abordagem sistÊmica e funcionalista – visÃo dinÂmica dentro do sistema

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1 PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DINTER UNESP/Instituto Federal do Ceará Campus de Fortaleza Disciplina: Metodologia da Pesquisa: abordagens quantitativas e qualitativas Docente responsável: Profa. Dra. Neusa Maria Dal Ri Doutorandos: FRANCISCO GLAUCO GOMES BASTOS ELISÂNGELA FERREIRA FLORO MARIA MADALENA DA SILVA DEMO, Pedro. Metodologia científica em ciências sociais. 3.ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas,1995 Capítulo 8 ABORDAGEM SISTÊMICA E FUNCIONALISTA VISÃO DINÂMICA DENTRO DO SISTEMA. p.p. 203 a 228 Neste capítulo ABORDAGEM SISTÊMICA E FUNCIONALISTA VISÃO DINÂMICA DENTRO DO SISTEMA” – Demo (1941 - ) procura dar mais importância à questão do sistemismo, uma vez que o considera mais importante dentro do quadro apresentado. No que tange ao funcionalismo, o autor se propõe a oferecer apenas um tratamento seletivo no plano da aproximação entre Parsons e Freud(p. 203) 1 . Segundo Demo, há certa semelhança entre sistemismo e funcionalismo. Para ele o sistemismo continua o espírito do funcionalismo. Ainda que o sistemismo se encerre no horizonte do sistema, tenta permanecer com a mesma dinamicidade do funcionalismo. É certo que as bases que dão ao originalidade ao sistemismo fundamentam-se na teoria da informação, da cibernética e de sua utilidade administrativa. 8.1 O PONTO DE VISTA DO SISTEMA De acordo com Pedro Demo, há um certo parentesco entre sistemismo e estruturalismo, uma vez que há uma aproximação entre o conceito de sistema e a definição de estrutura, numa perspectiva estruturalista. O autor recorre a Lévi-Strauss (1908-2009) para justificar sua afirmação, uma vez que uma estrutura é constituída por elementos que, se modificados, provocarão mudanças nos demais, o que dá a ela (estrutura) um caráter de sistema; há de se considerar também que “todo modelo pertence a um grupo de transformações(p. 203), sendo que cada uma das transformações pertence a um modelo da mesma família, de forma que o conjunto de transformações constitui um grupo de modelos; em razão do exposto, a reação do 1 Todas as citações desta resenha são extraídas do Capítulo 8 ABORDAGEM SISTÊMICA E FUNCIONALISTA VISÃO DINÂMICA DENTRO DO SISTEMA. p.p. 203 a 228. In: DEMO, Pedro. Metodologia científica em ciências sociais. 3.ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas,1995. Por isso convencionamos indicar apenas as páginas em que se encontram as citações.

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Page 1: ABORDAGEM SISTÊMICA E FUNCIONALISTA – VISÃO DINÂMICA DENTRO DO SISTEMA

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

DINTER – UNESP/Instituto Federal do Ceará – Campus de Fortaleza

Disciplina: Metodologia da Pesquisa: abordagens quantitativas e qualitativas

Docente responsável: Profa. Dra. Neusa Maria Dal Ri

Doutorandos: FRANCISCO GLAUCO GOMES BASTOS

ELISÂNGELA FERREIRA FLORO

MARIA MADALENA DA SILVA

DEMO, Pedro. Metodologia científica em ciências sociais. 3.ed. rev. e ampl. – São

Paulo: Atlas,1995

Capítulo 8 – ABORDAGEM SISTÊMICA E FUNCIONALISTA – VISÃO

DINÂMICA DENTRO DO SISTEMA. p.p. 203 a 228

Neste capítulo – “ABORDAGEM SISTÊMICA E FUNCIONALISTA – VISÃO

DINÂMICA DENTRO DO SISTEMA” – Demo (1941 - ) procura dar mais importância

à questão do sistemismo, uma vez que o considera mais importante dentro do quadro

apresentado. No que tange ao funcionalismo, o autor se propõe a oferecer apenas um

“tratamento seletivo no plano da aproximação entre Parsons e Freud”(p. 203)1.

