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UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA
FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
A RELAÇÃO DO COORDENADOR PEDAGÓGICO E O TRABALHO COLETIVO COM OS PROFESSORES E DIRETORES:
DESAFIOS E POSSIBILIDADES
AMARILDO GOMES PEREIRA
PIRACICABA, SP
(2013)
A RELAÇÃO DO COORDENADOR PEDAGÓGICO E O TRABALHO COLETIVO COM OS PROFESSORES E DIRETORES:
DESAFIOS E POSSIBILIDADES
AMARILDO GOMES PEREIRA
ORIENTADORA: PROFª. DRª. RENATA CRISTINA OLIVEIRA BARRICHELO CUNHA
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora do Programa de Pós-
Graduação em Educação da UNIMEP
como exigência parcial para obtenção
do título de Mestre em Educação.
PIRACICABA, SP
(2013)
BANCA EXAMINADORA
Profª. Drª. Renata Cristina Oliveira Barrichelo Cunha (orientadora) Profª Drª. Ana Maria Falcão de Aragão (UNICAMP) Profª Drª. Cláudia Beatriz de Castro Nascimento Ometto (UNIMEP).
DEDICATÓRIA
Escrevo esta dedicatória em reconhecimento a todos aqueles que tiveram
grandes influências na trajetória de minha formação acadêmica. Estou convencido
de que não existem conquistas individuais. Mesmo que, para se chegar a uma
posição mais elevada do mundo acadêmico ou profissional, a dedicação individual
seja fundamental, se olharmos para nossa história constataremos um número muito
grande de pessoas sem as quais não seria possível chegar aonde chegamos.
Assim, dedico este trabalho à Dona Celina, minha professora da 1ª série,
que me ensinou a ser estudante por meio de sua postura sempre exigente. Aos
seminaristas, que me levaram a acreditar que minha vida poderia ser diferente. Aos
meus colegas Derli, Reginaldo, Dercy, Isaias e Ademir com quem, juntos,
encaramos a jornada de voltar aos estudos. Ao professor Bachinn, cuja atuação
entusiasmada inspirou-me a ser professor. À Terezinha Santarosa, professora da
faculdade que, além dos conhecimentos, em muitos momentos me forneceu as
apostilas para estudar. Às colegas da faculdade Roseli e Élida que, nos momentos
em que as condições financeiras ameaçavam a interrupção dos estudos, estiveram
ao meu lado ajudando a enfrentar as crises. Ao meu irmão Eduardo, o grande
responsável por garantir o sustento da casa e o custeio da faculdade durante os
quatros anos em que eu me dedicava aos estudos.
Não poderia deixar de mencionar também o grupo de alunos e professores
do Núcleo de Formação de Professores, cujas aulas repletas de trocas de
experiências, reflexões e aprendizagens, foram de grande valor para a constituição
do problema de pesquisa, a percepção de lacunas no trabalho e para proporcionar
direcionamentos.
Por fim e, principalmente, à minha esposa, com quem compartilhei todo o
processo, desde a decisão pela realização do Mestrado até os momentos de
dificuldades e superações.
AGRADECIMENTOS
Tudo o que realizamos ocorre num contexto onde muitas pessoas, de forma
direta ou indireta, contribuem para o sucesso. Assim, um agradecimento que
abarque todas essas pessoas seria muito justo, no entanto, requer uma lista cujo
registro não seria possível neste trabalho. Desta forma, agradeço a todos que
contribuíram para a realização desta pesquisa e, em especial:
Ao meu Pai, o grande Deus, por ter estado ao meu lado em todos os
momentos.
Aos meus pais, José Gomes (in memoriam) e Dona Sebastiana que, embora
não pudessem contribuir com as tarefas escolares, souberam proporcionar uma
educação que se traduziu em caráter, respeito ao outro e honestidade.
À minha orientadora, Profª Drª Renata Cunha, pelo trabalho responsável e
exigente, tão necessário para que o comodismo não conduzisse a pesquisa à
estagnação e, ao mesmo tempo, por meio das orientações, por tornar claros os
caminhos que, às vezes, apresentavam-se tão obscuros.
Aos professores Drª. Roseli Pacheco Schnetzler, Drª. Maria Nazaré da Cruz,
Dr. José Maria de Paiva, Drª. Selma Venco e Dr. Cesar Romero, pelos diálogos
esclarecedores e instigantes.
Às professoras Drª. Ana Maria Aragão e Drª. Cláudia Ometto, por fazerem
parte da Banca Examinadora , cujas contribuições foram muito enriquecedoras.
Aos meus colegas coordenadores, sujeitos desta pesquisa, pela abertura e
comprometimento nos encontros de discussões, permitindo a realização do trabalho
de campo.
À Secretaria Municipal de Educação, que possibilitou o desenvolvimento da
pesquisa.
Aos funcionários da secretaria da Pós-Graduação da UNIMEP que, desde o
início, atenderam-me com muito carinho e competência.
À Universidade Metodista de Piracicaba e ao apoio da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES – Brasil, pelo qual foi
possível realizar este trabalho.
RESUMO
Essa dissertação de mestrado defende a escola básica como espaço de formação docente e desenvolvimento profissional e o coordenador pedagógico como responsável pela organização e articulação da formação continuada no contexto do trabalho coletivo em colaboração com os professores, corresponsáveis por essa formação. Admitindo a complexidade dessa tarefa, a pesquisa se propôs a compreender as condições de planejamento e encaminhamento das atividades de trabalho pedagógico (ATP) pelos coordenadores e identificar as suas dificuldades frente à articulação do trabalho coletivo e promoção da formação. A pesquisa, de natureza qualitativa, centrou-se no acompanhamento de seis encontros de formação para coordenadores pedagógicos oferecidos pela Secretaria Municipal de Educação de um município do interior paulista durante o primeiro semestre de 2012. O trabalho de campo foi documentado através de observação, registro em diário de campo, audiogravação dos encontros e transcrição a fim de responder a seguinte questão: quais as dificuldades dos coordenadores pedagógicos na articulação do trabalho coletivo e promoção da formação nas atividades de trabalho pedagógico? A partir da análise de conteúdo dos enunciados dos coordenadores foi possível reconhecer que os mesmos enfrentam muitas dificuldades para a realização de seu trabalho no cotidiano escolar e na condução do processo de formação desenvolvido nas ATP. Dois eixos de análise sistematizaram as dificuldades: a relação do coordenador com a direção e a relação do coordenador com os professores. Do ponto de vista da relação do coordenador com o diretor, a necessidade de aprovação e reconhecimento, uma vez que o acesso à função é por indicação, associada ao atendimento às demandas urgentes na escola constituem os principais desafios do coordenador. Na relação com os professores, a conquista do respeito e do reconhecimento do grupo de professores, a necessidade de abranger diferentes interesses e realidades e mobilizar os professores para o estudo e discussão, bem como buscar caminhos para construção do trabalho coletivo apresentam-se como fontes de preocupação. Para enfrentar essas dificuldades faz-se necessário instituir uma cultura de colaboração e participação democrática em que todos os atores da escola tenham clareza de sua função e potencial de contribuição para o trabalho coletivo da escola. Se a democracia na escola parece utopia, o autoritarismo e o individualismo são uma realidade, o que implica o investimento em uma formação e trabalho insistentes na consolidação do direito e da responsabilidade da participação na construção de uma escola de qualidade.
Palavras-chave: Coordenador pedagógico. Formação centrada na escola. Trabalho docente coletivo.
ABSTRACT
This master's dissertation defends the basic school as a space of teacher training and professional development, and the pedagogical coordinator as responsible for the organization and articulation of continuing education in the context of collective work in collaboration with the teachers, asserted by such training. Acknowledging the complexity of this task, the research is proposed to understand the conditions of planning and conduction of activities of pedagogical work (ATP, in Portuguese) by coordinators and identify their difficulties facing the articulation of collective work and promotion of training. The research, qualitative in nature, focused on the monitoring of six teaching coordinators training meetings offered by the Municipal Secretary of Education of a city in the countryside of the State of São Paulo during the first half of 2012. The field work was documented by means of observation, field journaling, audio recording of meetings and transcription in order to answer the following question: what are the difficulties of the pedagogical coordinators in the collective work articulation and promotion of the training in the activities of pedagogic work? From the analysis of content of utterances of the coordinators it was possible to recognize that they face many difficulties to carry out their work in school everyday and in conducting the process of formation developed in the ATP. Two axes of analysis systematized the difficulties: the relationship of the Coordinator with the direction and the Coordinator's relationship with teachers. From the point of view of the relationship of the Coordinator to the Director, there is need for approval and recognition, since access to the function is by indication, associated with the urgent demands attendance at school which constitutes the main challenges of the Coordinator. In the relationship with teachers, not only winning the respect and recognition of the group of teachers and the need to cover different interests and realities, in addition to mobilize teachers to the study and discussion, but also seek ways to build the collective work are sources of concern. To face these difficulties it is necessary to establish a culture of collaboration and democratic participation in which all the actors of the school have clarity of its role and potential of contribution to the collective work of the school. If democracy in school seems utopia, authoritarianism and individualism are a reality, which means the investment in insistent training and work in the consolidation of right and of the responsibility of participating in the construction of a school of social and educational quality.
Keywords: Pedagogical coordinator. Training focused on school. Collective teaching
work.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 10
CAPÍTULO 1 - A formação continuada de professores em contexto de trabalho ... 27
1.1. Formação continuada de professores: perspectivas .................................... 27
1.2. A escola: lugar de ensinar e de aprender ..................................................... 34
1.3. O desenvolvimento profissional do professor e o trabalho coletivo .............. 37
CAPÍTULO 2 - A coordenação pedagógica e o cotidiano escolar ........................... 43
2.1. O coordenador pedagógico como formador de professores .......................... 44
2.2. O dia a dia da escola e as ações do coordenador pedagógico na literatura
.................................................................................................................................. 50
CAPÍTULO 3 - Construção da pesquisa: a trajetória empreendida ......................... 60
3.1. Caracterização do local da pesquisa .............................................................. 61
3.2. Caracterização dos sujeitos da pesquisa ....................................................... 62
3.3. O desenvolvimento dos encontros: observações, registros e audiogravações
................................................................................................................................. 64
CAPÍTULO 4 - A articulação do trabalho coletivo e a formação dos professores:
interpretando os registros ....................................................................................... 70
4.1. As dificuldades da relação do CP com a direção .......................................... 72
4.1.1. Necessidade de aprovação e reconhecimento .............................................. 72
4.1.2. Atendimento às demandas urgentes na escola ............................................ 78
4.2. As dificuldades da relação do CP com os professores.................................. 90
4.2.1. A conquista do respeito e do reconhecimento do grupo de professores ...... 90
4.2.2. Abranger diferentes interesses e realidades e mobilizar os professores para o
estudo e discussão .................................................................................................. 96
4.2.3. Em busca de outros caminhos: o trabalho coletivo...................................... 103
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 107
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 115
ANEXO – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ................ 122
10
INTRODUÇÃO
Os saberes profissionais dos professores são temporais, ou seja, são adquiridos através do tempo [...] Uma boa parte do que sabem sobre o ensino, sobre os papéis do professor e sobre como ensinar provém de sua própria história de vida, e, sobretudo, de sua história de vida escolar [...] Os professores são trabalhadores que foram mergulhados em seu espaço de trabalho durante aproximadamente 16 anos (em torno de 15 mil horas), antes mesmo de começarem a trabalhar. Essa imersão se manifesta através de toda uma bagagem de conhecimentos anteriores, de crenças, de representações e de certezas sobre a prática docente. Esses fenômenos permanecem fortes e estáveis ao longo do tempo (TARDIF, 2011, p. 261).
A realização da presente pesquisa se dá no contexto de vivências humanas
individuais e coletivas, articulando experiências passadas, presentes e projetos de
futuro. Escrevo o texto da dissertação desempenhando a função de Coordenador de
Área da História numa Secretaria Municipal de Educação de um município do
interior do estado de São Paulo. Anteriormente, no momento do trabalho de campo,
desempenhava a função de Coordenador Pedagógico (CP) na mesma rede. Cabe
ressaltar que, antes disso, trabalhei como professor de História e Geografia.
Importa dizer que antes de ser coordenador e professor, reconheço-me
como uma pessoa dotada de conhecimentos, valores, crenças, cultura; sou ser
constituído na minha história de vida e na relação com os diversos grupos sociais
dos quais fiz e faço parte. Considerando a importância da trajetória de vida na
formação de um professor, descreverei brevemente minha história pessoal e de
formação escolar, percorrendo o longo caminho de estudos até chegar ao ingresso
no Mestrado, momento de produção deste trabalho.
Como bem ensina Tardif (2011), começamos a nos constituir como
professores muito antes de entrar na universidade, já que, para atuarmos, servimo-
nos também de nossa cultura pessoal, que provém de nossa história de vida. Assim,
tudo o que vivemos e aprendemos com nossos familiares, amigos e nas relações
com outras pessoas contribui para atuarmos como professores. A escolha por um
determinado tema de pesquisa também está inscrita na trajetória vivida.
De posse dessa compreensão, inicio descrevendo meu processo de
formação escolar, percurso este que pode ser dividido em várias etapas em razão
das constantes interrupções causadas, em grande parte, pelo atendimento às
necessidades básicas de subsistência.
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Desde criança, o trabalho para garantir meu sustento esteve ocupando o
espaço da educação escolar, fato que contribuiu para que precisasse de um longo
tempo para chegar à conclusão da faculdade e ao exercício da docência. O início de
minha formação escolar se deu aos sete anos, com o ingresso na 1ª série em 1975;
o término da Licenciatura em História ocorreu em 2001. Como se pode observar, foi
preciso um longo período para completar meus estudos.
Em síntese, da 1ª a 4ª série, 1975 a 1979, estudei na escola da Fazenda
Santo André, localizada na zona rural do município de Garça, SP. Em 1987,
frequentei a 5ª série. Em 1988 e 1989, cursei Mecânica Geral. Ambas as escolas
estavam situadas nessa mesma cidade. De 1991 a 1993, cursei a 6ª, 7ª e 8ª série
na modalidade Supletivo, em Americana, SP, de 1994 a 1996, o Ensino Médio em
Sumaré, SP. O ensino superior foi realizado numa universidade localizada em outro
município do interior do Estado de São Paulo.
Entre o término da 4ª série, em 1979, e o início da 5ª série, em 1987, houve
um espaço de sete anos, marcando a primeira e grande interrupção dos estudos.
Importa explicar esse período pelo grau de importância para a minha vida, devido às
interações e mediações humanas no meu processo de formação como pessoa e
como estudante, bem como pelos obstáculos e superações tão comuns na vida de
todas as pessoas.
Ao término desse primeiro ciclo de estudo, como todos os adolescentes da
fazenda onde morava, iniciei o ofício de lavrador, nome dado àqueles que
trabalhavam nas lavouras de café. O ensino oferecido aos alunos da fazenda
encerrava-se com a conclusão da 4ª série. Para dar continuidade havia a
necessidade de os moradores reivindicarem transporte até a escola mais próxima
que ficava a 16 km, porém, isso não aconteceu. Por qual razão?
Para os moradores, de maneira geral, e para meus pais, em particular,
ajudar no sustento da casa tinha mais importância do que dar continuidade aos
estudos. Ver os numerosos filhos alimentados era uma satisfação, era o que fazia
os pais dormirem em paz. Acredito ser este um pensamento que, comumente,
permeava a mentalidade dos moradores da zona rural nessa época.
Além da preocupação com o atendimento às necessidades básicas, os
investimentos do governo em educação, na década de 1980, não proporcionavam
condições para que se desenvolvesse uma cultura de valorização dos estudos.
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Parece que tanto para o governo quanto para nossos pais estava sedimentada a
ideia de que bastava às crianças aprender a ler e escrever, de forma bem
rudimentar, o que era possível concluindo apenas os quatros primeiros anos de
estudo.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)1, no
início da década de 1980, a taxa de analfabetismo no Brasil era de 25,41% e, na
zona rural, chegava a 46,21%. Esses dados alarmantes indicam o quanto estava
distante uma política voltada para a educação escolar nessa década. Meus pais
faziam parte desse enorme contingente da população.
Somente a partir da publicação da Constituição Federal de 1988 é que a
preocupação com a democratização da educação escolar ganhou destaque. Em seu
Art. 208 prescreve que “o dever do Estado com a educação será efetivado mediante
a garantia de que o Ensino Fundamental passe a ser obrigatório e gratuito, sendo
assegurada a oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade
própria” (OLIVEIRA; OLIVEIRA, 1998, p. 120). No entanto, isso indicava apenas
sinais de preocupação, expressos na Constituição, pois a realidade levaria ou levará
muito tempo para ser transformada, ou para que a educação seja democratizada de
fato.
A questão da igualdade de acesso implica considerar as profundas e históricas diferenças que tangenciam o modo como o direito à educação vem sendo concretizado no Brasil, pois é incontestável que a Constituição de 1988 permanece distante de uma concretude aos sujeitos que compõem o sistema de Educação brasileiro. Aos filhos e filhas das classes populares, a igualdade de condições e, principalmente, a permanência na escola não se efetivam numa sociedade em que as condições sociais dos diferentes grupos que a compõem são de fato desiguais (SANTOS, MELO; LUCIMI, 2012, p. 07).
Se atualmente a educação escolar no Brasil enfrenta grandes desafios
devido à falta de investimentos e vontade política, o que esperar dela na década de
1980?
Com base nessas informações é possível compreender o quanto esse
contexto contribuía para que não se desenvolvesse a consciência sobre a formação
escolar como prioridade, o que nos leva a entender por que não havia, entre os
moradores dessa fazenda, a preocupação com a escolarização dos filhos, mas tão
1 Dados fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Censo Demográfico 1980/2000. Disponível em: <www.ibge.com.br> Acesso em: 02 out. 2013.
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somente a de ensiná-los a lidar com os instrumentos necessários ao cultivo de
produtos agrícolas.
Como bem explica Linhares (2008, p.100),
o valor dado por essas famílias à escolarização [...] em parte, é porque não estava em jogo unicamente (ou propriamente) uma questão de valor, mas uma questão de necessidades e urgências cotidianas: os frutos do trabalho eram imprescindíveis para a vida imediata, [...] enquanto os frutos do estudo eram não só duvidosos como, de toda forma, projetados para uma vida futura, distante e incerta.
Assim, dar continuidade aos estudos não estava no pensamento do homem
da roça, não fazia parte de seus planos. Em primeiro lugar, por causa da
necessidade de garantir a sobrevivência; em segundo, pela falta de conhecimento
sobre a importância da educação como promessa de uma vida melhor.
Convivendo nesse meio seria impossível para meus pais pensar diferente.
Desta forma, meu primeiro registro em carteira data de 01 de setembro de 1982
com o cargo de Serviços Gerais2, embora já trabalhasse sem registro desde o
término da 4ª série, em 1979.
Assim, com 14 anos, tornara-me um trabalhador registrado. Estava
“matriculado” na escola do mundo do trabalho. Iria aprender todos os ofícios de
lavrador: conhecer os segredos da terra, o tempo de semear as sementes, o de
reconhecer quando os grãos estarão maduros o suficiente para colher, entre outros
afazeres, e também adquirir seu modo de vida, de se expressar, pensamento,
enfim, seria eu, num futuro próximo, um homem do campo.
No exercício dessa profissão, à medida que o tempo ia passando, os
saberes do dia a dia como trabalhador passaram a fazer parte cada vez mais de
minha formação e, em contrapartida, as aprendizagens escolares, aos poucos,
foram caindo no esquecimento.
Os elogios da professora pelas boas notas, aos poucos, foram substituídos
pelos elogios dos homens da roça: “Seu Zé, esse menino já está deixando os
grandes pra trás”! “Logo, logo ele vai puxar a enxada igual um homem formado”!
Falas como essas e outras semelhantes soavam como uma linda melodia aos
ouvidos de meu pai, que as repetia para minha mãe ouvir. Isso tudo também me
2 Nessa época, os adolescentes com essa idade podiam ser registrados como trabalhadores e
recebiam um salário mínimo como os demais.
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contagiava. Se no período da escola sonhava buscar alguma coisa por meio dos
estudos, após um bom tempo convivendo nesse meio os sonhos deixaram de
existir.
Nesse contexto de interações, essa convivência me levaria à assimilação
dos costumes, dos anseios, do linguajar do homem da roça, afastando-me, de forma
concreta, do universo da escola, do mundo das ideias, das aprendizagens dos
livros; os movimentos dos dedos para escrever, o raciocínio para compreender as
palavras, enfim, tudo fora se perdendo. Segundo Martins (2009, p. 9),
é nas relações sociais e pela intervenção do outro, que nos constituímos enquanto sujeitos produtores de cultura, a qual se materializa, cotidianamente, pelos nossos modos de agir que são regidos por convenções estabelecidas na coletividade de nossas práticas sociais, das quais nos apropriamos.
Com o passar dos anos, mergulhado nesse mundo, meus ideais de vida
estavam se consolidando: constituir família, ter filhos, trabalhar para sustentá-los
etc. O modo de viver, de pensar do grupo, havia sido internalizado.
Mas, como diz o poema de Fernando Teixeira de Andrade (apud PEREIRA,
2009, p.3), chega um tempo em que é preciso abandonar determinada maneira de
viver, para se buscar algo diferente.
Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas... Que já tem a forma do nosso corpo... E esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares... É o tempo da travessia... E, se não ousarmos fazê-la... Teremos ficado... para sempre... à margem de nós mesmos.
Quando minha vida de trabalhador da roça já estava consolidada surgiram
na fazenda dois rapazes a quem os moradores chamavam de seminaristas. Essa
maneira de identificá-los me faz hoje ter dificuldades para lembrar seus nomes; se
não me falha a memória, um deles se chamava Amâncio.
Todos os anos os seminaristas eram enviados à fazenda durante a Semana
Santa, pela Igreja Católica, diocese de Garça, para trabalhar com a evangelização e
com encontros de reflexão para jovens. Este encontro a que me refiro ocorreu em
1985. Os seminaristas passavam a semana realizando reuniões. Esses momentos
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eram especiais para os moradores, pois todas as noites havia orações, encontros
com adultos, com as crianças, com os jovens e outras atividades.
Num dos encontros realizados com os jovens, eles nos falaram sobre a
importância dos estudos para as pessoas, principalmente para os adolescentes e
jovens. Procuravam nos mostrar que precisávamos buscar algo maior para nossas
vidas. Não entendiam como não estudar era aceito como algo natural por nós.
Olhando para esse tempo, posso perceber que ocorrera aí o encontro de
dois mundos diferentes: os seminaristas com uma mentalidade da zona urbana,
cujas necessidades conduziam a olhar a educação escolar como algo indispensável;
e os moradores, cujo atendimento das necessidades não dependia da formação
escolar. O encontro de dois modos distintos tende a provocar transformações e, no
meu caso, essas intervenções foram provocativas.
Até então eu não tinha consciência do significado de possuir somente a
formação até a 4ª série. A vida era aquilo que estava vivendo, não vislumbrava
mudanças; o tempo do estudo havia ficado para trás. Agora, diante das
preocupações com os afazeres do cotidiano, ele não tinha importância para mim.
Afinal, para que servem os estudos a um lavrador?
Porém, as reflexões me desafiaram a romper com uma mentalidade já
consolidada, já que os seminaristas propuseram o início de um novo tempo, o
recomeço de uma nova história que fora interrompida.
Pela mediação do outro é que o sujeito se constitui e que constrói a significação daquilo que ele vivencia e, estando em seu grupo inserido, apropriado dos modos de fazer deste, a partir das necessidades surgidas, pela sua atividade, cria novos meios de agir e de se inter-relacionar. (MARTINS, 2009, p. 38).
E por que não um novo modo de pensar? Os seminaristas assumiram o
papel de mediadores, cuja ação, por meio das palavras orientadoras e
esclarecedoras, motivou-me a pensar sobre minha realidade e a criar coragem para
sair em busca de um ideal que estava adormecido, que havia sido interrompido pelo
trabalho.
Embora o desafio proposto fosse enorme, mas entusiasmados e cheios de
motivações, meus colegas e eu procuramos apoio do administrador da fazenda que
intermediou junto à prefeitura de Garça a condução para nos levar à cidade e nos
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colocar de volta aos bancos escolares. Entretanto, nossos desejos e planos só se
concretizariam dois anos depois. E por que tanta demora?
Para nossos pais, os filhos existiam também para ajudar no sustento da
casa. O tempo de estudar já havia se passado, agora era o tempo de trabalhar. O
que um jovem já se aproximando dos 19 anos iria fazer numa escola? De fato, eu
deveria voltar aos estudos me matriculando numa 5ª série; para mim, era
constrangedor, para meus pais, desnecessário.
A ideia de que cada coisa deve acontecer num momento certo formatava
meu pensamento também. O tempo do estudo. O tempo do trabalho. O tempo de
casar-se. Voltar a estudar significava desafiar essa lógica, significava ser diferente,
aquele que deseja ocupar um lugar que não lhe pertence mais. Eu precisava romper
com uma ideia que me paralisou e acomodou-me; eu precisava viver o “tempo da
travessia”.
Consciente dessa necessidade, em 1986, voltamos a insistir com nossos
pais e, no ano seguinte, fomos matriculados numa escola na cidade de Garça que
oferecia o ensino de 5ª a 8ª série no período noturno. Não era um supletivo, eu teria
que estudar os quatros anos para concluir o Ensino Fundamental. Meus pais e os
dos meus colegas entenderam que tínhamos o direito de buscar algo melhor para
nossas vidas.
Com essa conquista, um novo tempo se instaurou, o do trabalho e estudo:
trabalhar de sol a sol, viajar 16 km, estudar, viajar, dormir, acordar cedo, trabalhar,
viajar, estudar... Uma sucessão de convivências de tempos que se repetiriam
durante três anos.
No primeiro dia de aula, quando adentramos pelos corredores da escola, os
alunos ficaram paralisados. Os olhares curiosos e murmúrios interrogativos se
manifestavam por todos os cantos. Eu e meus colegas havíamos desembarcado da
condução, mas parecíamos ter desembarcado de uma nave espacial, considerando
o espanto causado a todos.
A diretora nos apresentou aos professores e recomendou que não
registrassem nossos nomes nos diários. Eles deveriam aguardar, pois, segundo ela,
provavelmente não conseguiríamos ficar. Ela sabia, mais do que nós, o quanto seria
difícil a jornada que estávamos empreendendo. Retornar aos estudos foi o primeiro
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e grande passo, mas a permanência, até nos dias de hoje, tem sido um grande
desafio.
Embora o desafio fosse gigantesco e se o que nos aguardava pela frente
eram dificuldades, essas eu já havia experimentado desde os primeiros anos de
vida quando meus pais trabalhavam para sustentar sete bocas, sem contar com
eles. Agora era o tempo de abandonar as roupas usadas no passado e vestir outra
roupagem, o que significava assumir a condição de estudante, superar
constrangimentos, inseguranças, dificuldades para chegar a outros lugares, adquirir
conhecimentos, ver e viver a vida de outra forma, diferente do que havia vivido até
então.
Começamos enfrentando os primeiros dias até chegar o primeiro mês;
enfrentamos os primeiros meses até chegar o final do ano com a conclusão da 5ª
série. Desta forma, todos os desafios foram vencidos, na base da superação, no
acreditar e no agir.
Nos anos seguintes, 1988 e 1989, cursei Mecânica Geral numa escola
técnica de Garça. Após a conclusão do curso mudei, juntamente com um dos meus
irmãos, o Eduardo, para a cidade de Caçapava, SP. Ele era mais novo e possuía
somente a 4ª série, mas minha mãe permitiu que ele fosse para não ver um dos
filhos sozinho e, assim, um deveria cuidar do outro. Porém, a difícil vida nesta
cidade nos levou a mudar para Campinas, onde um emprego noturno como
faxineiro e depois como ajudante de motorista, na cidade de Sumaré, SP, foram a
salvação para não passar necessidades.
Se por um lado eu tinha o sustento garantido, por outro, as longas viagens
impediam-me de dar continuidade aos estudos frequentando as aulas diariamente e
diante dessas condições cursei o Ensino Fundamental, de 6ª a 8ª série, numa
escola de ensino supletivo na cidade de Americana, SP, de 1991 a 1993,
comparecendo à escola somente para realizar as provas, uma vez que o tempo que
dispunha dava somente para isso. Estudava em casa.
No ano seguinte fui aprovado num vestibulinho de uma escola técnica na
cidade de Sumaré e cursei o Colegial, hoje Ensino Médio, de 1994 a 1996. E, por
fim, de 1997 a 2001, a faculdade de História. Valeria a pena descrever esse tempo
também, mas não farei isto neste momento.
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Com isso, transcorreram-se 26 anos, migrando de uma cidade para outra,
estudando em várias escolas, até tornar-me professor. Foi uma quantidade de
tempo muito superior ao utilizado quando se realiza o processo formativo seguindo
todas as etapas sem interrupções. No entanto, não existe um tempo marcado pra
ser professor. Existe? Tardif (2011) ensina que a constituição de um professor se
estende durante um longo período de tempo, que se inicia muito antes da formação
acadêmica, e que o professor continua em processo formativo. Assim, minha
formação ainda não foi concluída.
O tempo que precisei para estudar e a intensidade de interações, de buscas
e superações, tiveram impacto profundo na minha forma de ser professor e ser
coordenador hoje. Na forma como vejo e encaro os desafios, na forma que ensino e
aprendo, que oriento e compreendo as dificuldades, que valorizo as lutas e
conquistas. Somos pessoas constituídas na história de vida e carregamos as
marcas adquiridas no tempo.
Falando em tempo, acredito que este não está sob nosso domínio, ele irá
passar sempre, independentemente do que façamos; não podemos impedir.
Contudo, também não podemos deixar que ao passar nos deixe como legado um
amontoado de lamentações por não termos realizado nada de significativo. Como
também não podemos esperar que haja uma quantidade de tempo suficiente para
que possamos realizar as coisas que nos cabem.
Se eu não conseguisse superar essa maneira de pensar, provavelmente
não estaria escrevendo este trabalho. Lidar com o tempo de que dispunha foi
fundamental para a conclusão dos estudos até este momento. A existência do
tempo depende de nossa vontade, de nossa organização e determinação; ele
precisa ser criado. Caso contrário, acontecerá, como ressalta o poema de Mário
Quintana (1980 apud FREITAS; PORELI, 2011, p. 75):
Quando se vê, já são seis horas! Quando se vê, já é sexta-feira! Quando se vê, já é natal... Quando se vê, já terminou o ano. Se me fosse dado um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio. Seguiria sempre em frente E iria jogando pelo caminho a casa dourada e inútil das horas...
