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A charge como memória da democracia e da cidadaniaA charge como memória da democracia e da cidadaniaA charge como memória da democracia e da cidadaniaA charge como memória da democracia e da cidadania
Tereza Sibaldeli Sabo
Rosana Steinke
Resumo
Este artigo é resultado de uma proposta metodológica no uso de charges como
objeto de estudo na reflexão sobre a construção democrática da sociedade
brasileira, no período de 1937 a 2007. Partindo de uma discussão sobre
democracia e cidadania na atualidade busca-se reconhecer a historicidade da
criação chargística e os elementos significativos que estabelecem diálogo com
os fatos históricos nela impressa. O uso de charge na prática pedagógica, na
disciplina de História, demonstra um recurso atrativo ao público-alvo, neste
caso o 3º ano do Ensino Médio, pelo caráter risível desta ilustração para a
construção de conhecimento histórico. A abordagem deste tema permitiu ao
aluno o reconhecimento das interpretações e representações dos fatos sociais
e políticos inseridos na produção e publicação de charges nos diversos meios
impressos da mídia.
Palavras-chaves: democracia . cidadania. charge. memória.
Abstract
This article is the result f a methodological proposal with the use of charge as
object of study reflecting Brazilian society democratical construction from 1937
to 2007. Beginning from discussion about democracy and citizenship at the
present time, we aim recognize the historical of charge creation and the
significant elements the establish dialogue with historical facts printed on it. The
use of charge in pedagogical pratics, in history subject, shows an attractive
recourse, in this case, for high school on 3rd grader students because the
illustration characteristics in constructions of their historical knowledge. This
approach allows the students the recognition of interpretation of interpretation
and representation of politicals and social facts in production and publications of
several printed midia forms.
Key words: democracy. citizenship. charge. conscience
Introdução
A recente historiografia apresenta um universo rico e variado de fontes de
pesquisa, com a presença de novas tecnologias, se utilizando de uma
variedade de fontes que podem ser trabalhadas a partir de publicações da
imprensa, análise de letras de músicas, a iconografia de modo geral (mapas,
fotografias, filmes, obras de arte). Tais documentos permitem estudos sobre o
comportamento e códigos culturais, auxiliando significativamente na
abordagem reflexiva e crítica da sociedade moderna. O uso de tais
documentos, ao serem disponibilizados ao professor, podem contribuir nas
práticas pedagógicas da escola, especialmente na disciplina de História,
oportunizando um aprendizado mais significativo aos alunos.
A sala de aula, no presente trabalho, é o foco da ação pedagógica, por meio do
uso de charge. Ao eleger a temática a Memória da Cidadania Escancarada
pelo Riso, juntou-se a pesquisa de fontes elaborada ao longo do PDE com a
produção de trabalho visual e escrito feito pelos alunos.
Umas das grandes possibilidades apresentadas pelo uso da charge em sala de
aula está no fato de chamar a atenção dos alunos pela própria linguagem
artística que exibe; outro fator que merece ser mencionado é seu conteúdo
crítico, com inúmeras abordagens sobre a política nacional, estabelecendo
relações de intertextualidade, evocando conhecimentos específicos da
linguagem e do período histórico a ser analisado.
No recorte temático a que se propõe este trabalho, a investigação histórica
destaca o processo de democracia e cidadania num determinado período da
história do Brasil, com a intencionalidade de enfatizar o processo histórico
deste objeto de estudo, ajudando na compreensão da relação
passado/presente, suas limitações e interações com outras fontes para a
construção da consciência crítica.
A intenção é buscar orientar o uso da charge na compreensão e análise de
determinados fatos e leituras do mesmo. Buscou-se a percepção da História,
no trabalho desenvolvido com os alunos, como sujeitos de seu próprio tempo,
buscando despertar a consciência crítica destes. A execução das referidas
atividades ocorreu na XI Mostra Interdisciplinar, do Colégio Estadual Unidade
Polo, na turma do 3º Ano A do Ensino Médio.
