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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A TEORIA DA JUSTIÇA NA FILOSOFIA DE ARISTÓTELES: UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A ATUAÇÃO JURISDICIONAL DO OPERADOR DO DIREITO NELSON NATALINO FRIZON Itajaí , maio 2006

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

A TEORIA DA JUSTIÇA NA FILOSOFIA DE ARISTÓTELES: UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A ATUAÇÃO JURISDICIONAL DO

OPERADOR DO DIREITO

NELSON NATALINO FRIZON

Itajaí , maio 2006

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

A TEORIA DA JUSTIÇA NA FILOSOFIA DE ARISTÓTELES: UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A ATUAÇÃO JURISDICIONAL DO

OPERADOR DO DIREITO

NELSON NATALINO FRIZON

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor MSc. Josemar Sidinei Soares

Itajaí , maio 2006

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AGRADECIMENTO

Agradeço a força criadora, forma indescritível, só entendida na experiência pessoal, que

proporcionou-me o dom da vida.

À Família mais próxima:

Meu Pai Olimpio e Minha Mãe Irene,

Meus Irmãos e Cunhadas, Irmãs e Cunhados.

Meus Sobrinhos e Sobrinhas.

À Daiane Spézia, pelo incentivo e afeto.

Ao meu Orientador de Monografia Josemar Sidinei Soares, pela contribuição crítica, filosófica

e de vida.

Aos amigos Rafael Padilha dos Santos, Edmar Everson Alves e Professor Martinho pela

contribuição.

Aos integrantes do Grupo de Estudos de Filosofia do Curso de Direito pela oportunidade nas

discussões

Aos meus professores do Curso de Direito, cada qual, com seu modo de ser “mestre”.

Aos (As) colegas de Curso pela contribuição nas discussões e aquisição de conhecimentos.

Aos amigos(as) que estiveram a meu lado, nos momentos bons e, principalmente, nos momentos

difíceis que passei.

Aos que atribuíram suas críticas, pois, a partir delas, procurei fundamentar meu conhecimento.

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DEDICATÓRIA

À minha FAMÍLIA, à todas pessoas que fazem a história com Justiça... E a minha prole vindoura.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de Direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, 23 de maio de 2006

Nelson Natalino Frizon Graduando

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Nelson Natalino Frizon, sob o

título Teoria da Justiça na Filosofia de Aristóteles: uma contribuição para a

atuação jurisdicional do operador do Direito, foi submetida em 23/05/2006 à banca

examinadora composta pelos seguintes professores: Msc. Josemar Sidinei

Soares – Presidente, Onorato Jonas Fagherazzi - examinador e Msc. Maria da

Graça Mello Ferracioli - examinadora, e aprovada com a nota 9,5 (nove e meio).

Itajaí, 23 de maio de 2006

Professor Msc. Josemar Sidinei Soares Orientador e Presidente da Banca

Professor Msc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002

CP Código Penal Brasileiro

CPC Código de Processo Civil Brasileiro

CPP Código de Processo Penal Brasileiro

CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Justiça Geral

Aquela disposição de caráter que torna as pessoas propensas a fazer o que é

justo, que as faz agir justamente e a desejar o que é justo; de modo análogo, a

injustiça é seu contrário.1

Justiça Distributiva

É a que se manifesta nas distribuições de magistraturas, de dinheiro ou das

coisas que são divididas entre aqueles que têm parte na constituição.2

Justiça Corretiva

É aquela que desempenha uma função Corretiva nas transações entre

indivíduos.3 Tanto nas transações voluntárias como nas involuntárias. A igualdade

buscada é para as coisas que são transacionadas.

Meio termo

É o justo. E o justo deve ser ao mesmo tempo intermediário, igual e relativo.

Como intermediário deve estar entre determinados extremos (o maior e o menor);

como igual, envolve duas participações iguais; e relativo, para certas pessoas.4

Eqüidade

É uma correção da lei quando esta é deficiente em razão de sua universalidade.5

Jurisdição

É, ao mesmo tempo, poder, função e atividade. Como poder, é a manifestação

do poder estatal, conceituado como capacidade de decidir imperativamente e

1 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: editora Martin Claret, 2004. 1129a, 10 2 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: editora Martin Claret, 2004. 1130b, 30 3 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: editora Martin Claret, 2004. 1131a, 05 4 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: editora Martin Claret, 2004. 1131a, 15 5 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: editora Martin Claret, 2004. 1137b, 25

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impor decisões. Como função, expressa o encargo que têm os órgãos estatais de

promover a pacificação de conflitos interindividuais, mediante a realização do

Direito justo e através do processo, E como atividade ela é o complexo de atos do

juiz no processo, exercendo o poder e cumprindo a função que a lei lhe comete. O

poder, a função e a atividade somente transparecem legitimamente através do

processo devidamente estruturado (devido processo legal).6

Educação

É a excelência intelectual, o conceito que designa a educação no seu mais

elevado grau. A educação deve ser voltada para o exercício da cidadania. A

educação para a cidadania tem seu princípio voltado para a ordem pública.7

6 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, ADA Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 17aed. São Paulo: Malheiros, p.131 7 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça,Virtude Moral e Razão. Curitiba: Juruá Editora, 2004. p. 48

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SUMÁRIO

RESUMO........................................................................................... XI

INTRODUÇÃO ................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 4

DA JUSTIÇA EM ARISTÓTELES ...................................................... 4 1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS............................................................................4 1.1.1 BREVE BIOGRAFIA DE ARISTÓTELES ..................................................................4 1.1.2 O QUE SE CONHECE DA GRANDE OBRA ..................................................6 1.1.3 BREVES NOTAS DA FILOSOFIA NA GRÉCIA ANTES DE ARISTÓTELES ......................8 1.2 JUSTICA GERAL ...........................................................................................11 1.2.1 JUSTIÇA E MORAL ..........................................................................................14 1.2.2 DA JUSTIÇA LEGAL ........................................................................................16 1.2.3 JUSTIÇA DISTRIBUTIVA....................................................................................17 1.2.4 JUSTIÇA CORRETIVA.......................................................................................20 1.2.5 DO JUIZ .........................................................................................................21 1.2.6 MEIO TERMO ..................................................................................................22 1.2.6.1 Reciprocidade e retribuição proporcional ............................................23 1.2.7 JUSTIÇA POLÍTICA ..........................................................................................23 1.2.8 EQÜIDADE......................................................................................................25

CAPÍTULO 2 .................................................................................... 27

JURISDIÇÃO.................................................................................... 27 2.1 ORIGEM..........................................................................................................27 2.1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS................................................................................27 2.1.1.1 Autotutela ................................................................................................28 2.1.1.2 Autocomposição .....................................................................................29 2.1.1.3 Arbitragem ...............................................................................................29 2.1.1.4 Jurisdição ................................................................................................30 2.2 CONCEITOS DE JURISDIÇÃO......................................................................32 2.2.1 CARACTERÍSTICAS DA JURISDIÇÃO ..................................................................33 2.3 CLASSIFICAÇÕES DA JURISDIÇÃO ...........................................................36 2.3.1 JURISDIÇÃO PENAL E JURISDIÇÃO CIVIL............................................................36 2.3.2 JURISDIÇÃO COMUM E JURISDIÇÕES ESPECIAIS .................................................37 2.3.2.1 Jurisdição Federal...................................................................................37 2.3.2.2 Jurisdição trabalhista .............................................................................38 2.3.2.3 Jurisdição eleitoral .................................................................................38 2.3.2.4 Jurisdição militar ....................................................................................38

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2.3.3 JURISDIÇÃO COMUM OU ORDINÁRIA..................................................................38 2.3.4 JURISDIÇÕES DE PRIMEIRA E SEGUNDA INSTÂNCIAS ..........................................39 2.4 A JURISDIÇÃO E O ACESSO À JUSTIÇA ...................................................39 2.5 IDENTIFICAÇÃO DA FILOSFIA DE ARISTÓTELES NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO......................................................................................43 2.6 FUNÇÃO JURISDICIONAL ............................................................................44

CAPÍTULO 3 .................................................................................... 47

A FORMAÇÃO DO OPERADOR DO DIREITO COMO PRESSUPOSTO PARA SUA ATUAÇÃO JURISDICIONAL ............ 47 3.1 A PREPARAÇÃO DOS OPERADORES DO DIREITO ..................................47 3.2 DISCIPLINAS JURÍDICAS FUNDAMENTAIS................................................49 3.3 DA BUSCA DA EXCELÊNCIA MORAL E INTELECTUAL............................54 3.3.1 DAS VIRTUDES ÉTICAS ....................................................................................54 3.3.2 DAS VIRTUDES “DIANOÉTICAS”........................................................................57

CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 61

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 66

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RESUMO

A presente Monografia pesquisa a Teoria da Justiça na

Filosofia de Aristóteles como contribuição para a atuação jurisdicional do operador

do Direito, e visa mostrar quão importante é a formação moral e intelectual

daqueles que irão operar o Direito. Nesta linha de pesquisa, reservam-se espaços

para conceituar a Teoria da Justiça em Aristóteles: Justiça Geral, Justiça

Distributiva, Justiça Corretiva, Eqüidade e o estudo que o operador do Direito

deve proceder para alcançar o mais alto grau de excelência. A Teoria da Justiça

na filosofia de Aristóteles é pensada a partir de um conceito comum a todos,

segundo o qual as pessoas são propensas a fazer o que é justo e desejar o justo.

Na Ética a Nicômaco, o filosofo grego conceitua Justiça Geral e também teoriza

as partes da Justiça. A partição se estabelece em: Justiça Distributiva - aquela

que se relaciona às pessoas e seus méritos, ou seja, as qualidades necessárias

para receber as magistraturas, dinheiro ou coisas que devam ser distribuídas; e,

Justiça Corretiva - aquela que desempenha uma função Corretiva nas transações

entre indivíduos. O equilíbrio do justo é o meio termo. A Justiça tem estrita relação

com a lei. Mas quando a lei possui lacunas, em seus estatutos legais, para os

casos específicos, o Estado deve através de seu representante legal, o juiz,

buscar adequar a lei geral para o caso concreto. Isso se torna possível através da

Eqüidade. Portanto, o objetivo do presente trabalho é estudar a Teoria da Justiça

na Filosofia de Aristóteles, e sua contribuição para a atuação jurisdicional do

operador jurídico. A Jurisdição não se constitui fruto do acaso, mas de uma

evolução da organização dos seres humanos em Sociedade. A Sociedade,

percebe a necessidade de ter um ente capaz de por fim aos conflitos, organiza o

Estado e atribui a este a função de ser o responsável para manter a Paz Social.

Junto ao Estado surge a Jurisdição, instrumento que tem o objetivo de dizer o

Direito. No Brasil, segundo a Constituição, sua atuação deve ser o instrumento de

Garantia dos Direitos Fundamentais: a vida, a liberdade, a igualdade. Para o

desenvolvimento da pesquisa, adota-se o método indutivo. Como resultados,

aponta-se, de início, a perspectiva de que o operador do Direito deve ser um

agente preparado para exercer a função jurisdicional, precisando buscar o

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aprofundamento nos estudos acadêmicos. O operador do Direito deve buscar a

excelência moral e intelectual. Esta preparação dá condições para que sejam

preenchidos os requisitos aos que desejam atuar na função jurisdicional. Nesta

seara pedagógica, o operador do Direito deve aprofundar-se sobre os alicerces

legais que ostentam o Estado e que permitem a tomada de decisões justas, no

momento de por fim à lide. O estudo para o operador do Direito deve ser

constante, e não pode ser fruto do casuísmo, mas deve considerar os alicerces já

sedimentados na organização da Sociedade. As considerações finais buscam

sintetizar os conceitos estudados e apresentam propostas a serem observadas

pelos futuros operadores do Direito. O conceito de Justiça elaborado por

Aristóteles na Antigüidade, torna-se presente até nossos dias. O operador do

Direito deve desenvolver o estudo da filosofia do Direito como a ciência que

estuda o fenômeno jurídico manifestado ao longo dos tempos. As categorias

estudadas: Justiça, Jurisdição e educação.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto o estudo sobre a

Teoria da Justiça na filosofia de Aristóteles: uma contribuição para a atuação

jurisdicional do operador do Direito.

Os objetivos específicos são:

Produzir Monografia para obtenção do Título de Bacharel em

Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

Compreender a estrutura da Justiça na filosofia de

Aristóteles e suas partes.

Identificar como a Teoria da Justiça de Aristóteles se

desenvolve na estrutura jurisdicional.

Demonstrar a importância da educação na formação moral e

intelectual para alcançar a excelência..

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando da

Concepção de Justiça na filosofia de Aristóteles. Após breve contextualização

acerca do período histórico em que Aristóteles viveu e sua produção filosófica, se

discorre sobre o livro V, da Ética a Nicômaco, de Aristóteles, que é a base da

fundamentação do Conceito de Justiça desta pesquisa. Aristóteles teoriza a

Justiça no sentido amplo, a qual denominará de Justiça Geral e, no sentido

estrito, das partes da Justiça: Justiça Distributiva e Corretiva. Estudar-se-á o

papel do juiz, também os conceitos de meio termo, Justiça Política e Eqüidade.

No Capítulo 2, tratando da Jurisdição, que tem sua origem

não como fruto do acaso, mas sim da evolução racional do ser humano, surge

como o instrumento para dizer o Direito. Opta-se, neste estudo, por examinar a

Jurisdição como função, poder e atividade do Estado. Nesta linha da pesquisa se

analisará como se constitui a Jurisdição brasileira, a classificação mais usual das

jurisdições, a Jurisdição e o acesso à Justiça. Buscar-se-á apresentar alguns

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indicativos da presença da Filosofia de Aristóteles no ordenamento jurídico

brasileiro.

No Capítulo 3, tratando da formação do Operador do Direito

e sua atuação na Jurisdição, procura-se demonstrar a importância da sua

preparação e formação moral e intelectual. Será abordada breve análise de

algumas disciplinas jurídicas fundamentais na formação do Operador do Direito.

Apresentar-se-ão aspectos para a busca da excelência moral e intelectual na

formação dos Operadores do Direito, pessoas que devem atuar em vista do bem

comum da Sociedade.

O presente estudo se encerra com as Considerações Finais,

nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da

estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a Teoria da Justiça

na filosofia de Aristóteles, com a contribuição para a atuação jurisdicional do

operador do Direito.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

��A Teoria da Justiça, na filosofia de Aristóteles, seria pensada a partir de um conceito comum à todos demonstraria o agir humano.

��A Jurisdição não se constituiria fruto do acaso, mas de uma evolução da Sociedade, que perceberia a necessidade de ter um ente, o Estado, Capaz de pôr fim aos conflitos e manter a Paz Social.

��O operador do Direito deveria buscar a excelência moral e intelectual. Seria este o caminho para sua atuação jurisdicional.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase

de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, e, o resultado expresso na

presente Monografia é composto na base lógica Indutiva8.

8 PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica – idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. 7. ed. rev. atual. amp. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2002. 243 p.

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3

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa

Bibliográfica.

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CAPÍTULO 1

DA JUSTIÇA EM ARISTÓTELES

1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

1.1.1 Breve biografia9 de Aristóteles

Para quem pretende interpretar o pensamento de

Aristóteles, antes é necessário apresentar dados essenciais de sua vida, suas

obras e os aspectos políticos que ocorreram no tempo em que viveu este filósofo

grego, bem como a capacidade do filósofo em acolher as diferentes tradições

filosóficas que já haviam surgido no mundo ocidental.

Aristóteles nasceu em Estagira (por essa razão é chamado

de “o estagirista”), Macedônia, em 384 a.C. Chega em Atenas no ano de 367a.C.,

jovem, com cerca de dezoito anos. Como muitos outros, vem atraído pela intensa

vida cultural da cidade que lhe acenava com oportunidades para prosseguir seus

estudos. Não era belo e, para os padrões vigentes do mundo grego,

principalmente na Atenas daquele tempo, apresentava características que

poderiam dificultar-lhe a carreira e a projeção social. Em particular, uma certa

dificuldade em pronunciar corretamente as palavras deveria criar-lhe embaraços

e mesmo complexos numa sociedade que, além de valorizar a beleza física e

enaltecer os atletas, admirava a eloqüência e deixava-se conduzir por oradores.

Naquela época duas grandes instituições educacionais

disputavam em Atenas a preferência dos jovens que, através de estudos

superiores, pretendiam se preparar para exercer com êxito suas prerrogativas de

cidadãos e ascender na vida pública. Diante dos dois caminhos — o de Isócrates e

9 Utiliza-se nesta parte do trabalho algumas informações sobre a vida de Aristóteles com base no Livro V da Vida dos Filósofos de Diógenes Laêrtios, século III d. C.. Apud: REALE, Giovanni. Introdução a Aristóteles. 10 ed. Lisboa – Portugal: Edições 70, 1997. 197p.

