a.d.e.b. · o esquema apresentado na fig. 1 pretende, de forma sim-ples, exemplificar como funciona...

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BI POLAR REVISTA DA ASSOCIAÇÃO DE APOIO AOS DOENTES DEPRESSIVOS E BIPOLARES Nº 46 A.D.E.B. www.adeb.pt Circuitos da Criatividade Cidadania Ativa na Saúde Mental Dia 30 de Novembro 2013, no Anfiteatro da Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha - Lisboa, Av. de Ceuta, Edifício Urbiceuta, 1350-125 Lisboa Assembleia Geral Ordinária: 1 10.00 horas • Análise e Aprovação do Programa de Acção e Orçamento para o ano 2014 2 11.30 horas • Colóquio subordinado ao tema: 11:30 horas - Circuitos da Criatividade Cidadania Ativa na Saúde Mental (Ver Convocatória no encarte junto com a revista Bipolar)

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  • BIPOLARREVISTA DA ASSOCIAÇÃO DE APOIO AOS DOENTES DEPRESSIVOS E BIPOLARES Nº 46

    A.D.E.B.

    www.adeb.pt

    • Circuitos da Criatividade

    • Cidadania Ativa na Saúde Mental

    Dia 30 de Novembro 2013, no Anfiteatro da Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha - Lisboa, Av. de Ceuta, Edifício Urbiceuta, 1350-125 LisboaAssembleia Geral Ordinária:

    1 10.00 horas • Análise e Aprovação do Programa de Acção e Orçamento para o ano 2014

    2 11.30 horas • Colóquio subordinado ao tema: 11:30 horas - Circuitos da Criatividade Cidadania Ativa na Saúde Mental(Ver Convocatória no encarte junto com a revista Bipolar)

  • REVISTA BIPOLAR2

    SÍNTESE DO ESTATUTO EDITORIAL

    ÍndiceCircuitos da Criatividade 3

    Cidadania Ativa na Saúde Mental 6

    Estigma Social 7

    Despertar para a Arte e para aCriatividade 8Mais crise, mais desemprego,mais depressão 8International Forum on Innovationin Mental Health 9

    Emoção e Inspiração na Escrita Criativa 10

    Testemunho da minha participaçãoenquanto bailarino intérprete noprojeto “Fragile” - testemunho 11

    Como descobri que era Bipolar - testemunho 12

    Luís Carlos - testemunho 13

    Balanço das Comemorações do DiaMundial da Saúde Mental 14Nota Biográfica 15

    • Editoriaistemáticos;

    • Publicaçãodedocumentostécnicosecientíficos sobreasdoençasmentaisemgeral,eem especialsobreadoençaUnipolareBipolar;

    • Informaçãopedagógicademodoacontribuirpara aReabilitação,EducaçãoePrevençãodaqueles quesofremdadoençaUnipolareBipolar;

    • Entrevistas,artigosdeopiniãoedocumentários;

    • Divulgaçãoetestemunhosdepacientesefamiliares;

    • RelatóriodasatividadessociaisdesenvolvidaspelaADEB;

    • ConsultóriojurídicoabrangendotodososramosdoDireito;

    • Espaçoparadivulgaçãodaspotencialidadesdos associadosnocampocultural,recreativoesocial;

    ESCREVAEDIVULGUEAREVISTABIPOLAR

    A cidadania ativa é assaz uma atitude de combate ao estigma…!

    A Direção da ADEB no início do ano 2013, por razões de contenção financeira e falta de apoios públicos e privados, decidiu editar alguns números da revista Bipolar, números 44 e 45, em suporte informático, implicando que um número assinalável de associados, mais antigos, ou seja filiados desde o ano 1991 até 2005, não tenha tido a disponibilidade de acesso a fontes de informação na Internet, assim ficando privados do acompanhamento da vida associativa, atividades programadas e da publicação de artigos técnicos e pedagógicos sobre a saúde mental.

    Embora prevaleça o mesmo grau de falta de sustentabilidade financeira, foi considerado importante editar este número, excecionalmente, tendo em vista proporcionar aos associados um elo de comunicação institucional e solicitar um apoio e colaboração dos associados que já tenham correio eletrónico e que não recebem a revista em suporte informático. Desta forma devem proporcionar e rentabilizar esta fonte de comunicação para uma informação mais célere, atempada e sem custos para [email protected] , indicando o nº de associado, nome, e-mail , fim de ser registado e constar na Base de Dados da ADEB.

    Esta revista contém e dá relevância a duas temáticas: Circuitos da Criatividade e Cidadania Ativa na Saúde Mental, que são a expressão e o resultado de alguns trabalhos desenvolvidos por associados da ADEB, bem como de outras instituições, no campo das artes e letras durante o ano 2013, os quais foram selecionados por uma equipa de peritos conceituados, e estão publicados na página da internet da Direção Geral de Saúde, (DGS), tendo sido alvo também de exposição pública na comemoração do Dia Mundial de Saúde Mental de 2013, no Museu Nacional de Soares dos Reis, no Porto, e no Museu do Oriente em Lisboa.

    Nesta sequência, a coleção dos trabalhos criativos produzidos por alguns associados estão em exposição, até ao dia 31-11-2013, na Sede Nacional-Fórum da ADEB.

    Assim, convidam-se todas as pessoas a fazerem uma visita para apreciarem o acervo no campo da Saúde Mental e Arte.

    Cumpre salientar que a Cidadania Ativa também inclui: “os direitos culturais são parte integrante dos direitos humanos, os quais são universais, indivisíveis e interdependentes”.

    Aproveito desejar Votos de um Feliz Natal em paz e com saúde, bem como um Melhor e Ativo Ano 2014, onde a fraternidade e solidariedade impere em prol das pessoas mais desprotegidas e descriminadas por “este mundo cão, onde uns poucos comem tudo e, muitos passam fome e privação”.

    Presidente da Direção da ADEBSócio nº 8. Um dos fundadores da ADEBDiretor da revista “Bipolar”Delfim Augusto d`Oliveira

    Editorial

  • REVISTA BIPOLAR 3tema de capa

    ResumoO presente artigo é uma abordagem à criatividade. Em-bora se trate de um tema multifacetado e complexo, procurou-se, nesta apresentação, relacionar a criatividade e os processos cognitivos, nomeadamente a flexibilidade de pensamento (fluidez conceptual e a construção de analogias). Pretende-se compreender os caminhos do pensamento criativo e refletir sobre a relação entre arte e saúde mental, mais precisamente o papel da criatividade na doença mental.

    Palavras-chave: criatividade, flexibilidade de pensamen-to, analogia, doença mental, arte em contexto terapêutico.

    AbstractThis article is an approach to creativity. Although it is a multifaceted and complex subject, in this paper I relate creativity and cognitive processes, concerning the flexibil-ity of thought (conceptual fluidity and building analogies). The aim is to understand the paths of creative thinking, and reflect on the relationship between art and mental health, more precisely the role of creativity in mental illness.

    Keywords: creativity, flexibility of thought, analogy, men-tal illness, art in therapy context.

    Introdução

    Este artigo surgiu na sequência de um convite para es-crever algumas palavras acerca da relação entre criativi-dade e doença bipolar (maníaco-depressiva). Optei por iniciar este documento com a apresentação de um simples exercício que utilizei como ponto de partida (Fig.1), in-spirado na teoria das analogias e estabelecendo a ponte com a criatividade. Para, desta forma, abordar o tema da fluidez de pensamento, associada à criatividade, mas tam-bém à doença bipolar. Numa das primeiras leituras en-contrei o seguinte: Creativity is extra/ordinary, original and fitting, full-filling, in(ter)ventive, co-operative, un/conscious, female, re…creation1 (Pope, 2005); e se alguém dizia que é preciso ser-se criativo para abordar a criatividade, nada melhor do que inaugurar o artigo com esta original definição. Por outro lado, intitular este artigo de circuitos da criatividade é com o objetivo de realizar um trajeto pelos caminhos da criatividade e da flexibilidade de pen-samento. Por último, procura-se refletir sobre a relação entre arte e doença mental, valorizando alguns aspetos e desmistificando outros.

