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1. OS ASPECTOS CENTRAIS DA CONCEPTUALIZAÇÃO TEÓRICA DE SIDNEY BLATT SOBRE A DEPRESSÃO Nos anos 70, Blatt e seus colegas iniciaram uma série de estudos sobre a depressão (Blatt, 1974; Blatt, D’Afflitti & Quinlan, 1976; Blatt, Wein, Chevron & Quinlan, 1979; Blatt, Quinlan, Chevron, McDonald & Zuroff, 1982; Chevron, Quinlan & Blatt, 1978), tendo por base a premis- sa de que a psicopatologia em geral e a depres- são em particular podem ser melhor compreendi- das se consideradas como desvios em relação ao desenvolvimento normal (Blatt, 1990). Na conceptualização de Blatt, a dependência e o auto-criticismo podem ser vistos como dois ti- pos de depressão, dois tipos de experiências de- pressivas ou duas dimensões da personalidade. Podem ainda ser vistos como dois estilos de per- sonalidade ou dois tipos caracteriais que podem constituir factores de vulnerabilidade ou predis- posição à depressão. Os indivíduos com um esti- lo de personalidade dependente ou com um esti- lo auto-crítico estariam vulneráveis a vivenciar estados depressivos perante acontecimentos de vida stressantes. Os dependentes seriam sobre- tudo susceptíveis a acontecimentos na esfera interpessoal e os auto-críticos a acontecimentos na esfera da realização pessoal e da auto-defini- 285 Análise Psicológica (2000), 3 (XVIII): 285-309 Adaptação do Questionário de Experiências Depressivas (de Sidney Blatt e colegas) para a população portuguesa (*) RUI C. CAMPOS (**) (*) A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para Rui C. Campos, Departamento de Pe- dagogia e Educação, Universidade de Évora, Palácio da Inquisição, Apartado 94, 7002-554 Évora, Portugal. Agradecimentos: Este trabalho foi desenvolvido no âmbito da Dissertação de Mestrado em Psicologia Clí- nica apresentada pelo autor à Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, pelo que gostaríamos de agradecer a colaboração do orientador dessa tese, o Prof. Danilo R. Silva. Gosta- ríamos igualmente de agradecer ao Dr. João Moreira a ajuda prestada. Ainda uma palavra de agradecimento ao Prof. Mário Simões pelas sugestões e correcções ao texto relativo a este artigo. Queríamos também mani- festar o nosso agradecimento a todos os participantes no processo de tradução do questionário (Prof. Danilo R. Silva, Prof.ª Eugénia Duarte Silva, Dr. João Morei- ra, Dr.ª Rosa Novo, Dr.ª Nina Prazeres, Dr.ª Fernanda Rangel, Dr.ª Teresa Monteiro, Dr.ª Luisa Gaiolas e Dr.ª Joana Campos), aos Conselhos Directivos e do- centes das Instituições que permitiram a recolha dos protocolos e ainda ao Prof. Vaz Serra pelo envio da sua versão do Inventário de Depressão de Beck. O nosso pedido de autorização para traduzir e aplicar o Questionário de Experiências Depressivas foi aceite pelo autor principal do questionário (Blatt, comunica- ção pessoal, 3 de Novembro, 1998) a quem, por esse facto e pela gentileza de nos enviar alguma biblio- grafia inexistente no nosso país, queremos igualmente expressar o nosso agradecimento. (**) Psicólogo Clínico. Departamento de Pedagogia e Educação da Universidade de Évora.

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Page 1: Adaptação do Questionário de Experiências Depressivas (de ... · sa de que a psicopatologia em geral e a depres- ... ser enviada para Rui C. Campos, Departamento de Pe-dagogia

1. OS ASPECTOS CENTRAIS DACONCEPTUALIZAÇÃO TEÓRICA DE

SIDNEY BLATT SOBRE A DEPRESSÃO

Nos anos 70, Blatt e seus colegas iniciaramuma série de estudos sobre a depressão (Blatt,1974; Blatt, D’Afflitti & Quinlan, 1976; Blatt,Wein, Chevron & Quinlan, 1979; Blatt, Quinlan,Chevron, McDonald & Zuroff, 1982; Chevron,Quinlan & Blatt, 1978), tendo por base a premis-sa de que a psicopatologia em geral e a depres-são em particular podem ser melhor compreendi-das se consideradas como desvios em relação aodesenvolvimento normal (Blatt, 1990).

Na conceptualização de Blatt, a dependência eo auto-criticismo podem ser vistos como dois ti-pos de depressão, dois tipos de experiências de-pressivas ou duas dimensões da personalidade.Podem ainda ser vistos como dois estilos de per-sonalidade ou dois tipos caracteriais que podemconstituir factores de vulnerabilidade ou predis-posição à depressão. Os indivíduos com um esti-lo de personalidade dependente ou com um esti-lo auto-crítico estariam vulneráveis a vivenciarestados depressivos perante acontecimentos devida stressantes. Os dependentes seriam sobre-tudo susceptíveis a acontecimentos na esferainterpessoal e os auto-críticos a acontecimentosna esfera da realização pessoal e da auto-defini-

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Análise Psicológica (2000), 3 (XVIII): 285-309

Adaptação do Questionário de ExperiênciasDepressivas (de Sidney Blatt e colegas) paraa população portuguesa (*)

RUI C. CAMPOS (**)

(*) A correspondência relativa a este artigo deveráser enviada para Rui C. Campos, Departamento de Pe-dagogia e Educação, Universidade de Évora, Palácioda Inquisição, Apartado 94, 7002-554 Évora, Portugal.

Agradecimentos: Este trabalho foi desenvolvido noâmbito da Dissertação de Mestrado em Psicologia Clí-nica apresentada pelo autor à Faculdade de Psicologiae de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa,pelo que gostaríamos de agradecer a colaboração doorientador dessa tese, o Prof. Danilo R. Silva. Gosta-ríamos igualmente de agradecer ao Dr. João Moreira aajuda prestada. Ainda uma palavra de agradecimentoao Prof. Mário Simões pelas sugestões e correcções aotexto relativo a este artigo. Queríamos também mani-festar o nosso agradecimento a todos os participantesno processo de tradução do questionário (Prof. DaniloR. Silva, Prof.ª Eugénia Duarte Silva, Dr. João Morei-ra, Dr.ª Rosa Novo, Dr.ª Nina Prazeres, Dr.ª FernandaRangel, Dr.ª Teresa Monteiro, Dr.ª Luisa Gaiolas eDr.ª Joana Campos), aos Conselhos Directivos e do-centes das Instituições que permitiram a recolha dosprotocolos e ainda ao Prof. Vaz Serra pelo envio dasua versão do Inventário de Depressão de Beck. Onosso pedido de autorização para traduzir e aplicar oQuestionário de Experiências Depressivas foi aceitepelo autor principal do questionário (Blatt, comunica-ção pessoal, 3 de Novembro, 1998) a quem, por essefacto e pela gentileza de nos enviar alguma biblio-grafia inexistente no nosso país, queremos igualmenteexpressar o nosso agradecimento.

(**) Psicólogo Clínico. Departamento de Pedagogiae Educação da Universidade de Évora.

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ção. Os primeiros apresentariam, quando depri-midos, depressões anaclíticas ou de dependênciae os segundos depressões introjectivas ou de au-to-criticismo. Os estilos de personalidade depen-dente e auto-crítico apresentam diferenças namotivação, estilo relacional e de coping e nosmecanismos defensivos. Os dois tipos de vulne-rabilidade à depressão teriam origem em mo-mentos diferentes do desenvolvimento, consti-tuindo-se como consequência de tipos específi-cos de interacções perturbadas com as figurassignificativas. Estas relações perturbadas origi-nariam representações objectais igualmente per-turbadas, que seriam o pano de fundo da patolo-gia depressiva. Representações objectais pertur-badas interagem com acontecimentos de vidanegativos específicos para originar a depressão(veja-se para uma revisão de literatura relativaaos estudos sobre os vários componentes dateoria de Blatt, Blatt & Homann, 1992; Blatt &Zuroff, 1992; Coyne & Whiffen, 1995; Nietzel& Harris, 1990; Ouimette & Klein, 1993; Ro-bins, 1995).

Outros autores, psicodinâmicos e de outrasescolas, partilham a conceptualização de que apersonalidade predisponente interage com osacontecimentos de vida para originar a depres-são, e que existem fundamentalmente dois gran-des tipos de vulnerabilidade (veja-se Blatt, 1990;Blatt & Blass, 1992; Blatt & Maroudas, 1992;Blatt & Zuroff, 1992; Hokanson & Butler, 1992;Nietzel & Harris, 1990; Robins, 1995; Robins,Hayes, Block, Kramer & Villena, 1995; veja-seainda, e mais especificamente, Coimbra de Ma-tos, 1982, 1985, 1986, 1995, 1996, para a com-preensão de um modelo psicanalítico de vulnera-bilidade à patologia depressiva).

Blatt estudou inicialmente as experiênciasdepressivas em populações não clínicas e só de-pois o fez em populações psiquiátricas. Para es-te autor poderá ser importante estudar as expe-riências depressivas de dependência e de auto-criticismo em populações não clínicas, indo paraalém dos sintomas manifestos das síndromas dedepressão (Blatt et al., 1976). Um indivíduo po-de vivenciar experiências típicas dos depressivossem estar clinicamente deprimido. Os indivíduoscom estilos de personalidade de dependência ede auto-criticismo vivenciariam com mais fre-

quência essas experiências depressivas do queindivíduos sem esses estilos.

Segundo Blatt et al. (1976), tinha sido realiza-da pouca investigação sobre a depressão, em queesta não fosse considerada uma perturbação clí-nica, focada nas suas manifestações sintomáti-cas, mas antes uma experiência subjectiva inter-na presente em sujeitos normais. Não significaque estudar a gravidade dos sintomas nos esta-dos depressivos não possa ser revelador, mas asmanifestações sintomáticas podem também mas-carar aspectos mais subtis das experiências de-pressivas (Blatt et al., 1976) – (veja-se Blatt,1974, 1990; Blatt & Blass, 1990, 1992, 1996;Blatt et al., 1976; Blatt & Homann, 1992; Blatt& Zuroff, 1992, Blatt & Maroudas, 1992; Zuroff,Moskowitz, Wielgus, Powers & Franko, 1983,para uma compreensão mais alargada da pers-pectiva teórica de Blatt).

A formulação de Blatt sobre as dimensões dapersonalidade vai para além da sua relação coma depressão (Blatt & Maroudas, 1992). Inicial-mente, Blatt (1974) distinguiu a depressãoanaclítica da depressão introjectiva mas, mais re-centemente, generalizou esta distinção para de-finir duas configurações primárias de psicopato-logia (Blatt & Shichman, 1983), – a configura-ção anaclítica e a configuração introjectiva. Aconceptualização de uma personalidade anaclí-tica e de outra introjectiva tem implicações quevão para além da compreensão da depressão,aplicando-se a uma vasta gama de psicopatolo-gias (Blatt & Shichman, 1983). A distinção entreuma configuração anaclítica e uma configuraçãointrojectiva é também extensível à compreensãodo desenvolvimento da personalidade normal(Blatt & Blass, 1990, 1992, 1996). Apesar da«normalidade» ser teoricamente definida comouma integração das tarefas de desenvolvimentoque se referem aos aspectos do relacionamento eda vinculação com as tarefas relativas à auto-de-finição e à identidade, dentro da própria «norma-lidade» os indivíduos podem colocar um ênfaseexcessivo num dos tipos de tarefas de desenvol-vimento em detrimento do outro, o que permitedefinir assim, respectivamente as duas configu-rações básicas de personalidade – anaclítica eintrojectiva – (veja-se também Blatt, 1990, 1991,1995).