Princípios de Democracia e Cidadania
A sociedade brasileira nas últimas décadas do século XX, vivenciou a abertura
política e a ampliação da democracia. Tais aspectos foram construídos também
com avanços e recuos, ora buscando a ruptura com o advento da República,
ora aliando-se às práticas ideológicas forjadas em períodos ditatoriais. Neste
contexto histórico, acreditamos que a função social da escola é auxiliar a
conceituar e fundamentar democracia e cidadania, conceitos estes apregoados
nas sociedades atuais pelo compromisso de promoção dos valores
humanísticos.
Então, iniciamos nossas atividades nos indagando sobre qual modelo
democrático se pretende validar neste momento? As referências de
democracia e cidadania utilizadas pelos teóricos políticos da modernidade
dispõem dos mais variados conceitos, principalmente quando analisados na
perspectiva de nações modernas, como a brasileira, que vivenciou períodos
instáveis na sua história recente, onde a democracia apoiou-se fragilmente
apenas na esfera da participação política, intercalada por períodos de ditadura
ou governos populistas.
O conceito de democracia política que resguarda a participação da população
adulta das nações não é a condição final para a consolidação da igualdade de
direitos do cidadão brasileiro. O trabalho de conceituação e fundamentação de
cidadania não é fácil e rápido ao analisar os resultados da pesquisa realizada
pelo CPDOC³, em 1997. Conforme aponta Carvalho (2002), em Cidadania na
Encruzilhada, na primeira tabela (Concepção de consciência de cidadania de
direitos individuais) o percentual de 56,7% dos entrevistados não souberam
responder ou não sabiam os tipos de direitos do cidadão. Na terceira tabela
(Confiabilidade dos brasileiros), 30% de confiabilidade e 46% de pouca
confiabilidade; já na quarta tabela (Deveres dos brasileiros), observa-se que
55,7% não sabiam ou não responderam.
Estes dados representam uma sociedade que ainda não incorporou, nem
vivenciou a cultura cidadã de forma plena e demonstra um estranhamento
quando solicitada a sua participação ativa e não burocrática, como no período
eleitoral com o voto obrigatório. Não é intenção fundamentar este trabalho na
concepção do cidadão-consumidor, mas sim na compreensão da cidadania que
prioriza o coletivo, com ativismo político e a esfera pública dos debates e
deliberações (ARENDT apud CARVALHO, 2002), a liberdade de imprensa e
associação, a garantia de direitos coletivos, como direitos civis, sociais e a
garantia de justiça. Estas práticas cidadãs apontadas por Carvalho (2002) são
promissoras e tornam-se mais relevantes quanto mais diretamente envolvidas
no cotidiano do cidadão. Este princípio de cidadania representa uma
contemporaneidade fundamental para a construção da justiça social,
preservando os interesses coletivos, com a atuação do Estado com a
sociedade organizada e participativa para
...numa perspectiva em que a força do primeiro passa a depender do fortalecimento da segunda e em que este novo arranjo constitua a base para redefinir a nação. (CARVALHO, 2002, p. 126)
Faz-se necessário neste conjunto de conceitos e entendimentos aliar a
democracia política à cidadania, como princípio institucionalizado na prática
política dos cidadãos com um mínimo de condições sociais. Para Weffort
(1992), a consolidação da democracia torna-se impraticável enquanto
permanecerem as estruturas de desigualdade social e a presença ainda visível
dos resquícios de um período ditatorial da sociedade brasileira. A estas
estruturas, também denominadas de apartheid social, juntam-se outras tão
desfavoráveis à construção da democracia e cidadania plena, como a falta de
estruturas institucionais mais atuantes, a formação e atuação das lideranças, a
maior presença e valorização dos movimentos organizados da sociedade e a
exclusão econômica.
Portanto, a resposta para o questionamento inicial sobre o modelo democrático
que se deseja na sociedade brasileira se revela ainda um conceito não
finalizado pela própria sociedade, que busca a compreensão social, histórica e
ideológica das complexas relações e seus fenômenos para interagir
conscientemente.
Nesta reflexão sobre os desafios ora identificados nesta análise, reforça-se a
premissa da organização consciente da sociedade civil. Esta se torna
protagonista da solução de problemas que direitos sociais pretendem prevenir
e ao mesmo tempo está “mundializada” pela questão ética vigente nas
sociedades modernas (SINGER apud Pinsky, 2005).
