a reforma protestante

Upload: sidnei-de-santana

Post on 09-Mar-2016

6 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • SEMINRIO TEOLGICO NACIONAL

    DISCIPLINA: A REFORMA PROTESTANTE

  • A REFORMA PROTESTANTE

    Durante a Idade Mdia, a Igreja Catlica foi objeto de diversos movimentos que se propunham a reformar suas estruturas, corrigindo abusos do clero e recuperando a pureza original do Cristianismo. Entretanto, todos os autores dessas reformas - papas, bispos, fundadores de ordens religiosas - sempre foram pessoas pertencentes aos quadros da Igreja e incapazes de desligar-se dessa instituio, por mais que dela discordassem. Enfim, queriam arrumar a casa e no construir outra.

    No final da Idade Mdia, entretanto, as insatisfaes religiosas contra a Igreja acumulam-se de tal maneira que desembocaram num movimento de ruptura: a Reforma do sculo XVI. As graves crticas apresentadas contra a Igreja j no permitiam apenas arrumar internamente a casa. Os reformistas romperam definitivamente com a Igreja Catlica, provocando a quebra efetiva da unidade do pensamento ocidental cristo.

    A reforma representou um dos movimentos histricos fundamentais que marcaram o incio dos tempos modernos, sendo motivada por um complexo conjunto de causas que ultrapassaram os limites da mera contestao religiosa Igreja Catlica. Isso porque o homem do sculo XVI refletia, no plano da religio, toda uma srie de descontentamentos que se referiam s suas condies de vida material, tanto no plano poltico como no social ou no econmico.

    AS PRINCIPAIS CAUSAS DA REFORMA

    Existe todo um conjunto de causas religiosas, scio-econmicas e polticas que ajudam a entender a Reforma.

    CAUSAS RELIGIOSAS

  • Um clima de reflexo crtica e de inquietao espiritual espalhou-se entre diversos cristos europeus. Com a utilizao da imprensa, aumentou o nmero de exemplares da Bblia disponveis aos estudiosos. A divulgao da Bblia e de outras obras religiosas contribuiu para a formao de uma vontade mais pessoal de entender as verdades divinas, sem a intermediao dos padres. Desse novo esprito de interiorizao e individualizao da religio, que levou ao livre exame das Escrituras, surgiram diferentes interpretaes da doutrina crist. Nesse sentido, podemos citar, por exemplo, uma corrente religiosa que, buscando apoio na obra de Santo Agostinho, afirmava que a salvao do homem somente era alcanada pela f. Essas idias opunham-se posio oficial da Igreja, baseada em Santo Toms de Aquino, pela qual a salvao do homem era alcanada pela f e pelas boas obras.

    Analisando o comportamento do clero, esses cristos passaram a condenar energicamente uma srie de abusos e de corrupes que estavam sendo praticados. O alto clero de Roma estimulava inmeros negcios envolvendo a religio, como, por exemplo, o comrcio de relquias sagradas espinhos que coroaram a fronte de Cristo, panos que embeberam o sangue de seu rosto, objetos pessoais dos Santos etc.). Alm do comrcio de relquias sagradas, a Igreja passou a vender indulgncias, isto , o perdo dos pecados. Assim, mediante certo pagamento destinado a financiar obras da Igreja, os fiis poderiam comprar a sua salvao.

    No plano moral, a situao de inmeros membros da Igreja tambm era lastimvel, sendo o objeto de vrias crticas. Multiplicavam-se os casos de padres envolvidos em escndalos amorosos, de monges que viviam bbados como vagabundos e de bispos que somente acumulavam riquezas pessoais, vendiam os sacramentos e pouco se importavam com a religio.

    CAUSAS SCIO-ECONMICAS A concepo teolgica da igreja, desenvolvida durante o Perodo Medieval, estava adaptada ao sistema feudal, que se baseava na economia fechada e na auto-suficincia dos feudos, onde o comrcio subsistia apenas como atividade marginal.

  • Por isso, a teologia tradicional catlica condenava a obteno do lucro excessivo, da usura, nas operaes de comrcio, defendendo a prtica do preo justo.

    Com o incio dos tempos modernos, desenvolveu-se a expanso martima e comercial, e dentro desse novo contexto a moral econmica da Igreja comeou a entrar em choque com a atividade da grande burguesia. Essa classe, empenhada em desenvolver ao mximo as atividades comerciais, sentia-se incomodada com as concepes tradicionais da Igreja, que taxava de pecado a busca impetuosa do lucro. Assim, essa burguesia comeou a sentir necessidade de uma nova tica religiosa, mais adequada ao esprito do capitalismo comercial. Essa necessidade ideolgica da burguesia foi satisfeita, em grande parte, com a tica protestante, que surgiria com a Reforma. Convm frisar, entretanto, que nem todos os lderes reformistas estavam dispostos a incentivar as prticas do capitalismo. o caso, por exemplo, de Lutero, que condenava severamente o luxo e a usura, propondo para os cristos um ideal de vida modesto, em que no existiria a ansiedade pelo lucro e a vaidade pelas riquezas materiais.

    CAUSAS POLTICAS O sculo XVI foi um perodo de fortalecimento das monarquias nacionais. A Igreja Catlica, com sede em Roma e falando latim, apresentava-se como instituio de carter universal, sendo um fator de unidade do mundo cristo. Essas noes, entretanto, perdiam fora, na medida em que os sentimentos nacionais desenvolviam-se com grande vigor. Cada Estado, com sua monarquia, sua lngua, seu povo e suas tradies, estava mais interessado em autoafirmar-se enquanto nao do que em fazer parte de uma cristandade obediente Igreja. Opondo-se ao papado e ao comando centralizador da Igreja Catlica, a Reforma religiosa atendia aos anseios nacionalistas, permitindo a autonomia de Igrejas nacionais.

    A REFORMA DE MARTINHO LUTERO

    Martinho Lutero (1483-1546) nasceu em Eisleben, na Saxnia, sendo filho de um empreiteiro de minas que atingiu certa prosperidade econmica. Influenciado pelo pai, ingressou em 1501 na Universidade de Erfurt, para estudar direito, mas seu temperamento inclinava-o vida religiosa, Em 1505, aps quase ter morrido em uma

  • violenta tempestade, ingressou na Ordem dos Monges Agostinianos, cumprindo promessa feita a Santa Ana.

    Estudioso srio, metdico e aplicado, Lutero conquistou prestgio intelectual, tornando-se, em 1508, professor da Universidade de Wittenberg. Em 1510, viajou a Roma, de onde regressou decepcionado com o clima de corrupo que percebera no alto clero, Nos anos de 1511 a 1513, aprofundou-se nos estudos teolgicos, ate que comearam a amadurecer em seu espirito as idias para a criao de uma nova doutrina religiosa. Nas epstolas de So Paulo, encontrou uma frase que lhe paraceu fundamental: o justo se salvar pela f. Concluiu Lutero que o homem, corrompido em razo do pecado original, s poderia salvar-se pela f incondicional em Deus. Somente a f, e no as obras praticadas, seria o nico instrumento capaz de justificar os pecados e de conduzir salvao, graas misericrdia divina. Em 1517, eclodiu o incidente que provocaria o rompimento entre Lutero e a Igreja Catlica, girando em torno do episdio conhecido como venda de indulgncias. Tendo como o objetivo arrecadar fundos para financiar a reconstruo da Baslica de So Pedro, o Papa Leo X permitiu que se concedem indulgncias (perdo dos pecados) a todos os fieis que contribussem financeiramente com a Igreja. Escandalizado com essa salvao comprada a dinheiro, Lutero afixou na porta da Igreja de Wittenberg um manifesto pblico ( as 95 teses), em que protestava contra a atitude do Papa e expunha os elementos de sua doutrina. Iniciava-se, ento, uma longa discusso entre Lutero e as autoridades eclesiticas, culminando com sua excomunho pelo Papa, em 1520. Demonstrando descaso e revolta diante da Igreja, Lutero queimou em praa pblica a bula Papal Exsurge dimine, que o condenava.