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2. A VERSÃO ORIGINAL DO QUESTIONÁRIODE EXPERIÊNCIAS DEPRESSIVAS (Q.E.D.):

DESCRIÇÃO E CARACTERÍSTICASPSICOMÉTRICAS

2.1. Blatt e colegas (Blatt et al., 1976; Blatt,D’Afflitti & Quinlan, 1979) desenvolveram oQ.E.D. que permite medir os dois tipos de de-pressão, anaclítica ou de dependência e intro-jectiva ou de auto-criticismo.

O questionário foi inicialmente construídopara estudar as experiências depressivas em in-divíduos normais, sendo portanto apropriada to-da a investigação com ele realizada posterior-mente sobre fenómenos depressivos subclínicos(Blatt & Zuroff, 1992).

Revendo exaustivamente a literatura clínicasobre depressão, redigiram 150 afirmações queconstituíam experiências descritas por indivíduosdeprimidos no seu dia-a-dia, mas que não repre-sentavam necessariamente sintomas manifestosde depressão (Blatt et al., 1976; Blatt, 1990). Sãoafirmações que descrevem a forma como os de-pressivos se relacionam com os outros, como sesentem com eles próprios, a forma como condu-zem as suas vidas e aquilo que mais os preocupa(Blatt, 1990). Sessenta e seis dessas afirmaçõesforam seleccionadas por vários juízes, uma vezque se revelavam como descrevendo experiênci-as fenomenológicas típicas do depressivo, semestarem associadas a qualquer escola teórica(Blatt et al., 1976).

Assim, o Q.E.D. é constituído por 66 itens.Permite medir um conjunto de experiências rela-cionadas com a patologia depressiva, mas quenão são em si mesmas consideradas sintomas clí-nicos depressivos.

Os sujeitos respondem numa escala de Likertde sete pontos, correspondendo o 1 a «discordototalmente» e o 7 a «concordo totalmente». O 4 éo ponto médio, quando o sujeito está claramenteindeciso. Segundo alguns autores, por exemploComrey (1988), as escalas quantitativas de 7pontos são a opção óptima de resposta. As ins-truções são breves e claras, contendo apenas oessencial para que o sujeito possa responderadequadamente ao questionário.

Alguns dos itens têm uma redacção simples,clara e não muito extensa (ex. «Muitas vezessinto-me desamparado(a)»), embora outros

apresentem uma redacção extensa e(ou) ambígua(ex. «O modo como me sinto em relação a mimpróprio varia frequentemente: há alturas em queme sinto extremamente bem comigo próprio(a),e outras em que só vejo o que é mau em mim esinto-me um(a) falhado(a)»), que poderá even-tualmente dificultar a sua compreensão.

São obtidos resultados para três escalas oufactores que resultaram da análise factorial emcomponentes principais realizada com a amostraoriginal de aferição de estudantes universitáriosamericanos (Blatt et al., 1976, 1979).

O factor I foi designado de «dependência». Ositens mais saturados neste factor estão direccio-nados sobretudo para o exterior. Dizem respeitoàs relações interpessoais e envolvem temas comoa preocupação com ser abandonado ou rejeitado,ou com perder os outros, sentir-se só e desampa-rado e querer estar perto e depender dos outros.Envolvem também preocupações com a possibi-lidade de ofender ou magoar alguém, o que levaa dificuldades em expressar a raiva por medo devir a perder a gratificação que o outro pode pro-porcionar (Blatt & Homann, 1992). O factor IIfoi designado de «auto-criticismo». Os itenscom saturações mais elevadas neste factor têmuma dimensão mais interna, que expressampreocupações com sentir culpa, vazio interno,desesperança, insatisfação, insegurança e o sen-timento de não ter estado à altura das expectati-vas e dos objectivos. Expressam também dificul-dades em assumir responsabilidades, sentimen-tos de ameaça perante a mudança, sentimentosde ambivalência em relação ao próprio e aosoutros, tendência a assumir a culpa e ser críticoem relação a si próprio e a desvalorizar-se (Blatt& Homann, 1992).

A análise factorial revelou ainda, além dosdois principais factores consistentes com as duasdimensões da depressão previamente apresenta-das por Blatt (1974), a existência de um terceirofactor denominado «eficácia» (Blatt et al., 1976).Os itens que nele mais saturam, envolvem confi-ança sobre as capacidades e recursos do próprio,o sentimento de possuir força interior, ser capazde assumir responsabilidades, sentir-se indepen-dente, orgulhoso e satisfeito com as suas pró-prias realizações. Os indivíduos com resultadoselevados nesta escala caracterizam-se por pos-suir sentimentos de realização pessoal e poruma orientação para objectivos, mas não por

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excessiva competitividade (Blatt & Homann,1992).

Nietzel e Harris (1990) afirmam que os resul-tados na escala de eficácia têm diferentes signi-ficados dependendo da natureza das amostras emestudo, clínicas ou não clínicas. A escala de efi-cácia em populações clínicas deverá medir umadimensão relacionada com comportamentos emecanismos maníacos, dimensão maníaca esta,que se insere num contexto de negação de difi-culdades relacionadas sobretudo com a depen-dência (Blatt et al., 1982). Shapiro (1988) refereque o factor de eficácia poderá medir uma defesahipomaníaca contra a depressão, não necessaria-mente apenas, em pacientes psiquiátricos.

O factor de eficácia não apresenta, em termosde valores médios, diferenças entre pacientescom depressão e indivíduos normais (Franche &Dobson, 1992; Klein, Harding, Taylor &Dickstein, 1988) e não costuma apresentar corre-lações significativas com medidas de depressãoou de sintomatologia depressiva (Klein, 1989;Klein et al., 1988). Fuhr e Shean (1992) conside-ram que a escala de eficácia derivada da sua aná-lise factorial, poderá ter um significado interpre-tativo mais importante do que o atribuído nou-tros estudos, nomeadamente como uma escalaútil para avaliar a normalidade, definida não ape-nas, como ausência de dependência ou de auto--criticismo.

2.2. A forma de obtenção dos resultados éalgo complexa e sobretudo morosa. Cada um dos66 itens é utilizado para calcular os resultadosnas três escalas de forma ponderada, consoante opeso de cada item em cada factor, ao contráriodo que acontece habitualmente em questionáriosde personalidade, em que cada item entra apenasno cálculo do resultado de uma ou mais escalas,mas sem ter em conta qualquer tipo de pondera-ção.

Assim, o resultado para um indivíduo numdado factor é um somatório do resultado em cadaitem. Por sua vez, este resultado, sendo pondera-do para cada factor, é obtido da seguinte forma:multiplicando o coeficiente no factor desse itempor um quociente que constitui uma centragem eredução da variável (item) – o valor obtido pelosujeito no item (de um a sete) menos a média doitem na amostra de aferição, sobre o desvio pa-drão nessa mesma amostra.

Devido à morosidade e complexidade da cota-ção do questionário existe um programa infor-mático desenvolvido para o efeito.

2.3. Os três factores apresentaram-se bastanteestáveis na amostra de aferição de raparigas, e assoluções factoriais para rapazes e raparigas mos-traram-se semelhantes, quando se utilizou o coe-ficiente de congruência de Tucker (Blatt et al.,1976). A estrutura factorial foi reproduzida usan-do amostras mais numerosas de universitários deambos os sexos (Zuroff, Quinlan et al., 1990).Fuhr e Shean (1992) obtêm uma solução factori-al com jovens universitários semelhante à origi-nal no que respeita à variância explicada, aos va-lores próprios e magnitude das saturações nosfactores. A interpretação dos factores é seme-lhante, apesar de existirem algumas discordân-cias relativamente à saturação de alguns itensnos factores.

Jerdonek (citado por Viglione, Philip, Clem-mey & Camenzuli, 1990) reproduziu a estruturaoriginal, obtendo três factores ortogonais, numapopulação universitária, mas não conseguiu re-produzir a estrutura original numa amostra depacientes psiquiátricos. Obteve dois factores,contendo o primeiro itens dos factores originaisde dependência e de auto-criticismo e asseme-lhando-se o segundo, ao factor original de eficá-cia. Problemas psicométricos relativamente àpureza e diferenciação dos factores poderão estara enfraquecer o questionário (Viglione et al.,1990).

A consistência interna das três escalas pareceadequada com valores α de Cronbach modera-dos, quer no estudo original (Blatt, D’Afflitti etal., 1979), entre 0.72 e 0.83, quer no estudo dereplicação levado a cabo mais tarde (Zuroff,Quinlan et al., 1990), entre 0.69 e 0.80. No en-tanto, alguns autores apresentam resultados deconsistência interna fracos (Baker, Nenneyer &Barris, 1997).

A dependência e o auto-criticismo mostram-seestáveis ao longo do tempo, apresentando umacorrelação teste-reteste, respectivamente, de 0.80e 0.75, com um intervalo de 13 semanas, e de0.89 e 0.83, com um intervalo de cinco semanas,em universitários (Zuroff et al., 1983). Overhol-ser e Freiheit (1994) obtiveram uma correlaçãoteste-reteste de 0.78 para a escala de dependên-cia, com um intervalo de 10 semanas. Overhol-

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ser (1992) apresenta correlações teste-reteste de0.78 e 0.75, respectivamente, para as escalas dedependência e de auto-criticismo, com um inter-valo de 10 semanas. Zuroff, Igreja e Mongrain(1990) apresentam valores de correlação teste--reteste de 0.79 para ambas as escalas, com umintervalo de 12 meses, mas num grupo de indiví-duos com resultados extremos no Q.E.D..

Numa amostra de indivíduos que receberamclassificações escolares entre a primeira e asegunda aplicações, com um intervalo de cincosemanas, não se registaram diferenças nas mé-dias das escalas de dependência e de auto-criti-cismo, superiores às registadas apenas pela pas-sagem do tempo. Nesta amostra, as correlaçõesteste-reteste foram de 0.86 e 0.68 respectiva-mente para a dependência e para o auto-criticis-mo (Zuroff et al., 1983). Esta última correlação éum pouco mais baixa, mas é preciso não esque-cer que medidas de auto-estima tendem a ser al-tamente influenciadas pelo conhecimento de re-sultados de avaliações pessoais precedentes (Fry,citado por Zuroff et al., 1983). Também Ouimet-te e Klein (1993) encontraram valores de corre-lação teste-reteste que demonstram a estabilida-de temporal das escalas de dependência e de au-to-criticismo do Q.E.D., em sujeitos universitá-rios. As correlações foram respectivamente, de0.71 e 0.77, com um intervalo de tempo de 10semanas.

A estabilidade temporal das escalas apoia aconceptualização teórica de Blatt, segundo aqual, as vulnerabilidades para as depressõesanaclítica e introjectiva são características depersonalidade estáveis, estabelecidas precoce-mente no desenvolvimento.