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5

o de Platão — o jovem chegado da Macedônia não hesita: ingressa na Academia

de Platão.

De pura raiz jônica, a família de Aristóteles estava

tradicionalmente ligada à medicina e à casa reinante da Macedônia. Seu pai,

Nicômaco, era médico e amigo do rei Amintas II, pai de Filipe. Estagira, a cidade

onde Aristóteles nasceu, ficava na Calcídica e, apesar de estar situada distante

de Atenas e em território sob a dependência da Macedônia, era na verdade uma

cidade grega, onde o grego era a língua que se falava. A vida de Aristóteles — e

pode-se dizer que até certo ponto sua obra — estará marcada por essa dupla

vinculação: à cultura helênica e à aventura política da Macedônia.

Ao ingressar na Academia platônica — que viria a freqüentar

durante cerca de vinte anos — Aristóteles já trazia, como herança de seus

antepassados, acentuado interesse pelas pesquisas biológicas. Ao matematismo

que dominava na Academia, ele irá contrapor o espírito de observação e a

índole classificatória, típicas da investigação naturalista, e que constituirão traços

fundamentais de seu pensamento. Diante das questões políticas, Aristóteles

assumirá a atitude do homem de estudo, que se isola da cidade em pesquisas

especulativas, fazendo da política um objeto de erudição e não uma ocasião para

agir.

Em 347 a.C., com a morte de Platão, Aristóteles deixa

Atenas e vai para Assos, na Ásia Menor, onde Hérmias, antigo escravo e ex-

integrante da Academia, havia se tornado o governante. Três anos depois que

Aristóteles havia se transferido para Assos, Hérmias foi assassinado. Aristóteles

deixou então a cidade, levando em sua companhia Pítias, sobrinha do tirano

morto, e que se tornou sua primeira esposa. Mais tarde, morrendo Pítias,

desposará Herpilis, que lhe dará um filho, Nicômaco.

Saindo de Assos, Aristóteles permanece dois anos em

Mitilene, na ilha de Lesbos. É o momento em que a Macedônia, garantida pelo

poderio militar, começa a manifestar suas vastas ambições políticas. Filipe, em

343 a.C, chama Aristóteles à corte e confia-lhe importante missão: a de educar

seu filho, Alexandre. Durante anos o filósofo encarrega-se dessa missão. É ainda

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preceptor de Alexandre quando, em 338 a.C, os macedônios derrotam os gregos

em Queronéia.

Em 336 a.C, Filipe é assassinado e Alexandre sobe ao

trono. Logo em seguida prepara uma expedição ao Oriente, iniciando a

construção de seu grande império. Nada mais justificava a permanência de

Aristóteles na corte de Pela. É o momento de voltar à Atenas. Lá, próximo ao

templo dedicado a Apolônio Liciano, abre uma escola, o Liceu, que passou a

rivalizar com a Academia, então dirigida por Xenócrates. Do hábito — aliás,

comum em escolas da época — que tinham os estudantes de realizar seus

debates enquanto passeavam, teria surgido o termo peripatéticos (que significa

"os que passeiam") para designar os discípulos de Aristóteles. Durante uns doze

anos, Aristóteles ensinou no Liceu todos os ramos do saber filosófico.

Depois da morte de Alexandre, em 323 a.C, Aristóteles

passou a ser hostilizado pela facção antimacedônica, que o considerava

politicamente suspeito. Para que Atenas “não pecasse mais uma vez contra a

filosofia”, a exemplo do que acontecera com Sócrates, Aristóteles fugiu. Refugiou-

se em Cálcis, na Eubéia. Aí morreu no ano de 322 a.C.

1.1.2 O que se conhece da grande obra

A partir de declarações do próprio Aristóteles, sabe-se que ele

realizou dois tipos de composições: as endereçadas ao grande público, redigidas

em forma mais dialética do que demonstrativa, e os escritos ditos filosóficos ou

científicos, que eram lições destinadas aos alunos do Liceu. Estas últimas foram as

únicas que se conservaram, embora constituam pequena parcela do total que é

atribuído, desde a Antigüidade, a Aristóteles.

As obras exotéricas, destinadas à publicação, eram

freqüentemente diálogos, imitados dos de Platão. Delas restaram apenas

fragmentos, conservados por diversos autores ou referidos em obras de escritores

antigos.

As obras de Aristóteles chamadas acroamáticas, ou seja,

compostas para um auditório de discípulos, apresentam-se sob a forma de

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pequenos tratados, muitos dos quais reunidos sob um título comum (como é o

caso da Física). A arrumação desses tratados de modo a constituir as séries que

integram o conjunto das obras de Aristóteles -— o Corpus aristotelicum — remonta a

Andrônico de Rodes, que dirigiu à escola peripatética no século I a.C.

O conteúdo do Corpus aristotelicum apresenta uma

distribuição sistemática: Primeiro, os tratados de lógica, cujo conjunto recebeu a

denominação de Organon — já que para Aristóteles a lógica não seria parte

integrante da ciência e da filosofia, mas apenas um instrumento (organon) que elas

utilizam em sua construção. Após o Organon, o Corpus aristotelicum apresenta

obras dedicadas ao estudo da natureza. Uma primeira série de tratados refere-se ao

mundo físico, compreendendo: a Física, que examina conceitos gerais relativos ao

mundo físico (natureza, movimento, infinito, vazio, lugar, tempo, etc); o Sobre o Céu

(De Cieló) e o Sobre a Geração e a Corrupção (De Generatione et Corruptione),

estudos sobre o mundo sideral e o sublunar; finalmente os Meteorológicos, relativos

aos fenômenos atmosféricos.

O Tratado da Alma (De Anima) abre a série de obras

referentes ao mundo vivo, sendo seguido de pequenos tratados sobre diferentes

funções (a sensação, a memória, a respiração, etc.) e sobre Ciências Naturais.

Mas da série relativa aos seres vivos a obra principal é a História dos Animais,

contendo o registro de múltiplas e minuciosas observações.

A seqüência de obras dedicadas à filosofia teórica ou

especulativa é encerrada por catorze livros sobre a filosofia primeira, ou seja,

sobre os primeiros princípios e as primeiras causas de toda a realidade. Situados

após os tratados relativos ao mundo físico, esses tratados receberam a

designação geral de Metafísica. Mas, já na própria Antigüidade tal denominação

recebeu uma interpretação neoplatônica: aqueles livros abordariam questões

referentes a um plano de realidade situado além do mundo físico.

Depois da filosofia teórica seguem-se, no Corpus

aristotelicum, as obras de filosofia prática: a Ética e a Política. Das várias versões

existentes da ética aristotélica, a principal é a Ética a Nicômaco, assim chamada

porque o filho de Aristóteles foi quem primeiro a editou. A obra denominada Política

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é, na verdade, um conjunto de oito livros que não apresentam encadeamento

rigoroso. Da Política segue-se a Retórica, que se vincula, devido a seu tema, à arte

da argumentação ou dialética exposta nos Tópicos (Organon). Por fim, o

Corpus aristotelicum apresenta a Poética, da qual restou apenas fragmento.

Além desses trabalhos considerados autênticos, o Corpus

abrange ainda alguns escritos que a crítica revelou serem apócrifos, como o

Sobre o Mundo (De mundo), os Problemas, o Econômico e o Sobre Melisso,

Xenófanes e Górgias.

1.1.3 Breves notas10 da filosofia na Grécia antes de Aristóteles

Aristóteles chega à Grécia em um período que ocorrem

conflitos entre diversas tendências filosóficas existentes naquela época.

Brevemente, se pode destacar a tendência que segue a doutrina de Parmênides;

a da unidade indivisível e da fixidez imutável, e, ao mesmo tempo, há os

seguidores da doutrina de Heráclito; a da pura multiplicidade e do movimento

incessante. Constituídas por vias inteiramente opostas, mas que chegaram ao

mesmo resultado: a negação do conhecimento científico do universo físico.

Outra tendência, é dos seguidores da Escola Pitagórica, que

buscam nas ciências uma explicação do mundo físico através de figuras

geométricas e dos números, esperando, dessa forma dar a explicação última de

todas as coisas, em especial, do universo celeste e seu movimento.

As tentativas de sintetizar e unir as tendências em um novo

sistema, levaram a uma decadência da produção filosófica que, aliada aos

transtornos políticos existentes na Grécia, prepararam o terreno para o despertar

das idéias sofísticas. Os sofistas não primavam pela pesquisa científica, e

quiseram construir uma nova “sabedoria filosófica”, assentada na retórica: a arte

de persuadir. Nesse momento não é mais importante buscar a verdade; para os

sofistas o importante é vencer o embate da argumentação.

10 ABBAGNANO, Nicola. História da Filosofia. Volume I. Tradução de Antônio Borges Coelho, Franco de Sousa e Manuel Patrício. 5 edição. Lisboa: editorial Presença, 1991.

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Com a possibilidade de que o verdadeiro pensamento

filosófico desapareça e que a “arte de persuadir” dos sofistas sobrevenha, se

insurge o filósofo grego Sócrates, que deixa de lado o estudo das ciências da

natureza, da astronomia e da matemática, para dar atenção única à procura do

conhecimento da alma e das virtudes.

Sócrates provoca indagações filosóficas que levam ao

conhecimento de “si mesmo”. Sua grande doutrina é espelhada na expressão de

Delfos: “conhece-te a ti mesmo”. Nas discussões com seus discípulos procura

conhecer e definir com exatidão os elementos, da piedade, da coragem, da

amizade, da Justiça, da alma, buscando dessa forma construir uma ciência das

virtudes. Para Sócrates, o conhecimento de “si mesmo” e das virtudes da alma,

são o verdadeiro caminho filosófico e o único que interessa ao ser humano.

Tem-se, assim, o surgimento de mais duas tendências

filosóficas que se somam as três tendências tradicionais. Estas últimas afloram,

pois as preocupações da juventude ateniense estão voltadas à realidade do poder

político (sofistas) e do domínio de “si mesmo”. Será Platão, discípulo de Sócrates,

que tentará produzir uma síntese original, buscando unificar os diversos

conhecimentos filosóficos e a ambição política, na teoria da idéias.

Em sua teoria, procura estabelecer verdadeiras definições

da virtude e da alma. Segundo Platão, para serem verdadeiras, tais definições

não poderiam sofrer instabilidades e mobilidades do mundo sensível, mas

deveriam se apresentar como realidades imutáveis e perfeitas. Sob esse

raciocínio desenvolve sua teoria das Idéias. O mundo perfeito e verdadeiro é

constituído através de modelos que se encontram no mundo das idéias. As coisas

que estão no mundo sensível são só aparências. Com isso, Platão vincula-se às

pesquisas filosóficas tradicionais dos físicos, mas de modo original, pois dá uma

nova explicação do universo. Platão desenvolve o uso da dialética, “ciência

perfeita”, para compreender o paralelo dos mundos: o das coisas sensíveis e o

das formas ideais.

É em relação a essas seis tendências que orientaram a

pesquisa filosófica grega até então, que se precisa considerar a filosofia de

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Aristóteles. E bem verdade que o ponto determinante para o estudo da filosofia de

Aristóteles tem início na Academia, de fins marcadamente político, ou melhor,

ético-político-educativo. A influência de Platão foi determinante por toda a vida de

Aristóteles e na construção de sua filosofia, pois o platonismo é o núcleo em torno

do qual se constrói a especulação aristotélica.

A primeira fase da construção filosófica aristotélica, segundo

todos os indícios, é a que Aristóteles produziu durante seu período na Academia.

Um de seus escritos que se destaca nesse período trata-se do Exortação à

filosofia, do qual muitos são os fragmentos reproduzidos por Jâmblico. Os indícios

levam a crer que Aristóteles teria escrito o Protréptico no ano de 351/350 a. C..

Desta obra o fragmento 2 diz o seguinte sobre a

necessidade da filosofia:

Em suma, se há de filosofar, é preciso filosofar, e se não há que filosofar, é igualmente preciso filosofar; assim, pois, em qualquer caso é necessário filosofar. Se existe efectivamente a filosofia, todos estamos obrigados de qualquer forma a filosofar, uma vez que existe. Mas, se não existe, também neste caso nos vemos obrigados a investigar porque é que não existe a filosofia; mas, investigando, filosofamos, porque investigar é a causa da filosofia.11

A filosofia é necessária, como demonstra Aristóteles, pois

sendo a investigação sua causa, mesmo quem procura negá-la deve fazer uso

dos critérios da filosofia para tal demonstração. Desenvolver a filosofia é possível,

pois seus objetos específicos são os princípios e as causas primeiras. Ademais, a

filosofia é um bem objetivo e constitui o fim metafísico do homem. O homem,

como ser racional, procura alcançar a verdade, e esta se obtém com a filosofia.

A filosofia consiste em realizar no humano o que há de mais

elevado, a perfeição. Desta forma, o conhecimento é a virtude suprema; é, por

11 Cf. Protréptico, fr. 2 Ross. Apud. REALE, Giovanni, Introdução a Aristóteles. 10a ed. Lisboa – Portugal: Edições 70, 1997. p.18

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assim dizer, a chave da vida humana.12 Assim sendo, a filosofia nos faculta à

felicidade, e esta se realiza na atividade do pensamento.

E foi desenvolvendo essa investigação filosófica, que

Aristóteles desenvolve sua extensa e variada obra filosófica, onde contempla a

análise das virtudes humanas em suas obras sobre ética, e dedica em especial

um livro sobre a Justiça, na obra Ética a Nicômaco, a qual é tema desta pesquisa.

1.2 JUSTICA GERAL

O estudo ora desenvolvido se estrutura com base no livro V,

da Ética a Nicômaco, onde se procura os conceitos operacionais que

fundamentam a Teoria da Justiça que Aristóteles desenvolveu, ao que parece é o

grande conceito que irrompe milênios e continua a ser ponto de referência de

muitos ordenamentos jurídicos no mundo.

Aristóteles, ao especificar o seu estudo sobre Justiça, indaga

o que diz respeito à Justiça e à injustiça. Observa, também, que se deve fazer

uma análise para saber com que espécie de ações a Justiça e a injustiça se

relacionam, que espécie de meio-termo é a Justiça e entre que extremos se

encontra o ato justo.13

Aristóteles adota a opinião geral, que tem como base a

Justiça como “[...] aquela disposição de caráter que torna as pessoas propensas a

fazer o que é justo, que as faz agir justamente e a desejar o que é justo; de modo

análogo, a injustiça é seu contrário.”14

Utilizando-se da técnica de observar os contrários, afirma

que se um dos contrários for ambíguo, o outro também o será15. Acrescenta que

Justiça e injustiça parecem ser termos ambíguos, mas que passam

despercebidos, porque seus diferentes significados se aproximam uns dos outros.

12 Cf. Protréptico, fr. 6 Ross. 13 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129a, 01 14 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129a, 10 15 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129a, 25

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A seguir, o filósofo procura determinar as várias acepções

do que é um homem injusto.16 Nestes termos, acompanha-se os dizeres de

Aristóteles: “Tanto o homem que infringe a lei como o homem ganancioso e

ímprobo são considerados injustos, de tal modo que tanto aquele que cumpre a

lei como o homem honesto obviamente serão justos.”17 A definição de homem

injusto está relacionado a bens. A ação do homem injusto é escolher os bens de

forma não diligente e gananciosa.

Como, então, verificar se os atos são justos ou injustos? O

homem injusto é o que age sem lei e o justo é o cumpridor da lei.18 Neste sentido,

todos os atos conforme à lei são atos justos em certo sentido, pois os atos

prescritos pela arte do legislador19, visam à Justiça.

Diz-se que as leis visam à Justiça, de sorte que aqui se

retoma a definição primeira sobre o que é Justiça. E, nas disposições sobre todos

os assuntos, as leis visam ao bem comum, seja de todos, seja dos melhores ou

daqueles que detêm o poder ou algo semelhante.20 E, sob essa visão entende-se

que os atos justos são aqueles que tendem a produzir e a preservar a felicidade

de todos os que compõem a sociedade política.21

Entende-se que a Justiça como disposição da alma (éxis –

Capacidade racional), é analisada a partir do senso comum, da prática, do ethos

para ser compreendida na pólis. O ser humano realiza atividades e múltiplas são

suas finalidades que podem ser a riqueza, a saúde, fins que satisfazem e

proporcionam prazer. Mas a sociedade deve buscar um fim ulterior que é

desejado por todos e que vise ao bem comum, sendo que, o que é desejado na

interação social deve ser um bem supremo, este bem é a felicidade. A felicidade,

como bem supremo, “é buscada sempre por si mesma e nunca no interesse de

16 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129a, 30 17 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129a, 30 18 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129b, 10 19 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129b, 10 20 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129b, 20 21 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129b, 20

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uma outra coisa;”22. Tem um caráter objetivo, pois a atividade se dá em vista

deste fim.

