adolescente marginalizado frente a juventude liquida

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Adolescencia - Psicologia

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  • Protestantismo em Revista | So Leopoldo | v. 33 | p. 68-74 | jan./abr. 2014

    Disponvel em: < http://periodicos.est.edu.br/index.php/nepp>

    Protestantismo em Revista licenciada

    sob uma Licena Creative Commons.

    O adolescente marginalizado frente modernidade lquida

    The marginalized adolescent before liquid modernity

    Jferson Polidoro Ruaro Pimentel

    Mestrando em Teologia (EST)

    Resumo O artigo em questo objetiva destacar caractersticas dos adolescentes e fazer apontamentos de como eles se tornam marginalizados frente s situaes impostas pela modernidade lquida, e como ela influencia o seu comportamento na busca em atender a necessidade que sentem de serem aceitos na sociedade em que esto inseridos. Para tanto, foi utilizada a pesquisa bibliogrfica para o levantamento das informaes expostas, e o marco terico foi desenvolvido principalmente atravs dos estudos do socilogo Zygmunt Bauman, com base em sua teoria lquida, do telogo e psiclogo James Fowler, dos psicanalistas Contardo Calligaris e Franoise Dolto, com base em seus estudos sobre as caractersticas da fase da adolescncia. Os resultados encontrados na produo deste artigo sero utilizados para o desenvolvimento da dissertao de mestrado do autor, intitulada Desenvolvimento da f e educao crist na infncia para a

    formao cidad da criana, alm de ser debatido junto ao grupo de pesquisa Interculturalidade na Amrica Latina, coordenado pelo Dr.

    Roberto Ervino Zwetsch. Palavras-chave Adolescente marginalizado. Modernidade lquida. Sociedade. Abstract The article in question objective detach characters of adolescents to make directions of how they are marginalized by situations imposed by liquid modernity, and how it reflects in their behavior to search to attend the need they feel of been accepted in the society theyre in. It was used the

    Bibliographic search towards the making of exposed information, and the reference theoretical was developed mainly by the studies of sociologist Zygmunt Bauman, based in his liquid theory, of theological and psychologist James Fowler, of analysts Contardo Calligaris e Franoise Dolto, based in his studies of adolescence characteristics phase. The results found in the production of this article will be used in the master's degree dissertation of the author, entitled Desenvolvimento da f e

    educao crist na infncia para a formao cidad da criana, and will be

    Bacharel em Cincias Sociais e mestrando acadmico em Teologia na Faculdades EST, em So Leopoldo,

    RS, Brasil.O artigo parte integrante da dissertao de mestrado do autor, intitulada Desenvolvimento da f e educao crist na infncia para a formao cidad da criana e orientada pelo Dr. Roberto Ervino Zwetsch. Contato: [email protected]

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    Protestantismo em Revista | So Leopoldo | v. 33 | p. 68-74 | jan./abr. 2014

    Disponvel em: < http://periodicos.est.edu.br/index.php/nepp>

    debated with the research group Interculturalidade na Amrica Latina,

    coordinated by the Dr. Roberto Ervino Zwetsch. Keywords Marginalized adolescent. Liquid modernity. Society.

    Consideraes Iniciais

    A adolescncia a fase de transio entre a infncia e a idade adulta, podendo ser

    vista como um perodo de mutao de jovens indivduos, vistos como crianas para

    algumas coisas, e adultas para outras, fato esse que contribui para a confuso da

    identidade que ainda est sendo formada. Hoje, com a queda dos modelos familiares e

    sociais, principalmente atravs da diminuio dos ritos de passagens, o adolescente

    encontra dificuldades em se posicionar dentro da sociedade, e assim, acaba sendo atrado

    por grupos com os quais se identifica e atravs deles que tenta se afirmar como

    indivduo1. Conforme o socilogo polons Zygmunt Bauman, a sociedade passou por

    mudanas, deixando de ter dimenses claras e rgidas, no propensa a alteraes, quanto a

    sua forma, passando a ser lquida, fluda, constantemente propensa a alteraes,

    movendo-se facilmente de uma forma para outra com extraordinria mobilidade e leveza.

    A situao a que Bauman se refere foi chamada por ele de modernidade lquida.

    Segundo a psicanalista Franoise Dolto alguns psiclogos reduzem a

    adolescncia a um ltimo captulo da infncia2, chegando a fazer o seguinte

    questionamento: Ser uma idade fechada, uma idade marginal ou uma etapa original e

    capital da metamorfose da criana em adulto?3.

