amiloidose al: investigaÇÃo e prÁtica clinica · 3.6.2. sistema nervoso autónomo ... focada na...
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Mestrado Integrado em Medicina
Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar
Universidade do Porto
AMILOIDOSE AL:
INVESTIGAÇÃO E PRÁTICA CLINICA
DISSERTAÇÃO
ARTIGO DE REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Catarina Azevedo de Araújo Faria
ORIENTADORA
Prof.ª Doutora Luísa Lobato
Porto
2014/2015
2
Catarina Azevedo de Araújo Faria
Nº de aluno: 200900060
Amiloidose AL: investigação e prática clínica
Dissertação de Candidatura ao grau de Mestre em Medicina
submetida ao Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar
ORIENTADORA
Prof.ª Doutora Luísa Lobato
3
ESCOLHA DO TEMA
A área médica foi a opção de fundo da minha tese. Em fevereiro de 2014, altura em
que me candidatei ao Programa Erasmus, discuti com a minha orientadora o tema da
dissertação inicialmente vocacionada para a Nefrologia. Analisámos ainda outras
potenciais áreas de interesse. A minha escolha da Universidade de Pavia para uma
experiência de estudos na Europa foi fundamental para a definição final do tema. O
Hospital Policlinico San Matteo em Pavia (CITASP), como centro de referência em
amiloidose AL, oferecer-me-ia condições para contactar com uma patologia sistémica e
potencial envolvimento renal. A possibilidade de conhecer um centro internacional e
professores dedicados à investigação na amiloidose AL estimulou-me a prosseguir a
revisão bibliográfica, integrando-a em vivência prática.
4
LISTA DE ABREVIATURAS
A: Adquirida
AA: Proteína amilóide constituída por amilóide do soro A
AApoAI: Proteína amilóide constituída por uma variante da apolipoproteína AI
AApoAII: Proteína amilóide constituída por uma variante da apolipoproteína AII
AApoAIV: Proteína amilóide constituída por uma variante da apolipoproteína AIV
ABri: Proteína amilóide constituída por uma variante da ABriPP
ACys: Proteína amilóide constituída por uma variante da cistatina C
AFib: Proteína amilóide constituída por uma variante do fibrinogénio α
AGel: Proteína amilóide constituída por uma variante da gelsolisina
AH: Proteína amilóide constituída por cadeias pesadas monoclonais
AL: Proteína amilóide constituída por cadeias leves monoclonais
ALECT2: Proteína amilóide constituída pelo fator quimiotático de leucócitos 2
Alys: Proteína amilóide constituída por uma variante da lisozima
ATTR: Proteína amilóide constituída por uma variante da transtiretina
ATTRwt: Proteína amilóide constituída por transtiretina tipo selvagem
APTT: Tempo de tromboplastina parcial
Aβ2M: Proteína amilóide constituída por uma variante da β2-microglobulina
BNP: Péptido natriurético auricular tipo B
CDI: Cardiodesfibrilhador implantável
CITASP: Centro per lo Studio e la Cura delle Amiloidosi Sistemiche
CLL: Cadeias leves livres
CM: Componente monoclonal
cTN: Troponinas cardíacas
5
cTnI: Troponina I
cTnT: Troponina T
CyBord: Ciclofosfamida, bortezomib e dexametasona
dCLL: Diferença entre cadeias leves envolvidas e não envolvidas
DLCO: Capacidade de difusão do monóxido de carbono
DNA: Ácido desoxirribonucleico
ECOG: Eastern Cooperative Oncology Group
EDA: Endoscopia digestiva alta
EM: Espe trometria de massa
EMG: Eletromiografia
FA: Fibrilhação auricular
FCM: Fração de contração miocárdica
FE: Fração de ejeção
GMSI: Gamopatia monoclonal de significado incerto
H: Hereditária
h-FTAA: Heptameric formic thiophene acetic acid
IECA: Inibidor da enzima conversora da angiotensina
IMC: Índice de massa corporal
INR: Índice internacional normalizado
MAD: Melfalano em altas doses
MDex: Melfalano e dexametasona
MM: Mieloma Múltiplo
MO: Medula óssea
NT-proBNP: Fração N-terminal do pro-BNP
6
NYHA: New York Heart Association
PET: Tomografia de emissão de positrões
PAS: Pressão arterial sistólica
PIP: Perda intencional de peso
RM: Ressonância magnética
SAP: Componente amilóide P do soro
SNA: Sistema nervoso autónomo
SNC: Sistema nervoso central
SNP: Sistema nervoso periférico
sSTC2: Supressor tumoral solúvel 2
STC1: Estaniocalcinina 1
TACE: Transplante autólogo de células estaminais
TC: Tomografia computorizada
TFG: Débito de filtração glomerular
TP: Tempo de pró-trombina
VE: Ventrículo esquerdo
VM: Volume miocárdico
VS: Volume sistólico
VAD: Vincristina, adriamicina e dexametasona
7
ÍNDICE
Escolha do tema ............................................................................................................... 3
Lista de abreviaturas......................................................................................................... 4
Índice de tabelas ............................................................................................................... 9
Resumo ...........................................................................................................................10
Abstract ...........................................................................................................................11
Metodologia .....................................................................................................................12
1. Introdução .................................................................................................................13
2. Patogénese da amiloidose ........................................................................................15
3. Apresentação clínica da amiloidose AL ....................................................................18
3.1. Rim ................................................................................................................18
3.2. Coração .........................................................................................................19
3.3. Fígado ............................................................................................................20
3.4. Baço ...............................................................................................................20
3.5. Trato gastrointestinal ......................................................................................21
3.6. Sistema nervoso ............................................................................................21
3.6.1. Sistema nervoso periférico .........................................................................21
3.6.2. Sistema nervoso autónomo ........................................................................21
3.7. Sistema respiratório .......................................................................................22
3.8. Tecidos moles e pele .....................................................................................22
3.9. Articulações e músculo ..................................................................................22
3.10. Sistema endócrino .........................................................................................22
3.11. Alterações da coagulação ..............................................................................22
3.12. Amiloidose Localizada ....................................................................................23
4. Diagnóstico ...............................................................................................................24
4.1. Verificação da presença de depósitos amilóides ............................................25
4.2. Tipagem da substância amilóide ....................................................................26
4.3. Avaliação da extensão do dano e disfunção orgânica ....................................28
4.3.1. Coração ......................................................................................................28
4.3.2. Rim .............................................................................................................28
4.3.3. Fígado ........................................................................................................29
8
5. Tratamento ...............................................................................................................30
5.1. Tratamento específico ....................................................................................32
5.1.1. Tratamento de 1ª linha ...............................................................................32
5.1.2. Tratamento de doença refratária e recorrente .............................................34
5.2. Tratamento de suporte ...................................................................................35
5.2.1. Coração ......................................................................................................35
5.2.2. Sistema nervoso autónomo ........................................................................36
5.2.3. Rim .............................................................................................................36
6. Avaliação da Resposta Terapêutica e Prognóstico ...................................................38
7. Relatório de Estágio .................................................................................................43
7.1. Introdução e enquadramento .........................................................................43
7.2. Caracterização do CITASP ............................................................................43
7.3. Descrição das atividades ...............................................................................44
8. Conclusão .................................................................................................................46
Agradecimentos ...............................................................................................................47
Bibliografia .......................................................................................................................48
9
ÍNDICE DE TABELAS
Tabela I............................................................................................................................14
Tabela II...........................................................................................................................30
Tabela III ..........................................................................................................................31
Tabela IV .........................................................................................................................38
Tabela V ..........................................................................................................................40
Tabela VI .........................................................................................................................41
Tabela VII ........................................................................................................................42
10
RESUMO
A amiloidose por cadeias leves de imunoglobulinas (amiloidose AL) resulta da sua
deposição extracelular após assumir a conformação fibrilar. As imunoglobulinas são
produzidas por um clone monoclonal plasmocitário, mais frequentemente associado ao
isotipo lambda. Os depósitos comprometem a arquitetura tecidular, resultando em
disfunção orgânica, e as fibrilas podem assumir toxicidade celular direta. A amiloidose AL
é o tipo de amiloidose sistémica mais frequente nos países desenvolvidos sendo uma
doença que afeta especialmente os adultos com mais de 60 anos.
O caráter sistémico da deposição é responsável por apresentações clínicas
variáveis, muitas vezes inespecíficas e mimetizando outras patologias, sendo o diagnóstico
difícil e, por isso, frequentemente tardio. A variabilidade de apresentação depende do
tropismo orgânico de cada tipo de cadeia leve. O diagnóstico é também atrasado pela
necessidade de comprovar a patologia conjugando a clínica com a histopatologia,
aplicação do estudo proteómico e a investigação genética, etapas fundamentais para
afirmar em definitivo a etiopatogenia da amiloidose sistémica.
O mau prognóstico associado à doença avançada, particularmente a cardíaca,
tornou evidente a necessidade de marcadores precoces do envolvimento e gravidade do
atingimento orgânico. Esta avaliação tem particular interesse no prognóstico, na opção e
na resposta à terapêutica. Na atualidade são selecionados como marcadores de resposta
terapêutica e progressão o NT-proBNP, as troponinas, as cadeias leves livres séricas, o
débito de filtração glomerular e a proteinúria.
O principal objetivo do tratamento é eliminar a proteína monoclonal. As opções
devem ser adaptadas à heterogeneidade de manifestações e gravidade da doença,
associadas à decisão inicial de eleger o doente para o transplante autólogo de células
estaminais. A escolha terapêutica inclui o melfalano oral associado a dexametasona, os
regimes baseados em bortezomib e imunomoduladores, como a lenalidomida, combinados
com dexametasona.
Palavras-chave: amiloidose AL, proteómica, cadeias leves, tratamento, prognóstico,
NT-proBNP
11
ABSTRACT
Immunoglobulin light-chain (AL) amyloidosis results from its fibril-forming
extracellular deposition. Immunoglobulin light-chains, most frequently lambda isotype, are
secreted by an indolent plasma cell clone. Amyloid deposition disrupts tissue architecture
ending in organ dysfunction and direct cellular toxicity is mediated by circulating light-
chains. AL amyloidosis is the most common systemic amyloidosis in developed countries
affecting specially adults after the 50th decade.
Clinical presentation is often variable and unspecific, similar to several other
pathologies, delaying a difficult diagnosis. Light-chain organ tropism determines the clinical
picture. Histopathological evaluation, proteomics and sometimes genetics are fundamental
steps for accurate diagnosis of a systemic amyloidosis. Moreover, in all of its complexity,
are also responsible for a delayed diagnosis.