    1 Tradução: Criatividade é extra/comum, original e ajustada, completa, in(ter)ventiva, cooperativa, in/consci-ente, femininamasculina, re…criação.2 Hofstadter na sua abordagem sobre a perceção, define conceitos fluidos como conceitos com fronteiras flexíveis (…) que se adaptam a circunstâncias não antecipadas (Hofstadter et al., 1995).3 Nomeadamente numa sessão criativa, em contexto terapêutico.4 Os períodos distinguidos por Wallas são quatro: preparação, incubação, iluminação e verificação (Pope, 2005).

    O esquema apresentado na Fig. 1 pretende, de forma sim-ples, exemplificar como funciona o pensamento através de analogias, procurando retratar as inúmeras e inesperadas ligações que estabelecemos entre conceitos. Este exercí-cio não é um elemento de avaliação/análise, apenas serviu como levantamento de ideias ou fonte de inspiração na concretização deste artigo. Solicitava-se que fossem esta-belecidas associações à palavra CRIATIVIDADE; através do preenchimento dos balões vazios com outros conceitos (que estivessem interligados à palavra central). Foi inter-essante observar que estabelecemos associações distintas uns dos outros, bem como, enumeramos conceitos muito díspares entre si. Este esquema foi utilizado em diversos contextos3 e a forma como cada um resolveu o desafio, deveu-se, principalmente, ao conjunto de referências que se encontram na “bagagem” individual. Cada individuo usa os conceitos de forma muito diferente e é isto que pode diferenciar o processo criativo pois será a partir daqui que cada individuo constrói novas combinações e poderá criar novos repertórios.

    No processo criativo, a resposta a este desafio poderia corresponder ao período de preparação4; considerado um período inicial (onde os processos são maioritariamente inconscientes). As analogias representam uma espécie de veículo que nos guia aos lugares que desconhecíamos ou que julgávamos que não existiam. Funcionam como um processo cognitivo de transferência de informação, demonstram a relação que existe entre as coisas (relação de semelhança). Quando as pessoas estabelecem analo-gias, estão a perceber os aspetos das estruturas de duas situações, aquilo que Hofstadter identifica como a essência dessas situações, retirando elementos de uma e de outra. Na sua conferência Analogy as a core of cognition, este au-tor refere que a analogia é o motor do carro do pensamento e que as analogias acontecem sempre sem um propósito, são transitáveis, aparecem e desaparecem.

    Uma observação feita com o objetivo de falar na situação A pode implicitamente aplicar-se à situação B, ainda que não houvesse intenção de falar sobre a situação B e que B nunca tivesse sido mencionada. (Hofstadter, 2007)

    Fig.1 esquema baseado na teoria de Hofstadter2

    “Analogando”

    REVISTA BIPOLAR 3

    Circuitos da Criatividade

  • REVISTA BIPOLAR4

    Temperamento artísticoe doença Bipolar

    tema de capa

    Este exemplo sugere que utilizamos esquemas mentais para resolver problemas. Marvin Minsky diz que temos um grupo de trabalhadores no cérebro que explicam o que o cérebro faz quando recebe um estímulo. Muitas vezes, a informação não está lá toda, aquilo que Minsky refere como um certo desconhecimento de quem são os agen-tes5 que fazem o nosso trabalho mental. Aquele trabalho que nos faz encontrar as soluções para os nossos dilemas/ problemas. No que respeita à criatividade, com base na ar-quitetura cognitiva (onde se desenrolam os processos cria-tivos), trata-se de um nível correspondente a uma maior “busca”. Operações cognitivas cujo nível de operacionali-dade está dependente do desenvolvimento da abstração. A analogia como paradigma da cognição é um importante tópico para o estudo da criatividade pois somos criados com uma ilimitada capacidade para encaixar6 conceitos (conceitos dentro de conceitos dentro de conceitos); pos-sibilitando estabelecer conexões em geral e analisar seme-lhanças entre contextos aparentemente dissociados.

    Criatividade - Uma aliada (arte em contexto tera-pêutico)Os artistas concebem associações e justaposições ines-peradas, conceptualmente e visualmente. Eles agrupam, mistu- ram, atenuam e contrastam ideias, materiais e relíquias, tirando prazer do paradoxo e do imprevisível realçando o vulgar, o estranho e o óbvio. (Ede, 2000)

    O pensamento criativo, associado a um tipo de pensamento designado divergente, pauta-se pela capacidade de propor várias soluções para o mesmo problema, ca-racterizado por um registo exploratório e flexível. Quanto maior for o pensamento divergente maior será a capacidade criativa. Importa, contudo, salientar que a criatividade não surge do nada e a originalidade não se alcança através de formulas; a atividade mental inovadora e original é a que se afasta de padrões convencionais de resposta. O pensamento criativo está igualmente associado à capacidade de ante-cipar problemas ou acontecimentos, sendo esta antevisão importante para diversos contextos ou áreas profissionais.

    Os meus projetos podem orientar o meu olhar e torná-lo mais hábil e preciso; também posso construir a minha memória, a minha linguagem, os meus sentimentos (…) o eu criador ou executivo – o que planeia, escolhe, dirige, avalia, seleciona…(Marina, 1995).

    Numa outra perspectiva, podemos referir a importância da arte no contexto terapêutico, como potenciadora da criatividade. A arte desempenha hoje um papel incon-tornável na área da saúde, sendo por isso fundamental a definição do seu papel nas dinâmicas de reabilitação e a clarificação do seu contributo nos processos terapêuti-cos (criatividade e arte como terapia). Não de um ponto de vista instrumental (como ferramenta), mas antes como expansão de possibilidades. Através da arte podemos de-senvolver estratégias para equilibrar a complexa relação entre as expectativas e a realidade, traduzindo-se numa maior capacidade de adaptação a diversas situações. Segundo Vygotsky, a arte parece ser um meio psicológico para criar um equilíbrio entre o ambiente e os pontos críti-cos do nosso comportamento (Vygotsky, 2006). O trabalho

    5 O agente é qualquer parte ou processo da mente que é suficientemente simples por si só para ser entendido por si próprio, ainda que as interações entre os grupos destes agentes possam produzir fenómenos que são muito mais difíceis de entender (Minsky, 1986).6 Tradução de Chunking.7 Promovendo o combate ao estigma da doença mental.8 Muitas das mudanças de humor, de pensamento e de perceção que caracterizam os estados maníacos ligeiros - a inquietação, a ebulição, a expansividade, a irritabilidade, a mania das grandezas, os sentidos mais acelerados e mais agudos, as intensas experiências emocionais, a diversidade do raciocínio, e a rapidez dos processos associativos - são também características do pensamento criativo (Jamison, 2006).

    Neste ponto, pretende-se estabelecer a ligação da cria-tividade com a doença mental. Podia-se explorar este tema através do sofrimento como alimento para o ato criativo, na perspectiva de que momentos difíceis podem ser aproveitados criativamente. No entanto, no contexto deste artigo interessa a abordagem no âmbito da fluidez de pensamento.

    Embora se possa associar o aumento da produtividade artística à doença bipolar (talvez a doença ponha em evi-dência algumas das características mais criativas dos indi-víduos), tal não justifica a relação direta entre a doença bipolar e uma predisposição para as artes ou para as atividades criativas em geral. A relação entre hipomania e o talento artístico pode ser evidente, se considerarmos os estados de espírito elevados e efusivos, uma autoestima acentuada, enorme energia, pouca necessidade de sono, en-tre outros8 (Jamison, 2006). Ainda assim, mesmo conside-rando que certas características da doença, combinadas com talento, podem traduzir-se numa fonte de criativi-dade, é sempre necessário manter a atenção, a disciplina e o equilíbrio (Jamison, 2006). Esta disciplina está, portanto, relacionada com a capacidade de planear, mas também de executar. Fases mais difíceis da doença podem compro-meter a capacidade de concretização.

    artístico pode causar exaltação, mas também promover alívio, no sentido em que a arte pode repor o equilíbrio, atuando como elemento unificador de uma certa desa-gregação. A importância de quebrar fronteiras para en-contrar soluções criativas, serve para questionar e esta-belecer novas relações. Segundo Bohm, para despertar o estado mental criativo é necessário estar alerta das reações mecânicas que nos causam adormecimento. A revelação cria-tiva é crucial para dar novos passos e por isso fundamental para a vida em geral (Bohm, 2001).

    Paralelamente, pode-se pensar na arte como um possível caminho para tornar a sociedade mais inclusiva pois poderá contribuir decisivamente para a integração de todos7. Esta ideia de inclusão é particularmente importante para as minhas reflexões uma vez que pretendo, através dos meus projetos, “operar” em transformações de atitudes, construindo posturas mais criativas e por conseguinte mais flexíveis.

