alexandremoreira_prequestionamento

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PREQUESTIONAMENTO Alexandre Moreira Tavares dos Santos Promotor de Justiça no Estado de Roraima SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Resumo histórico. 3. Definição. 4. Prequestionamento indireto. 5. Exigência do prequestionamento nas questões de ordem pública, nos vícios surgidos no julgamento do acórdão recorrido e no recurso de terceiro. 6. Prequestionamento como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário interposto pela alínea “b” do permissivo constitucional e pela alínea “a” quando o tribunal a quo reputa constitucional determinado dispositivo normativo. 7. Dos embargos de declaração para fins de prequestionamento. 8. Do agravo de instrumento contra decisão que não admite recurso especial ou extraordinário por falta de prequestionamento. 9. Conclusão. 1. INTRODUÇÃO. O não atendimento ao requisito do prequestionamento é, sem sobra de dúvidas, um dos motivos mais corriqueiros do não conhecimento do recurso extraordinário lato senso . Por isso, o tema merece um detido estudo por parte dos advogados e membros do Ministério Público. 2. RESUMO HISTÓRICO. Conforme Alfredo Buzaid, o prequestionamento tem a sua origem na Lei Judiciária ( Judiciary Act ) norte-americana, de 24 de setembro de 1789. Esta lei criou o recurso de writ of error, pelo qual a parte pode recorrer das decisões das Justiças Estudais à Corte Suprema quando se questiona acerca da validade de tratado, lei ou ato praticado por autoridade da União e a decisão é contrária a essa validade; ou quando se questiona sobre a validade de uma lei ou de um ato cometido por autoridade de algum Estado, sob o fundamento de que repugna à Constituição, tratados ou leis dos Estados Unidos e a decisão é favorável à validade; ou se questiona sobre algum título, direito, privilégio ou imunidade, reclamados segundo a Constituição, tratado ou lei federal ou ato feito ou autoridade exercida pelos Estados Unidos e a decisão é contrária ao título, direito, privilégio ou imunidade. Assim, para a doutrina e jurisprudência prevalente nos Estados Unidos, o writ of error só é admitido caso a questão federal suscitada haja sido apreciada com clareza pelo tribunal estadual. 1 1 Voto proferido nos Embargos no Recurso Extraorinário n. 96802, publicado na RTJ 109/299.

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PREQUESTIONAMENTO

Alexandre Moreira Tavares dos Santos Promotor de Justiça no Estado de Roraima

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Resumo histórico. 3. Definição. 4. Prequestionamento indireto. 5. Exigência do prequestionamento nas questões de ordem pública, nos vícios surgidos no julgamento do acórdão recorrido e no recurso de terceiro. 6. Prequestionamento como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário interposto pela alínea “b” do permissivo constitucional e pela alínea “a” quando o tribunal a quo reputa constitucional determinado dispositivo normativo. 7. Dos embargos de declaração para fins de prequestionamento. 8. Do agravo de instrumento contra decisão que não admite recurso especial ou extraordinário por falta de prequestionamento. 9. Conclusão.

1. INTRODUÇÃO. O não atendimento ao requisito do prequestionamento é, sem sobra de dúvidas, um dos motivos mais corriqueiros do não conhecimento do recurso extraordinário lato senso . Por isso, o tema merece um detido estudo por parte dos advogados e membros do Ministério Público. 2. RESUMO HISTÓRICO. Conforme Alfredo Buzaid, o prequestionamento tem a sua origem na Lei Judiciária (Judiciary Act) norte-americana, de 24 de setembro de 1789. Esta lei criou o recurso de writ of error, pelo qual a parte pode recorrer das decisões das Justiças Estudais à Corte Suprema quando se questiona acerca da validade de tratado, lei ou ato praticado por autoridade da União e a decisão é contrária a essa validade; ou quando se questiona sobre a validade de uma lei ou de um ato cometido por autoridade de algum Estado, sob o fundamento de que repugna à Constituição, tratados ou leis dos Estados Unidos e a decisão é favorável à validade; ou se questiona sobre algum título, direito, privilégio ou imunidade, reclamados segundo a Constituição, tratado ou lei federal ou ato feito ou autoridade exercida pelos Estados Unidos e a decisão é contrária ao título, direito, privilégio ou imunidade. Assim, para a doutrina e jurisprudência prevalente nos Estados Unidos, o writ of error só é admitido caso a questão federal suscitada haja sido apreciada com clareza pelo tribunal estadual.1 1 Voto proferido nos Embargos no Recurso Extraorinário n. 96802, publicado na RTJ 109/299.