Fazemos parte de uma mesma espécie, de uma mesma comunidade, inseparável e indivisível... Nossa liberdade jamais será plenamente vivida, enquanto a liberdade de alguém, nos altiplanos da Bolívia ou nos arrozais do Vietnã, estiver ameaçada ou cercada. (PINSKY e PINSKY, 2005, p. 39) Preciso pegar amanhã o livro da História da cidadania para refazer a referência.
A escola
O trabalho desenvolvido no 3º ano do Ensino Médio na disciplina de História
insere-se no princípio da construção da consciência crítica dos alunos como
fundamento singular da educação pública e democrática. A intervenção
pedagógica, realizada em sala de aula com o uso de charges, permite
considerações significativas quando reconhecida pelas inferências ao
cotidiano, característica da sua constituição ilustrativa ao trazer informações
visual e textual sobre um fato, geralmente político, sugerindo atenção
redobrada ao aluno/leitor. As ações e expressões dos diversos setores na
recente história do Brasil são marcadas por avanços e recuos políticos e
sociais que se apresentam distintamente no objeto-charge.
Na escola pública, do Ensino Básico, está evidenciada a constituição da
sociedade atual, pela sua formação e organização peculiar de instituição social
e ideológica do Estado, com seus diversos sujeitos sociais, professores,
alunos, direção, equipe pedagógica, técnico-administrativa e de apoio, os pais
e a comunidade escolar.
Este espaço singular, enquanto reflexo da sociedade brasileira contemporânea,
expõe também as fragilidades sociais, políticas, econômicas e culturais desta
mesma sociedade, nos revelando a desigualdade social. Em contraposição,
neste mesmo espaço, concentra-se o conjunto de profissionais da educação
que têm a oportunidade de ocupar o espaço da escola, espaço esse rico de
conhecimento e sujeitos sociais, ainda que muitas vezes apresente dificuldades
e limitações para efetivar o acesso democrático e significativo ao conhecimento
para os alunos.
A fragilidade da escola básica no Brasil está registrada em vários estudos de
educadores e do próprio governo, seu mantenedor e gestor. No processo de
ensino-aprendizagem dos sujeitos professor-aluno é necessário manter diálogo
entre os saberes socialmente construídos e, por isso, constituídos de
significação para os envolvidos neste processo. O espaço escolar às vezes
torna-se estéril quanto a sua função social, problema esse que pode ser
apontado por diferentes motivos, além dos já citados acima, como planos
docentes equivocados, desmotivação dos alunos e a própria dinâmica da
sociedade moderna, que externa valores da sociedade capitalista e seus
contrastes.
Esta contradição vivenciada no espaço escolar e, principalmente, no interior
das salas de aula, demonstra que o aprimoramento das práticas pedagógicas
em todas as áreas, da formação do profissional da educação, a organização
pedagógica da escola e coerência nas ações do Estado, podem ser as
alternativas para viabilizar o ensino democrático, de qualidade e para todos,
pressuposto de um Estado democrático, centrado na justiça e na cidadania.
O Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, instituído pelo governo
do Estado do Paraná através da Secretaria de Estado da Educação, em
parceria com a Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
promove uma inovadora experiência pedagógica quanto à Formação
Continuada dos professores, na busca de novos paradigmas na estruturação
das disciplinas escolares e suas práticas pedagógicas. Tal iniciativa pode
colaborar para garantir a escola pública paranaense professores com
preocupações de reflexão sobre os problemas acima ressaltados e
proponentes de práticas que atendam às fragilidades do conhecimento,
explicitados no interior das escolas, conforme os índices escolares
apresentados tanto pelo governo federal quanto estadual.
É neste contexto educativo que o presente trabalho busca referências de
articular, através da narrativa histórica, a utilização da charge como fonte
histórica e como elemento significativo para a compreensão do processo
histórico baseado em intenções, conceitos e consciência das relações de
temporalidade.
