alerta no clima - danton júnior

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Ministério do Trabalho e Em- prego deverá tornar disponíveis informações relativas à contri- buição sindical obrigatória reco- lhida para sindicatos patronais e de trabalhadores. Os dados de- verão ser colocados para consul- ta em até 30 dias. PÁGINA 6 ANDRÉ ÁVILA AGRONEGÓCIO Mudanças climáticas preocupam produtores As duas companhias gaú- chas estão na lista de empre- sas que poderão ter partes privatizadas dentro da políti- ca de venda de ativos em es- tudo no governo do Estado. O Executivo tenta encaminhar análises sobre essa possibili- dade com discrição, mas as declarações de integrantes do governo já provocam o de- bate entre os que apoiam ou não a medida. Representan- tes de entidades como o Sindi- cato dos Engenheiros do RS entendem que a privatização não soluciona os problemas do Estado. PÁGINA 3 A cidade de Esteio registrou este ano a maior cheia de sua his- tória, afetando 3 mil pessoas. Ur- banização descontrolada às mar- gens de rios e arroios é uma das causas. Sem cuidados, obras po- dem apenas transferir o proble- ma para outro ponto. PÁGINA 9 SINDICATOS CGU exige transparência RICARDO GIUSTI Estudo aponta aquecimento global como causa do desaparecimento de algumas espécies de abelhas CORREIO RURAL PRIVATIZAÇÃO Corsan e CEEE sob análise ALAGAMENTOS Esteio busca soluções PÁGINA 11 Imigração » Milhares de senegaleses pedem asilo no Brasil, sem sucesso » Página 7 Estatuto do Desarmamento sob risco de revogação Posse de armas volta ao debate na Câmara dos Deputados. Comissão deve apresentar parecer em agosto Página 13 4º DISTRITO INOVAÇÃO INSPIRADA EM BARCELONA ANO 120 | Nº 299 PORTO ALEGRE, DOMINGO, 26 DE JULHO DE 2015 SC, PR - R$ 2,50 | RS - R$ 2,00

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Tema ainda controverso no campo, o impacto das mudanças climáticas na agricultura é assunto frequente entre pesquisadores — com especial atenção ao Rio Grande do Sul. Um estudo da Escola Superior de Agri-cultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) coloca o Estado como o segundo mais vulnerável aos efeitos da variação do clima na produção de alimentos, atrás apenas do Espírito Santo, que tem uma produção agrícola seis vezes menor. O cálculo foi feitopor meio de uma relação entre as variáveis climáticas e os valores de produção da agropecuária. Foram considerados 15 produtos, que tiveram seu desempenho analisado entre os anos de 1990 e 2012.

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Page 1: Alerta no clima - Danton Júnior

Ministério do Trabalho e Em-prego deverá tornar disponíveisinformações relativas à contri-buição sindical obrigatória reco-lhida para sindicatos patronaise de trabalhadores. Os dados de-verão ser colocados para consul-ta em até 30 dias. PÁGINA 6

ANDRÉ ÁVILA

AGRONEGÓCIO

Mudanças climáticas preocupam produtores

As duas companhias gaú-chas estão na lista de empre-sas que poderão ter partesprivatizadas dentro da políti-ca de venda de ativos em es-tudo no governo do Estado. OExecutivo tenta encaminharanálises sobre essa possibili-dade com discrição, mas asdeclarações de integrantesdo governo já provocam o de-bate entre os que apoiam ounão a medida. Representan-tes de entidades como o Sindi-cato dos Engenheiros do RSentendem que a privatizaçãonão soluciona os problemasdo Estado. PÁGINA 3

A cidade de Esteio registroueste ano a maior cheia de sua his-tória, afetando 3 mil pessoas. Ur-banização descontrolada às mar-gens de rios e arroios é uma dascausas. Sem cuidados, obras po-dem apenas transferir o proble-ma para outro ponto. PÁGINA 9

