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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO ANA CAROLINA SANTA RITA PICANÇO A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL À LUZ DO DIREITO CONTEMPORÂNEO NITERÓI 2013

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Page 1: A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL À LUZ DO DIREITO ... COM FICHA... · Síndrome da Alienação Parental, trazendo para o leitor conceitos para a identificação de sua ocorrência

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSECURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

ANA CAROLINA SANTA RITA PICANÇO

A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL À LUZ DO DIREITO CONTEMPORÂNEO

NITERÓI2013

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ANA CAROLINA SANTA RITA PICANÇO

A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL À LUZ DO DIREITO CONTEMPORÂNEO

Monografia apresentada ao Curso deGraduação em Direito da UniversidadeFederal Fluminense, como requisito parcialpara obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. JEAN ALBERT DE SOUZA SAADI

NITERÓI2013

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ANA CAROLINA SANTA RITA PICANÇO

“A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL À LUZ DO DIREITOCONTEMPORÂNEO”

Monografia apresentada ao Curso deGraduação em Direito da UniversidadeFederal Fluminense, como requisito parcialpara obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Aprovada em março de 2013.

BANCA EXAMINADORA

Professor Jean Albert de Souza SaadiUFF

Professor Sérvio Túlio Santos VieiraUFF

Professor Antônio PlastinaUFF

NITERÓI2013

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Universidade Federal FluminenseSuperintendência de Documentação

Biblioteca da Faculdade de Direito

P585 Picanço, Ana Carolina Santa Rita. A síndrome da alienação parental à luz do direito contemporâneo / Ana Carolina Santa Rita Picanço. – Niterói, 2013. 52 f.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) –Universidade Federal Fluminense, 2013.

1. Direito de família. 2. Alienação social. 3. Relaçõesfamiliares. 4. Parentesco. 5. Jurisprudência. 6. Estatuto daCriança e do Adolescente (ECA). I. Universidade FederalFluminense. Faculdade de Direito, Instituição responsável II.Título.

CDD 342.16

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Dedico este trabalho à todos os incansáveiscompanheiros e colaboradores.

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À minha família, pelo apoio incondicional.

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“Decidir ter um filho é algo de extrema importância. É decidirter o coração, para sempre, andando fora do seu corpo.” (Elizabeth W. Stone)

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RESUMO

O presente trabalho resume-se em um estudo acerca das causas, efeitos e consequências daSíndrome da Alienação Parental, trazendo para o leitor conceitos para a identificação de suaocorrência no caso concreto. O enfoque deste trabalho de conclusão de curso não se restringiuà análise das consequências da Síndrome em estudo apenas para os menores envolvidos, mastambém à análise de todos os reflexos que incidem sobre a família, ressaltando, além disso, aimportância do operador do direito nos casos levados à égide do Judiciário e as decisõesproferidas, que vêm tornando uniforme a jurisprudência pátria. Por fim, há de se frisar aindaque todo o estudo adiante exposto foi realizado sob a ótica comparativa da importância e doreconhecimento que se dava ao tema antes e como ele está sendo tratado após o advento daLei 12.318/2010.

Palavras-chave: Direito de família. Alienação social. Relações familiares. Parentesco.Jurisprudência. Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

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ABSTRACT

This work presents a study on the causes, effects, and consequences of the Parental AlienationSyndrome, bringing to the reader the concepts that identify its occurrence in specific cases.The focus of this course final paper is not only restricted to the analysis of the consequencesof the studied Syndrome for the under ages involved, since it also analyses all the reflexes onthe family, highlighting, in addition, the importance of the legal operator in the cases broughtto the Judiciary aegis and the decisions handed down, which are making the nationaljurisprudence uniform. Finally, it is also necessary to emphasize that the whole study set outbelow was undertaken from a comparative point of view on the importance and appreciationof the theme before and after implementation of Brazilian Law # 12.318/2010.

Keywords: Family Law. Social alienation. Family relations. Kinship. Jurisprudence. Statuteof Children and Adolescents.

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SUMÁRIO

1INTRODUÇÃO ...................................................................................................

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2O CONCEITO DE FAMÍLIA À LUZ DO DIREITO.....................................

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3HISTÓRICO .......................................................................................................

21

4CARACTERIZAÇÃO DO PROBLEMA.........................................................

25

4.1O menor alienado ..................................................................................................

12

4.2O genitor alienador ...............................................................................................

20

4.3O genitor alienado .................................................................................................

28

4.4As consequências no caso concreto ......................................................................

30

5O PAPEL DO JUDICIÁRIO E SEUS AUXILIARES ....................................

31

5.1Conselho tutelar ....................................................................................................

32

5.2Advogado ..............................................................................................................

33

5.3Mediador ...............................................................................................................

34

5.4Psicólogos e psiquiatras ........................................................................................

35

6POSIÇÃO JURISPRUDENCIAL.....................................................................

37

7RELATOS CONCRETOS.................................................................................

46

8CONCLUSÃO .....................................................................................................

49

9REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..............................................................

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1 INTRODUÇÃO

Antes de problematizar o tema, mister esclarecer brevemente o que se entende por

Síndrome da Alienação Parental.

Em estreita síntese, pode-se tratar a referida síndrome como sendo conhecida em

âmbito jurídico e sociológico como ‘SAP’ e trata-se do ‘processo de programar’ uma criança

para que não possua qualquer afinidade com o genitor não-guardião da mesma, sem que haja

qualquer justificativa idônea.

O fenômeno em estudo ocorre por influência do genitor guardião, com quem

normalmente a criança estabelece laços afetivos mais fortes, tendo em vista a intensidade do

contato, bem como até mesmo a maior afinidade que acaba por se desenvolver entre a criança

alienada e o genitor alienante.

Embora a denominação Síndrome de Alienação Parental seja recente – data de,

aproximadamente, 1998 –, o fenômeno é frequente nas separações, no tocante às visitas,

pensão alimentícia e guarda dos filhos, motivo pelo qual ganhou grande importância na

ciência jurídica recentemente, uma vez que comprovados os grandes transtornos e prejuízos

que a prática repudiável de afastamento compulsório entre genitor e descendente pode causar

ao menor, refletindo em toda a sua vida adulta, influenciando, inclusive em suas relações

sociais e constituição de sua família.

Para delimitar melhor o tema, cabe aqui frisar que, o que também se estuda

atualmente, é que nem sempre o causador do afastamento entre a prole e seus ascendentes é o

genitor cuidador, uma vez que muitas das vezes aquele se dá por culpa de outros membros da

família ou até mesmo por total abandono do segundo genitor, tema que, embora não seja o

foco do presente trabalho, por sua notável importância, há de ser citado, eis que veio

recentemente – acórdão publicado em 10/05/20121 – à pauta de julgamento do Superior

Tribunal de Justiça, que em decisão inédita, condenou em R$200 mil reais a título de danos

morais o genitor/réu pelo abandono de sua filha, conforme se pode aferir de informativo

veiculado no sítio do STJ2.

1 REsp 1159242.2 http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=105567

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Há de se notar que, em primeira instância, entendeu-se pela ocorrência da Síndrome da

Alienação Parental, ao prolatar sentença de improcedência dos pedidos autorais, o d. juízo a

quo fundamentou sua decisão alegando agressividade da mãe da autora nos episódio em que o

genitor tentou a procurar.

Contudo, em sede de Recurso Especial, o assunto foi devidamente esclarecido,

inclusive no sentido de se asseverar que a ocorrência da Síndrome da Alienação Parental, nos

casos similares, seria causa de excludente de ilicitude, impossibilitando a reparação

indenizatória pleiteada:

“Terceira Turma obriga pai a indenizar filha em R$ 200 mil por abandono afetivo.

“Amar é faculdade, cuidar é dever.” Com essa frase, da ministra Nancy Andrighi, aTerceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) asseverou ser possível exigirindenização por dano moral decorrente de abandono afetivo pelos pais. A decisão éinédita. Em 2005, a Quarta Turma do STJ, que também analisa o tema, haviarejeitado a possibilidade de ocorrência de dano moral por abandono afetivo. No caso mais recente, a autora entrou com ação contra o pai, após ter obtidoreconhecimento judicial da paternidade, por ter sofrido abandono material e afetivodurante a infância e adolescência. Na primeira instância, o pedido foi julgadoimprocedente, tendo o juiz entendido que o distanciamento se deveu aocomportamento agressivo da mãe em relação ao pai.

Ilícito não indenizável.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), porém, reformou a sentença. Emapelação, afirmou que o pai era “abastado e próspero” e reconheceu o abandonoafetivo. A compensação pelos danos morais foi fixada em R$ 415 mil.

No STJ, o pai alegou violação a diversos dispositivos do Código Civil e divergênciacom outras decisões do tribunal. Ele afirmava não ter abandonado a filha. Alémdisso, mesmo que tivesse feito isso, não haveria ilícito indenizável. Para ele, a únicapunição possível pela falta com as obrigações paternas seria a perda do poderfamiliar.

Dano familiar.

Para a ministra, porém, não há por que excluir os danos decorrentes das relaçõesfamiliares dos ilícitos civis em geral. “Muitos, calcados em axiomas que se focam naexistência de singularidades na relação familiar – sentimentos e emoções –, negam apossibilidade de se indenizar ou compensar os danos decorrentes dodescumprimento das obrigações parentais a que estão sujeitos os genitores”,afirmou.

“Contudo, não existem restrições legais à aplicação das regras relativas àresponsabilidade civil e o consequente dever de indenizar/compensar, no direito defamília”, completou a ministra Nancy. Segundo ela, a interpretação técnica esistemática do Código Civil e da Constituição Federal apontam que o tema dosdanos morais é tratado de forma ampla e irrestrita, regulando inclusive “osintrincados meandros das relações familiares”.

Liberdade e responsabilidade

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A ministra apontou que, nas relações familiares, o dano moral pode envolverquestões extremamente subjetivas, como afetividade, mágoa, amor e outros. Issotornaria bastante difícil a identificação dos elementos que tradicionalmentecompõem o dano moral indenizável: dano, culpa do autor e nexo causal.

Porém, ela entendeu que a par desses elementos intangíveis, existem relações quetrazem vínculos objetivos, para os quais há previsões legais e constitucionais deobrigações mínimas. É o caso da paternidade.

Segundo a ministra, o vínculo – biológico ou autoimposto, por adoção – decorresempre de ato de vontade do agente, acarretando a quem contribuiu com onascimento ou adoção a responsabilidade por suas ações e escolhas. À liberdade deexercício das ações humanas corresponde a responsabilidade do agente pelos ônusdecorrentes, entendeu a relatora.

Dever de cuidar

“Sob esse aspecto, indiscutível o vínculo não apenas afetivo, mas também legal queune pais e filhos, sendo monótono o entendimento doutrinário de que, entre osdeveres inerentes ao poder familiar, destacam-se o dever de convívio, de cuidado, decriação e educação dos filhos, vetores que, por óbvio, envolvem a necessáriatransmissão de atenção e o acompanhamento do desenvolvimento sócio-psicológicoda criança”, explicou.

“E é esse vínculo que deve ser buscado e mensurado, para garantir a proteção dofilho quando o sentimento for tão tênue a ponto de não sustentar, por si só, amanutenção física e psíquica do filho, por seus pais – biológicos ou não”,acrescentou a ministra Nancy.

Para a relatora, o cuidado é um valor jurídico apreciável e com repercussão noâmbito da responsabilidade civil, porque constitui fator essencial – e não acessório –no desenvolvimento da personalidade da criança. “Nessa linha de pensamento, épossível se afirmar que tanto pela concepção, quanto pela adoção, os pais assumemobrigações jurídicas em relação à sua prole, que vão além daquelas chamadasnecessarium vitae”, asseverou.

Amor

“Aqui não se fala ou se discute o amar e, sim, a imposição biológica e legal decuidar, que é dever jurídico, corolário da liberdade das pessoas de gerarem ouadotarem filhos”, ponderou a ministra. O amor estaria alheio ao campo legal,situando-se no metajurídico, filosófico, psicológico ou religioso.

“O cuidado, distintamente, é tisnado por elementos objetivos, distinguindo-se doamar pela possibilidade de verificação e comprovação de seu cumprimento, queexsurge da avaliação de ações concretas: presença; contatos, mesmo que nãopresenciais; ações voluntárias em favor da prole; comparações entre o tratamentodado aos demais filhos – quando existirem –, entre outras fórmulas possíveis queserão trazidas à apreciação do julgador, pelas partes”, justificou.

