a representaÇÃo das mulheres na polÍtica brasileira

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    Fernanda Beatriz Caricari de Morais

    A REPRESENTAO DAS MULHERES NA POLTICABRASILEIRA: UM ESTUDO SOB A PERSPECTIVA

    SISTMICO-FUNCIONAL1

    (The representation of brazilian women in politics:a study in the Systemic-functional perspective)

    Fernanda Beatriz Caricari de Morais(Pontifcia Universidade Catlica PUC/SP)2

    ABSTRACT

    This study aims to analyze the representation of women politicians inarticles. Linguistics Functional Grammar was used to analyze the ideationalmetafunction, so as to characterize the use of the language as representation.

    Results show that although Brazil had many social and politics changes,women and men had different representations. Many times, women arerepresented by their private lives and their female characteristics and not bytheir professional characteristics and competence. Men are represented bytheir competition and dishonesty.Keywords: woman, politician, Linguistics Functional Grammar, writtenmedia.

    RESUMO

    O objetivo desta pesquisa analisar a representao da mulher polticaem artigos de revistas de circulao nacional. Utilizou-se a LingusticaSistmico-Funcional para a anlise lingustica, em especial, a metafuno

    1. Este trabalho um recorte de minha pesquisa de mestrado intitulada: Asmulheres na poltica brasileira: um estudo sob a perspectiva sistmico-funcional.Dissertao de mestrado em Lingustica Aplicada e Estudos da Linguagem pelaPontifcia Universidade de So Paulo (PUC-SP) sob orientao da Profa. Dra.Leila Barbara.

    2. Graduada em Letras Ingls/Portugus pela Pontifcia Universidade Catlica deCampinas, onde realizou projeto de inciao cientfica com foco na representaodo feminino, sob superviso da Profa. Dra. Astrid Sgarbieri. Possui Mestradoem Lingustica Aplicada e Estudos da Linguagem pela Pontifcia Universidade deSo Paulo (PUC-SP) sob orientao da Profa. Dra. Leila Barbara. Atualmente doutoranda do mesmo programa sob a mesma orientao.

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    ideacional que caracteriza o uso da linguagem como representao. Osresultados possibilitam dizer que apensar dos avanos polticos e sociais da

    sociedade brasileira, os homens e as mulheres polticas so representados demaneiras diferentes. Elas, muitas vezes, so representadas pelas suas vidas

    privadas e suas caractersticas femininas e no por suas caractersticas ecompetncia profissionais. Eles so representados pelas suas disputas e

    desonestidades.Palavras-chave: Mulher, poltica, Lingustica Sistmico-Funcional, mdiaimpressa.

    IntroduoA pesquisa realizada fez parte do Projeto DIRECT (em direo

    linguagem do trabalho), desenvolvido no Programa de Estudos dePs Graduao em Lingustica Aplicada e Estudos da Linguagem(LAEL) da PUC-SP e teve como objetivo geral descrever e analisarcomo profissionais da rea poltica brasileira so representados, tendocomo foco de anlise da representao da mulher poltica em artigosde revistas de circulao nacional.

    Como esta pesquisa est inserida na rea da Lingustica Aplicada,alm de analisar a linguagem atravs de uma teoria lingustica, busca-

    se em uma outra rea do conhecimento, a de Cincias Polticas,subsdios para o melhor entendimento do papel da mulher na polticabrasileira.

    Pesquisas na rea de Cincias Polticas, como o de Avelar (2001)e Grossi e Miguel (2001), contribuem para o melhor entendimento daimportncia e dos desafios da mulher na poltica. A questo centraldessas pesquisas a analise da participao efetiva das mulheres econsideraes sobre as razes do lento processo de mudanas polticasdo pas e democratizao da sociedade brasileira sem discriminao degnero. Para realizar essas anlises, apia-se na Lingustica Sistmico-Funcional de Halliday (1994, 2004) e seus seguidores como Eggins(1994) e Thompson (1996). A Lingustica Sistmico-Funcional(doravante LSF) uma teoria de linguagem que est preocupada como uso efetivo da linguagem em diferentes contextos.

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    As pesquisas lingusticas sobre mulheres, como a de Fabrcio(2004) e a de Heberle (2005), e sobre mulheres polticas, como as deSgarbieri (2005, 2006), servem como apoio nas discusses das repre-sentaes feitas sobre a mulher poltica. Para a realizao da presentepesquisa foram coletados 52 artigos que tratam da mulher polticano perodo de 2002 a 2007 nos sites das revistas Veja, poca e Isto.Essas publicaes foram escolhidas por abordarem acontecimentos docenrio poltico brasileiro e circularem em todo territrio nacional.Aps a coleta, os artigos foram tratados com o auxlio da ferramentacomputacional WordSmith Tools (Scott, 1998), visando responder s

    seguintes perguntas sobre a representao das mulheres polticas:

    1. Como a mulher poltica brasileira representada pela mdia im-pressa? Essas representaes so positivas, negativas ou neutras?2. Quais escolhas lingusticas so responsveis por estarepresentao?3. Como se manifestam as diferenas e/ou semelhanas nasrepresentaes dos profissionais (homens e mulheres) na reapoltica?

