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Page 1: A trajetória da educação especial na Rede Municipal de Ensino de

A EDUCAÇÃO ESPECIAL NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE CAMPO

GRANDE – MS: UM ESBOÇO DE POLÍTICA PÚBLICA EM TEMPOS DE

‘INCLUSÃO ESCOLAR’

Celi Corrêa Neres ([email protected])1

Nesdete Mesquita Corrêa ([email protected])2

1. Introdução

Embora a educação especial esteja presente na constituição da história do estado de Mato

Grosso do Sul, desde a sua criação no final da década de 19703, as pesquisas publicadas na área que

retratam a educação especial em Campo Grande, capital do referido estado (DAL MORO, 1993;

NERES, 1999; FONSECA, 2003; OLIVEIRA, 2004; MUNIZ, 2006; SANTOS-BENATTI, 2008), além

de escassas, não focalizam como objeto de estudo a educação especial no âmbito do sistema municipal

de ensino, em Campo Grande – MS.

Portanto, é nessa direção que apresentamos este texto frente ao desafio de apreendermos os

marcos da história da educação em Campo Grande, sobretudo, da educação especial no percurso da sua

trajetória, da sua implantação aos dias atuais.

Diante disso, este estudo tem como objetivo registrar a trajetória da educação especial no

referido município, oferecendo uma contribuição para o estudo e a difusão do conhecimento sobre a

política local de educação especial, inserida no movimento de ‘inclusão escolar’ em nosso país.

Para tanto, recorreu-se à releitura de dois relatórios de pesquisa (CORRÊA, 2005; NERES,

2009) que se debruçaram sobre o registro da história da educação especial na Rede Municipal de

Ensino de Campo Grande, tendo como fontes: documentos, entrevistas com pessoas que participaram

da implantação dos serviços de educação especial no município e no estado de Mato Grosso do Sul e,

coleta de informações na Secretaria Municipal de Educação. Buscou-se na articulação com a política

nacional da educação especial, analisar o processo da implantação e o oferecimento dos serviços da 1Mestre em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Doutoranda do Programa de Pós-Graduação da Universidade de São Paulo (USP). Professora da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), Pólo de Campo Grande – MS.2 Mestre em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGEdu/CCHS/UFMS, da Linha de Pesquisa “Estado e Políticas Públicas de Educação” . Professora da UFMS, Câmpus de Aquidauana – MS (CPAQ).3 O estado de Mato Grosso do Sul foi criado pela Lei Complementar n. 31, em 11 de outubro de 1977, e instalado em 1º de janeiro de 1979 (ANACHE, 1994).

Page 2: A trajetória da educação especial na Rede Municipal de Ensino de

educação especial para os alunos com deficiência, matriculados na educação básica do sistema

municipal de ensino.

2. A educação especial na Rede Municipal de Ensino de Campo Grande: recortes de uma história

A pesquisa recentemente realizada sobre a municipalização da educação especial em Campo

Grande, desenvolvida por Corrêa (2005)4, aponta que desde a década de 1930, existem publicações de

informativos5 da cidade de Campo Grande com dados sobre a atuação do poder público municipal no

oferecimento da educação, seja nas escolas municipais, seja nas escolas subvencionadas pela prefeitura.

A autora assinalou que de acordo com Enciso (2003, p. 35), em 1948, criou-se a Seção de

Educação e Assistência Educacional de Campo Grande, passando a funcionar o primeiro setor da

Prefeitura Municipal para tratar dos assuntos referentes à educação. Como apresenta o documento da

Secretaria Municipal de Educação – Alternativa Curricular6, com a Lei n. 663, de 1959, foi criada a

Secretaria de Educação e Saúde do município de Campo Grande, no então Estado de Mato Grosso, à

qual competia planejar e executar os serviços municipais de educação e cultura, saúde e assistência

social. Em 1964, a Lei n. 896 altera a Lei n. 663/1959 e define as atribuições da Secretaria de Educação

e Cultura (Semec), que tinha como competência a coordenação da Rede Escolar mediante a lotação de

funcionários e da assistência material às escolas.

Os dados e análise apresentados no referido documento indicam que embora o cenário nacional

da história da educação no período de criação das escolas municipais apresentasse um movimento em

favor de uma escola nova, a educação no município de Campo Grande, de 1934 a 1969, foi marcada

pelo pensamento pedagógico liberal tradicional.

Com base no documento apontado anteriormente, constata-se que, em 1970, a estrutura da

Semec foi revista com a implantação de serviços de coordenação das ações educativas das escolas

municipais. Assim, na década de 1970, a Semec é marcada pela implantação da Supervisão Escolar

(1971), sob o título de Orientação Pedagógica, porém, devido ao seu caráter fiscalizador, segundo a

4 CORRÊA, Nesdete Mesquita. A construção do processo de municipalização da educação especial em Campo Grande no período de 1996 a 2004. 134 p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, UFMS. Campo Grande, 2005.5 Anuário de Campo Grande, maio de 1930, p. 72-73, 80. Folha da Serra. Revista mensal ilustrada. Campo Grande, 26 de agosto de 1936, p. s.n. Revista Mensal Éco. Ano I, n. 2-3, maio de 1939, Campo Grande, p. 6. 6 Elaborada pelo Laboratório de Currículo da Secretaria Municipal de Educação de Campo Grande, 1992.

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Page 3: A trajetória da educação especial na Rede Municipal de Ensino de

Alternativa Curricular, culminou com a resistência dos professores, tornando-se uma tentativa

frustrada.

Nesse contexto, com a aprovação da Lei n. 5.692/1971, passam a ser exigências a formação

pedagógica do diretor escolar, a expansão do ginásio e a criação de colégios para o segundo grau, além

de cada sistema de ensino ter de elaborar o seu regimento. Visando atender tal dispositivo legal, foi

normatizada pelo Secretário Municipal de Educação e Cultura, a Portaria n. 01, de 22/04/1974, que

estabelece o Grupo de Trabalho da Semec com a nomeação de sete professores que exerciam a função

de diretores de escolas, com o objetivo de assessorar a Secretaria de Educação na elaboração do

regimento interno.

