acidentes de moto crescem 350% em 10 anos em salvador

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SALVADOR SALVADOR SEGUNDA-FEIRA 25/4/2011 A4 REGIÃO METROPOLITANA [email protected] TRÂNSITO Em 2001, foram 26 óbitos na capital, contra 91 vítimas em 2010 Mortes em motocicletas sobem 350% em 10 anos HIEROS VASCONCELOS O número de mortes envol- vendo motociclistas em Sal- vador aumentou 350% de 2001 a 2010, enquanto o nú- mero de acidentes cresceu 302% no mesmo período. De acordo com estatísticas da Su- perintendência de Trânsito e Transporte (Transalvador), em 2001 ocorreram 1.948 aci- dentes e 26 óbitos, enquanto que em 2010 foram registra- dos 5.887 acidentes e 91 mor- tes. Apenas nos três primei- ros meses deste ano, o órgão contabilizou 1.309 acidentes com dez mortes. As estatísticas em Salvador acompanham o resultado do Mapa da Violência 2011, pes- quisa elaborada pelo Institu- to Sangari (ONG que desen- volve metodologias e mate- riais educacionais de ciên- cias) e divulgado em fevereiro deste ano. No caderno com- plementar Acidentes de Trân- sito, o estudo mostra que, de 1998 a 2008, o número de mortes de motociclistas no Brasil cresceu 754%, pulando de 1.894 para 11.471. O pesquisador Júlio Jacobo, responsável pelo caderno, destaca que o risco de um mo- tociclista morrer no trânsito é 14 vezes maior do que o de um ocupante de automóvel. Se- gundo ele, o aumento de in- dústrias de ciclomotores, as facilidades de compra e os in- centivos fiscais, a partir da dé- cada de 90, colocaram a mo- tocicleta como uma saída pa- ra a falta de mobilidade ur- bana, sem que fosse feito um acompanhamento do cresci- mento desenfreado e suas possíveis consequências no trânsito. O médico baiano e perito em acidentes de trânsito Eduardo Sampaio concorda, mas lembra que o principal causador dos acidentes continua sendo a imprudên- cia. “O aumento da frota e das facilidades de compra evidentemente vão amorti- zar o tráfego e torná-lo mais caótico. Mas, se os motoristas fos- sem conscientes, os acidentes não seriam tão frequentes”, diz. Para ele, há falhas na for- mação de condutores, falta de campanhas educativas e má fiscalização do trânsito. “O aluno vai para uma aula, faz uma prova e se julga apto a sair de motocicleta. Deveria haver um processo de trei- namento mais intensivo”, acredita. Frota Ainda conforme o Mapa da Violência 2011, a frota de mo- tos no Brasil cresceu 369% de 1998 até 2008, passando de 2,8 milhões para 13,1 milhões. Em Salvador, a frota de mo- tocicletas passou de 15.929, em 1998, para 86.390, até março deste ano, conforme dados do Departamento Es- tadual de Trânsito (De- tran-BA). O crescimento mé- dio é de 568 motocicletas por mês, cerca de 16% ao ano. Segundo o coordenador da Controladoria Regional de Trânsito do Detran-BA, Jorge de Assis, o curso dado aos ins- trutores de autoescolas con- templa todas as matérias re- lacionadas ao trânsito e teve a carga horária aumentada de 120 horas/aula para 180 ho- ras/aula. “Tem que haver maior conscientização por meio de campanhas educa- tivas, tem que haver a fisca- lização mais intensa dos ór- gãos de trânsito. É uma série de fatores que vai diminuir essas estatísticas”, afirma. O diretor de trânsito da Transalvador, Renato Araújo, reconhece a dificuldade em fiscalizar os motociclistas, mas garante que mais 13 ra- dares devem ser instalados nos próximos quatro meses, além dos 37 já existentes. “Temos buscado parceria com o governo e com a Polícia Militar para fiscalizarmos os motociclistas. Estes, quando passam pelos radares, che- gam a se deitar na moto e põem as mãos na placa”, ex- plica o diretor de trânsito da Transalvador. Fotos Raul Spinassé / Ag. A TARDE O risco de um motociclista morrer no trânsito é 14 vezes maior do que o de um ocupante de automóvel, segundo a pesquisa Acidentes de Trânsito, da ONG Instituto Sangari COMO SE PRECAVER Capacete O capacete é o mínimo que o motociclista deve usar ao sair na rua. É importante estar com sapato fechado Faixa Conforme o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), a moto deve ocupar o mesmo espaço