Advanced disease, associated with poor prognosis, especially with cardiac
evolvement, may be avoided by early disease biomarkers - also crucial determining
prognosis and choice of therapy. NT-proBNP, cardiac troponins, free light-chains,
glomerular filtration rate and proteinuria are the main evaluated parameters during
management of these patients.
Treatment’s main purpose is to eradicate monoclonal protein. The choice of therapy
must be adapted to the degree of organ evolvement and dysfunction ultimately determining
if autologous stem cell transplantation is a valid option. Other choices include oral
melphalan associated with dexamethasone, bortezomib-based regimens and
immunomodulatory drugs, such as lenalidomide, also associated with dexamethasone.
Key-words: amyloidosis AL, proteomics, light chains, treatment, prognosis, NT-proBNP
12
METODOLOGIA
Este trabalho, realizado no âmbito da unidade curricular de
"Dissertação/Projeto/Relatório de Estágio" do Mestrado Integrado em Medicina, consiste
numa dissertação sobre a Amiloidose AL, focada na investigação e prática clínica. Esta
tem como objetivo uma revisão bibliográfica aprofundada, utilizando como base artigos
científicos e publicados em revistas científicas de referência. Numa fase inicial, para melhor
enquadramento do tema, recorreu-se à plataforma de bases de dados UpTodate e
ClinicalKey. Como motor de pesquisa mais aprofundada foi utilizado o PubMed, usando
como palavra-chave “AL amyloidosis”. Complementando o conhecimento teórico foi
desenvolvido um estágio observacional na Universidade de Pavia, mais concretamente no
Centro per lo Studio e la Cura delle Amiloidosi Sistemiche (CITASP), com o grupo de
investigação dirigido pelo Prof. Doutor Giampaolo Merlini. Assim, foram escolhidos
preferencialmente os artigos publicados por este mesmo grupo.
13
1. INTRODUÇÃO
As amiloidoses constituem um grupo de doenças que têm em comum a deposição
extra-celular patológica de fibrilas insolúveis em diversos tecidos e órgãos. Essas fibrilas
têm uma configuração β-pregueada e são detetáveis como birrefringência verde sob luz
polarizada, quando coradas com vermelho do Congo.1–3 À microscopia eletrónica estas
surgem como fibrilas aleatoriamente orientadas, não ramificadas, de 7,5 a 10 nm de
diâmetro.4
Diversos tipos de proteínas – encontram-se descritas mais de 20 - podem formar a
substância amilóide, fator este que permite classificar os diferentes tipos de amiloidose.5
Na Amiloidose AL as fibrilas são compostas por fragmentos de cadeias monoclonais de
baixo peso molecular (geralmente do isotipo lambda). Estas cadeias são geralmente
produzidas por um pequeno clone indolente de plasmócitos.1 Não obstante, a amiloidose
AL pode também surgir associada a Mieloma Múltiplo, apresentação esta menos comum
(15% dos casos), e, mais raramente, a outras doenças linfoproliferativas. Outra
característica utilizada para a classificação das amiloidoses consiste no padrão de
deposição da substância amilóide, sistémico ou localizado.3 A amiloidose AL constitui a
forma sistémica mais comum e grave, na medida em que o atingimento cardíaco,
característico da mesma, condiciona um prognóstico sombrio.1 Das amiloidoses
hereditárias, a mais comum é a mutação na transtirretina, salientando-se a mutação V30M
– substituição do aminoácido valina por metionina, na posição 30 – a primeira a ser
identificada em famílias portuguesas.6 A sequenciação genética deve ser realizada sempre
que é possível amiloidose hereditária; de referir que a história familiar só é sugestiva em
cerca de 50% dos casos por penetrância incompleta.1 Outras amiloidoses hereditárias
surgem por mutações no fibrinogénio, gelsolisina, lisozima e apolipoproteínas AI e AII. A
amiloidose AA (amilóide do soro A) surge no decurso de uma doença inflamatória ou
infeciosa crónica, pelo que o seu tratamento deve ser dirigido à doença que a originou.7,8
A forma mais comum de amiloidose localizada está relacionada com a proteína β-amiloide
e encontra-se no cérebro de indivíduos com doença de Alzheimer.2 A tabela I apresenta
um resumo das amiloidoses sistémicas e do seu percursor proteico, com a nomenclatura
revista em 2014.9
A amiloidose AL pode ser vista como uma doença rara, estimando-se a sua
incidência em 6 a 10 casos/milhão/ano nos Estados Unidos. Sendo uma patologia
essencialmente do adulto e do idoso, toma particular relevância numa população
envelhecida como a ocidental.1,2,7,10,11
14
A complexidade do seu diagnóstico compreende-se pelas vastas apresentações
clínicas possíveis, compostas por sintomas muitas vezes gerais e inespecíficos, que
dependem do grau e número de órgãos afetados.3
Na última década existiram avanços importantes na abordagem terapêutica da
amiloidose, com um aumento significativo da sobrevivência e da qualidade de vida dos
doentes, fruto da aprovação de novos agentes para o tratamento do mieloma múltiplo,
existindo, contudo, ainda carência de trabalho de investigação dirigido à amiloidose em
particular. O atraso no diagnóstico leva à apresentação com envolvimento avançado, por
vezes irreversível dos órgãos-alvo, e reduzida sobrevivência dos doentes. O advento de
novos fármacos, o desenvolvimento do transplante autólogo de células estaminais e
mesmo a indicação para transplantação renal ou cardíaca, enfatiza a importância da
suspeição da patologia nos doentes jovens.7
Tabela I – Amiloidoses sistémicas e nomenclatura atual
Adaptado de Sipe JD et al, Nomenclature 2014: Amyloid fibril proteins and clinical classification of the
amyloidosis, Amyloid. 2014, 21(4):221-4. A – adquirida, H – hereditária, SNC – sistema nervoso central,
SNP – sistema nervoso periférico, SNA – sistema nervoso autónomo
Proteína
Fibrilar Percursor proteico
Adquirida/
Hereditária Órgãos-alvo
AL Cadeias leves de imunoglobulinas A/H Todos exceto o SNC
AH Cadeias pesadas de
imunoglobulinas A Todos exceto o SNC
AA Amilóide do soro A A Todos exceto o SNC
ATTRwt Transtirretina tipo selvagem A Coração (maioritariamente),
ligamentos, tenosinovio
ATTR Variante da transtirretina H SNP, SNA coração, olho,
leptomeninges, raramente rim
Aβ2M Variante da β2-microglobulina H Sistema nervoso autónomo
AapoAI Variante da apolipoproteína AI H
Coração, fígado, rim, SNP,
testículos, pele e laringe
(variantes C terminal)
AApoAII Variante da apolipoproteína AII H Rim
AApoAIV Apolipoproteína AIV tipo
selvagem A Medula renal e sistémica
AGel Variante da gelsolisina H SNP e córnea
Alys Variante da lisozima H Rim
ALECT2 Fator quimiotático de leucócitos 2 A Rim
AFib Variante do fibrinogénio α H Rim
Acys Variante da cistatina C H SNP e pele
ABri Variante da ABriPP H SNC
15
2. PATOGÉNESE DA AMILOIDOSE
Uma das características chave da amiloidose é a aquisição de uma estrutura
anormal numa proteína que normalmente é solúvel. A alteração da estrutura origina uma
proteína com tendência à agregação. Os agregados formam protofilamentos que se
associam em fibrilas amilóides, numa estrutura β-pregueada.3 Assim, a amiloidose resulta
da acumulação de várias proteínas fibrilares insolúveis a nível tecidual e orgânico, numa
extensão que afeta a função.
Apesar de uma proteína percursora ser essencial à formação da substância
amilóide, esta não é o único constituinte da mesma. Todas as fibrilas possuem um
componente P associado a elas, que deriva do componente amilóide P do soro (SAP) e se
liga à substância amilóide, independentemente da proteína que a originou. Esta
propriedade é a base dos exames radiomarcados com SAP para deteção de depósitos
amilóides. Este componente está muito protegido contra a proteólise contribuindo para a
resistência à degradação da substância amilóide. São também comuns
glicosaminoglicanos que interagem promovendo a formação de fibrilas e a sua estabilidade
nos tecidos. Não obstante, a deposição não é irreversível, pois resulta do balanço entre a
produção dos percursores amilóides e a sua reabsorção.
Figura 1: Formação da substância amilóide Fonte: Folding versus aggregation: Polypeptide conformations on competing pathways. Arch Biochem Biophys.
2008 Jan 1; 469(1):100-117
Os mecanismos exatos que determinam a acumulação da substância amilóide nos
tecidos requerem ainda elucidação. Interações específicas com os glicosaminoglicanos
dos tecidos, ou recetores de superfície celular, podem ser importantes na determinação do
tropismo por determinados órgãos. Está demonstrado tropismo particular pelo rim pelas
cadeias leves tipo λ. Na amiloidose AL, o reconhecimento de determinados constituintes
16
dos tecidos (por exemplo, colagéneo) pelas cadeias leves, pode determinar a
especificidade da deposição tecidual. A acumulação de grandes quantidades de material
fibrilar pode alterar a arquitetura tecidular com consequente disfunção orgânica.12
Evidência recente sugere que as proteínas percursoras da substância amilóide, ou
agregados das mesmas, têm efeito citotóxico direto que também contribui para as
manifestações da doença. A primeira pista para a existência deste mecanismo na
amiloidose AL foi o surgimento de acentuadas melhorias nas funções cardíaca e renal,
bem como da neuropatia periférica, após a supressão da produção de cadeias leves
amiloidogénicas pela quimioterapia.
Além disso, observação clínica de doentes com cardiomiopatia amiloidótica revelou
pouca relação entre a dimensão da infiltração por substância amilóide e o grau de
disfunção cardíaca. De facto, foi demonstrada diminuição nos valores de NT-proBNP
(principal marcador de disfunção cardíaca) associada à redução da concentração de
cadeias leves no soro, pós-quimioterapia, mesmo na ausência de alterações nos depósitos
amilóides miocárdicos, avaliados ecocardiograficamente. Assim, o percursor amilóide
neste tipo de amiloidose representa um papel central na disfunção orgânica, exercendo
citotoxicidade direta nas células cardíacas.5 A primeira evidência direta deste mecanismo
patogénico foi a descoberta da ativação da via p38MAPK minutos após a exposição a
cadeias leves amiloidogénicas.13 Posteriormente, observou-se que a estaniocalcinina1
(STC1), associada a stress oxidativo e mediadora da apoptose, se encontra sobre-
expressa no tecido cardíaco e a sua produção é induzida nas mesmas pela presença de
cadeias leves amiloidogénicas, através de ativação da via p38MAPK, com subsequente
dano mitocondrial. O mesmo não ocorre com cadeias leves não-amiloidogénicas. A STC1
surge assim como possível alvo terapêutico, apesar de serem necessários mais estudos
para uma melhor definição da fisiopatologia envolvida.14
Na amiloidose AL as fibrilas derivam principalmente dos resíduos N-terminal dos
aminoácidos da região variável das cadeias leves das imunoglobulinas. As características
das cadeias leves de imunoglobulinas, que as tornam propensas à formação de fibrilas
amilóides, constituem o isotipo λ e o subgrupo de variabilidade VλVI (uma família homóloga
de regiões variáveis das cadeias leves). Os domínios variáveis das cadeias leves V(L),
incluindo as cadeias amiloidogénicas, sofrem mutações durante a resposta imune; sendo
que algumas destas podem afetar locais essenciais à conformação normal, surgindo
proteínas instáveis e propensas à agregação.