Enfim, essas migrações, se por um lado prejudicaram a realização de uma
formação sistemática – o tempo “certo” de estudar” -, por outro, proporcionaram a
19
convivência com vários grupos de pessoas, compartilhando muitas experiências, ou
seja, favoreceram o contato com várias formas de ver e viver a vida. Hoje, essas
experiências auxiliam, entre outras coisas, a entender o quanto é importante sair do
lugar em que atuamos para conhecer outras formas de ver e entender a realidade e
a necessidade de trabalhar em parcerias, aprender com o outro.
Nessas andanças, o que me levou a fazer a escolha pela carreira de
professor, em grande, parte está relacionado às aulas ministradas pelo professor de
História, Sr Bachinn. Até o 2° ano do Ensino Médio, início de 1995, não passava por
meus pensamentos fazer faculdade, devido às condições financeiras, embora já
estivesse consciente, pelos desafios que enfrentara, que a busca pelo
conhecimento era fundamental para ter uma vida melhor. A partir desse ano,
observando como esse professor se dedicava às aulas, sempre preocupado em
relacionar as aprendizagens com as questões sociais da época, senti o desejo de
ser professor.
Na época, estava engajado na Pastoral da Juventude da cidade de Sumaré
e tínhamos discursos revolucionários onde acreditávamos que deveríamos e
poderíamos transformar a sociedade com nossa atuação, reivindicando nossos
direitos ou denunciando as injustiças. O senhor Bacchim era um professor que fazia
das aulas de História momentos de discussões sobre as questões da atualidade e
isso me atraía. Arroyo (2011) confirma esse fato ressaltando que nosso aprendizado
de ser professor vem dos contatos com os mestres que tivemos desde o maternal.
Sempre fui agraciado por excelentes mestres, mas a motivação maior pela escolha
da carreira deve-se a esse professor.
Apesar de estar sintetizando uma história de 26 anos, percorrer todo esse
caminho foi sofrível. Concretizou-se graças a Deus e às pessoas com quem convivi,
a exemplo de meu irmão, Eduardo, que se sacrificou para que eu pudesse fazer a
faculdade; de Roseli e Elida, colegas de curso, e da Drª. Terezinha Zanlochi,
professora de História, que me socorriam com caronas, textos e muito incentivo.
Todas essas pessoas e outras tantas que estiveram sempre me auxiliando
levam-me a entender que as relações sociais não só contribuem para nossa
formação integral como também são fundamentais para que consigamos superar os
desafios que surgem em nossa trajetória de vida. Desta forma, não é possível dizer
que haja conquistas individuais, todas são resultado de ações coletivas. As pessoas
20
fazem parte de nossas conquistas, seja por meio do trabalho que nos prestam, de
um auxílio material, seja por meio de suas ideias que nos ajudam a enxergar
caminhos, a encontrar saídas para os nossos desafios.
Todo o sacrifício e apoio precisavam ser valorizados com o exercício da
docência. Agora eu teria que ir para a prática, cujo início ocorreu em 2003, por meio
de substituições de aulas na Rede Estadual e como professor de História na
unidade da Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor (FEBEM)3, de uma
cidade do interior de São Paulo. Foram dois anos de extremas dificuldades para
adaptar-me. Precisava de conhecimentos que pareciam ter desaparecido ao sair da
faculdade. Necessitava de um pouco de jogo de cintura para lidar com os discentes,
sentia falta de algo a mais para ser reconhecido como autoridade pelos alunos e
pelos pares. Foi angustiante esta etapa da vida!
Ainda na Rede Estadual, trabalhei, de 2005 a 2009, como professor efetivo
de História. Lecionei quatro anos em duas escolas públicas estaduais localizadas
em dois municípios do interior de São Paulo, um ano numa e três na outra.
Estou explorando essa passagem para elucidar que todas as escolas
apresentavam características diferentes em vários aspectos: direção, professores,
alunos, pais e comunidade, que possuíam suas próprias maneiras de vivenciar a
escola. Por outro lado, apresentavam algumas coisas semelhantes como, por
exemplo, os olhares dos professores, dos coordenadores e diretores frente aos
Horários de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC)4.
Em ambas tínhamos, de um lado, o trio gestor (diretor, vice-diretor e
coordenador pedagógico) conduzindo os encontros e, por outro, a rejeição por parte
dos professores em relação ao que era desenvolvido nas reuniões. Ainda eram
comuns, nas escolas, com relação aos HTPC, as discussões acaloradas a respeito
dos problemas enfrentados sobre o que era necessário ser feito etc., e a influência
da Secretaria Estadual de Educação de São Paulo, por meio das Diretorias de
3 Atualmente denominada Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA), é uma autarquia do governo do estado de São Paulo (Brasil), vinculada à Secretaria de Estado da Justiça e da Defesa da Cidadania. Sua função é executar as medidas socioeducativas aplicadas pelo Poder Judiciário aos adolescentes autores de atos infracionais com idade entre 12 e 21 anos incompletos, conforme determina o Estatuto da Criança e do Adolescente.
4 Estes horários recebem nomes variados dependendo da Rede de Ensino, como por exemplo, Atividade de Trabalho Coletivo (ATP), Atividade de Trabalho Coletivo Pedagógico (ATPC), Horários de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC), entre outros.
21
Ensino e seus supervisores, nas atividades ali desenvolvidas. Nestes aspectos,
parecia que nem havia mudado de escola.
Paralelamente ao exercício da docência na Rede Estadual, trabalhei como
professor efetivo na Rede Municipal de Ensino, local desta pesquisa, de 2004 até o
início de 2009, quando fui convidado a exercer a função de Coordenador
Pedagógico (CP)5 na escola onde tenho o cargo de professor atualmente. Cumpre
agora descrever o processo de transição do exercício da docência para a função da
coordenação pedagógica.
A forma de acesso nesta Secretaria variava de escola para escola e, no
meu caso, foi por meio de convite da direção. Assumir a função de CP, por meio de
convite, implicou logo de início desafios e dificuldades que influenciaram o decorrer
do exercício do meu trabalho. Entre os desafios estava o de como contribuir para a
resolução dos problemas que a escola estava enfrentando, como os casos de
indisciplina, a baixa aprendizagem dos alunos.
Uma das dificuldades estava em não possuir formação que pudesse orientar
meu trabalho frente a essas situações. Até poucos dias eu era professor ensinando
História e Geografia, mas agora tinha esses desafios pela frente. Ao mesmo tempo,
teria que conquistar o respeito dos colegas que, em sua grande maioria, eram mais
experientes do que eu e, por este e outros motivos, não estavam dispostos a
receber orientações de um professor recém-promovido à coordenação.
Minhas primeiras ações frente às dificuldades mencionadas foram
fundamentadas nas experiências adquiridas trabalhando como professor, nas
observações dos coordenadores que tive e nas minhas próprias crenças em relação
a resoluções de conflitos. O resultado foi que minhas ideias não tinham muita
aceitação e acabavam ficando no papel.
Sem estar preparado para a função, consciente das resistências dos
docentes diante das minhas propostas acabei, como esclarece Franco (2008),
dando prioridade àquilo que, de alguma forma, sabia ou conseguia fazer. Desta
maneira, gastei grande parte do tempo procurando atender aos chamados dos
professores, independentemente se eram atribuição de minha responsabilidade ou
5 Esse profissional também é identificado como Professor Coordenador (PC) em algumas redes, como a rede estadual paulista e como Orientador Pedagógico (OP), na rede municipal de Campinas.
22
de outros funcionários da escola, inspetor ou diretor. Assim, passei os primeiros
três anos.
Durante esse período procurei ler e estudar e foi participando de um curso
de Pós-Graduação em Gestão Escolar, em 2010, que tive contato com o livro “O
coordenador pedagógico e o cotidiano da escola”, organizado por Placco e Almeida
(2009). Contudo, parece que certas coisas só são entendidas no tempo certo, então,
apesar das muitas contribuições desse livro, continuei agindo da mesma forma que
antes. Acredito que seja pelo fato de que as ideias, por melhores que sejam, são
subjulgadas pelas turbulências do dia a dia.
Uma das ideias contidas no livro, mais especificamente no capítulo intitulado
“O papel do coordenador pedagógico na formação do professor em serviço”, escrito
por Geglio (2009), era de que a formação continuada de professores deveria ocorrer
no próprio espaço de trabalho. Essa foi uma ideia em que passei a acreditar e seria
uma saída para solucionar o problema da baixa procura pelos cursos de formação
continuada oferecidos semestralmente pela Secretaria Municipal de Educação
(SME).
Este era um dado observado na própria Unidade Escolar na qual trabalhava.
A argumentação mais comum era de que os professores acumulavam cargos e isso
estava prejudicando a participação em cursos de formação continuada. Assim, no
meu modo pensar, a formação desenvolvida dentro da própria escola seria uma
alternativa para solução desse problema. Além disso, julgava que o aprofundamento
dos estudos era importante para o enfrentamento dos conflitos diários na escola.
Hoje, após muitas leituras para realização desta pesquisa, entendo que a
formação continuada desenvolvida no contexto de trabalho não se justifica para
suprir deficiências de um programa de formação, mas pela própria necessidade
humana e profissional de estarmos nos desenvolvendo e nos aperfeiçoando
sempre. Também, porque não é possível supor, de antemão os problemas do
cotidiano.
Além da preocupação com a formação dos professores, sentia-me na
obrigação de investir em meus conhecimentos, pois na medida em que lia textos,
livros e me defrontava com situações problemáticas, percebia que precisava
conhecer mais sobre as vicissitudes no cotidiano escolar para estar
desempenhando a função com propriedade.
23
Foi neste contexto de inquietações e de busca que, no segundo semestre
de 2011, me inscrevi para o processo seletivo ao Mestrado na Universidade
Metodista de Piracicaba (UNIMEP), com a crença de que com uma qualificação
mais elevada estaria em melhores condições de dar respostas às questões
levantadas pelos professores e de apontar caminhos para a solução dos problemas
enfrentados na unidade escolar. O objetivo da aprovação foi atingido para minha
felicidade, de minha esposa, familiares e amigos.
Como projeto de pesquisa apresentei um tema e problema voltado para a
formação de professores em serviço. Contudo, ainda nos dois primeiros meses do
Mestrado, compreendi – por meio das leituras e discussões nas aulas ministradas
pelos professores – que os problemas enfrentados pela escola não seriam
resolvidos somente por meio da pesquisa, já que a solução depende de um conjunto
de ações coletivas que envolvem as diversas questões e setores da sociedade. As
pesquisas poderiam sim contribuir com as discussões e até mesmo apontar
possibilidades, mas não soluções.
Desta forma, baseando-me nas aprendizagens adquiridas nas disciplinas,
destacando aquelas obtidas durante as apresentações do projeto no Núcleo
Formação de Professores e as orientações, comecei a olhar diferente para a própria
coordenação pedagógica, função que estava desempenhando.
No primeiro semestre de 2012, junto a mais quatro coordenadores, participei
de um grupo de estudos em formação oferecido pela Secretaria Municipal de
Educação - SME. Nos encontros, à medida que íamos discutindo os temas,
acabávamos compartilhando as dificuldades enfrentadas no dia a dia de trabalho. O
fato de nos tornarmos coordenadores e não possuirmos formação para o exercício
da função despertou meu interesse de pesquisar quais seriam as dificuldades frente
aos desafios enfrentados no cotidiano de trabalho e na condução das atividades
desenvolvidas nos horários de trabalho coletivo; nessa Secretaria estes espaços
são conhecidos por Atividade de Trabalho Pedagógico (ATP).
A partir dessas indagações e junto ao grupo de mestrado, reelaborei o
projeto, encaminhando a pesquisa para essa direção, cujo tema passou a ser “As
dificuldades dos Coordenadores Pedagógicos frente ao desafio de promover a
formação continuada nas Atividades de Trabalho Pedagógico”. E como nos foi
ensinado nas aulas, o problema de uma pesquisa não vem pronto e nem aparece
24
de repente, é preciso indagar, buscar, fazer um levantamento bibliográfico e, a partir
daí, chegar a ele. Desta forma, passei a me dedicar à revisão bibliográfica que,
embora já viesse sendo realizada, estava sem um foco preciso.
Nesse processo, passei a realizar leituras que defendiam o CP como
formador de professores e a escola como locus desta formação, valorizando as ATP
como momentos de discussão, reflexão e formação (ZUMPANO; ALMEIDA, 2012;
CAMPOS; ARAGÃO, 2012; PLACCO; ALMEIDA; SOUZA, 2011; CUNHA; PRADO,
2010; PLACCO; SILVA, 2011; FUSARI, 2011).
Eu estava identificado com a ideia de que a escola é um lugar onde se
desenvolve o trabalho docente e será de formação do professor se for organizada
para este fim (PLACCO; ALMEIDA; SOUZA, 2011) e que se faz necessário um
profissional que organize este espaço/tempo para fins formativos, no caso o CP,
cuja função é planejar e acompanhar a execução de todo o processo didático-
pedagógico da escola (CAMPOS; ARAGÃO, 2012).
Sendo assim, entendo que a formação continuada no contexto do trabalho
deve privilegiar a discussão dos problemas e dilemas concretos da escola, valorizar
as experiências vividas pelos professores, reconhecendo-os como produtores de
conhecimentos inseridos num contexto social, cultural e político. Deste modo é que
concebemos as possibilidades de contribuição do CP como o profissional que, na
unidade escolar, responde fundamentalmente pelo processo de formação
continuada dos educadores.
Dessa forma, para que o CP consiga desempenhar sua função de formador
é necessário planejar e objetivar as ações a serem realizadas nos espaços de
formação de professores, planejar as reuniões, escolher os procedimentos para a
condução das mesmas, elaborar um diagnóstico sobre as necessidades de
formação, sobre os problemas e dificuldades do grupo, enfim, uma formação
consistente não pode acontecer por meio de improvisos, ao contrário, requer que se
trabalhe com planejamentos (SOUZA, 2011; CLEMENTI, 2011; TORRES, 2011;
ZUMPANO; ALMEIDA, 2012).
No entanto, segundo os autores, o dia a dia de trabalho do CP é marcado
pela improvisação de ações, por situações inesperadas e imprevisíveis, acúmulo de
tarefas, falta de tempo, desvio de função, atendimento a demandas urgentes,
constantes interrupções, rotina de trabalho burocratizada etc. (LIMA, 2009; GOMES,
25
2011; ARAUJO, 2007; SANTOS, 2008; PLACCO; SOUZA, 2012; TORRES, 2011;
OLIVEIRA, 2006; SOARES, 2011; CHRISTOV, 2009).
Neste contexto de discussão é que me propus a problematizar quais são as
condições de planejamento e encaminhamento das atividades de trabalho
pedagógico (ATP) pelos CP, buscando responder à seguinte questão: Quais as
dificuldades dos CP na articulação do trabalho coletivo e promoção da
formação nas ATP?
Nesta pesquisa, objetivamos compreender as condições de planejamento e
encaminhamento das atividades de trabalho pedagógico (ATP) pelos coordenadores
e identificar as dificuldades dos coordenadores frente à articulação do trabalho
coletivo e promoção da formação nas ATP.
Intentando responder à questão e atender aos objetivos propostos para este
estudo, a apresentação deste texto está organizada da seguinte forma:
Capítulo I: A formação continuada de professores em contexto de trabalho.
Neste capítulo estabelecemos como objetivo apresentar as discussões de alguns
autores a respeito da formação continuada desenvolvida dentro da escola no
contexto de trabalho docente. Destacam-se os entendimentos que fazem sobre a
temática da formação continuada, do professor enquanto sujeito no processo
formativo, da escola como lócus de formação e sobre as atribuições do coordenador
pedagógico, com ênfase em seu papel de formador de professores.
Capítulo II: A coordenação pedagógica e o cotidiano escolar. Neste capítulo
temos por objetivo discutir questões referentes ao trabalho do coordenador no
espaço da escola, apresentando o que os autores reconhecidos nesse campo de
conhecimento entendem como atribuições desse profissional, as condições em que
ele desenvolve seu trabalho e as dificuldades que encontra frente às diversas
demandas provindas dos gestores, professores e das Secretarias de Educação.
Capítulo III: Construção da pesquisa: a trajetória empreendida. Neste
capítulo, temos por objetivo descrever o percurso percorrido que visou responder a
questão: Quais as dificuldades dos CP na articulação do trabalho coletivo e
promoção da formação nas ATP? Apresentamos o processo de constituição dos
sujeitos, grupo de coordenadores pedagógicos convocados para participarem de
formação durante 1º semestre de 2012, a caracterização do local de pesquisa, a
organização e as discussões dos encontros.
26
Capítulo IV: A articulação do trabalho coletivo e a formação dos professores:
interpretando os registros. Apresentamos as análises das transcrições,
considerando os diálogos entre os CP sobre a organização e condução da formação
nas ATP, salientando as principais dificuldades encontradas, cujo objetivo é
responder a questão da investigação. Para realizar as análises foram efetuados
recortes e os dados foram organizados em dois eixos categorias mutuamente
relacionados: as dificuldades da relação do CP com a direção e as dificuldades da
relação do CP com os professores.
Considerações finais. Apresentam os resultados da pesquisa articulados à
questão norteadora deste trabalho. Trazem as limitações da metodologia adotada e
apontam as possibilidades para a continuidade de discussões sobre a temática.
27
CAPÍTULO 1 - A formação continuada de professores em contexto
de trabalho
Neste capítulo estabelecemos como objetivo sistematizar as discussões dos
autores a respeito da formação continuada desenvolvida dentro da escola, no
contexto de trabalho docente, valorizando o professor enquanto sujeito ativo no
processo formativo, a escola como lócus de formação e o coordenador pedagógico
como formador de professores nas atividades de trabalho pedagógico.
1.1. Formação continuada de professores: perspectivas
Compreendemos que a formação continuada é um processo
“multideterminado que acontece em vários espaços e em circunstâncias formais e
informais a partir das interações que promovem o diálogo entre conhecimentos
teóricos e saberes da experiência” (CUNHA; PRADO, 2010, p. 107).
Nesse trabalho de pesquisa nos detivemos, em especial, na formação
continuada desenvolvida no interior da escola, em contexto de trabalho, assumindo-
a como processo formativo permanente que acompanha a trajetória profissional do
professor. Trata-se de uma modalidade formativa que considera o docente enquanto
profissional da educação cuja formação inicial acadêmica ocorre no Ensino Superior
e que, pela característica própria do ser humano – pessoa em constante
desenvolvimento – estende-se ao longo de sua carreira, uma vez que “o professor
não está pronto, vai-se construindo” (CHRISTOV, 2001 apud BENACHIO; PLACCO,
2012, p. 61).
Tardif (2011, p. 266) valoriza o tempo histórico na constituição do ser
professor, uma vez que considera as vivências, as aprendizagens e experiências
humanas adquiridas ao longo do tempo, ou seja, a formação do professor antecede
e ultrapassa o período de formação acadêmica.
Os professores são trabalhadores que foram mergulhados em seu espaço de trabalho durante aproximadamente 16 anos (em torno de 15 mil horas), antes mesmo de começarem a trabalhar. Essa imersão se manifesta através de toda uma bagagem de conhecimentos anteriores, de crenças, de
28
representações e de certezas sobre a prática docente. Esses fenômenos permanecem fortes e estáveis ao longo do tempo.
Pensando dessa forma, é preciso reconhecer o professor como um sujeito
histórico que se constitui nas vivências e convivências ao longo do tempo e que
carrega consigo marcas de sua vida, aprendizagens, experiências, crenças, cujas
apropriações não se encerram.
Reforçando esse aspecto, como ensina Paulo Freire (1996, p. 58), as
mulheres e homens são seres inconclusos e inacabados, isto é,
o inacabamento do ser ou sua inconclusão é próprio da experiência vital. Onde há vida, há inacabamento. Mas só entre mulheres e homens o inacabamento se tornou consciente. Gosto de ser homem, de ser gente, porque sei que a minha passagem pelo mundo não é premeditada, preestabelecida. Que o meu ‘destino’ não é um dado, mas algo que precisa ser feito e de cuja responsabilidade não posso me eximir. Gosto de ser gente, porque a História em que me faço com os outros, e de cuja feitura tomo parte, é um tempo de possibilidades e não de determinismo.
Também consideramos a formação continuada no contexto da escola como
processo pelo fato de a profissão ser construída em um percurso que ultrapassa as
regras do tempo cronológico, já que não pode ser enquadrada em períodos curtos,
como nos cursos de curta duração de 30 ou 40 horas desenvolvidos fora da escola,
que entendem a aprendizagem e o desenvolvimento do professor como algo que
pode ser previsto para determinado tempo específico. Nas palavras de Schnetzler
(2002, p. 16), “constituir-se professor é um processo que ocorre ao longo da vida.
Aprende-se a ser professor principalmente com alunos e colegas no contexto de
trabalho, ou seja, na escola”.
A autora nos faz avançar nesse entendimento, parafraseando Vaillant e
Marcelo (1998), ao afirmar que a formação é um processo de aprendizagem e de
socialização de natureza voluntária, informal e pouco previsível, que está centrado
na interação entre colegas e nos problemas que trazem de suas práticas docentes.
Por isso, um processo de formação continuada não é linear, mas sofre redefinições
de rumos dependendo das necessidades de seus participantes.
Este modelo de formação justifica-se, também, por ser o docente um
profissional da educação que tem seu trabalho envolvido por situações marcadas
pela complexidade e imprevisibilidade que requerem dele pensar, refletir, criar e
recriar ações que objetivem atender a demandas específicas de cada classe de
29
alunos. Ele precisa estar em constante desenvolvimento de suas capacidades e
conhecimentos para lidar com essas situações. Neste caso, o professor é "uma
pessoa que, nas situações profissionais, tantas vezes incertas e imprevistas, atua
de forma inteligente e flexível, situadas e reativas" (ALARCÃO, 2003, p. 41).
A dinâmica que envolve seu trabalho faz com que se torne criador de
estratégias novas, outras maneiras de enfrentar as situações problemáticas, o que
exige conhecimentos que, muitas vezes, não são encontrados à disposição no
momento que precisa e ele próprio tem que produzi-los enquanto atua.
Tardif (2011, p.266) esclarece que os saberes profissionais dos professores
“são situados, isto é, (...) construídos e utilizados em função de uma situação de
trabalho particular, e é em relação a essa situação particular que eles ganham
sentido”.
Furlanetto (2012, p. 73) corrobora acrescentando que “as situações que o
professor enfrenta são sempre singulares”, uma vez que “ele trabalha com uma
realidade complexa e necessita construir representações sobre ela que permitam
lidar com a realidade de maneira criativa”. Suas escolhas, decisões e ações são
determinadas pelas situações problemáticas que o processo de ensino-
aprendizagem lhe proporciona. Em outras palavras, os professores analisam as
situações, elaboram estratégias, encaminham ações no sentido de tentar resolver as
vicissitudes cotidianas.
A formação continuada no contexto de trabalho justifica-se, ainda, pela
própria dinamicidade que há na realidade: tanto o saber quanto a prática do
professor não são estáticos. “A realidade muda, e o saber que construímos sobre
ela precisa ser revisto e ampliado sempre. Dessa forma, um programa de educação
continuada se faz necessário para atualizarmos nossos conhecimentos”
(CHRISTOV, 2009, p. 10).
Daí a importância da formação continuada como momentos de construção e
reconstrução dos saberes, de novas práticas que possam dar conta das várias
situações de ensino e aprendizagem que surgem no dia a dia. O fenômeno
educativo “é complexo e singular, não cabendo receitas prontas produzidas por
terceiros, sejam coordenações pedagógicas, secretarias de educação ou mesmo
universidades bem intencionadas para com o trabalho docente” (SCHNETZLER,
2002, p.15).
30
Almeida (2005) conceitua a formação continuada como conjunto de
atividades desenvolvidas pelos professores, de maneira individual ou inseridos num
grupo em exercício, com objetivo formativo visando o seu desenvolvimento
profissional e pessoal, na direção de preparar-se para as tarefas atuais e outras
novas que surgirão.
Essa concepção reforça a ideia de que a elaboração e condução dos
programas de formação continuada não são exclusividade das instituições
formadoras e coloca em destaque o professor como colaborador e protagonista de
sua própria formação, realizada dentro do espaço de atuação, ou seja, na própria
escola.
Assim, os docentes passam a ter “uma forma alternativa de formação
continuada, desenvolvida no interior da própria escola, situada numa realidade
escolar específica” (BENACHIO; PLACCO, 2012, p. 62). Sua posição de
passividade é substituída pelo papel de responsabilidade no processo de formação,
diferentemente dos modelos formativos realizados em simpósios, congressos e
palestras esporádicas em grandes auditórios, que o consideram como consumidor
dos conhecimentos produzidos pela ciência e que lhe são transmitidos por meio
dessas palestras.
Nesse sentido, a formação continuada de professores em contexto de
trabalho realizada na escola acontece nos momentos em que os docentes são
reunidos para discutir temas de seus interesses ou sobre problemáticas vivenciadas
no dia a dia da sala de aula, ou da escola de forma geral. Segundo Placco e
Almeida (2011, p.12), a formação constitui-se também de momentos para os
professores “reverem as próprias práticas de ensino, tomarem consciência das
condições em que atuam e poderem encontrar os melhores caminhos para superar
os desafios da profissão”. Ou como destacam Campos e Aragão (2012, p. 54), são
momentos para o docente “socializar as experiências profissionais e dialogar sobre
os processos de aprendizagem dos alunos”.
Importa destacar que assumir a formação continuada no contexto da escola
não implica treinar professores para aplicar fórmulas ou receitas pedagógicas, mas
instituir “um espaço que possibilite ao professor um desempenho mais eficiente e
eficaz das suas tarefas, ou que o prepare para desenvolver novas tarefas”
(BENACHIO, 2008, p. 67). Assim, o espaço de trabalho é também o de formação
31
profissional por meio de discussão, revisão das ações, troca de experiências, lugar
de busca da prática pedagógica mais significativa para professores e alunos.
A expressão formação contínua, conforme Christov (2009, p. 09), “traz uma
crítica a termos utilizados tais como: treinamento, capacitação, reciclagem, que não
privilegiam a construção da autonomia intelectual do professor”. O modelo de
formação a que se refere a autora diz respeito àqueles realizados fora do contexto
de produção do trabalho docente, ou seja, da escola, sem a participação de seus
professores, e que chegam até estes por meio de imposições burocráticas: com
conteúdo, procedimentos, dias e horários, um condutor, como por exemplo o
coordenador pedagógico da Secretaria etc. Normalmente, possuem duração de 30
horas e não apresentam continuidade ao final do curso, como salienta Schnetzler
(2002, p. 16):
terminado o curso, cada professor retorna para o seu contexto de trabalho e, mesmo que esteja bem intencionado em aplicar o que aprendeu no curso, ele estará sozinho e sem o outro para discutir seus dilemas, hesitações e inseguranças em tentar algo novo, em inovar alguma coisa em sua aula. Isso é compreensível, porque toda ação docente é pautada por concepções e crenças que muitas vezes não são conscientes para o professor: concepções de ensino, aprendizagem, conhecimento, aluno, professor, escola, sociedade, mundo.
Nesse modelo de formação orientado pela racionalidade técnica, os docentes
são vistos como consumidores e aplicadores de conhecimentos elaborados pelos
especialistas. A crítica a se fazer sobre ele é a de que, entre outras coisas, segundo
Zeichner (1993 apud SCHNETZLER, 2002, p. 7),
i) restringem o processo de reflexão dos professores à consideração das capacidades e estratégias de ensino; ii) excluem os professores do processo de definição dos objetivos do ensino, da definição do que, como, por que e para quem ensinar; iii) limitam a reflexão dos professores à própria prática ou à dos seus alunos, desconsiderando as condições sociais do ensino; iv) insistem na reflexão individual dos professores, que devem pensar sozinhos sobre o seu próprio trabalho.
Ao contrário, estamos defendendo a formação de um profissional que atue
como protagonista do processo formativo, visando a uma prática percebida como
mais coerente e mais apropriada à realidade que enfrenta no dia a dia em sua sala
de aula. Para Sadalla e Sá-Chaves (2008, p. 190), a prática do professor não deve
ser resultado de instruções elaboradas fora do contexto de trabalho, mas sim um
32
“processo de emergência a partir da reflexão sobre as próprias práticas docentes e
da discussão sobre a relação ensino-aprendizagem”.
Além disso, a reflexão sobre a prática docente também não pode se
transformar simplesmente em refletir por refletir, pois reflexão sobre a prática que
não seja capaz de perceber que esta possui pontos contraditórios, pontos que
precisam ser revistos, ser superados ou substituídos por novas práticas não se
coloca como reflexão crítica.
A prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer [...]. É fundamental que, na prática da formação docente, o aprendiz de educador assuma que o indispensável pensar certo não é presente dos deuses nem se acha nos guias de professores que iluminados intelectuais escrevem desde o centro do poder, mas pelo contrário, o pensar certo que supera o ingênuo tem que ser produzido pelo próprio aprendiz em comunhão com o professor formador [...]; o de que se precisa é possibilitar, que, voltando-se sobre si mesma, através da reflexão sobre a prática, a curiosidade ingênua, percebendo-se como tal, se vá tornando crítica. Por isso é que, na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática (FREIRE, 1996, p. 43).
Nesse sentido, é necessário pensar criticamente a prática e superar as
próprias ingenuidades do próprio pensamento, permitindo-lhe melhoria da prática
pedagógica.
Não queremos defender que a formação contínua de professores no
contexto de trabalho será a solução “milagrosa” para os problemas que a educação
enfrenta atualmente, uma vez que essas possíveis soluções dependem de um
conjunto de fatores e relações que se encontram, em muitos casos, fora da escola.
Contudo, a formação poderá contribuir para que algumas transformações ocorram
(CHRISTOV, 2009).
Por meio dela, o professor pode encontrar “instrumentos para modificar as
tarefas educativas continuamente, numa tentativa de adaptação à diversidade e ao
contexto dos alunos, e comprometer-se com o meio social” (IMBERNÓN, 2004 apud
BENACHIO; PLACCO, 2012, p. 62).
A formação que valoriza a reflexão sobre a prática propiciará condições para
que ele “faça de sua prática objeto de reflexão e pesquisa, habituando-se a
problematizar seu cotidiano, a interrogá-lo e a transformá-lo, transformando a
própria escola e a si próprio” (ORSOLON, 2011, p. 23).