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No Brasil, fala-se pela primeira vez na exigência do prequestionamento devido ao disposto no art. 59, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal de 1891. Dizia o mencionado dispositivo que o recurso extraordinário seria cabível quando fosse questionado nas sentanças das Justiças dos Estados, em última instância, sobre a validade de tratados e leis federais e a decisão do tribunal estadual fosse contrário a ela. Este preceito foi praticamente repetido na reforma de 1926, bem como nas Constituições de 1934, de 1937 e de 1946. Assim, em vista de sua jurisprudência firmada sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal, em 16.12.1963, decidiu editar os enunciados das súmulas 282 e 356: “É inadmissível o recurso extraordinário quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada” e “O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento.” A Constituição de 1967, no entanto, não se referiu à expressão questionar o direito federal ou constitucional, quando tratou das hipóteses de cabimento do recurso extraordinário em seu art. 109, inciso III. Por isso, doutrinadores de escol, como José Afonso da Silva,2 passaram a entender que não seria mais exigível o requisito do prequestionamento para a admissibilidade do recurso extraordinário. Contudo, o Supremo Tribunal Federal, com razão, não acolheu esta orientação doutrinária, tendo afirmado a constitucionalidade do enunciado da Súmula 282 no julgamento dos Embargos no Recurso Extraordinário n. 96.802.3 Com efeito, a Constituição de 1967 ao delinear o cabimento do recurso extraordinário no inciso III do art. 119 prescreveu que este seria admissível nas causas decididas em única ou última instância por outros tribunais. Assim, tem-se que, consoante a interpretação teleológica deste dispositivo, o recurso extraordinário só poderia ser admitido se o tribunal a quo tivesse emitido juízo sobre a questão federal ou constitucional suscitada. Da mesma forma, a Constituição de 1988 também consagrou o prequestionamento como requisito do recurso especial e do extraordinário ao dispor que este será cabível em todas as causas decididas em última ou única instância, e aquele nas causas decididas em última ou única instância pelos Tribunais Regionais Federais, ou pelos Tribunais dos Estados e do Distrito Federal e Territórios (arts. 102, III, e 105, III). Ademais, o prequestionamento advém da própria essência e finalidade do recurso extraordinário e do especial, que é possibilitar ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça exercerem suas respectivas funções de guardiães da Constituição da legislação federal. Assim,

2 José Afonso da Silva. Do recurso extraordinário no direito processual brasileiro. São Paulo:RT, 1963. 3 RTJ 109/299

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se as instâncias ordinárias não se manifestaram expressamente sobre determinada norma federal, não há porque as Cortes Superiores exercerem sua jurisdição, pois não existirá interpretação ou aplicação da Constituição ou da Lei a ser corrigida ou unificada. Apesar de, logo após a promulgação da Carta Política de 1988, alguns doutrinadores terem novamente sustentado a inexigibilidade do prequestionamento, como o Ministro Carlos Mário da Silva Velloso,4 a jurisprudência do STF e do STJ em momento algum vacilou sobre a aplicação dos enunciados das súmulas 282 e 356 do Pretório Excelso. 3 – DEFINIÇÃO. O prequestionamento consiste no debate prévio, pelo tribunal a quo, da questão jurídica suscitada no recurso extraordinário . Por isso, para que este requisito de admissibilidade seja atendido, é preciso que os votos proferidos no acórdão recorrido tenham adotado entendimento explícito sobre a tese veiculada nas razões recursais do recorrente. Portanto, não basta que a parte tenha suscitado a questão jurídica em seu recurso (apelação, agravo de instrumento, recurso em sentido estrito) ou em sua defesa (contra-razões ou contra-minuta)5, nem basta que a matéria tenha sido ventilada no relatório do acórdão.6 É preciso que a questão jurídica tenha sido decidida pelo tribunal a quo, e, portanto, versada nos votos do acórdão recorrido. Sobre este último ponto, entendemos que o prequestionamento existe mesmo se a matéria suscitada no recurso extraordinário ou especial tiver sido ventilada apenas no voto vencido do acórdão recorrido. Porque, nesta hipótese, é inquestionável que o tribunal a quo discutiu (prequestionou) a tese jurídica do recorrente. 7 De outro lado, não há necessidade de que o número do dispositivo legal ou constitucional tido como violado ou contrariado tenha sido expressamente indicado no acórdão recorrido.8 Aliás, a mera indicação de

