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125 XVIII Seminário Internacional de Formação de Professores para o MERCOSUL/CONE SUL De 03 a 05 de novembro de 2010 Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Florianópolis – Santa Catarina – Brasil A SITUAÇÃO ATUAL DOS IDOSOS QUE VIVEM EM INSTITUIÇÕES DE LONGA PERMANÊNCIA NO MUNICÍPIO DE ALVORADA/RS ALVES, Simone Silva 45 Universidade Federal do Rio Grande do Sul- Brasil [email protected] Resumo O presente trabalho tem por objetivo refletir sobre a situação real dos idosos que vivem em Instituições de Longa Permanência no Município de Alvorada-RS. Atualmente o Brasil ocupa o 6º lugar no ranking dos países com maior número de pessoas idosas. Todavia, o Brasil apresenta uma expectativa de vida inferior a outros países da América Latina, como é o caso do Uruguai com 75,1; Argentina 73,9; Colômbia 71,8 e Paraguai 70,5. Observamos que o prolongamento da vida é mais elevado nas camadas sociais privilegiadas, chegando com uma esperança de vida de 70 a 80 anos em média, enquanto a mesma se mantém em níveis críticos de 40 a 50 anos nas camadas e regiões de baixa renda no Brasil. Esta realidade traz consigo a necessidade de se refletir sobre as novas práticas a serem desenvolvidas nos espaços dessas instituições, a fim de promover um nível superior de qualidade de vida às pessoas idosas. Para compreendermos esse fenômeno material social particular nos fundamentamos em autores como Marx, Mészáros, Beauvoir, Camarano, Triviños, Neri, e outros. Palavras-chave: Envelhecimento. Instituições de longa permanência para idosos. Políticas públicas. Educação. 1 Considerações iniciais O presente trabalho tem por objetivo refletir sobre a situação real dos idosos que vivem em Instituições de Longa Permanência no Município de Alvorada-RS. 45 Aluna do Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Pedagoga, especialista em Gerontologia Social pela UFGRS. Bolsista da CAPES. Orientador Prof. Dr. Augusto Nibaldo Silva Triviños. Grupo de Pesquisa Formação de Professores MERCOSUL/Cone Sul. UFRGS/ FACED/PPGEDU/TRAMSE.

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    XVIII Seminário Internacional de Formação de Professores para o MERCOSUL/CONE SUL De 03 a 05 de novembro de 2010 Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Florianópolis – Santa Catarina – Brasil

    A SITUAÇÃO ATUAL DOS IDOSOS QUE VIVEM EM INSTITUIÇÕ ES DE

    LONGA PERMANÊNCIA NO MUNICÍPIO DE ALVORADA/RS

    ALVES, Simone Silva45

    Universidade Federal do Rio Grande do Sul- Brasil [email protected]

    Resumo

    O presente trabalho tem por objetivo refletir sobre a situação real dos idosos que vivem

    em Instituições de Longa Permanência no Município de Alvorada-RS. Atualmente o

    Brasil ocupa o 6º lugar no ranking dos países com maior número de pessoas idosas.

    Todavia, o Brasil apresenta uma expectativa de vida inferior a outros países da América

    Latina, como é o caso do Uruguai com 75,1; Argentina 73,9; Colômbia 71,8 e Paraguai

    70,5. Observamos que o prolongamento da vida é mais elevado nas camadas sociais

    privilegiadas, chegando com uma esperança de vida de 70 a 80 anos em média,

    enquanto a mesma se mantém em níveis críticos de 40 a 50 anos nas camadas e regiões

    de baixa renda no Brasil. Esta realidade traz consigo a necessidade de se refletir sobre as

    novas práticas a serem desenvolvidas nos espaços dessas instituições, a fim de

    promover um nível superior de qualidade de vida às pessoas idosas. Para

    compreendermos esse fenômeno material social particular nos fundamentamos em

    autores como Marx, Mészáros, Beauvoir, Camarano, Triviños, Neri, e outros.