    Atravs deste artigo, sero destacadas caractersticas dos adolescentes e

    registrados apontamentos de como eles se tornam marginalizados4 frente s situaes

    impostas pela modernidade considerada como lquida. Tambm ser descrito como est o

    perfil dessa sociedade e como ela influencia o comportamento daqueles que esto

    inseridos nela. Por fim, buscar-se- montar um contraponto de como os adolescentes

    podem estar sendo influenciados por ela.

    A adolescncia: uma fase lquida

    Alguns especialistas situam a adolescncia entre os quatorze e dezoito anos,

    definindo-a como uma simples transio para a vida adulta. Outros, a definem em termos

    1 DOLTO, Franoise. A causa dos adolescentes. Aparecida: Ideias & Letras, 2004. 2 DOLTO, 2004, p. 13. 3 DOLTO, 2004, p. 13. 4 Segundo o dicionrio online Aulete (http://aulete.uol.com.br/marginalizado). Acesso em: 06 set. 2013 s

    10:30), pode ser considerado marginalizado aquele que est margem ou que foi excludo de uma sociedade, de um grupo, de uma atividade etc., e geralmente alvo de discriminao.

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    Disponvel em: < http://periodicos.est.edu.br/index.php/nepp>

    de crescimento como um perodo de desenvolvimento muscular e nervoso, podendo

    prolong-la at os vinte anos. Para o educador, o ponto de referncia ser o fim do perodo

    obrigatrio para a escolaridade. J o juiz, ter como base a maioridade penal5. No Brasil, o

    Estatuto da Criana e do Adolescente, Artigo 2, define que Considera-se criana, para os

    efeitos desta Lei, a pessoa at doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre

    doze e dezoito anos de idade6.

    Conforme o psicanalista Contardo Calligaris, o incio da adolescncia definido

    pela puberdade, tendo como base mudanas fisiolgicas no corpo do jovem, que passa a

    ter funes e atributos iguais ao dos adultos, e com o amadurecimento de seus rgos

    sexuais. Para Douto, difcil definir uma idade especfica para o incio ou final dela, mas

    ainda pode-se considerar que o fato de maior importncia que marca a ruptura com o

    estado de infncia a possibilidade de dissociar a vida imaginria e a realidade, os sonhos

    e as relaes reais7 e que o estado de adolescncia se prolonga de acordo com as

    projees que os jovens recebem dos adultos e de acordo com o que a sociedade lhe impe

    como limites de explorao8, podendo considerar ainda, que um jovem sai da

    adolescncia quando a angstia de seus pais no causa neles nenhum efeito inibidor9.

    Os jovens que se encontram nessa fase da vida, enfrentaro conflitos internos na

    busca de repostas sobre quem e o que os adultos esperam dele, uma vez que os adultos

    lhes exigem que sejam autnomos, mas lhes negam essa autonomia10. Com todos os

    conflitos gerados nesse momento, sua fragilidade passa a ser extrema e tendem a se

    defender dos outros pelo negativismo ou pela depresso. Como a famlia a base que os

    estrutura, quando no sentem o seu devido apoio, focam toda a sua honra para vencer a

    sociedade. Assim, dirigem as suas energias ao grupo de colegas da escola, esporte ou

    outros, podendo tambm buscar uma vida imaginria provinda de meios como a

    televiso, leitura e internet.11 O telogo e psiclogo James Fowler destaca que, como os

    adolescentes ainda no possuem uma identidade prpria, ser a partir dessa

    experimentao de modelos que iro se construir como adultos. Portanto, nessa fase

    normal que experimentem modelos de identidade e isso no deve ser encarado como uma

    patologia, mas uma forma de buscar a construo da normalidade.

    Pode-se observar tambm, que os adolescentes criam um vocabulrio prprio a

    fim de imporem sua diferena em relao s demais fases. Dentre as diversas

    caractersticas pertencentes a essa fase, pode-se destacar os fatos de que passam a

    5 DOLTO, 2004. 6 BRASIL. Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispe sobre o Estatuto da Criana e do Adolescente e d

    outras providncias. 7 DOLTO, 2004, p. 21. 8 DOLTO, 2004, p. 14. 9 DOLTO, 2004, p. 25. 10 CALLIGARIS, Contardo. A adolescncia. 2. ed. So Paulo: Publifolha, 2009. 11 DOLTO, 2004.

