arranjo familiar18 e o nvel de escolaridade
apontados nas tabelas abaixo. Nota-se claramente que existe uma forte presena da
populao migrante nas reas rurais, sendo ela responsvel pelo desenvolvimento da
agricultura e da pecuria instalada no estado. No grfico 1, mostraremos a faixa etria da
populao migrante, na tabela 1 apresentamos o tipo de arranjo familiar dos migrantes e na
tabela 2, o nvel de escolaridade dessa populao.
17
Destaca-se a procura por terras para a utilizao nos cultivos agrcolas. 18
Nesta categoria nos referimos ao grupo de indivduos migrantes: indivduos, casal sem filhos, casal com
filho, chefes com filhos e outros.
-
23
Grfico 1 - Pirmide da faixa etria da populao migrante no estado de
Mato Grosso do Sul 70/80, 81/91 e 91/96
FONTE: CUNHA, J.M.P. da. A Migrao no Centro-Oeste Brasileiro no Perodo 1970/1996: o esgotamento
de um Processo de Ocupao. Campinas: Ncleo de estudos de ocupao/ UNICAMP. 2002.
-
24
Tabela 1 - Tipo de arranjo familiar no estado de Mato Grosso do Sul 1970/1996
Tipo de arranjo
familiar
Mato Grosso do Sul19
1970/1980 1981/1991 1991/1996
Individual 10,3 10,0 20,1
Casal sem filhos 10,2 11,5 18,6
Casal com filhos 57,7 53,6 30,5
Chefe com filhos 5,5 8,2 5,5
Outros 16,3 16,7 25,3
FONTE: Cunha, J.M.P da. A migrao no Centro Oeste Brasileiro no perodo 1970/96: o Esgotamento de um Processo de Ocupao. Campinas: Ncleo de Estudos de Populao/UNICAMP, 2002.
Tabela 2 - Escolaridade dos Chefes de famlia migrantes das microrregies de MS - 1970 / 1996
Microrregies Sem Instruo Primrio Incompleto Ginsio Incompleto
70/80 81/91 91/96 70/80 81/91 91/96 70/80 81/91 91/96
Baixo Pantanal 21,4 9,7 3,0 13,1 7,7 6,4 28,4 21,8 15,0
Aquidauana 3,8 12,8 14,2 23,5 23,0 14,7 22,5 28,7 29,8
Alto Taquari 26,4 18,1 11,1 26,6 19,6 21,2 31,1 34,4 36,4
Campo Grande 20,9 8,2 5,6 16,4 11,2 11,7 27,9 29,8 27,2
Cassilndia 38,5 14,8 11,2 19,3 19,2 18,4 24,7 34,9 36,2
Paranaba 33,5 18,9 12,1 27,6 21,1 22,5 28,5 38,0 34,5
Trs Lagoas 33,8 16,1 10,4 23,0 23,7 21,0 28,5 34,2 35,7
Nova Andradina 39,9 21,7 13,0 28,2 25,9 20,1 22,3 31,0 36,9
Bodoquena 28,0 15,8 9,6 22,4 17,9 12,3 26,1 32,0 22,5
Dourados 26,2 10,3 9,9 24,4 16,4 17,8 30,7 36,2 29,7
19
O denominador das taxas expressas na tabela so mdias geomtricas da populao do perodo em destaque.
-
25
Iguatemi 39,6 23,6 18,9 31,4 27,7 28,0 21,9 31,1 31,1
Total 29,9 13,7 9,5 24,0 17,7 16,9 26,9 31,9 29,9
(Continuao)
Microrregies 2 Grau Incompleto
2 Grau Completo ou
mais
Alfabetizao
de adultos
Menos
de um
ano
No determinado
70/80 81/91 91/96 70/80 81/91 91/96 70/80 81/91 91/96 70/80 81/91 91/96
Baixo Pantanal 15,6 18,4 17,7 20,8 42,4 56,4 0,8 0,0 0,2 - 0,0 1,3
Aquidauana 7,3 16,4 13,3 12,8 19,2 26,1 0,2 0,0 1,7 - 0,0 0,3
Alto Taquari 6,2 10,9 11,6 9,2 16,8 18,8 0,5 0,2 0,5 - 0,0 0,4
Campo
Grande 11,5 15,2 15,9 22,9 35,3 38,3 0,3 0,3 0,4 - 0,0 0,8
Cassilndia 5,7 14,3 13,0 11,8 16,7 20,5 0,0 0,0 0,1 - 0,0 0,6
Paranaba 3,6 11,3 12,7 6,7 9,9 16,9 0,0 0,5 0,9 - 0,2 0,4
Trs Lagoas 5,8 10,6 11,9 8,0 14,6 19,5 1,0 0,7 0,7 - 0,0 0,8
Nova
Andradina 3,2 6,2 11,4 6,1 14,4 16,5 0,3 0,8 1,5 - 0,0 0,5
Bodoquena 10,1 13,1 13,5 13,4 20,9 41,9 0,0 0,4 0,1 - 0,0 0,1
Dourados 7,5 11,3 13,5 10,9 25,6 28,0 0,3 0,1 0,5 - 0,1 0,5
Iguatemi 2,8 7,7 10,0 3,5 9,4 10,6 0,7 0,5 0,8 - 0,0 0,6
Total 7,1 12,3 13,8 11,6 24,0 28,7 0,5 0,3 0,6 - 0,0 0,7
FONTE: Cunha, J.M.P da. A migrao no Centro Oeste Brasileiro no perodo 1970/96: o Esgotamento de um Processo de Ocupao. Campinas: Ncleo de Estudos de Populao/UNICAMP, 2002.
-
26
A partir dos grficos, possvel observar que a faixa etria da populao migrante no
perodo de 1970/1980 predominantemente composta por jovens adultos20 e crianas, sendo
essas caractersticas de migrantes que possuem famlia (esposa e filhos/casal com filhos).
Em anlise realizada por Cunha (2002) no que tange ao perfil socioeconmico, no caso
das reas de fronteiras (MT/MS foco da pesquisa), os imigrantes apresentaram baixos nveis de
escolaridade (ver tabela 2) e renda, e sua insero produtiva, de maneira geral, dava-se via
agricultura. Na dcada de 1980, o nvel de escolaridade da populao de Mato Grosso do Sul
sofre uma considervel mudana, em relao dcada anterior. A taxa de sem instruo
diminui e, consequentemente, aumenta o nvel de escolaridade da populao. Em Dourados, por
exemplo, a taxa de estudantes com o 2 Grau completo ou nvel superior passa de 10,9 para 25,6.