Desse modo, em 1973, é elaborado o primeiro regimento interno unificado das escolas

municipais que passam a ser denominadas de Rede Municipal de Ensino (Reme), ocasião em que

ocorreu a expansão do primeiro grau nas escolas municipais. Em 1975, a supervisão escolar foi

retomada, a princípio apenas no órgão central, sendo que, a partir de 1980, passa a compor as funções

do quadro de profissionais das escolas da Reme.

Segundo Bittar e Ferreira (1999, p. 190), em 1977, quando o estado de Mato Grosso foi

dividido e Campo Grande elevada à capital do novo estado de Mato Grosso do Sul, o prefeito em

exercício “[...] declarava que a cidade estava bem assistida de escolas: eram cerca de 20 mil alunos e

800 professores vinculados ao poder municipal”. Para os autores, ao que tudo indica, o fato de Campo

Grande ter ocupado a posição de centro político do sul do estado e ao se tornar ao mesmo tempo

“capital econômica”, tenha impulsionado a construção de uma rede de escolas municipais.

Para Bittar e Ferreira (1999, p. 191), nos anos 1970, “[...] enquanto a maioria das capitais

brasileiras não se incumbia de oferecer ensino fundamental, deixando-o a cargo do governo estadual,

Campo Grande vinha mantendo as suas escolas de oito anos obrigatórios antes de se tornar capital”.

Frente ao exposto, podemos observar que ao longo dos anos uma das características da Reme é a oferta

do ensino fundamental, adiantando-se em relação à política de municipalização do ensino implantada

nos anos 1990.

Anteriormente, o então estado de Mato Grosso passava por dificuldades de investimento na

educação. Em 1979, dois anos após a criação do estado de Mato Grosso do Sul e Campo Grande já se

configurando como capital, a situação financeira para a educação era difícil, não se diferenciando da

conjuntura anterior ainda no antigo estado do Mato Grosso. Nesse ano houve modificação na estrutura

da Secretaria Municipal de Educação e Cultura com a criação do Departamento de Educação, ao qual

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estavam subordinadas as Divisões de Ensino, Cultura, Educação Física e Desportos e Serviços Gerais.

A Divisão de Ensino abrangia os Serviços de Supervisão Escolar, Inspeção Escolar, Orientação

Educacional e de Pessoal e Caixa Escolar. É importante ressaltar que antes da criação dos serviços de

supervisão escolar e orientação educacional nas escolas da Rede Municipal de Ensino, esses serviços

funcionavam no órgão central e atendiam às unidades escolares em forma de apoio itinerante.

Como já abordado por Corrêa (id.), a Reme destaca-se desde o princípio do seu funcionamento

pela oferta do ensino de primeiro grau. Entretanto, em meados de 1979 e início de 1980, iniciou-se a

implantação das primeiras salas de pré-escola em algumas escolas novas, onde era possível fazer

adaptação do prédio, dentre elas: Escola Municipal Frederico Soares, Escola Municipal Pe. Heitor

Castoldi e Escola Municipal Prof. Múcio Teixeira Júnior.

A Deliberação do Conselho Estadual de Educação n. 723, de 14/06/1984, aprovou o

Regimento Escolar Padrão para as escolas urbanas da Rede Municipal de Ensino de Campo Grande.

Nesse período, iniciava-se o trabalho de estagiários de Psicologia na Escola Municipal Frederico

Soares, visando diagnosticar as dificuldades de aprendizagem apresentadas pelos alunos, sob a

responsabilidade do Serviço Social Escolar, pertencente à Divisão de Serviços Gerais da Semec. Além

desse setor, existia também o Serviço de Apoio ao Estudante cuja principal função era a distribuição de

merenda nas escolas, principalmente na zona rural. O apoio desse setor naquele período se restringia

apenas a oferecer o complemento da alimentação para os alunos nas escolas.

A partir do desenvolvimento de um novo trabalho do Serviço Social Escolar, voltado ao

atendimento das necessidades dos alunos, na época, composto por técnicos da Secretaria de Educação,

dentre eles alguns egressos da Secretaria de Bem-Estar Social (Sebem), houve uma visão mais ampla

do Serviço de Apoio ao Estudante:

[...] não era mais merenda, era assistência ao escolar, [...] problema de aprendizagem de aluno, principalmente de estupro, de violência sexual, [...] doença, morte [...] aluno morria demais [...] veio para superar a visão anterior [...] passou a fazer a assistência escolar de verdade, [...] veio para renovar [...] uma assistência social do estudante muito voltada para o aluno [...], então viu uma outra visão do Serviço Social. (Depoimento da técnica 1, da Semed, em 22/6/2004, In: CORRÊA, 2005, p.72).

Com o desmembramento da Secretaria Municipal de Educação e Cultura, os Decretos n. 5192

e n. 5193, de 4/6/1985, aprovaram os regimentos da Secretaria Municipal de Educação e da Secretaria

Municipal da Cultura e do Esporte, estabelecendo seus respectivos organogramas. A partir de então, a

Secretaria Municipal de Educação passou a ser denominada Semed, e novos serviços e competências

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foram atribuídos aos seus diversos setores. Dentre eles, é de fundamental importância fazer referência à

Coordenadoria de Apoio ao Estudante (CAE), que anos depois culminou na implantação das atividades

da educação especial na Rede Municipal de Ensino de Campo Grande.

Mesmo com a reestruturação da Secretaria de Educação, as atividades de apoio ao estudante,

agora sob a responsabilidade da CAE, permaneceram desvinculadas das atividades pedagógicas, não

relacionando as necessidades apresentadas no desenvolvimento do aluno com a construção do

conhecimento acadêmico.