    Temperamento artísticoe doença Bipolar

  • REVISTA BIPOLAR 5tema de capa

    9 Mania é caracterizada pelo excesso de energia e pode ser experimentada de forma negativa, como uma pressão interna disruptiva e perturbadora, ou positivamente, como uma sensação de poder infinito, de grande habilidade e criatividade (PDM, 2006).10 A capacidade de combinar as ideias ou as categorias do pensamento a fim de formar conexões novas e originais (JAMISON, 2006).

    Estudos apontam que num exercício de associações (se-melhante ao apresentado na Fig.1), as respostas a uma tarefa desta índole triplicavam durante a mania9 (Jamison, 2006), consequência da agilidade de raciocínio e grande rapidez nos processos associativos10. Não obstante, im-porta entender em que medida esta capacidade beneficia de facto o pensamento criativo. A fluidez de pensamento, a tendência para “disparar em diversas direções” pode fa-cilitar nas atividades criativas, mas apenas onde já exista al-gum talento ou motivação. À guisa de conclusão, deve-se assinalar que nem todos os indivíduos com doença mental são criativos, nem todos os criativos sofrem de doença mental.

    Conclusão

    A fluidez de pensamento é uma das características asso-ciadas ao pensamento criativo e também à doença bipolar. Contudo, é precipitada a estreita ligação, muitas vezes uti-lizada, entre esta doença e a tendência para as atividades artísticas /criativas. Por outro lado, se a atividade cria-tiva pode promover representações mais flexíveis e uma maior capacidade de adaptação (conduzindo a ações mais flexíveis), esta fluidez também pode ser aproveitada/ ca-nalizada para a melhoria da qualidade de vida das pessoas com doença mental. Através da arte podemos organizar e reorganizar a nossa experiência no (e do) mundo, para além de que a arte tem a capacidade de nos situar, con-tribuindo para o autoconhecimento (são atos de des-coberta permanentes).

    Referências bibliográficas

    BOHM, David. Sobre la creatividad. Editorial Kairós. Bar-celona, 2001.

    EDE, Siân. Strange and Charmed. Science and the contempo-rary visual arts. Calouste Gulbenkian Foundation. London, 2000.

    HOFSTADTER, Douglas. Fluid Concepts and Creative Anal-ogies: Computer Models of the Fundamental Mechanisms of Thought. Basic Books. New York, 1995.

    HOFSTADTER, Douglas. I Am a Strange Loop. Basic Books. New York, 2007.

    JAMISON, Kay Redfield. Tocados pelo fogo. A doença manía-co-depressiva e o temperamento artístico. Pedra de lua, ar-tes, letras e ofícios, SA. Colares, 2006.

    MARINA, José A. Teoria da Inteligência Criadora. Caminho. Lisboa, 1995.

    MINSKY, Marvin. The Society of Mind. Touchstone Book. Published by Simon & Schuster Inc., New York, 1986.

    PDM. Psychodynamic Diagnostic Manual. Silver Spring, MD: Alliance of Psychoanalytic Organizations, 2006.

    POPE, Rob. Creativity: theory, history, practice. Routledge, London, 2005.

    VYGOTSKY, Lev. Psicología del Arte. Editorial Paidós. Bar-celona, 2006.

    Analogy as a core of cognition – Douglas Hofstadter

    http://www.youtube.com/watch?v=n8m7lFQ3njk

    Dan Dennett: Can we know our own minds?

    http://www.youtube.com/watch?v=fjbWr3ODbAo

    Raquel Pedro

    Licenciada em Artes Plásticas – Pintura, pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa (FBAUL) e Pós Graduação em Ciência Cognitiva, Universidade de Lisboa. Atualmente, encontra-se a trabalhar na área da saúde men-tal (em Reabilitação Psicossocial), onde procura utilizar a arte em contexto terapêutico. Nos últimos anos, tem vindo a colaborar regularmente com a Fundação Gulbenkian numa iniciativa entre o Serviço Educativo do Museu Calouste Gulbenkian e a Casa de Saúde do Telhal, no âmbito das visitas culturais. No sentido de promover o debate reflexivo sobre a experiência artística e proporcionando um espaço de intervenção através da arte. Colabora pontualmente com o Serviço Educativo da Culturgest. Currículo artístico http://www.behance.net/raquelpedro.

  • REVISTA BIPOLAR6 tema de capa

    Todos somos seres individuais, que naturalmente procuram satisfazer as suas necessidades com um objectivo final igual para todos, atingir um bem-estar global que nos permita viver em harmonia a maior parte do tempo!

    Mas não vivemos isolados, vivemos inseridos numa comunidade, num ou vários grupos sociais onde a interação é inevitável entre todos os seus membros. Este facto faz de nós Seres Sociais e neste papel existe igualmente a necessidade de satisfazer interesses coletivos da comunidade em que estamos inseridos!

    O exercício desse papel é o exercício da cidadania! O conceito de cidadania teve origem na civilização greco-romana, na palavra “cidade”, significa o estatuto de pertença de um indivíduo a uma comunidade politicamente articulada e que lhe confere um conjunto de direitos e de deveres. É do vínculo de cidadania que decorrem as responsabilidades do cidadão face ao Estado, nomeadamente, o direito de participar na formação da vontade soberana e as obrigações cívicas, fiscais e de defesa.

    E neste contexto, Cidadania é o exercício dos direitos e deveres civis, políticos e sociais estabelecidos na constituição. Os direitos e deveres de um cidadão devem andar sempre juntos, uma vez que ao cumprirmos as nossas obrigações permitimos que o outro exerça também seus direitos e vice-versa.

    Exercer a cidadania é ter consciência desses direitos e obrigações e lutar para que os mesmos sejam colocados em prática. A prática da cidadania constitui um processo participado, individual e coletivo, que apela à reflexão e à ação sobre os problemas sentidos por cada um e pela sociedade. O exercício da cidadania implica, por parte de cada indivíduo e daqueles com quem interage, uma tomada de consciência, cuja evolução acompanha as dinâmicas de intervenção e transformação social. A cidadania traduz-se numa atitude e num comportamento, num modo de estar em sociedade que tem como referência os direitos humanos, nomeadamente os valores da igualdade, da democracia e da justiça social.

    Mais recentemente aparece o conceito de Cidadania Ativa que tem como obejctivo enfatizar o conceito inicial. Parte dos princípios individuais e coletivos, e envolve a participação efetiva dos indivíduos na vida política, na sociedade civil e na comunidade, considerando o cidadão ativo como potencial ator político, que, não só discute e debate, como também participa no curso dos processos sociopolíticos da sociedade onde está inserido.O exercício da cidadania, ativa ou não, está relacionado com a saúde dos cidadãos. Dificilmente se podem ter competências para uma cidadania positiva, implicada e ativa se o ator principal, o cidadão, não estiver munido da melhor saúde, ou se não tiver a seu lado quem o ajude nesse caminho.

    Mas neste “mundo” da Cidadania, que é o mundo de todos nós, quando se fala de Saúde Mental e de pessoas com um problema de saúde mental, temos que falar de igualdade de oportunidades, liberdade, empowerment e auto-representação.

    Entenda-se, aqui, igualdade de oportunidades, não pela igualdade de tratamento, mas pela ausência de descriminação, pela possibilidade, escolhida, de participação em todas as esferas da sociedade, aceitando as diferenças do outro.

    Quando falamos de Empowerment, falamos de um processo em que o individuo tem ao seu dispor instrumentos que lhe permitem

    Cidadania Ativa na Saúde Mental?... Ou simplesmente Cidadania?!

    um aumento de poder (psicológico, sócio-cultural, politico e económico) de modo a amplificar o exercício da sua cidadania. O poder da escolha e da expressão inteiramente ligado à evolução pessoal e social de cada um. O conceito de empowerment defende a inclusão de todos os tipos de grupos que necessitam de se envolver com a sociedade para se sentirem aceites e poderem atingir objectivos que necessitam de alcançar tal como equilíbrio de poder na sociedade, direitos iguais sem prejuízo das suas características bem como a possibilidade de se exprimirem livremente. Isso contribui para uma visão construtiva a longo prazo no que diz respeito a evolução pessoal e social.

