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Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013 Acessibilidade aos bens culturais imóveis Ana Carolina Araújo Pereira [email protected] Master em Arquitetura Instituto de Pós-graduação - IPOG Resumo A Constituição Federal de 1988 garante o direito de preservação e proteção do patrimônio cultural, bem como o direito das pessoas com deficiência de acessibilidade, inclusive aos bens culturais imóveis. Como garantir a acessibilidade nestes imóveis sem que haja prejuízo dos valores históricos culturais? Este artigo tem como objetivo compreender como é possível conciliar esses dois temas aparentemente incompatíveis. Para isso foi feita uma pesquisa bibliográfica da legislação vigente e dos temas envolvidos. Percebeu-se que no Brasil ainda há poucos estudos e conhecimento sobre o assunto e foram identificadas as principais barreiras encontradas. Por fim foram propostas algumas diretrizes de projeto para implantar a acessibilidade em bens culturais imóveis. Palavras-chave: Acessibilidade; Bens culturais imóveis; Pessoa com deficiência; Preservação. 1. Introdução Minas Gerais é o estado que possui o maior acervo de bens culturais imóveis e cidades históricas, como afirma Miranda (2009), além disso, possui três sítios históricos declarados como “Patrimônio Cultural da Humanidade” pela UNESCO. Conforme determina a Constituição Federal de 1988 e a legislação infraconstitucional, estes bens devem ser preservados e protegidos pelo Estado, com a colaboração da população. Essa proteção ao patrimônio cultural tem como um dos seus principais fundamentos o princípio da igualdade, vez que visa garantir o direito de as futuras gerações apreciarem esses bens de valor histórico e cultural acentuado, em sua integridade, com a mesma liberdade que possui a presente geração. (PEREIRA e LIMA, 2005) Entretanto, muitos desses bens culturais imóveis são abertos ao público, mas não permitem o acesso de todos e seu uso por todos da presente geração, pois não são acessíveis às pessoas com deficiência ou às pessoas com mobilidade reduzida e aos idosos. A Constituição Federal garante também o direito à igualdade sem distinção de qualquer natureza, bem como o direito das pessoas com deficiência à acessibilidade. “O homem construiu a história e deve ter condição de conhecê-la, valorizá-la e utilizá- la.”(ANDRADE, 2009:1) Para tanto é necessário que os bens culturais imóveis sejam acessíveis conforme determina a Constituição Federal e a legislação infraconstitucional. Tanto a preservação e proteção do patrimônio cultural quanto a acessibilidade de pessoas com deficiência são direitos com garantia constitucional, além da legislação específica, e devem ser respeitados e garantidos. Temos, portanto, um conflito entre dois direitos que, no entanto, aparentemente são incompatíveis. Como tornar os bens culturais imóveis acessíveis às pessoas com deficiência, sem que haja prejuízo dos valores históricos e culturais? Qual dos dois direitos é mais importante?

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Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

Acessibilidade aos bens culturais imóveis

Ana Carolina Araújo Pereira – [email protected]

Master em Arquitetura – Instituto de Pós-graduação - IPOG

Resumo

A Constituição Federal de 1988 garante o direito de preservação e proteção do patrimônio

cultural, bem como o direito das pessoas com deficiência de acessibilidade, inclusive aos

bens culturais imóveis. Como garantir a acessibilidade nestes imóveis sem que haja prejuízo

dos valores históricos culturais? Este artigo tem como objetivo compreender como é possível

conciliar esses dois temas aparentemente incompatíveis. Para isso foi feita uma pesquisa

bibliográfica da legislação vigente e dos temas envolvidos. Percebeu-se que no Brasil ainda

há poucos estudos e conhecimento sobre o assunto e foram identificadas as principais

barreiras encontradas. Por fim foram propostas algumas diretrizes de projeto para implantar

a acessibilidade em bens culturais imóveis.

Palavras-chave: Acessibilidade; Bens culturais imóveis; Pessoa com deficiência;

Preservação.

1. Introdução

Minas Gerais é o estado que possui o maior acervo de bens culturais imóveis e cidades

históricas, como afirma Miranda (2009), além disso, possui três sítios históricos declarados

como “Patrimônio Cultural da Humanidade” pela UNESCO. Conforme determina a

Constituição Federal de 1988 e a legislação infraconstitucional, estes bens devem ser

preservados e protegidos pelo Estado, com a colaboração da população.

Essa proteção ao patrimônio cultural tem como um dos seus principais fundamentos

o princípio da igualdade, vez que visa garantir o direito de as futuras gerações

apreciarem esses bens de valor histórico e cultural acentuado, em sua integridade,

com a mesma liberdade que possui a presente geração. (PEREIRA e LIMA, 2005)

Entretanto, muitos desses bens culturais imóveis são abertos ao público, mas não permitem o

acesso de todos e seu uso por todos da presente geração, pois não são acessíveis às pessoas

com deficiência ou às pessoas com mobilidade reduzida e aos idosos. A Constituição Federal

garante também o direito à igualdade sem distinção de qualquer natureza, bem como o direito

das pessoas com deficiência à acessibilidade.

“O homem construiu a história e deve ter condição de conhecê-la, valorizá-la e utilizá-

la.”(ANDRADE, 2009:1) Para tanto é necessário que os bens culturais imóveis sejam

acessíveis conforme determina a Constituição Federal e a legislação infraconstitucional.

Tanto a preservação e proteção do patrimônio cultural quanto a acessibilidade de pessoas com

deficiência são direitos com garantia constitucional, além da legislação específica, e devem

ser respeitados e garantidos.