Os registros apresentados pela pesquisa realizada por Corrêa (2005) indicam que a educação

especial na Rede Municipal de Ensino de Campo Grande (REME) teve início no final da década de

1970, na forma de atendimento itinerante às escolas, como parte integrante do Serviço de Apoio ao

Estudante. Este serviço, mais tarde, em 1985, passou a ser denominado de Coordenadoria de Apoio ao

Estudante – CAE.

A iniciativa de se constituir a educação especial na Rede Municipal de Ensino deu-se em

função da necessidade de intervenção da Secretaria Municipal de Educação (SEMED) frente às

dificuldades de aprendizagem encontradas e do grande número de evasão e repetência, na primeira

série, em algumas escolas. Isso evidencia a preocupação com o fracasso escolar e a educação especial,

na sua trajetória, tem sido requisitada como medida para correção das dificuldades de aprendizagem,

que na maioria das vezes, é imputada à criança.

Assim, em 1985, foi implantado um projeto de educação especial em três escolas que

apresentavam elevado índice de evasão escolar e repetência e nelas houve a abertura das denominadas

classes de recursos. Tal serviço visava corrigir distorções na etapa da alfabetização. Corrêa (2005, p.75)

relata que o município não tinha autonomia financeira para gerir os serviços da educação especial e que

o estado era o “representante da educação especial.” Entretanto, a educação especial ainda era pouco

estruturada na Secretaria Estadual de Educação, que contava com o apoio das instituições

especializadas como a APAE.

Quanto ao serviço realizado pelas classes de recursos e sua diferença em relação aos serviços

oferecidos pela Secretaria Estadual de Educação, Corrêa (2005) afirma que:

[...] a diferença entre os trabalhos desenvolvidos pelo apoio pedagógico era que nas classes de recursos ficavam as crianças que tinham sido diagnosticadas por serem trabalhadas com metodologia inadequada, porém que tinham potencial para aprendizagem. E, para as classes da educação especial do Estado ficavam as crianças que tinham “patologias orgânicas”.(CORRÊA, 2005, p.76, grifo da autora).

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Page 6: A trajetória da educação especial na Rede Municipal de Ensino de

As crianças da REME que apresentavam deficiências mais graves eram encaminhadas para as

instituições especializadas ou para os serviços especializados oferecidos pela Rede Estadual de

Educação.

Em 1986, a equipe da CAE foi ampliada, devido ao resultado positivo das atividades

desenvolvidas pelas classes de recursos e também devido à necessidade de investir na preparação dos

professores de outras etapas de ensino para o trabalho com alunos que apresentavam dificuldades de

aprendizagem. A equipe fazia o trabalho de acompanhamento dos alunos nas escolas e era composta por

psicólogos e assistentes sociais. Do final de 1987 ao início de 1988, as classes de recursos foram

extintas e criado o Serviço da Equipe Multiprofissional. (CORRÊA, 2005, p. 79).

A equipe multiprofissional era composta por assistente social, psicólogo, fonoaudiólogo,

fisioterapeuta, professora especializada em deficiência visual e orientador educacional. Essa equipe era

responsável pelo atendimento das crianças que apresentavam “aprendizagem lenta.” Corrêa (2005,

p.79). As crianças com deficiências continuavam a ser encaminhadas para os serviços de educação do

estado e para as instituições especializadas.

A partir de 1988, com o entendimento da divisão de responsabilidades dos sistemas da

educação e saúde, os profissionais da saúde deixaram de fazer parte da SEMED. Assim, a SEMED

passou a contar apenas com profissionais da área pedagógica. Corrêa (2005) afirma que tal situação

enfraqueceu a atuação da equipe nas escolas e os alunos recebiam atendimento na Rede Estadual.

Esse quadro só foi superado a partir do ano de 1991, em que a SEMED, frente à crescente

demanda pela descentralização dos serviços e de necessidades impostas pela ampliação das escolas da

REME. Destaca-se também a parceria com os serviços da saúde para diagnóstico nas áreas de

Deficiência visual e Auditiva. Corrêa (2005) cita a parceria com o Centro de Reeducação do Menor

(CRM – Centrinho) para diagnóstico e atendimento desses alunos, que primeiramente foram realizados

na escola e depois passaram a ser feitos no CRM.

Assim, o atendimento da REME era focado no diagnóstico e orientação às escolas. Não havia

serviços especializados organizados especificamente para esse fim. A educação especial também estava

ligada à CAE, que era responsável por outras atividades, conforme aponta Corrêa (2005, p. 83): “Nesse

período, a CAE era constituída dos serviços de apoio ao estudante [...] e serviços de acompanhamento

das hortas escolares e bandas das escolas municipais [...]”. Assim, de fato, a educação especial, não

contava com espaço próprio de atuação.

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Page 7: A trajetória da educação especial na Rede Municipal de Ensino de

A exemplo dos serviços especializados oferecidos pela Rede Estadual de Educação de Mato

Grosso do Sul, em 1993, com o início de nova administração municipal, ocorreram mudanças na

educação especial. A equipe que assumiu o Departamento de Ensino entendia que a educação especial

deveria estar articulada com o setor responsável pela parte pedagógica. Desse modo, foi criado o Núcleo

de Educação especial vinculado ao Departamento de Ensino. A partir de então, o Núcleo ficou

responsável pelo atendimento dos alunos com deficiência e não mais aqueles com problemas de

aprendizagem. Para tanto, foram organizados grupos para atendimento por área de deficiência.

Corrêa (2005, p.84) afirma que nesse período havia a intenção de se criar uma proposta para a

educação especial no município. Entretanto, tal iniciativa não se concretizou devido à saída da

Secretária de Educação, em meados de 1993. Essa situação é recorrente na educação especial no estado

de Mato Grosso do Sul. As mudanças de gestão acarretam descontinuidade nas propostas de

atendimento às pessoas com deficiência.