    Para esta ltima pergunta cujo objetivo a comparao,coletamos artigos sobre homens polticos nas mesmas publicaes.

    As mulheres polticas brasileiras

    Apresenta-se, neste item, uma viso geral dos estudos sobremulher poltica na rea de Cincias Polticas e de Lingustica Aplicadaque serviram como base para a discusso dos dados. Os estudossobre a participao das mulheres na vida poltica, no incio do sculoXX, colocaram em relevo aspectos relacionados com a evoluo dessaparticipao sob a perspectiva de mudanas sociais, culturais e polticasda sociedade. Destacam-se as mudanas na famlia, novas formas deproduo no mundo do trabalho com impacto nas relaes sociais,as conquistas femininas ao longo do sculo XX e o amadurecimento

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    de uma conscincia feminista, mudanas que acabaram por abalaras estruturas seculares sobre as quais se assentava a dominaomasculina em todas as esferas da vida pblica. No caso do Brasil, asanlises sobre mulheres na poltica levam em conta as razes do lentoprocesso de mudanas polticas, principalmente no campo dos direitosde cidadania, conforme apontam os estudos de Avelar (2001).

    Os direitos de cidadania so lentamente ampliados para ossegmentos desprivilegiados. As mulheres so bons exemplos para seter a idia de quanto longo o caminho da luta pela extenso realdos direitos de cidadania. A autora (op.cit.) enfatiza, ainda, que

    os movimentos urbanos dos anos 20 e 30 deixavam claro que asconquistas femininas no implicariam alterar a estrutura da sociedadee da famlia. Esses foram frutos da ao de mulheres de classe alta ereiteravam a poltica conservadora da poca.

    Somente em 24 de fevereiro de 1932 as mulheres conseguiramo direito ao voto por um decreto do presidente Getlio Vargas. Ostemas defendidos pelas feministas dos anos 30 eram: os interessesdas mulheres trabalhadoras, a necessidade de instituir educaoem colgios mistos, a mudana da legislao que reconhecia comoincapaz a mulher casada, a poltica voltada s crianas abandonadas ea emancipao econmica das mulheres. O posicionamento ideolgicodas mulheres tornou-se mais claro na medida em que no pas seconstrua um novo espao, o espao poltico da esquerda.

    O feminismo, como uma ideologia poltica, um elementocrucial na construo de identidades polticas femininas, porque umconjunto estruturado de idias que guia a ao poltica. A conscincia deque as mulheres so discriminadas e no usufruem das mesmas condiesde igualdade que os homens; a convico de que isso resultante dasituao de desigualdade estrutural das mulheres na sociedade e doreconhecimento de que so necessrias solues grupais, resultantesda ao coletiva, para a mudana em termos estruturais. Segundo Reis(2000), essa mudana um processo cognitivo, intelectual, construdosocialmente, e no apenas uma viso de mundo.

    A luta feminista se insere na luta pela democratizao deuma sociedade, e ela idntica quela de qualquer outro grupo

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    marginalizado da sociedade. Avelar (2001) toma as palavras de Reis(2000) para exemplificar esta luta pela democracia:

    Uma sociedade no ser democrtica na medida em que asoportunidades dos indivduos estejam condicionadas por sua inseronesta ou naquela categoria social: sejam quais forem os critrioscom base nos quais tais categorias se constituam (raa, classe, etnia,religio, gnero...), a sociedade assim caracterizada ser fatalmentehierrquica e autoritria,e as oportunidades diferenciais por categoriasde expressaro, ao cabo, o desequilbrio nas relaes de poder entre elase a subordinao de umas s outras. (AVELAR, 2001:26)

    Apesar da luta feminista, no Brasil, a entrada das mulheres napoltica, segundo Grossi e Miguel (2001:12), feita por dois grandescanais:

    U Participao em movimentos sociais, como: grupos debairro, sindicatos, etc.;

    U Relaes familiares, como o parentesco com um homempoltico, em geral, pai ou marido.

    As autoras (2001) discutem que, para muitas mulheres, chegar poltica pelo primeiro canal - o da participao em movimentossociais, seria enobrecedor, mas chegar poltica pelo segundo canal- o das relaes de parentesco seria desabonador, pois entraria napoltica de forma facilitada por relaes de clientelismo, presentes nacultura poltica brasileira. As mulheres que entram na carreira polticapelo primeiro canal so valorizadas pelo seu esforo pessoal. Por outrolado, as que entram pelo segundo canal so acusadas de terem sidoeleitas ilegitimamente, por terem se beneficiado tanto do prestgio,quanto das alianas feitas por um homem (pai ou do marido).

    Representada como uma carreira com duplo sentido, a carreirapoltica ora representada como fruto de projeto coletivo ideolgico,ora como fruto de um projeto totalmente individual. Por trs da crticas mulheres polticas parece haver uma viso de que a poltica deveria

    ser somente uma vocao e no uma carreira que exigiria um longoprocesso de formao.