    A DOUTRINA LUTERANA

    Vejamos, rapidamente, uma sntese dos principais pontos da doutrina luterana:

    .Igreja: proclamava a criao de Igrejas nacionais autnomas. O trabalho religioso poderia ser feito por pessoas no obrigadas ao celibato sacerdotal (obrigao de casar). Lutero aceitava a dependncia da Igreja ao Estado. O idioma das cerimnias religiosas deveria ser aquele de cada nao e no o latim, que era o idioma oficial das cerimnias catlicas.

  • .Rito Religioso: a cerimnia religiosa deveria obedecer a ritos mais simples, reduzindo a pompa existente nos cultos catlicos. Santos e imagens foram abolidos.

    .Livro Sagrado: A Bblia era o livro sagrado do Luteranismo, representando a nica fonte da f. Sua leitura e interpretao deveriam se feitas por todos os cristos. Lutero, em 1534, traduziu para o alemo um original grego da Bblia.

    .Salvao Humana: O homem salva-se pela f em Deu e no pelas obras que pratica.

    .Sacramentos: preservaram-se como sacramento bsicos o batismo e a eucaristia.

    A EXPANSO DO LUTERANISMO

    Paralelamente aos problemas meramente religiosos, houve uma srie de fatores sociais e econmicos que favoreceram a difuso das idias de Lutero na Alemanha. Destacam-se, entre eles, o fato de grande parte das terras alems pertencerem Igreja Catlica, havendo grande interesse da nobreza em apossar-se dessas terras.

    Nessa poca, o que chamamos de Alemanha nada mais era do que um conjunto de principados e de cidades autnomas, no havendo, portanto, um pas unificado, com autntica unidade poltica. A regio fazia parte dos domnios do Sacro Imprio Romano Germnico, controlado pela Dinastia dos Habsburgs, cujo imperador ficava na Espanha. O imperador era aliado do Papa e procurava, com isso, preservar certa unidade e poder sobre os prncipes alemes.

  • Com sede de poder e de riqueza, as classes elevadas (nobreza e burguesia) mostravam-se descontentes em relao Igreja e ao comando do imperador. Por outro lado, as classes sociais menos favorecidas (camponeses e artesos urbanos) tambm responsabilizavam a Igreja pela situao de misria e de explorao de que eram vtimas. Havia, portanto, um certo consenso entre as diversas classes sociais contra a Igreja.

    Liderados por Thomas Mnzer, os camponeses, a partir de 1524, organizaram uma srie de revoltas contra sacerdotes ricos e nobres, donos de grandes propriedades de terra. De forma violenta, os camponeses lutavam pela posse de terra e pelo fim de explorao. As classes dominantes, ento, uniram-se para dominar a revolta camponesa, contando com o apoio de Lutero, que publicou um manifesto cujo ttulo trazia as seguintes palavras Contra os bandos camponeses assassinos e ladres.... Confrontos com os poderosos, os camponeses foram esmagados: morreram mais de cem mil e o lder Thomas Munzer foi decapitado.

    Em troca de seu apoio s classes dominantes, Lutero conseguiu poderosos aliados entre a nobreza e a alta burguesia, que o auxiliaram a difundir sua doutrina religiosa pelo norte da Alemanha, pela Sucia, pela Dinamarca e pela Noruega. Foram esses aliados que, em 1529, protestaram contra a preservao das medidas tomadas pelo imperador contra Lutero, que impediam cada Estado de adotar sua prpria religio. A partir desse protesto que se difundiu o nome protestante para designar os cristos no catlicos.

    No sendo ouvidos pelo imperador, o grupo dos prncipais protestantes formou, em 1531, um liga poltico-militar (Liga de Smalkalde) para lutar contra as foras catlicas ligadas ao imperador Carlos V. Somente em 1555 o imperador aceitou a existncia oficial das Igrejas Luteranas, assinando com os protestantes a Paz de Augsburg. Era o reconhecimento jurdico final da separao religiosa do mundo cristo.

    A REFORMA DE CALVINO

  • Joo Calvino (1509 - 1564) nasceu em Noyon, na Frana, e desenvolveu nesse pas seus estudos de Teologia e de Direito. Influenciado por Guillaume Farel, aderiu s idias protestantes. Quando, em 1534, as autoridades catlicas francesas comearam a perseguir os suspeitos de heresias, Calvino fugiu para a Suia, onde o movimento reformista j tinha se iniciado, sob a liderana de Ulrich Zwingli (1484-1531).

    Em suas pregaes, Zwingli dava maior importncia do que Lutero crena na predestinao dos homens para a salvao, valorizando menos o aspecto da justificao pela f. Com seu esprito racionalista, Zwingli conquistou o apoio da burguesia mercantil da Sua, que admirava a objetividade de suas aes e o lado prtico de suas idias. Seu trabalho religioso preparou o caminho para que ali se desenvolvessem as idias de Joo Calvino.

    Em 1536, Calvino publicou sua principal obra, a Instituio da Religio Crist, na qual afirmava que o ser humano estava predestinado de modo absoluto a merecer o Cu ou o Inferno. Explicava Calvino que, por culpa de Ado, todos os homens j nasciam pecadores (pecado original), mas, Deus tinha eleito algumas pessoas para serem salvas, enquanto outras seriam condenadas maldio eterna. Portanto, nada que os homens pudessem fazer em vida poderia alterar-lhes o destino, j previamente traado. A f, existente em algumas pessoas, poderia ser interpretada como um sinal de que elas pertenciam ao grupo dos eleitos por Deus salvao. Tais pessoas, os eleitos, sentiriam dentro do seu corao um irresistvel desejo de combater o mal que

    povoa o mundo, simplesmente para a glria de Deus. A prosperidade econmica de algumas pessoas, sua riqueza material, tambm passou a ser interpretada pelos seguidores de Calvino como um sinal da salvao predestinada.

    Em 1538, Calvino foi expulso da Sua, devido aos seus excessos de rigor e de autoritarismo. Entretanto, conseguiu retornar em 1541 e consolidou seu poder na cidade de Genebra, tornando-se senhor absoluto do Governo e da nova Igreja

  • Calvinista, at o ano de 1561. Durante esse perodo, Genebra viveu um regime de carter teocrtico, em que se confundiam princpios religiosos e polticos.

    Entre os rgos criados pelo Governo calvinista, destacava-se o Consistrio, encarregado da vigilncia moral dos cidados e da solicitao de castigos ao Estado. Entre as atitudes condenadas pelo Calvinismo citam-se, por exemplo, o jogo, o culto a imagens, a dana, o adultrio e a heresia, sendo que as penas impostas aos infratores variavam conforme a gravidade do crime. Muitos foram condenados morte, figurando entre eles o mdico Miguel de Servet, que foi queimado vivo por negar o pecado original.

    Criou-se, com base no Calvinismo, um modelo ideal de homem, religioso e trabalhador, par quem o sucesso econmico e a conquista de riquezas eram um sinal da predestinao divina ao Paraso. Essa ideologia foi muito bem aceita pela burguesia mercantil, na medida em que sua ganncia pelo lucro era justificada pela tica religiosa. Identificando-se com a burguesia, o Calvinismo espalhou-se por diversas regies da Europa, como Frana, Inglaterra, Esccia e Holanda pases onde se expandia o capitalismo comercial.

    A REFORMA ANGLICANA

    Henrique VIII (1509-1547), rei da Inglaterra, tinha sido, durante certo tempo, um fiel aliado do Papa, recebendo deste o ttulo de Defensor da F. Entretanto, uma srie de fatores polticos e econmicos levaram tambm Henrique VIII a romper com a Igreja Catlica e a fundar uma Igreja nacional na Inglaterra, isso , a Igreja Anglicana.