4 RDA 175/9 e RDP 90/79. 5 Neste sentido, cf. no STF: AGRAG 277188, rel. Min. Marco Aurélio, 2ª Turma, DJU: 04.05.01, p. 12; e no STJ: EDRESP. 182813, rel. Min. Waldemar Zveiter, 3ª Turma, DJU: 01.07.1999, p. 174 e AGRESP. 300166, rel. Min. Francisco Falcão, DJU: 08.10.2001, p. 174. 6 De acordo, cf. no STF: AGRRE 175505, rel. Min. Marco Aurélio, 2ª Turma, DJU: 12.05.95, p. 13004. 7 Em sentido contrário, a 1ª Turma do STF vem entendendo que “não se configura o prequestionamento se, no acórdão recorrido, apenas o voto vencido cuidou do tema suscitado no recurso extraordinário, adotando fundamento independente, sequer considerado pela maioria.” (AGRAG 256130, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJU: 09.02.01, p. 18) Portanto, em vista do princípio da eventualidade, é importante que a parte oponha os embargos de decl aração com o fito de prequestionar a questão jurídica que pretende veicular na via excepcional quando ela foi abordada apenas no voto vencido do acórdão do qual se pretende recorrer ao STF ou ao STJ. 8 Em conformidade, cf. no STF: RE 128519, rel. Min. Marco Aurélio, Pleno, DJU: 08.03.91, p. 2206 e RE 170204, rel. Min. Marco Aurélio, 2ª Turma, DJU: 14.05.99, p. 19; e no STJ: ERESP 63410, rel. Min. Vicente Leal, Corte Especial, DJU: 22.10.2001, p. 260 e ESESP 155621, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Corte Especial, RSTJ

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dispositivo legal, sem a emissão de tese jurídica explícita sobre o seu preceito, ou seja, sem tornar res controversa a questão suscitada, não supre o requisito do prequestionamento.9 Porém, é imprescindível que da decisão recorrida depreenda-se de maneira inequívoca que o artigo de lei indicado no recurso especial (ou da Constituição, no recurso extraordinário) tenha balizado a decisão do tribunal. Caso contrário, a parte deverá opor embargos de declaração, para que a corte decida a respeito da questão jurídica que pretende veicular nas razões de seu recurso de natureza extraordinária. Pelo exposto, podemos definir o prequestionamento como sendo o prévio debate e julgamento, pelo tribunal a quo, sobre a tese jurídica suscitada no recurso extraordinário e no especial. 4 – PREQUESTIONAMENTO INDIRETO. Questão interessante é saber se há o prequestionamento da matéria argüida no recurso quando o acórdão do tribunal de 2ª instância confirma a sentença por seus próprios fundamentos, e nesta houve emissão de juízo explícito sobre a questão jurídica veiculada na via excepcional. Entendemos que duas hipóteses podem surgir. Se o acórdão apenas diz que confirma a sentença por seus próprios fundamentos, e não há nos votos a transcrição dos trechos da sentença que serviram para formar a convicção dos julgadores, é inequívoco que não houve debate explícito sobre o tema. Portanto, neste caso, entendemos que a matéria não foi prequestionada, cabendo à parte interessada opor embargos de declaração. Para nós, a única exceção ocorre nos juizados especiais, onde é permitido à Turma Recursal confirmar a sentença por seus próprios fundamentos, servindo a súmula do julgamento como acórdão. Portanto, o prequestionamento é feito indiretamente pela análise da matéria ventilada na sentença. Circunstância distinta é aquela na qual o tribunal confirma a sentença por seus próprios fundamentos, estando transcrito nos votos do acórdão os pontos do decisum monocrático que serviram para formar o entendimento dos julgadores. Aqui sim há o prequestionamento explícito e direto, uma vez que a matéria foi efetivamente debatida, tornando-se res controversa. Com efeito, não há nenhuma restrição legal que impeça o órgão julgador de reportar-se a sentença ou ao parecer do Ministério Público como fundamentação exclusiva do julgado.10 Neste caso, o juiz faz suas as palavras de terceiros e, desta forma, debate e decide as questões jurídicas que lhe são submetidas. 127/36. Na doutrina, cf. Ovídio A. Baptista da Silva. Recurso Especial por violação de princípio jurídico. in Revista dos Tribunais, São Paulo: RT,1997, p. 110. 9 De acordo, cf. no STF: RE 99613, rel. Min. Francisco Rezek, 2ª Turma, DJU: 24.02.84, p. 2208 e AGRAG 101700, rel. Min. Djaci Falcão, 2ª Turma, DJU: 01.04.85, p. 4284; e no STJ: AGRESP 223700, rel. Min. Francisco Falcão, 1ª Turma, DJU: 26.03.01, p. 374. 10 Neste sentido, cf. no STF: RE 179557, rel. Min. Ilmar Galvão, 1ª Turma , publicado no DJU: 13.02.98, p. 12; e no STJ: REsp. 3021, rel. Min. José Dantas, 5ª Turma, RSTJ 19/411, AGA 189942, rel. Min. Vicente Leal, 6ª Turma, DJU: 29.11.99, p. 124 e AGA 70775, rel. Min. Anselmo Santiago, 6ª Turma, DJU: 01.02.99, p. 235.