Em 1994, com a edição da Política Nacional de Educação Especial, o setor da educação

especial sofreu novas alterações, quando passou a ser denominado de Núcleo de Apoio ao Ensino dos

Portadores de Necessidades Especiais e iniciou o atendimento dos alunos com dificuldades de

aprendizagem e suspeita de deficiência no interior das escolas por meio de equipe itinerante. Essa

iniciativa vinha ao encontro das recomendações da Política em curso que era a de promover a

integração dos alunos no ensino comum. Os casos mais específicos detectados ainda continuavam a ser

encaminhados para as equipes da Rede Estadual, que nessa época se constituíam no atendimento

descentralizado das Unidades Interdisciplinares de Atendimento Psicopedagógico – UIAPS.

No período de 1995 a 1997 foram abertas nas escolas da REME salas de recursos para

atendimento dos alunos com deficiência. Tais iniciativas, segundo Corrêa (2005), visavam cumprir com

a política de expansão da educação especial proposta pelo MEC, em 1994. Corrêa registra que:

Em 1995, foram implantadas duas salas de recursos para alunos com deficiência auditiva nas Escolas Municipais Eulália Neto Lessa e Frederico Soares. Em 1996 e 1997, salas de recursos para alunos com deficiência mental nas Escolas Municipais Luís Antônio Sá de Carvalho, Aldo de Queiroz, Profª. Gonçalina Faustina de Oliveira e no Centro de Atendimento Integrado à Criança e ao Adolescente – Rafaela Abrão (CAIC), respectivamente [...].(CORRÊA, 2005, p.84).

A abertura das salas de recursos também foi resultado da ampliação do movimento da escola

para todos que ganhou força nos anos de 1990 e no bojo desse movimento, tem-se também o processo

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de municipalização7 do ensino fundamental presente na política educacional brasileira. Assim, houve

também um aumento na demanda pelos serviços de educação especial junto ao crescimento das redes de

ensino municipais.

Em 1997, com novas mudanças administrativas da SEMED, a educação especial passou a

fazer parte da Divisão de Apoio Pedagógico. Corrêa (2005) considera que a partir desse período, deu-se

início a uma política de educação especial no município de Campo Grande que resultou em expansão

dos serviços, inclusive a aquisição de transporte escolar específico. Grande parte dos serviços e projetos

contava com financiamento da Secretaria de Educação Especial/SEESP/MEC8. Nesse sentido, Corrêa

(2005) aponta que:

Durante os anos de 1999 e 2000, os serviços de apoio da educação especial diversificaram-se e expandiram-se para outras escolas da Reme, com vários apoios oferecidos pelo sistema municipal. Além das salas de recursos já existentes naquele período, passaram a funcionar os seguintes serviços: ensino itinerante, intérprete de língua brasileira de sinais, Núcleo de Produção Braille e Tipos Ampliados9 e transporte do escolar. (CORRÊA, 2005, p.89).

Esses serviços especializados foram amparados, em 2000, pela Resolução SEMED n. 31, de

3/5/2000, que dispõe sobre as Normas e Funcionamento da Educação Especial na Secretaria Municipal

de Educação e nas escolas da Rede Municipal de Ensino. A Resolução definia princípios e formas de

funcionamento dos serviços, que estavam referendadas nos documentos nacionais que à época

subsidiavam a educação especial, tais como: Política Educacional de Educação Especial (1994), LDB

n. 9.394/1996, Parâmetros Curriculares Nacionais – Adaptações Curriculares (1999) e da Deliberação

do Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso do Sul n. 4.827/1997. (CORRÊA, 2005, p. 91).

7 Corrêa (2005) ao discutir sobre o processo de municipalização e a educação especial, cita os estudos de Prieto (2002) indicando que “[...] houve retração do atendimento na esfera federal, com diminuição no número de matrículas da ordem de 65,5%. Já na esfera estadual, ainda que em números absolutos a matrícula tenha aumentado de 82.770, em 1988, para 115.424, em 1998, sua expressão e responsabilidade em relação às outras esferas de governo têm diminuído de 49,8%, em 1988, para 34,2%, em 1998. Assim, a esfera municipal vem ampliando progressivamente o número de matrículas nesse período, revelando crescimento de 452,9% e, na rede particular, esse aumento ocorreu em proporções menores, cerca de 127,3%.”(PRIETO 2002, apud CORRÊA 2005, p. 86)8 É oportuno enfatizar que com a política nacional de municipalização da educação especial, a partir de 1999, houve um significativo repasse de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE/MEC) para a Secretaria Municipal de Educação de Campo Grande, que foram utilizados na capacitação de docentes, compra de equipamentos, de material didático e pedagógico, de material de consumo e do transporte do escolar para viabilizar o funcionamento das salas de recursos [...] (CORRÊA, 2005, p.91)9 O Núcleo de Produção Braille e Tipos Ampliados entrou em funcionamento no ano de 2000, nas dependências da Escola Municipal José Rodrigues Benfica. A partir de 2003, passou a integrar o Centro Municipal de Educação Especial, criado pelo Decreto n. 8.715, de 30/6/2003. (Diogrande n. 1383, de 19/8/2003).

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Em 2002, por força do movimento de ‘inclusão escolar’10 e em atendimento às Diretrizes

Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica que preconiza a criação de setor específico

para atuação na educação especial nos sistemas de ensino11, houve a publicação do Decreto n. 8510, de

9 de agosto de 2002 que dispõe sobre a estrutura básica da SEMED. Nele, pela primeira vez a educação

especial passa a fazer parte da estrutura da Secretaria, com a criação da Divisão de Políticas e

Programas para Educação Especial.