33
Como reforça Gatti (2003, p. 201),
as formas interativas que propiciam convivências e interações com novos conteúdos culturais, com pessoas de outros ambientes e com ideias e níveis de informação diversificados, constituídas com o objetivo de entrosar elementos do contexto existente com novas experiências, parecem ser o caminho mais propício à criação de condições de integração de novos conhecimentos de modo significativo e de mudança ou criação de novas práticas.
Nesse âmbito, a defesa da formação continuada desenvolvida no contexto
de trabalho, admitindo o professor como ator e sujeito de sua formação, não
significa isolar a formação no espaço escolar ou desprezar o que já foi feito na área
de formação, mas apontar uma direção que possa contribuir para a melhoria da
educação. Como bem destacado por Oliveira-Formosinho (2009, p. 272-273),
formação centrada na escola não pode significar formação encerrada na escola. Pelo contrário, é essencial que a escola interactue com os seus contextos envolventes, é importante que a escola interactue com instituições de formação, especialistas em educação, movimentos pedagógicos, associações profissionais de professores, associações sindicais de professores, redes de escolas, projetos de professores.
Em outro trabalho, Oliveira-Formosinho e Formosinho (2002 apud CUNHA;
PRADO, 2010, p.106) sistematizam três equívocos que podem comprometer a
formação centrada na escola:
o primeiro equívoco é pensar que a formação que acontece na escola seja necessariamente mais ativa e envolvente. Eles argumentam que o deslocamento da formação da universidade para a escola não garante, necessariamente, maior participação dos professores. O segundo equívoco é confundir a formação centrada na escola com uma ‘barricada centrada na escola’, denunciando que ‘a escola concebida como uma fortaleza é uma escola que vira as costas às diferentes populações que diz servir’ [...]. O terceiro equívoco é considerar a formação centrada na escola como uma formação encerrada nos professores, dissociando o desenvolvimento profissional dos professores, o desenvolvimento das crianças e o desenvolvimento organizacional.
A formação centrada na escola deve abrir-se às parcerias, às contribuições
de outros espaços formativos, desde que considerem os problemas vivenciados
pelos professores como ponto de partida e de chegada da formação. Sair de dentro
da escola permite-nos ter visão crítica do local em que atuamos; permite-nos ver
sob outros ângulos os problemas que enfrentamos e perceber caminhos que não
34
são encontrados quando estamos envolvidos na resolução de determinado
problema, seja de uma sala de aula, seja de toda a escola.
Embora considerando todos esses aspectos, não se pode deixar de admitir
que a escola seja um lugar privilegiado para o professor ensinar e aprender, como
será discutido em seguida.
1.2. A escola: lugar de ensinar e de aprender
A defesa da escola como lócus de formação de professores leva em
consideração, primeiramente, que cada escola integra um grupo de pessoas que
vive num determinado espaço, seja em um bairro de periferia, seja no centro da
cidade, ambos possuindo uma realidade própria. Seus moradores vivenciam essa
realidade de formas diferentes, com seus valores, costumes, enfim, quando falamos
de escola “não se pode falar de escola, genericamente, mas de cada escola em
particular, dado que cada uma tem características pedagógico-sociais irredutíveis”
(AZANHA, 2003 apud PLACCO; ALMEIDA; SOUZA, 2011, p.5).
Nas palavras de Alarcão (2003, p.81), quando falamos de escola, estamos
falando de uma “comunidade em que participam vários actores sociais que nela
desempenham papéis activos, embora diversificados”. Ou seja, a escola é
constituída por pessoas, cada qual com sua particularidade, exercendo funções
diversificadas e que carregam consigo seus ideais, pensamentos, vontades que
incidem nos acontecimentos em seu dia a dia.
Para que a escola cumpra sua função social será necessária a integração
das ações de todas as pessoas envolvidas: família, funcionários, professores,
alunos, direção e coordenação. Para isso, ela precisa ser “um todo e não como um
ajuntamento de pessoas. Esse todo, para ser coeso e dinâmico, exige uma
organização. Em resumo, a escola é uma comunidade social, organizada para
exercer a função de educar e instruir” (ALARCÃO, 2003, p. 81).
A convivência de muitos atores agindo de forma interativa no interior da
escola não pode ser vista como entrave para o processo de ensino-aprendizagem,
mas como possibilidade de aprendizagem de alunos e professores.
35
As inúmeras interações que ocorrem no interior da escola permitem a concretização de processos dialéticos de ensinar e aprender. Professores poderão aprender ao ensinar, e se formar ao formar, se estiverem abertos às possibilidades que o encontro com os diversos sujeitos que fazem parte do cotidiano escolar pode gerar (CAMPOS; ARAGÃO, 2012, p. 40).
Assim sendo, é impossível dissociar a ação de cada indivíduo do coletivo da
escola, o que nos permite pensar o funcionamento de trabalho desta como um
processo de aprendizagem de seu coletivo. Porém, para isso, a escola precisa ser
um espaço de trabalho e reflexão de modo que seus atores possam discutir e refletir
coletivamente sobre os problemas que prejudicam a efetivação de sua missão de
educar.
Nas palavras de Alarcão (2003, p. 44),
a escola tem de se pensar a si própria, na sua missão e no modo como se organiza para a cumprir. Tem também ela, de ser reflexiva. Mas o que é a escola? Uma comunidade educativa, um grupo social constituído por alunos, professores e funcionários e fortes ligações à comunidade envolvente através dos pais e dos representantes do poder municipal. A ideia do professor reflexivo, que reflete em situação e constrói conhecimento a partir do pensamento sobre a sua prática, é perfeitamente transponível para a comunidade educativa que é a escola.
Assim, é no contexto da escola reflexiva que o professor aprende e
desenvolve novas capacidades, novos ideais e práticas, cria e recria novas ações
para um melhor ensino. Ou seja, quando reflete conjuntamente “nas tomadas de
decisões frequentes e recorrentes, na interlocução com os demais docentes da
escola, no planejamento, no momento em que tenta gerar aprendizagem nos
alunos” (CAMPOS; ARAGÃO, 2012, p. 40).
No entanto, para que ocorra formação do docente “o espaço da escola tem
que ser organizado de modo a criar condições de reflexibilidade individuais e
coletivas” (ALARCÃO, 2003, p. 44). Apontam, também, Campos e Aragão (2012, p.
54) que
quando a organização do cotidiano escolar permite o encontro dos professores para socializar as experiências profissionais e dialogar sobre os processos de aprendizagem dos alunos, a escola torna-se uma instituição aprendente. Torna-se espaço privilegiado de aprendizado também daqueles que têm a função de ensinar. Professores e também o coordenador aprendem e se formar quando planejam suas ações, quando propõem alternativas para o trabalho, quando avaliam suas interlocuções no intuito de redimensioná-las.
36
Nessa perspectiva, torna-se de grande importância criar espaços, momentos
em que toda a escola seja reunida para “repensar o trabalho que vem
desenvolvendo, numa dinâmica que envolveria direção, corpo administrativo, corpo
técnico, professores, especialistas, alunos e comunidade” (FUSARI, 2011, p. 18).
Damos destaque às ações voltadas para o processo de ensino-aprendizagem como
defende Nóvoa (2009, p.19): “é essencial reforçar dispositivos e práticas de
formação de professores, baseadas numa investigação que tenha como
problemática a acção docente e o trabalho escolar”.
A aprendizagem significativa depende de todo um contexto político e social,
de um conjunto de fatores para acontecer; dentre eles, procuramos destacar a
importância de se valorizar todos os atores da escola devido à ação individual e
coletiva dos professores. Nesse sentido, justifica-se a formação que dê importância
aos problemas relacionados à prática de ensino.
Zumpano e Almeida (2012, p. 34) concordam e ressaltam a importância da
formação centrada na escola atuar
considerando suas singularidades e características educativas, permitindo que os próprios professores disponham de um conhecimento aprofundado e concreto em relação a sua organização, elaborando um diagnóstico sobre seus problemas e suas dificuldades, mobilizando suas experiências, saberes e ideias para refletir sobre eles e, posteriormente, aplicá-los em possíveis soluções.
É preciso considerar no processo de formação que a escola está inserida
em determinada sociedade onde diversos atores participam e vivem a expectativa
de terem seus problemas resolvidos, seus sonhos realizados e que ela não pode
ignorar tudo isso. É preciso levar em consideração o desenvolvimento profissional
dos professores, como também as necessidades de aprendizagem dos alunos e
interesses das famílias e comunidade.
Para que a formação que estamos perspectivando aconteça, faz-se
necessário criar determinadas condições e assumir, pelo menos, três princípios:
“assegurar a formação coletiva e contínua no âmbito da escola, criar um ambiente
propício à participação efetiva dos envolvidos no processo de formação e ter um
projeto educativo como referencial de ação de todos” (BENACHIO, 2008, p. 74).
No primeiro caso, a instituição escolar precisa criar condições para que
todos os professores participem, então, “criar condições significa remunerar o tempo
37
da reunião, definir o tipo de formação continuada em serviço, convencer o professor
a participar das reuniões e tornar essas reuniões sistemáticas” (BENACHIO, 2008,
p. 36). Criar os momentos de formação, mas deixar livre a participação do professor
ou não valorizar sua presença, remunerando-o, pode contribuir para que a formação
não aconteça.
A segunda condição é criar um ambiente propício à participação efetiva dos
envolvidos no processo de formação, já que, segundo Benachio (2008), é
fundamental a presença de um formador que articule as necessidades trazidas
pelos professores, proponha desafios, interfira e questione:
participar é trazer dificuldades, dar contribuição, socializar os projetos e os desafios da ação pedagógica; é sentir-se convocado a buscar as respostas nem sempre imediatas, construir caminhos, individual e coletivamente. É envolver-se inteiramente em discussões a partir de diferentes autores e concepções, na busca de propostas que contribuam com a prática educativa do grupo. Neste sentido, é benéfica a presença do formador – ou de um professor constituído pelo grupo – para articular as necessidades e projetos trazidos pelos professores (BENACHIO, 2008, p.79).
A terceira condição é a necessidade de ter um projeto educativo ou projeto
político-pedagógico como “referencial de ação de todos os que atuam na unidade
educacional. Porque, subjacente a qualquer ação de um grupo, existe uma
intencionalidade, explícita ou não, que a orienta e dirige suas ações” (BENACHIO,
2008, p. 80). O projeto educativo, segundo a autora, serve de norte para as
discussões dos conteúdos selecionados pelo grupo, traz consigo o tipo de educação
que se quer buscar com as ações, que pessoa a escola busca formar, a concepção
de ensino e de aprendizagem que orienta o grupo.
A formação que parte do projeto educativo tem um ponto de partida e de
chegada com possibilidade de reflexão sobre o que já foi realizado para rever ações,
tomar novos caminhos, avaliar-se.
Em função de estarmos reconhecendo a escola como lócus privilegiado de
formação continuada de professores, é importante assumir o professor como sujeito
que reflete e produz conhecimentos sobre a sua prática e o faz melhor no contexto
do trabalho coletivo.
1.3. O desenvolvimento profissional do professor e o trabalho coletivo
38
O processo de formação continuada no contexto de trabalho deve
considerar os professores como sujeitos atuantes em ambientes marcados por
acontecimentos variados e, muitas vezes, imprevisíveis. As situações que surgem
na sala de aula nem sempre são enquadradas no planejamento da rotina diária.
Para atuar diante dessa peculiaridade, enfrentando tal realidade, o docente cria e
recria situações de aprendizagens, improvisa ações, desenvolve novas práticas,
enfim, age e reflete constantemente enquanto trabalha. Nesse contexto, o professor
é reflexivo, ou seja, "uma pessoa que, nas situações profissionais, tantas vezes
incertas e imprevistas, atua de forma inteligente e flexível, situada e reativa"
(ALARCÃO, 2003, p. 41).
Tardif (2011) corrobora ressaltando que “ao enfrentar situações
desafiadoras e imprevistas, o professor mobiliza diversos saberes produzidos em
contexto, ou seja, saberes específicos ao seu ofício, ao seu trabalho”. Pérez Gómez
(1992) concorda e destaca que os professores são sujeitos que acionam conceitos,
teorias, crenças, dados, procedimentos e técnicas para elaborar um diagnóstico da
realidade de ensino, desenhando estratégias de intervenção e buscando prever o
curso futuro dos acontecimentos.
De acordo com esses autores, podemos dizer que o professor é um
profissional possuidor de saberes e conhecimentos específicos da área e, desta
forma, num processo de formação contínua, o mais coerente é considerá-lo como
sujeito, autor desse processo. Autor no sentido de que participa dos momentos
formativos não somente como ouvinte, mas para ser ouvido; alguém que numa
relação com o grupo, por meio da troca de experiências, de seus conhecimentos e
saberes, poderá contribuir para com sua própria formação e a de seus pares.
Nas palavras de Tardif (2011), o espaço de trabalho do professor deve ser
considerado um lugar de produção, transformação e mobilização de teorias e
conhecimentos específicos da profissão.
Os professores de profissão possuem saberes específicos que são mobilizados, utilizados e produzidos por eles no âmbito de suas tarefas cotidianas. Noutras palavras, o que se propõe é considerar os professores como sujeitos que possuem, utilizam e produzem saberes específicos ao seu ofício, ao seu trabalho. A grande importância dessa perspectiva reside no fato de os professores ocuparem, na escola, uma posição fundamental em relação ao conjunto dos agentes escolares: em seu trabalho cotidiano com os alunos, são eles os principais atores e mediadores da cultura e dos saberes escolares. (TARDIF, 2011, p. 228).
39
Outro dado importante a ser considerado nesse processo é entender que os
professores são pessoas e profissionais inseridos num contexto social e cultural e
que carregam consigo influências, marcas da sociedade e da cultura a que
pertencem. Isso que dizer que eles possuem ideologias, valores, crenças, resultado
das relações sociais e culturais que muito influenciam suas ações em situações de
trabalho no contexto da sala de aula. Em muitos momentos são os conhecimentos e
saberes adquiridos dessas relações sociais, de suas experiências, que são
mobilizados para resolução dos problemas enfrentados na rotina do dia a dia.
Por isso Gatti (2003, p. 196) reforça que
é preciso ver os professores não como seres abstratos, ou essencialmente intelectuais, mas, como seres essencialmente sociais, com suas identidades pessoais e profissionais, imersos numa vida grupal na qual partilham uma cultura, derivando seus conhecimentos, valores e atitudes dessas relações, com base nas representações constituídas nesse processo que é, ao mesmo tempo, social e intersubjetivo. Há também que se considerar o papel de eventos mais amplos, sejam sociais, políticos, econômicos ou culturais, com seus determinantes que perpassam a vida grupal ou comunitária.
Benachio e Placco (2012, p. 59) apontam outro fator a ser considerado e
que não podemos deixar de mencionar: “é a compreensão do sujeito como um
sistema complexo e dinâmico em que se entrelaçam as dimensões
biopsicossociais”. Ou seja, isso implica olhar para o professor como uma pessoa
completa, dentre outros aspectos, com afetividade, sentimentos, sonhos,
desenvolvimento cognitivo, conhecimentos e relações que estabelece com os
outros.
Ainda, é preciso atentar para o fato de que os conhecimentos que são
produzidos fora da escola, ou seja, sem a participação dos professores, quando
chegam a eles por meio de cursos de formação ou de informes, textos, vídeos, entre
outros, são significados pelos docentes segundo seus interesses, crenças, valores,
posição política, condições de trabalho e realidade.
Não é tudo que lhes é transmitido que será acatado como verdade. Muitos
cursos em que os professores participam de forma passiva, como consumidores de
conhecimentos e de estratégias, são abandonados por eles em seus “arquivos de
informes que poderei utilizar um dia”. Isso explica as limitações dos cursos de
formação produzidos fora da escola e oferecidos anualmente pelas secretarias
estaduais e/ou municipais.
40
Gatti (2003, p. 192) nos alerta para o fato de que
esses profissionais são pessoas integradas a grupos sociais de referência nos quais se gestam concepções de educação, de modos de ser, que se constituem em representações e valores que filtram os conhecimentos que lhes chegam. Os conhecimentos adquirem sentido ou não, são aceitos ou não, incorporados ou não, em função de complexos processos não apenas cognitivos, mas, sócio-afetivos e culturais. Essa é uma das razões pelas quais tantos programas que visam a mudanças cognitivas, de práticas, de posturas, mostram-se ineficazes. Sua centralização apenas nos aspectos cognitivos individuais esbarra nas representações sociais e na cultura de grupos.
Ainda temos de considerar que o espaço em que o profissional da educação
atua está inserido em um contexto mais amplo da sociedade e que os
acontecimentos que nela ocorrem incidem sobre o cotidiano da escola e em seu
trabalho. Assim, importa ter ciência de que as questões políticas, econômicas e
sociais são pontos a se considerar na formação docente, pois muito dos problemas
que ele enfrenta na sala de aula têm ligação direta com essas questões.
Nesse processo de construção da formação e análise crítica das condições
de produção da própria profissão, “é importante que o professor se aproprie de
referenciais teóricos e críticos das realidades em questão (...) levando sempre em
consideração os contextos históricos, políticos e sociais que configuram as práticas
escolares” (SADALLA; SÁ-CHAVES, 2008, p.192).
Por essa e outras razões é que a formação continuada no contexto escolar
não pode “desconsiderar o momento histórico que o professor vive: a sociedade em
geral, a escola em particular e as condições de vida do docente” (BENACHIO;
PLACCO, 2012, p.59).
Porém, a valorização do professor como sujeito e autor da formação não
significa que ele deva agir de forma isolada, pois ele está – como foi dito – inserido
num contexto de que outros profissionais fazem parte. É primordial um trabalho
onde, em conjunto, reflitam, discutam, tomem decisões que proporcionem a
construção de referências coletivas para o que seja uma educação e qualidade. “É
neste local, o seu local de trabalho, que ele, com os outros, seus colegas, constrói a
profissionalidade docente” (ALARCÃO, 2003, p. 44).
Defendemos que o desenvolvimento profissional dos professores é
um processo contínuo de melhoria das práticas docentes, centrado no professor, ou num grupo de professores em interação, incluindo momentos
41
formais e não formais, com a preocupação de promover mudanças educativas em benefício dos alunos, das famílias e das comunidades (OLIVEIRA-FORMOSINHO, 2009, p.226).
Isto porque o principal compromisso da formação continuada e dos
processos de desenvolvimento profissional é promover benefícios dessa formação
para os alunos, ou seja, construir conhecimento profissional que contribua com a
aprendizagem dos alunos.
Esta é uma tarefa bastante exigente e não pode ser empreendida
solitariamente. São os encontros de trabalho coletivo, aqui nomeados de atividades
de trabalho pedagógico (ATP), que podem possibilitar aos professores “a troca de
experiências, a contribuição mútua na construção de sua ‘pedagogia’” (MENDES,
2008, p.40).
Os tempos e espaços de trabalho coletivo têm sido, muitas vezes, utilizados
para atender às demandas burocráticas das Secretarias de Educação, segundo
trabalho realizado por Mendes (2008, p. 40), onde os professores entrevistados se
queixaram das “discussões e recados que não levam a nenhum tipo de ação
pedagógica, ou seja, nada que tenha reflexos em sua prática; os recados acabam
extrapolando o horário, e não sobra tempo para planejar”.
Entretanto, o uso das ATP pode vir a ser um espaço privilegiado de
discussão e reflexão sobre as práticas, dilemas, problemas do dia a dia enfrentados
na prática docente. Como “espaços de formação/trabalho, socialização de
experiências, revisão de práticas e espaço/tempo de produção de conhecimentos e
saberes a favor do PPP” (CUNHA, 2012, p.16). Além disso, a autora ressalta que os
encontros de trabalho coletivo podem constituir-se como oportunidades para que
professores e gestores “confrontem as suas posições, interroguem o vivido,
elaborem projetos conjuntos, assumam a colaboração e interlocução sobre as
práticas como possibilidade de formação compartilhada” (CUNHA, 2012, p. 16).
Ainda, para Placco e Almeida (2011, p. 12), “os horários de trabalho coletivo
são um momento para os professores trabalharem, discutirem seus problemas
específicos enfrentados em sala de aula”. Essas discussões, quando transformadas
em problematizações pelo coordenador pedagógico6 (CP), podem criar
6 Esse profissional também é identificado como Professor Coordenador (PC) em algumas redes, como a rede estadual paulista, e como Orientador Pedagógico (OP), na rede municipal de Campinas.
42
oportunidades para os professores reverem as próprias práticas de ensino, tomarem
consciência das condições em que atuam e encontrar os melhores caminhos para
superar os desafios da profissão.
No entanto, para que as ATP possam tornar-se momentos de formação, é
necessário haver alguém que crie as condições para esse fim. Não é incomum
encontrar escolas em que os espaços coletivos são transformados em momentos de
recados, realização de atividades burocráticas como preenchimento de diários,
correção de provas ou situações descontextualizadas do processo pedagógico que
não auxiliam os professores a enfrentar os percalços da sala de aula.
O CP pode ser aquele “que irá facilitar a realização da formação em serviço,
alguém com quem o professor possa compartilhar seus pensamentos e ideias numa
troca de experiências, possibilitando que ambos olhem para suas práticas”
(PLACCO; SOUZA, 2006, p.76).
O CP, no conjunto de suas atribuições, desempenha importante papel na
condução da formação continuada dos professores nos contextos de trabalho
coletivo. Um número significativo de pesquisas sobre a temática, como os trabalhos
de Zumpano e Almeida (2012), Campos e Aragão (2012), Placco, Almeida e Souza
(2011), Cunha e Prado (2010), Placco e Silva (2011) e Fusari (2011) defende o CP
como formador de professores e a escola como lócus dessa formação, valorizando
as ATP como momentos de discussão, reflexão e formação.
Sob essa ótica, no próximo capítulo são abordados os aspectos relevantes
sobre as atribuições do CP, especificando seu papel de interlocutor da formação
continuada desenvolvida nos horários de trabalho coletivo, bem como as
dificuldades e as condições de trabalho a que está submetido.
43
CAPÍTULO 2 - A coordenação pedagógica e o cotidiano escolar
O presente capítulo tem por objetivo discutir questões referentes ao trabalho
do coordenador pedagógico (CP) no espaço da escola, apresentando o que os
autores discutem como as atribuições desse profissional, as condições em que ele
desenvolve seu trabalho e os desafios frente às diversas demandas provindas dos
gestores, professores e das Secretarias.
O cotidiano escolar é repleto de acontecimentos variados e, muitas vezes
imprevisíveis, que incidem sobre todos os que nela trabalham, quer de forma direta,
quer indireta; ou seja, tanto os professores quanto o coordenador têm suas
atuações influenciadas por esses acontecimentos.
Entre o conjunto de suas atribuições, Clementi (2011, p. 61) aponta uma
série de tarefas que o CP precisa cumprir, das quais muitas são relacionadas a
demandas burocráticas da escola.
O dia a dia do coordenador exige que ele administre seu tempo para cumprir inúmeras tarefas. Tem de formar o professor e, para isso, planejar reuniões; atualizar-se e planejar etapas para atualizar os professores e pensar em procedimentos específicos e nas necessidades de seu grupo. [...] Ainda precisa cumprir uma série de atividades burocráticas em relação à organização do trabalho: preenchimento de fichas e dados dos alunos; fichas de entrevistas; relatórios; organização dos protocolos de observação das salas de aula; organização de cartas aos professores e registros das reuniões com eles. Considerando uma dimensão maior de seu trabalho, ainda participa de reuniões com a equipe não docente da escola (outros coordenadores, diretores, funcionários); participa dos projetos coletivos elaborados nesses momentos; lida com questões organizacionais e burocráticas (organizar e participar de seleção de alunos, preencher papéis solicitados pela Secretaria de Educação, entre outros), além de ter de investir em seu próprio aprimoramento profissional, a que não é normalmente incentivado, e estar atualizado com relação às políticas educacionais vigentes.
Essa grande quantidade de tarefas com que o CP tem que se preocupar faz
com ele seja um profissional que se relaciona com vários atores dentro e fora da
escola: direção, pais, professores, alunos e funcionários de forma geral. Assim,
executa atribuições que vão do atendimento a pais, alunos, professores, aos
constantes pedidos da direção e solicitações provindas das secretarias
administrativas.
44
Identificamos, portanto, o CP como um profissional "polivalente" da escola
devido à quantidade e variedade de atribuições que são assumidas por si. É-lhe
cobrado que dê conta de não deixar lacunas que prejudiquem o andamento da
escola ofereça apoio a toda sorte de imprevistos.
Embora tenha seu cotidiano marcado por acontecimentos variados e
imprevisíveis, muitos pesquisadores defendem que o papel principal do CP é o de
formador de professores, ou seja, aquele que, no processo de formação continuada
que ocorre, sobretudo, nas atividades de trabalho pedagógico (ATP), conduzirá a
formação docente em seu espaço de trabalho.
Esse fato aponta a contradição da rotina do CP que atua em um ambiente
que exige dele flexibilidade e improvisos e a responsabilidade de planejar e conduzir
as atividades formativas realizadas nos horários e espaços coletivos.
Concordamos que o papel principal do CP na escola básica é o de formador
de professores e que ele é o responsável pela articulação, organização e condução
das ATP. Admitimos, no entanto, que algumas dificuldades precisam ser superadas
e é esse, inclusive, o tema da presente pesquisa.
Ampliando o diálogo dos dados dessa pesquisa com reflexões e análises
elaboradas pelos autores da área, problematizamos o papel do CP como formador
na próxima seção.
2.1. O Coordenador pedagógico como formador de professores
O estudo de Placco, Souza e Almeida (2011, p.6) sobre as publicações a
respeito das funções do CP ressaltam que, entre as atribuições recebidas nas
escolas, o coordenador tem uma função articuladora, formadora e transformadora.
O CP é, por excelência, o formador dos professores.
Entendemos, assim, que compete ao Coordenador Pedagógico: articular o coletivo da escola, considerando as especificidades do contexto e as possibilidades reais de desenvolvimento de seus processos; formar os professores, no aprofundamento em sua área específica e em conhecimentos da área pedagógica, de modo que realize sua prática em consonância com os objetivos da escola e esses conhecimentos;
45
transformar a realidade, por meio de um processo reflexivo que questiona as ações e suas possibilidades de mudança, e do papel/compromisso de cada profissional com a melhoria da educação escolar.
No conjunto de suas ações no cotidiano, o CP atua como o profissional
responsável pela efetivação da formação dentro da escola e também fora dela,
conforme salientam Zumpano e Almeida (2012), Campos e Aragão (2012), Placco,
Almeida e Souza (2011), Cunha e Prado (2010), Placco e Silva (2011), Fusari
(2011), entre outros.
De acordo com Campos e Aragão (2012, p. 40), sua “importância se deve à
própria especificidade de sua função, que é planejar e acompanhar a execução de
todo o processo didático-pedagógico da instituição”.
Enquanto coordenador cabe a esse profissional, entre outras coisas, a
tarefa de fazer com que os horários coletivos sejam organizados para fins
formativos. Admitimos que não basta ter um horário garantido por lei para que nele
se desenvolva a formação continuada; se não houver alguém que esteja à frente
coordenando todo o processo, esses horários servirão para outros objetivos, como
ocorre em algumas escolas, que utilizam esses momentos para recados
administrativos.
É importante esclarecer que entendemos a formação de professores no
espaço escolar como uma das atribuições do CP, mas não estamos defendendo
que ele seja o profissional detentor de elevado conhecimento a ser transmitido aos
professores, sujeitos providos de nenhum conhecimento e que, por isso, precisa
recebê-los de alguém que o possui.
Na verdade, na circulação de informações e conhecimentos, docentes e o
próprio CP se apropriam e transformam suas experiências em saberes, cada qual
com base em sua bagagem cultural e experiências vividas pessoal e
profissionalmente. Como explicam Placco e Souza (2006, p.76),
o CP será para o professor um facilitador, aquele que irá escutar suas queixas, trocar experiências, que o ajude a escolher o melhor caminho. Não se trata de alguém que está acima e que detêm muitos conhecimentos, mas aquele que está do lado, compartilhando erros, acertos, ideias. O formador de professor, no caso o coordenador, poderia estimular e acompanhar o trabalho do professor e com ele dialogar sobre suas opções de ação, em vez de bloqueá-las.
46
Entendemos, assim, que na função de formador o CP será um facilitador
para que a formação ocorra, será alguém que irá ao encontro do professor para dar
valor à sua voz, ouvindo o que ele tem a dizer e, ao mesmo tempo, podendo ser
ouvido por este, numa troca de experiências com o objetivo de encontrar possíveis
soluções para os problemas enfrentados no processo de ensino- aprendizagem.
O reconhecimento desse profissional como formador fundamenta-se na
concepção de que o processo educativo, segundo Clementi (2011), “é dinâmico e
necessita constantemente de debates amplos sobre seu fazer, para que possa,
junto com seus pares, desenvolver novas reflexões sobre a área”.
Souza (2011, p. 28) reforça essa ideia apontando que “é do CP a função de
formar esses professores dentro da instituição em que atua, condição para o
exercício de uma educação que vise atender as necessidades atuais dos alunos”.
A importância da formação está na própria dinamicidade do processo
educativo, que exige constantes reflexões sobre o ensino e a aprendizagem, para
que professores e alunos possam ser atendidos em suas necessidades. A defesa
do CP se justifica, ainda, por estar em constante movimento, ou seja, ele percorre
vários locais ao longo de sua jornada diária ou semanal. Por vezes, atua dentro da
escola, noutras participa de algum evento fora dela.
Essa mobilidade contribui para que possa olhar para a escola sob vários
pontos de vista, permite-lhe um movimento de aproximação e distanciamento. Como
ensina Clementi (2011), o CP tem um papel fundamental por participar do projeto
pedagógico da escola e por estar engajado em movimentos de reflexão internos e
externos às instituições em que atua.
O CP vem sendo apontado nesta pesquisa como o responsável por conduzir
a formação continuada de professores nos horários de trabalho coletivo. Contudo, é
importante salientar que ele não poderá fazer isso isoladamente e de forma
desordenada, mas deve envolver toda a equipe na elaboração de um plano de
formação cujo objetivo principal seja a melhoria da qualidade da educação. Desse
modo, “ele pode ser o mediador desse processo, aquele que o propõe, o coordena,
mas não é o responsável único por ele, o que deve ser assumido por toda a equipe
da escola” (SOUZA; PLACCO, 2011, p.36).
Sua contribuição para a melhoria da qualidade da educação dependerá de
que compreenda que o trabalho coletivo deve ser valorizado tanto nas ações do
47
cotidiano da escola como no processo de formação. Nas palavras de Almeida
(2011, p. 76), “se queremos, como coordenadores ou professores, que o grupo seja
um coletivo do qual resulte a solidariedade, é preciso investir no ‘Nós todos’”,
porque, segundo essa autora, o individualismo, tanto do professor, quanto do
coordenador, num processo de formação, pode constituir-se em obstáculo.