Segundo Demo, há certa semelhança entre sistemismo e funcionalismo. Para ele

o sistemismo continua o espírito do funcionalismo. Ainda que o sistemismo se encerre

no horizonte do sistema, tenta permanecer com a mesma dinamicidade do

funcionalismo. É certo que as bases que dão ao originalidade ao sistemismo

fundamentam-se na teoria da informação, da cibernética e de sua utilidade

administrativa.

8.1 O PONTO DE VISTA DO SISTEMA

De acordo com Pedro Demo, há um certo parentesco entre sistemismo e

estruturalismo, uma vez que há uma aproximação entre o conceito de sistema e a

definição de estrutura, numa perspectiva estruturalista. O autor recorre a Lévi-Strauss

(1908-2009) para justificar sua afirmação, uma vez que uma estrutura é constituída por

elementos que, se modificados, provocarão mudanças nos demais, o que dá a ela

(estrutura) um caráter de sistema; há de se considerar também que “todo modelo

pertence a um grupo de transformações”(p. 203), sendo que cada uma das

transformações pertence a um modelo da mesma família, de forma que o conjunto de

transformações constitui um grupo de modelos; em razão do exposto, a reação do

1 Todas as citações desta resenha são extraídas do Capítulo 8 – ABORDAGEM SISTÊMICA E

FUNCIONALISTA – VISÃO DINÂMICA DENTRO DO SISTEMA. p.p. 203 a 228. In: DEMO, Pedro. Metodologia científica em ciências sociais. 3.ed. rev. e ampl. – São Paulo: Atlas,1995. Por isso convencionamos indicar apenas as páginas em que se encontram as citações.

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modelo passa a ser previsível, caso um de seus elementos sofra alguma modificação, o

que exige que o modelo, ao ser construído, possa, em seu funcionamento, explicar todos

os fatos observados.

Para Mattoso Câmara (1904 – 1970) , no entanto, há uma distinção entre sistema

e estrutura. Para ele, a estrutura é condição prévia e necessária para a existência do

sistema, uma vez que o sistema pode ser definido como “uma estrutura de partes

satisfatoriamente distribuídas, que se associam e completam.(p. 204)”

Costa Lima (1937 - ), por sua vez, considera que no conceito de estrutura existe

uma ideia de totalidade e outra de interdependência entre os átomos que a constituem.

Nesse sentido, a estrutura, ainda que tenha do sistema o elemento formal da inter-

relação das partes, não se restringe a uma miniatura do sistema.

Buckley (1922-2006) define sistema “como um complexo de elementos ou

componentes direta ou indiretamente relacionados numa rede causal, de sorte que cada

componente se relaciona pelo menos com alguns outros, de modo mais ou menos

estável, dentro de determinado período de tempo.(p. 205)”

Podemos, então, conceber, dentro de uma visão sistêmica, que todo sistema pode

ser considerado um subsistema e que não existe um fim entre os seus limites, uma vez

que um mesmo elemento pode participar de vários sistemas simultaneamente. Nesse

sentido, não se pode conceber o sistema ( o todo) como a mera soma de partes, mas, na

verdade, o que se deve considerar é o modo como o todo organiza as partes. É a forma

peculiar de organização das partes pelo todo que caracterizará determinado sistema.

8.2 O FENÔMENO CIBERNÉTICO

Visto como um fenômeno cibernético pode-se dizer que sistema é auto-

regulação. Extrapolando a ideia de que sistema seria a inter-relação das partes e sua

organização no todo, a auto-regulação seria uma condição sine qua non para a

existência de um sistema.

Nessa perspectiva, define-se o elemento da informação como tudo que atinge um

sistema e pede resposta. Pressupondo que o sistema responde adequadamente e nisto se

regula, chegou-se ao conceito de realimentação sistêmica, ou seja, a capacidade que o

sistema tem de absorver informação e de responder a ela. A realimentação sistêmica,

considerada como a alma da auto-regulação, passa a ser o ponto essencial da definição

de sistema.