Alienação parental

A ministra ressalvou que o ato ilícito deve ser demonstrado, assim como o dolo ouculpa do agente. Dessa forma, não bastaria o simples afastamento do pai ou mãe,decorrente de separação, reconhecimento de orientação sexual ou constituição denova família. “Quem usa de um direito seu não causa dano a ninguém”, ponderou.

Conforme a relatora, algumas hipóteses trazem ainda impossibilidade prática deprestação do cuidado por um dos genitores: limitações financeiras, distâncias

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geográficas e mesmo alienação parental deveriam servir de excludentes de ilicitudecivil.

Ela destacou que cabe ao julgador, diante dos casos concretos, ponderar também nocampo do dano moral, como ocorre no material, a necessidade do demandante e apossibilidade do réu na situação fática posta em juízo, mas sem nunca deixar deprestar efetividade à norma constitucional de proteção dos menores.

“Apesar das inúmeras hipóteses que poderiam justificar a ausência de pleno cuidadode um dos genitores em relação à sua prole, não pode o julgador se olvidar que deveexistir um núcleo mínimo de cuidados parentais com o menor que, para além domero cumprimento da lei, garantam aos filhos, ao menos quanto à afetividade,condições para uma adequada formação psicológica e inserção social”, concluiu.

Filha de segunda classe

No caso analisado, a ministra ressaltou que a filha superou as dificuldadessentimentais ocasionadas pelo tratamento como “filha de segunda classe”, sem quefossem oferecidas as mesmas condições de desenvolvimento dadas aos filhosposteriores, mesmo diante da “evidente” presunção de paternidade e até depois deseu reconhecimento judicial.

Alcançou inserção profissional, constituiu família e filhos e conseguiu “crescer comrazoável prumo”. Porém, os sentimentos de mágoa e tristeza causados pelanegligência paterna perduraram.

“Esse sentimento íntimo que a recorrida levará, ad perpetuam, é perfeitamenteapreensível e exsurge, inexoravelmente, das omissões do recorrente no exercício deseu dever de cuidado em relação à recorrida e também de suas ações, queprivilegiaram parte de sua prole em detrimento dela, caracterizando o dano in reipsa e traduzindo-se, assim, em causa eficiente à compensação”, concluiu a ministra.

A relatora considerou que tais aspectos fáticos foram devidamente estabelecidospelo TJSP, não sendo cabível ao STJ alterá-los em recurso especial. Para o TJSP, opai ainda teria consciência de sua omissão e das consequências desse ato.

A Turma considerou apenas o valor fixado pelo TJSP elevado, mesmo diante dograu das agressões ao dever de cuidado presentes no caso, e reduziu a compensaçãopara R$ 200 mil. Esse valor deve ser atualizado a partir de 26 de novembro de 2008,data do julgamento pelo tribunal paulista. No julgamento do STJ, ficou vencido oministro Massami Uyeda, que divergiu da maioria.” (STJ, 2012)

Retomando ao assunto, nota-se que, quando a síndrome se instala, o relacionamento da

criança com o genitor alienado fica irremediavelmente comprometido.

O genitor que tem a guarda do filho vale-se de comportamentos manipuladores,

induzindo a criança a criar uma má imagem do outro genitor (não guardião), visando ‘puni-lo’

e expulsá-lo por completo da vida dos filhos. Com o tempo, a criança, consciente ou

inconscientemente, passa a colaborar com essa finalidade, situação altamente destrutiva para

ele e para o genitor alienado.

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Portanto, resta evidente que a Síndrome da Alienação Parental está intimamente ligada

a uma relação extremamente conflituosa entre os pais, o que gera grandes e negativas

consequências ao menor, e refletirá até mesmo em sua vida adulta.

O genitor alienante costuma impedir qualquer contato entre o filho e os parentes do

ex-cônjuge, aumentando o sentimento de perda da criança, já abalada com a separação dos

pais.

Os filhos, como mecanismos de autodefesa, negam o conflito, acreditando que

rejeitam o pai por crença própria, e não por induzimento do genitor guardião. Nutrem

sentimentos de baixa estima, exteriorizando comportamentos regressivos, como queda de

rendimento escolar e urinar nas vestes, não se adaptam aos ambientes sociais em que devem

interagir e apresentam agressividade imotivada.

Conclui-se que a alienação parental é uma das formas de abuso contra a criança,

podendo levar à destituição do genitor alienante do seu poder familiar, conforme será

estudado adiante.

O referido tema foi escolhido devido à grande discussão atual acerca das formas de

abuso contra a criança. O Estatuto da Criança e do Adolescente, criado pela lei 8.069/90, tem

o objetivo de minudenciar direitos assegurados ao menor e fazer cumprir a lei através de

meios coercitivos, garantindo os direitos fundamentais da criança de proteção à vida e à

saúde, mediante a efetivação das políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o

desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência3. Tais condições

dignas são constantemente desrespeitadas na atual conjuntura, principalmente no que

concerne à instituição da família.

Neste sentido, no ano de 2010 foi promulgada a lei nº 12.318, em 26 de agosto, que

deu destaque ao tema.

Contudo, desde 2004 já existe jurisprudência (principalmente no Rio Grande do Sul,

Distrito Federal, Rio de Janeiro, São Paulo e Mato Grosso) reconhecendo a Síndrome de

Alienação Parental e invertendo a guarda em casos onde persiste o desrespeito à convivência

e às visitas.

3 Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069/90, Capitulo I – do Direito à vida e à saúde. Brasília/DF,Senado Federal, 1990.

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Igualmente, será aqui abordado o posicionamento do Poder Judiciário e como o

problema é tratado por juízes, desembargadores, advogados, peritos e assistentes sociais, bem

como pelos pais e crianças ao se depararem com o problema.

Não se pode negar que o tema envolve o interesse de toda a sociedade, uma vez que

resguardar a criança é dever de todos, como bem coloca a legislação pátria, aduzindo que “a

criança tenha uma infância feliz e possa gozar, em seu próprio benefício e no da sociedade, os

direitos e as liberdades aqui enunciados e apela a que os pais, os homens e as mulheres em sua

qualidade de indivíduos, as organizações voluntárias, as autoridades locais e os Governos

nacionais reconheçam estes direitos e se empenhem pela sua observância mediante medidas

legislativas e de outra natureza, progressivamente instituídas”.

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2 O CONCEITO DE FAMÍLIA À LUZ DO DIREITO

Para melhor entender sobre o tema aqui abordado, mister se faz a realização de breve

exposição sobre o conceito de família para o direito pátrio.

Em que pese tenha evoluído ao longo do tempo, em linhas gerais, entende-se por

família o conjunto de pessoas possuidoras de grau de parentesco entre si, que residem e

convivem juntas, em um mesmo domicílio, formando um lar, sendo, em regra – admitindo-se

atualmente a união homoafetiva –, constituída por um casal (cônjuge varão e virago), unidos

por uma sociedade conjugal, que pode se dar pelo matrimônio ou união de fato, e por sua

prole, compondo uma família nuclear ou elementar.

Jurídico e socialmente falando, a família é considerada instituição responsável por

promover a educação dos filhos e influenciar o comportamento dos mesmos no meio social.

O papel da família – regido pelo poder familiar dos genitores – no desenvolvimento de

cada indivíduo é de fundamental importância, eis que no seio familiar é que são transmitidos

os valores morais e sociais que servirão de base para o processo de socialização da criança,

bem como as tradições e os costumes perpetuados através de gerações.

A sociedade é unânime no sentido de que o ambiente familiar é um local onde deve

existir harmonia, afetos, proteção e todo o tipo de apoio necessário na resolução de conflitos

ou problemas de algum dos membros. As relações de confiança, segurança, conforto e bem-

estar proporcionam a unidade familiar.

Além da tradicional estrutura familiar acima descrita, denominada nuclear ou

elementar, as transformações sociais e culturais, proporcionaram a existências de diferentes

estruturas familiares.

Neste sentido, alguns distintos conceitos doutrinários do instituto em comento:

“(...) Família em sentido genérico e biológico é o conjunto de pessoas quedescendem de tronco ancestral comum; em senso estrito, a família serestringe ao grupo formado pelos pais e filhos; e em sentido universal éconsiderada a célula social por excelência.(...)”4

4 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Vol. V - Direito de Família. 16. ed. Rio deJaneiro: Editora Forense, 2007.

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“(...) Formação por todas aquelas pessoas ligadas por vínculo de sangue, ouseja, todas aquelas pessoas provindas de um tronco ancestral comum, o queinclui, dentro da órbita da família, todos os parentes consanguíneos. Numsentido mais estrito, constitui a família o conjunto de pessoas compreendidopelos pais e sua prole.(...)”5

“(...) Todos os indivíduos que estiverem ligados pelo vínculo daconsanguinidade ou da afinidade, chegando a incluir estranhos. No sentidorestrito é o conjunto de pessoas unidas pelos laços do matrimônio e dafiliação, ou seja, unicamente os cônjuges e a prole.(...)”6

“(...) Uma reunião de pessoas descendentes de um tronco ancestral comum,incluídas aí também as pessoas ligadas pelo casamento ou pela união estável,juntamente com seus parentes sucessíveis, ainda que não descendentes.(...)”7

“(...) uma instituição social, composta por mais de uma pessoa física, que seirmanam no propósito de desenvolver, entre si, a solidariedade nos planosassistencial e da convivência ou simplesmente descendem uma da outra oude um tronco comum.(...)”8

‘(...) É o conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de naturezafamiliar.(...)”9

“(...) Todas as pessoas ligadas por vínculo de sangue e que procedem,portanto, de um tronco ancestral comum, bem como unidas pela afinidade epela adoção(...)”10

In casu, superadas as questões conceituais, estudar-se-á predominantemente a família

monoparental, que é composta por apenas um dos progenitores – pai ou mãe –, devido a

causas circunstanciais alheias ao relacionamento entre ambos e ao nascimento do menor,

como o abandono, separação/divórcio ou na decisão da mulher de gerar uma criança de forma

‘independente’.

Insta mencionar que o óbito de um dos genitores também é causa circunstancial

ensejadora de formação da família monoparental. Contudo, por óbvio, não é aplicável ao

objeto do presente estudo.

Assim, desfeita a família nuclear, seja por abandono, seja por separação do casal, em

muitos dos casos, principalmente quando impera o litígio entre os cônjuges, passa-se a

5 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil. Vol. 6 - Direito de Família. 28. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2004.6 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito de Família. Vol. 5. 22. ed. São Paulo: EditoraSaraiva, 2007.7 FIUZA, Cezar. Direito Civil – Curso Completo. 12ª ed. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2008.8 NADER, Paulo. Curso de Direito Civil. Vol. 5 - Direito de Família. 1. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense,2006.9 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Vol. VI - Direito de Família. 5. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2005.10 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Direito de Família. Vol. VI. 4. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2007.

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observar mudanças de comportamento da criança, não somente perante toda a sociedade, mas

também no que diz respeito a um de seus genitores.