Placco e Souza (2012) reforçam que trabalhar o coletivo implica o
envolvimento dos demais atores da escola, cujo processo deverá provocar
mudanças em seus modos de pensar e agir frente aos desafios que a escola
enfrenta em sua missão formadora.
Nessa perspectiva, Geglio (2009), esclarece que o CP é quem, num espírito
de parceria e coletividade, conduzirá o processo de formação na medida em que
participa, discute, ouve, propõe e não impõe, assume e compartilha as
responsabilidades com os demais. Indicará ações ao coletivo da escola, enfim, será
um líder dentro do grupo, com autoridade e não com autoritarismo. É mediante a
“articulação que respeita, recolhe e, conjuntamente, encaminha as questões,
advindas do grupo de professores, que o coletivo se constitui e vai-se tornando
corresponsável pela formação continuada em serviço” (BENACHIO; PLACCO, 2012,
p. 60).
Desenvolver a formação no seio da própria escola utilizando principalmente
os espaços coletivos não significa que as formações que ocorrem fora dela devam
ser desprezadas ou que basta a própria equipe para dar conta de uma boa
formação. O trabalho articulado com os profissionais de outros espaços, seja das
universidades, seja de outras instituições, torna-se importante uma vez que a
formação desenvolvida fora da escola contribui para que o CP analise a realidade
em que está inserido sob outro prisma.
As escolas estão inseridas num contexto maior, como descreve Orsolon
(2011, p. 18), ela “mantém uma relação dialética com a sociedade: ao mesmo
tempo em que reproduz, ela transforma a sociedade e a cultura”. Por isso não pode
ser desvinculada de um amplo contexto em que muitos aspectos da sociedade
também precisam ser transformados, juntamente com as condições de trabalho dos
que atuam na escola. Uma formação que vise a mudanças na sala de aula precisa
voltar-se também para as questões que estão fora dela por conta dessa relação
dialética.
48
Assim, enquanto docente, autor e produtor de conhecimentos e saberes,
defendemos a formação de professores centrada no espaço da escola tomando
como base as situações problemáticas vivenciadas no dia a dia e valorizando a
reflexão sobre a prática. Enfatizamos a melhoria na qualidade da educação, então,
apontamos ser necessário tomar alguns cuidados para que essa formação não se
torne mais um modelo como outros que fracassaram.
Zeichner (1993, p.44) nos chama a atenção a esse respeito quando aborda
o fracasso da formação reflexiva adotada em alguns lugares:
outro aspecto do fracasso da formação reflexiva de professores em promover o desenvolvimento genuíno do educador é a ênfase em enfocar internamente as reflexões dos professores, sobre sua própria atividade ou seus alunos, negligenciando toda e qualquer consideração acerca das condições sociais do ensino que influenciam seu trabalho na sala de aula. Essa tendência individualista torna menos provável que os professores consigam enfrentar e transformar tais aspectos estruturais de sua atividade, que os impedem de atingir suas metas educacionais. O contexto do trabalho do educador deve ser tomado tal como é dado. Ora, embora seja compreensível que as preocupações dos professores são principalmente a sala de aula e os alunos, é insensato restringir-lhes a atenção exclusivamente a essas preocupações.
O autor nos alerta para que a prática reflexiva do professor não se limite às
questões da sala de aula, sem levar em consideração o contexto em que ela está
inserida, o currículo que rege seu trabalho, o contexto social e institucional no qual
se dá o ensino e, ainda, que esta não seja de cunho individualista, desprezando os
demais colegas de trabalho, ou seja, há que haver reflexão coletiva sobre os
problemas.
Segundo Zeichner (1993, p.45), uma das consequências do isolamento e da
falta de atenção ao contexto social e institucional é que os professores passam “a
ver seus problemas como exclusivamente seus, sem relação com os de outros
professores, ou com a estrutura e os sistemas escolares”. Nesse sentido, uma
atuação do CP, considerando a escola como lugar de formação, sem desconsiderar
outros espaços formativos, contribuirá para a compreensão da dialética num
movimento de aproximação e distanciamento da realidade escolar, em relação ao
contexto mais global, culminando numa formação menos alienante, portanto, mais
crítica da realidade.
Tomando como pressuposto que a formação continuada dos professores
aconteça na escola, em seu contexto de trabalho, respeitando outros espaços
49
formativos, o CP, na condução desse processo, deve valorizar as experiências
vividas dos professores, seus conhecimentos e saberes. Como afirma Clementi
(2011, p.59), ele deve “considerar a forma de pensar e agir do professor como um
ponto de partida, como um indicativo de suas necessidades de formação”.
A partir de um olhar atento sobre a realidade do trabalho dos professores na
escola, de forma geral, e na sala de aula, em particular, o CP pode organizar
reuniões para reflexões sobre a prática de cada professor e promover discussões
grupais como forma de trocar experiências, informações e ideias para proposição de
ações coletivas.
Garrido (2011 p.13) sugere que na condução dos momentos de discussão, o
CP “parta do levantamento de um trabalho com cada professor, no sentido de
conhecer seu trabalho, de ouvir suas dificuldades e ajudá-lo, ou de valorizar suas
experiências, dando espaço para divulgá-las” no trabalho coletivo. Almeida (2010)
corrobora explicando que na condução das reuniões de formação, o CP traz consigo
conhecimentos a respeito da problemática vivenciada pelos docentes, o que
significa dar valor às ideias e à fala do professor.
É essencial que a fala do coordenador pedagógico carregue um conteúdo de reconhecimento e conhecimento – reconhecimento do ponto de vista do professor, de seus problemas, lacunas, recursos, mas também de conhecimento, oferta de subsídios para atuação. [...] O coordenador pedagógico precisa estar atendo a esse aspecto e retomar as preocupações das reuniões dos corredores e das salas de professores para reuniões de formação mais sistematizadas (ALMEIDA, 2010, p.75).
Outro aspecto que consideramos importante é que num processo de
formação, o CP enquanto formador deve lançar seu olhar aos problemas da prática
do professor, como foi dito anteriormente, e também não deixar de considerar que o
docente enquanto profissional da educação é um ser humano que na medida em
que trabalha, age com todo o seu ser. Neste caso, segundo Zumpano e Almeida
(2012, p.28), “formar o professor em serviço implica que o coordenador pedagógico
dialogue com ele continuamente no cotidiano da escola, lidando com emoções e
sentimentos dele próprio e do professor que acompanha”.
Não podemos acreditar que o investimento no desenvolvimento cognitivo do
professor seja suficiente para que ocorra formação. Quando trabalha, ele não se
separa de seus sentimentos, valores, expectativas com relação ao futuro, suas
50
desilusões. Ele é uma pessoa indivisível e isso precisa ser levado em consideração
pelo formador. Zumpano e Almeida (2012, p. 28) reforçam que:
para articular um processo de formação continuada em serviço, o coordenador pedagógico precisa olhar, antes de tudo, para o educador em sua totalidade (cognição/afetividade), conhecendo, respeitando e considerando sua historia de vida, sua bagagem cultural, suas experiências e seus valores pessoais, articulando os professores e suas concepções, à realidade da instituição na qual atuam, considerando suas concepções pessoais e as propostas pedagógicas adequadas às crianças pequenas.
Assim, a formação continuada realizada em contexto de trabalho precisa
considerar alguns aspectos, entre eles o reconhecimento do docente como pessoa
humana e profissional, bem como produtor de saberes e conhecimentos; valorizar
as queixas, as problemáticas vivenciadas no cotidiano da escola; dar voz e vez a
esse profissional.
De acordo com Bruno e Abreu (2011), é nessa esteira que conhecemos as
possibilidades de contribuição do CP como o profissional que, na unidade escolar,
responde fundamentalmente pelo processo de formação continuada dos
educadores e pelo projeto de construção da relação entre teoria e prática docente.
No entanto, é preciso destacar que o CP não encontra facilidade para
exercer sua função, ao contrário, como tratamos a seguir, as condições de trabalho
a que está submetido não são tão favoráveis como poderíamos supor. O CP não
tem, muitas vezes, clareza sobre seu papel e suas atividades são influenciadas
pelas características de cada espaço escolar, pelas interações com os demais
atores da escola, com expectativas conflitantes, num cotidiano marcado por
acontecimentos de toda ordem que se convertem em demandas de trabalho que o
afastam de sua atribuição como formador.
2.2. O dia a dia da escola e as ações do coordenador pedagógico na literatura
científica
O local de trabalho do CP é o espaço da escola como um todo, porque é aí
que se desenvolvem, praticamente, todas as atividades relacionadas ao ensino e à
aprendizagem, onde alunos e professores se encontram para cada qual realizar o
51
que lhe cabe dentro desse processo. Como já foi discutido, ao assumir suas
atribuições o CP desenvolve muitas ações no sentido de contribuir para com o
cumprimento do seu papel de educador no interior da escola.
Muitas de suas ações acontecem nos espaços da escola de modo geral,
porém, existem aquelas que precisam dispor de um lugar reservado para que sejam
desenvolvidas, como por exemplo, atender a alguém de forma particular: professor,
pai, aluno ou outra pessoa. Enfim, o CP precisa de uma sala que seja determinada
para a realização de atendimentos específicos.
Em pesquisa realizada, Soares (2011, p. 53) constata que ter um espaço
seu não é comum a todos os CP:
Em muitas escolas, o CP raramente possui uma sala específica para sua função, onde necessita atender individualmente professores e alunos a fim de regular o processo de aprendizagem. Quando esta sala existe, concentra a presença de outros profissionais, o que dificulta o estabelecimento de conversas e orientações individuais onde o professor sinta-se à vontade para desabafar e pedir ajuda para resolver os conflitos da sala de aula. Inserido nessa situação, mesmo tendo de dividir o espaço físico com outros profissionais, sem ter um computador, linha telefônica ou livros disponíveis, o CP procura romper com a precarização do trabalho e fomentar ações focadas no processo de aquisição do conhecimento.
Considerando que valorizar a escuta dos professores está entre as
prerrogativas para que possa desenvolver a formação no espaço da escola, o
atendimento individualizado contribui para que consiga extrair do professor as
dificuldades que está enfrentando. Compartilhar seus medos e inseguranças não é
fácil para um docente; nem todos se sentem à vontade quando precisam expor suas
fragilidades em grupo.
Dizer publicamente que tem dificuldades em relação ao controle da sala de
aula ou frente à sua prática de ensino não é uma situação simples já que, muitas
vezes, os professores são tratados como responsáveis pela ineficiência do sistema
educacional. Neste caso e em outros semelhantes, ter um lugar reservado para
esse fim torna-se imprescindível ao trabalho do CP. Não que ter um lugar reservado
seja suficiente para que o professor aceite conversar sobre todos os assuntos com o
CP; também é necessário que este conquiste a confiança de seus pares para haver
diálogo, trocas entre eles com o objetivo de compartilhar o que sentem.
Muitas escolas até dispõem desse espaço reservado ao CP, porém ele
acaba tornando-se local para guardar materiais pedagógicos que chegam e, muitas
52
vezes, não são aproveitados ou utilizados pelos professores. Outras vezes, esse
espaço não é respeitado como um lugar reservado ao trabalho de coordenação; a
qualquer momento o CP é interrompido por alguém que requisita sua presença em
outro lugar para resolver ou ajudar a resolver algum problema.
Christov (2009) descreve as constantes interrupções que inquietam os CP
no exercício de sua função. A autora aponta algumas hipóteses que poderiam
justificar essas interrupções, já que uma compreensão mais aprofundada
necessitaria de investigação mais rigorosa sobre esse assunto. Por exemplo, o CP é
entendido pelos pares como um funcionário dentro da escola que está ali para o
atendimento de todas as emergências. Todavia, acreditamos ser necessário que o
CP seja reconhecido como portador de uma função mais circunscrita às questões
pedagógicas e tenha seu espaço respeitado por todos dentro e fora da escola.
Outro fator que agrava as dificuldades para os CP desempenharem com
maestria seu trabalho pode estar nas especificidades do cotidiano da escola. André
e Vieira (2011, p.16) indicam que seu dia a dia “é repleto de acontecimentos
variados, superpostos e imprevisíveis. A cada nova situação, a cada novo fato, ele é
chamado a acionar um ou mais de seus saberes e a construir novos”. Se é assim o
cotidiano da escola, o dia a dia do CP não é diferente, pois é nesse meio que está
inserido e atua.
Contudo, somente isso não se configura, necessariamente, como
dificuldade ao seu trabalho, uma vez que deve existir uma equipe com funcionários
especializados para ajudar na resolução dos problemas recorrentes. Lopes, Mendes
e Ferreira (2011, p. 10) atestam que:
o clima organizacional da escola é permeado por conflitos e tensões. Embates e disputas marcam de forma recorrente a relação, pois o coordenador acaba sendo envolvidos em outras funções de gerenciamento, excessos burocráticos e emergências que afetam o cotidiano da escola (violência explícita e oculta envolvendo os diversos segmentos).
As tensões e conflitos que permeiam o dia a dia da escola causam estresse
nos professores e também atingem os CP. Não há como não atingir, pois são
constantemente requisitados para resolver problemas de difícil solução, já que
muitos desses problemas correspondem a questões que envolvem interesses
diferentes dentro da escola. Parece que professores e alunos são colocados em
uma arena para se degladiarem, já que ambos se encontram ocupando os mesmos
53
espaços, buscando objetivos diferentes e ali, em muitos casos, são esquecidos
pelas autoridades.
Nesse contexto, o CP é acionado para dar uma solução aos conflitos,
porém, não podem ser resolvidos de imediato e somente por meio de ações
isoladas e internas. Entre outros, o problema da violência é também estrutural, mas
o CP é cobrado por sua resolução seja por parte dos docentes, seja por parte de
pais e alunos, ou até mesmo pela direção.
Cunha (2006), em pesquisa junto a um grupo de formação de
coordenadoras, descreve os sentimentos das mesmas ao atuarem num ambiente
escolar conflituoso atuando como “bombeiros apagando incêndios”. Essa situação
provocava-lhes mal-estar; chegavam ao final do dia de trabalho com o sentimento
de não terem feito nada de importante. Logo, o resultado de atuar num ambiente
instável é que, ao terminar seu trabalho, o CP vai para sua casa sentindo
frustrações por não ter conseguido fazer o que planejou e, no dia seguinte, tem que
estar de volta a esse mesmo ambiente.
Como consequência de atuar em um ambiente escolar marcado por
tensões, acontecimentos variados e imprevisíveis, as ações do CP acabam por ser
orientadas por essas demandas e caracterizam-se por improvisações. Essa forma
de atuar dos CP é apontada por Tamassia (2011) como corriqueira em muitas
escolas, percebidas como espaços de pouco planejamento, improvisação, ações
espontaneístas, emergenciais e superficiais, baseadas no bom senso e que se
convertem em dificuldades ao trabalho.
O coordenador pedagógico relata em entrevista a mim concedida que sua maior dificuldade na função esteja em “administrar a descontinuidade das ações... Nenhum plano pode ser concluído porque sempre aparece uma coisa mais importante e mais urgente para a gente socorrer. Nós, coordenadores, somos bombeiros ou médicos de pronto-socorro. Vivemos apagando incêndios e socorrendo emergências. Somos na verdade auxiliares da direção” (CHRISTOV, 2009, p. 65).
Em contrapartida, dizer que o cotidiano do CP é marcado por
acontecimentos imprevisíveis e que isso, em grande parte, leva-o a atuar por meio
de ações improvisadas, sem planejamento, não significa que esses fatores
expliquem por completo suas dificuldades na realização de seu trabalho no dia a dia
e na condução das ATP, pois como destaca Pierini (2007, p.51), dispensar tempo
ao atendimento às urgências faz parte do papel do CP, uma vez que estas,
54
não são tão inesperadas como parecem e que podem e devem ser pensadas e consideradas de forma articulada àquelas propostas como de importância. Fazer a leitura do dia-a-dia da escola caracterizando, por exemplo, a dinâmica de cada um dos seus períodos de funcionamento, vem me possibilitando planejar algumas ações de forma a otimizar as condições para minha atuação e alinhavar alguns princípios ao buscar compreender as muitas escolas que aí existem.
Placco (2003, p. 49-50) contribui para nosso entendimento sobre as
urgências do cotidiano, esclarecendo que:
urge que o(a) coordenador(a) pedagógico-educacional aprenda a transformar muitas das URGÊNCIAS - atividades que direcionam-se para atender aos problemas-situações que não são previstos pelo processo de decisão-ação e que exigem permanente atenção (p. 50) - em ROTINAS - atividades que direcionam-se para o funcionamento do cotidiano, para as normas reguladoras dos processo decisão-ação, para a manutenção de procedimentos e de recursos de trabalho (p. 49) – prevendo comportamentos e ações necessárias, com pessoas responsáveis por elas, para responder por eventuais situações que, embora aparentemente inesperadas, não o são, no contexto da escola, que conhece, sobejamente, situações de incidentes ou acidentes com crianças, faltas de equipamento, de recursos, de profissionais e outras eventualidades.
Pelo exposto, admitimos a impossibilidade de eliminar as urgências, já que,
segundo as autoras, elas fazem parte do cotidiano da escola. Consequentemente,
não podemos eximir o CP da responsabilidade de planejar ações considerando essa
realidade heterogênea, ou seja, suas ações também precisam abarcar as urgências
do dia a dia, pois como nos lembra Pierini (2007), elas não são tão “inesperadas”.
No entanto, mesmo que diante dessa realidade as situações problemáticas
surjam e requeiram atenção do CP, uma vez que muitas delas estão ligadas às
questões de ensino e aprendizagem, o CP poderia ter suas funções mais
direcionadas ao atendimento às urgências ligadas às questões pedagógicas.
Segundo Fernandes (2010), as muitas atividades realizadas por esse
profissional no cotidiano da escola não são atribuições suas e poderiam ser
realizadas por outros funcionários, liberando-o para a realização de atividades
especificamente pedagógicas.
Porém, sem que haja orientação e apoio do gestor, o CP, por si só, não
conseguirá deixar de atender às demandas urgentes. Como nos relata Soares
(2011, p.49), “o cotidiano do coordenador pedagógico é determinado pela gestão
escolar, uma vez que se solicita que este execute atribuições de outros segmentos”.
55
As constantes solicitações dos gestores, juntamente com a obediência
quase total do CP, na maioria das vezes, conduzem-no ao desempenho de um
trabalho baseado em ações espontâneas e improvisadas. Muitas vezes ele é
requisitado e só vai tomar ciência do que se trata quando já se encontra diante de
um problema que exige ação imediata. E isso se repete várias vezes durante o dia.
Como ressaltam Placco e Souza (2012), muitos diretores acreditam ser
função dos CP o atendimento a todas as necessidades da escola e,
inadvertidamente, estes as assumem como suas.
Em última análise, fica claro que os diretores, embora afirmem valorizar as funções pedagógicas dos CP, na realidade, acreditam que eles devem atender às múltiplas necessidades cotidianas da escola, o que acaba por fazer com que os CP priorizem esse atendimento, deixando de lado outras atribuições de sua responsabilidade, principalmente as de cunho formativo. (PLACCO; SOUZA, 2012, p.12).
Como resultado dessa forma de o gestor entender o papel do CP é que, em
vez deste exercer suas funções, segundo Fernandes (2010), acaba realizando
atividades de forma coercitiva no dia a dia, desde o cumprimento de funções que
correspondem ao diretor, ao secretário, até as que são próprias do inspetor de
alunos, do servente, de professores e/ou de outros funcionários.
Se por um lado o gestor tem a crença que esse deva ser o papel do CP na
escola, por outro lado, mesmo sabendo de suas atribuições, assume-as como suas,
mesmo que isso lhe traga, como foi dito anteriormente, frustrações por não
conseguir ver resultados positivos em seu trabalho. Essa aceitação é explicada por
Soares como sendo resultado do respeito à hierarquia do sistema.
Os coordenadores pedagógicos sabem de suas atribuições, mas devido à hierarquia do sistema, acatam os pedidos equivocados dos gestores e acabam por contribuir para o não desenvolvimento das suas funções pedagógicas, como, por exemplo, atender aos pais de alunos enquanto a Orientação Educacional encontra-se na escola, mas o gestor prefere aproveitar a competência do coordenador (SOARES, 2011, p.51).
Outro aspecto que incide diretamente sobre o trabalho do CP é o fato de as
escolas contarem com um número insuficiente de funcionários. Este é um problema
que deve ser colocado num contexto mais geral, ultrapassando o âmbito da escola,
ou seja, depende em parte da postura do gestor, mas muito mais do sistema de
56
ensino de forma geral, uma vez que a solução deve provir da atuação direta das
secretarias e do governo.
As escolas, rotineiramente, contam com um quadro de professores titulares
incompleto, funcionando com professores substitutos. A ausência dos professores
obriga que o CP, em muitos momentos, assuma seu papel, já que se tornou praxe
ser dele a função de resolver os problemas que surgem, o que inclui substituir
professores em sala de aula.
Segundo os sujeitos da pesquisa realizada por Soares (2011), um dos
fatores que tem dificultado o trabalho do CP é a falta de professores na escola, pois
na ausência deles, este profissional tem que assumir o papel de professor, já que os
alunos não podem ser dispensados ou ficar sem aula, circulando pelos corredores
da escola.
Devido ao fato de as escolas contarem, rotineiramente, com uma equipe
incompleta, o CP tem que estar logo no início do horário de trabalho pronto a intervir
na ausência de professores e, independentemente de o motivo dessas faltas ser
justificável ou não, é ele quem deve providenciar substituto para os estudantes ou
assumir a responsabilidade de ir para a sala de aula cobrir as ausências do dia.
Essas substituições, segundo Araújo (2007), acabam interferindo no
desenvolvimento do trabalho de coordenação, posto que estando na sala de aula o
CP torna-se um professor, necessitando praticar a gestão da classe com todas as
implicações rotineiras que ocorrem, o que difere do que lhe é atribuído enquanto
função. Essa é uma situação que se repete com frequência na maioria das escolas
devido às recorrentes faltas dos professores.
As condições de trabalho dos docentes provocam um sentimento de
cansaço e desânimo que os fazem encontrar nas faltas momentos de alívio e
renovação de forças. A ausência de condições de vida digna para exercer o papel
de educador é caracterizada como burnout, o mal-estar docente que causa não só
insatisfações, como até problemas de saúde.
Somando-se a essas atribulações, os CP recebem outras incumbências tais
como “auxílio no controle dos alunos e a resolução de problemas administrativos e
burocráticos” (CARVALHO, 2010, p.101). O resultado de todas essas intercorrências
é que, segundo Mendes (2011, p. 86), o CP “acaba encontrando dificuldades para
definir seu campo de atuação na escola”.
57
Com seu campo de atuação mal compreendido por si mesmo, pelos
gestores e professores, e assumindo tarefas que não lhe cabem, o CP fica com
pouco ou nenhum tempo para investir em seu crescimento profissional, agravado
pelo fato de exercer seu papel, muitas vezes, sem ter tido a formação específica
adequada à coordenação pedagógica, o que, por sua vez, gera insegurança frente
ao trabalho de orientação pedagógica dos docentes.
Esta é uma das queixas dos CP, de acordo com o trabalho desenvolvido por
Franco (2008, p.7): “além da dificuldade referente à formação teórica, os
coordenadores se queixam de não dominar os conteúdos das diferentes áreas do
saber, e que isso os impede de trabalhar mais profundamente com os docentes”.
O sentimento de incapacidade para a realização das tarefas de orientação
pedagógica junto aos professores de cada área deixa os CP vulneráveis e, como
esclarece Franco (2008), acabam dando prioridade àquilo que, de alguma forma,
sabem ou conseguem fazer, mesmo que superficialmente, por gastarem grande
parte de seu tempo procurando atender aos chamados dos professores, sejam
atribuições de sua responsabilidade ou de outros funcionários da escola, inspetor ou
diretor.
Ficam, assim, sujeitos às demandas urgentes tanto por parte da direção,
como dos professores, como forma de legitimarem sua posição como
coordenadores, o que não deixa de ser uma preocupação pertinente, uma vez que
ocupam uma função que, aos olhos, principalmente dos docentes, é para alguém
que possui um grau mais elevado de conhecimentos. O receio de não corresponder
ao que dele se espera faz com que o CP valorize o atendimento de demandas que
não correspondem ao que seria própria de sua função, isto é, a orientação
pedagógica e a condução da formação continuada no espaço da escola.
Quais as implicações desse quadro sobre a postura do CP frente à
condução das ATP? Acostumados a solucionar problemas, a atender às demandas
de diretores e professores, os CP, segundo Dugnani (2011), terminam por conduzir
as ATP com a mesma postura com que se colocam diante das urgências do dia a
dia da escola.
O sentido de apagar incêndios também determina a forma como o orientador pedagógico conduz a formação continuada dos professores, visto que na ânsia por suprir as expectativas docentes de convivência com suas justificativas para os insucessos no processo de ensino-aprendizagem, torna-se complacente com a resistência dos professores às propostas de
58
reflexão que poderiam transformar as práticas docentes na escola. Desse modo, os espaços formativos são transformados em espaços para queixas e lamúrias, nos quais não se gestam novas formas de atuação que poderiam transformar a realidade da escola, e reforçam ainda mais a ideia de que os problemas vivenciados na escola não são passiveis de resolução (DUGNANI, 2011, p.141).
O espaço da escola requer a organização dos horários das ATP para fins
relacionados à formação, caso contrário, podem ocorrer, como tem acontecido em
alguns lugares, momentos de “discussões e de recados que não levam a nenhum
tipo de ação pedagógica (blá, blá, blá), ou seja, nada que tenha reflexos em sua
prática; os recados acabam extrapolando o horário e não sobra tempo para planejar”
(MENDES, 2008, p. 85).
Ao contrário, as ATP, muitas vezes utilizadas para atender às demandas
burocráticas da Secretaria de Educação, podem vir a ser um espaço privilegiado de
discussão e reflexão sobre as práticas, dilemas e problemas do dia a dia,
enfrentados pelos docentes, pois como destaca Cunha (2012, p. 16), esses
encontros
podem ser considerados como instâncias formativas privilegiadas, oferecendo oportunidades para que professores e gestores confrontem as suas posições, interroguem o vivido, elaborem projetos conjuntos, assumam a colaboração e interlocução sobre as práticas como possibilidade de formação compartilhada.
Diante do que foi abordado ao longo deste estudo entendemos que o CP é
um profissional de grande importância na escola pelas atribuições que lhe são
dadas e, principalmente, por ser aquele que assume a condução da formação
continuada dos professores no próprio local de trabalho.
Sob essa ótica, para que o CP consiga desempenhar sua função de
formador, é necessário elaborar diagnóstico sobre as necessidades de formação, os
problemas e dificuldades do grupo, planejar as reuniões e objetivar as ações,
escolher os procedimentos para sua condução, enfim, uma formação consistente
não pode acontecer por meio de improvisos, ao contrário, requer que se trabalhe
com planejamento (CLEMENTI, 2011, SOUZA, 2011; TORRES, 2011; ZUMPANO;
ALMEIDA, 2012).
Porém, como foi detalhadamente discutido na revisão bibliográfica dessa
pesquisa, o dia a dia de trabalho do CP é marcado pela improvisação de ações,
devido a situações inesperadas e imprevisíveis, acúmulo de tarefas, desvio de
59
função, atendimento a demandas urgentes, constantes interrupções, rotina de
trabalho burocratizada etc. (ARAÚJO, 2007; CHRISTOV, 2009; GOMES, 2011;
LIMA, 2009; OLIVEIRA, 2006; PLACCO; SOUZA, 2012; SANTOS, 2008; SOARES,
2011; TORRES, 2011).
Fundamentando-nos nos autores estudados, podemos inferir, então – após
essa exposição das vicissitudes que o CP enfrenta cotidianamente e que o impedem
de exercer sua função precípua de formador/orientador pedagógico dos colegas
docentes – que as circunstâncias em que atua precisam ser modificadas, embora
não dependa só dele alterar essas conjunturas, mas sim de todo o sistema de
ensino estreitamente vinculado às Políticas de Educação.
No próximo capítulo abordaremos a trajetória da construção desta pesquisa
destacando a constituição e a caracterização dos sujeitos e o local onde se
desenvolveu trabalho de campo. Apresentamos, ainda, o desenvolvimento dos
encontros de discussão entre os CP, a forma de registro e a construção dos dados.
60
CAPÍTULO 3 - Construção da pesquisa: a trajetória empreendida
Neste capítulo temos por objetivo descrever o percurso percorrido que visou
responder à questão: Quais as dificuldades dos CP na articulação do trabalho
coletivo e promoção da formação nas ATP?
Como CP inserido no contexto do curso de formação para coordenadores
oferecido pela Secretaria Municipal de Educação durante o primeiro semestre de
2012, propus-me, por meio de observação, participação e registro em diário de
campo, a acompanhar os seis encontros de formação desse grupo. Dos seis
encontros, quatro foram audiogravados e transcritos depois do consentimento dos
colegas.
Nesse sentido, esta pesquisa é de natureza qualitativa, uma vez que nos
propusemos a conhecer e interpretar as informações recolhidas num ambiente
natural e estivemos interessados no modo como os sujeitos dão sentido às suas
experiências pessoais e profissionais (BOGDAN; BIKLEN, 1994). Nosso foco de
interesse foram as experiências de condução e as dificuldades enfrentadas pelos
CP nas ATP e que foram compartilhadas no contexto dos encontros de formação na
Secretaria.
Mediante leitura, análise e interpretação das transcrições buscamos
responder à questão-problema. Nessas análises, consideramos os diálogos entre os
CP sobre a organização e condução da formação nas ATP salientando as principais
dificuldades encontradas. Posteriormente, construímos eixos de análise a partir da
leitura crítica do material. Esse modo de análise está caracterizado mais adiante.
Esta pesquisa caracteriza-se como estudo de caso na medida em que se
baseia na observação detalhada de um contexto e de um grupo específico, o de
coordenadores pedagógicos, uma vez que uma das relevâncias do estudo de caso é
poder contribuir com a discussão do tema em foco e, neste caso, trata-se da função
do CP como formadores de professores e as condições de acompanhamento das
ATP face às condições concretas de trabalho nas escolas públicas.
Os participantes e responsáveis pela organização do curso foram
informados sobre os objetivos da pesquisa e assinaram um termo de consentimento
livre e esclarecido, em anexo.
61
3.1. Caracterização do local da pesquisa
A Secretaria Municipal de Educação - SME, local onde se desenvolveu esta
pesquisa, pertence a um município com população estimada em mais de 300 mil
habitantes, localizado no interior do estado de São Paulo.
