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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS FORNECEDORES EM FACE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR SAMUEL MANTELLI CLEZAR DECLARAÇÃO “DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”. ITAJAÍ (sc), de de 2010. ___________________________________________ Professor Orientador: Eduardo Erivelton Campos UNIVALI – Campus Itajaí-SC

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS FORNECEDORES EM FACE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

SAMUEL MANTELLI CLEZAR

DECLARAÇÃO

“DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”.

ITAJAÍ (sc), de de 2010.

___________________________________________ Professor Orientador: Eduardo Erivelton Campos

UNIVALI – Campus Itajaí-SC

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS FORNECEDORES EM FACE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

SAMUEL MANTELLI CLEZAR

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito. Orientador: Prof. Espc. Eduardo Erivelton Campos

Itajaí (SC), novembro de 2010.

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AGRADECIMENTO

Gostaria de agradecer: obrigado.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos mineiros soterrados no Deserto de Atacama, no Chile e, especialmente, ao

inventor da Cápsula “Fênix 2”.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí (SC), novembro de 2010.

Samuel Mantelli Clezar Graduando

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Samuel Mantelli Clezar, sob o título A

Responsabilidade Civil dos Fornecedores em face do Código de Defesa do

Consumidor, foi submetida em 26 de novembro de 2010 à banca examinadora

composta pelos seguintes professores: Eduardo Erivelton Campos (Orientador e

Presidente da Banca), e Pollyanna Maria da Silva (Examinadora) aprovada com a

nota _________ (____________________).

Itajaí (SC), novembro de 2010.

Prof. Espc. Eduardo Erivelton Campos Orientador e Presidente da Banca

Prof. MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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SUMÁRIO

RESUMO........................................................................................... IX

INTRODUÇÃO .................................................................................. 10

CAPÍTULO 1 ........................................ ............................................. 13

A RESPONSABILIDADE CIVIL .......................... .............................. 13

1.1 NOÇÕES GERAIS ......................................................................................... 13

1.2 ASPECTOS HISTÓRICOS E EVOLUTIVOS .............. ................................... 14

1.3 CONCEITO .................................................................................................... 20

1.4 PRESSUPOSTOS .......................................................................................... 23

1.4.1 CONDUTA (AÇÃO OU OMISSÃO) ...................................................................... 23

1.4.2 IMPUTABILIDADE ............................................................................................ 24

1.4.3 CULPA OU DOLO ............................................................................................ 26

1.4.4 DANO ............................................................................................................ 27

1.4.5 RELAÇÃO DE CAUSALIDADE ........................................................................... 29

1.5 ESPÉCIES ..................................................................................................... 30

1.5.1 QUANTO AO FATO GERADOR .......................................................................... 30

1.5.2 QUANTO AO FUNDAMENTO/TEORIA ................................................................. 33

CAPÍTULO 2 ........................................ ............................................. 38

O DIREITO DO CONSUMIDOR ........................................................ 38

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vii

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA ............................ .................................................. 38

2.2 CONCEITO DE CONSUMIDOR ..................................................................... 44

2.2.1 INTERPRETAÇÃO FINALISTA ............................................................................ 47

2.2.2 INTERPRETAÇÃO MAXIMALISTA ....................................................................... 49

2.3 DESDOBRAMENTOS LEGAIS DO CONCEITO DE CONSUMIDOR ........... 51

2.4 DIREITOS DO CONSUMIDOR E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ............................................................................................................................. 52

2.5 CONCEITO DE FORNECEDOR .................................................................... 56

2.5.1 PESSOA FÍSICA .............................................................................................. 58

2.5.2 ENTE DESPERSONALIZADO ............................................................................. 58

2.5.3 PROFISSIONAIS LIBERAIS ............................................................................... 59

2.6 CONCEITO DE PRODUTO E SERVIÇO ....................................................... 60

2.6.1 SERVIÇOS PÚBLICOS ..................................................................................... 62

2.7 RELAÇÃO DE CONSUMO ............................ ................................................ 65

2.8 VÍCIO E DEFEITO DO SERVIÇO OU DO PRODUTO ................................... 67

2.8.1 VÍCIO DO SERVIÇO OU DO PRODUTO ................................................................ 67

2.8.2 DEFEITO DO SERVIÇO OU DO PRODUTO ........................................................... 69

CAPÍTULO 3 ........................................ ............................................. 72

A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS FORNECEDORES EM FACE D O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ....................................... 72

3.1 A RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO OU DO S ERVIÇO .. 72

3.1.1 A RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO ............................................. 75

3.1.1.1 A Responsabilidade Subsidiária do Comercian te pelo Fato do Produto .......77

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viii

3.1.1.2 Causas de Exclusão da Responsabilidade do F ornecedor de Produtos .......81

3.1.2 A RESPONSABILIDADE PELO FATO DO SERVIÇO ............................................... 83

3.2 A RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO .. 85

3.2.1 A RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO ............................................. 86

3.2.2 A RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO SERVIÇO ............................................... 92

3.3 A RESPONSABILIDADE DOS PRESTADORES DE SERVIÇOS PÚBLICOS94

3.4 A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PROFISSIONAIS LIBE RAIS ............. 97

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................. .............................. 102

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ..................... .................... 105

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RESUMO

As relações de consumo estão presentes na sociedade desde os seus primórdios,

tendo em vista a constante necessidade encontrada pela humanidade em trocar

seus bens. Nos primeiros momentos, não havia necessidade de regramento, eis que

o comércio era realizado de forma direta, entre produtor e consumidor, caracterizado

pela boa-fé. No entanto, as diversas modificações na sociedade a transformaram em

“sociedade de consumo”, marcada pela produção industrial massificada e veiculação

publicitária dos produtos, aumentando, assim, os problemas relacionados à

produção e ao consumo, alimentados por práticas abusivas e concorrências

desleais. Tal situação culminou na concentração de renda e disparidade social entre

fornecedores e consumidores, fazendo com que o Estado passasse a intervir nas

relações de consumo, mormente por meio de leis, buscando proteger a parte mais

fraca da corrente, qual seja, o consumidor. Diante dessa conjuntura, foi elaborado o

Código de Defesa do Consumidor, justamente com o escopo de resguardar os

direitos do consumidor e dispor regras inerentes à relação consumerista. A presente

monografia trata, efetivamente, acerca da Responsabilidade Civil dos Fornecedores

nas relações consumeristas, com enfoque na Responsabilidade Civil prevista no

Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 10.406/2002), que, tendo em vista a

relação de desigualdade estabelecida entre fornecedor e consumidor, confere a este

tratamento diferenciado, buscando-se a devida equiparação. Assim, o Código de

Defesa do Consumidor elenca um rol bastante abrangente de fornecedores

responsáveis por eventuais vícios ou defeitos nos produtos ou serviços, objetivando

que o consumidor lesado seja ressarcido em praticamente qualquer hipótese. Ainda,

adota como regra o regime de Responsabilidade Civil objetiva aos fornecedores,

baseado na teoria do risco.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto a Responsabilidade

Civil dos Fornecedores em face do Código de Defesa do Consumidor.

O seu objetivo é a identificação das situações que ensejam a

Responsabilidade Civil na relação de consumo e os respectivos responsáveis pela

reparação dos prejuízos causados ao consumidor ou terceiro a ele equiparado.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando da

Responsabilidade Civil em geral, desde os seus aspectos históricos e evolutivos,

conceito, pressupostos, até suas espécies (contratual e extracontratual, objetiva e

subjetiva).

No Capítulo 2, adentra-se na análise do Direito do Consumidor,

momento no qual se discorre acerca da sua evolução histórica, conceituação

(abrangendo as interpretações finalistas e maximalistas) e seus dobramentos legais,

dos principais elementos que o constitui, vícios e defeitos do serviço ou do produto e

da relação de consumo

Por fim, o Capítulo 3 versa propriamente sobre a

Responsabilidade Civil dos Fornecedores em face do Código de Defesa do

Consumidor, mais especificamente sobre a Responsabilidade pelo fato do produto

ou do serviço e as causas que a excluem, bem como sobre a Responsabilidade pelo

vício do produto ou do serviço, Responsabilidade dos prestadores de serviços

públicos e, no momento final, sobre a Responsabilidade dos profissionais liberais.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados,

seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a

Responsabilidade Civil dos Fornecedores em face do Código de Defesa do

Consumidor.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

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a) Há, no Código de Defesa do Consumidor, previsão acerca

da Responsabilidade Civil dos Fornecedores de produtos ou serviços;

b) A Responsabilidade Civil dos fornecedores prevista no

Código de Defesa do Consumidor é, em regra, objetiva, ou seja, prescinde de culpa

para que seja caracterizada;

c) Há casos em que a Responsabilidade Civil objetiva, regra do

Código de Defesa do Consumidor, dá lugar à Responsabilidade Civil subjetiva,

devendo-se perquirir a culpa do agente, mesmo em se tratando de relação de

consumo;

d) Em caso de defeito no produto, a Responsabilidade Civil do

comerciante pelo acidente de consumo é meramente subsidiária e somente surge

quando presentes alguma das hipóteses do artigo 13, I, II e III, do Código de Defesa

do Consumidor. Contudo, no caso de vício no produto, a sua Responsabilidade do

comerciante é solidária.

e) As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado

prestadoras de serviços públicos são consideradas fornecedoras de serviços para os

efeitos do Código de Defesa do Consumidor, estando elas adstritas a este Diploma

Legal.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de

Investigação1 foi utilizado o Método Indutivo2, na Fase de Tratamento de Dados o

Método Cartesiano3, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia

é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas

1 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a

moldura do Referente estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008. p. 83.

2 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 86.

3 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica . 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

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do Referente4, da Categoria5, do Conceito Operacional6 e da Pesquisa Bibliográfica7.

Por fim, cumpre consignar que as categorias fundamentais

para a monografia, bem como os seus conceitos operacionais serão apresentados

no decorrer do trabalho.

4 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto

desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54.

5 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25.

6 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37.

7 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209.

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13

CAPÍTULO 1

A RESPONSABILIDADE CIVIL

1.1 NOÇÕES GERAIS

Primeiramente, antes de discorrer acerca do tema proposto,

necessário se faz expor algumas noções gerais concernentes à Responsabilidade

Civil.

Nesse passo, sustentando-se no que ensina Coelho8, pode-se

afirmar que, em sociedade, estamos todos interagindo, fazendo com que a omissão

e a ação de uma pessoa cause algum prejuízo ou alguma melhoria a outrem,

interferindo, assim, na situação, nos interesses e nos bens desta. Consoante expõe

o autor, tais interferências são externalidades, nas quais uma pessoa tem sua

situação danificada por uma ação alheia sem que seja recompensada por isso.

Destarte, considerando a constante interação interpessoal

advinda do convívio em sociedade, conforme lecionam Gagliano e Pamplona Filho9,

"toda a atuação do homem invade ou, ao menos, tangencia, o campo da

Responsabilidade". Deveras, toda manifestação humana traz em si o problema da

Responsabilidade.

Dando sequência a esse raciocínio, os autores suso citados

afirmam que "[...] a noção jurídica de responsabilidade pressupõe a atividade danosa

de alguém que, atuando a priori ilicitamente, viola uma norma jurídica preexistente

(legal ou contratual), subordinando-se, desta forma, às consequências do seu ato"10

8 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil , v. 2. 2.ed. rev. São Paulo:

Saraiva, 2005, p. 249. 9 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de

direito civil , Volume III: responsabilidade civil. 5. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 9. 10 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de

direito civil , p. 9.

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14

Por seu turno, Venosa11 assevera, no mesmo diapasão, que "o

estudo da responsabilidade civil é parte integrante do direito das obrigações, sendo

a reparação dos danos algo sucessivo à transgressão de uma obrigação, dever

jurídico ou direito."

A respeito da questão, Fabio Ulhoa Coelho12 discorre que:

O que caracteriza a interação como externalidade é a inexistência de compensação entre as pessoas envolvidas. Se quem tem a situação piorada pela ação alheia não é compensado por isso, ou se aquele que ganhou não compensa ninguém pela melhora que experimentou, a interferência é uma externalidade. Caso contrário, isto é, na hipótese de compensação dos prejuízos ou ganhos, dá-se a internalização da externalidade. A externalidade é negativa se a ação de uma pessoa prejudica outra; e positiva se beneficia.

Assim sendo, em linhas gerais, a função da Responsabilidade Civil é a

reparação do dano causado por alguém a outrem. Está ela calcada, portanto, no

restabelecimento da situação anterior ao dano. E, em decorrência disso, todo dano

tem o direito de ser indenizado na mesma magnitude, restabelecendo-se o equilíbrio

das relações.13

Feitas as ressalvas gerais pertinentes, passa-se a um breve

relato no que tange a evolução histórica da Responsabilidade Civil, com o desiderato

de que seja exposta a forma como houve o surgimento e as modificações ocorridas

no decorrer dos anos, para melhor compreensão da sua aplicação nos tempos

atuais.

1.2 ASPECTOS HISTÓRICOS E EVOLUTIVOS

A Responsabilidade Civil teve uma significativa evolução

histórica, passando, seu entendimento por diversas etapas, que, com o tempo,

foram se amoldando às necessidades da sociedade.

Num primeiro momento, a Responsabilidade tinha sentido

11 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil . 5. ed.

São Paulo: Atlas, 2005. v.4. p. 13. 12 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil , p. 249. 13 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação

jurisprudencial . 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 67.

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expiatório, ou seja, para ser responsável bastava estar no mundo.14

Sobre o surgimento e a evolução da Responsabilidade Civil,

Guimaro Júnior15 sustenta que:

Antes de ingressar nos corpos legislativos das nações ocidentais, e da doutrina e jurisprudência dedicar a atenção que realmente lhe cabe, a questão da responsabilidade em decorrência do dano já permeava as mais primitivas relações humanas. Com o surgimento dos primeiros agrupamentos, a descoberta da agricultura e o desenvolvimento das atividades manufatureiras, a vida em sociedade passa a exigir uma interação verdadeiramente contratual. Abandonando o nomadismo e estabelecendo domicílio, o grupo social estratifica-se, distribui papéis aos que optam pela segurança social do mono, polis ou civita, e exige recíproco respeito à autoridade do governante e de seus pares.

Nos primórdios, diferentemente dos tempos atuais, a

Responsabilidade recaía sobre toda a coletividade. A esse respeito, Gomes16

leciona que:

[...] as sociedades humanas em seus primórdios eram de um todo organicista. O ser humano enquanto individualidade ainda não se firmava, vivendo em função da comunidade. Somente dentro desta possuiria identidade. O ser humano era visto como parte de um todo em relação ao qual deveria dedicar-se inteiramente. Não estando o ser humano individualizado a responsabilidade por seus atos recaía sobre toda a coletividade. Neste sentido, nas origens, era coletiva e atingia os membros do grupo, clã, família, tribo etc., independentemente da determinação ou não do autor material do dano. [...] a evolução operou-se no sentido de uma individualização progressiva.

Segundo Maria Helena Diniz17, a maioria dos autores, ao

explanarem sobre a evolução histórica da Responsabilidade Civil, afirmam que, nos

primórdios da civilização humana, aquela se fundava na vingança coletiva,

caracterizando-se pela reação conjunta do grupo contra o agressor, pela ofensa a

14 GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do Direito . 26. ed.

Uberaba: Forense, 1999. 15 GUIMARO JÚNIOR, Orlando. Elementos formadores da

responsabilidade civil . Ufac, Piracicaba, 2004. Disponível em: <http://www.ufac.br/ensino/cursos/curso_direito/docs/ufac_artigo_e12.doc>. Acesso em: 02/08/2010.

16 GOMES, Marcelo Kokke. Responsabilidade Civil . Dano e Defesa do Consumidor. Belo Horizonte. Editora Del Rey. 2001. p. 20.

17 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2006. v.7. p.8.

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16

um de seus componentes.

Consagrava-se, nesta primeira fase, a chamada justiça pelas

próprias mãos, caracterizando-se pela falta de proporcionalidade no revide à

agressão. A vingança privada constituiu-se, pois, na mais frequente forma de

punição adotada pelos povos primitivos.18

Num segundo momento, o entendimento passou a ser de que a

melhor forma de resolução dos conflitos restava na reação imediata, instintiva e

brutal do ofendido, não havendo, ainda, distinção entre Responsabilidade Penal e

Civil, tampouco entre Responsabilidade culposa e objetiva, nem sequer entre

Responsabilidade individual e coletiva.19

Destarte, o instituto evoluiu para uma reação individual, ou

seja, passou da vingança coletiva para a privada, reagindo o ofendido de maneira

imediata e brutal, movido instintivamente, prevalecendo, assim, a lei do mais forte.

Imperava a vingança privada como solução para os conflitos e reparação dos danos,

que, para Carlos Roberto Gonçalves20, é “forma primitiva, selvagem talvez, mas

humana, da reação espontânea e natural contra o mal sofrido; solução comum a

todos os povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal”.

Gagliano e Pamplona Filho21 igualmente narram que, na

organização das sociedades pré-romanas, predominava a concepção de vingança:

De fato, nas primeiras formas organizadas de sociedade, bem como nas civilizações pré-romanas, a origem do instituto está calcada na concepção de vingança privada, forma por certo rudimentar, mas compreensível do ponto de vista humano como lídima reação pessoal contra o mal sofrido.

Contudo, por uma série de fatores, em muitas oportunidades o

18 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : Responsabilidade

Civil, p.9. 19 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil . 9. ed. rev. de

acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-1-2002). São Paulo: Saraiva, 2005. p.4 20 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro , volume IV:

responsabilidade civil. 2. ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2007. p. 6 21 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de

direito civil , Volume III: responsabilidade civil, p. 10.

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lesado ficava impossibilitado de reagir desde logo à agressão, mormente porque

nem sempre ele estava presente no momento da prática do ato danoso. Nesse caso,

o castigo, por óbvio, havia de ser posterior, o que foi preponderante para que

surgisse a necessidade de regulamentar essa espécie de punição. Foi então que,

posteriormente, originou-se a pena "olho por olho, dente por dente", prevista na Lei

das XII Tábuas. Na Tábua VII, lei 11ª, ficou imposta a pena de Talião a quem ferisse

outrém, a menos que houvesse um prévio acordo.22

Em momento posterior, gradativamente, a violência com a qual

o lesionado era autorizado a reagir foi se atenuando e, consequentemente, a pena

foi deixando de ser pessoal para ser patrimonial. Foi-se transformando em um

período de composição voluntária, no qual o ofendido passou a ter a faculdade de

substituir a retaliação ao causador do dano por uma composição de caráter

patrimonial.

Na medida em que a pena privada foi perdendo o caráter de

punição, a idéia de reparação passou a tomar força, conforme aduz Dias23:

O prejudicado percebe que mais conveniente do que cobrar a retaliação - que é razoavelmente impossível no dano involuntário e cujo efeito é precisamente o oposto da reparação, porque resultava em duplicar o dano: onde era um, passavam a ser dois os lesados - seria entrar em composição com o autor da ofensa, que repara o dano mediante prestação da pena, espécie de resgate de culpa, pelo qual o ofensor adquire o direito ao perdão do ofendido. Aí informa o eminente Alvino Lima, a vingança é substituída pela composição a critério da vítima, mas subsiste com o fundamento ou forma de reintegração do dano sofrido.

Mas foi em Roma, mais precisamente através da Lei Aquília,

que surgiu, nos dizeres do autor supracitado, um princípio geral regulador dedicado

à reparação do dano, escopo basilar da Responsabilidade Civil.24

Gagliano25 sustenta, na mesma esteira de pensamento, que a

22 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : Responsabilidade

Civil, p.10. 23 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade Civil . Uberaba: Forense,

1979. v. 1. p. 24. 24 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade Civil , p. 24. 25 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil : Responsabilidade

Civil, p. 11.

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Lex Aquília foi um marco na evolução histórica da Responsabilidade Civil. A partir

daí a responsabilidade ganhou traços subjetivos, com a necessidade da averiguação

da culpa do agente para a caracterização da obrigação de ressarcir. Houve, nessa

fase, além do afastamento da responsabilidade objetiva, a cristalização da

reparação pecuniária.

Importante frisar que os povos ainda não faziam distinção entre

responsabilidade civil e responsabilidade penal, sendo ambas impostas ao causador

do dano. Conforme salienta Carlos Roberto Gonçalves26, a distinção entre a pena e

a reparação, entretanto, somente começou a ser esboçada ao tempo dos romanos,

com a distinção entre os delitos públicos (ofensas mais graves, de caráter

perturbador da ordem) e os delitos privados. Nos delitos públicos, a pena econômica

imposta ao réu deveria ser recolhida aos cofres públicos e, nos delitos privados, a

pena pecuniária era destinada à vítima.

Segundo Nalin27, "no Direito Romano, desde a época clássica,

a responsabilidade civil se notabilizava por atos ilícitos, contratuais e delituais, que

acarretavam o pagamento de certa quantia em dinheito ao ofendido, denominada de

poena.”

Destarte, conforme sintetiza Lopes28, a Responsabilidade foi

marcada por essas etapas:

1ª) responsabilidade puramente objetiva, em razão da solidariedade do grupo e da concepção política que então preponderava; 2ª) o bandono noxal (troca de um sistema político para outro de caráter jurídico) entregou o indivíduo causador do prejuízo à mercê da vítima, sem mais proteção da solidariedade do seu próprio grupo, situação que propiciou uma defesa individual e a idéia de inimputabilidade, diante de certas circunstâncias; 3ª) com o tempo, processou-se uma conciliação entre a responsabilidade objetiva e a subjetiva, favorecida pelo fato da lex aquilia ter silenciado ou não previsto, expressis verbis, os fatos involuntários dando margem à responsabilidade, tendo sido esta transação, na realidade, o fator preponderante do nascimento da idéia de culpa.

26 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro , volume IV:

responsabilidade civil, p. 6 27 NALIN, Paulo Roberto Ribeiro. Responsabilidade Civil,

Descumprimento do Contrato e Dano Extrapatrimonial . Curitiba: Juruá, 1996. p.22. 28 LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil . Rio de Janeiro:

Freitas Bastos, 2003. p.165.