As escalas do Q.E.D. parecem medir cons-tructos que são traços de personalidade estáveis,não afectados por estados depressivos, em popu-lações não clínicas. Zuroff et al. (1983) concep-tualizam a escala de dependência e de auto-cri-ticismo como medidas de vulnerabilidade a doistipos de humor ou experiências depressivas, enão como medidas da intensidade de estadosafectivos momentâneos. Nietzel e Harris (1990)na sua revisão de literatura, trataram o Q.E.D.como uma medida de predisposições pré-mór-bidas para a depressão. Os traços dependentes eauto-críticos, medidos pelo Q.E.D., são conside-rados por Zuroff e Lorimier (1989), factores de

personalidade que podem constituir vulnerabili-dade a estados afectivos.

2.4. Uma das críticas mais importantes quetem sido efectuada ao Q.E.D. prende-se com ofacto de alguns estudos com populações normaise sobretudo com populações de deprimidos, en-contrarem uma correlação elevada entre a escalade auto-criticismo e a de dependência (Fuhr &Shean, 1992; Shapiro, 1988; Overholser, 1991;Overholser & Freiheit, 1994). Robins et al.(1994) afirmam que a elevada correlação entreas escalas de dependência e de auto-criticismoem alguns estudos, embora não seja contraditóriacom o modelo de Blatt, levanta problemas mé-tricos, uma vez que se torna difícil estudar asrelações diferenciais com outras escalas. No en-tanto, a grande maioria dos estudos obteve cor-relações modestas entre as duas escalas com va-lores situados entre -0.18 e 0.16 em populaçõesnormais (Aube & Whiffen, 1996; Bartelstone &Trull, 1995; Blaney & Kutcher, 1991; Blatt et al.,1982; Klein, 1989; Dunkley, Blankstein & Flett,1997; Mongrain, Vettese, Shuster & Kendal,1998; Ouimette & Klein, 1993; Robins et al.,1994; Rude & Burnham, 1993; Smith, O´Keeffe& Jenkins, 1988; Zuroff et al., 1983; Zuroff,1994; Zuroff & Fitzpatrick, 1995; Zuroff, Igrejaet al., 1990; Zuroff, Quinlan et al., 1990) e corre-lações com valores um pouco mais elevados empopulações clínicas, entre -0.02 e 0.35, (Bagby& Rector, 1998, p. 896; Blatt et al., 1982; Klein,1989; Klein et al., 1988; Santor, Zuroff, Mon-grain & Fielding, 1997) com um estudo a apre-sentar um valor de 0.42 (Riley & McCraine,1990) e outros dois, 0.51 (Baker et al., 1997;Brown & Silberschatz, 1989).

Nietzel e Harris (1990), na sua meta-análiseda literatura publicada, observaram que a corre-lação média entre as duas escalas foi de 0.22,considerando um total de 15 estudos com amos-tras clínicas e não clínicas, um valor que se podeconsiderar moderado.

Fuhr e Shean (1992) afirmam que, se a depen-dência e o auto-criticismo são dois tipos depres-sivos independentes, então a sua correlação de-veria ser fraca. Colocam a hipótese de serem di-mensões que se sobrepõem, não sendo indepen-dentes. Fuhr e Shean (1992) encontraram umelevado número de indivíduos universitários(sem valores de depressão significativos) com

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resultados elevados (acima do valor do primeiroquartil) em ambas as escalas de dependência e deauto-criticismo, número esse superior ao de indi-víduos com resultados elevados em apenas umadas duas escalas e com resultados baixos na ou-tra. Este dado aponta uma vez mais para a nãoindependência das escalas. O mesmo aconteceem populações clínicas, em que uma forma dedepressão mista, composta por dependência eauto-criticismo que, segundo Viglione et al.(1990), não tinha sido conceptualizada por Blatt,se revelou como um síndroma depressivo distin-to.

Também Brown e Silberschatz (1989) referemque os seus resultados proporcionam um fracoapoio à conceptualização de Blatt de dois sub-ti-pos depressivos ou de duas classes de experiên-cias depressivas independentes, numa amostrapsiquiátrica, apesar de ambas se relacionaremsignificativamente com a depressão. Os pacien-tes tenderam a apresentar valores semelhantesnas duas escalas.

Mas, no estudo inicial como o Q.E.D., Blatt etal. (1976) defendiam já que a dependência e oauto-criticismo poderiam não ser mutuamenteexclusivos, havendo a possibilidade de se encon-trar «uma forma composta de depressão, que in-cluísse traços da dimensão anaclítica e da dimen-são introjectiva», que seria particularmente pre-valente em populações clínicas. Assim sendo,espera-se que uma correlação moderada possaexistir entre as duas escalas, especialmente empopulações clínicas.

Por sua vez, Franche e Dobson (1992) hipote-tizam que os esquemas de dependência e de au-to-criticismo sejam independentes, emboraadmitam que nalguns casos co-ocorram nomesmo indivíduo. Poderá ser, consideram osautores que, em populações clínicas, os esque-mas estejam mais vezes presentes simultanea-mente no mesmo indivíduo. Para um indivíduose tornar severamente deprimido, poderá ter deapresentar ambos os factores de vulnerabilidade.

2.5. O factor de auto-criticismo correlaciona--se habitualmente de forma significativa e mo-derada com as medidas estandardizadas tradi-cionais de depressão e de sintomatologia depres-siva, quer em populações clínicas (Blatt & Zu-roff, 1992; Klein, 1989), quer em populaçõesnormais universitárias, nomeadamente com as

escalas de depressão de Beck, de Zung, ou comoutras medidas de intensidade ou severidadedos sintomas depressivos (Blatt & Zuroff, 1992).As correlações variaram entre 0.38 e 0.65 con-soante os estudos e as medidas de sintomatologiausadas, em populações não clínicas (Bagby, Se-gal & Schuller, 1995; Bartelstone & Trull, 1995;Blatt et al., 1976; Blatt et al., 1982; Dunkley etal., 1997; Fuhr, & Shean, 1992; Mongrain & Zu-roff, 1989; Ouimette & Klein, 1993; Overholser,1991; Riley & McCraine, 1990; Robins et al.,1994; Smith et al., 1988; Santor, Zuroff, Mon-grain et al., 1997; Zuroff, Igreja et al., 1990),ocorrendo apenas um estudo com um valor infe-rior de 0.22 (Aube & Whiffen, 1996). As corre-lações variaram entre 0.34 e 0.64 (Blatt et al.,1982; Baker et al., 1997; Brown & Silberschatz,1989; Klein et al., 1988; Riley & McCraine,1990; Santor, Zuroff, Mongrain et al., 1997) empopulações clínicas. No caso da escala de depen-dência, as correlações foram em média menoselevadas mas, em alguns casos, significativas(Blatt & Zuroff, 1992), principalmente em po-pulações clínicas (Klein, 1989), variando entre-0.10 e 0.41 consoante os estudos, a natureza daamostra (clínica ou não clínica) e as medidas desintomatologia utilizadas (Aube & Whiffen,1996; Baker et al., 1997; Bartelstone & Trull,1995; Blatt, D’Afflitti et al., 1976; Blatt et al.,1982; Dunkley et al., 1997; Fuhr & Shean, 1992;Klein et al., 1988; Mongrain & Zuroff, 1989;Overholser, 1991; Overholser & Freiheit, 1994;Riley & McCraine, 1990; Robins et al., 1994;Smith et al., 1988; Santor, Zuroff, Mongrain etal., 1997; Zuroff, Igreja et al., 1990). Apenas emdois estudos se encontraram valores mais eleva-dos de 0.45 (com uma amostra normal; Ouimette& Klein 1993) e 0.53 (com uma amostra patoló-gica; Brown & Silberschatz, 1989).

Estes resultados corroboram as ideias defendi-das por Blatt e seus colegas, de que o factor dedependência parece medir uma dimensão da de-pressão que é, de certa forma, negligenciada pe-los principais métodos de avaliação da depressão(Blatt, 1990; Blatt, D’Afflitti et al., 1976; Blatt& Homann, 1992), que tendem a estar maisaptos a medir a dimensão de auto-criticismo(Blatt & Zuroff, 1992). É o que parece acontecercom a escala de Zung e com o Inventário deBeck que só secundariamente medem a dimen-são de dependência (Blatt et al., 1982). Poderá

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ser que, a fraca associação entre dependência edepressão se relacione com o facto de a grandemaioria das medidas de depressão possuir muitositens que reflectem sintomas de auto-criticismoda depressão-estado, não sendo boas medidas desintomas da depressão-estado de dependência(Smith et al., 1988, p. 161) que este tipo de ins-trumentos seja uma medida mais adequada dasintomatologia depressiva que é mais proemi-nente para o auto-criticismo. Nietzel e Harris(1990, p. 293) chamam a atenção para o facto demedidas de depressão, como o inventário deBeck, poderem conter mais itens medindo sinto-mas cognitivos e auto-avaliativos da depressãodo que itens avaliando queixas interpessoais, ex-plicando assim, a correlação mais elevada com ofactor de auto-criticismo.

Nietzel e Harris (1990, p. 289) na sua meta--análise da literatura publicada até essa dataobservaram que a correlação média entre a esca-la de dependência e medidas de depressão sinto-mática foi de 0.29, considerando um total de 12estudos com amostras clínicas e não clínicas, e acorrelação média entre a escala de auto-criticis-mo e medidas de depressão foi de 0.49.

Segundo Blatt e Zuroff (1992), uma análisedos 20 itens da escala de Zung mostra que 14deles avaliam uma dimensão mais psicológica,associada a características como a desesperança,o auto-criticismo e a insatisfação. Este conjuntode itens correlaciona-se fortemente com o factorde auto-criticismo do Q.E.D.. Seis itens, no en-tanto, avaliam uma dimensão somática ou físicado estado depressivo, associando-se a preocupa-ções sobre o bem-estar físico como, fadiga, len-tidão psicomotora, irritabilidade e lentidão, apre-sentando uma correlação elevada com o factor dedependência. Poderá ser que as preocupações de-pressivas de dependência apareçam expressas deforma mascarada (Blatt, 1990; Blatt & Zuroff,1992; Riley & McCraine, 1990) ou através deequivalentes depressivos, expressos em queixase preocupações físicas (Blatt & Homann, 1992).Os indivíduos depressivos dependentes «tendema ser pouco reflexivos, particularmente sobre asexperiências afectivas e, em vez disso, expres-sam a sua depressão através de queixas somá-ticas» (Blatt & Zuroff, 1992, p. 548), tendendo aprocurar a ajuda de um médico (Blatt, 1990;Blatt & Zuroff, 1992) e a preocuparem-se poucocom aspectos psicológicos (Blatt, 1990).

A dependência não tem sido tão exploradacomo o auto-criticismo, a culpa e a desvaloriza-ção na investigação sobre o fenómeno depres-sivo (Blatt, 1990; Blatt & Homann, 1992). Cons-titui, no entanto, uma dimensão importante nadepressão (Blatt et al., 1982; Blatt & Zuroff,1992), apesar de nem sempre se correlacionarcom ela de forma significativa (Smith et al.,1988). Poderá constituir para o indivíduo umaexperiência difícil de articular e, daí, expressar--se sob equivalentes somáticos (Blatt et al.,1982). Para o clínico, poderá também ser difícilde avaliar.