O processo de aprendizagem na disciplina de História também está
comprometido diante das fragilidades apontadas anteriormente. Para Marson
(1990) a crise não é aguda e está relacionada ao efêmero, volátil e descartável,
resultante da sociedade capitalista, obrigatoriamente consumista e dinâmica na
sua sustentação. Portanto, no contexto exemplificado que se encontra a
sociedade brasileira, vislumbramos o aumento e o acesso significativo de
documentos disponíveis para análise do historiador e o exercício da prática do
historiador:
Estamos dentro de um círculo de ferro cujo rompimento não é fácil. Em geral, no afã de cumprir a nossa missão pedagógica, temos substituído uma dada interpretação por outra mais “correta", sem que o vínculo mesmo da dominação seja tocado. Outras soluções deveriam ser tentadas. (MARSON, apud SILVA, 1990, p.41)
Torna-se necessário fortalecer a instituição educacional como espaço legítimo
da produção do conhecimento, através de ações como investimentos
financeiros, recursos humanos cada vez mais qualificados e práticas didáticas
disponibilizadas democraticamente para promoção do conhecimento científico
e crítico aos nossos alunos.
A charge e democratização do conhecimento
Como já foi ressaltado, o uso de charges tem a possibilidade de inserir um
diálogo argumentativo com a presença do humor, por meio da linguagem visual
satírica, texto curto e articulado com as circunstâncias históricas. Tais
documentos estabelecem um diálogo para a investigação histórica e despertam
a reflexão inicial do aluno, ainda que este possa, num primeiro momento, estar
alheio e não relacioná-la ao seu cotidiano. A compreensão da charge como um
elemento próximo, real e prazeroso pelo leitor-aluno significa o reconhecimento
deste objeto de estudo como uma
Representação humorística, portanto, com aquele esforço inaudito de desmascarar o real, de captar o indizível, de surpreender o engano ilusório dos gestos estáveis... ( SALIBA, 2002, p. 29)
A charge carrega na sua constituição visual o dialogismo (Bakhtin, 1979),
sendo vozes que se inter-relacionam numa ‘batalha social’ presente no embate
da vida cotidiana. A palavra e a imagem são práticas discursivas de natureza
ideológica, revelando idéias da coletividade numa determinada temporalidade.
As charges ocupam um significado expressivo nas lutas presentes nos
movimentos sociais, políticos e culturais da sociedade brasileira gerando
discussões pródigas quanto aos anseios da construção de uma sociedade
democrática e cidadã, desde o século XIX, mas principalmente a partir de 1945
e no final da Segunda Guerra Mundial. Simultaneamente expõe os anteparos
políticos e sociais que limitam a efetivação deste ideal de sociedade.
Na face duplicada de significados apresentados na mídia impressa, a charge
encontra sua especificidade mostrando sua força ao revelar as fissuras de um
contexto (DRIGO e SOUZA, 2006). Assim, muitas vezes expressa a crítica
individual evidenciando o discurso persuasivo pela posição política que está no
exercício do poder.
O processo de investigação histórica, a partir da utilização da charge, permite
aos alunos a apropriação de conceitos, de reconhecimento do objeto de
estudo, a análise de sua natureza e a produção da narrativa histórica
contextualizada e argumentada pelo discurso presente na mesma.
A presente investigação histórica busca ainda atender às Diretrizes
Curriculares para o Ensino de História e a Proposta Pedagógica Curricular da
Disciplina de História – Ensino Médio, no que se refere aos fundamentos
teórico-metodológicos desta disciplina.
A memória da cidadania escancarada pelo riso
Em um primeiro momento, este trabalho teve como objetivo um recorte
temático que privilegiasse o conteúdo redemocratização do Brasil - 1978 a
1982 tendo em vista a possibilidade de trabalhar os conceitos de democracia,
ditadura militar, cidadania, os movimentos sociais, políticos e culturais,
principalmente pela proximidade do tempo histórico.
Também se levou em consideração a grande produção de charges neste
momento histórico da sociedade brasileira. A historiografia brasileira, no
referido período, tem material diversificado e rico para a investigação histórica,
sendo a charge um elemento significativo. Com a seleção de análise de uma
produção de charges que abrangia um período mais longo, optou-se, neste
trabalho, o estudo do período de Getúlio Vargas até o presente momento (1937
A 2007).