Demo acrescenta que

“A cibernética levou à constatação de que o sistema é propriedade de toda

organização, física ou humana. A definição de sistema não se atém mais apenas

ao fenômeno da inter-relação das partes e de sua organização interna, mas

centra-se sobretudo no discernimento da propriedade da organização auto-

suficiente, com regulação própria. A retroalimentação do sistema é que o faz

sistêmica, ou seja, que o torna um todo, dá-lhe contorno delineável e explica

sua razão de persistência. E a recíproca: um sistema não persiste se já não tem

condições de se retroalimentar.” (p. 208)

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Infere-se, pois, que o ciclo sistêmico deve apresentar as seguintes etapas: input,

conversão, output e feedback.

Input seria a informação captada, tudo aquilo que entra no sistema; conversão é

a propriedade responsável por perfazer o caminho entre o que entra e o que sai, cabendo

a ela não somente a captação da informação, mas também a capacidade de elaborar uma

respostapara a informação; output seria a resposta já elaborada; por fim, o feedback, ou

retroalimentação, responsabiliza-se por descrever a propriedade central do sistema.

8.3 ESPERANÇA NA UNIDADE DAS CIÊNCIAS

O sistemismo, da mesma forma que todas as outras metodologias, por acreditar

na unidade das ciências, busca ser um instrumento universal de explicação. Nesse

sentido, o austríaco Bertalanffy (1901 – 1972), criador da teoria geral dos sistemas,

apresenta como pontos de fundamentação possível do isomorfismo científico os

seguintes: os esquemas intelectuais, os quais, por revelarem em princípio número

restrito, são captáveis por leis do pensamento; a estrutura da realidade, a qual, por sua

natureza, permite a aplicação dos seus conceitos2 ; por fim, teríamos a descoberta de que

o isomorfismo, ainda que também encontrado em outros domínios, tem por base a

existência de princípios gerais dos sistemas.

8.4 ACENTUAÇÃO DO ASPECTO RELACIONAL

O sistemismo tem, porém, recebido críticas principalmente no que concerne ao

seu aspecto relacional. Para alguns teóricos, o método sistêmico recai numa perspectiva

estruturalista quando deixa de estudar as coisas, para se deter nas relações existentes

entre elas. Nesse sentido, a ideia de isomorfismo traria inerente uma visão reducionista,

uma vez que tranformaria o hoem apenas em variáveis incapazes de estabelecer

horizontes éticos. O homem seria reduzido a peça natural, a qual deveria receber

tratamento natural.

Apesar das críticas ao sistemismo, não podemos deixar de considerar que,

enquanto o estruturalismo dá ênfase ao fenômeno da troca e da comunição, o

sistemismo enfoca o fenômeno da organização. Nesse sentido, as ciências sociais

souberam tirar proveito da teoria geral dos sistemas, uma vez que seu objeto de estudo

tem sido os grupos ou sistemas humanos em sua forma de se organizar.

Ainda que na raiz do sistemismo se encontra o funcionalismo, vale ressaltar que

o sistemismo procura enquadrar o dinamismo da sociedade como fenômeno relevante, o

que o torna uma renovação metodológica essencial.

Cabe aqui uma distinção da visão de conflito entre o funcionalismo, o

sistemismo e o método diáletico. Para os funcionalistas, o conflito é uma mera

disfunção; para os sistemistas, o conflito se encontraria dentro do próprio conceito de

2 Bertalanffy defende a ideia de que todas as leis científicas represantam tão somente idealizações e

abstrações capazes de exprimir certos aspectos da realidade. Para ele, como qualquer construção conceitual se relaciona com certos aspectos de ordem na realidade, a ciência, qualquer que seja ela, significa a imagem esquematizada da realidade.

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sistema, uma vez que se movimentaria para dentro, considerado como todo dinâmico, e

para fora, no relacionamento problemático com a ambiência; já para os dialéticos, todo

conflito é antagônico, fato que não ocorre obrigatoriamente no sistemismo.

8.5 CIRCULARIDADE SISTÊMICA

Outra característica que vem a diferenciar o sistemismo do método dialético é a

circularidade sistêmica, a qual se funda no processo de retroalimentação, religando o

output ao input.