Tal comportamento passou a ser objeto de estudo de inúmeras áreas profissionais,

como a psicologia, sociologia, medicina etc., motivo pelo qual, para o direito, que regula as

relações sociais, não houve outra escolha senão ater-se à sua dinamicidade, tendo de passar a

estudar, para posteriormente regulamentar, a síndrome que irá se analisar a diante e foi

formalmente introduzida no ordenamento jurídico nacional com o advento da lei 12.318 de

2010, que alterou o art. 236 do Estatuto da Criança e Adolescente. Vejamos seu inteiro teor:

“Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a alienação parental. Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formaçãopsicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dosgenitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a suaautoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo aoestabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atosassim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente oucom auxílio de terceiros:I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício dapaternidade ou maternidade; II - dificultar o exercício da autoridade parental; III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criançaou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós,para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar aconvivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste oucom avós. Art. 3º A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança oudo adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nasrelações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criançaou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental oudecorrentes de tutela ou guarda. Art. 4º Declarado indício de ato de alienação parental, a requerimento ou de ofício,em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente, oprocesso terá tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido oMinistério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação daintegridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar suaconvivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for ocaso. Parágrafo único. Assegurar-se-á à criança ou adolescente e ao genitor garantiamínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco deprejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestadopor profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento dasvisitas. Art. 5º Havendo indício da prática de ato de alienação parental, em ação autônomaou incidental, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica oubiopsicossocial. § 1º O laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial,conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame

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de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação,cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame daforma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusaçãocontra genitor. § 2º A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados,exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ouacadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.§ 3º O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência dealienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo,prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativacircunstanciada. Art. 6º Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta quedificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ouincidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrenteresponsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuaisaptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso: I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; III - estipular multa ao alienador; IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; VII - declarar a suspensão da autoridade parental. Parágrafo único. Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ouobstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levarpara ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião dasalternâncias dos períodos de convivência familiar. Art. 7º A atribuição ou alteração da guarda dar-se-á por preferência ao genitor queviabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor nashipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada. Art. 8º A alteração de domicílio da criança ou adolescente é irrelevante para adeterminação da competência relacionada às ações fundadas em direito deconvivência familiar, salvo se decorrente de consenso entre os genitores ou dedecisão judicial. Art. 9º (VETADO) Art. 10. (VETADO) Art. 11. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”

Atualmente, apesar de ainda não haver vasta bibliografia sobre o tema, já existem

algumas obras dedicadas à sua análise, bem como recentemente passou a ser objeto de

julgados não só dos Tribunais Estaduais, como das Cortes Suprema e Superior. Vejamos atual

posicionamento doutrinário:

“Este tema começa a despertar a atenção, pois é prática que vem sendodenunciada de forma recorrente. Sua origem está ligada à intensificação dasestruturas de convivência familiar, o que fez surgir, em consequência, maioraproximação dos pais com os filhos. Assim, quando da separação dosgenitores, passou a haver entre eles uma disputa pela guarda dos filhos, algoimpensável até algum tempo atrás.”11

11 DIAS, Maria Berenice. Síndrome da Alienação Parental, o que é isso?. Retirado dehttp://www.mariaberenice.com.br, em 18/12/2012 às 20:00h.

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“Ela costuma ser desencadeada nos movimentos de separações ou divórciosdos casais, mas sua descrição ainda constitui uma novidade, sendo poucoconhecida por grande parte dos operadores do direito.”12

“De forma para lá de desarrazoada foram vetados dois procedimentos dosmais salutares: a utilização da mediação e a penalização de quem apresentarelato falso que possa restringir a convivência do filho com o genitor. Assim,a lei que vem com absoluto vanguardismo deixa de incorporar prática quetem demonstrado ser a mais adequada para solver conflitos familiares. Tal,no entanto, não compromete o seu mérito, eis que estava mais do que nahora de a lei arrancar a venda deste verdadeiro crime de utilizar filhos comoarma de vingança!”13

“As crianças, ao contrário do genitor afastado, estão totalmente indefesaspara ajudar a si mesmas. Só lhes resta esperar que os adultos resolvam oproblema para libertá-los desse pesadelo. Se a intervenção não acontece, acriança fica abandonada e crescerá com pensamentos disfuncionais.”14

Sendo assim, adiante, após colocações preliminares, passaremos à problematização do

tema.

12 KÉPES, Rada. A Síndrome de Alienação Parental: um estudo exploratório.13 DIAS, Maria Berenice. Alienação parental: uma nova lei para um velho problema!. Retirado dehttp://www.mariaberenice.com.br, em 18/12/2012 às 20:15h.14 DARNALL, Dr. Douglas. Consequências da Síndrome de Alienação Parental sobre as crianças e sobre ogenitor alienado. Retirado de http://www.vev.chen/pas/bw199809.htm, em 18/12/2012 às 20:30h.

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3 HISTÓRICO

É possível concluir através de simples observância da vida cotidiana que a síndrome

ora em análise, que será à frente pormenorizada em seus detalhes, é fenômeno relativamente

recente, cada vez mais recorrente e de proporções cada vez mais devastadoras para as

crianças, jovens, adolescentes e sociedade.

Tal mudança é facilmente explicável pela evolução do tratamento dado pela sociedade

e pelo direito à ruptura da sociedade conjugal.

Frise-se que aqui o termo evolução não foi usado em seu sentido estrito, dicionarizado,

posto que, como iremos concluir ao final deste trabalho, que o que vem ocorrendo nas

famílias é um verdadeiro retrocesso social.

Como se sabe, a Síndrome da Alienação Parental surge da disputa de guarda dos filhos

pelos seus pais, tendo como origem, em regra, o divórcio judicial e/ou de corpos.

Anteriormente ao advento da Emenda Constitucional nº 66 de 13 de julho de 201015, a

doutrina e jurisprudência tratavam dois como sendo os institutos de ruptura da relação

conjugal: a separação e o divórcio, que para Maria Berenice Dias possuíam distinções

conceituais essenciais à compreensão da SAP, pois a separação ainda não dissolvia a

sociedade conjugal e o vínculo entre o casal era mantido.

A própria redação da lei anterior ao advento da mencionada Emenda Constitucional já

se encarrega de estabelecer a distinção entre os dois institutos, ao especificar que somente a

morte e o divórcio dissolvem o casamento.

Contudo, paradoxalmente, aduzia a lei que a separação colocava termo a sociedade

conjugal, mas não a dissolve, flagrando-se uma certa incongruência entre tais afirmativas.16

Entretanto, por ter sido aquele panorama acerca da ruptura das sociedades conjugais

alterado, não se faz necessária a análise minuciosa de suas características e diferenças entre si

neste momento.15 Dá nova redação ao § 6º do art. 226 da Constituição Federal, que dispõe sobre a dissolubilidade do casamentocivil pelo divórcio, suprimindo o requisito de prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou decomprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos.16 DIAS, Maria Berenice. Direito de Família e o novo Código Civil / Coordenação Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira. – 3. ed., ver. Atual. e ampl., Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p 101.

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Sendo assim, com a mencionada alteração na legislação pátria, faremos a análise em

comento nos referindo à ruptura das relações conjugais como um único instituto – o divórcio

–, que com o conservadorismo na sociedade do século passado, e junto a uma influência forte

da religião, por muito tempo não existiu, sendo o casamento, até um passado relativamente

recente, não passível de dissolução.

O casamento, no entanto, sempre conviveu no Brasil com outras situações de fato: a

união não matrimonializada entre casais, frequente desde o período colonial, e família

monoparental socialmente caracterizada pela figura da mãe solteira e da mulher que fora

abandonada pelo companheiro.

Com os costumes evoluindo na sociedade, houve uma própria revolução no conceito

de família – já analisada no presente trabalho –, mas a resistência com relação ao divórcio

ainda existia, e que para acontecesse uma lei que regulamentasse o divórcio, houve a

necessidade de algumas concessões.

Inicialmente, foi chamado de desquite, e com a edição de lei nova (Lei 6.515 de 26 de

dezembro de 1977) passou-se a chamar de separação judicial que dispensava os cônjuges dos

deveres do casamento sem romper o matrimônio.

Entretanto, embora normatizada e juridicamente aceita, a ideia não foi de imediato

recepcionada pela sociedade, sendo, anos depois, alterada pela Lei 7.841 de 17 de outubro de

1989, que afastou a necessidade de identificar a causa para a concessão.

Sendo assim, em seguida, após a possibilidade de obter o divórcio com a mera

comprovação de ruptura da vida em comum, foi institucionalizada a forma direta,

consolidando como instituto autônomo sem necessidade de prévia separação judicial,

dispondo do efeito de impedir um novo casamento, não obstando, no entanto a constituição de

uma nova união estável.

Contudo, embora já esteja superado o temor de que o divórcio iria levar a degeneração

da sociedade, a efemeridade das relações matrimoniais ocasionadas pela atual facilidade da

ruptura da sociedade conjugal vem causando enormes conflitos em relação à guarda da

criança fruto da relação findada, refletindo diretamente nos menores envolvidos nesse

processo de rompimento, dando muitas vezes ensejo à síndrome objeto do presente estudo.

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Desta forma, a psicologia jurídica e o Poder Judiciário passam a atuar juntos para a

solução das questões conflituosas que se instauram envolvendo divórcios – outrora precedidos

por separações –, com ou sem disputa de guarda, pedidos de alimentos, regulamentação de

visitas, modificação de guarda e outros, pois os Tribunais acabam por receber muitos casos,

passando por crises pessoais e interpessoais, sobrecarregando as varas de família e da infância

e da juventude com problemas a serem resolvidos a longo prazo e que requerem toda uma

estrutura interdisciplinar para resolução de situações que envolvam violência e abusos,

visando o apoio aos genitores e, principalmente, aos menores envolvidos.

O conflito envolvendo a mudança de guarda de crianças e adolescentes é o maior

gerador da Síndrome da Alienação Parental e, nesta seara do direito de família, é o assunto

que mais requer atenção do Judiciário, pois prescinde de atenção e análise cuidadosa do caso

concreto, eis que uma decisão errada pode causar grandes transtornos que refletirão na vida

dos menores envolvidos e, por corolário lógico, em toda a sociedade.

Neste ínterim, Denise Maria Peressini17 explica essa questão da psicologia jurídica na

aérea do processo judicial brasileiro:

Nas Varas de Família e das Sucessões dos Foros Regionais e dos Tribunais deJustiça estaduais, priorizam-se casos em que há filhos envolvidos (direta ouindiretamente) nas relações processuais. Isso porque, como membro da famíliaafetivamente mais sensível, a criança percebe mais facilmente os efeitos nocivos deuma desestruturação familiar, e por esse motivo sofre os maiores prejuízosemocionais e comportamentais. (SILVA, 2013)

Em regra, o que se vê com frequência é que os casais que chegam aos litígios não se

esforçam para resolver seus conflitos da melhor maneira possível sem prejudicar a criança,

pois, na maioria das vezes, agem sob forte pressão emocional, devendo ser repensada a

questão da maior atuação do trabalho do psicólogo judiciário para analisar a situação e tentar

amortizar os impactos negativos que a ruptura da relação conjugal traz a todo o núcleo

familiar envolvido.

Sendo assim, com o panorama histórico brevemente aqui explanado e com todos os

conflitos da separação judicial seguidos da disputa de guarda da criança, efeitos e

consequências aparecem, ensejando a Síndrome de Alienação Parental, o que deu azo a

estudos mais aprofundados sobre o tema, passando a ser, como já dito, protegido pela

legislação pátria, uma vez concluído que a ruptura do casamento dos pais é um evento

17 SILVA, Denise Maria Peressini da. Psicologia jurídica no Processo Civil Brasileiro: a interface da psicologiacom direitos nas questões de família e infância, São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003, p.112.

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traumático que irá evocar na criança sentimento de culpa, ansiedade, sentimentos de

abandono, menor tempo de dedicação dos pais aos filhos, problemas escolares e outros.

4 CARACTERIZAÇÃO DO PROBLEMA

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Inicialmente, é necessário falar sobre o surgimento do problema, que se dá com a

separação do casal e com a necessária definição de guarda da prole entre os genitores,

restando ao outro genitor não guardião apenas a convivência delimitada por competente

processo de regulamentação de visitas, que poderá ocorrer mediante acordo ou estipulado pelo

juiz.

Contudo, embora os genitores litigantes lutem por este direito como se lhes

pertencessem, ao contrário do que possa parecer, esse direito é da criança e visa minimizar os

efeitos causados com o fim da sociedade conjugal, preservando os laços de convivência.

Assim, elucidadas as questões atinentes à ruptura da relação conjugal, visando atender

não apenas os interesses dos genitores, mas todos os relacionados à criança, o direito de

convivência entre o menor e genitor não guardião não pode sofrer qualquer resistência,

embaraço ou dificuldade para seu exercício, exceto raríssimas exceções como, por exemplo,

comprovados maus tratos e abusos sexuais, temas estes não objetos do presente trabalho.

Ocorre que, iniciada a disputa judicial pela guarda do filho, os genitores, tomados por

sentimentos degenerativos, se esquecem que os interesses da criança são os que devem

prevalecer e devem ser preservados, pois, com a intenção de afastar a criança do convívio

com o genitor não guardião, o guardião fomenta a Alienação Parental, que é o início,

propriamente dito, do processo de afastamento.

A Alienação Parental, como já mencionado no presente trabalho, consiste na

implantação de falsas memórias com a finalidade de criar sentimentos de repúdio da criança

em relação ao genitor alienado.