    Entre os principais fatores que provocaram a Reforma Anglicana, podemos destacar os seguintes:

  • * Fortalecimento da monarquia: a Igreja Catlica exercia grande influncia poltica dentro da Inglaterra, pois era dona de grande parte das terras e monopolizava o comrcio de objetos sagrados. Para fortalecer o poder da monarquia inglesa, Henrique VIII teria que reduzir a influncia do Papa dentro da Inglaterra;

    * A posse das terras da Igreja: a nobreza capitalista inglesa tinha grande interesse econmico em apossar-se das terras da Igreja. Para que isso acontecesse era preciso unir-se em torno do rei, a fim de que os poderes da Igreja Catlica se enfraquecessem;

    * O pedido de divrcio do rei Henrique VIII: casado com a princesa espanhola Catarina de Arago, Henrique VIII teve com ela uma filha para suced-lo no trono. Entretanto, o rei estava bastante descontente com seu casamento. Primeiro, devido origem espanhola de sua esposa, j que a Espanha era inimiga da Inglaterra. Segundo, porque o rei desejava um herdeiro masculino e pretendia casar-se com Ana Bolena. Assim, em 1529 pediu ao Papa que anulasse seu matrimnio com Catarina de Arago, mas deparou-se com a recusa do Sumo Pontfice. Apesar disso, Henrique VIII conseguiu que o alto clero ingls e o Parlamento reconhecessem a validade de suas intenes. Em 1534, o Parlamento ingls votou um Ato de Supremacia, pelo qual considerava Henrique VIII o chefe supremo da Igreja Nacional Anglicana. Os ingleses, por juramento, deviam submeter-se a essa supremacia, caso contrrio seriam excomungados e perseguidos pela justia real. Houve pouca resistncia, nela includa a de Thomas Morus, que foi decapitado. Suprimiu-se o clero regular e seus bens, devolvidos coroa, foram vendidos.

    Aps a criao da Igreja Anglicana, surgiram, com os sucessores de Henrique VIII, uma srie de Lutas religiosas internas. Primeiro, tentou-se implantar, no governo de Eduardo VI (1547-1553), o Calvinismo no pas. Depois, no governo de Maria Tudor (1553-1558), filha de Catarina de Arago, houve a reao catlica. Somente no governo de Elisabeth I (1558-1603) que se consolidou a Igreja Anglicana, que permanece dominante no pas at hoje. O calvinismo puritano conseguiu, entretanto, grande nmero de adeptos entre a burguesia, entretanto, grande nmero de adeptos entre a burguesia manufatureira. Foi dos puritanos que surgiram os grandes lderes da Revoluo inglesa do Sculo XVII.

  • A FORMA E O CONTEDO DA REFORMA ANGLICANA A Igreja Anglicana procurou desenvolver uma conciliao original entre o rito tradicional do catolicismo e o dogma de carter protestante. Em outras palavras, mantinha-se nas cerimnias a forma catlica (conservao da liturgia catlica, da hierarquia eclesistica etc.) e introduziam-se na doutrina elementos do contedo protestante (salvao pela f, preservao de apenas dois sacramentos - batismo e comunho etc.).

    Essa foi a soluo encontrada pela monarquia inglesa para favorecer, no pas, a convivncia social dos diferentes grupos religiosos rivais. Assim, de acordo com as circunstncias histricas de cada momento, a monarquia inglesa dirigia a Igreja Anglicana para enfatizar a forma catlica ou o contedo protestante. Se quisesse agradar aos protestantes, valorizava o contedo dos cultos; se quisesse agradar aos catlicos, valorizava o rito formal das cerimnias.

    A REFORMA CATLICA OU CONTRA-REFORMA Diante dos movimentos protestantes, a reao inicial e imediata da Igreja Catlica foi a de punir os lderes rebeldes, na esperana de que as idias dos reformadores no se propagassem e o mundo cristo recuperasse a unidade perdida. Essa ttica, entretanto, no deu bons resultados, j que o movimento protestante avanou pela Europa, conquistando crescente nmero de seguidores. Era foroso, assim, reconhecer a ruptura protestante.

    Diante disso, ganhou fora dentro do Catolicismo um amplo movimento de moralizao do clero e reorganizao das estruturas administrativas da Igreja. Esse movimento de reformulao da Igreja Catlica ficou conhecido como Reforma

  • Catlica ou Contra-Reforma. Seus principais lderes foram os Papas Paulo III (1534-1549, Paulo IV (1555-1559), Pio V (1566-1572) e Xisto V (1585-1590).

    Todo um conjunto de medidas foi colocado em prtica pelos lderes da Contra-Reforma, tendo em vista deter o avano do protestantismo. Entre essas medidas, destacam-se as seguintes:

    * Aprovao da Ordem dos Jesutas: no ano de 1540, o Papa Paulo III aprovou a criao da Ordem dos Jesutas ou Companhia de Jesus, que tinha sido fundada pelo militar espanhol Incio de Loyola, em 1534. Inspirando-se na estrutura militar, os jesutas consideravam-se os soldados da Igreja, sua tropa de elite, cuja misso era combater a expanso do protestantismo. Entretanto, o combate deveria ser travado com as armas do esprito, e para isso Incio de Loyola escreveu um livro bsico, chamado Os exerccios espirituais, em que se propunha a programar a converso do indivduo ao catolicismo, mediante tcnicas de contemplao. A criao de escolas religiosas foi um dos principais instrumentos da estratgia dos jesutas. Outra arma utilizada foi a catequese dos no-cristos, isto , os jesutas empenharam-se em converter ao catolicismo os povos dos continentes recm-descobertos. O objetivo era expandir o domnio catlico para os demais continentes;

    * Convocao do Conclio de Trento: no ano de 1545, o Papa Paulo III convocou um Conclio, cujas primeiras reunies foram realizadas na cidade de Trento, na Itlia. Ao final de longos anos de trabalho, terminados em 1563, o Conclio apresentou um conjunto de decises destinadas a garantir a unidade da f catlica e a disciplina eclesistica. Reagindo s idias protestantes, o Conclio de Trento reafirmou diversos pontos da doutrina catlica, como, por exemplo:

    - Salvao humana: depende da f e das boas obras humanas. Rejeitava-se, portanto, a doutrina da predestinao;

  • - Fonte da f: o dogma religioso tem como fonte a Bblia, cabendo Igreja dar-lhe a interpretao correta, e a tradio religiosa, conservada pela Igreja e transmitida s novas geraes. O Papa reafirmava sua posio de sucessor de Pedro, a quem Jesus Cristo confiou a construo de sua Igreja;

    - A missa e a presena de Cristo: a Igreja reafirmou que no ato de eucaristia ocorria a presena real de Jesus no po e no vinho. Essa presena real de Cristo era rejeitada pelos protestantes.

    O Conclio de Trento determinou, ainda, a elaborao de um catecismo com os pontos fundamentais da doutrina catlica, a criao de seminrios para a formao dos sacerdotes e a manuteno do celibato sacerdotal;

    * Restabelecimento da Inquisio: no ano de 1231 a Igreja Catlica criou os Tribunais de Inquisio, que, com o tempo, reduziram suas atividades em diversos pases. Entretanto, com o avano do protestantismo, a Igreja decidiu reativar, em meados do sculo XVII o funcionamento da Inquisio, que se encarregou, por exemplo, de organizar uma lista de livros proibidos aos catlicos, o Index librorum prohibitorum. Uma das primeiras relaes de livros proibidos foi publicada em 1564.