    Palavras-chave: Envelhecimento. Instituições de longa permanência para idosos.

    Políticas públicas. Educação.

    1 Considerações iniciais

    O presente trabalho tem por objetivo refletir sobre a situação real dos idosos que

    vivem em Instituições de Longa Permanência no Município de Alvorada-RS.

    45Aluna do Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Pedagoga, especialista em Gerontologia Social pela UFGRS. Bolsista da CAPES. Orientador Prof. Dr. Augusto Nibaldo Silva Triviños. Grupo de Pesquisa Formação de Professores MERCOSUL/Cone Sul. UFRGS/ FACED/PPGEDU/TRAMSE.

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    XVIII Seminário Internacional de Formação de Professores para o MERCOSUL/CONE SUL De 03 a 05 de novembro de 2010 Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Florianópolis – Santa Catarina – Brasil

    A cidade de Alvorada, que é uma das trinta e uma (31) cidades que integram a

    região metropolitana de Porto Alegre-RS, tendo o clima subtropical e o solo é

    predominantemente argiloso. Limitando-se, ao norte, com as cidades de Cachoeirinha e

    Gravataí; a oeste, com Porto Alegre; ao sul e ao leste, com o município de Viamão.

    Distante 16 km de Porto Alegre, capital do Estado do Rio Grande do Sul.

    De acordo com os estudos que realizamos e, como moradora da cidade de

    Alvorada, desde o tempo de infância, podemos dizer, de forma geral, que na cidade

    existem muitos indivíduos vivendo em total situação de vulnerabilidade social. Isto é,

    com baixo nível de qualidade de vida no que diz respeito às necessidades básicas de

    sobrevivência humana, tais como: água potável, saneamento básico, alimentação,

    energia elétrica, entre outros.

    Nesse sentido, para os idosos a situação ainda é pior, porque os serviços de

    saúde oferecidos à população idosa são insuficientes e de baixo nível de qualidade. As

    consultas médicas e os serviços oferecidos à população idosa, nos postos de saúde, são

    precários e não há nenhum médico geriatra trabalhando na rede pública de saúde na

    cidade de Alvorada-RS.

    Desta maneira, analisando as instituições de longa permanência para idosos da

    cidade, também podemos dizer que a situação dos idosos que vivem nessas ILPIs46, não

    é muito diferente dos indivíduos de outras faixas etárias, pois, nessas instituições,

    encontramos um nível baixo de qualidade de prestação de serviços, já que a maioria são

    instituições privadas, com fins lucrativos, que prestam este atendimento à população

    idosa na cidade.

    O Brasil está entre os países da América Latina com o maior número de idosos

    do planeta. É expressivo o aumento da participação da população maior de 60 anos no

    total da população. Em 1940 era de 4%, passou a 8,6% em 2000, projeções recentes

    indicam que esse segmento passará a 15% em 202047.

    46 Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI) é uma denominação adotada pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) nos debates de suas comissões especializadas e em seus congressos e jornadas, como correspondente a Long-term Care Institution (Born & Boechat, 2006). Porém, não se trata de um termo substituto para o popular asilo. 47 Conforme levantamento feito ao IBGE por Freitas (2004, p. 34).

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    De acordo com as informações do Instituto Brasileiro Geografia Estatística, o

    crescimento se dará de forma ainda mais acentuada na faixa etária de 80 anos ou mais,

    ou seja, aquela que demanda maiores recursos socioeconômicos. O crescimento da

    população idosa é consequência de dois processos: a alta fecundidade no passado,

    observada nos anos 1950 e 1960, comparada à fecundidade de hoje e a redução da

    mortalidade da população idosa.

    Desta forma, o grupo dos idosos também tem crescido entre os demais grupos

    populacionais, pois entre os idosos observamos um aumento do número de centenários.

    Atualmente, existem 24,5 mil pessoas com mais de 100 anos no país48.