Nesses perodos, de 1940/1970, a regio de MT/MS recebeu uma grande quantidade de
migrantes devido aos incentivos do governo ao criar projetos que viabilizassem o povoamento e a
ocupao das terras frteis / produtivas do estado. O estado de Mato Grosso do Sul foi uma das
regies, segundo Cunha (2002), amplamente beneficiada pela marcha modernizadora do oeste,
que provocou um intenso direcionamento dos fluxos migratrios para as reas mais promissoras.
Reduzindo o fluxo de migrantes em 1980 devido reduo dos projetos/recursos destinados ao
povoamento do estado.
Segundo Carli (2008) constata-se com isso que as terras desenvolvidas pelos
governantes federais, estaduais e municipais, serviram de iscas para atrarem esses migrantes,
gerando um aumento populacional com pessoas dispostas a trabalhar persistentemente em
atividades que exigem esforo fsico. Em meados de 1980, surgiu uma maior procura por
educao, entretanto, a falta de mo de obra qualificada na regio era muito grande, pois os
migrantes que chegavam regio sul eram agricultores que no possuam nenhum tipo de
instruo. Eram famlias humildes que tiravam o sustento nas plantaes e na criao de animais.
Podemos observar que o governo do estado buscou solucionar alguns problemas das
necessidades bsicas que a regio estava enfrentando. Por meio do relatrio produzido pela
Secretaria de Educao e Cultura da Universidade Estadual de Mato Grosso de 1966, sabe-se
que:
(...) a partir de 1966, o governo do Estado de Mato Grosso, deu incio a um
processo de reestruturao e de criao de novas entidades administrativas que
viessem atender as exigncias e a solicitaes de uma sociedade em perodo de
transio, de mudana de sua estrutura scio-econmica. (...) consciente do
20
Com idade mxima de 40 anos.
-
27
extraordinrio desenvolvimentista, criou a Universidade Estadual de Mato
Grosso, objetivando atender as reais necessidades e as exigncias de nosso
desenvolvimento scio econmico. Assim, atravs da Lei n 2.972, de 02 de janeiro de 1970, que dispe sobre a reestruturao e as diretrizes do Ensino
Superior do Estado de Mato Grosso, dentre os vrios centros integrantes da
UEMT, foi criado o Centro Pedaggico de Dourados (...) ( p.1-2)
Para a escolha dos cursos a serem implantados no centro pedaggico foi realizada uma
pesquisa a fim de buscar quantos e quais eram os profissionais, na poca, que a cidade
necessitava.
Mediante a necessidade apontada para a contratao de professores, foi feita uma
pesquisa quantitativa para saber quantos professores estavam atuando na cidade de Dourados e
nas regies prximas. Observe abaixo as tabelas21
referentes pesquisa realizada em meados de
1966:
Tabela 3 - Quantidade de professores atuantes na cidade de Dourados22
em 1966
Disciplinas Licenciatura
curta
Licenciatura
Especfica CADES
Curso
Superior23
Sem
nenhuma
formao
Total
Cincias 1 1 1 1 2 6
Matemtica 2 1 - 3 6 12
Desenho 2 - 1 1 2 6
Fsica - - 1 1 1 3
Qumica - 1 1 - - 2
Biologia - 1 - - - 1
Total 5 4 4 6 11 30
FONTE: CDR - Centro de Documentao Regional de Dourados / UFGD.
Observa-se que os professores, atuantes em escolas de primeiro e segundo graus de
Dourados, destacavam-se, em sua maioria, por terem um curso superior desvinculado do
magistrio (exemplo, advogados que davam aulas de Matemtica) ou por atuar na educao sem
21
Tabela retirada do Relatrio produzido pela Universidade Estadual de Mato Grosso 1966, encontrado no Centro de
Documentao Regional- Dourados/MS. 22
Zona Rural e Urbana. 23
Formao em nvel superior em distintas reas do conhecimento, exceto na licenciatura.
-
28
formao alguma para tanto. A quantidade de professores formados em Matemtica equivale a
um quarto da totalidade de professores do municpio nessa rea.
Observando, ainda, a rea de Matemtica, percebe-se o quanto o nmero de professores
atuantes e sem formao expressivo na regio da Grande Dourados. As tabelas a seguir
evidenciam esses nmeros, bem como a presena da CADES - Campanha para o
Aperfeioamento e Difuso do Ensino Secundrio (instituda pelo decreto 34.638 de 14/11/1953)
na formao Matemtica dos professores atuantes na regio. A CADES objetivava elevar o nvel
do ensino secundrio, dedicando-se, numa poca em que haviam poucas faculdades, a ofertar
cursos de um ms de durao a professores leigos.
Tabela 4 - Quantidade de professores atuantes na cidade de Ponta Por e Ftima do Sul em
1966
Disciplinas Licenciatura
curta
Licenciatura
especfica CADES
Curso
superior
Sem
nenhuma
formao
Total
Cincias 1 2 7 4 29 43
Matemtica - 2 2 7 34 45
Desenho 2 - 2 4 14 22
Fsica - - 1 1 3 5
Qumica - 1 1 2 2 6
Biologia - 1 - - - 1
Total 3 6 13 18 82 122
FONTE: CDR - Centro de Documentao Regional de Dourados / UFGD.
Tabela 5 - Quantidade de professores atuantes em algumas cidades da regio da Grande
(Itapor, Caarap, Rio Brilhante, Navira e Maracaj) Dourados em 1966
Disciplinas Licenciatura
curta
Licenciatura
especfica CADES
Curso
superior
Sem
nenhuma
formao
Total
Cincias - - 3 - 7 10
Matemtica - - 1 2 12 15
Desenho - - - - 5 5
Fsica - - - - 1 1
Qumica - - - - - -
Biologia - - - - - -
-
29
Total - - 4 2 25 31
FONTE: CDR - Centro de Documentao Regional de Dourados / UFGD.