As ações que tendem para este fim, a felicidade, são

voluntárias, livres e virtuosas. Pode-se dizer que são indivisíveis, na ordem

prática. Muitos podem ser os fins que se deseja alcançar e diversos meios

podem ser utilizados, mas há um fim que não depende de outra coisa, que é um

fim em si mesmo. Ora, parece que tal fim é a felicidade por excelência. Sendo a

felicidade o bem supremo, Aristóteles dedica seu primeiro livro da Ética a

Nicômaco, para esclarecer o que é a Felicidade.

Segundo ensina o Soares: “[...] é observando a finalidade

humana que se encontra a dimensão ética, e neste aspecto, a Justiça em

Aristóteles é identificada dentro de uma concepção teleológica.”23 É nas ações

que o ser humano realiza que se pode identificar o bem que se deseja, a

finalidade humana que se quer alcançar. Existe uma infinidade de finalidades,

muitas ainda a serem descobertas, outras já aclamadas, e a cada uma delas

encontramos entrelaçado seu respectivo bem, que foi fator que impeliu o

desenvolvimento da atividade24. Sobre o que é o bem assim conceituou

Aristóteles: “[...] o bem é aquilo a que as coisas tendem.”25 O bem que se pode

diagnosticar e que é comum a todas as finalidades que existem, o bem desejado,

Aristóteles chamou de sumo bem e o identificou como sendo a felicidade.

Para a felicidade ser alcançada deve o ser humano agir

guiado pela razão, agir justamente e buscar a Justiça. Agindo desta forma,

controlará os instintos e a volúpia, de sorte que a forma mais correta é seguir a

lei, por ser ela quem aponta os caminhos mais virtuosos26.

22 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1094a, 20 23 SOARES, Josemar Sidinei. Os Pressupostos Filosóficos da Idéia de Justiça na História da Filosofia: contribuições para o ensino jurídico. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, 2003. p.8 24 SOARES, Josemar Sidinei. Os Pressupostos Filosóficos da Idéia de Justiça na História da Filosofia: contribuições para o ensino jurídico. p.8 25 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1094a, 01 26 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129a, 30.

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1.2.1 Justiça e Moral

Os atos praticados com Justiça tendem a levar o ser

humano a alcançar a excelência moral. Neste raciocínio, deve-se entender que

não há oposição entre política e moral27. Para que se alcance a excelência moral

e intelectual, o ser humano precisa desenvolver suas faculdades intelectiva e

prática. Isso deve acontecer por força do hábito. O hábito torna o ser humano

virtuoso. Seguir as leis é a possibilidade de alcançar a virtude. A Sociedade

política cria as leis que vão orientar a natureza humana na busca do bem

supremo, que a sociedade deseja, que é a felicidade.

Tomás de Aquino,28 exímio comentador da Filosofia de

Aristóteles, apresenta a Justiça como a virtude do ser humano que o leva à

excelência moral. Segundo Aquino “sendo toda virtude um hábito”,29 deve este

ser um ato bom , pois a Justiça tem como sua própria matéria os atos relativos

aos outros. Numa redução de sua definição conclui: “a Justiça é um hábito pelo

qual, com vontade constante e perpétua, atribuímos a cada um o que lhe

pertence”.30 Assim, Aquino se aproxima da definição feita por Aristóteles. E, nesta

mesma linha de pensamento, ensina Giovanni Reale:

Realizando gradualmente atos justos, tornamo-nos justos, ou seja, adquirimos a virtude da Justiça que, em seguida, permanece em nós de forma estável como um habitus, contribuirá sucessivamente para que realizemos como felicidades ulteriores atos de Justiça. Realizando paulatinamente atos de valor tornamo-nos valentes, isto é, adquirimos o hábito do valor que, mais tarde, nos ajudará a realizar facilmente atos de valentia. E assim sucessivamente. Em suma, para Aristóteles, as virtudes éticas aprendem-se do mesmo modo que se aprendem as diferentes artes, que também são hábitos”.31

27 CHÂTELET, François. História da Filosofia. De Platão a São Tomás de Aquino. Vol. I. Lisboa; Publicações Dom Quixote, 1995. 28 Tomás de Aquino foi sem sombra de dúvidas o grande comentador da obra de Aristóteles, seguindo os estudos de seu mestre Alberto Magno, foi muito além de glosas na obra, mais, colocou o pensamento aristotélico no Ocidente novamente, mantendo originalidade do pensamento (grifo nosso). 29 AQUINO, Tomás de, Suma Teológica. v. V, p. 2486 30 AQUINO, Tomás de, Suma Teológica. v. V, p. 2487 31 REALE, Giovanni. Introdução a Filosofia. p.88

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Na concepção de que a Justiça é alcançada pela prática

constante de atos bons, estes devem ser realizados em relação ao outro. Uma

educação conveniente ensinará, que os atos praticados com Justiça tornam as

ações dos seres humanos boas, e aquele que pratica boas ações torna-se bom32.

Tornar-se bom é praticar habitualmente as virtudes éticas.

Para Aristóteles não há virtudes se existir excesso ou defeito. A virtude, pelo

contrário, implica na justa proporção que é a mediania entre dois extremos. Para

compreender os “excessos”, “defeitos” e “justo meio” das virtudes éticas, é

necessário analisar os sentimentos, as paixões e as ações do ser humano.

No entendimento de Giovanni Reale, a doutrina da virtude

assim se apresenta:

“Esta doutrina da virtude como “justo meio” entre dois extremos é ilustrada por uma ampla análise das principais virtudes éticas (ou melhor, das que o Grego de então considerava como tais), naturalmente não deduzidas segundo um fio condutor preciso, mas derivadas empírica e cumulativamente, de um modo rapsódico (harmonioso). A virtude do valor é o “justo meio” entre os excessos da temeridade e da covardia; o valor é, pois, a justa medida que se impõe ao sentimento de temor que, se estiver privado do controle racional, pode degenerar, quer por defeito, em covardia, quer pelo excesso oposto, em audácia. A temperança é o justo meio entre os excessos da intemperança ou libertinagem e a insensibilidade; a temperança é, pois, a atitude justa que a razão nos obriga tomar perante determinados prazeres. A liberalidade é o “justo meio” entre a avareza e a prodigalidade; a liberalidade é, pois, o comportamento justo que a razão nos obriga a assumir em relação à acção de gastar dinheiro. E assim sucessivamente.33

A Justiça, entendida neste sentido, consistirá, portanto, na

justa medida com que se dividem os benefícios, as vantagens e os ganhos, ou os

males e as desvantagens, e constitui uma posição média “porque esta é a

característica do justo meio, ao passo que a injustiça o é dos extremos”.34

32 AQUINO, Tomás de, Suma Teológica. v. V, p. 2490 33 REALE, Geovani. Introdução a Filosofia. p.89 34 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129b, 27-30

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1.2.2 Da Justiça Legal

Questiona-se como o homem pode praticar bons atos e

tornar-se bom? Basta que ele aja conforme a lei. Aquele que age conforme a lei

está praticando o que se denomina de Justiça Legal, ou virtude geral.35 A Justiça

Legal determina que os atos humanos sejam ordenados ao fim que o Estado tem

para seus cidadãos, que é o bem comum.

Aristóteles assim considera a Justiça Legal:

E a lei determina que pratiquemos tanto os atos de um homem corajoso (isto é, que não desertemos de nosso posto, nem fujamos, nem abandonemos nossas armas), quanto atos de um homem temperante (isto é, que não cometemos adultério nem nos entreguemos a luxúria), e os de um homem calmo (isto é, que não agridamos nem caluniemos ninguém); e assim por diante com respeito às outras virtudes, prescrevendo certos atos e condenando outros. A lei bem elaborada faz essas coisas retamente, ao passo que as leis elaboradas às pressas não o fazem tão bem assim. Assim, essa é a virtude perfeita, não pura e simplesmente, mas em relação a outrem.36

Comentando o tema, Aquino define Justiça Legal, também

chamada de virtude geral, aquela que ordena os atos praticados pelo homem nas

outras virtudes para o fim da Justiça.37 Assim, como a Justiça Legal ordena todos

a um fim, devem existir certas virtudes particulares, como a temperança e a

fortaleza, ordenando a um fim pessoal que, de certa forma, faz o homem reflitir

sobre suas ações.38

É nas relações sociais que se pode analisar os atos justos,

pois a Justiça é a virtude completa. Enquanto as demais virtudes, a temperança, a

prudência, a coragem podem ser exercidas em relação a si próprio. Deste modo,

enquanto até o pior dos homens pode agir de modo a utilizar-se de tais virtudes, o

35 AQUINO, Tomás de, Suma Teológica. v. V, p. 2494 36 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1129b 25 / 1130a 10 37 AQUINO, Tomás de, Suma Teológica. v. V, p. 2492 38 AQUINO, Tomás de, Suma Teológica. v. V, p. 2494

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mesmo não ocorre com a Justiça, pois esta só pode ser realizada em relação ao

outro.

A Justiça é considerada a mais completa das virtudes, pois a

ação não é relacionada a si próprio, mas nas ações que se relacionam com os

outros. É uma disposição de caráter que visa ao bem comum. É o sentido de

alteridade. Pois se relaciona com o outro, fazendo o que é vantajoso a um outro,

quer se trate de um governante, ou de um membro da comunidade.39

Na primeira parte de sua exposição sobre Justiça,

Aristóteles apresenta um conceito geral relacionando com virtude. Aliás, nesse

sentido, a Justiça não é uma parte da virtude, mas a virtude inteira e a mais

completa.

Identifica-se o justo como aquele seguidor da lei e probo; e o

injusto em ilegítimo e ímprobo. Ao ilegítimo corresponde o sentido de injustiça.

Mas ilegitimidade e improbidade não podem ser igualadas no sentido amplo,

tornando-se necessário estudá-las como parte do vício completo. A Justiça ou

injustiça no sentido particular deverá ser analisada observando os atos ordenados

pela lei. É evidente que a lei é constituída por atos prescritos, tendo em vista a

virtude considerada como um todo.40

Entende-se que há uma Justiça em sentido amplo e outra

em sentido estrito. Ambas consistem em uma relação para com o outro.41

Enquanto uma diz respeito a tudo com que se relaciona ao homem bom, a outra

diz respeito à honra, ao dinheiro ou à segurança, motivada por prazer que se

alcança pelo ganho.42

1.2.3 Justiça Distributiva

Ao discorrer sobre a Justiça no sentido particular, Aristóteles

trata, primeiro, da Justiça das distribuições. Aquela que se relaciona às pessoas e

39 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1130a, 01 40 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1130b, 25 41 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1130b, 01 42 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1130b, 05

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seus méritos, ou seja, às qualidades necessárias para receber as magistraturas,

dinheiro ou coisas que devam ser distribuídas.

Da Justiça particular e do que é justo no sentido que lhe corresponde, uma das espécies é a que se manifesta nas distribuições de magistraturas, de dinheiro ou das coisas que são divididas entre aqueles que têm parte na constituição43

A Justiça Distributiva, de honra ou mérito, funda-se na

convenção e distribuição do justo44. O critério para identificar a distribuição de

honras ao justo diferencia-se nos diferentes sistemas de governo.

De modo simplificado, pode-se dizer que a aplicação da

Justiça Distributiva assim se observa: na democracia, a distribuição está na

condição de homem livre; na oligarquia, está no grau de riqueza ou no grau de

nobreza; na aristocracia, define-se pelo grau de excelência.45 O mérito que

possibilita receber as honras se faz na Justiça pelo exercício de uma vida prática

que está em conformidade com a virtude moral.

Neste entendimento, o mérito indica o merecimento, a

recompensa que se considera Justiça. Esta recompensa por merecimento é dada

à pessoa, considerando-a de forma individualizada, não a sua ação, mas a sua

disposição no agir de forma virtuosa, com os princípios de coragem, Justiça,

humildade, moderação, prudência. A aprovação destas virtudes e dos méritos é

reconhecida e tem seu fundamento na consciência da Sociedade, que enaltece as

ações virtuosas do ser humano de forma individualizada. Neste aspecto, para

Aristóteles:

o princípio de Justiça Distributiva funda-se na igualdade, mas não para todos, senão para os que são iguais entre si. Da mesma forma, justa é a desigualdade, porém para os desiguais entre si.46

A Justiça, como princípio da igualdade, é sempre relativa. O

fundamento da igualdade deve ser buscado na virtude moral. Deste raciocínio, se 43 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1130b, 10 44 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1130b, 30 45 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça, Virtude Moral e Razão. Curitiba: Juruá Editora, 2004. 46 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça,Virtude Moral e Razão. p. 57

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entende que todo ser humano, independente de sua riqueza material, deve ter

assegurado a si o princípio da igualdade, pois, neste caso, a igualdade equipara

seres humanos e não coisas. Para que a distribuição das honras seja alcançada

com Justiça, Aristóteles teoriza utilizando-se da fórmula de aplicação da

progressão geométrica.47 A Justiça Distributiva é aquela que regula as relações

entre o comum (de todos) e o particular, onde os bem comuns são distribuídos

proporcionalmente.

No entendimento do professor Montoro:

“a igualdade proporcional ou relativa é a que se realiza na distribuição dos benefícios e encargos entre os membros de uma comunidade: se A, contribui com 50, recebe 5, B, que contribui como 80, receberá 8 (5/50 = 8/80). Na distribuição dos lucros de uma sociedade, se A, que contribuiu com 50, recebeu 5, e b, que contribuiu com 80, recebeu 8, foi respeitada uma igualdade básica.”48

Conforme Aristóteles, o justo é o proporcional e o injusto é o

que viola a proporção49. Questiona-se se de fato a Justiça Distributiva só teria

eficácia entre a comunidade política. Parece que não se convalida a hipótese de

que não se possa aplicar a Justiça Distributiva a todos os entes que compõem a

sociedade. A sociedade Política é a que deve realizar a Justiça Distributiva entre

seus membros.

A aplicação da Justiça Distributiva estende-se a todas as

comunidades que apresentam características de instituição. A participação dos

particulares no bem comum deve acontecer observando uma igualdade

proporcional. Têm-se por base a condição das pessoas, a natureza do bem

distribuído e a espécie de comunidade que se aplica a Justiça Distributiva. É

dever das autoridades proporcionar aos membros da sociedade uma participação

eqüitativa no bem comum, garantindo o Direito de todos participarem.

47 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1131b, 05 48 MONTORO, André Franco. Introdução à ciência do Direito. 25 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 136 49 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1131b, 30

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1.2.4 Justiça Corretiva

Sob o princípio da igualdade se dá a compreensão da

Justiça Corretiva, como aquela que desempenha uma função Corretiva nas

transações entre indivíduos50. Aristóteles coloca a aplicação da Justiça Corretiva

sob duas modalidades: nas relações voluntárias e involuntárias. As voluntárias

estão ligadas a forma de ação das partes que estão envolvidas. As partes têm

ciência dos atos que estão praticando. Nas ações involuntárias, uma das partes

sempre perde sem consentimento.

“Voluntárias são, por exemplo, as compras e vendas, os empréstimos para consumo, o empréstimo para uso, o penhor, o depósito, a locação (todas essas ações são chamadas voluntárias porque sua origem é voluntária). Das transações involuntárias, algumas são clandestinas, como o furto, o adultério, o envenenamento, o lenocínio, o engodo com o objetivo de escravizar, o falso testemunho; e outras violentas, como a agressão, o seqüestro, o assassinato, o roubo, a mutilação, a injúria e o ultraje.”51

A correção é necessária quando nessas transações ocorrem

vícios nas suas relações, como bem definiu Tomás de Aquino ao comentar a obra

de Aristóteles. Há entendimento, também, que a Justiça Corretiva tenha a divisão

em: Justiça comutativa e judicial. Del Vecchio52 vê, na Justiça Corretiva de

Aristóteles, essas duas subespécies.

A Justiça comutativa é a que se relaciona com as ações

voluntárias, onde se pressupõe igualdade das partes. Prevalece, neste caso, o

acordo existente entre as partes, que é o elemento principal para a concretização

dos acordos contratuais.

Pressupõe a participação de pelo menos duas pessoas.

Estas devem estar equiparadas uma a outra, para que não haja a necessidade de

intervenção do juiz. A Justiça aqui usa o critério absoluto de igualdade entre bens

50 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1131a, 05 51 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: editora Martin Claret, 2004. 1131a, 5. 52 DEL VECCHIO, Giorgio. Justice. Hardcover: Philosophical Library,1953. 236p. p.49

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e coisas, como salário e trabalho, dano e indenização. É, portanto, Justiça do

Direito privado.

