a primeira guerra mundia na tribuna religiosa

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA CURSO DE MESTRADO EM HISTÓRIA DO BRASIL A Primeira Guerra Mundial N”A Tribuna Religiosa -Formação da Neo-cristandade- (1917-1919) Severino Vicente da Silva 1985

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Page 1: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA

CURSO DE MESTRADO EM HISTÓRIA DO BRASIL

A Primeira Guerra Mundial N”A Tribuna Religiosa

-Formação da Neo-cristandade- (1917-1919)

Severino Vicente da Silva

1985

Page 2: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

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A Primeira Guerra Mundial N”A Tribuna Religiosa

-Formação da Neo-cristandade- (1917-1919)

Severino Vicente da Silva

“Nesta hora solene e grave da história do Brasil, para que Deus Nosso Senhor conceda a

nossa Pátria querida a vitória completa dos seus direitos, é necessário que nós

brasileiros, sendo patriotas como os que mais o são, fiquemos mais do que nunca unidos

a Deus e aos seus representantes na terra, a fim de que, sobrenaturalizado o nosso

patriotismo, chamemos sobre nós e a nossa causa a abundância das graças divinas”

30 de Novembro de 1917.

D. Sebastião Leme

“Muitas vezes, especialmente no período Constantino, não anunciou com suficiência

seus ideais de bondade, justiça e amor à sociedade e ao Estado injustos. Mas, proferiu

estar afirmativamente ao lado dos grandes proprietários e dos exércitos mais fortes.

Comprou com a aura de justiça eterna os senhores injustos da sociedade, dando-lhes

legitimidade e motivando a muitos a se sacrificarem de bom grado e com humildade

pela minoria no processo de produção, como também nos campos de batalha. O

catolicismo perdeu o seu sal escatológico e se tornou uma ideologia que justificava as

ordens de dominação dadas. Desta maneira, só aumentou a dicotomia entre o particular

e o universal e evitou a sua reconciliação numa sociedade mais livre. Tornou-se

reacionário”.

R. Siebert, apud Leonardo Boff

Page 3: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

4

ÍNDICE

01. APRESENTAÇÃO..........................................................................03

02. AGRADECIMENTOS.....................................................................05

03. INTRODUÇÃO – POR

QUÊ?...............................................................................................07

04. Cap. I – A IMPRENSA

CATÓLICA....................................................................................16

05. Cap. II – A TRIBUNA RELIGIOSA.............................................25

06. Cap. III – O FIM DA

NEUTRALIDADE........................................................................32

07. Cap. IV – A GUERRA EM CASA...............................................41

08. Cap. V – POSIÇÃO DA

HIERARQUIA..............................................................................48

09. Cap. VI – A DIPLOMACIA NA

TRIBUNA.....................................................................................58

Page 4: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

5

10. Cap. VII – O PAPADO E A

GUERRA......................................................................................66

11. Cap. VIII – O FIM DA

GUERRA......................................................................................75

12. Cap. IX – O MONSENHOR AFFONSO

PEQUENO: UMA PENA PELA

PAZ.....................................................................................................81

13. CONCLUSÃO..............................................................................89

14. BIBLIOGRAFIA

GERAL...............................................................................................94

APRESENTAÇÃO

Este trabalho foi feito com o objetivo de obter o grau de mestre em História do

Brasil, em defesa pública, na Universidade Federal de Pernambuco. É evidente que o

autor não pretende de forma alguma estar completando ou apresentando a forma

definitiva de um tema que, a cada dia, mais chama atenção aos estudiosos. Houve um

momento em que se julgou ser ultrapassado qualquer estudo mais sério sobre a Igreja no

Brasil e na América Latina. Nos últimos anos, contudo, a efervescência do continente

Latino Americano, numa fase em que sai dos subterrâneos da História, para tornar-se

sujeito de sua própria História, tem sido demonstrado a grande importância e o papel

catalisador e orientador que as igrejas – na maioria dos casos, a Igreja Católica – tem

desempenhado nesse processo de assumpção história das massas latino americanas. É

por isso que o interesse de estudar a Igreja tem aumentado. É necessário compreender as

diversas etapas pelas quais vem trilhando a Igreja, pois, se ela é parte do processo, e as

experiências de Nicarágua e El Salvador mostram isso, cabe-nos evitar que

simplificações sem fundamentos sejam lançadas e assumidas como fossem de verdade.

Estudamos aqui parte do processo, o nascimento de um momento que, ao longo

de cinqüenta anos, caracterizou a ação da Igreja na América Latina e no Brasil.

Buscamos esclarecer como uma Igreja local assume o seu papel dentro de um processo

que, simultaneamente, ocorre em todo continente, e por isso faz surgir até mesmo um

Page 5: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

6

quase confronto dentro da Igreja local, pois a realidade é não uniforme, como gostariam

que fosse aqueles que buscam impor modelos aos povos.

Dividimos o trabalho nas seguintes fases:

1. A Introdução e os capítulos I e II procuram justificar o trabalho e dar uma visão da

Imprensa Católica e do Jornal A TRIBUNA RELIGIOSA, procurando ressaltar,

além do simples acontecimento, a sua importância social e posição sistêmica.

Buscamos explicitar que a TRIBUNA RELIGIOSA é parte de um grande contexto e

de uma forma específica de se viver o catolicismo;

2. Os capítulos de III a VIII procuram aprofundar as questões mais ligadas à guerra em

diversos aspectos. Primeiro, como ocorria a experiência da neutralidade do país e a

chegada da guerra. Cuidamos, então, de aprofundar como o povo de Recife viu e

experimentou o gosto da guerra, o ódio ao inimigo (cap. IV). Em seguida

procuramos ver, nas páginas dA TRIBUNA RELIGIOSA, como a hierarquia

católica vê e analisa a guerra, orientando os seus fiéis (cap. V); como o jogo

diplomático entre a Sé Romana e o Governo brasileiro é apresentado ao público

leitor (cap. VI) e então procuramos a imagem que A TRIBUNA RELIGIOSA faz do

papa Bento XV para os seus leitores. Finalmente, no capítulo VIII, apresentamos

como foi, em Recife, para os católicos, o fim da guerra.

3. A parte final do trabalho é dividida em duas partes: primeiro dedicamos uma

atenção especial ao Monsenhor Pequeno, pois o julgamos como um precursor de

uma cristandade que se forma. Os estudiosos do pensamento político brasileiro

poderão encontrar uma analogia entre ele e Alberto Torres, dois teóricos a quem a

guerra matou, pois os pensamentos que esposaram não se coadunavam com a

realidade econômico-política internacional que advém com a paz de Versalhes; em

segundo lugar, apresentamos as nossas conclusões, refletindo em torno da arte

política de Dom Sebastião Leme, Bispo de Recife na época, e seu principal fiador,

pois, sendo A TRIBUNA RELIGIOSA o seu jornal oficial, nela estavam as suas

idéias.

Assim, com esse trabalho, esperamos estar contribuindo para o debate amplo e

necessário a ser feito por todos os setores da sociedade brasileira, o debate sobre

suas próprias origens e superações, o debate sobre as suas instituições e projetos, o

debate sobre si mesmo.

Page 6: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

7

AGRADECIMENTOS

Este é um trabalho de muitos, cumpridos por um. Nas páginas que se seguem há

os sonhos de tantos, que é uma pretensão assinar este trabalho. Não é uma fuga das

responsabilidades. O texto e as idéias são minhas. Mas, a realização desse trabalho é

fruto das noites e dias de trabalho de papai, João Vicente da Silva, agricultor analfabeto

que veio para o Recife com o sonho de ver os filhos formados; de Maria Ferreira da

Silva, a minha mãe, uma mulher que veio a aprender a dominar as letras muito tarde,

mas que ensinou a minha fé e, com o seu exemplo de vida simples e santa, ilumina a

minha vida; de João Batista, meu professor do curso primário, o homem que me ensinou

a dar as primeiras aulas, quando me chamou a tomar as lições dos meus colegas. Ele fez

de mim o professor que, aos dez anos, alfabetizava os adultos do bairro de Nova

Descoberta, homens que, como eu, vinham fugindo do domínio do latifúndio. Aqui se

encontram os sonhos de todos os homens e mulheres de Nova Descoberta. Eles sempre

acreditaram em mim e sempre me amaram – o seu amor mantém a minha vida, ainda

agora, que já não estou materialmente entre eles; estão os sonhos de Tereza Noronha

Ramos, que se tornou Vicente da Silva para tornar minha vida mais doce e mais amável;

estão os gestos de amizade de meu compadre e dileto amigo José Nivaldo Jr.,

companheiro dos mais altos ideais de minha vida, embora apreçamos tão distantes;

Hebert Mansfield que me ajudou a compreender e a superar as fronteiras que separam e

unem os povos; aqui se encontram os gestos de amizade – a certeza de Armando Souto

Maior (ajudou-me quando tentei desistir do curso); de Marc Jay Hoffnagel, o professor

Page 7: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

8

exigente e compreensivo com o aluno pouco metódico; de Roberto Amorim, que se

dispõe a entender as minhas discussões pela metade. Aqui se encontram os

ensinamentos de Eduardo Hoornaert, Pe. Humberto Plumem, Michael Bargman; aqui

está a atenção que me deram Dom Lamartine, Monsenhor Isnaldo Cabral e Josefa

Bezerra da Silva, conhecida como “Menininha”. Nestas páginas está o apoio do Instituto

de Teologia do Recife, apoio moral e financeiro, a minha gratidão ao padre João Ernani

Pinheiro; aqui se encontra o carinho da comunidade franciscana de Olinda, de quem fui

hóspede para poder pensar com tranqüilidade; aqui se encontra o entusiasmo de Antonio

Jorge de Siqueira, o meu orientador, que tanto me entendeu e suportou de minha

arrogância; aqui está Marly Cavalcanti, está Clécia Ramos, a direção do Colégio 2001

Absolon Pedrosa Bezerra, Eduardo José de Almeida, Cilas Cunha de Menezes e tanta

gente eu devo este trabalho. Todo esse trabalho é por causa deles e para eles. Eles

pertencem a classes sociais diferentes, são um retrato do Brasil, a quem devo tudo que

sou, ou melhor, quase tudo. Pois, esse trabalho é fruto do amor de Deus para comigo, e

a Ele, por meio de seu povo, esse trabalho é dedicado

.

Page 8: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

9

INTRODUÇÃO

POR QUÊ?

Os estudos de História do Brasil só nos últimos anos têm recebido uma maior

atenção por parte dos diversos setores da sociedade brasileira. A rigor, o brasileiro não é

um homem que parece gostar de cultivar o seu passado, ou que dele tenha orgulho. É

voz corrente que “o povo não tem memória”, e isso se deve ao fato de que ele vota,

quase sempre, naqueles que o têm explorado e dele se servido para avançar na escalada

social. É voz comum, dita por artistas, políticos, cardeais, professores, atletas e outras

aves não muito raras que o “povo não está preparado” para votar, escolher seus

dirigentes, possuir isso ou aquilo. Na verdade, no olhar da elite brasileira – às vezes se

pensa aristocrática – o povo brasileiro não está preparado para nada. Tal é o desprezo

que essa elite cultiva pelo povo do Brasil, que chega a causar surpresa que ainda

continuem a viver aqui, em contato com tal povo. Talvez fiquem por aqui por não serem

aceitos em outras regiões (exceto quando vão gastar em algumas horas o resultado de

meses de trabalho de muitos operários), ou mesmo porque sejam incapazes de conviver,

talvez por inapetência natural, com seres que já se descobriram humanos e iguais.

Também é anedota corrente que outros povos da América Latina, aos brasileiros,

chamam-nos de “los macaquitos”. É que têm as nossas elites o hábito terrível de imitar

jeitos e trejeitos europeus, pois precisam compensar o tamanho desprezo que nutrem

pelo Brasil e sua gente trabalhadora. Muitos de nós temos dedicado mais tempo em

Page 9: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

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nossas vidas ao estudo dos costumes, hábitos e história dos outros povos, de tal forma

que somos capazes de “assoletrar e dizer de cor salteado e de traz pra frente e de frente

pra traz” toda a história dos outros, mas somos profundos desconhecedores e completos

ignorantes da história do lugar de nossa origem. Não temos, ás vezes, consciência de

nós mesmos.

É muito recente o hábito de nos voltarmos para os nossos valores. A Semana de

Arte Moderna de 1922 foi o início precursor de uma atitude que só muito lentamente se

formula e mais lentamente ainda a ela nos habituamos. Felizmente, nos últimos anos

tem aumentado essa tendência. É que em época de crise econômica já não é mais tão

fácil passar as férias na Europa. Essas são feitas por aqueles a quem o deus Mercúrio ou

o Protetor de Midas, bafejaram de tal sorte as suas vidas, que o seu modo de viver está a

produzir a morte dos outros. A tudo que tocava, Midas fazia virar ouro, diz-nos o mito;

e o seu toque veio a produzir-lhe a morte. Tal qual os nossos dirigentes. Midas estava

distante de seu povo e, semelhante a Narciso, morreu por pensar basta-se. Mas, a nossa

desgraça como povo parece tão mais imensa que o toque dos nossos “midas” provoca a

morte do povo.

Sempre, e hoje mais que nunca, é grande-demasiado grande – a responsabilidade

daqueles que se pretendem historiadores. Entender o movimento do tempo e das ações

humanas, o destino dos homens, procurar entender aquilo que ele fez e faz; entender-se

e aos outros, os de ontem e os de hoje, uma dialética em que o homem é o pêndulo e o

caminho do pêndulo.

Entender o pêndulo e ver o seu caminho, sendo o pêndulo. Talvez até apresentar

pistas pra correção do curso. Embora seja quase imperceptível a participação do

indivíduo na História, ele faz parte das mudanças, das permanências, das viradas de

épocas. Passou-se o tempo em que se via o historiador apenas como um mero fotógrafo

dos acontecimentos, como se ele não estivesse a fazer julgamento, seleção de fatos, para

elaborar o seu trabalho. A busca de uma imparcialidade absoluta em muito atrasou o

pensamento histórico. Cria-se em uma quimera, não em um sonho. O sonho é dos

homens lúcidos, a quimera é o desespero, a crença no não perceberem as mudanças,

pois a elas as mudanças não interessam. Preferem a manutenção do status que só a eles

beneficia.

Ainda hoje, em nossas faculdades, formamos professores de história que outra

coisa não fazem que transmitir fatos, datas, como se isso simplesmente, algum dia,

tivesse sido ciência. Confundimos tanto almanaque com livros de história: entretanto,

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ainda no início, estamos começando a procurar o verdadeiro saber e sabor de nossa

gente, de nossa história. É urgente conhecermos melhor os passos que já demos, pois só

assim, esse povo poderá alevantar-se e tomar em suas mãos o seu presente. Sem refletir

sobre as suas realizações passadas um povo não pode criar o seu futuro. Cabe a todos os

homens de um povo a tarefa de caminhar com as suas próprias pernas, mas, em um país

como o nosso, cabe aos que, pelo seu trabalho e pelo trabalho dos outros, pela

acumulação de alguma riqueza – que foi tirada da produção da pobreza dos outros –

chegaram aos institutos universitários, auxiliar todo o resto do povo a manter-se de pé.

Não que ele não saiba, mas porque os de sempre não o deixaram e ainda não o

permitem.

O pretenso historiador que sou, faz este trabalho nessa direção. Pretende auxiliar

o seu povo a se entender, na recordação de fatos (e na sua interpretação), que ainda

estão presentes na mente de alguns e que foram deixados escritos em alguns papéis e na

sua interpretação.

Os estudos de História não podem prescindir de alguma erudição, mas, como

nos ensina Fernand Braudel, “cada forma de História, implica, de fato, uma erudição

correspondente”1 É provável que tenhamos de procurar, em textos pouco usuais nesta

escola, citações e informações para um trabalho que, embora seja sobre a realidade

brasileira, não é dos mais enfocados em nossos institutos universitários: a História da

Igreja no Brasil.

Embora a Igreja esteja presente, desde o início de nossa História, na formação do

povo brasileiro e de seu caráter, o que dela se tem estudado é a história anedótica,

episódica, ou de alguns homens que, em um determinado momento, vislumbraram o

domínio de Cena. Isto é resultante do próprio tipo de historiografia que foi realizada

durante muito tempo no Brasil, uma historiografia baseada na arte memorialística, ou na

busca de antecedentes que pudesse garantir galardões heráldicos a esta ou àquela

família. O período colonial, época das mais estudadas e, no entender de professores

como Caio Prado Jr., Celso Furtado, Jocab Gorender, Nelson Werneck Sodré,

Capistrano de Abreu, Antonio Novaes e muitos outros, de enorme importância pois é de

lá que vem toda a nossa base como Povo, Nação e Estado2

. Dessa época temos as

crônicas da Companhia de Jesus, os Sermões de Pe. Vieira, As Visitações do Santo

Ofício, o Orbe Seráfico, Monumenta Brasiliae. Porém todas carecendo de uma visão

crítica da realidade, que seus autores não possuíam na época, envolvidos que estavam

com o Pacto Colonial3 .Têm sido feitos estudos sobre as ordens religiosas, como a

Page 11: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

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dissertação de Maria do Céo sobre a ordem dos Oratorianos, mas que infelizmente não

tem sido reproduzida para o grande público, ainda que os estudantes. O período

Imperial parece sofrer mais ainda, pois a participação de setores do clero no processo de

independência tem tolhido a reflexão história sobre os personagens mais famosos

daqueles momentos, sem perceber que a Instituição a que pertenciam não tem sido

estudada com o mesmo afinco.

Nos últimos anos o estudo das instituições está-se avolumando em nossa

sociedade. Aos poucos estão sendo superados os estudos meramente biográficos –

embora haja ainda muitas biografias a serem escritas, não a dos ligados aos latifúndios

(criatórios ou agrícolas), mas de gente que, ao seu tempo, foi representante dos anseios

do povo – para melhor compreensão não do indivíduo e sua glorificação, mas para

compreensão da sociedade brasileira e do seu caminhar ao longo do tempo.