Considerando os indicativos de demanda, inicialmente, em 1970, foi criado o Centro
Pedaggico de Dourados, em seguida, incorporado a Universidade Estadual de Mato Grosso.
Neste Centro foi implantado o curso de Licenciatura curta em Letras e o de Estudos Sociais para
capacitar alguns professores da regio da Grande Dourados. Com o passar do tempo, foram
implantados os cursos de Licenciatura curta em Cincias (1975), Agronomia (1978) e Pedagogia
(1979) na ento Universidade Estadual de Mato Grosso (UEMT24
).
Com a indicao do CFE, proposta pelo conselheiro Newton Sucupira, foi criada a
Licenciatura Curta no Brasil em meados de 1964. Surgiu em meio a grande escassez de
profissionais da educao, com carter experimental e como soluo emergencial. Com a Lei n
5692/71, os cursos de formao de professores em superior sofreram algumas alteraes,
reforaram a ideia de formar professores polivalentes, ou seja, segundo Ferreira (1983), as
licenciaturas curtas, com durao de trs anos deveriam cobrir todos os campos de
conhecimento gerais no ciclo ginasial. Formariam um tipo de professor polivalente capaz de
desdobrar-se para lecionar vrias disciplinas.
O curso de Licenciatura Curta foi proposto para ser desenvolvido por um curto tempo e,
somente, para as regies interioranas do Brasil, mas no foi o que realmente aconteceu, esse
curso foi implantado em vrias universidades por todo o pas e permaneceu durante muito tempo.
Tabela 6 - Cursos de Licenciatura de Curta 1 Grau/ 1978
Regio Modalidade Federal Estadual Municipal Particular Total
Norte
Cincias 3 - - - 3
Estudos
Sociais 2 - - - 2
Letras 2 - - - 2
Nordeste
Cincias 4 2 6 7 19
Estudos
Sociais 1 3 6 6 16
Letras - 3 4 3 10
Centro-Oeste Cincias 1 1 1 2 5
Estudos - - 1 2 3
24
A Universidade Estadual de Mato Grosso deixou de existir aps o desmembramento do estado de Mato Grosso
Uno em 1979, tornando-se ao sul do estado UFMS e ao norte UFMT.
-
30
Sociais
Letras - - - 1 1
Sudeste
Cincias 3 5 9 56 73
Estudos
Sociais 1 3 5 55 64
Letras 1 3 1 24 29
Sul
Cincias - 4 6 13 23
Estudos
Sociais 1 3 5 15 24
Letras 1 2 1 19 14
Total de
Cincias
123 instituies
Total de
Estudos Sociais 109 instituies
Total de Letras 56 instituies
TOTAL 288
FONTE: FERREIRA. E.F. Licenciatura de Curta Durao: Soluo Emergencial ou Definitiva? Disponvel em:
http://www2.uefs.br/sitientibus/pdf/3/lincenciatura_de_curta_duracao.pdf. Acessado em: 09/12/2013.
Observando a tabela acima, possvel notar que existiam no pas 288 cursos de
Licenciatura Curta em trs reas: Cincias, Estudos Sociais e Letras. Sendo que, 58 instituies
estavam localizadas nas capitais, e as 235 restantes estavam localizados nos municpios do
interior do pas. Segundo Ferreira (1983) dentre as instituies em pleno desenvolvimento no
pas, 67% so mantidos por instituies particulares, o que demonstra que o setor privado foi
chamado a participar da soluo da crise universitria, absorvendo os excedentes das instituies
oficiais ao baixo investimento para implementao de cursos na rea de educao.(p.162)
Na tentativa de esclarecer a diferena entre a Licenciatura Curta da Plena, foi publicado
no parecer n 895/71, do extinto CFE esclarecendo que a Licenciatura Curta possua uma carga
horria entre 1200 a 1500 horas e a Licenciatura Plena em torno de 2200 a 2500 horas. Sendo
definitivamente extinta pela Lei de Diretrizes e Bases da Educao (LDB) de 1996, passando a
ser somente desenvolvida como Licenciatura Plena.
As mudanas ocorreram em todos os cursos do Brasil, no sendo diferente nos cursos da
UEMT de Dourados. Alm dessas mudanas, em 1979, o estado deixou de ser territrio de Mato
Grosso, tornando-se Mato Grosso do Sul. Assim, a partir de 1979, atravs da Lei Federal
n6.674, a Universidade Estadual de Mato Grosso localizadas na regio sul do estado passou a
ser denominada Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. De tal modo que, as instituies
-
31
presentes na regio norte do estado de Mato Grosso uno foram federalizadas por meio da Lei
Federal n6.674 de 5 de junho de 1979, tornando-se a atual Universidade Federal de Mato
Grosso- UFMT.
Com o decorrer dos anos, foram implantados outros cursos como: Licenciatura e
Bacharelado em Geografia (1983), Habilitao em Matemtica no curso de Cincias (1984),
Bacharelado em Cincias Contbeis (1986), Licenciatura Plena em Matemtica (1987), Cincias
Biolgicas (1991), Mestrado em Agronomia (1994), Anlise de Sistemas (1996), Mestrado em
Histria (1999), Medicina (2000), Administrao (2000), Direito (2000), Mestrado em
Entomologia (2002), Mestrado em Geografia (2002) e doutorado em Agronomia (2003).
Para a escolha destes novos cursos, a Comisso Permanente de Vestibular -COPEVE da
UFMS da Grande Dourados realizou uma pesquisa em conjunto com as escolas de Ensino Mdio
da Grande Dourados, antes da mudana para UFGD. No ano de 2005, atravs da Lei Federal n
11.153 a UFMS - Campus de Dourados passou a ser denominada Universidade Federal da
Grande Dourados- UFGD. Os demais campi25
da UFMS, permaneceram com a mesma
administrao. Os cursos que estavam implantados na antiga instituio de Dourados
permaneceram, e houve a implantao de vrios outros cursos26
. Dispuseram 26 novos cursos a
serem implantados no decorrer de cinco anos, segundo o Projeto de Criao e Implantao da
UFGD (2004)27
. Observem no mapa os municpios que pertencem regio da Grande Dourados:
25
Os demais campi so das cidades de Corumb, Trs Lagoas e Campo Grande, que atualmente pertencem UFMS. 26
Engenharia de Alimentos, Odontologia, Psicologia, Recursos Florestais e Engenharia. Florestal, Zootecnia,
Cincias Sociais, Educao Fsica, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Servio Social, Educao Artstica, Engenharia
Cartogrfica, Farmcia, Nutrio, Veterinria, Arquitetura e Urbanismo, Comunicao Social, Jornalismo, Marketing
e Propaganda, Engenharia Sanitria, Eng. de Computadores, Engenharia Civil, Engenharia Eltrica, Engenharia
Mecnica, Engenharia, Eletrnica, Comrcio Exterior e Fsica. 27
Brasil. Projeto de Criao e Implantao. Disponvel em: http://www.ufgd.edu.br/sobre/projeto-criacao-ufgd.pdf.