Como no caso da amiloidose AL, as amiloidoses cuja proteína percursora se
encontra no plasma são fruto de uma suscetibilidade intrínseca à aquisição de uma
conformação anormal, que se torna mais evidente com o envelhecimento ou pelo aumento
17
da concentração da mesma (amiloidoses adquiridas), ou são formas mutantes, como na
amiloidose ATTR (amiloidoses hereditárias).
Apesar da infiltração medular ser subtil, a amiloidose AL partilha diversas alterações
cromossómicas numéricas com patologias como a GMSI e o MM, nomeadamente deleções
13q14 e t(11;14), pertencendo ao espetro das doenças proliferativas de plasmócitos.11 Por
outro lado, a prevalência desta patologia entre os doentes com discrasias de plasmócitos
tem aumentado pela maior sobrevida dos mesmos, decorrente da eficácia das novas
terapias disponíveis.5
De referir um artigo publicado em abril do corrente ano (Benson et al), que descreve
um caso de amiloidose AL hereditária. O isolamento e caracterização da cadeia leve tipo κ
do soro de um indivíduo afetado, revelou uma mutação na região constante da cadeia leve
κ, com substituição de cisteína por serina no aminoácido 131, que foi posteriormente
confirmada em análise de DNA. Trata-se de uma descoberta importante na medida em que
estes casos não constituem uma discrasia de plasmócitos e mal diagnosticados levam à
realização de quimioterapia desnecessária.15
18
3. APRESENTAÇÃO CLÍNICA DA AMILOIDOSE AL
Com a ocorrência de deposição da substância amilóide a nível sistémico, a
apresentação clínica é extremamente variável. Virtualmente, qualquer órgão ou tecido
pode ser atingido, com exceção do sistema nervoso central.7
A dispneia e a fadiga são os sintomas mais frequentemente referidos, ambos
inespecíficos e vagos, conduzindo muitas vezes a um atraso no diagnóstico.10
De referir que o surgimento de sintomas indica já um dano orgânico importante,
salientando-se a importância do uso de biomarcadores sensíveis o suficiente para detetar
dano orgânico pré-sintomático. Especial atenção deve ser dada a indivíduos com GMSI e
rácio de cadeias leves livres anormal, pois encontram-se em maior risco de desenvolver
amiloidose.
O envolvimento orgânico mais comum verifica-se a nível renal e cardíaco, isolada
ou simultaneamente.
3.1. RIM
Aquando da apresentação inicial, dois terços dos doentes têm atingimento renal.
De referir que a ausência de envolvimento renal na apresentação inicial torna diminuta a
probabilidade de este órgão vir a ser envolvido.
A acumulação de substância amilóide no rim manifesta-se clinicamente como
síndrome nefrótico – proteinúria nefrótica constituída maioritariamente por albumina –
associada a diminuição da função renal em 50% dos casos.16 Tal facto deve-se à
acumulação predominantemente a nível glomerular, comum à maior parte das amiloidoses,
com comprometimento da membrana glomerular.4 Uma pequena percentagem de doentes
(10%) pode sofrer acumulação de substância amilóide a nível vascular e tubulointersticial
renal, apresentando assim um quadro de disfunção renal sem proteinúria significativa.17 As
figuras 2 e 3 demonstram acumulação de substância amilóide no rim, através de diversas
colorações em que a mesma assume características específicas.
A avaliação da microalbuminúria e do débito de filtração glomerular (TFG) nos
indivíduos em risco permite identificar os doentes numa fase precoce de deposição de
substância amilóide. Evidência recente demonstra que o dano renal é reversível se a
intervenção for precoce (proteinúria <5g/24h e a TFG>60mL/min).8
19
Figura 2 – A substância amilóide apresenta tipicamente uma aparência eosinofílica quando corada com
hematoxilina-eosina (A), cora fracamente pelo PAS (B), cora negativamente com a prata (C) e apresenta uma
coloração azulada no tricrómio (D)
Fonte: Khalighi MA et al, Amyloid Nephropathy, Clin Kidney J. 2014 Apr;7(2):97-106.
Figura 3 – Coloração com vermelho do Congo (A) demonstra depósitos amorfos globalmente no mesângio e
nas paredes dos capilares. Sob luz polarizada (B) o material demonstra birrefringência verde, comprovando a
presença de substância amilóide
Fonte: Khalighi MA et al, Amyloid Nephropathy, Clin Kidney J. 2014 Apr;7(2):97-106.
3.2. CORAÇÃO
Cerca de metade dos doentes surge com atingimento cardíaco na apresentação
inicial. Este condiciona uma cardiomiopatia restritiva, manifestando-se clinicamente por
insuficiência cardíaca.10 As paredes ventriculares encontram-se espessadas
concentricamente com cavidades diminuídas ou normais; a fração de ejeção pode ser
normal ou encontrar-se ligeiramente diminuída, mas o comprometimento do enchimento
ventricular limita o débito cardíaco.18 No ecocardiograma são evidentes as características
de cardiomiopatia restritiva, sendo de salientar a aparência hiperecogénica do miocárdio,
descrita como brilhante. Eletrocardiograficamente é comum um padrão de baixa voltagem,
20
muitas vezes associado também a um padrão de pseudo-enfarte.18 Além disso, a infiltração
do músculo cardíaco pode condicionar o surgimento de distúrbios do ritmo, sob a forma de
arritmias ventriculares ou supra-ventriculares. A substância amilóide pode também afetar
as artérias coronárias, maioritariamente intramurais, podendo ser observado todo o espetro
clínico da doença arterial coronária.19–21
3.3. FÍGADO
A presença de hepatomegalia pode surgir, tanto no contexto de insuficiência
cardíaca congestiva, como por acumulação de substância amilóide. Na segunda, é
possível ao exame físico detetar à palpação um fígado endurecido não depressível.
Laboratorialmente, é típica a elevação marcada da fosfatase alcalina associada a elevação
ligeira das transaminases, sem alterações sugestivas de insuficiência hepática.22 Contudo,
existem descritos casos raros de hepatite colestática que pode resultar em insuficiência
hepática com hipertensão portal, acompanhada de hematomas subcapsulares e rutura
espontânea do fígado.
Um artigo publicado por Cichoż-Lach et al relata um caso de amiloidose AL
manifestado por hepatomegalia, perda ponderal e mal estar geral. Este caso revelou na
biópsia hepática uma deposição de substância amilóide ao longo dos sinusóides, espaço
de Disse, paredes vasculares e tecido conjuntivo dos espaços portais, que constitui o
padrão típico de deposição. A figura 4 mostra o aspeto histológico de uma biópsia de fígado
afetado com amiloidose.23
Figura 4 – Depósitos de substância amilóide entre os sinusóides e hepatócitos com atrofia dos últimos
Fonte: Cichoż-Lach H et al, Hepatomegaly, weight-loss and general malaise – the first manifestations of primary
systemic amyloidosis, Prz Gastroenterol. 2014;9(1):57-61.
3.4. BAÇO
O envolvimento esplénico é constante e, na maior parte das vezes, assintomático.
Em doentes com acumulação exuberante observam-se sinais de hipoesplenismo (corpos
21
de Howell-Joly) no esfregaço sanguíneo, associados frequentemente a trombocitopenia.
Existem também descritos alguns casos de rutura espontânea do baço.
3.5. TRATO GASTROINTESTINAL
O envolvimento do trato gastrointestinal é comum – observado em 80% das
biópsias do estômago (Figura 5) ou reto – e frequentemente assintomático. A
sintomatologia habitual inclui comprometimento do trânsito intestinal, podendo também
contribuir para esta o envolvimento do sistema nervoso autónomo, bem como, hemorragia
oculta. Num espetro de complicações mais grave, podem surgir quadros de mal-absorção,
perfuração, hemorragia ou obstrução intestinal aguda.10
Figura 5 – Depósitos anelares de substância amilóide rodeiam os capilares da mucosa gástrica.
A – hematoxilina-eosina, B – vermelho do Congo
Fonte: Cichoż-Lach H et al, Hepatomegaly, weight-loss and general malaise – the first manifestations of primary
systemic amyloidosis, Prz Gastroenterol. 2014;9(1):57-61.
3.6. SISTEMA NERVOSO
3.6.1. SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO
O atingimento do sistémico nervoso periférico está presente em 20% dos doentes
com amiloidose AL e caracteriza-se por uma polineuropatia sensitivomotora periférica,
dolorosa e lentamente progressiva, semelhante à neuropatia diabética.
3.6.2. SISTEMA NERVOSO AUTÓNOMO
A neuropatia autonómica, que pode surgir isoladamente, ou associada a neuropatia
periférica, manifesta-se com gastroparesia, diarreia ou obstipação, impotência e, muito
frequentemente, é responsável por hipotensão postural grave e incapacitante, com
22
necessidade de períodos de decúbito prolongados, representando elevado impacto na
sobrevida.
3.7. SISTEMA RESPIRATÓRIO
A doença a nível pulmonar é caracterizada pela infiltração intersticial de substância
amilóide, cuja expressão clínica depende da difusão e localização dos depósitos. A
insuficiência respiratória rapidamente progressiva pode surgir com o envolvimento
broncoalveolar e aparentemente é mais frequente em doentes com paraproteinemia IgM.
A presença de nódulos pulmonares isolados está associada a doença localizada.
3.8. TECIDOS MOLES E PELE
O envolvimento dos tecidos moles origina macroglossia, síndrome do túnel cárpico,
nódulos na pele, artropatia, alopecia, distrofia ungueal, hipertrofia das glândulas
submandibulares, púrpura peri-orbitária e rouquidão. Salienta-se que a macroglossia,
apesar de presente numa minoria dos doentes, é muito típica da amiloidose AL.
Encontram-se assim descritas uma série de lesões a nível da pele, desde o típico
hematoma periorbital já referido a pápulas, nódulos e máculas e, excecionalmente,
vesículas ou bolhas, localizadas na face e tronco.
