aguirre. a participação social na gestão ambiental

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gestão ambintal

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  • No ms de novembro passado tive aoportunidade de conhecer alguns projetos demanejo de recursos naturais na Amazniabrasileira, a convite do Ministrio de RelaesExteriores. Entre os mltiples aspectos deinteresse vinculados com o desenvolvimento e osproblemas ambientais que pude obser v a rdurante a visita, h um que pretendo destacarneste artigo: a participao crescente dasociedade na gesto dos recursos naturais.

    Este um fator que est intimamenterelacionado com algumas problemticas daregio, tais como a conservao ambiental, odesenvolvimento social, a construo da cida-dania e o fortalecimento da democracia, a redu-o das desigualdades sociais e o aproveita-mento de recursos naturais renovveis, oreconhecimento e o respeito pelas culturas dospovos de origem ancestral e os papis dos gover-nos locais no desenvolvimento sustentvel.Definitivamente, a participao social na gestoambiental surge como uma via idnea para oencontro de respostas apropriadas aos proble-mas da regio e aos desafios do desenvolvi-mento sustentvel.

    A importncia estratgica que pode ter aparticipao social na gesto ambiental para odesenvolvimento da regio exige uma ateno

    especial s diversas experincias que sorealizadas em realidades semelhantes nos pasesda Amrica do Sul, apesar das diferenas locaise a especificidade de cada situao. O contrasteentre as diversas experincias pode conduzir adoo de pautas e critrios tomados por mtuoacordo para o desenvolvimento da regio quepossui suas particularidades, a partir das quaisdeve inserir-se e potencializar-se em um mundoglobalizado.

    Atualmente, existem vrias tendncias eposies sobre o manejo de recursos naturaisrenovveis. Assim, existem correntes queprivilegiam a conservao dos recursos em seuestado natural, excluindo toda forma de inter-veno antrpica. H outras que subordinam aconservao s necessidades do mercado e docrescimento econmico. Por ltimo, esto ascorrentes de pensamento e de ao que reconhe-cem a necessidade de encontrar prticas produ-tivas equilibradas que permitam o desenvol-vimento econmico e o manejo adequado danatureza.

    Nas experincias que se desenvolvem naAmaznia do Brasil, como ocorre em outrospases da regio, podem ser reconhecidas estasdiferentes tendncias. Junto a experincias depesquisa vinculadas conservao intern a c i o n a lde aves migratrias, polticas e prticas dec o n s e rvao de ecossistemas frgeis como osbosques midos amaznicos e as florestastropicais, encontram-se experincias dec o n s e rvao que incluem polticas que promovema melhoria da qualidade de vida das populaeslocais, utilizando para isso os recursos naturaisde maneira sustentvel. Assim mesmo, existemexperincias de manejo de recursos naturais no

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    A participao socialna gesto ambiental:percepes sobrealgumas experinciasa m a z n i c a s

  • renovveis - como o gs natural e o petrleo deU ruc que realizam um enorme esforo parao controle da qualidade ambiental, com opropsito de reduzir os nveis e os riscos decontaminao, ainda que neste caso no se incluaa participao social devido a inexistncia depopulaes relevantes nas reas de interv e n o .

    Em todas estas experincias podem serencontrados alguns elementos comuns: a preo-cupao pela conservao, a necessidade depromover o desenvolvimento econmico, a lutacontra a pobreza, a promoo da participaoda sociedade civil no planejamento e gesto deiniciativas de manejo ambiental e a responsa-bilidade industrial.

    Na base destes elementos comuns existetambm uma preocupao: a de encontrar alter-nativas prprias para o desenvolvimento daAmrica Latina que enfatizem a necessidade deresponder aos objetivos de melhoria da qualida-de de vida de nossos povos, ao mesmo tempo emque permitam conservar os recursos naturaiscomo fatores estratgicos do desenvolvimento.

    Ainda que a Amrica Latina enfrente odesafio de construir seus prprios caminhos e deencontrar suas prprias respostas em um mundointegrado, os pases que compartilhamos abacia amaznica temos o desafio particular deencontrar as vias mais adequadas para odesenvolvimento dos povos amaznicos, oaproveitamento de seus recursos naturais e aconservao de seus frgeis ecossistemas.