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É de se notar, porém, que há julgados recentes do STF aceitando o prequestionamento indireto quando o acórdão recorrido se limita a invocar, como razão de decidir, súmula do próprio tribunal ou de outro. Entretanto, nesses casos, a impugnação da parte deve se dirigir contra os fundamentos dos precedentes do enunciado invocado, devendo ser juntada cópia autenticada dos mesmos ou indicado o repertório autorizado de jurisprudência que os tenha publicado, sob pena de não ser conhecido o recurso extraordinário.11 5 – EXIGÊNCIA DO PREQUESTIONAMENTO NAS QUESTÕES DE ORDEM PÚBLICA, NOS VÍCIOS SURGIDOS NO JULGAMENTO DO ACÓRDÃO RECORRIDO E NO RECURSO DE TERCEIRO. O prequestionamento tem por fundamento o disposto nos artigos 102, III, e 105, III, da Constituição Federal. Daí forçoso concluir que sua exigência é indeclinável para que possa ser admitido o recurso extraordinário e o especial.12 Portanto, mesmo tratando-se de questão de ordem pública, apreciável de ofício pelas instâncias ordinárias, ela não poderá ser conhecida pelo STF ou pelo STJ caso não tenha sido prequestionada no acórdão recorrido.13 Com efeito, o preceito do parágrafo único do art. 245 do CPC não se aplica às causas levadas às instâncias superiores mediante recurso extraordinário e especial, uma vez que a legislação infraconstitucional não tem o condão de restringir a eficácia dos dispositivos constitucionais nos quais se funda o requisito do prequestionamento. Nesta mesma linha de raciocínio, também não prescinde do requisito do prequestionamento os vícios surgidos no julgamento do acórdão recorrido, como, por exemplo, quando o tribunal não observa os limites da matéria devolvida pelo recurso, bem como quando profere julgamento extra, ultra ou citra petita, ou quando incida em erro na apreciação dos requisitos de admissibilidade do recurso. Portanto, cabe à parte interessada fazer com que o tribunal a quo se manifeste explicitamente sobre o vício ocorrido no julgamento mediante a oposição de embargos de declaração.14 11 Nesse sentido, cf.: RE 221.437, rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, j. 23.04.2002, Informativo do STF nº 265 - (Precedente citado: AG 318.285, DJU: 19.10.2001). 12 Cf. Eduardo Ribeiro de Oliveira. Prequestionamento. in Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis de Acordo com a Lei 9.756/98. Coord. Arruda Alvim Wambier e Nelson Nery Jr., 1999, p. 249. 13 De acordo, cf. no STF: AGRAG 135644, rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJU: 14.12.90, p. 15113 e RE 91395, rel. Min. Rafael Mayer, 1ª Turma, RTJ 92/1383; no STJ: AERESP 85558, rel. Min. Eliana Calmon, 1ª Seção, DJU: 12.06.2000, p. 65, AGA 199033, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª Turma, DJU: 08.03.2000, p. 123 e AGRESP 197814, rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, DJU: 23.10.00, p. 134. 14 A jurisprudência do STF admitia a falta de prequestionamento quando se trata de vício no julgamento referente a causas externas, como, v.g., defeito ou falta da intimação da pauta (RE 86496, rel. Min. Décio Miranda, 2ª Turma, DJU: 10.09.79, p. 6679). Atualmente, porém, a jurisprudência do Pretório Excelso é firme em exigir o prequestionamento explícito de qualquer questão constitucional que surja originariamente no acórdão recorrido (AGRAG 242317, rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, DJU: 10.12.99, p. 05). No STJ, a jurisprudência inicialmente orientou-se de forma liberal, deixando de exigir o requisito do prequestionamento no caso de vício surgido no próprio julgamento. Tal entendimento, entretanto, encontra-