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    As mulheres que seguiram tradies familiares no campo dapoltica, a sua prpria autoria e desejo, reconhecendo que muitasmulheres que contaram com o prestgio poltico dos seus maridos oupais, tomaram rumos independentes e, muitas vezes, at superaramo prestgio dos seus familiares. Pode-se chamar a representao damulher poltica de sub-representao poltica, por ser a mesma dasde outros grupos em condio de desigualdade nas condies de vidae na estrutura das oportunidades. Como outros grupos da sociedademenos privilegiados, as mulheres encontram-se fora dos processos dedeciso poltica. H muito o que avanar rumo igualdade entre os

    sexos, avanos que so lentos quando no h mulheres na poltica quedefendam temas que levariam igualdade.O nmero de mulheres nas cpulas partidrias brasileiras

    ainda muito pequeno. Se for analisada a presena feminina conformea tendncia ideolgica dos partidos, vemos que a maior presena dasmulheres encontra-se nos partidos de direita. Nos partidos constitudospelas foras polticas de esquerda, ainda pequena a participao damulher, como mostram os quadros abaixo sobre o nmero de mulheressenadoras e deputadas:

    W

    &

    ^ d d

    PC DO B 5 0 5 PDT 1 0 1

    W&> 5 4 9

    PMDB 9 0 9

    PP 3 0 3

    PPS 1 0 1

    PR 4 0 4

    PSB 6 1 7

    PSDB 3 2 5

    PT 7 3 10

    PTC 1 0 1

    ^ 1 0 1

    d 46 10 56

    Tabela 1: Senadoras e deputadas dos maiores partidos polticos brasileiros

    (Fonte: site da organizao Cfmea, 2007)

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    Conforme tabela acima, a participao das mulheres no Senadoe na Cmara ainda muito baixa. Se esses dados forem comparadoscom os referentes aos homens, tem-se uma diferena alarmante, comona tabela abaixo:

    D D D , , d

    &

    46 466 512

    ^ 10 71 81

    d 56 537 593

    Tabela 2: Diferentes representaes por sexo. (Fonte: site da organizao Cfmea, 2007).

    Segundo a tabela acima, as mulheres representam menos de 10%dos senadores e deputados brasileiros, este nmero muito pequenose pensar-se na poltica de cotas adotada pelo Governo em 1996 paraobrigar os partidos a investirem nas candidaturas femininas. A UnioInter-Parlamentar referencia o Brasil se encontra na 104 posio noranking de presena de mulheres no parlamento no mundo. Entreos pases do continente latino-americano, fica atrs, apenas, daGuatemala e do Haiti.

    A sub-representao um problema a ser resolvido, pois tratade uma questo de democratizao da representao e de justia paracom um desequilbrio que foi decorrente de vetos polticos histricos edesvantagens socioeconmicas, derivadas de preconceitos e valores degnero. H poucos estudos em Lingustica e Lingustica Aplicada quetratam da representao da mulher poltica brasileira. Sgarbieri (2003,2005) analisou a mulher poltica em artigos de revistas de informao,como esta pesquisa tambm analisa,Veja, poca e Isto e mostrouque as mulheres so muitas vezes representadas pelos seus atributosfemininos e seus parentescos polticos.

    H diversos trabalhos sobre a representao feminina, entre

    les: Widholzer (2005), Gastalo (2005), Bisol (2005) e Sabat (2005),que estudam as representaes das mulheres no discurso publicitrio.

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    Caldas-Couthard (1997, 2005) analisa no primeiro estudo como amulher descrita em notcias de jornais ingleses, mostrando emsuas anlises que as mulheres so sub-representadas, suas vozes somenos ouvidas e suas presenas menos significantes. No segundo,a autora analisa como as mulheres so representadas em narrativasna revista feminina de forma submissa em Marie Claire. Heberle(2005) analisa as representaes de identidade e gnero em ambientesmultimiditicos na internet e Fabrcio (2004) problematiza o papeldas histrias narradas pela imprensa escrita na construo da idia deidentidades generificadas e questiona mitos da mulher frgil, incapaz

    e descontrolada emocionalmente.

    3. A Lingustica Sistmico-Funcional

    Esta pesquisa tem como fundamentao terica a LingusticaSistmico-Funcional de Halliday (1985, 1994, 2004) e seus seguidoresEggins (1994), Thompson (1996), entre outros. A LSF tem como focoa linguagem em uso, por isso sua preocupao explorar como a lngua estruturada para o uso em diferentes contextos. Eggins (1994:40)baseada em Halliday (1985) define que uma das premissas bsicas

    da abordagem sistmico-funcional que o uso da lngua motivadopelas relaes sociais e que as escolhas lxico-gramaticais realizadaspelos falantes/escritores no so aleatrias e esto condicionadas pelocontexto.

    Halliday (1994:14) explica que na LSF a lngua interpretadacomo um sistema de significados que so realizados atravs dasformas lingusticas. A lngua vista como uma rede de escolhas,em que as formas lingusticas so analisadas levando-se em contaoutras possibilidades oferecidas pela lngua. A anlise do texto, emtermos gramaticais, considerada o primeiro passo para a anlise.A realizao de um texto acontece atravs das relaes semnticas egramaticais. A gramtica requerida por fornecer uma compreensoclara do sentido e da efetividade de um texto, por isso precisa teresta orientao semntica e funcional. A interpretao de um texto,

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    seja este oral ou escrito, deve levar em conta o contexto de suaproduo.