    Nosso interesse nesse tema de pesquisa justifica-se por sermos professores e

    estarmos diante de uma realidade histórica, especialmente nos países de terceiro mundo,

    onde os idosos são isolados do processo produtivo pela estrutura hierárquica do capital.

    Pensamos que essa situação deve mudar e que esse tema merece estar inserido

    nas atividades escolares, ensinando não somente às crianças, mas sim a todas as pessoas

    de nossa sociedade o respeito aos indivíduos idosos que já não podem trabalhar.

    Para Beauvoir (1976), a situação dos idosos, na sociedade capitalista, é difícil e

    até mesmo sombria para a maioria dos brasileiros. Podemos dizer, de forma geral, que

    existe pouca ou nenhuma vontade dos representantes da classe dominante na

    concretização das políticas públicas. Observamos, na atual perspectiva do sistema

    capitalista, que o idoso representa o trabalhador que se tornou improdutivo e obsoleto,

    devendo ceder lugar às novas gerações de trabalhadores dotados de conhecimentos

    tecnológicos atualizados e de maior força de trabalho.

    Para organizarmos esse estudo tomamos conhecimento das condições

    socioeconômicas das pessoas idosas e dos principais dispositivos legais que apoiam esse

    grupo etário, tais como a Constituição Federal de 1988, A política Nacional do Idoso, O

    Estatuto do Idoso e a Resolução 283/2005 da ANVISA.

    48IBGE. Censo Demográfico 2000. Disponível em: . Acesso em: 20 jul.2010

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    Segundo Triviños (1996, p. 28) é impossível “corrigir os aspectos formais das

    normas as quais nos regem, sem penetrar profundamente no conteúdo social e

    econômico do qual emanam”.

    Diante dessas premissas, o problema fundamental é o abandono às pessoas

    idosas que já não dão mais lucro aos interesses da sociedade capitalista, o que não é

    característica apenas do Brasil, mas de grande parte dos países do terceiro mundo.

    Acreditamos que devemos lutar por uma sociedade mais justa e igualitária, com

    melhores condições de vida para toda a humanidade, e na busca por alternativas e

    propostas que indiquem para uma mudança de nível na qualidade49 de vida dos idosos

    que necessitam viver em instituições de longa permanência.

    2 Os Idosos nas instituições de longa permanência

    Conforme investigações realizadas por Camarano50, atualmente existem mais de

    15 mil idosos vivendo em instituições de longa permanência no Sul do Brasil. São 5.542

    no Paraná, 2.521 em Santa Catarina e 7.359 no Rio Grande do Sul em 693 instituições

    especializada registradas. Dos 2.474.174 brasileiros com mais de 60 anos, que vivem na

    Região Sul do Brasil, 15.422 (0,6%) moram em Instituições de longa permanência para

    idosos.

    De acordo com o Relatório de Inspeção a Instituições de Longa Permanência

    para Idosos51, “[...] o Estado brasileiro não dispõe de dados básicos sobre quem são

    essas pessoas e, sobretudo, como vivem concretamente” (BRASIL, 2008).

    Entretanto, a se julgar pelas projeções estatísticas e pela situação

    socioeconômica da maioria dos idosos brasileiros, podemos prever um considerável

    aumento das ILPIs nas próximas décadas.

    49 Estamos usando o termo “qualidade”, não no principio da ideologia capitalista, mas como conceitua Cheptulin: “O conjunto das propriedades que indicam o que uma coisa dada representa e o que ela é constitui sua qualidade” (1982, p. 203). 50 Estas informações são do estudo “Características e Condições de Atendimento em Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI)”, Ana Amélia Camarano, pesquisadora do IPEA (2007-2008). 51 BRASIL. Relatório de Inspeção a Instituições de Longa Permanência para Idosos. Brasília, 2008.