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Ademais, os embargos declaratórios, neste caso específico, podem dar ensejo à modificação do julgado, caso acolhidos. Assim, antes da interposição deste recurso não se terá esgotada as instâncias ordinárias, razão pela qual não poderá a parte recorrer às instâncias superiores. No caso de recurso de terceiro que pretenda sustentar nulidade advinda de não haver figurado como parte no processo, também se exige o requisito do prequestionamento. Nesta hipótese, como nas demais, não há razão para deixar de incidir os preceitos constitucionais que condicionam a admissibilidade do recurso extraordinário e especial ao prequestionamento. Destarte, se o acórdão não enfrentou a matéria que o terceiro pretende suscitar em sede de recurso extraordinário e especial, faz-se imprescindível a oposição dos embargos de declaração.15 6 – PREQUESTIONAMENTO COMO REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO INTERPOSTO PELA ALÍNEA “B” DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL E PELA ALÍNEA “A” QUANDO O TRIBUNAL A QUO REPUTA CONSTITUCIONAL DETERMINADO DISPOSITIVO NORMATIVO. No controle difuso de constitucionalidade acolhido pala Constituição de 1988, qualquer juiz pode declarar incidenter tantum a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo que contrarie a Carta Magna. Contudo, em relação aos tribunais, vige o princípio da reserva de plenário, pelo qual somente o pleno ou o órgão especial da corte pode declarar, pela maioria de seus membros, a inconstitucionalidade de lei ou ato normat ivo (art. 97 da CF). Portanto, quando o órgão fracionário acolhe o incidente de inconstitucionalidade, lavra-se o acórdão e a questão é submetida ao pleno ou ao órgão especial para que estes decidam quanto à constitucionalidade da lei (art. 481 do CPC). Encerrado o julgamento do incidente, o processo é devolvido ao órgão fracionário para que este julgue a causa, tendo como premissa obrigatória a declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade proferida pelo pleno ou pelo órgão especial. Porém, seguindo orientação traçada pelo Supremo Tribunal Federal, a Lei n. 9756, de 17.12.1998, inseriu o parágrafo primeiro do art. 481 do CPC, permitindo que os órgãos fracionários dos tribunais declarem de imediato a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo quando houver precedente do pleno ou do órgão especial do tribunal, bem como do pleno do STF. Neste caso, para que seja atendido ao requisito do prequestionamento, faz-se mister que a parte junte aos autos a cópia autenticada do precedente do pleno ou do órgão especial no momento da se atualmente superado, sendo assente na jurisprudência da corte a exigência do prequestionamento nesta circunstância (ERESP 8285, rel. Min. Garcia Vieira, Corte Especial, DJU: 09.11.98, p. 2; REsp. 136277, rel. Min. Eduardo Ribeiro, 3ª Turma, RSTJ 133/251 e REsp. 264181, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira , 4ª Turma, DJU: 23.10.00, p. 145). Na doutrina, cf. sobre o tema: Moniz de Aragão, Pré-questionamento, RF 328/45-46. 15 Cf. Eduardo Ribeiro de Oliveira, op. cit., p. 251.