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Nessa marcha de evolução da Responsabilidade, Diniz29 relata

que "na Idade Média, com a estruturação da idéia de dolo e de culpa stricto sensu,

seguida de uma elaboração da dogmática da culpa distingui-se a responsabilidade

civil da penal".

No decorrer do tempo, o direito francês foi aperfeiçoando essas

idéias, estabelecendo determinados princípios que influenciaram em outros povos,

tais como o direito à reparação sempre que houvesse culpa, ainda que leve, fixando

a distinção entre a Responsabilidade Civil e a Responsabilidade Penal; e a

cristalização da existência de uma culpa contratual, que não se liga a crime

tampouco a delito, mas se origina da imperícia, negligência ou imprudência.30

Foi elaborado, em 1804, o Código de Napoleão e, com ele, a

distinção entre culpa delitual e contratual. Surgiu, pois, a definição de que a

Responsabilidade Civil se funda na culpa, o que se propagou nas legislações de

todo o mundo.31

Assim procedeu o atual Código Civil italiano, no qual o princípio

geral dominante (art. 2.043) é o de que todo fato doloso ou culposo, que ocasiona a

outrém um prejuízo injusto, obriga ao que perpetrou o dano.

No mesmo diapasão, tanto o Código Civil da Grécia quanto o

Código Civil egípcio, de 1948, firmaram o princípio da culpa como fundamento da

responsabilidade civil.

A Responsabilidade Civil no Direito brasileiro, em que pese ter

sofrido forte inclinação para a teoria do risco (responsabilidade objetiva), adotou a

teoria da culpa, expressa no artigo 159 do Código Civil de 191632.

29 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : Responsabilidade

Civil, p.10. 30 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 10. 31 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 5. 32 Art. 159. "Aquele que, por ação ou omissão coluntária, negligência, ou

imperícia, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade regulam-se pelo disposto neste Código, arts. 1518 a 1532 e 1537 a 1553".

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O Código Civil de 2002, em seu artigo 18633, manteve a teoria

subjetiva como principal fundamento da responsabilidade civil. Destaca-se, nesse

Diploma Legal, a inovação trazida no seu artigo 92734, parágrafo único35, que

apresentou um princípio geral para a responsabilidade objetiva.

Ultrapassado esse breve relato acerca de como se desdobrou

a Responsabilidade Civil desde os tempos remotos até os atuais, pertine adentrar à

sua conceituação, a fim de facilitar o entendimento sobre o assunto.

1.3 CONCEITO

Primeiramente analisar-se-á a origem e significado da palavra

Responsabilidade.

Conforme lecionam Gagliano e Pamplona Filho36,

responsabilidade é originária do verbo respondere, que significa a obrigação que

alguém tem de assumir as conseqüências jurídicas de sua atividade.

Segundo Venosa37:

A palavra responsabilidade é utilizada para designar várias situações na área jurídica. Em sentido amplo, é o fato de atribuir a um sujeito o dever de assumir as conseqüências de um evento ou de uma ação, podendo ser também utilizada no sentido de capacidade.

Para Lisboa38, o conceito de Responsabilidade, no sentido

jurídico, "é o dever jurídico de recomposição do dano sofrido, imposto ao seu

causador direto ou indireto".

33 Art. 186: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".

34 Art. 927: "Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrém, fica obrigado a repará-lo".

35 Parágrafo único: "Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem".

36 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil : responsabilidade civil, p. 2.

37 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil : parte geral, p.12. 38 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil . Volume 2: obrigações

e responsabilidade. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. p. 427.

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Nos dizeres de Carlos Roberto Gonçalves39, a palavra

Responsabilidade encerra a idéia de segurança ou garantia da restituição ou

compensação do bem sacrificado. Teria assim, o significado de recomposição, de

obrigação, de restituir ou ressarcir.

Rui Stoco40, por sua vez, aproxima a definição de

responsabilidade à idéia de obrigação e conclui:

Responsável, responsabilidade, assim como, enfim, todos os vocábulos cognatos, exprimem idéia de equivalência de contraprestação, de correspondência. É impossível, diante disso, fixar uma noção, sem dúvida ainda que imperfeita, de responsabilidade, no sentido de repercussão obrigacional (não interessa investigar a repercussão inócua) da atividade do homem. Como esta varia até o infinito, é lógico concluir que são espécies de responsabilidade, conforme o campo que se apresenta o problema: na moral, nas relações jurídicas, de direito público ou privado. A responsabilidade não é fenômeno exclusivo da vida jurídica, antes se liga a todos os fenômenos da vida social.

Por seu turno, o termo "civil" é atribuído ao cidadão, tendo em

vista as suas relações com os demais membros da sociedade, o que enseja o

surgimento de direitos a exigir e obrigações a cumprir.41

Assim, conforme leciona Coelho, no momento em que "alguém

intencionalmente causa dano ao patrimônio de outrem, a convivência em sociedade

pressupõe a obrigação de aquele repor a este os prejuízos causados". 42

Consoante expões Dias: “O interesse em restabelecer o

equilíbrio econômico-jurídico alterado pelo dano é a causa geradora da

responsabilidade civil”.43

39 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil , p. 15. 40 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial,

p. 45. 41 CORREIA, Jadson Dias. Responsabilidade civil do advogado . Proteus,

Aracaju, 2002. p. 01. Disponível em: <http://proteus.limeira.com.br/jurinforma/portal.php?cod=4&grupo=notasd&p=171> Acesso em: 02/08/2010

42 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil , volume 2, p. 249. 43 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil , p. 42.

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Dessa forma, Gagliano e Pamplona Filho44 dizem que a “[...]

responsabilidade civil deriva da agressão a um interesse eminentemente particular,

sujeitando, assim, o infrator, ao pagamento de uma compensação pecuniária à

vítima, caso não possa repor in natura o estado anterior de coisas”.

Coelho45, dando continuidade ao raciocínio, conclui que a

Responsabilidade Civil é uma forma de justiça, e é caracterizada como sendo "[...] a

obrigação em que o sujeito ativo pode exigir o pagamento de indenização do passivo

por ter sofrido prejuízo imputado a este último"

Diniz46, por seu turno, explica da seguinte forma o tema:

A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou simples imposição legal.

Savatier, citado por Rodrigues47, ensina que a responsabilidade

civil é “[...] a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado

a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam”.

Considerando as lições suso transcritas, tem-se que a

Responsabilidade Civil obriga o infrator a reparar o dano causado a outrém, seja em

consequência de ato próprio ou de ato de pessoas ou coisas que dele dependam.

Essa reparação, frise-se, tem o desiderato de ressarcir de forma justa o mal sofrido,

seja através da restauração do patrimônio ou a compensação pelos sofrimentos

causados.

Nessa toada, Sampaio48 conclui:

[...] diz-se portanto, que o instituto da responsabilidade civil é parte

44 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de

direito civil : responsabilidade civil, p. 9. 45 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil , volume 2, p. 252. 46 DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro : responsabilidade civil, p. 36. 47 RODRIGUES, Silvio. Direito civil : responsabilidade civil. V. 4. São Paulo.

Saraiva. 18. ed. 2000 p. 06. 48 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito Civil Responsabilidade

Civil , 3ª ed. Editora Atlas S.A, 2003. p. 17.

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integrante do direito obrigacional, posto que consiste na obrigação que tem o autor de um ato ilícito de indenizar a vítima pelos prejuízos a ela causados. [...] amolda-se ao conceito genérico de obrigação, qual seja, o direito de que é titular o credor em face do devedor, tendo por objeto determinada prestação [...] assume a vítima de um ato ilícito a posição de credora, podendo então, exigir do autor determinada prestação, cujo conteúdo consiste na reparação dos danos causados.

Conceitua-se a Responsabilidade Civil, pois, como a obrigação

que fica adstrito o lesante em reparar os danos causados a outrem, seja por meio do

ressarcimento da coisa in natura ou através do pagamento da quantia pecuniária

correspondente à lesão causada. De outra monta, seu objetivo é a restauração do

status quo ante rompido pelo dano, tendo-se como garantia do adimplemento o

patrimônio do lesante.

1.4 PRESSUPOSTOS

De acordo com Queiroga49, “são pressupostos da

responsabilidade civil: ação ou omissão do agente, culpa ou dolo, relação de

causalidade e dano experimentado pela vítima.”

Far-se-á, pois, a análise de cada pressuposto.

1.4.1 Conduta (Ação ou Omissão)

A conduta define-se como um ato humano, que pode ser

comissivo ou omissivo, lícito ou ilícito. A Responsabilidade do agente, por seu turno,

pode decorrer de ato próprio, de ato de terceiro que esteja sob sua

responsabilidade, ou de dano causado por coisa que esteja sob a sua guarda.

Acerca dos atos, Diniz50 ensina:

A ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado.

49 QUEIROGA, Antônio Elias de. Responsabilidade civil e o novo código

civil . Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 15. 50 DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro : responsabilidade civil, p. 39.

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Nesse sentido, Rodrigues51 leciona que “o ato ilícito pode advir

de uma ação ou omissão do agente. Desse modo, decorrerá sempre de uma atitude

sua, ativa ou passiva, que irá causar dano a terceiro”. E continua o raciocínio

afirmando que a conduta ativa, em regra geral, consubstancia-se em ato doloso ou

imprudente, conquanto que a passiva configura-se pela negligência, sendo que a

omissão ocorre quando o agente, devendo agir de determinada maneira, deixa de

fazê-lo.52

O autor acima citado dispõe, ainda, sobre a Responsabilidade

de ato próprio e de terceiro:

A responsabilidade por ato próprio se justifica no próprio princípio informador da teoria da reparação, pois se alguém, por sua ação pessoal, infringindo dever legal ou social, prejudica terceiro, é curial que deva reparar esse prejuízo. A responsabilidade por ato de terceiro ocorre quando uma pessoa fica sujeita a responder por dano causado a outrem não por ato próprio, mas por ato de alguém que está, de um modo ou de outro, sob a sujeição daquele.53

Por fim, no que tange a conduta omissiva, Serrano54 Júnior faz

as ressalvas pertinentes:

A conduta omissiva tem natureza normativa. Do nada, nada surge. Assim, a omissão tem relevância para o direito, quando importa na inobservância de um dever de agir. Atribui-se sua responsabilidade pela não prática de um certo ato que deveria realizar. Como exemplo temos a inexecução de uma obrigação contratual.

Dessa forma, tem-se que a omissão somente surte efeitos

jurídicos quando for esperada conduta contrária do agente.

1.4.2 Imputabilidade

A imputabilidade, em sentido amplo, é a possibilidade de

responsabilizar determinada pessoa pela prática de uma conduta.

51 RODRIGUES, Silvio. Direito civil : parte geral, p. 309. 52 RODRIGUES, Silvio. Direito civil : parte geral, p. 309. 53 RODRIGUES, Silvio. Direito civil , p. 14-15. 54 SERRANO JÚNIOR, Odoné. Responsabilidade CIvil do Estado por

Atos Judiciais . 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 23.

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Para Venosa55, "Imputar é atribuir a alguém a responsabilidade

por algum fato ou ato. Desse modo, a imputabilidade é pressuposto não só da culpa,

mas da própria responsabilidade".

Diniz56 leciona que:

A imputabilidade, elemento constitutivo de culpa, é atinente a condições pessoais (consciência e vontade) daquele que praticou o ato lesivo, de modo que consiste na possibilidade de se fazer referir um ato a alguém, por proceder de uma vontade livre. Assim, são imputáveis a uma pessoa todos os atos por ela praticados, livre e conscientemente. Portanto, ter-se-á imputabilidade, quando o ato advier de uma vontade livre e capaz.

A imputabilidade caracteriza-se, pois, pela consciência e

vontade do agente causador do dano, elementos necessários para que seja

atribuído um ato a alguém.

Serrano Júnior57 faz digressão necessária à matéria:

Não obstante, pelo sistema jurídico pátrio, o fato do ato ser praticado por menor de 16 anos, inimputável do ponto de vista do direito civil, não afasta desde logo, o direito de indenização a que tem direito o lesado. Seja o menor imputável ou não, o ato ilícito por ele praticado acarreta a responsabilidade da pessoa (pai ou tutor) a quem incumbe vigilância (Código CIvil 1916 art. 1.521, I e II, Código Civil 2002 art. 923, I e II), com fundamento na culpa in vigilando.

Nessa esteira de pensamento, Monteiro58 conclui que "essa

culpa é presumida pelo legislador, de modo que só não responderá o pai ou o tutor,

pelo ato praticado pelo filho ou pupilo, se provar não ter agido com culpa".

Destarte, em espartilhada síntese, o ato imputável ao agente

deve preceder de uma vontade livre. Assim, agindo conscientemente e sendo capaz,

o agente lesante fica obrigado a indenizar o agente lesado dos danos advindos da

55 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil : responsabilidade civil, p. 62. 56 DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro : responsabilidade civil, p. 40. 57 SERRANO JÚNIOR, Odoné. Responsabilidade CIvil do Estado por

Atos Judiciais , p. 24. 58 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil : direito das

obrigações. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 288.

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conduta que praticou.59

1.4.3 Culpa ou Dolo

Em sentido amplo, a culpa define-se pela inobservância de um

dever que o agente devia conhecer e observar. O Código Civil de 2002, no seu

artigo 186, elegeu a culpa como o centro da Responsabilidade subjetiva, que norteia

a Responsabilidade Civil brasileira, não distinguindo o dolo da culpa para fins de

ressarcimento do dano causado.60

Entretanto, para fins didáticos, Alonso61 discrimina:

Se há vontade consciente de produzir um efeito danoso a outrem, reputa-se que ocorreu a culpa lato sensu ou intencional, chamada pelo direito penal de dolo; se, no entanto, a vontade do agente não era praticar o ato danoso, mas por negligência ou imprudência veio a causá-lo a alguém, diz que houve culpa stricto sensu ou não intencional, pois, embora o ato praticado tenha sido querido pelo agente, o resultado danoso não era o objetivo dele.

Segundo Rodrigues62, “na culpa o comportamento do agente

não tinha em vista causar dano à vítima, mas de sua atitude negligente, imprudente

e de sua imperícia resultou em dano a ela”.

Contudo, ante a não distinção da culpa e do dolo pelo Código

Civil, que adotou genericamente a culpa como pressuposto da Responsabilidade

subjetiva, o fato do agente ter agido culposa ou dolosamente não gera

diferenciações na obrigação a ser-lhe imposta a título de ressarcimento do dano

causado.

Assinala Diniz63 que o ordenamento jurídico brasileiro tem

como regra geral o dever ressarcitório pela prática de atos ilícitos decorrentes da

culpa, ou seja, de conduta reprovável ou censurável do agente. Por sua vez, o

59 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil : responsabilidade civil, p. 23. 60 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil : responsabilidade civil, p. 23. 61 ALONSO, Paulo Sergio Gomes. Pressupostos da responsabilidade

civil objetiva . São Paulo: Saraiva, 2000. p. 25. 62 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil, p. 16. 63 DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro : responsabilidade civil, p. 40.

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comportamento do agente será reprovado ou censurado, quando ele poderia ter

agido de forma diferente. Dessa forma, o ato ilícito qualifica-se pela culpa, e no caso

de não haver culpa, não haverá, em regra, responsabilidade.

A culpa é, assim, pressuposto da responsabilidade civil e

classifica-se em "ato negligente, imprudente, imperito ou intencional destinados a

prejudicar alguém."64

Dissertando acerca da classificação, Diniz65 ensina que:

A culpa, em sentido amplo, com violação de um dever jurídico, imputável a alguém, em decorrência de fato intencional ou de omissão de diligência ou cautela, compreende: o dolo, que é a violação intencional do dever jurídico, e a culpa em sentido estrito, caracterizada pela imperícia, imprudência ou negligência, sem qualquer deliberação de violar um dever. Portanto, não se reclame que o ato danoso tenha sido realmente, querido pelo agente, pois ele não deixará de ser responsável pelo fato de não ter apercebido do seu ato nem medido as suas consequências.

Negligência constitui-se em inobservância do dever de cuidado,

por omissão; imprudência se caracteriza quando o agente decide enfrentar, sem que

haja necessidade, o perigo, atuando contra as regras básicas de cautela; por fim, a

imperícia é forma de exteriorização da culpa que decorre da falta de aptidão ou

habilidade para a realização de uma atividade técnica ou científica.66

Como visto, no campo da Responsabilidade Civil a culpa

abrange o dolo. A maior consequência disso, ao menos para efeitos práticos, é que

o agente não se eximirá da responsabilidade de ressarcir os danos causados pelo

fato de ter agido sem qualquer intenção de violar um dever, não importanto, assim,

se houve efetivamente o dolo.

1.4.4 Dano

O dano é a peça chave para o surgimento da Responsabilidade

64 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil , p. 308. 65 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : responsabilidade

civil, p. 42. 66 GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de

direito civil , volume III: responsabilidade civil, p. 128.

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Civil. Inexistindo um dano a ser reparado, o intituto da Responsabilidade Civil não se

contempla.

Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho67 entendem

que o dano é "requisito indispensável para a configuração de qualquer espécie de

Responsabilidade (contratual ou extracontratual, objetiva ou subjetiva).

De acordo com Diniz68:

O dano é um dos pressupostos da responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, visto que não poderá haver ação de indenização sem a existência de um prejuízo. Só haverá responsabilidade civil se houver um dano a reparar. Isto é assim porque a responsabilidade resulta em obrigação de ressarcir, que, logicamente, não poderá concretizar-se onde nada há que reparar.

Cavalieri Filho69 conceitua dano da seguinte maneira:

Conceitua-se, então, o dano como sendo a subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial, quer se trate de um bem integrante da própria personalidade da vítima, como a sua honra, a imagem, a liberdade etc. Em suma, dano é a lesão de um bem jurídico, tanto patrimonial como moral, vindo daí a conhecida divisão do dano em patrimonial e moral.

O dano, pressuposto da maior relevância para a caracterização

da Responsabilidade Civil e a consequente obrigação de reparação, nada mais é,

pois, que a diminuição ou destruição de um bem jurídico tutelado, pertencente a uma

pessoa.

Pode ser ele individual ou coletivo, moral ou material.

Entretanto, em regra, deve estar presente a noção de prejuízo. Assim, mesmo que

haja transgressão a uma norma, somente surgirá a possibilidade de indenização se

o ato ilícito ocasionar dano.70

67 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de

direito civil , volue III: responsabilidade civil, p. 35. 68 DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro : responsabilidade civil, p. 58. 69 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil . São

Paulo: Editora Atlas, 2008. p. 71. 70 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil : responsabilidade civil, p. 33.

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Acerca das espécies de dano, Xavier71 distingue:

Quanto à natureza, o dano pode ser material, quando abranger coisas móveis ou imóveis; e imaterial ou pessoal, quando abalar a integridade física ou estética. Em sede de dano moral, este foi elevado a uma espécie de direito fundamental constitucional, como estabelece o Art. 5o, incisos V e X, como também a Súmula n. 37 do Superior Tribunal de Justiça, informando este que "são cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato". Trata-se de uma compensação ou equilíbrio pelo dano sofrido, que poderão ser atenuados com uma soma pecuniária, a ser aplicada em satisfações materiais ou ideais, sempre observando o caso concreto.

Assim, o dano pode ser de ordem moral, quando atinge a

própria personalidade da vítima, ou material, que lesa o seu patrimônio econômico,

sendo que ambas, no caso de indenização, se oriundas do mesmo fato, podem ser

cumuladas.

1.4.5 Relação de Causalidade

A relação de causalidade entre o dano experimentado pela

vítima e a ação do agente é pressuposto essencial para o surgimento da obrigação

de reparar o dano.72

Sobre o tema, Venosa73 afirma que, "entre o dano e a conduta

do agente, deve existir um nexo causal. A relação de causalidade, [...], procura

elucidar a questão.

Por sua vez, Queiroga74 define relação de causalidade como a

ligação que deve existir entre o fato ilícito e o dano produzido. Se não existir essa

relação de causa e efeito, não haverá a obrigação de indenizar. Assim, o dano só

poderá gerar responsabilidade quando for possível estabelecer o nexo causal entre

71 XAVIER, Rafael Alencar. Breves comentários sobre a

responsabilidade civil do profissional advogado . Escritório online, São Paulo, 2006. Disponível em: <http://www.escritorioonline.com/webnews.php?id_noticia=7124&>. Acesso em: 06/08/2010, p. 6.

72 RODRIGUES, Sílvio. Responsabilidade civil . 20. ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2003. p. 18

73 VENOSA, Sílvio de Salvo. Responsabilidade civil . 3. ed. - São Paulo: Atlas, 2003. p. 508.

74 QUEIROGA, Antônio Elias de. Responsabilidade civil e o novo código civil , p. 27.

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ele e o autor.

Nesse diapasão, Rodrigues75 relata:

Para que surja a obrigação de reparar, mister se faz a prova de existência de uma relação de causalidade entre ação ou omissão culposa do agente e o dano experimentado pela vítima. Se a vítima experimentar um dano, mas não se evidenciar que este resultou do comportamento ou da atitude do réu, o pedido de indenização formulado por aquela deverá ser julgado improcedente.

O nexo de causalidade nada mais é, portanto, que a relação de

causalidade entre a ação ou omissão culposa do agente e o dano sofrido pela

vítima.

Esses são, pois, os pressupostos da Responsabilidade Civil.

1.5 ESPÉCIES

A Responsabilidade Civil apresenta-se sob várias espécies,

conforme a perspectiva analisada.

Segundo Diniz76, ela divide-se da seguinte maneira: a) quanto

ao seu fato gerador: ela pode ser: contratual (partindo de um contrato), ou

extracontratual ou aquiliana (advinda da prática de um ato ilícito, seja por pessoa

capaz ou incapaz); b) em relação ao seu fundamento: podendo ser objetiva (quando

se funda no risco), ou subjetiva (possuindo seu fundamento na culpa ou no dolo,

seja por ação ou omissão).

Pertinente, para a compreensão do estudo proposto, destarte,

fazer as devidas distinções.