    A Mensagem da Reforma para os Dias de Hoje

    I. Por que Lembrar a Reforma?

    Em 31 de outubro de 1517 Martinho Lutero pregou as suas hoje famosas 95 Teses na porta da catedral de Wittenberg. Periodicamente as igrejas evanglicas relembram aqueles eventos que, na soberana providncia de Deus, preservaram viva a sua igreja. Muitos, entretanto, questionam essas comemoraes e alguns chegam at a contestar a lembrana da Reforma. "Por que considerar o que aconteceu h quase 500 anos?"

  • Seguramente muitos no estudam a Reforma por mero desconhecimento, por falta de informao, por no se aperceberem da sua importncia na vida da igreja e da humanidade. Entretanto, muitos procuram um esquecimento voluntrio daqueles eventos do sculo XVI. Martin Lloyd-Jones1 nos fala que entre aqueles que rejeitam a memria da Reforma temos, basicamente, dois tipos de argumentao: 1. "O passado no tem nada a nos ensinar." Segundo este ponto de vista, o progresso cientfico e o futuro o que interessa. Firmadas em uma mentalidade evolucionista, estas pessoas partem para uma abordagem histrica de que "o presente sempre melhor do que o passado" e assim nada enxergam na histria que possa nos servir de lio, apoio, ou alerta. 2. A segunda forma de rejeio parte daqueles que vem a Reforma como uma tragdia na histria religiosa da humanidade. Estes afirmam que deveramos estar estudando a unidade em vez de um movimento que trouxe a diviso e o cisma ao cristianismo. Dentro desta viso, perdemos tempo quando nos ocupamos de algo to negativo.

    Podemos dar graas, entretanto, pelo fato de que um segmento da igreja ainda acha importante estar relembrando e aplicando as questes levantadas pelos reformadores. Mas o mesmo Martin Lloyd-Jones que alerta para um perigo que ainda existe dentro do interesse pelos acontecimentos que marcaram o sculo XVI. Na realidade, ele nos confronta com uma forma errada e uma forma certa de relembrar o passado, do ponto de vista religioso.

    A forma errada, seria estudar o passado por motivos meramente histricos. Esse estudo seria semelhante abordagem que um antiqurio dedica a um objeto. Por exemplo, quando ele examina uma cadeira, ele no est interessado em saber se ela confortvel, se d para sentar-se bem nela, se ela cumpre adequadamente a funo de cadeira. Basicamente a preocupao se resume sua idade, ao seu estado de conservao e, principalmente, a quem pertenceu. Isto determinar o valor daquele objeto para o antiqurio e, conseqentemente, o seu estudo motivado por essa viso.

    Em Mateus 23.29-35 teramos um exemplo dessa abordagem errada do passado. O trecho diz:

  • Ai de vs, escribas e fariseus, hipcritas! ...porque edificais os sepulcros dos profetas, adornais os tmulos dos justos, e dizeis: Se tivssemos vivido nos dias de nossos pais, no teramos sido seus cmplices no sangue dos profetas. Assim, contra vs mesmos testificais que sois filhos dos que mataram os profetas. Enchei vs, pois, a medida de vossos pais. Serpentes, raa de vboras! como escapareis da condenao do inferno? Por isso eis que eu vos envio profetas, sbios e escribas. A uns matareis e crucificareis; a outros aoitareis nas vossas sinagogas e perseguireis de cidade em cidade; para que sobre vs recaia todo o sangue justo derramado sobre a terra, desde o sangue do justo Abel at ao sangue de Zacarias, filho de Baraquias, a quem matastes entre o santurio e o altar.

    Jesus diz que aqueles homens pagavam tributo memria dos profetas e lderes religiosos do passado. Eles prezavam tanto a histria, que cuidavam dos sepulcros e os enfeitavam. Proclamavam a todos que os profetas eram homens bons e nobres e atacavam quem os havia rejeitado. Diziam eles: "se estivssemos l, se vivssemos naquela poca, no teramos feito isso!" Mas Jesus no se impressiona e os chama de hipcritas! A argumentao de Jesus a seguinte: Se vocs se dizem admiradores dos profetas, como que esto contra aqueles que representam os profetas e proclamam a mesma mensagem que eles proclamaram? Ele prova a sinceridade deles pondo a descoberto a sua atitude no presente para com aqueles que agora pregam a mensagem de Deus e mostra que eles prprios seriam perseguidores e assassinos dos proclamadores da mensagem dos profetas.

    Esse tambm o nosso teste: uma coisa olhar para trs e louvar homens famosos, mas isso pode ser pura hipocrisia se no aceitamos, no presente, aqueles que pregam a mensagem de Lutero e de Calvino. Somos mesmo admiradores da Reforma, daqueles grandes profetas de Deus?

    Mas existe uma forma correta de relembrar o passado. Ns a deduzimos no apenas por excluso e inferncia do texto anterior, mas porque temos um trecho na Palavra de DeusHebreus 13.7-8, que diz: "Lembrai-vos dos vossos guias, os quais

  • vos falaram a palavra de Deus, e, atentando para o xito da sua carreira, imitai-lhes a f. Jesus Cristo o mesmo, ontem, e hoje, e eternamente."

    A maneira correta de relembrar a Reforma , portanto, verificar a mensagem, a Palavra de Deus, como foi proclamada, e isso no apenas por um interesse histrico de "antiqurio," mas para que possamos imitar a f demonstrada pelos reformadores. Devemos observar aqueles eventos e aqueles homens, para que possamos aprender deles e seguir o seu exemplo, discernindo a sua mensagem e aplicando-a aos nossos dias.

    II. Distores Verificadas na Lembrana da Reforma

    Muitos de ns que crescemos neste pas de maioria catlica podemos nos recordar de, numa ou outra ocasio, termos ouvido alguma posio distorcida sobre os fatos da Reforma do Sculo XVI, ou sobre os reformadores. Uma das verses comuns, na viso da Igreja Catlica, era apresentar Lutero como um monge que queria casar e que por isso teria brigado com o papa. Outros diziam que Lutero foi algum que ambicionava o poder poltico. Ainda outros falam que Lutero era apenas um mstico rebelde, sem convices reais e profundas. At mesmo a descrio dele como doente da alma, psicopata, enganador e falso profeta permanece em vrios escritos de historiadores famosos do perodo.2 Um famoso autor e historiador catlico brasileiro chegou a escrever que "excomungado em Worms, em 1521, Lutero entregou-se ao cio e moleza."3

    Em anos mais recentes, um novo de tipo de abordagem da Reforma tem surgido nos crculos catlicos, que igualmente representa alguma forma de distoro. Por exemplo, nos 500 anos do nascimento de Lutero (1983) o Papa participou de algumas cerimnias comemorativas do evento, na Alemanha.4 Certamente no foi por convencimento das verdades ensinadas por Lutero, pois a igreja que representa nada mudou doutrinariamente aps a sua participao. A visita do Papa evidencia, entretanto, uma comprovao de que a imagem de Lutero e os princpios que pregava esto sendo alvo de revisionismo histrico e de distores. Diluindo-se a fora das doutrinas pregadas pelos reformadores, possibilita-se uma aproximao com os fatos histricos descontextualizados.

  • Em 1967, nos 450 anos da Reforma, a revista TIME escreveu o seguinte:"O domingo da Reforma est se tornando um evento ecumnico que olha para o futuro, em vez de para o passado."5 Na mesma ocasio, um semanrio jesuta fez esta afirmao: "Lutero foi um profundo pensador espiritual que foi levado revolta por papas mundanos e incompetentes."6 Podemos ver como essa colocao faz da Reforma uma revolta contra pessoas temporais e no contra um sistema de doutrinas de uma igreja apstata, que persiste at hoje.