Apresentam-se os estudos sobre a imprensa, sobre a mentalidade das classes sociais,

sobre os partidos políticos, os modos de produção, os processos de destribalização,

desculturação, entre outros temas. A maior parte desses estudos tem sido feito ora por

sociólogos, ora por antropólogos, psicólogos etc. Em muito os historiadores podemos

aprender, aproveitar e contribuir nesse processo de dissecação de nossa sociedade. Não

podemos nos colocar à margem de uma tendência que está presente em todas as ciências

sociais, pois então correremos o risco de sermos virtualmente inúteis em nossa

existência. É necessário estar voltado para as realidades e “entendo por realidades

sociais, todas as formas amplas da vida coletiva: as economias, as instituições, as

arquiteturas sociais e, por último (e sobretudo) as civilizações, todas elas realidades que

os historiadores de ontem, certamente, não ignoram, mas que, salvo alguns

supreendentes precursores, consideram com excessiva freqüência pano de fundo,

estendido apenas para explicar – ou como se quisesse explicar as obras dos indivíduos

excepcionais, em volta dos quais se move complacentemente o historiador”. 4Cabe-nos,

aos que nos dedicamos ao estudo da história, contribuir para que todos entendamos –

nós e a sociedade – que, embora formada por homens, as instituições adquirem uma

vida histórica que, em dadas circunstâncias, supera o ato individual, os acontecimentos

em si. Precisamos estudar História, procurando entender a dor e a esperança que cada

acontecimento causa aos indivíduos. Mas, urge entender as causas profundas dessas

dores e dessas esperanças. E, precisamos procurar entender por que elas ultrapassam os

indivíduos e alcançam toda a sociedade.

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A História está em constantes “dores de parto” e essas dores são as esperanças

de uma mudança e a esperança da superação dessas dores. É lamentável ver que, de

tanto dissecarem a dor, esquecem que, se a vida continua, é porque o sonho continua

sendo o alimento dos homens, tanto quanto – ou mais – o pão. É, pois quem sabe,

necessário que se estude também a história da esperança humana e se descubra quais as

fontes que possuem o homem e as sociedades, para manterem-se firmes e constantes na

caminhada histórica. E, talvez, aqui, embrenhemo-nos no campo das ideologias. E,

nesse campo, encontremos as igrejas e as religiões, embora nem são elas sejam

ideologias, e nem só elas podem se prestar ao papel de “falsas representações da

realidade”. Penso necessário dizer isso, pois parece haver um preconceito especial

contra elas, pois tão pouco nos debruçamos honestamente sobre essas instituições e suas

formas específicas de manifestações sociais.

Inegável, havermos sempre de repetir, a importância que a religião católica

representou na formação de mentalidade do povo brasileiro5, embora não apenas ela.

Quase sempre há colonial. Contudo, à medida que nos aproximamos acima, sobre o

período recentes – Império e República – forma sendo deixados de lado os estudos

sobre a Igreja. Seria isso apenas conseqüência de nossas mazelas de atraso cultural, ou

não estaríamos confundindo o trabalho do historiador com o trabalho do político

partidário? Como a República definiu-se sem confissão religiosa, não será que julgamos

inexistente a religião e então nos abstivemos de estudá-la? Ou será que acreditamos

tanto na explicação de que a religião é uma falsa ideologia, e por ser falsa, por que

estudá-la? Não seria melhor, podíamos estar pensando, estudar as verdadeiras realidades

em lugar da “falsa ideologia? É tempo de desenvolvermos novas atitudes em relação à

História das Religiões no Brasil, quando, se não para evitar que as façam os que não

manejam bem os métodos da ciência.

Eis, contudo, nos últimos anos já começam a proliferar livros e trabalhos

científicos sobre o papel de Religião, das Igrejas, e especialmente da Igreja Católica no

Brasil a maioria desses trabalhos estão mais focados no interesse de entender o

comportamento da Igreja em relação ao Estado de força militar que se estabeleceu no

Brasil após o Primeiro de Abril de 1964. Surpreendente é que a grande parte dessa

produção é feita nas universidades estrangeiras, em teses 6, como é o caso do livro de

Roberto Romano, que é “uma versão da tese de doutoramento defendida em Paris, na

École de Houte Études en Sciences Sociales”; de M. Morais Alves, L‟Eglises et La

Politique au Bresil; CH. Antoine, L‟Eglises et le Pouvoir au Bresil, Naiscence du

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Militarismo; Th, Buzun, The Political Transformation of The Brasilian Catholic, em

Londres etc.; etc. Mas, na maioria das universidades brasileiras, nem uma linha dos

currículos dos programas das Faculdades de História é dedicada à reflexão dos

movimentos da Igreja (com exceção aos tradicionais movimentos de Canudos,

Contestado, Juazeiro, a “Questão Religiosa”). Acontece isso, porque “certas noções

adquiriram o estatuto de verdades inquestionáveis, como, por exemplo, a subsunção da

Igreja sob a rubrica de „aparelho ideológico‟ do Estado”? 7 Ainda que fosse assim,

precisamos estudar para provar se é verdadeiro ou não tal hipótese, ou “fé”.

Esta dissertação pretende compreender um pouco a participação da Igreja

Católica Apostólica Romana na Arquidiocese de Olinda e Recife durante os anos de

guerra de 1914-1918, lastimavelmente chamada de primeira de uma série. Buscamos

compreender qual o papel que a Imprensa Católica desempenhou naquele momento

excepcional da História do Brasil. Sendo A TRIBUNA RELIGIOSA órgão da Diocese,

coube a ela explicitar o movimento pendular da instituição diante das forças sociais que,

tendo como pano de fundo a participação do Brasil no conflito europeu, disputavam

acirradamente o controle do poder.

Para alcançar tal objetivo, fizemos a leitura do jornal A TRIBUNA

RELIGIOSA, órgão oficial da Arquidiocese, apenas nos anos da guerra, mais

detalhadamente nos anos 1917 e 1918. O jornal não foi distribuído durante o ano de

1918, e apenas os anos de 1917 e 1918 dedicam um maior espaço à guerra. Aquele por

nele ocorrer o debate sobre a neutralidade ou não, além do alinhamento do Brasil ao

lado dos “aliados”, e este pelas influências que a declaração de guerra aos Países

Centrais vieram a ter no país. Naquele período ocorreu epidêmico da Gripe Espanhola e,

em uma Quinta-feira, o jornal não saiu, porque seus tipógrafos foram acometidos de tal

mal 8. O jornal, naquela época, era publicado sempre às quintas. Como tal tema, a

guerra, não trouxesse maior controvérsia com os demais jornais de Pernambuco, não

procurei a ressonância nos outros jornais dos artigos publicados nA TRIBUNA

RELIGIOSA. Realmente era uma época de grande confrontação e debate entre a Igreja

e a sociedade civil sobre a educação religiosa, avanço do protestantismo, confronto em

torno do tema da guerra.

A TRIBUNA RELIGIOSA deixou de circular nos anos 1960. A sua vida,

iniciada em 1907, é bastante atribulada. Em várias ocasiões, questões econômicas e

financeiras afastaram o jornal das mãos dos católicos recifenses e pernambucanos. Em

substituição à TRIBUNA RELIGIOSA, o BOLETIM ARQUIDIOCESANO, desde

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1969, também semanal, tem servido de elo de ligação entre a Igreja e a sociedade, a

hierarquia e os leigos.

Tendo sido um jornal oficial da Arquidiocese, nas páginas de A TRIBUNA

RELIGIOSA aparecem, necessariamente, a orientação de cada bispo, o direcionamento

que ele imprime no trato das questões sejam de ordem interna, sejam de ordem externa.

Ler A TRIBUNA RELIGIOSA é recuperar os diversos momentos vividos pelo

catolicismo em Pernambuco, as diversas formas que, ao longo de cinqüenta anos, tomou

o catolicismo em Pernambuco. É de notar que o Bispo de Olinda, na época em que nos

detemos, é Dom Sebastião Leme, o mesmo que veio a dirigir os caminhos da Igreja no

Brasil, desde o seu cargo de cardeal-arcebispo do Rio de Janeiro, tendo sido um dos

artífices, se não o maior, da neo-cristandade, que dominou o Brasil desde 1930 até as

calendas dos anos sessenta.

Em sua monumental e importantíssima HISTÓRIA DA IMPRENSA DE

PERNAMBUCO, Luiz do Nascimento dedica oito páginas à TRIBUNA RELIGIOSA.

O tempo vivido pelo jornal, seja na sua duração, seja na sua dinamicidade, já nos dá

caminho para entendimento de sua importância. Foi testemunha de momentos cruciais

da História do Brasil e da História de Pernambuco, de modo especial. A TRIBUNA

RELIGIOSA pode ser motivo de interesse para o estudioso da arte, da gravura, pelos

anúncios de suas páginas, que em determinados momentos chegou ao número de três,

completamente tomadas pelos anúncios de casas comerciais. Abre perspectivas para um

estudo sobre as idéias agrícolas da época, pois o jornal mantinha uma secção com

matérias especialmente voltadas para o agropecuarista. Sendo um jornal vendido no

agreste e sertão, uma vez que a diocese alcançava os limites do Estado, era um material

com leitor garantido. Mas, n‟A TRIBUNA RELIGIOSA podem ser encontrados dados

para uma história demográfica, se o pesquisador se debruçar sobre os relatórios das

paróquias. A TRIBUNA RELIGIOSA é um manancial para o estudo da sociedade

pernambucana, inclusive porque mostra essa sociedade na visão de um grupo que se

percebe com especiais obrigações e direitos.

Não foi a TRIBUNA, o primeiro jornal católico em Pernambuco. O

CATHOLICO, publicado entre 1869 e 1872, durante o governo de Dom Cardos Aires

foi um período de caráter oficial. Após o seu fechamento, pode-se mencionar “A

ORDEM”; “O LIDADOR ACADÊMICO”; “O ORIENTE”, “O OITO DE

DEZEMBRO”, o que denota a grande atividade da imprensa católica em Pernambuco.

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Embora seja o jornal oficial da diocese, ele não é o único jornal católico em

Pernambuco. Várias paróquias possuem seu próprio jornal. Em Pernambuco, como em

todo Brasil, temos Boa Imprensa e há um relacionamento entre os diversos jornais,

tendo havido mesmo um esforço para a formação de uma agência católica de notícias

para fornecer notícias aos diversos jornais e gazetas. Alguns jornais fundados à época da

criação da TRIBUNA ainda subsistem hoje, sendo O SÃO PAULO, órgão da

Arquidiocese de São Paulo, o mais famoso de todos. Através de A TRIBUNA

RELIGIOSA pode-se acompanhar, em parte, o debate católico nacional, uma vez que

foram transcritos muitos artigos de periódicos de São Paulo e do Rio de Janeiro.

Encontramos artigos de Afonso Celso, Tristão de Ataíde, Gustavo Corção, ao lado de

assinaturas como as de Nilo Pereira, Luiz Delgado, Potiguar Matos, Zeferino Rocha, e

outros.

Nos seus últimos anos de vida. A TRIBUNA RELIGIOSA esteve sobre os

cuidados da Associação da Boa Imprensa, fundada por Dom Miguel Valverde, em 1923,

então bispo de Olinda e Recife. O tempo escasso do pesquisador, sem auxílio e

tranqüilidade, situação própria do pesquisador que habita o terceiro mundo, impediu-nos

de buscar os arquivos da Associação de Boa Imprensa, e daqui nos desculpamos e

lamentamos não ter podido fazê-lo. Manuseamos a coleção do jornal que pertence à

Arquidiocese de Olinda e Recife. É evidente que ficamos devendo um estudo sobre a

contabilidade e as verdadeiras razões do desaparecimento da TRIBUNA RELIGIOSA,

o que tem de passar, necessariamente, pelos arquivos da Associação da Boa Imprensa.

Apesar de termos em mãos tão vasto e tão rico material, decidimos orientar a

nossa pesquisa e reflexão em torno do período da Primeira Guerra Mundial. Duas razões

nos levaram a tal decisão: primeiro, a guerra nos oferece um momento especial para

entender o comportamento da Igreja diante do problema humano, do Estado e do Estado

em Guerra. A doutrina da Igreja sobre o comportamento do católico face ao Estado

apresenta possibilidades de confronto que, em situações normais, ou seja, de

problemática não extremada, sequer são percebidas. Em segundo lugar, o momento da

guerra de 1917-1918, a nosso ver, apresenta um momento especial nas relações entre a

Igreja e o Estado no Brasil desde a Proclamação da República que a Igreja se via

afastada do poder, do palco efetivo do poder. Raras foram as oportunidades que tivera,

até então, para mostrar a sua importância dentro da sociedade brasileira, para a

manutenção da paz social. Os casos de Canudos, a Questão do Contestado, os milagres

do juazeiro, forma fatos regionais e sem maiores repercussões nacional. A guerra,

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17

contudo, é um problema nacional e, mais que nunca, a Igreja tem a ocasião de prestar

serviços que, pela sua relevância, não poderiam ser dispensados pela sociedade civil,

política, militar e, por que não dizer, econômica. Então estaria provocada a importância

da Igreja, importância negada por outros grupos, outras filosofias, outras religiões. A

Primeira Guerra Mundial marca o início de uma nova aliança entre a Igreja e o Estado,

uma nova cristandade, um novo pacto que durará meio século. A TRIBUNA

RELIGIOSA nos mostra o seu nascimento e acompanha o desenrolar do Drama.

Estudamos o seu nascimento.

Referências Bibliográficas

1BRAUDEL, Fernand- História e Ciências Sociais. Lisboa: Editorial Presença, 1982, p.

58.

2 Cf. Os Clássicos Formação do Brasil Contemporâneo. Formação Econômica do Brasil

– Escravismo Colonial.

3 Veja a apreciação de Eduardo Hoornaert em História da Igreja no Brasil. Tomo II,

Período Colonial, Petrópoles: Ed. Vozes, 1979; também de Eduardo Hoornaert,

Formação do Catolicismo Brasileiro, Vozes, 1977.

4 Braudel, Op. Cit. p. 57.

5 HOLANDA, Sérgio Buarque de. Visão do Paraíso, Edit. Nacional, e Raízes do Brasil,

José Olímpio. Quero apenas citar esses dois, pois são Clássicos, entretanto existem

vários outros que podem ser apresentados. É uma longa lista.

6 Cf. ROMANO, Roberto. Igreja Contra Estado, São Paulo: Kairós, 1979.

7 ROMANO, Roberto. Op. Cit. p. 12.

8 Isso ocorreu no dia 17 de outubro de 1918, conforme o jornal seguinte. TR. N.º 40 –

Ano

II – 24.10.1918.

Page 17: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

18

Capítulo I

A Imprensa Católica

Características das mais fortes na sociedade que se forma desde o final da Idade

Média aos nossos dias é o uso da imprensa. A palavra escrita é tão sintomaticamente

significativa entre nós, que os historiadores dividem a história em antes e depois da

escrita, tendo sido aceito sem debates mais sérios, até pouco tempo, que os povos

ágrafos não seriam históricos. Essa é uma visão dos alfabetizados, não dos que não

possuem o domínio do mistério das letras. O homem é anterior à escrita e, portanto, a

história também o é. Entretanto, é de suma relevância a presença ou a ausência da

escrita entre os povos. Na verdade, o fato de poder armazenar as informações em

tabuinhas ou livros, ou o que quer que seja, aumentou em muito as possibilidades de

invenção e modificação dos padrões culturais humanos desde então. Mas, enquanto

eram precárias as condições de armazenamento dessas informações pergaminhos e os

trabalhos de reprodução fossem sempre únicos e solitários, os benefícios dessas

informações acumuladas só a poucos interessava ou atingia mais de perto. No início da

chamada Idade Moderna, o aperfeiçoamento dos tipos móveis e a invenção da imprensa

vieram a dar um novo ânimo à produção e guarda do material abstrato, sonhado,

intelectual, teórico, o que seja, criado pelo homem. Desde então a palavra disseminou-se

em uma permanência que jamais havia alcançado. A possibilidade de fazer várias cópias

do mesmo texto amplia o horizonte de modificações possíveis de serem provocadas por

aquele texto. Este é o milagre da imprensa, o milagre de estende o eco de seu pensar

Page 18: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

19

para além dos limites de sua voz e de um texto unitário. O mundo em que nós vivemos é

o mundo da palavra imprensa, o mundo do livro e dos jornais.

O livro parece ser o momento nobre da palavra, o quase definitivo, enquanto

puderem ser definitivas as palavras e ações humanas. O jornal é cotidiano, o incidente

rotineiro, a escrita leve, ligeira, mas que atinge com maior presteza, se bem que sempre

com maior justeza. A imprensa jornalística vai-se tornando parte essencial da vida

humana, à medida que avançam os séculos, á medida que se forja a sociedade da massa,

à medida que aumenta o número daqueles que sabem ler. A revolução industrial exige

trabalhador letrado e aquele que foi alfabetizado deseja continuar o exercício da leitura,

mesmo quando não profunda, mas precisa da leitura aquele que sabe ler, como o corpo

precisa do alimento.

É preciso ter estado acompanhando o caminhar dos homens, registrando os seus

passos, no dia-a-dia, que a imprensa é uma fonte de pesquisa inestimável e

insubstituível para o conhecimento das sociedades contemporânea. Edgar Carone,

referindo-se á consulta aos jornais para a pesquisa da vida republicana, diz que “aí então

realmente eu senti a diferença entre a pesquisa em livros propriamente dita e a pesquisa

em outras fontes como jornais”, pois, se “os livros são fundamentais, ou jornais talvez o

sejam mais”1. Continuando, Carone diz que, ao defender a sua tese, uma das críticas

recebidas foi que os jornais eram partidários. Ora, toda a publicação é partidária. Ao

escrever um livro, um artigo para jornal ou qualquer outro tipo de publicação o autor

seleciona os fatos, escolher alguns para não dizê-los, esconder certas realidades,

procurando enaltecer outras que estejam mais de acordo com a sua posição social. Toda

leitura é uma leitura, toda explicitação é uma explicitação, seja a dos livros, seja a dos

jornais. Por pertencerem por estarem ligados a algum grupo social – ou classe social –

os jornais nos retratam as forças sociais em ebulição, sem os rebusques literários

(embora haja grandes momentos de beleza literária nos escritos jornalísticos), pois esta

não é a sua função, mas a de informar e formar a opinião pública.