1.5.1 Quanto ao Fato Gerador

A Responsabilidade Civil, como visto alhures, pressupõe uma

obrigação decorrente de um inadimplemento. Esse inadimplemento, ou seja, o fato

75 RODRIGUES, Silvio. Direito civil : responsabilidade civil, p.17. 76 DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro : responsabilidade civil, p.

121.

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31

originário da Responsabilidade Civil pode advir de disposição contratual ou de uma

violação de conduta77. Nesse aspecto, divide-se, a Responsabilidade, em contratual

e extracontratual ou aquiliana.

Gagliano e Pamplona Filho78 ensinam que:

[...] se o prejuízo decorre diretamente da violação de um mandamento legal, por força da atuação ilícita do agente infrator, estamos diante da responsabilidade extracontratual [...]. Por outro lado, se, entre as partes envolvidas, já exista norma jurídica contratual que as vincula, e o dano decorre justamente do descumprimento de obrigação fixada neste contrato, estaremos diante de uma situação de responsabilidade contratual.

Fernando Noronha79 assinala que a Responsabilidade

extracontratual "[...] não é simplesmente aquela que fica para além dos contratos,

ela é bem mais importante, é o regime-regra da responsabilidade civil"*.

Leciona Rodrigues80:

O ilícito pode se apresentar fora do contrato. Quando isso ocorre não há nenhuma ligação que vincule o causador à vítima do dano. Devido a isso, aquele que infringiu uma norma legal por dolo ou culpa, violou um preceito de conduta do qual resulta em prejuízo a outrem, devendo, portanto indenizar. Trata-se da responsabilidade extracontratual ou aquiliana.

A responsabilidade extracontratual está fundamentada no

artigo 186 do Código Civil Brasileiro, o qual determina que “Aquele que, por omissão

voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda

que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”81

Outrossim, a Responsabilidade contratual se configura quando

77 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : teoria geral das obrigações e

teoria geral dos contratos. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 507. 78 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de

direito civil : responsabilidade civil, p. 18. 79 NORONHA, Fernando. Direito da obrigações : Fundamento do Direito

das obrigações, Introdução à Responsabilidade Civil. V.1. São Paulo, 2003. p. 433. 80 RODRIGUES, Silvio. Direito civil : parte geral, p. 308. 81 BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002: Código Civil .

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.html>. Acesso em 06/08/2010.

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da preexistência de um vínculo obrigacional e o dever de indenizar é consequência

do seu inadimplemento.82

Maria Helena Diniz83 assenta que:

Quando ocorre o inadimplemento do contrato, não é a obrigação contratual que movimenta a responsabilidade, uma vez que surge uma nova obrigação que se substitui à preexistência no todo ou em parte: a obrigação de reparar o prejuízo consequente à inexecução da obrigação assumida.

A Responsabilidade Civil contratual está prevista no artigo 389

do Código Civil Brasileiro de 2002, que dispõe que, “Não cumprida a obrigação,

responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária

segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”84.

Desse modo, nos termos do dispositivo legal suso transcrito,

tem-se que aos devedores que não cumprirem com suas obrigações contratuais, é

imposta a responsabilidade de reparação dos danos que os credores vierem a

experimentar em face do descumprimento. A indenização devida é, em muitos

casos, por igual, um substituto da prestação contratada85.

Entretanto, Venosa86 anota que "[...] nem sempre resta muito

clara a existência de um contrato ou de um negócio, porque tanto a responsabilidade

contratual como a extracontratual com frequência se interpenetram e

ontologicamente não são distintas".

Não obstante, faz-se necessária a identificação das espécies

de Responsabilidade Civil, para determinar, dentre outros aspectos, a quem

pertencerá o ônus da prova da culpa, bem como para fixar a extensão dos seus

efeitos.

82 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil , p. 38. 83 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro :responsabilidade

civil, p. 119. 84 BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002: Código Civil .

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.html>. Acesso em 06/08/2010.

85 RODRIGUES, Sílvio. Responsabilidade civil . 20, p. 8. 86 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil : responsabilidade civil, p. 19.

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33

O principal efeito das diferenças entre as Responsabilidades

extracontratual e contratual se dá em função de que nesta o inadimplemento

presume-se culposo, enquanto naquela ao lesado incumbe o ônus de provar a culpa

ou o dolo do causador do dano.

Gagliano e Pamplona Filho87 assim discorrem:

[...] na responsabilidade civil aquiliana, a culpa deve ser sempre provada pela vítima, enquanto na responsabilidade contratual, ela é, de regra, presumida, invertendo-se o ônus da prova, cabendo à vítima comprovar, apenas, que a obrigação não foi cumprida, restando ao devedor o ônus probandi [...].

Destarte, em havendo previsão contratual (Responsabilidade

contratual), a inadimplência do devedor acarreta a presunção de culpa deste, e na

Responsabilidade extracontratual, cabe à vítima o dever de comprovar a culpa ou o

dolo do agente. Essa diferença, frise-se, é essencial na busca à indenização.

1.5.2 Quanto ao Fundamento/Teoria

No instituto da Responsabilidade Civil há duas teorias que se

coadunam a cada caso conforme alguns pressupostos, quais sejam: subjetiva, regra

geral do Código Civil, sustentada na idéia de culpa; e objetiva, prevista também no

Código Civil e em leis extravagantes, esteada na teoria do risco e aplicada em casos

pré-determinados, segundo as características e particularidades apresentadas.

Rodrigues88 distingue:

[...] diz ser subjetiva a responsabilidade quando se inspira na idéia de culpa, e objetiva quando esteada na teoria do risco [...], dentro da concepção tradicional a responsabilidade do agente causador do dano só se configura se agiu culposa ou dolosamente. De modo que a prova da culpa do agente causador do dano é indispensável para que surja o dever de indenizar. A responsabilidade, no caso, é subjetiva, pois depende do comportamento do sujeito.

A teoria da Responsabilidade subjetiva, originada no Código

Napoleônico e inserta no Direito Civil brasileiro através do artigo 159 do Código Civil

87 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de

direito civil : responsabilidade civil, p. 20. 88 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil, p. 11.

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de 1916, tem sua essência assentada, segundo Pereira, "fundamentalmente, na

pesquisa ou indagação de como o comportamento contribui para o prejuízo sofrido

pela vítima"89.

Dessa forma, tendo em vista a relevante análise do

comportamento do lesante na Responsabilidade subjetiva, esta somente se

caracteriza quando ficar comprovado que o causador do dano tenha agido com dolo

ou culpa.

Monteiro90 conceitua a Responsabilidade Civil subjetiva da

seguinte maneira:

[...] pressupõe sempre a existência de culpa (latu sensu), abrangendo o dolo (pleno conhecimento do mal e direta intenção de o praticar) e a culpa (stricto sensu), violação de um dever que o agente podia conhecer e acatar, mas que descumpre por negligência, imprudência ou imperícia.

Diz-se que a Responsabilidade Civil subjetiva é inspirada na

idéia de culpa porque, para que seja caracterizada, além da necessidade de

comprovação do liame causal entre o dano injusto e a atividade imputada ao

responsável, é essencial a caracterização de ter o imputado agido com culpa.

Assim, quatro são os requisitos essenciais para a apuração da

Responsabilidade Civil subjetiva, quais sejam: a) a ação ou omissão; b) a culpa ou o

dolo do agente; c) o dano sofrido pela vítima; e d) o nexo de causalidade entre a

conduta do lesante e o dano sofrido pela vítima.

Essa é, de modo geral, a regra, eis que, conforme diz

Gonçalves91 citando Reale, o indivídio somente deve ser responsabilizado, em

princípio, por sua ação ou omissão, culposa ou dolosa. É o que preconiza o artigo

89 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil . 11. ed.

atual. por Regis Fichtner. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 562. 90 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil : direito das

obrigações, p. 449. 91 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro , vol. IV:

responsabilidade civil, p. 33.

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186 do Código Civil de 200292:

Art. 186 Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

Diniz93, compartilhando desse mesmo entendimento, disserta

que:

No nosso ordenamento jurídico vigora a regra geral de que o dever ressarcitório pela prática de atos ilícitos decorre da culpa, ou seja, da reprovabilidade ou censurabilidade da conduta do agente. O comportamento do agente será reprovado ou censurado quando, ante circunstâncias concretas do caso, se entende que ele poderia ou deveria ter agido de modo diferente.

Entretanto, conforme assinala Pereira94, em que pese a regra

geral no Direito Civil brasileiro assentar sua idéia na Reponsabilidade subjetiva

(culpa), pode essa noção não ser observada em alguns casos em que a lei autoriza:

[...] a regra geral, que deve presidir à responsabilidade civil, é a sua fundamentação na idéia de culpa; mas sendo insuficiente esta para atender às imposições do progresso, cumpre ao legislador fixar especialmente daquele os casos em que deverá ocorrer a obrigação de reparar, independentemente daquela noção. Não será sempre que a reparação do dano se abstrairá do conceito de culpa, porém quando o autorizar a ordem jurídica positiva.

Há circunstâncias, pois, em que a caracterização da culpa não

é necessária. Nesses casos haverá a responsabilidade civil objetiva. Nessa espécie

de responsabilidade, o dolo ou culpa do agente causador do dano é irrelevante,

sendo necessário para que surja o dever de indenizar, a existência do elo de

causalidade entre o dano e a conduta do agente responsável.95

Ao contrário da Responsabilidade Civil subjetiva que é

92 BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002: Código Civil . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.html>. Acesso em 06/08/2010.

93 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : responsabilidade civil, p. 44.

94 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . Vol. III. Contratos: declaração unilateral de vontades; Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 562.

95 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil : responsabilidade civil, p. 15.

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fundamentada na culpa, a Responsabilidade Civil objetiva é calcada na teoria do

risco.

Rodrigues96 faz as considerações pertinentes:

A teoria do risco é a da responsabilidade objetiva. Segundo essa teoria, aquele que, através de sua atividade, cria um risco de dano para terceiros deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua atividade e o seu comportamento sejam isentos de culpa. Examina-se a situação, e, se for verificada, objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por aquele.

Esta espécie de Responsabilidade assenta-se na premissa de

que aquele que, através de sua conduta, cria uma situação de risco de dano para

outrem, fica obrigado a repará-lo caso se efetive. Basta, pois, a simples ocorrência

do dano para a sua caracterização, não havendo que se falar em intenção do

agente. Deveras, é suficiente que se observe um nexo de causalidade entre a

atividade criadora do risco e o dano, sem que seja necessário investigar se o agente

praticou dolosa ou culposamente um ato ilícito.

Nessa senda, Diniz97 enfatiza que, em se de Responsabilidade

Civil objetiva, a conduta culposa ou dolosa do agente causador do dano é

irrelevante, uma vez que o dever de indenizar surge apenas com a existência do

nexo causal entre o prejuízo sofrido pela vítima e a ação do agente.

Observa-se que a Responsabilidade objetiva é comumente

aplicada em relações de desigualdade, objetivando, destarte, uma espécie de

equiparação.

Nessa teoria, portanto, o dever de indenizar não mais encontra

amparo no caráter da conduta do agente causador do dano, mas sim no risco que o

exercício de sua atividade causa a terceiros, em função do proveito econômico daí

resultante.

96 RODRIGUES, Silvio. Direito civil : responsabilidade civil, p.11. 97 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro , p. 111.

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Tal teoria encontra-se no artigo 927 do Código Civil98:.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187), causar dano a outrem, é obrigado a repará-lo.

Parágrafo único: Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Tendo em vista que três são as modalidades de riscos, que

ensejam a aplicação da Responsabilidade objetiva, quais sejam: de empresa,

administrativo e risco-perigo, Noronha99 disserta:

(...) quem exerce profissionalmente uma atividade econômica, organizada para a produção ou distribuição de bens e serviços, deve arcar com todos os ônus resultantes de qualquer evento danoso inerente ao processo produtivo ou distributivo, inclusive os danos causados por empregados e prepostos; que a pessoa jurídica pública responsável, na prossecução do bem comum, por certa atividade, deve assumir a obrigação de indenizar particulares que porventura venham a ser lesados, para que os danos sofridos por estes sejam redistribuídos pela coletividade beneficiada; que quem se beneficia com uma atividade lícita e que seja potencialmente perigosa (para outras pessoas ou para o meio ambiente), deve arcar com eventuais conseqüências danosas.

Assim, depreende-se que a obrigação de indenizar é imposta

por lei a determinadas pessoas, independentemente de terem elas praticado ilícito,

mormente porque certas atividades criam um risco especial para os demais.

Feita a explanação necessária acerca da Responsabilidade

Civil, passa-se ao estudo do Direito do Consumidor.

98 BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002: Código Civil .

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.html>. Acesso em 08/08/2010 99 NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações . São Paulo: Saraiva,

2003. V. 1. p. 486.

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CAPÍTULO 2

O DIREITO DO CONSUMIDOR

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Inicialmente, deve-se frisar que o comércio está presente na

sociedade desde os primórdios, sendo utilizado para suprir as necessidades

encontradas pela humanidade em trocar seus bens. Num primeiro momento, na

forma de escambo, o comércio destinava-se a eliminar os excedentes gerados nas

produções, tendo como caracterísitcas as relações pessoais. Posteriormente,

quando o ser humano passou a dominar as técnicas de cultivo de vegetais e

domesticação de animais, crescendo, assim, a agricultura e a pecuária, as primeiras

cidades foram se desenvolvendo e, concomitantemente, as relações de consumo

também.100

Antes das revoluções industriais e tecnológicas, as relações de

consumo caracterizavam-se como relações interpessoais, nas quais os fornecedores

mantinham contatos diretos com os consumidores. Conforme relata Leite, naquela

época, "as relações de consumo eram singelas e modestas: o consumidor final, por

via de regra, adquiria as mercadorias diretamente do produtor101. Assim, a margem

de vícios e defeitos encontrados nos produtos era mínima, eis que os bens eram

manufaturados de forma quase individualizada para cada consumidor.102

Em um momento posterior, conforme assenta Simão, "o

liberalismo tornou o contrato o mais importante negócio jurídico, conferindo ao

100 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direito do consumidor . 9.

ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 22. 101 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor: os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor. São Paulo: LTr, 2002. p. 25 102 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 25.

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princípio da pacta sunt servanda importância máxima, desconsiderando as

diferenças sociais e econômicas dos contratantes"103.

Ainda esclarece o autor que, no que tange os contratos

estabelecidos entre as partes, estas estavam em posição de igualdade, respeitando-

se a vontade e a livre discussão de cláusulas do instrumento, tendo em vista que a

relação contratual naquela época era bem mais simples que a de hoje104.

Entretanto, o grande avanço das indústrias, que acarretou as

produções em grandes escalas, veio a revolucionar os negócios, tornando essas

relações pluripessoais105.

A partir de então, ante a perda de importância do consumidor

singular e a produção em quantidade como fator determinante do lucro, a existência

de legislação específica de consumo passou a ser necessária, o que se tornou

latente após a Revolução Industrial.

Deveras, a Revolução Industrial foi o grande marco para a

evolução do Direito consumerista, eis que a produção artesanal deu lugar à

produção em série, visando um aumento nas vendas. A partir daí, frise-se, a relação

entre fornecedores e consumidores, antes marcada pela confiança e singularidade

pessoal, passou a ser marcada pela impessoalidade106.

Conjuntamente com alguns institutos típicos da sociedade de

consumo, tais como os contratos massificados, técnicas de publicidade e a larga

utilização de crédito como forma de fomentar o consumo107, o produtor passou a

praticar atos abusivos, conforme leciona Souza108:

103 SIMÃO, José Fernando. Vícios do produto no novo código civil e no

código de defesa do consumidor . São Paulo: Atlas, 2003. p. 25. 104 SIMÃO, José Fernando. Vícios do produto no novo código civil e no

código de defesa do consumidor . p. 25. 105 GAMA, Helio Zaghetto. Curso de direito do consumidor . p. 10. 106 SOUZA, Ulisses César Martins de Souza. Proteção ao consumidor no

comércio eletrônico . Em Evidência: Revista Magister de Direito Empresarial, n. 12, Dez.-Jan./2007, p. 86. 107 SOUZA, Ulisses César Martins de Souza. Proteção ao consumidor no comércio eletrônico, p. 07.

108 SOUZA, Miriam de Almeida. A política do consumidor no direito

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O produtor precisava dar escoamento à produção, praticando, às vezes, atos fraudulentos, enganosos, por isso mesmo, abusivos, A justiça social, então, entendeu ser necessária a promulgação de leis para controlar o produtor-fabricante e proteger o consumidor-comprador.

Isso porque o produtor, via de regra, sempre se interessou

preponderantemente pela parte monetária, ou seja, pelo lucro, do que com a

qualidade do produto e a satisfação do consumidor109.

Em consequência disso, a liberdade de contratar, tão

respeitada antes da industrialização, fora olvidada nessa época. Simão110 sustenta

que, na prática, a parte mais forte passou a exercer sua vontade ante a mais fraca,

que, sob pena de ficar a mercê do bem almejado, era simplesmente obrigada a

contratar, independentemente das condições oferecidas. A liberdade, pois, que era

caracterísitca entre os burgueses, virou uma espécie de opressão, face a relação

jurídica estabelecida entre partes economicamente desiguais.

Diante disso, logo no início do industrialismo, começaram a

surgir pequenas organizações voltadas para os problemas concernentes às relações

de consumo, associando os interesses dos consumidores às conquistas sociais

então vividas, momento em que teve origem o "movimento consumerista",

caracterizado pelas revoltas contra as práticas abusivas dos comerciantes e

fabricantes111.

Nesse passo, uma associação de advogados de Nova York foi

a primeira organização conhecida. Ela objetivava, em suma, proporcionar melhores

condições de trabalho aos empregados do comércio, para que refletisse no

atendimento aos fregueses dos estabelecimentos comerciais.112

comparado , p. 40.

109 SOUZA, Miriam de Almeida. A política do consumidor no direito comparado , p. 48.

110 SIMÃO, José Fernando. Vícios do produto no novo código civil e no código de defesa do consumidor , p. 26.

111 GAMA, Helio Zaghetto. Curso de direito do consumidor , p. 2. 112 GAMA, Helio Zaghetto. Curso de direito do consumidor , p. 10.

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As primeiras idéias de tutelar juridicamente as relações de

consumo surgiram, pois, nos EUA, alavancadas pela amplidão de seu mercado

interno.

Outro marco de grande relevância para a evolução do Direito

do Consumidor foi a Segunda Guerra Mundial, momento em que se intensificou a

produção em massa e surgiu, dentre outras, as idéias de mídia e tecnologia.

Acerca do assunto leciona Souza113:

A guerra intensificou a produção industrial em massa, e contribuiu para as grandes invenções e o aprofundamento da produção em série. Todo o esforço da guerra resultou, inevitavelmente, em aumento substancial de produção no posterior tempo de paz. O know-how gerado para a guerra provocou, então um crescimento em vários segmentos industriais, gerando um arsenal de produtos supérfulos e diversificados, em um mercado antes restrito somente ao essencial. Com o advento da televisão, resultou da propaganda informativa o marketing (desenvolvido em forma de propaganda de guerra), com o objetivo de escoar a produção no mercado. Com isso, aumentaram os problemas relacionados à produção e ao consumo, em face de uma competitividade altamente sofisticada por causa das novas mídias e das próprias complexidades dos mercados surgidos no pós-guerra, e do advento do marketing científico. Passou-se então a praticar uma concorrência desleal, fortalecendo a tendência da formação dos cartéis, trustes e oligopólios, o que sem dúvida, colaborou, dentre outros motivos, para o agravamento dos problemas sociais e conflitivos urbanos em decorrência da concentração de renda.

Assim, as consequências trazidas pela Segunda Guerra

Mundial refletiram diretamente no consumidor, que passou a ter a idéia de que

precisava de objetos que outrora jamais sentiria necessidade de adquirir.

Diante disso e não se olvidando às diversas práticas desleais

perpetradas pelos fornecedores, surgiu, no período pós-guerra, a cláusula rebus sic

stantibus, denominada de "teoria da imprevisão", que enfraqueceu o princípio da

força obrigatória dos contratos e possibilitou o efetivo surgimento do Direito do

Consumidor.

Gomes114 relata:

113 SOUZA, Miriam de Almeida. A política legislativa do consumidor no

direito comparado , p. 54.

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42

O princípio da força obrigatória das convenções, pelo qual o juiz estava obrigado a fazer cumprir os efeitos do contrato, quaisquer que fossem as circunstâncias ou as conseqüências, está abalado. O legislador intervém, a cada instante, na economia dos contratos, ditando medidas que, tendo aplicação imediata, alteram os efeitos dos contratos anteriormente praticados, e vai se admitindo o poder do juiz de adaptar seus efeitos às novas circunstâncias (cláusula rebus sic stantibus ), ou de exonerar o devedor do seu cumprimento, se ocorrer imprevisão. Por fim, desde que os contratos são fonte de obrigações e estas importam limitação da liberdade individual, entendia-se que os seus efeitos não deveriam atingir a terceiros. O contrato era res inter alios acta . Mas as necessidades sociais impuseram a quebra, ainda que excepcional, desse princípio da relatividade dos efeitos do contrato, para a satisfação de certos interesses coletivos privados.

Dessa forma, para disciplinar as relações jurídicas, "foi

necessária a intervenção estatal no direito privado, citando-se, inclusive, em certos

aspectos, verdadeiro dirigismo, o que afetou profundamente a noção privatista de

contrato.115

O Presdente Kennedy foi o primeiro estadista a requerer que

os direitos dos consumidores fossem preservados, consolidando-os116. Segundo

Souza117, Kennedy, em março de 1962, proclamou como objetivos do seu governo

os seguintes direitos consumeristas:

(1) os bens e serviços colocados no mercado devem ser sadios e seguros para o uso, promovidos e apresentados de uma maneira que permita ao consumidor fazer uma escolha satisfatória; (2) que a voz do consumidor seja ouvida no processo de tomada de decisão governamental que detenha o tipo, a qualidade e o preço de bens e serviços colocados no mercado; (3) tenha o consumidor o direito de ser informado sobre as condições e serviços; (4) e ainda o direito a preços justos.