    No que respeita ao conceito de auto-representação, este é um princípio universal que se aplica a qualquer pessoa. Cada pessoa, independentemente das suas capacidades ou dificuldades, deve participar e ter voz ativa na tomada de decisões que afetam as suas vidas. Todos temos direito à informação necessária para poder tomar decisões e fazer escolhas bem como direito ao conhecimento das possíveis consequências dos nossos atos, O que difere de pessoa para pessoa é o apoio que cada um necessita para tomar decisões e fazer escolhas, devido à sua idade, conhecimentos, estado de saúde, experiências ou capacidades.

    A auto-representação é então, um processo que envolve o reco-nhecimento de obstáculos e o desenvolvimento de estratégias para ultrapassar esses mesmos obstáculos, aumentando a capacidade de argumentação em defesa própria e de exercício de plena cidadania. No fundo, o exercício de uma cidadania plena, implica já por si uma participação ativa, de modo a facilitar a obtenção de algo que se quer alcançar, seja a mudança, ou aspectos mais pontuais. Nun-ca esquecendo que é um processo que requer responsabilidade para se alcançar o que se pretende, assumindo igualmente as con-sequências dessa escolha, equilibrando direitos e deveres.

    Quando se liga o conceito e o exercício de uma cidadania plena e ativa à Saúde Mental não podemos deixar de fazer outra ligação. A ligação com o conceito de Reabilitação Psicossocial, conceito que parte do princípio que é possível ajudar a pessoa a ultrapassar as limitações causadas pela sua doença, através da (re)aprendizagem de competências, não esquecendo a sensibilização da comunidade, sempre com o intuito de diminuir barreiras. Os objectivos finais desta intervenção passam pela emancipação do utente, a redução da discriminação e do estigma, a melhoria da competência social individual e, sempre que possível, a criação de um sistema de apoio social de longa duração.

    Ao longo das últimas décadas tem havido uma evolução significativa neste campo, não esquecendo o processo de desinstitucionalização e a reforma dos serviços de psiquiatria que tem sido lenta e difícil mas tem acontecido, nomeadamente com a criação de estruturas na comunidade. Nesta intervenção comunitária é necessário continuar a incentivar e dinamizar ações que impliquem a participação dos utentes e familiares na deteção das necessidades, no planeamento de medidas e na avaliação dos serviços reconhecendo a sua experiência como uma mais-valia, a promoção de grupos de auto-ajuda e do associativismo, a luta contra o estigma, a discriminação e a desigualdade, responsabilizando e apoiando as pessoas com problemas de saúde mental e a sua família, de forma a que possam participar ativamente em todas as áreas importantes da sua vida. Tudo isto será possível se cada um de nós tiver consciência do exercício da sua cidadania, sempre ativa!

    Dra. Teresa Ribeiro

  • REVISTA BIPOLAR 7

    ESTIGMA SOCIALAntigamente, o estigma era a marca de um corte ou uma queimadura no corpo e significava algo de mal para a convivência social. Podia simbolizar a categoria de escravos ou criminosos, um rito de desonra etc. Era uma advertência, um sinal para se evitar contatos sociais, no contexto particular e, principalmente, nas relações institucionais de caráter público, comprometendo relações comerciais.

    Na época do cristianismo, as marcas corporais tinham um significado metafórico; os sinais representavam a “graça divina”, que se manifestava através da pele. Eram também uma referência médica, representando perturbações físicas.

    Na atualidade, a palavra “estigma” representa algo de mal, que deve ser evitado, uma ameaça à sociedade, isto é, uma identidade deteriorada por uma ação social.

    Segundo Goffman (1993), a sociedade estabelece um modelo de categorias e tenta catalogar as pessoas conforme os atributos considerados comuns e naturais pelos membros dessa categoria. Estabelece também as categorias a que as pessoas devem pertencer, bem como os seus atributos, o que significa que a sociedade determina um padrão externo ao indivíduo que permite prever a categoria e os atributos, a identidade social e as relações com o meio. Criamos um modelo social do indivíduo e, no processo das nossas vivências, nem sempre é impercetível a imagem social do indivíduo que criamos; essa imagem pode não corresponder à realidade, mas ao que Goffman (op. cit.) denomina de uma identidade social virtual. Os atributos, nomeados como identidade social real, são, de fato, o que pode demonstrar a que categorias o indivíduo pertence.

    Alguém que demonstra pertencer a uma categoria com atributos incomuns ou diferentes é pouco aceito pelo grupo social, que não consegue lidar com o diferente e, em situações extremas, o converte em uma pessoa má e perigosa, que deixa de ser vista como pessoa na sua totalidade, na sua capacidade de ação e transforma-se em um ser desprovido de potencialidades. Esse sujeito é estigmatizado socialmente e anulado no contexto da produção técnica, científica e humana.

    Para Goffman, o estigma estabelece uma relação impessoal com o outro; o sujeito não surge como uma individualidade empírica, mas como representação circunstancial de certas características típicas da classe do estigma, com determinações e marcas internas que podem sinalizar um desvio, mas também uma diferença de identidade social.

    O estigma é um atributo que produz um amplo descrédito na vida do sujeito; em situações extremas, é nomeado como “defeito”, “falha” ou desvantagem em relação ao outro; isso constitui uma discrepância entre a identidade social virtual e a identidade real. Para os estigmatizados, a sociedade reduz as oportunidades, esforços e movimentos, não atribui valor, impõe a perda da identidade social e determina uma imagem deteriorada, de acordo com o modelo que convém à sociedade. O social anula a individualidade e determina o modelo que interessa para manter o padrão de poder, anulando todos os que rompem ou tentam romper com esse modelo.

    Em 2002, a Organização Mundial da Saúde - OMS alerta para a estigmatização ser uma das principais “barreiras para a implementação de intervenções efetivas” na área da saúde mental (Organização Mundial da Saúde, 2002, p.101), vendo-a como a principal causa de discriminação. Convida assim a uma maior educação e sensibilização

    por parte dos profissionais de saúde, bem como para um sistema de saúde mental mais próximo da comunidade e ações de informação junto do publico em geral. Estas recomendações abrangem não só a sociedade civil no geral, mas também as famílias dos doentes em particular. Em 2005, a Comissão das Comunidades Europeias reforça esta ideia referindo que “a estigmatização, a discriminação e o desrespeito dos Direitos do Homem e da dignidade da pessoa doente ou diminuída mental, continua a ser uma realidade que se opõe aos valores europeus fundamentais”. Consequentemente, o Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 prevê campanhas nacionais de luta contra o estigma e a discriminação das pessoas com doença mental grave (Coordenação Nacional para a Saúde Mental, 2008).

    Recentemente, a atual Proposta de Plano de Acão para a Reestruturação e Desenvolvimento dos Serviços de Saúde Mental em Portugal 2007- 2016, indica também a diminuição do estigma como um dos objetivos a alcançar até 2016 (CNRSSM, 2007). Embora escassos, os dados existentes sugerem que a prevalência dos problemas de saúde mental não se afastará muito da encontrada em países europeus com características semelhantes, ainda que os grupos mais vulneráveis (mulheres, pobres, idosos) pareçam apresentar um risco mais elevado do que no resto da Europa. A análise do sistema de saúde mental em Portugal mostra alguns aspetos positivos na evolução das últimas décadas. Foi um dos primeiros países europeus a adotar uma lei nacional (1963) de acordo com os princípios da sectorização, a qual permitiu a criação de centros de saúde mental em todos os distritos e o aparecimento de vários movimentos importantes, tais como os da psiquiatria social e da ligação aos cuidados de saúde primários.

    A nova legislação de saúde mental, aprovada nos anos 90 (a Lei nº 36/98 e o Decreto Lei nº 35/99) reforçou este capital, de acordo com os princípios recomendados pelos organismos internacionais mais importantes na área da organização dos serviços de saúde mental.

    Nos últimos vinte anos, a ADEB tem sido a Associação ligada á Saúde Mental que mais tem lutado no combate ao estigma, através da valência da educação para a saúde (Sessões Psicopedagógicas, Colóquios, Palestras, intervenções em escolas, Municípios etc.), bem como a presença nos meios de comunicação social (meios audiovisuais e imprensa escrita). A ADEB tem ainda participado em campanhas de sensibilização como “A Depressão Dói” e “Saia do Escuro”.