Blatt et al. (1976) referem que a escala de de-pendência do Q.E.D. parece avaliar uma dimen-são menos diferenciada do que o auto-criticismo,o que estaria de acordo com a perspectiva teórica(Blatt, 1974) de que a depressão centrada na de-pendência tende a ocorrer num nível de desen-volvimento mais primitivo e menos diferenciado.

Blatt, Zohar, Quinlan, Zuroff e Mongrain(1995) referem que a análise do conteúdo dositens da escala de dependência, sugere que me-dem uma grande variedade de aspectos do rela-cionamento interpessoal, desde formas mais ima-turas de relacionamento, como aspectos de de-pendência, a questões mais evoluídas, como amutualidade e a interdependência, de acordocom os desenvolvimentos teóricos de Blatt(1990; Blatt & Shichman, 1983). Poderá ser queas correlações pouco significativas entre o factorde dependência e as medidas tradicionais de de-pressão se devam ao facto de que itens que me-dem verdadeiramente a dependência se encon-trem misturados com itens que medem uma for-ma mais evoluída de relacionamento interpessoal(Blatt et al., 1995). Teoricamente, faria sentido, apriori, propor duas facetas dentro do factor dedependência: a dependência e relacionamento. Aprimeira conteria itens que expressam sobretudouma grande necessidade dos outros, mas semuma diferenciação clara relativamente a quem seé dependente. Temas centrais seriam o desampa-ro e a fragilidade na ausência dos outros. A se-gunda faceta conteria itens associados ao rela-cionamento com uma pessoa em particular, nãose tratando de uma relação indiferenciada, massim, de uma relação onde seriam reconhecidas asqualidades únicas dessa pessoa. Não há um sen-timento de desamparo ou de aniquilação na au-sência de uma relação, mas sim uma valorização

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da relação e, por conseguinte, uma vulnerabili-dade à perda. O tema central é a solidão (Blatt etal., 1995).

A diferenciação de duas facetas dentro dofactor de dependência foi demonstrada em váriasamostras. Os resultados de Blatt et al. (1995)mostraram que a faceta de dependência constituiuma medida mais consistente de depressão doque a escala original de dependência, especial-mente nas mulheres e que a faceta de relaciona-bilidade se correlacionou significativamente commedidas de bem-estar psicológico (Blatt et al.,1995). Ficou demonstrada a diferenciação dedois níveis de relacionamento interpessoal naescala de dependência. O mesmo não acontecena escala de auto-criticismo. Neste caso, os itensparecem medir, sobretudo, experiências associa-das com uma dimensão evoluída e articulada deauto-definição e parecem faltar itens que avaliemexperiências mais imaturas, expressas por exem-plo, em medos de aniquilação ou ausência de au-to-definição. Os autores sugerem que se expandao Q.E.D., criando itens que avaliem diferentesníveis de auto-definição. Embora Blatt et al.(1995) tenham também salientado a necessidadede mais investigação na tentativa de purificar asduas facetas de relacionamento encontradas,uma vez que partilham uma porção de variânciaelevada, nenhum trabalho posterior se propôs de-senvolver estas propostas.

Mas se, para alguns autores, o facto do auto--criticismo apresentar valores de correlaçãosignificativos e moderados com as medidas desintomatologia depressiva ser um factor positivoe o facto da dependência apresentar valores decorrelação pouco expressivos ser um factor ne-gativo, outros autores afirmam que ambas as cor-relações deveriam ser baixas. Robins (1995) re-fere que na ausência de factores de stress rele-vantes, «uma escala que mede um factor de vul-nerabilidade, deverá ter apenas uma correlaçãomodesta com a depressão. Se a correlação fordemasiado elevada poderá estar a medir algumaspecto do estado depressivo em si». Uma medi-da da personalidade não se deve correlacionarcom medidas de estados afectivos (Robins et al.,1994).

A análise do conteúdo dos itens sugere que aescala de auto-criticismo do Q.E.D. poderá con-ter itens relacionados com sintomas da depressão(Robins, 1995), ou com estados afectivos, e não

com a personalidade (Robins et al., 1994). Bla-ney e Kutcher (1991) sugerem que a escala deauto-criticismo contém demasiados itens que sesobrepõem ao stress manifesto. Alguns autoresafirmam, segundo Blatt e Zuroff (1992), que estaescala poderá conter itens de depressão-estado.Coyne e Whiffen (citados por Aube & Whiffen,1996) salientam que poderá existir uma sobrepo-sição entre o auto-criticismo e a depressão, peloque os correlatos obtidos a vários níveis para ofactor de auto-criticismo poderão reflectir o efei-to da depressão, mais do que o efeito de umfactor de vulnerabilidade.

Apesar destas afirmações, Bartelstone e Trull(1995) referem que os itens das escalas doQ.E.D. não são representativos da sintomatolo-gia depressiva, tendo antes a ver com expressõesde estilos caracteriais. Neste contexto, Fuhr eShean (1992) verificaram que valores elevadosnas escalas de dependência e de auto-criticismo,em populações não clínicas, não implicaram, ne-cessariamente, resultados elevados em escalas dedepressão sintomática como o Inventário de De-pressão de Beck, ou seja, resultados elevados nasescalas do Q.E.D., acima do quartil superiordas distribuições, não implicam forçosamente aocorrência de sintomatologia depressiva sufici-ente para se poder falar de um estado clínico de-pressivo.

As correlações encontradas na literatura entrea escala de auto-criticismo e as medidas de sin-tomatologia depressiva não nos parecem dema-siado elevadas, se considerarmos que poderãoser medidas de estado e traço, respectivamente,de uma mesma dimensão. Zuroff (1994) afirmaque correlações entre 0.30 e 0.60 entre variáveisde personalidade, como o auto-criticismo e o In-ventário de Depressão de Beck, não são proble-máticas. Seria estranho é que isso não aconteces-se.

2.6. Vários trabalhos deram contribuiçõesimportantes para a investigação da validade,nomeadamente a validade de constructo doQ.E.D. e, ao mesmo tempo, da própria concep-tualização de Blatt. Estes trabalhos proporcio-naram também evidências relativamente às ca-racterísticas dos indivíduos dependentes e auto--críticos.

Vários trabalhos (Aube & Whiffen, 1996;Bagby & Rector, 1998; Bagby, Segal & Schuller,

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1995; Bagby, Schuller et al., 1994; Blatt et al.,1982; Blatt et al., 1976 1990; Blatt & Homann,1992; Blatt & Zuroff, 1992; Brewin & Furnham,1987; Brown & Silberschatz, 1989; Dunkley etal., 1997; Klein, 1989; Franche & Dobson, 1992;Lehman et al., 1997; Mongrain et al., 1998;Mongrain & Zuroff, 1994, 1995; Nietzel & Har-ris, 1990; Ouimette & Klein, 1993; Riley &McCraine, 1990; Rosenfarb, Becker, Khan &Mintz, 1988; Santor, Zuroff, Mongrain et al.,1997; Santor & Zuroff, 1997, 1998; Thompson& Zuroff, 1998; Zuroff, 1994; Zuroff et al.,1983; Zuroff & Fitzpatrick, 1995; Zuroff & Lo-rimier, 1989; Zuroff & Mongrain, 1987; entreoutros) apresentam evidências que apoiam, aindaque em alguns casos parcialmente, a validade deconstructo do Q.E.D. e da conceptualização deBlatt. De uma forma geral os resultados dosestudos com amostras não clínicas são, do pontode vista psicométrico, superiores aos encontra-dos com amostras clínicas, nomeadamente emrelação à pureza e distintividade dos factores en-contrados.

Mas apesar destes resultados e do facto dadependência e do auto-criticismo se apresenta-rem como factores estáveis e com adequada ga-rantia, o que está de acordo com a conceptuali-zação de Blatt das dimensões anaclítica e intro-jectiva como factores de personalidade estáveis,Viglione et al. (1990) concluem que, a revisão deliteratura que levaram a cabo sobre a validade doQ.E.D. sugere que o questionário não é uma ope-racionalização válida das dimensões propostaspor Blatt, sobretudo em populações clínicas.Robins et al. (1994) referem que o Q.E.D. apre-senta dificuldades em questões de validade. Fuhre Shean (1992) salientam que os seus resultadosnão apoiam a validade das escalas de dependên-cia e de auto-criticismo como operacionalizaçõesadequadas dos constructos originais de Blatt(1974). O modelo de Blatt parece engenhoso ecompleto, o problema parece estar no Q.E.D.,que não será um instrumento adequado paramedir os seus constructos (Fuhr & Shean, 1992).

Por sua vez, Robins et al. (1995) afirmam queé necessária uma maior afinação psicométrica emais estudos de validade com o Q.E.D.. Lehmanet al. (1997) lembram que é necessária mais in-vestigação sobre os constructos de Blatt e sobrea associação com outras medidas de personalida-de, de forma a clarificar a sua validade.

3. PORQUÊ ADAPTAR O QUESTIONÁRIO DEEXPERIÊNCIAS DEPRESSIVAS?

Apesar de algumas dificuldades psicométricasreferidas por alguns autores na versão original econsequentes críticas ao Q.E.D., nomeadamenteem relação à sua validade (nem sempre, pensa-mos, totalmente fundamentadas), optámos portraduzir e adaptar essa versão em detrimento dequalquer das suas revisões (Welkowitz, Lish &Bond, 1985; Bagby, Parker, Joffe & Buis, 1994;Santor, Zuroff & Fielding, 1997), também desen-volvidas devido à complexidade e sobretudomorosidade dos procedimentos de codificação,por várias ordens de razão: por um lado porqueas várias revisões apresentam, também elas, di-ficuldades, por ventura mais do que a própriaversão original. Porque a maioria dos estudos jápublicados usou a versão original (em relação a2 das 3 revisões não encontrámos nenhum estu-do posterior que tenha usado essa revisão) e por-que pensamos que apesar de algumas dificulda-des da versão original, o instrumento é suficien-temente adequado do ponto de vista psicométri-co e potencialmente muito útil para a prática clí-nica (Aube & Whiffen, 1996).

Parece-nos de grande relevância prática disporde um instrumento de avaliação da personalidadeque possa medir a dependência e o auto-criticis-mo, ou as dimensões anaclítica e introjectiva dapersonalidade, dado o seu papel central na pato-logia depressiva (Blatt, 1974; Blatt & Maroudas,1992).

Na prática clínica será, pensamos, de todo ointeresse poder avaliar não apenas a sintomato-logia depressiva (que obviamente também é rele-vante), mas mais do que isso. Parece-nos que éigualmente importante avaliar as experiênciassubjectivas internas, as experiências psíquicasdepressivas de sujeitos que, embora possam nãose encontrar clinicamente deprimidos poderãoestar predispostos a vivenciar essa patologia,poderão ser propensos a experienciar estados de-pressivos. Do ponto de vista intra-psíquico nãohaveria diferenças substanciais entre o indivíduodeprimido e vulnerável à depressão, uma vez quecomo já dissemos as suas vivências internas po-derão ser qualitativamente semelhantes. Comoafirmam Blatt et al. (1982), a diferença entre po-pulações clínicas e não clínicas relativamente àdepressão tem sobretudo a ver com uma questão

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de intensidade. Quanto mais intensa for a vivên-cia de experiências depressivas de dependência,de auto-criticismo ou de ambas por parte de umdado indivíduo (e que na prática devem obvia-mente ser avaliadas), mais premente se tornará aintervenção terapêutica sobre a estrutura da per-sonalidade.