    Refletindo o sentimento ecumnico que tem permeado a segunda metade do sculo XX, bispos das igrejas catlica e luterana dos Estados Unidos fizeram uma declarao solidria, no aniversrio da Reforma, dizendo o seguinte: "recomendamos um programa conjunto, entre os membros de nossas igrejas, de estudos, reflexo e orao."7 Podemos imaginar discpulos jesutas consciente e sinceramente fazendo estudos, reflexo e orao em comemorao Reforma do Sculo XVI? Certamente s se ignorarem os pontos fundamentais de doutrina levantados pelos reformadores.

    Refletindo uma viso poltico-sociolgica da Reforma, uma outra distoro permeou durante muito tempo o pensamento revisionista da histria. Na poca em que o comunismo ainda imperava na Europa oriental, porta-vozes do partido comunista da Alemanha relembraram Lutero como sendo "um precursor da revoluo."8

    III. Esquecimento Doutrinrio dos Princpios da Reforma

    Muitas das aes descritas acima, de comemorao conjunta da Reforma por catlicos e protestantes, s ocorrem porque no se fala nas doutrinas cardeais levantadas pelo movimento do sculo XVI. Tristemente, temos observado que mesmo no campo chamado "evanglico" a situao semelhante. Raras so as igrejas e denominaes evanglicas que ensinam o que foi a Reforma do Sculo XVI e muito poucas as que comemoram o evento e aproveitam para relembrar e reaplicar os princpios nela levantados. Mais recentemente, observamos que tem sido removida a clara linha que separa as igrejas protestantes da catlica quanto ao entendimento da f crist e da salvao. Esta ao, at alguns anos atrs praticada somente pela teologia liberal, que j havia declaradamente abandonado os

  • princpios norteadores da Palavra de Deus, hoje est presente no campo protestante evanglico.

    A falta de discernimento e conhecimento histrico, prtico e teolgico tem-se achado at mesmo dentro do campo ortodoxo e inclui telogos reformados e tradicionais. Referimo-nos ao documento "Evanglicos e Catlicos Juntos" (Evangelicals and Catholics Together), publicado em 1994 nos Estados Unidos, que tem sido uma fonte de controvrsia desde a sua divulgao.

    A base e inteno do documento foi a realizao de aes conjuntas de cunho moral-poltico por catlicos e protestantes,9 mas ele evidencia uma grande falta de discernimento e sabedoria. Por exemplo, o documento encoraja a que as pessoas convertidas sejam respeitadas em sua deciso de filiar-se quer a uma igreja catlica quer a uma protestante.10 Essas declaraes foram emitidas como se a f fosse a mesma, como se a doutrina fosse igual, como se a base dos ensinamentos fosse comum, como se as distines inexistissem ou fossem extremamente secundrias.

    A premissa bsica do documento "Evanglicos e Catlicos Juntos" que a evangelizao de catlicos algo indesejvel e no recomendvel, uma vez que a verdadeira f e prtica crist devem j estar presentes na Igreja de Roma. Em sua essncia, esse documento a grande evidncia do esquecimento da Reforma do Sculo XVI e do que ela representou e representa para a verdadeira igreja de Cristo.

    Algum evanglico poderia argumentar, "mas isso coisa de americano, no atinge o nosso pas!" Ledo engano! A conhecida e prestigiada Revista Ultimato trouxe em suas pginas, no nmero de setembro de 1996, artigos e depoimentos, advindos do campo evanglico conservador, refletindo basicamente a mesma compreenso do documento "Evanglicos e Catlicos Juntos," ou seja: as distines com relao Igreja de Roma seriam secundrias e no essenciais.

  • Tal situao reflete pelo menos uma crassa ignorncia da doutrina catlica romana. Por exemplo, os cannes 9 e 10 do Conclio de Trento, escritos no auge da Contra-Reforma mas nunca ab-rogados at os dias de hoje, dizem o seguinte:

    Cnon 9: Se algum disser que o pecador justificado somente pela f, querendo dizer que nada coopera com a f para a obteno da graa da justificao; e se algum disser que as pessoas no so preparadas e predispostas pela ao de sua prpria vontadeque seja maldito.

    Cnon 11: Se algum disser que os homens so justificados unicamente pela imputao da justia de Cristo ou unicamente pela remisso dos seus pecados, excluindo a graa e amor que so derramados em seus coraes pelo Esprito Santo, e que permanece neles; ou se algum disser que a graa pela qual somos justificados reflete somente a vontade de Deusque seja maldito.11

    Estas declaraes, ou melhor, maldies, foram pronunciadas contra os protestantes. Elas atingem o cerne da doutrina da justificao somente pela f. So afirmaes contra a defesa inabalvel da soberania de Deus na salvao, proclamada pela Reforma do Sculo XVI, e continuam fazendo parte dos ensinamentos da Igreja Catlica.

    A viso distorcida do evangelho e da evangelizao, no campo catlico romano, no algo que data apenas da era medieval. Veja-se esta declarao extrada da encclica papal "O Evangelho da Vida," escrita e divulgada Igreja em 1995: "O Evangelho a proclamao de que Jesus possui um relacionamento singular com todas as pessoas. Isso faz com que vejamos em cada face humana a face de Cristo."12 Certamente teramos que chamar esta viso do evangelho de universalismo e declar-la contrria f crist histrica.

    Perante esse emaranhado de opinies to diferenciadas, perante o testemunho e o registro implacvel da histria, perante a crise de identidade, de doutrina e de prtica

  • litrgica que nossas igrejas atravessam, qual deve ser a nossa compreenso da Reforma?

    IV. Consideraes Prticas Sobre a Reforma e os Reformadores

    Nosso apreo pela Reforma e suas doutrinas no deve levar-nos a uma viso utpica e idealista com relao aos seus personagens principais. Devemos reconhecer os seus feitos, mas tambm as suas limitaes. na compreenso da falibilidade humana que detectamos a mo soberana de Deus empreendendo os seus propsitos na histria. Vejamos alguns pontos que valem a pena ser recordados:

    A. Lutero foi um Homem Falvel

    As 95 Teses de Lutero13 realmente representaram um marco e um ponto de partida para a recuperao das ss doutrinas. Entre as teses encontramos expresses de compreenso dos ensinamentos da Bblia, como por exemplo na Tese 62 ("O verdadeiro tesouro da Igreja o sacrossanto Evangelho da glria e da graa de Deus") e na Tese 94 ("Os cristos devem ser exortados a seguir a Cristo, a sua cabea, com diligncia"). Entretanto, devemos reconhecer que elas esto longe de serem, em sua totalidade, expresses precisas da verdadeira f crist. Elas registram, na realidade, o incio do pensamento de Lutero, que seria trabalhado e refinado por Deus ao longo de seus estudos e experincias posteriores. Vejamos os seguintes exemplos:

    Lutero faz referncia ao purgatrio, sem qualquer contestao doutrina em si, em doze das suas teses (10, 11, 15, 16, 17, 18, 19, 22, 25, 26, 29, 82). Ex.: Tese 29: "Quem disse que todas as almas no Purgatrio desejam ser redimidas? Temos excees registradas nos casos de S. Severino e S. Pascal, de acordo com uma lenda sobre eles."

  • Alm da meno aos santos na tese acima, Lutero faz referncia a Maria como me de Deus (Tese 75), aparentemente no no sentido histrico do termo (o termo histrico, em grego theotokos,tinha o propsito de reconhecer a divindade de Jesus14), mas no conceito catlico da expresso, que infere a existncia de um poder especial em Maria. Diz a Tese 75: " loucura considerar que as indulgncias papais tm to grande poder que elas poderiam absolver um homem que tivesse feito o impossvel e violado a prpria me de Deus."

    Quatro teses inferem legitimidade ao papado e sucesso apostlica (77, 5, 6, 9). Ex.: Tese 77: " blasfmia contra So Pedro e contra o Papa dizer que So Pedro, se fosse o papa atual, no poderia conceder graas maiores [do que as atualmente concedidas]."