Ora, ainda não existe uma literatura histórica a partir da leitura e análises dos

jornais, embora algumas obras já estejam ao alcance do público, mas ainda estamos

longe de termos desvendado a nossa sociedade através dos periódicos. Foram já

apresentados estudos sobre os jornais paulistas à época da República, estudos sobre a

imprensa na Independência. As obras de Edgar Carone são amplamente documentadas a

partir dos jornais, assim como as obras de Bóris Fausto e outros que se dedicam ao

estudo do Brasil contemporâneo. Entre nós, do Nordeste, temos o pioneirismo de

Page 19: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

20

Gilberto Freyre, Amaro Quintas, Vamireh Chacon. É, pois, o estudo do jornal como

fonte de pesquisa que se impõe para um conhecimento real dos movimentos sociais

brasileiros.

A imprensa chegou ao Brasil tardiamente, decorrência do exclusivismo colonial.

Só após a presença da Família Real portuguesa foi permitido o estabelecimento de

oficinas gráficas em territórios brasileiros2. Evidentemente, foi a princípio, uma

imprensa quase folclórica e oficial, com o jornal da corte. Contudo, a imprensa, em seus

primórdios, já apresenta os ideais dos setores que pretendem a liberdade do Brasil,

como o Correio Brasiliense, de Hipólito da Costa3. Desde os anos 30 do século passado

podemos observar o avanço da imprensa em todo o território nacional, seja nos centros

urbanos, seja nas áreas rurais. Gastão Thomas de Almeida fez um estudo sobre o avanço

da imprensa no interior paulista, que, com as especificidades das diversas regiões do

Brasil, é provável que possa ser aplicado nas demais regiões4. Embora fossem pequenos

os números de leitores, pois é um país de um grande número de escravos e de

analfabetos, a imprensa mostra uma enorme vitalidade no século XIX.

Dom Duarte Silva, bispo de Goiás, em sua pastoral de 7 de março de 1902, diz

que “qualquer lugarejo para ter foros de civilização há de ter ramas, rolos, galés,

componedores, carrampões e uma velha e imprestável máquina, para publicar, nem que

seja de seis em seis meses, um jornaleco qualquer”5 e, apesar de um certo desprezo que

se apresenta em certas palavras, isso mostra como era forte a presença dos jornais ao

longo do território nacional. Em nosso trabalho interesse sobremodo a relação entre a

Igreja e a imprensa, de como ela reagiu aos jornais e como ela produziu a sua própria

imprensa.

De maneira geral a imprensa é vista como um progresso e um fator de progresso

das sociedades. assim nos diz Dom Duarte:

“efetivamente é o jornal que tem por missão manifestar os abusos dos

depositários dos destinados da nação, é o jornal que ilumina, esclarece e dirige a

opinião pública, enveredando-a para o bem e arendando-a do mal; é o jornal que

descobre a falsidade e, confundindo a mentira, apresenta ao público a verdade

em toda a sua pureza; é o jornal o oficioso dos direitos dos fracos e do oprimido,

do perseguido, da vítima, abatendo a protávia, o orgulho e a prepotência e o

despotismo do forte, do opressor, do perseguidor, do algoz; (...) é o grande fator

do desenvolvimento do pensamento urbano, maior eficácia do que o livro, porque

familiarizou-se com todas as classes de pessoas (...)”.

Page 20: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

21

Este também é o pensamento de Dom Francisco de Campos Barreto, bispo de

Pelotas, na sua carta pastoral “Sobre a Imprensa”, datada de 4 de agosto de 1913,

quando

afirma que

É,

aqui, então

encontram

os que o pensamento dos bispos é um pensar dualístico, pois, se eles afirmam a

existência de “uma verdadeira imprensa”, uma “digna imprensa”, é porque eles

entendem a existência de uma “má imprensa”, da qual devemos conhecer a sua

definição. Para Dom Francisco de Campos Barreto, a

e mais adiante diz

que a má imprensa

“receber, guardar, conservar e transmitir às gerações os conhecimentos

e a ciência dos antigos, os esforços já adquiridos e as energias já

vencidas, para um fácil e proveitoso aperfeiçoamento – eis o papel da

imprensa, da verdadeira imprensa, da digna imprensa”.

“má imprensa é o inimigo contra o qual todos os nossos esforços de

bons católicos devem se voltar, pois ela, com os recursos dos ímpios

e com o favorecimento das paixões sempre saciadas das perversas

doutrinas que prega, tem procurado avassalar tudo, deturpando aos

mais belos princípios da religião e da moral,

“é toda aquela que ataca a religião, os costumes e a sociedade. Assim, sob o

ponto de vista religioso, todo jornal, livro ou revista que atacam a Deus, a

Jesus Cristo, a Igreja, o Papa, os bispos, os padres, a verdade da fé, os

princípios da moral cristã, o culto e as cerimônias católicas. Sob o ponto de

vista dos costumes, é má toda imprensa que corrompe o coração, destilando-

lhe mortífero veneno quer falando-lhe pela voz dos romances que oferecendo-

lhes vistas ou gravuras indecorosas.”

Page 21: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

22

Poderíamos continuar extraindo das pastorais uma definição da má imprensa. É

contra essa “má imprensa” que serão fundados os jornais católicos, as revistas católicas,

as publicações católicas, que são definidas assim:

Esse pensamento de Dom Francisco de Campos Barreto corresponde ao de Dom

Duarte Silva que diz que o fim do jornal católico é “conservá-la (a fé), e assim

conservar a religião Santa Católica”. Dom José de Camargo Barros ensina que

pois,

Essas considerações e definições mostram como a história viu, sempre com grande

preocupação, a imprensa. Assim, os pronunciamentos dos papas Pio IX, Leão XIII,

além das disposições do Concílio Plenário Latino-Americano, são sempre lembrados

nessas pastorais.

O CEPHIB – Centro de Pesquisas e Estudos de História da Igreja no Brasil –

tem-se preocupado com a necessidade de estudar mais atentamente a Imprensa católica

no Brasil, pois ela é “uma espécie de termômetro da comunidade eclesial em cada uma

“o jornal católico deve especialmente defender e restabelecer os

sãos princípios da nossa fé e da nossa moral no meio do mundo,

onde, caluniosamente, todos os dias são arremessados à rua da

amargura a Igreja, os seus ministros e até católicos de ação franca

e sincera”.

“A imprensa católica é uma obra pia utilíssima, grandemente

necessária e igualmente santa e por isso constante e

energicamente recomendada pelos Sumos Pontífices e bispos do

orbe católico”

“onde o púlpito dorme e não fala, o periódico torna-se para

o povo o suplemento da homilia ou da palavra do pároco e,

para dizer todo o nosso pensamento, o seu único

catecismo”.

Page 22: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

23

das épocas históricas significativas. Através da Igreja, de suas posições e se pode contar

com dados preciosos e diversificados para uma interpretação objetiva da participação

dos católicos na vida da sociedade brasileira” 7. Ora, isso só é possível porque, ao lado

da imprensa leiga, “profana”, desenvolveu-se, em paralelo, uma imprensa confessional

e, no nosso caso estudo, uma imprensa católica. Embora tardia em relação à outra

imprensa, o primeiro jornal católico foi publicado em 1836 na Bahia e se intitulava

REVISTA CATÓLICA8. Logo depois, em todo território brasileiro, outros periódicos

surgiram como A SELETA CATÓLICA, na diocese de Marina, em Minas Gerais, e que

circulou entre 1846 e 1847, sendo em seguida substituída por ROMANUS. Em São

Luiz do Maranhão, Dom Joaquim Silveira publicou O ECLESIÁSTICO durante o ano

de 1852. Em São Paulo, no ano de 1855, circulou O AMIGO DA RELIGIÃO. Em

Pernambuco, no ano de 1847, publicou-se A ÁGUIA CATÓLICA. Nos anos após 1860

aumentou o número de jornais católicos em todo o Brasil, alguns com maior ou menor

duração, mas todos morreram na dobrada do século. Temos então O APÓSTOLO, na

corte; A BOA NOVA, em Belém do Pará; A TRIBUNA CATÓLICA, em Fortaleza,

CE; A CRÔNICA RELIGIOSA, Salvador, BA; UNIÃO, Recife, PE; O BOM

LADRÃO, Marina, MG; A ORDEM, São Paulo, SP; O TABOR, São Paulo, SP;

PÁTRIA, São Paulo, SP; CRUZ, Goiás, GO; CORREIO CATÓLICO, Uberaba, MG;

ERA NOVA, Recife, PE; VIÇOSO, Marina, MG; A ESTRELA, Curitiba, PR8. No

início do século XX continuaram a surgir novos jornais, que sempre tiveram uma vida

curta. Um ou outro ultrapassava a casa dos 30 anos. Tudo isso era devido aos problemas

financeiros, aos custeios e manutenção do jornal. Tendo de ser vendido em um país de

analfabetos, era pouco o número de leitores efetivos dos jornais. Isso não ocorria apenas

com os jornais católicos, pois, como nos afirma Gastão Thomas de Almeida,

“este abre-fecha não era exclusividade do interior paulista, mas era – e é, ainda

hoje – o normal em todo o Brasil e, possivelmente, em todo o mundo. A

longevidade nunca foi uma das características das publicações periódicas e

constituem exceção os casos daqueles que conseguiram superar os cem, duzentos

ou mais anos. Um exemplo conhecido é The Times, de Londres, fundado em 1875

(com o nome de Daily Universal Register, passando a ter o nome atual em 1888)

que parece estar em condições de superar a enorme crise por que passa nestes

últimos anos.”10

Page 23: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

24

Na verdade, poucos são os jornais brasileiros que ultrapassam a marca dos cem anos,

tendo astão Thomas feito uma relação em que se encontram: o Diário de Pernambuco

(1825); O Jornal do Comércio do Rio de Janeiro (1827); O Estado de São Paulo (antiga

Província de São Paulo (1875)); O Correio Paulista; que fechou após completar cem

anos em 1966; O Mossoroense (1873); A Tribuna do Norte; de Pindamonhangaba (1862);

Diário Popular (SP 1884); e seguem os jornais, em maior número de 90, 80, 60, 50 e

menos anos em atividade11

. Ora, pois, não há surpresa que os jornais católicos tenham

tido pouca vida, ainda porque eles são dirigidos a um público bem mais restrito que os

demais jornais. Um jornal, para ser caracterizado como católico, não significa apenas

que seja feito por católicos, mas que exerça uma “vinculação orgânica com a Igreja,

sendo parte de sua missão no mundo”12

, conforme conceituação por Frei Oscar Lustosa.

Evidentemente, os jornais católicos não apresentam a mesma linha desde o

aparecimento da imprensa católica até os dias de hoje. Assim, é necessário promover

alguma periodização para o estudo. O Frei Hugo Fragoso apresenta uma proposta que

divide a imprensa católica nos seguintes períodos:

1. do início do Império (1822) até o começo do segundo Império, em

que “os periódicos procuram defender o Catolicismo em face das

idéias liberais e do protestantismo”;

2. desde 1850 até 1870, fazendo coincidir essa fase com o movimento

de “reforma” de Igreja no Brasil, onde os bispos passaram,

ostensivamente, a “servir-se dos meios de comunicação como

instrumento Pastoral”, sendo esta fase mais preocupada com a

exposição da doutrina da Igreja, embora esteja penetrada na luta

contra o liberalismo e Protestantismo;

3. começa por volta de 1872, caracterizando-se pela Luta contra a

maçonaria, pela defesa da fé católica, da infabilidade papal e dos

demais dogmas13

.

A periodização de Frei Hugo Fragoso detém-se no período imperial, talvez

devido a que se dedica e à obra se publica. Entretanto, não fica muito clara a diferença

entre o segundo e terceiro período apresentado por ele, embora pareça tomar como

ponto base de sua divisão a famosa questão Religiosa, pois, naquele momento, muitas

Page 24: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

25

foram as folhas católicas que surgiram como uma reação de uma Igreja que se sentia

perseguida.

Outra periodização é apresentada pela CEPHIB, no livro do Frei Oscar Lustosa

que, embora diga que é apenas uma proposta, dificilmente, no momento atual de

investigação sobre a Imprensa Católica no Brasil, posa ser afastada, Frei Lustosa divide

a Imprensa nas seguintes fases:

1. fase de iniciação, compreendendo 1830 até 1870. Observa-se nessa

fase “o empirismo, o artesanato e a dispersão de iniciativas”, que é

decorrente do tipo de catolicismo praticado no Império, por uma

natural influência do sistema de Padroado que “não permitia

quaisquer iniciativa s em que transparecesse a intenção e a tendência

de articular um movimento ou um programa de Igreja;

2. fase de consolidação e articulação – de 1870 até 1900. Neste

momento, os jornais apresentam uma maior informação sobre os

assuntos da Igreja e com perspectivas polêmicas, tendo de enfrentar

as muitas mudanças que estavam ocorrendo na sociedade brasileira e

que, em grande parte eram trazidas da Europa. Havia uma

necessidade de defender-se contra os ataques sofridos pela Igreja. São

nesses ataques que fazem proliferar uma maior quantidade de jornais

católicos;

3. fase de organização e articulação – de 1900 até 1945, em que pode

ser encontrada uma preocupação com a formação de uma infra-

estrutura para o jornal e se pensa formar uma Associação de Boa

Imprensa, como se faz em várias dioceses e até mesmo um Centro da

Boa Imprensa, que serviria de base para a centralização e distribuição

de notícias para todos os jornais católicos no Brasil;

4. fase da especialização, após 1945, em decorrência dos avanços

tecnológicos e dos meios de comunicação que devem criar novas

perspectivas para a missão da imprensa católica14

.

É pouco dificultoso notar que a essa periodização do CEPHIB, apresentada por

Frei Lustosa, pouco se pode propor. Contudo, deveríamos notar que eles se refere

apenas aos jornais, não levando em consideração as revistas como VOZES,

CONCILIUM, CEAS, e outras que, surgiram após o ano de 1945, embora a Revista

VOZES circule desde 1910. Por outro lado, deve-se ainda pensar na formação das

Page 25: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

26

editoras criadas pelas ordens religiosas que chegaram ao Brasil após 1880, como os

Maristas, os Paulinos e Paulinas e outras ordens que se dedicaram à Boa Imprensa. Há,

pois, muito ainda a se estudar e se compreender na atuação da Igreja na Imprensa e, por

meio dela, na Sociedade brasileira. Há, ainda, no campo das comunicações sociais, todo

um estudo a ser feito, analisando a participação da Igreja no campo da rádio difusão e

da televisão. Contudo, esses são um outro aspecto dessa imensa realidade que é a

necessidade do estudo sobre a Igreja no Brasil.

Referências Bibliográficas

1CARONE, Edgar. Arquivo, Boletim histórico e informativo. São Paulo: Edição

Arquivo do Estado, vol.4, n.º 3, 1983, pp. 109-110.

2SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Edt.

Civilização Brasileira, 1966.

3KOSHIBA, Luiz e PEREIRA, Denise Nanci. História do Brasil. São Paulo: Editora

Atual, 1980, p. 124.

4ALMEIDA, Gastão Thomas de. Imprensa do Interior, Um Estudo do Preliminar. São

Paulo: Convênio IMESP-DAESP, 1983.

5Pastoral publicada in Lustorsa, Oscar de Figueredo. Os Bispos do Brasil e a Imprensa.

São Paulo: Edições Loyola/CEPHIB, 1983.

6Todas as citações das pastorais são retiradas da obra de Oscar Lustosa citada na nota 5,

não sendo necessário enviar o leitor às notas cada vez que citamos uma pastoral, desde

agora.

7LUSTOSA, Oscar de Figueredo. Op. Cit. p. 11.

8Idem, pp. 13.

9Idem, pp.12 e seguintes.

10ALMEIDA, Gastão Thomas de. Op. Cit., p.24.

11Idem. p. 24 e seguintes, aqui Gastão apresenta um quadro em que estão listados os

jornais paulistas mais antigos e ainda em circulação.

12LUSTOSA, Oscar de Figueredo. Op. Cit. p. 29.

13FRAGOSO, Hugo. Imprensa Católica no Império. In: História da Igreja no Brasil.

Petrópoles: Vozes. Tomo II/2, 1981, p. 214 ss.

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27

14LUSTOSA, Oscar de Figueredo. Op. Cit. p. 12 ss.

Capítulo II

A Tribuna Religiosa

Em toda a História do Brasil, Pernambuco tem sempre marcado sua presença de

uma forma criativa e, muitas vezes, de maneira pioneira. Na colonização, no

estabelecimento de uma forma própria de ocupação territorial, no aproveitamento das

terras, nas lutas pelos ideais libertários, na formação de uma ideologia nacional, nas

campanhas pela Independência, além de ter sido a última trincheira revolucionária do

século XIX, precursora dos ideais socialistas. Tudo isso faz parte da História de

Pernambuco e do Brasil. na imprensa, contudo, não foi Pernambuco um precursor.

Coube ao Rio de Janeiro tal honra, ainda porque sede do governo. E, se o Rio de Janeiro

apresenta o primeiro exemplar de jornalismo no Brasil, é na Bahia que se publicam as

primeiras folhas católicas. É lá onde nasce a imprensa católica no Brasil.

Os jornais, são, sem a menor dúvida, uma das principais fontes de pesquisas para

o conhecimento dos homens, das sociedades grafas. Neles podemos encontrar o dia-a-

dia, a preocupação singela, os acontecimentos fortuitos que tecem a vida de uma cidade,

de uma comunidade, de um bairro, ou de um grupo social mais próximo, porque

identificado com os sentimentos mais profundos e arraigados, que são os sentimentos

religiosos. Ora, Pernambuco possui em sua história uma plêiade de jornais e pasquins

Page 27: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

28

onde estão retratados, a cru, os mais diversos matizes políticos e sociais das diversas

classes, defendendo os mais díspares interesses econômicos, religiosos, políticos,

desportivos, etc., etc., etc.