Temos, portanto, um conflito entre dois direitos que, no entanto, aparentemente são

incompatíveis. Como tornar os bens culturais imóveis acessíveis às pessoas com deficiência,

sem que haja prejuízo dos valores históricos e culturais? Qual dos dois direitos é mais

importante?

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

Embora os estudos sobre acessibilidade e sua aplicação em projetos de edificações e espaços

urbanos tenham se desenvolvido muito nos últimos anos, os estudos com relação à

acessibilidade em bens culturais imóveis ainda são muitos escassos, especialmente em Minas

Gerais, onde o turismo histórico é muito grande e deveria garantir a todos o acesso a esses

locais.

Há vários critérios e parâmetros de acessibilidade previstos na legislação vigente e na norma

específica, os quais devem ser seguidos. No entanto, sabe-se que muitas vezes fica difícil

encontrar soluções para atender a todos os padrões exigidos em bens culturais imóveis, tendo

em vista a preservação dos valores históricos e culturais.

Todos os projetos de intervenção em bens culturais imóveis, inclusive os de acessibilidade,

devem ser aprovados pelos órgãos de preservação, seja em nível federal, o Instituto do

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, em nível estadual ou municipal. Esses

órgãos muitas vezes apresentam muitos impedimentos para a implantação da acessibilidade,

pois, conforme afirma Andrade (2009), alguns “estudiosos acreditam que o patrimônio é

imexível e não pode ser alterado”.

O objetivo desse artigo é propor diretrizes que possam auxiliar nos projetos para implantação

de acessibilidade nos bens culturais imóveis sem prejuízo dos seus principais valores

históricos e culturais, através de um estudo da legislação e normas específicas, bem como

uma revisão bibliográfica sobre o tema.

2. Fundamentação Teórica - Acessibilidade

De acordo com o Censo Demográfico de 2000, aproximadamente 24,5 milhões de pessoas no

Brasil possuem algum tipo de deficiência, o que corresponde a 14,5% da população total do

país. Além disso, muitas outras pessoas que não possuem nenhum tipo de deficiência

encontram dificuldades de deslocamento e para execução das atividades cotidianas, por

exemplo pessoas obesas, idosos, crianças, gestantes, pessoas com carrinhos de bebê ou com

algum membro fraturado.

Não existe “homem padrão”. As pessoas apresentam características diferentes entre

si, seja em relação ao sexo, a idade ou a cultura. Existem pessoas magras e altas,

outras gordas e baixas. Elas podem apresentar diferentes capacidades e habilidades

físicas. Para a concepção de ambientes e produtos que possam ser utilizados por

todas as pessoas, é necessário conhecer essas diferenças e projetar espaços levando

em consideração esses fatores. (ANDRADE, 2009: 7)

O Decreto Federal 5296 define pessoa com deficiência como aquela que “possui limitação ou

incapacidade para o desempenho de atividade”, e divide as deficiências em cinco categorias:

deficiência física, deficiência auditiva, deficiência visual, deficiência mental e deficiência

múltipla.

Quando se trata de acessibilidade normalmente associa-se a pessoas com

deficiência, porém, o importante a ser considerado não são as suas características

físicas, e sim suas necessidade ou restrições. Garantir a plena acessibilidade

representa o respeito à individualizada de cada um. (PAIVA, 2009: 34)

Para Andrade, para se criar ambientes acessíveis a todos é preciso conhecer as diferentes

dificuldades e limitações que o ser humano pode encontrar na realização das atividades

diárias, para identificar as principais barreiras encontradas.

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

A Norma Brasileira ABNT NBR 9050 (2004) define acessibilidade como “possibilidade e

condição de alcance, percepção e entendimento para a utilização com segurança e autonomia

de edificações, espaço, mobiliário, equipamento urbano e elementos”. Na visão de

Dischinger, Bins Ely e Piardi (apud ANDRADE, 2009), acessibilidade é bem mais que atingir

um local. “É também necessário que o local permita ao usuário compreender sua função, sua

organização e relações espaciais, assim como participar das atividades que ali ocorrem”.

O uso de soluções de acessibilidade pode beneficiar a todas as pessoas. Andrade (2009)

afirma que “falar em acessibilidade é projetar edifícios, cidades e produtos que possam ser

utilizados com conforto, segurança e autonomia por todas as pessoas, independente de suas

capacidades ou limitações, de forma igualitária”.

Dischinger, Bins Ely e Piardi (apud Andrade, 2009) dividiram os componentes de

acessibilidade espacial em quatro categorias: orientação espacial, comunicação, deslocamento

e uso, sendo que “cada componente é constituído por um conjunto de diretrizes que definem

características espaciais de forma a permitir a acessibilidade aos edifícios públicos e

minimizar possíveis restrições”.

A orientação espacial está ligada à compreensão do espaço, permitindo, assim, que

os usuários reconheçam a identidade de funções do espaço e definam suas

estratégias de deslocamento e uso.(...) A comunicação refere-se às possibilidades de

troca de informações interpessoais, ou troca de informações por meio da utilização

de equipamentos de tecnologia assistiva, que permitam o acesso, a compreensão e o

uso das atividades existentes. O deslocamento faz referência às condições de

movimento ao longo de percursos horizontais e verticais de forma independente,

segura e confortável, sem interrupções e livre de barreiras.O uso é obtido através da

possibilidade de participação de todo e qualquer indivíduo nas atividades, podendo

utilizar todos os ambientes e equipamentos. (ANDRADE, 2009: 16)

A partir do entendimento dos componentes de acessibilidade verifica-se que cada tipo de

deficiência convive com diferentes problemas, que geram necessidades especiais específicas.

As restrições e necessidades especiais, conforme apontam Andrade (2009) e Paiva (2009),

podem ser divididas em: restrições em atividades físico-motoras, restrições em percepção

sensorial, restrições em atividades de comunicação e restrições em atividades cognitivas.