Na maioria das vezes tudo não passa de devaneios do genitor alienante que,

inconformado, em regra, com o fim do relacionamento, tenta por termo aos laços afetivos

ainda existentes daquela família, ainda que estas não sejam suas reais intenções – muitos dos

genitores alienantes o fazem sem ter ciência, ou seja, involuntariamente.

Com a intensificação desse quadro surge uma Síndrome que resulta das técnicas e

procedimentos utilizados pelo guardião para atingir o resultado final, qual seja, o afastamento

completo entre ambos.

Desta forma, passando a se identificar cada vez mais com seu guardião e acreditando

em tudo o que lhe é contado, o menor passa então a entrar em um processo de rejeição do

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outro genitor, repelindo qualquer tentativa de aproximação e contato sem qualquer

justificativa aparente.

Assim, com o passar do tempo e a constante repetição de conceitos negativos sobre o

outro genitor, esse quadro evolui para um irreversível afastamento.

Os efeitos dessa alienação podem durar anos – no caso da publicitária Rafaella,

narrado em capítulo adiante, essa situação perdurou até os seus 26 anos, só tendo cessado

após dar início a um tratamento psicológico – com consequências gravíssimas para a

formação da criança, que somente será superada quando adquirida independência em relação

ao genitor alienante, que ainda assim fará o possível para que o quadro não seja revertido.

A Síndrome de Alienação Parental no Brasil ainda é objeto de muitos estudos e só

passou a regulamentada a partir de 2010, diferente do que ocorre em outros países do mundo,

como por exemplo, os Estados Unidos, onde é punida severamente.

A SAP foi identificada e estudada profundamente pelo Dr. Richard A. Gardner, que a

define da seguinte maneira:

A síndrome da alienação parental (SAP) é um distúrbio que surge inicialmente nocontexto das disputas em torno da custódia infantil. Sua primeira manifestaçãoverifica-se numa campanha que visa denegrir a figura parental perante a criança,uma campanha que não tem justificação. Esta síndrome resulta da combinação deum programa de doutrinação dos pais (lavagem cerebral) juntamente com acontribuição da própria criança para envilecer a figura parental que está na miradesse processo.18

Elaborados os devidos conceitos, ato contínuo, mister se faz expor a linha tênue que

diferencia a Alienação Parental da Síndrome da Alienação Parental, que, embora intimamente

ligadas, sendo uma fruto de desdobramento da outra.

Contudo, seus conceitos não se confundem.

Isto por que, entende-se que a Alienação Parental é a desconstituição da figura

parental de um dos genitores ante a criança, consistindo na campanha de desmoralização, de

marginalização desse genitor, sendo a criança manipulada com o intuito de transformar esse

genitor num estranho, a criança então é motivada a afastá-lo do seu convívio.

Esse processo é praticado dolosamente ou não por um agente externo, um terceiro, e

não está restrito ao guardião da criança, pois como será possível verificar nos julgados e nos

18 Disponível em: http://www.paskids.com/.

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casos concretos trazidos à colação no presente trabalho adiante, há casos em que a Alienação

Parental é promovida pelos avós, por exemplo, sendo perfeitamente possível ser fomentada

por qualquer pessoa com relação parental com a criança ou não.

Já a Síndrome de Alienação Parental se instala após recorrentes ocorrências de

tentativa de alienação, ou seja, tentativas de afastamento e ruptura do laço entre pais e filhos,

dizendo respeito aos efeitos emocionais e às condutas comportamentais desencadeados na

criança que é ou foi vítima desse processo.

Resumindo, grosso modo, podemos aduzir que a SAP consiste nas sequelas deixadas

pela Alienação Parental.

Sendo assim, o que se conclui é que, com a ajuda de profissionais da área da

psicologia e psiquiatria e do Poder Judiciário, enquanto não se instala a Síndrome, é possível a

reversão da Alienação Parental e o restabelecimento da ordem no núcleo familiar.

Posto isso, estudar-se-á adiante os personagens desse triste quadro – o menor alienado,

o genitor alienador e o genitor alienado – e, por fim, suas consequências.

4.1 O menor alienado

É entendimento pacífico tanto doutrinário, quanto jurisprudencial que a criança é a

maior vítima e a mais prejudicada nos casos de instalação da Síndrome da Alienação Parental.

Isso se dá porque elas não têm a capacidade de reconhecer as manipulações que

sofrem, pois possuem capacidade limitada de se defender, o que é somado à dependência

financeira e emocional em relação aos pais, bem como sua ainda restrita e subdesenvolvida

habilidade de avaliar e posicionar-se acerca da disputa entre os pais.

O que se vê é que a criança é utilizada pelo alienador como objeto de disputa, uma

arma na guerra que se instaurou contra o outro genitor, passando a criança a não existir mais

para si, mas como objeto de uso de seus genitores, posto que incorpora todas aquelas falsas

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memórias que lhe foram implantadas, o que gera, em um futuro próximo, depressão, suicídio,

vícios e outros.

Assim, entendimento incontroverso é que a presença pacífica e contínua de ambos os

genitores é da máxima importância na fase de desenvolvimento da criança e transição para a

vida adulta do adolescente, não devendo a prole de forma alguma ser utilizada para fins

repudiáveis como observamos no presente estudo.

4.2 O genitor alienador

Pelo o que se extrai da literatura e pelo o que se vê dos julgados, em sua maioria, o

genitor alienante é a mulher.

Contudo, é importante ressaltar que nem sempre é a mãe o genitor alienador, podendo

ele ser o pai ou algum outro parente como os avós, por exemplo.

Neste sentido, as opiniões divergem quanto à estatística e as motivações, que são as

mais diversas, resumindo-se, em geral, em ciúmes, inveja, vingança, possessividade, egoísmo,

irresignação com o término do relacionamento.

Para a advogada, ex-desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e

Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro do Direito de Família, Maria Berenice Dias,

é a dificuldade de elaborar o luto que leva a mulher, ou o genitor alienador a cometer tais atos,

que são, muitas das vezes, motivadas pela ruptura da vida conjugal, que gera na mãe

sentimento de abandono, de rejeição, de traição, surgindo uma tendência vingativa muito

grande.

E, quando não consegue elaborar adequadamente o luto da separação, desencadeia um

processo de destruição, de desmoralização, de descrédito do ex-cônjuge, motivo pelo qual, ao

ver o interesse do pai em preservar a convivência com o filho, quer vingar-se, afastando este

do genitor.19

19 Retirado do site www.mariaberenice.com.br, em 16/02/2013, às 18:35h.

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Assim, conclui-se como característica inerente a todos os alienadores a incapacidade

de superar perdas, sendo estas sempre o estopim para dar início aos seus planos

maquiavélicos.

Para a psicanálise existem dois tipos de genitores alienadores.

O primeiro é o superprotetor, que pretende reparar uma ferida em si próprio, e que

acredita ser o melhor genitor, o único capaz de cuidar bem dos filhos, utilizando-se de

pequenas ocorrências pretéritas com o intuito de desmoralizar o outro e sempre acreditando

que de fato esses irrelevantes desvios desqualificam subitamente o outro.

Já o segundo é o genitor que pode ser chamado de vingativo, paranóico ou perverso,

pois se sente sempre sob ameaça do outro, fantasiando todo o mal que poderá causar aos

filhos, o acusando de violências e comportamentos reprováveis que não passam de fruto de

sua imaginação.

Este tipo é o que se entende como mais temível, pois, em regra, começa o processo de

alienação parental com implantação de falsas memórias antes mesmo da dissolução da

sociedade conjugal, sendo quase impossível para as vítimas – a criança e o genitor alienado –

escaparem da instalação da síndrome.

4.3 O genitor alienado

Na visão do genitor alienador e da criança alienada o personagem em comento é visto

como intruso, pessoa que não é bem vinda ao convívio e foi banida do contexto familiar.

Contudo, o que se sabe é que, assim como a criança, o genitor alienado também é uma

das vítimas da Síndrome da Alienação Parental.

Isso porque, em que pese inicialmente tente reverter o quadro de alienação instaurado,

posteriormente, começa a sofrer com um tipo de stress pós-traumático criado pelas rejeições,

agressões e humilhações que se acumulam, o que o impedirá de dormir, ocupará

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negativamente seus pensamentos e se estenderá às outras esferas de sua vida, o prejudicando

na esfera profissional, em suas relações sociais e até uma eventual nova relação conjugal.

A situação do genitor alienado ainda se agrava por restar como único vinculo entre ele

e seu antigo núcleo familiar a questão financeira, posto que, embora esteja sendo impedido de

manter contato com sua prole, geralmente suas obrigações alimentícias continuam a ser

pontualmente cobradas, e muitas vezes até judicialmente, causando mais humilhações e

culminando até mesmo em prisões civis, gerando uma síndrome depressiva neste personagem,

posto lhe ser a única margem de ação lhe resta.

4.4 As consequências no caso concreto

Sendo assim, delimitadas as ações e atitudes comportamentais de todos os personagens

envolvidos nestas tristes histórias, passaremos a dissertar sobre as consequências observadas

no caso concreto.

O que se conclui é que, por ser levada a odiar o genitor alienado, acaba-se por romper

um vinculo sanguíneo e afetivo muito forte que existe entre pais e filhos que permanecerá

irremediavelmente destruído.

Tal ruptura refletirá em toda a vida adulta da criança alienada que poderá vir a

desenvolver diversos sintomas e transtornos psiquiátricos e, sem tratamento adequado, trarão

sequelas capazes de perdurar para o resto da vida, implicando em um comportamento que

pode ir de socialmente reprovável (imoral) até ilícito (criminosos de todos os tipos).

Desta forma, em um sentido amplo, o que se observa são duas diferentes

consequências causadas pela SAP: uma de ordem pessoal, que atinge tão somente a esfera

psicológica do menor, lhe causando futuros transtornos muitas vezes até de cunho sexual, e

uma de ordem pública, que atinge toda a sociedade que irá vir a conviver com o adulto

problemático que aquela criança irá de tornar.

A de ordem pessoal é considerada pelo Legislativo e pelo Judiciário como forma de

maus tratos e covardia para com a criança alienada, motivo pelo qual foi editada a Lei

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12.318/2010, que tipifica a conduta do alienador de modo a preservar a vida e integridade

psíquica do menor, alterando, por conseguinte o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Já as consequências de ordem pública deverão ser objeto de estudo mais aprofundado

em outra oportunidade, uma vez que carecem de dados concretos para que se possa afirmar a

ligação direta entre adolescentes infratores e adultos criminosos com os casos de alienação

parental, embora tal afirmativa seja um tanto quanto óbvia.

5 O PAPEL DO JUDICIÁRIO E SEUS AUXILIARES

Em síntese, ao Poder Judiciário, na seara familiar em estudo cabe, além das questões

de cunho patrimonial, atribuir a guarda dos filhos a um dos genitores nos casos de dissolução

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da sociedade conjugal, devendo em cada caso concreto exercer a tarefa de identificar qual dos

genitores ou, se for o caso, terceiro – parente ou não –, possui melhores condições para

possuir a guarda e exercer todas as obrigações a ela inerentes.

Em contrapartida, ao genitor não guardião são designadas visitas periódicas, que

devem ser prestadas conforme acordado entre as partes, nos casos de ruptura harmoniosa, ou

como determinar o juízo, nos casos de litígio.

Entretanto, há que se compreender que, exceto nos casos de ruptura consensual e

harmoniosa, o que chega ao Judiciário são os restos de sentimentos, um relacionamento

fracassado, carregado de mágoas, ressentimentos e, muitas vezes, desejo de vingança norteado

pela culpa que se transfere ao ex-cônjuge.

Assim, na linha dinâmica nesta narrativa, as armas da guerra instaurada, como aqui já

visto, são os filhos, restando ao Judiciário a intermediação com a finalidade de, além de

decidir a lide que lhe foi apresentada, amortizar o máximo possível as consequências para

todo o núcleo familiar, sendo formada toda uma estrutura multidisciplinar de profissionais

capacitados, envolvendo o Conselho Tutelar, advogados, mediadores, psicólogos e

psiquiatras, cujos papéis serão aqui analisados.

5.1 Conselho tutelar

Inicialmente, falaremos do Conselho Tutelar, que com o papel fundamental na

proteção das crianças e adolescentes, sua principal função é zelar pelos direitos da infância e

juventude, nos termos do estabelecido pela Lei 8.069 de 13 de julho de 1990 – Estatuto da

Criança e do Adolescente.