    “A sociedade estabelece os meios de categorizar as pessoas e o total de atributos considerados como comuns e naturais para os membros de cada uma dessas categorias”. (Goffman, 1975)

    Orlanda Correia

    (Técnica Superior de Serviço social)

  • REVISTA BIPOLAR8

    A Organização Mundial de Saúde considera a depressão a grande epidemia do século XXI. Já atinge quase ¼ dos Portugueses, sendo a principal causa de incapacidades e a origem de mais de um milhar de mortes anualmente. Portugal vive numa grave depressão, também em termos de coesão social. Esta sociedade tem cada vez menos capacidade de resposta em momentos de falta de saúde, desemprego e pobreza extrema. A erosão da coesão social é galopante, repercutindo-se acentuadamente na saúde mental dos nossos concidadãos, na combalida sanidade das famílias, no aumento exponencial dos suicídios, na ocorrência de mortes evitáveis. A depressão instala-se e é diretamente proporcional à penúria de resposta do mercado de trabalho. Quem está desempregado e não recebe prestação social – deprime. Esta sociedade economicamente anémica e socialmente desigual e injusta, empobrecida e onde o comum cidadão não interessa para nada, espoleta cada vez mais um maior número de pessoas vulneráveis à depressão. A área da saúde mental é muito sensível aos apoios sociais e quando estes vão sendo suprimidos a gravidade dos quadros depressivos aumenta significativamente. As dificuldades económicas, a perda de emprego, da casa e por vezes da própria família, deixam as pessoas mais do que tristes, causando o desespero. Há casos em que os doentes não conseguem ultrapassar a doença apenas com a ajuda da Psicologia, necessitando de complementar a terapêutica com medicamentos. As doenças mentais e neurológicas já afetam 2,5 milhões de Portugueses, daqui a uns anos os índices serão reveladores... Devido à potenciada crise e ao darwinismo social instalado, a falta de dinheiro gera dramas como os doentes terem que interromper a medicação e não se poderem deslocar aos hospitais e centros de saúde. Porém, na Europa somos os que gastamos mais em antidepressivos (!). Esta gente que diz governar (diz...), cada vez menos dinheiro utiliza do PIB para tratar a saúde mental. Está em marcha um plano de regressão sobre os psicofármacos receitados. Prescrevem-se remédios de há 40/50 anos com efeitos secundários perversos, dando origem à significativa perda de qualidade de vida dos doentes. Porquê esta perniciosa opção? Porque o ministro fiscalista da saúde “quer fazer mais com menos”. Como disse?“A saúde mental é tão ou mais importante que a saúde física” disse e bem o Presidente da ADEB, Delfim Augusto de Oliveira (aproveito para lhe dar um abraço de Saúde!). Investir na nossa saúde mental é lutar por melhor qualidade de vida, diminuindo o sofrimento das pessoas com diagnóstico psiquiátrico. A prevenção é a melhor forma de poupar dinheiro. “(...)a doença mental é responsável por quase metade do absentismo laboral [e] os custos de não agir, ou agir de forma insuficiente para a dimensão do problema, serão enormes e consumirão muito mais recursos no futuro, com as consequências negativas daí decorrentes. Esta é mais uma dívida pública para as gerações vindouras pagarem!” escreveu assertivamente no Diário de Notícias, o bastonário da Ordem dos Psicólogos Portugueses, Telmo M. Baptista. Cortar e recortar na saúde mental é CRI-ME!Humor irregular, insónia persistente, ansiedade, angústia, falta de energia anímica, raciocínio e memória em perda e ideias pessimistas acompanhadas de tendência para o suicídio , são alguns dos sintomas que pré-anunciam depressão, precisando de ajuda e acompanhamento da Psicologia e Psiquiatria. Quem aceitar e admitir o seu transitório estado depressivo tornará mais fácil, mais rápido e mais eficaz o tratamento. É da mais elementar justiça realçar o meritório trabalho desenvolvido pela ADEB – Associação dos Doentes Depressivos e Bipolares, como um bom porto de abrigo para recuperação, reinserção e superação de inúmeros casos diagnosticados. Urge ser resiliente. Os tratamentos existem, a cura é possível e a Vida (que é Querida!) voltará a sorrir também com Força interior. È preciso Acreditar!, que a depressão pode deixar de doer!!

    Vítor Colaço SantosSocio ADEB

    Mais crise, mais desemprego,mais depressão

    Despertar para a Arte e para a Criatividade

    Desde que me lembro de ser pessoa, a Arte cativa-me, expressão do olhar, da mente e da alma do artista. As formas, a luz, as cores e os materiais sempre foram apelativos para mim. Beneficiei de uma educação aberta aos horizontes culturais, em geral, e artísticos, em particular. Já jovem, algo me compelia a procurar os museus, as exposições, os livros e o cinema sobre Arte, desde os cânones clássicos até aos contemporâneos. Todavia, a biografia de muitos célebres artistas era fonte de inquietação, pois parecia haver um gene de loucura que os amaldiçoava. Vejamos os casos de Van Gogh, Munch, Camille Claudel, entre outros. Decidi atribuir à Arte o lugar de ocupação de tempos livres, ou nenhum lugar, em períodos de escassez de tempo disponível por imperativos laborais...

    Tenho encontrado ao longo da minha vida adulta, sobretudo nos espaços de formação artística que fui frequentando de forma intermitente (destacando a Sociedade Nacional de Belas Artes), diversas pessoas que se interessam pela Arte, simplesmente pessoas, sem qualquer rótulo de doença / saúde mental. Quanto a mim, mais de metade dos quarenta e poucos anos de vida tem sido acompanhada pela doença unipolar (depressão recorrente), agravada por sintomas psicóticos. Tem sido um longo percurso de aprendizagem e adoção de estratégias para minimizar a doença – em que a Arte tem um papel –, com mais ou menos apoio de familiares e amigos, bem como de profissionais, gerindo melhor ou pior as atividades que estruturam a vida. Fruto da degradação da minha saúde mental e das circunstâncias, eis-me atualmente dedicada à criação artística.

    A relação entre a Criatividade e a saúde mental é uma questão que merece a atenção de médicos, psicólogos, entre outros técnicos. Creio que uma pessoa não é doente por ser criativa. Uma pessoa criativa pode ser ou não doente, sendo que a Criatividade pode ser um instrumento terapêutico. Em que medida?

    Criar é construir algo que nos realiza e edifica. A Criatividade que habita em mim revela-se sobretudo na Arte pictórica, mas a Criatividade pode manifestar-se de muitas outras formas, tais como Literatura, Música, Dança, Artesanato, etc. e pode refletir-se em muitos domínios da vida. Ao criar podemos transformar muitos tormentos em energias positivas. Podemos exteriorizar o que nos vai na alma: o que nos perturba, o que desejamos. Podemos acalmar o caos da nossa mente e, eventualmente, reorganizar o que pensamos e sentimos. Podemos, a pouco e pouco, observar o mundo com novos olhos e voltar a acreditar em dias melhores. Podemos restaurar energias. Podemos melhorar a autoestima. Podemos simplesmente experimentar um novo desafio, sem certo ou errado.

    O que representa a minha colaboração com a ADEB, codinamizando workshops / oficinas de desenho e aguarela? Em geral, representa uma oportunidade para partilhar, abrindo portas para que outros explorem o potencial libertador da Arte. Em particular, é um modo de proporcionar a (re)aprendizagem da capacidade de observação e de interpretação de motivos materiais ou imateriais. É também um meio para transmitir como recriar volumes na superfície do papel, seja pela delicadeza dos traços e manchas a grafite ou a tinta da China, bem como pela expressividade do carvão (desenho), seja pela magia das cores, associada ao imprevisto inerente ao elemento água (aguarela). Em qualquer caso, é uma porta para descobrir e desenvolver uma bagagem criativa, quebrando a solidão, proporcionando realização e bem-estar. Em suma, é uma ponte para menos doença / mais saúde para quem ensina e quem aprende.

    14 de outubro de 2013Maria João Neves

  • REVISTA BIPOLAR 9

    Decorreu no passado dia 3 e 4 de outubro de 2013, em Lisboa, o “International Forum on Innovation in Mental Health”, organizado pela plataforma de Saúde Mental Global da Gulbenkian em colaboração com a Organização Mundial de Saúde.