Já pouco antes da Independência do Brasil. Cipriano Barata lançou o seu famoso

“Sentinela da Liberdade”, de vida tão heróica quanto conturbada. Em 1821, Rodrigo

Fonseca Magalhães dirigia o “Aurora Pernambucana” e Felipe Calado publicava o

“Cegarrega”. Mais famoso e maisconhecido foi o “Tiphys Pernambucano”, do

carmelita, Prof. Frei Joaquim do Amor Divino Caneca. Além desses, podíamos citar

tantos outros, porém apenas mencionaremos o “Diário de Pernambuco”, “O Repúblico”,

“O Tribuno”, “O Sete de Setembro”, “O Diário Novo”, “O Jornal de Recife”, e tantos

outros que fizeram e ainda fazem a história da imprensa em Pernambuco. Não é nosso

intento nem nosso objetivo nesse trabalho enveredar por uma longa pesquisa e

dissertação no campo vasto da análise dos jornais pernambucanos. Amaro Quintas,

Gilberto Freyre, Vamireh Chacon, Mario Márcio, Marc Jay Hoffnagel, José Nivaldo Jr.,

Leda Rivas, e tantos outros já o fizeram e ainda o fazem com a propriedade que não

possuímos1. A obra mais monumental é a de Luiz Nascimento, História da Imprensa de

Pernambuco, e que nos dá um retrato de riqueza qualitativa e quantitativa da imprensa

pernambucana.

Mas a vitalidade publicatória veio a alcançar, também o espaço das confissões

religiosas, especialmente a Igreja Católica em Pernambuco, que nos interessa

sobremodo. Já no século XIX floresceram aqui uma série de publicações, de vida

relativamente curta, de orientação católica. Ainda em 1848, o Diário de Pernambuco

anunciava o nascimento da folha O GUIA CATÓLICO e augurava sucesso ao novo

jornal, pois “a religião é o primeiro e mais forte elemento formador da sociedade”2. De

todos os jornais e folhas católicos publicados no século passado foi A UNIÃO o que

mais tempo viveu.

A própria TRIBUNA RELIGIOSA nos informa sobre a vida diversos jornais

católicos existentes em Pernambuco. A lista que ela apresenta é:

Page 28: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

29

Ora, não queremos fazer um levantamento de toda a imprensa católica em

Pernambuco com o que foi explicado acima. Pretendemos mostrar que o jornal A

TRIBUNA RELIGIOSA é um jornal filho de seu tempo, não sendo único nem solitário.

Apenas tem uma importância especial, pois ele é, por desejo de seus bispos, o órgão

oficial da diocese de Olinda, desde o dia primeiro de fevereiro de 1909.

A TRIBUNA RELIGIOSA tem o seu nascimento na fase que o Frei Oscar

Lustosa chamou de “Organização e Articulação” de imprensa católico no Brasil, fase

que vem desde 1900 até 1945. Contudo, a vida de A TRIBUNA RELIGIOSA segue até

o início dos anos de 1960, tendo, portanto, alcançado a fase da chamada

“especialização”.

Conforme dissemos anteriormente, nas páginas de A TRIBUNA RELIGIOSA

encontramos os mais diversos assuntos, tais como conselhos aos agricultores sobre

método de plantio; notícias sobre epidemias que nos assolam; debate político, apesar de

dizer se “apolíticos”; luta contra o protestantismo, que avança sobre Pernambuco desde

o início do século XX; análises de filmes; notícias do mundo; defesa do Papa etc.. Em

sema, todos os artigos que possam provocar interesse aos homens de leitura, ou de

escuta, pois é de se esperar que, nas noites sem televisão de antanho, tenha sido comum

a roda à boca da noite, para a leitura comum do jornal, por aqueles a quem a sorte e os

caprichos do sistema econômico-político-social tenha permitido a graça de aprender a

ler.

A Tribuna Religiosa, como tantos outros momentos de rara inspiração da Igreja

Católica em Pernambuco, nasceu no Seminário de Olinda. Os Seminaristas estudantes

de teologia formavam a Pia União de São Luiz de Gonzaga e, e reunião do dia 13 de

julho de 1906, decidiram pela formação de um jornal que receberia o nome de A

TRIBUNA. Tudo isto está contado no n.º 1 do jornal, a nossa principal fonte de

A Voz Parochial- publicado em Vitória, com tiragem mensal;

A Voz das Crianças- publicado em Recife de forma irregular;

A Pátria- mensário publicado em Recife desde 1913;

A Mocidade- publicado na cidade de Olinda sob a direção do Pe. João Uchoa;

O Lyrio- publicação da Academia São Luiz de Gonzaga;

A Folha do Sertão- semanário publicado na cidade de Triunfo;

A Gazeta- semanário da Paróquia da Boa Vista, em Recife;

Maria- revista mensal dos Filhos de Maria;

Alto Sertão- jornal publicado semanalmente em Floresta;

Mês do Clero- revista fundada em 1917 pelo Monsenhor Affonso Pequeno3.

Page 29: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

30

pesquisa. Quando ocorreu a fundação do jornal, a diretoria da Pia União de São Luiz de

Gonzaga estava assim formada:

Presidente - Clérigo Olynpio Mello

Vice-Presidente - Clérigo Balthazar Vieira

Primeiro-Secretário - Clérigo João Von Werdt

Segundo-Secretário - Sr. José Antero

Orador - Clérigo Ricardo Vilella

O primeiro número veio a ser publicado em 26 de agosto de 1906, com o

formato 27X18, com quatro páginas de duas colunas. A impressão do jornal foi feita nas

oficinas do Jornal do Recife, na Rua do Imperador, n.º 434. Os primeiros redatores do

jornal foram: Dom José Pereira Alves, Dom João Tavares de Moura, ainda estudantes

de teologia do Seminário, Dom Augusto Álvaro da Silva, então vigário de São José e o

Pe. Vicêncio Luna Sobrinho, vigário de Vicência5.

Os primeiros números de A TRIBUNA indicam que ela foi criada para ser um

órgão dos estudantes do Seminário, contudo eles esperavam que as paróquias vizinhas

ao Seminário viessem a ler beneficiar-se do jornal. De fato eles escreviam para toda a

sociedade. Desde o primeiro editorial que vem com o título “A Boa Imprensa”. Esta é

definida como

e o terceiro número, com o editorial “A Cruz e a Imprensa”, afirma que é

Está aqui presente a idéia da liberdade que a Igreja sentia ameaçada

naquele momento, seja pela Estado brasileiro seja por outros, como a França –

que é chamada de “França Ingrata”, ou o México, vizinho mais próximo, onde a

Igreja está sofrendo maus momentos com a Revolução Mexicana.

O Arquivo da Arquidiocese de Olinda e Recife, das iniciais dos dez

números, só conta com os três primeiros. Segundo Luiz Nascimento, o “n.º 10,

“A Salvaguarda da civilização e da moral por ela há

de pregar a verdade”6.

“a Imprensa a alavanca poderosa que cavou a

ruína do despotismo”7.

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31

datado de janeiro de 1907, insere portaria do Bispo de Olinda, Dom Luiz Brito,

segundo a qual ficava aumentado o corpo redacional, sob a direção do

Monsenhor Marcolinho Pacheco do Amaral, reserva-se uma secção para o

“Boletim Oficial destinado a divulgar a solução dos casos de moral, as

disposições da Santa Sé e as da administração diocesa”8. O número 11, datado

de 1º de fevereiro de 1907, torna o jornal Órgão Oficial da Diocese de Olinda e

passa a ostentar o nome de A TRIBUNA RELIGIOSA. Tal título, quem sabe,

seja uma afirmação contra outras religiões que proliferam cada vez mais em

Pernambuco. Assim, o jornal parece querer-se afirmar como a “única” tribuna

religiosa. Agora, órgão oficial, a TRIBUNA RELIGIOSA apresenta uma novo

formato 37X25, com três colunas e passa a ser tipografado na Imprensa

Industrial, situada na Rua do Apolo, n.º 49/519 e a redação do jornal passa a ser

no palácio do bispo. O jornal define-se afirmando que

Veja-se que se

entende política, aqui, no

seu sentido tacanho, não

percebendo que o “nobilitamento moral da sociedade” é uma postura política em seu

aspecto mais saudável. É desta época que se forma um sistema de assinatura que, com

várias crises e penúrias, irá manter o jornal funcionando até os anos de 1960.

Várias crises acompanharam o jornal durante esse longo tempo de vida,

variando, também as oficinas tipográficas que fazem o jornal. Desde 15 de agosto de

1907, segundo Luiz Nascimento, passou a ser tipografado na Agência Jornalística

Pernambucana, de propriedade de Júlio Agostinho, que, funcionava na Rua do

Imperador, n.º 31/33. Neste número, o jornal apresenta um novo formato, 49X35. Em

1909 passa a possuir sua própria oficina, na Rua da Aurora, n.º 197, e se torna semanal.

Uma das grandes crises foi em 1916, quando foi suspenso, reaparecendo em 15

de março de 1917 e, em editorial, o jornal desculpa-se por ter estado ausenta tanto

tempo, mas afirma estar de volta para cumprir

“somos inteiramente estranhos à política, pelo que não nos

enredos dos partidos. Desejamos concorrer para o

nobilitamento moral da sociedade”10

.

“o alto dever de expor a verdade, defender a Fé Católica e

combater o erro sob todas as formas de modalidade”11

.

Page 31: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

32

Uma outra pequena crise, em 1921, faz o jornal voltar ao nome primitivo. A

TRIBUNA12

. Pensando na manutenção do jornal, o Arcebispo Dom Miguel Valverde

cria a Associação da Boa Imprensa e, desde 18 de outubro de 1923, o jornal passa a ser

órgão dessa Associação que, a cada primeiro Domingo de cada mês, tem campanha com

objetivo de angariar fundos13

. Entre 1932 e 1934 passa a ser publicado

bissemanalmente, sob a direção do Professor Rui Belo, mas, ao final de 1934, volta a

sua edição semanal14

. Entre 1943 e 1947 o jornal fica suspenso e, ao retornar, sob a

direção de Luiz Delgado, mantém contrato com “Notícias Católicas”, agência mantida

pelo National Catholic Welfare Coucil15

.

Sem dúvida, se condições financeiras foram sempre causas da suspensão de A

TRIBUNA RELIGIOSA, como deixa a entrever a circular do Bispo Dom Sebastião

Leme, em 12 de fevereiro de 1917, ao dizer que

O remédio adotado foi aumentar o preço da assinatura que, segundo o bispo, é

mais barata que a dos demais jornais que circulam na cidade. Pede ajuda aos vigários

para conseguir novas assinaturas. É aos vigários que o bispo “entrega a sorte do nosso

pobre jornal”.

Os articulistas colaboradores do jornal era, a princípio, na sua maioria, padres.

Padres foram os seus diretores, como Pe. Alberto Pequeno, Pe. Leonardo Mascelo, Pe.

Pereira Costa. Mas, também foram leigos diretores do jornal ao longo tempo. Católicos

leigos como Lacerda de Almeida (1925), Rui Aires Belo (1932). Luiz Delgado (1947).

Os colaboradores do jornal eram os mais diversos, padres, leigos. Citamos uma lista de

alguns, mais ou menos na cronologia em que escreveram pra a TRIBUNA

RELIGIOSA: Antônio Guedes Alcoforado, Pe. José G. de Sá Leitão, Pe. José do Carmo

Barata, Prof. João Feliciano da Motta Albuquerque, Barreto Campelo, Landelino

Câmara, Correia Brito, Tributino Mondin, Epifânio Bezerra, J. Falcão Filho, Manuel

Cirilo, João Monteiro, Eustógio Vanderlei, Bejamim de Albuquerque, Pe. Dubois, Pe.

Júlio Cabral, Álvaro Negromonte, Heloísa Fonseca, Andrade Bezerra, Monsenhor

Xavier Pedrosa, Pe. Nestor de Alencar, Felisberto de Santos Pereira, Mauro Mota, Pe.

“com o encarecimento dos materiais de imprensa, essas

dificuldades cresceram tanto, que ela (A TRIBUNA) deixará

de existir, se não acudirmos com pronto remédio”16

.

Page 32: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

33

Antônio Fernandes, Mílton Cabral, Costa Rego Jr., Domingos de Albuquerque, Gomes

Maranhão, Nilo Pereira, Pe. Tenório das Canavieiras (este era o pseudônimo de D.

Cabral Beltrão), Luiz Delgado, José Vieira Coelho, Manuel Lubambo, Tristão de

Ataíde, Ségio Higino, Novais Filho, Oscar Mendes, Dom Costa, Dom Hélder Câmara,

Pe. Daniel Lima, Dom Pedro Bandeira de Melo, Pe. Bonifácio Hemelink, Judite

Listowel, Pe. Zeferino Rocha, Amadeu Cunha, Francisco Barreto Campelo, Costa Porto,

Carlos Schanal, Pe. Francisco Hansen, Frei Bonifácio Muller, Flávio Guerra, e tantos

outros. Pelos nomes de seus colaboradores, nota-se que a importância de A TRIBUNA

RELIGIOSA é grande dentro do mundo intelectual pernambucano, e este, por si só, já

seria um motivo para estudar a TRIBUNA, entender o que ela representou para uma

geração, ou melhor, várias gerações de católicos, alguns dos quais homens de brilho nas

letras e nos pensares pernambucanos. Contudo, queremos apenas entender qual o papel

que A TRIBUNA RELIGIOSA representou no grande drama da Primeira Guerra

Mundial, momento crítico para a sociedade brasileira, momento do zênito e do declínio

da aristocracia rural, momento do início da ascensão da burguesia ao poder.

Referências Bibliográficas

1Veja-se nos compêndios de História do Brasil e Luta contra os Holandeses; Carlos

Guilherme Mota. MOTA, Carlos Guilherme da. A Idéia de Revolução no Brasil,

Petrópoles: Vozes, 1980. Nordeste 1817, E. Perspectiva, 1978. QUINTAS, Amaro. O

Sentido Social da Revolução Praieira. Recife: Ed. Universitária – UFPE, 1975.

CHACON, Vamireh. História das Idéias Socialistas no Brasil. Rio de Janeiro:

Civilização Brasileira, 1966.

2LUSTOSA, Oscar. Os Bispos e a Imprensa no Brasil. São Paulo: Ed. Loyola/CEPHIB,

1983, pp. 14.

3TRIBUNA RELIGIOSA, n.º 43, Ano XII, 7.11.1918, pp. 01.

4NASCIMENTO, Luiz de. História da Imprensa de Pernambuco. Recife: Ed.

Universitária – UFPE, Vol. 05, 1975, pp. 118.

5Idem.

6TRIBUNA RELIGIOSA, n.º 2, Ano I, 09.09.1906.

7TRIBUNA RELIGIOSA, n.º 3, Ano I, 16.09.1906.

Page 33: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

34

8NASCIMENTO, Luiz do. Op. Cit., pp. 182.

9Idem.

10Idem.

11TRIBUNA RELIGIOSA, n.º 1, Ano XI, 15.09.1917, pp. 01.

12NASCIMENTO, Luiz do. Op. Cit., pp. 182.

13Idem, pp. 185.

14Idem, pp. 188.

15Idem, pp. 188.

16TRIBUNA RELIGIOSA, n.º 1, Ano XI, 15.03.1917, pp. 01.

Capítulo III

Preâmbulos de Guerra

- O Fim da Neutralidade –

Até 1917 o Brasil proclamou-se neutro diante o conflito armado que se iniciara em

1914 como conseqüência da expansão dos países capitalistas europeus. O imperialismo

economicamente provoca tais conflitos. Os diversos segmentos da sociedade brasileira

não estavam unidos quanto à posição de neutralidade adotada pelo Estado brasileiro.

Seguindo a orientação vinda do Vaticano, a Igreja Católica assumiu e defendeu a

neutralidade. Outros segmentos sociais também tomaram uma posição de neutralidade e

defendiam uma política que levasse à paz. Os setores operários assumiram tal postura,

desde a denúncia sistemática dos “sorteios militares” até à formação do exército

profissional. Os setores operários do país entenderam que a guerra era uma necessidade

capitalista, dos diversos capitalismos nacionais, uma vez que os mercados internos já

não ofereciam condições para o consumo de toda a produção nacional de sua indústria.

O operariado nacional condena a guerra por ela fazer parte de uma política de expansão

Page 34: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

35

ou de uma política colonial. Assim o conflito de interesses “surgido em virtude das

rivalidades comerciais e industriais das potências européias”1 faz com que patriotismo,

honra nacional, raças, defesa da cultura e da civilização, tornem-se balelas que

encobrem os reais interesses da burguesia. Por essas razões os operários dizem:

A burguesia, por seu turno, é guerreira. Deleite-se com a ação de Olavo Bilac,

com a sua companha pelo serviço militar obrigatório, com a organização da Liga de

Defesa Nacional, com a formação das linhas de tiro. Ora, na prática, apesar do discurso

neutro, mesmo antes da declaração de guerra, membros da hierarquia católica assumem,

regionalmente, a direção da Liga de Defesa Nacional, numa clara demonstração de

adesão aos conceitos da burguesia. Contudo, dentro da Igreja havia setores que estavam

mais próximos das razões operárias e viam com seriedade a política de neutralidade.

O Cônego Afonso Pequeno é um dos defensores da neutralidade e se contrapõe

com entusiasmo aos grupos que pressionam o governo para que o Brasil entre na guerra.

Em artigo publicado em 12 de abril de 1917, ele assim escreve:

“Nós queremos a paz. A guerra fere fundo os nossos interesses

mais vitais. Recusamos aos governos dos países em guerra o

direito de perturbar a vida internacional. A conflagração é um

crime monstruoso de lesa- humanidade. E contra os criminosos

guerreiros, nós, todos, dos povos dos países neutros, temos o

direito de protestar. Temos o direito de exigir a paz. Temos o

direito de exigir que a guerra termine”2.

“não quero levantar a mão desse papel sem protestar contra as

indignas insinuações de alguns jornalistas belicosos que cinicamente

argumentam que devemos passar o lado dos aliados. Para não

sofrermos a pressão da Inglaterra que se arvora em garantidora de

nossos empréstimos aos banqueiros da Europa”. “Protesto também

energicamente contra os que dizem que devemos seguir aos Anglo-

saxãos Americanos”. “Nunca. O Brasil não é satélite de povo algum.

Ele tem sua órbita independente gravitando unicamente em torno do

sol da justiçpa13”.