114 GOMES, Orlando. Contratos. 24. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p.

105-106. 115 SIMÃO, José Fernando. Vícios do produto no novo código civil e no

código de defesa do consumidor . p. 26. 116 GAMA, Helio Zagheto. Curso de direito do consumidor , p. 14. 117 SOUZA, Miriam de Almeida. A política legislativa do consumidor no

direito comparado , p. 56.

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43

Saad118 relata que outros países, a medida que atingiram o

grau de industrialização, também regularam, por meio de conjunto de leis, os vários

aspectos das relaçoes de consumo.

Em 1973, na 29ª Sessão, realizada em Genebra, a Comissão

de Direitos Humanos das Nações Unidas reconheceu os princípios e denominou-os

de Direitos Fundamentais do Consumidor, dividindo-os em: proteção da saúde e da

segurança; proteção dos interesses econômicos; reparação dos prejuízos;

informação e educação; representação (direito de ser ouvido)119.

Ressalta a autora que as Nações Unidas, por meio da

Resolução n. 39/248, estabeleceram objetivos, princípios e normas para que os

Estados-membros desenvolvessem ou reforçassem as políticas relativas à proteção

ao consumidor120. Sendo assim, sintetizando a evolução histórica do contrato,

conforme observa Simão121, esta acompanhou as mudanças globais, que clamaram

pela desvinculação definitiva do conceito individual estabelecido no século XIX para

adotar elementos mais justos em suas regras, mormente nas relações jurídicas nas

quais havia hipossufiência de uma das partes.

O autor continua seu raciocínio concluindo que atualmente "a

rapidez dos negócios exigiu a transformação das relações pessoais e jurídicas e, por

isso, o contrato hoje mudou de estilo. Mudou para atender às necessidades. É o

direito que acompanha a realidade”122.

Ou seja, o antigo Estado Liberal, no qual vigia o princípio da

pacta sunt servanda transformou-se, pelos vários fatores suso exposto, em Estado

Social, no qual o Estado passou a intervir nas relações jurídicas em flagrante

desequilíbrio, como no caso das relações de consumo.

118 SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários ao código de defesa do consumidor: lei 8078, de 11/09/90 . 3. ed. São Paulo: LTr, 1998. p. 02.

119 SOUZA, Miriam de Almeida. A política legislativa do consumidor no direito comparado , p. 56.

120 SOUZA, Miriam de Almeida. A política legislativa do consumidor no direito comparado , p. 57.

121 SIMÃO, José Fernando. Vícios do produto no novo código civil e no código de defesa do consumidor . p. 27.

122 SIMÃO, José Fernando. Vícios do produto no novo código civil e no código de defesa do consumidor , p. 27.

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44

No Brasil, somente com a elaboração da Constituição Federal

da República, mais precisamente com o artigo 48 do Ato das Disposições

Constitucionais Transitórias, a Assembléia Nacional Constituinte determinou que o

Congresso Nacional elaborasse o Código de Defesa do Consumidor, com especial

destaque para a contemplação dos direitos fundamentais do consumidor (ao próprio

consumo, à segurança, à escolha, à informação, a ser ouvido, à indenização, à

educação para o consumo e a um meio ambiental saudável)123.

2.2 CONCEITO DE CONSUMIDOR

É de fundamental importância as diversas definições do que

vem a ser consumidor, tuteladas pela Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do

Consumidor).

O artigo 2º desse Diploma Legal traz em seu contexto a

definição de consumidor como sendo "toda pessoa física ou jurídica que adquire ou

utiliza produto ou serviço como destinatário final"124.

O parágrafo único desse artigo dispõe que "equipara-se a

consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja

intervindo nas relações de consumo"125.

Interpretando esse dispositivo legal, Marques126 assenta:

[...] destinatário final é aquele destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. O destinatário final é o consumidor final, o que retira o bem do mercado ao adquirir ou simplesmente utilizá-lo (destinatário final fático), aquele que coloca um fim na cadeia de produção (destinatário final econômico), e não aquele que utiliza o bem para continuar a produzir, pois ele não é o

123 FILOMENO, José Geraldo Britto. Manual de direitos do consumidor , p.

21/22 124 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 15/08/2010.

125 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 15/08/2010.

126 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor : o novo regime das relações contratuais. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 378.

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consumidor final, ele está transformando o bem, utilizando o bem.

Esse conceito, como se vê, abrange a concepção econômica

de consumidor final, limitação esta que nem sempre é acolhida pelo Direito, eis que

outras considerações podem interferir nesse conceito.

Por seu turno, o artigo 17 do Código de Defesa do Consumidor,

equipara "[...] aos consumidores todas as vítimas do evento"127 danoso.

Já o artigo 29 do mesmo Diploma Legal diz que "[...]

equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas

às práticas nele previstas"128.

Para Leite129, esse dispositivo legal "desdobra o conceito de

consumidor para alcançar todas as pessoas, determináveis ou não, expostas às

práticas comerciais ou contratuais abusivas".

Destarte, o conceito de consumidor não se restringe somente

àquele que adquire ou utiliza bens ou serviços, mas também àqueles expostos a tais

práticas. Frise-se que o referido artigo 2º e seu parágrafo único fazem alusão a

pessoas determináveis ou não, enquanto o artigo 29 identifica o consumidor como

aquele que esteja exposto às práticas comerciais.

Filomeno130 entende que:

O conceito de consumidor adotado pelo CDC foi exclusivamente de caráter econômico, ou seja, levando-se em consideração tão somente o personagem que no mercado de consumo adquire bens ou então contrata prestações de serviços, como destinatário final, pressupondo-se que assim age com vistas ao atendimento de uma necessidade própria e não para o desenvolvimento de uma outra

127 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 15/08/2010.

128 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 15/08/2010.

129 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor: os direitos do consumidor e a aplicação do código de d efesa do consumidor , p. 50.

130 FILOMENO, José Geraldo Brito. Código brasileiro de defesa do consumidor : comentado pelos autores do anteprojeto. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p. 25.

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atividade.

Contudo, Almeida131 afirma que consumidor, mesmo sob o

enfoque econômico, abrange não apenas aquele que adquire bens para uso próprio,

mas também aquele que intermedia repasse a outros fornecedores. Assim, conclui

que é inconveniente transplantar a concepção econômica de consumidor para o

campo jurídico.

Pode-se perceber, destarte, que há uma divergência de

entendimentos, consoante expõe Nunes132:

O problema do uso do termo "destinatário final" está relacionado a um caso específico: o daquela pessoa que adquire produto ou serviço como destinatário final, mas que usará tal bem como típico de produção. Por exemplo, o usineiro que compra uma usina para a produção de álcool. Não resta dúvida de que ele será destinatário final do produto (a usina); contudo, pode ser considerado consumidor?

Assim, tendo em vista o embate travado entre os

doutrinadores, calcado, mormente, na interpretação do denominado destinatário final

expresso no artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor, eles se dividem em duas

correntes, a saber:

a) a finalista;

b) a maximalista.

Sobre as correntes, Marques133, ao interpretar o artigo 2º do

Código de Defesa do Consumidor, sintetiza:

A interpretação finalista nada mais é do que uma interpretação conforme a Constituição (princípio constitucional da igualdade e proteção da dignidade e direito fundamental do cidadão à proteção do Estado, como consumidor - art. 5º, caput e inciso XXXII, da CF/88), interpretação conforme a nova ordem econômica constitucional (art. 170 da CF/88) e a importância da identificação do

131 ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor . São

Paulo: Saraiva, 2002. p. 36. 132 NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor . 2. ed.

São Paulo: Saraiva, 2005. p. 76. 133 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do

consumidor , p. 373-374.

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sujeito de direito a tutelar de maneira especial, o consumidor! É interpretação do art. 2º do CDC utilizando todos os métodos clássicos de interpretação: literal, lógico-sistemático e teleológico. A teoria contrária - maximalista - propugna uma interpretação apenas literal da expressão "destinatário final", concluindo que basta ser destinatário final fático do produto ou serviço.

Para uma melhor conceituação de consumidor, pertinente

adentrar no estudo mais detalhado das referidas correntes.

2.2.1 Interpretação Finalista

Conforme exposto alhures, a interpretação finalista restringe a

definição da expressão "destinatário final", constante no artigo 2º do Código de

Defesa do Consumidor, de forma puramente objetiva, entendendo-se como

consumidor o destinatário fático e econômico do produto ou serviço, ou seja, aquele

que retira do mercado, utiliza e consome.

Marques134 define tal corrente da seguinte maneira:

Destinatário final é aquele destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo, segundo esta interpretação teleológica, não basta ser destinatário final fático do produto, retirá-lo da cadeia de produção, levá-lo para o escritório ou residência, é necessário ser o destinatário final e econômico do bem, não adquiri-lo para revenda, não adquiri-lo para uso profissional, pois bem seria novamente um instrumento de produção, cujo preço será incluído no preço final do profissional que o adquiriu. Neste caso, não haveria a exigida "destinação final" do produto ou do serviço.

Para essa corrente, o campo de aplicação do Código de

Defesa do Consumidor é, pois, restrito. Considera-se consumidor final aquele que

adquire o bem ou o serviço para o uso restrito a si próprio ou de sua família, sem

que o utilize como meio para a obtenção de lucro.

Exclui-se os bens e serviços destinados ao desenvolvimento de

uma outra atividade, ou seja: os intermediários, bem como os destinados ao insumo.

Tal fundamento sustenta-se na premissa de que a lei consumerista objetiva amparar

134 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do

consumidor , p. 100.

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a fração mais frágil da sociedade, buscando o equilíbrio nas relações jurídicas,

conforme leciona Miragem135:

A defesa da interpretação finalista parte do pressuposto de que o CDC constitui uma lei especial de proteção do consumidor, logo sua aplicação deve ser estritamente vinculada à finalidade desta lei. Em outros termos, sustenta-se que a lei, uma vez que visa reequilibrar uma relação manifestamente desigual, não pode ser aplicada extensivamente, sob pena de produzir outras desigualdades (proteger quem não tem necessidade ou legitimidade para merecer a proteção).

Destarte, a corrente finalista embasa suas idéias na

conservação do consumidor como parte vulnerável, proporcionando-lhe maior

arrimo, a fim de reequilibrar a relação jurídica desigual. Assim, o consumidor há de

ser o alvo frágil, distinguindo dos casos em que o profissional, imbuído no caráter de

consumidor, reclama benefícios além dos que o direito comercial já lhes

proporciona136.

No mesmo norte, Marques137 assenta:

A interpretação finalista, que defendo, tem sua base na vulnerabilidade (presumida ou comprovada) do sujeito de direitos tutelado e restringe conscientemente a figura do consumidor stricto sensu àquele que adquire (utiliza) um produto para uso próprio e de sua família e permite a equiparação dos arts. 17 e 29 do CDC somente com base em prova de equiparação. Consumidor não seria o profissional, pois o fim do CDC é tutelar de maneira especial um grupo da sociedade que é mais vulnerável.

Daí decorre o caráter de proteção do Código de Defesa do

Consumidor, tendo em vista que, segundo essa corrente deve-se tutelar os

interesses dos mais fracos com a finalidade de concretizar os direitos humanos,

fundamentais e subjetivos e, dessa forma, equilibrar as relações de consumo.

135 MIRAGEM, Bruno Nubens Barbosa. Direito do consumidor . São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2002. p. 18. 136 MARQUES, Cláudia Lima; BENJAMIM, Antonio Herman de Vasconcelos;

MIRAGEM, Bruno Nubens Barbosa. Comentários ao código de defesa do consumidor : arts. 1º a 54º. São Paulo: Saraiva: 2000. p. 84.

137 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor , p. 380.

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2.2.2 Interpretação Maximalista

No que tange a corrente maximalista, esta estabelece um novo

regulamento de mercado do consumidor, extendendo a proteção dada pela lei

consumerista também ao consumidor profissional. Nessa visão, basta que o produto

ou o serviço esteja dentro do mercado de consumo, independentemente da

qualidade daquele que o adquire ou o utiliza138.

Assim, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor é a

mais abrangente possível, em função da sua característica de regulador do mercado

de consumo.

É o que ensina Marques139:

A definição do CDC deve ser interpretada o mais extensivamente possível, segundo esta corrente, para que as normas do CDC possam ser aplicadas a um número cada vez maior de relações de mercado. Consideram que a definição do art. 2º é puramente objetiva, não importando se a pessoa física ou jurídica tem ou não fim de lucro quando adquire um produto ou utiliza um serviço.

Lisboa, aduzindo o princípio da não intervenção entre os

Poderes, defende tal corrente sob a ótica de que não cabe ao intérprete estabelecer

distinções onde o legislador não o fez, pois, assim agindo, estar-se-ia subvertendo a

estrutura do sistema, transformando o aplicador da lei em legislador140.

Destarte, levando-se em conta que o legislador não fez

qualquer ressalva com relação à pessoa do consumidor no artigo 2º do Código de

Defesa do Consumidor, presume-se que qualquer um que se enquadre no conceito

poderá arguir esse Diploma Legal a seu favor. Ademais, acrescenta-se ainda que

inexiste qualquer dispositivo que delimite a extensão da expressão destinatário final,

especialmente de caráter econômico. Destinatário final é, portanto, segundo a

138 MIRAGEM, Bruno Nubens Barbosa. Direito do consumidor , p. 19-23. 139 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do

consumidor , p. 67-69. 140 LISBOA, Roberto Senise. Contratos difusos e coletivos. 2. ed. São

Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 300/301.

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corrente maximalista, o destinatário fático do produto ou do serviço,

independentemente da sua destinação141.

Nessa senda, Miragem142 exemplifica:

Segundo esta visão, serão consumidores as empresas que adquirem automóveis ou computadores para a realização de suas atividades, o agricultor que adquire adubo para o preparo do plantio, ou a empresa que contrata serviço de transporte de pedras preciosas ou de cartão de crédito.

Não obstante os fundamentos que sustentam a corrente

maximalista, esta é alvo de críticas e discordância, senão veja-se:

Dizer-se, como querem os assim denominados pela autora retrocitada 'maximalistas', que se aplica o Código, sem qualquer distinção, às pessoas jurídicas, ainda que fornecedoras de bens e serviços, seria negar-se a própria epistemologia do microssistema jurídico do que se reveste.143

Contudo, na prática forense, a teoria maximalista é a

predominante, conforme se depreende da jusrisprudência do Tribunal de Justiça de

Santa Catarina:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE LOCAÇÃO DE FOTOCOPIADORAS FIRMADO ENTRE PESSOAS JURÍDICAS. APLICAÇÃO DO CDC. TEORIA MAXIMALISTA. CONSUMIDOR COMO DESTINATÁRIO FINAL DO PRODUTO. TESE MAJORITÁRIA NESTE TRIBUNAL. [...]

Para a teoria maximalista, basta que o consumidor seja o "destinatário final" dos produtos ou serviços (CDC, art. 2º), incluindo-se aí não apenas aquilo que é adquirido ou utilizado para uso pessoal, familiar ou doméstico, como também o que é adquirido para o desempenho de atividade ou profissão, bastando, para tanto, que não haja finalidade de revenda. "À luz da teoria maximalista, predominantemente aplicada por este egrégio Tribunal de Justiça, basta que a pessoa física ou jurídica enquadre-se no conceito de destinatário final fático do produto ou serviço adquirido para que sejam aplicadas as disposições constantes no CDC". (TJSC. Agravo de Instrumento n. 2007.011000-3, de Curitibanos. Relatora: Desa.

141 GOMES, Rogério Zuel. Teoria contratual contemporânea: função social

do contrato e boa-fé. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 107/108. 142 MIRAGEM, Bruno Nubens Barbosa. Direito do consumidor, p. 88. 143 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código brasileiro de defesa do

consumidor . 6. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 31.

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SALETE SILVA SOMMARIVA. Decisao em 05/06/2007). [...]144

Por fim, saliente-se que o conceito de consumidor é de suma

importância para o enquandramento jurídico, eis que somente aquele que tenha

essa situação jurídica estará amparado pelo Código de Defesa do Consumidor.

2.3 DESDOBRAMENTOS LEGAIS DO CONCEITO DE CONSUMIDOR

Diante da fundamentação exposta, mormente compulsando os

dispositivos legais supratranscritos, conclui-se que consumidor é toda a pessoa

física ou jurídica que adquire ou utiliza produtos ou serviços como destinatária final

em uma relação de consumo ou em função dela.

Ainda, equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas,

determináveis ou não, todas as vítimas de evento expostas às relações de consumo,

previstas nos artigos 17 e 29 do Código de Defesa do Consumidor.

Assim, quem quer que seja exposto, ainda que de modo

indeterminado, nas relações de consumo, é equiparado a consumidor e, por

conseguinte, recebe a proteção a este dispensada. Se um sujeito compra, por

exemplo, uma pasta de dentes que é utilizada por vários estudantes, moradores de

uma mesma república, e tal pasta causa uma séria inflamação nas gengivas dos

usuários, todos os que a utilizaram são consumidores, mesmo que não tenham

firmado contrato de consumo (comprado a pasta).145

Acerca do consumidor coletividade, leciona Leite146:

As coletividades de pessoas indetermináveis, também protegidas pela lei, são aqueles grupos em relação aos quais não é possível identificar e particularizar os riscos ou prejuízos a que cada um ficou exposto em razão da imperfeição de produtos ou serviços. Por exemplo, não se pode individualizar as pessoas que ficaram

144 BRASIL, Tribunal de Justiça de Santa Catarina . Apelação Cível n.

2004.005718-0. Julgada em 14/03/2008. Disponível em <http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia> acesso em 17/08/2010.

145 GUIMARÃES, Henrique. Saiba quando você é um consumidor e direito . 2009. Disponível em: <http://www.bahiaja.com.br/noticia.php?idNoticia=15293#_ftn1>. Acesso em: 17/08/2010.

146 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor. p. 51.

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expostas aos riscos gerados por um medicamento defeituoso colocado no mercado nacional.

É o mesmo caso daquele que ganha um produto ou um serviço

como presente, conforme assinala Leite147:

Além da pessoa que efetua diretamente a aquisição do produto ou serviço, também é consumidor aquele que recebe o produto ou serviço como presente. Dessa forma, alguém que receba uma geladeira de presente de casamento pode, ele mesmo, exigir do fabricante ou importador - e, se for o caso, do comerciante - que responda por vícios ou defeitos do produto.

Na hipótese de determinado dano, causado por vício ou defeito

na qualidade de bens ou serviços, além de atingir o próprio consumidor, afetar

terceiro alheio à própria relação jurídica de consumo, este é equiparado àquele,

consoante dispõe o artigo 17 do Código de Defesa do Consumidor, e tem seus

direitos e interesses tutelados por esse Diploma Legal.

O artigo 29 dessa mesma Lei, como anteriormente exposto,

igualmente equipara outro grupo de sujeitos aos consumidores, independentemente

de serem ou não destinatários finais do bem ou serviço.

Em última análise, vislumbra-se que o objetivo do dispositivo

legal parece ser o de buscar a máxima efetividade aos dispositivos do Código de

Defesa do Consumidor, sendo que a violação de uma de suas normas poderá

autorizar qualquer pessoa exposta a essa violação, ainda que não tenha diretamente

participado da relação de consumo, a arguir a sua aplicação.148

2.4 DIREITOS DO CONSUMIDOR E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Oportuno frisar, primeiramente, que os direitos do consumidor

estão contidos no Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078/90, editado em

razão de determinação constitucional (artigo 48 do Ato das Disposições

147 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor. p. 50. 148 NUNES JUNIOR, Vidal Serrano; SERRANO, Yolanda Alves Pinto.

Código de defesa do consumidor interpretado , São Paulo: Saraiva, 2003. p. 103.

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Constitucionais Transitórias da Contituição Federal149). Esse Diploma Legal, além de

regular as relações consumeristas, compõe-se de princípios constitucionais

fundamentais, prevalecendo diante dos demais sistemas reguladores, com exceção

da própria Carta Política.

Nessa esteira de pensamento, Nunes150 disserta:

Não será possível interpretar adequadamente a legislação consumerista se não se tiver em mente esse fato de que ela comporta um subsistema no ordenamento jurídico, que prevalece sobre os demais - exceto, claro, o próprio sistema da Constituição, como de resto qualquer norma jurídica de hierarquia inferior -, sendo aplicável às outras normas de forma supletiva e complementar.

Isso se dá também porque, "o interesse dos consumidores em

geral penetra em quase tudo: o direito à saúde, à previdência, à assistência social, à

educação [...]."151

Seguindo essa linha de pensamento, Lucca152 assevera que

"não apenas o Código de Defesa do Consumidor tem por base constitucional (Art. 48

do ADCT) como, mais amplamente, todo princípio da proteção acha-se

constitucionalmente assegurado".

Assim, tem-se que o Código de Defesa do Consumidor está

fortemente ligado à Constituição Federal e, por ser baseado em princípios

fundamentais, é aplicável a qualquer relação de consumo, mesmo que haja

regramento em outra norma jurídica infraconstitucional.

Pelo fato de ser norteado pelos referidos princípio, diz-se que o

Código de Defesa do Consumidor é uma lei principiológica. Deveras, seu caráter

principiológico assenta-se na concretização de princípios e garantias constitucionais,

razão pela qual sua essência não pode ser alterada.

149 "Art. 48 O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da

promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do consumidor". 150 NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor . 2. ed.

São Paulo: Saraiva, 2005. p. 65. 151 LUCCA, Newton de. Direito do consumidor . Aspectos práticos:

perguntas e respostas. 2. ed. São Paulo: Edipro, 2000. p. 22/23. 152 LUCCA, Newton de. Direito do consumidor , p. 34.

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Nesse norte, Nunes153 ressalta que a lei consumerista torna

explícitos, para a relação de consumo, os comandos constitucionais, em especial os

princípios fundamentais da República, que norteiam todo o regime constitucional e

os direitos e garantias fundamentais.

As normas consumeristas, portanto, transportam explicitamente

os comandos constitucionais para a seara das relações de consumo.

Dando embasamento a tal assertiva, Nunes154 ensina que:

À frente de todos está o superprincípio da dignidade da pessoa humana (CF, art, 1º, III), como especial luz a imantar todos os demais princípios e normas constitucionais e apresentando-se a estes como limite intransponível e, claro, a toda e qualquer norma de hierarquia inferior.