Nesse mesmo ano, perseguindo o discurso da ‘inclusão escolar’, o Conselho Municipal de

Educação publica a Deliberação n. 77, de 5 de dezembro de 2002, que dispõe sobre a educação de

alunos que apresentam necessidades educacionais especiais, na educação básica, em todas as suas

etapas e modalidades do sistema municipal de ensino. O texto do documento define a educação

especial e seus alunos conforme o estabelecido nas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na

Educação Básica e postula que “O Sistema Municipal de Educação, através de seu órgão responsável,

viabilizará recursos e serviços educacionais especiais que dêem sustentação ao processo de construção

da educação inclusiva para a Rede Municipal de Ensino”. (DELIBERAÇÃO CME/CAMPO GRANDE

N. 77, art. 1º parágrafo 1º, 2002).

Quanto ao atendimento aos alunos com deficiência, a Deliberação n.77, prescreve que cabe às

escolas viabilizar a ‘inclusão’ em classes comuns em todas as etapas ou modalidade de ensino,

conforme critérios estabelecidos em sua proposta pedagógica e Regimento Escolar. Para essa ‘inclusão’

recomenda que em cada turma de alunos, sejam incluídos no máximo três alunos preferencialmente

com a mesma deficiência e ainda que as escolas contem com os serviços especializados que deverão

ocorrer no espaço escolar. Entre os serviços de apoio pedagógico especializado, encontram-se as

classes comuns, a sala de recursos, a itinerância e os professores intérpretes.

10 Almeida e Corrêa (2007), ao tratarem sobre o conceito político da ‘inclusão’, apontam que:“Compreender o processo de inclusão na política educacional é entendê-la como um mecanismo que pode ser usado como estratégia política, social e econômica e, por isso mesmo, precisa ser estudado, discutido e modificado, não podendo ser simplesmente ignorado. Como mecanismo político, a inclusão é enfatizada pela sua abrangência a diferentes grupos excluídos, o que a torna um processo social que busca favorecer parcela da população, geralmente desfavorecida social e economicamente. Como mecanismo econômico, a inclusão é meio para diminuir as profundas diferenças originadas pelo poder econômico de cada grupo social. Identificar o processo de inclusão como mecanismo de manutenção do poder econômico não nos impede de lutarmos pela concretização de ideais almejados há séculos, ou seja, lutarmos por melhores condições de vida e de participação na sociedade, com direitos e necessidades respeitadas, dentre eles o direito ao acesso, permanência e sucesso na vida escolar” (ALMEIDA; CORRÊA, 2007, p.248).11 A Resolução CNE/CEB n. 2, de 11 de setembro de 2001, no parágrafo único, art.3º, define que: “Os sistemas de ensino devem constituir e fazer funcionar um setor responsável pela educação especial, dotado de recursos humanos, materiais, financeiros que viabilizem e dêem sustentação ao processo de construção da educação inclusiva”. (BRASIL, 2001, p.69)

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No documento em pauta, sobre as práticas pedagógicas, há a recomendação que as escolas

organizem classes comuns e serviços especializados, flexibilização e adaptação curricular, metodologia

de ensino e recursos didáticos diferenciados. Sobre a avaliação do rendimento escolar do aluno com

deficiência no ensino comum, a Deliberação n. 77, no art. 9º, recomenda a previsão de estratégias

adequadas ao desenvolvimento do aluno, em consonância com a Proposta Pedagógica da escola, já no

art.26, prevê que: “o aluno com necessidades especiais que estiver freqüentando sala comum do ensino

regular terá sua promoção através do mesmo critério estabelecido para os demais alunos.”

(DELIBERAÇÃO CME/ CAMPO GRANDE N. 77, art. 26, 2002).

Quanto às instituições e escolas especializadas, a Deliberação em referência prevê a atuação

dessas para o atendimento daqueles alunos que necessitam de atenção especializada às quais o ensino

comum não consiga suprir:

Art.8º A educação escolar de alunos que apresentam necessidades educacionais especiais e que requeiram atenção individualizada, nas atividades de vida autônoma e social, apoios intensos e contínuos, flexibilizações e adaptações curriculares significativas que a escola comum não tenha conseguido prover, pode efetivar-se em instituições de ensino especializadas em Educação Especial. (DELIBERAÇÃO CME/ CAMPO GRANDE N. 77, art. 8º, 2002).

Além das instituições de ensino especializadas há no texto do documento a recomendação da

parceria entre as escolas comuns e as especializadas para o atendimento dos alunos com deficiência,

conforme definições dos documentos nacionais orientadores da educação especial.

Na mesma direção, visando atender as definições das Diretrizes Nacionais para a Educação

Especial na Educação Básica, em 2003, a SEMED publica a Resolução n. 56, de 4 de abril de 2003,

que dispõe sobre as normas e funcionamento da Educação Especial na Secretaria Municipal de

Educação e nas escolas da Rede Municipal de Ensino. A Resolução demarca os serviços para ao

atendimento tais como: ensino itinerante, salas de recursos; salas de enriquecimento curricular;

intérprete de língua de sinais; Núcleo de Produção Braille e tipos ampliados; atendimento domiciliar;

atendimento hospitalar e educação profissional. Em relação aos alunos, matrículas e organização das

práticas pedagógicas nas escolas comuns a Resolução segue o disposto na Deliberação CME/CAMPO

GRANDE n. 77, de 5 de dezembro de 2002.