2.1. Legislação aplicada

As pessoas com deficiência ao longo da história foram muito rejeitadas, sendo comum serem

exterminadas ou abandonadas pela família, sendo que até a Idade Média as deficiências eram

comumente associadas a castigos de Deus. Segundo Aranha (2012), só no século XVI as

deficiências começam a serem associadas a causas ambientais e surgem os primeiros tipos de

tratamentos. Sendo que somente no século XX, a sociedade percebe que as pessoas com

deficiência precisam integrar-se nas atividades cotidianas e participarem do convívio social

(GURGEL, 2012).

Durante as guerras, muitas pessoas ficaram com sequelas, que geraram deficiências. Foi nesta

época que surge na Europa a preocupação com a reabilitação dessas pessoas e a integração

delas na sociedade. No ano de 1948, foi promulgada a “Declaração universal dos direitos

humanos” pela Organização das Nações Unidas - ONU, que marca o início da defesa das

pessoas com deficiência. Algum tempo depois, a ONU criou também a “Declaração dos

direitos das pessoas com deficiência”, em 1975, e o “Programa de ação mundial para as

pessoas com deficiência”, em 1982.

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

No Brasil a Constituição Federal de 1988 foi um marco na defesa das pessoas com

deficiência, garantindo que o Estado deverá promover a proteção e a integração social destas

pessoas, o direito a assistência social, a educação especializada, a igualdade de direitos no

trabalho e acesso a cargos públicos, e o direito a acessibilidade de logradouros, edifícios e

transporte.

Foi a partir da Constituição Cidadã que o tema referente à pessoa portadora de

deficiência ganhou maior realce e conquistou destaque constitucional e

infraconstitucional, recebendo por certo, o tratamento devido, mesmo que muito

ainda se tem a alcançar, pois as conquistas ainda estão longe de se findar.(CHATT,

2010)

Com relação à garantia do direito à acessibilidade são destaques o § 2º do art. 227 e o art. 244,

que preveem que a lei disporá sobre normas de construção, bem como a adaptação, de

logradouros e edifícios de uso público e de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir

acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência. No art. 215, caput, prevê que “o Estado

garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes de cultura

nacional”.

Conforme afirmam Miranda e Novais (2008) “resta claro que o legislador constituinte quis

assegurar a todos, e de maneira especial aos portadores de deficiência, o acesso aos bens

culturais existentes em nosso país”.

Entretanto, somente no ano 2000, foi promulgada a Lei Federal 10098, que estabelece normas

gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de

deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências, sendo que foi

regulamentada em 2004, através do Decreto 5296, o qual determina que:

Art. 10. A concepção e a implantação dos projetos arquitetônicos e urbanísticos

devem atender aos princípios do desenho universal, tendo como referências básicas

as normas técnicas de acessibilidade da ABNT, a legislação específica e as regras

contidas neste Decreto.

Art. 11. A construção, reforma ou ampliação de edificações de uso público ou

coletivo, ou a mudança de destinação para estes tipos de edificação, deverão ser

executadas de modo que sejam ou se tornem acessíveis à pessoa portadora de

deficiência ou com mobilidade reduzida. (BRASIL, 2004)

Além das questões de acessibilidade física das edificações, o decreto prevê também

acessibilidade em vias e praças, no mobiliário urbano, nos transportes, sinalização para

pessoas com deficiência visual e interpretes da Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS, entre

outras. Sempre fazendo referência às normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas –

ABNT. Sendo que no ano de 2004, também saiu a última revisão da Norma Brasileira ABNT

NBR 9050 – Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos.

Com relação aos bens imóveis culturais, o art. 30 do Decreto 5296, prevê que a adaptação

deve estar de acordo com a Instrução Normativa n.o 1 do IPHAN, de 25 de novembro de

2003, que dispõe sobre acessibilidade em bens culturais imóveis.

3. Fundamentação Teórica – Patrimônio Cultural

A palavra patrimônio vem do latim e historicamente está associada à herança paterna, bens de

família e quaisquer bens materiais pertencentes a uma pessoa ou instituição. O conceito de

patrimônio cultural está ligado a bens que tenham algum interesse para uma comunidade.

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

As primeiras atividades para a preservação dos bens culturais imóveis foram iniciadas no

século XIX, no período pós-guerra e durante a revolução industrial, para recuperação de

muitos monumentos destruídos ou danificados. (ANDRADE, 2009).

Em 1931, durante a primeira conferência internacional sobre preservação de monumentos,

surge a “Carta de Atenas”, documento que visa à preservação dos bens culturais. Nos anos

seguintes são criadas outras cartas internacionais que tratam sobre o mesmo tema.

A “Carta de Burra”, de 1980, trouxe várias definições de conceitos importantes para o

presente artigo:

- A conservação de um bem compreende os “cuidados a serem dispensados a um bem para

preserva-lhe as características que apresentem uma significação cultural”. Pode implicar em

preservação, restauração e mesmo compreender obras mínimas de reconstrução ou adaptação,

conforme cada circunstância.

- A preservação de um bem compreende a manutenção da sua substância física e a

desaceleração do seu processo de degradação.

- A restauração implica em restabelecimento da substância física do bem em um estado

anteriormente conhecido.

- A adaptação é o “agenciamento de um bem a uma nova destinação sem a destruição de sua

significação cultural”.

De acordo com o mesmo documento, o principal objetivo da conservação de um bem deve ser

a preservação do seu valor histórico, e a opções escolhidas no processo determinarão as

futuras destinações que sejam compatíveis como o bem, as quais impliquem em modificações

que alterem o mínimo possível o valor cultural do bem ou que sejam reversíveis.