Se observarmos, por exemplo, os resultadosobtidos por Franche e Dobson (1992, p. 428)podemos entender a importância de avaliar asdimensões em questão (dependência e auto-cri-ticismo). Estes autores verificaram que um grupode pacientes com depressão e um grupo de pa-cientes recuperados dessa patologia, há pelomenos um mês, sem sintomas depressivos, apre-sentavam resultados superiores em dependênciae em auto-criticismo relativamente a uma amos-tra não psiquiátrica e não significativamente di-ferentes entre si. Franche e Dobson (1992, p.430) concluem que a dependência e o auto-cri-ticismo são factores de vulnerabilidade estáveis,permanecendo activos após remissão dos episó-dios agudos de depressão, não sendo, portanto,apenas correlatos desses episódios.

Segundo Franche e Dobson (1992), os seusresultados têm implicações para o tratamento dadepressão. É necessário, segundo eles, concep-tualizar o paciente depressivo tendo em mente osconstructos de Blatt; não chega medicar os pa-cientes e eliminar os sintomas, uma vez que con-tinuam vulneráveis à depressão, mesmo após re-missão destes. É necessário, tendo em vista aprevenção de futuras recaídas, mudar a persona-lidade predisponente.

A distinção entre duas configurações de per-sonalidade e de psicopatologia, é importante, nãoapenas para a avaliação e estudo da depressão eda psicopatologia em geral, mas também para oestudo e planeamento do processo terapêutico.Os pacientes, não necessariamente deprimidos,excessivamente preocupados com questões derelacionamento (anaclíticos) e os pacientes ex-cessivamente preocupados com a auto-definição(introjectivos) mudam de forma diferente e res-pondem diferencialmente a diferentes tipos detratamento (Blatt, 1990, 1991, 1995; Blatt &Blass, 1992, 1996).

4. A TRADUÇÃO DO Q.E.D.

No processo de tradução tivemos em conta osprocedimentos habituais, descritos na literatura,de forma a que a versão portuguesa se tornasse,tanto quanto possível, linguística e psicometri-camente equivalente à versão original.

4.1. Tradução preliminar

Na tradução preliminar que efectuámos, man-tivémos o formato dos itens e das instruções co-mo sugerem Spielberger e Sharma (1976). Ten-támos, sempre que possível, traduzir os itens daforma mais directa possível, mas sempre que nãofoi possível uma tradução literal, tentámos man-ter o sentido essencial do item original. Quandose tratava de expressões idiomáticas, mais doque uma tradução à letra das várias palavras, fi-zemos um esforço no sentido de captar o sentidoconotativo da expressão original (Spielberger& Sharma, 1976), e por traduzi-la por uma ex-pressão que na língua portuguesa pudesse ter omesmo significado.

Tivemos presente as directrizes de Van de Vij-ver e Hambleton (1996), que chamam a atençãopara o facto de ser necessário assegurar que «oprocesso de tradução/adaptação tenha em contaas diferenças linguísticas e culturais das popula-ções para as quais se destinam as versões tra-duzidas e adaptadas dos instrumentos» (p. 93).Seguimos uma directiva destes autores, no senti-do de traduzir os itens numa linguagem clara quepudesse ser entendida pela população alvo, pri-vilegiando, em alguns casos, este aspecto, emdetrimento da literalidade da tradução que pode,segundo Van de Vijver e Hambleton (1996, p.94), produzir uma linguagem pouco comum,prejudicando a legibilidade.

4.2. Avaliação da tradução preliminar porespecialistas na língua e no assunto e se-lecção de itens para a versão experimen-tal

Após a tradução preliminar do questionáriopedimos a colaboração de quatro docentes daFaculdade de Psicologia e de Ciências da Educa-ção da Universidade de Lisboa, com bons conhe-cimentos de Inglês e de uma professora de línguaInglesa para avaliarem a tradução preliminar

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efectuada. Aos quatro docentes foi entregue umacópia do questionário original, uma cópia da ver-são traduzida, uma cópia da tabela de saturaçãodos itens nos três factores medidos pelo questio-nário e ainda uma cópia de um artigo (Zuroff,Quinlan et al., 1990), onde se apresentam algu-mas características psicométricas do instrumentooriginal, bem como uma descrição resumida dosconstructos medidos pelo questionário. Emboranão deixando de considerar a indicação propostapor Spielberger e Sharma (1976) de distribuir oManual, não considerámos importante fazê-lo,entregando em alternativa o material já referido,uma vez que o Manual só apresenta resultadosexperimentais e a forma de cotação do instru-mento, não fazendo referência a aspectos teóri-cos. No caso da professora de língua Inglesa, fo-ram apenas entregues as duas versões do ques-tionário. Pedia-se aos avaliadores que quandoconsiderassem incorrecta a tradução de um item,propusessem uma forma alternativa.

O procedimento de avaliação da tradução pre-liminar de um instrumento é sugerido por Spiel-berger e Sharma (1976) que recomendam queesta seja feita por especialistas na matéria e nalíngua do instrumento original. Por outro lado,Van de Vijver e Hambleton (1996) chamam aatenção para a necessidade de participação noprocesso de tradução de várias pessoas especia-listas no assunto e na língua, principalmentequando os itens são de difícil tradução, o que pa-rece acontecer com alguns itens do questionárioem estudo. Este procedimento poderá conduzir auma qualidade superior da tradução final relati-vamente ao método em que apenas participamdois tradutores, um realizando a tradução e outrouma retroversão.

Na sequência do processo de avaliação datradução preliminar alguns itens foram alterados.Este procedimento foi conduzido em conjuntopelo autor e por um outro avaliador (Prof. DaniloR. Silva). Nos casos em que não houve acordoquanto à melhor forma de redigir os itens, foramintroduzidos itens alternativos. Foi criada umaforma alternativa para os itens 3, 9, 39, 41, 44,47, 50, 52, 54, 63. No caso do item 31 foramcriadas duas alternativas. Este procedimento étambém sugerido por Spielberger e Sharma(1976), quando há desacordo entre tradutores.

4.3. Retroversão da versão experimental doquestionário e reescrita de itens

Uma outra técnica usada para avaliar a ade-quação da tradução de um teste psicológico é ada retroversão (Van de Vijver & Hambleton,1996; Spielberger, & Sharma, 1976). Deste mo-do pedimos a uma tradutora de Inglês para pro-ceder à retroversão da versão experimental paraa língua Inglesa, sem ter acesso ao original. As-sim sendo os 78 itens da versão experimental (66mais os 12 itens alternativos) foram sujeitos a re-troversão.

Evidentemente que dada a complexidade daredacção de alguns itens, e dado o facto já des-crito, de em alguns casos não privilegiarmos aliteralidade da tradução, a semelhança entre a re-troversão e o original não foi absoluta. Apesardisso, não fizemos modificações em alguns itens,cuja semelhança entre a sua retroversão e o ori-ginal não era perfeita, desde que o sentido origi-nal do item não se apresentasse alterado na retro-versão.

Na sequência da retroversão, foi possíveloptar-se por uma das alternativas de alguns dositens em que não houvera acordo entre o autor eo segundo avaliador quanto à melhor forma deserem redigidos, aquando da selecção de itenspara a versão experimental, uma vez que a suaretroversão se aproximava mais do original. Fo-ram ainda alterados outros itens que não tinhamsuscitado desacordo, mas cuja retroversão seapresentava diferente do original.

Ainda assim, permaneciam alguns itens quenão pareciam totalmente claros e bem escritos naversão portuguesa, apesar disso não ter sidoevidente aquando da avaliação da tradução e daselecção de itens para a forma experimental. Ve-rificámos que podiam ser redigidos de váriasformas, sem que se alterasse substancialmente oseu significado.

Pedimos, então, a colaboração de três pessoas(sem conhecimentos psicológicos) e de umpsicólogo, que já tinha participado na avaliaçãoda tradução (Dr. João Moreira) para darem a suaopinião sobre esses itens, isto é, se os considera-vam claros como estavam redigidos e, caso nãoestivessem, como poderiam ser reescritos. Emalguns casos sugeríamos alternativas; redacçõesmuito próximas do item que tinha sido sujeito aretroversão. No caso dos itens que não tinham

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merecido acordo entre autor e orientador e emque se mantinha ainda a possibilidade de seremescritos sob mais do que uma forma, apresentá-vamos as alternativas criadas na altura da selec-ção de itens para a forma experimental para queos sujeitos pudessem escolher a que lhes pareciamais adequada. A clareza de linguagem era oúnico aspecto que poderia distinguir as alterna-tivas que propúnhamos aos sujeitos, dado que oseu significado nos parecia perfeitamente equi-valente.

Tendo em conta as sugestões recebidas, foi re-escrita a forma experimental com os 66 itens quepareciam mais adequados. Posteriormente, foicorrigida a ortografia e a pontuação e alteradauma ou outra construção frásica. Esta última re-visão foi realizada em conjunto com uma pro-fessora de português.

4.4. Retroversão da versão experimentalreescrita do Q.E.D.

Antes da aplicação experimental do questio-nário, pedimos a uma segunda tradutora querealizasse uma retroversão da versão experimen-tal reescrita do questionário, uma vez que, pos-teriormente à primeira retroversão, tinham sidofeitas várias alterações. Na sequência desta se-gunda retroversão não realizámos mais modifi-cações no questionário. Embora alguns itensvoltassem a apresentar uma redacção diferentedo original, o que já esperávamos, uma vez quealguns deles são extensos e complexos, as dife-renças não justificavam modificações, dado queo sentido dos itens era idêntico na versão origi-nal e na retroversão. Além disso, numa observa-ção atenta, não parecia haver palavras chave dositens originais que estivessem mal traduzidas pa-ra a língua portuguesa.

5. APLICAÇÃO EXPERIMENTALDO QUESTIONÁRIO

Seguindo a sugestão de Golden, Sawicki eFranzen (1984) após a redacção dos itens,resolvemos fazer uma aplicação experimental doQ.E.D.. Este tipo de estudo piloto pode ser útilna detecção de algum item menos compreensí-vel, ou seja, pode ser importante para averiguarse o conteúdo dos itens é familiar (Van de Vijver

& Hambleton, 1996). Este tipo de aplicação éimportante para ‘sentir’ o instrumento na prática,para perceber como os indivíduos encaram oquestionário.

Aplicámos o questionário a 32 sujeitos doquarto ano da licenciatura em Psicologia da Fa-culdade de Psicologia e de Ciências da Educaçãoda Universidade de Lisboa. A aplicação decorreuna parte final de uma aula prática.