SINDICATOS

CGU exigetransparência

RIC

AR

DO

GIU

STI

Estudo aponta aquecimento global como causa do desaparecimento de algumas espécies de abelhas CORREIO RURAL

PRIVATIZAÇÃO

Corsan eCEEE sobanálise

ALAGAMENTOS

Esteio buscasoluções

PÁGINA 11

Imigração » Milhares de senegaleses pedem asilo no Brasil, sem sucesso » Página 7

Estatuto do Desarmamentosob risco de revogação

Posse de armas volta ao debate na Câmara dos Deputados. Comissão deve apresentar parecer em agosto Página 13

4º DISTRITO

INOVAÇÃOINSPIRADA EMBARCELONA

ANO 120 | Nº 299 PORTO ALEGRE, DOMINGO, 26 DE JULHO DE 2015 SC, PR - R$ 2,50 | RS - R$ 2,00

Page 2: Alerta no clima - Danton Júnior

correiodo povoruralDOMINGO, 26 de julho de 2015

■ DANTON JÚNIOR

Tema ainda controverso nocampo, o impacto das mudan-ças climáticas na agricultura éassunto frequente entre pesqui-sadores — com especial atençãoao Rio Grande do Sul. Um estu-do da Escola Superior de Agri-cultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) coloca o Estado como o se-gundo mais vulnerável aos efei-tos da variação do clima na pro-dução de alimentos, atrás ape-nas do Espírito Santo, que temuma produção agrícola seis ve-zes menor. O cálculo foi feitopor meio de uma relação entreas variáveis climáticas e os valo-res de produção da agrope-cuária. Foram considerados 15produtos, que tiveram seu de-sempenho analisado entre osanos de 1990 e 2012.

“Já está consagrado na litera-tura que a agricultura é um dossetores que mais vai sofrer”,afirma a economista NicoleRennó, responsável pela pesqui-sa. “Pela própria característicada produção agrícola, ela é bemvulnerável a variações climáti-

cas”, complementa. Nicole espe-ra que o estudo possa ser útil,tanto para a elaboração de polí-ticas públicas quanto para no-vas pesquisas mais específicas.

Os dez estados pesquisadostiveram um crescimento de pro-dutividade médio de 60% no pe-ríodo avaliado, considerando ovalor bruto de produção em re-lação à área colhida. No RioGrande do Sul, a expansão foide 31%. O estudo cita dados doInstituto Nacional de Meteorolo-gia (Inmet), que entre 1995 e2012 apontam que a temperatu-ra média do Estado passou de18,4 para 19,2 graus — uma altade 4,6%. Santa Catarina e Para-ná, por exemplo, tiveram au-mentos inferiores, de 3,2% e2,3%. Já a precipitação teveuma variação positiva de 1,05%,no RS, enquanto a média nacio-nal foi de -6,9%.

Pela sua localização geográfi-ca, o Rio Grande do Sul sofrecom maiores variações de tem-peratura durante o ano. Comoconsequência, temos períodosde muito calor no verão e muitofrio no inverno. Embora muitos

estudos apontem o aumento datemperatura mínima nos últi-mos anos, não há consenso so-bre os seus efe i tos . “Asconsequências disso podem serpositivas ou negativas, depen-dendo da cultura”, explica Ber-nadete Radin, agrometeorologis-ta da Fundação Estadual de Pes-quisa Agropecuária (Fepagro).Conforme a pesquisadora, asculturas que necessitam de umdeterminado número de horasd e f r i o p a r a q u e b r a r adormência (soma de horas ouunidade de frio abaixo de 7graus) podem ser prejudicadas.

As fruteiras de clima tempera-do, como a macieira, estão entreelas. “Se não ocorrer a quebrade dormência adequada, haverámenos floração, floração maisdesuniforme e, consequentemen-te, menor produção e frutos”, ob-serva. Por outro lado, o aumen-to da temperatura mínima, se-gundo Bernadete, pode levar àmenor ocorrência de geadas, demodo a favorecer culturas quenão toleram esse fenômeno.