    Esta ação, que contou com o contributo de especialistas de todo o mundo, procurou promover uma reflexão critica que contribua para a melhoria do conhecimento sobre saúde mental, tendo em conta quatro temas relevantes:

    - Determinantes sociais que possam ser modificados para ajudarem na promoção da saúde mental e prevenção das doenças mentais;

    - As relações fundamentais entre a doença física e mental, e as implicações da integração da saúde mental nos planos de saúde em geral;

    - A urgência de uma mudança radical na gestão das doenças mentais, afastando-se das hospitalizações a longo termo e promovendo a integração destes cuidados na comunidade;

    - A importância da proteção dos direitos de pessoas com doença mental, especialmente as crianças em ambientes psiquiátricos.

    Foram apresentados relatórios com dados de vários países dentro destas áreas e foi reiterada a necessidade de se dar mais protagonismo e importância, por parte da comunidade e dos decisores políticos, ao impacto real da doença mental nas pessoas, na sociedade e na economia, assentando no princípio de que não pode haver saúde, sem saúde mental.

    Segundo um estudo mundial, realizado em 2005, cerca de 28% do peso das doenças com impacto nos anos de vida e na produtividade das pessoas, são doenças neuropsiquiátricas, afetando a doença Unipolar cerca de 10% e a doença Bipolar cerca de 2% da população mundial (Prince M. et al. No Health without mental health. The Lancet, 2007, 370 (9590): 859-77). No entanto, e apesar desta constatação, esta área não é valorizada no quadro global estratégico de intervenção, em detrimento de outras doenças, o que dificulta bastante a implementação de mais estratégias inovadoras e eficazes.

    Vários especialistas de diferentes países partilharam a sua visão acerca das estratégias e determinantes envolvidos na área da saúde mental. O processo de desinstitucionalização, que passou, também em Portugal, pelo encerramento de grandes hospitais psiquiátricos, nem sempre foi acompanhado pelo desenvolvimento de estruturas na comunidade que proporcionassem um alternativa consistente aos doentes e às suas famílias, tendo muitas vezes resultado num aumento da população de pessoas com doença mental nas prisões e nos sem-abrigo. Por outro lado, têm sido desenvolvidas na comunidade respostas que, progressivamente, vão assegurando a manutenção dos cuidados médicos,

    complementados por estratégias de integração e reabilitação psicossocial e capacitação dos doentes e suas famílias, para que possam sentir-se mais informados e apoiados.

    Há que manter o investimento nestas estruturas, para que elas possam melhorar os serviços que proporcionam e abranger áreas populacionais cada vez mais vastas. O rácio de médicos e instituições por pessoa é abismalmente díspar em continentes como a Europa e África, por exemplo, e até dentro dos próprios continentes, tendo em conta as suas especificidades culturais, geográficas e socio económicas.

    Foi no entanto muito importante a identificação de vários projetos que começam a dar os seus passos, em áreas do planeta normalmente mais vulneráveis e menos protegidas, por exemplo em África e Ásia. No entanto, nem sempre o rendimento per capita implica necessariamente uma diferenciação positiva na esperança média de vida, nem na qualidade de vida, devendo cada situação ser analisada e interpretada à luz das suas características específicas.

    A relação de uma doença como a depressão, com o aumento de probabilidade de morte por outras doenças foi também um fator abordado, bem como a dificuldade de se fazer um diagnóstico médico adequado neste tipo de casos, remetendo-se para a necessidade de uma mais eficaz integração da saúde mental nas estratégias de gestão da saúde em geral.

    É necessário que existam mais profissionais qualificados, distribuídos geograficamente de acordo com as necessidades das populações em todo o mundo, e com o envolvimento das políticos e das comunidades, para que este objetivo seja alcançado com eficácia. Estas questões estão identificadas há muito, mas há uma certa resistência na sua implementação no terreno. Um dos conferencistas abordou a importância que estratégias inovadoras como a Tele psiquiatria (consultas via telefone ou via Skipe), tem em países com vastas áreas geográficas e com más redes de transporte. Esta, como outras técnicas está em fase de exploração, para que se possa concluir acerca da eficácia da sua implementação, mas representa um esforço criativo de ultrapassar as dificuldades que se vão encontrando.

    Foi dada uma grande importância ao papel da intervenção precoce, nas crianças e nos jovens, quer em termos médicos, quer sociais, visto que estas áreas estão bastante interligadas e influenciam-se mutuamente.

    O objetivo global da redução do risco da doença mental deve ser feito através de intervenções estruturais, ambientais e locais, integradas no sistema global de saúde de cada país, apostando-se na melhoria dos processos de desinstitucionalização, e no desenvolvimento de respostas complementares adequadas. Há que dar-se continuidade à prevenção e promoção da saúde mental, com vista a alcançar estes objetivos.

    Dra. Renata FrazãoPsicóloga Clínica ADEB

    International Forumon Innovation inMental Health

  • REVISTA BIPOLAR10 testemunho

    À partida todas as formas de escrita são potencialmente

    criativas. O estímulo que nos assola ao escrever pode ter

    origem em variadíssimos acontecimentos, por exemplo

    um sonho, um fenómeno da vida real, uma palavra, um

    gesto, etc.; A isto chamamos muitas vezes inspiração.

    Quantas e quantas vezes não nos emocionamos com

    algo que nos acontece, quantas vezes esse facto não é

    pretexto para um texto ou um poema? A Escrita Criativa

    pode-se desenvolver mas não se pode ensinar, não tem

    receitas nem dogmas.

    A leitura é indispensável; só quem lê observa e

    interpreta todo o mundo da escrita. É muito difícil

    escrever sem ler muito. A leitura dá-nos bagagem e

    ferramentas para estruturar a nossa própria escrita.

    Escrita Criativa é todo o universo que se nos apresenta

    numa folha em branco. Começar é o primeiro desafio,

    fazer desfilar as palavras segundo o nosso contentamento,

    segundo o nosso gosto, preenchendo assim, o espaço

    vazio da nossa folha. Quando emocionalmente

    envolvidos, a caneta toma conta das palavras e toma

    conta de todo o texto; Uma vontade irreprimível agarra-

    nos na mão e conduz-nos a um mundo que à partida

    não se nos afigurava real. É necessário uma boa dose

    Emoção e Inspiração na Escrita Criativa

    de perseverança para escrever e é preciso ter uma

    intenção: um objectivo. Devemos sempre estabelecer o

    nosso objetivo: organizar previamente o que se pretende

    alcançar e quais as etapas para o concretizar. Para isso

    é necessária força de vontade, porque nem sempre

    as coisas saem como nós queremos, muitas vezes é

    preciso recomeçar e recomeçar até conseguirmos algum

    resultado.

    Sendo a escrita produto de emoção e inspiração, o

    ato de escrever é sempre um ato solitário, somos nós

    e a nossa folha. É com esta solidão que temos de nos

    confrontar; o nosso desígnio depende desta solidão e

    só assim podemos ser completamente críticos do nosso

    trabalho. O sentido de autocrítica deve estar sempre

    presente. Nós somos os nossos mais cruéis juízes.

    Todo o texto criativo é produto de reflexão e de

    trabalho de ideias, cresce quando começa e esgota-

    se quando termina. Por tudo isto é importante termos

    presente todas as fases da escrita, estarmos atentos às

    nossas emoções e contar sempre com uma dose de

    inspiração.

    António Alberto

  • REVISTA BIPOLAR 11

    Poder fazer parte de um elenco profissional composto por pessoas que amam e dedicaram grande parte da sua vida à dança foi extremamente gratificante. Na minha perspetiva, participar neste projeto exigiu um grau de disponibilidade elevado ao nível físico e mental, bem como muita responsabilidade devido aos compromissos que foram assumidos e a interdependência que se estabeleceu entre todo o grupo de trabalho.

    Responsabilidade acrescida pela minha necessidade de conciliar todos os fatores com o meu trabalho e estudos. Foi sem dúvida um grande desafio. A possibilidade de aprender várias técnicas e metodologias associadas ao processo artístico da dança contemporânea e poder expressar-me através desta arte com todo o elenco, foi uma experiência maravilhosa e única.

    O projeto português foi criado de raiz, onde todos fomos parte ativa e nos foi dada a possibilidade de contribuir na criação, desenvolvimento e construção da nossa peça. A metodologia utilizada originou altos níveis de identificação por parte de todos os intervenientes.

