a publicidade e a cultura participativa - introdução à publicidade
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Fernanda Carvalho, Gabriella Carvalho e Lucas Linhares. UFF.TRANSCRIPT
A Publicidade e a Cultura Participativa.
O termo Cultura Participativa se refere a um novo nível de inserção do
consumidor no mercado, este sendo não mais só quem consome, mas quem colabora
para uma ampla relação midiática com o produtor, que é o desenrolar de uma
transformação que começa no desdobramento dos meios como TV, rádio e mídia
impressa para um novo setor ainda ilimitado em padrões: a internet.
A chamada cultura free na era digital molda uma adaptação dos meios, que
devem agora selecionar o que se encaixa em cada plataforma, de maneira que seu
retorno financeiro seja condizente ao apelo por informação e mais, com uma nova
necessidade de participação por parte do consumidor. Logo, esse não é mais um
termo referente a uma medida de incentivo da mídia e do mercado, mas uma realidade
cultural expansiva.
Essa nova necessidade de participação é por essência um reflexo social,
resultado de um processo que acompanhou a evolução da tecnologia. Hoje grande
parte da população tem acesso a instrumentos que possibilitam interferir na mídia,
logo, internet se torna cada dia mais uma área que te convida a participar. A
sociedade agora aprende que pode produzir conhecimento e disseminar informações,
e além disso: ela tem o poder da escolha.
Em um mundo onde a cybercultura não para de se expandir, a interação entre
pessoas gerou a necessidade de uma construção coletiva de inteligência. Muita
procura por informação, fazendo nascer novas demandas a cada dia. Eis então que o
consumidor da informação passou a também produzir a informação. Os professores
de Educação Física passaram a usar seus alunos para divulgar online os treinos e
dicas da profissão, então outros professores poderiam adotar o que aprenderam
postando os resultados na rede social, os alunos também poderiam se filmar
praticando os exercícios todos os dias e assim por diante. O fã da série, do filme, do
livro pode criar seu próprio conteúdo, gerando a febre dos Fanfics (ficção criada por
fãs), dos blogs de críticas e resenhas, captura de diálogos em imagens, etc.
Essa forma de interação se insere em peso na produção publicitária, de forma
criativa e altamente influente. O consumidor que antes era passivo, se torna ativo. Ele
adapta o que o produtor divulga ao seu cotidiano, suas vontades momentâneas e seu
corpo social. Logo, a esfera digital, ainda que relativamente recente, já modela
relações de mercado que se diferenciam em peso de anos atrás. Essa metamorfose
vai da forma como a pesquisa de marketing é agora mais profunda e delicada, a como
o consumidor agora recebe e responde ao produto com verdadeira liberdade e tem o
poder de mudar o que antes apenas lhe era imposto.
A capacidade de mudança é fruto justamente daquilo que podemos definir
como o primeiro ponto importante a ser considerado quando começamos a analisar os
desdobramentos diretos da Cultura Participativa no fazer publicitário: a capacidade de
escolha. Os consumidores são protagonistas de suas próprias ações, que ocorrem o
tempo todo e são regidas por um sistema constante de auto-seleção1 de conteúdo. Ou
seja, se antes a pulverização de uma mídia tradicional isolada já dificultava a obtenção
da atenção de um espectador, agora isso parece ainda mais desafiador, uma vez que
elas, teoricamente, precisariam disputar a audiência com outras plataformas.
Alguns grupos de comunicação têm se mostrado competentes na reação à
nova realidade. E é aqui que a convergência de mídias aparece de maneira mais clara
como uma solução, especialmente para a televisão: ao invés de disputar com outras
plataformas, o que seria um suicídio, é preciso integrá-las. Logo, os programas
televisivos, assim como os pertencentes às mídias tradicionais em geral, começaram a
adotar crescentemente sistemas de interação em tempo real com o conteúdo
transmitido. Paralelo a isso, eles também ocupam as mídias digitais produzindo
conteúdos específicos, com linguagem e características próprias desses novos meios
de comunicação.