Page 35: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

36

Neste artigo do Monsenhor Afonso Pequeno uma demonstração de uma política

contra a guerra. Ele, o Monsenhor, não a deseja. Mesmo porque a postura da Igreja tem

sido de neutralidade, pois desde o início do conflito que o papa Bento XI tem-se

oferecido para servir de mediador e pôr fim à guerra. Contudo, o Monsenhor apresenta

razões que não serão as defendidas pela maioria de hierarquia católica no Brasil. o

Monsenhor denuncia que o patriotismo não é o verdadeiro motivo da guerra. Mostra que

certos setores estão ligados a potências estrangeiras e ele se recusa a aceitar tal

dependência. O seu artigo pretende que o Brasil possa evitar a dependência do capital

Estrangeiro e dá a entender que as nações vivem em um mundo em que as vontades

individuais se sobrepõem aos mecanismos de interesses. O posicionamento do

Monsenhor Pequeno torna explícito a dualidade permanente da postura da Igreja,

dividida entre a vontade de alguns e a imposição política que se direciona em busca da

formação de uma nova cristandade.

Neste mesmo número é anunciado que o navio PARANÁ foi torpedeado e

ocorre o rompimento de relações com a Alemanha4. Começa agora o momento de tensão

em que a Igreja e o clero de Recife vêm a viver, pois, indiferente aos apelos do papa, a

Guerra continua.

O editorial do número 6, do dia 10 de abril de 1917, é dedicado á questão do

navio PARANÁ e qual será o rumo que o Brasil irá tomar.

Nota-se aqui, mais uma vez, a colocação de que o Brasil irá à guerra arrastado

pelos Estados Unidos. Neste editorial os brasileiros são chamados a “confiar na ação

prudente, enérgica e inteligente do nosso patriótico governo”, embora afirme que a guerra

deva ser evitada, pois o editorial esforça-se para defender uma posição de neutralidade,

pois essa é a postura do Santo Padre,

“Seremos arrastados ao grande incêndio? Os Estados Unidos

nos levarão na sua cauda à desumana guerra em que se matam

os povos?”5

“porém Quod Averat justas razões obrigarem os brasileiros às armas,

então caminharemos para o campo da honra e da vida”.

Page 36: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

37

Postura dúbia:

quer-se a neutralidade, sabe-se que há o interesse americano, mas os valores do

patriotismo e expressões como “campo de honra” pretendem encobrir as verdadeiras

razões. Assim, o jornal caminha em uma linguagem bilacquiana para dizer que embora

seja dito que a guerra é “um grande incêndio” onde se matam os povos”. Observamos,

pois, que a neutralidade é uma política que pode mudar em função da pátria. O Jornal

mostra-se voltado para os anseios de uma parcela do povo, e virá a animar o patriotismo

ufanista, o patriotismo esperado pelo movimento que tem como líder Olavo Bilac, um

patriotismo próximo da burguesia e distante das parcelas operárias do Brasil.

Ainda nesse número 6, é mencionado que o povo carioca “tem feito manifestações

ruidosas ao Presidente da República diante da atitude que assumiu o Brasil perante o

torpedeamento do Paraná”.

Como se comportará o clero perante a guerra que se aproxima inevitável? O

Bispo Dom Sebastião Leme concedeu entrevista ao Jornal A PROVÍNCIA, de Recife,

no dia 6 de maio de 1917. Parte foi reproduzida nA TRIBUNA RELIGIOSA do dia 10

de maio, número 9 daquele ano. Assim se manifesta o prelado:

“iremos ressuscitar o heroísmo do nosso passado glorioso e

derramar pela nossa querida pátria o generoso sangue de

nossas veias6”

“Afaste Deus do Brasil, os flagelos da guerra. Mas se para cumprir

honrosamente o seu dever o nosso governo declarar guerra, nós do clero

estaremos em nosso posto de honra. Nós estamos, pois, ao lado do governo.

Por último a minha opinião pessoal: nem a guerra afoita por amor aos

aliados, nem a Paz humilhante por amor aos alemães. Nem atitudes de quem

perdeu o juízo, nem atitudes de quem tem medo de definir-se. Sejamos dignos

de nossos antepassados, calmos e ponderados em nossas relações com o

estrangeiro, mas cônscios de nossa dignidade. Ciosos da Honra de nossa

Bandeira”7.

Page 37: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

38

Notamos, nessa declaração, como é entendida a neutralidade e qual será a

política que pautará todo o comportamento da Igreja e do jornal face à guerra: ela

deverá ser evitada, mas, se vier, encontrará a Igreja, o clero e os católicos ao lado do

governo, com espírito patriótico aceso e pronto pra as armas.

No número 12, do dia 31 de maio de 1917, um artigo assinado por Zacheu, traz o

título “Cobardia...Não!” . Então é analisada a participação dos padres na guerra. Estavam

sendo assacadas acusações de que os padres não queriam a guerra. Em defesa dos

presbíteros, Zecheu afirma que

Continuando, o artigo coloca que

Então a guerra é vista

como uma questão moral, uma questão ética que não pode ser presa à interesse

“menores”. Zacheu diz que a atitude do brasileiro e do clero católico face à guerra dever

ser de cautela mas,

e continua

“o clero não deseja a guerra porque a guerra é um mal, mas

quer a paz porque a paz é um bem”8.

“não devemos proclamar a necessidade da guerra por

conveniência baixas que a dignidade repele9”...

“se o Brasil, obrigado pelas circunstâncias, apanhar um cartel de desafio

e entrar na guerra, nenhum sacerdote, estou certo, recusará seus serviços

á Pátria, porque todos amam acendradamente o Brasil; mas, enquanto o

país estiver á margem do abismo, o grito de todo brasileiro deve ser este:

Pela Paz! Paz! Enquanto não se avilte a nossa honra”

“o pensar do Clero Católico é este: se a guerra vier, o Brasil dispõe

de nossas forças, de nossa vida, porque somos a sentinela da

religião e da Pátria10

”.

Page 38: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

39

e ,então vemos a relação Religião-Pátria. A guerra oferece a oportunidade para reatar as

relações, os laços próximos que a República cortara, vemos a formação da nova

cristandade, ou seja, esse modo específico de inserção da Igreja na sociedade, em que se

utiliza o poder político e social das classes dominantes como mediação junto aos

homens.

O reatamento das relações é buscado por ambos os lados, pela Igreja e pelo

Estado. O jornal de 3 de maio de 1917, número 8, traz uma nota informado que o

Ministro do Supremo Tribunal Federal e Presidente da Liga de Defesa Nacional, Olavo

Bilac, comunica ao Bispo de Olinda que ele foi nomeado membro do Diretório Regional

de Pernambuco da Liga de Defesa Nacional11

.Vê-se que o processo de aproximação das

instituições vem sendo acelerado por conta desse momento de crise. Dom Sebastião

assumiu o cargo em sessão solene realizada no Teatro Santa Isabel12

no dia 13 de maio

de 1917. Naquela ocasião, o Bispo discursou analisando a situação em que vive o Brasil

e que ele chamou de “Letargia do Civismo13

. Então afirma:

Porém, como afirmara anteriormente, o Bispo não deseja a guerra, pensa em

evitá-la. Assim ele comenta:

Ora, como Bispo ele não pode querer a guerra, ele é o defensor da Paz, mas é, ao

mesmo tempo, membro da Liga de Defesa Nacional, por isso exclama:

“a Liga quer preparar a defesa nacional primeiramente

dos perigos externos, imediatos, diretos, atuais e

possíveis14

.

“Não quero referir-me à probabilidade de uma guerra

próxima. Longe de mim, concorrer para escaldar o

espírito público. Apóstolo da Paz não posso pregar a

guerra15

”.

“de uma momento para outro os povos fracos e desarmados

podem ser vítimas dos mais fortes. Nestas condições não

podemos descurar de armar a Nação. Pois, mais do que a

guerra porém, nós amaldiçoamos a possibilidade de uma

derrota16

”.

Page 39: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

40

seguindo o seu discurso, apela para que

e a Igreja pode ser o cimento que irá promover a unidade da Pátria. A partir desses

dados, podemos notar que há um grande esforço para demonstrar que a Igreja não é

inimiga do Estado ou do governo. Pelo contrário. É um esforço que se percebe a nível

nacional. O exemplar de número 12, de 31 de maio de 1917, reproduz trechos da

circular dos bispos do Sul sobre a Religião e o Patriotismo. Tal circular vem assinada

pelo Cardeal Arcoverde, Rio de Janeiro; Dom Silvério, Mariana; Dom Duarte , São

Paulo; Dom Carlos, Cuiabá; Dom João, Porto Alegre. Os bispos estabelecem que não há

qualquer oposição entre o fato de ser católico e o patriotismo, pois

Além disso, nada impede a adesão às demais questões sociais que dependem de uma

direção à qual se furta o pronunciamento episcopal.

O diálogo entre as instituições – Estado/Igreja – continua. No dia 14 de junho de

1917, o número 14 transcreve telegrama que o Marechal Castanho de Farias, Ministro

da Guerra, enviou ao Cardeal Arcoverde. Refere-se à circular dos bispos. Diz o

telegrama:

“desapareça, por isso, as desconfianças e morram as

dissenções e de pé juremos defender a unidade da Pátria”.

“à Igreja importa a submissão da inteligência aos seus

dogmas, da vontade às suas disciplinas, do coração à

sua direção”.

“Permita que eu facilite a V. Ema. como chefe de nossa Igreja, pelos

conceitos altamente patrióticos da circular coletiva dos Exmos. Srs.

Arcebispos. Permita, ainda, que eu apresente a V. Ema. os mais

sinceros agradecimentos pelas honrosas referências ao soldado

brasileiro, em cujo caráter repercutirão as palavras de amor e

patriotismo da Circular. A Nação, e especialmente o exército,

sentirão, ao ler tão importante documento, um justo orgulho em

possuir, em seu seio , um Clero que sabe tão nobremente aliar os seus

diversos sagrados com os sentimentos nacionais17

”.

Page 40: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

41

Em tais documentos há uma linguagem de respeito mútuo a que não estamos

mais acostumados em tempos mais recentes. Naquele momento de guerra, tudo se

encaminhava para unir as instituições maiores. E isso não ocorria apenas no Brasil.

Mesmo na França, em que o anticlericalismo no período anterior à guerra foi tão forte,

os bispos franceses, noticia a TRIBUNA RELIGIOSA

Inferimos, então, que é desejo da hierarquia o reatamento das relações. Este

desejo é prontamente respondido por um setor social que está em ascensão e que no

momento é foco das atenções, devido à iminente declaração do estado de guerra. O

Exército sente-se „orgulhoso‟ em saber que o clero “sabe aliar os seus deveres sagrados

ao patriotismo”. As duas espadas, os dois “gládios” estão próximos. As duas instituições

sentem-se irmanadas e aptas para enveredar por um longo caminho de convivência. A

confiança foi restabelecida. A manutenção da ordem e o respeito aos valores nacionais

são abençoados sobre as orações consagrações da França, da Bélgica ao Sagrado

Coração de Jesus. A cidade do Recife é consagrada à Nossa Senhora do Carmo. O

Brasil à Nossa Senhora de Aparecida. A neutralidade em face à guerra acaba. E, com o

seu fim, a hierarquia, embora continue falando de Paz, assume posição ao lado do

Estado que se prepara para a guerra. Tudo isso se torna mais claro quando o governo

declara guerra. É o que veremos a seguir.

Referências Bibliográfica

1CARONE, Edgar. A primeira República. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1973,

pp. 247.

2Idem, pp. 247-251. Manifesto assinado pela Confederação Operária Brasileira,

Federação Operária do Rio e Janeiro, Sindicado dos Operários das Pedreiras, Sindicato

“a fim de obterem vitória fácil para os seus exércitos, fizeram

voto de celebrar anualmente, com toda solenidade e em todas as

Igrejas e Capelas da França, a festa do Sagrado Coração de

Jesus18

”.

Page 41: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

42

dos Panificadores, Sindicato dos Sapateiros, Centro dos Operários Marmoristas, Liga

Federal dos Empregados de Padarias, Liga Nacional dos Pintores, União dos Alfaiates,

Sociedade União dos Estivadores, Centro Cosmopolita, Liga Anticlerical, Centro de

Estudos Sociais.

3T.R. – Dia 03.04.1917, pp. 1, n.º 5.

4T.R. – Idem, pp. 3.

5T.R. n.º 6, dia 10.04.1917, pp. 1.

6Idem.

7T.R. n.º 9 – 10.05.1917, pp. 1.

8T.R. n.º 12 – 31.05.1917, pp. 1.

9T.R. Idem.

10T.R. Idem. Ibiden.

11T.R. n.º 8 – dia 03.05.1917, pp. 1.

12T.R. n.º 11, dia 24.05.1917.

13T.R. Idem, pp. 1.

14T.R. Idem.

15T.R. Idem.

16T.R. Idem.

17-T.R. n.º 14 – dia 14.06.1917.

18T.R. n.º 22 – dia 09.08.1917.

Page 42: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

43

Capítulo IV

A Guerra em Casa

Quando candidato à Presidência da República, Wenceslau Braz disse que o bom

Presidente “governa fora e acima dos partidos”1. Tal frase fora o sonho dos imperadores

Pedro I e Pedro II, o poder moderador, Wenceslau Braz apresentou-se “paciente,

contemporizador, maleável, tolerante, por índole e cálculo, o político mineiro não tinha

prazer em forçar os acontecimentos. A sua tática seria sempre ladeá-los, contando com a

função emoliente do tempo”2. O Presidente não desejou a guerra, conforme manifesto

feito á Nação e que foi reproduzido nA TRIBUNA RELIGIOSA, como também em

todos os períodos. Os navios brasileiros foram torpedeados e a participação do Brasil na

guerra foi oficializada em 26 de outubro de 1917, através do decreto n.º 33613. Os

leitores de A TRIBUNA RELIGIOSA tomaram conhecimento do fato através do

número 34 do ano XI, datado de primeiro de novembro de 1917, com o surgimento de

uma nova secção, que será publicado durante todo o restante do ano e durante o ano de

Page 43: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

44

1918, enquanto perdurarem entusiasmos que a guerra provoca. A secção chama-se O

BRAZIL NA GUERRA e começa assim:

A nota completa, chamando atenção para a necessidade de União Nacional

diante do grave momento em que vive a Nação e chama a atenção para a inexistência de

desordens públicas, “neste momento histórico cessarão os ódios políticos, calar-se-ão as

simpatias individuais, e unidos todos ao governo farão do amado Brasil uma Nação forte,

porque um país unido é um país vitorioso. O nosso Brasil mostrou sua alta educação na atual

emergência. Apesar do grande patriotismo dos seus filhos, não houve uma desordem, não

houve uma dessas manifestações hostis que depôem contra a educação de um povo”5.

Essas últimas palavras são expressivas, o articulista deve estar pensando em

manifestações como as que foram anunciadas terem ocorrido na Argentina. No número

31, datado de 11 de outubro de 1917, entre os Registros da Semana, na página 5, pode-

se ler: “Na Argentina tem havido desordens por ocasião de manifestações em favor da

neutralidade”6.

Provavelmente estaria pensando em um bom número de frades de origem alemã

que dirigiam paróquias na cidade. Mas, para o articulista, o Brasil é uma Nação ordeira

e de um povo educado. Qualquer movimento contrário à ordem pública será sempre

mostrado como obra de meus elementos. É claro que o jornal percebe inquietação em

alguns seguimentos da sociedade quanto ao clero, conforme vimos anteriormente.

“A 25 do corrente, chegou ao Brasil a notícia do torpedeamento do

vapor nacional Macau, por um submarino alemão nas costas da

Espanha, sendo aprisionado o seu comandante. Em vista deste novo

ataque à soberania da Nação, o Sr. Presidente da República enviou

ao Congresso a seguinte mensagem, e que foi aprovada na Câmara

por 114 votos contra 1 e no Senado por unanimidade, no dia 26 de

outubro último. Fica reconhecido o estado de guerra iniciado pelo

Império Alemão contra o Brasil. O Presidente da República é

autorizado a adotar as providências constantes na mensagem do dia

25 do corrente mês de outubro e a tomar todas medidas para a defesa

Nacional e a segurança pública que julgar necessária; abrindo

créditos e revogando as disposições em cotrário. A notícia da

declaração de guerra foi recebida com patriotismo por todos os

brasileiros que saberão cumprir o seu dever”4.

Page 44: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

45

Logo após a tomada de conhecimento da declaração do estado de guerra, o

“Comitê Pró-Pátria” realizou uma concentração na Praça da Independência, com falação

de vários oradores7. Após o “meeting” foi realizada um “prestito” que após percorrer

diversas ruas da cidade, dirige-se ao Largo da Soledade, então residência dos Bispos8.

Na ocasião Dom Sebastião conclama “a multidão a manter-se unida aos poderes da Nação,

pronta sempre para todos os sacrifícios que a Pátria exigir, mas sem se afastarem em suas

manifestações das normas da ordem, calma e civilização, respeitando assim as pessoas e os

bens dos estrangeiros residentes no Brasil”9.

Esses fatos ocorreram no dia 4 de novembro de 1917. Era um Domingo. Nos

dias seguintes, outros “meetings” ocorreram na cidade e em outros estados brasileiros.

Tudo ocorrendo dentro da ordem, segundo A TRIBUNA RELIGIOSA.

No dia 7 de novembro, após um desses “meetings” na Praça da Independência,

ocorreram “desordens”, infelizmente só muito tarde dominadas pela política10

. A turba

incendiou a Casa Alemã da Sra. Júlia ª Dorderlein e ameaçou invadir o convento dos

Franciscanos localizado na Rua do Imperador. Acompanhemos, pela TRIBUNA, a

repercursão da tentativa de invasão do Convento, pois ao outro fato não há qualquer

menção.

O número 36, datado de 15 de novembro de 1917, coloca em destaque os

acontecimentos do dia 7. Na primeira página está estampada a Proclamação do

Arcebispo ao Povo e ao Clero. Esta proclamação está dividido em três etapas: na

primeira conclama pra que os “cristãos, oremos pelo Brasil”, sendo esse o seu dever.