    Voltar a pisar grandes palcos foi muito importante. Viajar, poder expressar-me através da dança contemporânea a outros povos e culturas, foi uma experiência extremamente positiva e inesquecível.

    Partilhar o palco com artistas de outros países com diferentes perspetivas de vida foi muito enriquecedor.

    Este projeto vale pelo seu todo, tem uma dimensão grandiosa ao nível pessoal, humano e social. É uma referência para trabalhar com pessoas que possuam necessidades específicas e teve um impacto muito positivo na sociedade. Os meus familiares, amigos, colegas e professores ficaram extremamente satisfeitos ao constatar que é possível pessoas com necessidades específicas na área da visão poderem exprimir-se e dançar a nível profissional.

    Senti admiração por me verem a ultrapassar todas estas barreiras tantas vezes intransponíveis, umas vezes por

    Testemunho da minha participação enquanto bailarino intérprete no

    projeto “Fragile”

    testemunho

    pura ignorância, outras porque outros valores se levantam, dando primazia ao materialismo em detrimento do Humanismo.

    Este projeto só foi possível porque existiu consciência política, económica e social para a sua concretização.

    É extremamente importante que haja continuidade destas políticas e que as pessoas com necessidades específicas que receberam formação nesta área sejam acolhidas, acarinhadas e envolvidas em novos projetos, para que a semente que foi plantada se possa transformar numa árvore robusta que dê belos frutos.

    Gostaria por último de agradecer a toda a equipa com quem trabalhei, à Ana Rita Barata, Pedro Sena Nunes, Joana, Bernardo Gama, Sofia Serominho, Clara, Tiago, João Caxulo, a todos os Colegas que constituíram o elenco da Noruega e Estónia, bem como a todos aqueles que assistiram aos nossos espetáculos, nos aplaudiram e acarinharam.

    Deixo ainda um agradecimento à Vo´arte e à ADEB, instituição onde trabalho e que desde o início me apoiou e incentivou durante todo este projeto, não podendo ainda esquecer o meu Colega José Torres que me apoiou incondicionalmente nesta caminhada, bem como à minha mulherDiana Couto, às minhas filhas Ana Rita e Bruna Raquel e ao meu pai Delfim Oliveira e Mãe Aurelina Oliveira, bem como às minhas irmãs Catarina e Mónica. Porque a união faz a força e a diferença entre o possível e o impossível é ínfima e depende única e simplesmente da determinação de cada um. E porque ter participado numa experiência como a que foi proporcionada neste projeto foi extraordinário,

    Verto aqui a palavra saudade

    Muito Obrigado a Todos

    Até Sempre

    Luís Oliveira

  • REVISTA BIPOLAR12 testemunho

    Agora tenho 47 anos, tenho esta doença desde os meus vinte anos, naquele tempo chamavam-lhemaníaco-depressiva. Parece que ainda estou a ouvir a minha irmã a gritar no Centro de Saúde Mental de V.N.Gaia:

    - “Ela é maníaca!” Foi quando ela e a minha mãe me acompanharam num episódio de crise; já não era a primeira vez, mas foi a primeira vez que a enfermeira disse o nome da doença.

    Recuamos 23 anos atrás e tudo era quase desconhecido, principalmente quando se tratava de uma doença do foro psiquiátrico.

    Eu era uma rapariga “normal” quando andava na escola, nunca reprovei, no liceu vivi o meu 1º amor e a 1ª desilusão. Após essa experiência desastrosa, adormecia sempre a chorar, andei assim durante 1 ano. Tinha um quarto só para mim, por isso ninguém se apercebeu.

    Mudamos de casa, acabei o 12º ano e como não entrei na universidade, ao surgir a possibilidade de emigrar, não pensei duas vezes. Fiz 18 anos em outubro e em dezembro, uma semana antes do Natal, lá fui eu para a Suiça, ganhar tanto como o meu pai, que já trabalhava à 20 anos. O meu 1º emprego e sem nunca ter estado fora de casa, à exceção do mês das férias grandes, na aldeia em Trás dos Montes.

    Um ano antes desta minha partida, tivemos uma grande tragédia na família, num acidente de automóvel perdi a minha avó, um tio e a minha afilhada no mesmo dia. Fiquei um mês nos C. Intensivos do Hospital Pediátrico de Coimbra a cuidar de um primo cujos pais, que também ficaram feridos, não tinham condições para o fazer. Digo isto porque há pessoas que dizem que acontecimentos traumatizantes podem espoletar a doença.

    No Natal de 1988 estávamos muito atarefados no que diz respeito a clientes (ex. Carolina do Mónaco, família Agnelli, etc.), pela 1ª vez fui ao médico da aldeia dos Alpes onde trabalhava; talvez o velho Dr. Durban tenha diagnosticado mal aquele episódio, atribuindo o meu problema ao stress receitou-me umas gotas para tomar 15 antes de dormir. Passei esse fim de ano no Hospital Psiquiátrico quase a 200 km, tendo sido encaminhada depois para um psicólogo no Hospital de Samedan.

    Nessa única consulta, pós internamento, o psicólogo chegou à conclusão que o meu problema era igual ao dele, “saudades”, era italiano casado com uma suiça, disse que sentia “nostalgia” do seu país e amigos.Considerou que sendo eu muito nova, nunca tendo estado longe de casa antes, tinha sido desenraizada da família, amigos e de tudo o que me era mais querido.

    Um ano mais tarde, para dar oportunidade à minha irmã de arranjar lá trabalho, fui numa viagem de barco, com amigos ingleses, suíços, holandeses, etc. de Espanha até à Grécia. Quando lá chegámos, e porque o mar é muito desgastante, já estava doente. Voltei através da embaixada, entregue a uma hospedeira.Fui levada por uma tia à urgência do Hospital Magalhães Lemos, fiquei internada cerca de 2 semanas. A minha mãe falou com a médica que concordou com o médico italiano ao dizer que eu

    COMO DESCOBRI QUE ERA BIPOLAR!...

    não tinha estofo para emigrante, criando na minha mãe a ideia que se eu ficasse por cá nunca mais ficaria doente.

    A verdade é que tal não aconteceu, comecei a trabalhar em Maio de 1989 na empresa onde estou hoje e Graças a Deus onde todos são meus amigos e me tentam ajudar.

    Depois de vários internamentos no CHVN Gaia, e depois de um casamento desastroso, ouvi falar da ADEB; já tinha tentado encontrar a associação noutra ocasião, sem sucesso, ainda era na Boavista.

    Em Agosto de 2010, estava com outra depressão e o meu diretor insistiu que eu tinha de ser internada. Isso eu tinha a certeza que não queria. Fiquei um mês de baixa e aproveitei para procurar encontrar a ADEB.

    Desde essa altura, depois de ter sido muito bem acolhida e acompanhada, quer em consultas de apoio psicológico, quer fazendo parte do GAM (grupo de ajuda mútua), participando em sessões psicopedagógicas ou em Workshops (ex. sobre Ansiedade), etc., tenho andado muitíssimo bem.

    Continuo a ser acompanhada pela minha psiquiatra no H Santos Silva, mas a verdade é que me foram facultadas armas e ajudas na ADEB para enfrentar esta doença que se eu continuasse sozinha talvez esta história fosse bem mais triste.

    Há muitas pessoas que poderiam aparecer por lá e ser ajudadas. Eu conheço pessoas com familiares doentes a quem falei, mas preferem suportar o fardo sozinhas. Dizem logo, é melhor não. Ainda há vergonha nos dias de hoje de procurar ajuda. Têm medo que digam disparates e os deixe ficar mal. Não querem arriscar, têm filhos em casa, até era bom para eles entenderem um pouco mais o que se passa.

    Eu tenho um filho com 16 anos, não tem sido fácil para ele, mas desde que estou na ADEB, já precisei de apoio para ele e tenho a certeza que neste momento me entende muito melhor graças ao apoio que lhe foi facultado.

    Não é escondendo-nos em casa, fugindo das pessoas, tentando ignorar a doença que ficamos melhor.

    1º Passo é aceitá-la e tentar falar com outros pois não estamos sós.

    2º Passo nunca esquecer de tomar a medicação, estes

    serão os 2 primeiros de muitos outros que nos podem proporcionar bem estar, só de nós depende encontrar força para não entrar em depressões e tentar viver o melhor possível.

    Espero que este testemunho ajude mais pessoas que como eu andaram muito tempo numa montanha russa de emoções e que agora estão estáveis, não é uma cura milagrosa, mas não custa tentar.