Ainda em 2003, por meio do Decreto n. 4.067, de 15 de agosto de 2003, o prefeito de Campo

Grande tornou oficial o Centro Municipal de Educação Especial e denominou-o como “Centro

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Page 11: A trajetória da educação especial na Rede Municipal de Ensino de

Municipal de Educação Especial Amilton Garai da Silva”. No relatório de atividades do Departamento

de Educação Especial (2002-2006), consta que o referido Centro foi concebido para:

[...] avaliar os encaminhamentos, atender e acompanhar os alunos indicados pela SEMED, por meio do Departamento de Educação Especial, nas áreas de: deficiência auditiva, mental, visual, física, condutas típicas e altas habilidades; oferecer capacitação em serviço para todos os professores da Rede Municipal, família e comunidade; [...] acompanhar alunos que participam deste Centro nas salas regulares, de recursos e outros serviços oferecidos, atender aos pais e responsáveis dos alunos que recebem os atendimentos, implantar projetos de prevenção às deficiências[...] desenvolver programas voltados à educação profissional e inclusão no mercado competitivo de trabalho[...]. (CAMPO GRANDE/SEMED, 2006, p.7)

Por força do movimento da escola para todos12 e da ‘inclusão escolar’13 a partir dos anos de

1990, percebe-se que a educação especial em Campo Grande ganha um espaço significativo na gestão

municipal, tanto no que se refere à sua constituição, bem como quanto aos investimentos aplicados na

capacitação de pessoal, criação de serviços e aquisição de material pedagógico.

Dados apresentados por Corrêa (2005) ilustram essa situação. Segundo a autora, no período de

1998 a 2004 a educação especial do sistema municipal de ensino de Campo Grande recebeu recursos

do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE no valor total de R$ 244.319,82. Em

1998, foram liberados R$ 7.484,40 para capacitação de professores. Em 2000, os recursos utilizados

somam: R$ 7.484,40 para capacitação de professores, R$ 25.218,21 para aquisição de material

didático/pedagógico, R$ 10.320,20 para equipamento para as escolas e R$ 23.000.00 para transporte

escolar. No ano de 2002, foram destinados R$ 10.751,40 para atividades de capacitação; já para

material didático e pedagógico ficaram com R$ 24.740,80. Em 2003, para capacitação foram

destinados R$ 11.404,66 e R$ 11.835,45 para compra de equipamento para as escolas e, R$ 1.668,15

12 De acordo com Torres (2001), “Apesar de sua difusão, a educação para todos é amiúde interpretada, equivocadamente, como ‘escolaridade para todos’ e considerada equivalente à Educação Primária Universal (EPU), uma meta amplamente proclamada pela comunidade internacional”. (TORRES, 2001, p. 13). Ainda segundo a autora, a “‘Educação para Todos’ equivale a ‘Educação Básica para Todos’, entendendo-se por educação básica uma educação capaz de satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem (Neba) de crianças, jovens e adultos [...] definidas como aqueles conhecimentos teóricos e práticos, destrezas, valores e atitudes que [...] tornam-se indispensáveis para que as pessoas possam encarar suas necessidades básicas [...]”. (TORRES, id., p. 20).13 Na década de 1990, no contexto de uma economia capitalista excludente, o movimento internacional de reforma educacional se configurou pela necessidade do estabelecimento de políticas sociais de inclusão, dentre elas a educação, como justificativa de que dessa forma daria condições aos sistemas educacionais dos países com maior número de analfabetos e maiores déficits no atendimento da escolaridade obrigatória, dentre eles o Brasil, visando promover a erradicação do analfabetismo e a universalização do ensino fundamental, para enfrentar os desafios de uma nova ordem econômica mundial. (CORRÊA, 2005, p. 57). “Atualmente, o discurso da inclusão faz com que a educação especial seja o centro das discussões na educação básica, o que pode ser observado na elaboração das políticas públicas da educação no país, a partir da última década do século XX”. (CORRÊA, id. p. 46).

11

Page 12: A trajetória da educação especial na Rede Municipal de Ensino de

foram destinados para material de consumo para o Núcleo de Produção Braille e ainda, R$ 24.745,05

para aquisição de material didático. No ano de 2004, a capacitação de professores ficou com R$

39.265,80 e a aquisição de equipamento para as escolas somou R$ 46.401,30. (CORRÊA, 2005, p. 92).

Frente ao exposto, verifica-se que nesse período os investimentos na educação especial se

justificaram tendo em vista a política de inclusão em curso, momento em que houve financiamento do

governo federal para que os estados e os municípios se adequassem a essa política. Corrêa (2005)

aponta que, especificamente no município de Campo Grande, esses investimentos devem-se também ao

fato de que de 1997 a 2004 a capital foi administrada por um único prefeito, considerando-se a sua

reeleição, e que nesse período a pasta da Secretaria Municipal de Educação foi ocupada pela mesma

Secretária, que já havia trabalhado anteriormente com educação especial, por oito anos.

No levantamento dos dados da educação especial na REME, a evolução dos serviços estão

assim demonstrados: em 1998, a equipe da educação especial da SEMED, realizou 145 avaliações

psicopedagógicas; em 2004, esse número cresceu para 1132. Em 1998, a SEMED disponibilizava três

salas de recursos - deficiência auditiva e em 2004, a Rede já contava com dez salas para esse tipo de

atendimento. Quanto ao número de alunos atendidos, em 1998, a Rede atendeu 145 alunos e em 2004

esse quantitativo subiu para 1112. (CORRÊA, id., p. 94-96):

Os serviços das salas de recursos - deficiência mental, que em 1998 não eram oferecidos,

chegou no ano de 2004, com 25 salas em funcionamento. Na evolução dos atendimentos, os serviços de

ensino itinerante e de intérpretes de Língua de Sinais também apresentaram índices significativos de

atendimento. O primeiro serviço que em 1998 não oferecia atendimento, em 2004 passou a funcionar

em sete escolas. Já o segundo, que também não pertencia aos serviços da REME em 1998, em 2004,

contava com dezenove escolas oferecendo esse serviço (CORRÊA, 2005, p. 94).

A expansão da oferta desses serviços ocorreu devido à necessidade de se acompanhar os

alunos com deficiência que vinham de maneira crescente, sendo inseridos nas escolas do ensino comum

da Rede Municipal de Ensino, diante do aumento de matrículas no ensino fundamental.