Acesso em: 19 de dezembro de 2012.
-
32
Figura 5 - Localizao dos municpios pertencentes regio da Grande Dourados
FONTE: Projeto de criao da UFGD.
Notamos no mapa da pgina anterior que, a regio da Grande Dourados composta por
uma grande quantidade de cidades e uma vasta rea territorial localizada no extremo sul do
estado de Mato Grosso do Sul. Dentre as 37 cidades pertencentes regio da Grande Dourados, o
municpio de Dourados se destaca pela grande importncia econmica, poltica e educacional
-
33
para as cidades circunvizinhas, sendo denominado como uma cidade polo. Nesse cenrio, nos
dedicaremos compreenso acerca da implantao e expanso da Licenciatura em Matemtica
que ocorria em uma Dourados distinta da atual.
Segundo Isaac de Barros28
, na dcada de 1980 a cidade de Dourados era pacata e
buclica. Era uma tpica cidade do interior, tranquila, onde todos se conheciam. Tinha uma
pequena populao de aproximadamente 106 mil29
habitantes.
interessante observar que o crescimento populacional de Dourados , tambm,
decorrncia de uma populao migrante advinda principalmente da regio sul do Brasil. Os
migrantes tinham como objetivo buscar novas terras para a prtica da agricultura, pois, em sua
maioria, eram produtores rurais que trouxeram suas famlias para se instalarem na regio sul do
estado de Mato Grosso. Segundo Moro (2006), Em decorrncia dessa migrao populacional de
trabalhadores houve um acrscimo da mo de obra rural e urbana que possibilitou, em parte, um
crescimento significativo da economia, sobretudo nas culturas agrcolas (...) (p.357).
Como evidenciado nas tabelas anterior, nas dcadas de 1970 e nas que a antecederam, a
regio da Grande Dourados necessitava de instituies para proporcionar a formao educacional
em todos os nveis de ensino. Apesar do grande nmero de migrantes que vieram para Dourados
(geralmente em busca de terras, como afirmado anteriormente), a quantidade de mo de obra
qualificada era insuficiente para abastecer as necessidades da regio, pois a populao migrante,
em sua maioria, era rural.
Com o aumento da populao na regio de Grande Dourados, aumentou tambm a
procura pela educao bsica. Assim, para suprir as necessidades dessas escolas, o governo
buscou qualificar a populao da regio, criando os Centros Pedaggicos e oferecendo cursos de
formao de professores.
Em meados de 1980, a cidade possua duas Instituies de formao em nvel superior.
A SOCIGRAN30
- Sociedade Civil de Educao da Grande Dourados e a UFMS, composta por
alguns cursos31
que atraam estudantes de municpios prximos a Dourados. As famlias que no
possuam condies financeiras para que os filhos continuassem seus estudos fora do estado,
28
Entrevista realizada no dia 13 de dezembro de 2012, em Dourados. 29
Gressler, L.A., Swensson, L.J. Aspectos Histricos do Povoamento e da Colonizao do Estado de Mato Grosso
do Sul. Estado, 1988. 30
Sendo a atual UNIGRAN (Centro Universitrio da Grande Dourados). 31
Direito, Biologia e Administrao; Licenciatura curta em Letras e Estudos Sociais, Licenciatura curta em Cincias,
Agronomia, Pedagogia, Licenciatura e Bacharelado em Geografia, habilitao em Matemtica no curso de Cincias,
Bacharelado em Cincias contbeis e Licenciatura Plena em Matemtica, respectivamente.
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sentiram-se aliviadas com a instalao das universidades, segundo os depoimentos dos
professores e os breves contextos histricos das instituies apresentados nos respectivos sites.
Assim, puderam proporcionar aos seus filhos a possibilidade de escolher algum curso de
formao em nvel superior oferecido pela UFMS ou pela SOCIGRAN. Em particular, o primeiro
curso de formao de professores em Matemtica na regio da Grande Dourados foi implantado
na UFMS em 1984 como Habilitao em Matemtica no curso de Cincias e, em 1987, como um
curso de Licenciatura Plena em Matemtica tambm na UFMS.
Aps a instalao da universidade, podemos notar e diferenciar, por meio de estudos
histricos32
da poca, a mudana dos objetivos do movimento migratrio no estado. Antes da
instalao das universidades, a populao migrante chegou ao sul do estado procura de terras
frteis, com o intuito de cultivar cereais. Com o aumento da populao do estado, era necessria a
criao de escolas para seus filhos, bem como contratao de profissionais de diversas reas, no
somente a agrcola. Percebe-se, na historiografia local, a Grande Dourados constituir-se-ia plo
de referncia para as cidades vizinhas, especificamente em termos educacionais. Assim, em
meados de 1971, foram criados e construdos os centros pedaggicos localizados na Rua Joo
Rosa Ges na cidade de Dourados, para qualificar os futuros professores. Inicialmente foram
implantados os cursos de licenciatura curta em Letras e Estudos Sociais. Com o passar do tempo,
aumentou o nmero dos cursos oferecidos pela instituio e a quantidade vagas para os docentes.
Na dcada de 1980, o estado de Mato Grosso do Sul possua poucas instituies de nvel
superior. Em relao aos cursos pblicos de Matemtica, inicialmente eram oferecidos nas
cidades de Corumb (a partir de 1976) como Habilitao, em Campo Grande (a partir de 1981)
como Licenciatura, (a partir de 1984) em Dourados como Habilitao e em 1987 como
Licenciatura em Matemtica. Esses cursos, geralmente, eram criados para suprir as necessidades
de sua regio. Assim, os poucos professores que se formavam eram direcionados a suprir as
necessidades das escolas da educao bsica.