Para a dialética as mudanças acontecem não somente dentro do sistema, mas do

sistema em si. Os sistemistas não concebem que o sistema consiga dar conta de

superações históricas. Para eles, seria a incapacidade conversão de novas informações e

a queda de retroalimentação o suficiente para se decretar o fim de um sistema.

No que diz respeito à transição de um sistema para outro, pode-se dizer que os

sistemas, vistos de maneira isolada, são caracterizados, como sugere Gaboriau, mais

pela resistência à mudança que pelo dinamismo. Nesse sentido, recorremos a Ricoeur ao

afirmar que existe uma inversão das relações entre o sistema e a história. Segundo ele,

no historicismo, compreender seria encontrar a gênese, a forma anterior, as fontes, o

sentido da evolução; já com o estruturalismo, o que seria inicialmente inteligíveis

seriam os arranjos, as organizações sistemáticas num estado dado.

O sistema das diferenças surgiria, pois, apenas sobre um eixo das coexistências,

o qual é totalmente diferenciado do eixo das sucessões. Nessa perspectiva, a história

estaria em segundo plano, sendo importante apenas como alteração do sistema, uma vez

que se defende a ideia de repetição cíclica dos fenômenos. Nesse sentido, Bertalanffy

afirma que “(...) o processo histórico não é completamente acidental, mas obedece a

regularidades ou leis que podem ser determinadas.””Trata-se, pois, de descobrir

regularidades da história ainda que as grandes teorias sejam “modelos muito

imperfeitos”.”(p. 217)

Desse ponto de vista, poder-se-ia afirmar que não seria possível introduzir o

novo na história, uma vez que ela seria uma espécie de reino de regularidades cíclicas.

Apesar de, nessa perspectiva, a história ter apenas um sentido explicativo secundário, é

possível perceber nela (na perspectiva sistêmica) mais dinamismo que o estruturalismo

e o funcionalismo, a partir dos conceitos básicos de contigência, coerções e graus de

liberdade. Esses conceitos nos remetem naturalmente à ideia de sistema aberto.

Para Demo, o que singulariza o sistemismo, diferenciando-o do funcionalismo, é

a sua capacidade de explicar como os sistemas se mantêm, como resistem às mudanças.

8.6 APLICAÇÃO À POLÍTICA

Para Demo, o poder, visto de cima para baixo, é totalmente sistêmico, uma vez

que não admite conflitos insuperáveis, luta para se institucionalizar e considera-se

sempre administrável.

No que concerne à política social, é evidente a forma de organização do sistema

no intuito de manter o controle social. Nessa organicidade que coloca todo o

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conhecimento a serviço dos donos do poder para manter o sistema em funcioamento é

que reposaria a utilidade das ciências sociais.

8.7 ELEMENTOS DO FUNCIONALISMO DE PARSONS

Talcott Edgar Frederick Parsons (1902 – 1979) é um sociólogo funcionalista

norte-americano que recebeu influências de Pareto, Durkheim, Weber e Freud, além dos

teóricos da escola inglesa de Malinowski, Radcliffe-Brouwn, Evans Pritchard e Leach.

8.7.1 Sistema social e personalidade

Para Parsons existem quatro dimensões totalizantes da realidade que interagem

mutuamente: o sistema social, o sistema de valores, o organismo humano e a

personalidade individual.

Segundo Demo, na visão de Parsons,

“Somente o sistema social e o de personalidade são sistemas de ação

propriamente ditos. O organismo é o pressuposto fisiológico. O sistema

cultural compõe-se de valores, normas e símbolos que orientam as

possibilidades de escolha do agente e delimitam seus tipos de interação. O

sistema social é composto de agentes, que têm sua ação social orientada

segundo outros agentes, dentro de um quadro relativamente consensual de fins

coletivos. O sistema da personalidade é centrado sobre o agente individual, que

tende a satisfazer suas necessidades e a adotar comportamento compatível

dentro da sociedade.” (p. 222)

Parsons recorre, então, ao conceito freudiano de socialização para justificar a

relação existente entre o sistema social e o da personalidade. Nesse sentido, considera-

se que a ação dos agentes sobre os novos agentes, a fim de que estes assumam os

mesmos padrões sociais de ação seria a própria fonte da funcionalidade.