O aumento da temperaturado planeta, porém, não é pontopacífico para os representantesdo agronegócio. “A maior dúvi-da é se esse processo existe defato”, questiona o assessor doSistema Farsul Eduardo Condo-relli. Ele afirma que vários estu-dos mostram que o que estamosvivendo hoje já foi registrado emoutras eras. Isso não significa,conforme Condorelli, que o setornão esteja atento à adoção demedidas que beneficiem o meioambiente. Entre as principais, ci-ta o plantio direto e a fixaçãobiológica de nitrogênio, evitandoo uso de adubos nitrogenados.

Apontada muitas vezes como

vilã do aquecimento global devi-do à emissão de gás metano, apecuária pode ter um desempe-nho favorável ao clima quandoconduzida de forma adequada,segundo Condorelli. Ele cita co-mo exemplo o papel das pasta-gens. “Essas plantas seques-tram carbono para que o animalse alimente”, argumenta.

Os efeitos das mudanças cli-máticas no agronegócio poderãoser percebidos não de formaimediata, mas daqui a algunsanos. Um dos maiores especialis-tas do tema no país, Hilton Sil-veira Pinto, professor aposenta-do do Centro de PesquisasMeteorológicas e Climáticas Apli-cadas à Agricultura (Cepagri)da Unicamp, afirma que no Esta-do o reflexo deve começar a serobservado entre 2025 e 2030. “Oque acontece hoje, no Rio Gran-de do Sul, normalmente é efeitodo El Niño”, explica. Segundoele, as futuras alterações pode-rão provocar uma mudança naconfiguração da atividade agríco-la, com a substituição das cultu-ras de clima temperado por ou-tras de clima tropical.

»

Pesquisa daEsalq aponta o RS

como segundoestado mais

vulnerável aoimpacto das

mudanças climáticasno campo.

ANO 32 | NÚMERO 1.670

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Page 3: Alerta no clima - Danton Júnior

DOMINGO | 26 de julho de 2015 CORREIO DO POVOcorreio do povo rural

O ranking dos estados maisvulneráveis ao impacto do climano campo, conforme estudo daEsalq/USP, é liderado pelo Espí-rito Santo, seguido por Rio Gran-de do Sul, Minas Gerais, MatoGrosso do Sul, Santa Catarina,São Paulo e Paraná, nesta or-dem. O único estado em que arelação entre o aumento da tem-peratura e o valor da produçãoreal da agricultura mostrou-sepositivo foi Goiás. Outros doisestados, Bahia e Mato Grossonão apresentaram impacto signi-ficativo. “Uma possível explica-ção refere-se à predominânciada soja na produção de Goiás edo Mato Grosso, produto que te-ve expressivo aumento de adap-tabilidade a condições climáti-cas tropicais, resultado de me-lhoramento genético”, explica aeconomista Nicole Rennó.

Além da temperatura, que en-tre 1995 e 2012 aumentou 4,6%no Rio Grande do Sul, o resulta-do é influenciado pela precipita-ção. O nível de chuvas no Esta-do aumentou 1,05%, chegando a1.463 milítros durante todo oano de 2012, enquanto que nasoma dos dez estados houve re-dução de 6,9%.

Ainda conforme o estudo, os

estados do Mato Grosso e MatoGrosso do Sul foram os queapresentaram as temperaturasmédias anuais mais elevadas en-tre os dez estados analisados,superiores a 25 graus. Na com-paração entre as temperaturasde 1995 e 2012, apenas o Espíri-to Santo não registrou aumentodurante o período.

No caso das precipitações, apercepção de um padrão não étão clara, conforme o estudo. Deum modo geral, houve reduçãogeral das chuvas para a médiados estados pesquisados, em6,9%. Apenas no Mato Grosso(27%), Mato Grosso do Sul (5%)e Rio Grande do Sul (1%) foramregistrados aumentos com rela-ção a 1995. Entre os demais es-tados, a redução mais expressi-va ocorreu na Bahia, com umaqueda de 45%.