Adotada a subdivisão na Justiça Corretiva, a intervenção

judicial é aplicada quando se faz necessário a reparação contra a vontade de uma

das partes.53

Considerando a proporção matemática aritmética que

orienta a Justiça Corretiva, é irrelevante se uma pessoa boa lesa uma pessoa má,

ou se uma pessoa má sofre injustiça de uma pessoa boa. Não se discute nesta

Justiça particular as qualidades ou as virtudes da pessoa, posto que as pessoas

são tratadas igualmente. Mas se procura restabelecer o meio-termo entre os

excessos, ou seja, entre o ganho de um e a perda de outro. O tratamento é dado

pelo Estado, através de seu representante legal, aquele que vai estabelecer o

meio-termo, o juiz.

1.2.5 Do juiz

Na Justiça Corretiva o principio da igualdade está nas

relações e não nas pessoas. As relações devem ser corrigidas, pois se deve

buscar equilíbrio entre o ganho e a perda. Esta correção, de perda ou ganho,

sendo fruto da lei, é de responsabilidade do Estado. O Estado age através do seu

representante legal, o juiz. Este, se utiliza da lei, que considera apenas o caráter

distintivo do delito, isto é, esclarece que a pessoa que cometeu é autora e a outra

que sofreu, a vítima do delito. O juiz procura restabelecer a igualdade justa. Os

juizes, considerados uma espécie de Justiça animada, são procurados como

intermediários. Em muitos casos são mediadores dos litígios, pois se os litigantes

obterem um meio-termo, obterão o que é justo, pois se entende que o meio-termo

é justo.54 A fórmula aritmética é utilizada para concretizar essa correção.55

Não se leva em conta o caráter das pessoas, mas o dano ou

violações nas coisas. As pessoas buscam o juiz, ou mediador, em determinados

casos, para dar solução às disputas. Muitas vezes o juiz comparece para

53 DEL VECCHIO, Giorgio. Justice, p.49 54 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1132a, 25. 55 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça,Virtude Moral e Razão. p. 59

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restabelecer a igualdade, por meio da penalidade, retirando do infrator o ganho e,

quando apurada a perda da vítima, procura restabelecer a igualdade que se dá

procurando um meio-termo.

“[...] quando ocorrem disputas as pessoas recorrem ao juiz. Recorrer ao juiz é recorrer à Justiça, pois a natureza do juiz é uma espécie de Justiça animada, e as pessoas procuram o juiz um intermediário, e em algumas cidades-Estado os juizes são como mediadores, na convicção de que, se os litigantes conseguirem o meio-termo, obterão o que é justo. Portanto, justo é um meio-termo já que o juiz o é”.56

A Justiça judicial está ligada às relações de julgamento.

Quando há violações, necessário se faz buscar uma paridade entre o dano e a

reparação, de modo que o juiz, neste caso, restabelece a igualdade por meio da

pena.

1.2.6 Meio Termo

Surgem os questionamentos: como ser ou atribuir o justo? A

aplicação do meio-termo poderia ser válida para ambas Justiças particulares? No

tocante a meio-termo, parece que seu uso não pode ser igual. Pois na Justiça

Distributiva, há uma aplicação da proporcionalidade geométrica, na Justiça

Corretiva, a proporção é aritmética.

A Justiça Distributiva, no uso da proporção geométrica, dá

coisas que pertencem ao todo (de todos), ao particular conforme sua importância.

Sendo assim, quanto maior é a importância do particular na sociedade, maior será

o seu ganho. A Justiça Distributiva não se dá na igualdade de uma coisa e outra,

mas na proporção de uma coisa e as pessoas, de modo que, se uma pessoa

excede a outra na sua importância, também a coisa que lhe é dada excederá em

sua proporção. A Justiça Distributiva tem a função de manter o meio termo57.

Na Justiça Corretiva, a igualdade se dá de forma aritmética,

nas relações de troca, como é o caso, sobretudo, da compra e venda, nas

56 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1132a, 20 57 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1132b, 05

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transferências a titulo gratuito e nos depósitos. Sendo a proporção aritmética, a

igualdade se dá nas coisas que precisam ter valor igual, de modo que se alguém

recebe a mais do que era seu, deve restituir.

Com efeito, quando alguma coisa é subtraída de um de dois seguimentos iguais e acrescentada ao outro, este excede o primeiro pelo dobro da parte subtraída, já que, se o que foi subtraído de um segmento não fosse acrescentado ao outro, a diferença seria de um só.58

Sendo assim, o meio-termo está entre o ponto maior

daquele que subtraiu e acrescentou ao seu e o ponto maior daquele que foi

subtraído e perdeu. Isso mostra que não basta tirar daquele que subtraiu, mas é

necessário acrescentar ao que foi subtraído.

1.2.6.1 Reciprocidade e retribuição proporcional

Reciprocidade não é sinônimo de Justiça, visto que a

reciprocidade não se identifica nem com Justiça Distributiva nem com Corretiva.

Para as injustiças cometidas contra pessoas e nas

transações de troca em espécie, foram instituídas as penas, e criado o dinheiro.

As penas são aplicadas nas transações involuntárias e o dinheiro serve como uso

de meio-termo nas transações voluntárias.

O dinheiro é o que permite que as sociedades se

mantenham unidas. O dinheiro não existe por natureza, mas por força de lei. Os

homens criaram o dinheiro para tornar os bens comensuráveis, permitindo a

equiparação dos bens entre si. As pessoas se associam para trocar, pois a

felicidade também se encontra no desfrutar das coisas materiais.

1.2.7 Justiça Política

A Justiça Política é concebida entre os Homens livres que

visam ao bem comum e buscam a felicidade. A Justiça é em parte natural e em

58 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1131a, 30

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parte legal.59Aristóteles teoriza, em sua obra A Política, a cidade como seguindo

uma ordem natural. A primeira sociedade é constituída por muitas famílias60 que

formam os burgos. A sociedade formada por inúmeros burgos constitui-se uma

cidade completa61. Uma cidade subsiste para uma existência feliz, pois a

felicidade das pessoas é a razão pela qual a cidade se integra. A busca da

felicidade é da natureza humana, sendo esta natureza o real fim de todas as

coisas. É natureza das cidades manter os diversos seres integrados para que

atinjam o completo desenvolvimento.

Teoriza Aristóteles: “Fica evidente, portanto, que a

cidade participa das coisas da natureza, que o homem é um animal político, por

natureza, que deve viver em sociedade. [...]”. A parte natural da Justiça Política é

aquela que tem a mesma força em todos os lugares. A parte legal é aquela que

tem sua origem no justo natural, ou seja, por força da lei ou convenção.

De qualquer modo, existe uma Justiça por natureza e uma

por convenção62. Ambas são mutáveis. Por meio de exemplos, Aristóteles

apresenta a possibilidade de isso acontecer: “[...] por natureza, a mão direita é

mais forte, porém é possível que qualquer pessoa possa vir a se tornar

ambidestra”.63 “As coisas que são justas apenas em virtude da convenção e da

conveniência assemelham-se a medidas, pois as medidas para o vinho e para o

trigo não são iguais em toda parte [...]”.64

A Justiça Política é organizada seguindo o critério de

organização de cada sociedade e conforme a constituição a qual está

subordinada. Os democratas a identificam com a condição de homens livres, os

partidários da oligarquia com a riqueza e os aristocratas com a excelência.

Mas não obsta o regime de governo para decidir se a lei

corresponderá à natureza à qual se destina. Pois a lei poderá nascer eivada de

59 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1134b, 20. 60 ARISTÓTELES. Política. São Paulo: editora Martin Claret, 2004. Livro I, § 7 61 ARISTÓTELES. Política. Livro I, § 8 62 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1135a, 25. 63 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1134b, 30 64 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1135a, 01.

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vícios, se não corresponder à busca do bem comum e da felicidade dos que

vivem em Sociedade.

1.2.8 Eqüidade

A Eqüidade é a interpretação do Estado-juiz na lei geral para

aplicá-la ao caso particular, quando há lacunas na lei. A Eqüidade tem por função

adequar a lei, do âmbito geral para o particular, na realização da Justiça. O juízo

de Eqüidade corresponde à Justiça do ponto de vista particular, e representa a

concretização da Justiça.

A lei, no momento em que fixa regras gerais, pode não

contemplar particularidades existentes nos casos concretos.

A lei tem necessariamente caráter geral; por isso às vezes sua aplicação é imperfeita ou difícil, em certos casos. Nesses casos, a eqüidade intervém para julgar, não com base na lei, mas com base na Justiça que a própria lei deve realizar.65

Ela consiste na criação de regras particulares, que se

aplicam, exclusivamente, às especificidades de cada caso. Na aplicação da

Justiça como Eqüidade, não se considera injusta a lei genérica, por não prever

hipóteses de particularidades normativas, mas uma adequação da lei. Para

ilustrá-la, Aristóteles refere-se “[...] à régua de chumbo utilizada pelos construtores

em Lesbos, a qual não é rígida e se adapta à forma da pedra; da mesma forma a

lei deve se adaptar aos fatos”.66

A Eqüidade não constitui forma complementar de Justiça, se

não a própria Justiça. Ao pesquisar o tema Eqüidade, encontra-se, também, a

idéia que Rawls67 apresenta no § 14, sobre o problema da Justiça Distributiva.

Como ordenar as instituições da estrutura básica num esquema unificado de instituições para que um sistema de cooperação

65 ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. Trad. Ivone Castilho Benedetti. 4a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p.340 66 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: editora Martin Claret, 2004. 1137b, 30. 67 RAWLS, John. Justicia como equidad – materiales para una teoria de la justicia. Trad. Miguel Angel Ridilla. Madrid: Ed. Tecnos. 1986.

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social eqüitativo, eficiente e produtivo possa se manter no transcurso do tempo, de uma geração para a outra?

A resposta apresentada para este problema, por Rawls, é o

de que o eqüitativo encontra-se no entendimento de como se dá a cooperação

social. Os cidadãos que se encontram em uma sociedade bem ordenada em que

estão presentes as liberdades básicas iguais, com igualdade eqüitativa de

oportunidades, cooperam para produzir os recursos sociais.

Mas a questão de distribuição eqüitativa reside no

conhecimento da estrutura na qual a sociedade está organizada, bem como ao

conhecimento das exigências especificadas nas normas, que devem ser

honradas. São questões procedimentais estabelecidas pelas instituições, das

quais indivíduos e associações participam. Estas instituições estabelecem normas

de como a sociedade deve se organizar de modo a manter o equilíbrio.

Dentre as formas que as sociedades encontram para que

ocorra a Justiça Distributiva com Eqüidade, estão o sistema tributário, concursos

públicos, cujas regras, quando bem definidas, possibilitam uma igualdade

eqüitativa na participação que respeita o princípio da diferença.

Não se quer, aqui, esclarecer o ideário de Rawls, mas

demonstrar que a idéia aristotélica tem seu uso na filosofia contemporânea e

muito pode contribuir para o alcance da Justiça.

Mesmo que a Sociedade política crie leis com a intenção de

praticar a Justiça, muitas vezes não consegue que seja aplicada a lei, no sentido

stricto, ao caso em discussão. Aristóteles emprega o termo Eqüidade como

adequação da lei ao caso fático, para o alcance da excelência moral. A Eqüidade

denota a excelência moral, no seu mais elevado grau de Justiça. A função da

Eqüidade é o de adequar a lei do âmbito geral para o particular, na realização da

Justiça. O juízo de Eqüidade é a concretização da Justiça.

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CAPÍTULO 2

JURISDIÇÃO

2.1 ORIGEM

2.1.1 Considerações iniciais

O ser humano tende a se organizar em Sociedade para

sobreviver, pois é um ser de sentimentos afetivos e, além disso, necessita de

cuidados desde seu nascimento. É da natureza humana a vida em sociedade.

Como já afirma Aristóteles “[...] o ser humano é um ser social”68. A decisão do ser

humano de viver em sociedade está ligada a uma série de fatores, sejam

econômicos, históricos, políticos. Aqui interessa estudar o fator político, pois este

mostra a capacidade do ser humano organizar uma sociedade de Direito. Se o ser

humano tem necessidade de viver em sociedade, seus membros buscam

organizar-se estabelecendo Direitos. É consenso, entre os doutrinadores, afirmar

que não há sociedade sem Direito. Segundo o entendimento de Cintra,

[...] o Direito exerce na sociedade: a função ordenadora, isto é, de coordenação dos interesses que se manifestam na vida social, de modo a organizar a cooperação entre pessoas e compor os conflitos que se verificam entre seus membros.69

É na vida social que surgem as relações intersubjetivas, as

quais, quando conflituosas, exigem a intervenção jurisdicional existente na

sociedade, que se utilizará da ordem jurídica para pôr fim aos conflitos.

A tarefa da ordem jurídica é exatamente a de harmonizar as relações sociais intersubjetivas, a fim de ensejar a máxima realização dos valores humanos com o mínimo de sacrifício e desgaste. O critério que deve orientar essa coordenação ou

68 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça,Virtude Moral e Razão. p.48 69 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 17aed. São Paulo: Malheiros, p.19.

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harmonização é o critério do justo e do eqüitativo, de acordo com a convicção prevalente em determinado momento e lugar.70

Pode se dizer que o ordenamento jurídico, estabelecido pela

sociedade, oportuniza a seus membros a solução dos conflitos dentro do Direito.

Mas os critérios a serem seguidos devem ser os da Justiça, pois só a existência

de Direitos não garante a vida em sociedade.

Toma-se o exemplo da propriedade de um terreno. Mesmo

que o Direito garanta a um ser o proprietário e dispor deste bem, poderá haver a

pretensão do outro em tomar para si este bem, gerando um conflito. Este

necessita ser solucionado para que a sociedade possa permanecer unida.

Ademais, a sociedade visa, através de seus organismos

institucionais, estabelecer paz social e harmonia entre seus membros. Mas nem

sempre foi dessa forma. A vida em Sociedade, desde os primórdios, sofreu

mudanças no modo de se organizar. Conflitos sempre existiram e diferentes

formas foram utilizadas, ao longo dos tempos, para pôr fim a estes conflitos:

autotutela, autocomposição, arbitragem e Jurisdição.

2.1.1.1 Autotutela

Nas fases primitivas da civilização, não havia um Estado que

estabelecesse normas gerais que regrasse a vida dos particulares. Não havendo

lei, na há de se falar em garantia de Direitos através do Estado.

Assim, quem pretendesse alguma coisa que outrem o impedisse de obter haveria de, com sua própria força e na medida dela, tratar de conseguir, por si mesmo, a satisfação de sua pretensão. A própria repressão aos atos criminosos se fazia no regime de vingança privada e, quando o Estado chamou a si o jus punitionis, ele o exerceu inicialmente mediante seus próprios critérios e decisões, sem interposição de órgãos ou pessoas imparciais independentes e desinteressadas.71

70 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. p.19. 71 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. p.21

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A essa forma de resolver os conflitos chama-se autotutela, o

que significa dizer que a solução dos conflitos e desavenças era feita através da

imposição de uma das partes sobre a outra, não garantindo a Justiça, mas a

vitória do mais forte, mais astuto ou ousado. Havia sempre uma parte que se

submetia a outra mesmo que perdesse todos seus bens.

2.1.1.2 Autocomposição

Outra forma de solução dos conflitos é a autocomposição,

forma pela qual as partes de comum acordo buscam resolver suas divergências, a

solução é alcançada quando uma das partes abre mão do interesse ou parte dele,

ou mesmo ambas abrem mão de seu interesse.

São três as formas de autocomposição (as quais, de certa maneira, sobrevivem até hoje com referência aos Direitos disponíveis): a) desistência (renúncia à pretensão); b)submissão (renúncia à resistência oferecida à pretensão); c) transação (concessões recíprocas). Todas essas soluções têm em comum a circunstancias de serem parciais – no sentido de que dependem da vontade e da atividade de uma ou ambas as partes envolvidas.72

Mas a autocomposição, também, não satisfaz plenamente a

solução dos conflitos, pois onde não há o consenso entre as partes, em ceder ou

renunciar interesses, o conflito continua. Como dependem da vontade das partes,

muitas são as ocasiões em que não há solução, visto que uma não quer ceder, ou

ambas não o querem. Esse impasse possibilitou o surgimento de uma nova forma

de autocomposição: a arbitragem.

2.1.1.3 Arbitragem

A insatisfação, gerada pela solução parcial de seus conflitos,

fez com que os indivíduos buscassem uma outra forma de solucionar seus atritos.

Através de uma pessoa de confiança, buscavam uma solução amigável e

imparcial. Surge a função do árbitro, que nos primórdios era atribuída aos

sacerdotes, por terem ligações com as divindades garantiria uma decisão

72 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. p.21

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acertada e de acordo com a vontade dos deuses; ou aos anciãos, por terem

conhecimento das tradições e costumes do grupo social ao qual pertenciam os

interessados. Dessa forma de decisão aparece a figura do juiz.