Para o Programa Monumenta (2012), “preservar os bens integrantes do patrimônio cultural

implica no reconhecimento dos valores artísticos e históricos, que o objeto de intervenção

possui. Ou seja do seu caráter único e insubstituível, admitido como obra de arte e/ou

documento histórico”.

3.1. Legislação aplicada

No Brasil, em 1937, foi promulgado o Decreto-Lei 25, documento que organiza a proteção do

patrimônio histórico e artístico nacional e cria o instituto do tombamento no país. No caput,

do art. 1o define que:

Constitui patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e

imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua

vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor

arqueológico ou etnológico, bibliográfico ou artístico. (BRASIL, 1937)

Para serem considerados parte integrante do patrimônio histórico e artístico nacional os bens

precisavam antes ser inseridos em um dos Livros do Tombo, ou seja, serem tombados.

A Constituição Federal de 1988 apresentou grandes avanços na defesa dos bens culturais. No

caput do art. 216, apresenta a denominação patrimônio cultural e sua definição: “Constituem

patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial tomados

individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos

diferentes grupos formadores da sociedade brasileira” (BRASIL, 1988)

A Constituição Federal dispõe que a proteção do patrimônio cultural é uma obrigação do

Poder Público, com colaboração da comunidade. Além disso, inclui o inventário também

como instrumento de proteção. “O inventário de um bem cultural feito por órgão de

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

preservação o coloca como bem de interesse público submetendo-o ao regime jurídico

específico dos bens culturais protegidos e conferindo-lhe restrições”. (MACHADO, 2009:51)

Desde 1937, o Decreto-Lei 25 determina em seu art. 17 que “as coisas tombadas não poderão,

em caso nenhum, ser destruídas, demolidas ou mutiladas, nem sem prévia autorização

especial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ser reparadas, pintadas ou

restauradas (...)”. Portanto, toda obra a ser realizada em um bem cultural, inclusive para

adequação aos critérios de acessibilidade, deve antes ser aprovada pelos órgãos competentes.

3.2. Instrução Normativa n.o 1 do Instituto do Patrimônio Artístico Nacional

Através desta Instrução Normativa o IPHAN resolveu:

Estabelecer diretrizes, critérios e recomendações para a promoção das devidas

condições de acessibilidade aos bens culturais imóveis, a fim de equiparar as

oportunidades de fruição destes bens pelo conjunto da sociedade, em especial pelas

pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida. (IPHAN, 2003)

De acordo com a Instrução Normativa, as soluções adotadas para adequação dos bens

culturais imóveis aos critérios de acessibilidade devem compatibilizar-se com a sua

preservação, assegurando condições de acesso, de trânsito, de orientação e de comunicação

para todo o público.

Determina ainda, nos itens 3.4 e 3.7, que os estudos para as propostas de intervenção devem

resultar de uma abordagem global da edificação, sendo que as intervenções devem contar

“com o registro e a indicação da época de implantação (...), privilegiando-se os recursos

passíveis de reversibilidade, de modo a permitir a inclusão de novos métodos, tecnologias ou

acréscimos” (IPHAN, 2003).

Conforme determina o item 1.4, os projetos para promoção da acessibilidade em bens

culturais imóveis devem ser submetidos à aprovação do pelo órgão do patrimônio histórico

responsável pela sua proteção, a fim de garantir a preservação dos elementos de maior

importância histórica.

A Instrução Normativa não apresenta nenhuma solução de projeto, sendo ainda bastante

superficial, no entanto percebe-se a preocupação do IPHAN com a acessibilidade nos bens

culturais imóveis. Para Gerente e Bins Ely (2004), “o documento destaca a importância de se

adotar soluções segundo os preceitos de desenho universal, observando sua compatibilidade

com as características históricas”.

4. Critérios de acessibilidade

De acordo com a legislação vigente todos os edifícios de uso público e de uso coletivo devem

ser acessíveis a pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. Deve haver uma rota

acessível, que compreende “o trajeto contínuo, desobstruído e sinalizado, que conecta os

ambientes externos ou internos de espaços e edificações, e que possa ser utilizado de forma

autônoma e segura por todas as pessoas” (ABNT, 2004). A rota acessível deve interligar a via

pública, os meios de transporte e estacionamentos aos edifícios.

A acessibilidade na via pública compreende os passeios públicos, os locais de travessia de

pedestres, os locais de parada de transporte coletivo e de estacionamento.

Os passeios devem ter uma faixa livre para circulação mínima de 1,20m (um metro e vinte

centímetros), superfície regular, firme, estável e antiderrapante sob qualquer condição, e que

não cause trepidação em cadeiras de rodas e carrinhos de bebê. Não deve haver desníveis nos

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

passeios, sendo a inclinação longitudinal adequada de até 8,33% (oito vírgula trinta e três por

cento), e a inclinação transversal deve ser de no máximo 3% (três por cento). Não deve haver

obstáculos na faixa de circulação com altura menor que 2,10m (dois metros e dez

centímetros). Os passeios devem sinalizados com pisos táteis de alerta e direcional para a

orientação de pessoas com deficiência visual.

De acordo com o § 2º do art. 15 do Decreto 5296:

Nos casos de adaptação de bens culturais imóveis e de intervenção para

regularização urbanística em áreas de assentamentos subnormais, será admitida, em

caráter excepcional, faixa de largura menor que o estabelecido nas normas técnicas

(...), desde que haja justificativa baseada em estudo técnico e que o acesso seja

viabilizado de outra forma, garantida a melhor técnica possível. (BRASIL, 2004)

Nas esquinas e locais de travessia de pedestres deve haver faixa demarcada no piso, rebaixo

do meio-fio ou travessia elevada, sinalizados com piso tátil. Além disso, os semáforos devem

ser equipados com sinal sonoro para orientação de pessoas com deficiência e ter tempo

compatível com a largura da via.