    Alm disso, verificamos que resqucios do romanismo se fizeram presentes na formulao da Igreja Luterana, principalmente na sua estrutura hierrquica e na compreenso quase catlica dos elementos da Ceia do Senhor. Possivelmente tambm poderamos dizer que na Reforma encontramos individualismo em excesso e falta de unidade entre irmos de mesma persuaso teolgica (principalmente nas interaes dos luteranos com Zunglio e Calvino). Mas, com todas essas limitaes, os reformadores foram poderosamente utilizados por Deus na preservao das suas verdades.

    B. A Revolta de Lutero foi Eminentemente Espiritual

    No podemos compreender a Reforma se acharmos que Lutero liderou uma revolta contra pessoas, contra padres corruptos, apenas. A ao de Lutero foi uma revolta contra uma estrutura errada e uma doutrina errada de uma igreja que distorcia a salvao. No foi um movimento sociolgico: ele no pretendia ensinar a salvao do homem pela reforma da sociedade, mas compreendia que a sociedade era reformada pelas aes do homem resgatado por Deus. Na realidade, a Reforma do Sculo XVI foi um grande reavivamento espiritual operado por Deus, que comeou com uma experincia pessoal de converso.

  • C. Lutero no Formulou Novas Doutrinas, ou Novas Verdades, mas Redescobriu a Bblia em sua Pureza e Singularidade

    As 95 Teses representam coragem, despreendimento e uma preocupao legtima com o estado decadente da igreja e com a procura dos verdadeiros ensinamentos da Palavra. Mas um erro acharmos que a Reforma marca o surgimento de vrias doutrinas nunca dantes formuladas. A Palavra de Deus, cujas doutrinas estavam soterradas sob o entulho da tradio, que foi resgatada. Uma das caractersticas comuns das seitas a apresentao de supostas verdades que nunca haviam sido compreendidas, at a sua revelao a algum lder. Essas "verdades" passam a ser determinantes da interpretao das demais e ponto central dos ensinamentos empreendidos. A Reforma coloca-se em completa oposio a esta caracterstica. Nenhum dos reformadores declarou ter "descoberto" qualquer verdade oculta, mas eles to somente apresentaram em toda singeleza os ensinamentos das Escrituras. Seus comentrios e controvrsias versaram sempre sobre a clara exposio da Palavra de Deus.

    Mais uma vez, Martin Lloyd-Jones nos indica "que a maior lio que a Reforma Protestante tem a nos ensinar justamente que o segredo do sucesso, na esfera da Igreja e das coisas do Esprito, olhar para trs."15 Lutero e Calvino, diz ele, "foram descobrindo que estiveram redescobrindo o que Agostinho j tinha descoberto e que eles tinham esquecido."16

    V. A Mensagem da Reforma para os Dias de Hoje As mensagens proclamadas pela Reforma continuam sendo pertinentes aos nossos dias. Da mesma forma como as Escrituras so sempre atuais e representam a vontade de Deus ao homem, em todas as ocasies, a Reforma, com suas mensagens extradas e baseadas nessas Escrituras, transborda em atualidade para a cena contempornea da igreja evanglica. Vejamos apenas alguns pontos pregados pelos Reformadores e a sua aplicao presente:

    A. A Reforma Resgatou o Conceito do Pecado Rm 3.10-23

  • A venda das indulgncias mostra como o conceito do pecado estava distorcido na poca da Reforma do Sculo XVI. A igreja medieval e, principalmente, as aes de Tetzel, fugiram totalmente viso bblica de que pecado uma transgresso da Lei de Deus e qualquer falta de conformidade com seus padres de justia e santidade. A essncia do pecado foi banalizada ao ponto de se acreditar que o seu resgate podia se efetivar pelo dinheiro. fcil vermos as implicaes que a falta de um conceito bblico de pecado tem para outras doutrinas chaves da f crist. Por exemplo: se o resgate em funo da soma de dinheiro paga, como fica a expiao de Cristo, qual a necessidade dela? Ao se insurgir contra as indulgncias Lutero estava, na realidade, reapresentando a mensagem da Palavra de Deus sobre o homem, seu estado, suas responsabilidades perante o Deus Santo e Criador, e sua necessidade de redeno.

    Hoje esses conceitos esto cada vez mais ausentes da doutrina da igreja contempornea. A mensagem da Reforma continua necessria aos nossos dias. Estamos nos acostumando a ouvir que todas as aes so legtimas; que pecado uma conceito relativo e ultrapassado; que o que importa a felicidade pessoal e no a observncia de princpios. Mesmo nos meios evanglicos existe grande falta de discernimento h uma preocupao muito maior em encontrar justificativas, explicaes e racionalizaes do que com a convico de pecado e o arrependimento.

    B. A Reforma Pregou a Doutrina da Justificao Somente pela F Gl 3.10-14

    A Igreja Catlica havia distorcido o conceito da salvao, pregando abertamente que a justificao se processava por intermdio das boas obras de cada fiel. Lendo a Palavra, Lutero verificou quo distanciada esta pregao estava das verdades bblicas a salvao era uma graa concedida mediante a f. Todo o trabalho vem de Deus. As boas obras no fornecem a base para a salvao, mas so evidncias e sub-produtos de uma salvao que procede da infinita misericrdia de Deus para com o homem pecador que ele arranca da perdio do pecado.

    Hoje estamos novamente perdendo essa compreenso a mensagem da Reforma necessria. A justificao pela f continua sendo esquecida e procura-se a

  • justificao pelas obras. Muitas vezes prega-se e procura-se a justificao perante Deus atravs do envolvimento em aes de cunho social.

    A justificao pela f est sendo, ultimamente, considerada at um ponto secundrio, mesmo no campo evanglico, partindo-se para trabalhos de ampla cooperao, como base de f e de unidade, como vimos no pensamento expresso pelo documento j referido: Evanglicos e Catlicos Juntos.

    C. A Reforma Resgatou o Conceito da Autoridade Vital da Palavra de Deus 2 Pe 1.16-21

    Na ocasio da Reforma, a tradio da igreja j havia se incorporado aos padres determinantes de comportamento e doutrina e, na realidade, j havia superado as prescries das Escrituras. A Bblia era conservada distante e afastada da compreenso dos devotos. Era considerada um livro s para os entendidos, obscuro e at perigoso para as massas. Os reformadores redescobriram e levantaram bem alto o nico padro de f e prtica: a Palavra de Deus, e por este padro aferiram tanto as autoridades como as prticas religiosas em vigor.

    Hoje o mundo est sem um padro. Mas no somente o mundo: a prpria igreja evanglica est voltando a enterrar o seu padro em meio a um entulho mstico pseudo-espiritual a mensagem da Reforma continua necessria.

    Sabemos que nas pessoas sem Deus imperam o subjetivismo e o existencialismo. A nica regra de prtica existente parece ser: "Comamos e bebamos porque amanh morreremos." Verificamos que nas seitas existe uma multiplicidade de padres. Livros e escritos so apresentados como se a sua autoridade fosse igual ou at superior da Bblia. A cena comum a apresentao de novas revelaes, geralmente de natureza escatolgica e com caractersticas fluidas, contraditrias e totalmente duvidosas.

  • No meio eclesistico liberal, j nos acostumamos a identificar o ataque constante veracidade das Escrituras. J vamos com mais de dois sculos de contestao sistemtica da Palavra de Deus, como se a f crist verdadeira fosse capaz de subsistir sem o seu alicerce principal.