    Na LSF, a funcionalidade, segundo Halliday (1994:20) significaser baseada no significado e, o fato de ser gramtica entendido comoa interpretao das formas lingusticas. Por isso, a gramtica separa aspossveis variveis e aponta suas possveis funes para podemos dara nossa interpretao de um texto tanto pela sua descrio semnticacomo pelas caractersticas lingusticas. A linguagem vista comoprtica social, cujo uso motivado por uma finalidade, por isso ela um recurso usado pelos seres humanos para criar significados. Nessa

    perspectiva, como aponta Halliday (1985:4), a LSF estuda as maneiraspelas quais as pessoas utilizam a linguagem para atingir determinadosobjetivos em situaes especficas dentro de uma sociedade.

    Para saber o que significa uma escolha, precisa-se ver o contexto:o que isto significa na sociedade? quais so os fatores contextuaisque fazem uma escolha ser mais apropriada que outra? As escolhaslingusticas precisam ser identificadas, ou seja, as possibilidadeslexicais e estruturais que a lngua oferece para o uso precisam serexploradas, assim como, os significados que cada escolha expressa(Thompson, 1996:8).

    Ao fazer uma determinada escolha, o falante/escritor realizatrs tipos de significados simultaneamente:

    U Significados relacionados s representaes de poder esolidariedade, o que engloba as atitudes em relao ao outroe os papis sociais desempenhados;

    U Significados relativos representao da experincia atravsda lngua, sobre o que se fala e sobre o que (ou quem) agesobre o que (ou quem);

    U Significados relativos organizao do contedo damensagem, em relao com o que se diz e ao que foi dito.

    Esses trs tipos de significado esto relacionados com cadametafuno da linguagem: interpessoal, ideacional e textual. Para a

    anlise da representao da mulher poltica, concentra-se na metafunoideacional que reflete a representao sobre padres de experincia,

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    realidade e a experincia do que acontece dentro das pessoas, por isso,reflete a representao sobre o mundo. Nessa metafuno, a oraotem um papel central, pois nela que se incorpora um princpio geralde modelagem da experincia, que o princpio de que a realidade construda atravs dosprocessos, dos participantes e das circunstncias.

    O primeiro a ao ou estado propriamente ditos e representa-se por um grupo verbal. Os participantes so representados porgrupos nominais ou pronominais. So aqueles que realizam as aesou so afetados por elas. As circunstncias representam-se por gruposadverbiais e sua funo de acrescentar informao (es) s aes

    representadas pelos processos. Halliday (1994) explica que h trstipos de processo principais o material, o mental e o relacional. Osdemais, chamados intermedirios, so: o comportamental, o verbale o existencial. Para este artigo, optou-se por focar os processosrelacionais por ser eles o responsveis pela atribuio de caractersticas,identificaes e avaliaes no texto. O processo relacional so os daordem doser.

    4. Procedimento de coleta e tratamento dos dados

    Para responder as duas primeiras perguntas de pesquisa, estetrabalho utilizou um corpus formado por 52 artigos cujo tpicoprincipal ou titulo, se refere mulher poltica, corpus que denominou-se mulher poltica (MP). Para a questo de nmero trs, foi formadoum outro corpus com 52 artigos que fazem referncia a polticoshomens (HP). Para compor este ltimo corpus, foram selecionadosarquivos que tratavam de polticos em geral.

    Inicialmente, analisou-se como as mulheres so representadas.Com base nessa anlise e levando em conta a baixa participaopoltica das mulheres, decidiu-se coletar artigos que fazem refernciaao homem poltico com o propsito de analisar as possveis diferenase/ou semelhanas, dependendo do gnero do profissional enfocado.

    Os artigos selecionados foram gravados em arquivos individuaisno formato txt e foram submetidos a um tratamento de Lingustica de

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    Corpus atravs das ferramentas lista de palavras e concordanciadordo programa computacional WordSmith Tools 4.0 (Scott, 1998), quesero descritas a seguir. O quadro acima foi retirado dos nmerosestatsticos da ferramentawordlist do programa WordSmith Tools 4.0(Scott, 1998), apresentado no item seguinte.

    DW ,W

    d 194.839 190.234

    W 6.489 5.939

    d 32.750 31.829

    W 1.568 1.600

    E 81 1.200

    E 1713 11.412

    Tabela 3: Resultado estatst ico dos corpora.

    Os corpora foram submetidos a um tratamento computacionalpossibilitado pela Lingustica de Corpus (LC) que se faz presentemetodologicamente, nesta pesquisa, atravs de ferramentas doprograma WordSmith Tools 4.0 (Scott, 1998).