O mobiliário urbano deve dar condições de aproximação segura e uso por todas as pessoas,

independente do tipo de deficiência e limitação.

Os estacionamentos, tanto na via pública quanto no interior das edificações, devem ter vagas

reservadas para veículos que transportem pessoas com deficiência, as quais devem estar

próximo à entrada acessível ou ao elevador.

Nas edificações de uso público ou de uso coletivo, pelo menos um acesso, de preferência o

principal, deve ser acessível. Nos edifícios de uso público deve haver rota acessível

comunicando todas as suas dependências e serviços, no caso de edifício de uso coletivo, a rota

acessível deve interligar todas as partes de uso comum ou abertas ao público.

Caso não haja possibilidade de entrada principal ser acessível, pode-se adotar um acesso

secundário, o qual deve ser lateral e estar a uma distância máxima de 50m (cinquenta metros)

do acesso principal. Este deve estar devidamente sinalizado e permanecer aberto ou estar

conectado à recepção através de campanhia. A entrada acessível não deve usada como entrada

de serviços.

A entrada acessível deve ser sinalizada com sinalização visual e tátil para orientação de todas

as pessoas. Quando houver rampa ou escada na entrada acessível, estas devem atender aos

critérios da Norma Brasileira ABNT NBR 9050, quanto ao dimensionamento, ter corrimãos

em ambos os lados, piso tátil de alerta e sinalização visual nos degraus das escadas.

Nos locais de recepção e espera, o mobiliário de atendimento deve ser acessível e deve haver

assentos reservados para pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida e espaços para

cadeiras de rodas, devidamente sinalizados. Deve haver sinalização visual e tátil para

orientação das pessoas. Além disso, deve haver pessoal treinado para atendimento de pessoas

com deficiência auditiva, treinadas em LIBRAS, e equipamentos de assistência.

A circulação interna deve ter largura de acordo com os critérios da Norma Brasileira ABNT

NBR 9050, sendo a largura mínima admissível de 90cm (noventa centímetros), e piso

antiderrapante. As portas internas devem ter vão livre de no mínimo 80cm (oitenta

centímetros) e permitir a aproximação de pessoas em cadeiras de rodas.

De acordo com o art. 26 do Decreto 5296, nas edificações de uso público ou de uso coletivo, é

obrigatória a existência de sinalização visual e tátil para orientação de pessoas com

deficiência auditiva e visual.

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

As rampas, as escadas e os equipamentos de circulação vertical que integrarem a rota

acessível devem atender os critérios das normas técnicas da ABNT.

Nos edifícios de uso público a serem construídos deve haver, no mínimo, uma cabine sanitária

para cada sexo em cada pavimento da edificação; e nos edifícios de uso público já existentes

deve haver, no mínimo, uma cabine por pavimento. Nos edifícios de uso coletivo, deve haver

sanitários acessíveis com onde sanitários públicos.

Os sanitários acessíveis devem sempre ter entrada independente dos demais sanitários

coletivos, de forma a permitir a entrada de acompanhantes, e devem atender todos os critérios

da Norma Brasileira ABNT NBR 9050, quanto a dimensionamento, posição das peças, uso de

barras de apoio, etc. Nas portas dos sanitários deve haver sinalização visual e tátil.

Os cinemas, teatros, auditórios e similares devem possuir, na área destinada ao público,

espaços reservados para pessoas em cadeira de rodas, assentos reservados para pessoas com

deficiência visual, pessoas com mobilidade reduzida e para pessoas obesas. Estes espaços e

assentos devem permitir o assento junto a pelo menos um acompanhante, estarem distribuídos

pelo recinto, em locais de boa visibilidade e próximo dos corredores. Palcos, coxias e

camarins também devem ser acessíveis.

Em locais de exposição todos os elementos expostos para visitação pública devem estar em

locais acessíveis. Os títulos, textos explicativos ou similares devem também estar em Braille.

Deve-se permitir que algumas peças sejam tocadas por pessoas com deficiência visual e

outros mecanismos para que possam ajudá-los a compreender os elementos expostos.

Restaurantes, bares e similares devem possuir mobiliário acessível e cardápio em Braille.

As escolas devem dar condições de acesso e utilização de todos os ambientes, como salas de

aula, bibliotecas, auditórios, ginásios, laboratórios, áreas de lazer e sanitários.

5. Diagnóstico dos problemas de acessibilidade nos imóveis históricos

“A trajetória histórica revela que as pessoas portadoras de deficiência por muito tempo

viveram marginalizadas, sendo vítimas da exclusão proporcionada pela própria

sociedade.”(PEREIRA e LIMA, 2006). Tal fato explica a dificuldade de se promover a

acessibilidade nos bens culturais imóveis, pois estes foram construídos em épocas em que os

valores eram outros e não foram projetados para receber as pessoas com deficiência.

Entretanto, muitos destes imóveis atualmente abrigam atividades abertas ao público, como

museus, teatros, cinemas, centros culturais, e devem ser adaptados para receber as pessoas

com deficiência.

Os principais problemas de acessibilidade encontrados nos bens culturais imóveis vão desde o

espaço urbano em que estão inseridos até questões de sinalização interna.

a) Problemas urbanos:

Muitos centros históricos ou mesmo bens imóveis históricos isolados foram inseridos em

locais de topografia muito acidentada, o que produz vias com inclinação muito alta, onde

muitas vezes há inclusive escadarias.