» Rio Grande do Sul

Apontada por especialistascomo um indicador biológico dedesequilíbrio ambiental, a apicul-tura tem se mostrado sensível afenômenos meteorológicos, oque estaria ligado ao declínio dapopulação de abelhas observadorecentemente em vários países.Um estudo publicado há duas se-manas na revista científicaScience aponta o aquecimentoglobal como a principal causado desaparecimento de algumasespécies. A cargo de uma equi-pe liderada pela Universidadede Ottawa, no Canadá, o estudoanalisou quase meio milhão deregistros de 67 espécies de abe-lhas nos últimos 110 anos, naAmérica do Norte e Europa. Aconclusão é de que elas perde-ram terreno nas áreas maisquentes, ao Sul, e não estão colo-nizando novas áreas, ao Norte.

O presidente da AssociaçãoGáucha de Apicultores (AGA),Adenor Furtado, afirma sentirsaudades de quando o Rio Gran-de do Sul tinha as quatro esta-ções bem definidas. A mudançana temperatura, segundo ele,“trava” a postura da rainha, queproduz mais em ambiente de cli-ma temperado, com temperatu-ra entre 25 e 30 graus. Furtadodiz que as mudanças começa-ram a ser percebidas de formamais intensa há cerca de 15anos. Em condições climáticasnormais, as colmeias começama ser alimentadas 60 dias antesdo início da primavera, que équando se inicia a safra. “Quan-do chegava no final destes 60dias, a colmeia já estava populo-sa, acima de 100 mil insetos,pronta para a produção de mel”,recorda. “Hoje isso não aconte-ce por causa dessa quebra de ci-clo. A rainha não mantém a pos-tura e para começar novamentedemora muito tempo.”

Criado próximo dos apiáriosdo pai, em Roca Sales, no Vale

do Taquari, o produtor NelsonVuaden, 50 anos, perdeu 300colmeias na última safra — qua-se um terço do total de mil queele possui distribuídas em muni-cípios da região. “Nestes últi-mos 15 anos, todos os anos amãe natureza tem nos dado la-ço”, descreve. Na última safra,o problema foi o inverno muitoúmido. Mas as altas temperatu-ras do verão também contri-buem para reduzir a produtivi-dade. “Tu preparas a abelha pa-ra uma certa época, já tem aidentificação da época em queaflora. Qualquer intempérie mu-

da completamenta a previsão”,descreve Vuaden.

Embora as lamentações so-bre o clima sejam unânimes en-tre os apicultores, ele não é oúnico responsável pelo declínioda população de abelhas. O agrô-nomo Luis Fernando Wolff, daEmbrapa Clima Temperado, dePelotas, aponta outros três fato-res: a contaminação pelos agro-químicos aplicados nas lavou-ras, manejos inadequados eoportunismo dos inimigos natu-rais. Ao clima, porém, ele atri-bui importância superior a 25%.“Ele afeta não só a rotina e as

atividades das abelhas em si,mas também a oferta de néctare pólen”, detalha. Conforme o es-pecialista, os desequilíbrios am-bientais fazem com que as flora-das fiquem mais curtas ou nãoaconteçam. “Isso afeta direta-mente a biologia das abelhas etambém da flora apícola, masprincipalmente os inimigos dasabelhas, em especial os parasi-tas”, constata Wolff.

A abelha africanizada, espé-cie mais comum no Rio Grandedo Sul, até gosta do calor. O pro-blema, segundo Wolff, é afrequência de eventos extremos,

como o prolongamento de perío-dos de estiagem, inundações outornados. A queda no númerode abelhas preocupa não ape-nas quem vive da produção demel, já que a polinização é apon-tada em diversos estudos comofator de aumento de produtivida-de de grãos, inclusive a soja. “Agrande maioria das plantas culti-vadas pelos seres humanos tembenefícios ou necessidades depolinização dirigida pelas abe-lhas, de maneira que essa ausên-cia de polinizadores coloca emrisco e produtividade das cultu-ras”, descreve Wolff.