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    apresentar certa extravagncia ao se vestir; que iro se ruborizar com maior facilidade; que

    iro esconder o rosto com os cabelos; que iro gesticular mais para diminuir o

    constrangimento de estar em pblico; que buscaro parceiros de mais idade; que se

    prepararo para a primeira experincia amorosa; que surgiro as primeiras experincias e

    dvidas quanto morte; que os meninos ficam menos sociveis aos treze anos do que aos

    doze.12

    Fowler, em seus estudos sobre os estgios da f, aponta que o Estgio 3 (F

    Sinttico Convencional) o estgio que tipicamente surge e toma fora na adolescncia.

    Dentre todas as suas caractersticas, destaca que:

    No estgio 3, a pessoa tem uma ideologia, um conjunto mais ou menos

    consistente de valores e crenas, mas no a objetivou para avaliao e, em certo sentido, no tem conscincia de possu-la. Diferenas de ponto de vista em relao a outras pessoas so experimentadas como diferenas no tipo de pessoa. A autoridade se localiza nos portadores de papis

    tradicionais de autoridade (se percebidos como pessoalmente dignos) ou no consenso de um grupo face-a-face ao qual a pessoa preza.13

    Dessa forma, localizaro a autoridade em pessoas consideradas dignas por ela ou

    pelo consenso do grupo ao qual participam. Como meio de defesa, normal que usem

    como escudo tudo aquilo que entendem como seguro (ideologias, amigos, personalidades

    em destaque na mdia, figuras histricas...) e que no tenham discernimento para separar

    o smbolo daquilo que simbolizam, por isso, qualquer pancada que recebam poder

    ficar marcada para o resto de suas vidas, mesmo que aparentemente encontrem formas de

    disfarar.

    Dolto faz a colocao de que os adolescentes se tornaram uma classe de tanto

    serem rejeitados como incapazes de entrarem na sociedade14, mas tendo em vista a pouca

    importncia e o pouco espao que recebem de seus adultos, os grupos de amigos acabam

    se tornando um meio de no se sentirem isolados e descarregar as aflies que trazem

    consigo.

    A sociedade da modernidade lquida

    Bauman apresenta a ideia de que estamos vivendo em uma era de grupos, porm,

    com delimitaes no to claras e evidentes, at por serem muitos e estarem

    constantemente chocando-se entre si. Esse fato o que faz com que os padres da

    sociedade sejam desfeitos, podendo gerar confuses e dificultar a autoconstruo do

    indivduo.

    12 DOLTO, 2004. 13 FOWLER, James. Estgios da f: A psicologia do desenvolvimento e a busca de sentido. So Leopoldo:

    Sinodal, 1992, p. 146-147. 14 DOLTO, 2004, p. 28.

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    Disponvel em: < http://periodicos.est.edu.br/index.php/nepp>

    Os telogos Nstor Mguez, Joerg Rieger e Jung Mo Sung falam em uma sociedade

    moldada por um imprio que nasce de diversos desequilbrios sociais e age atravs de

    foras que ultrapassam qualquer tipo de fronteiras, sejam elas econmicas, culturais ou

    territoriais. Esse imprio leva os integrantes da sociedade a um desejo de consumo que

    no natural e que provocado por anunciantes que buscam manter esse sistema em

    andamento15. Bauman se refere a esse desejo de consumo como um vcio, uma compulso

    por comprar que vai alm da necessidade ou utilidade e pode se apresentar na forma de

    liberao de fantasias desejosas16 que possivelmente iro permanecer insaciveis.

    No se comprar apenas comida, sapatos, automveis ou itens de imobilirio. A busca vida e sem fim por novos exemplos aperfeioados e por receitas de vida tambm uma variedade de comprar, e uma variedade da mxima importncia, seguramente luz das lies gmeas de que nossa felicidade depende apenas de nossa competncia pessoal mas que somos (como diz Michael Parenti17) pessoalmente incompetentes, ou no to competentes como deveramos, e poderamos, ser se nos esforssemos mais.18

    preciso destacar tambm o poder exercido pelos meios de comunicao sobre o

    povo, seja de forma coletiva ou individual, que estabelece aquilo que deve ser seguido e as

    necessidades citadas anteriormente. Dentre suas influncias, observa-se que:

    [...] a vida desejada tende a ser a vida vista na TV. A vida na telinha diminui e tira o charme da vida vivida: a vida vivida que parece irreal, e continuar a parecer irreal enquanto no for remodelada na forma de imagens que possam aparecer na tela.19

    Ao encontro do mundo globalizado, onde na teoria tudo possvel para todos,

    mas que quem no tem dinheiro no tem direito aos recursos que fazem a vida, no tem

    direito a existncia20, fica vulnervel gama de opes ofertadas pelo mercado e

    destacadas pelos meios de comunicao.