    Atualmente a LC, segundo Berber-Sardinha (2004), fornecesubsdios tericos e metodolgicos para muitas reas da Lingustica

    Aplicada (Ensino de Lnguas, Traduo, Anlise do Discurso,Lexicografia, etc), porque trabalha dentro de um quadro conceitualformado por uma abordagem empirista e uma viso de linguagemenquanto sistema probabilstico. O programa foi escolhido comoinstrumento de anlise de dados, pois possibilita o trabalho com umagrande quantidade de textos, alm de dispor de uma srie de recursosque so extremamente teis e poderosos na anlise de vrios aspectos dalinguagem, como: a composio lexical, a temtica de textos selecionadose a organizao retrica e composicional de gneros discursivos.

    Utilizamos duas das suas principais ferramentas para a anlise:a lista de palavras (wordlist) e o concordanciador (concordancer)3. A

    3. Como o programa est em Ingls, colocou-se em parnteses o nome das ferramentasno original.

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    primeira foi utilizada para organizar os corpora em listas das palavras.Elas podem ser ordenadas alfabeticamente ou pela frequncia com queaparecem, comeando pela palavra de maior frequncia. Nesta mesmaferramenta, foram obtidos dados estatsticos dos textos: nmero depalavras (tokens) e de palavras diferentes (types), nmero de oraes(sentence), etc. Ela nos ajudou tanto na organizao dos dadosestatsticos como na anlise das palavras mais frequentes utilizadaspara nomear os profissionais polticos.

    Atravs das listas de concordncias foi possvel estudar ocontexto de ocorrncia das palavras de busca simultaneamente em todo

    o corpus. Esta anlise, com base na Lingustica Sistmico-Funcional,que uma teoria de linguagem e um mtodo de anlise de textos emseus contextos de uso permite entender como os indivduos usam alinguagem e como a linguagem estruturada em seus diferentes usos.

    O suporte da LSF possibilita a analise de como os profissionaisda rea poltica so representados nos artigos e as diferenas e assemelhanas na representao do homem poltico e da mulher poltica.Halliday (1994:15) discute que qualquer anlise de discurso semprefeita em dois nveis; o primeiro a compreenso do texto: a anliselingustica permite que se mostre como e por que o texto significa oque significa; o outro nvel uma contribuio avaliao do texto:a anlise lingustica permite que se diga o motivo pelo qual o texto ou no um texto eficaz para os seus propsitos, e requer no somenteuma compreenso do texto, mas tambm de seu contexto (contexto decultura e contexto de situao) e do relacionamento sistemtico entreo contexto e o texto.

    5. Anlise e discusso dos resultados

    As anlises preliminares permitiram dividir as ocorrnciasem categorias maiores, baseadas tanto na semntica, ou seja, sobreo que elas tratam, como nos elementos da transitividade. Alm dosprocessos, h outros elementos (participantes e circunstncias) quepodem conduzir s categorias maiores, detalhadas a seguir:

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    b. &

    c.

    d.

    e.

    Quadro 2: Categorias de anlise

    Atravs das categorias apresentadas, organizou-se a anlise comfoco na representao da mulher poltica, quais so as escolhas lexicaisque expressam e realizam esta representao e quais so as diferenase/ou semelhanas com os homens polticos.

    As categorias de anlise mostram, a seguir, que os profissionaispolticos so constantemente identificados e avaliados pela mdiajornalstica por meio de processos relacionais, utilizados paraestabelecer relaes entre duas entidades, identificando ou atribuindocaractersticas a algo ou a algum.

    a) estratgias polticas

    Os exemplos abaixo representam dois candidatos, Marta Suplicye Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) em vspera de eleies:

    1. Marta salientou que, por enquanto, a nica candidata indicadapelo partido. (poca 16/12/2003).2. Alves o nico peemedebista que j se lanou candidato sucessodo alagoano Renan Calheiros. (poca 04/12/2007).

    Estas oraes intensivo-identificadoras representam os

    candidatos Marta e Alves com destaque por serem identificados comonicos, como mostram os identificadores a nica candidata... e o

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    nico peemedebista.... Marta, em sua fala, auto identifica-se como anica candidata mulher na disputa pelo Governo do Estado de SoPaulo indicada pelo seu partido, o PT. Da mesma forma como Alvesque identificado como o nico candidato de seu partido (PMDB) sucesso de Renan Calheiros (PMDB-AL).

    Assim como Marta se auto-identificou como a nica candidatamulher do partido, foram encontrados, nos artigos de HP, outrasidentificaes feitas pelos jornalistas sobre os candidatos EduardoSuplicy e Geraldo Alckmin:

    3.Ele o homem a ser batido nas eleies para o Senado em So Paulo.(Isto 15/03/2006).4. Por enquanto, ele o nome com mais chances de disputar o segundoturno com Lula. (Isto 18/06/2006).

    Em ambos tem-se oraes intensivos-identificadoras. Oidentificador em 3 enfatiza a disputa poltica e identifica Suplicycomo um candidato a ser derrotado pelos adversrios nas eleies.Analisou-se esse identificador, tambm, como uma aluso invencibilidade de Suplicy, pois ele possui um eleitorado cativo noEstado de So Paulo.

    De forma diferente, em 4, temos a identificao do candidato

    Alckmin (identificado) como o nico com chances de disputar osegundo turno nas eleies presidenciais. Notou-se que o identificador,aqui, coloca Lula como o candidato mais forte da disputa presidencial.