Maioriadosestadosapresentouefeitos

ANDRÉ ÁVILA

■ Temperatura média anual1995: 18,42012: 19,2 (variação de 4,6%)■ Precipitação total anual1995: 1448 mm2012: 1463,13 mm (variação de1,05%)

Fonte: Inmet e Esalq/USP

Reduçãodasemissõesem pauta

MAURO SCHAEFER / CP MEMÓRIA

Fenômeno impacta nas colmeias Produçãoaliadaàpreservação

Vargas, produtor de trigo e soja em Carazinho, implantou medidas que ajudam a mitigar efeitos do climaNelson Vuaden atribui ao inverno úmido a perda de 300 colmeias na última safra: ‘A mãe natureza tem nos dado laço’, comenta o apicultor

Temperatura média aumentou 4,6% em sete anos no Rio Grande do Sul

Page 4: Alerta no clima - Danton Júnior

DOMINGO | 26 de julho de 2015 CORREIO DO POVOcorreio do povo rural

Dono da segunda maior áreaflorestal do planeta e do maiorestoque de biomassa, o Brasil éapontado como um ator funda-mental na busca pela reduçãodas emissões de carbono no pla-neta. A definição de um acordoglobal sobre as mudanças climá-ticas, para entrar em vigor em2020, estará em jogo durante a21ª Conferência do Clima (COP21), que ocorre em Paris nomês de dezembro.

O Ministério da Agriculturanegocia, junto com a Pasta doMeio Ambiente, a proposta queserá levada pelo Brasil ao en-contro. “Estamos nos empenhan-do para fazer a coisa certa, complantio direto e integração la-

voura-pecuária, sempre procu-rando tecnologia e inovação pa-ra fazer uma agricultura susten-tável”, afirma a ministra daAgricultura, Kátia Abreu.

Com o objetivo de promoverações que reduzam as emissõesde carbono na atmosfera e criaruma agenda desenvolvimentosustentável, um grupo de 50 enti-dades lançou recentemente, emSão Paulo, o movimento Coali-zão Brasil: Clima, Florestas eAgricultura. Foram elaboradas17 propostas consideradas prio-ritárias, sendo a maior parte de-las — nove — relacionadas ao ei-xo florestal e agrícola.

“A inexistência de mecanis-mos de administração de risco

no agro brasileiro e a maior vo-latilidade climática têm trazidoprejuízos para a economia”, afir-ma Gustavo Junqueira, presiden-te da Sociedade Rural Brasileira(SRB), uma das entidades queintegram a coalizão. De acordocom ele, entre os fatores que oBrasil deve priorizar na COP 21estão a efetiva implantação donovo Código Florestal, o aumen-to do uso de energias renová-veis e a universalização do Pro-grama Agricultura de Baixo Car-bono (ABC). Mas o grande desa-fio da coalizão, conforme Jun-queira, é transformar as exigên-cias do Código Florestal em ati-vos ao setor produtivo, e não so-mente em passivos.

O produtor Paulo RobertoVargas, de Carazinho, não estácompletamente convencido so-bre o aquecimento global e seusefeitos. “A natureza é sábia. Elavai se adaptar conforme as ne-cessidades do globo”, acredita.Apesar disso, ele adotou na suapropriedade medidas que sãoconsideradas como recomenda-das para reduzir os efeitos doclima. A lavoura onde ele cultivasoja e trigo conta, há três anos,com uma estação meteorológica,que além de captar os dados cli-máticos, ajuda a prevenir doen-ças. Com a vantagem de poderacessar os resultados de qual-quer lugar, pelo computador, eletem a possibilidade de observaras condições meteorológicas eplanejar suas ações com basena previsão.