    Numa sociedade sinptica de viciados em comprar/assistir, os pobres no podem desviar os olhos; no h mais para onde olhar. Quanto maior a liberdade na tela e quanto mais sedutoras as tentaes que emanam das vitrines, e mais profundo o sentido da realidade empobrecida, tanto mais irresistvel se torna o desejo de experimentar, ainda que por um momento

    15 MGUEZ, Nstor; RIEGER, Joerg; MO SUNG, Jung. Para alm do esprito do Imprio. Novas perspectivas

    em poltica e religio. So Paulo: Paulinas, 2012. 16 BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Lquida. Traduo Plnio Dentzien. Rio de Janeiro: Zahar, 2001, p. 89. 17 Ver Michael Parenti, Inventing Reality: The Politics of the Mass Media, Nova York: St. Martins Press, 1986, p.

    65. 18 BAUMAN, 2001, p. 87. 19 BAUMAN, 2001, p. 99. 20 MGUEZ; RIEGER; MO SUNG, 2012, p. 31.

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    fugaz, o xtase da escolha. Quanto mais escolhas parecem ter os ricos, tanto mais a vida sem escolha parece insuportvel para todos.21

    Bauman chama a ateno para o fato de que viver em um mundo cheio de

    oportunidades e possibilidades, cada uma com a tendncia de ser mais atraente que a

    outra, aparenta ser uma experincia interessante, principalmente porque nada tende a ser

    definitivo, irreversvel, e dessa variedade que pode acabar vindo a infelicidade dos

    consumidores/indivduos, no da falta de escolha, mas do excesso que vai deix-lo com a

    dvida de ter feito a escolha certa ou no, e com isso a aflio de nunca ter os seus desejos

    plenamente atendidos.

    Consideraes finais

    A adolescncia a fase em que o jovem ir contestar praticamente todas as

    informaes que veio coletando durante a sua vida, por isso, exemplos e valores

    provindos de sua base familiar podem ter efeitos positivos ao confrontar-se com o mundo.

    As alteraes em seu corpo aliadas a todas as dvidas e conflitos internos que iro surgir

    nesse momento, deixaro o adolescente propenso baixa de sua auto-estima e a carga de

    informaes e influncias (positivas ou negativas) recebidas do meio ao qual est inserido

    podero contribuir para a formao do seu ser, ou machuc-lo para resto da vida. Assim,

    quanto mais voltil for o seu meio e mais possibilidades ele lhe ofertar, maior a

    tendncia de o adolescente no encontrar rapidamente as respostas para suas dvidas e

    prend-lo em um crculo de consumo e convivncia focado na manuteno de aparncias e

    falsos desejos. Contudo, exemplos adequados e orientaes podero ajudar a lev-los em

    direo a um futuro prspero, mesmo que no de forma imediata como gostariam.

    Referncias

    BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Lquida. Traduo Plnio Dentzien. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

    BRASIL. Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispe sobre o Estatuto da Criana e do Adolescente e d outras providncias.

    CALLIGARIS, Contardo. A adolescncia. 2. ed. So Paulo: Publifolha, 2009.

    DOLTO, Franoise. A causa dos adolescentes. Aparecida: Ideias & Letras, 2004.

    FOWLER, James. Estgios da f: A psicologia do desenvolvimento e a busca de sentido. So Leopoldo: Sinodal, 1992.

    21 BAUMAN, 2001, p. 104.

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    Protestantismo em Revista | So Leopoldo | v. 33 | p. 68-74 | jan./abr. 2014

    Disponvel em: < http://periodicos.est.edu.br/index.php/nepp>

    IDicionrio Aulete. Lexikon Editora Digital. Disponvel em < http://aulete.uol.com.br >. Acesso em: 06 set. 2013.

    MGUEZ, Nstor; RIEGER, Joerg; MO SUNG, Jung. Para alm do esprito do Imprio. Novas perspectivas em poltica e religio. So Paulo: Paulinas, 2012.

    [Recebido em: novembro de 2013

    Aceito em: abril de 2014]