Antes da construo das rodovias ( que sucedeu em 1974) que ligam a cidade de
Dourados capital Campo Grande, distantes aproximadamente 230 km, era difcil realizar essa
trajetria com frequncia. Existiam poucos alunos que tinham condies financeiras de morar na
capital para terminar seus estudos no nvel superior. Houve ento, a necessidade de criar novos
cursos para suprir as necessidades bsicas da educao em Dourados. Em meados das dcadas de
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Washington Alves da Silva, Hildebrando Campestrini (2011) e Isaac de Barro (este em sua entrevista concedida
nesta pesquisa) ressaltam mudanas nos objetivos da migrao.
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1980 e 1990 a economia de Dourados cresceu muito, tornando-se um grande produtor de gros,
segundo o projeto de criao da UFGD. Era necessrio acompanhar o desenvolvimento e as
necessidades da regio, ento, foram criados cursos mais especficos da rea, como os de
licenciatura plena. Alm desses cursos de licenciatura, foram criados novos cursos na instituio,
desta forma, houve a necessidade de mo de obra qualificada, sendo necessria a contratao de
novos professores, contratados ou concursados. Assim, os editais eram divulgados nas
instituies e publicados em jornais da poca.
Como a capital do estado oferecia uma melhor infraestrutura e mais opes culturais, os
professores mais qualificados preferiam ficar no campus da capital a ir para o interior do estado.
Ressalta-se, ainda, que a quantidade de professores que se formava era muito aqum das
necessidades da regio da capital.
Neste sentido, o curso de Cincias com Habilitao em Matemtica de Dourados
recebeu professores migrantes de outros estados para compor o corpo docente, pois no existia
outro curso de Matemtica nas cidades mais prximas a Dourados. Em virtude de nossa
inquietao em querer saber quem e de onde vieram esses professores, bem como as influncias
que estes traziam para a implementao e estruturao dos cursos de habilitao e licenciatura em
Matemtica em Dourados, se estruturou esta pesquisa.
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CAPTULO 2 FUNDAMENTAO TERICO METODOLGICA: ARTICULANDO
LEITURAS, DELINEANDO UMA PERSPECTIVA
Nossa pesquisa inscreve-se no campo da Histria da Educao Matemtica e, dentro
deste campo, buscamos caracterizar a implementao e estruturao de propostas formativas de
professores de Matemtica em Dourados, especificamente nos cursos de Habilitao e
Licenciatura da UFMS/UFGD.
Como assinalado anteriormente, esta pesquisa visa contribuir para a compreenso do
movimento de formao de professores que ensinam Matemtica no pas.
Abaixo, busca-se articular leituras realizadas individualmente ou em grupo, nas reunies
semanais do Grupo Histria da Educao Matemtica em Pesquisa HEMEP. Nessa articulao
pretendemos costurar alguns pressupostos tericos (na tentativa de desenvolver um olhar
historiogrfico) com encaminhamentos procedimentais para a realizao dessa pesquisa.
2.1 Histria, Histria da Educao Matemtica e Formao de Professores
comum falar e escutar a palavra Histria, visto que desde a infncia essa palavra faz
parte do nosso cotidiano. O significado desta palavra sempre me pareceu to simples e bvio:
estudar o passado. Nas perspectivas assinaladas por dicionrios de lngua portuguesa esto
presentes os significados: narrar um fato notvel ocorrido, relatar um acontecimento do passado,
estudar as origens e progresso da cincia, fazer uma biografia de uma personalidade ou
simplesmente um livro de histria. Em levantamento feito pela Profa. Luzia Aparecida de Souza
(orientadora dessa pesquisa) em turma de dezessete mestrandos da UFMS em 2012, no foram
diferentes os significados apresentados pelos alunos no primeiro dia de aula. Fatos, evoluo,
origens, passado so constructos presentes em nossas falas como fruto de nossa experincia com
a historiografia. Essa, por sua vez, envolve longos anos de formao no ensino bsico em que so
privilegiados nomes de reis, heris e anti-heris; fatos e datas.
Foi no mestrado, na preparao para estruturao do projeto dessa pesquisa que outros
atores e regies, no centrais, apresentaram-se no somente como participantes da histria (fluxo
de vida), mas como temas fundamentais ao desenvolvimento da historiografia (estudo da
histria).
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Para tanto, foi necessrio ampliar a noo temporal e questionar a perspectiva evolutiva
trazida para o mestrado e, nesse sentido, um autor da dcada de 1920, trouxe relevantes
contribuies. Segundo Marc Bloch (2001), histria (no sentido de historiografia) o estudo dos
homens no tempo, ao que acrescentamos: vivendo em comunidade. tambm este autor que
discute a ideia de que o princpio no justifica a continuidade, no sentido de que arriscado
trabalhar com perspectivas deterministas entre acontecimentos. O passado no foco de estudo,
mas fruto de construo do presente. So as questes atuais, como a que propomos, que
mobilizam estudos, nos permitem reconhecer indcios como fontes e, a partir das perguntas que
conseguimos elaborar, extraem informaes dessas fontes. Desse modo, o passado se apresenta
como algo que se transforma e modifica por meio dos conhecimentos e interesses do nosso
presente.
Antonio Miguel33
relatou durante uma banca de qualificao (FERNANDES,
SALANDIM, GARNICA, 2011) que a histria dentro da Educao Matemtica uma prtica
social interpretativa e problematizadora, e no deveria ser propriamente vista como uma cincia
do passado, mas, como aquela que procuraria estabelecer um dilogo do presente com o passado,
no qual o presente tomaria e conservaria a iniciativa.
Visto que a histria , segundo Albuquerque (2007), formada por vrias foras e
influenciada por inmeras situaes, no coerente se debruar no estudo da origem das coisas,
dos acontecimentos, por ao menos duas razes: sempre existir um acontecimento anterior que
pode ter influncias e a prpria coisa ou acontecimento ser constitudo a partir de questes feitas
no presente (o que leva, por exemplo em (SOUZA, 2011), ao reconhecimento de diferentes
Movimentos sob a nomenclatura Matemtica Moderna). Assim, Albuquerque (2007) afirma que a
prpria origem no nica, mas composta por situaes que se encontram e se cruzam para dar
forma s suas reivindicaes.