Sua definição legal está no artigo 131 da aludida lei, onde é previsto que

“(...) o Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo, não jurisdicional,encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e doadolescente, definidos nesta Lei. (...)”

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O artigo 136 do ECA (Estatuto da criança e do adolescente) continua a tratar da

instituição em comento, delineando suas atribuições em rol enumerativo, que consiste em i)

atender às crianças e adolescentes que tiverem seus direitos ameaçados por ação ou omissão

da sociedade, Estado ou dos próprios familiares; ii) receber a comunicação dos casos de

suspeita ou confirmação de maus tratos, de reiteradas faltas injustificadas ou de evasão

escolar depois de esgotados os recursos escolares e de elevados níveis de repetência; iii)

requisitar ao serviço social, previdência, trabalho e segurança, ao promover a execução de

suas decisões; iv) atender e aconselhar os pais e responsáveis, podendo aplicar algumas

medidas, tais como encaminhamento a cursos ou programas de orientação e promoção a

família e tratamento especializado; v) assessorar a administração pública na elaboração de

propostas orçamentárias, com a finalidade de garantir planos e programas de atendimento

integrado nas áreas de saúde, educação, cidadania, geração de trabalho e renda a favor da

infância e juventude; vi) encaminhar a notícia de fatos que constituem infração administrativa

ou penal contra os direitos da criança e do adolescente; e, por fim, vii) incluir no programa de

auxílio, orientação e tratamento de alcoólatras e toxicômanos.

Delimitadas suas funções, temos como seu representante junto à comunidade o

Conselheiro Tutelar, que atua como porta voz junto ao Judiciário e aos órgãos e entidades de

apoio do Estado.

A escolha do Conselheiro é realizada através de sufrágio direito, onde a comunidade

elege cinco membros para mandato de três anos, observando sempre a absoluta autonomia e

independência funcional do Órgão Tutelar.

5.2 Advogado

Diante da problemática exposta, muito se pergunta qual deverá ser o comportamento e

medidas adotadas pelo do advogado que, embora exerça munus publico, não tem suas

atividades diretamente ligadas e/ou subordinadas ao Estado?

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Deverá ele usar de todos os meios processuais para alcançar o almejado por seu cliente

ou deverá ponderar entre aqueles interesses e os interesses e bem estar do menor envolvido?

Diante de um contexto desses, como deve ser a postura do advogado?

O papel do advogado nesses casos é demasiadamente delicado, eis que deve sempre

levar em conta os melhores interesses das crianças e adolescentes envolvidos, ainda que tenha

de ir de encontro aos desejos de seu cliente, o que por muitas das vezes cria rompimentos

contratuais, tornando a advocacia em âmbito familiar de dificultoso exercício.

Assim, fugindo totalmente às suas atividades habituais, o advogado deverá observar

atentamente a de terceiro não cliente – o menor –, considerando a vontade do menor e levando

em conta alguns critérios para ter a capacidade de bem representá-la, como, por exemplo, sua

idade, a maneira de se expressar, seu raciocino, seu comportamento diante do problema

concreto e, principalmente, diante da hipótese de solução.

Na qualidade de estranho mais próximo ao litígio instaurado, o advogado deve atentar

para postura do genitor guardião, com a finalidade de detectar qualquer vestígio de tentativa

de uma possível Alienação Parental como, por exemplo, raiva persistente e exagerada em

relação ao outro genitor; aceitação dos pedidos e das acusações da criança; incapacidade em

encontrar qualidades no outro genitor; recusa de considerar que uma terapia possa ser útil, etc.

São atitudes simples e fáceis de observar que demonstram a animosidade em relação

ao outro genitor que devem ser observadas pelo advogado, devendo desde logo tentar impedir

que as tentativas de alienação virem constantes e a Síndrome da Alienação Parental se instale

no núcleo familiar, indicando uma solução mais adequada ao caso concreto, buscando sempre

o melhor interesse da criança.

5.3 Mediador

A mediação familiar é realizada como forma de desafogar o judiciário, bem como

evitar que os conflitos cheguem às últimas consequências, que é levar o litígio para ser

dirimido pelo Estado.

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Trata-se de um procedimento estruturado de gestão de conflitos pelo qual a

intervenção confidencial e imparcial de um profissional qualificado – às vezes psicólogos, às

vezes assistentes sociais –, o mediador, tenta restabelecer a comunicação e o diálogo entre as

partes.

O mediador possui como papel a condução da problemática apresentada pelas partes

com a finalidade de firmar acordos razoáveis e duráveis, que zelem principalmente nas

necessidades e no bem estar das crianças envolvidas.

A título comparativo, temos que a mediação familiar pode ser comparada aos tribunais

arbitrais – frise-se, resguardadas as devidas diferenças e consequências jurídicas concedidos

às decisões finais –, eis que, na prática, assim como naquele, o que o Mediador encontra,

quando convocado a participar de um processo de separação, é uma situação conflituosa,

dramática, da qual participam pessoas extremamente abaladas por uma recente ruptura.

In casu é, cada um dos cônjuges em conflito está pensando apenas em si mesmo,

motivo pelo qual não mais se atêm aos frutos do relacionamento que ali se põe termo, motivo

pelo qual é de extrema importância a intervenção mediadora.

5.4 Psicólogos e psiquiatras

Por fim, como um dos principais profissionais de apoio ao Judiciário nas situações

aqui estudadas, temos os psicólogos e psiquiatras, que, por muitas vezes são peritos nos feitos

judiciais em âmbito familiar.

Quando não atuam com a finalidade de amenizar os prejuízos trazidos pelos litígios –

fins terapêuticos –, os profissionais dessa área atuam como peritos, por designação formal de

autoridade judicial, administrativa ou como assistentes técnicos, usando de conhecimento

cientifico e clínico indispensáveis aos litígios jurídico familiares.

Sobre estes profissionais, Denise Maria Perissini da Silva20:

20 SILVA, Denise Maria Perissini da. Psicologia jurídica no processo civil brasileiro: a interface da psicologiacom direitos nas questões de família e infância. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003, p 62/63.

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“Um bom perito deve ser antes de tudo, um bom medico (psiquiatra) ou psicólogo,com no mínimo dois anos de prática clinica, a fim de conhecer o diagnostico, apartir daí, precisa saber articular o discurso médico ou psicológico com o forense.A principal dificuldade consiste na ausência de formação em psicologia jurídica namaioria dos cursos de graduação e pós-graduação das universidades públicas eparticulares brasileiras, com exceção de algumas instituições particulares quetomaram essa iniciativa e incluem essa disciplina no currículo.A formação acadêmica da maioria das universidades brasileiras volta-se para omodelo clínico, e o psicólogo que atua no poder judiciário atua com situaçõesdiferenciadas, porque representa uma instituição diferente do consultório, e precisase fazer compreender no meio jurídico.”

Por fim, a mencionada escritora na mesma obra define as atividades destes

profissionais:

“Sua função consiste em interpretar a comunicação inconsciente que ocorre nadinâmica familiar e pessoal, em processos jurídicos que envolvem: separação(consensual ou litigiosa), divórcio (consensual ou litigioso), modificação da guarda,tutela, curatela, pensão alimentícia, vitimização em qualquer de suas formas (física,sexual, psicológica), perda ou suspensão do poder familiar, entre outras.”

6 POSIÇÃO JURISPRUDENCIAL

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Antes finalizar o presente trabalho de conclusão de curso, ilustrando o tema aqui

estudado com relatos de casos reais, para concluir a análise do papel do judiciário na

medicalização da problemática ilustrada, seguirão colacionados abaixo recentes julgados

acerca do tema.

Aqui será possível verificar também, que, como já dito, muitas das vezes, a síndrome

ora em análise envolve não tão somente o núcleo familiar – pai, mãe e filhos. Vejamos.

1) Voto do Desembargador Relator Dr. Nagib Slaib do Tribunal de Justiça do Estado

do Rio de Janeiro, nos autos do Agravo de Instrumento n° 0054637-76.2012.8.19.0000,

interposto contra decisão que manteve a visitação do genitor mesmo diante de denúncias de

abuso sexual do avô paterno, evitando assim a instauração da SAP21:

“Integra-se ao presente o douto parecer de fls. 137/141, de lavra da culta e diligenteProcuradora de Justiça, Doutora Cristiane Bernstein Seixas, nos termos dopermissivo constante do art. 92, § 4º, do Regimento Interno deste Tribunal.

Debate-se neste agravo sobre decisão liminar, proferida em medida cautelar desuspensão de visitação paterna à criança, que permitiu a visita do pai, sem pernoite esem a presença do avô paterno, sob suspeita de ter cometido abuso sexual e outrasmedidas.

Liminarmente foi deferido o efeito suspensivo pleiteado no agravo. A agravantesustenta que o filho do casal, sofreu abuso sexual perpetrado pelo avô paterno e queo agravado, pai da criança, continua a fomentar o contato da criança com o avô, nãoacreditando que houve o abuso.

O estudo psicológico (fls. 96/110) não revela com segurança a ocorrência do abuso,mas enfatiza na conclusão que não existe óbice à visitação e convivência com o pai.

“Assim, com base nas considerações acima apontadas, prestigiando os interesses dacriança, como sujeito de direitos, bem como a preservação de sua integridadepsicológica e, notadamente, porque não foi identificado nenhum óbice de ordempsicológica no pai, não vejo motivo plausível para recomendar a convivência entrepai e filho, mormente diante da manifestação de Bernardo ao dizer que sentesaudades”.

Da mesma forma, no douto parecer ministerial:

“Quanto ao mérito do agravo, opina esta Procuradoria de Justiça pelo improvimentodo mesmo, sendo de ser estritamente observada a determinação contida na decisãoatacada no sentido de a visitação paterna ser realizada sem a presença do avôpaterno, em razão das graves notícias que pairam quanto ao suposto abuso sexualperpetrado pelo idoso figurando como vítima o seu neto Bernardo. Se, por um lado,são gravíssimas as suspeitas de vitimização da criança, por outro é certo que não é opai, ora agravado, o suspeito de perpetrar o abuso. Desta forma, prover o agravo e

21 Ementa: “Direito da criança e do adolescente. Medida cautelar visando à suspensão temporária da convivênciacom o pai. Suspeita de abuso sexual perpetrado pelo avô paterno. Decisão determinando a convivência aosdomingos em horário específico, sem pernoite e sem a presença do avô paterno. Manutenção. Os estudos sócio-psicológicos realizados demonstraram que a criança sente falta do pai e que a desconfiança do abuso pairasomente em relação ao avô paterno. Prevalência do melhor interesse da criança. Preservação do vínculo deparentesco, evitando-se a alienação parental. Desprovimento do recurso.”

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manter a decisão liminarmente deferida significaria verdadeira alienação parental,fato igualmente indesejável ao salutar desenvolvimento da criança”.

Os estudos sociopsicológicos realizados demonstraram que a criança sente falta dopai e que a desconfiança do abuso paira somente em relação ao avô paterno.

Assim, visando à prevalência do melhor interesse da criança, com a preservação dovínculo de parentesco, evitando-se a alienação parental, deve ser revogada a liminaranteriormente concedida por este Relator e desprovido o agravo.

No mesmo sentido, o seguinte precedente:

Processo: 0033077-78.2012.8.19.0000 1ª Ementa - AGRAVO DE INSTRUMENTODES. CARLOS EDUARDO PASSOS - Julgamento: 29/08/2012 - SEGUNDACÂMARA CÍVEL GUARDA DE MENOR. Prevalência do interesse do menor.Conceito juridicamente indeterminado. Certa liberdade na operação deconcretização. Criança com quatro anos de idade. Suspeita de abuso sexualpraticado pelo genitor. Ausência de provas produzidas sob o crivo do contraditório.Laudos produzidos unilateralmente pelo agravante. Pleito de suspensão integral davisitação. Medida drástica suscetível de gerar alienação parental. Estabelecimento devisitação quinzenal na presença dos avós paternos e de pessoa indicada pelagenitora, além da autorização de correspondência virtual entre pai e filho.Providência que preserva, simultaneamente, a convivência entre ambos e o bomdesenvolvimento físico-psíquico do menor. Recurso provido em parte.

A ausência da convivência com o pai pode gerar a situação de alienação parental,havendo risco de jamais ser restabelecida psicológica e emocionalmente.