    Mas no campo evanglico que somos perturbados com os ltimos ataques Bblia como regra inerrante de f e prtica. Ultimamente muitos chamados intelectuais tm questionado a doutrina que coloca a Bblia como um livro inspirado, livre de erro. Podemos tomar como exemplo o caso do Fuller Theological Seminary. Esta famosa instituio evanglica foi fundada em 1947 sobre princpios corretos. Logo aps o seu incio, formulou-se uma declarao de f que especificava: "os livros do Velho Testamento e do Novo Testamento, nos originais, so inspirados plenariamente e livres de erro, no todo e em suas partes" Entretanto, em 1968, o filho do fundador, Daniel Fuller, que havia estudado sob Karl Barth, comeou a questionar a inerrncia da Bblia, fazendo distino entre trechos "revelativos" e trechos "no revelativos" das Escrituras. Foi seguido nessa posio pelo presidente, David Hubbard, e por vrios outros professores, todos considerados evanglicos.17 Logicamente no h critrio coerente ou legtimo para fazer essa distino. Subtrai-se da igreja o seu padro, derruba-se um dos pilares da Reforma, e a igreja retroagida a uma condio medieval de dependncia dos especialistas que nos diro quais as partes em que devemos crer realmente e quais as que devemos descartar como mera inveno humana.

    No campo evanglico neopentecostal, a suficincia da Palavra de Deus desconsiderada e substituda pelas supostas "novas revelaes," que passam a ser determinantes das doutrinas e prticas do povo de Deus.

    Em seu Captulo I, Seo II, a Confisso de F de Westminster apresenta a mensagem inequvoca da Reforma do Sculo XVI, cada vez mais vlida para os nossos dias. Ali a Bblia descrita como sendo a "regra de f e de prtica."

  • D. A Reforma Redescobriu na Palavra a Doutrina do Sacerdcio Individual do Crente Hb 10.19-21

    O sacerdcio individual do crente foi uma outra doutrina resgatada. Ela apresenta a pessoa de Cristo como nico mediador entre Deus e os homens, concedendo a cada salvo "acesso direto ao trono" por intermdio do sacrifcio de Cristo na cruz e pela operao do Esprito Santo no "homem interior."18 O ensinamento bblico, transmitido pela Reforma, eliminava os vrios intermedirios que haviam surgido ao longo dos sculos entre o Deus que salva e o pecador redimido. Na ocasio, esse era um ensinamento totalmente estranho Igreja de Roma, que sempre se apresentou como tendo a palavra final de autoridade e interpretao das Escrituras.

    Lutero rebelou-se contra o vu de obscuridade que a Igreja lanava sobre as verdades espirituais e levou os fiis de volta ao trono da graa. Isso proporcionou uma abertura providencial no conhecimento teolgico e religioso. Lutero sabia disso, mas tambm sabia que o acesso a Deus deveria estar fundamentado nas verdades da Bblia, tanto assim que um de seus primeiros esforos, aps a quebra com a Igreja Romana, foi a traduo da Palavra de Deus para a lngua falada em seu pas: o alemo.

    O ensinamento do sacerdcio individual do crente foi o grande responsvel pelo estudo aprofundado das Escrituras e pela disseminao da f reformada. Levados a proceder como os bereanos,19 os crentes verificaram que no dependiam do clero para o entendimento e aplicao dos preceitos de Deus e passaram a penetrar com determinao nas doutrinas crists.

    A mensagem da Reforma continua sendo necessria hoje. A igreja contempornea est multiplicando-se em quantidade de adeptos, mas uma multiplicao estranha porque acompanhada de uma preguia mental quanto ao estudo. Parece que fomos todos tomados de anorexia espiritual, pois nos contentamos com muito pouco, nos achamos mestres sem estudar, nos concentramos na periferia e no no cerne das doutrinas, e ficamos felizes com o recebimento s do "leite" e no da "carne."

  • A mensagem da Reforma necessria para que no venhamos a testemunhar a consolidao de toda uma gerao de "cristos analfabetos." Em vez de procurarmos coisas "enlatadas" e de deixar que apenas formas de entretenimento povoem nossas mentes e coraes, devemos lembrar-nos constantemente da importncia de "guardar a palavra no corao."

    Precisamos nos aperceber de que o contedo da Palavra de Deus verdade proposicional objetiva. Mas essa objetividade tem que ser acompanhada do nosso estudo e da nossa capacidade de compreenso, sob a iluminao do Esprito Santo, e da aplicao coerente dos ensinamentos dessa Palavra em nossas vidas.

    E. A Reforma Apresentou, de Forma Clara e Inequvoca, o Conceito da Soberania de Deus Salmo 24

    Na ocasio da Reforma, as expresses de religiosidade tinham se tornado totalmente centralizadas no homem. Isso ocorreu principalmente pela grande influncia de Toms de Aquino na sistematizao do pensamento catlico romano. Abraando as idias de Pelgio, Aquino enfatizou fortemente o livre arbtrio do ser humano, desconsiderando a gravidade da escravido ao pecado que o torna incapaz de escolher o bem, a no ser que a ele seja direcionado por Deus. Lutero reconheceu que a salvao se constitua em algo mais que uma mera convico intelectual. Era, na realidade, um milagre da parte de Deus e por isso ele tanto pregou como escreveu sobre "a priso do arbtrio." Costumamos atribuir a cristalizao das doutrinas relacionadas com a soberania de Deus a Joo Calvino apenas, mas o ensinamento bblico de Lutero traz, com no menor veemncia, uma teologia teocntrica na qual Deus reina soberanamente em todos os sentidos.

    Hoje, a mensagem continua a ser necessria, pois o homem, e no Deus, permanece no centro das atenes. Mesmo dentro dos crculos evanglicos, nossa evangelizao efetivada tendo a felicidade do homem como alvo principal, e no a glria de Deus. At a nossa liturgia desenvolvida em torno de algo que nos faa "sentir bem," e no com o objetivo maior da glorificao a Deus. Nesse aspecto, deveramos estar atentos mensagem de Ams, que nos ensina (Am 4.4-5) que Deus no se impressiona com uma liturgia que no direcionada a ele.20 Nesse

  • trecho vemos que a adorao realizada em Betel21 e Gilgal22 tinha vrias caractersticas dos cultos contemporneos:

    1. Os locais eram suntuosos e famosos (Betel possua belas fontes no da montanha).

    2. A periodicidade dos cultos e possivelmente a freqncia era exemplar (reuniam-se diariamente).

    3. As contribuies eram generosas, superando at os padres de Deus (de trs em trs dias traziam as ofertas).

    4. O louvor era abundante (sacrifcios de louvor eram ofertados; Am 5.23 e 6.5 tambm fala do estrpito dos cnticos e da transbordante msica instrumental).

    5. Havia bastante publicidade (as ofertas eram divulgadas e apregoadas).

    6. Havia alegria e deleite geral nos trabalhos ("disso gostais," diz o profeta). O resultado de toda essa adorao centralizada no homem foi a mo pesada de Deus em julgamento sobre aquela sociedade insensvel (com aquele culto, as pessoas, dizia o profeta, "multiplicavam as suas transgresses"). Realmente, semelhana da Reforma, precisamos resgatar a pregao da soberania de Deus e demonstrar essa doutrina na prtica de nossas vidas e na de nossas igrejas.

    Concluso

    Devemos reconhecer a Reforma como um movimento operado por homens falveis, mas poderosamente utilizados pelo Esprito Santo de Deus para resgatar suas

  • verdades e preservar a sua igreja. No devemos endeusar os reformadores nem a Reforma, mas no podemos deix-la esquecida e nem deixar de proclamar a sua mensagem, que reflete o ensinamento da Palavra de Deus aos dias de hoje. A natureza humana continua a mesma, submersa em pecado. Os problemas e situaes tendem a repetir-se, at no seio da igreja. O Deus da Reforma fala ao mundo hoje, com a mesma mensagem eterna. Devemos, em orao e temor, ter a coragem de proclam-la nossa igreja.