Após agradecer a participação, que era obvia-mente voluntária, pediu-se também que lessemas instruções e que, se surgisse alguma dúvida nacompreensão do conteúdo de algum item, nãohesitassem em chamar-nos. Esta última directivafoi enfatizada, referindo-se que era uma aplica-ção experimental e que seria importante para oautor saber quais os itens que poderiam suscitardificuldades de compreensão. Foram levantadasdúvidas em onze itens, tendo os itens 1, 46 e 66sido questionados por dois estudantes diferentes.Além destes, foram questionados os seguintesitens: 4, 9, 10, 15, 17, 24, 47, 63.

Estes dados mostram que nenhum item foi sis-tematicamente questionado pelos estudantes. Es-te facto abona em favor de uma versão portu-guesa que aparentemente não levanta dificulda-des de compreensão ou, pelo menos, cujo con-teúdo dos itens parece familiar na população emcausa.

De salientar que se os sujeitos universitáriosparecem compreender o conteúdo dos itens, nãoé improvável, dada a já referida complexidade daredacção de alguns deles, que populações menosescolarizadas ou de um nível cultural inferiorpossam encontrar dificuldades em responder aoinstrumento.

Claro está, que este tipo de aplicação não ésuficiente. Os estudos de precisão são necessá-rios para as complementar, no sentido de noscertificarmos de que os itens estão a medir cor-rectamente aquilo para que foram desenvolvidos.No entanto, estas aplicações podem permitirpoupar muito tempo e trabalho, já que, se umqualquer item não é sistematicamente compre-endido, ou um qualquer outro aspecto do ques-tionário não parece estar a funcionar correcta-mente (por exemplo, a compreensão das instru-ções), poderão fazer-se de imediato as necessá-rias alterações.

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6. DEMONSTRAÇÃO DA EQUIVALÊNCIALINGUÍSTICA CRUZADA ENTRE O ORIGINAL

E A VERSÃO PORTUGUESA

A demonstração da equivalência linguísticaentre um questionário original e a sua traduçãonuma outra língua é um passo essencial no de-senvolvimento dessa versão traduzida (Spiel-berger & Sharma, 1976). Segundo Van de Vijvere Hambleton (1996), deve recorrer-se a métodosestatísticos que permitam avaliar a equivalênciaentre as várias versões linguísticas de um mesmoquestionário. Esta avaliação pode ser realizadaobtendo as correlações entre a versão original doteste e a sua tradução, sendo conveniente recor-rer a sujeitos bilingues para responderem a am-bas as formas do instrumento. A condição bilin-gue «pode definir-se pela eficiência de leitura emduas línguas» (Spielberger & Sharma, 1976, p.18).

A fim de avaliar a equivalência linguística en-tre a nossa versão do Q.E.D. e a versão originalem língua inglesa, realizámos uma aplicaçãodas duas formas do instrumento a um grupo de22 estudantes universitários do terceiro ano docurso de tradutores e intérpretes de inglês daUniversidade Autónoma de Lisboa. Espera-seque alunos do terceiro ano do curso em questãopossuam já um conhecimento aprofundado dalíngua, suficiente para que possam compreenderclaramente o conteúdo dos itens em inglês. Me-tade dos sujeitos começou por responder à ver-são portuguesa e a outra metade à versão inglesa,de forma a podermos controlar o efeito da ordemde aplicação. Entre as duas aplicações do Q.E.D.os sujeitos responderam a três questionários (emfase de obtenção de normas para a populaçãoportuguesa) num total de 105 itens. Este proce-dimento visou impedir a memorização dos itens,isto é, os três questionários serviram como dis-tractores.

Após agradecer a participação, informámos ossujeitos de que se tratava de um estudo em quese iriam aplicar questionários de personalidade eque a razão pela qual pedíamos a sua colabora-ção era a existência de um questionário que es-tava escrito em inglês. Pediu-se aos sujeitos queapenas identificassem os questionários com umpseudónimo ou um qualquer sinal, para que pu-déssemos mais tarde saber que um determinadoconjunto de instrumentos pertencia ao mesmo

indivíduo, e ao mesmo tempo pudéssemos ga-rantir o anonimato. Foi-lhes pedido ainda quelessem as instruções de todos os questionários eque nos chamassem se tivessem alguma dúvidana compreensão de algum item.

Cada sujeito recebia o questionário originalou a tradução e, após terminar de responder, en-tregava-nos esse teste e recebia os três questio-nários que serviam de distractores. Após finali-zar a resposta a esses três instrumentos, entre-gava-os e recebia finalmente a versão do Q.E.D.a que ainda não tinha respondido.

As correlações entre as três escalas do Q.E.D.da forma americana e da forma portuguesa forambastante elevadas; respectivamente 0.85, 0.85 e0.90 para as escalas de dependência, de auto--criticismo e de eficácia. Estes resultados sãosugestivos de uma equivalência entre as duasversões do questionário, uma vez que os sujeitosbilingues apresentam resultados totais idênticosnas três escalas que compõem o instrumento, emambas as versões (Spielberger & Biaggio, 1992).Os resultados obtidos podem ainda constituir«uma evidência da validade concorrente [das for-mas em causa] bem como da sua equivalência psi-cométrica» (Spielberger & Sharma, 1976, p. 19).

7. ESTUDOS PSICOMÉTRICOS COM A VERSÃOPORTUGUESA DO Q.E.D.

7.1. Instrumentos aplicados, caracterizaçãoda amostra e procedimento experimental

Como os resultados obtidos até ao momentonos pareciam satisfatórios, pensámos continuar onosso trabalho, estudando algumas característi-cas psicométricas da versão portuguesa doQ.E.D.. Como sugerem Golden et al. (1984),«uma vez a escala desenvolvida, a atenção devedirigir-se para a análise das suas propriedadespsicométricas» (p. 28).

7.1.1. Além do Q.E.D., foi também aplicado oInventário de Depressão de Beck (I.D.B., Beck,Ward, Mendelson, Mock & Erbaugh, 1961) naversão portuguesa de Vaz Serra (1972; Vaz Serra& Abreu, 1973), de forma a que pudéssemosestudar as correlações que com ele apresentavam

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as escalas do Q.E.D. e, consequentemente, a va-lidade discriminante dessas escalas.

O I.D.B. é um inventário constituído por 21itens, construído para medir a gravidade da de-pressão em adolescentes e adultos (Beck &Steer, 1987). Embora o Inventário não tivesse si-do originalmente criado para detectar a presençade síndromas depressivas em populações nor-mais, tem sido usado para esse fim desde hámuitos anos (Beck & Steer, 1987). Nestes casosdeve ser usado com precaução.

Os itens que compõem o inventário «foramescolhidos apenas para medir a severidade da[patologia depressiva], e não de forma a reflecti-rem nenhuma teoria particular da depressão»(Beck & Steer, 1987, p. 1), e foram desenvolvi-dos tendo como base a observação clínica e adescrição feita por doentes psiquiátricos depri-midos dos seus sintomas, em comparação comdescrições de doentes psiquiátricos não depri-midos. Estas observações e descrições foramagrupadas de forma sistemática em 21 sintomasou grupos sintomatológicos medidos numa esca-la de quatro pontos (de 0 a 3 consoante o grau degravidade).

Na versão portuguesa de Vaz Serra (1972, VazSerra & Abreu, 1973) foram introduzidas algu-mas variações em relação à versão original. As-sim, alguns dos grupos sintomatológicos (itens)têm mais de quatro alternativas de resposta. Ositens podem ter quatro, cinco ou seis alternativasde resposta. No entanto, quando um item apre-senta mais de quatro alternativas de resposta, éporque algumas delas são equivalentes, isto é,têm o mesmo valor de outras alternativas «per-mitindo uma maior maleabilidade de escolha»(Vaz Serra & Abreu, 1973, p. 5). Cada grupo sin-tomático é cotado numa escala de quatro pontos,numa das seguintes categorias (0- inexistente; 1-leve; 2- moderado; 3- grave).

Vaz Serra e Abreu (1973) apresentam os re-sultados da aplicação do inventário a uma amos-tra de pacientes depressivos. As suas caracterís-ticas psicométricas parecem claramente satisfa-tórias.

7.1.2. Para efeitos de codificação do Q.E.D.foram usados os parâmetros de cotação do sexofeminino do estudo original (Blatt, D’Afflitti etal. 1979), embora tenham participado indivíduosde ambos os sexos. Este procedimento tem sido

usado na maioria das investigações que utiliza-ram o questionário e é consistente (Zuroff, Quin-lan et al. 1990), uma vez que as soluções facto-riais originais para ambos os sexos são altamentecongruentes. Este processo torna possível a com-paração directa entre sexos dos resultados nastrês escalas (Zuroff, Quinlan et al. 1990). Blaneye Kutcher (1991) encontraram resultados equiva-lentes usando, na codificação, os coeficientesfactoriais obtidos com a amostra original derapazes e com a amostra de raparigas, sugerindoos autores que não será necessário utilizar oscoeficientes factoriais específicos para cada se-xo.

7.1.3. O Q.E.D foi aplicado a 494 estudantesdo ensino superior, tendo seis estudantes sidoeliminados devido a itens não respondidos. Dosrestantes 488, 129 indivíduos (26.43%) eram dosexo masculino e 359 indivíduos (73.57%) dosexo feminino. As idades variaram entre os 18 eos 29 anos (M=20.42, Me=20, SD=1.9).

Cento e nove sujeitos (22.34%) frequentavama Faculdade de Medicina de Lisboa, 124(25.41%) frequentavam a Faculdade de Ciênciasde Lisboa, 166 (34.02%) a Faculdade de Psicolo-gia e de Ciências da Educação de Lisboa e 89(18.24%) frequentavam o curso de Direito daUniversidade Autónoma de Lisboa.

Cem sujeitos (20.49%) estavam inscritos noprimeiro ano, 120 (24.59%) estavam inscritos nosegundo ano, 140 (26.69%) no terceiro ano e 128(26.23%) estavam inscritos no quarto ano da suainstituição de ensino.

7.1.4. No caso das Faculdades de Medicina ede Ciências, as turmas foram seleccionadas paraa aplicação dos questionários pelos respectivosConselhos Directivos, e no caso das outras duasinstituições, (Faculdade de Psicologia e de Ciên-cias da Educação da Universidade de Lisboa eUniversidade Autónoma de Lisboa) contactámosdirectamente com docentes que disponibilizarama parte inicial ou final das suas aulas para quepudéssemos realizar as aplicações. As aplicaçõesforam realizadas em grupos que variaram entre18 e 55 elementos. A participação dos estudantesfoi voluntária.

Pedia-se aos estudantes que preenchessem oselementos do cabeçalho, assegurava-se a confi-dencialidade dos resultados, pedia-se para que

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lessem as instruções dos dois questionários e quese tivessem alguma dúvida na compreensão dealgum item, não hesitassem em chamar-nos.

Os participantes recebiam um exemplar doQ.E.D. e do I.D.B. e pedia-se-lhes que respon-dessem primeiro ao Q.E.D.. Pretendia-se que asua resposta a este questionário não fosse in-fluenciada pelo I.D.B., um inventário sintomáti-co e que poderia transmitir imediatamente aideia de que se estavam a estudar característicaspsicopatológicas, podendo criar tendências deresposta no Q.E.D..

7.2. Resultados

7.2.1. Estatística descritiva, distribuições deresultados e comparações entre grupos

Foram calculadas as médias, medianas e des-vios-padrão dos resultados nas escalas do Q.E.D.e do resultado no I.D.B. nos grupos de estudan-tes do sexo feminino e do sexo masculino. Estesresultados são apresentados na Tabela 1.