Esta Secretaria administra um sistema de ensino com atividades em 61
escolas de Educação Infantil, com 5.844 alunos; 11 escolas de Educação Infantil de
atendimento em tempo integral, com 3.406 alunos; 10 Polos de Educação de
Jovens e Adultos, com 198 alunos; 11 escolas de Ensino Fundamental I e 05
escolas de Ensino Fundamental II, com o total de 8.491 alunos matriculados.
Possui em seu quadro de funcionários 54 professores na Educação de
Jovens e Adultos; 573 professores de Educação Infantil; 447 professores efetivos de
Educação Fundamental I e II, além de 14 professores adjuntos (substitutos) de
Educação Fundamental II, sendo 2 de Educação Física, 2 de Geografia, 1 de
História, 1 de Ciências, 2 de Língua Portuguesa, 2 de Inglês, 1 de Arte e 3 de
Matemática. Esses professores adjuntos têm sua sede numa das cinco unidades
escolares do 6° ao 9° ano e sua função é assumir as classes que não foram
atribuídas no início do ano e substituir os professores em suas ausências durante o
ano letivo e na ausência eventual de professores.
No que diz respeito aos coordenadores pedagógicos, a rede possui um na
Educação de Jovens e Adultos; 23 na Educação Fundamental I e 5 na Educação
Fundamental II (grupo pesquisado). A Educação Infantil não conta com coordenador
pedagógico, apenas um diretor geral.
No que se refere à formação continuada, a SME proporciona,
semestralmente, aos professores de seu sistema e aos de escolas conveniadas,
cursos de curta duração que são elaborados e conduzidos pelos Coordenadores de
Áreas. Esses coordenadores comumente contam com apoio de professores das
universidades, geralmente públicas, que atuam dentro do projeto de extensão
desenvolvendo trabalhos relacionados à formação continuada na Secretaria.
Em relação à formação continuada dos CP, quando assumi esta função em
2009, não havia ainda cursos para os CP do Ensino Fundamental II. Nossa
formação dependia de leituras, participação em congressos, cursos de Pós-
62
Graduação, desde que fossem assumidas por nós e, às vezes, participando de
palestras oferecidas pela SME. Somente no 1° semestre de 2012 fomos
convocados pela primeira vez para participar de formação e é nesse contexto,
portanto, que a pesquisa se desenvolveu. Já para os CP do 1° ao 5° ano havia
formação desde 2009. Eles eram convocados para reuniões quinzenais, cuja
coordenação ficava a cargo de uma das Coordenadoras de Áreas da Secretaria.
A formação continuada oferecida pela SME a todos os CP do 6 ao 9° ano,
planejada e conduzida por uma Coordenadora de Área, teve início em maio de 2012
dentro do seu programa de formação continuada semestral. Foi um curso de 30
horas inicialmente organizado em oito encontros presenciais, dos quais dois não
aconteceram devido à adequação do calendário. Fomos convocados para essa
formação e o grupo no qual desenvolvi a pesquisa contou com os cinco
coordenadores do Ensino Fundamental II, duas supervisoras da Secretaria que
participaram alternadamente do terceiro e quarto encontro e a coordenadora do
curso. No tópico a seguir descrevemos a caracterização dos participantes que
estiveram envolvidos nas discussões e assinaram o termo de consentimento livre e
esclarecido.
3.2. Caracterização dos sujeitos da pesquisa
Neste estudo participei como sujeito e pesquisador, uma vez que integrei o
grupo formado pelos cinco CP reunido em formação no 1° semestre de 2012. Nas
análises das falas aparecerei com o meu próprio nome, Amarildo. Desde março de
2013 desempenho a função de Coordenador de Área de História na Secretaria.
Todavia, no contexto em que se iniciou e se desenvolveu esta pesquisa estava
atuando como Coordenador Pedagógico em uma das cinco unidades escolares do
Ensino Fundamental II.
Como relatei no meu memorial, cheguei à coordenação por meio de convite
da direção, no início de 2009. Este era um dos meios pelo quais os CP assumiam a
63
função nesta Secretaria, o que era o caso de todos os CP do grupo, exceto uma das
coordenadoras7.
Os encontros foram conduzidos pela Coordenadora de Área, Ângela8, que
ocupava o cargo de diretora de Divisão de Coordenação de Áreas do Departamento
Pedagógico da SME e responsável pela formação de professores e pela equipe de
apoio nas áreas de Ciências Naturais, Meio Ambiente e Educação Ambiental. Sua
carreira profissional teve início com o exercício de docência em 1987, como
professora efetiva de Ciências na SME. Em 2005, assumiu o cargo de direção.
Desde 2010 atuava na formação de professores e da equipe escolar. É formada em
Ciências Biológicas, possui especialização em Educação para a Ciência,
especialização em Gestão Escolar e mestrado em Educação para a Ciência.
A CP Débora formou-se em Educação Física e Pedagogia e fez
especialização em Educação Física Escolar. Sua carreira profissional teve início
com o exercício da docência na Rede Estadual, atuando como Admitida em Caráter
Temporário (ACT) de 2002 a 2011. No período em que se desenvolveu a pesquisa,
havia um ano que estava na função de CP, assumida por meio de eleição pelos
pares. Em 2013 voltou para a sala de aula.
A CP Márcia é formada em Ciências Biológicas e cursou mestrado na área
de Educação para Ciências. O início de sua carreira docente se deu na Rede
Estadual de Ensino, atuando como ACT. Ingressou como professora de Ciências
numa Rede Municipal de Ensino e, em 2010, assumiu, por convite da direção, a
função de Coordenadora Pedagógica na unidade em que possui o cargo efetivo de
professora.
A CP Raquel possui formação em Engenharia e em Matemática. Iniciou a
carreira de docente ensinando Matemática na Rede Municipal de Ensino, local em
que se realiza esta pesquisa. Em 2011, assumiu a função de Coordenação
Pedagógica por meio de convite da direção. No início de 2013 retornou à sala de
aula.
7 A partir de maio de 2012, em meio ao nosso processo de formação na SME, com a promulgação de
uma lei municipal, os CP passaram a ser escolhidos seguindo uma regulamentação específica. Em síntese, a lei determina que a partir de sua publicação a função de coordenação pedagógica deveria ser ocupada por meio de apresentação de projeto, eleição pelos pares e aprovação de uma comissão formada pela supervisão e direção da unidade em que o professor apresentou o projeto. É importante ressaltar que, na prática, esta lei passou a vigorar somente a partir de novembro do mesmo ano. 8 Os nomes dos sujeitos da presente pesquisa são fictícios.
64
3.3. O desenvolvimento dos encontros: observações, registros e
audiogravações
Os dois primeiros encontros foram realizados em 13/03/2012 e 27/03/2012
no espaço destinado à realização dos cursos de formação da Secretaria. Nesses
dois primeiros encontros tivemos como formadora uma professora de uma
universidade pública paulista que desenvolveu discussões sobre a Coordenação
Pedagógica.
No primeiro, a formadora apresentou um histórico sobre a Coordenação
Pedagógica no Brasil. No segundo, discutimos as atribuições e as dificuldades dos
CP. Para este encontro, ela nos pediu que trouxéssemos uma tarefa que havia
passado no final do primeiro encontro. A atividade consistia em descrever nossas
dificuldades no dia a dia e apresentar uma ação desenvolvida com sucesso na
escola.
Iniciamos o encontro compartilhando as tarefas e, embora não tenha sido
realizada por todos, à medida que os CP iam compartilhando suas experiências as
discussões ganhavam destaque a ponto de que nem todos os que a realizaram
conseguiram socializar o que haviam desenvolvido. Pelas discussões ficava clara a
necessidade que nós, CP, tínhamos de falar, de compartilhar nossas experiências,
nossas dificuldades.
Desses dois encontros, participaram todos os CP do 1º ao 9º ano do Ensino
Fundamental em virtude de estarmos aproveitando a presença da formadora
externa. Ao final, fomos informados de que os demais encontros seriam realizados
em dias e horários diferentes, estando cada qual sob uma coordenação (Ensino
Fundamental I e II separadamente).
Entre o segundo e o terceiro encontro é que houve um intervalo de tempo
que me permitiu providenciar os documentos necessários para que pudesse iniciar
esta pesquisa, registrando e audiogravando as discussões dos encontros seguintes.
Assim, para que a pesquisa de campo transcorresse obedecendo ao que
determina o Comitê de Ética da UNIMEP, procurei a SME com o objetivo de
conseguir sua autorização. De posse dos documentos necessários, Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido e Declaração de Responsabilidade do
65
Pesquisador, entrei em contato com o departamento responsável e obtive o
documento de Autorização do Local de Pesquisa assinado.
De posse desses documentos, o passo seguinte foi dialogar com o grupo
sobre o desenvolvimento da pesquisa, sobre os objetivos e a metodologia, para que
consentissem na realização das gravações em áudio e na utilização das
transcrições para análises de pesquisa. Isto foi feito já no primeiro encontro
realizado somente com os CP do Ensino Fundamental II, isto é, com o grupo
específico.
Desta forma, o terceiro encontro de formação, ocorrido em 24 de abril,
passou a ser o primeiro sistematicamente registrado em diário de campo e gravado
em áudio. Para este encontro, cheguei um pouco antes com a finalidade de
conversar primeiramente com nossa coordenadora, que já se encontrava presente
preparando o local para as discussões.
Apresentei-lhe o projeto e a documentação de autorização da Secretaria a
que ela demonstrou boa receptividade. Com a chegada dos demais CP, apresentei
meu projeto de pesquisa. Eles também foram bem receptivos. Em seguida,
entreguei-lhes o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, cujo conteúdo
informava o projeto de pesquisa e seus objetivos, que foi lido e assinado por todos.
Entreguei, também, o documento de Declaração de Responsabilidade do
Pesquisador.
No terceiro encontro de formação, primeiro audiogravado, estiveram
presentes os cinco CP, uma supervisora da SME e a coordenadora do grupo. A
coordenadora informou que constituíriamo-nos como um grupo de estudos, cujos
temas haviam sidos escolhidos baseando-se nas indicações que fizemos
anteriormente via e-mail. Mais uma vez salientou que eu estava desenvolvendo o
projeto de pesquisa de Mestrado e que os encontros seriam audiogravados e
transcritos para análises, como já havia sido mencionado; todos fizeram gestos
concordando. Assim, liguei o gravador de voz modelo Sony ICD-PX312 e iniciamos
as discussões.
O espaço de formação da SME possui sete salas, sendo três no piso térreo
e quatro no piso superior. Nossos encontros ocorreram todos no piso superior, mais
especificamente nas salas quatro e cinco. São duas salas com bom isolamento
66
acústico, de forma que ocorreram formações nas salas ao lado sem prejudicar
nossas discussões e a gravação de áudio.
Como primeiro tema de discussão tivemos o texto “O coordenador
pedagógico na educação básica: desafios e perspectivas” (LIMA; SANTOS, 2007)9.
Este texto, como já mencionei, foi-nos enviado via e-mail, portanto, o grupo já
possuía algumas anotações sobre o tema. Como éramos um grupo de estudos, a
condução das discussões se desenvolveu de forma interativa.
À medida que íamos lendo trechos, fazíamos paradas para discussões que
ganhavam proporções e direções diversas. Na maioria das vezes entrávamos em
outros assuntos, principalmente naqueles relacionados ao nosso dia a dia de
trabalho. As dificuldades, angústias, dúvidas, enfim, as discussões ficavam repletas
de assuntos de nosso cotidiano.
No quarto encontro, segundo audiogravado, realizado em 08 de maio de
2012, estiveram presentes a coordenadora desse grupo de formação, a supervisora
e os cinco coordenadores do 6° ao 9°. Neste encontro discutimos o texto “Remédios
para o professor e a educação” (POLATO, 2008)10
.
A coordenadora iniciou explicando o que tínhamos estudado no encontro
anterior, justificou a escolha do texto e o que iríamos discutir naquele dia. Na parte
introdutória do texto a autora informa que cada vez mais professores sofrem com
estresse, dores de cabeça, distúrbios de voz e tantos outros problemas; finaliza
apresentando oito remédios que, além de melhorar o bem-estar, vão garantir
também mais qualidade para as aulas. Entre eles, alívio para problemas como
estresse e dores musculares – as maiores causas de afastamento da sala de aula –
para, assim, garantir um ensino de qualidade.
O texto se propunha, como um receituário, a resolver muitos dos problemas
que as escolas enfrentam devido a problemas físicos e emocionais que muitos
professores apresentam. Os CP demonstraram-se entusiasmados com a
possibilidade de terem encontrado formas de resolver os problemas que
enfrentavam em suas escolas.
9 LIMA, P. G.; SANTOS, S. M. O coordenador pedagógico na educação básica: desafios e perspectivas. Educare et Educare, São Paulo, v. 2, n. 4, p.77-90, jul./dez. 2007. Disponível em: http://e-revista.unioeste.br/index.php/educereeteducare/article/view/1656. Acesso em: 12 ago. 2013.
10 POLATO, A. Remédios para o professor e a educação. Nova Escola, São Paulo, edição 211, p.39-45, abr. 2008. Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/formacao/formacao-continuada/ remedios-professor-educacao-423190.shtml. Acesso em: 12 ago. 2013.
67
A dinâmica utilizada para as discussões foi a mesma do encontro anterior,
destacando a multiplicidade de assunto que acabavam surgindo durante as
discussões. Parece que não havia como deixar de remeter aos problemas
cotidianos enfrentados por todos nas escolas.
Esse tema ajudou a perceber que as condições de trabalho a que os
professores estão submetidos, estresse, desânimo, dentre outros, acabam
sobrepondo-se ao trabalho do CP. A esse respeito Torres (1994 apud PIERINI,
2007, p. 44),
aponta que os profissionais não docentes não estão isentos das pressões que responsabilizam os educadores pelas crises verificadas na educação e que este peso em seus ombros pode colocá-lo numa posição também de isolamento (à semelhança dos professores) e com menores chances de encontrar interlocutores que o auxiliem a rever suas atuações.
Pudemos inferir que as condições de trabalho a que os docentes estão
submetidos e as cobranças que lhes recaem têm influência direta sobre o trabalho
do CP, já que coordenadores e professores possuem estreita relação no trabalho
diário da escola.
No quinto encontro, terceiro audiogravado, realizado em 22 de maio de
2012, estiveram presentes a coordenadora do grupo e apenas dois CP, além de
mim. Esse encontro diferenciou-se dos demais pela ausência de quatro
participantes: três CP e a supervisão. No momento, não foi possível saber os
motivos das ausências, fato que deixou o grupo um pouco abatido. Embora abatidos
com as ausências, discutimos o assunto seguindo a dinâmica anterior.
Tivemos como texto-base o tema: “A síndrome de Burnout e o trabalho
docente” (CARLOTTO, 2002)11
que busca, a partir da literatura, apresentar a
Síndrome de Burnout sob a perspectiva sócio-psicológica de Christina Maslach.
Expõe os principais modelos explicativos de Burnout em professores e
fundamentado em estudos recentes, identifica suas principais causas e
consequências para os profissionais e para as instituições de ensino. Embora
fôssemos apenas três participantes, nossas discussões seguiram conforme as
demais, uma vez que o tema nos remetia aos problemas enfrentados pelos
professores em seu cotidiano.
11
CARLOTTO, M. S. A síndrome de burnout e o trabalho docente. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 7, n. 1, p.
21-29, jan./jun. 2002. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/pe/v7n1/v7n1a03.pdf.> Acesso em: 12 ago.
2013.
68
O sexto encontro, quarto audiogravado, foi realizado em 19 de junho de
2012. Neste último encontro avaliamos a formação e elaboramos propostas para a
continuação do grupo no 2º semestre de 2012. Neste dia, participaram do encontro
os cinco coordenadores e a coordenadora do grupo. O encontro iniciou-se com
cumprimentos entusiasmados, risos, perguntas e justificativas pelas faltas do
encontro anterior.
Neste momento estávamos bastante alegres, diferentes do encontro anterior
devido às ausências das coordenadoras. As justificativas foram: duas
coordenadoras estavam trabalhando em suas escolas e iriam chegar atrasadas,
mas não conseguiram sair de suas unidades escolares; uma se esqueceu do
encontro e foi fazer consulta médica.
O grupo de estudo foi bem avaliado pelos CP e todos demonstraram muito
entusiasmo com a possibilidade de darmos continuidade no 2° semestre. Porém,
não houve sequência nessa modalidade, pois no 2° semestre de 2012 todos os CP
participaram de um curso de formação continuada oferecido pela SME na
modalidade de Educação a Distância (EAD).
Acredito ser importante destacar que em todos os encontros, na medida em
que ocorriam as discussões, acabávamos entrando em outros assuntos
relacionados às nossas vivências nas unidades escolares, como os problemas que
enfrentávamos, as experiências negativas ou positivas, enfim, as discussões
enveredavam por caminhos muitos diversos. Foram encontros de duas horas de
duração em que as nossas conversas se prolongavam e variavam. Esse fato
contribuiu para que surgissem, nas transcrições, elementos variados, principalmente
relacionados às dificuldades dos CP na articulação dos trabalhos diários e em
relação à condução das ATP.
Embora eu estivesse participando ao mesmo tempo como pesquisador e
integrante do grupo, na medida em que se ampliaram as discussões, o meu
envolvimento enquanto coordenador era intenso, de forma a ficar muito integrado às
discussões. As problemáticas vivenciadas no dia a dia da escola eram discutidas e
compartilhadas com o grupo na condição de coordenador. Todos os dias, em nosso
local de trabalho, tínhamos pela frente situações concretas próprias da função de
69
CP e discutir esses assuntos com os colegas estava sendo uma experiência que
ainda não havia vivido.
Era a primeira vez que estávamos juntos em formação. Nós não nos
conhecíamos até então, a não ser em pequenos contatos, em algumas reuniões de
que participamos. A experiência que tivemos – estou afirmando no plural porque foi
o que ouvi dos demais colegas – é que não estávamos sós com nossas angústias,
com nossas dificuldades, mas compartilhávamos muitas coisas. De modo particular,
para mim, foi um alívio.
As gravações de áudio totalizaram 7h40min. Para realizar as transcrições a
média de tempo gasto para cada hora de áudio gravado foi de 8 horas de trabalho.
A transcrição completa rendeu 146 páginas.
Para facilitar na identificação das falas de cada integrante utilizei um
programa chamado Audacity - 203-32. Com ele foi possível retornar várias vezes a
cada trecho quando me deparava com falas sobrepostas, que não foram muitas.
Por ser um grupo pequeno, quando alguém iniciava uma exposição de
ideias os demais rapidamente silenciavam. Isso contribuiu para que predominassem
nas gravações de áudio falas isoladas que, por sua vez, facilitaram as transcrições.
As falas dos integrantes aparecem com nomes fictícios como forma de preservar
sua identidade.
Com o objetivo de assinalar os desafios dos CP frente à condução da
formação continuada desenvolvida nos horários das ATP, no quarto capítulo
apresentamos as análises e discussões das transcrições dos encontros entre
coordenadores pedagógicos a fim de responder à questão orientadora da pesquisa:
Quais as dificuldades dos CP na articulação do trabalho coletivo e promoção da
formação nas ATP?
70
CAPÍTULO 4 - A articulação do trabalho coletivo e a formação dos
professores: interpretando os registros
Neste capítulo apresentamos as análises dos diálogos entre os CP sobre a
organização e a condução da formação nas ATP, salientando as principais
dificuldades encontradas. Destacamos que esta sistematização busca responder
aos objetivos desta investigação: compreender as condições de planejamento e
encaminhamento das atividades de trabalho pedagógico (ATP) pelos
coordenadores; e compreender as dificuldades dos coordenadores frente à
articulação do trabalho coletivo e promoção da formação nas ATP.
A questão norteadora da pesquisa é: Quais as dificuldades dos CP na
articulação do trabalho coletivo e promoção da formação nas ATP?
Os eixos e as categorias de análise foram definidos após a leitura
sistemática do conteúdo. No decorrer das sucessivas leituras foi possível
reconhecer que os CP falavam de dois aspectos complementares, ou seja, suas
dificuldades com a direção e com os professores. As conversas no grupo não
obedeciam uma linearidade, pois começavam pelos textos indicados pela formadora
para nortear as discussões e se desdobravam nos relatos dos problemas do dia a
dia de trabalho na escola. Às vezes voltávamos aos textos, outras vezes não. As
contribuições de cada um dos PC eram muito espontâneas e diversificadas e na
medida em que um CP levantava um problema vivenciado os pares se
sensibilizavam para ouvi-lo e compartilhar desafios semelhantes.
Esses eixos de análise foram construídos num processo de interpretação de
sentidos apoiada na análise de conteúdo segundo Gomes (2011), que faz uma
adaptação da análise de conteúdo proposta por Bardin (2009).
A base da análise de conteúdo de Bardin enquanto técnica de pesquisa está
voltada para a descrição sistemática e objetiva, interessada nas recorrências
manifestas nas situações de comunicação. Na busca de indicadores (palavras,
frases, temas) que permitam inferências, este tipo de análise de conteúdo nem
sempre considera as condições de produção e interlocução dos sujeitos da
pesquisa, bem como seus lugares sociais e seus contextos.
71
A proposta de Gomes é buscar interpretar os sentidos das falas e das ações
para chegar a uma compreensão que vá além do descrito pelos sujeitos, isto é, que
avance em relação ao conteúdo manifesto considerando as interações e o contexto.
O foco da intepretação é o conjunto de opiniões sobre o tema que se pretende
investigar considerando as singularidades e diferenças entre os sujeitos; nesse
processo é preciso buscar a lógica interna dos fatos, relatos ou observações, bem
como situá-los no contexto dos seus atores. Segundo este autor, o método de
intepretação de sentidos:
é uma tentativa de avançarmos mais na intepretação, caminhando além do conteúdo dos textos na direção de seus contextos e revelando as lógicas e as explicações mais abrangentes presentes numa determinada cultura acerca de um determinado tema (GOMES, 2011, p. 105).
Assim, o processo de intepretação obedeceu a três etapas: leitura do
material; exploração do conteúdo; e elaboração da presente síntese interpretativa.
Inicialmente, como apontado por Gomes (2011, p. 100), “buscamos, de um
lado, ter uma visão de conjunto e, de outro, apreender as particularidades do
material”. Isto exigiu muitas leituras das transcrições dos encontros entre os CP para
construir os eixos e categorias de análise que pudessem atender aos objetivos da
pesquisa.
Nesse processo é que pudemos reconhecer os dois eixos apontados.
Definidos os eixos, procedemos a identificação de categorias O eixo das
dificuldades da relação do CP com a direção foi dividido em duas categorias:
necessidade de aprovação e reconhecimento; e atendimento às demandas urgentes
na escola. O eixo sobre as dificuldades da relação do CP com os professores foi
analisado a partir de três categorias: conquista do respeito e do reconhecimento de
grupo de professores; abranger diferentes interesses e realidades e mobilizar os
professores para o estudo e discussão; e ir em busca de outros caminhos, o
trabalho coletivo.
Tendo estabelecidos os eixos e categorias de análise, fez-se necessário
buscar os sentidos mais amplos atribuídos às enunciações dos sujeitos no diálogo
com a leitura de outras pesquisas e dos autores que subsidiaram as reflexões
teóricas.
72
Por fim, nesta síntese interpretativa propomos-nos a fazer a articulação
entre os objetivos do estudo, a base teórica adotada e o material produzido no
contexto das interações com os CP.
4.1. As dificuldades da relação do CP com a direção
A relação do CP com a direção deve ser colaborativa, porém não podemos
desconsiderar que existe a hierarquia na escola, uma vez que o primeiro deve
responder ao segundo por suas ações no contexto de trabalho.
Ao tratarmos da relação do CP com a direção, contudo, não estamos
pretendendo simplesmente expor os conflitos que existem ou podem existir entre
ambos, tampouco responsabilizar os diretores pelas dificuldades do trabalho do PC.
Esses conflitos, de nosso ponto de vista, têm relação com as condições de
trabalho das equipes gestoras e com a indefinição do papel do PC na rede de
estudo pesquisada. Pretendemos, ao explicitar as dificuldades na relação entre PCs
e diretores, abrir novas discussões e retomar outras, evidenciando as principais
dificuldades como o acesso à função de CP medida pela relação de confiança com
o diretor e o atendimento às demandas consideradas urgentes na escola.
4.1.1. A necessidade de aprovação e reconhecimento
A necessidade de aprovação e reconhecimento do trabalho e desempenho
do CP pela direção pode parecer, num primeiro momento, não ter tanta relevância,
pois tanto diretor quanto CP exercem atividades complementares. Contudo, se
considerarmos que estes profissionais exercem função12
de confiança e, portanto,
podem ser desligados, a preocupação com essa questão os acompanha o tempo
todo.
12
Nesta Secretaria os CP assumem a função e não cargo de coordenação. Para preenchimento da função os professores interessados participam de um processo seletivo regulamentado por lei municipal.
73
Conforme já relatado em meu histórico, cheguei à coordenação por meio de
convite da direção no início de 2009. Este era o procedimento pelo qual os CP
assumiam a função na Secretaria. Porém, com promulgação de uma lei municipal13
,
os CP passaram a ser escolhidos seguindo uma regulamentação específica que
consistia em apresentação de projeto, eleição pelos pares e aprovação de uma
comissão formada pela supervisão e direção da unidade em que o professor
apresentou o projeto.
Essa lei, em seu capítulo IV, trata da criação da função de confiança de
coordenador pedagógico e estabelece os critérios para participar do processo de
sua escolha em cada unidade escolar, mas não define quais seriam suas
atribuições. O contexto da fala a seguir é anterior à publicação dessa lei.
Amarildo - Acho que mesmo que normalize [regulamente] as atribuições do CP, ele vai continuar ainda fazendo coisas que seriam mais da direção, do vice... Ele vai acabar se envolvendo, pela própria história: desde que começamos ficamos envolvidos com muitas atividades, acostumamos a isso. Na prática do dia a dia, dificilmente vamos ficar fora de alguma coisa.
Esta manifestação está fundamentada no contexto de discussão baseado
no excerto do texto de Lima e Santos (2007, p.82): “desta forma o coordenador
pedagógico é solicitado à realização de qualquer tipo de atividade, cujo responsável
está impossibilitado de desenvolvê-la por sobrecarga, indisponibilidade ou pela
ausência desse profissional na escola”. A regulamentação da função de
coordenação pedagógica era aguardada por nós e, para mim, mesmo que ela fosse
criada, as coisas não mudariam muito.
Esse enunciado me leva a examinar por que, desde o início de minha
atividade como CP, eu venho assumindo atividades que não me competem, ou seja,
não me recusei a assumir as tarefas que eram de outros. Adentrando um pouco
mais, verificamos em outros trechos das falas dos outros CP que o sentimento de
“ser útil” está atrelado à necessidade de aprovação da direção, pois a permanência
na função, em grande parte, depende da avaliação realizada pelo diretor; precisam
estar “afinados” na forma de pensar e de trabalhar. O diretor precisa de alguém em
quem possa confiar ocupando essa função.
13
As leis e decretos municipais não serão relacionados no texto e na bibliografia para impedir a identificação da rede de ensino e os sujeitos da pesquisa.
74
Vejamos, por exemplo, a legislação acerca da ATP que se deu por meio de
um decreto. Em seu Art. 2º define-se por Atividades de Trabalho Pedagógico (ATP)
aquelas atividades desenvolvidas fora de sala de aula pelo conjunto de especialistas
em educação, sob orientação do diretor da Unidade Escolar e, em caso de
impedimento legal deste, de seu substituto legal.
No Art. 5 está escrito que “as ATP devem ser sistematicamente planejadas,
organizadas e registradas pela equipe de especialistas em educação e gestão de
cada Unidade Escolar”. Já o Art. 7º diz que “cabe ao especialista em gestão ou
respectivo substituto da Unidade Escolar, planejar as Atividades de Trabalho
Pedagógico (ATP) coletivas, através de projeto de formação continuada em serviço”.
Entre os objetivos deste decreto encontram-se a construção e a
implementação do Projeto Político-Pedagógico para possibilitar a reflexão sobre a
prática docente, favorecer o intercâmbio de experiências, promover a
complementação pedagógica que deve compreender leituras, pesquisas,
participação em projetos, cursos, palestras e demais atividades definidas pela
Unidade Escolar (UE), bem como pela Secretaria Municipal da Educação,
(re)planejar e avaliar as atividades escolares tendo em vista as diretrizes comuns
que a escola pretende imprimir como necessárias ao trabalho docente, e
acompanhar o processo de desenvolvimento e aprendizagem dos alunos.
O decreto, embora no Art. 5º valorize a equipe de especialistas14
, estabelece
responsabilidade maior à direção da escola na orientação das ATP e, em sua
ausência, para seu substituto legal que, no caso desta Secretaria, é o vice- diretor.
Porém, nas escolas em que os CP atuam a organização e a condução das ATP é
assumida pela direção e coordenação.
Em relação aos objetivos das ATP descritas anteriormente, observamos que
elas têm um cunho formativo e, de acordo com os autores consultados neste
trabalho (ZUMPANO; ALMEIDA, 2012; CAMPOS; ARAGÃO, 2012; PLACCO;
ALMEIDA; SOUZA, 2011; CUNHA; PRADO, 2010; PLACCO; SILVA, 2009; FUSARI,
2011), o CP é o profissional responsável por assumir este papel.
14
Nesta Secretaria os professores são denominados de Especialistas de Educação Básica do Ensino Fundamental.
75
Como podemos perceber a seguir, a CP toma todos os cuidados para que
nada seja realizado sem que primeiro seja obtido o aval da diretora, estabelecendo
uma relação de subordinação e não de colaboração.
Ângela - Mas e os outros temas das ATP, como é que você se envolve? Junto com a direção? É que você está de diretora nova agora, né?
Raquel - É, antes era a Joana e agora, a Miranda, como ela veio pela primeira vez, veio e foi pondo o que ela gosta, os combinados, como você disse. Ela combinou tudo isso antes de ela começar.
Ângela - E em relação à coordenação na ATP?
Raquel - Então, tudo que eu vou fazer eu mostro pra ela antes, né? A mesma coisa que eu fazia com a Cláudia também. “– Aí, você quer alguma alteração? Não quer uma alteração? Você quer falar de alguma coisa? Você quer que a gente fale de alguma coisa?” Sempre combinávamos juntos antes, eu, a Sandra e a Cláudia.
Ângela - E a vice junto, né? A Roberta tem que estar junto.