Enquanto brasileiro chama o povo a dar “todo o apoio e estímulo às linhas de tiro” para

evitar “para o nosso Pernambuco a inglória de uma abstenção gelada nos preparativos de

defesa da Pátria”. Ainda nessa primeira parte lembra que “ao clero e aos fiéis católicos,

cabe o dever de um patriotismo sem jaça. Oração fervorosa e instante, apoio incondicional às

autoridades do país, confiança absoluta em nossas forças alarmar o povo, ocasionando

desordens ou perturbando a vida Nacional da população, muito menos, comentar notícias

tendenciosas que possam deprimir as nossas capacidades de defesa”.

A segunda parte da Proclamação é para aconselhar que se evite tocar na pessoa e

nas propriedades dos estrangeiros que vivem no Brasil. Clama que é “contra a Alemanha

armada e não contra a Alemanha armada e não contra eles, inermes, a nossa guerra”.

A terceira parte da Proclamação é dedicada ao comportamento que deve ter para

com os religiosos de origem alemã sitos em Pernambuco. Deixemos Dom Sebastião

falar:

Page 45: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

46

Esta Proclamação estabelece uma nova postura de colaboração com o Estado,

uma nova atitude que demonstra a capacidade de a Igreja, em sua hierarquia, variar o

seu comportamento perante o Estado e os seus segmentos mais afirmativos e

dominantes da sociedade. Com esta Proclamação, a Igreja põe-se totalmente nas mãos

de uma sociedade para quem “a liberdade do Estado estava acima das liberdades dos

particulares, entre eles a Igreja12

”.

Ainda no número 36, página dois, há um informe de que o Arcebispo pediu um

inspetor para vigiar os religiosos do Convento e que foi escolhido para tal missão o

capitão Dr. A. Marques, oficial do Exército.

Na secção Brasil na Guerra, o comentário sobre essas iniciativas continua dessa

forma:

“quanto aos religiosos nascidos no país em guerra conosco, nada

absolutamente eu temo que possa fazer de menos leal para com a nossa

Pátria. Respeite-se neles o caráter sacerdotal. Somos um povo cristão. Apesar

de serem homens pacatos, sacerdotes respeitáveis e inofensivos, já em nome

deles me entendi com as autoridades competentes para que a qualquer hora e

do modo que for julgado melhor sejam fiscalizados os seus conventos. Bom é

que se saiba que tais conventos não são alemães; são conventos brasileiros,

presentemente administrados por alemães, como podiam ser administrados

por brasileiros, franceses ou outras nacionalidades. Em todo caso,

respeitando desconfianças possíveis, já os religiosos alemães deixaram as

paróquias que estavam a seu cargo”11

.

“no mesmo dia em que todas essas providências formam

ultimadas, um boato falso do torpedeamento do Bejamim

Constant fez desencadear a tempestade, no meio das justas

expansões do patriotismo popular, alguns maus elementos

cometeram as mais reprováveis cenas, apedrejando e

incendiando casas. Um ou dois metigueiros anticlericais

tentaram danificar o Convento de São Francisco aos gritos

ensurdecedores de “morram os frades alemães”. Felizmente

que o vetusto Convento foi a tempo defendido pela política,

poupando-nos assim a negra fama de destruidores de

igrejas13”.

Page 46: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

47

Notamos que o articulista isenta o povo de qualquer responsabilidade. Toda a

ação foi colocada sob a responsabilidade de “maus elementos” e de “anticlericais”.

Quanto ao povo, a sua ação é considerada como um “justo patriotismo”. Assim continua

a matéria:

Veja-se, portanto, neste texto, a eterna preocupação existente nas camadas

dirigentes do Brasil em jamais admitir que o “povo” possa fazer algo de violento. Esses

atos são sempre colocados sob a responsabilidade de alguns criminosos, “subversivos”,

“agitadores” etc.. Para as Elites, o povo é sempre inocente e usado por alguns para

atingir as autoridades constituídas, ou àqueles que, em alguma situação venha a ser com

eles confundidos.

A tentativa de invasão ao Convento de São Francisco, mereceu, ainda, um artigo

assinado por “um ilustre e digno pernambucano”. A assinatura é simplesmente: “Dr. X

de X”15

. Nesse artigo se afirma claramente que não é o momento para discutir “se o

Brasil errou ou não ao entrar na guerra”, agora é aceitar, “com confiança, a linha traçada

pelo Chefe da Nação”16

. Adianta o seu pensamento dizendo que, se antes da declaração

do estado de guerra com a Alemanha, fosse admissível que brasileiros se dividissem em

germanófilos e aliadófilos, após o dia 26 de agosto, “seria criminoso o brasileiro que ainda

fosse germanófilo”17

. Acusa alguns “desclassificados” de tentarem pular o muro do

Convento, e lembra que “Pernambuco inteiro estigmatizou essa fúria destruidora”18

.

O Dr. X de X afirma que o ataque ao Convento de São Francisco “foi uma

injustiça e uma ingratidão”19

contra os frades. Analisa que os frades alemães chegaram

há vinte anos e “se dedicam ao serviço da salvação das almas no Brasil” Sacerdotes

abnegados, na Europa deixaram pai, mãe, irmãos e para aqui vieram trabalhar por nós e

“Para a honra do povo pernambucano, devemos notar que a sociedade e o

povo da cidade e do Estado não pactuaram e o povo da cidade e do Estado

não pactuaram com os desordeiros triviais que, procuramos desvirtuar os

calores do Patriotismo popular pensaram em cometer imprudentemente os

mais baixos crimes. Nem o povo, nem o povo, nem a política lhes serviu de

capa. A verdade nua e crua foi esta: a multidão popular tremia de

Patriotismo mas os excessos criminosos não partiram do povo, e sim de um

punhado de desclassificados14

”.

Page 47: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

48

pelo Brasil”20

. Em seguida, o articulista narra das dificuldades enfrentadas pelos frades

franciscanos, desde o sol, as chuvas e até a morte, vitimados que foram pela febre

amarela. Lembra, ainda, os serviços que foram prestados pelos frades “na Campanha de

Canudos”, na “Questão do Contestado” e até quando a “peste bubônica assolou

Pernambuco, quem recolheu-se aos hospitais para dar aos pestilentos o consolo da Religião?

Quem? O frade alemão. Qual o crime deles? Ter nascido na Alemanha. Mas, esse crime

infando não terá sido resgatado por vinte anos de serviços desinteressados aos brasileiros?”,

pergunta o articulista.

Os argumentos, pois, pretendem ressaltar que os frades alemães não são

inimigos. São brasileiros. Mas o Dr. X de X levanta uma questão séria e a responde de

pronto. Se por acaso, eles, em algum momento, traírem o Brasil, qual deve ser a atitude

adotada? O Dr. X de X não tergiversa e responde:

“então nós mesmos seremos os primeiros a entregá-los á autoridade militar”21

.

Este artigo foi feito sob encomenda pela redação dA TRIBUNA RELIGIOSA e

revela e que a guerra foi assumida e por isso até a delação, se necessária, passa a ser

cogitada. O bispo mostra-se disposto à colaboração, os padres estrangeiros são

afastados, o católico declara guerra, o jornal assume o clero, Católico e Nação passam a

confundir-se. A guerra, indesejada a princípio, é assumida em toda a sua crueza e

extensão. Acima da tolerância e da compreensão a defesa da Pátria coloca-se acima de

tudo e domina as relações sociais.

Referências Bibliográfica

1FELIZARDO, Joaquim Jr.. História Nova da República Velha. Petrópoles: Vozes,

1980, pp. 80.

2esta é a observação de José Maria Belo IN: História da República. São Paulo: Cia.

Editora Nacional, 1972,citado por Felizardo, Joaquim, Op. Cit. pp. 81.

3FELIZARDO, Joaquim. Op. Cit. pp. 81.

4T. R. n.º 31, Ano XI, dia 01.11.1917, pp. 2.

5T. R. Idem.

6T. R. n.º 31, Ano XI, dia 11.10.1917, pp. 5.

7T. R. n.º 35, Ano XI, dia, 08.11.1917, pp. 2.

Page 48: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

49

8desde fevereiro de 1917 que o Arcebispo se havia mudado pra o largo da Soledade,

pois havia sido vendido aos padres jesuítas o Palácio da Soledade pela quantia de 200

contos de réis, sendo 150 contos a crédito. O Arcebispo então estava no largo da

Soledade, em prédio hoje demolido, e onde funcionou, mais tarde, a fábrica dos Irmãos

Vita. Já em 1919 o Arcebispo iria para o Palácio dos Manguinhos. Ver T.R. n.º 1, do

Ano XI, datado de 15.03.1917.

9T.R. n.º 35, Ano XI, dia 08.11.1917, pp. 2.

10T.R. 36. Ano XI, dia 15.11.1917, pp. 2.

11T. R. 36. Idem.

12ROMANO, Roberto. Brasil: Igreja contra Estado. São Paulo: kairós Livraria e

Editora, 1979, pp. 109.

13T.R. n.º 36, Ano XI, dia 15.11.1917, pp. 2.

14T.R. Idem.

15T.R. Idem.

16 T.R. Idem.

17 T. R. Idem.

18 T.R. Idem.

19. T.R. Idem.

20 T.R. Idem.

21 a política imperial, ao criar dificuldades para a formação de novos noviços, pôs em

perigo de extinção as ordens religiosas. No final do século XIX, ocorreu um grande

processo de restauração dessas ordens. Os franciscanos da Província de Santo Antônio

(BA) e São Francisco (Recife) foram restauradas por frades da Saxônia que chegaram

ao Brasil por volta de 1893. Inicialmente, porém, eles pensaram em dedicar-se aos seus

contemporâneos do sul, mas terminaram por assumir as Províncias do Nordeste.

22 T. R. Idem.

Page 49: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

50

Capítulo V

Posição da Hierarquia

Todos sabemos que a Proclamação da República veio a separar o Estado e a

Igreja1. Pondo fim ao sistema de Padroado que dava à Igreja uma proteção que a

abafava2. Quando, porém, foi promulgada a Constituição de 1891, a separação do

Estado-Igreja tomou outro diapasão que não o esperado pela Igreja. “Um ato de tirania

na bandeira um lema de uma escola filosófica”3. O Pe. Júlio Maria via que os

legisladores republicanos secularizaram o novo regime político, confundindo as idéias

de “Estado Laico” com “Estado Ateu”4. O que teria ocorrido no final do século XIX e

que “no momento em que se instaurou a República, o político liberal utilizou em sua

luta para reduzir a Igreja à particularidade, “argumentos” clássicos do tipo “écrassez

I‟infâme”: Ressurgem na sua fala as figuras do clero enganador, do maquiavelismo

jesuítico e romano, da astúcia e da superstição, cujo fim inconfessado seria manter a

consciência da massa no atraso e na ignorância”5. Parece que se esperava que a Igreja

Page 50: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

51

aceitasse desaparecer nas sombras, para entregar “aos sábios competentes o monopólio

do poder espiritual, e isto sem nenhuma dissimulação já agora por parte dos positivistas,

nos parâmetros de uma ditadura que, segundo seu mestre, seria o preâmbulo” de toda

verdadeira regeneração”6. Contudo, a Igreja “pouco a pouco foi desfazendo a cortina

ideológica que a separava das política dos “homens do progresso” na América Latina e

no Brasil”7.

A guerra, palco de tantas dores e sofrimentos, apresentou à Igreja meios para se

recompor socialmente. A TRIBUNA RELIGIOSA ocupa espaços para, dentro de uma

situação de crise, afirmar, através de artigo de um colaborador que assina L. de B, que

e, refletindo sobre os atuais momentos em que vive a humanidade, proclama que

e

Continua exaltando a necessidade de um retorno do Estado à Igreja, dizendo que

.

“é preciso combater e abandonar as doutrinas perniciosas

que antes da guerra foram semeadas a mãos cheias,

produzindo a decadência moral, a corrupção dos

costumes, o horror ao trabalho honesto, a avidez do

dinheiro, a ânsia de enriquecimento sem esforço e sem

trabalho”, 8

“a guerra à religião, a educação sem Deus e sem moral não

podiam dar outros frutos”9.

“o resultado tem sido a decadência do ensino, a decadência

da moral que se manifesta no aumento da criminalidade, no

abandono de todos os escrúpulos de honestidade e horadez,

nos freqüentes assaltos aos cofres públicos, na cínica

ostentação das rápidas fortunas desonestamente

adquiridas”,10

“sem Deus a pátria é uma palavra vá e o patriotismo

deixa de ser um sentimento elevado para se transformar

em banal retórica”11

.

Page 51: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

52

É esta toda uma interpretação teológica da história, uma visão que tem por

centro a Igreja e do seu papel insubstituível na sociedade. Mais tarde, Alceu de

Amoroso Lima, analisando “a luta civil e a falta de Conselho Nacional vigentes (1936)”

dizia quase as

mesmas palavras:

A guerra ofereceu uma senda por onde os homens podiam trilhar para o encontro

de Deus e da Igreja, pois

Mas não só no

campo da

assistência

religiosa, pura e simples. O Senador Henry Chéron, relator Comission De la Armé, diz a

TRIBUNA RELIGIOSA, na sessão de 15 de fevereiro de 1917, teria dito:

“a Revolução que aí temos desencadeada não é obra de governos

nefastos nem das oposições extremadas. Ela é obra da Constituição

sem Deus, da Escola sem Deus, da família sem Deus, das

consciências sem Deus. Restituir a Lei de Deus, de Cristo e da

Igreja, à Constituição, à escola, à família e às consciências, eis aí o

caminho único da paz”12

.

“os Capitães Militares tiveram um fecundo campo de ação entre os que

partiram, nos campos de batalha ou nos hospitais”13.

“desde os princípios desta guerra, os membros do clero... Têm

mantido uma atitude digna dos maiores elogios. Muitos padres foram

gloriosamente mortos pelo inimigo. Eles têm cumprido o seu dever,

quer como ganscardiers, quer nas ambulâncias, quer nos hospitais”.

O Sr. Ministro da Guerra, General Lyautay, tomando parte na

discussão parlamentar disse: „permitir que com a mais firme

convicção eu em associe a referência que o honrado relator fez aos

eclesiásticos que tão largamente têm pago tributo à pátria‟”14

Page 52: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

53

Ou ainda, com o título “Patriotismo do Clero na guerra, vindo ainda da França, A

TRIBUNA RELIGIOSA publica

.

Procurando esclarecer, ainda mais os brasileiros de como a religião e a Igreja

exercem um papel fundamental na vida social, a TRIBUNA RELIGIOSA publicou sob

o título “O que a guerra fez” o seguinte:

Para A TRIBUNA RELIGIOSA, o momento serve para mostrar que da guerra

podem ser tiradas lições de convivência política e de aprendizado mútuo e benéfico,

tanto para a Igreja quanto para o Estado. A França dá o exemplo. A Igreja francesa

muito sofreu no início do século. Os fundadores da República foram buscar entre os

franceses o seu evangelho de Ordem e Progresso. A TRIBUNA RELIGIOSA aponta

que o Estado brasileiro poderia aprender as lições de Clemenceau.

Mas, se a declaração de ministros do governo francês devem ensinar o

comportamento a ser tomado pelo Estado brasileiro, o clero esforça-se por encontrar na

guerra as razões divinas. Assim, A TRIBUNA RELIGIOSA apresenta declarações do

Monsenhor Ginisty, Bispo de Verdun, concedidas a um jornal das trincheiras. Teoriza o

Monsenhor:

“nesta guerra os padres têm cumprido o seu dever com simplicidade,

sempre com dedicação (...) perto de 200 sacerdotes já morreram no

campo de honra (...) mirem-se neste espelho. Os brasileiros,

felizmente contra os padres e principalmente os jesuítas. Heróis de

Christo, sabem ser heróis da Pátria”15

.

“Seria cousa monstruosa expulsar novamente da França, quando

terminar a guerra, pessoas (das ordens religiosas) a que confiamos,

com tanto acerto, os nossos numerosos feridos. A separação da

Igreja do Estado, a lei sobre as associações, na forma atual,

constituem enorme falta. A guerra pode ministrar ocasião de

reparár-las seria mlavadez e impolítico deixá-la escapar”16

.

“Esta guerra espantosa é a bancarrota de todos os cálculos

humanos, tanto do lado dos aliados, como nos Impérios Centrais:

ela revela com evidência o papel e os desígnios da Providência na

trama dos acontecimentos; esses desígnios são manifestações a

salvação da cristandade e a vitória da Igreja”17

.

Page 53: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

54

Claro está que a guerra, apesar de não ser a vontade de Deus, pode trazer de

volta o mundo ao seu rebalho, pois não há contradição entre ser cidadão e ser cristão e a

guerra apresenta uma oportunidade ímpar de se compreender o verdadeiro papel da

religião e a sua real importância. Também uma linguagem conciliatória foi usada pelo

Observatore Romano, fonte oficial de informações do Vaticano, quando ocorreu a

invasão alemã sobre a Itália. Apesar de posição neutral do Vaticano, a nota diz assim:

Para A TRIBUNA RELIGIOSA este é o desejo da Igreja no Brasil, quando luta

para o retorno do ensino religioso nas escolas. Então, as virtudes religiosas poderão

complementar a educação laica e fortalecer os ideais patrióticos. Por isso tudo existe um

grande júbilo quando a TRIBUNA RELIGIOSA publica carta do Almirante Alexandre

D‟Alencar, Ministro da Marinha ao Cardeal Arcoverde, pedindo para que as Irmãs de

Caridade possam trabalhar nos hospitais da Marinha19

, ou quando publica essa notícia

com o título “Christo no Júri”:

“se em todo tempo a circunstância se impõe aos cidadãos e

obrigação de cumprirem os seus deveres e principalmente os

que professam as nossas crenças e princípios, esta obrigação

surge de modo especial agora que a Pátria está em perigo.

Temos o dever de escrupulosa obediência às leis do Estado,

de firme disciplina, de dignidade calma, de redobrado zelo

para inculcar a todos, mediante a palavra e exemplos. A

prática daquelas virtudes cívicas, que, unidas nobremente às

religiosas, formam o patrimônio sagrado e guia seguro de

todas as consciências retas”18

.

“O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo pegou o pedido de

Habeas Corpus solicitado por um jurado de Botucatu, alegando o

constrangimento pela colocação de Imagem de Cristo no Salão do

Júri. Alguns ministros observaram que , em tal caso, poderia

impetar a ordem era o Cristo, que muita vez deve sentir-se

constrangido com as injustiças praticadas pelo Júri popular”20

.