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    Segundo nossas investigações 2,3% de idosos52 estão vivendo em Instituições de

    longa permanência em Alvorada-RS. Esse elevado índice de idosos vivendo em ILPIs,

    na cidade, fez surgir a necessidade de analisarmos essa realidade e refletirmos sobre ela.

    Quem seriam esses idosos? Que tipo de instituição prestaria esse cuidado?

    Averiguamos que na cidade de Alvorada existem, aproximadamente, 270

    pessoas idosas vivendo em ILPIs (sendo 133 homens e 137 mulheres) e 12 instituições

    de longa permanência para idosos. Sendo 10 ILPIs privadas, com fins lucrativos e 02

    ILPIs privadas, filantrópicas sem fins lucrativos.

    Conforme nossos estudos, podemos dizer que não existem instituições de longa

    permanência para idosos no município de Alvorada-RS, de natureza Pública, o que nos

    faz refletir sobre o descaso do Estado às pessoas idosas que necessitam viver neste tipo

    de instituição.

    Para Oliveira (1999), os direitos devem conceber uma compensação pelas perdas

    e limites por que passam os indivíduos ao envelhecer, em particular nos aspectos físicos

    e psicológicos. É uma etapa sociocultural e econômica simultaneamente, na qual esses

    indivíduos tornam-se menos produtivo, reclamando atenção e cuidados que, muitas

    vezes, a família não tem condições de atender essas necessidades. Para a autora “os

    idosos representam hoje uma questão para o Estado resolver” (OLIVEIRA, 1999, p.

    182).

    Entendemos que existem várias condições específicas dessa faixa etária que

    necessita ter uma atenção especial das políticas públicas. “Uma delas é a situação da

    renda, já que a maioria das pessoas com 60 anos ou mais estão aposentados pela

    Previdência Social e o valor da aposentadoria é inferior ao recebido antes da

    aposentadoria” (CARLOS E HEREDIA, 2004, p. 125).

    Nesse sentido, a sociedade como um todo terá que se reorganizar para atender as

    necessidades especifica da população idosa, principalmente, os idosos que se encontram

    nas classes menos favorecidas economicamente. Entretanto, informações referentes à

    pobreza, na velhice, ainda são escassas.

    52 Como idoso, está se considerando a população de 60 anos e mais, tal como estabelecido na Política Nacional do Idoso.

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    XVIII Seminário Internacional de Formação de Professores para o MERCOSUL/CONE SUL De 03 a 05 de novembro de 2010 Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Florianópolis – Santa Catarina – Brasil

    Enfatizamos que esse grupo etário que estamos investigando pertence à classe

    social que recebe, em média, por mês, um salário mínimo nacional53, referente à

    aposentadoria ou pensão.

    Marx nos explica que:

    Os proprietários de simples força de trabalho, os proprietários de capital e os proprietários de terras, cujas respectivas fontes de renda são o salário, o lucro e a renda da terra, quer dizer, os operários assalariados, os capitalistas e os proprietários de terras formam as três grandes classes da sociedade moderna baseada no regime capitalista de produção (MARX apud SANTOS, p.15-16).

    Desta forma, o conceito de classes surge como a expressão das principais

    categorias econômicas de um determinado sistema de produção. Todavia, esse sistema

    está em movimento e relacionado a outros regimes de produção e a outros elementos

    socioeconômicos desse mesmo sistema produtivo.

    Compreendemos que a pobreza das pessoas idosas é originada pelas formações

    de classe que surgem e se desenvolvem à medida em que os homens “vivem suas

    relações produtivas e experimentam suas situações determinadas, no interior do

    conjunto das relações sociais, com a cultura e esperanças que herdaram, e à medida que

    trabalham de formas culturais suas experiências” (WOOD, p. 76).

