algumas figuras de linguagem

4
Figuras de Linguagem Metáfora Leia esses versos de Chico Buarque: “Sua boca é um cadeado E meu corpo é uma fogueira”. Observe que o eu lírico mantém uma relação de similaridade entre os termos “boca” e “cadeado”, de modo que as características do “cadeado” (fechado) sejam atribuídas à “boca”. O mesmo ocorre entre os termos “corpo” e “fogueira” (ambos são quentes). Existe aqui uma transferência da significação própria de uma palavra, no caso aqui “cadeado” e “fogueira”, para outra significação quem lhe convém graças a uma comparação existente no espírito do autor, ou seja, acontece de maneira implícita. A isso chamamos metáfora. Veja outros exemplos de metáfora: “O samba é o pai do prazer O samba é filho da dor”. (Caetano Veloso) Nesses versos, o poeta faz referência a duas informações inerentes ao samba. Como “pai do prazer”, refere-se ao espírito festivo e contagiante que envolve a dança; como “filho da dor”, remete-nos a refletir sobre a origem do ritmo, dando ênfase ao sofrimento da raça negra desde o primeiro contato com o homem branco. Os versos a seguir, de Cecília Meireles, apresentam um tipo diferente de metáfora: “Pelos vales de teus olhos de claras águas antigas meus sonhos passando vão”. Neste caso, “águas” e “vales” mantém uma relação de similaridade, fazendo-nos entender que os olhos de quem o eu lírico se refere estão marejados de lágrimas. Nesse caso, a metáfora aconteceu por substituição, ou seja, o vocábulo “águas” foi empregado no lugar de “vales”, evitando a repetição e adicionando mais um sentido a ela. Em suma, metáfora é a figura de linguagem que consiste em empregar uma palavra num sentido que não lhe é comum ou próprio, numa relação de semelhança entre dois termos. Antítese Leia os versos abaixo de Charly Garcia: “O sonho de um céu e de um mar E de uma vida perigosa Trocando o amargo pelo mel E as cinzas pelas rosas Te faz bem tanto quanto mal Faz odiar tanto quanto querer.”

Upload: orlando-brandao

Post on 29-Nov-2015

49 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Algumas Figuras de Linguagem

Figuras de Linguagem

Metáfora

Leia esses versos de Chico Buarque:

“Sua boca é um cadeadoE meu corpo é uma fogueira”.

Observe que o eu lírico mantém uma relação de similaridade entre os termos “boca” e “cadeado”, de modo que as características do “cadeado” (fechado) sejam atribuídas à “boca”. O mesmo ocorre entre os termos “corpo” e “fogueira” (ambos são quentes).

Existe aqui uma transferência da significação própria de uma palavra, no caso aqui “cadeado” e “fogueira”, para outra significação quem lhe convém graças a uma comparação existente no espírito do autor, ou seja, acontece de maneira implícita. A isso chamamos metáfora.

Veja outros exemplos de metáfora:

“O samba é o pai do prazerO samba é filho da dor”.

(Caetano Veloso)

Nesses versos, o poeta faz referência a duas informações inerentes ao samba. Como “pai do prazer”, refere-se ao espírito festivo e contagiante que envolve a dança; como “filho da dor”, remete-nos a refletir sobre a origem do ritmo, dando ênfase ao sofrimento da raça negra desde o primeiro contato com o homem branco.

Os versos a seguir, de Cecília Meireles, apresentam um tipo diferente de metáfora:

“Pelos vales de teus olhosde claras águas antigasmeus sonhos passando vão”.

Neste caso, “águas” e “vales” mantém uma relação de similaridade, fazendo-nos entender que os olhos de quem o eu lírico se refere estão marejados de lágrimas. Nesse caso, a metáfora aconteceu por substituição, ou seja, o vocábulo “águas” foi empregado no lugar de “vales”, evitando a repetição e adicionando mais um sentido a ela.

Em suma, metáfora é a figura de linguagem que consiste em empregar uma palavra num sentido que não lhe é comum ou próprio, numa relação de semelhança entre dois termos.

Antítese

Leia os versos abaixo de Charly Garcia:

“O sonho de um céu e de um marE de uma vida perigosaTrocando o amargo pelo melE as cinzas pelas rosasTe faz bem tanto quanto malFaz odiar tanto quanto querer.”

Observe que o eu lírico emprega palavras que se opõem quanto ao seu sentido: “céu” se opõe a “mar”, “amargo” a “mel”, “bem” a “mal”, “odiar” a “querer”, com a finalidade de construir o sentido a partir do confronto entre idéias opostas. O mesmo acontece nesses versos de Vinícius de Morais:

Page 2: Algumas Figuras de Linguagem

“Tristeza não tem fim,Felicidade, sim.”

Há quem confunda “antítese” com “paradoxo”. A diferença reside, entretanto, na maneira como esses opostos se relacionam. Na antítese, temos duas teses contrárias, antônimas:

“Estou acordado e todos dormem, todos dormem, todos dormem”.(Monte Castelo, Renato Russo)

Enquanto o eu lírico está acordado, os outros serem dormem. Seria um exemplo de paradoxo se a mesma construção estivesse da seguinte maneira:

“Estou dormindo acordado”.

Neste caso, temos um exemplo de paradoxo, já que a oposição de idéias se dá num mesmo referente.

Portanto, antítese é a figura de linguagem que consiste em construir um sentido através do confronto de idéias opostas.

Paradoxo

Leia atentamente os versos a seguir:

“Amor é fogo que arde sem se verÉ ferida que dói e não se senteÉ um contentamento descontenteÉ dor que desatina sem doer”.

(Camões)

Nestes versos, percebe-se que o poeta constrói o sentido do Amor-idéia, amor universal, filosofando a respeito do amor, não falando de seus sentimentos pessoais. Para isso, ele se apropria de elementos que, apesar de se excluírem mutuamente, se fundem num mesmo referente, constituindo afirmações aparentemente sem lógica.

Esse mesmo efeito de contradição acontece neste trecho de Carlos Drummond de Andrade:

“Eu fujo ou não sei não, mas é tão duro este infinito espaço ultra fechado”.

Observe que a afirmação sublinhada contraria o consenso, englobando simultaneamente duas idéias opostas. A esse tipo de figura de expressão chamamos paradoxo.

Há quem confunda paradoxo com antítese. Apesar de serem parecidas, elas se diferenciam por que no paradoxo a oposição se funde num mesmo referente, criando um efeito de contradição:

“A explosiva descobertaAinda me atordoa.Estou cego e vejo.Arranco os olhos e vejo”.

(Carlos Drummond de Andrade)

Page 3: Algumas Figuras de Linguagem

Na antítese, o sentido é construído a partir do confronto entre idéias opostas:“Queria um apoio, um horizonte limitado, não o mar sem fim”. (Autran Machado)

Em síntese, paradoxo é a figura de linguagem que consiste em empregar palavras que, mesmo opostas quanto ao sentido se fundem num mesmo enunciado.

Fontes

CEREJA, William Roberto e MAGALHÃES, Thereza Cochar. Literatura Brasileira em diálogo com outras literaturas. 3 ed. São Paulo, Atual editora, 2005, p.38-9.

PIRES, Orlando. Manual de Teoria e Técnica Literária. Rio de Janeiro, Presença, 1981, p. 103-4.SAVIOLE, Francisco Platão. Gramática em 44 lições. 15 ed. São Paulo, Ática, 407, 12-13.

TUFANO, Douglas. Estudos de Língua Portuguesa – Minigramática. São Paulo, Moderna, 2007.