A seguir, no texto constitucional estão os demais princípios e garantias constitucionais que são reconhecidos no CDC e que aqui relembramos: o princípio da igualdade (CF, art. 5º, caput, e inciso I); a garantia da imagem, da honra, da privacidade, da intimidade, da propriedade e da indenização por violação a tais direitos de modo material e também por dano moral (CF, art. 5º, V c/c os incisos X e XXII); ligado à dignidade e demais garantias está o piso vital insculpido como o direito à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à segurança, à previdência social, à maternidade etc. (CF, art. 6º); e unidos a todos esses direitos está o da prestação de serviços públicos essenciais com eficiência, publicidade, impessoalidade e moralidade (CF, art. 37, caput).

Feita a relação entre os princípios constitucionais e os direitos

consumerista, importante consolidar que estes são, conforme revela Leite155,

classificados em cinco categorias, quais sejam: "a) direito à saúde e à segurança; b)

direito à proteção econômica; c) direito à informação e à educação; d) direito à

representação; e) direito à reparação de danos".

Discorrendo acerca dessas categorias de direitos fundamentais

do Consumidor, o autor supracitado afirma que, no que tange a saúde e a

segurança, estas se configuram na proibição de colocar no mercado de consumo

153 NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor , p. 66. 154 NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor , p. 66. 155 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 112.

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"produtos e serviços perigosos, exceto aqueles naturalmente perigosos, como

agrotóxicos, fogos de artifício, serviços de vigilância e seguranla, demolição de

edifícios"156.

O direito à proteção econômica, por sua vez, atrela-se

mormente ao acesso ao consumo, à liberdade de escolha e à validade das cláusulas

do contratuais.157

E, como remédio às cláusulas contratuais indigitadas abusivas,

o artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor estipula que são elas nulas de

pleno direito, ainda que o consumidor tenha aceitado.

De outra monta, no que cerne o direito à informação e à

educação, estes estão expressos no artigo 6º, incisos III e IV do Código de Defesa

do Consumidor, que estabelecem:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

[...]

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;158

Com relação ao direito à representação, Leite159 aduz que ele

"decorre do princípio democrático e consiste no direito de ser ouvido e de participar

das decisões relativas aos seus interesses".

156 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 113. 157 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 113. 158 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 26/08/2010.

159 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

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E, por fim, no que diz respeito ao direito à reparação do dano, o

artigo 6º, inciso VI, do Código de Defesa do Consumidor dispõe que é direito básico

do consumidor "a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais,

individuais, coletivos e difusos"160.

Feitas as considerações pertinentes acerca do consumidor e

seus direitos, passa-se, então, à definição do que vem a ser fornecedor no âmbito

consumerista.

2.5 CONCEITO DE FORNECEDOR

Nos termos do caput do artigo 3º do Código de Defesa do

Consumidor, fornecedor é:

Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.161

Da leitura desse dispositivo legal, depreende-se que o conceito

de fornecedor possui a maior abrangência possível. Isso se dá, segundo Leite162,

com o desiderato de fixar a responsabilidade solidária de todos os co-responsáveis

por eventuais vícios ou defeitos dos produtos e serviços.

Observa-se, então, a preocupação do legislador em ampliar ao

máximo possível o rol de possibilidades e contornos que pode assumir aquele que

coloca no mercado, em razão de sua atividade econômica, produtos ou serviços,

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor. p. 120.

160 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 26/08/2010.

161 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 26/08/2010.

162 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor. p. 43.

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disponibilizando-os para aquisição e utilização, ou até mesmo expondo-os de

alguma forma.163

Assim sendo, Simão164 complementa:

Assim, independentemente da qualidade do que presta o serviço - profissional ou não -, havendo remuneração e habitualidade, o Còdigo de Defesa do Consumidor considera-o fornecedor e a relação, de consumo. A intenção do legislador foi, certamente, possibilitar a inclusão do maior número possível de prestadores de serviços no conceito de fornecedores, os quais, portanto, terão suas relações reguladas pelo Código de Defesa do Consumidor.

Percebe-se, pois, que qualquer pessoa, física ou jurídica, que

forneça produto ou serviço habitualmente é considerada fornecedor perante o

Código Consumerista.

Contudo, não obstante a refalada amplitude no conceito de

fornecedor, tendo em vista que o seu critério caracterizador consiste no

desenvolvimento de atividade tipicamente profissional, aliado à uma certa

habitualidade, deve-se excluir das aplicações das normas constantes no Código de

Defesa do Consumidor os contratos firmados entre dois consumidores, não-

profissionais.165

Isso porque, nas relaçoes de consumo, pressupõe-se uma

desigualdade entre as partes.

A título de ilustração, Leite166 explica que "não se considera

fornecedor o não-profissional que pratica ato de venda ocasional de objeto de sua

propriedade, como, por exemplo, um veículo usado".

Dessa forma, carecendo a figura do fornecedor, não há que se

falar em relação de consumo e, por conseguinte, em aplicação da legislação

163 NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. Código de defesa do consumidor

interpretado , p. 103/104. 164 SIMÃO, José Fernando. Vícios do produto no novo código civil e no

código de defesa do consumidor , p. 38. 165 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do

consumidor : o novo regime das relações contratuais, p. 393. 166 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 44.

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consumerista. Inexistindo algum dos sujeitos da relação de consumo, a situação

deve ser regulada pelo direito civil comum.

Passa-se agora, por derradeiro, a tecer breves comentários

relativos a algumas espécies de fornecedores.

2.5.1 Pessoa Física

No que tange a pessoa física, Nunes167 aduz que "tem-se, em

primeiro lugar, a figura do profissional liberal como prestador de serviços [...]".

Olvidando-se ao profissiona liberal, assunto que será tratado

em tópico próprio, o autor menciona outra situação que identifica a pessoa física

como fornecedor:

É aquela em que desenvolva atividade eventual ou rotineira de venda de produtos, sem ter-se estabelecido como pessoa jurídica. Por exemplo, o estudante que, para pagar a mensalidade da escola, compra jóias para revender entre os colegas ou o cidadão que compra e vende automóveis - um na seqüência do outro - para aferir lucro.168

Destarte, conclui-se que a habitualidade é o principal requisito

para que a pessoa física seja considerada fornecedor perante a legislação

consumerista, mesmo que não tenha ela se estabelecido como pessoa jurídica.

Assim, desenvolvendo sucessivamente atividade econômica,

tanto vendendo produtos quanto prestando serviços, a pessoa física está adstrita às

disposições constantes no Código de Defesa do Consumidor.

2.5.2 Ente Despersonalizado

O artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor prevê

expressamente que o ente despersonalizado é considerado fornecedor para seus

efeitos.

167 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do

consumidor , p. 112. 168 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do

consumidor , p. 112.

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Dessa forma, Leite169 arremata que institutos como "massa

falida, o espólio, o condomínio e família (...)" são classificados como fornecedores,

devendo responder como tal diante da legislação consumerista.

Fundamentando a razão pela qual o Código adotou tal postura,

mais especificamente no tocante à massa falida, Nunes170 afirma que "apesar de

uma pessoa jurídica falir, existirão no mercado produtos e, eventualmente,

resultados dos serviços que ela ofereceu e efetivou, e que continuarão sob a

proteção da lei consumerista".

Dessa forma, os produtos e serviços provenientes de entidades

sem personalidade jurídica permanecem sob a égide da proteção dada pelo Código

de Defesa do Consumidor.

2.5.3 Profissionais Liberais

Conforme assenta Leite171, "os profissionais liberais, tais como

o médico, advogado, engenheiro, contador e outros, também respondem como

fornecedores pelos serviços prestados".

Kriger Filho172 conceitua profissional liberal da seguinte forma:

Há uma primeira colocação que advém do adjetivo liberal. É toda profissão cujo exercício se da por conta e risco próprios. Na pureza da expressão, profissional liberal é quem não mantém vínculo de emprego subordinado a terceira pessoa em relação a atividade que presta. O que se está acentuando é que a atividade que presta como profissional liberal é por conta própria, sem qualquer vínculo de subordinação com outrem. Entretanto, nem tudo que tem autonomia na prestação de serviço é profissional liberal. Um reparador de rede residencial que trabalha por conta própria, sem relação empregatícia, é um autônomo, mas não um profissional liberal. Este se configura se, além da autonomia, o conteúdo de serviço executado depende de conhecimento científico alcançados numa universidade, com

169 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor. p. 44. 170 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do

consumidor , p. 111. 171 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor. p. 46. 172 KRIGER FILHO, Domingos Afonso. A responsabilidade civil e penal

no código de proteção e defesa do consumidor. 2. ed. Porto Alegre: Síntese, 2000. p. 71.

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concessão de habilitação.

Portanto, percebe-se que o profissional liberal é espécie do

gênero profissional autônomo, eis que, além de prestar serviços por conta própria,

deve ele possuir concessão de habilitação para tanto, além de conhecimento

científico adquirido numa universidade.

Ademais, conforme ensina Nunes173, além da autonomia

profissional, o profissional liberal tem como características a prestação do serviço de

forma pessoal, ao menos nos aspectos mais relevantes, e elaboração de suas

próprias regras concernentes ao atendimento profissional, que deve respeitar as leis

e, especialmente, a legislação da sua categoria profissional.

Imperioso ressaltar, por conseguinte, que o profissional liberal

também responde como fornecedor perante a lei consumerista pelos serviços

prestados. Entretanto, há relevantes peculiaridades no que tange a sua

Responsabilidade Civil, conforme será abordado no Capítulo subsequente.

2.6 CONCEITO DE PRODUTO E SERVIÇO

O §1º do artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor

conceitua o produto como sendo "qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou

imaterial"174.

Considerando essa definição trazida pelo Código de Defesa do

Consumidor, Gama175 assevera que "(...) tudo o que seja suscetível de uma

valoração econômica é um produto."

Assim, além dos bens materiais, são produtos também os

imateriais, ou seja, os "direitos autorais sobre obras intelectuais, direito hereditários,

usufruto e outros bens incorpóreos"176.

173 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor: com

exercícios, p. 337. 174 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 20/08/2010.

175 GAMA, Helio Zaghetto. Curso de direito do consumidor . Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 39.

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O conceito de serviço está expresso no §2º do artigo 3º do

Código de Defesa do Consumidor, que define-o como sendo "qualquer atividade

fornecida no mercado de consumo mediante remuneração, inclusive as de natureza

bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de

caráter trabalhista"177.

Para Saad*, serviço "é, enfim, uma atividade humana que, na

ótica do CDC, exerce-se sem vínculo empregatício e, de conseguinte, com

autonomia, mas sempre remunerada, pois o serviço gratuito escapa à

regulamentação legal"178.

Assim, pode-se dizer que o serviço, atividade que decorre de

uma ação humana, não se configura, para efeitos consumeristas, quando não

remunerado, bem como quando prestado no âmbito do contrato de trabalho.

Entretanto, em que pese o serviço constituir atividade exercida

com certa repetição e sempre em caráter remunerado, Gama179 revela que

determinadas atividades gratuitas, fornecidas graciosamente no bojo das demais

ofertas de bens e serviços, não deixam de ser consideradas serviço remunerado,

haja vista que há sempre embutido um interesse negocial.

No mesmo sentido, discorre Nunes180:

[...] consigne que praticamente nada é gratuito no mercado de consumo. Tudo tem, na pior das hipóteses, um custo, e este acaba, direta ou indiretamente, sendo repassado ao consumidor. Assim, se, por exemplo, um restaurante não cobra pelo cafezinho, por certo seu custo já está embutido no preço cobrado pelos demais produtos. Logo, quando a lei fala em ‘remuneração’ não está necessariamente se referindo a preço ou preço cobrado. Deve-se entender o aspecto ‘remuneração’ no sentido estrito de absolutamente qualquer tipo de

176 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 52. 177 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 20/08/2010.

178 SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor . Lei 8.078 de 11.09.90. 7. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 83-84.

179 GAMA, Helio Zaghetto. Curso de direito do consumidor , p. 39-40. 180 NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Comentários ao Código de Defesa do

Consumidor , p.100.

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cobrança ou repasse, direto ou indireto.

Vê-se, pois, que até mesmo um produto ou serviço oferecido, à

primeira vista, sem custos pelo fornecedor, pode ensejar a caracterização da relação

de consumo, uma vez que a remuneração de que trata o artigo 3º, §2º, do Código

Consumerista comporta ampla interpretação, podendo ser qualquer cobrança ou

repasse, direto ou indireto.

De outra monta, no que cerne a terceirização estabelecida em

contrato de prestação de serviço, pode-se afirmar que "o primeiro fornecedor

permanece responsável, perante o consumidor, pela perfeita execução do serviço

contratado"181.

Dessa forma, tratando-se de terceirização de serviço, o

fornecedor que firmou o contrato com o consumidor é o responsável pela execução

do serviço contratado.

Nota-se, ainda, que o Código de Defesa do Consumidor dispõe

acerca, além dos serviços privados, também dos públicos, tema que será ora

abordado, tendo em vista as ressalvas a serem feitas.

2.6.1 Serviços Públicos

Primeiramente, serviço público é, segundo Meirelles182, aquele

"prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles

estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou

simples conveniências do Estado."

E, com efeito, o Código de Defesa do Consumidor engloba tais

serviços. Pode-se perceber a intenção do legislador quando, no artigo 3º, diz que

pessoa jurídica pública pode ser fornecedor, bem como quando, no artigo 22, refere-

se às atividades oferecidas pelos órgãos públicos diretamente ou de forma indireta,

181 SAAD, Eduardo Gabriel; SAAD, José Eduardo Duarte; BRANCO, Ana

Maria Saad C.. Comentários ao código de defesa do consumidor e sua jurisprudência anotada : Lei 8.078, de 1990. p. 90.

182 MEIRELLES, Hely Lopes. Curso de direito administrativo . 19ª ed. São Paulo: Editora Malheiros, 1994. p. 294.

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por meio de suas empresas públicas ou de economia mista, das concessionárias e

permissionárias, bem como de qualquer outra forma de empreendimento.

Entretanto, o conceito de serviço trazido pelo artigo 3º, §2º, do

Código Consumerista, gera sérias dúvidas sobre a matéria, de modo que a doutrina

se divide em duas correntes. A controvésia cinge-se acerca da aplicabilidade do

Código de Defesa do Consumidor em face dos serviços públicos uti universi.

Por oportuno, consoante define Meirelles183, os serviços

públicos uti universi são aqueles prestados a usuários indeterminados, atendendo a

coletividade no seu todo, possuindo natureza indivisível e mantidos, em regra, por

tributos em geral. Já os serviços públicos uti singuli, cuja incidência da legislação

consumerista é certa, caracterizam-se pela destinação a usuários determinados,

sendo mensurável a sua utilização ou seu consumo individual, como, por exemplo,

telefonia, água e energia eletrica, que são remunerados por meio de tarifa.

Benjamin e Oliveira184, bem como Nunes185, entendem que

todos os serviços públicos podem ser regidos pelo Código Consumerista, não

fazendo distinções em relação a prestações uti singuli e uti universi. Sustentam que

todos os serviços públicos devem ser compreendidos sem ressalvas com relação

aos serviços privados. Fundamentam o posicionamento nos conceitos de fornecedor

e consumidor previstos nos artigos 2º e 3º do Diploma Legal, concluindo que o não

pagamento direto e imediato não enseja o afastamento da incidência da norma.

Divergindo desse posicionamento, Filomeno186 discorre:

E, efetivamente, fala o § 2º do art. 3º do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor em "serviço" como sendo "qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, (...)". Importante salientar-se, desde logo, que aí não se inserem os "tributos", em geral, ou "taxas" e "contribuições de melhoria",

183 MEIRELLES, Hely Lopes. Curso de direito administrativo , p. 295. 184 BENJAMIN, Antonio Herman de Vasconcelos e. In: OLIVEIRA, Juarez de

(Coord.) Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor . São Paulo: Saraiva, 2003, p. 110-111.

185 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do consumidor , p. 102.

186 GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor : comentado pelos autores do anteprojeto. 7.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 44.

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especialmente, que se inserem no âmbito das relações de natureza tributária. Não há que se confundir, por outro lado, referidos tributos com as "tarifas", estas, sim, inseridas no contexto dos "serviços" ou, mais particularmente, "preço público", pelos serviços prestados diretamente pelo Poder Público, ou então mediante sua concessão ou permissão pela iniciativa privada. O que se pretende dizer é que o "contribuinte" não se confunde com o "consumidor", já que no primeiro caso o que subsiste é uma relação de Direito Tributário, inserida a prestação de serviços públicos, genérica e universalmente considerada, na atividade precípua do Estado, ou seja, a persecução do bem comum.

Assim, o autor acima citado relembra que, considerando a

definição do art. 3º, §2º do Código, somente aos serviços pagos aplica-se as normas

consumeristas. Em consequência disso, os serviços públicos uti universi - aqueles

prestados a todos os cidadãos, arrecadados por tributos - ficam excluídos da

aplicação do Código de Defesa do Consumidor, mormente porque não há uma

correspondência entre o que foi arrecadado e o custo do serviço.

No mesmo diapasão, para Marques187, somente os serviços

públicos uti singuli, como o fornecimento de água, energia elétrica, gás, telefonia,

transportes públicos, financiamento, construção de moradias populares etc, é

abarcado pelo pelo Código Consumerista, estando adstritos às suas regras.

A jurisprudência, por sua vez, inclina-se a favor dessa segunda

corrente, que entende a ineplicabilidade das regras consumeristas aos prestadores

de serviços uti universi, senão veja-se:

ADMINISTRATIVO - AGRAVO DE INSTRUMENTO - CDC - SERVIÇO UTI UNIVERSI - INAPLICABILIDADE

- Os serviços "uti universi" - prestados a todos os cidadãos por meio de recursos arrecadados através de impostos - encontram-se excluídos da órbita do Código de Defesa do Consumidor, ante a ausência de remuneração em benefício do Estado. [...]188

187 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do

Consumidor : o novo regime das relações contratuais, p. 486-487. 188 BRASIL, Tribunal de Justiça de Minas Gerais . Agravo de Instrumento

n. 1.0686.08.229095-4/001, de Teófilo Otôni. Relator Manuel Saramago. Julgado em 01/10/2009. Disponível em <http://www.tjmg.jus.br/juridico/jt_/> acesso em 30/08/2010.

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Assim, predomina o entendimento de que, nos termos do §2º

do artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor, somente os serviços públicos uti

singuli são protegidos pela lei consumerista.

2.7 RELAÇÃO DE CONSUMO

Para melhor elucidação do tema, pertine dividir o termo,

explicando cada uma das suas partes.

Inicialmente, para Leite189, relação "provem do latim relation,

onis, 'ação de dar em retorno, ato de pagar um favor com outro favor', o qual deriva

do verbo latino referre, 'restituir, repor, trazer de novo, reproduzir, repetir'".

Por seu turno, com relação à palavra consumo, o autor afirma

que ela provém do verbo latino consumere, 'comer, consumir, gastar', o qual deriva

do latim sumere, 'tomar'. Mais adiante, em sentido genérico, ele conceitua consumo

como sendo "todo ato ou processo humano de utilização de bens e serviços

econômicos destinados à satisfação direta de necessidade ou desejo.190"

Dessa forma, Leite191 entende que relação de consumo é:

[...] uma relação de cooperação, pois um cidadão entra com o bem ou serviço e o outro oferece em troca o pagamento do preço; ambos colaboram assim para o sucesso do objetivo comum, que é a transferência do domínio do bem ou a execução dos serviços".

Martins, analisando essa relação, mais precisamente as partes

participantes, define-a como o "vínculo jurídico por meio do qual uma pessoa física

ou jurídica, denominada consumidor, adquire ou utiliza produto ou serviço de uma

outra pessoa denominada fornecedor"192.

189 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 54. 190 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 53. 191 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 53. 192 MARTINS, Plínio Lacerda. O abuso nas relações de consumo e o

princípio da boa-fé . Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 16.

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Na relação de consumo pressupõe-se, pois, a existência, de

um lado, do fornecedor e, de outro, do consumidor, sendo, assim, uma relação

bilateral.

Almeida193 corrobora com essa afirmação, sustentando que, de

fato, as relações de consumo são:

(...) bilaterais, pressupondo numa ponta o fornecedor - que pode tornar forma de fabricante, produtor, importador, comerciante e prestador de serviço - aquele que se dispõe a fornecer bens e serviços a terceiros, e, na outra ponta, o consumidor, aquele subordinado às condições e interesses impostos pelo titular dos bens ou serviços, no atendimento de suas necessidades de consumo.

Diante da evolução e das transformações nas relações de

consumo, consoante anteriormente exposto, o consumidor passou a ser a parte

mais fragilizada e o fornecedor a parte mais forte, razão pela qual a regulamentação

dessa relação jurídica pelo direito é o objeto principal ocupante do Código de Defesa

do Consumidor.194

Isso porque essa relação de consumo pode se transformar em

uma relação de concorrência, conforme ressalta Leite195:

Pode, no entanto, a relação de consumo transformar-se numa relação de concorrência se o consumidor constatar, por exemplo, que o bem recebido está em desacordo com as expectativas do negócio realizado entre as partes e o fornecedor se recuse a reparar o problema. Eles passam assim a buscar objetivos distintos: um quer desfazer o negócio, o outro quer mantê-lo.

Essa transformação da relação de consumo em relação de

concorrência, diante da hipossuficiência e vulnerabilidade que assola o consumidor,

se dá, em grande parte das vezes, por haver defeito ou vício no produto ou no

serviço, cuja diferenciação passa-se a expor no presente momento.

193 ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor . São

Paulo: Saraiva, 2002. p. 1. 194 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 55. 195 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 55.

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2.8 VÍCIO E DEFEITO DO SERVIÇO OU DO PRODUTO

Ressalta-se, inicialmente, que, na esfera do Direito do

Consumidor, vício e defeito não possuem o mesmo significado. Com efeito, o

primeiro reduz o produto à imprestabilidade ou à redução de seu valor, enquanto o

segundo não proporciona a segurança que dele se espera.