    Até sempre!...

    Teresa RibeiroSócia ADEB

  • REVISTA BIPOLAR 13

    Tive no verão de 1990 uma grande paixão por uma cantora muito conhecida do rock português e deixei de dormir cerca de duas semanas.

    Não sabendo o que tinha, fui internado no hospital psiquiátrico do Telhal.

    Mais tarde melhorei e comecei a pensar na minha vida. Em 1993, com vontade de pintar, fui para a Escola de Artes , o A.R.C.O tirar um curso de pintura.

    Nessa altura já escrevia poesia e letras para canções.

    Comecei a fazer exposições, com a saúde em bom estado, tomando a medicação que me era receitada pela Psiquiatra e tudo foi andando.

    No ano 2000 fui representar Portugal à Hungria num workshop de artes plásticas, tive um descuido com a medicação e fui parar ao Hospital de Veranka, a cem quilómetros de Budapeste, capital da Hungria.

    Hoje escrevo livros e faço exposições, com a saúde estabilizada, tomando sempre a medicação, frequentando o apoio psicológico da ADEB e não tenho uma crise há treze anos.

    Há dois anos deixei as bebidas alcoólicas e melhorei ainda mais.

    Leio muito sobre a doença, sinto-me normal, faço aquilo de que gosto e assumi publicamente num livro que escrevi que tinha a doença Bipolar.

    Para terminar vou dizer o seguinte a todas as pessoas que têm a doença Bipolar: tomem a medicação e evitem as bebidas alcoólicas, porque tiram o efeito dos medicamentos.

    Medicado, um doente Bipolar pode ter uma vida normal, mas sem estar medicado tem muitos problemas.

    Sabemos que neste mundo bipolar existem também grandes génios, da literatura, da política e da arte.

    Eu já escrevi até agora três livros de poesia, fiz doze exposições individuais e quinze exposições coletivas de pintura. Esta doença não tem cura, mas não mata ninguém.

    Luís Carlos Lopes

    testemunho REVISTA BIPOLAR 13

  • REVISTA BIPOLAR14

    No passado dia 12 de Outubro de 2013, no âmbito das Comemorações do Dia Mundial da Saúde Mental subordinado ao tema “Encontros de Saberes e Memórias entre Gerações”, a Delegação Norte da ADEB realizou no Auditório do Município de Matosinhos, uma Sessão Pública em que foram apresentadas as comunicações sobre a “Saúde Mental na Comunidade” e “Impacto da Doença na Pessoa com Perturbação do Humor e na Família”, ambas enquadradas no programa de ação e na consequente função de intervenção comunitária.

    A abertura da Sessão foi presidida pela Sra. Vereadora do Pelouro da Ação Social da C. M. de Matosinhos, Dra. Lurdes Queirós, em representação do Presidente da Câmara, Dr. Guilherme Pinto e pelo Membro da Direcção e Coordenador da Delegação da Região Norte Dr. António Vieira, em representação do Presidente da Direção Nacional da ADEB, Delfim Oliveira.

    Como oradores convidados participaram o Dr. Álvaro Carvalho (Director do Programa Nacional para a Saúde Mental), o Dr. Jorge Bouça (Coordenador Regional da Saúde Mental-ARSN), a Dra. Ana Venâncio (representante do Centro Distrital da Segurança Social do Porto), o Dr. Jaime Neto (Membro da FNERDM), a Dra. Fátima Ferreira

    BALANÇO DAS COMEMORAÇÕES do DIA MUNDIAL da SAÚDE MENTAL,

    subordinado ao tema

    “Encontros de Saberes e Memórias entre Gerações”.

    (Directora do Serviço de Psiquiatria da UL. de Saúde de Matosinhos), o Dr. Paulo Horta (Médico psiquiatra do Hospital Magalhães Lemos), a Prof. Dra. Lia Fernandes (Médica Psiquiatra do Hospital de S. João, e Presidente da Associação Portuguesa de Gerontopsiquiatria) e o Dr. Adrián Gramary (Director Clínico do Hospital do Conde Ferreira).

    A realização deste evento pela ADEB insere-se na vertente da Promoção e Educação para a Saúde Mental, como meio de proporcionar à comunidade, aos associados da ADEB bem como aos seus familiares, informação especializada, permitindo aceder a elementos fundamentais na educação para a saúde, de modo a gerar um maior conhecimento e uma proximidade interpessoal mais salutar.

    A sessão contou com a presença de setenta pessoas, entre as quais representantes de autarquias e unidades de saúde, profissionais de reabilitação psicossocial, estudantes, bem como associados e familiares e terminou com um almoço convívio.

    Este evento foi Co-Financiado pela Segurança Social: AFEAF’2012 | Apoio Financeiro do Estado às Associações de Família.

    Orlanda Correia

    outubro/2013

  • poesias REVISTA BIPOLAR 15

    Taita M. Cunha nasceu em Huambo, Angola, em 29 de Março de 1959. É licenciada em Engenharia Agroindustrial, tem uma graduação em Engenharia da Qualidade e é actualmente, doutoranda em Bioquímica.

    Em Janeiro de 2009 começou a desenhar devido a uma psicose. É uma autodidata. Continuou a pintar, atravessando todas as depressões e psicoses que teve, com o seu Cristal – a Pintura-. Grande parte dos seus quadros foi pintada em hospitais.

    Taíta M. Cunha tem um verdadeiro fascínio pelas cores. Muito embora toda a sua vida tenha sido de grande esforço e sacrifício, todos os seus trabalhos refletem Alegria, sintonia com o Universo e uma grande Paz interior.

    Os desenhos de Taita M. Cunha representam um verdadeiro desafio à flexibilidade mental. Os múltiplos efeitos de ilusão óptica e o facto de alguns poderem ter leituras em várias posições, transportam a perceção visual para o mundo da fantasia. Não basta um simples olhar para os observar.

    O resultado da percepção de um arranjo visual é

    NOTA BIOGRÁFICA

    determinado pelas relações que a pessoa faz entre as imagens e o seu contexto. Essas relações são únicas para cada pessoa e cada contexto, mas são balisadas nas experiências prévias da pessoa.

    Os conjuntos possuem leis próprias e estas regem os seus elementos (e não o contrário). Só através da perceção da totalidade é que o cérebro humano pode perceber, descodificar e assimilar uma imagem ou um conceito.

    Taita M. Cunha dá vida aos seus desenhos com base no princípio Gestalt da Psicologia de que “o todo é mais do que a soma das partes”. Isto equivale a dizer que “A + B” não é simplesmente “(A+B)”, mas sim um terceiro elemento “C” que possui características próprias.

    Gestalt é um termo intraduzível do alemão, utilizado para abarcar a teoria da perceção visual baseada na psicologia da forma.

    Taita M. Cunha foi selecionada, este ano (2013), para representar Portugal, no mais importante livro de arte internacional que sai em Novembro, “State of the Art – Artist’s Book”

  • Até quando?Ate quando a solidão e a dor?Quero um verdadeiro amorvê-lo sorrir ao chegare em seus braços descansar

    Quando?Quando virá a paixãoque em amor se tornaráa febre no coraçãocorpo e alma ao deus dará

    Será uma tola ambiçãoquerer viver em sintoniater o desejo latentemistura de corpo e de mente?

    O todo é a soma das partes?Amor, Sexo e Paixão3 vertentes de 3 artescom salpicos de razãonuma teia de ilusão

    Desprograma o inconsciente,usa a auto-sugestãovive as emoções a quente,solta a imaginação!

    Joana Plácido

    AGUACEIROSTenho tantos sonhos, tantos e tão belosPorque não levaste, Mãe, um dois ou três?Eram meus tesouros, são os teus anelosE são tantos sonhos, tantos e tão belosQue sempre me deste mais um dois ou três

    O canto que eu cantoÉ voz a fluirDa voz do encantoQue eu gosto de ouvir

    De onde a outra voz?Que estranho doerA fugir de nósA sorrir a sósSem qualquer nascer

    Em tantas cantigasDe nada passouE em loas antigasTriste não parouEste coraçãoMeu tesouro inquietoChave sem razãoCom nada secretoVoa se quiseresMas volta ao lugarSe não esqueceresO que te é voar!

    Otília Ferreira

    CANÇÃO DE EMBALAR