    Atualmente, a crise atual do sistema capitalista de produção abarca todas as

    esferas da vida social, todos os países, todos os segmentos populacionais, todas as

    faixas etárias, enfim, perpassa todas as classes sociais, mas não da mesma forma. Os

    índices em desabono à qualidade e quantidade com que essa crise atinge,

    principalmente, àqueles que já não podem trabalhar, como os idosos, são alarmantes e

    vêm se elevando aceleradamente.

    Compreendemos que o Brasil não está preparado para lidar com esta questão

    social, pois, além de ter sido um processo extremamente rápido, o envelhecimento

    populacional disputa recursos socioeconômicos com outros grupos sociais que ainda

    não tiveram as suas necessidades fundamentais atendidas como, por exemplo, a infância

    e adolescência.

    53 Presidência da República. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12255.htm

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    Marx e Engels (2002, p. 21) nos ensinam que:

    [...] para viver, é preciso antes de tudo beber, comer, morar, vestir-se e algumas outras coisas mais. O primeiro fato histórico é, portanto, a produção dos meios que permitem satisfazer essas necessidades, a produção da própria vida material; e isso mesmo constitui um fato histórico, uma condição fundamental de toda a história que se deve, ainda hoje como há milhões de anos, preencher dia a dia, hora a hora, simplesmente para manter os homens com vida.

    Segundo Marx e Engels (2002), os homens são dependentes, portanto, das

    condições materiais da sua produção. Desse modo, compreendemos que é através das

    relações produção que conseguimos saber em poder de quem estão os meios de

    produção, se estes meios estão à disposição da sociedade ou de indivíduos particulares.

    Nesse sentido, ao longo de sua história, o sistema capitalista de produção social

    apropriou-se de diversas estratégias para sobreviver. Atualmente, o sistema passa por

    uma crise, mas segue se alimentando da pobreza do povo e da exploração da classe

    trabalhadora em todos os países, principalmente no Brasil.

    Hoje, as estridentes desigualdades sociais se expressam pela exclusão de

    milhares de pessoas das condições favoráveis de existência. O Brasil tem o terceiro pior

    nível de desigualdade de renda do mundo, empatado com o Equador. A constatação é do

    primeiro relatório sobre desenvolvimento humano para América Latina e Caribe sobre

    distribuição de renda, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o

    Desenvolvimento (Pnud)54.

    Salientamos que dos 15 países do mundo com maior concentração de renda, dez

    são da América Latina. Segundo a Organização das Nações Unidas, o baixo nível

    educacional é um dos fatores que mais dificultam a melhoria social na região. No

    mundo são 1,7 bilhões de pessoas vivendo na pobreza absoluta (têm renda inferior a

    US$ 1,25 por dia), pelos critérios do Banco Mundial55.

    Conforme Mészáros (2009), essa situação é histórica, e está determinada pela

    crise estrutural do sistema do capital global. Entretanto, o que se torna relevante, nesse

    54 http://www.diap.org.br/index.php/agencia-diap/13755-brasil-tem-o-3o-pior-indice-de-desigualdade-do-mundo-segundo-onu 55 http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=1661

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    momento, para entendermos nosso fenômeno material social, não é somente a carência

    contingente dos recursos econômicos disponíveis. O que explica essa situação é a fatal

    deficiência estrutural de um sistema que atua através dos seus elementos defeituosos de

    desperdícios e de inópia.

    Para compreendermos e mudarmos essa realidade social se torna necessário a

    apreensão do fenômeno material social numa dimensão histórica. Marx (1974) nos

    explica que:

    Na medida em que milhões de famílias camponesas vivem em condições econômicas que as separam uma das outras, e opõem o seu modo de vida, os seus interesses e sua cultura aos das outras classes da sociedade, estes milhões constituem uma classe (MARX, 1974, p. 115 e 116).

    Assim sendo, a classe seria um todo organizado com elementos objetivos e

    subjetivos que, sobre a base das condições materiais de existência e das relações sociais

    correspondentes, a classe inteira organizaria e formaria maneiras de pensar e

    concepções de vida distintas e peculiarmente constituídas. Sobre a vida objetiva, se

    formaria valores subjetivos, pois o ser social condiciona a consciência social.