A arbitragem foi, também, uma das primeiras formas do

Estado se impor perante os particulares. Sua inserção pelo Estado remonta ao

período do Direito romano arcaico. “Os cidadãos em conflito compareciam

perante o pretor, comprometendo-se a aceitar o que viesse a ser decidido”.73

Tem-se a substituição da arbitragem facultativa para a arbitragem obrigatória, que

tem na figura do pretor, aquele que conhece o mérito dos litígios entre particulares

e profere a sentença.

Com ela completou-se o ciclo histórico da evolução da chamada Justiça privada para a Justiça pública: o Estado, já suficientemente fortalecido, impõe-se sobre os particulares e, prescindindo da voluntária submissão destes, impõe-lhes autoritativamente a sua solução para os conflitos de interesses. À atividade mediante a qual os juízes estatais examinam as pretensões e resolvem os conflitos dá-se o nome de Jurisdição.74

A arbitragem é o modo de solução de conflitos que induz o

ente estatal tomar para si o poder de dirimir os conflitos. Mesmo porque os

conflitantes aceitam com mais senso a decisão proferida por um terceiro que, a

priori, estaria neutro às circunstancias que geraram os conflitos. Dessa forma, o

Estado organiza toda uma estrutura para atender as reivindicações conflituosas

que envolvem seus membros.

2.1.1.4 Jurisdição

A origem da Jurisdição não se constitui fruto do acaso, mas

da evolução racional do ser humano. A Sociedade, percebendo a necessidade de

ter um ente capaz de pôr fim aos conflitos, organiza um Estado soberano e com

autoridade e atribui a este a função de manter a Paz Social. Surge, então, a

Jurisdição que terá a capacidade de dirimir os conflitos que envolvem os

73 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. p.23 74 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. p.23

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particulares (inclusive o próprio Estado), decidindo e fazendo com que tais

decisões sejam aceitas.

A origem etimológica da palavra Jurisdição vem do Latim

Jurisdictio.75 Seu surgimento remonta o período do Direito romano. Para o Direito

romano a concepção de Jurisdição compreendia exclusivamente a função de

declarar o Direito, o que limitava o procedimento ordinário, sendo sempre uma

relação de Direito privado.

Na leitura feita sobre a Filosofia de Aristóteles, é possível

observar que seus escritos já apresentavam características para se instituir a

Jurisdição estatal. Os romanos souberam usar desses indicativos e

desenvolveram uma estrutura jurisdicional que se tornou referência ao longo do

tempo.

Aristóteles apresenta os pressupostos para a Jurisdição civil

e penal quando trata da Justiça Corretiva,76 onde o juiz é o meio pelo qual as

cidades-Estados promoveriam a Justiça. Sempre é importante relembrar que a

solução dos conflitos deve estar estritamente ligada à realização da Justiça. A

idéia de Justiça, de Aristóteles, serviu de fundamento para a elaboração de

muitos ordenamentos jurídicos.

Na sua idéia de Justiça, Aristóteles dispõe que cada povo

tem a liberdade de escolher a forma de governo que melhor lhe prover. Poderá

optar por um Estado governado por aqueles que visam às riquezas, os membros

da oligarquia. Por um Estado governado por aqueles que visam a busca da

excelência, os partidários da aristocracia. Ou, por um Estado governado por

aqueles que visam à liberdade do ser humano, os partidários da democracia. E

através das constituições os Estados estabelecem a forma de organização

jurisdicional. Para o estudo que ora se realiza, o modo de governo democrata é o

que estabelece os procedimentos e os meios a serem usados para a solução dos

conflitos e a realização da Justiça.

75 Termo de origem do Direito Romano. 76 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1132a. Recorrer ao juiz é recorrer à tutela do Estado (grifo nosso).

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Como as pessoas não podem mais fazer Justiça com as

próprias mãos, resta a elas a possibilidade solicitar ação do poder estatal, devem

provocar a função jurisdicional através do processo,

instrumento por meio do qual os órgãos jurisdicionais atuam para pacificar as pessoas conflitantes, eliminando os conflitos e fazendo cumprir o preceito jurídico pertinente a cada caso que lhes é apresentado em busca de solução.77

O processo é o meio que o poder político dispõe às partes

para que possam formular suas pretensões e defesas. A partir do qual, o Estado

poderá formular e realizar o Direito àqueles que buscam a Jurisdição.

2.2 CONCEITOS DE JURISDIÇÃO

Desde a organização da Sociedade, em Estado, inúmeros

foram os conceitos atribuídos a Jurisdição. Tendo em vista a diversidade de

conceitos, far-se-á uma breve exposição de alguns conceitos mais utilizados

pelos doutrinadores do Direito.

Segundo Greco Filho, [...] Jurisdição é o Poder, Atividade e

Função. De aplicar o Direito a um fato concreto, pelos órgãos públicos destinados

a tal, obtendo-se a justa composição da lide”78.

Athos de Gusmão conceitua Jurisdição, usando-se dos

ensinamentos do mestre Galeno Lecerda. “É a atividade pela qual o Estado, com

eficácia vinculativa plena, elimina a lide, declarando e/ou realizando o Direito em

concreto”79. Com eficácia vinculativa plena, significa dizer que a lide existente

deve ser eliminada revestindo-se de caráter de definitividade. A coisa julgada é

alcançada por sentença de mérito. A lide é eliminada mediante a declaração e

aplicação do Direito incidente ao caso concreto (processo de conhecimento), ou

mediante a realização do Direito (processo de execução)80.

77 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. p.23 78 GRECO FILHO, Vicente . Direito Processual Civil. São Paulo: Ed. Saraiva, 2003. p167 79 CARNEIRO, Athos de Gusmão. Jurisdição e Competência. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 04 80 CARNEIRO, Athos de Gusmão. Jurisdição e Competência. p. 04

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Para Colucci, “Jurisdição é a função do Estado de compor os

conflitos de interesses pela aplicação da lei ao caso concreto”.81 Segundo Rocha,

é ela “que tem a finalidade de manter a eficácia do Direito em última instância no

caso concreto, inclusive recorrendo à força se necessário”.82

Para Cintra, Grinover e Dinamarco, Jurisdição é,

ao mesmo tempo, poder, função e atividade. Como poder, é a manifestação do poder estatal, conceituado como capacidade de decidir imperativamente e impor decisões. Como função, expressa o encargo que têm os órgãos estatais de promover a pacificação de conflitos interindividuais, mediante a realização do Direito justo e através do processo, E como atividade ela é o complexo de atos do juiz no processo, exercendo o poder e cumprindo a função que a lei lhe comete. O poder, a função e a atividade somente transparecem legitimamente através do processo devidamente estruturado (devido processo legal).83

Opta-se, neste estudo, examinar a Jurisdição como poder,

função e atividade do Estado. Nesta seara, estudar-se-á as características que

compõem a função e a atividade jurisdicional. Antes, porém, é preciso esclarecer

que essa classificação diferencia-se em alguns pontos entre os doutrinadores,

mais em questão de nomenclatura do que de conteúdo.

2.2.1 Características da Jurisdição

A Jurisdição possui algumas características que se tornam

essenciais para a estruturação da Jurisdição estatal. Isto quer dizer que o ente

Estado assume a responsabilidade de resolver os conflitos, apresentando-se de

diversas maneiras.

Substituição: A Substituição surgiu a partir do momento que

a decisão dos conflitos passou a acontecer fora do âmbito da Justiça privada, o

81 COLUCCI, Maria da Glória Lins da Silva. ALMEIDA, José Mauricio Pinto de, Lições de Teoria Geral do Processo. 4aed. Curitiba: Juruá, 1999. p.20 82 ROCHA, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Saraiva, 1991. p.52 83 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. p.131

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Estado toma para si a responsabilidade de apreciar e resolver as controvérsias.

Através da figura do juiz busca uma substituição fiel.

Segundo ensina Greco Filho:

“a característica essencial da Jurisdição, segundo a doutrina consagrada, é a substitutividade, porque o Estado, por uma atividade sua, substitui a atividade daqueles que estão em conflito na lide [...], pois é a função do Estado dizer o Direito e não permitir que os conflitantes busquem Justiça pelas próprias mãos, ainda que legítima, neste sentido a função do Estado em dizer o Direito tem o caráter de definitividade encerrando o devido processo legal”.84

As partes interessadas não podem, nenhuma delas, dizer

definitivamente se a razão está com uma ou com a outra: nem podem, senão

excepcionalmente, invadir a esfera jurídica alheia para satisfazer-se de uma

pretensão. Portando, a única atividade admitida pela lei, quando surge o conflito,

é a do Estado que substitui as partes.85

Lide: A lide pode ser entendida como a pretensão resistida,

ou mesmo, como o próprio conflito de interesses. Theodoro Júnior afirma que,

“há conflito de interesses quando mais de um sujeito procura usufruir o mesmo bem. [...] Há litígio quando o conflito surgido na disputa em torno do mesmo bem não encontra uma solução voluntária ou espontânea entre os diversos concorrentes.”86

Existindo a lide o Estado quando movido na Jurisdição

Voluntária ou na Jurisdição Contenciosa busca solucionar os conflitos. A atividade

jurisdicional da lide é uma atividade provocada. Não há Jurisdição sem ação. É

importante lembrar que os juízes não saem em busca de lides. Mas elas devem

ser movimentadas pelos interessados.

84 GRECO FILHO, Vicente . Direito Processual Civil. p. 168 85 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. p.132 86 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1.Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 31.

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Coisa Julgada: a solução dos conflitos de forma definitiva,

através da coisa julgada, mostra que a Jurisdição é capaz de manter a segurança

e a certeza jurídica. Assegura as partes o conforto de extinção definitiva de

determinado conflito. Necessário se faz observar que a coisa julgada não é

condição essencial da Jurisdição, mas é entendido como atributo específico.

Mesmo Liebman que é considerado um adepto da coisa julgada entende que os

efeitos da sentença se produzem independentemente da coisa julgada:

[...] De fato, os efeitos possíveis da sentença (declaratório, constitutivo, executório) podem, de igual modo, imaginar-se, mesmo em sentido puramente hipotético produzidos independentemente da autoridade da coisa da julgada, sem que por isso se lhe desnature a essência. A coisa julgada é qualquer coisa mais que se ajunta para aumentar-lhe a estabilidade, e isso vale igualmente para todos os efeitos possíveis da sentença87.

Neste aspecto, a solução dos conflitos não se alcança só

com a coisa julgada, o instrumento da sentença já traz uma certeza jurídica e

pacífica. A coisa julgada é a estabilidade das decisões. Toda sentença, após

transcorridos os prazos para recursos, ou já esgotados os recursos que podiam

ser interpostos, faz coisa julgada formal. Não podendo sofrer modificação e nem

impugnação dentro do processo.

A coisa julgada material é alcançada com a sentença de

mérito (salvo algumas exceções), sua eficácia projeta-se fora do processo em que

a sentença foi proferida. Os efeitos da sentença tornam-se imutáveis, após

transitada materialmente em julgado, as partes (ou seus sucessores) não poderão

mais discutir ou reclamar o objeto da lide que a sentença denegou ou atribuiu a

qualquer uma das partes envolvidas. Tem-se neste aspecto a eficácia vinculativa

plena, que a atividade jurisdicional produz.

Imparcialidade: necessária para dirimir os conflitos, a fim de

alcançar um resultado justo, independente das partes que estão litigando. A

figura, juiz natural, legitimamente investido no cargo, vai representar o Estado. A 87 LIEBMAN. Enrico Tullio.Eficácia e Autoridade da Sentença. Trad. de Alfredo Buzaid e Benvindo Aires; Trad dos textos posteriores à edição de 1945 e notas relativas ao Direito de Ada Pellegrini Grinover. 3. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 19/20.

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decisão do juiz será centrada na lei e o fim a ser alcançado deve ser a Justiça.

Para tanto concede então algumas prerrogativas à magistratura, como a

vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade dos vencimentos.

O juiz que pretende alcançar a Justiça não pode negar a

força de seu poder de decisão. Neste aspecto, analisar politicamente a

organização das Sociedades deve ser a função do juiz. Não deve o magistrado

tomar posições partidárias, mas entender que suas decisões devam dar um

tratamento eqüitativo às partes a fim de assegurar a Justiça...

2.3 CLASSIFICAÇÕES DA JURISDIÇÃO

Buscando assegurar a Justiça, as partes procuram a tutela

estatal, através do modo mais eficiente e rápido. Nesta direção o Estado

Brasileiro organizou-se através de diversas jurisdições. A classificação

apresentada é a que Athos Gusmão88 expôs em seus ensinamentos.

2.3.1 Jurisdição penal e Jurisdição civil

A diversidade das pretensões postas em juízo e a

heterogeneidade das lides ocorrentes na vida social conduzem à “classificação”

da Jurisdição em:

Jurisdição penal – quando o titular da ação (Ministério

Público ou o querelante) pretende a aplicação ao demandado de sanções de

natureza penal (finalidade “aflitiva”)89. A Jurisdição penal demanda causas penais

e pretensões punitivas.

Jurisdição civil – é exercida em face de pretensões não-

penais, com finalidade reparatória (lato sensu) ou de resguardo do Direito violado

ou ameaçado. Abrange todos os ramos não-penais, incluído matérias de Direito

administrativo, comercial, tributário, agrário etc.

88 CARNEIRO, Athos de Gusmão. Jurisdição e Competência. São Paulo: Saraiva, 2002. p.23 89 CARNEIRO, Athos de Gusmão. Jurisdição e Competência. p.23

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O critério da divisão entre Jurisdição penal e civil atende

apenas a um conveniência de trabalho, pois a grande parte das pequenas

comarcas do país, o juízo que julga as lides penais e civis é o mesmo. Não seria

viável estabelecer uma divisão sem interação das decisões, pois se tornaria uma

atividade antieconômica.

2.3.2 Jurisdição comum e jurisdições especiais

A multiplicidade e a diversidade dos conflitos sociais

conduzem à conveniência de especialização de funções, criando-se, pois, ao lado

da “Jurisdição ordinária”, as “jurisdições especiais”.

A competência das jurisdições especiais é definida expressa

e taxativamente na Constituição Federal. A lei ordinária não poderá restringir, nem

ampliar, tal competência. Os juizes que exercem as jurisdições especiais

pertencem ao Poder Judiciário da União (excetuados os integrantes da Justiça

Militar dos Estados), sendo, portanto, em sentido lato, “juizes federais”.

2.3.2.1 Jurisdição Federal

A Jurisdição federal é exercida pelos juízes federais (stricto

sensu), tendo como órgão de segunda instância os Tribunais Regionais Federais.

Sua competência define-se, em quaisquer causas, pela presença da União

Federal, de suas autarquias ou empresas públicas (e também das “fundações

federias”), como autoras, rés ou intervenientes90, e ainda, em alguns casos, pela

natureza da lide.

Esta Jurisdição abrange causas penais e cíveis, e pode

excepcionalmente ser exercida, em primeira instância, por juízes estaduais, nas

hipótese previstas na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.91

90 CRFB/1988, art. 109, I 91 CRFB/1988, art. 109, §§ 3o e 4o

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2.3.2.2 Jurisdição trabalhista

À Jurisdição trabalhista cabe o julgamento dos dissídios

(lides) individuais e coletivos entre empregados e empregadores e, mediante lei,

de outras controvérsias oriundas de relação de trabalho.92 Esta Jurisdição poderá

ser, em caráter de exceção, exercida por juizes de Direito, nas comarcas onde

não houver Vara do Trabalho.93

2.3.2.3 Jurisdição eleitoral

À Jurisdição eleitoral cabem atribuições administrativas (em

Jurisdição voluntária) relativamente à organização e realização dos pleitos

eleitorais, bem como o julgamento, em sede contenciosa, de lides cíveis e

criminais previstas em lei complementar.94

2.3.2.4 Jurisdição militar

À Jurisdição militar pertence o julgamento dos crimes

militares definidos em lei.95 Esta Jurisdição atua não apenas no âmbito federal,

como ainda é exercida por juizes militares estaduais (nos crimes militares

imputados a integrantes das polícias militares estaduais.96

2.3.3 Jurisdição comum ou ordinária

Por exclusão, as demais causas são processadas e julgadas

pela Justiça comum ou Justiça ordinária, integrada não só pelos juizes

componentes do Poder Judiciário dos Estados, como ainda pelos juízes “locais”

(vinculados embora à União) do Distrito Federal.