Este diálogo revela, ainda, que esses CP assumem o planejamento das
ATP; parecem possuir certa autonomia em sua elaboração, contudo, essa
autonomia é relativa, pois, como vimos, as ideias contidas nas pautas não podem
ser colocadas em prática sem o consentimento da direção.
Ainda sobre o planejamento das ATP, há outro trecho de diálogo onde
Márcia expõe suas dificuldades sobre preparar encontros para três grupos
diferentes. Seu comentário está relacionado com o contexto de discussão sobre o
saber-fazer do CP (LIMA e SANTOS, 2007).
Márcia - Eu tenho uma realidade um pouco diferente, que é o supletivo, a turma da noite. E é em cima disso que eu falo contemplar os tarde (professores de 1º ao 5º ano) que tem uma realidade e também os alunos do 6º ao 9º e os que estudam à noite (supletivo). Então os professores dos supletivos, que muitas vezes... Eu não posso se esquecer deles, são poucos, mas tenho contemplado com os assuntos, eles. Então comecei a perceber que os que não aderiam eram justamente esses, viu... Os do supletivo, que tem uma realidade diferente, que é um aluno mais velho, é um... Então, você percebe, eu tenho que pensar em tudo isso. E, quem pensa é sempre o coordenador, ou tem que ter ajuda da direção?
Ângela - Eu penso que o coordenador pode ir com ideias, mas fala com a direção, senão a direção vai chegar lá, áh ãh... O que vai acontecer, ãh, não é?!
Notemos que Márcia se encontra diante de três realidades distintas:
professores especialistas de várias disciplinas que trabalham com crianças e
adolescentes de 11 a 14 anos; professores generalistas, que trabalham com
crianças de 6 a 10 anos; e professores especialistas que trabalham com jovens e
adultos. Sua fala revela que essas diferentes realidades e o isolamento causam-lhe
certa angústia, pois sente que não consegue dar conta de tudo.
76
O sentimento de isolamento de Márcia encontra apoio em Pierini (2007, p.
44) quando ressalta que o peso nos ombros CP “pode colocá-lo numa posição
também de isolamento (à semelhança dos professores) e com menores chances de
encontrar interlocutores que o auxiliem a rever suas atuações”. Ou seja, se os
professores encontram apoio uns nos outros, com quem a CP iria compartilhar suas
angústias?
Não estamos defendendo que a direção deva se ausentar de sua
responsabilidade em estar acompanhando o trabalho do CP, porque isso
configuraria para a escola que as funções são isoladas e cada qual realiza o que lhe
cabe. A organização das ATP enquanto espaços de formação e informação deve
estar a cargo de uma coletividade e nela CP e a direção precisam de momentos
para trocar ideias, experiências. Como dizem Marta e Raquel:
Marta - A ATP tem que ser feito uma...
Raquel - Uma sintonia...
Trabalhar em sintonia é superar a divisão de funções em que o papel do CP
está limitado a pensar, planejar e organizar as atividades das ATP e o papel da
direção em verificar se está tudo correndo conforme suas determinações, se está de
acordo com o que pensa e deseja.
É preciso que haja diálogo, socialização de ideias e experiências entre
todos: coordenadores, diretores, professores, para que as atividades formativas
sejam resultado de uma coletividade no sentido de produção e execução. Como
bem ressaltam Campos e Aragão (2012, p. 41), “não há trabalho de coordenação
que seja realizado na individualidade. É no coletivo que o coordenador encontra
espaço para a realização de suas funções. Fazer junto pode ser um dos segredos
da qualificação da atuação do coordenador”.
Desenvolver um trabalho envolvendo o coletivo da escola num projeto
visando a uma educação de qualidade exige a mobilização de conhecimentos e
saberes. Placco, Almeida e Souza (2011), apoiando-se em Tardif (2002), apontam
como necessários ao CP: ter a capacidade de articular diferentes tipos de saberes
para solucionar os problemas que lhe chegam; dominar saberes gerenciais;
curriculares, pedagógicos, relacionais; atuar, inovar e provocar inovações; confrontar
os professores com a necessidade de variar as estratégias; ser um profissional
77
atento às mudanças na sociedade e na escola; estar atento também às pessoas
que os cercam, respeitando seus medos, inexperiências e frustrações.
Entretanto, para alcançar um nível de conhecimento e adquirir experiência e
saberes como os descritos, é necessário que o CP tenha sua permanência na
função garantida por um período de tempo para isso, pois, assim como o professor,
a constituição do coordenador pedagógico se dará no tempo de vivência e
convivência na função.
Em relação à forma de acesso à função/cargo de CP, a pesquisa
desenvolvida pela Fundação Carlos Chagas por encomenda da Fundação Victor
Civita, coordenada por Placco, Almeida e Souza (2011, p. 45) revela que:
A maioria dos coordenadores pedagógicos que atuam em escolas das redes municipal e estadual, nas cinco cidades e estados pesquisados, ingressou
no cargo porque foi convidada, eleita ou transferida de função (12) e somente oito ingressaram por meio de concurso. Acreditamos que esse fato interfere no significado atribuído à atividade do CP, visto que não houve, segundo o que declaram os sujeitos, desejo ou escolha por exercê-la (grifos nossos).
Baseando-nos nesta informação e sem entrar de forma aprofundada nas
discussões sobre o que seria mais apropriado para acesso do CP, isto é, assumir a
função por meio de convite ou cargo por concurso, podemos identificar no excerto a
seguir que estar na coordenação pedagógica exige um preparo que não se dará de
forma imediata. O CP precisaria de longo período de tempo exercendo a função
para chegar a um patamar de conhecimento mais adequado ao exercício do que lhe
cabe. Como bem ensinam as autoras, experiência, tempo e atualização são a base
para uma coordenação preparada para o exercício.
Acreditamos que é no encadeamento de tais aspectos (experiência, tempo na função e atualização profissional) que se constitui a base que dará ao coordenador o suporte necessário para o exercício da sua função articuladora junto à equipe escolar e, consequentemente, potencializará a aprendizagem dos alunos (PLACCO, ALMEIDA; SOUZA, 2011, p. 46).
Nesta perspectiva, para ter a garantia de que permanecer na função não
estará sujeita a interesses particulares, a forma de acesso à coordenação
pedagógica por meio de concurso, a princípio, estaria mais adequada ao processo
de formação do CP ao longo de seu exercício profissional. Assim ele poderia estar
melhorando sua atuação com passar do tempo, à medida que trabalhe, estude,
78
reflita criticamente sobre suas experiências e busque interlocutores que ampliem
sua compreensão da realidade vivida.
4.1.2. Atendimento às demandas urgentes na escola
Entendemos por demandas todas as solicitações feitas aos CP durante sua
jornada diária de trabalho. Isto compreende, entre tantas outras tarefas, o
atendimento aos casos de indisciplina, onde professores ou diretores lhe atribuem a
função de resolver a questão por meio do diálogo com o aluno, pais e responsáveis
ou aplicando-lhe uma advertência e dando-lhe suspensão.
Analisando a legislação das cinco regiões do país, Placco, Almeida e Souza
(2011, p. 33) fazem descrição das tarefas previstas como função do coordenador:
atividades como avaliação dos resultados dos alunos da escola, diagnóstico da situação de ensino e aprendizagem, supervisão e organização das ações pedagógicas cotidianas (frequência de alunos e professores, andamento do planejamento de aulas (conteúdos ensinados), planejamento das avaliações, organização de conselhos de classe, organização das avaliações feitas pelos sistemas de ensino (municipal, estadual ou nacional), material necessário para as aulas e reuniões pedagógicas, atendimento de pais, etc.), além da formação continuada dos professores.
Trazendo também alguns dados da pesquisa desenvolvida pela Fundação
Vitor Civitta em 2010 e publicada em 2011, é possível observar que o papel do
coordenador pedagógico constitui-se num conjunto de demandas que vai
do atendimento ao pai de um aluno indisciplinado à avaliação da limpeza das classes, o coordenador pedagógico é responsável por uma série de atividades que não lhe dizem respeito e acaba omisso em sua principal função: a formação contínua dos docentes. O levantamento da fundação escutou a 400 coordenadores de 13 capitais brasileiras, portanto âmbito nacional apresenta que, enquanto 72% deles acabam responsáveis por fiscalizar a entrada e a saída de alunos - trabalho de bedel, como são chamados os inspetores no ambiente escolar -, só 19% dá atendimento individual aos professores (BALMANT, 2011, p. 1).
A lista de solicitações é vasta e restringimo-nos a analisar o atendimento
aos casos de indisciplina escolar, aos pais e às urgências do dia a dia por serem
recorrentes e também documentadas em outras pesquisas. Iniciaremos com a
primeira questão.
79
A problemática da indisciplina é um problema vivenciado pelas escolas
públicas e privadas no Brasil. De acordo com Calil e Aragão ( 2011, p.2),
indisciplina, violência, ofensas, desrespeito são comportamentos presentes nas queixas da maioria dos professores de escolas públicas e privadas do Brasil. Uma pesquisa realizada pelo Ibope e a Revista Nova Escola, em 2007, com 500 professores de todo o país, revelou que 69% deles apontavam a indisciplina e a falta de atenção entre os principais problemas da sala de aula.
Com relação à indisciplina, vejamos o que diz Raquel:
Raquel - Mas também não é função nossa dar advertência, suspensão, não é? É minha função fazer isso também?
Ângela – Não.
Amarildo - Mesmo que diga que resolver o problema de indisciplina é do diretor ou do vice-diretor, o coordenador vendo acontecer, não vai ficar parado. Ele não vai deixar de falar, de se envolver, de sentir alguma coisa em relação àquilo que está acontecendo.
Ângela - Então, mas como fica o papel do inspetor para colaborar? Por que o inspetor é pra inspecionar só?
Débora - Ajudar na indisciplina, não é?
Marta - Ele auxilia o professor, cuida dos alunos, fica em sala aula quando o professor precisa sair, fica no portão na saída dos alunos.
Ângela - Ele deve diminuir a sobrecarga do coordenador também, não é?
O enunciado de Raquel se deu quando discutíamos sobre o que era ou não
era função do CP, uma vez que o texto de apoio dizia que “o coordenador
pedagógico é solicitado à realização de qualquer tipo de atividade” (LIMA e SANTOS,
2007, p. 82).
Quando Raquel questiona que se também é sua função dar advertência e
suspensão, ficam evidências de que, além do atendimento aos casos de
indisciplina, ela é responsável por aplicar advertências e suspensão aos alunos
envolvidos em algum problema desse tipo.
Compreendemos que o cotidiano de uma escola é marcado, entre outros
aspectos, por conflitos de interesses. Os conflitos existentes se expressam de
formas variadas e, em alguns casos, por atos que chegam ao desrespeito,
agressões verbais e físicas.
Embora exista a presença do inspetor de alunos, do vice-diretor e da própria
direção, comumente a tarefa de apaziguar as situações acaba recaindo sobre o CP.
Este é chamado para ir até a sala com o objetivo de solucionar um problema ou é
requisitado para receber alunos que apresentam problemas de comportamento.
80
Atender os casos de indisciplina tem sido uma das demandas do cotidiano
dos CP em todas as escolas; trata-se do problema que mais requer tempo e esforço
para sua resolução. De acordo com Carvalho (2010, p. 99),
Na maioria dos relatos [de sua pesquisa], tanto de escolas municipais quanto das estaduais, percebe-se a forte presença de um intenso esforço por parte do coordenador, em buscar soluções para a constante indisciplina dos alunos, o que em vários momentos é apontado como um fator limitador da sua ação, face às demais demandas de trabalho presentes na escola.
Resolver os problemas de indisciplina envolve ações que, no primeiro
momento, parecem ser simples, contudo, dar advertência ou suspender um aluno
não resolve o problema, ou seja, as punições vêm se demonstrando ineficazes para
acabar com atos de indisciplina ou violência nas escolas, pois não se trabalham as
causas, os princípios, os valores nos quais se baseiam o comportamento do aluno.
O fato é que após receber tais punições o aluno volta para a sala de aula e se o
problema persistir o CP será cobrado.
Calil e Aragão (2011) salientam que as escolas, não sabendo como resolver
os conflitos, que ora são gerados pela indisciplina, ora são geradores desta, acabam
por impor um grande número de regras sem que haja a explicitação dos princípios
que as regem ou as justifiquem, terminando por não serem legitimadas pelos alunos
que continuam a burlá-las.
Desta forma, qualquer pessoa que se dispuser a dar conta de todos os
casos que surgem passará boa parte de seu tempo envolvida com essas questões,
ou seja, seu trabalho ficará limitado a essas demandas de orientação dos alunos.
Raquel cita outro fato: a interrupção de suas atividades para atender pais
que vão à escola buscar os filhos.
Raquel - Você vai abraçando as coisas, quando vê, já fez. Tipo: chega uma mãe e fala assim: - Eu preciso falar com Fulano. Aí você está fazendo as coisas e tem que largar tudo para chamar a criança porque a mãe está chamando para ir embora.
Ângela - Mas e o inspetor?
Raquel - É complicado, viu?
Amarildo - Mas e o inspetor?
Ângela - É, tem que ser função do inspetor. É ele que deve chamar a criança.
A norma nas escolas é que os pais devem se apresentar primeiramente na
secretaria para depois serem encaminhados aos demais funcionários. O que a CP
reclama é que o simples ato de se chamar um aluno na sala de aula é atribuído a
81
ela. Os demais questionam sobre a presença do inspetor, o que dá a entender que
seria dele essa função e não do CP.
Mesmo tendo a consciência de que não caberia ao CP assumir certas
atribuições, já que existe um inspetor e outros funcionários, ele vai assumindo, como
se expressa Raquel, “você vai abraçando tudo e, quando vê, já fez, você tem que
largar tudo”. Ou seja, parar o que está fazendo para exercer uma função que seria
de outro funcionário significaria agir como “bombeiros”.
Débora - É um bombeiro!
Amarildo - Bombeiro. (...) É que tem emergências...
Débora – É!
Amarildo – Ele [o CP] não consegue ficar parado...
Débora - Você vai fazendo...
Bombeiro é uma metáfora utilizada pelos CP para significar suas ações
baseadas no atendimento às urgências e emergências dentro da escola. Sobre este
ponto Pierini nos ajuda a compreender que o atendimento às urgências é
constitutivo do cotidiano escolar e que o entendimento dessa realidade permite ao
CP planejar algumas ações de forma a otimizar as condições de sua atuação.
Se por um lado o atendimento às urgências pode ser considerado negativo,
uma vez que isso pode significar que o CP deixe suas tarefas para assumir outras
que não são especificamente suas, por outro, como esclarece Pierini (2007), é
preciso que o CP aprenda a trabalhar com essas urgências uma vez que muitas
delas são inerentes à realidade da escola e, neste caso, o CP pode organizar suas
ações prevendo esses eventos.
A esse respeito Placco (2003) contribui dizendo que é uma necessidade que
o CP transforme certas urgências em rotinas, ou seja, transformá-las em atividades
rotineiras tornando possível planejar ações para que o processo de ensino-
aprendizagem não sofra perdas, mas se desenvolva.
Então, para dar conta de tudo, o CP precisa adequar suas atribuições às
constantes interrupções já que o atendimento às urgências requer que, em muitos
casos, ele deixe o que está fazendo para fazer outra tarefa; se isso não for
otimizado, tornar-se-á um empecilho para o trabalho de coordenação.
Christov (2009, p. 62) descreve sua inquietação por não conseguir concluir o
atendimento de orientação aos CP de sete escolas públicas devido às constantes
82
interrupções. Relata ela que
ao sair de algumas escolas, senti muitas vezes que as coordenadoras, diante da interrupção de sua função, estavam sendo levadas a um estresse e a acreditar que são imponentes e nada podem fazer contra um sistema que desvaloriza cotidianamente e pertinazmente sua função essencial.
Nas falas dos CP a seguir o atendimento às demandas é resultado da falta
da definição de suas atribuições. Por não terem suas funções definidas acabam
trabalhando como assistentes, como equipe de apoio, um “fazedor de tudo”.
Amarildo - Por isso aquela questão de não ter a função do CP definida. Se falarem assim: - Sua função é fazer isso, você está resguardado, tranquilamente.
Raquel - (...) porque ao mesmo tempo você fica de assistente, ao mesmo tempo você fica de apoio, ao mesmo tempo você é tudo.
Amarildo - É o fato de você não ter definido, você fica com esse... - Bom eu vou fazer isso ou não vou?
Raquel - E é cansativo não é? Porque é muita coisa...
Este “ser tudo ao mesmo tempo” gera intranquilidade, cansaço, dúvidas
sobre o que se deve assumir ou não. Trabalhar permeado por dúvidas não
corrobora para uma escola que precisa cumprir seu papel de educar e de formar. Os
CP entendem que a definição da função seria um caminho para resolver esse
problema. Mas a quem caberia definir essas funções?
Retorno à minha fala:
Amarildo - Acho que mesmo que normalize [regulamente] as atribuições do CP, ele vai continuar ainda fazendo coisas que seriam mais da direção, do vice... Ele vai acabar se envolvendo, pela própria história: desde que começamos ficamos envolvidos com muitas atividades, acostumamos a isso. Na prática do dia a dia, dificilmente vamos ficar fora de alguma coisa.
Para mim, os próprios CP não conseguirão fugir dessa rotina se não houver
um interferência externa, ou seja, uma regulamentação sobre suas atribuições. “-
Acho que o coordenador, por si só, dentro da escola, não consegue delimitar qual
vai ser sua função: agora só vou fazer isso”.
A minha fala revela uma expectativa nas regulamentações quanto às
atribuições dos CP, fato que não ocorreu. Como foi dito anteriormente, a lei
municipal especificou somente a forma de acesso à função da coordenação.
Neste caso, pareço entrar em contradição, pois se por um lado defendo a
necessidade de definição de minhas atribuições, por outro acredito que mesmo que
83
haja essa regulamentação o CP continuará assumindo tudo o que lhe atribuem,
revelando com isso que a regulamentação não irá alterar sua forma de atuar.
No entanto, o que parece ser contradição acaba por revelar um sentimento
oculto. Tanto na minha primeira fala, como na segunda, não digo abertamente de
quem estou falando, porém na primeira eu revelo o local - “por si só dentro da
escola (meu local de trabalho) não consegue delimitar qual vai ser sua função” -, o
que me leva supor que eu espero que a direção delimite minhas atribuições. No
segundo caso, sou mais direto, embora não deixe claro em relação a quem cabe
normalizar as atribuições; aponto que mesmo com a existência de uma
normalização irei continuar fazendo coisas que seriam próprias da direção.
Quem poderia me pedir para que realizasse um papel próprio da direção? E
prossigo dizendo que sempre as fiz, sempre disse sim, de que forma agora iria dizer
não? Iria mudar a forma de agir? Essa minha postura é consoante com a
observação de Soares (2011, p. 51) quando destaca que as ações dos CP estão
condicionadas pelo respeito à hierarquia do sistema:
os coordenadores pedagógicos sabem de suas atribuições, mas devido à hierarquia do sistema, acatam os pedidos equivocados dos gestores e acabam por contribuir para o não desenvolvimento das suas funções pedagógicas, como, por exemplo, atender aos pais de alunos enquanto a Orientação Educacional encontra-se na escola, mas o gestor prefere aproveitar a competência do coordenador.
Ângela, apoiada no texto que estávamos discutindo e em referência ao trecho
“o coordenador pedagógico deve sensibilizar seu saber fazer de maneira de não
unilateralizar as tomadas de decisão, como se tivesse todas as respostas para os
encaminhamentos pedagógicos e resoluções de conflitos que inquietam a equipe
docente” (LIMA e SANTOS, 2007, p. 78), diz que essa postura dos CP em assumir
tudo que lhes é solicitado traz consequências para seu trabalho, gerando-lhes mais
problemas do que satisfações.
Ângela – Então, eu penso assim: cuidado para essa questão de eu resolver tudo, o famoso “Bombril”, porque você acaba deixando algo a desejar (pausa). Então, faça aquilo que é competência do seu trabalho, mas faça bem feito. Então, porque a gente não tem definição clara de função, de campo de trabalho, nós nos angustiamos. Eu concordo com vocês, eu penso que a gente está lá pra somar com a direção, com a gestão escolar, senão não teria sentido estar lá... Ai eu me cobro por não ter sobrado tempo para fazer [outras coisas]. Ao mesmo tempo em que sou solidária com esta questão, eu me cobro por fazer e isto me gera angústia. (silêncio).
84
Os problemas estão, entre outras coisas, no fato de não conseguir dar conta
de tudo e, ao mesmo tempo, acabar executando tarefas que não são de sua
competência e, mesmo que não sejam, ela será cobrada como se fossem. Diante
das cobranças surgem os constrangimentos, as angústias. O silêncio na sequência
indica que os PCs concordam com o que foi dito por Ângela. Observamos que isso
tudo faz parte da realidade vivida por eles e que, em contrapartida, também são
responsáveis pelas dificuldades e angústias que sentem.
Desta forma, não é exagero afirmar que as dificuldades que os CP
enfrentam na realização de seu trabalho diário dentro da escola estão ligadas aos
desvios da função que, em grande parte, dependem da visão que a direção tem
sobre o papel do CP. De um lado, a direção se posiciona como entendendo que o
CP é um funcionário importante para ajudar na administração da escola, na
organização e condução dos projetos, no atendimento aos professores, pais e
alunos, enfim, como uma pessoa com quem que ele pode contar em todos os
instantes.
Por outro lado, porque o próprio CP acaba contribuindo para que os desvios
ocorram, uma vez que não consegue dizer não às demandas, pois, como diz
Ângela, “Eu me sinto útil naquele horário por estar ajudando naquela situação, não
dá pra esperar por x ou por y, mas depois eu fico... Não fiz isto, não fiz aquilo”, ele
precisa sentir-se útil no momento em que é requisitada pela direção. Não percebe
que, agindo dessa forma, estará contribuindo para a prática rotineira de atendimento
às demandas.
De acordo com Lima (2009), consideram-se desvios de função as
atribuições assumidas pelos CP que deveriam ser exercidas por outros funcionários
da escola: inspetor de alunos, secretário, professores, direção e vice, uma vez que
este profissional constantemente é chamado para exercer funções alheias à qual foi
eleito. Geglio (2009, p. 115), corrobora, reafirmando que o desvio de função não é
raro nas escolas e o CP, diferentemente dos demais funcionários, vê-se envolvido
em múltiplas tarefas.
Num ambiente escolar, não é raro o coordenador pedagógico realizar atividades que não são da sua competência. Enquanto o professor, o diretor, o secretário e os demais funcionários da escola possuem atividades especificas, o coordenador pedagógico se vê efetuando múltiplas tarefas que, objetivamente, não lhe dizem respeito. São ações, que, do ponto de vista das atribuições do cargo que ocupa, podem ser caracterizadas como ‘desvio de função’.
85
No trecho a seguir, Raquel descreve seu cotidiano em que precisa estar
pronta para atender aos pedidos de cópias de materiais pedagógicos, ficando sob
sua responsabilidade a reprodução e a entrega de material aos professores.
Raquel - Você tira xérox?(cópias)
Amarildo - Do quê?
Raquel - Dos professores: provas, tudo?
Amarildo – Não, Raquel.
Raquel - Eu que tiro. Nossa, é complicado isso! Você fica louquinha ali!
Ângela - Você alguma vez conversou com a sua diretora sobre esse aspecto, tirar xérox?
Raquel - Porque é uma loucura, viu? É um volume de xérox que pelo amor de Deus.
Ângela - É função do coordenador tirar xérox para professor? Se fosse função do coordenador olhar se aquele material é pertinente ou não...
Raquel – Sim, eu acho que é.
Ângela - Ele passa para o coordenador e ele delega: - Bom esse aqui está tudo bem então vai; esse não está bom...
A fala de Raquel confirma que o desvio da função é um fato presente no dia
a dia do seu trabalho, o que acarreta complicações ao seu trabalho, uma vez que
essa atribuição consome um bom de tempo de seu dia. É importante destacarmos
também que essa atribuição assumida por Raquel não constitui atendimento de
urgências já que trata de atividades previstas na rotina da escola e, por este fato,
poderiam ser executadas por outros funcionários.
Notemos também que Raquel, embora fique incomodada com a ideia de ter
que tirar cópias, entende que essa é uma atribuição sua. Mesmo sendo indagada
por Ângela se é função do CP tirar cópias, pois ela entende que caberia ao CP
apenas verificar o material a ser fotocopiado, Raquel consente. Sobre esse aspecto,
Gomes (2011) chama a atenção de que o próprio coordenador pedagógico
desconhece seu limite de atuação, o que o leva a confundir sua verdadeira função.
Neste caso, a CP revela faltar clareza sobre o que faz parte de sua função.
Tirar cópias, normalmente, é um papel assumido por outros funcionários da
escola designados para isso. Restaria saber quem designou Raquel a ficar
responsável por esse trabalho. Para Soares (2011, p.49), “o cotidiano do
coordenador pedagógico é determinado pela gestão escolar, uma vez que se solicita
que este execute atribuições de outros segmentos”. Assim, entendemos que a
gestão tem forte influência sobre a atuação da CP dentro da escola, tornando-se a
corresponsável pelo desvio da função.
86
Em pesquisa realizada por Carvalho (2010), ele descreve os relatos de um
grupo de alunos do curso de Pedagogia que fizeram estágio sobre coordenação
pedagógica em escolas públicas. Ao fazerem um levantamento sobre o que os CP
faziam na escola, entre outras atribuições, destacaram a substituição do porteiro em
sua ausência, tirar xérox, substituir professores, aguardar a chegada dos pais
quando um aluno passa mal, organizar a saída dos alunos e ficar com os alunos que
os pais buscam muito depois do horário do término da aula.
Todas essas atribuições poderiam ser assumidas por outros funcionários da
escola, mas são os CP que as assumem, o que nos leva a entender que o desvio de
função faz parte da realidade da coordenação pedagógica de outras Secretarias
também, ou seja, não é um somente dessa secretaria onde se desenvolveu esta
pesquisa.
Ainda, em relação ao tirar cópias, quando Raquel se expressa - “é uma
loucura, é um volume que pelo amor de Deus!” - deixa transparecer que essa
atribuição tem prejudicado as outras tarefas mais específicas sob sua
responsabilidade, por tratar-se de uma grande quantidade de cópias de que precisa
dar conta diariamente. No entanto, como foi dito anteriormente, ela a realiza por
entender que é um dever do CP; revela, com isso, não ter clareza de seu papel ao
acreditar que sua função principal na escola é tirar cópias.
Outra demanda frequente na rotina dos CP é a substituição de professores
em sala de aula, tanto dos que deveriam assumir as classes no início do ano letivo,
como daqueles que precisam faltar durante o ano em curso. A discussão sobre
substituição de professores se deu quando da leitura de uma parte do texto de
Polato (2008), onde se anuncia que no estado de São Paulo são registradas 30 mil
faltas por dia.
As escolas em que os CP atuam não contam com professores adjuntos
(substitutos) em número suficiente para assumir, logo no início do ano, as classes
que não são atribuídas. Neste caso, os CP são indicados a assumir as aulas até que
se consiga um professor. Em certos casos esse professor só assume as turmas
muito tempo depois de iniciadas as aulas; em outros, essas aulas não são
atribuídas ou o professor desiste. No caso de Raquel, ela ficou o ano todo
trabalhando com acúmulo das duas funções: coordenadora e professora. Este fato é
confirmado nas falas a seguir.
87
Débora – A escola Camargo Filho (escola municipal, nome fictício) está sem professor de Português e Matemática, a gente não conseguiu ainda.
Ângela - Então, quais são as causas? Várias causas. Agora, quando você tem especialistas na área, pressupõe que ele dá conta, mesmo se eu for substituir lá.
Raquel - Está difícil o especialista, só agora que está vindo um...
Débora - Está precisando de adjuntos (professores contratados para substituir).
Raquel - Ah, mas eu fiquei o ano passado inteiro trabalhando de coordenadora e professora.
Embora não sejam apontadas as causas, como questiona Ângela, o fato é
que as escolas iniciam o ano letivo com um quadro incompleto de professores. Este
quadro vai sendo completado aos poucos na medida em que os professores
adjuntos (substitutos) vão sendo enviados às escolas. Isto leva algum tempo, como
foi descrito. Enquanto eles não chegam, o CP assume a função docente também.
Exercer o papel de coordenador e professor torna-se um desafio e converte-
se em dificuldades para a realização de outras atividades. O coordenador continua a
ser requisitado para dar conta de uma grande quantidade de afazeres e, ao mesmo
tempo, precisa planejar e colocar em prática as aulas assumidas por ele.
Em trabalho realizado por Soares (2011, p. 84), o CP entrevistado acumula
outras dificuldades estando em sala de aula:
quando a gente vai para uma sala de aula substituir um professor, ele pode até montar o plano, mas a gente não tem conhecimento daquele conteúdo. O que a gente vai fazer? A gente simplesmente vai repassar, vai mandar copiar o texto, ou vai copiar as atividades de matemática. Não existe. Ou tu fazes as duas coisas ao mesmo tempo: atende o professor na porta e ajuda o aluno dentro da sala e fica naquela confusão, não faz nem uma coisa, nem a outra bem feita. Ou tu simplesmente não atendes ninguém e dizes: Não. Eu estou dando aula, que é a fala que a gente acaba tendo que ter para poder ficar em sala de aula.
Como argumenta o sujeito da pesquisa de Soares, o CP acaba por não
realizar bem nenhuma das duas tarefas, deixando a desejar no cumprimento de
suas atribuições.
Além do quadro incompleto de professores adjuntos, as escolas contam
constantemente com as ausências de seus professores regulares. Todos os
docentes têm, por direito adquirido, as faltas abonadas anuais e, além disso,
precisam faltar por questões de saúde e/ou outros motivos.
No diálogo entre os professores também aparece a figura do CP como o
“salvador da pátria”. Ou seja, é aquele que irá socorrer a escola, como relatou
88
Ângela: - Se faltou professor, o CP é o primeiro que vai para a sala. E se possível,
às 6h50min.
Quando ocorrem estes imprevistos a primeira alternativa encontrada é
enviar o CP para a sala de aula, uma vez que os alunos não podem ser
dispensados nem ser deixados no pátio da escola ou nos corredores, como nos
revela o diálogo a seguir.
Ângela - E ai quando (...) você chega lá na escola e o professor falta e você fala: - Tô com um “abacaxi”. Porque eu sou coordenador e faltou professor, não posso mandar aluno embora.
Raquel- Não podem [os alunos] ficar andando pela escola.
Ângela - Não.