3.9. ARTICULAÇÕES E MÚSCULO
Articularmente pode surgir poliartropatia bilateral, simétrica e progressiva, que
atinge os dedos, pulsos, ombros e joelhos. A substância amilóide pode infiltrar a bainha
dos tendões criando o clássico sinal shoulder pad. Quando esta invade o músculo o doente
apresenta uma aparência pseudo-atlética, comumente associada a cardiopatia amilóide.
3.10. SISTEMA ENDÓCRINO
Estão descritos casos raros de endocrinopatias, como hipotiroidismo e insuficiência
adrenal, provocados por acumulação de substância amilóide nas glândulas, em doentes
com amiloidose AL.16
3.11. ALTERAÇÕES DA COAGULAÇÃO
Por fim, a amiloidose está bem associada a complicações hemorrágicas, fruto de
deficiências nos fatores de coagulação (maioritariamente do X, menos frequentemente do
V ou IX) com aumento da fibrinólise.24–26
23
3.12. AMILOIDOSE LOCALIZADA
Alguns doentes apresentam uma forma localizada de amiloidose AL, resultado da
deposição da substância amilóide num local próximo à sua produção por um clone focal de
plasmócitos. A maior parte destes indivíduos não possui evidência de gamopatia
monoclonal. A bexiga, trato urinário, sistema respiratório, globo ocular e pele, são os
principais locais associados a esta forma de amiloidose.10
Um artigo publicado em 2013 por Raja et al, descreve um caso raro de amiloidose
localizada na bexiga. O doente, do sexo masculino e com 56 anos de idade, apresentava
hematúria recorrente (há 3 meses) e intermitente (1 a 2 episódios/semana) sem outra
sintomatologia associada, apresentação esta típica, apesar de alguns doentes poderem
apresentar sintomas maioritariamente irritativos. Esta patologia surge geralmente entre a
sexta e oitava décadas e representa um desafio diagnóstico pela sua semelhança a uma
neoplasia infiltrativa da bexiga. A figura 6 apresenta os resultados obtidos na biópsia
realizada por cistoscopia. Os depósitos da substância amilóide geralmente encontram-se
na lâmina própria e atingem principalmente as paredes laterais ou posteriores da bexiga,
resultados semelhantes foram encontradas no doente em questão.
Tal como esperado, o rácio de cadeias leves livres encontrava-se normal, bem
como todos os outros exames realizados, destinados a excluir amiloidose AL sistémica,
MM e outras neoplasias comumente associadas a amiloidose.27
Figura 6 – A. Coloração Hematoxilina e Eosina de biópsia da bexiga demonstra depósitos nodulares de
material hialiano e acelular na lamina (setas) B. Coloração com prata mostra a coloração negativa do material
hialino (setas).
Fonte: Raja K, Ahmed E, Mubarak M, Iqbal T, Hassan SM, Primary localized amyloidosis of urinary bladder: a
case report and review of literature, Nephrourol Mon. 2013, 5(5):994-6.
24
4. DIAGNÓSTICO
O diagnóstico de amiloidose AL é muitas vezes tardio, fruto da sintomatologia
inespecífica e vaga da mesma. O facto da presença de sintomatologia indicar um dano
orgânico grave, que condiciona mau prognóstico, realça a importância do diagnóstico
precoce.3 Tal tem particular relevância nos doentes que se encontram em risco,
nomeadamente, doentes com gamopatia monoclonal de significado incerto (GMSI)
(particularmente os que apresentam alteração do rácio к:λ), em que a deteção de
albuminúria deve levantar a suspeição de amiloidose AL (figura 7).8 A associação de
síndrome nefrótico e insuficiência cardíaca, neuropatia periférica e autonómica simultâneas
em doentes não diabéticos ou critérios ecocardiográficos de hipertrofia ventricular
esquerda sem evidência eletrocardiográfica consistente, são outros exemplos de situações
clínicas que devem levantar a suspeição desta patologia.1 Alguns doentes com amiloidose
cardíaca não diagnosticada e uma percentagem de plasmócitos na medula óssea <10%,
podem vir a ser referenciados a um hematologista com o diagnóstico de MM “atípico”, pois
a fadiga é atribuída a anemia ligeira e a infiltração cardíaca não é reconhecida pela
manutenção da fração de ejeção, normalidade da silhueta cardíaca e atribuição do
espessamento ventricular a hipertrofia e não a infiltração.2
Figura 7 – Espetro das possíveis progressões da GMSI
Fonte: Merlini G, Determining the significance of MGUS, Blood. 2014, 123(3):305-7.
De referir que a deposição de substância amilóide é contínua no tempo, bem como
os danos por ela causada, não sendo de todo irrelevante o intervalo decorrente até ao
25
início do tratamento, especialmente no que diz respeito à amiloidose AL, a amiloidose
sistémica com evolução mais rápida.8
Outra das dificuldades no diagnóstico desta patologia reside na ausência de um
único teste imagiológico, ou de outra modalidade, que realize o diagnóstico definitivo. A
tomografia de emissão de positrões (PET) com 18F-florbetapir – aprovada na doença de
Alzheimer – está sob investigação como possível exame diagnóstico de imagem nos
doentes com depósitos sistémicos de substância amilóide.2
O diagnóstico de amiloidose envolve três etapas principais, a primeira consiste na
verificação da presença de depósitos amilóides nos tecidos; posteriormente é necessário
determinar qual o tipo de substância amilóide e, finalmente, avaliar a extensão do
dano/disfunção orgânica.8
4.1. VERIFICAÇÃO DA PRESENÇA DE DEPÓSITOS AMILÓIDES
A demonstração da presença de depósitos amilóides requer a realização de biópsia
tecidual e posterior coloração com vermelho do Congo para visualização das amostras à
microscopia ótica com luz polarizada – depósitos amilóides apresentam birrefringência
verde (figura 8).8,12 A biópsia de agulha fina de gordura abdominal subcutânea é um
procedimento simples e relativamente pouco invasivo, positivo para depósitos amilóides
em mais de 70% dos doentes com amiloidose AL.3 Outros tecidos que permitem realização
de biópsia menos invasivamente são as glândulas salivares menores – método utilizado se
elevada suspeição clínica e biópsia de gordura abdominal subcutânea negativa - gengiva,
reto e pele.1,28 Contudo, por vezes pode ser necessária a realização de biópsia de um
órgão-alvo afetado; nestes casos deve existir avaliação da hemostase, pois na amiloidose
AL são comuns anomalias da coagulação (mais comum o défice de fator X) que aumentam
substancialmente o risco hemorrágico associado à realização de biópsia. Na presença de
biópsia positiva em qualquer órgão, o nível de envolvimento do mesmo é definido por
parâmetros clínicos, laboratoriais e imagiológicos, consistentes com lesão provocada por
acumulação de substância amilóide.8
Apesar de ser usada há várias décadas, a coloração de vermelho de Congo pode
facilmente originar resultados falso-positivos ou falso-negativos se realizada em centros
menos experientes. Um estudo recentemente publicado, realizado por Sjölander et al,
comparou a coloração h-FTAA (heptameric formic thiophene acetic acid) com o vermelho
do Congo e concluiu que a primeira é mais sensível que a segunda, apesar de ter uma
especificidade baixa. Sendo a deteção precoce uma premissa fundamental nas
amiloidoses sistémicas, a elevada sensibilidade deste método de coloração, associada à
sua fácil aplicação na prática clínica, torna-o uma ferramenta de diagnóstico promissora.29
26
Figura 8: Biópsia de gordura abdominal corada com vermelho do Congo. Birrefringência verde da substância
amilóide quando sob luz polarizada (direita). Fonte: Halloush R A et al, Diagnosis and typing of systemic amyloidosis: The role of abdominal fat pad fine
needle aspiration biopsy. CytoJournal 2009, 6:24 (15 January 2010)
4.2. TIPAGEM DA SUBSTÂNCIA AMILÓIDE
Uma vez comprovada a presença de substância amilóide é necessário determinar
qual a proteína percursora, de forma a classificar a amiloidose, pela abordagem terapêutica
distinta inerente a cada tipo.1 Apesar de existirem variações na apresentação clínica das
várias amiloidoses, não é possível realizar um diagnóstico definitivo sem recorrer a exames
de diagnóstico que identifiquem inequivocamente o subtipo. Além disso, a importância da
instituição da terapêutica correta o mais precocemente possível torna compreensível a
necessidade absoluta de um diagnóstico preciso. Os métodos histológicos tradicionais,
baseados em identificação com anticorpos, através da microscopia ótica por
imunohistoquímica ou imunofluorescência, possuíam algumas desvantagens (o
processamento das proteínas depositadas leva a alterações na conformação que podem
condicionar a não deteção das mesmas pelos anticorpos - que foram desenvolvidos para
as proteínas nativas - e estas técnicas só podem ser informativas se entre os anticorpos
usados se encontrarem os dirigidos à proteína amilóide presente na amostra), apesar de
poderem ser otimizados se realizados por laboratórios de referência.8,30 Assim, o advento
da proteómica revolucionou o método de tipagem da substância amilóide. Foram
desenvolvidos alguns métodos baseados na proteómica, sempre assentes na identificação
da proteína por espetrometria de massa (EM) (figura 9).31–34 A técnica mais amplamente
utilizada consiste na seleção das áreas amilóide-positivas por microdisseção com laser
com posterior realização de EM.35 No final deste processo o patologista determina o subtipo
de amilóide pela lista de proteínas identificadas, considerando as espécies amiloidogénicas
mais abundantes detetadas ao longo das várias microdisseções. Outro método, também
utilizado em diversos laboratórios de referência, consiste na identificação dos depósitos
proteicos no tecido todo, ou seja, sem seleção prévia das zonas amilóide-positivas. O
27
princípio que suporta esta abordagem é a presença de maior abundância proteica nos
indivíduos afetados, em relação aos não afetados. Assim, a tipagem obtém-se por
comparação do perfil proteico dos doentes com perfis proteicos de referência de tecidos
controlo (obtidos de indivíduos não afetados).36 Ambos os processos possuem fases
morosas, apesar de em etapas distintas, sendo o objetivo futuro maior simplificação e
rapidez dos mesmos.8
A identificação de cadeias leves amiloidogénicas requer a combinação de
imunofixação do soro e da urina com quantificação das cadeias leves (rácio к:λ).37 Mesmo
sendo identificadas cadeias leves monoclonais no soro e/ou urina, a biópsia de medula
permanece necessária para exclusão de mieloma múltiplo ou outras gamopatias
monoclonais menos comuns, como por exemplo, macroglobulinemia de Waldenström.38
Na amiloidose AL, a infiltração medular geralmente é modesta (mediana de 5-10%) e os
clones λ dominam os к por 4:1, contrariamente à proporção de 2:3 encontrada no MM. Se
a imunofixação do soro e da urina é negativa e o rácio de cadeias leves livres é normal, a
amiloidose AL é pouco provável e não é necessária a realização de mais exames, exceto
se o nível de suspeição clínica for muito alto.2
Uma banda monoclonal na imunofixação do soro e/ou urina de indivíduos com mais
de 70 anos pode constituir apenas um achado acidental em 5-10% dos doentes – GMSI. A
distinção desta entidade de outras discrasias de plasmócitos reside na ausência de dano
orgânico. Contudo, o facto de todas serem doenças prevalentes nos idosos, que possuem
muitas vezes diversas comorbilidades, pode tornar complexa a determinação da etiologia
dos danos orgânicos encontrados.3,39
Figura 9: Espetrometria de massa com a identificação de diversos tipos de amiloidose Fonte: Sanjeev Sethi, Julie A Vrana, Jason D Theis, Nelson Leung, Anjali Sethi et al., Laser microdissection
and mass spectrometry-based proteomics aids the diagnosis and typing of renal amyloidosis. Kidney International, Apr 11, 2012
28
4.3. AVALIAÇÃO DA EXTENSÃO DO DANO E DISFUNÇÃO ORGÂNICA
Assim, surge a última etapa diagnóstica, a avaliação dos danos orgânicos
presentes.