de um automóvel na pista Buracos na pista É necessário atenção redobrada aos buracos na pista, que podem desequilibrar facilmente os motociclistas Chuvas Evite andar debaixo de chuva. Pare e espere a chuva diminuir para seguir adiante Ponto cego Mantenha o farol dianteiro ligado enquanto estiver pilotando para evitar não ser visto ao passar por um ponto cego do retrovisor dos motoristas de veículos de quatro rodas Acidente de moto transtorna a vida de estudante O estudante Gilson Fontes, 42 anos, teve planos interrom- pidos e uma dezena de com- plicações após sofrer um aci- dente, em 23 de novembro de 2010, na Avenida Gal Costa, quando pilotava sua motoci- cleta. Gilson voltava do trei- namento da empresa Consór- cio Alusa, em Madre de Deus, quando um veículo invadiu a contramão e colidiu com ele. “Eu havia decidido ter uma moto após meu carro ter sido roubado. E realmente era muito prático. Mas, hoje, não aconselho a ninguém ter mo- to sem ter experiência”, afir- ma. Cinco meses depois de in- ternações e de dificuldades para conseguir atendimento na rede pública, Gilson aguar- da mais uma vaga no Hospital Estadual Manoel Vitorino – referência em traumas e or- topedia – para realizar a nona cirurgia na perna esquerda, onde quebrou a tíbia, o fêmur, e joelho, que precisou ser re- construído. Por causa do acidente, per- deu o emprego que tinha aca- bado de conseguir. “Inicial- mente, a Alusa ligou e disse que prestaria todo apoio, pois já havia entregado todos os meus documentos. Mas quando eles viram que, por um erro de uma funcionária, minha carteira de trabalho não estava assinada, volta- ram atrás”, relata. Gilson sabe que não terá sua vida restabelecida e que ficará para sempre com pla- tina na perna. Mas só tem a agradecer a Deus pela rápida recuperação, que chegou a ser descartada por médicos. “Achei que com uma moto te- ria mais mobilidade e aces- sibilidade. Eu era prudente, tinha cuidado e pilotava na faixa de carro. Na chuva, sem- pre parei. Mas sei que a maio- ria dos motociclistas não age assim”, conta. Competição O diretor de trânsito da Tran- salvador, Renato Araújo, lem- bra que a maioria dos mo- tociclistas trabalha com en- tregas e, segundo ele, está na faixa de 18 a 25 anos. “São motoboys, entregadores de pizza, mototaxistas. Essas pessoas, de certa forma, par- ticipam de uma competição”, afirma. Também há motoris- tas que não respeitam mo- tociclistas, por estarem em veículos menores. “O carro causa uma sensação de poder e de espaço”, lembra o psi- cólogo George de Almeida. Na colisão, Gilson Fontes sofreu fratura na bacia e na perna esquerda, na qual quebrou tíbia, fêmur e joelho Maioria dos motociclistas são motoboys, entregadores de pizza e mototaxistas Regularização do mototaxista esbarra em lei e questionamentos O crescente número de aci- dentes envolvendo motoci- cletas põe em questionamen- to a regularização de cerca de quatro mil mototaxistas que atuam clandestinamente em Salvador. Há mais de cinco anos, o Sindicato dos Moto- taxistas da Bahia (Sindimo- tos-BA) luta pela regulariza- ção da profissão, mas esbarra em um projeto de lei parado na Câmara Municipal, embo- ra conte com a promessa do prefeito João Henrique de re- gularizar a situação. Segundo o vice-presidente Jerônimo Batista, o sindicato sempre trabalha, durante as reuniões, com a questão da segurança e da prudência dos mototaxistas no trânsito. “Te- mos consciência dessa preo- cupação e trabalhamos isso com os mototaxistas. E o pró- prio passageiro também tem atuado como fiscalizador. Não temos nem 1% de queixas ainda”, afirma. Para o médico e perito em acidentes de trânsito Eduardo Sampaio, o serviço de moto- taxista não deveria ser regu- lamentado sem antes Salva- dor passar por uma reestru- turação viária. Ele defende motovias na ci- dade para que os mototaxis- tas não burlem o CTB, que determina que o condutor transite na mesma faixa que um automóvel. “Salvador não está preparada para esse tipo de atuação”, declarou. Editor-coordenador Cláudio Bandeira TRÂNSITO PERIGOSO Confira mais informações sobre o assunto www.atarde.com.br