Os passeios nos centros históricos são geralmente muito estreitos, com meio-fios altos e sem

rebaixo para acesso de pedestres. A pavimentação é feita com material escorregadio e

irregular, muitas vezes com grandes pedras. Além dos passeios serem estreitos, há muitos

obstáculos, como poste, mobiliário urbano e vegetação, sem sinalização tátil de alerta, que

dificultam a circulação e podem causar acidentes em pessoas com deficiência. Também é

comum encontrar desníveis nos passeios causados por degraus e rampas de acesso às

edificações.

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

Faltam locais para travessia e as faixas de pedestres existentes não possuem sinalização

adequada. Os semáforos também não possuem sinais sonoros e o tempo reduzido não permite

travessias seguras.

Não há piso tátil para orientação das pessoas com deficiência visual.

Todos estes problemas dificultam ou impossibilitam o deslocamento das pessoas com

deficiência ou com mobilidade reduzida aos bens culturais imóveis.

b) Problemas no acesso ao edifício:

A maioria dos bens culturais imóveis possui escadas no acesso principal, quase sempre com

piso escorregadio, degraus irregulares e sem corrimãos. A dificuldade de tornar essas entradas

acessíveis está ligada ao fato de que quase sempre não há espaço para instalação de rampas

adequadas ou equipamentos eletromecânicos, além de haver interferência na fachada, o que

muitas vezes não é aprovado pelos órgãos do patrimônio cultural. Em alguns casos onde

foram construídas rampas, estas têm inclinação maior que a recomendada, não atendendo aos

padrões da Norma Brasileira ABNT NBR 9050.

Quando é feito um acesso alternativo acessível, não há sinalização que o indique e este muitas

vezes fica trancado sem comunicação com a recepção.

Também não há piso tátil e sinalização tátil e visual para orientação das pessoas com

deficiência, pois muitas vezes não são permitidas alterações na fachada e no piso devido ao

valor histórico.

Nos estacionamentos não há vagas reservadas para pessoas com deficiência e o percurso até o

imóvel não é acessível.

c) Problemas internos:

Na recepção não há mobiliário de atendimento acessível, os balcões geralmente são altos, o

que não permite a visão do atendente por pessoas em cadeiras de rodas, anões ou crianças, e

não possuem espaço para aproximação. Nas esperas não há locais para cadeiras de rodas e

assentos reservados para pessoas com dificuldade de locomoção e idosos.

Não há pessoal treinado para atendimento de pessoas com deficiência auditiva ou

equipamentos de assistência que possa auxiliá-las. Também não há sinalização tátil para

pessoas com deficiência visual.

As circulações internas às vezes são estreitas e com piso escorregadio, além de possuírem

obstáculos, como mobiliário e vegetação. Dificilmente são encontrados bebedouros e

telefones públicos acessíveis. A maioria das portas também é estreita, e quando possuem duas

folhas somente uma é aberta.

A circulação vertical geralmente é somente por escadas, muitas vezes estreitas, sem corrimãos

e com piso escorregadio. Em alguns casos é muito difícil a instalação de um elevador.

Não há sinalização para pessoas com deficiência visual e auditiva em caso de emergência.

Os sanitários quase sempre são pequenos e em número reduzido, não permitindo o uso por

pessoas em cadeiras de rodas ou mobilidade reduzida. O tamanho dos sanitários muitas vezes

inviabiliza a sua adaptação, sendo necessária a construção de novos sanitários em outro local.

As principais dificuldades em se adaptar os espaços internos aos critérios de acessibilidade

estão relacionadas ao valor histórico atribuído aos pisos e revestimentos de paredes, que

dificultam a instalação de pisos antiderrapantes, rampas, pisos táteis, corrimãos e sinalização

interna.

Os principais problemas de acessibilidade encontrados nos bens culturais imóveis são comuns

também em edificações recentes que foram projetadas sem a preocupação em atender a

legislação e norma vigentes referentes à acessibilidade.

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

Andrade (2009) percebeu através da pesquisa de campo que o indivíduo mais afetado quando

os parâmetros de acessibilidade não são considerados nos diferentes espaços é o cego, seguido

do indivíduo em cadeira de rodas e o indivíduo com muletas.

6. Sugestões de soluções para adaptação dos bens culturais imóveis

Para a implantação de acessibilidade em bens culturais imóveis deve-se conhecer bem o

imóvel, seus, detalhes, suas principais características históricas, inclusive as peculiaridades do

local onde estão inseridos e materiais de maior relevância histórica, para que possam ser

preservados, e também dos principais problemas de acessibilidade.

O Programa Monumenta (2012), sugere que os projetos de intervenção em bens culturais

imóveis devem compreender as seguintes etapas:

- Identificação e conhecimento do bem, que tem o objetivo de conhecer e analisar a edificação

sob aspectos históricos, estéticos, artísticos, formais e técnicos, compreender seu significado

atual e ao longo dos tempos, inclusive sua evolução. Compreende, pesquisa histórica,

levantamento físico, análise tipológica, identificação de matérias e sistemas construtivos e

prospecções, se necessário;

- Diagnóstico, é a etapa de consolidação dos estudos e pesquisas, analisando de forma

detalhada determinados problemas ou interesses específicos de utilização do imóvel.

Compreende o mapeamento dos dados, análise do estado de conservação e dos problemas

encontrados, inclusive de falta de acessibilidade, e outros estudos de acordo com a

intervenção a ser realizada;

- Por fim são apresentadas as propostas de intervenção, divididas em estudo preliminar,

projeto básico e projeto executivo.