Com o desiderato de melhor compreender o tema, necessário

se faz discorrer mais profundamente sobre cada um dos institutos, o que se passa a

fazer.

2.8.1 Vício do Serviço ou do Produto

O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 20, trata da

responsabilidade do fornecedor pelos vícios, esboçando uma conceituação:

Art. 20 O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha

[…]

§ 2° São impróprios os serviços que se mostrem inad equados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade.196

Tem-se, assim, que a existência do vício pressupõe uma

inquinação na qualidade ou na quantidade dos produtos ou serviços, provocando

dano à própria coisa. Não há que se falar, portanto, em exteriorização a ponto de

causar dano à saúde ou à segurança do consumidor. A desconformidade que ocorre

no vício compromete apenas a prestabilidade ou servibilidade do próprio produto ou

serviço.197

196 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 20/08/2010.

197 SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho. Código de defesa do consumidor anotado e legislação complementar . 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 87.

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68

No mesmo norte, Leite198 conceitua vício, no âmbito

consumerista, como sendo "as imperfeições que tornam o produto (art. 18) ou

serviços (art. 20) impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam [...]”.

Nunes199 ressalta que "são considerados vícios as

características de qualidade ou quantidade que tornem os produtos ou serviços

impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam e também que lhes

diminuam o valor".

Percebe-se, pois, que vícios são imperfeições concernentes à

qualidade ou quantidade dos produtos ou serviços, que tornam-os impróprios ou

inadequados para o fim que se destinam, ou até mesmo diminuam os seus valores.

O produto impróprio é, por seu turno, "uma mera conseqüência

da conformidade material ou formal (informativa), quer seja ela localizada na

segurança, quer na adequação ou quantidade do produto ou serviço colocados no

mercado"200.

Exemplificando as impropriedades dos produtos ou serviços, o

autor elenca:

a) produtos com prazo de validade vencido, caso em que a impropriedade é formal, alheia ao seu conteúdo; b) produtos deteriorados, que têm sua qualidade ou condição primitiva modificada por causas naturais, somente indiretamente ligadas ao comportamento humano (má-conservação); c) produtos alterados, que têm a sua condição e qualidade primitivas alteradas por intervenção humana direta, intervenção esta não comunicada ao consumidor; d) produtos corrompidos ou adulterados, que são produtos modificados para pior em sua essência, por ação humama direta; e) produtos falsificados, que são produtos modificados com aparência genuína; f) produtos avariados, que não se prestam a cumprir, por completo, sua destinação mercadológica, seja por apresentarem alguma falha interna, seja por estarem em mau estado; g) produtos portadores de vícios de qualidade por segurança, nocivos à saúde e vida humana; h) produtos em desacordo com as

198LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 139. 199 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do

consumidor , p. 182. 200 KRIGER FILHO, Domingos Afonso. A responsabilidade civil e penal

no código de defesa do consumidor , p. 79.

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69

normas regulamentares.201

Os vícios podem, ainda, ser divididos em aparentes e ocultos.

Nunes202 faz a devida distinção:

Os aparentes ou de fácil constatação, como o próprio nome diz, são aqueles que aparecem no singelo uso e consumo do produto (ou serviço). Ocultos são aqueles que só aparecem algum ou muito tempo após o uso que, por estarem inacessíveis ao consumidor, não podem ser detectados na utilização ordinária.

Portanto, os vícios ocultos, chamados também de redibitórios,

são aqueles que não são possíveis de se identificar prontamente, requerendo certo

tempo ou análise de uma pessoa especializada para a sua constatação. Os vícios

ocultos desnaturam, depreciam, ou até mesmo desvalorizam de tal forma a coisa,

considerando as finalidades a que se destina, que, caso fossem conhecidos antes, o

contrato não seria celebrado.

Já os vícios aparentes ou de fácil constatação, como o nome já

diz, são aqueles cuja indentificação não exige grandes conhecimentos por parte do

consumidor. Logo, uma básica e superficial verificação deve constatá-los.

2.8.2 Defeito do Serviço ou do Produto

O §1º do artigo 12 e o §1º do artigo 14, todos do Código de

Defesa do Consumidor, trazem um esboço do que vem a ser defeito, afirmando,

respectivamente, que "o produto é defeituoso quando não oferece a segurança que

dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias

relevantes, (...)" e que "o serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que

o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias

relevantes (...)".203

201 KRIGER FILHO, Domingos Afonso. A responsabilidade civil e penal

no código de defesa do consumidor , p. 79. 202 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do

consumidor , p. 182. 203 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 02/09/2010.

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Atentando-se ao texto legal, "consideram-se defeituosos os

produtos ou serviços que não apresentam a segurança que deles legitimamente se

espera na sociedade de consumo."204

Leite205, por seu turno, assenta que defeitos são "imperfeições

de natureza grave, capazes de causar dano à saúde ou à segurança do

consumidor".

Destarte, posto que o vício é uma característica que assola o

próprio produto ou serviço, provocando dano diretamente à própria coisa, pode-se

dizer que o defeito pressupõe o vício, não obstante a recíproca não ser verdadeira.

Ou seja, há vício sem defeito, mas inexiste defeito sem vício.

Nunes206 explica o tema:

O defeito é o vício acrescido de um problema extra, alguma coisa extrínseca ao produto ou serviço, que causa um dano maior que simplesmente o mau funcionamento, não-funcionamento, a quantidade errada, a perda do valor pago - já que o produto ou serviço não cumpriram o fim ao qual se destinavam. O defeito causa, além desse dano do vício, outro ou outros danos ao patrimônio jurídico material e/ou moral do consumidor.

Os defeitos juridicamente relevantes estão expostos no caput

dos artigos 12 e 14 do Código de Defesa do Consumidor, que assim elencam:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos. (grifou-se)

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da

204 SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Responsabilidade civil no

código de defesa do consumidor e a defesa do fornec edor . São Paulo: Saraiva, 2002. p. 114. 205 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os

direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 139. 206 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do

consumidor , p. 183.

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existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. 207(grifou-se)

Acerca dos dispositivos legais supratranscritos, Leite208 divide

os defeitos em três categorias:

a) os defeitos de criação, relativos ao projeto e à fórmula; b) os defeitos de produção, relativos à fabricação, construção, montagem, manipulação e acondicionamento; c) os defeitos de informação, relativos à publicidade, apresentação e informação insuficiente ou inadequada.

Portanto, sinteticamente, pode-se diferenciar vício e defeito da

seguinte forma: o primeiro traz ao consumidor um prejuízo estritamente de ordem

econômica, atingindo diretamente o serviço ou o produto, enquanto o segundo traz,

além do prejuízo econômico, abalo moral ao consumidor, colocando em risco sua

saúde e segurança.

207 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 02/09/2010.

208 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor: os direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 140.

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CAPÍTULO 3

A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS FORNECEDORES EM FACE D O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

3.1 A RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO OU DO S ERVIÇO

Como é cediço, a ação humana (positiva ou negativa) pode

ensejar a ocorrência de um fato jurídico, acontecimento com relevância para o

Direito que implica na necessidade de regulamentação por meio de norma jurídica,

mormente falando em relação consumerista, que engloba não apenas os interesses

das partes envolvidas na relação, mas também uma série de outros direitos.209

Com relação ao acidente de consumo, fato jurídico

concernente aos danos provocados na relação consumerista, este prejudica o direito

à vida, à saúde ou à segurança do consumidor ou de terceiro vítima do evento (art.

17, da Lei 8078/90) e tem como causa o defeito no produto ou no serviço lançado no

mercado. 210

A Responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço advém,

portanto, dos possíveis defeitos que inquinam a qualidade do bem ou da prestação

de um serviço, provocando, além da frustração do resultado esperado pelo

consumidor, a sua exposição a riscos à vida, à saúde ou à segurança.

Destarte, "a responsabilidade pelo fato do produto ou serviço

decorre da exteriorização de um vício de qualidade, vale dizer, de um defeito capaz

de frustrar a legítima expectativa do consumidor quanto à sua utilização ou

fruição"211.

209 LISBOA, Roberto Senise. Contratos difusos e Coletivos , p. 323. 210 LISBOA, Roberto Senise. Contratos difusos e Coletivos , p. 323-324. 211 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código brasileiro de defesa ao

consumidor , p. 31.

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A responsabilidade pelo fato do produto ou serviço refere-se,

basicamente, aos acidentes de consumo, que podem atingir o consumidor tanto

física (saúde, vida, segurança etc) quanto economicamente, por meio da

insegurança do produto ou serviço, causada pela exteriorização dos vícios de

qualidade.

Nesse norte, Gama212 discorre que:

Quando tratamos da 'responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço', estamos nos atendo aos chamados 'acidentes de consumo'. Podem ser fatos que ocorram com os produtos ou serviços e que atinjam física ou economicamente aos consumidores. Podem ser fatos que ocorram com as pessoas ou os bens dos consumidores quando dos atos de consumir. Ou podem ser seqüelas decorrentes dos atos de consumir.

Lisboa213 continua o raciocínio e exemplifica:

O acidente de consumo pode ocorrer tanto com o destinatário final do produto ou serviço, como atingindo alguma vítima que seja equiparada ao consumidor [...]. Podem ser vítimas da inadequação por insegurança do produto ou serviço [...]. Tome-se como exemplo, um acidente de consumo ocorrido no interior de uma residência. A genitora adquirente de um eletrodoméstico e o filho - que é terceiro em relação ao negócio jurídico - poderão ser vítimas relacionados ao mesmo negócio jurídico celebrado, se, ao ligarem corretamente o eletrodoméstico adquirido, vierem a sofrer os efeitos decorrentes de choque elétrico proveniente do mesmo.

Conclui-se, assim, que o acidente de consumo pode atingir não

só o destinatário final do produto ou serviço, ou seja, aquele que o adquiriu ou está

utilizando-o, mas também terceiros que vierem a sofrer algum dano decorrente do

defeito.

Importante ressaltar que, em ambas a hipóteses, a

consequência do dano ao consumidor decorrente de defeitos no produto ou no

serviço é a Responsabilidade pelo fato do produto, prevista nos artigos 12 e 13 do

Código de Defesa do Consumidor, ou do serviço, prevista no artigo 14 do mesmo

Diploma Legal.

212 GAMA, Hélio Zaguetto. Curso de direito do consumidor , p. 55. 213 LISBOA, Roberto Senise. Contratos difusos e Coletivos , p. 325-326.

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Essa Responsabilidade, consoante assenta Nunes214, "é

objetiva, e os eventos relativos aos danos são os chamados acidentes de consumo".

Ela é esteada, pois, na teoria do risco e independe da existência de culpa ou dolo

para que se caracterize.

No que tange a teoria do risco, Kriger Filho215 sustenta que a

"segurança, quando se fala em mercado de consumo, deve ser associada à idéia de

risco (probabilidade de um produto ou serviço vir a causar dano à saúde humana),

[...]." E continua o raciocínio afirmando que a legislação consumerista, que é

baseada na qualidade, tem como desiderato "envidar todos os esforços no sentido

de assegurar que os riscos existentes se mantenham num limite razoável, que não

ameacem a segurança social"216.

Assim, em que pese a impossibilidade de eliminar totalmente

os riscos oriundos da relação de consumo, que, diante da organização em

sociedade e da produção em série, pode ameaçar a segurança social, o direito

busca, ao menos, minimizá-los. Por isso, no âmbito consumerista, o sistema

tradicional da Responsabilidade Civil, fundado na culpa, foi suprimido pelo sistema

da Responsabilidade Civil, baseado no risco.

Bonatto e Moraes217 enfatizam, no mesmo diapasão, que a

adoção da Responsabilidade objetiva na esfera consumerista "cumpre outras

funções de âmbito global, que efetivam uma melhor distribuição dos prejuízos

causados pela necessária atividade produtiva e de massa".

Ao comentar o assunto, Marques218 assinala que a

Responsabilidade adotada pelo Código de Defesa do Consumidor aparentemente

214 NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Comentários ao Código de Defesa do

Consumidor , p. 171. 215 KRIGER FILHO, Domingos Afonso. A responsabilidade civil e penal

no código de proteção e defesa do consumidor , p. 67. 216 KRIGER FILHO, Domingos Afonso. A responsabilidade civil e penal

no código de proteção e defesa do consumidor , p. 67. 217 BONATTO, Cláudio; MORAES, Paulo Valério Dal Pai. Questões

controvertidas no Código de Defesa do Consumidor : principiologia, conceitos, contratos. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 116.

218 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor , p. 1213.

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surgiu da influência de dois sistemas: o norte-americano, que, partindo de idéias

implícitas (contratuais), chega-se à Responsabilidade objetiva; e o da Comunidade

Européia, que adota o posicionamento de que os defeitos dos produtos

industrializados introduzidos no mercado pelo fornecedor imputam Responsabilidade

objetiva ao fabricante.

Conclui-se, assim, que aquele que exerce atividade no

mercado de consumo é o responsável pelos danos causados por defeito na sua

atividade, independentemente da existência de culpa. É a chamada Teoria do Risco

do Empreendimento, que é conceituada da seguinte maneira por Cavalieiri Filho219:

Pela teoria do risco do empreendimento, todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços. O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos.

Feitos os comentários gerais relativos à Responsabilidade pelo

fato do produto ou serviço, incluindo breves digressões acerca do acidente de

consumo e da teoria do risco, pertine adentrar, neste momento, ao estudo efetivo

dos artigos concernentes ao tema vertente.

3.1.1 A Responsabilidade pelo Fato do Produto

O artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor discrimina "os

agentes econômicos que diretamente responderão pelos fatos ilícitos que vierem a

ser causados em decorrência de determinado produto (...)".220 Sua redação é a

seguinte:

219 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil , p.

475/476. 220 BONATTO, Cláudio; MORAES, Paulo Valério Dal Pai. Questões

controvertidas no Código de Defesa do Consumidor : principiologia, conceitos, contratos. p. 114.

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Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.221 (grifou-se)

Da leitura do dispositivo legal supratranscrito, a primeira e mais

simples conclusão que se tem é a de que, "do ponto de vista do dever de indenizar,

a Responsabilidade Civil do agente é objetiva, oriunda do risco integral de sua

atividade econômica"222.

De outra monta, percebe-se que o legislador, ao elencar os

agente econômicos que responderão pelo fato do produto, objetivou atingir

praticamente todos os participantes do ciclo produtivo-distributivo, elegendo o

fabricante, o produtor, o construtor e o importador como responsáveis diretos.

Dessa forma, a Responsabilidade direta, consoante afirma

Lisboa223, é do fornecedor mediato (fabricante, produtor, construtor ou importador). É

ele quem responde, em via de regra, pelos defeitos do produto que cause dano ou

ameace algum direito personalíssimo do consumidor.

Compulsando o §1º do referido artigo224, tem-se que é

considerado defeituoso o produto que deixa de proporcionar ao consumidor a

segurança que dele se espera, tendo em vista sua natureza, características,

apresentação, uso, circulação no mercado, dentre outras circunstâncias relevantes.

221 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 09/10/2010.

222 NUNES, Luiz Antônio Rizzato. Comentários ao código de defesa do consumidor , p. 179.

223 LISBOA, Roberto Senise. Contratos difusos e Coletivos , p. 325. 224 § 1° O produto é defeituoso quando não oferece a s egurança que dele

legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - sua apresentação; II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III - a época em que foi colocado em circulação.

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Contudo, é imperioso consignar que, nos termos do §2º do

aludido artigo225, não há que se considerar defeituoso o produto pelo fato de ser

colocado no mercado outro de melhor qualidade.

No mesmo sentido, Lisboa226 leciona que "a inserção de um

produto ou de um serviço de melhor qualidade ou mais aperfeiçoado tecnicamente

não torna defeituoso o produto ou o serviço anterior ou mesmo posteior colocado no

mercado de consumo".

Assim sendo, em uma síntese geral do dispositivo legal em

comento, o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o

importador são os responsáveis principais pela reparação dos danos causados ao

consumidor (destinatário final ou terceiro equiparado) por defeito do produto,

independentemente da existência da culpa.

Por sua vez, o artigo 13 do Código de Defesa do Consumidor

acrescenta, em casos especiais, mais um responsável solidário à lista constante no

artigo 12: o fornecedor final ou comerciante227, conforme será analisado a seguir.

3.1.1.1 A Responsabilidade Subsidiária do Comercian te pelo Fato do Produto

O fornecedor imediato, chamado pelo Código de Defesa do

Consumidor de comerciante, conforme leciona Marques228, possui uma acepção

bastante ampla, eis que mesmo não exercendo atos tipicamente de comércio poderá

ser caracterizado como tal.

Acerca da Responsabilidade do fornecedor imediato

(comerciante), Leite229 faz as considerações iniciais pertinentes:

A leitura isolada do art. 3º do Código pode conduzir o intérprete à conclusão de que são co-responsáveis o produtor, o importador e o

225 § 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de

melhor qualidade ter sido colocado no mercado. 226 LISBOA, Roberto Senise. Contratos difusos e Coletivos , p. 324. 227 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do

consumidor , p. 1210.

228 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor , p. 1213.

229 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor : os direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor, p. 140.

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comerciante. Isso porque o referido dispositivo qualifica como fornecedor "toda pessoa (...) que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação" (o produto lato sensu), de "importação, exportação, distribuição" (o importador) e de "comercialização de produtos" (comerciante).

Entretanto, em que pese essa primeira impressão advinda da

hermenêutica do artigo 3º* do Còdigo de Defesa do Consumidor, de que o

comerciante seria co-responsável, nas mesmas condições que os fornecedores

mediatos, mais adiante, o artigo 13 do mesmo Diploma Legal rechaça tal conclusão,

senão veja-se:

Art. 13. O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando: I - o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados; II - o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador; III - não conservar adequadamente os produtos perecíveis.230

Da leitura do dispositivo legal acima exposto, tem-se que a

Responsabilidade pelos danos causados pelos acidentes de consumo somente

recairá sobre o comerciante quando não for identificado o fornecedor mediato

(fabricante, construtor, produtor ou importador) ou quando ele não conservar

adequadamente os produtos perecíveis. 231

Ve-se, pois, que o campo da Responsabilidade do comerciante

é reduzido, surgindo apenas em casos especiais pré-determinados. Destarte, ele é

considerado responsável subsidiário pelo estado de fato do produto.

Isso porque, normalmente, a conduta do comerciante não é a

principal causa do evento danoso, haja vista que ele, sem participar da efetiva

produção, construção ou fabricação, apenas repassa o produto ao consumidor,

sendo, portanto, o fornecedor final.

230 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 12/10/2010.

231 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor , p. 1213.

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Acerca da Responsabilidade subsidiária do comerciante,

Nunes232 discorre:

Nem poderia ser de outra forma, porquanto a responsabilidade do comerciante, pelo menos nas hipóteses dos incisos I e II, somente existe porque o produto original não foi ou não está identificado. Bastava a identificação para excluir a responsabilidade do comerciante".

Assim, pode-se afirmar que a Responsabilidade do

comerciante é meramente subsidiária, de modo que a sua Responsabilidade

solidária somente se caracteriza quando se tratar de uma das três hipóteses

contidas nos incisos do artigo 13 do Código de Defesa do Consumidor.

Nesse norte, a jurisprudência do Tribunal de Justiça de Santa

Catarina posiciona-se:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. RELAÇÃO DE CONSUMO. AQUISIÇÃO DE SEMENTES QUE ESTARIAM CONTAMINADAS POR FUNGO. DOENÇA CONHECIDA POR "CARVÃO DE ESPIGA E DO PENDÃO". LAVOURA QUE NÃO ATINGIU A PRODUTIVIDADE ALMEJADA, ALÉM DE CONTAMINAR O SOLO, INVIABILIZANDO CULTURAS FUTURAS. VÍCIOS POR INSEGURANÇA E VÍCIOS POR INADEQUAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL PELO FATO DO PRODUTO. ARTIGO 12 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO COMERCIANTE QUE SE APRESENTA VIÁVEL APENAS NAS HIPÓTESES DO ARTIGO 13, INAPLICÁVEIS AO CASO EM EXAME. HIPÓTESE QUE VERSA SIMPLES RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO COMERCIANTE. MERCADORIA QUE É ACONDICIONADA EM EMBALAGEM PRÓPRIA DO FABRICANTE. FALHA NO ARMAZENAMENTO DO PRODUTO QUE NÃO FOI ALEGADA NA PETIÇÃO INICIAL. PLEITO INDENIZATÓRIO QUE ESTARIA ALICERÇADO NO PROCESSO DE PRODUÇÃO DA SEMENTE. ILEGITIMIDADE PASSIVA RECONHECIDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

Se a causa versa sobre vício por insegurança, a responsabilidade civil do comerciante é meramente subsidiária. Haveria responsabilidade solidária do comerciante se estivesse presente uma das 3 (três) hipóteses elencadas no artigo 13 do Código de Defesa

232 NUNES, Luiz Antônio Rizzato. Comentários ao código de defesa do

consumidor , p. 199.

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do Consumidor, o que os autos não reproduzem.233

No mais, ainda em análise à aludida norma jurídica, acredita-se

que o legislador "[...] pretendeu dizer que o comerciante é responsável, também,

independentemente da existência da culpa, se for encontrado em uma das três

situações elencadas nos incidos I, II e III do art. 13 sob comentário"234.

Dessa forma, Benjamin235 conclui que "o CDC prevê três tipos

de responsáveis: o real (fabricante, construtor e produtor), o presumido (o

importador) e o aparente (o comerciante quando deixa de identificar o responsável

real) [..]".

No entanto, o parágrafo único do artigo 13 do Còdigo de

Defesa do Consumidor236 determina que "aquele que efetivar o pagamento ao

prejudicado poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis,

segundo sua participação na causação do evento danoso".

Sobre o assunto, Nunes237 leciona que:

A norma em comento serve para toda ou qualquer hipótese de pagamento de verba indenizatória ao consumidor, feita por qualquer dos co-responsáveis solidários. Quer em função de defeito - quando propriamente se fala em indenização ao consumidor -, quer em função de vício - quando se troca o produto ou se devolve o dinheiro ou parte dele. Nesse caso de vício, o prejuízo pode ser apenas do comerciante, que pode acionar o co-responsável.