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interposição do recurso extraordinário. Porque a motivação referente à inconstitucionalidade da lei está naquele precedente, tendo em vista que o órgão fracionário apenas aplica aquela decisão como premissa do julgamento da causa, sendo irrelevante suas considerações a respeito do tema. Da mesma forma, exige-se para a satisfação do prequestionamento a juntada do acórdão do pleno ou do órgão especial quando a turma ou câmara declara a constitucionalidade da lei ou ato normativo atacados mediante simples referência à decisão daqueles órgãos. Pois somente assim o STF terá como apreciar os fundamentos do julgado recorrido, que é integrado formalmente para todos os efeitos pelo acórdão do pleno ou do órgão especial.16 Entretanto, caso o órgão fracionário do tribunal repute constitucional a lei ou ato normativo impugnados, já antes declarada pelo plenário, mediante fundamentação própria, não é exigível a juntada do acórdão do referido precedente para que esteja satisfeito o prequestionamento, bastando para tanto que o tribunal emita juízo explícito a respeito da tese versada no recurso extraordinário. É que, nesta hipótese, como bem destacou o Ministro Sepúlveda Pertence: “ao contrário do que sucede no caso de declaração de inconstitucionalidade – o acórdão do plenário que, decidindo incidente de suscitado em outro processo, já houver resolvido, no mesmo sentido, a prejudicial de inconstitucionalidade, é mero precedente jurisprudencial, que não integra, formalmente, porém, a decisão da Câmara ou da Turma.”17 7 - DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PARA FINS DE PREQUESTIONAMENTO. Quando o tribunal de 2ª instância queda-se omisso na apreciação de questão jurídica suscitada pela parte nas razões de seu recurso (apelação, agravo de instrumento, recurso em sentido estrito) ou de sua defesa (contra-razões ou contra-minuta), ou no parecer proferido pelo Ministério Público, bem como quando deixa de apreciar questão de ordem pública conhecível de ofício, cabe à parte opor embargos de declaração com o fito de sanar a omissão perpetrada pelo órgão julgador, e, assim, prequestionar a matéria que pretende veicular no recurso extraordinário ou especial.18

16 No mesmo sentido, cf. no STF: AGRRE 149478, rel. Min. Sepúlveda Pertence, Pleno, DJU: 23.04.93, p. 6926 e AGRRE 160041, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJU: 21.05.93, p. 9772. 17 AGRRE 149478, rel. Min. Sepúlveda Pertence, Pleno, DJU: 23.04.93, p. 6926. 18 O parecer proferido pelo Ministério Público na qualidade de custos legis não serve apenas para cumprir uma exigência formal, que pode ser desprezada pelo tribunal no momento do julgamento da causa. Com efeito, seria inútil a intervenção do Ministério Público como fiscal da lei se suas ponderações jurídicas pudessem ser simplesmente desprezadas pelo Judiciário. Por isso, entendemos que no caso de omissão de questão jurídica suscitada pelo Ministério Público em seu parecer é cabível a oposição de embargos de declaração, mesmo que a matéria não tenha sido anteriormente articulada pelas partes. Em sentido contrário, decidiu a 2ª Turma do STJ que “o tribunal não está obrigado a examinar os questionamentos contidos no parecer ministerial, atuante como custos legis , abandonando, por via oblíqua, a exigência do prequestionamento.” (EDRESP. 55651, rel. Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, DJU: 05.02.2001, p. 84)

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Os embargos de declaração para fins de presquestionamento tem sua hipótese de cabimento delineada pelo art. 535, II, do CPC e 619 do CPP. Na realidade, trata-se de embargos com a finalidade de sanar omissão existente no acórdão recorrido. Por isso, não se admite embargos de declaração com a finalidade de prequestionar questão jurídica que não tenha sido articulada pela parte ou pelo Ministério Público antes do julgamento do acórdão embargado, salvo se a questão for de ordem pública, conhecível de ofício, ou tratar-se de vício surgido no próprio acórdão. Porque, se a questão não tiver sido deduzida pela parte em suas razões recursais ou contra-razões, o tribunal não tem o dever de emitir juízo sobre ela.19 De outro lado, se determinada tese jurídica é defendida pela parte em suas razões recursais ou contra-razões, o tribunal tem o dever de se manifestar expressamente sobre ela. As alegações das partes não são feitas a título de mera formalidade que pode ser simplesmente desprezada pelo juiz. Com efeito, o art. 458, II, do Código de Processo Civil determina que a fundamentação das sentenças e dos acórdãos devem conter a análise das questões de fato e de direito deduzidas pelas partes. Portanto, o acórdão que não decide as questões jurídicas suscitadas pelas partes, mesmo após a oposição de embargos de declaração, obstando o acesso destas às instâncias superiores, ofende o art. 535, II, do CPC ou 619 do CPP.20 Questão controvertida, porém, ocorre quando o tribunal, mesmo após instado mediante embargos de declaração a se manifestar sobre a tese jurídica suscitada anteriormente pela parte, simplesmente rejeita os declaratórios sem prequestionar a matéria ou os acolhe sem suprir a omissão. Para alguns, neste caso não houve prequestionamento, pois a matéria não foi debatida pelo tribunal.21 Para outros, a parte esgotou seu dever de tentar prequestionar a questão que pretende suscitar nas instâncias superiores, tendo cumprido o preceito da Súmula 356 do STF, razão pela qual se considera suprido o requisito do prequestionamento.22 No STJ prevaleceu o primeiro entendimento, conforme ficou consubstanciado na Súmula 211: “Inadmissível o recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo.”