A charge revela-se como um traço da história, “na medida que capta o ocorrer
do seu processo no seu acontecer, denunciando faces do poder com sua
linguagem metafórica”, sendo “o humor não um estado de espírito, mas uma
visão de mundo” (SALIBA, 2002). Então, o desenho ilustrativo da charge é uma
“representação humorística com a função de denunciar, satirizar, ridicularizar,
criticar um fato, um personagem real, mantendo viva a memória histórica”
(MIANI,2001).
Tomemos um exemplo:
A charge acima, de Silveira, publicada no O Jornal de Maringá, em 20/11/81,
representa um período econômico e social que a inflação corroía os salários
dos trabalhadores e colocava dois sujeitos sociais, o desempregado e o
empregado, praticamente na mesma situação de miséria. Ao ser analisada em
sala de aula observou-se as contradições da organização política social do
Brasil. Neste momento ocorreu a desconstrução do discurso ideológico que
sustentou durante décadas os militares no poder, de um lado o argumento do
governo sobre a necessidade de “crescer o bolo” para depois dividi-lo para
promover a igualdade social. Do outro lado, os movimentos sociais se
organizando contra o aumento do custo de vida. Esta mobilização contra o
aumento do custo de vida reuniu milhares de paulistanos em 27 de agosto de
1978 na Praça da Sé, em São Paulo, quando os manifestantes entregam
documentos com 1,3 milhões de assinaturas à Comissão de Justiça e Paz ,
pedindo o congelamento de alimentos, aumento de salários e abono salarial
imediato.
O exagero presente nesta linguagem metafórica e risível mostra o contexto
social brasileiro em um determinado momento e se apresenta ao leitor (alunos
adolescentes) como elemento sedutor na intenção de motivá-lo a investigar,
selecionar, analisar e narrar um conteúdo previamente selecionado. Nesta
perspectiva, Miani nos chama atenção para a charge “como instrumento de
persuasão, intervindo no processo de definições políticas e ideológicas do
receptor, através da sedução do humor...”.
A análise do contexto histórico de um fato na perspectiva da representação
chargística visa romper com o tradicionalismo no uso de documentos e fontes,
superar conceitos pré-elaborados, no senso comum. Tal prática, pode levar o
aluno a ir formando uma elaboração do conhecimento fundamentado na
percepção
- pesquisa bibliográfica e síntese de leituras referentes;
- organização de seminário para apresentação do tema aos professores da
turma para a 1ª avaliação;
- pertinência teórica e metodológica;
- produção de trabalho escrito com normas pré-estabelecidas
- para finalizar, a exposição do tema para a comunidade escolar.
Esta proposta de implementação foi adequada às representações sociais dos
alunos que encontraram significado no tema que aqui apresentamos, Memória
da cidadania escancarada pelo riso, abordando o Brasil no período da
democracia e da ditadura, de 1937 a 2007. Após eleição e avaliação do
material a ser utilizado foi feita também uma avaliação sobre sua relevância no
processo ensino-aprendizagem do Ensino Médio e dos alunos que estavam
concluindo o Ensino Básico. Anteriormente, foi elaborado um cd-room
contemplando um texto em linguagem didática contendo a análise de charges,
material didático que está disponível na Biblioteca Escolar e do Professor. O
acesso ao Material Didático – PDE/História (O Bê-a-Bá da Cidadania), criou no
conjunto da turma uma perspectiva ampla e coletiva de análise histórica com o
estudo através de charges.
A charge de Nani foi a primeira a ser apresentada como incentivadora da
análise histórica com o objetivo de contextualizar o tema a ser abordado pelos
alunos. Esta charge representa dois personagens, o militar e o trabalhador
rural, suas características físicas, a paisagem e o texto. Todos estes elementos
subsidiaram uma primeira análise e se concretizou com outras leituras e
intervenções durante duas aulas. A Ditadura Militar e a submissão são
reconhecidas nesta análise.
Fonte: Nani, O Jornal de Maringá, 01/11/81
A preocupação didática com o uso desta fonte de pesquisa conforma-se com a
preposição de Bittencourt (2005, p.364-5) para a necessidade de “estabelecer
relações com outras fontes, notadamente com textos escritos”... “identificando
como o aluno apreende as imagens e suas representações”. O processo
corresponde a reconstrução do conhecimento adquirido pelo aluno na sua
trajetória de vida e escolar subsidiada também pelas disciplinas de Língua
Portuguesa e Sociologia para desenvolver um trabalho que sensibilize pela sua
relevância na concretização da percepção da cidadania.