Vale transcrever os artigos 2º e 3º da Lei nº 12.318/2010, que dispõe sobre aalienação parental e altera o art. 236 da Lei nº 8069/1990:

Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formaçãopsicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dosgenitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a suaautoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo aoestabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atosassim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente oucom auxílio de terceiros:

I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício dapaternidade ou maternidade;

II - dificultar o exercício da autoridade parental;

III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;

IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;

V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criançaou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;

VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós,para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;

VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar aconvivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste oucom avós.

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Art. 3º A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança oudo adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nasrelações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criançaou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental oudecorrentes de tutela ou guarda.

Ante tais considerações, o voto é no sentido de negar provimento ao recurso,mantendo-se integralmente a decisão impugnada.”

2) Voto da Desembargadora Relatora Dra. Maria Berenice Dias do Tribunal de Justiça

do Estado do Rio Grande do Sul, nos autos do Agravo de Instrumento n° 70015224140,

interposto contra decisão liminar que havia suspendido a visitação do genitor e,

posteriormente, foi reconsiderada pelo próprio juízo a quo22:

“Trata-se de agravo de instrumento interposto por Miriam S.S., em face da decisãoda fl. 48, que, nos autos da ação de destituição de poder familiar que move em facede Sidnei D. A., que tornou sem efeito a decisão da fl. 41, que, na apreciação dopedido liminar, suspendeu o poder familiar do agravado.

Alega que a destituição do poder familiar havia sido determinada em razão da fortesuspeita de abuso sexual do agravado com a filha do casal.

Afirma que não concorda com a manifestação do magistrado que tornou sem efeitosa decisão proferida anteriormente, visto que não utilizou nenhum expedientedestinado a induzir a erro a magistrada prolatora do primeiro despacho. Ademais,ressalta que juntou aos autos documentos de avaliação da criança e do grupofamiliar. Requer seja provido o presente recurso e reformada a decisão impugnada,com a consequente suspensão do poder familiar (fls. 2-7).

O Desembargador-Plantonista recebeu o recurso no efeito meramente devolutivo (fl.49).

O agravado, em contrarrazões, alega que a agravante não trouxe aos autos o laudopsicológico das partes, o qual é essencial para o entendimento do caso. Afirma que olaudo pericial produzido em juízo reconheceu a impossibilidade de diagnosticar aocorrência do suposto abuso sexual de que é acusado. Salienta que tal ação estásendo utilizada pela agravante como represália pelo fato de o agravante já terprovado na ação de regulamentação de visitas a inexistência de tal atrocidade, bemcomo, ter obtido o direito de rever sua filha. Requer o desprovimento do agravo (fls.58-64).

A Procuradora de Justiça opinou pelo conhecimento e parcial provimento, para queseja suspenso, liminarmente, o poder familiar do agravado por seis meses,determinando-se, de imediato, o seu encaminhamento a tratamento psiquiátrico, nostermos do art. 129, incisos III, do ECA, para futura reapreciação da medidaproposta, restabelecendo as visitas, caso assim se mostre recomendável, medianteparecer medicopsiquiátrico, a ser fornecido pelos profissionais responsáveis pelotratamento do agravado e da infante, no prazo acima mencionado, a fim de permitirao Juízo o exame da matéria (fls. 119-127).

22 Ementa: “Destituição do poder familiar. Abuso sexual. Síndrome da alienação parental. Estando as visitas dogenitor à filha sendo realizadas junto a serviço especializado, não há justificativa para que se proceda adestituição do poder familiar. A denúncia de abuso sexual levada a efeito pela genitora, não está evidenciada,havendo a possibilidade de se estar frente à hipótese da chamada síndrome da alienação parental. Negadoprovimento.”

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Requerido o adiamento do julgamento do recurso, em face da audiência. Nesta,deliberada a continuação das visitas junto ao NAF, requereu a agravante odesacolhimento do recurso (fls. 130-142).

É o relatório.

A agravante ingressou com ação de destituição do poder familiar com pedidoliminar de antecipação de tutela a fim de que fosse suspenso o poder familiar do pai,em razão de fatos que desencadearam inclusive processo crime por atentado violentoao pudor: entre 16 e 17 de abril de 2005, em oportunidades distintas, o genitor atritarseu corpo contra o corpo da filha, então com 3 anos de idade, simulando umarelação sexual, bem como manipulando-lhe as nádegas e introduzindo um dos dedosno órgão genital da menina (fl. 32)

As partes controvertem em duas outras ações: guarda e regulamentação de visitas,ambas propostas pelo genitor, em face de ter a genitora passado a inviabilizar oscontados da filha com ele.

Na ação de regulamentação de visitas foi determinada sua realização junto aoNúcleo de Atendimento à Família do Foro Central – NAF.

Neste mesmo processo foi celebrado acordo entre os genitores, de aproximaçãoentre pai e filha, com a mediação de profissionais habilitados.

Nesta oportunidade restou consignado: O MP concorda com acordo pela razão deinexistir nos autos prova incontroversa da existência de abuso sexual por parte doréu, mormente o exame de constituição carnal e, também as demais avaliaçõespericiais realizadas pelo Juízo (fl. 47).

No dia 19-4-2006, junto ao Projeto de Conciliação, foi suspenso o poder familiar emantecipação de tutela (fl. 41). Em 27-4-2006, a decisão foi tornada sem efeito pelojuízo, vez que se utilizou a autora de expediente destinado a induzir em erro amagistrada (fl. 48), decisão que deu ensejo a presente irresignação. Claro que este éuma das mais difíceis situações em que a Justiça é chamada a decidir. De um lado,há a obrigação constitucional de assegurar proteção integral às crianças eadolescentes, e de outro, deve ser reconhecida a importância da manutenção dosvínculos afetivos entre pais e filhos.

Assim, quando da separação dos pais, a maior preocupação de ambos deveria serpreservar, acima de tudo, os laços de convivência da prole com ambos os genitorespara minimizar os reflexos que o fim da convivência sempre gera.

No entanto, e infelizmente, isso nem sempre ocorre e acaba sendo delegado ao juiz aimpossível tarefa de decidir o que nem os pais conseguem: dizer o que é melhor paraos seus filhos.

Muitas vezes a ruptura da vida conjugal gera sentimento de abandono, de troca, detraição, surgindo uma tendência vingativa muito grande.

Ao ver o interesse do genitor em preservar a convivência com o filho, independentedo fim da relação conjugal, o guardião quer se vingar, afastando os filhos do outro.Quando não consegue elaborar adequadamente o luto da separação, desencadeia umprocesso de destruição, de desmoralização, de descrédito do ex-parceiro.

Tal é o que moderna doutrina designa como “síndrome de alienação parental”:processo para programar uma criança para que odeie o genitor, sem qualquerjustificativa. Trata-se de verdadeira campanha de desmoralização. O filho é utilizadocomo instrumento da agressividade direcionado ao genitor. Assim, são geradas umasérie de situações que levam o filho a rejeitar o pai. Este processo recebe também onome de “implantação de falsas memórias”. A criança é levada a repetir o que lhe é

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dito de forma repetida. O distanciamento gera contradição de sentimentos e adestruição do vínculo entre ambos. Restando órfão do genitor alienado, acaba o filhoidentificando-se com o genitor patológico, passando a aceitar como verdadeiro tudoque lhe é informado.

O próprio genitor alienador acaba não conseguindo distinguir a diferença entreverdade e mentira e a sua verdade passa a ser verdade para o filho que vive comfalsas personagens de uma falsa existência. Monitora o tempo do filho com o outrogenitor e também os sentimentos para com ele.

O filho acaba passando por uma crise de lealdade e experimenta intenso sofrimento.Claro que esta é uma forma de abuso, pondo em risco sua saúde emocional. Atéporque acaba gerando um sentimento de culpa quando, na fase adulta constatar quefoi cúmplice de uma grande injustiça.

Aliás, é a isso que se refere o laudo pericial da lavra do Dr. Hélvio Carpim Corrêa,Psiquiatra Forense, nos autos do processo de regulamentação de visitas (fl. 66-117):

Na situação de separação, o pior conflito que os filhos podem vivenciar, é o conflitode lealdade exclusiva, quando exigida por um ou por ambos os pais. A capacidadeda criança de lidar com crise de separação deflagrada vai depender sobretudo darelação que se estabelece entre os pais e da capacidade destes de distinguir, comclareza, a função conjugal da função parental, podendo, assim, transmitir aos filhos acerteza que as funções parentais de amor e de cuidado serão mantidas. Os paistendem, em geral, a fragilizar a capacidade dos filhos para lidar com a separação,projetando neles um mundo que é vivido por eles. (sem grifo no original – fl. 112).

Neste jogo de manipulações todas as armas são válidas para levar ao descrédito dogenitor, inclusive a assertiva de ter sido o filho vítima de incesto.

Ainda que não se esteja a afirmar que se está frente a esta síndrome, misterreconhecer que estes traços se detectam na avaliação psiquiátrica levada a efeito noDepartamento Médico Legal (fl. 30): Durante o relato Vanessa, além de verbalizar,demonstra com gestos as atitudes atribuídas ao pai. Seu falar e agir são naturais, emesmo que esteja sendo influenciada pela mãe, parece realmente ter vivenciado oque relata. O conflito afetivo da mãe com o pai pode ter influenciado a opinião delasobre o pai quando ela diz não gostar do pai porque ele faz maldade. Porém, estainfluência não parece estar presente no discurso de Vanessa no tocante à descriçãodas atitudes atribuídas por ela ao pai. Assim conclui o Dr. Hélvio Carpim Corrêa:(...) há um intenso ódio mútuo entre o réu e a autora, é imprescindível monitorar asmensagens que poderão surgir (e que já foram dadas para a menor no passado), nosentido de denegrir a imagem materna e paterna (fl. 113).

Diante deste quadro, e inexistindo prova da existência de abuso sexual na ação deregulamentação de visitas, não há justificativa para a suspensão do poder familiar doagravado, devendo permanecer as visitas estipuladas junto ao Núcleo deAtendimento à Família do Foro Central – NAF, para que evitar maiores danos àinfante, conforme recomendado pelo Dr. Hélvio Carpim Corrêa (fls. 111-112): Apresença do pai no encontro com a menor deve fazer parte de um processoterapêutico, mais que uma possibilidade jurídica, pois não se reestrutura uma relaçãodeficitária por decisão judicial, ou imposição por força física ou poder financeiro,mas sim com um profundo trabalho terapêutico experiente e continente para asangústias e distorções de ambos subsistemas (Vanessa e o réu). Nesse momento,uma proibição das visitas para o réu em relação a sua filha aumentaria ainda mais adistância entre eles.

Aliás, fica aqui a advertência à genitora para que não mais crie empecilhos àvisitação, sob pena de se fazer necessárias medidas outras para assegurar oindispensável convívio entre o genitor e a filha.

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Ao depois, é de ser acolhido o parecer pericial que indica que mãe e filha sejamencaminhadas a tratamento terapêutico.

Por tais fundamentos, nega-se provimento ao recurso.”

3) Voto do Desembargador Relator Dr. Luiz Felipe Brasil Santos do Tribunal de

Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, nos autos da Apelação n° 70017390972, interposta

contra sentença prolatada nos autos de uma ação de guarda, onde litigaram o genitor e os avós

maternos da menor alienada23:

“Trata-se de recurso de apelação interposto por ATAÍDES S. e MARIA O. P. S.,irresignados com sentença que, julgando conjuntamente dois processos em quecontendiam com EDER A. L. pela guarda da infante VICTÓRIA C. (10 anos deidade), deferiu a guarda da menina ao pai.