19 De acordo, cf. no STF: RECR 192574, rel. Min. Néri da Silveira, 2ª Turma, DJU: 06.03.98, p. 19 e AgIn 133199, rel. Min. Celso de Mello, 1ª Turma, RTJ 131/1386; no STJ: EERESP. 31257, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 1ª Turma, DJU: 22.08.94, p. 21213. 20 Neste sentido, cf. REsp. 67514, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª Turma, RSTJ 85/274, REsp. 111887, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, 5ª Turma, DJU: 09.06.97, p. 25556 e REsp. 79139, rel. Min. Milton Luiz Pereira, 1ª Turma, DJU: 21.10.96, p. 40203. Em sentido contrário, há julgado entendendo que “não se tem por prequestionada questão que, a despeito da oposição de embargos de declaração, não foi apreciada pelo Tribunal de origem, o qual não é obrigado a rebater, uma a uma, todas as alegações das partes, devendo sim, decidir a lide tal qual esta se lhe apresentou, utilizando -se da interpretação e da legislação que entender melhor aplicável à hipótese.” (AGRESP 202076, rel. Min. Francisco Falcão, 1ª Turma, DJU: 03.09.01, p. 147) 21 Assim defendeu o Ministro Eduardo Ribeiro, op. cit., p. 252 -255. 22 Neste sentido, cf. José Guilherme Villela, RePro 41/142.

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Portanto, quando o tribunal não acolhe os embargos declaratórios para fins de prequestionamento, cabe à parte interpor o recurso especial por negativa de vigência ao art. 535, II, do CPC ou 619 do CPP, pedindo a cassação do acórdão para que outro seja proferido com a análise da questão suscitada.23 Outrossim, em decorrência do princípio da eventualidade, a parte após pedir a cassação do acórdão recorrido deve veicular a tese jurídica que pretende ver apreciada na instância superior, haja vista que o STJ pode entender que a matéria já estava prequestionada no acórdão embargado. No STF, a 1ª e a 2ª Turma tem entendimentos divergentes sobre a matéria. A 1ª Turma consolidou o entendimento de que a mera oposição dos embargos de declaração supre o requisito do prequestionamento, mesmo que esses sejam rejeitados.24 A 2ª Turma, entretanto, tem entendido que a oposição dos embargos de declaração não suprem o requisito do prequestionamento se a questão suscitada no recurso extraordinário não foi efetivamente debatida no acórdão que julgou os embargos.25 No julgamento do RE 208639, em 6.4.99, pareceu que a 2ª Turma havia revisto este entendimento.26 Porém, em julgados posteriores, a Turma continuou exigindo o debate da matéria no acórdão recorrido para que estivesse atendido o requisito do prequestionamento.27 A forma que a parte deve proceder para não ter seu recurso extraordinário inadmitido por falta de prequestionamento também não é tranqüila. Existem julgados decidindo que, no caso dos embargos de declaração para fins de prequestionamento serem rejeitados, a prestação jurisdicional foi incompleta, tendo sido violado o princípio do devido processo legal e da ampla defesa previstos nos incisos LIV e LV do art. 5º da Constituição Federal.28 Contudo, outros acórdãos acolhem o entendimento de que neste caso não há ofensa direta à Constituição, mas sim indireta, razão pela qual não é admissível o recurso extraordinário nesta hipótese.29 Portanto, quando a parte tiver seus embargos de declaração rejeitados, ou acolhidos sem a emissão de juízo explícito sobre o tema constitucional, deverá, em decorrência do princípio da eventualidade, deduzir preliminarmente em seu recurso extraordinário a alegação de violação ao art. 5º, LIV e LV, da Carta Magna, e requerer a cassação do acórdão recorrido. Após a argüição da preliminar, deverá ser suscitado o próprio mérito recursal. Nesse contexto, se o recurso for distribuído à 2ª Turma, esta cassará o acórdão recorrido e mandará que o tribunal a quo decida a questão jurídica, e se for distribuído à 1ª Turma, esta julgará de imediato o mérito recursal. Além disso, outra alternativa para aumentar as chances de conhecimento do recurso