Raquel - Nada pode. Mas quando você fica naquele aperto, você fica desesperada pra achar um professor, não é? Ontem ia faltar professora e eu fiquei ligando...
Débora - A gente, na verdade, nem tem tanta gente (professores) pra telefonar, tem uns dois ou três e olhe lá.
Ângela - Pensa você dando aula numa sala e eles [alunos do professor que faltou] percorrendo a escola.
Raquel- É...
Ângela - Como é que faz?
Amarildo - Só que teremos um problema maior (...) se deixarmos eles soltos na escola.
Raquel - Não pode, mas aí se deu certo, ótimo, você não fez mais que a sua obrigação; se deu errado, nossa, como você é incompetente!
Trata-se de um entrave por vários motivos: um, porque os alunos não
podem ser liberados para ir embora e se o CP os liberar, terá que responder por
isso; se deixá-los no pátio terá que enfrentar outros problemas advindos desse fato.
Então, como diz Raquel, você fica “naquele aperto”, pois terá que encontrar
professores substitutos e, como já foi dito, não são muitos.
Quando falta mais de um professor, como diz Ângela “- Olha, pra você ver,
se faltam quatro professores... Olha a função do coordenador: ele não tem como
suprir, não tem como montar as salas”. A alternativa seria seguir o que sugere
Raquel “- Tem que distribuir os alunos nas outras salas que, por sua vez, já estão
lotadas”. Os professores são obrigados a receber mais alunos e isso gera certa
resistência por parte destes e que o CP terá que contornar.
Assim, a solução mais segura seria assumir as aulas, colocando-se na
condição de professor substituto, contribuindo, desta forma, para que se legitime a
visão de que o CP está aí para fazer tudo, para assumir todas as atribuições que lhe
são requisitadas.
89
Entretanto, como nos esclarece Soares (2011, p. 85), essa substituição
“dificulta ao coordenador pedagógico coordenar todo o trabalho pedagógico, uma
vez que, ao assumir o papel de professor substituto, passa a atuar no micro, e
precisa deixar o olhar macro sem atenção”. Em outras palavras, estando na sala de
aula o CP tende a se envolver com as questões que ali surgem, deixando de cuidar
das demais questões próprias de sua prática de coordenador.
Finalizando este bloco de discussões no que diz respeito às dificuldades do
CP na relação com a direção, podemos supor que não há clareza por parte de
ambos sobre o papel do CP. Esta deficiência faz com que a direção entenda que
cabe ao CP realizar uma infinidade de coisas, independentemente de estarem
relacionadas às questões propriamente pedagógicas ou não. Ao fazer isto, contribui
sobremaneira para que o trabalho do CP seja marcado por ações espontâneas e
improvisadas, o que não corrobora o desenvolvimento de um trabalho guiado por
planejamento.
O planejamento é um requisito básico para o desenvolvimento do processo
de ensino-aprendizagem uma vez que nenhuma escola poderá cumprir seu papel
formador sem estar pautada em um projeto político-pedagógico. As improvisações
fazem parte do cotidiano escolar, já que muitas ações acontecem de forma
inesperada, contudo elas não podem constituir-se em regra para uma escola.
Os CP também demonstraram não ter bem claro qual é seu papel enquanto
coordenadores pedagógicos ao assumirem tudo que lhes é requisitado. Porém, esta
falta de clareza não se configurou como a única responsável pela postura do CP em
“ser o faz tudo” dentro da escola. Nas falas podemos identificar alguns indícios que
sustentam essa postura. Entre elas, está a necessidade de atender às expectativas
da direção, ou seja, achar que precisa fazer de tudo para que seu trabalho seja
reconhecido por todos na escola, principalmente por seu diretor, pois é ele quem
poderá garantir sua permanência ou não na função.
Esta postura do CP tem um preço: viver o dia a dia de trabalho atribulado
com uma quantidade infinita de afazeres, o que sempre gera, ao final de cada dia,
sensação de desgaste físico e mental; embora tenha realizado inúmeras tarefas,
parece-lhe que não realizou nada de importante.
90
4.2. As dificuldades da relação do CP com os professores
Neste segundo eixo objetivamos identificar as dificuldades dos CP ligadas à
sua relação com os professores com quem trabalham. Embora os grupos de
professores, em cada unidade de ensino, apresentem especificidades próprias, é
possível identificar aspectos comuns, como por exemplo, as dificuldades
encontradas pelos CP na realização de seu trabalho diário e na condução das ATP.
Torna-se importante destacar que a relação do CP com professores deve
ser entendida no sentido de que o primeiro assume “o papel de mediador, de
interlocutor, de orientador, de propositor, de investigador do grupo e com o grupo”
(GEGLIO, 2009, p. 117).
As análises dos diálogos entre os CP apontam para alguns aspectos
considerados relevantes.
4.2.1. A conquista do respeito e do reconhecimento pelo grupo de professores
Como já mencionado, no momento em que se desenvolveu a pesquisa de
campo por meio do acompanhamento dos encontros de formação dos CP ainda não
havia regulamentação para a função de coordenação pedagógica.
Os CP envolvidos nessa pesquisa não foram escolhidos pelos seus pares,
mas por indicação da direção. Esta forma de acesso implica para o CP enfrentar
muitos desafios, entre eles, a conquista do respeito e reconhecimento por parte do
grupo de professores.
No diálogo a seguir, percebemos que a CP, ao chegar a uma escola para
assumir a função e começar a desenvolver seu trabalho, primeiro precisou construir
vínculo com o grupo como forma de superar as resistências.
Ângela - Em minha opinião você (coordenadora que assumiu a função em outra escola) foi corajosa. Porque sair da unidade escolar em que está sedimentada para ser coordenadora em outra escola, você tem que conquistar primeiro o grupo de professores.
Raquel - Com certeza.
Ângela - Não é? Mesma coisa aconteceu com você [dirigindo à CP Débora]. Depois, você tem que ir conquistando a comunidade estudantil. Então, é um procedimento doloroso no começo, e você fica meio perdida, não é?
91
Débora - Isso.
Para Débora a conquista não se configurou como um processo simples e
fácil, pelo contrário, foi doloroso e desgastante. As dificuldades do início da nova
função, contudo, podem ser superadas, como destaca Placco (2003), por meio da
conquista e da construção do vínculo afetivo com o grupo de professores e com a
comunidade escolar. No entanto, a conquista do reconhecimento nem sempre
ocorre de maneira continua e regular, pois há “movimentos que envolvem idas e
vindas, circularidades, saltos, evoluções e retrocessos, no tempo e no espaço em
que a prática se realiza” (PLACCO, 2003, p.55).
Quando se faz necessário questionar algumas posturas com relação à
prática de ensino dos professores, o CP tende a enfrentar maiores dificuldades,
como vemos a seguir.
Neste diálogo Ângela descreve como foi assumir a função de diretora em
uma escola, referindo-se à mesma necessidade de conquistar os professores.
Ângela - Só que tem uma coisa: eu fui muito bem recebida, eu fui muito querida, até a hora em que eu comecei a mexer em pontos nevrálgicos, ai eu virei o bicho. E aí teve campanha contra a minha pessoa dentro da própria escola, professores e alunos, porque eram pontos necessários que eu precisava mexer na gestão da escola. Então, eu penso assim: existem situações que são necessárias, você chega a um lugar e você vê que aquilo pode ser melhorado, você não vai fazer?! Então eu estou sendo o quê?
Raquel - Injusto, não é?
Ângela - Eu estou deixando... e vai fazendo conforme vai dando.
Marta - Aí precisa de você, não é?
Ângela - Pois é! Então, eu via as situações que estavam acontecendo em questão de horário, de sala, disso e daquilo. Eu dei um tempo pra me provarem que aquilo dava. E eu vi que não dava. Também eu já fui meio preconceituosa, já cheguei lá com o pé atrás. Eu falei: - Eu não vou chegar mexendo, porque aí já viu, não é? Então eu esperei, eu dei um tempo, foi um mês... - Eu tive que mexer. A partir dali eu virei, não queria mais; mas também ‘ser querida’, também não me preocupou muito não, porque a minha função é de direção; a função de coordenador é do mesmo jeito. De repente, se você começar a mexer na prova, numa atividade, pra fazer uma atividade fora da escola, cadê o plano para você sair? Para uma visita técnica, ok?
Marta - E é isso que a gente tem que fazer, tem que amadurecer porque o papel do coordenador é esse, mexer nessa zona de conforto. Muitas vezes não é agradável! Não é, mas é o papel.
Segundo sua percepção, tudo pode correr bem desde que não se mexa em
pontos “nevrálgicos”, ou seja, em pontos que incomodam os professores:
organização da escola, sistema de provas, atividades comumente realizadas etc.
Enquanto mantiver distância de questões que dizem respeito à mudança de
92
prática dos docentes o CP será aceito pelo grupo. Porém, a partir do momento em
que resolve propor alternativas para melhorar essa prática pedagógica poderá
encontrar resistências.
Esses momentos marcados por conflitos, intranquilidade e incertezas podem
ser estendidos à vida de um CP ao assumir a função. Mesmo que desestabilizar a
chamada “zona de conforto” seja para o CP desconfortável, porque gera incômodo
àqueles que estão confortáveis, seguros, ele precisa enfrentar esse desafio,
conforme ressalta Marta, pois é seu esse papel.
Caso não assuma seu papel desde o início, deixará espaço para que se crie
uma visão distorcida em relação ao que precisa assumir e como deve comportar-se
enquanto coordenador. Como resultado, terá sua atuação caracterizada pelo
cumprimento de atribuições diversas, como profissional preocupado em atender aos
interesses deste ou daquele grupo.
Trabalhar as relações interpessoais e pedagógicas exige do CP certos
cuidados. A esse respeito, Sousa (2009, p. 29) aponta a importância do
estabelecimento de vínculos pautados no respeito mútuo para que o CP possa fazer
as intervenções que julgar necessárias.
É preciso muito cuidado para abordar com os professores questões relativas à atividade docente. Não se podem apontar os erros diretamente, antes da construção de vínculos. Só quando os vínculos estão estabelecidos é que se torna possível lidar com as críticas, expor os não-saberes, confrontar-se com as falas.
O estabelecimento de vínculos calcados no respeito e reconhecimento do
papel de cada um requer um processo em que as trocas de experiências e o
respeito às diferenças constituem-se num relacionamento capaz de criar condições
para que as críticas, as sugestões e as intervenções sejam compreendidas.
O CP iniciante conviverá com o que Ângela denomina de “jogo dos
professores”.
Ângela - Então, às vezes pode achar que o coordenador é o suprassumo da escola e o professor vai “jogar” um pouco mesmo, por quê? Tem um professor que está ansioso porque você é coordenador. Tem professor que acha que ser coordenador é ótimo, porque você saiu sala de aula, não é? E tem gente que acha que o coordenador não faz nada.
Amarildo - Que é aquele que resolve tudo, responsável por todos os problemas.
93
Diante de um contexto onde a função deste profissional não está bem clara,
os professores tendem a criar expectativas conflitantes: “o suprassumo da escola:
ser coordenador é ótimo, coordenador não tem muito que fazer, ou é aquele que
resolverá tudo”. Milanez (2011, p. 103), salienta que:
possivelmente, o professor idealiza o coordenador como um ’super-profissional’, capaz de resolver todos os problemas, inclusive os específicos de cada professor em sua disciplina/conhecimento, pela posição que o coordenador assume na hierarquia da escola.
Este é um momento em que o CP precisa estar consciente, como
encontramos na fala a seguir, de que ele não é o “dono” de todos os
conhecimentos, aquele que tem resposta para tudo, que é capaz de resolver todos
os entraves cotidianos.
O meu comentário a seguir surgiu em resposta ao questionamento da
Ângela sobre a seguinte passagem do texto de Lima e Santos (2007, p.78): “o
coordenador pedagógico deve sensibilizar seu saber-fazer de maneira a não
unilateralizar as tomadas de decisão”.
Amarildo - Acho que não pode entrar na ideia de que o CP é aquele que sabe todas as coisas, ele tem que estar sempre buscando conhecimentos. Ele não tem as respostas prontas, exatas pra cada professor, sobre cada professor. Isso talvez seja um drama dos coordenadores. Eu tenho que formar professor, eu tenho que saber tudo pra ensinar aos professores, acho que não é por aí.
O processo de ensino-aprendizagem, para que consiga ser realizado com
sucesso, precisa ser pautado em ações coletivas; não se faz por meio de medidas
tomadas individualmente. Nas minhas palavras “é o caminhar, é um buscar, é um
descobrir, é um ir aprendendo”. O caminhar juntos significa compartilhar o
enfrentamento dos desafios, descobrir alternativas, buscar subsídios para a
compreensão da realidade vivida.
Se não pensar desta forma o CP corre o risco de iniciar a função realizando
tudo o que se espera dele e passar a carreira trabalhando desta forma o que, por
um lado, contribui para a manutenção de um conceito de escola individualista e, por
outro, terá seu dia a dia marcado por frustrações por não conseguir dar conta de
todas as incumbências que esperam que ele desenvolva.
94
Outro aspecto que interfere na conquista do respeito e do reconhecimento
do grupo de professores é a expectativa com relação à sua formação como
interlocutor dos professores e articulador do trabalho pedagógico na escola.
É preciso reconhecer que o CP precisa dispor de um quadro teórico de
referências para que possa desempenhar sua função. Ele tem diante de si um grupo
de professores que espera que ele conheça ou saiba como ajudá-los a resolver
seus problemas, já que para eles o CP assumiu a coordenação porque possui
formação para esse papel.
Segundo Tamassia (2011, p. 56),
para poder coordenar e intervir junto ao grupo de professores, precisa conhecer os assuntos sobre os quais pretenda discutir, pois, do contrário, ficará sem argumentos, e seus encontros de formação e de reflexão podem acabar se tornando um ’muro de lamentações’, sem propostas concretas para a solução dos problemas. As redes de ensino pouco têm promovido espaços de formação para os que atuam na coordenação das escolas. Isso faz com que a tarefa de sua própria formação fique sob sua própria responsabilidade.
Os sujeitos desta pesquisa eram professores de diversas disciplinas que
saíram sala de aula para desempenhar uma função para a qual, como todos
profissionais, dentro ou fora da educação, não possuíam formação inicial suficiente;
foram aprendendo a ser CP por meio de leituras, baseando-se em suas próprias
experiências ou em cursos de formação continuada.
Embora as participações nesses momentos de formação sejam para eles de
grande importância para fundamentação de suas ações, dando-lhes sustentação
para seus discursos, argumentações nos momentos de orientações pedagógicas, os
CP demonstram preocupações e inquietações em relação à sua formação.
No diálogo a seguir, eles revelam a preocupação com a necessidade de
estarem preparados intelectualmente para enfrentar os debates com os docentes.
Ângela - Para eu poder falar eu tenho que ter substância.
Marta – É claro!
Ângela - Eu tenho que ter fundamento. Se um vier gritar mais alto e eu encolher, acabou, gente.
Os CP entendem que a demonstração de falta de preparo para o exercício
da função leva os professores a colocarem resistências às suas ideias. Para ser
condutor dos momentos formativos desenvolvidos nas ATP, o CP precisa
95
demonstrar domínio sobre o que irá propor. Um professor não aceitará ser formado
por alguém que não lhe acrescente nada, que não tenha o que oferecer. Neste
caso, perceber a falta de preparo do CP gera resistência dos docentes.
Raquel – Eles têm resistência, não é?
Ângela - Não, mas é resistente por quê? Porque ele está sentindo e vendo em você uma fragilidade que você não tem. Fundamentação e fundamentos se tem onde? Em conteúdo, para mim é conteúdo. Agora, se você rebate e fala: - Olha, nós temos uma pesquisa! Olha, isso está acontecendo! Olha, tal situação! Então ele vai perceber que vocês não estão falando no vazio. Agora, se você deixar a desejar, então você não serve pra ser coordenador. (silêncio)
O silêncio dos CP diante desta colocação pode indicar que foram tocados
num ponto que os incomoda. Sabem que a formação que possuem é insuficiente
para dar conta de atender às necessidades dos professores, para dar respostas as
suas indagações. Ao mesmo tempo, revelam entender que é dever de um CP
conhecer inúmeros aspectos relacionados à educação escolar, entretanto, isso tudo
se converte em angústias, uma vez que não é possível tornar-se um especialista em
todas as áreas do conhecimento.
Esta é uma realidade de que o CP precisa estar consciente: não possui
formação suficiente, mas, independentemente disso, as cobranças virão e o
trabalho precisa ser feito. Os CP vivem sob as sombras das cobranças dos outros e
de si mesmos, embora entendam que sejam injustas, pois não tiveram formação
necessária para assumir e desempenhar a função. Os encontros de formação
tornam-se, então, momentos de aprendizagem, como também um porto seguro para
eles que convivem com sentimentos de insegurança como está explícito no diálogo
a seguir.
Amarildo - Acho que o CP tem que estar consciente também da própria realidade. Nossa realidade hoje é essa, que nossa função não está definida e a nossa formação está se dando agora por meio desses encontros. Tudo isso é uma realidade.
Raquel - E tem que continuar (formação que estamos fazendo), senão como ter forças para...
Amarildo - Eu acho que tem que continuar. E aí vêm cobranças e diante das cobranças você acaba se cobrando também como se fosse o único responsável. Como eu posso me cobrar por estar falhando em determinada função se eu não tenho a formação, ou se eu não tenho o domínio sobre as minhas funções? Como que eu posso ficar me cobrando?!
Percebemos, nesta fala, forte sentimento de angústia devido às cobranças
96
que recaem sobre nós, e argumentos de defesa, alegando falta de formação e
autonomia sobre algumas ações. Os CP defendem que uma vez estando bem
preparados e inseridos num processo formativo, podem ser cobrados e
responsabilizados. Este diálogo revela também a falta de consciência dos CP de
que eles não precisam ser necessariamente mais “inteligentes”, mas ser capazes de
problematizar as situações, fazer articulações e mobilizar o grupo para as
discussões.
Notemos que eu atribuo às falhas cometidas a falta de formação e à própria
responsabilidade individual e não como resultado de um trabalho coletivo. Os erros
fazem parte de um processo de ensino-aprendizagem, todavia, como o CP tem
assumido todas as atribuições como suas, naturalmente as cobranças também
recaem sobre ele, resultando em sentimentos angustiantes como foram expressos
nos diálogo do grupo.
4.2.2 Abranger diferentes interesses e realidades e mobilizar os professores
para o estudo e discussão
Entre as dificuldades dos CP apontadas até agora, soma-se a necessidade
de abarcar os diferentes interesses seja na condução das ATP, seja na realização
do trabalho diário. Já foi discutido no Capítulo I que o quadro de funcionários de
uma escola é constituído por um grupo não homogêneo, isto é, convivem diferentes
pessoas com maneiras de pensar a realidade vivida. Quando esses modos de
pensar e encarar a realidade não se ajustam, cada qual passa a defender seu ponto
de vista diante dos fatos.
Inserido nesse meio, o CP, ao realizar seu trabalho, tem que lidar com
interesses diversos e, muitas vezes, contraditórios. Isto posto, também devemos
esperar que na realização das ATP os pontos de vista e os interesses diferentes
também se manifestem de forma que o condutor das atividades ali desenvolvidas
precisa estar canalizando-os para um objetivo comum.
Nas análises das transcrições a seguir defrontamo-nos com manifestações
reveladoras das dificuldades que os CP enfrentam diante da necessidade de
abranger interesses diferentes na condução da formação desenvolvida nas ATP.
97
Ao buscar dar resposta ao questionamento da Ângela sobre a questão do
saber-fazer do coordenador (LIMA; SANTOS, 2007), Márcia procura justificar seu
saber-fazer apontando suas dificuldades frente a condução das discussões.
Márcia - As pessoas, os professores, são muito diferentes! É difícil uma proposta na ATP que contemple a todos. Eu, agora, estou trabalhando um filme com eles, e estou vendo como que eu faço para “pegar de volta”, ter uma devolutiva. Acho que isso é o mais difícil. É difícil achar uma proposta que contemple a todos no ATP, porque vejo que são muitos.
Raquel – São muitos seguimentos, não é?!
Márcia - O debate chega para alguns, devido aos problemas que eles estão passando, e, para outros, não faz a diferença. E quando eu faço alguma coisa, fico observando: tem gente que possui um nível de formação excelente e não é tudo que vai chegar a eles, porque o nível de formação deles é excelente.
Débora - Mas são muitas pessoas, se fossem poucas... São muitas pessoas envolvidas.
As justificativas dadas pelos CP estão fundamentadas na ideia da existência
de grupos numerosos, de vários níveis de ensino, de níveis de formação
diferenciados e, desta forma, os assuntos abordados são assimilados por alguns e
por outros não. Baseando nesse pressuposto, entendem que tudo o que for
discutido tem que ser apropriado por todos.
Márcia procura encontrar formas que possam fazer com que todos do grupo
demonstrem aceitação do que foi proposto por ela. Como resultado desse modo de
pensar e agir é que o retorno torna-se frustrante e causa-lhe angústias, pois mesmo
que tenha se esforçado para contemplar a todos, os resultados não são o que ela
gostaria que fossem. Já Débora entende que se fosse um grupo pequeno não
haveria esse problema, embora saibamos que mesmo num pequeno grupo haverá
divergências e conflitos de pensamentos. Aqui, mais uma vez, precisamos atentar
para o que nos alerta Placco (2003, p. 55), quando reforça que
o(a) coordenador(a) pedagógico-educacional não pode supor que as transformações da prática possam ocorrer de maneira contínua e regular, e na direção previamente estabelecida, mas haverá sempre, no cotidiano, um movimento que envolve idas e vindas, secularidades, saltos, evoluções e retrocessos, no tempo e no espaço em que a prática se realiza.
Dessa forma nossas frustrações poderiam ser menos dolorosas se
houvesse entendimento quanto aos resultados que esperamos com nossas ações,
ou seja, as transformações poderão ocorrer, mas não da forma como imaginamos e
gostaríamos; é preciso respeitar os movimentos, as evoluções e retrocessos. E, ao
98
mesmo tempo, como explica a autora (id.,p. 55), “qualquer mudança não é definitiva,
mas indicativa de tendências”.
De um lado não podemos esperar que, com nossas ações, venhamos a
colocar fim a todos os problemas, uma vez que os desafios sempre estarão à nossa
frente. Por outro lado, se partirmos do princípio de que a escola é constituída por
pessoas e cada qual possui sua maneira de pensar, não importa muito se o grupo é
pequeno ou numeroso; o fato é que querer organizar as atividades das ATP com a
preocupação de agradar a todos incorre no risco de passar a vida toda sem que isso
se efetive. Ângela demonstra estar ciente dessa realidade e tenta transmitir isso aos
colegas, mais especificamente à Márcia.
Ângela - Você entendeu, Márcia? Isto que você está falando, o que a Marta falou, todos nós vivenciamos isso. Unificar desejos nos grupos, isso não vai acontecer nunca; e a gente fica magoada, porque a gente prepara algo numa expectativa...
Marta - Dizer que esperava outra coisa, não é? Porque cada pessoa tem um conceito educativo diferente.
Ângela - A gente nunca vai agradar todo mundo, gente. Eu penso que, talvez, até entre nós, que somos aqui vocês cinco e nós duas, não é? Vamos colocar entre nós, sete pessoas. Talvez o que eu selecionei pra gente trabalhar talvez incomodasse vocês, não vão falar diretamente olhando para mim...
A ideia de que as ações do CP, obrigatoriamente, tenham que agradar a
todos vai contra o princípio da heterogeneidade, da pluralidade de ideias,
características própria de qualquer grupo, pois agradar a todos indica esperar que
todos tenham os mesmos pensamentos e interesses.
Como descreve Souza (2003, p. 98),
de alguma forma, o coordenador pedagógico espera que seu grupo seja homogêneo, que aceite enquadrar-se no que o sistema entende como professor, padronizando seus saberes ou mesmo recusando-os para impor os seus, negando suas individualidades, suas crenças e seus valores. É de esperar que essa tensão de relações gere conflitos entre o grupo de professores e a coordenação.
Com essa expectativa poderá encaminhar as atividades nas ATP
desconsiderando a riqueza da diversidade, empobrecendo as discussões e as
trocas de experiências. Neste caso, os horários das ATP passarão a ser espaço de
uma única voz, a da coordenação, e de um grupo ouvinte, os professores, que o
acompanham e assistem a tudo sem nada contradizer e sem nada propor, utilizando
esses momentos com pouco aproveitamento para a formação.
99
Os horários de trabalho coletivo foram pesquisados por Fernandes (2009) e,
segundo os dados de sua pesquisa, em algumas escolas esses horários são
transformados em meras exigências burocráticas, com pauta fechada e definida, ou
seja, o que poderia ser um espaço de negociações e estudos acaba transformando-
se em ‘palcos de encenações’.
Embora uma escola seja constituída por pessoas com pensamentos e ideais
diferentes e é importante que isso seja respeitado, ela precisa construir um projeto
político-pedagógico aproveitando essa diversidade, para que seja ele o norteador
das ações da escola, seja no planejamento dos projetos, das práticas de ensino,
seja nas atividades de formação das ATP.
Assim, os CP se desvencilhariam do fardo que carregam pela necessidade
de atender a interesses individuais e despenderiam suas energias em articular o
coletivo da escola em torno da realização do seu projeto político-pedagógico. Esta é
uma defesa que ganha apoio no trabalho de Orsolon (2011, p. 19) quando ensina
que
para coordenar, direcionando suas ações para a transformação, precisa estar consciente de que seu trabalho não se dá isoladamente, mas nesse coletivo, mediante a articulação dos diferentes atores escolares, no sentido da construção de um projeto político-pedagógico transformador.
Se os grupos de pessoas apresentam diferenciações, as realidades em que
elas vivem também. Este é um caso mais específico das escolas que possuem
deferentes níveis de ensino. A escola em que Márcia trabalha atende ao Ensino
Fundamental I e II durante o dia e ao Supletivo à noite. Este argumento de Márcia
emerge no contexto de discussão sobre o saber-fazer do CP:
Márcia. - Eu tenho uma realidade um pouco diferente. Lá tenho supletivo e a turma da noite. E é em cima disso que eu falo: contemplar os da tarde que têm uma realidade e os da noite também.
Ângela - Com qual coordenação eles ficam? Do 1° ao 5° ou do 6° a 9°?
Márcia - Do 6° ao 9°. Então os professores dos supletivos, que muitas vezes eu tenho que não me esquecer deles; são poucos, mas tenho que contemplar com os assuntos para eles.
Marta - Também ter uma metodologia diferente, não é?
Márcia - É, então, tem essas realidades lá. Sou só eu que tenho essa realidade?
Márcia - Então, comecei a perceber que os que não aderiam eram justamente esses, os do supletivo, que têm uma realidade diferente, que é um aluno mais velho, é um...
Na organização dos encontros de formação ela precisa abranger todos eles,
isto é, pensar nos temas e nas atividades de modo que nenhum nível de ensino
100
fique prejudicado e, ao mesmo tempo, sejam respeitadas as necessidades de cada
grupo.
Como diz a CP, não adianta preparar um tema para ser discutido e estendê-
lo a todos, pois o professor que trabalha com adultos enfrenta problemas de ensino
diferentes dos demais, pois suas necessidades são outras. De acordo com nossa
reflexão inicial sobre desvio de função e atendimento às demandas, perguntamos:
quando o CP encontrará tempo para dar conta de tudo o que lhe é solicitado
diariamente e preparar uma formação adequada a cada nível de ensino?
Clementi (2011, p. 61) corrobora expondo que
o dia a dia do coordenador exige que ele administre seu tempo para cumprir inúmeras tarefas. Tem de formar o professor e, para isso, planejar reuniões; atualizar-se e planejar etapas para atualizar os professores e pensar em procedimentos específicos e nas necessidades de seu grupo.
A administração do tempo para dar conta da necessidade de planejar e
conduzir os encontros das ATP sem cair na improvisação é uma realidade que o CP
precisa assumir. Esperar que se garanta um tempo reservado para determinadas
ações dentro de um espaço de trabalho marcado pela dinamicidade,
imprevisibilidades, urgências, poderá levar a uma imobilização por parte do CP que,
como vimos, atua num ambiente muito heterogêneo. Compreender essa realidade
se torna imperativo; mais do que a disponibilidade de tempo, urge uma tomada de
consciência quanto ao seu papel, às suas limitações e ao meio em que trabalha.
Além disso, é preciso garantir aos CP condições de trabalho para que
possam desempenhar sua função de articulador, formador e transformador,
condições estas, que passam pelo reconhecimento de sua profissão. Para articular
e formar, o uso do seu espaço/tempo precisa estar mais direcionado para esses
fins, e isso não será possível se ele for entendido como aquele deve atender a todas
as demandas.
A busca pelo reconhecimento como formador não se configura como um
trabalho suave aos CP; analisando o diálogo entre os CP, identificamos sentimentos
de inquietação diante do descontentamento dos professores em relação aos temas
propostos. Tomemos como exemplo o relato de Débora, que se encontra diante da
rejeição de uma professora frente ao tema apresentado para estudo. Esse relato
surgiu quando da leitura do trecho “o stress aumenta quando a pessoa faz algo que
101
não motiva, faz por obrigação, por isso temos investido em capacitação pra dar
melhor condição à educação pra se desenvolver e desempenhar sua função com
prazer” (POLATO, 2008, p. 41).
Ângela – Essa capacitação dever algum momento de estudo, o ATP é um momento de estudo.
Débora - Mas aí entra aquela situação do “nada está bom”! Eu estava conversando com eles: - A gente vai falar sobre avaliação!
(Fala da Profª)- Eu não aguento mais ouvir falar disso! Pelo amor de Deus! Só se fala disso!
Débora - Eu tenho necessidade da gente conversar algumas coisas... - Eu falei assim: - “Olha, (ela é do Estado) pode ser que nos seus HTPCs... Porque no HTPC, os professores e os coordenadores estão tendo formação na Diretoria de Ensino e vem com os temas prontos, não é? Pode ser que nos seus HTPCs já tenha sido falado muito”. Gente, eu acho que eu fui rude, não é? Eu falei assim: - “Mas eu acho que você está precisando repensar, porque nem prova adaptada você fez e está falando que avaliação já está na ponta da língua?! Eu falei ainda: - “Mas, nossa, se você está cheia de ouvir falar e não consegue nem fazer uma avaliação adaptada para o seu aluno...”
Márcia - É fácil ir ali e criticar, agora ir lá na frente e “tocar” [a reunião] é difícil.