Outro exemplo dessa participação ocorre quando a publicação que
determinada conta faz em uma rede social, por exemplo, é visualizada por um usuário
não só considerando o conteúdo dito principal, produzido pelo primeiro autor, mas é
visto como um todo que inclui interações espontâneas, interações numéricas e afins.
Conforme os usuários foram se apropriando melhor dessas ferramentas, construíram
uma realidade atual onde o conteúdo principal passa a ser muitas vezes o produzido
nos espaços conhecidos como “comentários” e “respostas a comentários”. E cada
nova interação constrói o conteúdo como ele é. Ou seja, na Cultura Participativa, a
interação passa a ser tanto fim quanto meio.
O terceiro fator importante para a consolidação da Cultura Participativa, que
reverberou em novos desafios para a Publicidade, está nas margens que limitavam as
plataformas, agora mais borradas pelo hibridismo, pela comunicação integrada e pelo
all-line2. Isso significa para os profissionais da Publicidade e da Comunicação que não
basta utilizar a velha fórmula de ocupar uma mídia acreditando que bastará para que a
marca tenha um processo de construção de imagem exitoso. É preciso, além de
entender que as manifestações espontâneas são uma realidade importante nessa
nova configuração social, compreender também que aquele conteúdo precisa interagir
com outras plataformas quando pertinente, e invariavelmente deverá gerar resultados
off-line.
Eis que se faz indispensável nesse contexto a relevância do conteúdo para o
seu target. Isso porque um anúncio interrompendo o feed do usuário pode ser tanto
um incômodo quanto um passo importante na construção de uma imagem positiva.
Isso depende do nível de conhecimento do perfil e do comportamento - online e off-line
- de quem está sendo alcançado e da capacidade de identificação e sentido que
aquele conteúdo é capaz de gerar.
E é claro que já não faltam exemplos de apropriação exemplar de todas essas
possibilidades. Considerando o mercado da Comunicação e as Mídias, é notável um
telejornalismo mais aproximado das linguagens digitais2; o público dos reality-shows
musicais selecionando ou reprovando candidatos durante a apresentação com um
simples gesto em um aplicativo móvel3; as revistas passando a exibir vídeos em uma
espécie de “página de LED”4, entre outras tendências.
Já concentrando na Publicidade, os cases em que é utilizado outdoor interativo
como mídia são ótimo exemplo de como a Publicidade pode servir com sucesso à
Cultura Participativa. O recente mais famoso é uma criação da agência London WCRS
para a anunciante Women’s Aid5, uma instituição que luta contra a violência
doméstica. Na peça, o rosto de uma mulher com sangue e hematomas, seguido das
palavras “Look at me. We can stop it”. A interação estava numa tecnologia de
reconhecimento facial que calculava quantas pessoas olhavam para o outdoor e a
partir de determinada quantidade de olhares, as manchas começavam a desaparecer.
Ou seja, é interação de plataformas diferentes ao mesmo passo que interação entre
pessoas e essas plataformas.
Outro exemplo de ação de sucesso para o fornecedor é a “Você escolhe o
sabor!”, que mostra o quão influente é o poder de escolha. A Fanta, da Coca Cola
Company, investe há alguns anos nesse tipo de ação, criando novos sabores e
incentivando o público a escolher qual produto continua no mercado de acordo com a
sua preferência. A campanha atual7 envolve inclusive a implementação de combos de
pipoca personalizados da Fanta, com pequenas latas de amostra dos dois sabores em
diversos cinemas da rede Cinemark. Outras marcas também investiram na ideia nos
últimos anos: Habib’s com a escolha do recheio dos miniquibes, Ruffles com uma ação
que permitia ao consumidor criar um novo sabor para a Batata da onda e até o leite
fermentado Chamyto entrou na febre participativa e, claro, lucrativa.