 3. Mapeando as atuais ações e programas desenvolvidos na política da educação especial em Campo Grande

No âmbito do sistema municipal de ensino de Campo Grande, os serviços da educação

especial continuaram crescendo nos anos de 2005, 2006, 2007 e 2008. Durante o ano de 2005 e 2006

(Quadro 1), os atendimentos foram ampliados, a rede de parcerias também cresceu e o Centro

12

Page 13: A trajetória da educação especial na Rede Municipal de Ensino de

Municipal de Educação Especial, passou a oferecer atividades na brinquedoteca e ainda: Coral mãos

que cantam, Capacitação para o mercado de trabalho, Psicopedagogia, Oficina de LIBRAS, Curso para

intérpretes, Capacitação de recursos humanos, informática, Programa de baixa visão, Fonoterapia,

Psicologia educacional, Capoeira, Atividades físicas, Alfabetização em português para surdos, Sala de

enriquecimento eurricular, Alfabetização em braille e a Biblioteca braille Helen Keller (CAMPO

GRANDE/SEMED, 2006). Para desenvolver esses serviços, o Centro contava com convênios com

instituições especializadas e universidades.

Quadro 1- Evolução dos atendimentos da educação especial na REME (2005-2006) Fonte:

Relatório de Atividades Departamento

de Ed. Especial -2002 a 2006 (CAMPO

GRANDE/SEMED, 2007)

Em 2006, com as novas mudanças ocorridas na SEMED criou-se o Departamento de

Educação Especial (DEE). Dados levantados por Neres (2009) apontam que em 2007, houve alteração

na chefia e na equipe do DEE e a nova gestão, implantou mudanças na organização dos serviços

existentes.

No relatório de atividades do ano em referência, consta que o primeiro semestre foi dedicado

para a organização das equipes e do atendimento educacional especializado nas escolas. Foram

implantados seis Núcleos Municipais de Apoio Psicopedagógico (NUMAPS). Esses, segundo o

relatório de atividades do DEE (2007) tinham como proposta coordenar o processo da educação

especial enquanto atendimento educacional especializado e, identificar os alunos com deficiência

matriculados nas classes comuns, oferecendo-lhes apoio psicopedagógico.

Os NUMAPS14 foram criados a partir de uma proposta de descentralização do atendimento às

escolas municipais e funcionam em seis Unidades Pólo, localizadas em escolas da REME. Segundo o

relatório de atividades do DEE (2007), os Núcleos foram implantados como estratégia para oferecer um

“acompanhamento o mais próximo possível dos alunos e dos professores”. (CAMPO

GRANDE/SEMED, 2007).

14 Até o término da coleta de dados em março de 2009, não havia a oficialização da criação dos NUMAPS e segundo os técnicos da SEMED, o seu projeto encontra-se em fase de revisão para publicação.

Serviços Oferecidos 2005 2006Salas de Recursos - Deficiência mental 29 34Salas de Recursos - Deficiência auditiva 10 08Salas de Recursos - Deficiência visual 01 01Salas de Recursos - Enriquecimento curricular 01 02Intérprete de Língua de Sinais 19 22Itinerante 12 87

13

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De acordo com o relatório, os NUMAPS foram implantados para dar “sustentação aos avanços

da inclusão” (CAMPO GRANDE/SEMED, 2007) a partir do entendimento de que esse suporte dá-se

via atendimento e acompanhamento especializado. Segundo o depoimento de uma técnica da SEMED,

no início foram lotados de quatro a cinco técnicos (psicólogos e pedagogos), em cada NUMAPS.

Considerando-se que cada Unidade do NUMAPS é responsável por 16 escolas, em média, o número de

técnicos era insuficiente para o devido acompanhamento dos alunos matriculados nas escolas.

No quadro 2, estão registradas as atividades desenvolvidas pelo NUMAPS no ano de 2007.

Quadro 2 - Ações desenvolvidas pelos NUMAPS - 2007

Ações desenvolvidas Pólo I Pólo II Pólo III Pólo IV Pólo V Pólo VI TotalN. de alunos atendidos 310 370 694 197 332 332 2247N. de alunos com deficiências 120 126 133 163 215 236 993N. de salas de aulas com alunos em processo de inclusão

78 119 90 105 130 182 704

N. de escolas com sala de recursos 07 03 04 05 08 03 30N. de professores intérpretes 08 05 13 04 04 08 42N. de professores itinerantes 10 22 06 15 30 11 94N. de alunos aprovados 118 114 100 106 187 143 768N. de alunos reprovados 02 04 03 10 10 30 59

Fonte: Relatório de Atividades - DEE ano de 2007. (CAMPO GRANDE/SEMED, 2007).

Diante dos dados apresentados, é possível observar o grande volume de atendimentos

realizados em cada NUMAPS, o que evidencia o esforço dos técnicos para realização dos

atendimentos. Todavia, essa situação se faz presente desde o início da história da educação especial na

REME, considerando-se que a equipe sempre foi reduzida para atender a demanda existente, o que

evidencia a racionalização no investimento de recursos para esse fim, por parte do poder público

municipal.

O número de professores intérpretes e de itinerantes também sofreu um aumento considerável,

se comparados com os dados levantados em 2005 e 2006. Em relação aos alunos que receberam

atendimento nas escolas e que foram reprovados, observa-se apenas um pequeno número de

reprovações. Esse número é questionável comparando-se o número de alunos atendidos e alunos

aprovados. Somando-se os atendimentos não é possível obter com precisão o percentual de retenção e

aprovação. Além disso, durante a coleta de dados nas escolas ficou evidente as dificuldades dos

professores diante da tomada de decisão da retenção dos alunos acompanhados na série em que

14

Page 15: A trajetória da educação especial na Rede Municipal de Ensino de

estavam matriculados, pois segundo os professores, há orientação por parte da equipe pedagógica da

escola de que o aluno com deficiência, não pode ser retido na série que cursa.