Pesquisa realizada por Almeida (2009), que analisa depoimentos de dez CP
de escolas públicas estaduais e municipais da grande São Paulo, encontra nos
registros quanto à escolha de estratégias adequadas para garantir o interesse dos
professores pelos HTPC, que alguns demonstram desânimo e outros tentam
garantir esse interesse de alguma forma. Isto nos leva a entender que esta é uma
dificuldade que pode ser compartilhada com outros CP de diversas secretarias.
Quando o CP, diante de um grupo de professores, se depara com a
incumbência de motivá-los para estudo de algum tema e, ao anunciá-lo, ouve uma
manifestação negativa como a descrita, poderá ter reações diversas. Para Débora,
lidar com essa situação não foi confortável. Sua forma de tratar a questão foi de
enfrentamento, revelando irritação, o que culminou com sua exposição pessoal
diante dos colegas de trabalho, apresentando publicamente suas deficiências
pedagógicas.
A fala de Débora não revela quantos professores rejeitaram o tema sobre
avaliação, pois ela cita somente uma professora manifestando-se contrária a ele.
Talvez este seja o motivo pelo qual a CP optou pelo enfrentamento. Se os demais
se comportassem como a colega de trabalho, Débora teria que encontrar outra
maneira de resolver a questão, pois conduzir um encontro onde há rejeição
generalizada não é uma tarefa fácil. Para os professores ver um colega de trabalho
102
ser exposto não é agradável, mesmo que este tenha cometido um erro ao
desconsiderar o trabalho de outro profissional.
Este exemplo nos ajuda a refletir sobre as dificuldades que os CP enfrentam
em propor temas que sejam discutidos pelos professores de forma efetiva. O
diálogo a seguir indica ser um dilema não somente para Débora, mas para os
demais CP.
Marta – Débora, por que você não troca? Fala: - “Olha, eu estava pensando, você não gostaria de falar sobre o assunto?”
Márcia - No nosso próximo ATP é você.
Ângela - Mas você pensa, essa não é uma má ideia. Não assim de jogar na hora, mas da gente dividir talvez no começo do ano, a cada semestre, formar duplas dos professores e eles trabalharem algum tema. Que tem gente preparada também, não é?
Débora - Que nem você fala, é um momento histórico, a gente não tinha ATP, agora a gente tem.
Ângela - Por que a ATP...
Débora - É a necessidade, não é? Porque nada quer, nada está bom, nada agrada.
Raquel - Se é pouco, é pouco; se é muito, é muito.
Ângela - Eu vou usar a frase da professora de ontem que eu já usava, agora vou me apropriar.
Marta - Tenho que ficar quieta, mas eu não aguento.
O dilema vivenciado por Débora e compartilhado com os demais CP é
encontrado também no diálogo dos coordenadores sujeitos da pesquisa
desenvolvida por Mendes (2011, p. 90), onde estes se deparam com professores
cansados e desanimados já no primeiro bimestre. Neste caso, apesar da
reclamação, as CP destacam que é preciso considerar que os professores são
pessoas que um dia podem estar bem, outro não, assim como toda pessoa tem seu
senso crítico; chegar com a pauta pronta, sem abrir para acatar contribuições dos
professores não é garantia de que eles irão aceitar a proposta com entusiasmo.
Nós estamos em abril e eles dizem que estão muito cansados. O diretor comprou um data show, eu gosto de tecnologia, então, as reuniões são sempre com um filminho, eu levo uma animação ligada ao que aconteceu na escola naquela semana, sempre relacionada a um fator pedagógico. (CP6). Como coordenadora, a gente tem que ter um feeling pra esse HTP. Você lida com pessoas, os professores hoje, como vocês sabem, estão cansados em abril. Pode ser que em uma terça–feira o HTP seja lindo, produtivo e, na outra terça-feira, você não consiga fazer nada que você colocou na sua pauta. Então, eu acho que o principal é o feeling, porque você, no seu cargo de coordenadora, chegar coma pauta prontinha e querer enfiar aquilo para eles (professores), não adianta que não vai (CP4).
103
Pelo que podemos perceber nos diálogos entre os CP, existe a preocupação
com a necessidade em dar conta de todas as solicitações, em não frustrar seus
superiores, nem desagradar aos professores com seu desempenho na condução
das atividades, na sugestão dos temas etc. Assim, acabam encontrando muitas
dificuldades em seu dia a dia de trabalho ou na condução das ATP, convivendo com
alternâncias de momentos de inseguranças, de incertezas e angústias.
Esses sentimentos não serão minimizados sem que haja uma
transformação na maneira como se entende o papel desse profissional. Para que
seja ele, o articulador e formador de professores, direção, professores e os próprios
CP precisam reconhecer e assumir essa condição.
Proporcionar transformações na prática de ensino, nas posturas, requer
momentos de paradas, de reflexão, de partilha e estudos. Neste caso, os
coordenadores precisam dispor de tempo para pensar em temas e em estratégias
para a realização dos encontros, preparar material, dinâmicas e, como foi relatado
em momentos anteriores, esse tempo precisa ser criado e administrado para que
consiga dar conta de suas atribuições.
4.2.3. Em busca de outros caminhos: o trabalho coletivo
Diante de toda a problemática levantada é oportuno também apontarmos
para possíveis caminhos em busca da superação de alguns problemas discutidos.
Para desenvolver a formação nos horários das ATP, os apontamentos a seguir
poderão servir de indicativos para que haja mudanças no que diz respeito à
preparação das ATP.
Iniciamos com Torres (2011), que contribui para a reflexão apontando o
diálogo entre CP e professores como forma de fazer das reuniões momentos
efetivos de discussões e de estudos visando a formação contínua e que esse
processo seja assumido por ambos.
Placco e Souza (2006, p. 76) enfatizam a importância do CP na condução
do processo formativo na medida em que ele seja para o docente “alguém com
104
quem ele possa trocar experiências, que o ajude no exame de diferentes caminhos,
que o escute, de forma a permitir que ele se veja e reveja”.
A coordenadora Ângela sugere o diálogo com os professores e a divisão de
responsabilidades na escolha dos temas a serem discutidos e utilização de
dinâmicas diferenciadas quando houver os encontros coletivos do 1° ao 9° ano do
Ensino Fundamental. Isto significa entender os professores como protagonistas e
não como expectadores.
Ângela - A experiência do 1º ao 5º ano, eles tem uma dinâmica diferenciada do 6º ao 9º. Mas, do 6º ao 9º, o que nós podemos fazer de diferente? Por que não tem a hora que separa os grupos? Hora dos “juntinhos” e hora dos “separados”? Então, a hora que separou, conversar com eles: é o seguinte, nós vamos começar a discutir algo diferenciado entre nós. Então vamos dividir a cada dois um texto, vocês podem até dizer: - “Olha, então vai ser um texto, ou fazer um Jack Estripador: você fica com a primeira parte, a segunda, a terceira e a quarta”. Mas, engraçado, só vai ler aquele pedaço, mas nesse momento, até pra começar, talvez seja bom; é porque aluno faz isso bem, os engraçados fazem isso na sala de aula. (...) Mas é necessário, porque, se o professor também no ATP começar, em vez de ir como expectador apenas, na hora em que ele começar a ser o protagonista, vai mudar, porque ele também vai ter que ter...
Raquel - Responsabilidade?
Ângela - De ir pro ATP.
Márcia - E ele tem que estar motivado a parar para ver aquilo (discutir um tema).
Esse entendimento vai também ao encontro do que ensina Fujikawa (2011,
p. 127) sobre o papel do CP:
o coordenador pedagógico assume um papel importante no estabelecimento da parceria e na divisão de responsabilidades, no credenciamento e na valorização das conquistas realizadas, no planejamento de novos instrumentos de reflexão e de avaliação e, principalmente, no trabalho de formação de professores.
No dialogo entre mim e Márcia encontramos a defesa da valorização de um
trabalho educativo onde a continuidade e a unidade sejam referências para a
realização de projetos visando a melhoria do ensino.
Márcia - E é importante haver uma continuidade entre os professores, ou seja, as soluções, as estratégias... Porque, veja, há aluno lá na classe que passa por todos os professores; se todos tiverem o mesmo compromisso é mais fácil.
Amarildo - Isso, essa consciência está sendo trabalhada, porque não adianta o professor sozinho...
Márcia - Um fazer de um jeito, outro de outro jeito.
Amarildo - É, todos vão ter que falar a mesma língua. E isso eles estão assimilando: que não adianta um fazer, e outro não fazer.
Márcia - Tem que haver uma continuidade.
105
Amarildo - Um pede e exige, e outro não pede; quem o aluno vai seguir, não é? O pai que está deixando ou a mãe que não está deixando? É a mesma coisa na sala de aula: - Bom, aqui eu vou fazer desse jeito... Qual é o certo, e o errado?
Entendemos que as posturas diferentes adotadas frente à condução das
atividades escolares criam nos alunos descrédito para as orientações, seja da
prática de ensino, seja de comportamentos disciplinares, de forma que estes não
respeitam ou não levam a sério o que está sendo exigido pela escola, ou não
conseguem distinguir o que deve ou não deve ser seguido. Isso não significa dizer
que o grupo deva ser homogêneo, no sentido de haver padronização de posturas,
comportamentos, mas que tenha suas ações pautadas em princípios
fundamentadas no projeto político-pedagógico da escola.
No diálogo a seguir revelamos entendimento de que a escola como um todo
precisa compreender que não pode haver projeto de algum evento ou de formação
deste professor ou daquele, do coordenador ou do diretor, mas que todos os
projetos que forem realizados na escola sejam trabalhados coletivamente.
Amarildo – Então, assim, a escola precisa assumir essa postura. Até surgiu uma fala: - “O projeto do Amarildo! Aí, no ATP passado, li alguma coisa a respeito de participação democrática, que não existe projeto desse professor ou deste outro; existe o projeto da escola.
Ângela – Isso!
Amarildo - Se der certo ou errado, todos temos que assumir. Então, todos têm que se sentir parte desse projeto para quebrar a ideia de que é de Fulano; então, Fulano vai embora e acabou? Tem que continuar a ideia, que é da escola, não dá pessoa. Do grupo, não é? Isso tem que ser trabalhado bastante...
É preciso, como destacam Placco e Souza (2012), que se trabalhe com o
coletivo, o que significa envolver os demais atores de modo que todos se sintam
valorizados, respeitados e responsáveis pela construção do projeto político-
pedagógico, visando ao aperfeiçoamento do processo de ensino-aprendizagem.
Não pode haver autoria individual dos projetos formativos desenvolvidos na
escola, nem tampouco ações que visem à resolução de questões problemáticas que
concernem a todos. Quando um professor ou coordenador, ou ainda a direção,
assume a autoria individual da condução de determinada ação no enfrentamento de
um problema específico ou das atividades formativas desenvolvidas nas ATP, se
houver sucesso, nem todos comemorarão, embora se beneficiem, mas se der
errado, provavelmente todos irão responsabilizá-lo.
106
Isto posto é mais adequado o caminho da participação democrática na
idealização e condução de uma escola que exista em função de uma coletividade de
pessoas: alunos, professores, pais, funcionários, direção e coordenação. Que os
frutos e/ou as decepções também sejam compartilhados entre todos.
Embora a ideia de participação democrática pareça ser muito romântica
frente à realidade em que a educação está inserida - problemas de infraestrutura,
violência, descrédito, entre outras coisas - não é possível vislumbrar outro caminho
que não seja o envolvimento do coletivo para enfrentar situações problemáticas que
concernem a todos.
Se a democracia parece utopia, o autoritarismo e o individualismo são uma
realidade, seja na educação, seja fora dela. O trabalho do CP a favor do coletivo da
escola é contribuir com a humanização de toda a comunidade escolar.
107
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa desenvolvida objetivou compreender as condições de
planejamento e encaminhamento das atividades de trabalho pedagógico (ATP) de
um grupo de coordenadores de uma rede municipal do interior paulista, bem como
identificar suas principais dificuldades frente à articulação do trabalho coletivo e
promoção da formação nas ATP.
Admitindo que o coordenador pedagógico (CP) é o principal responsável
pelo encaminhamento da formação centrada na escola, isto é, pela formação no
contexto de trabalho, tendo como desafios atuar como formador, articulador e
transformador da realidade escolar (PLACCO, SOUZA; ALMEIDA, 2011),
reconhecemos a complexidade dessa tarefa e interrogamos: quais as dificuldades
dos CP na articulação do trabalho coletivo e promoção da formação nas ATP?
Na condição de CP e pesquisador, participei de um curso de formação para
coordenadores promovido pela Secretaria Municipal de Educação – SME ao longo
do 1° semestre de 2012. Esse foi o contexto da pesquisa, que reuniu os cinco CP do
Ensino Fundamental II do município.
Interessado na problemática da função do CP na escola e mobilizado por
várias preocupações com relação aos encaminhamentos das ATP, a oportunidade
de compartilhar minhas dificuldades e ouvir os meus colegas, além de uma
experiência formativa, constituiu-se como oportunidade privilegiada para a
construção da pesquisa.
Nós, coordenadores, reunidos com uma formadora da SME durante seis
encontros para socializarmos nossas práticas e tive oportunidade de audiogravar
nossas discussões a partir do quarto encontro, depois de autorizado pela SME e
pelos próprios colegas, que assinaram um termo de consentimento livre e
esclarecido.
Por meio de leituras e estudos, observação e participação nos encontros
com os CP, registro em diário de campo, audiogravações e transcrições de nossas
discussões é que a sistematização dos resultados da dissertação se faz agora
possível.
Nessas linhas finais busco traduzir e organizar o que pude aprender ao
longo desse percurso.
108
A formação que acontece na escola a partir das interações entre
professores a favor do diálogo entre conhecimentos teóricos e saberes da
experiência justifica-se pela própria dinamicidade que há na realidade escolar, pois
tanto o saber quanto a prática dos professores não são estáticos. A realidade muda
e os saberes que construímos sobre ela precisam ser revistos e ampliados sempre.
A defesa da escola como lócus de formação leva em consideração que o
desenvolvimento da formação continuada não é exclusividade das instituições
formadoras, colocando em destaque o professor como colaborador e protagonista
de sua própria formação quando realizada dentro do espaço de atuação, ou seja, na
própria escola.
Esse modelo de formação opõe-se às ideias de treinamento, capacitação,
reciclagem, que não privilegiam a construção da autonomia intelectual do professor
e os concebem como consumidores e aplicadores de conhecimentos elaborados
pelos especialistas. Defendo que o docente é um profissional da educação que tem
seu trabalho marcado por situações de complexidade e imprevisibilidade e que
requerem dele pensar, refletir, criar e recriar ações para atender as demandas
específicas de cada classe de alunos. Para dar conta de tudo isso ele precisa estar
em constante desenvolvimento de suas capacidades e conhecimentos. No caso da
formação centrada na escola, que privilegia a socialização das experiências, sua
posição de passividade é substituída pelo papel de sujeito corresponsável por seu
processo de formação.
Ao defender a formação do professor como um profissional que atua como
protagonista do processo formativo, visando uma prática percebida como mais
coerente e mais apropriada à realidade que enfrenta no dia a dia de sua sala de
aula, não quero dizer que ela será a solução para todos os problemas que a
educação enfrenta atualmente, uma vez que essas possíveis soluções dependem
de um conjunto de fatores e relações que se encontram, em muitos casos, fora da
escola. Contudo, a formação continuada poderá contribuir para que as
transformações necessárias para uma melhor aprendizagem ocorram.
Por meio da formação o professor pode encontrar instrumentos para
modificar as tarefas educativas continuamente, numa tentativa de adaptação à
diversidade e ao contexto dos alunos, além de comprometer-se com o meio social.
Ele poderá fazer de sua prática objeto de reflexão e pesquisa, problematizando seu
109
cotidiano, interrogando-o e transformando-o, bem como transformando a própria
escola e a si próprio. Enquanto desempenha sua função docente o professor
aprende e desenvolve novas capacidades, novas ideias e práticas, cria e recria
ações para um melhor ensino.
No entanto, para que ocorra essa formação continuada, o espaço da escola
tem que ser organizado de modo a criar condições para reflexões coletivas. Nessa
perspectiva, é importante criar espaços e momentos para que toda a escola esteja
reunida para repensar o trabalho que vem desenvolvendo, numa dinâmica que
envolve direção, corpo administrativo, corpo técnico, professores, especialistas,
alunos e comunidade, todos envolvidos em um mesmo projeto educativo.
Acredito que o CP, como já discutido na revisão bibliográfica da dissertação,
é o profissional responsável por criar essas condições de participação e reflexão
coletiva. A discussão e elaboração do projeto político-pedagógico e a revisão das
práticas supõe um articulador e mobilizador de situações formativas.
Na função de formador, o CP será um facilitador para que a formação
ocorra, será alguém que irá ao encontro do professor para dar valor à sua voz,
ouvindo o que ele tem a dizer e, ao mesmo tempo, podendo ser ouvido por este,
numa troca de experiências com o objetivo de encontrar possíveis soluções para os
problemas enfrentados no processo de ensino-aprendizagem.
O cotidiano escolar é repleto de acontecimentos variados e, muitas vezes
imprevisíveis, que incidem sobre todos os que nela trabalham, de forma direta ou
indireta. Essa é uma condição de trabalho do CP que não pode ser evitada e que
deve, inclusive, ser antecipada. O problema é quando suas ações estão voltadas
exclusivamente para o atendimento emergencial das demandas do dia a dia
referentes a atendimento de pais, alunos, professores, constantes pedidos da
direção, solicitações das Secretarias administrativas.
Como formador, ele precisa ter tempo para estudar e se organizar para as
ATP, ampliando seu repertório de contribuições. Isso não significa que ele deve
definir o que será trabalhado e preparar pautas fixas para as reuniões, pois a
formação centrada na escola é de natureza compartilhada. O CP precisa envolver
toda a equipe na elaboração de um plano de formação cujo objetivo principal deve
ser oferecer uma educação de qualidade para os alunos, mas precisa levantar
110
possibilidades e propostas. Desse modo ele pode ser o mediador desse processo,
aquele que co-ordena, incentiva a participação dos professores.
Numa atmosfera de parceria e coletividade o CP pode conduzir o processo
de formação na medida em que participa, discute, ouve, propõe e não impõe,
assume e compartilha as responsabilidades com os demais. Nesse processo, deve
valorizar as experiências vividas pelos professores, seus conhecimentos e saberes,
considerando a forma de pensar e agir do professor como um ponto de partida,
como um indicativo de suas necessidades de formação.
No entanto, reconheço que existem algumas limitações para que ele exerça
bem esse papel. A contribuição dessa pesquisa é, justamente, identificar algumas
dificuldades na ação dos CP de modo que a organização do trabalho pedagógico
possa ser revista nas escolas.
A análise dos enunciados dos CP no contexto do grupo de estudos e de
pesquisa apontou que eles enfrentam condições de trabalho bastante
desfavoráveis, potencializadas pela heterogeneidade do cotidiano e indefinição de
quais são suas responsabilidades na escola.
Nesse sentido, discriminamos dois conjuntos de dificuldades mutuamente
relacionadas: as dificuldades da relação do CP com a direção e as dificuldades da
relação do CP com os professores.
No que se refere às dificuldades da relação do CP com a direção, pude
reconhecer que a necessidade de buscar o reconhecimento e a aprovação da
direção em tudo o que faz é que orienta os CP no cotidiano de seu trabalho na
escola. Essa necessidade de aprovação e reconhecimento do trabalho decorre do
fato de que ocupando função de confiança – foi convidado a ocupar esse lugar pelo
próprio diretor – o CP pode ser desligado a qualquer momento.
A preocupação em garantir a aprovação do diretor revelou-se, no que
concerne ao planejamento das ATP, no cuidado de repassar as propostas de
trabalho com diretores de modo não só a incorporar sugestões, mas evitar conflitos.
Subordinado à aprovação do diretor, sem autonomia para encaminhar seu trabalho
como formador, o CP, inclusive, não elabora, reelabora e amplia seus próprios
saberes.
Considerando que o CP não tem uma formação específica para desenvolver
seu trabalho, construindo-a e reconstruindo-a ao longo da prática, seria importante
111
que ele pudesse ficar um longo período nessa função sem ameaças de interrupção
e desligamento. Contudo, sentindo-se obrigado a agradar a direção e “ser útil” para
os professores, o CP se propõe ou aceita realizar inúmeras tarefas que, a rigor, não
lhe competem, como fazer cópias de materiais pedagógicos, substituir professores,
entre outras atividades. Muitos desvios de função são gerados por demandas da
direção e dos professores, mas não só: os CP, por internalizarem essas demandas
cotidianas, incorporando-as como funções, assumem-nas como constitutivas de sua
ação.
Isso significa que a falta de clareza acerca da função do CP não só é da
direção e dos professores, mas dos próprios CP. Essa indefinição promove um dia a
dia de trabalho atribulado, com uma quantidade infinita de afazeres, o que sempre
gera, ao final de cada dia, sensação de desgaste físico e mental.
No que se refere às dificuldades da relação do CP com os professores,
identificamos que a maior parte delas está ligada à necessidade de conquista do
respeito e do reconhecimento pelo grupo de professores, além de atender diferentes
interesses e realidades e de mobilizá-los para estudo e discussão.
Em relação à conquista de respeito e reconhecimento do grupo de
professores, o fato dos CP não terem sido escolhidos por seus pares, mas pela
direção, exige deles superar muitas desconfianças e dúvidas quanto à sua
capacidade.
Um dos desafios identificados nas análises dos diálogos entre os CP quanto
a esse aspecto é a expectativa com relação à sua formação ou ao preparo para
estar na função. O CP tem diante de si um grupo de professores que espera que ele
saiba como ajudá-los a resolver seus problemas. No entanto, os CP, antes de
assumir essa função, eram professores de diversas disciplinas e foram aprendendo
a desempenhar suas tarefas por meio de leituras, baseando-se em suas próprias
experiências ou em cursos de formação continuada.
Para ser mediador dos momentos formativos desenvolvidos nas ATP, o CP
sabe que precisa demonstrar domínio sobre o que irá propor, embora isso não
signifique que ele detenha todos os conhecimentos ou disponha de respostas para
todas as dúvidas. O fato é que ele precisa dispor de um quadro teórico de
referências para que possa desempenhar e planejar suas ações e intervir de modo
112
apropriado para ir vencendo as resistências dos professores e conquistando apoio e
respeito.
Os CP precisam ser capazes de problematizar as situações, fazer
articulações e mobilizar o grupo para as discussões e, nesse sentido, sua formação
continuada é imprescindível. Pesquisas, leituras, participação em palestras,
encontros de formação etc. devem ser incorporadas à sua rotina e cabe às
Secretarias criar as condições para isso. As redes de ensino precisam se
responsabilizar pela formação dos CP e a avaliação positiva de nossos encontros,
por exemplo, é um indicativo dessa necessidade. Contudo, garantir a continuidade
da formação, superando as práticas pontuais, precisa ser assumido como
compromisso dos gestores centrais.
Outra dificuldade dos CP está relacionada à necessidade de abarcar os
diferentes interesses dos professores, seja na condução das ATP, seja na
realização do trabalho diário. A heterogeneidade em um grupo é perfeitamente
natural e necessária, porém, quando os interesses e modos de pensar e encarar a
realidade divergem, a condução das atividades desenvolvidas nas ATP torna-se um
desafio ao CP. Frente aos diferentes pontos de vista e expectativas cabe ao CP
ajudar o grupo a construir sentidos para o trabalho comum. . É preciso fazer com
que todos se envolvam na construção do projeto político-pedagógico a partir da
diversidade; a busca de um objetivo comum é legítima e necessária para a
educação de qualidade, sem a qual cada um caminhará numa direção, defenderá
seu ponto de vista, sem contribuir para o crescimento de todos.
Compartilhando responsabilidades e identificando problemas comuns os CP
podem se desvencilhar do fardo de agradar e atender a interesses individuais e
dirigir sua atenção para a articulação do trabalho coletivo da escola com foco na
discussão e realização do seu projeto político-pedagógico.
Porém, essa forma de atuar exige que ele encontre tempo para planejar,
organizar os encontros, preparar material de estudos, conduzir discussões,
providenciar encaminhamentos, mobilizar o grupo de professores e funcionários. Se
levarmos em conta que o CP passa seus dias atendendo a demandas emergenciais,
como já assinalado anteriormente, como dar conta dessa responsabilidade?
O tempo é nossa medida para realizar as tarefas e/ou para justificar por que
algo não foi realizado. No entanto, tempo pode ser compreendido como kairos -
113
momento oportunizado para as realizações – ou pode ser assumido como chronos -
tempo marcado pelo relógio, medido pelo calendário.
Nossa sociedade está organizada pelo chronos e o CP não pode trabalhar
sem considerar essa organização. No entanto, se não vivenciar o tempo do kairos
corre o risco de só ver o tempo passar a partir da velocidade dos ponteiros de um
relógio. Há que se reparar no tempo das realizações e das possibilidades sob o
risco de enfrentar o sentimento de não dar conta dos afazeres.
Reportando-me ao meu próprio processo de formação escolar descrito no
memorial, em boa parte da trajetória não havia tempo para o estudo, pois o trabalho
para garantir o sustento se fazia mais urgente. Foi preciso refletir sobre o fato de
que tempo para o estudo não existia e o que havia era uma realidade que precisava
ser modificada de alguma forma. O tempo para os estudos tinha que ser criado e
administrado, então, o tempo kairos teve que se sobrepor ao tempo do chronos.
A administração do tempo e a definição de prioridades, como a necessidade
de planejar e conduzir os encontros das ATP evitando a improvisação é um desafio
e uma possibilidade que o CP precisa assumir. Esperar que lhe seja garantido um
tempo reservado para determinadas ações no espaço de trabalho marcado pela
dinamicidade, imprevistos e urgências poderá levá-lo a uma imobilização. Como
apontamos, o CP atua num ambiente que lhe exige respostas frente a uma
variedade de situações; compreender essa realidade se torna um imperativo.
Mais do que esperar a disponibilidade de tempo, urge uma tomada de
consciência quanto ao seu papel. Nossas ações têm capacidade de transformar o
tempo de que dispomos, assim precisamos ficar atentos quanto à nossa capacidade
de organização para que as ações não sejam, o tempo todo permeadas por
improvisações.
É preciso garantir ao CP condições de trabalho que permitam desempenhar
seu papel principal, que é de articulador do projeto político-pedagógico, formador de
professores e transformador da realidade escolar. Para articular, formar e
transformar, o uso do seu espaço/tempo – instituído e instituinte – ele precisa estar
mais direcionado para esses fins, o que não será possível se continuar assumindo a
função de “faz-tudo”.
Novas pesquisas são necessárias para documentar experiências de
formação de coordenadores pedagógicas e, sobretudo, pesquisas desenvolvidas
114
pelos próprios CP que podem refletir e problematizar formas de superação de suas
dificuldades apontando novas e promissoras possibilidades de trabalho.
115
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Anexo
UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA - UNIMEP
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO - PPGE
Pesquisador responsável – Amarildo Gomes Pereira
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Título do projeto: As dificuldades dos coordenadores pedagógicos frente ao
desafio de promover a formação continuada nas Atividades de Trabalho
Pedagógico
As informações abaixo-relacionadas estão sendo fornecidas com o objetivo de definir a sua participação voluntária neste estudo. Os dados serão coletados mediante observação, participação e registro (escrito e audiogravado) nos encontros do curso de formação continuada dos coordenadores pedagógicos da desta Secretaria da Educação, sendo garantido o sigilo das informações obtidas durante o trabalho e a utilização de seus resultados somente para a pesquisa.
Objetivos da pesquisa
Compreender as condições de planejamento e encaminhamento das atividades de trabalho pedagógico (ATP) pelos coordenadores pedagógicos;
Identificar as dificuldades dos coordenadores frente à articulação do trabalho coletivo e promoção da formação nas ATP.
Metodologia Os procedimentos utilizados serão: observação e registro escrito (diário de
campo do pesquisador), bem como audiogravação das interações nos encontros de formação dos coordenadores. O material será transcrito posteriormente para análise.
Esclarecimentos sobre a participação na pesquisa
Os participantes da pesquisa poderão se recusar a continuar na pesquisa e retirar seu consentimento em qualquer fase, sem penalização alguma. A qualquer momento poderão buscar, junto ao pesquisador responsável, esclarecimentos de qualquer natureza, inclusive relativos ao método.
Será garantindo o sigilo quanto aos dados coletados, sendo os mesmos utilizados somente para o desenvolvimento da pesquisa, mantendo-se a confidencialidade e a privacidade dos sujeitos. As audiogravações poderão ser
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utilizadas para fins científicos, aqui incluídas publicações e participações em Congressos, nos limites da ética e do proceder científico íntegro e idôneo, e as situações vividas no curso de formação dos coordenadores poderão ser levantadas, analisadas e utilizadas para a realização desta pesquisa.
A participação no projeto apresenta poucos riscos à saúde física ou psicológica dos indivíduos, por ser um tipo de pesquisa que é centrada na produção de registros audiogravados e escritos, em situações de formação docente, não sendo utilizado método que possa trazer prejuízo à saúde dos participantes.
Esclarecemos que os coordenadores e os formadores não receberão ajuda de custo para se dirigirem aos encontros de formação, uma vez que a pesquisa transcorrerá em horários que fazem parte da jornada de trabalho dos envolvidos.
Ressarcimento e indenização
Se, tendo sido tomados todos os cuidados necessários, for verificado algum
dano causado diretamente pelos procedimentos deste estudo, com nexo causal comprovado, conforme item II.9 da Resolução CNS 196/96, a indenização será conferida na forma da lei.
Não há despesas pessoais para a participação neste estudo, assim como não há compensação financeira.
Este documento está impresso em duas vias, sendo que uma ficará com o pesquisador responsável e outra será entregue ao participante.
Devido às informações que me foram apresentadas e esclarecidas, referentes
aos procedimentos da pesquisa: Eu,..................................................................................................................
RG:.............................., residente na Rua/Av.............................................. , na cidade de .............., declaro que concordo em participar como voluntário(a) do
projeto "As dificuldades dos coordenadores pedagógicos frente ao desafio de
promover a formação continuada nas Atividades de Trabalho Pedagógico". Declaro, ainda, que consinto com a socialização de minhas intervenções nos
encontros de formação continuada pelo pesquisador responsável, desde que nas situações citadas acima.
De minha parte garanto o meu compromisso de, enquanto estiver participando do trabalho, seguir as orientações recebidas e assim garantir a confiabilidade dos resultados da pesquisa.
........................, ...... de 2013.
________________________________________________
(Assinatura do voluntário)
_________________________________
(Assinatura do responsável pela pesquisa) Pesquisador Responsável: Amarildo Gomes Pereira Telefone – (14) 3276-1446 - e-mail – [email protected]