    Assim como os candidatos acima foram destacados, os exemplosabaixo destacam a Senadora Helosa Helena tanto por ser a primeiramulher a concorrer Presidncia, como por mostrar coragem eenfrentar um poltico poderoso:

    5. Candidata arretada. Expulsa do PT em 2003, Helosa Helena aprimeira mulher de expresso a concorrer Presidncia no Brasil. (Veja07/06/2006).6. Foi a primeira pessoa a enfrentar o cacique baiano Antonio Carlos

    Magalhes no Congresso Nacional - uma briga que at hoje lhe rendeacusaes pessoais e inimizades ferozes. (poca 10/02/2003).

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    Tem-se processos relacionais do tipo intensivo-identificadornos exemplos acima. O primeiro identificador (5) mostra a baixaparticipao das mulheres no cenrio poltico, conforme apontaAvelar (2001) em suas pesquisas. A participao feminina ainda muito pequena no pas e, embora com poucas mulheres envolvidas napoltica, houve um progresso, em especial, por ter a candidatura daprimeira mulher no Brasil, no ano de 2006.

    Ainda em 5, no incio da orao, temos Candidata arretada, cha-mada na LSF como orao menor. Para Halliday (2004:153) as fun-es das oraes menores so: exclamaes, chamadas, cumprimentos

    e alarmes. No caso de 5, a orao menor tem funo exclamativa einterpretou-se o seu uso como um grito sbito de admirao, geral-mente utilizado na fala. Na escrita acompanhado do sinal grfico deexclamao, ausente neste exemplo. O atributo arretada muito utili-zado no nordeste do pas e entende-se seu significado como sinnimode bacana e excelente e utilizado, aqui, para apreciar a candidata.

    Na segunda orao, neste mesmo exemplo, h umanominalizao emexpulsa do PTa partir de uma orao passiva queremete a um fato marcante tanto na poltica brasileira, na histria dopartido, como na vida poltica da Senadora. Em seguida, o identificadorda orao relacional intensivo-identificadora atribui Helosa Helenaa identificao de ser a primeira mulher de expresso a concorrer presidncia, representando-a como uma figura poltica importante. Ameno da expulso da Senadora foi interpretado como um recursopara mostrar sua fora, sua luta pelos ideais originais do PT e no porinteresses prprios.

    Em 6, o identificador enfatiza a coragem da Senadora HelosaHelena (identificado) ao enfrentar um poltico poderoso em pblico,como temos na circunstncia no Congresso Nacional. Nota-se que aSenadora no foi a primeira mulher, mas sim, a primeira pessoa aenfrent-lo, o que mostra um avano na sociedade, pois as mulherespassam a ser vistas no mais como seres frgeis e desprovidos deatitudes, mas como profissionais que podem fazer diferena na

    poltica. A consequncia desta briga, enfocada no final do exemplo,salienta ainda mais a coragem da Senadora.

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    Encontrou-se, em um artigo sobre HP, um exemplo do Ministroda Sade, Jos Gomes Temporo que se assemelha e ao mesmo tempodifere da referncia acima sobre Helosa Helena:

    7. Seu jeito direto de quem est sempre disposto a comprar brigas maisassociado ao esteretipo masculino. Em apenas dois meses no cargo,Temporo j arrumou confuso para um mandato inteiro. Por defendero debate sobre a legalizao do aborto, atraiu a ira da Igreja Catlica.(poca 05/11/2007).

    H uma aparente semelhana entre as representaes da

    senadora Helosa Helena e do ministro Temporo, pois ambos sorepresentados como profissionais que compram brigas. Enquanto noexemplo anterior, Helosa representada por brigar com um polticopoderoso, Antnio Carlos Magalhes, a circunstncia do processomaterial arrumou, em 16, enfatiza que em pouco tempo de mandatoTemporo causou muita polmica, como observou-se no processomental atraiu e no fenmeno desse processo a ira da Igreja Catlica.Destaca-se a comparao da postura briguenta do Ministro com oesteretipo masculino, como no atributo mais associado ao esteretipomasculino. Interpretou-se isto como uma afirmao machista dojornalista, pois as mulheres tambm podem adotar essa postura na

    poltica, como Helosa Helena nos exemplos analisados.

    b) reconhecimento polticoNos exemplos abaixo, os autores descrevem as qualidades de

    algumas mulheres polticas:

    8. A ex-prefeita Marta Suplicy, de So Paulo, um dos fenmenospolticos mais interessantes do Brasil. (Veja 23/03/2005).9. O PSOL no ter muito brilho poltico nem hoje nem no futuro...Isso no impedir a senadora Helosa Helena de se firmar como umarespeitvel figura poltica, coisa que ela j . (Veja 16/06/2004).

    As oraes intensivas-identificadoras identificam as participantes(Marta Suplicy e Helosa Helena) como profissionais de destaque

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    na poltica brasileira, atravs dos identificadores: um dos fenmenosmais interessantes... e uma respeitvel figura poltica. Analisou-se, em 9, o processo firmar como material, pois o interpretamoscomo sinnimo de estabilizar. Firmar tambm tem como meta umarespeitvel figura poltica, representando Helosa Helena como umaprofissional experiente, devido a sua vivncia na carreira poltica. Deacordo com o significado defenmeno, parte do identificador, Marta representada como uma poltica que possui qualidades extraordinriase surpreendentes.