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Em 2001 foram 26 acidentes, contra 91 em 2010

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Page 1: acidentes de moto crescem 350% em 10 anos em Salvador

SALVADORSALVADOR SEGUNDA-FEIRA 25/4/2011A4

REGIÃO METROPOLITANA

[email protected]

TRÂNSITO Em 2001, foram 26 óbitos nacapital, contra 91 vítimas em 2010

Mortes emmotocicletassobem 350%em 10 anosHIEROS VASCONCELOS

O número de mortes envol-vendo motociclistas em Sal-vador aumentou 350% de2001 a 2010, enquanto o nú-mero de acidentes cresceu302% no mesmo período. Deacordo com estatísticas da Su-perintendência de Trânsito eTransporte (Transalvador),em 2001 ocorreram 1.948 aci-dentes e 26 óbitos, enquantoque em 2010 foram registra-dos 5.887 acidentes e 91 mor-tes. Apenas nos três primei-

ros meses deste ano, o órgãocontabilizou 1.309 acidentescom dez mortes.

As estatísticas em Salvadoracompanham o resultado doMapa da Violência 2011, pes-quisa elaborada pelo Institu-to Sangari (ONG que desen-volve metodologias e mate-riais educacionais de ciên-cias) e divulgado em fevereirodeste ano. No caderno com-plementar Acidentes de Trân-sito, o estudo mostra que, de1998 a 2008, o número demortes de motociclistas no

Brasil cresceu 754%, pulandode 1.894 para 11.471.

O pesquisador Júlio Jacobo,responsável pelo caderno,destaca que o risco de um mo-tociclista morrer no trânsito é14 vezes maior do que o de umocupante de automóvel. Se-gundo ele, o aumento de in-dústrias de ciclomotores, asfacilidades de compra e os in-centivos fiscais, a partir da dé-cada de 90, colocaram a mo-tocicleta como uma saída pa-ra a falta de mobilidade ur-bana, sem que fosse feito um

acompanhamento do cresci-mento desenfreado e suaspossíveis consequências notrânsito.

O médico baiano e peritoem acidentes de trânsitoEduardo Sampaio concorda,mas lembra que o principalcausador dos acidentescontinua sendo a imprudên-cia. “O aumento da frota edas facilidades de compraevidentemente vão amorti-zar o tráfego e torná-lo maiscaótico.

Mas, se os motoristas fos-sem conscientes, os acidentesnão seriam tão frequentes”,diz. Para ele, há falhas na for-mação de condutores, falta decampanhas educativas e máfiscalização do trânsito. “Oaluno vai para uma aula, fazuma prova e se julga apto asair de motocicleta. Deveriahaver um processo de trei-namento mais intensivo”,acredita.

FrotaAinda conforme o Mapa daViolência 2011, a frota de mo-tos no Brasil cresceu 369% de1998 até 2008, passando de2,8 milhões para 13,1 milhões.Em Salvador, a frota de mo-tocicletas passou de 15.929,em 1998, para 86.390, atémarço deste ano, conforme

dados do Departamento Es-tadual de Trânsito (De-tran-BA). O crescimento mé-dio é de 568 motocicletas pormês, cerca de 16% ao ano.

Segundo o coordenador daControladoria Regional deTrânsito do Detran-BA, Jorgede Assis, o curso dado aos ins-trutores de autoescolas con-templa todas as matérias re-lacionadas ao trânsito e teve acarga horária aumentada de120 horas/aula para 180 ho-ras/aula. “Tem que havermaior conscientização pormeio de campanhas educa-tivas, tem que haver a fisca-lização mais intensa dos ór-gãos de trânsito. É uma sériede fatores que vai diminuiressas estatísticas”, afirma.

O diretor de trânsito daTransalvador, Renato Araújo,reconhece a dificuldade emfiscalizar os motociclistas,mas garante que mais 13 ra-dares devem ser instaladosnos próximos quatro meses,além dos 37 já existentes.

“Temos buscado parceriacom o governo e com a PolíciaMilitar para fiscalizarmos osmotociclistas. Estes, quandopassam pelos radares, che-gam a se deitar na moto epõem as mãos na placa”, ex-plica o diretor de trânsito daTransalvador.