4.3.1. CORAÇÃO
O envolvimento cardíaco pode ser evidente pela presença de sintomatologia ou
alterações ecocardiográficas e eletrocardiográficas típicas, já referidas. A Ressonância
Magnética (RM) cardíaca pode identificar depósitos amilóides em doentes com espessura
ventricular esquerda (VE) normal.40 Contudo, o ideal será a sua deteção no estadio pré-
sintomático, recorrendo a biomarcadores, como o NT-proBNP, BNP e troponinas.18 Na
presença de valores de NT-proBNP inferiores a 332ng/L o envolvimento cardíaco pode ser
excluído. Por outro lado, valores superiores a 332ng/L são sugestivos do mesmo e surgem
antes de qualquer manifestação clínica e ecográfica. No entanto, existem outras patologias
(fibrilhação auricular e insuficiência renal, por exemplo) que podem ser responsáveis pelo
aumento deste marcador. A presença de insuficiência renal moderada a grave obriga a
uma interpretação mais cuidada, com adaptação dos valores de cutoff, pois a clearence
dos péptidos natriuréticos é dependente da função renal e a sua concentração aumenta na
insuficiência renal. De facto, em doentes com doença renal terminal deve ser preferido o
uso do BNP, apesar de ser um marcador menos sensível de amiloidose cardíaca pois
existem doentes com valores normais, ou abaixo do cutoff definido, e com atingimento
cardíaco.41
4.3.2. RIM
O diagnóstico de amiloidose renal requer a confirmação da presença de substância
amilóide por biópsia ou, na impossibilidade da realização da mesma, a presença de
proteinúria superior a 0,5g/dia, predominantemente constituída por albumina, associada a
evidência histológica de substância amilóide de outro tecido.42 Quando realizada biópsia
renal em doentes com envolvimento renal, esta é positiva para depósitos amilóides em
80% dos casos. Estes surgem predominantemente no mesângio e ao longo da membrana
glomerular. Depósitos vasculares e intersticiais também são observados com frequência,
mas raramente isolados.4 A avaliação do atingimento renal deve também incluir o cálculo
da TFG de forma a determinar a repercussão na função renal.8
29
4.3.3. FÍGADO
Como referido anteriormente, o envolvimento hepático é também comum. Valores
de fosfatase alcalina 1,5 vezes superiores ao limite superior do normal é critério
estabelecido de envolvimento hepático.42
O esquema 1 representa, em forma de resumo, um algoritmo possível para a
avaliação diagnóstica de um doente com amiloidose AL confirmada histologicamente.43
Esquema 1 – Algoritmo para avaliação diagnóstica de doente com amiloidose AL
Adaptado de Weber N et al, Management of systemic AL amyloidosis: recommendations of the Myeloma
Foundation of Australia Medical and Scientific Advisory Group, Intern Med J. 2015, 45(4):371-82.
CLL – cadeias leves livres, MO – medula óssea, TFG – débito de filtração glomerular, APTT – tempo de
tromboplastina parcial, TP – tempo de pró-trombina, INR – índice internacional normalizado, RM – ressonância
magnética, EMG – eletromiografia, EDA – endoscopia digestiva alta, TC – tomografia computorizada,
SAP – Amilóide do soro A
30
5. TRATAMENTO
A abordagem terapêutica tem dois pressupostos principais: melhoria da disfunção
orgânica e aumento da sobrevida, com a cessação da produção do percursor da proteína
amilóide. Assim, o objetivo da terapêutica é a supressão do clone de células plasmáticas
responsáveis pela produção de cadeias leves monoclonais. A decisão terapêutica deve ter
sempre em consideração a dicotomia eficácia/tolerabilidade do tratamento. De facto, o
tratamento da amiloidose tem que ser adaptado à heterogeinidade de manifestações e
gravidade da doença, que resultam em padrões distintos de atingimento e disfunção
orgânica. Em suma, indivíduos de baixo risco beneficiam de terapia agressiva, enquanto
que os de alto risco devem ser tratados com terapias menos agressivas mas que,
simultaneamente, atuem rapidamente. Os critérios que definem os grupos de risco estão
descritos na Tabela II. 1,3,10
Tabela II – Definição dos grupos de risco na amiloidose AL
BAIXO RISCO ALTO RISCO RISCO INTERMÉDIO
Deve respeitar todos os
seguintes critérios:
Idade≤65 anos
cTn dentro dos níveis
de referência
FE>45%
PAS em ortostatismo
>90mmHg
DLCO>50%
Performance status
(ECOG)<3
TFG>50mL/minx1.73m2
Basta possuir um dos
seguintes critérios:
cTnI>0,1ng/mL ou
cTnT>0,035ng/mL
Performance status
(ECOG)≥3, desde
que não exista
envolvimento do SNA
Todos os doentes que não
podem ser incluídos nos
grupos de baixo ou alto risco
Adaptado de Terapia dell’amiloidosi AL sistemica – Linee Guida 2011. cTn – troponinas cardíacas, FE – fração
de ejeção, PAS – pressão arterial sistólica, DLCO – capacidade de difusão do monóxido de carbono,
ECOG - Eastern Cooperative Oncology Group, TFG – débito de filtração glomerular, cTnI – troponina I,
cTnT – troponina T, SNA – sistema nervoso autónomo
31
Tabela III – Escala performance status (ECOG)
Grau Eastern Cooperative Oncology Group (ECOG)
0 Totalmente ativo, capaz de manter todo o desempenho pré-doença sem restrições.
1 Restrito em atividade física extenuante, porém capaz de realizar um trabalho de natureza
leve ou sedentária, por exemplo, as tarefas de casa leves, o trabalho de escritório.
2 Doente em ambulatório e capaz de todo o autocuidado, mas incapaz de realizar
quaisquer atividades de trabalho. De pé ≥50% das horas de vigília.
3 Capaz de autocuidado mas com limitação, confinado a uma cama ou cadeira ≥50% das
horas de vigília.
4 Completamente incapacitado. Incapaz de autocuidado. Permanentemente confinado a
uma cama ou cadeira.
5 Falecido
Adaptado de Oken M, Creech R, Tormey D, et al. Toxicity and response criteria of the Eastern Cooperative
Oncology Group.AM J CLIN ONCOL. 1982;5:649-655.
Um estudo recente, publicado na revista Amyloid, avaliou o valor prognóstico da
quantificação semiautomática do encurtamento do longo eixo ventricular esquerdo, um
parâmetro facilmente obtido na ecografia. Este foi obtido logo na avaliação inicial e
demonstrou ser um preditor independente de sobrevida logo no primeiro ano após o
diagnóstico. Este estudo veio atribuir a este parâmetro ecocardiográfico um possível valor
na estratificação de risco dos doentes recentemente diagnosticados com amiloidose AL.44
Teoricamente, qualquer tratamento que tenha mostrado eficácia no mieloma
múltiplo ou outras doenças linfoproliferativas pode ser usado na amiloidose.10 É com base
neste pressuposto que os doentes são tratados, pois não existem fármacos aprovados
especificamente para o tratamento da amiloidose.7 Contudo, os doentes com amiloidose
AL não possuem uma neoplasia hematológica, mas sim dano orgânico funcional, que os
deixa extremamente frágeis e mais suscetíveis à toxicidade da quimioterapia. Posto isto,
não existindo evidência suficiente para ser definido qual o melhor tratamento, sempre que
possível os doentes devem ser inseridos nos ensaios clínicos que se encontram a
decorrer.45
Com o tratamento pretende-se a aquisição de uma resposta hematológica,
idealmente completa, ou parcial muito boa, a primeira claramente associada a aumento
significativo da sobrevida e qualidade de vida.10 A aquisição de uma resposta hematológica
completa tem um impacto muito distinto na amiloidose AL, comparando com o MM. Uma
baixa quantidade de cadeias leves de imunoglobulinas circulantes é suficiente para a
formação de substância amilóide e subsequente acumulação orgânica, pelo que uma
resposta hematológica completa é um fator prognóstico essencial. De facto, uma resposta
completa num doente com amiloidose AL representará uma sobrevida média de 113
32
meses, enquanto que num doente com MM corresponderá a uma sobrevida média de 59,5
meses. Tal diferença deve-se provavelmente à natureza não proliferativa da amiloidose
AL, pois as recaídas desenvolvem-se mais lentamente.2
A resposta hematológica completa é definida por (todos os critérios têm que estar
presentes): ausência de componente monoclonal no soro e na urina na eletroforese com
imunofixação; rácio de cadeias leves livres no plasma normal; biópsia de medula óssea
com <5% de plasmócitos e sem predominância clonal à imunohistoquímica.3
Uma vez que o seguimento dos doentes, com avaliação da resposta à terapêutica,
é realizado através da concentração de cadeias leves livres circulantes e dos
biomarcadores cardíacos (NT-proBNP e troponinas cardíacas), os níveis basais destes
devem ser obtidos antes do início da terapêutica.46
5.1. TRATAMENTO ESPECÍFICO
5.1.1. TRATAMENTO DE 1ª LINHA
O transplante autólogo de células estaminais (TACE), associado a melfalano em
altas doses (MAD), deve ser considerado em doentes de baixo risco, dado o aumento de
sobrevida que pode ser adquirido. A seleção adequada dos doentes aptos a este
tratamento permite reduzir a mortalidade relacionada com o transplante a menos de 5%.