Por fim, é possível ver um último exemplo de interferência do consumidor no
campo publicitário analisando revistas de moda recentes. O ano de 2015 marca uma
nova produção cultural mudada em valores não só comerciais, mas morais. Para
exemplificar, podem se comparar as edições brasileiras do mês de abril e maio
respectivamente de duas revistas famosas: Vogue e Elle8. Na primeira, um ensaio com
atrizes influentes no Brasil. O ensaio não repercutiu tão bem quanto esperado nas
redes sociais, com críticas em destaque ao Photoshop usado na atriz Fernanda
Montenegro, com a pele praticamente lisa, e na atriz Camila Pitanga, que
naturalmente morena, aparece com a pele branca na capa9.
Entra então a comparação com a segunda, a revista Elle, que comemorou seu
aniversário com uma edição especial: a capa toda espelhada tinha a ideia de que a
consumidora se visse e fosse então a própria capa. Entre as matérias de grande
destaque estavam um ensaio fotográfico com a atriz Rebel Wilson e outro com
algumas blogueiras. Os dois ensaios, muito bonitos, chamaram a atenção por
divergirem das fotos que usualmente divulgam em revistas de moda: eram mulheres
de todos os tipos, todas as curvas, cabelos diferentes e estilos singulares. Tudo fora
do padrão esbelto e maquiado. A repercussão da matéria foi explosiva, a quantidade
de fotos divulgadas, incluindo selfies com o espelho da capa, foram enormes. Na
página do Facebook foi visível o espaço e elogios que a revista conquistou. A
mudança já vinha acontecendo: a democratização da moda já vinha ganhando
espaço, e essa edição foi o Bastilha dessa transformação.
Apesar de todo potencial bom presente nessa nova cultura de participação,
podem existir alguns problemas quando não usada de maneira equilibrada. A
propriedade intelectual pode ser afetada, graças a apropriação e alteração do
conteúdo que pode estar protegido por direitos autorais e comerciais, o que pode gerar
um enorme desconforto e várias tensões entre as partes. Hoje, as indústrias midiáticas
se dividem em duas reações: algumas proíbem completamente qualquer participação
de fora e protegem de todas as formas o seu produto intelectual; outras adotaram uma
doutrina cooperativista, enxergando em seus fãs colaboradores e participativos um
meio de enaltecer e promover seu produto.
1. Manuel Castells, 2000.
2. Ana Paula Cruz e Helena Figueiredo Pina.
3. Jornal Nacional (Rede Globo) revolucionou sua linguagem verbal, diminuindo a
distância da linguagem constante das redes, e visual, apresentando tecnologias
modernas com o conceito da aproximação. 27/04/2015.
4. Superstar (Rede Globo) estreia como o primeiro programa nacional ao vivo de TV
aberta que depende da participação online do público através de um aplicativo
para celular. 06/04/2014.
5. Enternainment Weekly é a primeira revista a apresentar propaganda em vídeo em
suas páginas para a Pepsi (17/09/2009). A tecnologia volta aprimorada na Esquire
e Popular Mechanics para a Chevrolet, pela Mccan (16/04/2015).
6. London WCRS, para a Women’s Aid – “Look at me”. 05/03/2015.
7. Campanha Fanta vs. Fanta: https://fantavsfanta.fanta.com.br/
8. Analise das redes sociais Facebook e Instagram das revistas Elle Brasil e Vogue
Brasil durante os meses de abril e maio.
9. http://f5.folha.uol.com.br/celebridades/2015/04/1610192-internautas-reclamam-de-
camila-pitanga-branca-e-globais-sem-rugas-na-vogue-veja.shtml
Bibliografia
1. OLIVEIRA, Diego. In site Meio e Mensagem: A cultura participativa e os ex
espectadores.
http://www.meioemensagem.com.br/home/midia/ponto_de_vista/2015/03/23/A-cultura-
participativa-e-os-ex-espectadores.html
2. JENKINS, Henry. (2006) Cultura de Convergência.
Fernanda Carvalho, Gabriella Carvalho e Lucas Linhares são graduandos
de Comunicação Social na Universidade Federal Fluminense. Este é um
trabalho acadêmico da disciplina “Introdução à Publicidade”, orientado pela
professora Lilian Ribeiro.