Para testar a normalidade das distribuições deresultados, usou-se o teste do Qui quadrado e oteste de Kolmogorov-Smirnov. As distribuiçõesdos resultados nas três escalas do Q.E.D apre-sentam uma distribuição normal, quer no grupodos indivíduos do sexo masculino, quer no grupodos indivíduos do sexo feminino.

No caso dos rapazes, obtiveram-se resultados(χ2 =3.83, p=0.57; d=0.03, n.s.) para a escala de

dependência, (χ2 =5.05, p=0.28; d=0.03, n.s.)para a escala de auto-criticismo e (χ2 =.1.75,p=0.78; d=0.02, n.s.) para a escala de eficácia,que mostram que se trata de distribuições nor-mais.

No caso das raparigas obtiveram-se resultados(χ2 =13.57, p=0.56; d=0.03, n.s.) para a escalade dependência, (χ2 = 13.27, p=0.65; d=0.02,n.s.) para a escala de auto-criticismo e (χ2 =17.80,p=0.40; d=0.02, n.s.) para a escala de eficácia,que mostram que se trata de distribuições nor-mais.

Não se encontraram diferenças significativasentre os grupos de rapazes e de raparigas, no querespeita às médias na escala de auto-criticismo(t=1.49, df=486, p=0.14), e na escala de eficácia(t=.80, df=486, p=0.42), mas verificaram-se di-ferenças altamente significativas entre os doisgrupos no que respeita à escala de dependência(t=6.14, df=486, p<0.000001). Relativamente àescala de dependência, os resultados são conso-nantes com os apresentados na literatura, (Aube& Whiffen, 1996; Chevron, Quinlan & Blatt,1978; Dunkley et al., 1997; Overholser, 1991;Steele, 1978; Zuroff, 1994; Zuroff & Fitzpatrick,1995; Zuroff, Quinlan & Blatt, 1990) onde osrapazes obtêm resultados médios significativa-mente inferiores às raparigas.

Relativamente à escala de eficácia, os resul-tados também estão de acordo com os apresen-tados na literatura, onde rapazes e raparigas nãoobtêm resultados significativamente diferentes(ex., Chevron et al., 1978)

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TABELA 1Médias, medianas e desvios-padrão dos resultados nas escalas de dependência, de auto-criticismoe de eficácia do Q.E.D., e do resultado no I.D.B., nos grupos de estudantes do sexo masculino e do

sexo feminino

Participantes Dependência Auto-criticismo Eficácia I.D.B.

Rapazes M= -.50 M= -.25 M= -.29 M= 5.65(n=129) Me= -.45 Me= -.29 Me= -.27 Me= 4

SD= .96 SD= .09 SD= .96 SD= 5.07

Raparigas M= .05 M= -.39 M= -.22 M= 6.62(n=359) Me= .09 Me= -.37 Me= -.12 Me= 5

SD= .82 SD= .90 SD= .93 SD= 6.40

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No que respeita à escala de auto-criticismo, osresultados estão de acordo com os de alguns es-tudos publicados. Em alguns trabalhos os indiví-duos do sexo masculino apresentaram resultadossignificativamente superiores nesta escala relati-vamente aos indivíduos do sexo feminino (Che-vron, et al., 1978; Dunkley et al., 1997; Zuroff,Quinlan et al., 1990). Noutros trabalhos, não seregistaram diferenças significativas entre sexos,apesar do resultado nos homens ser normalmentemais elevado (Aube & Whiffen, 1996; Overhol-ser, 1991; Steele, 1978; Zuroff, 1994; Zuroff &Fitzpatrick, 1995), como aconteceu no presentetrabalho.

7.2.2. Comparação com as amostras de rapa-zes e raparigas americanas usadas noestudo de replicação do estudo originalde aferição (Zuroff, Quinlan et al.,1990)

Com o intuito de contribuir para o estudo de

possíveis diferenças na expressão da dependên-cia, do auto-criticismo entre a população portu-guesa e a população americana, comparámos asmédias dos resultados nas três escalas do Q.E.D.,obtidas pelos estudantes portugueses e ameri-canos. Não usámos o estudo original, porque ne-le não são apresentados os valores médios nasescalas do questionário. As médias e desvios-padrão dos resultados nas três escalas do Q.E.Ddas amostras de estudantes universitários ame-ricanos do sexo masculino e do sexo feminino doestudo de replicação do original encontram-se naTabela 2.

No que respeita à escala de dependência,verificaram-se diferenças significativas entre asamostras americana e portuguesa de raparigas(Z=2.79, p=0.0052), mas não se registaramdiferenças significativas no caso dos rapazes(Z=.46, p=0.6428). As raparigas portuguesasmostraram-se, em média, mais dependentes doque as americanas.

Relativamente à escala de auto-criticismo,

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TABELA 2Médias e desvios-padrão dos resultados nas escalas do Q.E.D. nas amostras de estudantes

universitários americanos de rapazes e de raparigas, do estudo de Zuroff, Quinlan et al. (1990)

Estudantes Dependência Auto-criticismo Eficácia

Rapazes M= -.54 M= -.04 M= .15(n=373) SD= .80 SD= .86 SD= .99

Raparigas M= -.10 M= -.19 M= .14(n=779) SD= .83 SD= .87 SD= .95

TABELA 3Correlações das escalas do Q.E.D. entre si, e das escalas do Q.E.D. com o resultado no I.D.B.,

para os rapazes e para as raparigas portuguesasa

Dependência Auto-criticismo Eficácia I.D.B.

Dependência -.15 -.02 .20

Auto-criticismo -.05 .12 .48

Eficácia .19 .11 -.20

I.D.B. .27 .50 -.02

a as correlações acima da diagonal referem-se aos indivíduos do sexo masculino e abaixo da diagonal referem-se aos indivíduos dosexo feminino

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verificaram-se diferenças significativas entre asduas populações, para ambos os sexos. Os rapa-zes portugueses mostraram-se em média menosauto-críticos do que os americanos (Z=2.35,p=0.0186), bem como as raparigas portuguesas(Z=3.54, p=0.0004).

Outros estudos, com outras amostras, são ne-cessários, no sentido de se garantir que as dife-renças inter-culturais relativamente a estes cons-tructos existem de facto. Se assim for, deverátentar compreender-se essas diferenças.

7.2.3. Correlações entre escalas

De forma a poder estudar a validade discrimi-nante das escalas do Q.E.D., calcularam-se ascorrelações dessas escalas entre si e entre cadauma delas e o resultado no I.D.B.. A Tabela 3apresenta os resultados dessas correlações em se-parado para os rapazes e para as raparigas por-tuguesas.

Os resultados das correlações entre as escalasde dependência e de auto-criticismo sugeremuma independência dos dois constructos, comotem sido referido na literatura a que fizemos re-ferência anteriormente.

As correlações da escala de eficácia com asescalas de auto-criticismo e de dependência fo-ram de acordo com o esperado, um pouco supe-riores às apresentadas por Zuroff, Quinlan et al.(1990) mas inferiores, por exemplo, às de Klein(1989), à volta de 0.19, para mulheres não depri-midas.

As correlações das escalas de dependência ede auto-criticismo com o resultado do I.D.Bapresentam valores dentro do esperado, isto é,foram relativamente elevadas, principalmenteno caso da escala de auto-criticismo, mas nãoexcessivamente. O que este resultado pareceindicar, é que o I.D.B. mede algo diferente dasescalas do Q.E.D., mas que tem alguma relaçãocom os constructos medidos por essas escalas,principalmente com o constructo de auto-criticismo.

Poderá ser que este inventário meça uma va-riável de estado com alguma relação com variá-veis traço medidas pelas escalas do Q.E.D.,principalmente uma variável relativa à vertentede auto-criticismo da depressão-estado e nãotanto relativa à vertente de dependência. Se as-sim for, os valores de correlação de 0.48 e 0.50

entre a escala de auto-criticismo e o resultado noI.D.B., fazem todo o sentido. Aliás, como foi di-to anteriormente, os inventários de sintomatolo-gia depressiva, nomeadamente o I.D.B, tendem aestar mais aptos a medir a vertente de auto-cri-ticismo do estado depressivo, do que a vertentede dependência e daí apresentarem correlaçõesmais elevadas com a escala de auto-criticismo,nos vários estudos publicados.

No entanto, como já foi referido, alguns au-tores afirmam que o Q.E.D. contém um exces-sivo número de itens relacionados com a depres-são-estado na vertente de auto-criticismo. Nãopensamos que este argumento tenha validade, oque pensamos é que as correlações entre umamedida de uma variável estado e uma medida deuma variável traço de um mesmo constructo, de-verão apresentar valores moderados, como acon-tece nos nossos resultados. Para citar um outroexemplo, no caso da ansiedade, as escalas doSTAI de estado e traço apresentam entre si, napopulação portuguesa universitária, valores decorrelação de 0.60 e 0.70, respectivamente pararaparigas e rapazes (Silva & Campos, 1999).

Na nossa opinião, os resultados apresentadosapoiam a validade discriminante das escalas doQ.E.D..

7.2.4. Estrutura factorial

Para estudarmos a estrutura factorial do ins-trumento, realizámos uma análise em componen-tes principais, usando desta forma, o mesmo pro-cedimento de Blatt (Blatt et al., 1979, Zuroff,Quinlan et al., 1990).

Dado o número relativamente reduzido deindivíduos do sexo masculino para uma análisedeste tipo, optámos por efectuar a análisefactorial apenas com os sujeitos do sexo femini-no. Guadagnoli e Velicer (1988) referem que ouso de uma amostra com um N superior a 300possibilitará a obtenção de um padrão de resulta-dos semelhante aos da população, independente-mente do número de componentes que se obte-nham, apesar dos valores das saturações facto-riais poderem ser baixos e de se consideraremum número de variáveis elevado. O número departicipantes do sexo feminino no nosso estudo éde 359.

A análise em componentes principais reveloua existência de três factores. A escolha do núme-

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ro de factores a considerar foi efectuada seguin-do um método baseado na progressão dos valo-res próprios – o método do cotovelo (Catell &Vogelmannn citados por Moreira, no prelo). Osautores citados referem que a validade do méto-do parece adequada e salientam a existência deum elevado grau de acordo entre juizes, minima-mente conhecedores do que se pretende, na gran-de maioria dos casos. Zwick e Veliver (citadospor Moreira, no prelo) consideram-no um dosmétodos mais rigorosos na determinação do nú-mero de factores a considerar na análise emcomponentes principais.

Na tentativa de nos certificarmos que a nossaapreciação estava correcta, quisemos conhecer oparecer de um especialista (Dr. João Moreira)sobre o número de factores a considerar, o qualcorroborou a existência de três factores. Os va-lores próprios dos três factores são respectiva-mente: 9.01, 4.44 e 3.22. De seguida procedemosà rotação varimax dos factores. A saturação decada item nos três factores encontra-se em anexo(ANEXO A – Tabela 4). Após a rotação, o pri-meiro factor explica 11.54% do total da variân-cia, o segundo explica 8.09% da variância e oterceiro 5.62%.