Dessa forma, vislumbra-se a adoção da solidariedade em

relação à Responsabilidade entre o comerciante e o fabricante, produtor, construtor

ou importador nos casos dos incisos I, II e III do artigo 13 do Código de Defesa do

233 BRASIL, Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n. 2003.025639-3. Câmara Especial Temporária de Direito Civil. Julgada em 13/11/2009. Relator Jânio Machado. Disponível em <http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia> acesso em 23/10/2010.

234 SAAD, Eduardo Gabriel; SAAD, José Eduardo Duarte; BRANCO, Ana Maria Saad C.. Comentários ao código de defesa do consumidor e sua jurisprudência anotada : Lei n. 8.078, de 1990. p. 315.

235 BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcelos e. Código brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do ant eprojeto . 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. p. 55. 236 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 26/10/2010.

237 NUNES, Luiz Antônio Rizzato. Comentários ao código de defesa do consumidor, p. 203.

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Consumidor. Todos respondem, assim, igualmente pelo dano causado ao

consumidor em decorrência do vício de qualidade do produto, independentemente

de ser ele ou não o responsável pela deterioração do produto.

3.1.1.2 Causas de Exclusão da Responsabilidade do F ornecedor de Produtos

O artigo 12, §3º do Código de Defesa do Consumidor traz as

hipóteses de exclusão da Responsabilidade dos fornecedores, a saber:

§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou impo rtador só não será responsabilizado quando provar: I - que não colocou o produto no mercado; II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste; III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.238

A primeira hipótese versa sobre o produto que, embora

defeituoso, não tenha sido colocado no mercado. Por óbvio, nesse caso, o defeito do

produto não atinge o consumidor ou terceiro equiparado na relação de consumo.

Não há, assim, o fato juridicamente relevante a ser tutelado pela legislação

consumerista.

Norris239 discorre acerca da colocação do produto no mercado:

Deve-se entender como colocado em circulação um produto sempre que o seu produtor, entendendo encontrar-se a mercadoria em perfeitas condições, faz sua entrega ao mercado de consumo, introduzindo-o, de forma consciente, no circuito de distribuição, mesmo que seja para exame ou prova.

Importante ressaltar, destarte, que a colocação do produto no

mercado não se caracteriza, necessariamente, no momento em que o fornecedor o

entrega para que ele seja comercializado, podendo configurar-se também quando o

entrega para exame ou prova.

O segundo caso, qual seja, da inexistência de defeito no

produto, é o mais fácil de se vislumbrar. Consoante exposto alhures, o defeito é

238 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 30/10/2010.

239 NORRIS, Roberto. Responsabilidade civil do fabricante pelo fato do produto . Rio de Janeiro: Editora Forense, 1996. p. 86.

.

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elemento indispensável para o surgimento do fato do produto e, por conseguinte, da

Responsabilidade do fornecedor. Não havendo defeito, não há, igualmente, que se

falar em Responsabilidade, porquanto inexiste relação de causa e efeito entre um e

outro.

Por fim, a culpa exclusiva do consumidor também exclui a

Responsabilidade do fornecedor pelos danos decorrentes do produto.

Conforme relata Cavalieri FIlho240, é possível falar-se em

participação da vítima no resultado danoso mesmo em se tratando de

Responsabilidade objetiva. Entretanto, ocorrerá somente em casos excepcionais,

nos quais o dano causado não guarde qualquer relação com eventual defeito do

produto. Nessa toada, caso a conduta da vítima, mesma que culposa, seja inócua

para a produção do resultado, não se pode admití-la como minorante da

Responsabilidade do fornecedor.

A culpa exclusiva de terceiro, por seu turno, produz os mesmo

efeitos da culpa exclusiva da vítima, consoante assinala o autor supracitado:

Tal como se põe para o fato exclusivo do consumidor, só haverá a exclusão da responsabilidade do fornecedor se o acidente de consumo tiver por causa o fato exclusivo, não concorrendo qualquer defeito do produto. A culpa de terceiro, repita-se, perde toda e qualquer relevância desde que evidenciado que sem o defeito do produto ou serviço o dano não teria ocorrido.241

Assim, havendo concausalidade culposa de terceiro, ou seja,

caso um terceiro aja com culpa concorrentemente ao defeito do produto, provocando

danos, a Responsabilidade do fornecedor não sofre redução ou exclusão.

Seguindo essa esteira de pensamento, Rocha242 assevera:

Com efeito, tratando-se de terceiro, não teria sentido a culpa concorrente dele excluir a responsabilidade do fornecedor, porque isso redundaria em irreparável prejuízo para o consumidor. Assim, a concausalidade culposa de terceito não constitui causa de redução

240 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil . 433. 241 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil . 434. 242 ROCHA, Silvio Luis Ferreira da. Responsabilidade civil do fornecedor

pelo fato do produto no direito brasileiro . 3. ed. São Paulo: editora RT, 2000. p. 107.

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nem de exclusão da responsabilidade do fornecedor perante a vítima.

Não há que se falar, pois, em culpa concorrente de terceiro

como causa de exclusão da Responsabilidade do fornecedor.

3.1.2 A Responsabilidade pelo Fato do Serviço

A Responsabilidade pelo fato do serviço está prevista no artigo

14 do Código de Defesa do Consumidor243:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. (grifou-se)

Da leitura desse dispositivo legal, verifica-se que a sua redação

guarda estreita semelhança com a do artigo 12 do mesmo Diploma Legal.

De igual sorte, a caracterização da Responsabilidade pelo fato

do serviço prescinde de culpa, ou seja, é objetiva.

Acerca do tema, extrai-se da jurisprudência do Tribunal de

Justiça de Santa Catarina:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. CARTÃO DE CRÉDITO. CONSUMIDORA QUE NÃO CONTRATOU COM A ADMINISTRADORA DE CARTÃO DE CRÉDITO. AÇÃO CAUTELAR PREPARATÓRIA PARA EXCLUSÃO DO NOME DE CADASTROS RESTRITIVOS. LIMINAR DEFERIDA. BANCO QUE ALEGA TAMBÉM TER SIDO VÍTIMA DE FRAUDE DE TERCEIRO. INSCRIÇÃO INDEVIDA. DEVER DE INDENIZAR. SENTENÇA REFORMADA SOMENTE PARA REDUZIR O QUANTUM DA INDENIZAÇÃO. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA. ARTIGO 21, § ÚNICO DO CPC. APELO DA AÇÃO CAUTELAR DESPROVIDO E RECURSO DA AÇÃO PRINCIPAL PROVIDO EM PARTE.

Responde pelos danos que causar ao consumidor, o fornecedor de serviços, sem a necessidade de perquirir acerca da culpa (inteligência do art. 14 do CODECON). É da instituição financeira,

243 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 28/10/2010.

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que detém para si o risco da prestação do serviço, a responsabilidade pela análise e pesquisa dos dados apresentados para contratação de seus serviços, tratando-se de risco inerente à prestação do serviço.244

A diferença encontra-se, assim, na designação do agente

responsável, sendo que, nesse caso, a lei refere-se ao fornecedor de serviços.

Entrementes, conforme entende Nunes245, a forma mais adequada seria mencionar

"prestador de serviço, porquanto o termo fornecedor é o gênero do qual prestador do

serviço é espécie [...]".

Pois bem. Primeiramente, importante consignar que prestação

adequada de serviço, para o autor supracitado, é:

[...] aquele feito de conformidade com a oferta e cujo desenvolvimento esteja adequado e do qual advenha resultado útil, da maneira prometida, e que se tenha estabelecido diretamente pelo prestador, quer ele o faça diretamente (como no exemplo do profissional liberal), quer se utilize de produto ou serviço de terceiros.246

Depreende-se, então, que o serviço prestado de forma

adequada é aquele executado conforme ofertado e cujo resultado útil coaduna-se

com o prometido pelo prestador do serviço ou corresponda ao esperado pelo

consumidor.

De outro giro, de acordo com o artigo 14, §1º, I, II e III247, do

Còdigo de Defesa do Consumidor, um serviço é considerado defeituoso quando não

oferece a segurança e a qualidade que razoavelmente dele se espera, atentando-se:

ao "modo de seu fornecimento" (inc. I), assim compreendida a sua apresentação ao

público consumidor; o resultado prático, que não pode destoar do que se espera

244 BRASIL, Tribunal de Justiça de Santa Catarina . Apelação Cível n.

2007.025367-1 e 2007.025366-4. Terceira Câmara de Direito Civil. Julgada em 28/08/2007. Relator Sérgio Izidoro Heil. Disponível em <http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia> acesso em 28/10/2010.

245 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do consumidor , p. 205.

246 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do consumidor , p. 295.

247 § 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a s egurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III - a época em que foi fornecido.

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(inc. II); os riscos de sua fruição, que não devem ultrapassar os que razoavelmente

se tem expectativa (inc. II); bem como a "época em que foi fornecido" (inc. III). Da

mesma sorte que o produto, o serviço não é considerado defeituoso pelo fato de

surgirem novas técnicas, consoante dispõe o art. 14, §2º248 do Código de Defesa do

Consumidor, devendo levar-se em conta as técnicas no momento da prestação do

serviço e não posteriormente.

Bem assim, o fornecedor exime-se da Responsabilidade pelos

danos causados pelo serviço prestado caso comprove a inexistência de defeito ou

que a culpa é exclusiva do consumidor ou terceiro, nos termos do §3º do mesmo

artigo249.

3.2 A RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO

Conforme consignado alhures, vício e defeito não possuem o

mesmo significado, ao passo que "defeito de produto é a ausência da segurança que

dele legitimamente se espera (art. 12). Vício do produto é de qualidade ou de

quantidade que o torna impróprio para consumo ou que lhe reduz o valor"250.

Em consequência disso, surgem diversas diferenças entre os

dois institutos. Nessa toada, frise-se que a Responsabilidade pelo vício do produto

ou serviço não guarda similaridade à Responsabilidade pelo fato, eis que o

fundamento daquela recai sobre os vícios de qualidade ou quantidade, que,

diferentemente dos vícios redibitórios, podem, por exemplo, ser aparentes ou

ocultos, tendo em vista a sua natureza.251

248 § 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas

técnicas. 249 § 3° O fornecedor de serviços só não será responsa bilizado quando

provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

250 SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários ao código de defesa do consumidor , p. 269.

251 SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários ao código de defesa do consumidor , p. 272.

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Para melhor abordagem do tema, é necessário dissertar

separadamente sobre a Responsabilidade pelo vício do produto e do serviço, o que

passa-se a fazer.

3.2.1 A Responsabilidade pelo Vício do Produto

A Responsabilidade pelo vício do produto está prevista na

Seção III do Código de Defesa do Consumidor e tem como preponderante objeto,

segundo Kriger FIlho, a "esfera patrimonial do consumidor procurando protegê-los

dos vícios de qualidade (artigo 18) e dos vícios de quantidade (artigo 19)"252.

Os referidos artigos dispõem o seguinte:

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

Art. 19. Os fornecedores respondem solidariamente pelos vícios de quantidade do produto sempre que, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, seu conteúdo líquido for inferior às indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou de mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I - o abatimento proporcional do preço; II - complementação do peso ou medida; III - a substituição do produto por outro da mesma espécie, marca ou modelo, sem os aludidos vícios; IV - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos.253

Nunes254, interpretando o caput dos dispositivos

supratranscritos, entende que eles tem como desiderato colocar "todos os partícipes

do ciclo de produção como responsáveis direto pelo vício, de forma que o

252 KRIGER FILHO, Domingos Afonso. A responsabilidade civil e penal

no código de proteção e defesa do consumidor , p. 78. 253 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 30/10/2010.

254 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do consumidor , p. 240.

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consumidor poderá escolher e acionar diretamente qualquer dos envolvicos,

exigindo seus direitos [...]". Assim, o autor conclui que "todos os fornecedores são

solidariamente responsáveis pelos vícios (e pelos defeitos, na medida de suas

participações)"255.

Conforme sugere a própria redação dos dispositivos legais

supracitados, o dever de reparar o dano oriundo de vício no produto é solidário, de

modo que não se extingue a Responsabilidade dos demais fornecedores que

indiretamente tenham participado da relação de consumo. Assim, conforme assenta

Kriger Filho256, o comerciante é também responsável principal, respondendo

solidariamente com os demais fornecedores mediatos, salvo quando se tratar de

produto in natura cujo seu produtor seja claramente identificado (artigo 18, §5º, do

Código de Defesa do Consumidor).

Diga-se, por oportuno, que a Responsabilidade decorrente da

presença de vícios de qualidade ou quantidade nos produtos e serviços independe

de culpa, ou seja, é igualmente objetiva.257

Ainda, à luz do art. 18, caput, do Código de Defesa do

Consumidor, os consumidores de produtos, duráveis ou não duráveis, poderão

reclamar a reparação na hipótese de o produto ser impróprio para a finalidade

esperada ou tenha seu valor econômico diminuído em virtude de estar inquinado por

vício de qualidade ou quantidade.

Em que pese o preceito mencionar vício de qualidade e

quantidade, Nunes258 assenta que o artigo 18 refere-se somente ao vício de

qualidade, sendo um equívoco a referência ao de quantidade, que, por sua vez, é

regulado no artigo 19.

255 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do

consumidor , p. 241. 256 KRIGER FILHO, Domingos Afonso. A responsabilidade civil e penal

no código de proteção e defesa do consumidor, p. 81. 257 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de

direito civil , p. 305. 258 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Curso de direito do consumidor , p.

173.

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Entretanto, pode-se considerar que o mencionado artigo 18

equipara o vício de quantidade ao de qualidade quando a diferença de peso e/ou

medida tornar o produto impróprio ao fim a que se destina. O artigo 19, então, é

reservado para as hipóteses em que o vício na quantidade não afetar a destinação

do produto.259

Portanto, em síntese, o artigo 18, caput, do Código de Defesa

do Consumidor, trata da Responsabilidade dos fornecedores pelos vícios de

qualidade do produto, que caracteriza-se quando: a) o produto torna-se impróprio ao

consumo a que se destina; b) o produto desvaloriza-se; e c) há disparidade

informativa.

Vício de qualidade é, assim, aquele que torna o produto

impróprio ao consumo, sendo que as impropriedades, classificadas em materiais e

formais, estão previstas no §6º do artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor.

São considerados materialmente impróprios os produtos

deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados,

nocivos à vida ou à saúde (artigo 18, §6, II), eis que há alteração fisica, na própria

substância, comprometendo a sua utilidade natural.

A impropriedade formal, por seu turno, caracteriza-se no

"produto com prazo de validade vencido" ou "estiver em desacordo com as normas

regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação" (art. 18, §6º, I e II,

ultima parte).

O artigo 18, §6º, III, preceitua, outrossim, que são impróprios

ao uso e consumo "os produtos que, por qualquer motivo, se revelam inadequados

ao fim a que se destinam", revelando claramente que o rol de situações descritas

como sendo de impropriedade não são taxativas.260

259 AMARAL JR., Alberto do. Proteção do consumidor no consumo de

compra e venda . São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 277. 260 GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos

et al. Código de defesa do consumidor comentado pelos auto res do anteprojeto , p. 97.

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Caracterizada uma das situações expostas, surge ao

fornecedor a Responsabilidade pelo vício de qualidade no produto. Almeida261

assinala que "a responsabilidade pelo vício busca proteger a esfera econômica,

ensejando tão-somente o ressarcimento segundo as alternativas previstas na lei de

proteção"*. As alternativas, por conseguinte, estão elencadas no §1º do artigo 18 do

Código de Defesa do Consumidor:

§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de tr inta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III - o abatimento proporcional do preço.262

Há que se ressaltar que, no caso do inciso I, a substituição do

produto deve ser efetuada por outro com as mesmas especificações,

compreendendo a mesmas espécie, marca e modelo. Caso o consumidor escolha

essa alternativa e sua realização seja impossível (o produto não é mais fabricado),

poderá ele requerer a entrega de produto de diferente espécie, marca ou modelo.

Assim, caso seja de preço superior daquele adquirido originalmente, obrigará o

complemento do preço e, se inferior, à restituição da diferença (artigo 18, §4º, do

Código de Defesa do Consumidor).

Acerca das alternativas dadas ao consumidor, oportuno

colacionar jurisprudência do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

APELAÇÕES CÍVEIS. CONEXÃO. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL E SUSTAÇÃO DE PROTESTO. VÍCIO NO PRODUTO. RECLAMAÇÃO DO CONSUMIDOR. DEFEITO NÃO SANADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. INTELIGÊNCIA DO ART. 18 DO CDC. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS AO CONSUMIDOR E RESTITUIÇÃO DO BEM EM FAVOR DA EMPRESA FORNECEDORA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSOS DESPROVIDOS.

O artigo 18 do Código de Defesa do consumidor estabelece o prazo de 30 dias para que o vício seja sanado, oferecendo ao consumidor

261 ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor , p. 48. 262 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 30/10/2010.

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três opções de ressarcimento caso o vício não seja sanado: - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; - o abatimento proporcional do preço.263

Importante consignar que a sanação do vício compreende a

substituição das partes ou componentes que tornam o produto impróprio ao fim a

que se destina. Saliente-se que os componentes devem ser substituídos por outros

novos e originais, não sendo permitido o conserto ou reparo da peça264. Essa

substituição, ainda, serve somente para peças ou componentes secundários ou de

pequena monta, que não comprometa a qualidade ou característica do produto ou

lhe reduza o valor. É o que se conclui da hermenêutica sistemática do caput e do

§3º, do artigo 18 do Còdigo de Defesa do Consumidor265.

O consumidor somente pode valer-se das alternativas previstas

nos incisos do citado §1º, portanto, caso o vício não seja sanado no prazo de trinta

dias ou na hipótese de atingir componente principal, cujo reparo comprometa a

qualidade do produto.

Vale frisar que, a teor do §2º, do mesmo artigo, esse prazo de

trinta dias pode ser reduzido ou ampliado por convenção das partes, não podendo

ser inferior a sete tampouco superior a cento e oitenta dias, e, em se tratando de

contrato de adesão, a cláusula de prazo deve ser expressamente manifestada pelo

consumidor e convencionada em separado. Deve-se observar, porém, que "qualquer

alteração há que significar adaptação real do lapso às necessidades específicas de

um dado produto, de vez que diversos são os graus de complexidade

tecnológica"266.

263 BRASIL, Tribunal de Justiça de Santa Catarina . Apelação Cível n.

2006.046292-3, de Fraiburgo. Primeira Câmara de Direito Comercial. Julgada em 08/04/2010. Relator Stanley da Silva Braga. Disponível em <http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia> acesso em 30/10/2010.

264 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor , p. 989.

265 § 3° O consumidor poderá fazer uso imediato das al ternativas do § 1° deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial.

266 GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos et al. Código de defesa do consumidor comentado pelos auto res do anteprojeto ,

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Acerca do prazo, Nunes267 leciona:

[...] o fornecedor não pode beneficiar-se da recontagem do prazo de 30 dias toda vez que o produto retorna com o mesmo vício. Se isso fosse permitido, o fornecedor poderia, na prática, manipulando o serviço de conserto, sempre prolongar indefinidamente a resposa efetiva de sanemaneto.

O fornecedor não pode, pois, valer-se da recontagem do prazo

para sanação do vício. Assim, Nunes268 sustenta que o tal prazo é passível de ser

frassionado, de modo que, caso o fornecedor tenha se utilizado, por exemplo, de

dez dias para efetuar o reparo do produto viciado, caso o mesmo reaparecer, ele

teria ainda mais vinte dias para eliminá-lo. Outros doutrinadores divergem deste

entendimento, assentando que o fornecedor tem apenas uma oportunidade para

eliminar o vício, sendo preclusivo o prazo para sanação do vício.

De outra monta, no que cerne o vício de quantidade do

produto, este caracteriza-se, nos dizeres de Benjamin269, pela "desconformidade

quantitativa a menor". Ou seja, deve haver uma diferença a menor de qualquer

medida (peso, metragem etc).

O artigo 19 do Còdigo de Defesa do Consumidor tem como

escopo resguardar que haja correspondência, conformidade, entre a quantidade

presente no produto e aquela anunciada. Em outras palavras, deve haver uma

simetria entre a medida do conteúdo e a sua indicação.270

A quantidade anunciada pelo fornecedor no recipiente,

embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária deve ser, portanto, efetivamente a

existente no produto. Caso contrário, o Código de Defesa do Consumidor oferece

p. 90.

267 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Curso de direito do consumidor . São Paulo: Saraiva, 2004, p. 183.

268 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Curso de direito do consumidor , p. 184.

269 GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos et al. Código de defesa do consumidor comentado pelos auto res do anteprojeto , p. 85.

270 LÔBO, Paula Luiz Netto. Comentários ao código civil : parte especial, das várias espécies de contratos - arts. 481 a 564 - V. 6. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 65.

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como solução: a) o abatimento proporcional do preço; b) a complementação do peso

ou medida; c) a substituição do produto; e d) a restituição da quantia paga.

Como já dito, os fornecedores respondem de forma solidária

pelos vícios de qualidade do produto. No entanto, essa solidariedade é rompida e o

fornecedor imediato responde exclusivamente quando ele "fizer a pesagem ou a

mediação e o instrumento utilizado não estiver aferindo segundo os padrões oficiais"

(art. 19, §2º, Código de Defesa do Consumidor).

3.2.2 A Responsabilidade pelo Vício do Serviço

Preceitua o artigo 20 do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, [...].271

Interpretando o dispositivo legal acima transcrito, Nunes272

esclarece quem é, de fato, o responsável pelos vícios do serviço:

Ao contrário do estabelecido nos arts. 18 e 19, nos quais aparecem como sujeitos os "fornecedores", assim no plural, aqui no art. 20 há designação do termo no singular: "fornecedor". Dessa forma, é de entender que a lei se refere ao fornecedor direto dos serviços prestados. E isso é adequado, na medida em que o serviço é sempre prestado diretamente ao consumidor por alguém. E é essa pessoa, quer seja física quer seja jurídica, a responsável.