A etapa de sistematização teórica e preparação do seminário a ser
apresentado em Julho/2008 mostrou-se pouco elucidativa e atraente para
alguns alunos, sendo necessária a intervenção dirigida da professora para
estimular a execução de tarefas e manter o cronograma de atividades, afinal
não era a intenção selecionar charges e apresentá-las, mas justificá-las
teoricamente como fonte de análise de um determinado período, e tornar a
oralidade interdisciplinar compatível com a série. Observou-se a rápida solução
adotada pela turma para concluir esta etapa com a organização de três grupos
de estudos:
- ditadura de Vargas e governos populistas (1937 a 1964);
- ditadura militar (1964 a 1985);
- redemocratização do Brasil (1985 a 2007);
- produção de material de apresentação no Data-Show.
Num segundo momento, trabalhou-se um texto elaborado pelos alunos, a partir
das pesquisas e sínteses realizadas, usando como referência a importância da
charge como objeto de estudo. Neste exercício, chama-se a atenção para a
intervenção multidisciplinar dos professores de Língua Portuguesa e
Sociologia.
Nos meses de agosto e setembro os alunos receberam a visita de dois artistas
plásticos que atuam em Campo Mourão. O primeiro foi Pixote, artista plástico,
referência na comunidade, destaca-se também na criação de charges; o
segundo foi o artista plástico Fernando Nunes, ilustrador de livros, chargista,
ator e publicitário. As palestras cumpriram o objetivo de ilustrar e melhor
esclarecer aos alunos sobre a criação das charges e outras ilustrações. Tal
exercício produziu momentos significativos de participação dos alunos, com
levantamento de hipóteses quanto a criação e o significado da charge.
Percebe-se que houve, por parte dos alunos, o reconhecimento e a valorização
do porquê deste trabalho e como esta turma poderia contribuir para a melhoria
das práticas pedagógicas através de intervenções e não apenas um executor
de tarefas previamente determinadas.
A etapa de construção do trabalho escrito expôs fragilidades no domínio de
regras da escrita e conseqüentemente as dificuldades para a elaboração do
trabalho. A resistência identificada foi entendida pelos alunos como resultado
da “tradição” de apenas um ou dois alunos se responsabilizarem na produção
de texto técnico, quando da participação desta turma em Mostras anteriores.
Detectados tais problemas, retomamos o roteiro inicial da pesquisa produzindo
um trabalho coletivo, que foi analisado por dois professores da turma com a
intenção de orientar a revisão através de uma correção preliminar.
Ressaltamos que esta prática de revisão no texto ocorre com nos trabalhos
produzidos por todas as turmas da escola, das 5ªs ao 3ºs. Esta etapa foi
concluída satisfatoriamente conforme os requisitos solicitados pela comissão
organizadora.
A última etapa deste trabalho foi tornar a nossa pesquisa acessível à
comunidade escolar com a participação de todos os alunos na elaboração do
estande. Este momento consolidou todo o processo com participação criativa
dos alunos. A opção inicial dos alunos era organizar uma oficina de produção
de charges que foi logo descartada porque não tínhamos na turma alguém com
habilidades técnicas para coordenar, então foi sugerido montar painéis com as
charges pesquisadas, enfatizando a história recente do Brasil (1990 a 2007).
Ocorreu a organização de grupos de trabalho para reprodução de charges
pesquisadas, o estudo sobre cada uma delas para serem apresentadas ao
público visitante e a preparação do ambiente para a exposição das charges. O
dia da exposição para a comunidade ocorreu no dia 13 de setembro/2008 com
a turma dividida em três grupos de apresentadores. A apresentação e
exposição do material, com os devidos créditos à qualidade e a participação
dos alunos, recebeu o convite do Diretor da FECILCAM, Carlos Aleixo, para
agendamento da exposição nesta instituição.