Para se compreender o que Histria, Albuquerque (2007) apresenta, em sua obra
Histria: a arte inventar o passado, uma explicao relacionando as caractersticas, singulares
ou no, da vida social com a Histria.
A vida social e a Histria teriam, para Foucault, as mesmas caractersticas que
definem o que seria uma atividade de jogo. A Histria seria movimento, seria
ao criativa, inveno constante de novos lances, mesmo que seus sujeitos
33
Professor e pesquisador, Antonio Miguel participou de uma banca de qualificao de um membro do grupo
GHOEM e, nesta, elaborou e autorizou aos professores Da Nunes Fernandes, Maria Ednia Martins Salandim e
Antonio Vicente Marafioti Garnica a utilizao de um texto de sua autoria que no foi publicado.
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estejam limitados por regras, por normas, tenham que obedecer a regulamentos.
A Histria possvel porque os homens, mesmo limitados por um dado
contexto, por um conjunto de regras e prescries, mesmo atuando em um
espao e um tempo delimitado, so capazes de driblar a potncia do mesmo e a
imposio de repetio e criar o diferente, a novidade, de produzirem a surpresa
e o inesperado. A Histria, como jogo, faz-se de risco e habilidade, de variao e
mudana, de limite e inveno, de regras imanentes e de restries voluntrias.
(p.173)
impossvel um pesquisador ser neutro ao contar ou a construir uma nova histria.
Nessa direo, Cury (2011) argumenta pela inexistncia de uma assepsia no campo cientfico.
Cabe ressaltar que esse tipo de argumentao se pe, ainda nos dias atuais, por no ser
consensual nas comunidades cientficas de diferentes reas. Em particular, na historiografia, o
reconhecimento dessa no neutralidade foi um exerccio rduo se considerarmos a fora do
movimento que buscou a implementao de uma histria dita cientfica.
Esse movimento defendia uma historiografia em que o pesquisador deveria desempenhar
um papel neutro, mantendo-se de forma imparcial ao ponto de o objeto descrito mostrar-se tal
como ele era, sem possveis interferncias do pesquisador que o investigava. Para tanto, era
necessrio que o historiador fosse ao passado e se desligasse do presente, mantendo uma postura
objetiva e contribuindo para a escrita dessa histria que enfatiza os grandes acontecimentos e
nomes ilustres. Esse pressuposto trazia consigo algumas limitaes em relao s fontes
legitimadas na/pela historiografia: fontes orais, cartas pessoais, entre outros, tiveram sua
admisso cerceada nessa rea. O trabalho com oralidade, de modo especfico, ganha espao na
Histria a partir de sua aproximao com as Cincias Sociais.
Os documentos utilizados nas pesquisas dos historiadores eram vistos como verdadeiros
e, portanto, sem brecha para questionamento. J com Bloch (2001), os documentos so vestgios
se assim percebidos pelo investigador e, desse modo, so alterados num processo de autoria da
leitura. Os documentos no falam, s respondem o que lhes perguntado.
Esse e outros posicionamentos participam significativamente das discusses na
historiografia a partir da criao da Escola dos Annales (fundada por Marc Bloch e Lucien
Febvre). A ampliao das fontes admitidas na historiografia, bem como a aproximao da
Histria com as Cincias Sociais trariam necessidades quanto mudana de perspectiva
metodolgica e um contexto para novos posicionamentos frente objetividade, neutralidade,
verdade histrica.
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A partir da, abriu-se um leque com vrias opes e formas de realizar pesquisa. Na
interlocuo entre Histria e Educao Matemtica, por exemplo, tem-se atualmente estudos
voltados ao cotidiano escolar, livros didticos, currculo e disciplinas, questes polticas e
sociais, escola rural, estudo de gneros, etnia e geraes, entre muitos outros.
Atualmente, podem ser encontradas diversas pesquisas relacionadas com a Histria da
Educao Matemtica na formao de professores. Nessas pesquisas, ressalta-se a marca, ainda
aparentemente necessria, dos argumentos em relao ao reconhecimento da subjetividade do
pesquisador, da ampliao de fontes, da relativizao da ideia de verdade.
Os trabalhos do GHOEM e, mais recentemente, do Grupo HEMEP articulam essas
discusses em uma frente que busca investigar o movimento de implantao e efetivao de
cursos formadores de professores que ensinam Matemtica no pas. A histria oral (metodologia
mobilizada nesses grupos) neste contexto, assume um papel importante para a formao de
professores segundo Garnica (2006):
A Histria Oral como metodologia de pesquisa qualitativa pode, nesse aspecto,
desempenhar papel fundamental por focar sujeitos concretos e prximos ao
contexto dos estudantes (o que permite ao estudante perceber que as prticas
tratadas no esto no mbito de uma abstrao que lhe distante e alheia).
Concebendo como elementos de abstrao as teorias pedaggicas, os mtodos
didticos, os aspectos filosficos, polticos e axiolgicos da Educao e da
Educao Matemtica, as atividades em Histria Oral e Educao Matemtica
podero articular, por exemplo, as disciplinas classicamente conhecidas como
disciplinas pedaggicas s situaes concretas, visando a buscar, ao longo da formao inicial, a to decantada articulao teoria prtica. Alm disso, a
Histria Oral permite uma reconfigurao da concepo clssica de Histria
(incluindo nisso, a desestabilizao da Histria como estudo do passado e instrumento de heroificao) ( p. 159).
Valente (2010) dedicou-se a compreender, a partir de Roger Chartier, que as linguagens
que utilizamos para nos expressar ou comunicar sofrem mudanas no decorrer do tempo. Este
observou que no possvel realizar uma pesquisa histrica a fim de resgatar o passado, pois no
temos como reviv-lo tal como ocorreu.