92 CRFB/1988, art. 114. 93 CRFB/1988, art. 112 94 CRFB/1988, art. 121. 95 CRFB/1988, art. 124. 96 CRFB/1988, art. 125, § 4o

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2.3.4 Jurisdições de primeira e segunda instâncias

É ainda cabível falarmos em Jurisdição de primeira instância

e de segunda instância. A primeira é exercida pelos juizes vitalícios e pelos juizes

dos “juizados especiais”, tanto togados como leigos.97 Perante os juízes de

primeira instância é ajuizada a quase-totalidade das demandas.

A Jurisdição de segunda instância é exercida na Justiça

comum pelos Tribunais de Justiça e de Alçada, com a faculdade de derrogação,

mediante a interposição de recursos, das decisões e sentenças proferidas nos

juízos inferiores; algumas causas, pela sua relevância, são de “competência

originária” dos Tribunais.

Nas jurisdições especializadas, os recursos ordinários são

apreciados pelos Tribunais Regionais Federais do Trabalho, pelos Tribunais

Regionais Eleitorais e pelo Superior Tribunal Militar.

O Tribunal Superior do Trabalho e o Tribunal Superior

Eleitoral superpõem-se aos respectivos Tribunais Regionais e lhes uniformizam a

jurisprudência.98

Apesar de o Estado organizar-se de tal forma jurisdicional e

proceder segundo essa organização. Mesmo assim, o acesso à Justiça, ainda, é

dificultado e não atinge a todos de que dela necessitam. Portanto, necessário se

faz uma observação crítica do que impede o acesso à Justiça.

2.4 A JURISDIÇÃO E O ACESSO À JUSTIÇA

Desde o estudo conceitual da Jurisdição e a classificação de

suas competências, busca-se saber qual a importância dos procedimentos

97 CRFB/1988, art. 98, I 98 GUSMÃO, Athos Gusmão. p. 25-27 – expõe: cumpre reafirmar a antiga e autorizada lição de João Mendes (Direito Judiciário p.40) de que o Poder Judiciário, “delegado da soberania nacional”, não é nem federal nem estadual: “É eminentemente a nacional, quer se manifestando na Jurisdição quer se aplicando ao crime, quer decidindo em inferior, quer em superior instância”. Aliás, a vigente Constituição Federal, mantendo esse posicionamento, no elenco dos órgãos do Poder Judiciário incluiu os “Tribunais e Juizes dos Estados” (art. 92, VII).

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instituídos no sistema jurídico-decisório? É possível solucionar os conflitos com

Justiça social? O sistema democrático pode auxiliar?

[...] a existência de um organismo burocrático, apto a proferir decisões orientadas no sentido da resolução dos conflitos sociais pela aplicação do Direito, no âmbito do Estado, parece antever uma preocupação axiológica recorrente: a de que as decisões assim obtidas expressem, simultaneamente, a ambição de realização social da Justiça, com permeabilidade ética e processual das decisões judiciais ao ideal democrático. Ou, em uma outra perspectiva, que as normas do jogo democrático, consideradas finalisticamente, permitam ao sistema judicial realizar a Justiça na sociedade. A democracia assim imaginada é início e fim do processo decisório de realização do justo na sociedade.99

Os procedimentos instituídos no ordenamento jurídico

parecem que ainda não conseguem dar respostas terminativas para a solução

dos conflitos na concretização da Justiça social. Pois ao decidir, o juiz usando da

hermenêutica não pode se preocupar somente com a estrutura processual

argüida, necessariamente precisa conciliar o agir humano com a Justiça. Ao que

parece, esse é o ideal democrático. Questiona-se se é possível alcançar a Justiça

social?

Se lidassem apenas com a busca da verdade – no sentido estrito da pesquisa factual – talvez pudessem honestamente dizer que não lhe têm respostas. Como lidam com a Justiça – ainda que não em oposição àquela, mas com ela estreitamente vinculada – sua responsabilidade é maior, porque suas decisões terminam sempre por imputa-la ou negá-la a quem clama por ela.100

Como anota Rawls, “a Justiça é virtude primeira das

instituições sociais, tal como a verdade o é para os sistemas de pensamento”.101

Ao que parecem, as questões procedimentais existentes, até então, não podem,

por si só, oportunizar a prática da Justiça social, dependem da produção de novas

99 RIBEIRO, Paulo de Tarso Ramos. Direito e Processo: Razão Burocrática e Acesso à Justiça. São Paulo. Editora Max Limonad, 2004. p.18 100 RIBEIRO, Paulo de Tarso Ramos. Direito e Processo: Razão Burocrática e Acesso à Justiça.. p.20 101 RAWLS, John. A theory of justice. Oxford, Oxford University Press, 193, pp. 03-04

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leis que possam ser utilizadas nos conflitos que surgem, desde que, tenham sido

previstas as possíveis necessidades legais. O que se viabilizaria através da

instrução do processo.

A importância do processo e, de modo geral, dos procedimentos que instrumentalizam as decisões do sistema judicial está em ser, com relação à Justiça, uma via de duas mãos, na qual trafegam, tanto as demandas pelo sentido do justo, quanto os critérios de justificação ética das opções racionais de Justiça do ordenamento, também efetuados mediante um procedimento.102

E, justamente, há falta de critérios que dê legitimidade ao

Judiciário, no exercício de sua função jurisdicional. Pois até então, os juizes

precisamente, se utilizam só da razão técnica quando da tomada de suas

decisões. O que limita a decisão dos juizes, principalmente, pelas constantes

mudanças de demandas jurisdicionais.

A produção intensa de contínua expansão da demanda pela tutela jurisdicional, leva a um inexorável processo de confrontação dos juízos normativos com a realidade social pela exaustão da racionalidade formal do Direito. A hermenêutica jurídica tradicional empreendida pela dogmática não é capaz de estruturar normativamente a multiplicidade de situações conflitivas a serem resolvidas, apenas no âmbito circunscrito da dogmática tradicional, o risco da desilusão é tanto maior, na medida da erupção contínua e ininterrupta de conflitos inéditos que se originam de circunstâncias de fato, não imaginadas normativamente pelo legislador.103

Nota-se como anteriormente dito, que o que se faz

necessário em si não são leis pré-estabelecidas para situações fáticas, mas

critérios de como proceder em determinadas circunstâncias. A necessidade,

também, de se ter critérios mais consistentes para justificar a aplicação da Justiça

Distributiva na repartição dos bens sociais.

102 RIBEIRO, Paulo de Tarso Ramos. Direito e Processo: Razão Burocrática e Acesso à Justiça. p.24 103 RIBEIRO, Paulo de Tarso Ramos. Direito e Processo: Razão Burocrática e Acesso à Justiça. p.40

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A questão acerca da Justiça Distributiva na repartição dos bens sociais passa a ser pressuposta e assumida como tal pelo sistema judicial, que se vê desobrigado a justificar os seus valores topicamente, sempre que é chamado a decidir em cada caso particular. O exercício da função jurisdicional é assim vinculado, cada vez mais, a questões de Justiça retributiva, afirmando o Judiciário enquanto serviço público, funcionalmente responsável pela alocação de Direitos já definida normativamente na sociedade.104

Se tais critérios fossem estabelecidos, a problemática das

incertezas nas decisões jurídicas aplicadas à Justiça Distributiva poderiam ser

sanadas. Visto que os padrões normais seguem uma interpretação dogmática dos

termos e para isso precisariam do ponto de vista social, necessariamente,

considerar o caráter difuso dos Direitos e obrigações que se apresentam como

expectativa de Direito no ordenamento jurídico do Estado.

Seria o critério do pacto político, que estaria faltando? Eis

que é uma questão ainda sem repostas. O risco da politização é, de que o juiz

passe, da prolação de decisões normativas, de cunho técnico e de neutralidade,

para um campo de formulações estratégicas de ação política, e que teria como

fundamento último o êxito de suas prescrições. Neste caso, o Judiciário estaria

desenvolvendo um papel anômalo a sua função, pois estaria entrando na área de

atuação do poder Legislativo. E não é esse o desafio do judiciário.

[...] o desafio colocado ao Judiciário, enquanto poder, é como ampliara cognição judicial dos conflitos em ordem a intensificar qualitativamente o exercício da Jurisdição. Vale dizer, a expansão da apreciação judicial dos conflitos importa transpor os limites da Justiça retributiva, legal ou contratual, que balizam o exercício da função jurisdicional rumo à Justiça Distributiva.105

A legislação de procedimentos é necessária para as

decisões judiciais, estas que tem o objetivo de praticar Justiça com critérios

104 RIBEIRO, Paulo de Tarso Ramos. Direito e Processo: Razão Burocrática e Acesso à Justiça. p.60 105 RIBEIRO, Paulo de Tarso Ramos. Direito e Processo: Razão Burocrática e Acesso à Justiça. p.62

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éticos. E que estes levem a prática da Justiça social e que alcancem as pessoas

do Estado democrático de Direito.

2.5 IDENTIFICAÇÃO DA FILOSFIA DE ARISTÓTELES NO ORDENAMENTO

JURÍDICO BRASILEIRO

Algumas garantias consolidadas no Direito positivo brasileiro

que permite o entendimento da filosofia aristotélica nos dias atuais. A Justiça

Distributiva tem sua aplicação nas funções do Estado. O Estado é o campo mais

importante da aplicação Distributiva. Ela está presente em suas principais

funções: função jurídica, social, administrativa e fiscal.

Exemplifica-se de modo conciso da seguinte forma: na

realização de concursos públicos, na função jurídica - todos são iguais perante a

lei - e garantias de Direitos assegurados na forma da lei, a judicatura ou poder de

polícia e acesso gratuito ao judiciário dos comprovadamente necessitados106.

Para a família somam-se aos supra citados, a especial

proteção do Estado,107 devendo este assegurar o Direito à vida, à saúde, à

alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao

respeito, à liberdade.108 O código Civil Brasileiro também encontra fundamentos

para aplicação da Justiça Distributiva quando trata do Direito de Família e

sucessões.109 No código penal tem-se fundamentos no capitulo que trata da

aplicação pena.110 São estes alguns exemplos que poderiam ser elencados.

A Justiça Distributiva da empresa para com seus membros é

garantia que vem sendo assegurada pela legislação nos Estados modernos.

Incluem-se o pagamento de “salário-família”111, estabilidade no emprego,112

participação do empregado na vida da empresa, sobre o assunto a Constituição

trata em seu Art. 7o XI, e outras leis tratam da participação na administração da 106 CFRB/1988, art. 5. 107 CFRB/1988, art. 226 108 CFRB/1988, art. 225 e 227 109 Código Civil Brasileiro, 2002. Livro V, Do Direito das Sucessões. Titulo III. Da Sucessão Testamentária. 110 Código Penal brasileiro nos art.59, 60, 61, 62, 65, 66 e 67. 111 CFRB/1988, art. 7 112 CFRB/1988, art. 7o I e II

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propriedade sob a modalidade de co-proprietários da empresa e associados

solidários no processo de produção.

No ordenamento jurídico brasileiro se tem a previsão da

Eqüidade em alguns casos. Na CLT, no art. 8o, determina sua aplicação “na falta

de disposições legais ou contratuais”. No Código de Processo Civil, o art. 127,

dispõe que: “o juiz decidirá por Eqüidade nos casos previstos em lei”. Dentre as

previsões em lei se pode citar: na lei nº 9.099/95 (Juizados especiais), o art. 6º, “o

juiz adotará em cada caso o decisão que reputar mais justa e equânime,

atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum”, no art. 25,

refere-se ao árbitro que conduzirá o processo com os mesmos critérios do Juiz

“podendo decidir por Eqüidade” e art. 1.109 do Código de Processo Civil, “o juiz

poderá adotar em cada caso a solução que reputar mais conveniente ou

oportuna”. Estes são exemplos de autorização que permitem agir por Eqüidade.

Pode-se dizer que são poucas as garantias asseguradas

legalmente diante da necessidade de se praticar Justiça, mas o Operador do

Direito tem o dever de viabilizar essas garantias e ampliar sempre que possível

utilizando-se do princípio da Eqüidade e do justo meio-termo. Para que isso venha

acontecer é necessário que se eduque para esse fim.

2.6 FUNÇÃO JURISDICIONAL

No Brasil, segundo a Constituição da República Federativa

do Brasil de 1988, a função jurisdicional deve ser o instrumento de Garantia dos

Direitos Fundamentais à vida, à liberdade, à igualdade. Nesta direção buscar-se-á

entender o contexto de um Estado de Direito, instituto promotor da legalidade e

dos Direitos Fundamentais. Que procura fazê-lo através da tutela Jurisdicional do

Estado.

Historicamente o Estado de Direito passa a ser defendido

nas idéias filosóficas de Montesquieu113, surge, então, a teoria de formar um

Estado com distribuição de poderes. Com as Revoluções Burguesas dos séculos

113 MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. Do espírito das leis. São Paulo: Martin Claret, 2003.

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XVII e XVIII surgem os Estados Liberais. Estes passam a ter Constituições

escritas e um ordenamento jurídico que garante alguns Direitos fundamentais à

vida humana.

No Brasil do Século XX, especificamente, com a

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o Estado democrático de

Direito alcança seu ponto mais alto na garantias de Direitos fundamentais.

Permanecendo a previsão legal da distribuição e funções dos poderes do Estado

que se encontra no art. 2º “São poderes da União, independentes e harmônicos

entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.

Na CRFB/88, ocorre o grande avanço para a concepção da

função Jurisdicional ao trazer a função de cada poder estatal, bem como, ampliar

os Direitos e deveres do cidadão. Neste aspecto, faz-se necessário entender que

os Direitos fundamentais descritos na CRFB/88, tem seus limites nos Direitos

fundamentais universais.114

No aspecto do Direito Penal, temos a previsão do Direito à

vida. Algumas situações, no entanto, que estão descritas no ordenamento

jurídico, como o estado de necessidade, a legítima defesa e o estrito cumprimento

do dever legal, devem ser analisados com cautela pelo Estado, através do juiz,

figura imparcial, mas responsável pela atuação da função jurisdicional, de modo a

dar uma solução que permita celebrar a paz social. O Direito do contraditório e da

ampla defesa são garantias mínimas para que a função da Jurisdição, através do

juiz, possa dizer o Direito às partes envolvidas na lide.

A Jurisdição como a função do Estado de Direito aparece

delimitada pelo ordenamento positivado constitucionalmente. Nesta seara,

entender a partição dos poderes do Estado é de fundamental importância, bem

como respeitar a forma procedimental que a cada um pertence. Quanto menor for

o conflito na forma de organização do Estado, mais firme será a solução dos

conflitos que surge no bojo da sociedade. O caminho para pacificar a sociedade

114 Declaração universal dos Direitos humanos. Assembléia Geral das Nações Unidas em dezembro de 1948.

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terá o cunho de assegurar a defesa da legalidade e da igualdade às partes que

estão em conflito.

Seguindo este raciocínio, nota-se que é de supra

importância a preparação do operador do Direito. Seja para atuar como agente de

decisão, estando este inserido na função jurisdicional, representado na pessoa do

juiz, ou como parte que intervém e movimenta a Jurisdição, representados na

pessoa do Ministério Público, do Advogado e de outros operadores do Direito.

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CAPÍTULO 3

A FORMAÇÃO DO OPERADOR DO DIREITO COMO PRESSUPOSTO PARA SUA ATUAÇÃO JURISDICIONAL

3.1 A PREPARAÇÃO DOS OPERADORES DO DIREITO

O operador do Direito deve ser um profissional preparado

para exercer a função jurisdicional. Para tanto, precisa renovar o aprofundamento

nos estudos do Direito. Albert Einstein, em suas declarações que se tornaram

famosas, fala sobre a educação em vista de um pensamento livre:

Não basta ensinar ao homem uma especialidade. Porque se tornará assim uma máquina utilizável, mas não uma personalidade. É necessário que adquira um sentimento, um senso prático daquilo que vale a pena ser empreendido, daquilo que é belo, do que é moralmente correto. A não ser assim, ele se assemelhará, com seus conhecimentos profissionais, mais a um cão ensinado do que a uma criatura harmoniosamente desenvolvida. Deve aprender a compreender as motivações dos homens, suas quimeras e suas angústias para determinar com exatidão seu lugar exato em relação a seus próximos e à comunidade.115

São reflexões como estas que se tornam essenciais e

presentes no dia-a-dia da vida acadêmica, pois não obsta estar escrito nos

manuais, antes deve fazer parte da cultura que procura socializar o sentido

comunitário da existência humana e busca como fim a felicidade, desenvolvendo

no ser humano a excelência moral e intelectual. Não se pode acreditar que a

competição construa a cultura da humanidade.