Esta atividade desenvolvida no decorrer do ano letivo de 2008 com o 3º ano A,
do Colégio Estadual Unidade Polo, demonstrou que vale ousar, investir e
persistir
“na utilização das diferentes linguagens, pesquisando e fazendo os alunos
pesquisarem. Os resultados têm sido sempre um prazer, mesmo sem atingir todos
os objetivos iniciais, muitas vezes utópicos. Mas é preciso a utopia para trabalhar
como educador” (BITTENCOURT, 2005, p.396).
As fotos a seguir registram alguns destes momentos da finalização do trabalho
nos dias 12 e 13 de setembro de 2008.
Alunos do 3º Ano A , do Colégio Estadual Unidade Polo de Campo Mourão,
12 e 13 set de 2008, durante a XI Mostra Interdisciplinar
Considerações Finais
As atividades realizadas com o estudo de charges no ensino de História,
enfatizando o reconhecimento da memória da cidadania brasileira, 1937 a
2007, por meio deste documento, demonstrou-se pertinente ao universo dos
jovens. Tal pertinência se deve a diferentes fatores, como o atrativo visual
deste objeto de estudo que garantiu intervenções teóricas para evidenciar
conceitos, análises temporais e espaciais e um trabalho interdisciplinar da
História, Língua Portuguesa e Sociologia.
A contribuição no processo ensino-aprendizagem foi considerado relevante
pela equipe pedagógica, pelos professores de História, Língua Portuguesa e
Sociologia e pelos próprios alunos. Os envolvidos na execução deste trabalho
expuseram suas considerações positivas e negativas na realização deste
trabalho, sendo as limitações iniciais abrandadas e superadas com atividades
extras, estudos específicos para dominar o conceito de charge, cidadania e
democracia.
A pesquisa proporcionou aos alunos a utilização de diversos materiais
existentes na escola, livros, revistas, jornais, o Laboratório de Informática para
pesquisa em sites específicos, valorizando fontes e recursos até então pouco
utilizados no cotidiano destes alunos.
A charge ocupou espaço de discussão durante as aulas de História, nas quais
foi abordada a sua criação, veiculação e tom denunciatório de diferentes
momentos políticos. Igualmente foi atribuída à ela o fato de ser um instrumento
de resistência civil aos modelos políticos estabelecidos.
Notas
¹ Professora de História da Rede Pública do Estado do Paraná, Núcleo
Regional de Campo Mourão.
² Professora Rosana Steinke (Orientadora). Graduada em História (UEM),
Mestre em Arquitetura e Urbanismo (USP) e Doutoranda em História (UFPR).
³ Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea realizou em
parceria com o ISER (Instituto de Estudos da Religião) a pesquisa Cidadania,
Justiça e Violência, entre os anos de 1997 e 1998, com coordenação de José
Murilo de Carvalho.
Referências
BAKTHIN. Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec,
1979.
BITTENCOURT, Circe (org.). Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2005. CARVALHO, José Murilo. A Cidadania na Encruzilhada. In BIGNOTO, N. Pensar a República. Editora da UFMG, 2000. PARANÁ. Diretrizes Curriculares de História, SEED/ Superintendência da Educação, 2007. DRIGO, Maria Ogécia e SOUZA, Luciana Coutinho Pagliarini. A charge política jornalística como processo sígnico. 2006. Disponível em: www.versoereverso.unisinos.br/índex.php?e=7&s=98&@=64-50k Acesso em 28 mai. 2007. MARSON, Adalberto. Reflexões sobre o procedimento histórico. In: SILVA, Marcos Silva (org). Repensando a História. 2. ed. São Paulo: Marco Zero, 1990 MIANI, Rozinaldo Antônio. A utilização da charge na imprensa sindical na década de 80 e sua influência política e ideológica. São Paulo: ECA/USP, 2000. Dissertação de Mestrado SALIBA, Elias Thomé. Raízes do Riso: a representação humorística na história brasileira: da Belle Époque aos primeiros tempos do rádio. São Paulo: Cia. Das Letras, 2002. SINGER, Paul. Cidadania para todos. PINSKY, Jaime e PINSKY, Carla B. História da Cidadania. São Paulo: Contexto, 2005.
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