Sustentam que (1) cuidaram da neta antes mesmo do seu nascimento,acompanharam a gestação, os primeiros passos e as primeiras palavras, sentindo-seaniquilados com a sentença que lhes negou a guarda da menina; (2) jamais negaramao pai o direito de ver a filha, mesmo que a tenha renegado enquanto estava nabarriga da mãe e descurado nos seus cuidados, quando com ela esteve, de mesmaforma que fez com o irmão da menina, que veio a falecer, conforme provado dainstrução; (3) se o apelado realmente amasse a filha, não teria incomodado tanto amãe, a ponto de lhe provocar um infarto, temendo que ele lhe tomasse a guarda; (4)clamam pelo bom senso e pelo respeito à vontade da criança, que deseja permanecercom os avós; (5) não é a psicóloga ou a assistente social, pessoas que mal aconhecem, que vão saber o que é melhor para menina; (6) é o apelado quemdemonstra obsessão pela guarda da menina, movido por interesses materiais; (7) amenor prefere ficar com avós, pois se sente mais segura com eles, com quem estevedesde o nascimento; (8) foi o apelado que provocou a animosidade entre as partes,com a sua insistência, sua intemperança e sua irresponsabilidade; (9) todos ostestemunhos desabonam a conduta do pai, diferentemente do que concluiu asentença, que acabou por valorizar somente o depoimento do conselheiro tutelar,justamente favorecendo o apelado; (10) o parecer do MP culpa somente os apelantespelas pressões psicológicas que a menina vem sofrendo, prevendo que ela poderá terproblemas na adolescência, quando na verdade os apelantes sabem que maioresproblemas terá ela com um pai irresponsável, desleixado, interesseiro, que querdemonstrar que tem força bastante para ganhar sua guarda “no braço”; (11)VICTÓRIA está com 10 anos e já pode decidir com quem quer ficar e sua vontadedeve ser respeitada, como determina o ECA; (12) a menina foi ouvida apenas umavez no processo; (13) se é tão bom para a menina ficar com o pai, porque estabelecerum período de adaptação (?); (14) o processo não foi bem conduzido, pois váriastestemunhas poderiam ter sido ouvidas. Pedem provimento, inclusive comsuspensão liminar da antecipação de tutela concedida em sentença.

Houve resposta.

O Ministério Público opinou pelo conhecimento e não provimento do apelo.

23 Ementa: “Apelação cível. Mãe falecida. Guarda disputada pelo pai e avós maternos. Síndrome de alienaçãoparental desencadeada pelos avós. Deferimento da guarda ao pai. 1. Não merece reparos a sentença que, após ofalecimento da mãe, deferiu a guarda da criança ao pai, que demonstra reunir todas as condições necessárias paraproporcionar a filha um ambiente familiar com amor e limites, necessários ao seu saudável crescimento. 2. Atentativa de invalidar a figura paterna, geradora da síndrome de alienação parental, só milita em desfavor dacriança e pode ensejar, caso persista, suspensão das visitas aos avós, a ser postulada em processo próprio.Negaram provimento. Unânime.”

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O apelado peticionou requerendo expedição de ofício ao seu empregador parasuspensão do desconto em folha dos alimentos prestados à filha, já sob sua guarda,obtendo deferimento.

Novamente comparece aos autos o apelado, relatando fatos novos, juntando laudopsicológico e pedido a suspensão das visitas aos avós, pretensão que restouindeferida.

Regularmente intimados, os apelantes permaneceram silentes quanto ao teor dapetição e dos documentos trazidos aos autos pelo apelado.

Em nova vista o MP reitera parecer anterior e opina, em acréscimo, pela restriçãodas visitas dos avós.

Foi atendido o disposto nos art. 549, 551 e 552 do CPC.

É o relatório.

Não merece qualquer reparo a sentença recorrida.

A guarda de VICTÓRIA foi deferida ao pai, pessoa que lutou para ter consigo afilha e que tem todas as condições para educá-la e criá-la num ambiente afetivo eestruturado, que equilibre amor e limites, necessários para prepará-la e fortalecê-lapara enfrentar a vida.

Embora compreensível o sofrimento e a irresignação dos apelantes por perderem aguarda da neta, as razões de apelação bem expressam o turbilhão de sentimentosvivenciados pela família materna da menina.

Numa mistura de mágoa e rancor, os apelantes assumem a posição de vítimas,procuram responsabilizar o apelado pelas mortes do neto e da filha, sem se dar contade que, com isso, permitem que esses sentimentos negativos embotem o amor quesentem pela neta, transferindo para ela o peso de ser o único consolo dos avósvelhinhos, a única coisa que restou da mãe.

VICTÓRIA é apenas uma criança, que não pode carregar a responsabilidade de ser,para os avós, a única lembrança da mãe, e com isso, ser levada a rejeitar o pai evivenciar um conflito de lealdade extremamente prejudicial à sua formação e ao seudesenvolvimento emocional.

Talvez o sofrimento que estão vivenciando, pela prematura morte da filha, não estejapermitindo aos apelantes enxergar que VICTÓRIA, justamente por ter perdido amãe, precisa receber amor, venha de onde vier, inclusive e principalmente do pai,figura necessária e fundamental na elaboração do luto e na reestruturação do afetodesta criança, para que cresça segura e feliz.

Ao invés de se mobilizarem em desfazer da figura do pai – ensejando a síndrome dealienação parental noticiada na petição e laudo de fls. 438/443, o que de melhor afamília materna fazer por esta menina é um esforço para superar as diferenças e seempenhar para que ela se sinta amada e afetivamente amparada por todos aqueles aquem ama, inclusive o pai.

Esse esforço é fundamental para evitar as graves sequelas da Síndrome de AlienaçãoParental, que podem se manifestar como depressão crônica, incapacidade deadaptação em ambiente psico-social normal, transtornos de identidade e de imagem,desespero, sentimento incontrolável de culpa, sentimento de isolamento,comportamento hostil, falta de organização, dupla personalidade a às vezes suicídio.

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Para mitigar os efeitos sensíveis do processo de alienação, instaurado pela mágoa e orancor, inicialmente da mãe, e depois dos avós maternos, VICTÓRIA já estárecebendo acompanhamento psicológico.

Contudo, para que o tratamento seja realmente efetivo, imperioso que também osavós se submetam a tratamento especializado, para que seu imenso amor pela netareverta puramente em favor dela, despido dos sentimentos negativos remanescentesdos rancores da filha falecida, até então não tratados. Desde logo, porém, convémque fiquem advertidos de que, caso persistam no comportamento alienante, poderãoter as visitas suspensas, por meio de processo próprio.

Não merece qualquer censura a condução da instrução processual. Os apelantestiveram oportunidade de arrolar testemunhas, e assim o fizeram. Não podem imputarà magistrada o ônus probatório que lhes competia.

Aliás, pela condução irrepreensível do processo e pelo brilhantismo da sentençaprolatada nestes autos, proponho seja encaminhado ao Conselho da Magistraturavoto de louvor à magistrada RAQUEL M. C. A. SCHUCH.

Nesses termos, nego provimento ao apelo, mantendo a sentença nos seus exatostermos e pelos seus próprios fundamentos, os quais invoco também como razões dedecidir.”

4) Voto do Desembargador Relator Dr. Neves Amorim do Tribunal de Justiça do

Estado de São Paulo, nos autos do Agravo de Instrumento nº 2011.0000121856, interposto

contra decisão que deixou de determinar as medidas provisórias previstas no artigo 6º da Lei

nº 12.318/2010, nos autos de uma ação declaratória de alienação parental24:

“Trata-se de agravo de instrumento interposto contra a decisão proferida a fls. 78(aqui copiada a fls. 103) que, em ação declaratória de alienação parental, deixou dedeterminar as medidas provisórias previstas no artigo 6º da Lei nº 12.318/2010.

Insurge-se o agravante contra a r. decisão sustentando que a agravada “vemprocedendo de forma reprovável, fazendo crer a filha do casal que o pai não seimporta com a filha, que não participa de sua criação, impede a criança de receber ostelefonemas que o pai lhe faz, encontra 'desculpas' para não deixar o genitor visitar afilha dizendo que ela não está, não responde e-mails e não mais atende os telefonesquando é o pai da criança que liga, além de nutrir na criança sentimento deindiferença com relação ao seu genitor, chegando ao absurdo de deixar de utilizar osobrenome paterno e não ligar sequer no dia do aniversário do agravante nem no diados pais.” Requer sejam aplicadas, desde já, as medidas previstas no artigo 6º da Leinº 12.318/2010, garantindo-se o exercício de seu direito de visitas à filha. A liminarpleiteada foi indeferida (fls. 108).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls.111/112).

É o relatório.

O recurso não merece provimento. Conforme ressaltado na decisão de fls. 108, opedido inicial do agravante data de novembro de 2009 e os boletins de ocorrênciacopiados nos autos narram fatos ocorridos em 2007 e 2008. Não há, pois, relato de

24 Ementa: “Ação declaratória de alienação parental determinação das medidas provisórias previstas no artigo 6ºda Lei nº 12.318/2010. Não cabimento, por ora inexistência de relato de ocorrências recentes que envolvam aagravada e sua conduta de impedir a convivência entre pai e filha. Aguardo do contraditório e melhor instruçãodo feito. Decisão mantida. Recurso improvido.”

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ocorrências recentes que envolvam a agravada e a sua conduta de impedir aconvivência entre pai e filha. Ademais, a agravada não foi sequer citada, sendomedida de prudência que se aguarde o estabelecimento do contraditório e a instruçãodo feito. Por tratar de tema semelhante ao debatido nestes autos, merece transcriçãotrecho do voto da Ministra Nancy Andrighi, proferido no Recurso Especial nº1.032.875 DF, julgado em 28 de abril de 2009, que deve utilizado como fonte dereflexão para ambos litigantes:

“(...) Um ex-casal que procura de todas as formas dificultar a vida um do outro, eque, admoeste-se, deve poupar a filha, para que não seja também atingida pelairreflexão comum àqueles que, ao perderem a vida em comum, perdem também acoerência de suas próprias vidas, tomando armas para fazer frente a fatos em que,certamente, um simples diálogo poderia resolver o impasse, sem necessidade deconcentrar na criança mais um foco da discórdia. Em consideração à pequena, cujosdireitos devem ser amplamente assegurados, sobreleva-se a questão, porquanto aprevalência do melhor interesse da criança impõe o dever aos pais de pensar deforma conjugada no bem estar da filha, para que ela possa usufruir harmonicamenteda família que possui, tanto a materna, quanto a paterna, sob a premissa de que todacriança ou adolescente tem o direito de ter amplamente assegurada a convivênciafamiliar, conforme linhas mestras vertidas pelo art. 19 do ECA. Não pode umacriança ser privada desse convívio, especialmente quando por motivos queapequenam a alma humana. Sob essa perspectiva, é inerente ao poder familiar, quecompete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores, tê-los em sua companhia, nostermos do art. 1.634, II, do CC/02, ainda que essa companhia tenha que ser reguladapelo direito de visitas explicitado no art. 1.589 do CC/02, considerada a restriçãocontida no art. 1.632 do CC/02, quando colhido o casal pela separação judicial,divórcio ou dissolução da união estável. Sem que se tenha notícia de que o poderfamiliar do recorrido em relação à filha tenha sido de alguma forma suspenso ouextinto, assiste-lhe o direito de visitar a filha, nos termos em que fixadas as visitasem Juízo.(...)”.

“Destarte, deve ser mantida a decisão agravada, ao menos até que novos elementosde convicção sejam trazidos aos autos. Assim, pelo meu voto, nego provimento aorecurso.”

7 RELATOS CONCRETOS

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Concluída a problematização do tema objeto do presente estudo, antes de finalizá-lo, a

título ilustrativo, mister se faz trazer à colação narrativas reais de casos de instalação da SAP,

onde, ratificando todo o já aqui exposto, é possível visualizar todos as consequências e

malefícios causados pela síndrome aqui já mencionados.

Relato número 1:

“Em meados de 2002, chegou ao meu consultório um senhor com uns 45 anos, quevinha indicado por um advogado, que eu mesma não conhecia.

Então nos apresentamos e perguntei a ele qual o motivo de sua consulta. Foi quandoo mesmo me respondeu que precisava de orientação para lidar com a difícil situaçãoque vinha atravessando por não poder ser pai de sua única filha. Explique melhornão pode ser pai? Pois para mim se você tem uma filha é porque já o é.

Foi então que começou a relatar que logo após o nascimento de sua filha sua esposanão deixava que ele tivesse um acesso direto a filha, só a mãe é que sabia e podiacuidar dela. Bem, a situação foi se agravando e a separação foi inevitável. Foi aí quetudo piorou, pois se morando já era difícil ficar com a filha, quanto mais afastado.Nessa mesma época meu cliente ficou envolvido com a doença de seu pai que veio afalecer e por esta razão não tinha muita disponibilidade de ver sua filha diariamente.Com isso a mãe afastava cada vez mais essa aproximação paterna. Investigueidurante esse ano como era a sua relação com o pai.