    SEITAS MARGINAIS REFORMA

  • A liberdade sobre a leitura bblica imposta pela Reforma ocasionou um enorme avano ao cristianismo, ou pelo menos, possibilitou-o a retomar os passos do cristianismo primitivo. Nesta liberdade vrias correntes de interpretao surgiram nos sculos subseqentes. Pessoas comearam a ler a bblia de acordo com o seu tempo o que respondeu a inmeras perguntas, mas suscitou muitas interpretaes distintas. Veremos alguns ramos (abordaremos mais a questo do no-pentecostalismo pois trata-se de algo emergente e atual).

    Faremos aqui uma breve definio de seita, a partir do que diz o Rev. Tcito Gama:

    O termo seita vem do substantivo latino secta e do verbo sequi, que significa seguir. A palavra grega que aparece na bblia hiresis, ou seja, heresia, que, por causa da semntica, foi traduzido na Vulgata por seita. No seu sentido original significa escola ou modo de pensar e de viver que seguido por pessoas. O sentido original, portanto, no pejorativo, visto que o prprio cristianismo foi denominado de seita (At 26.5). Com o tempo, o termo foi adquirindo um significado negativo, ou seja, esprito sectrio, ferrenho, estreito, agressivo, maquiavlico1.

    Seitas Profticas

    Seitas profticas, em sua maioria, so movimentos que surgem a partir de uma viso fantica, de um sonho, uma revelao pessoal aliada uma interpretao descontextualizada de algumas passagens bblicas. Geralmente profetizam o fim dos tempos; sua linguagem natural de sectarismo e sua argumentao est baseada em profecias futursticas. Tambm no vem Jesus como o nico Deus, mas como um deus. Dentre elas podemos destacar: Adventistas do Stimo dia, Mrmons, Cincia Crist, Testemunhas de Jeov, Meninos de Deus, entre outras.

    Seitas Pentecostais

    O pentecostalismo nunca foi homogneo. Desde seu incio, sempre conteve diferenas internas. As maiores diferenas na verdade, no so nem tanto teolgicas, mas comportamentais, e so elas que definem a identidade pentecostal;

  • desde o seu surgimento at agora, inmeros ramos brotaram na rvore pentecostal. So difceis, no de discernir, mas de dar-lhes uma identidade. Vrios telogos tentam dividir o movimento pentecostal. A diviso que achamos ser mais coerente a de Paul Freston:

    O pentecostalismo brasileiro pode ser compreendido como a histria de trs ondas de implantao de igrejas. A primeira onda a dcada de 1910, com a chegada da Congregao Crist (1910) e da Assemblia de Deus (1911). A segunda onda pentecostal dos anos 50 e incio de 60, na qual o campo pentecostal se fragmenta, a relao com a sociedade se dinamiza e trs grandes grupos (em meio a dezenas de menores) surgem: Quadrangular (1951), Brasil para Cristo (1955) e Deus Amor (1962). O contexto dessa pulverizao paulista. A terceira onda comea no final dos anos 70 e ganha fora nos anos 80. Seus principais representantes so a Igreja Universal do Reino de Deus (1977) e a Igreja Internacional da Graa de Deus (1980). O contexto fundamentalmente carioca2

    O tempo vai passando e mudando, com isso, determinando a leitura e o surgimento de novos grupos oriundos da f pentecostal. Sua marca, em todas as classificaes, o sentimentalismo e a experincia. O homem foi colocado no centro para que pudesse sentir a experincia com o divino. Eis a classificao atual de pentecostalismo baseada em Freston:

    a) Pentecostalismo Clssico

    Fazem parte dessa linhagem, no Brasil, a Igreja Assemblia de Deus e a Crist no Brasil. O termo clssico surgiu em meados de 1970, quando pesquisadores norte-americanos acrescentaram a designao classical s denominaes pentecostais do incio do sculo, perodo de gnese do pentecostalismo, para distingui-las de outras pentecostais ou carismticas surgidas nos anos 60. Alguns autores tambm usam o termo histrico, ou ainda, tradicional. Para entender o que se denomina movimento pentecostal clssico do sculo XX, necessrio tornar claro o seguinte: um movimento missionrio de carter mundial, que possui uma dinmica prpria,

  • herdando muitos traos dos movimentos de santidade da Inglaterra e dos Estados Unidos, particularmente do metodismo. A grande maioria das igrejas pentecostais surgiram das igrejas histricas herdeiras da Reforma Protestante do sculo XVI. Seu marco inicial foi em 1900, quando Charles Parham, alugou uma "Manso de Pedra", como era conhecida, em Topeka, Kansas para estabelecer uma escola bblica chamada Betel. Cerca de 40 estudantes ingressaram na escola para o seu primeiro e nico ano atrados pelo seguinte propsito - "descobrir o poder que os capacitaria a enfrentar o desfio do novo sculo". O mtodo de ensino era pesquisar e estudar um assunto, esgotando todas as citaes bblicas sobre o assunto e apresent-lo para a classe em forma de sabatina oral, orando para que o Esprito Santo estivesse sobre a mensagem trazendo convico. At dezembro de 1900, j tinham estudado sobre arrependimento, converso, consagrao, santificao, cura e a eminente vinda do Senhor. No dia 25 de dezembro, Charles Parham iria se ausentar por alguns dias e deu a seguinte instruo para eles:

    "Ns nos deparamos em nossos estudos com um problema. sobre o segundo captulo de Atos?... Tendo ouvido tantas entidades religiosas diferentes reivindicarem diferentes provas como evidncias do recebimento do batismo pentecostal, eu quero que vocs estudantes estudem diligentemente qual a evidncia bblica do batismo no Esprito, para que possamos apresentar ao mundo alguma coisa incontestvel que corresponda absolutamente com a Palavra"3.

    Trs dias aps, apresentaram seus trabalhos com a mesma histria. Embora diferenas tenham ocorrido quando a beno pentecostal caiu, tinham como prova irrefutvel o falar em outras lnguas. Foi esta descoberta, que deu inicio o Movimento Pentecostal do sculo XX. "Tal foi a magnitude e impacto do movimento, que, j na primeira dcada depois de Azuza , sabia-se de experincias pentecostais na sia, frica, Europa e Amrica Latina. O movimento se multiplicava agora em muitos movimentos com variedade de matizes e expresses, como um grande caleidoscpio"4.

    O movimento pentecostal no Brasil, teve inicio com os missionrios Daniel Berg e Gunner Vingren, crendo ter recebido revelaes de Deus, vieram para o norte do Brasil -estado do Par; onde, numa Igreja Batista, comearam a pregar o batismo

  • com o Esprito Santo e ali fundaram a Igreja Assemblia de Deus. Outro missionrio, Luigi Francescon, antigo membro da Igreja Presbiteriana Italiana de Chicago, tambm, por revelao de Deus, segue para a Argentina e Brasil, iniciando nos estados de So Paulo e Paran a Congregao Crist do Brasil.

    b) Deutero-pentecostalismo

    Nos anos 50, uma segunda onda pentecostal se iniciou, fazendo dos milagres e da cura divina sua principal nfase, diferentemente da primeira onda, onde a nfase recaia sobre a glossolalia, entretanto, o ncleo doutrinrio permaneceu inalterado. Os pioneiros dessa nova viso so os ex-atores americano: Harold Williams e Raymond Batright. Difundiram-na por meio do rdio. Surgem denominaes como a Igreja do Evangelho Quadrangular - Cruzada Nacional de Evangelizao (1953)5; Igreja Pentecostal "O Brasil para Cristo"(1956); Igreja de Nova Vida (1960); Igreja Pentecostal "Deus Amor"(1961); Casa da Beno(1964), Metodista Weslyana(1967) e uma enorme quantidade de pequenas denominaes, formando comunidades locais.