Em 2008, o DEE implantou as salas de recursos multifuncionais para atender os alunos que

possuem deficiências. O serviço é respaldado pelo Ministério da Educação (MEC) por meio do Decreto

n. 6.571, de 17 de setembro de 2008 que dispõe sobre ao atendimento educacional especializado. No

texto do referido decreto as salas de recursos multifuncionais constituem em “ambientes dotados de

equipamentos, mobiliários e materiais didáticos e pedagógicos para a oferta do atendimento

educacional especializado.” (BRASIL, 2008).

No texto da Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da educação inclusiva,

publicado na página eletrônica do MEC/SEESP em 2008, há a recomendação de que os sistemas

implantem as salas de recursos funcionais e inclusive há um programa de financiamento para essa

implantação:

O programa apóia os sistemas de ensino na implantação de salas de recursos multifuncionais, com materiais pedagógicos e de acessibilidade, para a realização do atendimento educacional especializado, complementar ou suplementar à escolarização. A intenção é atender com qualidade alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, matriculados nas classes comuns do ensino regular. O programa é destinado às escolas das redes estaduais e municipais de educação, em que os alunos com essas características estejam registrados no Censo Escolar MEC/INEP. (MEC/SEESP disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12295&ativo=596&Itemid=595, acesso em 20 de abril de 2009).

A organização e o funcionamento das salas multifuncionais na REME ainda não estão

regulamentados. Entretanto, segundo depoimento dos técnicos das escolas da Rede, as salas foram

implantadas para prestar atendimento especializado nas várias áreas de deficiências. Para a implantação

desse serviço a SEMED realizou, em 2008, um programa de formação continuada para os professores

das salas de recursos. Os professores participantes estavam apreensivos diante da possibilidade de atuar

em uma atividade que exigia conhecimento específico em várias áreas de deficiências. Esse tipo de

iniciativa busca a racionalização de recursos, visto que em um único ambiente, vários alunos são

atendidos sob a responsabilidade de um professor.

Além desse tipo de serviço, a SEMED passou a contar com os profissionais de apoio, que

prestam assistência na locomoção e higiene dos alunos com deficiência e que necessitam desse tipo se

15

Page 16: A trajetória da educação especial na Rede Municipal de Ensino de

serviço. Em 2008, a SEMED contou com 73 profissionais de apoio que foram efetivados por meio de

concurso público específico para esse fim. São profissionais de nível médio e estavam recebendo

capacitação para tal função.

Segundo depoimentos de professores e técnicos especializados, alguns professores itinerantes

foram substituídos por esses profissionais. Essa medida revela, mais uma vez, a racionalização de

recursos na realização do atendimento especializado. Tal iniciativa provocou reação de pais e alunos

que eram assistidos pelo professor itinerante. Esses últimos passaram a ser denominados de professores

auxiliares.

No quadro 3, é possível observar as ações e serviços desenvolvidos pelos NUMAPS e pelo

DEE, no sentido de promover/ dar sustentabilidade ao processo de inclusão dos alunos com deficiência

no ensino comum.

Quadro 3 - Ações desenvolvidas pelos NUMAPS - 2008

Ações desenvolvidas Pólo I Pólo II Pólo III Pólo IV Pólo V Pólo VI TotalN. de alunos atendidos 175 122 153 241 548 316 1.555N. de alunos em sala de recursos 90 64 116 102 168 163 703N. de salas de sala de recursos multifuncionais 1 1 1 1 1 1 5N. de escolas com sala de recursos 7 5 6 5 7 6 36N. de professores intérpretes - - - - - - 43N. de profissional de apoio - - - - - - 73N. de professores auxiliares - - - - - - 55

Fonte: Relatório de Atividades - DEE ano de 2007. (CAMPO GRANDE/SEMED, 2008)

Os dados revelam aumento no número de salas de recursos e de professores intérpretes em

relação ao ano de 2007. Entretanto, o número de alunos atendidos sofreu uma redução, bem como o

número de professores itinerantes/auxiliares, demonstrando o que fora apontado no depoimento dos

professores e técnicos: a substituição desses pelos profissionais de apoio de nível médio.

4. Considerações finais

Ao analisar a história da educação especial na Rede Municipal de Ensino de Campo Grande,

fica evidenciado que a sua organização revela a tentativa da gestão municipal em adequar-se às atuais

políticas educacionais, fundamentadas no paradigma da ‘inclusão’, diante das constantes mudanças na

reestruturação dos serviços.

Portanto, cabe indagar se essas mudanças têm-se traduzido em melhores condições de acesso,

permanência e sucesso para a educação das pessoas com deficiência, considerando-se que na trajetória

16

Page 17: A trajetória da educação especial na Rede Municipal de Ensino de

da educação especial na REME a racionalização de recursos fica evidenciada na dinâmica dos serviços

oferecidos a essa população.

A sustentabilidade de um projeto de ‘inclusão escolar’ para alunos com deficiência exige

investimentos na construção de um novo projeto de escola, conforme assinalam Bueno (2008),

Lancillotti (2006), Ribeiro (2004). Assim, a organização dos serviços para implantação da ‘inclusão

escolar’ presume investimentos e não, a racionalização de recursos. Todavia, Cardoso (2005), Arruda,

Kassar e Santos (2006) indicam em suas pesquisas que os sistemas educacionais têm adotado o

discurso de ‘inclusão’ como tentativa de diminuir gastos com a educação especial.

Na contramão da realidade apontada, cabe-nos como educadores a busca de caminhos que

apontem para novos rumos educacionais em direção a uma proposta educativa que contemple a todos,

inclusive as pessoas com deficiência.

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