Ele me relatou que a sua ex-sogra e suas duas filhas foram abandonadas por esse paique nunca mais conviveu com as mesmas. Ficou claro para mim que essa mãe nãotinha nenhuma referência boa da figura paterna e com isso faltava nela aidentificação de quanto um pai é necessário para o desenvolvimento e crescimentode um filho. Penso que por esta razão sua ex-esposa vinha punindo não só o pai desua filha, mas também o seu próprio pai e tendo como referência à mãe ou a figuramaternal como única, se apossando assim de sua filha e privando o pai de poderacompanhar e principalmente criar os vínculos afetivos de pai e filho. Fazendo comque se caracterize alienação parental.

Interpretação do caso

Neste caso, como em alguns semelhantes que já tive a oportunidade de trabalhar,percebo que a mãe é socorro, abrigo e segurança. A mãe ama sem limites, semcondições, sem interesse próprio nem expectativas. Vive para o filho! Do que estoufalando? Certamente essa mãe de carne e osso não era esse ideal perfeito. Ela secansa, se ressente, se queixa. Sem dúvida ama outras pessoas e nem sempre nosama, e deve haver momentos em que a criança se aborrece, se incomoda e tem raiva.Contudo, se a mãe for suficientemente boa, citando Winnicott, essa bondade ésentida como perfeição. Agora se ela for apenas suficientemente boa, os desejos,sonhos e fantasias se confirmam e ela dá o sabor do amor incondicional a esse filho.Permitindo que o filho perceba principalmente a figura do pai, formando assimfiguras parentais, assim como outras pessoas são tão necessárias para seudesenvolvimento normal e saudável.

Conclusões finais

Neste caso em particular eu citei a relação anterior da mãe com seu pai. Porquê oamor infantil segue o princípio de que “amo porque sou amado”. Logo essa mãe quenão recebeu esse amor do pai, não reconhece a figura paterna, sendo assim, seestabelece à alienação parental, não sendo apenas suficientemente boa, nãoconseguiu fazer a transferência do amor de sua filha para o seu pai. Pois amor é osangue da vida, o poder de reunião do que está separado.

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O que estou querendo dizer é que apesar de ter ocorrido à separação do casal, oamor e a união dos filhos com os pais não deve acabar.”25

Relato número 2:

“A mãe apresenta-se muito resistente, enfatizando que só veio ao consultório porcausa da assistente social do Fórum. Apresenta um discurso paranóico, dizendo queo advogado dela não lhe deu nenhuma informação e que não quis levá-la àaudiência; que a promotora é amiga do ex-marido; que a assistente social mentiu einventou as informações contidas no relatório; que os dados do colégio – que estãonos autos – não são verdadeiros e tampouco, as declarações do ex-marido.

Não poupava o filho do seu ódio em relação ao ex-marido em momento algum.

Na recepção do consultório falou, na frente do filho, que o pai não presta, que nãoquer saber dos filhos, que os abandonou e que não deixará os filhos participarem daperícia junto com o pai.

Rodrigo apresentou-se meio “curioso”, quando o encontrei na recepção com suamãe, esperando uma aprovação. Esta imediatamente disse que ele não queria entrarsozinho e pediu para entrar junto. Pedi a ela que aguardasse um pouquinho, que iriamostrar o consultório para Rodrigo e, caso ele quisesse, a chamaria para ficar umpouco com ele.

Rodrigo entrou comigo e não pediu para chamar a sua mãe durante toda a sessão.Ele olhou todo o consultório, os jogos e brinquedos. Jogamos um jogo da memória,em que os pares eram formados por um bicho adulto numa peça e por dois filhotesnoutra. Ora Rodrigo referia que os “filhinhos” estavam com o papai”, ora com a“mamãe”. Pergunto se ele também gostaria de estar ora com a mamãe e ora com opapai, e ele fala que não sabe. Depois fala que não, porque o pai é um mentiroso.Diante da minha pergunta sobre qual seria a mentira a ele contada, Rodrigo diz nãosaber, não lembrar, mas imediatamente afirma que a mãe sabe, a mãe conhece.

Rodrigo internaliza o discurso da mãe, e o reproduz como se fosse o dele, como seassim tivesse vivenciado. Ao “arrumar” a casinha de brinquedos, Rodrigo tira todosos bonecos que representam uma grande família, deixando só o pai e o filhomorando na casa.

Pergunto por que, e ele fala que assim é melhor, que o pai está separado. Pergunto seele quer morar só com o pai, ele se limita a dizer que o pai mente.

No desenho da família, inclui a mãe, o irmão, ele e o pai. O pai de mão com o filho,e pairando sobre a cabeça dos filhos dois pesos: um, que ele chama de peruca, detamanho muito maior que a cabeça, num formato de uma grande pedra, e na domaior, uma “bazuca”. Ele demora muito para desenhar, apresentando muitadificuldade na motricidade fina.

Nas outras sessões geralmente falou, primeiro, que não queria entrar no consultório,que estava cansado, que queria ir dormir. No entanto, ao se separar da mãe, tudomudava e tinha que pedir para que ele saísse ao acabar a sessão, pois queriacontinuar.

A avaliação diagnóstica de Rodrigo sugeriu: retraimento, isolamento, inibição,tendência à fuga, sentimentos de inadequação, dificuldade de contato, falta de calore afeto no lar, fraca estabilidade, discrepância entre o desejo e realidade,insegurança, imaturidade, instabilidade emocional, traços depressivos, apresentação

25 Relato da psicóloga Maria Helena Alcântara Lisboa, retirado do sitehttp://www.mhrpsicologos.com.br/pgartigos3.html, em 02/02/2013 às 00:11h.

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de conflitos não resolvidos, sentimentos de estar constantemente pressionado eprecário equilíbrio da personalidade.

Rodrigo traz no seu discurso fragmentos da fala da mãe, mas não consegue sustentá-las, denunciando na sua dinâmica, durante a avaliação, a falta que o pai faz.

Rodrigo é o depositário das desavenças dos pais, de um pai que repentinamentedesaparece da sua vida e de uma mãe que repete incessantemente que o pai oabandonou, que não gosta dele, que mente.

Rodrigo ao mesmo tempo em que diz não querer saber do pai, que ele é mentiroso,mostra o quanto internamente o pai faz falta. No comportamento manifesto (o queverbaliza) não quer saber do pai, e no comportamento latente (inconsciente) mostraa necessidade de contato, o afeto que guarda endereçado à figura paterna.”26

Relato número 3:

“Dos 8 aos 26 anos, a publicitária Rafaella Leme odiou o pai. Motivo não havia.Mas isso ela só sabe hoje, aos 29. Quando fez 5 anos, seus pais se separaram. A mãetinha sua guarda e a do irmão mais novo. Rafaella ainda tem a lembrança inicial devoltar feliz dos fins de semana com ele. Eram passeios no Aterro do Flamengo, debicicleta ou de skate. Mas, assim que ele arrumou uma namorada, tudo mudou – acomeçar pelo discurso de sua mãe. “Ela passou a dizer o tempo todo que ele nãoprestava, que era um canalha e não gostava de verdade da gente. Era assim 24 horaspor dia, como um mantra”, afirma. Rafaella acreditou. Mais: tomou a opinião comosua.

Quando Rafaella era adolescente, o pai mudou-se para o Recife, a trabalho. Nasférias, ele insistia para que os filhos o visitassem. “Eu tinha nojo da ideia. Só ligavapara ele para pedir dinheiro, para mim era só para isso que ele servia”, diz. Tudopiorou quando a mãe veio com a informação de que ele estivera no Rio de Janeiro enão fora procurá-los. Durante dez anos, Rafaella cortou relações com o pai. Por maisque a procurasse, ela preferia não retornar. Até que ele parou de tentar. O laço jáfrágil que existia se rompeu. Aos 26 anos, ela foi fazer terapia. No divã, percebeuque não tinha motivo para não gostar do pai. Resolveu procurá-lo. “Foi umalibertação. Por mais dedicada que minha mãe tenha sido, ela nos fez de fantoches, dearma contra o ex-marido.”

Com a aproximação do pai, foi a vez de a mãe lhe virar as costas. Só um ano depoisvoltaram a se falar. Rafaella se emociona todas as vezes que conta sua história. “Sóquem passa por isso e se dá conta sabe a tristeza que é”, afirma.”27

8 CONCLUSÃO

26 SILVA, Evandro Luiz; RESENDE, Mário. SAP: a exclusão de um terceiro. In: Síndrome da alienação parentale a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado pela Associação de Pais e MãesSeparados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 30-31.

27 Relato de Rafaella Leme sobre sua experiência como criança alienada, retirado do sitehttp://psicosaber.wordpress.com/2009/07/29/sindrome-de-alienacao-parental/, em 08/02/2013 às 17:40h.

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O presente trabalho pautou-se na problemática cada vez mais recorrente na sociedade

contemporânea tomada pela efemeridade dos sentimentos e relacionamentos: a Alienação

Parental.

A escolha do tema foi realizada em detrimento de inúmeros outros assuntos, posto que

entendo ser hipótese vitimizada pela morosidade do legislativo, que diante do problema

instaurado, só veio à o regulamentar a situação no ano de 2010, sendo a medida

incontroversamente intempestiva, face aos inúmeros casos de instalação da SAP, que já

podíamos observar no Brasil.

Assim, verificado o atraso do legislativo em proteger os vitimados pela Síndrome em

comento, pautamos o presente estudo na atuação do judiciário e seus auxiliares, que desde

antes de suaa regulamentação, através de medidas de prevenção e reparação, tentavam

amortizar seus efeitos no seio familiar adoecido.

Para alcançar os objetivos acadêmicos deste trabalho, foram realizadas pesquisas em

livro relacionados ao tema, buscas por relatos reais de famílias atingidas pela SAP, e,

principalmente, análise minuciosa da vasta legislação pátria sobre o tema.

Desta forma, diante do todo exposto no presente trabalho acadêmico de conclusão de

curso, conclui-se que durante todo o decorrer do trabalho procurou-se mostrar o quanto a

Síndrome da Alienação Parental influencia e afronta o que chamamos de família, poder

familiar, o afeto entre pais e filhos, o menor, a dignidade dele e de todos envolvidos.

Falou-se ainda sobre o surgimento e amadurecimento da família diante da legislação

pátria e da sociedade, bem como analisou-se as inúmeras fases e tratamentos dados à ruptura

das relações conjugais, as examinado diante da égide jurídica, social e religiosa, passando

pelas Constituições Federais, o Código Civil, o Estatuto da Criança e do Adolescente,

chegando até os dias atuais, em que podemos falar da lei da Síndrome da Alienação Parental,

o que demonstra o caráter dinâmico e mutante da nossa sociedade e dos seus valores.

Ademais, o que deve se asseverar ainda é que, consolidada a já mencionada cultura da

efemeridade das relações conjugais na sociedade contemporânea, o Estado – através dos

Poderes Legislativo e Judiciário – torna-se responsável por amenizar os impactos negativos

que as relações de animosidade entre genitores pode causar aos menores envolvidos.

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Todos devem trabalhar com leis e justiça para cuidar desse drama da chamada

Síndrome da Alienação Parental, que foi o foco deste trabalho.

Contudo, devemos ainda é trabalhar a educação do homem, toda a sociedade deve ser

reeducada, alterando conceitos egoístas e destrutivos – sentimentos estes que fazem um adulto

utilizar-se da ingenuidade de uma criança para afetar seu ex-cônjuge, comportamento que

deve ser banido através de reeducação para vivermos em sociedade e tratarmos nossas

diferenças com “civilidade” à luz da evolução social.

O que se observa ainda, por fim, é que o que esta se pondo em risco não é só o futuro

do cidadão em seu âmbito particular, se restringindo às suas relações interpessoais futuras,

pois, a meu ver, as consequências da Síndrome da Alienação Parental para a vida do alienado

se refletiram em toda a sociedade, pois que serão nela inserida com um certo grau de

desordem ética quanto ao convívio social, passando a problemática aqui colocada ser caso de

ordem e saúde pública.

Por fim, sugere-se como continuação deste trabalho acadêmico, o estudo mais

aprofundado dos reflexos da SAP na sociedade como um todo e não pautada tão somente nos

interesses do menor, visando ter base empírica, através do auxilio da psicanálise para analisar

aspectos histórico-familiares de criminosos, a fim de que novas medidas sejam tomadas pelo

legislativo e judiciário com fins de busca pelo constante aperfeiçoamento das ciências

criminais.

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