    Nos exemplos seguintes temos mais identificadores sobre o

    desempenho poltico da senadora Patrcia Saboya e do Ministro daSade Temporo:

    10. Aos 41 anos, a senadora Patrcia Saboya Gomes (PPS-CE) umaestrela emergente no Congresso Nacional. Preside uma CPI mista parainvestigar a explorao sexual de crianas e adolescentes, vice-lder dogoverno, coordena a Frente Parlamentar da Criana e do Adolescentee integra a Comisso de Assuntos Econmicos, a mais poderosa doSenado. (poca 17/07/2003).11. Temporo um dos ministros mais ativos do governo Lula. Trabalhaem mdia 12 horas por dia e reconhecido como um talento na rea desade pblica. (poca 05/11/2007).

    Em 10, Patrcia Gomes identificada como uma profissionalque ganhou destaque na poltica. Nota-se, no artigo, a remio aoincio da sua carreira - acompanhando o seu ex-marido, Ciro Gomes.Depois da separao, Patrcia ganhou um grande destaque devido aoseu trabalho, como mostram os processos materiais:preside, coordenae integra e suas respectivas metas; e o relacional e seu atributo vice-lder do governo.

    Os temas trabalhados por Patrcia ganharam destaque; elaintegra tanto comisses ligadas ao social (crianas e adolescentes),como a econmica, enfatizada, no final da orao, como a comissomais poderosa do Senado. Avelar (2001) aponta, em seus estudos,

    que a maioria das mulheres trabalha com temas relacionados aosocial e os temas econmicos so, em geral, trabalhados por polticos

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    homens. Pode-se, portanto, notar um progresso na poltica brasileira,j que Patrcia trabalha com temas ligados tanto ao social como aoeconmico.

    No ltimo exemplo, por meio da meta e do fenmeno dosprocessos trabalha (material) e reconhecido (processo mental) est oento ministro Temporo, responsvel pela rea da sade, representadocomo um poltico trabalhador e com bons desempenhos na poltica.

    c) honestidadeChamou-nos a ateno, nos artigos sobre HP, as ocorrncias

    envolvendo diferentes polticos em situaes desonestas, o que noaconteceu ao analisar os artigos que fazem referncia MP. Buscou-seocorrncias, nos dados de MP, que envolviam casos de desonestidade,mas apenas foram encontradas avaliaes negativas sobre seusdesempenhos profissionais, por isso pode-se inferir que as mulheresno esto envolvidas nessas situaes, por parecerem ser mais honestasque os homens.

    Aqui os processos relacionais possuem funo de auxiliar nasconstrues passivas com o processo cassado tratam de diferentespolticos em situaes polticas delicadas. Alguns foram cassados porcorrupo e outros por participarem de crimes, como mostram os

    exemplos abaixo:

    12. Foi cassado na noite de quinta-feira, pela Cmara Legislativade Braslia, o mandato do deputado distrital Carlos Xavier (PMDB),acusado de ordenar o assassinato de um adolescente identificado comosuposto amante de sua ex-esposa. (Veja 06/08/2004).13. O mandato de deputado de Hildebrando foi cassado em 1999,por quebra de decoro parlamentar, aps investigaes sobre o crimeorganizado no Acre. Ele j foi condenado por trfico de drogas,formao de quadrilha e crime eleitoral. At a deciso de hoje, as penasde Hildebrando chegavam a quase 70 anos. (Veja 29/11/2006).14. O deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) foi cassado na noite destaquarta-feira em votao secreta na Cmara pela maioria dos votos dosparlamentares, que preencheram cdulas impressas. (Veja 14/09/2005).15. Entre os novos deputados, circula discreto pelo Congresso o gacho

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    Ibsen Pinheiro, do PMDB. Ele retorna depois de ter sido cassado comoum dos integrantes da mfia do Oramento. (Isto 21/02/2007).

    Os dois primeiros exemplos tratam da cassao de doisdeputados em situaes relacionadas com o crime, apresentamprocessos verbais na voz passiva: acusado e condenado. Nota-se quena passiva o participante que ocupa a posio de sujeito o poltico; aomisso do agente um recurso comum do texto que no explicitar oagente responsvel pela ao. Em 13, alm de ter participado do crimeorganizado, o texto apresenta um histrico sobre outras desonestidades

    cometidas pelo Deputado, explicitadas na circunstncia do processoverbal condenado.Em 14, o processo material mostra o deputado punido com

    cassao por ter participado de esquemas de corrupo, o mensalo.Em 15, o deputado volta vida pblica tendo sido cassado (processomaterial retorna) e sua circunstncia que tambm contm o processocassado na passiva.

    d) aparncia

    Nesta categoria, apresentam-se como os profissionais da poltica

    so representados pelas suas aparncias. A maioria dos exemplosremete s mulheres polticas, que so frequentemente representadaspelas caractersticas ligadas feminilidade. Nos artigos que tratam depolticos homens, h poucas ocorrncias desse tipo de representaes.A ocorrncia encontrada remete a um nico poltico o ex-presidenteFernando Collor de Melo.