Os excessos do sistema de competição e de especialização prematura, sob o falacioso pretexto de eficácia, assassinam o espírito, impossibilitam qualquer vida cultural e chegam a suprimir os progressos nas ciências do futuro. É preciso,

115 RODHEN, Huberto, Einstein O Enigma do Universo. São Paulo: Martin Claret, 2004. p.162.

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enfim, tendo em vista a realização de uma educação prefeita, desenvolver o espírito crítico na inteligência do jovem. Ora, a sobrecarga do espírito pelo sistema de notas entrava e necessariamente transforma a pesquisa em superficialidade e falta de cultura. O ensino deveria ser assim: quem o receba, o recolha como um dom inestimável, mas nunca como uma obrigação penosa.116

Não resta dúvidas que a percepção de Einstein, sobre a

forma de educação que os jovens devam receber, aplique-se também aos futuros

operadores do Direito. O conhecer é de todos, mas a sabedoria é para aqueles

que desejam alcançá-la.

Os ensinamentos do professor Motta orientam o operador do

Direito seguir o caminho da sabedoria filosófica para alcançar a excelência moral

e intelectual.

“Em sentido estrito: corresponde àquele que busca ser o mais perfeito em sua arte respectiva. Revela-se o grau de excelência naquele que se notabiliza em sua atividade profissional. Em sentido amplo: quem a possui, é capaz de ultrapassar os horizontes específicos do conhecimento, sendo capaz de investigar os primeiros princípios”. 117

O desenvolvimento da sabedoria filosófica é o caminho que

possibilita ao ser humano realizar-se como pessoa e o torna eficaz em sua

atividade profissional. Ademais, a sabedoria filosófica não se restringe em uma

especialidade, “a sabedoria corresponde a uma combinação da inteligência com

o conhecimento cientifico”.118 Esta combinação volta-se para o conhecimento das

coisas mais simples as mais sublimes que envolvem o ser humano.

A sabedoria volta-se para o conhecimento das coisas mais

sublimes que envolvem o ser humano e a Justiça, como a excelência moral mais

perfeita, corresponde à sabedoria no mais elevado grau.119

116 RODHEN, Huberto, Einstein O Enigma do Universo. p.162. 117 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça,Virtude Moral e Razão. p. 52 118 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1141a, 15 119 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça,Virtude Moral e Razão. p. 52

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O operador do Direito deve buscar esta sabedoria. O Estado

proporciona, através de suas instituições, a oportunidade para a preparação do

operador do Direito. Esta preparação dá condições para que sejam preenchidos

os requisitos aos que desejam atuar na função jurisdicional.

A Jurisdição, no decurso deste trabalho, foi interpretada

como a função, atividade e poder do Estado, de dizer o Direito e promover a

Justiça entre os agentes sociais que estão em conflito e buscam a tutela

jurisdicional para a solução da lide.

Nesta seara pedagógica, o operador do Direito deve ter a

oportunidade de aprofundar-se sobre os alicerces legais que ostentam o Estado,

afim de permitir a tomada de decisões justas, no momento de pôr fim à lide.

O fim da lide não é simplesmente atribuir uma sentença ao

processo, mas junto ao fim da lide deve conter uma prática de atos justos. Para

que possa garantir a paz social, de modo a atender os anseios daqueles que

buscam a Jurisdição como forma de solucionar seus conflitos.

O estudo para o operador do Direito deve ser constante, e

não pode ser fruto do casuísmo, mas deve considerar os alicerces já

sedimentados na organização da Sociedade. O conceito de Justiça elaborado por

Aristóteles, na Antiguidade, torna-se presente até nossos dias. Pois, promover a

Justiça em muitos casos não é seguir a lei em sua interpretação gramatical, mas

na aplicação da Eqüidade, ou seja, adequar a lei ao caso concreto.

3.2 DISCIPLINAS JURÍDICAS FUNDAMENTAIS

Algumas disciplinas jurídicas têm grande importância para

que o operador do Direito, na sua formação acadêmica, torne-se apto a atuar na

Jurisdição. Tendo o conhecimento necessário para concretizar o acesso e a

realização da Justiça.

O que interessa nessa pesquisa é saber quais destas

disciplinas tem ligação com o pensamento aristotélico do agir humano. Para isso,

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recorre-se à lei atual para saber o que ela dispõe. No artigo 10, I da resolução que

acompanha o Parecer CES/CNE no 146/02 estabelece120:

Art. 10 Os cursos de graduação em Direito deverão contemplar, em seus projetos pedagógicos e em sua organização curricular, conteúdos que atendam aos seguintes eixos interligados de formação:

I – Conteúdos de Formação Fundamental, que tem por objetivo integrar o estudante no campo do Direito, estabelecendo ainda relações do Direito com outras áreas do saber, abrangendo estudos que envolvam a Ciência Política (com Teoria Geral do Estado), a Economia, a Sociologia Jurídica, a Filosofia e a Psicologia Aplicada ao Direito e a Ética Geral e Profissional.

II – Conteúdos de Formação Profissional, abrangendo, além do enfoque dogmático, o conhecimento e a aplicação do Direito, observadas as peculiaridades dos diversos ramos do Direito, de qualquer natureza, estudados sistematicamente e contextualizados segundo a evolução da Ciência Jurídica e sua aplicação às mudanças sociais, econômicas, políticas e culturais do Brasil e suas relações internacionais.

III – Conteúdos de Formação Prática, que objetiva a integração entre a prática e os conteúdos desenvolvidos nos demais eixos, especialmente nas atividades relacionadas como estágio curricular durante o qual a prática jurídica revele o desempenho do perfil profissional desejado, com a devida utilização da Ciência Jurídica e das normas técnico-jurídicas.

O artigo estrutura-se de modo a contemplar todos os

aspectos necessários para o agir do operador do Direito. E demonstra que a

formação passa por três eixos essenciais na formação do operador do Direito.

Mas o primeiro, chamado de eixo de formação fundamental, é o qual absorve o

conteúdo filosófico e que é objeto desta pesquisa. Parte desse conteúdo já vinha

sendo defendido pelos grandes doutos do magistério.

120 RODRIGUES, Horácio Vanderlei. JUNQUEIRA, Eliane Botelho. Ensino do Direito no Brasil: diretrizes curriculares e avaliação das condições de ensino. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2002.

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O professor Paulo Nader apresenta três disciplinas jurídicas

fundamentais: a) Ciência do Direito, b) Filosofia do Direito e c) Sociologia do

Direito.

A Ciência do Direito também conhecida como Dogmática

Jurídica, é entendida como a disciplina que tem o papel de:

[...] revelar o ser do Direito, aquele que é obrigatório, que se acha posto à coletividade e que se localiza, basicamente nas leis e códigos. Não é de natureza crítica, isto é, não penetra no plano de discussão quanto a conveniência social das normas jurídicas. Ao operar no plano da Ciência do Direito, o cientista tão-somente cogita dos juízos de constatação, a fim de apurar as determinações contidas no conjunto normativo.121

Nesta fase do estudo do Direito é irrelevante discutir valores

morais, sociais e de Justiça. Mas o estudo da Dogmática Jurídica é muito

importante, pois é o que vai possibilitar ao operador do Direito, definir e

sistematizar o conjunto de normas que o Estado impõe à sociedade. Os

positivistas defendem que isto basta para a aplicação do Direito, já para os

jusnaturalistas a preocupação está com a Justiça substancial e com o Direito

natural.

Em posição diferente da Ciência do Direito encontra-se a

Filosofia do Direito que transcende o plano meramente normativo, para questionar

critérios de Justiça, partindo dos conceitos normativos levando-os para campo da

indagação de valoração. Enquanto a Ciência do Direito procura responde a

pergunta “o que é de Direito?”, a Filosofia do Direito procura atender a pergunta “o

que é Direito?”.

Está é uma disciplina de reflexão sobre os fundamentos do Direito. É a própria Filosofia Geral aplicada ao objeto Direito. Preocupada com o dever ser, com o melhor Direito, com o Direito justo, é indispensável que o jusfilósofo conheça tanto a natureza humana quanto o teor das leis.122

121 NADER, Paulo. Introdução ao estudo do Direito. 16 edição. Rio de Janeiro: Forense, 1998 p.12 122 NADER, Paulo. Introdução ao estudo do Direito. p.13

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A Filosofia do Direito envolve-se pela pesquisa lógica que

procura compreender os mais variados e complexos conceitos do Direito, e pela

pesquisa axiológica que estuda os valores de Justiça e segurança.

A sociologia é uma disciplina que examina o fenômeno jurídico do ponto de vista social, a fim de observar a adequação da ordem jurídica aos fatos sociais. As relações entre a sociedade e o Direito, que formam o núcleo de seus estudos, podem ser investigados sob os seguintes aspectos principais: a) adaptação do Direito à vontade social; b) cumprimento pelo povo das leis vigentes e aplicação destas pelas autoridades; c) correspondência entre os objetivos visados pelo legislador e os efeitos sociais provocados pelas leis.123

A Sociologia do Direito tem sua importância por ser utilizada

para conhecer a sociedade. O Direito de um povo passa por mudanças e se

adapta ao momento histórico. A Sociologia do Direito presta um importante

trabalho para a correção dos desajustamentos entre a sociedade e as leis.

A estas acrescenta-se a Ciência Política que o próprio

Aristóteles a definiu como sendo a ciência que estuda o bem supremo: a

felicidade. Quando procurou responder o que fosse esse bem, e de que ciências

ou faculdades seria ele objeto.

“E, ao que parece, ele é objeto da ciência mais prestigiosa e que prevalece sobre tudo. Ora, parece que esta é a Ciência Política, pois ela é que determina quais as ciências que devem ser estudas e uma cidade-Estado, quais as que cada um deve aprender, e até que ponto;[...]”.124

Aristóteles esclarece que Ciência Política pode se utilizar

das demais ciências e mesmo legislar sobre a forma de comportamento que as

pessoas devam ter para alcançar a finalidade, que deve ser o bem humano. Para

a pessoa que quer ser bom juiz sobre o modo de vida da Sociedade deve ter um

bom conhecimento e boa instrução sobre o assunto que vai decidir.

123 NADER, Paulo. Introdução ao estudo do Direito. p.14 124 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1094a, 27

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Por essa razão, quem quiser ouvir com proveito as exposições sobre o que é nobre e justo, e em geral sobre a ciência política, é preciso ter sido educado nos bons hábitos. O fato é o princípio, ou o ponto de partida, e se ele for suficientemente claro para o ouvinte, não haverá necessidade de explicar por que é assim; e o homem que foi bem educado já conhece esses princípios ou pode vir a conhecê-los com facilidades.125

Já se mencionou da necessidade e da responsabilidade da

Jurisdição em garantir a viabilidade dos Direitos fundamentais do ser humano. Em

muitos casos, precisam da movimentação do operador jurídico, pois este é o mais

habilitado para agir em defesa dos que tiveram seus Direitos tolhidos.

O operador do Direito deve desenvolver o estudo da

Filosofia do Direito como a ciência que estuda o fenômeno jurídico manifestado

ao longo dos tempos.

Conforme Miguel Reale “aos cientistas do Direito o seu

interesse não obsta naquela experiência já aperfeiçoada e formalizada em leis,

mas também como vai se manifestando na sociedade, nas relações de

convivência”.126

O operador do Direito precisa recorrer aos subsídios da

hermenêutica filosófica, quando necessário para redefinir o Direito Positivo como

um todo lógico, para que o fim que se deseja alcançar seja capaz de irradiar a

segurança e a Justiça. Ensina professor Paulo Nader:

Ainda que mal elaboradas sejam as leis, como visível atraso em relação ao momento histórico; ainda que apresentem disposições contraditórias e numerosas lacunas ou omissões, ao jurista caberá como seu conhecimento cientifico e técnico, revelar a ordem jurídica subjacente. Em seu trabalho deverá submeter as regras à interpretação atualizadora, renovando sua compreensão à luz das exigências contemporâneas; deverá expungir, não considerar, as regras conflitantes com outras disposições e que não se ajustem à índole do sistema; preencher os vazios da lei mediante o emprego

125 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1095b, 05 126 REALE. Miguel. Lições Preliminares do Direito. 25 ed. São Paulo: 2001. Ed. Saraiva.

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da analogia e da projeção dos princípios consagrados no ordenamento jurídico.127

Se o futuro operador do Direito, em seu período de estudo

na Universidade, não se dedicar à pesquisa e a ciência não fará outra cousa

senão dogmática jurídica. Não se pode aqui interpretar a dogmática como

imposição de verdades infalíveis. Nos dizeres de Miguel Reale a “dogmática

jurídica tem sua explicação, no fato, que são posições normativas das quais os

operadores devem partir para sua atividade prática”.128 Mas há de se lembrar que,

mesmo seguindo essa conceituação, não se pode reduzir a ciência do Direito a

dogmática jurídica.

A ciência do Direito, que deve ser feito pelo filósofo do

Direito, tem o objetivo de levá-lo a desenvolver sua excelência intelectual.

Anteriormente se estudou a excelência moral ligada a concretude da Justiça.

Nesta parte, quer-se aprofundar a categoria da excelência intelectual já teorizada

por Aristóteles e comentada pelo professor Motta. Observa-se que a excelência

intelectual se apóia na experiência e no tempo.129

3.3 DA BUSCA DA EXCELÊNCIA MORAL E INTELECTUAL

3.3.1 Das virtudes éticas

As virtudes éticas são numerosas e apresentam-se nas

pessoas pelos costumes. O ser humano é capaz de realizar gradualmente atos

justos que o torna um ser justos, isso pela força do hábito permanece nele, o que

faz com que vá aprendendo os atos que o levem a alcançar o mais alto grau da

excelência moral, a felicidade.

Aristóteles descreve e analisa de forma concreta uma série

de virtudes éticas: as de coragem, de temperança, de liberalidade, de

magnificência, magnanimidade, enfim a de Justiça. São virtudes por que

127 NADER, Paulo. Introdução ao estudo do Direito. p.97 128 REALE. Miguel. Lições Preliminares do Direito. 129 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça, Virtude Moral e Razão. p.47

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alcançam o justo meio, ou seja a média entre duas paixões extrema: o excesso e

o defeito.

A virtude da coragem apresenta-se como o justo meio com

relação aos sentimentos de medo e as audácias. Por natureza o ser humano

tende a temer todos os males,

Por exemplo, a desonra, a pobreza, a doença, a falta de amigos, a morte, mas não se pensa que a coragem se relacione com todos eles, pois temer certas coisas é até justo e nobre, e é vil não as temer, como, por exemplo, a desonra: as pessoas que a temem são boas e recatadas [...].130

Nem todos os males se relacionam com a coragem,

Aristóteles afirma que sejam os mais temíveis, exemplo a morte. “Ora, a morte é a

mais temível de todas as coisas, pois ela é o fim de tudo, e acreditamos que para

os mortos já nada mais há de bom ou mau”131. Mas quais são as circunstâncias

que se pode dizer, que alguém age com coragem ao enfrentar a morte? Sem a

menor dúvida, nas mais nobre, na batalha, em face de defesa ao seu Estado. A

coragem está relacionada a enfrentar os males por que é nobre fazê-lo, ou porque

é vil deixar de fazer.

A temperança está relacionada entre os extremos dos

prazeres do corpo, pois os prazeres dividem-se em: do corpo e da alma ( amor a

honra, conhecimento). Mas nem todos os prazeres do corpo são moderados pela

temperança, e principalmente os do tato e do paladar.

A temperança e a intemperança relacionam-se coma espécie de prazeres que os outros animais também sentem, e que por esses motivos parecem inferiores e bestiais, que são prazeres do tato e do paladar. (...) as pessoas desregradas sentem prazer no gozo do objeto em si, que em todos os casos é uma questão de tato, tanto quanto aos alimentos, como quanto à bebida e à união de sexos.132

130 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1115a, 12 131 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1115a, 25 132 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1118a, 25

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Aristóteles chega a apontar como que a coragem e a

temperança fossem virtudes da parte irracional da alma. Neste sentido essas

duas virtudes, da coragem e da temperança, moderam o apetite sensível e o

enobrecem, de modo que este apetite segue as exigências da reta razão. A

coragem aperfeiçoa o irascível133; a temperança, o concupiscível134.

Sendo a liberalidade o justo meio entre dar e obter riquezas,

ela impede a prodigalidade que é o excesso em dispor, e a falta que é a avareza.

Sendo, então, a liberalidade um meio-termo entre dar e obter riquezas, o homem liberal dará e gastará as quantias certas com os objetos certos, quer sejam coisas pequenas, quer sejam grandes, agirá assim com prazer; e também obterá as quantias que convêm das fontes que convêm.135

A magnificência modera as despesas das grandes riquezas.

Pode-se dizer que a magnificência é uma virtude anexa a liberalidade. O

magnificente é quem gasta muito generosamente nas grandes ocasiões, isso

dentro de suas possibilidades, pois quem excede nos gastos mais do que poderia

nessas ocasiões é um tolo. Os extremos dessa virtude são a falta é a mesquinhez

e o excesso é o mau-gosto, a vulgaridade.