    EXPERINCIAS DE MANEJO DERECURSOS E PARTICIPAOSOCIALDesde a perspectiva do fomento da

    participao social na gesto ambiental,destaco duas experincias: a conservao doParque Nacional do Ja e a do Lago do Tup emManaus.

    A Fundao Vitria Amaznica:Populao e conservao do ParqueNacional do Ja

    Vitria Amaznica uma organizao no-g o v e rnamental com sede em Manaus quetrabalha no Rio Negro desde 1991. Atualmente,colabora no manejo do Parque Nacional do Ja,com uma extenso de 2.2 milhes de hectares eest localizado a 220 quilmetros de Manaus.

    Como em muitas outras experinciassemelhantes, a presena de organizaes no-governamentais em reas protegidas propicia ofortalecimento da poltica e gesto pblicas deconservao e, ao mesmo tempo, aprofunda oconhecimento sobre as reas que se protegem, oque por sua vez abre a possibilidade de umaviso crtica das polticas pblicas existentes, oque contribui, mediante uma adequada interlo-cuo, a uma constante adequao de ditaspolticas.

    No caso do Parque Nacional do Ja sedescobriu que nele habitavam aproximadamente1.000 pessoas, antes da declarao destaunidade de conservao. No caso da legislaobrasileira, est proibida a presena de pessoasno interior de uma unidade de conservaodeste tipo, o que provoca a disjuntiva deassentar em outros lugares a uma populaodispersa ou de encontrar mecanismos paravincul-la gesto das aes conservacionistas.

    Esta situao, que se repete em outros casosdo Brasil e em muitos outros pases, nos colocadentro de uma das problemticas que interessaressaltar neste artigo: compatvel a presenade populaes humanas com as estratgias paraconsolidar unidades de conservao? possvele conveniente incorporar essas populaes sprticas de conservao?

    Evidentemente que no existe uma respostanica, pois as respostas dependero dasparticularidades ambientais de cada ecossis-

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  • tema ou grupos de ecossistemas que sepretendam conser v a r, das particularidadessocio-culturais, polticas, e das prticasprodutivas que se realizam ou que influem nasreas de conservao. Em princpio, a presenade populaes dentro de reas de conservaoou em zonas de influncia no incompatvelcom os esforos e as necessidades deconservao. Mais ainda, em muitos casos soaliados naturais porque do aproveitamentosustentvel de recursos depende suas possibi-lidades de sobrevivncia, reproduo e melhora-mento da qualidade de vida, e esta circunstnciafaz que em muitas ocasies se constituam emguardies naturais frente a tentativas deinvaso de grupos colonizadores ou de gruposde interesse vinculados a prticas extrativistasindiscriminadas ou de plantaes extensivas querequerem a destruio de bosques naturais.

    No caso do Equador, muitos dos conflitossociais em reas protegidas tem relao comsuas declaratrias sem que se considere apopulao preexistente e, portanto, seus direitossobre o uso dos recursos. No entanto, esta umasituao inevitvel dado o tamanho do pas e apresena de populao indgena ou rural emtodo seu territrio. Para o Equador, pratica-mente impossvel ter unidades de conservaoque no guardem relao com gru p o spopulacionais no seu interior ou em reas deamortecimento, o que vem obrigando a flexibili-zao das prticas de conservao no sentido debuscar alianas com estes grupos humanos, demodo a promover a valorizao das reasprotegidas como uma oportunidade para odesenvolvimento destas populaes e nosomente como uma limitao a suas prticasextrativistas e produtivas.

    No caso brasileiro, a experincia da VitriaAmaznica nos mostra que, apesar da extensodo territrio, tambm subsistem estesproblemas. Frente a eles, parece que o maisadequado reconhecer esta realidade e

    promover a articulao das populaes locais c o n s e rvao e bom manejo dos recursosnaturais antes que a busca de sua expulso.