“Não adianta o agricultor fa-zer um estrago se nós depende-mos da chuva e do sol”, justificao produtor. “Somos os maioresinteressados em proteger.” Há25 anos, Vargas adotou o siste-ma de plantio direto, que devidoà menor erosão reduz a contami-nação do meio ambiente. Mesmoa produção de grãos, segundoele, contribui com o clima ao re-ter carbono que, de outra forma,poderia ser jogado na atmosfe-ra. “A base das plantas paracrescer é carbono. O produtorque mantém uma reserva legalestá ajudando a evitar essas mu-danças”, observa. Outra medidaadotada é tentar aumentar aprodução mantendo a mesmaárea. Na última safra de soja,Vargas colheu 67 sacas por hec-tare — sem a utilização de pivôsde irrigação.

Para a economista NicoleRennó, responsável pela pesqui-sa da Esalq/USP sobre o tema, oresultado da relação entre as va-riáveis climáticas e a agricultu-ra irá depender tanto das mu-danças climáticas quanto das es-tratégias de adaptação adota-das pelo produtor. “Consideran-do as previsões de mudançasmais intensas para os anos re-centes, estratégias planejadas etransformacionais são necessá-rias”, acredita. “À medida emque você tem previsões de varia-ção climática, se não houveruma adaptação por parte dosprodutores, o impacto serámaior”, acrescenta.

Integrante do grupo que tra-balhou na elaboração dos relató-rios do Painel Intergovernamen-tal sobre Mudança do Clima, daONU, o agrônomo GilbertoCunha, da Embrapa Trigo, dePasso Fundo, afirma que não sepode negar as mudanças climáti-cas, motivadas principalmentepela atividade humana e pelaelevação dos gases de efeito es-tufa na atmosfera. Porém, desta-ca que é necessário levar emconta a capacidade de inovaçãotecnológica do agronegócio, queele considera o grande desafiodo setor. Na sua avaliação, a tec-nologia tem ajudado a agricultu-ra a superar o impacto do clima.“Tanto que os nossos níveis deprodutividade têm se elevadosubstancialmente”, exemplifica.Isso não significa, segundoCunha, que não se deve adotarpolíticas de mitigação. “A tempe-ratura média está se elevando.O planeta está se aquecendo. Osdiagnósticos para o Sul do paísnão são diferentes”, relata.

A soja, segundo Hilton Silvei-ra Pinto, professor aposentadodo Cepagri/Unicamp, não deve fi-car imune ao fenômeno climáti-co. “Se você tiver uma tempera-tura muito elevada, mais ou me-nos na época do florescimento,em setembro ou outubro, issocausa aborto floral e a produtivi-dade baixa”, explica. Por isso,segundo ele, há uma tendênciade aumento da área na regiãoCentral do Brasil, que, apesarde ser uma região mais seca,conta com uma cobertura maiorde irrigação. “Em Santa Catari-na, algumas culturas frutíferasde clima temperado já estão so-frendo por causa desse ligeiroaquecimento, migrando um pou-co mais para o Sul”, exemplifica.

O consultor da Farsul Eduar-do Condorelli destaca que o Bra-sil possui 60% do seu territóriocoberto por florestas nativas, en-quanto que a agricultura utilizamenos de 10%. “Temos um pa-pel importante a colaborar, mascertamente o nosso papel deveser compatibilizado com a atitu-de de outros segmentos da socie-dade”, observa. Na opinião dele,o setor acaba “levando a fama”enquanto, na zona urbana, secontinua a privilegiar os combus-tíveis fósseis nos automóveis,por exemplo.

PAULO ROBERTO VARGAS / ARQUIVO PESSOAL

Reduçãodasemissõesem pauta

MAURO SCHAEFER / CP MEMÓRIA

Fenômeno impacta nas colmeias Produçãoaliadaàpreservação

Vargas, produtor de trigo e soja em Carazinho, implantou medidas que ajudam a mitigar efeitos do climaNelson Vuaden atribui ao inverno úmido a perda de 300 colmeias na última safra: ‘A mãe natureza tem nos dado laço’, comenta o apicultor