    Uma das caractersticas femininas mais identificadas nos dados a beleza fsica, que muitas vezes, no discurso jornalstico, enfatizadaem detrimento de sua atuao profissional, como em 16 e 17:

    16. Salto alto, leveza, fina estampa e atuao combativa. Com essasarmas, Rita Camata (PMDB-ES), a escolhida para ser a vice do

    candidato tucano Jos Serra, tem a misso de barrar a curva ascendentede Luiz Incio Lula da Silva (PT). (poca 27/05/2002).

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    17. Alm de ser mulher e bonita fatores que podem ser decisivos numaetapa em que 23% do eleitorado feminino ainda no tem candidato ,Rita uma poltica de primeira linha. Chegou a Braslia como a Musada Constituinte, em 1987, mas 15 anos depois figura entre os maisrespeitados da casa. (poca 27/05/2002).

    Os exemplos acima foram retirados de um mesmo artigo queapresenta Rita Camata como candidata vice-presidente nas eleiespresidenciais. No incio do primeiro exemplo, salienta-se a descriode Rita por meio das particularidades femininas e somente a ltimaremete caracterstica profissional. Em 16, as primeiras caractersticas

    de Rita, encontradas no atributo mulher e bonita, tambm enfatizamo seu lado feminino. Nota-se que a atuao profissional apareceapenas posteriormente, como mostra o identificador seguinte umapoltica de primeira linha. A ltima orao, deste exemplo, ilustra queinicialmente Rita era considerada uma musa e somente 15 anos depoisfoi considerada uma poltica respeitada, o que permite dizer que amulher poltica alm de ser representada pelo seu trabalho e pelas suascaractersticas profissionais representada como mulher (pela suabeleza e pelas suas caractersticas femininas).

    e) relacionamentos familiares

    Nesta categoria, apresenta-se como os polticos sorepresentados atravs de suas relaes familiares. Conforme abordadoanteriormente, uma das formas de entrada da mulher no cenriopoltico brasileiro atravs das relaes familiares, como o parentescocom um homem poltico, em geral, marido ou pai, como podemos vernos exemplos 18 e 19:

    18. ... ele [ Gerson Camata] uma velha figura da poltica capixaba.(poca 27/05/2002).19. J o senador Eduardo Suplicy seria, para Marta, antes uma soluo

    que um problema. Tradicional campeo de votos, o petista um caboeleitoral e tanto. (Veja 28/07/2004).

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    Em 18 e 19 h oraes relacionais do tipo intensivo-identificadoras. Seus identificadores mostram a experincia polticado marido de Rita Camata e do ex-marido de Marta Suplicy. Pode-se notar que ambos os polticos so os identificados das oraes. Acircunstncia em 19, tradicional campeo de votos, utilizada paraavaliar Suplicy como um poltico querido e popular entre os eleitorese que poderia contribuir para uma boa imagem na campanha da ex-mulher Marta Suplicy. Nos artigos sobre MP, foram encontradasocorrncias em que as carreiras das mulheres polticas so influenciadaspelas de seus maridos polticos, mas o mesmo no ocorre nos artigos

    de HP. No foi encontrada nenhuma ocorrncia que os representasseatravs de suas esposas polticas. Acredita-se que o motivo se deve baixa participao das mulheres na poltica.

    Consideraes finais

    De modo geral, foram descritas as ocorrncias frequentes arespeito do reconhecimento do profissionalismo das mulheres e daconquista de seu espao na poltica. Algumas polticas so bastantepopulares e queridas pela populao. Os homens polticos, ao

    contrrio, possuem poucas ocorrncias ligadas ao reconhecimento e popularidade. Apenas dois polticos, Eduardo Suplicy e Jos Temporo,so representados por sua honestidade, competncia e popularidade.

    Acredita-se que esses aspectos apontam para mudanas narepresentao das mulheres. Levando em conta que a poltica, emnosso pas, uma rea em que a grande maioria homem, as mulheresesto mostrando-se competentes e conquistando mais espao.

    Deve-se lembrar que a mudana na representao das mulherespolticas um processo longo e que envolve aspectos sociais e culturaisde nossa sociedade. Espera-se que com o aumento da participaofeminina contribua para o desenvolvimento poltico e social do nossopas.

    Como esta uma pesquisa desenvolvida na rea de LingusticaAplicada, estudou-se a linguagem das revistas dentro de um contexto

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    social e espera-se, com este trabalho, ter contribudo para o melhorentendimento das representaes das mulheres polticas em nossasociedade.

    Esta pesquisa est delimitada em um perodo de 2002 a 2007,julga-se interessante um trabalho sobre a atual representao dasmulheres polticas j que houve mudanas na conjuntura polticae, hoje, tem-se uma mulher no cargo mximo a presidente DilmaRousseff. Outro aspecto importante analisar se os homens polticosso representados de forma diferente ou no pela mdia brasileira.

    Recebido em: julho de 2012Aprovado em: setembro de [email protected]

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