Page 54: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

55

Ora, tudo o que um jornal selecione a publica é a sua ou a defesa de seus

argumentos e suas razões. Os argumentos e as razões de um jornal católico não são

outros senão os desejos dos senhores bispos.

A guerra ofereceu aos bispos a oportunidade de falar sobre temas políticos, sobre

a guerra e o comportamento dos católicos face a tais problemas. Circulares foram

produzidos pelos bispos e reproduzidos pelos periódicos católicos. A TRIBUNA

RELIGIOSA publicou várias dessas circulares ou pastorais, algumas na íntegra, outras

apenas partes. O número 39 do Ano XI, datado de 6 de dezembro de 1917, publica

trechos da circular dos bispos de Minas Gerais, o número 40 do Ano XI, datado de 13

de dezembro de 1917, publica “trechos de circular dos Bispos de São Paulo”. O número

37, datado de 22 de novembro de 1917, publica a “circular do Sr. Cardeal Arcoverde”.

O número 41, datado de 20 de dezembro de 1917, publica “Circular do Arcebispo de

Diamantina”. Essas pastorais causaram tal simpatia e acolhida por parte do governo que

informa que vai publicar um volume com todas as Cartas Pastorais sobre o Estado de

Guerra21

.

Essas Pastorais estão carregadas de um sentimento de Patriotismo agregado às

virtudes cristãs. Assim, o Cardeal Arcoverde escreve que

Mais adiante, informando que foi recebido pelo Presidente da República, afirma:

“todos (párocos, eclesiásticos, sacerdotes) que nos honramos com o

título de cidadãos brasileiros e que pela grandeza da Pátria, na defesa

dos seus direitos, para a glória do seu nome e pela integridade de seu

território, não hesitamos um instante em afrontar os maiores perigos, e

suportar e abraçar os sacrifícios mais penesos; não somos nós que,

neste momento de tamanha gravidade, tenhamos de mentir ao nosso

mumus, calando ou sopitando sentimento que muito nos honram e

plenamente justificam as expansões generosas de Santo Amor e de

verdadeira fidelidade que todos nós devemos à Pátria querida”22

.

Page 55: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

56

Os Bispos de São Paulo afirmam que

Os bispos esperam que no “nosso fervor patriótico, não nos esqueçamos de

nossas responsabilidades tradicionais” e pedem, como o Presidente, respeito aos nossos

irmãos alemães, suas propriedades, suas convicções nacionais”26. Os bispos tocam um

ponto nevrálgico, ao mencionar o binômio indivíduo-sociedade com outro, Católico-

Patriota.

Os bispos afirmam com bastante forças que

“Temos o prazer de vos comunicar que fomos recebidos pelo Exmº Sr.

Presidente da República em audiência por nós solicitada, e mais uma

vez sentimos e dizemo-lo mais gostosamente que em boa hora foram

confiados os destinos dessa grande Pátria a esse Varão Conspícios,

Presidente, criterioso, bem intecionado e enérgico que é o Exmº Sr. Dr.

Wenceslau Braz”23

.

“depois do amor materno, não conhecemos na terra um sentimento

mais vivo, mais generoso que o amor da Pátria (...) „Sentimo-nos

tão inteiramente ligados aos nossos destinos, que compreendemos

perfeitamente aquela passagem do livro dos macabeus, “Mellius

este Nobis Morri in Bello, Quanvidera mal Gentis Notras”24

.

“Entre o coração do Pastor que ama sinceramente as suas ovelhas, sem

distinção de nacionalidade e a alma do patriota que prefere a morte a

assistir a desgraça de seu povo, desenha-se o campo acidentado e

ingrato de nossa ação pastoral. O que certamente se faz mister e

sinceramente esperamos obter é que todos os católicos desta Província,

sacerdotes e leigos, sem distinção de nacionalidades e simpatias,

auxiliem a nossa ação Pastoral, como homenagem a atual situação do

Brasil, que os abrigou ou os viu nascer, e uma prova de afeto filial aos

prelados que tanto os estimam e veneram27

”.

Page 56: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

57

Como se nota, este último texto refere-se aos padres de origem alemã. É uma

ameaça para que não duvide, a sociedade, das reais intenções de cooperação para com o

Estado. São provas insofirmáveis da cooperação para com o Estado e dos benefícios que

o Estado pode receber e também oferecer à Igreja. A linguagem é dura para os padrões

eclesiásticos. É uma opção política clara. Principalmente nas regiões meridionais onde

era maior o número de religiosos e leigos chegados recentemente da Europa.

A exortação dos bispos de Minas Gerais apresenta o mesmo tom. Afirma que

e mais adiante pergunta- se:

Podemos notar que os bispos não fazem qualquer restrição. Afirmam que

“faremos tudo quanto ela nos pedir”. É um compromisso tão forte com o Estado que

quase se perde o senso crítico.

“não se pretende, todavia, a sombra de respeitáveis imunidades religiosas e

eclesiásticas, favorecer aspirações do inimigo declarado da Pátria, não se

profane o púlpito com pregações imprudentes e (que seria pior) insultuosas

ao país, ao governo ou ao povo; não se expandam em comentários que os

comprometem ou nos ausceptibilizem. Em casos tais seríamos forçados a

“dar a César o que é de César” e, certamente saberíamos, ainda que com

pesar, restringir como fosse necessário, a âmbito de nossa vontade e

auxílio28

”.

“não haveremos de apadrinhar imprudentes ou ingratos desleais à

hospitalidade que lhes dispensamos. (...) Um crime de lesa-

patriotismo é certamente uma injustiça, um pecado contra Deus e

contra o próximo29”

“Que faremos pela Pátria? Tudo. tudo quanto ela nos

pedir e estiver em nossas forças. Não sabemos se o nosso

sacrifício irá até o tributo de sangue, mas é mister que

para ele nos preparemos, além de tudo mais que

possamos fazer para a defesa do abençoado solo

brasileiro30”.

Page 57: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

58

Mas, os bispos têm esperanças para com o Estado, tanto oferta e prova de

amizade espera uma contrapartida. Deixe-mos os bispos falar:

O diálogo, como se vê, é de Instituição pra Instituição. Não parece que existam

outros setores na vida nacional. Governo e Igreja debatem, conversam, decidem(?)

soberanamente sem ouvir os demais setores que podem ser acusados de “sectários”. Por

outro lado, a preocupação dos bispos é consigo mesmos e com as ordens religiosas e

seus bens. Nenhuma palavra para e sobre os sofrimentos que a guerra pode vir a causar

às massas. A pastoral está mais preocupada com a “consciência católica” do que com o

que os católicos possam vir a sofrer com a fome e as exigências que uma guerra

normalmente traz.

Assim, ainda aqui notamos como a guerra foi momento excepcional nesse

diálogo entre a Igreja e o Estado no Brasil República. O momento de comoção social

fez surgir e desabrochar os sentimentos cívicos do país e a Igreja, bem ou mal, contribui

para a formação e manutenção desse entusiasmo, quase sendo uma “muleta do estado”,

mobilizando os sentimentos em direção a guerra.

Os bispos brasileiros sentiram o imposto do fim do Padroado durante as

primeiras décadas da República. Viram o crescimento de outras religiões e Igrejas que

agora tinham privilégios a que antes só ela tinha acesso. Em momento de crise tão grave

apresenta-se a possibilidade de a Igreja servir como cimento da nacionalidade e, com

isso, retomar os benefícios que haviam escapado. Sem dúvida essa atuação valeu-lhe o

reconhecimento pelo Estado Burguês que se instala após a Revolução de 1930.

“Esperamos que o governo tenha confiança em nós e não duvide

jamais de nossa colaboração decidida e generosa, em tudo o que seja

necessário à segurança do país e não vá de encontro à nossa

consciência e aos nossos deveres de Bispos católicos. Esperamos que

o governo, malgrado as insinuações sectárias que vão surgindo

contra os sentimentos gerais do país, contra o verdadeiro espírito

democrático e a liberdade espiritual, não tome nenhuma medida de

exceção contra as congregações religiosas e os seus bens, nem

qualquer outra que venha melindrar a Consciência Católica, e que

seria um verdadeiro desastre no atual momento de união de todos os

brasileiros31”.

Page 58: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

59

Referências Bibliográficas

1Decreto de 7 de Janeiro de 1890, n.º 119-A – Governo Provisório.

2Pastoral coletiva do Episcopado Brasileiro de 1890, in A Igreja na República. Brasília:

Edt. Universidade de Brasília, 1981.

3FRETRE, Felisbelo. História Constitucional da República dos Estados Unidos do

Brasil. In: MARIA, Júlio. A Igreja e a República. Universidade de Brasília, 1981, pp.

106.

4 O Pe. Júlio Maria argumenta baseado no raciocínio de Leroy Beaulieu, O Estado

Moderno e suas Funções. In: Júlio Maria, padre, Op. Cit., pp. 107.

5ROMANO, Roberto. Brasil: Igreja conta Estado. São Paulo: Kairós Livraria e Editora,

1979, pp. 115.

6ROMANO, Roberto. Idem.

7Idem. pp. 117.

8T. R. n.º 3, Ano XII, 31.01.1918, pp. 1.

9Idem. Ibidem.

10Idem.

11Idem.

12In Azevedo, Thales de. A Religião Civil Brasileira, um instrumento político.

Petrópoles: Vozes, 1981, pp. 80.

13K. Bihlmeyer e H. Tucle. História da Igreja. São Paulo: Ed. Paulinas, vol. 3, 1965, pp.

685.

14 T. R. n.º 5, Ano XII, 14.02.1918, pp. 3.

15 T. R. n.º 7, Ano XII, 28.02.1918, pp. 1.

16 T.R. n.º 3, Ano XII, 31.01.1918, pp. 3.

17 T.R. n.º 30, Ano XI, 04.10.1917, pp. 2.

18 T. R. n.º4, Ano XII, 07.02.1918, pp. 1.

19 T. R. n.º 23, Ano XI, 16.08.1917, pp. 3.

20 T. R. n.º 24, Ano XI, 23.08.1917, pp. 1.

21 T. R. n.º 41, Ano XI, 20.12.1917, pp. 5.

22 T. R. n.º37, Ano XI, 22.11.1917, pp. 1.

Page 59: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

60

23 T. R. Idem, Ibdem.

24 T.R. n.º40, Ano XI, 13.12.1917, pp. 1.

25 Idem, Ibdem.

26 Idem.

27 Idem.

28 Idem.

29 T.R. n.º39, Ano XI, 08.12.1917, pp. 1.

30 Idem, Ibdem.

31 Idem.

Capítulo VI

Diplomacia na Tribuna

O historiador Fernand Braudel, em uma das obras, afirmou que “as catástrofes

não serão necessariamente os artífices, mas são, com toda certeza, os arautos infalíveis das

resoluções reais; em todo o caso, constituem sempre um incitamento e pensar, ou melhor, a

repor a ordem do universo”1. Essas palavras talvez com um pouco de complascência,

pudessem ser aplicadas à situação em que foi posta a sociedade brasileira por conta da

guerra de 1917-1918, lamentavelmente conhecida como a Primeira Guerra Mundial. É

Page 60: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

61

nosso entendimento que o conflito foi motivo para uma política de maior aproximanção

e entendimento entre a Igreja e o Estado no Brasil, e isso teria acontecido, tanto no

plano interno quanto no externo.

“A Primeira Guerra Mundial seria responsável por consideráveis transformações no

quadro econômico, político, social e ideológico, quer no plano externo quer no plano interno”2.

Durante a Guerra, inicialmente neutro, não foi o Brasil afetado diretamente pelo conflito

que se iniciara na Europa. Contudo, possuindo uma indústria ainda incipiente, em muito

dependia dos países europeus para atender as necessidades de consumo de certos setores

de sua população. Por outro lado, a sua situação financeira e suas tradicionais alianças,

levá-lo-iam, fatalmente, à guerra.

A nós interessa ver o relacionamento do Brasil, não com as potências

beligerantes, mas com o Estado Desarmado, o Estado que tinha o seu Chefe

“prisioneiro”, em uma situação que só seria resolvida, bem mais tarde, com o Estado

Italiano. Interessa-nos a relação do Brasil com Santa Sé.

As relações do Brasil com a Sé Romana sempre foram amigáveis. Na verdade,

durante o período colonial eram relações de perfeita harmonia, e durante a maior parte

do período imperial as relações de Padroado evitaram estremecimentos maiores.

Contudo, como sabemos, o Império desabou algum tempo após a chamada Questão

Religiosa, que envolveu os bispos de Olinda e Belém. Alguns historiadores acham que

esta foi uma das causas da Proclamação da República e da dissolução do Império. Na

verdade a dita Questão Religiosa serviu para demonstrar que o sistema de Padroado já

não era de boa serventia, seja à Igreja, seja ao Estado Monárquico. O Padroado, que

durante tantos séculos prendera a Igreja no Brasil aos destinos do Estado, não tinha mais

serventia, pois o Estado brasileiro encontrava-se dominado por maçons e bebia de uma

nova ideologia que já não mais necessitava do estofo ideológico que a religião católica

sempre lhe oferecera. Por outro lado, questões eram transferidas da Europa, fazendo

reviver aqui os embates entre a maçonaria e o catolicismo ultramontano2. A definição,

posterior, da República como um Estado leigo foi uma vitória dos positivistas. Os

entendimentos de uma parte da Igreja ensinam que

“a laicização termina por ser sinônimo de descristianização. À

antiga religião do Estado sucede a irreligião estatal”4

Page 61: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

62

E tal coisa, entende a Igreja, pode ser evitada, como nos dá a entender A TRIBUNA

RELIGIOSA e a política papal. Já no Pontificado de Leão XIII, a Santa Sé mostra um

interesse especial para com o Brasil, pois

Durante o Período Colonial e o Período Imperial, ou seja, enquanto durou o

sistema de Padroado, foram poucas as dioceses criadas. Como cabia ao Estado o

pagamento das despesas dos clérigos e a manutenção das dioceses e paróquias, não

interessava ao governo um grande número de prelados em atuação dentro do território

brasileiro. A situação da Igreja no Brasil era, portanto, precária, pois o sistema de

Padroado a manietava, além de que muitas ordens religiosas passaram fortes riscos de

serem fechadas6, pois desde 1855 o Ministério da Justiça publicara um aviso

O Papa Leão XIII tomou a iniciativa de dar uma nova vida á hierarquia, criando

as dioceses do Amazonas, Paraíba, Niterói e Curitiba. Ao terminar o Século XIX, havia

apenas 16 dioceses no Brasil, enquanto que entre 1900 e 1918 – inclusive foram criadas

32 novas dioceses. Tais desmembramentos mostram uma expansão da atividade

missionária e também uma atenção especial para com o Brasil por parte da Santa Sé8. O

estabelecimento de dioceses visa criar uma estrutura mais propícia pra o atendimento

das necessidades dos fiéis católicos e servia para promover um clima de maior

animação naquele momento em que, no Brasil, a Igreja começava a dar os seus

primeiros passos sem as muletas do Estado.

Passos de boa vontade foram dados pela Sé Romana, quando consagrou o Brasil

à Nossa Senhora Aparecida, com decreto emanado da Basílica Vaticana de São Pedro,

em 28 de dezembro de 19039. Ainda no início do século, a Santa Sé fez de um brasileiro

o primeiro cardeal da América Latina, o Arcebispo do Rio de Janeiro, o Cardeal

Arcoverde. A representação do Vaticano junto ao governo brasileiro, que era de nível de

embaixada, foi elevada à categoria de nunciatura apostólica. Essas gestos de boa

vontade para com o Brasil, fazem de uma ofensiva diplomática da Santa Sé para

“era o principal interesse da Santa Sé erigir novas dioceses no

Brasil”5.

“proibindo noviciado, até que se procedesse uma reforma nas

ordens religiosas, a ser estipulada com a Santa Sé. Esta medida do

Governo representava a pena de morte das ordens religiosas”7.

Page 62: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

63

conseguir um melhor relacionamento com o novo Estado brasileiro. É bom jamais

esquecer que o Brasil, por sua extensão territorial e sua população, concentrava, à época

e hoje, um dos maiores contigentes de católicos do mundo. Esses católicos deveriam ser

melhor atendidos. Por outro lado, o movimento anticatólico e anticlerical que se

expandia na Europa, tornava cada vez mais necessária a manutenção do catolicismo na

América Latina, pois essa é uma reserva da qual não pode descuidar-se a Igreja

universal.

Em 1918, o CORREIO DA MANHÃ, do Rio de Janeiro, publicou um artigo de

Gil Vidal que foi transcrito por A TRIBUNA RELIGIOSA. Dizia assim:

É um lamento por parte dos católicos. Era Ministro brasileiro junto à Santa Sé o

Dr. Magalhães de Azevedo. E foi ele quem entregou à Santa Sé a resposta do Governo

Brasileiro à Proposta de Paz feita por Bento XV. Há um razoável lapso de tempo entre a

Proposta de Paz (1º de agosto de 1917) e a resposta do Governo Brasileiro (novembro

de 1917). Tal lapso é justificado por, não estando o Brasil em Estado de Guerra, não se

sentiu o governo motivado ou obrigado a responder a tal iniciativa do Sumo Pontífice.

Contudo, nos primórdios de sua participação na guerra, o governo brasileiro dirigiu

carta à Santa Sé, justificando a demora de sua resposta e explicando a sua participação

no conflito, além de chamar atenção para os limites de sua adesão à proposta de Bento

XV. A TRIBUNA RELIGIOSA achou por bem de publicar na íntegra a resposta do

Governo Brasileiro ao chamamento de Paz do Pontífice. “Vossa Excelência dirá a Sua

Santidade que o Sr. Presidente da República não tinha autorizado ainda a responder a

sua proposta de Paz, porque agora o Brasil está em estado de guerra. Nação que nunca

fez a guerra de conquista e que inscreve o arbitramento obrigatório na sua Constituição

Republicana para a solução dos problemas externos; que nada sofreu no passado; nada

tendo a vingar no presente; que resolveu serenamente todas as suas questões de limite,

“Há algum tempo elevou a Santa Sé a sua internunciatura à

nunciatura e aquela corresponde a legação e esta à embaixada.