23 Cf. jurisprudência citada na nota n. 19. 24 Cf. RE 214724, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJU: 06.11.98, p. 19 e RE 273791, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJU: 15.09.2000, p. 133. 25 Cf. AGRRE 146660, rel. Min. Marco Aurélio, 2ª Turma, DJU: 07.05.93, p. 8334. 26 RE 208639, rel. p/ acórdão Min. Nelson Jobim, 2ª Turma, Informativo n. 144. 27 Cf. AGRRE 210769, rel. Min. Marco Aurélio, 2ª Turma, DJU: 25.06.99, p. 19. 28 Cf. RE 251241, rel. Min. Marco Aurélio, 2ª Turma, Informativo 217 e RE 242064, rel. Min. Marco Aurélio, 2ª Turma, Informativo 210. 29 Cf. AGRAG 290213, rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, DJU: 16.03.01, p. 92.

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extraordinário neste caso é a interposição simultânea do recurso especial alegando violação ao art. 535, II, do CPC ou 619 do CPP.30 Como se vê, a falta de unificação da jurisprudência do STF sobre a interpretação da Súmula 356 vem acarretando sério transtorno e insegurança às partes que pretendem recorrer àquele pretório excelso. Porque dependendo da Turma para o qual o recurso for distribuído, diferente será o seu destino. Portanto, urge que o Pleno do STF pacifique de uma vez por toda a matéria. Para nós, a interpretação mais correta é a que considera suprido o requisito do prequestionamento após a oposição dos embargos de declaração, mesmo que estes sejam rejeitados sem o exame da questão jurídica suscitada. É que a exigência da interposição do recurso extraordinário ou especial apenas para anular o acórdão que se negou a completar a decisão recorrida é formalismo inútil que serve somente para congestionar mais ainda o judiciário e acarretar o atraso de vários anos na solução da lide. Portanto, tal providência não se coaduna com os princípios da instrumentalidade, efetividade e economicidade, os quais devem nortear o processo contemporâneo. 8 – DO AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE NÃO ADMITE RECURSO ESPECIAL OU EXTRAORDINÁRIO POR FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. Da decisão que não admite recurso extraordinário e especial cabe agravo de instrumento, para o STF ou para o STJ, conforme o caso. Dispõe o § 1º do art. 28 da Lei n. 8.038/90, aplicável aos processos criminais, e o § 1º do art. 544 do CPC, que o agravo deverá ser instruído obrigatoriamente, sob pena de não conhecimento, com a cópia do acórdão recorrido, da petição de interposição do recurso denegado, das contra-razões, da decisão agravada, da certidão da respectiva intimação e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado. Além da cópia desses documentos, a jurisprudência do STJ e do STF exigem a juntada da cópia da certidão de intimação do acórdão recorrido. Contudo, quando o Presidente do tribunal a quo não admite o recurso especial ou extraodinário por falta de prequestionamento, mesmo tendo a parte oposto embargos de declaração contra a decisão recorrida, e argüido violação ao art. 525 do CPC ou art. 5º, LIV e LV, da CF/88, torna-se obrigatória a juntada da cópia do recurso julgado (apelação, recurso em sentido estrito,...) ou das contra-razões deste, sob pena de não conhecimento do recurso extraordinário ou especial. Essa exigência decorre do fato de que só com a juntada dessas peças, o STF ou o STJ saberá se os embargos de declaração prequestionadores eram procedentes, ou seja, se a parte havia suscitado a questão jurídica omitida antes do julgamento recorrido.31

30 A 1ª Seção do STJ já firmou o entendimento de que mesmo se o tema de fundo for de índole constitucional, é admissível o recurso especial fundado na alegação de violação ao art. 535 do CPC. (ERESP 162765, rel. Min. Franciulli Netto, 1ª Seção, DJU: 27.08.01, p. 219) 31 Neste sentido, cf. AGRAG 164035, rel. Min. Ilmar Galvão, 1ª Turma, DJU: 27.10.95, p. 36340.

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9 – CONCLUSÃO. O prequestionamento está presente no direito brasileiro, como requisito de admissibilidade dos recursos de natureza extraordinária, desde a Constituição Federal de 1891. Entretanto, até hoje o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça ainda não delinearam de forma precisa diversos aspectos importantes desse requisito de admissibilidade, o que gera estrema dificuldade e insegurança com aqueles que pretendem ver suas causas decididas pelas cortes superiores do país.