De acordo com o que preconiza a Instrução Normativa n.º 1, as adaptações do nos bens

culturais imóveis devem retratar a época em que foram feitas:

As soluções adotadas para a eliminação, redução ou superação de barreiras na

promoção da acessibilidade aos bens culturais imóveis devem compatibilizar-se com

a sua preservação e, em cada caso específico, assegurar condições de acesso, de

trânsito, de orientação e de comunicação, facilitando a utilização desses bens e a

compreensão de seus acervos para todo o público. (IPHAN, 2003)

As soluções de acessibilidade devem ser dadas para cada bem cultural imóvel

individualmente, conforme as peculiaridades de cada um. No entanto a seguir serão

apresentadas algumas sugestões que podem auxiliar na elaboração de projetos de adaptação

destes locais.

a) Vias públicas

Sugere-se que sejam traçadas rotas acessíveis nos centros históricos, integradas com as

paradas de transporte coletivo e estacionamentos, por vias que tenham inclinação máxima de

8,33% (oito vírgula trinta e três por cento). As paradas de transporte coletivo também devem

ser acessíveis e os estacionamentos devem ter vagas reservadas para veículos que transportem

pessoas com deficiência, com sinalização adequada. Onde não houver estacionamentos ou que

seja difícil garantir a rota acessível, pode-se adotar vagas reservadas na via pública próximo

aos imóveis mais importantes.

Devem ser adotados locais de travessia de pedestres seguros e bem sinalizados, através de

rebaixo de meio-fio ou travessia elevada, com semáforos com indicador sonoro e tempo de

travessia compatível com pessoas com mobilidade reduzida.

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

Os passeios na rota acessível devem ter largura mínima de 1,20m (um metro e vinte

centímetros), sendo admissível em casos excepcionais largura mínima de 90cm (noventa

centímetros). Esta faixa de circulação deve ser livre de qualquer obstáculo, com altura inferior

a 2,10m (dois metros e dez centímetros), e ter piso antiderrapante.

Toda a rota acessível deve ter sinalização visual e tátil para orientação de pessoas com

deficiência. Sugere-se o uso de totens e mapa táteis móveis.

Em locais onde os passeios forem muito estreitos e que possuírem piso com valor histórico,

sugere-se que seja impedido o trânsito de veículos nestas vias e que seja feita uma faixa

acessível, com a largura mínima recomendada e atendendo ao todos os demais critérios, e que

sejam preservadas as características históricas no entorno.

Para auxiliar na orientação e percepção dos diferentes espaços, pode-se fazer uso de variedade

visual, tátil, sonora e olfativa, através do uso de diferentes, materiais de revestimento, cores,

texturas e vegetação.

Nos locais onde houver intervenções, como troca de piso e aplicação de piso tátil, estes

devem identificar a época em que foram inseridos, de preferência passíveis de serem

revertidos.

b) Acesso aos edifícios

Deve-se priorizar a adaptação de entrada principal garantindo o mesmo acesso para todos,

através da instalação de rampas ou equipamentos eletromecânicos quando houver desnível.

As rampas podem inclusive ser móveis, desde que atendam a todos os critérios da Norma

Brasileira ABNT NBR 9050 e que esteja no local durante todo o período em que o edifício

estiver em funcionamento.

Quando não for possível adaptar o acesso principal, deve-se garantir um acesso alternativo

acessível para pessoas com deficiência. Esta entrada deve ser de preferência lateral à principal

e com distância máxima de 50m (cinquenta metros), além disso, nunca deve ser usada como

entrada de serviço. A entrada acessível deve ser devidamente sinalizada, estar sempre aberta

ao público e interligada à recepção.

Outra solução para a entrada acessível seria a adoção do novo acesso para todas as pessoas,

garantindo assim um acesso único e a preservação da antiga entrada com todas as

características históricas.

É importante salientar que na entrada acessível mesmo as escadas devem atender aos critérios

da Norma Brasileira ABNT NBR 9050, com corrimãos e piso tátil. No caso de escadas

históricas, caso não haja corrimãos sugere-se que estes sejam instalados no piso ou na

alvenaria que tiver menor valor histórico, e no caso de piso com valor histórico que o piso

tátil tenha menor interferência visual, de preferência adesivo ou colado.

Para garantir a adequada sinalização pode-se adotar totens móveis, com informação visual e

tátil, e uso de placas discretas, com pouca interferência visual nas fachadas. A sinalização,

assim como todas as demais intervenções, devem ter as características da época em que foram

inseridas.

c) Espaço interno

A acessibilidade no espaço interno dos bens culturais imóveis deve iniciar-se nos locais de

recepção e espera, que devem dispor de balcões de atendimento e bilheterias acessíveis. No

caso do balcão de valor histórico, sugere-se a adoção de um mobiliário lateral onde possa ser

feito o atendimento de pessoas com deficiência. Nos locais de espera deve haver espaço

reservado para cadeira de rodas e assentos para pessoas com deficiência e mobilidade

reduzida. Para o atendimento de pessoas com deficiência auditiva, deve haver pessoal

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

treinado em LIBRAS e equipamento de tecnologia assistida. Placas e informativos devem ser

disponibilizados também em Braille.

Nos corredores internos e espaço de circulação das salas, sugere-se adoção de rampas móveis

para vencer o desnível, de forma a não modificar o piso original. Os obstáculos existentes nas

áreas de circulação devem ser retirados, garantindo largura mínima de 90cm (noventa

centímetros) e as portas de duas folhas devem ser mantidas abertas, a fim de permitir a

passagem de pessoas em cadeiras de rodas.