No estudo original (Blatt et al., 1979) oprimeiro factor explicava 10.44% da variância, osegundo 9.65% e o terceiro 5.43%. No estudo dereplicação de 1990 (Zuroff, Quinlan et al., 1990)o primeiro factor explicava 10.20%, o segundo8.20% e o terceiro 5.80%.

Na solução factorial obtida originalmente porBlatt, o factor I foi designado de «dependência»,o II de «auto-criticismo» e o III de «eficácia».Na presente solução, o factor I que explica amaior percentagem de variância total, é o deauto-criticismo, se tivermos em conta os itensque saturam mais nesse factor e o factor II, o dedependência, mantendo-se o factor III, o deeficácia. Tendo em vista a comparação entre asolução factorial obtida no presente estudo e aobtida no estudo original de Blatt, calculámos ocoeficiente de congruência (Gorsuch, 1983) paraas três escalas do questionário. O coeficiente decongruência foi de 0.92 para as escalas de de-pendência, 0.93 para as escalas de auto-criti-cismo e de 0.86 para as escalas de eficácia. Osresultados apontam para que as soluções facto-riais americana e portuguesa se possam conside-rar bastante semelhantes.

A análise factorial pode ser útil para umacomprovação estatística da equivalência entrevárias versões de um mesmo instrumento (Vande Vijver & Hambleton, 1996). Assim sendo, osresultados obtidos ajudam a corroborar a equiva-lência entre a versão portuguesa e a versão ame-ricana do Q.E.D., já avaliada através da aplica-ção aos sujeitos bilingues.

A análise factorial pode também proporcionarprovas acerca da validade de um instrumento.Através deste método estatístico podemos teruma ideia sobre se os itens estão a comportar-sede um modo esperado (Comrey, 1988), ou seja,se estão a medir aquilo que supostamente deve-riam medir. Os resultados obtidos, sendo seme-lhantes aos do estudo original de Blatt, apontamno sentido de uma validade adequada da versãoportuguesa do instrumento. Evidentemente, queeste tipo de análise, exploratória, não é suficientepara garantir a validade de uma prova psicoló-gica. Outro tipo de estudos e análises são neces-sários, nomeadamente a análise factorial confir-matória (Golden et al., 1984).

7.2.5. Consistência interna

Relativamente à consistência interna, calculá-mos o coeficiente alfa de Cronbach para as trêsescalas do Q.E.D., em separado, para o grupodos rapazes e para o grupo das raparigas. Estesresultados encontram-se na Tabela 5.

Os resultados obtidos aproximam-se bastantedos de Blatt, quer dos resultados do estudooriginal de aferição, quer dos obtidos no estudode replicação efectuado em 1990. No primeirotrabalho, os valores de alfa de Cronbach obtidosforam, no grupo dos rapazes de 0.77 para a es-cala de dependência, 0.83 para a escala de auto-criticismo e 0.75 para a escala de eficácia. Nogrupo das raparigas, os resultados foram de 0.81para a escala de dependência, 0.80 para a escalade auto-criticismo e 0.72 para a escala de eficá-cia.

No segundo estudo (Zuroff, Quinlan et al.,1990), no grupo dos rapazes os valores do alfade Cronbach foram 0.80 para a escala de depen-dência, 0.77 para a escala de auto-criticismo e0.69 para a escala de eficácia. No grupo dasraparigas os resultados foram de 0.81, 0.75 e0.73 respectivamente para as escalas dedependência, auto-criticismo e eficácia.

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Os nossos resultados sugerem que as escalasda versão portuguesa do Q.E.D. apresentam umbom nível de consistência interna, ou seja, queestão a medir consistentemente os constructosque deveriam medir.

8. CONCLUSÕES

Os resultados obtidos são, na generalidade,bastante animadores. Mas outros estudos psico-métricos são necessários, nomeadamente, ondese possam medir as correlações das escalas doQ.E.D. com outros instrumentos que meçamconstructos afins – validade concorrente (Goldenet al., 1984) –, ou as correlações das escalas comcritérios externos, por exemplo, com avaliaçõesrealizadas por peritos que conheçam bem a teo-ria de Blatt – validade relativa a um critério(Nunnally, 1978). Seria ainda útil avaliar a cor-relação com outros instrumentos que meçamconstructos não directamente relacionados – va-lidade discriminante (Golden et al., 1984).

Os estudos psicométricos futuros deverão usaramostras de indivíduos normais (adultos de dife-rentes níveis socio-culturais) e também amostrasde pacientes, no sentido de avaliar, como suge-rem Zuroff, Quinlan et al. (1990), se nestas últi-mas as propriedades psicométricas do instrumen-to se mantêm. Será, por exemplo, que a depen-dência e o auto-criticismo se apresentam comoconstructos independentes, como acontece empopulações normais? Ou não, como sugeremalguns críticos do modelo de Blatt e do Q.E.D..

Depois do desenvolvimento de uma escala, hásempre mais dados a recolher com o objectivo desaber aquilo que ela realmente mede (Comrey,1987). Como relembram Van de Vijver e Ham-

bleton (1996), a validade de um instrumento nãopode ser «transferida» de um contexto culturalpara outro, tendo de ser demonstrada nessa novapopulação.

Seria também útil e importante realizar umestudo de garantia teste-reteste para avaliar a es-tabilidade da versão portuguesa do Q.E.D., bemcomo a obtenção de normas, quer para a popu-lação normal, quer para grupos clínicos.

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303

TABELA 5Valores de alfa de Cronbach para as três escalas do Q.E.D., calculados em separado para o grupo

dos rapazes e para o grupo das raparigas

Participantes Dependência Auto-criticismo Eficácia

Rapazes (n=129) .82 .78 .71

Raparigas (n=359) .77 .79 .70

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RESUMO

No presente trabalho apresentamos os estudos leva-dos a cabo para adaptar o Questionário de Experiên-cias Depressivas (Q.E.D.) de Sidney Blatt e colegaspara a população portuguesa. Iniciamos o artigo comuma breve exposição dos aspectos centrais da con-ceptualização de Sidney Blatt sobre a depressão.Descrevemos depois a versão original do Q.E.D. e assuas propriedades psicométricas. Posteriormenteapresentamos o processo de tradução do instrumento,a sua aplicação experimental, a demonstração daequivalência linguística cruzada entre a versão originale a versão portuguesa e, finalmente, alguns estudospsicométricos com a versão portuguesa do questioná-rio, nomeadamente relativos à análise da estruturafactorial e de consistência interna. Calculámos tambémos valores das médias, medianas e desvios-padrãonas escalas do Q.E.D. e no Inventário de Depressão deBeck, de duas amostras portuguesas de estudantesuniversitários: uma de rapazes e outra de raparigas uti-

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lizadas neste processo de adaptação e comparámos es-sas duas amostras entre si, no que respeita aos valoresmédios nas escalas do Q.E.D. Comparámo-las tambémcom as amostras americanas de rapazes e raparigas doestudo de replicação do estudo original de aferição.Calculámos ainda as correlações entre as escalas doQ.E.D. entre si e entre cada uma delas e o Inventáriode Depressão de Beck. Os resultados obtidos são, deuma forma geral, bastante satisfatórios, apesar de sernecessário levar a cabo mais estudos de validade etambém de precisão teste-reteste.

Palavras-chave: Adaptação, Questionário de Expe-riências Depressivas, Sidney Blatt, estudos psicomé-tricos, versão portuguesa.

ABSTRACT

In these work we present the studies carried out toadapt the Depressive Experiences Questionnaire(D.E.Q.) by Sidney Blatt and coleagues to the Portu-guese population. We begin the paper with a brief pre-sentation of Blatt’s theory of depression. Than we des-

cribe the original version of D.E.Q. and its psychome-tric properties. After that we present the translationprocess of the instrument, its experimental aplication,the demonstration of the linguistic equivalence bet-ween the original version and the Portuguese versionand finaly we present some psychomteric studies withthe Portuguese version of the questionnaire, namely offactorial structure and internal consistency. We alsocalculate the means, medians and standard-deviationson the D.E.Q. scales and on Beck Depression Inven-tory of a Portuguese female and male college studentsamples used in the adaptation processs and wecompared those two samples on D.E.Q. results. We al-so compared them with the American female and ma-le samples used in the replication study of the originalstandardization study. We also calculate the correla-tions between D.E.Q. scales and between them and theBeck Depression Inventory. The results obtained aregenerally quite satisfactory, but it will be necessary tocarry out more validity studies and also of test-retestreliability.

Key words: Adaptation, Depressive ExperiencesQuestionnaire, Sidney Baltt, psychometric studies,Portuguese version.

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ANEXO A

TABELA 4Saturação dos 66 itens do Q.E.D. nos 3 Factores obtidos através da Análise Factorial em

Componentes Principais após rotação Varimax, com a amostra de estudantes do sexo feminino

Item Factor I Factor II Factor III

Item 1 -.13 .01 .44Item 2 .06 .48 .07Item 3 .09 .09 -.17Item 4 .46 .14 .25Item 5 -.04 -.22 .01Item 6 .29 .25 -.17Item 7 .56 .10 -.14Item 8 -.30 .14 .23Item 9 .11 .30 -.13

Item 10 .46 .32 -.04Item 11 .63 .29 -.04Item 12 -.24 -.36 .19Item 13 .60 -.08 .17Item 14 .25 -.20 .19Item 15 .12 .12 .46Item 16 .54 .11 .02Item 17 .64 -.05 .13Item 18 -.14 -.44 .12Item 19 .20 .57 -.01Item 20 .04 .49 .25Item 21 -.24 .04 .32Item 22 .41 .22 -.04Item 23 .27 .41 .05Item 24 .16 .18 .48Item 25 .51 .11 -.10Item 26 -.08 -.46 .16Item 27 .34 -.08 .21Item 28 .45 .50 -.01Item 29 .18 .19 .27Item 30 .60 .07 -.06Item 31 -.07 -.01 .30Item 32 .11 .30 .15Item 33 -.28 -.04 .57Item 34 .05 .48 .20Item 35 .54 -.01 .02Item 36 .71 .20 .04Item 37 .49 .23 -.02Item 38 .02 -.47 .36Item 39 .11 .21 .38Item 40 .05 .45 .27Item 41 .37 .39 .08Item 42 -.13 -.34 .49Item 43 .61 .23 -.04Item 44 .44 -.06 .25Item 45 .08 .46 .27

(continua na página seguinte)

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(continuação da página anterior)

Item Factor I Factor II Factor III

Item 46 .08 .35 .14Item 47 .16 .01 .14Item 48 -.34 -.16 .12Item 49 -.15 .18 .16Item 50 .39 .47 .05Item 51 .41 .17 -.08Item 52 -.04 .44 .07Item 53 .35 .16 .02Item 54 -.25 -.18 .35Item 55 .37 .43 .06Item 56 .24 .14 .09Item 57 .22 -.31 -.04Item 58 .51 -.13 .28Item 59 .13 .05 .58Item 60 -.02 .24 .45Item 61 -.29 .28 .13Item 62 -.55 .14 .38Item 63 .01 .25 .25Item 64 .29 .21 .28Item 65 .02 -.52 .10Item 66 .40 .11 .19

% de Var. explicada 11.54% 8.09% 5.62%