    Nessa concepção, os fenômenos materiais sociais foram criados pelos seres

    humanos e sua existência está relacionada, de forma geral, com as necessidades que as

    pessoas ou grupos de pessoas tiveram, ou tem em sua totalidade num determinado

    período histórico.

    Portanto, a questão do envelhecimento e da velhice abrange um conjunto

    complexo de fatores para o seu estudo. Entendemos o envelhecimento como um

    processo biológico, fisiológico, psicológico e social. Dessa forma, entendemos a

    questão social como o conjunto de problemas políticos, sociais e econômicos que se

    originou com o surgimento da classe operária na constituição da sociedade capitalista.

    Ou seja, a questão social está baseada no conflito entre o capital e o trabalho.

    Cremos que a grande maioria dos idosos do Brasil é pobre e continua

    empobrecendo, o que não difere do nível socioeconômico de grande parte da população

    brasileira. Dessa forma, a situação econômica do idoso está correlacionada à população

    em geral.

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    2.1 Os Dispositivos legais vigentes de proteção aos idosos

    Para Néri (2005), o Estatuto do Idoso - Lei n° 10.741/2003 amplia os direitos

    dos cidadãos com idade acima de 60 anos. Assim, o Estatuto é mais abrangente que a

    Política Nacional do Idoso - Lei nº 8.8842/1994, pois inova ao instituir penas severas

    para quem desrespeitar ou abandonar o indivíduo idoso.

    Entendemos que o Estatuto do Idoso apresenta em um único e amplo diploma

    legal, muitos dispositivos legais e políticas já aprovadas. Nesse sentido, podemos dizer

    que o Estatuto do idoso veio assegurar, de forma explícita, o que a Constituição Federal,

    já trazia em seu bojo e, de forma mais abrangente o que antecipava a Lei nº 8.842/94 -

    Poítica Nacional do Idoso. O Estatuto também incorpora novos elementos e aspectos,

    dando um tratamento integral e uma visão de longo prazo para a organização de

    instrumentos que visam proporcionar um nível superior de qualidade de vida aos

    indivíduos idosos.

    Atualmente, é a Resolução n° 283/2005- ANVISA, que regulamenta e normatiza

    as instituições de longa permanência para idosos no Brasil. Embora essa Resolução

    tenha representado um avanço ao normatizar e estabelecer princípios de funcionamento

    as instituições de longa permanência para idosos no Brasil, infelizmente, o que

    observamos, ainda, são amplas limitações para a aplicação desses dispositivos legais na

    prática.

    Para Vieira (2001), quando nos referimos às “políticas”, ou seja, política social,

    política econômica, política fiscal, política tributária, política de saúde, política

    habitacional, política de assistência, política previdenciária, política educacional, etc.;

    estamos falando de estratégias governamentais. Conforme Vieira (2001, p. 18):

    No Brasil e na América do Sul se têm empregado políticas econômicas discutíveis, praticamente sem formulações de política social. Ás vezes aparecem programas e diretrizes, relacionadas com a política social; tais programas e diretrizes em si revelam somente pretensões de uma política social. Quase sempre eles não se concretizam, apenas se transformam em quimera, em sonho, em programas e diretrizes para serem exibidos à sociedade, sem a intervenção nela, porque não tem função de intervir.

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    Entendemos que, um Estado que se diz democrático, não necessita priorizar os

    direitos a nenhuma categoria de sujeitos se todos são iguais perante as leis. Portanto,

    esse direito no nível do imaginário, nesse tipo de sociedade em que vivemos, não tem

    noções e nem praticas para torná-los concretos.

    Assim, “em vez de universalização dos direitos, convivemos com a

    discriminação por nível de renda, por idade e por classe social. Podemos ver isso todos

    os dias nas filas do INSS e dos hospitais públicos” (NERI, 2005, p. 14).