Fotos Raul Spinassé / Ag. A TARDE

O risco de um motociclista morrer no trânsito é 14 vezes maior do que o de um ocupante de automóvel, segundo a pesquisa Acidentes de Trânsito, da ONG Instituto Sangari

COMO SE PRECAVER

Capacete O capaceteé o mínimo que omotociclista deve usarao sair na rua. Éimportante estar comsapato fechado

Faixa Conforme oCódigo de TrânsitoBrasileiro (CTB), a motodeve ocupar o mesmoespaço de umautomóvel na pista

Buracos na pista Énecessário atençãoredobrada aos buracosna pista, que podemdesequilibrarfacilmente osmotociclistas

Chuvas Evite andardebaixo de chuva. Pare eespere a chuva diminuirpara seguir adiante

Ponto cego Mantenhao farol dianteiro ligadoenquanto estiverpilotando para evitarnão ser visto ao passarpor um ponto cego doretrovisor dosmotoristas de veículosde quatro rodas

Acidente demoto transtornaa vida deestudante

O estudante Gilson Fontes, 42anos, teve planos interrom-pidos e uma dezena de com-plicações após sofrer um aci-dente, em 23 de novembro de2010, na Avenida Gal Costa,quando pilotava sua motoci-cleta. Gilson voltava do trei-namento da empresa Consór-cio Alusa, em Madre de Deus,quando um veículo invadiu acontramão e colidiu com ele.“Eu havia decidido ter umamoto após meu carro ter sidoroubado. E realmente eramuito prático. Mas, hoje, nãoaconselho a ninguém ter mo-to sem ter experiência”, afir-ma.

Cinco meses depois de in-ternações e de dificuldadespara conseguir atendimentonaredepública,Gilsonaguar-da mais uma vaga no HospitalEstadual Manoel Vitorino –referência em traumas e or-topedia – para realizar a nonacirurgia na perna esquerda,ondequebrouatíbia,ofêmur,e joelho, que precisou ser re-construído.

Por causa do acidente, per-deu o emprego que tinha aca-bado de conseguir. “Inicial-mente, a Alusa ligou e disseque prestaria todo apoio, poisjá havia entregado todos osmeus documentos. Masquando eles viram que, porum erro de uma funcionária,minha carteira de trabalhonão estava assinada, volta-ram atrás”, relata.

Gilson sabe que não terá

sua vida restabelecida e queficará para sempre com pla-tina na perna. Mas só tem aagradecer a Deus pela rápidarecuperação, que chegou a serdescartada por médicos.“Achei que com uma moto te-ria mais mobilidade e aces-sibilidade. Eu era prudente,tinha cuidado e pilotava nafaixa de carro. Na chuva, sem-

pre parei. Mas sei que a maio-ria dos motociclistas não ageassim”, conta.

CompetiçãoO diretor de trânsito da Tran-salvador, Renato Araújo, lem-bra que a maioria dos mo-tociclistas trabalha com en-tregas e, segundo ele, está nafaixa de 18 a 25 anos. “São

motoboys, entregadores depizza, mototaxistas. Essaspessoas, de certa forma, par-ticipam de uma competição”,afirma. Também há motoris-tas que não respeitam mo-tociclistas, por estarem emveículos menores. “O carrocausa uma sensação de podere de espaço”, lembra o psi-cólogo George de Almeida.

Na colisão, Gilson Fontes sofreu fratura na bacia e na perna esquerda, na qual quebrou tíbia, fêmur e joelho

Maioria dosmotociclistassão motoboys,entregadoresde pizza emototaxistas

Regularizaçãodo mototaxistaesbarra em lei equestionamentos

O crescente número de aci-dentes envolvendo motoci-cletas põe em questionamen-to a regularização de cerca dequatro mil mototaxistas queatuam clandestinamente emSalvador. Há mais de cincoanos, o Sindicato dos Moto-taxistas da Bahia (Sindimo-tos-BA) luta pela regulariza-ção da profissão, mas esbarraem um projeto de lei paradona Câmara Municipal, embo-ra conte com a promessa doprefeito João Henrique de re-gularizar a situação.

Segundo o vice-presidenteJerônimo Batista, o sindicatosempre trabalha, durante asreuniões, com a questão dasegurança e da prudência dosmototaxistas no trânsito. “Te-mos consciência dessa preo-cupação e trabalhamos issocom os mototaxistas. E o pró-prio passageiro também tematuado como fiscalizador.Não temos nem 1% de queixasainda”, afirma.

Para o médico e perito emacidentesdetrânsitoEduardoSampaio, o serviço de moto-taxista não deveria ser regu-lamentado sem antes Salva-dor passar por uma reestru-turação viária.

Ele defende motovias na ci-dade para que os mototaxis-tas não burlem o CTB, quedetermina que o condutortransite na mesma faixa queum automóvel. “Salvador nãoestá preparada para esse tipode atuação”, declarou.

Editor-coordenadorCláudio Bandeira

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