Segundo Miguel e Miorim (2004) necessrio um dilogo entre a Histria e a Educao
Matemtica em todos os nveis de educao institucional. Por suas experincias em ministrar
aulas nos cursos de licenciatura, propuseram algumas aulas de Histria da Matemtica voltadas
para a formao de professores, mas ficaram insatisfeitos com os resultados obtidos, pois embora
o objetivo fosse auxiliar a formao dos futuros professores por meio da Histria da Matemtica,
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puderam notar que os alunos somente se entusiasmaram e aprenderam contedos da Histria da
Matemtica, os feitos e fatos importantes.
Entendemos que o entusiasmo e o envolvimento deles estavam muito mais associados
aos novos conhecimentos obtidos, atravs do estudo da prpria Histria da Matemtica, do que
com a percepo da relevncia pedaggica de tal estudo para o exerccio da profisso docente. (
MIGUEL; MIORIM, 2004, p.153)
Considerando os poucos trabalhos citados anteriormente, j possvel notar a
diversidade temtica e as possibilidades formativas (em ensino e pesquisa) da Histria da
Educao Matemtica. Segundo Garnica e Souza (2012)34
[...] a Histria da Educao Matemtica visa a compreender as alteraes e
permanncias nas prticas relativas ao ensino e aprendizagem de Matemtica;
a estudar como as comunidades se organizavam no que diz respeito
necessidade de produzir, usar e compartilhar conhecimentos matemticos e
como, afinal de contas, as prticas do passado podem se que podem nos ajudar a compreender, projetar, propor e avaliar as prticas do presente. (p. 22)
A Histria da Educao Matemtica permite compreender/construir cenrios
educacionais em que outros homens, em outros tempos, viviam em outras comunidades. Desse
modo, ao estudar qualquer temtica nessa rea, importante a busca pela caracterizao temporal
quanto situao poltica, social e cultural. Essa busca no possui o fim de estabelecer
comparaes com estruturas atuais da educao, visto que as condies e foras atuantes em cada
poca so distintas, mas compreender o poder de organizao e as variveis envolvidas no
movimento educacional ao longo do tempo.
Os indcios e construes so realizados em diferentes linguagens, mas a palavra, no
mbito acadmico, tem especial papel. Segundo Albuquerque (2007), o homem existe em estado
de palavra, pois narrativo, construo daqueles que com ele convivem. Em sua percepo, ns
somente existimos no mundo (ou seja, frente ao outro) por causa das palavras que nos descrevem
e registram nossas aes. So as histrias, registradas por meio das palavras, que so construdas
no sentido de produo ou significao pelo leitor. As palavras nos falam e dizem muito, mas
sempre acompanhadas de tons e mediadas num contexto. Segundo Barros (2009),
Estar no estado de palavra como estar em estado interessante, estar em estado
de prontido para o nascimento de algo, para o parto de novos temas, de novos
problemas, de novas abordagens, de novos conceitos. Estar em estado de palavra
estar grvido de possibilidades de dizer e de fazer ver e compreender, estar
no cio por novos acoplamentos, por novas conexes entre aquilo que se conhece
e aquilo que se busca conhecer, estar preparado para gestar novos objetivos,
34
Trata-se de livro publicado em 2013 com data de 2012.
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novos prenncios do gozo causado pela descoberta de sentido ainda no
produzido, pelo ineditismo de uma interpretao, pela leitura de um documento
desconhecido, pela tese nova que se vai apresentar perante os pares. Estar no
estado de palavra sentir prazer de criar, de inventar, de enredar, de tramar, de
dizer de maneira nova, de fazer ver de outro ngulo, aquele assunto j to
desgastado, j to laspeado que chega a estar spero. (apud ALBUQUERQUE,
2011, p. 260)
Situaes passadas deixam algumas marcas em nosso presente e estas convivem com os
imaginrios construdos e divulgados cotidianamente. No caso da histria da educao
Matemtica, por exemplo, muitas construes discursivas, algumas contraditrias, perpassam o
cotidiano escolar. Um exemplo so as frequentes afirmaes de que antigamente os alunos eram
melhores e aprendiam o contedo e o ensino de antigamente era melhor. Esses constructos
devem ser discutidos dentro do contexto de sua produo. Segundo Valente (2010), a importncia
de insero da Histria da Educao Matemtica como disciplina nos cursos de formao de
professores , assim, justificada:
(...) a Histria da Educao Matemtica tem como objetivo criticar essas
representaes do passado, que tm fundo ficcional, memorialstico e a-
histrico. Desconstruir essas representaes de outros tempos da educao
Matemtica, alterar a relao que os professores de Matemtica tm com os seus
antepassados profissionais, em benefcio de novas representaes mais
aliceradas na crtica aos documentos e fontes das prticas pedaggicas
realizadas noutros tempos tarefa que justifica a incluso da histria da
educao Matemtica na formao de professores. (p. 134)
Esses referenciais nos ajudaram a compreender e fundamentar, por meio do discurso
Historiogrfico, a nossa pesquisa ligada Histria da Educao Matemtica.
2.1 Faces da Histria Oral como ferramenta para a Historiografia
Nos ltimos tempos, surgiram algumas mudanas para se realizar uma pesquisa
historiogrfica, possibilitando a interdisciplinaridade e a utilizao de vrios tipos de fontes. A
diversidade de fontes mobilizada em uma operao historiogrfica provoca a necessidade de
ampliao das perspectivas metodolgicas admitidas nessa operao. No caso dessa pesquisa, a
Histria Oral vem sendo utilizada como uma metodologia para o exerccio historiogrfico
proposto, ou seja, um recurso que nos tem auxiliado no registro de experincias profissionais por
meio da entrevista e anlise de documentos escritos. Ou seja, a utilizao dessa metodologia no
serve somente aos interesses especficos dessa investigao, mas aponta um caminho para criao
e divulgao de fontes.
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A Histria Oral chegou ao Brasil em 1990, tendo se consolidado nos Estados Unidos e,
apesar de ser muito discutida em seminrios por historiadores brasileiros e estrangeiros, a sua
aceitao no Brasil no foi muito rpida. Segundo Meihy (2005), a Histria Oral no teve uma
aceitao muito rpida, pois o pas no possua uma tradio, dentro das universidades, em
desenvolver projetos que registrem e utilizem os depoimentos da populao local em pesquisas
acadmicas. Uma das marcas reconhecidas por este autor na Historiografia atual a
interdisciplinaridade, e esta vem contribuindo, tal como o fez no incio da Escola dos Annales,
para ampliao das perspectivas envolvendo fontes e mtodos.