Os critérios de elegibilidade são os seguintes: cTnT<0,06ng/mL; NT-proBNP<5000ng/L;
idade<65 anos; performance status entre 0 e 2; fração de ejeção>45%; PAS>90mmHg
(medida em pé) e DLCO>50%.47,48 A dose de melfalano utilizada pode ser adaptada (100,
140, ou 200mg/m2) consoante a idade e as funções renal e cardíaca.10 Se usada uma dose
atenuada deve ser realizada consolidação com bortezomib ou talidomida, pois aumenta
substancialmente a taxa de respostas hematológicas completas, com consequente
aumento da sobrevida (é atingida uma sobrevida média de 8 anos).43 Infelizmente, apenas
uma pequena percentagem de doentes (20-25%) possui as características necessárias à
realização deste tratamento.2
A maior parte dos doentes inclui-se no risco intermédio e benefecia de tratamentos
com quimioterapia combinada. De facto, foi demonstrada eficácia semelhante à do
TACE/MAD com regimes de melfalano associado a dexametasona (MDex) ou vincristina
associada a adriamicina e dexametasona (VAD).49,50 Os regimes com MDex obtêm muitas
vezes respostas hematológicas completas que são duradouras, mantendo-se durante 3
anos em pelo menos 70% dos doentes, com baixos níveis de toxicidade. Um estudo
realizado por Palladini et al, obteve 76% de respostas hematológicas e uma sobrevida
33
média de 7,4 anos, em doentes que toleravam melfalano em altas doses. A resposta dos
doentes de alto risco a este regime não é satisfatória – sobrevida média de apenas 20
meses.51
Diversos estudos têm demonstrado resultados encorajadores com o uso de novos
agentes, como a talidomida ou a lenalidomida e o bortezomib.52–57 A combinação destes
agentes com dexametasona induz resposta hematológica num curto espaço de tempo na
maior parte dos doentes. Regimes com talidomida associada a ciclofosfamida e
dexametasona parecem obter resultados semelhantes aos obtidos com MDex, enquanto
que a combinação de lenalidomida com MDex aumenta ligeiramente a percentagem de
respostas hematológicas.52,53 Relativamente ao bortezomib, as respostas obtidas com
toxicidade reduzida e em relativamente pouco tempo de tratamento, tornam-no útil no
tratamento de doentes em alto risco, que necessitam de resultados rápidos.1,58–60 Existem
vários regimes que incluem este fármaco, sendo o mais recomendado nos doentes de alto
risco uma associação de dexametasona a bortezomib em baixas doses, com aumento
progressivo e controlado das mesmas, de forma a evitar toxicidade, nomeadamente
retenção hídrica ou arritmias induzidas por dexametasona, ou a diminuição brusca da
fração de ejeção que pode ocorrer, ocasionalmente, em doentes com cardiomiopatia
amiloidótica avançada, com o bortezomib.10 Outra combinação já estudada foi a de
ciclofosfamida, bortezomib e dexametasona (CyBorD), aplicada em doentes com estadio
III da Mayo Clinic para a amiloidose cardíaca, tendo sido obtido 68% de respostas
hematológicas, 42% completas ou parciais muito boas, resultando em 32% de respostas a
nível cardíaco.61
O esquema 2 representa um algoritmo de tratamento possível nos doentes
diagnosticados com amiloidose.
34
Esquema 2 – Algoritmo de tratamento dos doentes com amiloidose AL. TACE – transplante autólogo de células
estaminais, MAD – melfalano em altas doses, MDex – melfalano e dexametasona
5.1.2. TRATAMENTO DE DOENÇA REFRATÁRIA E RECORRENTE
A escolha dos fármacos a utilizar depende do tratamento prévio realizado e das
manifestações clínicas do doentes em questão. Na doença recorrente, se a primeira
remissão foi prolongada, pode ser tentada a re-aquisição de resposta com a terapêutica
usada em primeira linha. Os regimes com bortezomib são os preferidos em doentes que
ainda não foram expostos a este fármaco e não possuem neuropatia grave.45
O principal problema no tratamento destes doentes reside no desenvolvimento de
envolvimento cardíaco grave, o que reduz muito as opções terapêuticas e prevê um
prognóstico sombrio.1
Foram realizados, por Palladini et al, dois estudos distintos com doentes resistentes
a melfalano, bortezomib e talidomida. O primeiro, publicado em 2011, utilizou um regime
de lenalidomida (15mg nos dias 1-21) e dexametasona (20mg nos dias 1, 8, 15 e 22), tendo
sido realizado o ajuste necessário das doses à função renal do doente. Este tratamento foi
capaz de ultrapassar a resistência criada aos tratamentos anteriores, com níveis de
toxicidade aceitáveis. Apesar de não terem existido respostas completas, daqueles que
atingiram a resposta parcial (41%), estimou-se que 90% estariam vivos dali a 2 anos. O
segundo, publicado em 2012, utilizou um regime com ciclofosfamida, lenalidomida e
35
dexametasona. Foi obtida resposta hematológica em 62% dos doentes, uma delas
completa. A sobrevida média foi de 3 anos e este aumento da sobrevida foi relacionado
com a existência de resposta hematológica. Contudo, mais de metade dos doentes
sofreram efeitos adversos, tendo sido o mais comum a neutropenia. Assim, a adição de
ciclofosfamida permitiu aumentar a percentagem de respostas hematológicas, mas
aumentou a toxicidade sofrida.56,62
Novos fármacos estão atualmente em estudo, o que poderá permitir aumentar as
opções terapêuticas.1
5.2. TRATAMENTO DE SUPORTE
Independentemente do tratamento específico dirigido à discrasia de plasmócitos, é
necessário tratamento de suporte para diminuição de sintomas e suporte de órgãos
afetados.
5.2.1. CORAÇÃO
No que diz respeito ao tratamento da cardiomiopatia amiloidótica, este consiste na
restrição salina e administração de diuréticos, que deve ser cuidadosa, pela dificuldade em
atingir o equilíbrio entre controlo da insuficiência cardíaca e depleção de volume
intravascular; principalmente nos doentes com concomitante envolvimento do sistema
nervoso autónomo ou envolvimento renal com síndrome nefrótico. A resistência ao
tratamento diurético é comum nos doentes com síndrome nefrótico, sendo necessária a
associação de metolazona ou espironolactona aos diuréticos de ansa. Além disso, os
doentes com diminuição do volume sistólico podem beneficiar da diminuição de pós-carga
obtida com inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECAs). Contudo, a utilização
destes agentes requer cuidado (iniciar com baixa dose) pelo possível desenvolvimento de
hipotensão postural, que requer o abandono desta terapêutica. A digoxina geralmente não
tem um papel no tratamento da cardiomiopatia amiloidótica, exceto talvez nos doentes com
fibrilhação auricular (FA) com resposta ventricular rápida. A disfunção contrátil auricular é
comum e constitui indicação para terapia anticoagulante, mesmo da ausência de FA. Os
bloqueadores dos canais de cálcio devem ser evitados pois podem piorar a insuficiência
cardíaca da cardiomiopatia amiloidótica. Doentes com síncopes de repetição podem
requerer a implantação de pacemaker; as arritmias ventriculares geralmente são tratadas
com amiodarona e, em doentes selecionados, com CDI. O papel do transplante cardíaco
tem sido muito limitado pela natureza sistémica e rapidamente progressiva da doença,
idade avançada dos doentes e complicações relacionadas com o tratamento. Um doente
36
com amiloidose AL, elegível para transplante cardíaco, teria de ter as seguintes
características: <60 anos, estadio III da Mayo Clinic para amiloidose cardíaca, classe III ou
IV da New York Heart Association (NYHA) após terapia diurética adequada, boa função
renal e hepática, neuropatia autonómica não significativa, baixa percentagem de
plasmócitos na medula óssea e ainda ser elegível para TACE após o transplante cardíaco.
Estudos demonstraram que com a seleção adequada de candidatos este método
proporciona melhor prognóstico e aumento da sobrevida. Porém, esta abordagem é
também limitada pela disponibilidade de dadores.18–20,63,64
5.2.2. SISTEMA NERVOSO AUTÓNOMO
A hipotensão ortostática pode ser grave e difícil de tratar. O uso de meias de
compressão elástica e midodrina pode ser útil. A fludrocortisona geralmente não é uma
boa opção pela retenção hídrica que causa. Perfusão contínua de norepinefrina foi relatada
como um tratamento de sucesso nos casos refratários ao tratamento convencional.
Nos doentes com envolvimento do sistema nervoso autónomo a diarreia é um
problema comum e muito incapacitante, o uso de octreótido pode diminuir este sintoma em
muitos doentes, mas a pseudo-obstrução intestinal crónica é refratária ao tratamento. A
suplementação nutricional oral ou intravenosa adequada é sempre mandatária nos doentes
subnutridos. A dor neuropática é muito difícil de controlar – a gabapentina como tratamento
é bem tolerada mas muito frequentemente ineficaz.3,43
5.2.3. RIM
O tratamento de suporte para a amiloidose com atingimento renal, bem como para
outras causas de síndrome nefrótico, inclui a restrição salina, tratamento diurético e
tratamento da hiperlipidemia. Os IECAs, como já referido, devem ser usados com cuidado,
além disso, não foi provado que desacelerassem o processo de disfunção renal. Tanto a
hemodiálise como a diálise peritoneal são utilizadas na doença renal terminal associada à
amiloidose. A seleção do melhor método de diálise deve ter em conta a existência ou não
de fragilidade hemodinâmica, ou sintomas gastrointestinais, como saciedade precoce. À
semelhança do papel do transplante cardíaco, também o papel do transplante renal é
limitado. Similarmente, o sucesso desta abordagem depende da seleção adequada dos
doentes. Bom performance status, ausência de envolvimento clinicamente relevante de
outros órgãos ou aquisição de resposta completa ou parcial muito boa com quimioterapia
associada ou não a TACE, constituem os principais critérios necessários à elegebilidade
37
dos doentes. De referir a importância de uma avaliação cardíaca exaustiva, que, como já
discutido, pode ser difícil pela influência da insuficiência renal nos marcadores
cardíacos.3,65,66
38
6. AVALIAÇÃO DA RESPOSTA TERAPÊUTICA E PROGNÓSTICO
Apesar da abordagem terapêutica da amiloidose ter sido construída com base nos
conhecimentos adquiridos com o MM, o seu prognóstico é definido por parâmetros
distintos. A eficácia terapêutica é determinada pela cessação de produção de cadeias leves
monoclonais, bem como, pelo bloqueio e possível reversão dos danos orgânicos
existentes. A cardiomiopatia amiloidótica constitui a principal causa de morte nestes
doentes e a gravidade da disfunção cardíaca é o principal fator prognóstico. Deste modo,
a medição direta do percursor amiloidogénico – as cadeias leves livres (CLL) – e a
avaliação minuciosa da função cardíaca através dos biomarcadores, NT-proBNP e
troponinas, representa um bom método de estadiamento dos doentes.67–70
Desde de 2003, vários estudos demonstraram um aumento da sobrevida associado
a redução da concentração das CLL e melhoria da função cardíaca (avaliada através do
NT-proBNP).71,70,69,68,72 Contudo, apenas em 2012 foi publicado um estudo que permitiu
identificar e validar quais os critérios de resposta hematológica que melhor discriminam
grupos prognóstico (Tabela IV).