Para garantir a circulação vertical acessível, sugere-se a instalação de equipamento

eletromecânico, nos locais onde a interferência no valor histórico do bem seja menor. Caso

seja um bem que o maior valor esteja no volume arquitetônico ou nas fachadas, o

equipamento deve ser instalado em algum cômodo interno, para que não haja alteração do

volume. Se o maior valor esteja na fachada frontal ou nas características internas, o

equipamento pode ser instalado externamente, na fachada de menor valor.

No caso de adequação de escadas, deve-se garantir que ao menos uma atenda aos critérios da

Norma Brasileira ABNT NBR 9050. Sugere-se que sejam preservadas as escadas principais

com valor histórico e sejam adequadas escadas secundárias, com dimensões adequadas, piso

antiderrapante, corrimãos, piso tátil e sinalização visual dos degraus.

Em piso de valor histórico, sugere-se o uso de piso tátil sem contraste visual, para não haver

muito destaque, e que seja reversível.

Na instalação da sinalização interna, sugere-se que seja instalado no local de menor valor

histórico, ou seja nas paredes, forro ou no piso, através de totens.

Deve-se garantir pelo menos, um sanitário que atenda à Norma Brasileira ABNT NBR 9050 e

um bebedouro acessível.

É importante também que os profissionais que irão fazer os projetos de acessibilidade

conheçam as limitações e dificuldades de cada tipo de deficiência, de forma estas possam

propor soluções que realmente irão auxiliar quem necessite. “Para a aplicação da norma, é

preciso que se tenha um profundo conhecimento das limitações advindas das diferentes

deficiências que podem atingir as pessoas para, então, poder definir soluções que as auxiliem

e, ao mesmo tempo, não alterem a arquitetura.”(ANDRADE, 2009:151)

7. Conclusão

É importante garantir que a população como um todo, inclusive as pessoas com deficiência,

tenham acesso aos bens culturais imóveis e a possibilidade de uso pleno desses espaços, para

que possam conhecê-lo e valorizá-lo. Dessa forma, a população irá colaborar com a

preservação e proteção destes bens, afinal se um bem cultural deixar de ter significado para a

comunidade dificilmente será preservado.

A preservação dos bens culturais é de extrema importância para a história e a cultura da

população das gerações presente e futuras, no entanto deve-se prever a compatibilização dos

dois temas para que todos tenham acesso e esses bens. Assim, será possível garantir a

igualdade das pessoas com deficiência e das gerações futuras de apreciarem os bens imóveis

de valor histórico e cultural.

A grande dificuldade de tornar os bens culturais imóveis acessíveis é que estes foram

construídos em épocas que as pessoas com deficiência eram muito descriminadas e não

tinham acesso a estes espaços. Além disso, atualmente existem as leis de preservação e

proteção do patrimônio cultural, que não permitem alterações nos imóveis, dificultando a

aplicação da legislação de acessibilidade e da Norma Brasileira ABNT NBR 9050.

Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

Existem várias leis e normas para implantação da acessibilidade, no entanto há poucos

estudos e pouco conhecimento sobre a sua aplicação em bens culturais imóveis. A Instrução

Normativa n.o 1 do IPHAN foi um avanço e mostra que há uma preocupação do Poder Público

com o tema, no entanto não apresenta soluções ou mesmo diretrizes de projeto. A Norma

Brasileira ABNT NBR 9050, serve como base para os projetos, porém também não apresenta

soluções para implantação da acessibilidade em bens culturais imóveis.

Os projetos de acessibilidade em bens culturais imóveis devem resultar de uma abordagem

global do mesmo, prevendo intervenções que garantam às pessoas com deficiência ou com

mobilidade reduzida a possibilidade de acesso ao interior do imóvel, orientação espacial,

comunicação, deslocamento e uso. Muitas vezes são implantadas soluções isoladas que não

garantem a acessibilidade completa aos imóveis.

Para promoção da acessibilidade aos bens culturais imóveis devem ser consideradas as

peculiaridades de cada bem, inclusive as características da região em que estão inseridos,

evitando a descaracterização dos ambientes construídos, e garantindo a preservação dos

valores históricos e culturais mais relevantes por meio de estudos específicos para cada caso.

A análise das soluções para cada caso deve acontecer mais de uma vez e com frequência,

visto que podem surgir novas tecnologias que possibilitarão a eliminação de certas barreiras

que não foram resolvidas numa primeira análise.

As intervenções que se realizarem em um bem cultural imóvel devem ser feitas de forma

harmônica com as características originais, no entanto devem retratar a época em que foram

inseridas, permitindo a compreensão dos significados adquiridos ao longo do tempo.

Entretanto, percebe-se que mais o mais importante para a aplicação da Norma Brasileira

ABNT NBR 9050 é a conscientização da população e do Poder Público da importância de

garantir às pessoas com deficiência o acesso aos bens culturais imóveis. Além disso,

profissionais envolvidos na elaboração de projetos de acessibilidade e os profissionais ligados

à preservação do patrimônio cultural devem conhecer as limitações e dificuldades que cada

tipo de deficiência pode causar nas pessoas, para que possam propor soluções adequadas.

As diretrizes propostas neste artigo foram elaboradas com base na legislação vigente e na

Norma Brasileira ABNT NBR 9050, e visam colaborar com os profissionais na elaboração de

projetos de acessibilidade em bens culturais imóveis.

Referências

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partir do estudo da arquitetura eclética em Pelotas – RS. Dissertação de Mestrado

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Acessibilidade aos bens culturais imóveis janeiro/2013

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histórico e artístico nacional.

BRASIL. Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Estabelece normas gerais e critérios

básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com

mobilidade reduzida.

BRASIL. Decreto 5296, de 2 de dezembro de 2004. Regulamenta as Leis 10048, de 8 de

novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, e 10098, de

19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da

acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras

providências.

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