Não obstante tal entendimento, imputando a Responsabilidade

àquele que diretamente prestou o serviço, cumpre consignar que a regra geral

presente na legislação consumerista, no tocante à Responsabilidade por vício, é a

solidariedade. Destarte, caso tenha havido participação de outros prestadores de

serviço, mesmo que indiretamente, responderão eles solidariamente por eventual

vício. Essa Responsabilidade, diga-se, é objetiva.

271 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 30/10/2010.

272 NUNES, Luiz Antônio Rizzato. Comentários ao código de defesa do consumidor , p. 293.

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O vício do serviço, por sua vez, manifesta-se por três formas, a

saber: a) pela impropriedade; b) pela desvalorização; e c) pela disparidade

informativa.

Como no caso dos produtos, "são impróprios os serviços que

se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam" (artigo

20, §2º, primeira parte, Código de Defesa do Consumidor). Ou seja, devem eles

atender as expectativas dos consumidores, cumprindo suas finalidades. Conforme

ensina Marques273, "a prestação de serviço adequado passa a ser regra, não

bastando que o fornecedor tenha prestado serviço com diligência". Vê-se, assim,

que há impropriedade tanto pelo modo de execução quanto pelo efeito da própria

prestação, diz-se, pelo seu resultado final.

São também considerados impróprios, os serviços "que não

atendam as normas regulamentares de prestabilidade (artigo 20, §2º, última parte,

Código de Defesa do Consumidor). Essas normas regulamentares são aquelas de

natureza técnica, fixadas por órgãos oficiais competentes, que definem padrões

mínimos de qualidade. Configura-se, pois, impropriedade formal, sendo que, não se

coadunando com as referidas normas regulametares, ainda que o serviço seja apto

aos fins a que se destina, será ele considerado viciado.

Oportuno frisar que, em que pese algumas normas

regulamentares serem facultativas, não é autorizado que o prestador de serviço

olvide-as, eis que poderão servir de parâmetro para a aferição de qualidade. Acerca

do tema, Benjamin274 assinala que a norma facultativa "indica uma meta a ser

alcançada, nem por isso deixa de afirmar um patamar de qualidade que, no estado

da arte do momento, é considerado alcançável e adequado".

Caracterizado um vício do serviço, o Código de Defesa do

Consumidor, nos incisos do seu artigo 20, possibilita que o consumidor exija: a) a

reexecução dos serviços, quando cabível, sem custo adicional (inciso I); b) a

273 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do

consumidor , p. 308. 274 GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de

Vasconcellos et al. Código de defesa do consumidor comentado pelos auto res do anteprojeto , p. 377.

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restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de

eventuais perdas e danos (inciso II); e c) o abatimento proporcional do preço.

Cumpre ressaltar que são soluções alternativas, não havendo

hierarquia entre esses direitos, cabendo a escolha exclusivamente ao consumidor.

A alternativa prevista no inciso I, consubstanciada na

reexecução do serviço, somente pode ser efetuada "quando cabível", como sugere a

própria redação legal. Isso porque, em determinadas situações, a sua concretização

ou não é possível ou se mostra desproporcional, o que justificaria a oposição do

fornecedor à sua realização. Restaria ao consumidor, então, optar entre as outras

duas alternativas.275

Por fim, o artigo 20, §1º do Código de Defesa do Consumidor

dispõe que "a reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros devidamente

capacitados, por conta e risco do fornecedor".

Na interpretação prática de Marinoni276, caso deseje que o

serviço seja prestado por terceiro, "o credor deverá indicá-lo desde logo, não

havendo razão para ter que se subordinar a uma indicação do devedor ou do juiz,

embora esse corra por conta e risco do fornecedor".

Assim, caso o consumidor vislumbre a possibilidade do §1º,

deverá ele, na oportunidade da reclamação, desde logo, indicar terceiro capacitado

para executar o serviço.

3.3 A RESPONSABILIDADE DOS PRESTADORES DE SERVIÇOS PÚBLICOS

Como anteriormente dito, alguns serviços públicos estão

abrangidos pelo Código de Defesa do Consumidor e, consequentemente, o Estado é

considerado fornecedor de serviço, devendo, destarte, obedecer as disposições da

lei consumerista.

275 COELHO, Fábio Ulhoa. O empresário e os direitos do consumidor.

São Paulo: Saraiva, 2000. p. 78. 276 MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos .

São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 411.

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O artigo 22, desse Diploma Legal, trata do tema:

Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.277

Não obstante a divergência quanto a aplicabilidade do Código

Consumerista em determinados serviços públicos, certamente, conforme afirmam

Vasconcellos e Benjamin278, qualquer deles - seja público stricto sensu ou de

utilidade pública, seja uti singuli ou uti universi - deve ser prestado de forma

adequada, eficiente e segura, conforme reforça o artigo em comento. Tal conclusão

advém, também, do princípio da eficiência, previsto constitucionalmente, que impõe

à Administração Pública prestação de serviços eficientes, adequados e seguros.

Os usuários de serviços públicos, de fato, devem receber

proteção em face dos riscos provocados por práticas no fornecimento de serviços

considerados perigosos e nocivos, que gerem riscos à vida, saúde e segurança.

Devem receber também informações claras acerca dos serviços, principalmente no

que tange o preço, qualidade e eventual periculosidade. Ainda, devem ter proteção

contra a publicidade enganosa e abusiva e direito à efetiva reparação dos prejuízos

sofridos.279

Corroborando, o dispositivo legal supracitado determina as

características que devem revestirem-se os serviços prestados pelos órgãos

públicos, direta ou indiretamente, a saber: a) eficiência e adequação; b) segurança;

e c) continuidade. O parágrafo único preve que, na ausência de uma dessas

277 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do

consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 30/10/2010.

278 BENJAMIN, Antonio Herman de Vasconcelos e. In: OLIVEIRA, Juarez de (Coord.) Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor . São Paulo: Saraiva, 2003, p. 110-111.

279 GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. O serviço público e a Constituição Brasileira de 1988 . São Paulo: Malheiros, 2003. p. 348

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características, a pessoa jurídica é responsabilizada pela reparação dos danos

causados.

Sendo inadequados, ineficientes, inseguros, ou, no caso de

essenciais, descontínuos os serviços prestados, serão os fornecedores obrigados a

cumprir suas obrigações, na forma prevista no Código.

No entanto, a expressão "na forma prevista neste código",

constante no parágrafo único do artigo 22, gera algumas divergências,

principalmente no que tange a aplicabilidade do artigo 20 do mesmo Diploma Legal.

Segundo Pasqualotto280, o referido artigo 20 pode ser invocado

quando cuidar-se de vício de qualidade do serviço, que o torne impróprio para o

consumo, ou no caso de ser feita propaganda enganosa, cabendo, nessas

hipóteses, que o consumidor opte por: ter o serviço reexecutado; ser ressarcido da

quantia paga; ou ser abatido o preço proporcionalmente.

No mesmo norte é o entendimento de Filomeno281:

Quando aqui se tratou do conceito de fornecedor, ficou consignado que também o Poder Público, como produtor de bens ou prestador de serviços, remunerados não mediante a atividade tributária em geral (imposto, taxas e contribuições de melhoria), mas por tarifas ou ‘preço público’, se sujeitará às normas ora estatuídas, em todos os sentidos e aspectos versados pelos dispositivos do novo Código do Consumidor, sendo, aliás, categórico o seu art. 22.

Assim, conforme entendem os autores acima citados, o

fornecedor de serviço público está sujeito ao artigo 20 do Código Consumerista,

inclusive no que diz respeito às alternativas colocadas a disposição do consumidor,

quais sejam: a) a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível; b)

a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de

eventuais perdas e danos; c) o abatimento proporcional do preço.

280 PASQUALOTTO, Adalberto. Os serviços públicos no Código de

Defesa do Consumidor . Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n. 01, p. 140. 281 GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de

Vasconcellos et al. Código de defesa do consumidor comentado pelos auto res do anteprojeto , p. 133.

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Por outro lado, dissonando dessa vertente, Denari282 afirma

que o Estado goza de posição privilegiada justamente por não se sujeitas às

sanções previstas no artigo 20, sustentando que o parágrafo único do artigo 22 faz

alusão apenas ao cumprimento do dever de prestar serviços de boa qualidade, sob

pena de incorrer em Responsabilidade objetiva e ter que reexecutar o serviço

defeituoso, afastando as alternativas da restituição da quantia paga e do abatimento

do preço.

Grotti283 complementa assentando que:

Deve-se observar que os órgãos públicos possuem tratamento privilegiado, não se submetendo às mesmas sanções previstas no art. 20 para os fornecedores de serviço, pois o parágrafo único refere-se apenas ao cumprimento do dever de prestar serviços de boa qualidade, envolvendo somente a reexecução dos serviços públicos defeituosos, o que exclui as alternativas da restituição da quantia paga e do abatimento do preço. Por outro lado, tratando-se de reparação de danos, responsabiliza as entidades públicas na forma prevista no Código, ou seja, independentemente da existência de culpa, conforme preceitua o art. 14 do CDC.

Destarte, esse posicionamento afirma que, em que pese a

Responsabilidade do fornecedor de serviços públicos ser objetiva, a única sanção

prevista no artigo 20 do Código de Defesa do Consumidor contra ele aplicável é a

reexecução do serviço.

3.4 A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PROFISSIONAIS LIBE RAIS

Conforme visto alhures, os profissionais liberais, tais como os

médicos, advogados, engenheiros, contadores, dentistas etc., estão submetidos às

regras insertas no Código de Defesa do Consumidor.

Contudo, no que tange o profissional liberal, em exceção "à

regra geral da responsabilidade por culpa presumida do fornecedor, o Código

282 DENARI, Zelmo. Revista de Direito do Consumidor , São Paulo, n. 31,

p. 179. 283 GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. O serviço público e a Constituição

Brasileira de 1988 , p. 348

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estabelece que a sua responsabilidade pessoal seja apurada mediante a verificação

da culpa (art. 14, §4º)"284.

Com efeito, o §4º do artigo 14 do Código de Defesa do

Consumidor285 dispõe que "a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais

será apurada mediante a verificação de culpa". Em outras palavras, pode-se afirmar

que a Responsabilidade do profissional liberal é subjetiva.

Frise-se que tal exceção, a única ao sistema da

Responsabilidade objetiva instituída pelo Código de Defesa do Consumidor, não

impede que o profissional liberal seja obrigado a indenizar. Ela apenas condiciona tal

obrigação à apuração da ocorrência de culpa ou dolo.

Kriger Filho286, explicando a razão pela qual é dispensado

tratamento mais benéfico ao profissional liberal, assenta:

Em nosso modo de ver, a adoção da responsabilidade subjetiva para os profissionais liberais se dá porque estes só podem se propor a utilizar todos os meios ao seu alcançe e seu conhecimento para realizar o serviço contratado, o que enseja a sua responsabilidade caso estes meios não sejam utilizados adequadamente, pois tal situação caracteriza a culpa profissional.

Conforme se depreende da afirmação do autor acima citado, o

profissional liberal deve realizar o serviço contratado utilizando-se de seus

conhecimentos e de todos os meios possíveis, almejando auferir o fim esperado.

Entretanto, como se ve, o fim desejado não é necessariamente sua obrigação, eis

que não há como se garantir a perfeição dos seus serviços, tendo em vista que os

resultados dependem de fatores alheios ao seu empenho. Assim sendo, somente

será responsabilizado, o profissional liberal, quando os meios empregados não

forem adequados, caracterizando a culpa profissional.

284 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor: os

direitos do consumidor e a aplicação do código de d efesa do consumidor , p. 46. 285 BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990: Código de defesa do consumidor . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 30/10/2010.

286 KRIGER FILHO, Domingos Afonso. A responsabilidade civil e penal no código de proteção e defesa do consumidor , p. 71.

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Entrementes, nem todo o serviço prestado por profissional

liberal exige apenas diligências nos meios empregados. Deveras, ele assumirá

contratualmente uma obrigação, podendo comprometer-se com um certo resultado

ou apenas com a utilização de prudência e diligência para alcançá-lo, sem

compromisso de obtê-lo. Deve-se perquirir, assim, se a obrigação assumida é de

meio ou de resultado.287

A distinção entre essas obrigações é de suma relevância para

a aferição da Responsabilidade do profissional liberal.

Aguiar Júnior288, referindo-se às obrigações de meio, define:

[...] o profissional assume prestar um serviço ao qual dedicará atenção, cuidado e diligência exigidos pelas circunstâncias, de acordo com o seu título, com os recursos de que dispões e com o desenvolvimento atual da ciência, sem se comprometer com a obtenção de um certo resultado.

Dessa forma, conclui-se que o serviço deve pautar-se numa

atividade prudente e diligente, olvidando-se à obrigação de se alcançar um

resultado. O profissional, portanto, somente será responsável na hipótese de atuar

com ausência do comportamento exigido, ou com comportamento pouco diligente e

leal. Logo, não será responsabilizado caso tenha agido com prudência, diligência e

escrúpulo, independentemente da consecução do resultado.289

Normalmente essa obrigação de meio é assumida pelos

médicos, eis que não poderão garantir a cura do paciente, e pelos advogados, pois

não poderão garantir a vitória numa demanda judicial. Isso porque os resultados

dependem de circunstâncias alheias às vontades dos referidos profissionais.

Do outro lado, no que tange as obrigações de fim, Diniz290

define-a como "aquela em que o credor tem o direito de exigir do devedor a

287 COMPARATO, Fábio Konder. Enciclopédia Saraiva de Direito . Coord.

Prof. R. Limongi França. São Paulo: Saraiva, 1977. 55 v. p. 422. 288 AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. Responsabilidade Civil do médico .

Revista dos Tribunais, n º 718, p. 33-53, ago. 1995. p. 35. 289 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro :

Responsabilidade Civil, p. 282. 290 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro :

Responsabilidade Civil., p. 282.

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produção de um resultado, sem o que se terá inadimplemento da relação

obrigacional".

Destarte, a obrigação de resultado ocorre, no caso do

profissional liberal, quando ele é contratado para prestar determinado serviço e fique

obrigado a atingir um resultado, ou seja, além de comprometer-se a atuar com

prudência e diligência, garante ao consumidor a aferição do fim pretendido.

Consequentemente, o profissional somente se desimcumbirá

da obrigação quando ela for totalmente adimplida, com a efetiva produção do

resultado almejado. Caso contrário, e não provando que agiu com culpa, surgirá a

sua Responsabilidade.

É o caso das cirurgias estéticas, conforme se evidencia por

meio da jurisprudência do Tribunal de Justiça do Paraná:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - ERRO MÉDICO - CIRURGIA PLÁSTICA - CIRURGIA ESTÉTICA - NARIZ - OBRIGAÇÃO DE RESULTADO - DEFORMIDADE OCASIONADA PELA INTERVENÇÃO CIRÚRGICA - DANO MATERIAL E MORAL - NEXO DE CAUSALIDADE PRESENTE - OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR - VALORAÇÃO DOS DANOS MORAIS.

Nas cirurgias plásticas estéticas, de forma geral, se presume a culpa do cirurgião pelo não atingimento do resultado esperado, pois esta intervenção objetiva a mudança de padrão estético da pessoa, ao embelezamento puro e simples, constituindo por tanto obrigação de resultado, devendo indenizar pelo não cumprimento da mesma, decorrente de eventual deformidade ou de alguma irregularidade.291

No entanto, é importante ressaltar que a adoção da Teoria do

Resultado não importa no afastamento da verificação da culpa, ou melhor, mesmo

tratando-se de obrigação de resultado, o profissional liberal somente será

responsabilizado se for demonstrado que agiu com culpa.292

291 BRASIL, Tribunal de Justiça do Paraná . Apelação Cível n. 0241611-3.

Décima Quinta Câmara Cível. Julgada em 07/11/2007. Relator Sérgio Luiz Patitucci. Disponível em <http://portal.tjpr.jus.br/web/jurisprudencia> acesso em 30/10/2010.

292 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6 ed. rev., atual. e amp. São Paulo: RT, 2004, p. 160.

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101

Stoco293 destaca que:

[...] em ambas (obrigações de meio e de resultado) a responsabilidade do profissional está escorada na culpa, ou seja, na atividade de meios culpa-se o agente pelo erro de percurso mas não pelo resultado, pelo qual não se responsabilizou. Na atividade de resultado culpa-se pelo erro de percurso e também pela não obtenção ou insucesso do resultado, porque este era o fim colimado e avençado, a "meta optata".

E conclui:

No primeiro caso (obrigação e meio) cabe ao contratante ou credor demonstrar a culpa do contratado ou devedor. No segundo (obrigação de resultado) presume-se a culpa do contratado, invertendo-se o ônus da prova, pela simples razão de que os contratos em que o objeto colimado encerra um resultado, a sua não obtenção é "quantum satis" para empenhar, por presunção, a responsabilidade do devedor.294

Tem-se, assim, que a Responsabilidade do profissional liberal

pelos serviços por ele prestados é subjetiva. A distinção da obrigação assumida é de

suma relevância para a comprovação da culpa: sendo de meio, o consumidor deverá

provar a culpa do profissional, salvo se for caso de inversão do ônus da prova;

sendo de resultado, a inversão é automática, devendo o profissional provar que não

laborou com culpa, sob pena de ser responsabilizado.

293 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil , p. 161. 294 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil , p. 161.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta monografia teve como escopo a análise da

Responsabilidade Civil dos Fornecedores em face do Código de Defesa do

Consumidor, utilizando-se, para tanto, de entendimentos doutrinários, legais e

jurisprudenciais.

Conforme se infere da pesquisa acerca da Responsabilidade

Civil, esta existe desde os primórdios da vida em sociedade. Os primeiros relatos

dão conta de que era ela puramente objetiva, de forma física, e marcada pela

solidariedade entre os integrantes de um grupo. Posteriormente, este aspecto

coletivo deu lugar a uma espécie de defesa individual, que, diante de certas

circunstâncias, se mostrava ineficaz. O grande marco para a evolução da

Responsabilidade ocorreu no Direito Romano, mais precisamente com a edição da

Lex aquilia, que estabeleceu contornos subjetivos ao instituto e cristalizou a

reparação pecuniária.

O Direito consumerista, por sua vez, iniciou-se com o

liberalismo, marcado pela igualdade entre as partes e o respeito ao princípio da

pacta sunt servanda. Contudo, com a Revolução Industrial, momento em que se

intensificou a produção em massa e as práticas abusivas dos fornecedores, surgiu a

necessidade de leis para regular as relações de consumo. Assim, o Estado passou a

interferir no direito privado, mormente com a edição de leis protetoras do

consumidor, parte mais fraca da relação, que teve origem nos Estados Unidos.

No Brasil, em que pese existir há muito tempo previsão legal

acerca da Responsabilidade Civil (cite-se, por exemplo, o Código Civil de 1964),

somente com a elaboração da Constituição Federal de 1988, foi determinado, por

meio do artigo 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a elaboração

do Código de Defesa do Consumidor, com o desiderato de estabelecer os direitos

fundamentais do consumidor (ao próprio consumo, à segurança, à escolha, à

informação, a ser ouvido, à indenização, à educação para o consumo e a um meio

ambiental saudável).

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Assim, em 11 de setembro de 1990, foi elaborado o Código de

Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078), que disciplina, dentre outros direitos e

institutos, a Responsabilidade Civil dos Fornecedores.

Pois bem. Após o estudo da Responsabilidade Civil dos

Fornecedores prevista no Código de Defesa do Consumidor, infere-se que as

hipóteses argüidas, com algumas ressalvas, se confirmaram, senão veja-se:

a) A Responsabilidade Civil dos Fornecedores está disposta no

Capítulo IV, Seções II (da Responsabilidade pelo Fato do Produto e do Serviço) e III

(da Responsabilidade por Vício do Produto e do Serviço) do Código de Defesa do

Consumidor, correspondentes ao artigo 12 ao 25 da Lei consumerista;

b) O Código de Defesa do Consumidor impõe, em regra, o

regime de Responsabilidade Civil objetiva para as relações de consumo, de modo

que os fornecedores, nos termos dos artigos 12, 13 e 14, respondem

independentemente da existência de culpa;

c) O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 14, §4º,

confere tratamento diferenciado aos profissionais liberais. Com efeito, esse

dispositivo legal estabelece uma exceção à regra da Responsabilidade Civil objetiva

dos fornecedores, dispondo que o profissional liberal terá sua Responsabilidade

apurada mediante a verificação da culpa (Responsabilidade Civil subjetiva).

Importante frisar que tal exceção é aplicável sempre que se tratar de fornecedor

profissional liberal, independentemente se a obrigação por ele assumida é de meio

ou de resultado;

d) Em que pese na maioria das hipóteses insertas no Código

de Defesa do Consumidor todos os fornecedores responderem solidariamente, a

Responsabilidade Civil do comerciante por acidentes de consumos oriundos de

defeitos no produto é meramente subsidiária. De acordo com o artigo 13, I, II, III, do

Código de Defesa do Consumidor, o comerciante somente responderá pelos

defeitos do produto caso não forem identificados o seu fabricante, construtor,

produtor ou importador, quando o produto for comercializado sem a identificação

clara do seu fornecedor mediato ou se ele conservou o produto perecível de forma

inadequada;

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e) O artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor obriga os

órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob

qualquer forma de empreendimento a prestarem serviços adequados, eficientes,

seguros e, no que tange aos essenciais, contínuos, sob pena de serem compelidos

a prestarem-os nessas condições ou, até mesmo, a reparar os danos causados, nos

termos da Lei consumerista. Entretanto, conforme entende a doutrina e

jurisprudência dominante, apenas estão incluídos na esfera do direito do consumidor

os serviços uti singuli, remunerados por meio de pagamento de tarifas.

Assim, com base no que foi estudado, estão postos os pontos

relevantes concernentes às hipóteses apontadas na introdução.

Importante frisar que a presente monografia não busca esgotar

o assunto, mas ser um elemento para aumentar a discussão sobre a

Responsabilidade Civil dos Fornecedores em face do Código de Defesa do

Consumidor, mormente considerando a amplitude da matéria e a constante evolução

das relações consumeristas, que enseja, por conseguinte, novos entendimentos e

situações merecedoras de novas pesquisas.

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