Tabela IV – Resposta hematológica
RESPOSTA HEMATOLÓGICA CRITÉRIO
Resposta completa Imunofixação negativa do soro e da urina
Rácio CLL normal
Resposta parcial muito boa dCLL < 40mg/dL
Resposta parcial dCLL com diminuição > 50%
Sem resposta
Adaptado de Palladini G et al, New criteria for response to treatment in immunoglobulin light chain amyloidosis
based on free light chain measurement and cardiac biomarkers: impact on survival outcomes, J Clin Oncol. 2012, 30(36):4541-9. CLL – cadeias leves livres, dCLL – diferença entre cadeias leves envolvidas e não envolvidas
O estudo referido, realizado por Palladini et al, identificou e validou critérios de
resposta hematológica e cardíaca a terapia de 1ª linha, com base na sua associação com
a sobrevida.
Os dados obtidos demonstraram que a qualidade da resposta na quantidade de
CLL está estrita e diretamente relacionada com a sobrevida. A concentração absoluta após
quimioterapia, e não a percentagem de redução, constitui o melhor indicador,
independentemente do valor inicial observado. Contrariamente ao que ocorre no MM, mas
consistente com os mecanismos patológicos recentemente identificados na amiloidose AL,
a resposta na quantidade de CLL correlacionou-se melhor com a sobrevida do que a
resposta no componente monoclonal (CM). De facto, doentes com resposta no CM que
39
não obtiveram resposta na quantidade de CLL, não obtiveram melhoria na sobrevida. Este
constitui mais um dado consistente com a toxicidade celular direta das CLL. O estudo
revelou também que a resposta hematológica ao fim de 3 meses de tratamento já prevê a
sobrevida, o que possibilita uma avaliação precoce da eficácia terapêutica, permitindo
assim alteração precoce da terapêutica nos casos não-responsivos.
Outras conclusões obtidas neste mesmo estudo dizem respeito ao biomarcador NT-
proBNP. As alterações no mesmo são as que melhor definem a resposta ou progressão da
disfunção cardíaca, com aumentos ou diminuições significativas a demonstrar forte
correlação com alterações na sobrevida. Além disso, uma resposta no NT-proBNP foi
associada à qualidade da resposta hematológica. Também este marcador pode ser
avaliado ao fim de 3 meses, o que permite, mais uma vez, alterações terapêuticas precoces
nos casos não-responsivos. Como já referido, a clearence do NT-proBNP depende quase
exclusivamente da sua filtração a nível glomerular, portanto, este foi validado como
marcador de resposta e progressão do envolvimento renal em doentes com insuficiência
renal. Contudo, a presença de insuficiência renal afeta a capacidade deste marcador em
avaliar a resposta cardíaca e predizer a sobrevida. Posto isto, o NT-proBNP não deve ser
utilizado como marcador de progressão e resposta cardíacas em doentes que sofrem
agravamento da sua insuficiência renal.
Outros biomarcadores amplamente usados na avaliação do atingimento cardíaco
na amiloidose AL são as troponinas (T ou I). O aumento de 33% nas mesmas está
associado a pior percurso da doença, constituindo mais um bom marcador para o follow-
up da disfunção cardíaca. Ambas as troponinas, ou seja T ou I, representam o mesmo valor
prognóstico.
O critério tradicional de avaliação de resposta cardíaca, uma redução de 2mm do
septo interventricular (SIV), não mostrou neste estudo benefício na sobrevida. Além disso
não foi demonstrada correlação entre alterações no NT-proBNP e diminuição do SIV,
sugerindo baixa correlação entre o grau de disfunção cardíaca e a dimensão da deposição
de substância amilóide. Outros critérios que se demonstraram válidos na avaliação da
resposta cardíaca são a resposta na classe New York Heart Association (NYHA) e o
agravamento da fração de ejeção (FE). Não obstante, é necessário ter em atenção a
subjetividade da classificação do NYHA, pelo que se deve preferir o uso dos
biomarcadores. De referir que a melhoria na classe NYHA foi sempre associada a resposta
no NT-proBNP. Os critérios com valor prognóstico que podem ser utilizados na avaliação
cardíaca, bem como a sua interpretação, encontram-se resumidos na Tabela V.73
40
Tabela V – Critérios de resposta e progressão cardíaca com valor prognóstico
CRITÉRIO INTERPRETAÇÃO
NT-proBNP
Resposta cardíaca: diminuição >30% e >300ng/L se valor de base
≥650ng/L
Progressão: aumento >30% e >300ng/L
cTn Progressão: aumento ≥33%
Classe NYHA Resposta cardíaca: diminuição ≥ a 2 classes, se classe de base 3 ou 4
FE Progressão: diminuição ≥ 10%
Adaptado de Palladini G et al, New criteria for response to treatment in immunoglobulin light chain amyloidosis
based on free light chain measurement and cardiac biomarkers: impact on survival outcomes, J Clin
Oncol. 2012, 30(36):4541-9. cTn – troponinas cardíacas; FE – fração de ejeção
Contudo, um estudo, realizado por Tendler et al, publicado no corrente ano na
revista Amyloid, veio questionar a utilidade da FE na determinação da sobrevida. De facto,
é sabido que a mesma se pode manter normal ou preservada, apesar da diminuição
existente no volume sistólico (VS) que acompanha a progressão da doença, mesmo em
estadios avançados, pela diminuição no volume da câmara cardíaca ser progressiva. A
fração de contração miocárdica (FCM) é definida pela razão entre o VS sobre o volume
miocárdico (VM) e constitui uma medição volumétrica do encurtamento miocárdico. Uma
vez que a amiloidose cardíaca resulta em diminuição progressiva do encurtamento
miocárdico, o estudo referido pôs como hipótese uma maior utilidade da FCM em relação
à FE. Os resultados obtidos revelaram que a FCM é um importante fator preditor de
sobrevida, ao invés da FE, que não o é. O fato de este ser um parâmetro facilmente
calculado através de medidas ecográficas facilita a sua utilização futura em grande escala.
De referir que este estudo tem como principal limitação uma amostra pequena, sendo
necessários estudos de maiores dimensões que confirmem a validade estatística do
mesmo.74
Novos biomarcadores cardíacos estão a ser estudados, principalmente os que
representam um mecanismo fisiopatológico distinto do dos marcadores atualmente
utilizados, com o intuito de adicionar valor prognóstico. Um estudo publicado no corrente
ano, realizado pela equipa de investigação da Mayo Clinic, avaliou a utilidade de dois
biomarcadores em doentes com amiloidose AL, a galactina-3 e o supressor tumoral solúvel
2 (sST2), pois a sua validade prognóstica havia sido demonstrada em doentes com doença
arterial coronária estável, enfarte do miocárdio e insuficiência cardíaca congestiva. Ambos
mostraram valor prognóstico, apesar de apenas o sST2 ser independente das troponinas,
NT-proBNP, CLL e PAS. O sST2 constitui assim um novo biomarcador com valor
prognóstico adicional, na medida em que este representa fibrose miocárdica, as troponinas
refletem necrose miocárdica e o NT-proBNP estiramento do miocárdio.75
41
Existem também definidos critérios de resposta a nível renal e hepático, que se
encontram resumidos na Tabela VI. Não existem definidos critérios para avaliação de
resposta no que diz respeito ao atingimento do sistema nervoso periférico, incluindo o
sistema nervoso autónomo.46
Tabela VI – Critérios de resposta renal e hepática
Avaliação Renal Avaliação Hepática
Resposta: redução ≥50% na
proteinúria (que deve ser no mínimo
0,5g/24h antes do início da terapia)
Progressão: redução na
TFG≥25mL/minx1,73m2 e aumento da
concentração de creatinina de pelo
menos 0,5g/dL
Pelo menos um dos seguintes critérios para a
existência de resposta hepática:
Redução ≥2cm na dimensão do
fígado, avaliada através de TC ou
ecografia abdominais
Redução ≥50% da fosfatase alcalina
Adaptado de Terapia dell’amiloidosi AL sistemica – Linee Guida 2011. TFG – débito de filtração glomerular,
TC – tomografia computorizada
A resposta renal foi também relacionada com a sobrevida em geral. Um estudo
realizado por Leung et al, verificou que, apesar de uma redução >50% na proteinúria
parecer estar associada a melhoria da sobrevida, esta só ocorria verdadeiramente em
doentes com diminuições >75% na proteinúria. Além disso, uma melhoria mais acentuada
na sobrevida foi encontrada nos doentes com reduções >95% na proteinúria, o que sugere
que diferentes níveis de resposta originam diferentes impactos na sobrevida. Por fim,
observou-se que um aumento de 25% na creatinina sérica não possui impacto negativo
nos doentes que atingiram diminuição >75% na proteinúria. Tal pode significar que a
diminuição na proteinúria >75% representa recuperação do rim em relação aos efeitos da
acumulação do substância amilóide, pelo que o aumento da creatinina não será fruto da
amiloidose AL, levando a um diferente impacto na sobrevida. Outra interpretação para este
resultado pode ser que a diminuição >75% na proteinúria consegue ultrapassar o efeito
negativo do aumento da creatinina. Estes resultados, se confirmados em larga escala,
podem originar uma nova definição de resposta renal, sendo que os autores sugerem a
apresentada na Tabela VII.76
42
Tabela VII – Nova definição de resposta renal sugerida por Leung et al
RESPOSTA RENAL COMPLETA Diminuição >95% na proteinúria
RESPOSTA RENAL PARCIAL Diminuição >75% na proteinúria
RESPOSTA RENAL MÍNIMA Diminuição >50% na proteinúria
Adaptado de Leung N et al, A detailed evaluation of the current renal response criteria in AL amyloidosis: is it
time for a revision?, Haematologica. 2013, 98(6):988-92.