    Nesta direo deram resultados positivosuma srie de iniciativas como a incorporaodos critrios da populao local na formulaode planos de manejo, na promoo de educaoambiental, na gerao de atividades paramelhorar os nveis de sade e educao, assimcomo na execuo de aes coordenadas entreas prefeituras municipais para melhorar ascondies de vida da populao.

    Linhas de trabalho como as propostas abremo caminho para nveis de acordo e conciliaopara incorporar as populaes locais ao manejode recursos naturais conservados, sem violentarseus direitos e so coerentes com o necessriovnculo entre conservao e o melhoria daqualidade de vida das populaes locais.Adicionalmente, estas so experincias quecontribuem para o dilogo sobre as polticaspblicas e, eventualmente, modificao denormas jurdicas, particularmente no que serefere aos povos indgenas ou a assentamentosbem mais antiguos que as decises pblicas dedeclarar unidades de conservao.

    A Prefeitura Municipal de Manaus:Participao comunitria naconservao do Lago do Tup

    O Lago do Tup um lugar de excepcionalbeleza. Est localizado a aproximadamente umahora de viagem fluvial de Manaus, separado doRio Negro por uns duzentos metros de fina areiabranca. Nas margens do lago e do rio que oalimenta, vivem h mais de cinquenta anos cercade vinte famlias rurais de maneira perm a n e n t ee outras cinquenta de forma intermitente; todaselas sendo sumamente pobres.

    A Prefeitura desenvolveu com a Comunidadede So Joo do Tup um conjunto de atividades

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    Miguel Carvajal AguirreDiretor da Fundao Ambiente e Sociedade, Quito-Equador.E-mail: [email protected]

    sociais e de assistncia tcnica produtivaorientada para a melhoria da qualidade de vidae incorporao da populao na conservaode seus recursos naturais.

    necessrio reconhecer dois fatoresimportantes desta experincia. Em primeirolugar, o vnculo da conservao do Lago do Tupcom o sistema de conservao nacional do RioNegro e com uma poltica ambiental da Prefei-tura, que inclui tambm um Jardim Botnico, oParque do Mind, entre outros. Em segundolugar, a gerao de iniciativas de desenvol-vimento local baseadas em um eixo deconservao de recursos naturais, promovidopelo governo local.

    As atividades que se realizam com apopulao consistem na promoo de iniciativasprodutivas que combinam o melhoramento daproduo agrcola, a recuperao de solos e adiversificao produtiva atravs de sistemasagro-florestais, a apicultura, o artesanato e oturismo comunitrio.

    Um dos aspectos relevantes destaexperincia a possibilidade de combinar aescujos resultados demoram alguns anos para suaconcretizao, com atividades que produzemresultados imediatos como a apicultura, a vendade artesanato e o turismo comunitrio. Estarelao permite consolidar iniciativas deconservao a mdio prazo na medida em queresponde s urgncias da populao paramelhorar suas renda econmica, o que pareceser uma condio para a eficcia de qualquerprojeto de manejo de recursos naturais que

    trabalhe com populaes pobres.

    Esta tambm uma iniciativa que coloca ac o n s e rvao de recursos como umaoportunidade para as comunidades locais, poisem torno das iniciativas municipais deconservao do Lago foram gerados diversosinvestimentos que oferecem alternativas populao, tais como a promoo de um novodestino turstico para a populao local deManaus e, eventualmente, para um segmento doturismo internacional, o melhoramento dosestabelecimentos de educao e sade, acapacitao e promoo de artesanato parag rupos de mulheres, a assistncia tcnicaorientada para a diversificao de ingressosfamiliares na agricultura e em novas atividadescomo o turismo comunitrio. Simultneamente,a populao foi incorporada de maneiraorganizada ao controle da pesca e da extraode madeira.

    Esta experincia da Prefeitura de Manaustem uma semelhana de enfoque com respeito aoutras prticas que se realizam na AmricaLatina, particularmente na Amaznia. Semdvida, constitui uma contribuio especialpara as polticas e possibilidades de intervenodos governos locais amaznicos na gesto ambi-ental, articulando iniciativas de conservao, depromoo de alternativas produtivas, de prti-cas de educao ambiental e de construo dacidadania, em momentos em que crescem astendncias de descentralizao em nossospases.