    Compreendemos que o distanciamento entre a lei e a realidade dos idosos, no

    Brasil, ainda é abissal.

    Triviños (1996, p. 29) nos explica que:

    De maneira que se a lei é formalística não o é porque determinada sociedade bem como com suas práticas, a estabelece, mas porque uma classe social, que cumpre o papel do antigo colonizador, e que é extraordinariamente minoritária no grupo social todo, a dita.

    Desta forma, entendemos que as políticas públicas apresentam um conteúdo de

    classe social, mas que em última instância respondem aos interesses das classes

    dominantes.

    Para Marx e Engels (2002), a sociedade capitalista vive com a farsa da

    democracia, da liberdade, da igualdade. Tais valores, postos como fundamentais,

    mascaram uma realidade desumana e uma democracia que de fato não se concretiza. A

    democracia liberal sustenta a liberdade individual, a igualdade de oportunidades entre os

    homens, mas considerando-os naturalmente diferentes em suas capacidades, levando

    naturalmente às desigualdades sociais e à dominação de uma classe sobre a outra.

    De acordo com Beauvoir (1976, p.95):

    Teoria e prática nem sempre se conjugam: a velhice pode ser ridicularizada em particular e receber demonstrações públicas de atenção e respeito. É mais encontrada a situação oposta: os velhos são honrados verbalmente e, na prática, deixados ao deus-dará.

    Nesse momento, no Brasil, o centro de ataque do programa neoliberal tem-se

    voltado para a não materialização das políticas públicas que estabelecem as

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    necessidades dos sujeitos das classes menos favorecidas. A interferência do Estado

    nessas questões é ilusória e, com isso, mantêm-se as taxas alarmantes de desemprego,

    concentração de renda, fome, doenças, criminalidade e pobreza na velhice.

    Todavia, isto não significa que devemos negar ou rejeitar as políticas públicas

    em nosso país. Nesse sentido, o fundamental é o fortalecimento daqueles que se

    encontram fora dos processos decisórios. Contudo, ainda nos resta à esperança de uma

    transformação radical na estrutura social, que nos permita mudanças em nossas práticas

    com as pessoas idosas e na concepção da sociedade como um todo sobre igualdade e

    universalidade dos direitos, transformações que somente serão possíveis em uma

    sociedade mais justa e igualitária.

    3 Algumas reflexões necessárias

    Sabemos que o tema dos idosos que vivem em instituições de longa permanência

    é complexo e exige contínuo estado de investigação, análise crítica e diálogo. Em nosso

    país, o descaso com as condições de vida das pessoas idosas esta representado nas

    péssimas condições estruturais das ILPIs.

    Constatamos que, na cidade de Alvorada, esses idosos são atendidos, em sua

    maioria por organizações “empresariais”, com baixo nível de qualidade, no diz respeito

    a prestação de serviços onde, muitas vezes, são negados medicamentos, alimentação

    adequada e outras necessidades básicas para que essas pessoas possam viver com

    dignidade e respeito. Identificamos que uma das principais causas da vulnerabilidade do

    idoso é a precariedade das ILPIs que prestam atendimento aos idosos.

    Com base em nossos estudos e pesquisas, bem como em nossa experiência como

    educadora de programas sociais organizados para pessoas idosas, em Alvorada-RS,

    propomos e defendemos que os dispositivos legais vigentes de proteção aos idosos

    sejam concretizados e que os órgãos responsáveis pela fiscalização e organização das

    ILPIs atuem como indicam as leis, pois somente dessa maneira, será possível oferecer

    níveis superiores de qualidade de vida aos idosos que necessitam viver em instituições

    de longa permanência em nosso país.

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    XVIII Seminário Internacional de Formação de Professores para o MERCOSUL/CONE SUL De 03 a 05 de novembro de 2010 Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Florianópolis – Santa Catarina – Brasil

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