A demonstração da subnutrição como fator prognóstico em diversas doenças
agudas e crónicas, com impacto na qualidade de vida, grau de tolerância aos tratamentos
(por exemplo, quimioterapia), aumento na morbilidade e mortalidade, levou ao estudo do
impacto da mesma nos doentes com amiloidose AL.77
A subnutrição é uma comorbilidade comum nos doentes diagnosticados com
amiloidose AL. O seu fator prognóstico na amiloidose AL está demonstrado, mas
inicialmente foi também associado a envolvimento cardíaco, o que sugeria possível
interação entre ambos os fatores. Um estudo publicado em 2014 veio clarificar a
associação entre estado nutricional, grau de envolvimento cardíaco e mortalidade nos
doentes com amiloidose AL. Assim, tanto um Índice de Massa Corporal (IMC) <22kg/m2,
como uma perda intencional de peso (PIP) ≥10%, constituem fatores independentes
associados a maior taxa de mortalidade (subnutrição moderada). Estes dois fatores,
quando associados (subnutrição severa) estão associados a um risco semelhante de maior
mortalidade, do que quando analisados independentemente. Este estudo revelou também
que o efeito da subnutrição na taxa de mortalidade é independente do estadio de
envolvimento cardíaco - apesar de este se manter como principal fator prognóstico - e da
resposta hematológica. O IMC e a PIP constituem dados fáceis de obter de forma
económica e rápida e não requerem interpretações particulares, pelo que devem ser
determinados em todos os doentes com amiloidose AL desde a primeira consulta.78,79 De
referir que, outro estudo, publicado em 2011, revelou que o estado nutricional é também
um fator independente na determinação da qualidade de vida dos doentes com amiloidose
AL desde o momento do diagnóstico.80
43
7. RELATÓRIO DE ESTÁGIO
7.1. INTRODUÇÃO E ENQUADRAMENTO
Este relatório é realizado no âmbito do Projeto/Dissertação de Mestrado Integrado
em Medicina, sobre o tema “Amiloidose AL”. Consiste na descrição do estágio
observacional realizado, durante o período de mobilidade Erasmus, no Centro per lo Studio
e la Cura delle Amiloidosi Sistemiche (CITASP), no ano letivo 2014/2015.
A motivação para a realização do estágio surge pela oportunidade única de
contactar com um centro de referência a nível internacional, bem como os seus métodos
de trabalho e investigação, no que diz respeito a uma doença, que pela sua baixa
prevalência, carece do mesmo.
Entre os principais objetivos do estágio constam os seguintes: observação e
compreensão do método de funcionamento do centro; contacto com os métodos de
diagnóstico clínico da amiloidose AL, assim como, o trabalho realizado a nível laboratorial.
7.2. CARACTERIZAÇÃO DO CITASP
O CITASP foi fundado em 1986 e a sua sede está localizada no hospital
universitário Policlinico San Matteo. Este centro é reconhecido como de referência em
doenças raras na região da Lombardia e possui estreitas colaborações com diversos
centros a nível internacional. São avaliados anualmente cerca de 2000 doentes com
amiloidose.
O centro funciona em regime ambulatório, com recolha de informação clínica e
realização dos exames diagnósticos necessários ao estabelecimento do diagnóstico e
decisão terapêutica. Se necessário pode ser realizada consulta de cardiologia e/ou
nutrição. Existe colaboração estreita com o Policlinico San Matteo, pelo que na
necessidade de internamento este é realizado no serviço de Medicina Interna ou de
Oncologia do mesmo.
Os doentes são referenciados de toda a Itália, além disso, como centro de
referência a nível internacional, recebe também inúmeros pedidos de avaliação a doentes
tanto europeus, como não-europeus. A observação anual de vários doentes com
amiloidose, a sua inclusão em diversos ensaios clínicos, bem como a investigação clínica
e laboratorial continuamente realizadas, resultaram na publicação de cerca de 200 artigos
em revistas internacionais, com impacto direto no tratamento desta patologia.
O centro de Pavia coordena o grupo de estudo italiano para a amiloidose, uma rede
de 62 serviços e instituições de pesquisa espalhados por todo o território nacional, que
constituem pontos de atendimento qualificado e de fácil acesso para os doentes. A
44
atividade do grupo é regulada por um protocolo de diagnóstico e terapêutica comum, que
é discutido e atualizado a cada dois anos. Estudos realizados demonstram que a
abordagem multicêntrica, coordenada pelo grupo de Pavia, é viável e rentável para os
pacientes com amiloidose. Além disso, colabora com algumas das instituições
internacionais mais importantes para o estudo e tratamento da amiloidose. Os projetos
conjuntos são realizados com a Mayo Clinic (EUA), com o l'Amyloid Treatment and
Research Program da Faculdade de Medicina da Universidade de Boston (EUA), com a
Unidade de Amiloidose do Instituto de Biologia Molecular e Celular do Porto (Portugal) e
com o National Amyloidosis Centre em Londres (Reino Unido).
7.3. DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES
As atividades no CITASP foram divididas em duas vertentes principais: o trabalho
desenvolvido na clínica e o trabalho desenvolvido a nível laboratorial.
O trabalho na clínica é, como já referido, em regime ambulatório e consiste em
consultas de avaliação e seguimento de doentes já diagnosticados ou com suspeita de
amiloidose, bem como, em consultas de seguimento dos doentes inseridos em ensaios
clínicos. Tive a oportunidade de assistir a diversas consultas realizadas pelo Prof. Doutor
Giovanni Palladini; sempre estruturadas em duas fases essenciais, colheita pormenorizada
de história clínica com posterior realização de exame físico dirigido. Diversos doentes são
referenciados ao centro por outros clínicos sob suspeita de amiloidose, nos casos em que
a suspeição clínica é de facto elevada, procede-se à realização dos exames diagnósticos
necessários, nomeadamente, biópsia de gordura abdominal periumbilical, biópsia de
medula óssea, colheita de sangue e urina para análise e, se pertinente, avaliação cardíaca
incluindo realização de eletro e ecocardiograma. De facto, uma das manhãs de estágio foi
dedicada à observação da avaliação cardiológica, o que me permitiu visualizar diversos
aspetos ecográficos, desde o normal até ao aspeto clássico de deposição de substância
amilóide, passando por alterações fruto de cardiopatia isquémica e hipertensiva, bem
como, diversas valvulopatias (a maior parte de etiologia provavelmente degenerativa pela
faixa etária elevada da maior parte dos doentes). Também na consulta de avaliação
cardiológica pude observar diversos eletrocardiogramas e os aspetos típicos neles
observados nos doentes com amiloidose AL.
A observação do trabalho realizado na clínica possibilitou maior familiarização com
a apresentação clínica dos doentes com amiloidose, bem como com os principais
procedimentos diagnósticos realizados. O surgimento desta doença maioritariamente em
faixas etárias avançadas, em doentes que possuem muitas vezes diversas comorbilidades,
pode tornar os achados clínicos de difícil interpretação, mesmo por clínicos experientes e
45
familiarizados com a patologia em questão. Todos os casos que surgiam, principalmente
os mais complexos, eram discutidos com o Prof. Doutor Giampaolo Merlini, pela sua vasta
experiência e conhecimento na área em questão. Realça-se também a importância dos
métodos laboratoriais pois são, de facto, os mais precisos e essenciais ao diagnóstico
definitivo.
A segunda vertente do estágio foi, portanto, o contacto com o trabalho desenvolvido
a nível laboratorial pela Prof.ª Doutora Francesca Lavatelli. Uma das atividades consistia
na interpretação dos resultados obtidos nas eletroforeses com imunofixação do soro e da
urina dos doentes, tanto para efeitos diagnósticos, como para seguimento. Nos doentes
com atingimento renal, foi possível observar na urina a presença de proteinúria constituída
maioritariamente por albumina. A dificuldade na interpretação reside na baixa concentração
do componente monoclonal que gera por vezes bandas muito ténues, salientando-se a
importância da existência de centros de referência com profissionais experientes para
otimização da sensibilidade e especificidade das técnicas utilizadas. Outra das atividades
realizadas foi a observação de amostras coradas com vermelho do Congo à microscopia
ótica com luz polarizada. Também a nível laboratorial são realizadas análises genética e
proteómica com recurso a espetrometria de massa.
46
8. CONCLUSÃO
Vários avanços têm sido feitos ao longo dos últimos anos no âmbito da amiloidose,
tanto na compreensão da fisiopatologia da mesma, como na avaliação dos melhores
marcadores pré-sintomáticos e de prognóstico e novas opções terapêuticas.
O advento de diversos marcadores prognóstico, que permitem também avaliar a
resposta à terapêutica, nomeadamente a nível de disfunção orgânica, possibilita uma
vigilância apertada dos doentes e mudança precoce de terapia quando esta se revela
ineficaz. Tal é de extrema importância pela necessidade absoluta de melhoria na função
dos órgãos afetados para aumento da sobrevida e da qualidade de vida.73
O principal desafio reside ainda em armas de diagnóstico precoce, pois é sabido
que na presença de doença avançada, especialmente se a nível cardíaco, o prognóstico é
sombrio e as hipóteses terapêuticas limitadas. Pela baixa prevalência da doença
dificilmente se justificarão exames de rastreio na população geral, mas estes são fulcrais
nas populações de alto risco – doentes com GMSI e rácio de CLL alterado.1
A aprovação de diversos fármacos para o tratamento do MM permitiu o uso dos
mesmos na amiloidose AL, contudo, características exclusivas dos doentes com
amiloidose (atingimento multi-orgânico e maior fragilidade à toxicidade dos tratamentos
disponíveis) traduzem diferente eficácia. Estudos específicos e em grande escala são
necessários para reunir evidência necessária à determinação da melhor opção terapêutica.
O futuro residirá numa abordagem multifacetada que atue bloqueando os diversos
mecanismos patogénicos envolvidos – cessação da produção do percursor amilóide,
prevenção da formação de agregados fibrilares e indução da reabsorção das fibrilas.1,2,10
47
AGRADECIMENTOS
Um especial agradecimento à Prof.ª Doutora Luísa Lobato, ICBAS, Universidade
do Porto, pela sua disponibilidade e imprescindível orientação. Agradeço a toda a equipa
do Centro per lo Studio e la Cura delle Amiloidosi Sistemiche – do Hospital Policlinico San
Matteo, Pavia, particularmente à Prof.ª Doutora Francesca Lavatelli e ao Prof. Doutor
Giovani Palladini pela constante disponibilidade e simpatia ao longo da realização de todo
o estágio.
48
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Na elaboração desta tese não incorri em plágio (ato pelo qual o indivíduo, mesmo por omissão,
assume a autoria de um determinado trabalho intelectual, ou parte dele). Mais declaro que o retirado
de trabalhos anteriores pertencente a outros autores foi devidamente referenciado. As tabelas e
algoritmos apresentados possuem a citação da fonte bibliográfica. No caso de adaptação da tabela
ao atual trabalho esta metodologia também é nomeada.