A magnanimidade é a virtude das grandes coisas. Pode se

dizer que é o sensato. “magnânimo é o homem que se considera digno de

grandes é está à altura delas, pois aquele que se arroga uma dignidade da qual

não está a altura é um tolo, e nenhum homem virtuoso é tolo ou insensato”.136

Entre as virtudes éticas , tem-se, enfim, a Justiça que já foi

esclarecida no primeiro capitulo deste estudo e que é a base para o

aprofundamento acadêmico ao qual se busca aperfeiçoar desde o início, visando

alcançar a excelência intelectual.

133 poder irascível, que é auxiliar do princípio racional e indigna-se e luta por aquilo que a razão julga justo (ABBAGNANO, Nicola, Dicionário de Filosofia) 134 poder que preside aos impulsos, aos desejos, às necessidades e concerne ao corpo. (ABBAGNANO, Nicola, Dicionário de Filosofia) 135 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1120b, 25 136 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1123b, 02

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3.3.2 Das virtudes “dianoéticas”

Acima das virtudes éticas encontram-se outras virtudes que

estão em uma parte mais elevada alma, isto é, da alma racional, as quais

Aristóteles classifica-as como virtudes da razão, e recebem o nome de virtudes

dianoéticas. A alma racional se divide em duas partes, a quais se denomina de

razão racional e a razão teorética, em ambas é natural existir uma perfeição ou

virtude. As virtudes são as formas perfeitas com que se apreende a verdade

prática e a teorética.137

As virtudes dianoéticas são classificadas da seguinte

maneira por Giovanni Reale, “a virtude típica da razão prática é a phrónesis,

habitualmente traduzida por “prudência”, enquanto a virtude específica da razão

teorética é a “sabedoria” (Sophia).138

A “prudência”, em Aristóteles, está como razão

prática,139que consiste em saber dirigir corretamente a vida do ser humano. É

saber deliberar acerca do que é bom ou mau. Mas esse saber deve ser o agir de

forma correta através de meios idôneos para alcançar os verdadeiros fins. Mas

para alcançar os verdadeiros fins não basta a prudência, pois a virtude ética é

fundamental para indicar os atos justos que o humano deve ter em seu agir e a

prudência indica a forma de realizar tais atos. Daí a conclusão de que não é

possível ser virtuoso sem prudência e nem ser prudente sem ser virtuoso.

A sabedoria (sophia), outra virtude dianoética, a mais

elevada. Aristóteles identifica a sabedoria como “uma combinação da razão

intuitiva e com o conhecimento científico – uma ciência das coisas mais elevadas,

isto é, a excelência que lhe é própria”.140 Deste entendimento é possível afirmar

que a sabedoria Filosófica é uma combinação entre conhecimento científico e

razão intuitiva das coisas mais elevadas da natureza.141

137 REALE, Giovanni. Introdução a Filosofia. p.91 138 REALE, Giovanni. Introdução a Filosofia. p.91 139 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1140a, 25 140 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1141a, 15 141 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1141b, 01

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Na hierarquia das virtudes, a mais perfeita é a sabedoria

filosófica (teorética, contemplativa). A sabedoria teorética é a perfeição, a

felicidade, mais divina de nossa alma. Mas há outra felicidade, imperfeita em

relação a contemplação, mas permanece verdadeira felicidade, é a sabedoria

prática, ou seja, nossa vida ativa142.

A prudência fruto da inteligência desempenha papel

semelhante ao da sabedoria, mas deve ser lembrado que enquanto a primeira

esta no intelecto prático a segunda encontra-se no intelecto especulativo, mas

ambas possuem sua nobreza.

O alcance da sabedoria teórica e da sabedoria prática faz

parte das virtudes intelectuais do ser humano. A sabedoria prática permite aos ser

humano deliberar sobre o que é bom e conveniente para ele e para aqueles que

contribuem para a vida boa em Sociedade.

A sabedoria teórica combina a intuição e o conhecimento

científico. É a que eleva o ser humano a ação mais perfeita. É superior a

sabedoria prática. Ao operador do Direito se exige que possua as duas espécies

de sabedoria, mas que aperfeiçoe a sabedoria teórica.

A semelhança da excelência moral, a excelência intelectual,

também está intimamente ligada ao hábito e tem por fundamento a sabedoria

teórica e a sabedoria empírica.143 A busca do aperfeiçoamento da sabedoria

intelectual se dá pela instrução. “termo instrução equivale a educação”.144

Sendo a excelência intelectual, o conceito que designa a

educação no seu mais elevado grau. A educação deve ser voltada para o

exercício da cidadania. A educação para a cidadania tem seu princípio voltado

para a ordem pública. O legislador deve produzir leis que proporcionem boa

educação para ao jovem.145 O atendimento da boa educação deve ser a todos,

pois a Sociedade é constituída de pessoas de diferentes classes, mas o princípio

142 PHILIPE, Marie-Dominique. Introdução à Filosofia de Aristóteles. São Paulo: Paulus, 2002. p.37 143 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça, Virtude Moral e Razão. p.48 144 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça, Virtude Moral e Razão. p. 48 145 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça, Virtude Moral e Razão. p. 48

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universal da educação deve ser o da sua unidade. Se o ser humano for educado

para viver em Sociedade organizada, tendo a educação conforme o regime

político estabelecido, o mesmo terá condições de desenvolver suas

potencialidades e aprendendo a conviver em Sociedade livre.

O operador do Direito que busca alcançar a excelência

moral e intelectual, não deve jamais deixar de lado o pensamento aristotélico da

idéia de Justiça. Como bem manifestou Soares:

O pensamento aristotélico serve de base para muitas teorias que vêm depois dele, e com isso, torna-se indispensável o conhecimento destes pressupostos por parte dos docentes e discentes do curso de Direito, mas al[em disto, toca em um ponto extremamente relevante que é a existência de duas dimensões para que cheguemos a uma sociedade justa, à formação moral pelas virtudes e à orientação legal par determinarmos condutas, unificando externamente a vida nas diversas áreas, comercial, familiar, pública e ou privada [...]146

Quanto à importância de ter a filosofia aristotélica como base

dos estudos jurídicos, não mais necessita de argumentos. Mas importante

destacar as dimensões que Soares salienta: a formação moral pelas virtudes e à

orientação legal para determinadas condutas147. Se existentes as dimensões elas

deve ser alcançadas pelos operadores do Direito. A presente pesquisa mostrou

como elas se estruturam, basta agora trilhar o caminho da educação humana.

A educação deve ser voltada para que o ser humano seja

livre. O ser livre é capaz de escolhas e de entender seu papel na Sociedade.

Aquele que quer bem governar, antes de tudo deve aprender a obedecer.148 A

educação deve ser voltada para a vida em Sociedade, mas não se pode esquecer

que a Sociedade tem sua constituição primeira na célula familiar. É na família que

146 SOARES, Josemar Sidinei. Os Pressupostos Filosóficos da Idéia de Justiça na História da Filosofia: contribuições para o ensino jurídico. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, 2003. p. 122. 147 SOARES, Josemar Sidinei. Os Pressupostos Filosóficos da Idéia de Justiça na História da Filosofia: contribuições para o ensino jurídico. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, 2003. p. 122. 148 SILVA, Moacyr Motta da. Direito, Justiça, Virtude Moral e Razão. Curitiba: Juruá Editora, 2004. p. 49

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se aprende a consonância entre o particular e o social. O conjunto funcionará

quando não tiver debilidades das partes. Nesta linha de compreensão se faz

necessário cuidar dos detalhes desde o princípio da educação e ao operador do

Direito não será diferente. O que confirma, uma vez mais, a necessidade do

mesmo buscar uma formação completa desde os primeiros anos de academia.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Confirma-se as hipóteses levantadas no início da presente

pesquisa. O pensamento moral exposto na obra Ética a Nicômaco está

intimamente ligado à teoria política. A ética diz respeito ao indivíduo, enquanto a

política considera o ser humano em sua dimensão social.

A importância da Ética a Nicômaco, exposta nesta pesquisa,

delimita-se na sua origem filosófica: foi o primeiro tratado sobre o agir humano da

história, daí sua incontestável contribuição para compreensão das relações

sociais. A abordagem sobre as relações entre os indivíduos na Ética a Nicômaco

tornou-se a proposta e objetivo da ética aristotélica.

A convivência política é onde o ser humano se realiza

perfeita e plenamente. Só assim alcança a plenitude de sua natureza. Daí a

estrita ligação entre ética e política. A ética individual é a ética das virtudes morais

e pessoais que estão subordinadas à ética política, ou seja, à comunidade

política. Para Aristóteles, a comunidade política se guia pela mais completa das

virtudes, a Justiça.

O conjunto de obras aristotélicas, em especial as Ética a

Nicômaco, Retórica e A Política, elencam passagens sobre o Direito e a política

que visam à concretude da Justiça. O caminho do Direito adotado por Aristóteles

foi a grande sustentação para sua tese sobre a Justiça. Mesmo que para muitos

pensadores as obras jurídicas surgem com o Direito romano, não se pode negar

que este se constituiu sob a inspiração da obra aristotélica. Aristóteles clarificou

os problemas e apontou os caminhos, permitindo aos romanos a construção do

belo edifício do Direito.

Aristóteles compreendeu e expressou perfeitamente a

essência do Direito, sendo que tal compreensão proporcionou um valor

inestimável para a ciência jurídica. A obra de Aristóteles torna-se presente e apta

a novas leituras e diferentes descobertas, contribuindo para a compreensão da

Justiça na Sociedade.

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Ao tempo que Aristóteles delimita o Direito, também aponta

caminhos para a autonomia política das Sociedades. Nesse contexto, escreve

suas éticas que apontam o modo do agir humano.

O agir humano é um emaranhado de relações sociais que

visam a um fim em si mesmo, ao qual a ética aristotélica define como bem. O bem

que Aristóteles considera um fim em si mesmo e o mais desejado entre todos é a

felicidade, sendo, então, a felicidade a finalidade da ação humana.

Aristóteles procura definir o que seja a felicidade e quais as

ações humanas que conduzem ao bem supremo, sendo as ações humanas

analisadas como virtudes: virtudes morais e intelectuais.

Nesta pesquisa optou-se em esclarecer, na primeira parte, a

mais completa das virtudes morais, a Justiça, que foi conceituada no Livro V da

Ética a Nicômaco, obra que é dirigida aos juristas. Será nesta obra que se

permitirá a existência do jurista e da filosofia do Direito, como entidades

epistemologicamente autônomas. É observando esses escritos que melhor se

compreende a Justiça em Aristóteles.

A conceituação do que é Justiça, Aristóteles a faz

verificando os diferentes significados dos termos Justiça e injustiça. O justo é o

que pratica a Justiça. Quem é o justo? É aquele que respeita a lei e aquele que

respeita a igualdade. O injusto é o seu contrário. Contudo, Aristóteles deixa claro

que a Justiça da lei é Justiça apenas em certo sentido, pois, deve-se considerar a

dimensão da virtude como Justiça. A Justiça como virtude é aquela disposição de

caráter do ser humano em relação ao outro.

A Justiça enquanto virtude chama-se Justiça Geral ou total,

enquanto a Justiça especifica denomina-se de Justiça particular. Esta é objeto

próprio do Direito da arte jurídica. Esta distinção feita por Aristóteles sobre Justiça

Geral e Justiça particular é o que importa ao estudo realizado. Enquanto a Justiça

Geral é entendida como matéria da ética e da política, a Justiça particular é a

parte que interessa diretamente ao Direito.

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A relação da Justiça com o Direito é o que conduz à

organização social, pois a meta que se deseja alcançar quando se busca o Direito

é a Justiça. Ademais, é a Justiça que apresenta os critérios para aferir e julgar o

Direito que cada um busca através da tutela do Estado, e este age visando o bem

comum e a paz social.

A contra senso, vê-se que é por meio do Direito que a

Justiça se concretiza como positividade jurídica, aquilo que se destacou no

trabalho: da necessidade do legislador produzir leis que cada vez mais

concretizem a realização da Justiça torna-se presente. E quando a lei universal

não atender ao caso particular, que deve o operador do Direito invocar a

Jurisdição da Eqüidade, que tem a função Corretiva da lei, ou seja, estabelece o

fundamento necessário para adequar a lei universal para o caso concreto.

Entretanto, deve-se lembrar que a Eqüidade não é a criação de uma nova lei. O

juiz não fará o papel do legislador, tão somente usará da Jurisdição da Eqüidade

para dizer o Direito ao caso concreto com Justiça, e a Justiça proferida na

Jurisdição da Eqüidade é o justo.

Para que a Justiça seja entendida no mais alto grau da

excelência, necessário se faz compreender como o Estado estrutura

modernamente suas jurisdições para garantir o acesso à Justiça. A estrutura

estatal, para viabilização da Justiça, é a estrutura jurisdicional.

No segundo capitulo, procurou-se demonstrar a Jurisdição

como fruto da razão humana, pois a partir dos conflitos surgidos entre os

humanos, há a busca de uma forma de solucioná-los. Um longo período se

passou e diferentes formas surgiram: a autotutela, a autocomposição, e a forma

mais aperfeiçoada de solução de conflitos que até hoje subsiste na maior parte do

mundo, a Jurisdição. Na qual o Estado toma para si a responsabilidade de dirimir

os conflitos.

A Jurisdição como função, atividade e poder de o Estado

dizer o Direito e praticar a Justiça, foi a definição adotada no trabalho. Estudou-

se, anteriormente, a estrita relação entre Direito e Justiça. Relação tão estrita que

muitos, hoje, referem-se a busca do Direito como busca da Justiça, o que, para o

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operador do Direito, não pode ser confundido, pois deve ficar claro que o Direito

pode conduzir à Justiça, desde que a lei não contenha vícios.

Surge então a pergunta: O que o operador do Direito deve

fazer para que o Direito seja o instrumento para a prática da Justiça? Uma vez

mais, retorna-se à filosofia de Aristóteles, para demonstrar que ao operador do

Direito cabe estar preparado para interpretar a lei e utilizá-la sempre em vista da

Justiça, não como mera garantia do Direito, mas, como promotora da cidadania e

de democracia. A preparação para tal função se alcança quando se busca a

excelência moral e intelectual.

No terceiro capitulo, procurou-se mostrar a importância da

formação do operador do Direito, que, para tanto, precisa buscar a excelência

moral e intelectual. Ambos são fruto do hábito. Sendo assim, necessário saber

quais são os caminhos e critérios a serem seguidos.

Se o futuro operador do Direito, em seu período de estudo

na Universidade, não se dedicar à pesquisa e à ciência, não fará outra coisa

senão dogmática jurídica. Não se pode interpretar a dogmática como imposição

de verdades infalíveis. Mesmo seguindo essa conceituação, não se pode reduzir

a ciência do Direito a dogmática jurídica. A ciência do Direito, que deve ser feito

pelo filósofo do Direito, deve ter o objetivo de levá-lo a desenvolver sua

excelência moral e intelectual, que se alcança com a educação.

A educação deve ser voltada para que o ser humano seja

livre. O ser livre é capaz de escolhas e de entender seu papel na Sociedade.

Aquele que quer bem governar, antes de tudo deve aprender a obedecer. A

educação deve ser voltada para a vida em Sociedade, mas não se pode esquecer

que a Sociedade tem sua constituição primeira na célula familiar. É na família que

se aprende a consonância entre o particular e o social. O conjunto funcionará

quando não tiver debilidades das partes. Nesta linha de compreensão se faz

necessário cuidar dos detalhes desde o princípio da educação, sendo que ao

operador do Direito não será diferente. O que confirma, uma vez mais, a

necessidade deste buscar uma formação completa desde os primeiros anos de

academia.

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A formação do operador do Direito deve ser constante, e não

pode ser fruto do casuísmo. Entretanto, deve considerar os alicerces já

sedimentados na organização da Sociedade. A Teoria da Justiça, elaborada por

Aristóteles, na Antigüidade, torna-se presente até nossos dias. Promover a

Justiça, em muitos casos, não é seguir a lei em sua interpretação gramatical, mas

usar da aplicação da Eqüidade, ou seja, adequar a lei ao caso concreto.

E, por fim, necessário se faz lembrar que a pesquisa sobre a

temática proposta inicialmente não teve o intuito de ser um tratado completo. Foi

uma visão, de certo modo simples, mas que procurou apontar elementos

filosóficos teóricos e práticos para o agir humano. Ademais, vale ressaltar, que os

pontos elencados não são somente os consensuados pelos estudiosos

aristotélicos. Surge, assim, a afirmação de que o estudo cada vez mais precisa

ser aprofundado.

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