Neste sentido, a Histria Oral no assume somente o papel de viabilizar o uso de fontes
orais que posteriormente so textualizadas, mas contribui para mostrar que no existe uma
histria verdadeira ao trabalhar com uma multiplicidade de olhares que a ns, pesquisadores,
cabe registrar e interpretar.
Trata-se de entender a Histria Oral na perspectiva de, face impossibilidade de
constituir A histria, (re)constituir algumas de suas vrias verses, aos olhos de atores sociais que vivenciaram certos contextos e situaes, considerando
como elementos essenciais, nesse processo, as memrias desses atores via-de-regra negligenciados sem desprestigiar, no entanto, os dados oficiais, sem negar a importncia de fontes primrias, de arquivos, de monumentos, dos tantos
registros possveis. No havendo uma histria verdadeira, trata-se de procurar pela verdade das histrias, (re)constituindo as como verses, analisando como se
impem os regimes de verdade que cada uma dessas verses cria e faz valer.
Historiadores orais so, portanto, criadores de registros; constrem, com o
auxlio de seus depoentes colaboradores, documentos que so, na trama dessas
concepes que alinhavei, enunciaes em perspectiva. Documentos cuja funo preservar a voz do depoente muitas vezes alternativa e dissonante que o constitui como sujeito e que nos permitem (re)traar um cenrio, um
entrecruzamento do quem, do onde, do quando e do porqu (GARNICA, 2005,
p.6).
Considerando que o texto de Garnica de 2004, ressaltamos a necessidade de uma
atualizao que se mostraria necessria nas discusses posteriores quele momento. A Histria
Oral no visa constituir verses da histria, como apontado no incio da citao, mas verses
histricas. Essa diferenciao marca a postura de que no existe uma histria a priori sobre a qual
as outras so produzidas e aproximadas, existem verses ou, ainda, existem histrias. Desse
modo, ao admitir a pluralidade resultante do processo criativo de verses, busca-se um
afastamento da noo de verdade e histria singulares.
A Histria Oral est intrinsecamente ligada memria. Este, segundo Delgado (2006),
a principal fonte dos depoimentos orais, um cabedal infinito no qual mltiplas variveis dialogam
entre si. Podemos relacionar vrios assuntos em nossa memria, o tempo nos protege das
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lembranas desagradveis e traumticas nos fazendo esquecer ou ocultando para que,
inconscientemente, nos tranquilizemos. De um modo ou de outro, segundo a autora, as
lembranas podem ser relembradas por estmulos externos materiais ou situacionais.
No caso da histria oral, o estmulo lembrana pode ser feito a partir de um estudo
documental prvio. Um recorte de jornal, uma foto da poca, documentos profissionais de
determinado professor, a ata de uma reunio especfica, entre outros, so documentos que podem
ajudar no processo de rememorao. No caso especfico dessa pesquisa, essa prtica no foi
implementada, por conta da extrema dificuldade em localizar documentos da poca investigada,
optando por um processo inverso em que os professores entrevistados poderiam, mobilizando
suas memrias, dar indcios para localizao dos documentos escritos e pictogrficos.
A memria foi motivo de desconfiana durante muito tempo. Hoje, a memria e a
Histria Oral esto sendo muito utilizadas, ganharam fora e um grau de importncia dentro das
pesquisas acadmicas. Em virtude dessa grande mobilizao em diferentes pesquisas, a Histria
Oral assume diferenciaes, marcando, em princpio, trs faces: a tcnica, a disciplina e a
metodologia. Muitos pesquisadores que utilizam a Histria Oral como uma tcnica, e consideram
uma importante forma de registrar os depoimentos (os tipos de aparelhos), de transcrio e de
forma de conservao dos arquivos. interessante salientar que a entrevista utilizada para
complementar outros tipos de fontes e, assim, atender as necessidades da pesquisa. Os que
consideram a Histria Oral como disciplina, focam na busca por conceitos prprios,
procedimentos metodolgicos e tcnicas especficas de pesquisa. Segundo Cury (2011), existem
algumas ideias e direcionamentos da Histria Oral como disciplina que so semelhantes
Histria Oral como metodologia:
O testemunho oral apresenta o ncleo da investigao, nunca sua parte acessria;
O uso sistemtico do testemunho oral possibilita Histria Oral esclarecer trajetrias individuais, eventos ou processos que s vezes no tm como ser
entendidos ou elucidados de outra forma;
Na Histria Oral existe a gerao de documentos (entrevistas) que possuem uma caracterstica singular: so o resultado do dilogo entre
entrevistador e entrevistado, entre sujeito e objeto de estudo;
A pesquisa com fontes orais apia-se em pontos de vista individuais, expressos nas entrevistas;
A histria do tempo presente, perspectiva temporal por excelncia da Histria Oral, legitimada como objeto da pesquisa e da reflexo histricas;
Na Histria Oral o objeto de estudo do historiador recuperado e recriado por intermdio da memria dos depoentes;
O fato de a Histria Oral ser largamente praticada fora do mundo acadmico, entre grupos e comunidades interessados em recuperar e reconstruir
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sua prpria memria, tem gerado tenses, pois as perspectivas, os objetos e os
modos de trabalho de acadmicos e no-acadmicos podem diferir muito;
Tanto a narrativa quanto a forma de construo e organizao do discurso so valorizadas pelo historiador. ( p.27 28)
Uma das diferenas entre a Histria Oral como metodologia e como disciplina, que na
perspectiva metodolgica existe uma ordem nos procedimentos de trabalho, a quantidade
necessria de entrevistas (conforme os assuntos se tornem repetitivos), a forma de realizar a
transcrio e como sero utilizadas para relacionar a teoria e a prtica dos conhecimentos obtidos
(anlise). Embora haja discusses conceituais prprias do mtodo, estas no se fecham no
mesmo, estando abertas articulao com outras teorias fundantes da prpria histria, ou da
sociologia, ou da antropologia, entre outras. Ao ser abordada como metodologia, segundo
SOUZA (2011), a histria oral mostra-se com articulao coerente entre fundamentao terica
(geralmente advinda da rea de interesse do pesquisador) e procedimentos de pesquisa.
Um direcionamento comum
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