O Soberano Pontífice já há anos é, representado junto ao

Governo brasileiro por um embaixador, ao passo que o

Governo do Brasil junto ao Vaticano continuou a ter ali

simplesmente um ministro”10.

Page 63: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

64

sabendo o que tem de seu, conhecendo definitivamente toda a extensão do seu território,

que é grande e que vai sendo maior, graças não só ao trabalho dos seus filhos,

ambiciosos de provar que merecem a honra de possuir tão rico Patrimônio, como no

trabalho dos estrangeiros que a nossa hospitalidade faz logo brasileiros; o Brasil, pode

afirmar Vossa Excelência à Sua Santidade, teria ficado estranho ao conflito da Europa,

apesar das sympathias da opinião pública pela causa liberal dos aliados, se a Alemanha

não estendesse à América os processos violentos da guerra, impedindo a todos os povos

neutros o seu comércio com o exterior.

O Brasil não podia faltar aos seus deveres de Nação Americana, e tomando em

última extremidade a posição de beligerante fizemo-o sem ódio e sem interesse, mas tão

somente na Pátria; hoje, felizmente, todas as Repúblicas do Novo Mundo, umas mais

ofendidas que outras, mas todas ameaçadas na sua liberdade e na sua soberania,

estreitam uma solidariedade que já era geográfica-econômica, histórica e que o

sentimento de defesa comum e Independência Nacional vai tornando política também.

O Brasil não pode por isso ter hoje uma atitude isolada nem mesmo falar

individualmente, solidária como deve ser e como é, facto, com as Nações a que se

ajuntou.

Não houve, entretanto, coração brasileiro que não recebesse com uma viva

emoção o eloqüente apelo de Sua Santidade, pedindo aos beligerantes a Paz em nome

de Deus; o Brasil, embora não seja o Estado órgão de nenhuma crença revelada, livres e

garantidos como são todos os cultos, não deixa de ser por isso a terceira Nação Católica

do Mundo. Com relações quase seculares e nunca interrompidas com o Governo da

Igreja, reconhece os generosos motivos que inspiram o apelo de Sua Santidade,

reclamando “com o desarmamento e a arbitragem a implantação de um regime em que a

força material dos Exércitos seja substituída pela força moral do direito, acordadas as

reivindicações territoriais da França e da Itália, considerados devidamente os problemas

dos Balcans e restituída a liberdade da Polônia”.

Os povos mais diretamente interessados nessa questões é que poderão dizer se a

honra das armas já está salva nesta guerra, ou se estas modificações na Carta Política da

Europa, podem dar-lhe tranqüilidade, estando como está ainda de pé a organização

política e militar que suspendeu a vida do direito em toda a parte, suprimiu as

conquistas que o espírito humano supunha definitivas na alteração dos rigores da guerra

e destruiu tudo quanto o sentimento cristão tem inspirado a sociedade das Nações.

Page 64: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

65

Só eles dirão se, tendo desaparecido a confiança nos tratados e na lealdade

internacionais, haverá uma força senão um espírito novo de ordem a garantir a Paz, sem

que dos desenganos, dos sofrimentos, tenha saído um mundo melhor, como se fora

nascido da própria liberdade.

Assim se firmaria a Paz duradoura, sem restrições políticas, o seu lugar ao sol,

com os mesmos direitos, trocando idéias, trocando trabalhos e trocando mercadorias,

sob bases amplas de justiça e equidade.

Queira Vossa Excelência apresentar a Sua Santidade as homenagens de profunda

veneração do Senhor Presidente da República.

NILO PEÇANHA”.

Como pudemos ver, o Ministro de Relações Exteriores do Brasil faz questão de

mostrar que não tinha havido qualquer rompimento das relações entre os dois Estados, e

faz questão de chamar para o Brasil a honra de ser um dos países de maior número de

católicos do mundo. Por outro lado, apresenta o Brasil como sendo, desde o passado até

então, um dos Estados que tem praticado o arbitramento, inclusive por forças de lei e

que se obriga a tal. O Governo brasileiro faz ver ao Governo da Santa Sé que a guerra

lhe foi imposta e só os principais beligerantes, os mais ofendidos, é que podem decidir o

momento em que a ofensa tenha sido superada, para então ser assinada a paz.

Ao publicar a carta do Ministro do Governo brasileiro, A TRIBUNA

RELIGIOSA quer mostrar que, apesar dos percalços, analisados em outro momento

deste trabalho, a Sé do Vaticano tem uma expressiva importância para o Governo,

ressalvando-se que foi de pronto e imediata a resposta brasileira, tão logo o estado de

guerra foi declarado. Embora possa parecer clara essa importância, a política de certos

setores da sociedade é de mostrar uma importância menor do Vaticano entre as nações

do mundo. As constantes publicações, nas páginas da A TRIBUNA RELIGIOSA, de

notícias das relações entre a Santa Sé e os Estados têm uma função educativa e

pedagógica: demonstrar a importância do Vaticano no seu relacionamento como mundo

e levar a uma aceitação de melhoria das relações entre o Brasil e a Santa Sé. É com esse

objetivo que são publicadas notícias como essa:

“O novo governo da Finlândia acaba de enviar á Santa Sé uma

missão diplomática composta dos Senhores Lourenço Kihlman,

Eugênio Wolff, Tancredi Borenius, com o fim de participar a Sua

Santidade a constituição da Finlândia em Estado independente e

livre”12

.

Page 65: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

66

Ainda:

e este outro que procura manter um governo que caiu:

Todas essas notas e outras que estão publicadas em uma secção com o título

“Pelo Mundo”, ora aparecendo na página 1 a maioria das vezes, ora na página 2,

demonstram um esforço de A TRIBUNA RELIGIOSA em realçar a presença e a

importância da Igreja no cenário internacional e o seu reconhecimento pelas Nações.

Esse esforço visa educar os brasileiros e alertar para que o Brasil promova um melhor

relacionamento com a Santa Sé. É neste sentido que Gil Vidal chama atenção ao

Governo Brasileiro para o distanciamento injustificável enter o Brasil e o Vaticano. Por

isso ele afirma que:

“O Observatore omano, do dia 11 de julho, tendo a República da

China mostrado desejo de entrar em relações com a Santa Sé,

Sua Santidade acedeu bem voluntariamente a tal desejo e

acertou a nomeação do Sr. Tay Tcheny Ling, para enviado

extraordinário e Ministro Plenipotenciário junto à Santa Sé”13

.

“Resposta da Bélgica á mensagem do Papa. O governo da

Belga examina a possibilidade de contribuir, tanto quanto

dele dependa, a realização do amplo desejo em que se

inspirou a mensagem, a saber: Apressar o fim da guerra,

atenuar e tornar impossível a repetição de semelhante

catástrofe”14

“O Ministro da Rússia junto à Santa Sé declarou não

reconhecer o atual governo do seu país e considerar nulos

todos os tratados feitos com os Impérios Centrais”15

.

“ao Brasil Republicano, mais do que ao Brasil Imperial,

tem a Santa Sé acumulado de atenções. Não foi no Brasil

que ela escolheu o primeiro cardeal da América do Sul?

Corresponde ao benévolo e atencioso tratamento que

sempre tem merecido do Soberano Pontífice”16

.

Page 66: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

67

Em 191918

logo após a guerra, o Brasil elevou à categoria de embaixada a sua

representação junto ao Vaticano, sendo o Dr. Magalhães de Azevedo o primeiro

Embaixador do Brasil junto à Santa Sé. Posteriormente, por acordo entre o Itamarati, a

Nunciatura e os demais embaixadores, o Núncio Apostólico veio a ser considerado o

Decano entre os diplomatas junto ao Governo brasileiro. Desde então melhoraram

sensivelmente as relações entre os dois Estados, especialmente até final dos anos de

1960, momento em que a cristandade que se organizara durante e após a primeira

guerra, começa a ser desfeita por conta da militância político-social de setores leigos e

mesmo de uma parte do clero. É evidente que não queremos atribuir à A TRIBUNA

RELIGIOSA ou a qualquer jornal católico a responsabilidade pela melhoria das

relações entre os dois Estados, apenas constatamos que os jornais, órgãos formadores de

opinião pública, serviram-se de suas páginas para esclarecer os temores que certos

setores da sociedade brasileira quanto às relações entre o Brasil e a Santa Sé. Não se

deve temer um Estado que merece o respeito de tantos outros congêneres, parece querer

ensinar a A TRIBUNA RELIGIOSA, notadamente quando o seu chefe, é um dos que

podem ser citados como artífice da Paz e é uma potência desarmada.

Referencias Bibliográficas

1 BRAUDEL, Fernand. História e Ciência Social. Lisboa: Ed. Presença, 1982, pp. 51.

2 FELIZARDO, Joaquim José. História Nova da República Velha – Do manifesto de

1870 à Revolução de 1930. Petrópoles: Vozes, 1980, p. 96-97.

3 CASTRO, Marco de. 64: Conflito Igreja X Estado. Petrópoles: Vozes, 1982, p. 35-51.

Page 67: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

68

4 SILVEIRA, Monsenhor Paulo Florencio da. In: Brhlmeyer. História da Igreja.

Paulinas, 1965, pp. 748.

5 Idem. pp. 751.

6 Interessava ao Império o fechamento dos Conventos para poder assenhorear-se dos

bens de mão morta, quando da morte do último frade ou monge. Desde 1860 que havia

um grande esforço por parte de Bispos reformadores na reorganização e fortalecimento

da Igreja e das ordens e Congregações religiosas. Confira Azzi, Reollando, O

Movimento da Reforma Católica durante o século XIX in Reb, Vol. 34, set. 1974, p.

647-662; Azzi, Riollando. Dom Manuel Joaquim da Silveira, Primaz da Bahia (1861-

1874) e a luta pela liberdade da Igreja in Reb, Vol. 34, junho 1974, p. 359-370; Fragoso,

Hugo. Igreja na formação do Estado Liberal (1840-1875) in História da Igreja no Brasil,

Tomo II/2, Vozes, 1980.

7 FRAGOSO, Hugo. Igreja na formação do Estado Liberal (1840-1875), OP. Cit.

8 Foram criados nesse período as dioceses de Maceió, Pouso Alegre, Terezina,

Campanha, Uberaba, Florianópoles, Botucatu, São Carlos do Pinhal, Ribeirão Preto,

Taubaté, Campinas, Natal, Aracaju, Pesqueira, Montes Claro, São Luiz de Cárceres,

Pelotas, Uruguaiana, Santa Maria, Aracaju, Barra, Caitité, Ilhéus, Cajazeiras, Crato,

Sobral, Porto Nacional, Caratinga, Penedo, Guaxupé, Aterrado, Garanhuns, Nazaré.

9 SILVEIRA, Monsenhor Paulo Florenço. Op. Cit. pt. 755.

10 T.R. n.º 41, Ano XII, 31.10.1918, pp. 1.

11 T.R. n.º 39, Ano XI, 06.12.1917, pp. 1.

12 T.R. n.º 15, Ano XII, 25.04.1918, pp. 2.

13 T.R. n.º 36, Ano XII, 19.09.1918, pp. 2.

14 T.R. n.º 04, Ano XII, 07.04.1918, pp. 2.

15 T.R. n.º 16,. Ano XII,02.05.1915, pp. 1.

16 T.R. n.º 41, Ano XII, 31.10.1918, pp. 1.

17 SILVEIRA, Monsenhor Paulo Florença. Op. Cit, pp. 759.

18 Idem, pp. 759.

Capítulo VII

O Papado e a Guerra

Todos sabemos que as interpretações históricas são provenientes de um

determinado lugar, o lugar onde se encontra o historiador, a sua classe social, a sua

Page 68: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

69

ideologia, as suas lealdades, ainda que ele se esforce para evitar tais penetrações em

suas análises. É assim que podemos compreender que a Primeira Guerra Mundial, como

qualquer evento humano, pode ser vista e analisada por vários e, às vezes, contraditórios

ângulos, e apresente as mais diversas versões. Na busca das causas da guerra, um

historiador católico diz que

Esta é uma opinião que tem uma visão idealística e religiosa da História,

segundo a qual a guerra foi provocada pela irreligião, pela crença de que os homens e a

sua ciência tudo podem e tudo fazem. É um engano achar que o homem tudo pode, é um

engano acreditar que os atos humanos são resultados apenas de suas vontades, é não

compreender toda uma gama de interesses que, sem dúvida, às vezes encobre o

indivíduo.

O final do século XIX foi de uma grande expansão na ciência e nas técnicas de

comunicação e transporte. A Igreja não soube reagir e assimilar, de imediato, as

mudanças que estavam ocorrendo ao seu redor. A sua estrutura medieval e as suas

instituições não possuíam a agilidade dos novos tempos. A condenação aos „erros do

mundo moderno‟ feita por Pio IX na Encíclica QUANTA CURA e no SILLABUS em

muito contribuiu para isolar a Igreja do mundo. É de lá que o Cardeal Tiago Della

Chiesa, eleito Papa (setembro de 1914), governará a Igreja com o nome de Bento XV,

até 19223. Desde o Vaticano

Para ele a guerra se apresentava como o suicídio da Europa Civil.

“ela foi o fruto maduro do desenvolvimento fatal do século

XX e assinala a explosão das graves crises sociais e

espirituais que por muito tempo se foram preparando”1

“as causas mais profundas desta catástrofe mundial são, não

bastante tudo, ideológicas: o afastamento de Deus da parte

dos Estados e dos povos na idade recente, a sua defecção dos

ideais cristãos para os bens materiais e o egoismo nacional

anticristão”2.

“ele ergue de modo infatigável a sua voz contra o

prosseguimento da guerra”4.

Page 69: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

70

Desde o início da guerra, desde o início do seu pontificado, Bento XV tentou

promover a Paz. Debalde seus esforços e, ainda que historiadores católicos vejam a

guerra como fruto do “egoísmo nacional anticristão”, vê se surgir na França

Por outro lado os católicos alemães reagiram, e os protestantes também, pois

A guerra, fruto da expansão capitalista, é transformada em uma cruzada entre

partidos religiosos. E, a tudo isso era necessário vencer e esta parece ter sido a grande

campanha de Bento XV. Em 1º de agosto de 1917 Bento XV ofereceu ao mundo uma

proposta de Paz. Ela está transcrita pela TRIBUNA RELIGIOSA no número 30, do ano

XI, datada de 04 de outubro de 1917. Nesse documento o Papa Bento XV, dirigindo-se

às potências, chefes dos povos Belgirentes, diz que:

“grupo de católicos, guiados pelo historiador da Igreja,

Alfredo Boudrilat, reitor do Instituto Católico de Paris,

promoveu uma desagradável campanha propagandística

contra a Alemanha, vista como única responsável pela

guerra e a pior inimiga da Igreja”5.

“na Alemanha, no ano jubilar da Reforma

Protestante(1917), procurou-se caracterizá-la (a guerra)

como uma luta pelos bens conseguidos pelo

protestantismo”6.

“Desde o princípio do nosso Pontificado, entre os horrores da terrível

tempestade que caíra sobre a Europa, três coisas nos propusemos

acima de todas as outras: uma perfeita imparcialidade para com todos

os beligerantes, como convinha a quem é pai comum e ama com igual

afeto todos os seus filhos, um esforço contínuo para fazer o maior bem

que pudêssemos isso sem acepção de pessoas, sem distinção de

nacionalidade ou religião, como nos impõe o Supremo Ofício que nos

foi confiado por Cristo e finalmente o cuidado assíduo, exigido

igualmente pela nossa missão de Paz, de nada omitir que nos fosse

possível para abreviar o fim dessa calamidade, induzindo os povos e

seus chefes a conselhos mais pacíficos, a serenas deliberações da Paz,

de uma Paz justa e duradoura”7.

Page 70: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

71

Após esse início, que é um resumo de sua ação durante a guerra, Bento XV

propõe que

Para conseguir isso, o Papa chama atenção de que normas devem ser

estabelecidas com clareza, de comum acordo entre todos, objetivando a manutenção

desse acordo, Bento XV propõe

O Papa propõe, ainda, que

Compreendo que um

dos grandes problemas a serem

resolvidos após a guerra é a questão das indenizações aos prejuízos causados pelo

conflito, o Papa diz:

“em primeiro lugar, o ponto fundamental deve ser que a força

seja substituída pela força moral do direito, por conseguinte um

justo acordo de todos na diminuição dos armamentos”8.

“em substituição das armas, o instituto da arbitragem, com a

sua alta função de Paz, segundo as normas a serem

determinadas e as sanções a serem estabelecidas”9.

“se tire todo o obstáculo ás vias de comunicação dos povos

com a verdadeira liberdade e comunismo dos mares”10.

“quanto aos danos e despesas de guerra, não descobrimos

outro meio de resolver a questão que a norma geral de um

interiço e recíproco perdão, justificado pelos benefícios do

desarmamento”11

Page 71: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

72

Ora, o que o Papa está sugerindo é que se aplique a norma cristã do perdão e isso

exige a contrapartida na prática, por isso ele ensina que

Embora apresente algumas falhas de precisão em alguns pontos, este é sem

dúvida, um programa para uma Paz verdadeira entre as Nações, pois, estabelecendo o

desarmamento e a restituição de territórios ocupados, pretende afastar algumas das

principais causas das guerras. O Papa propõe o reinício da vida internacional em novas

bases. A TRIBUNA RELIGIOSA comenta e exulta com a proposta da Papa. Não pode

ser esquecido que estava ocorrendo, naquele período, o processo de centralização na

Cúria Romana e que ainda há pouco havia sido estabelecido o dogma da infabilidade

papal13

. Talvez por isso a proposta de Bento XV é saudada como a palavra do “Rei sem

Exército” no editorial intitulado “O Anjo da Paz”14

. Ainda no número 24, datado de 23

de agosto de 1917, o Monsenhor Affonso Pequeno no artigo “Aurora da Paz” faz

comentários sobre a proposta do Pontífice e argumenta em torno da Igreja católico da

seguinte forma:

É evidente que o Monsenhor e A TRIBUNA RELIGIOSA pretendem tornar o

mais claro possível a autoridade do Papa. E isso é feito não apenas em função dos

Estados, mas tendo em vista as demais religiões e líderes religiosos. Por isso entende o

Monsenhor que

“estes acordos pacíficos com inumeráveis vantagens,

não são possíveis sem a recíproca restituição dos

territórios atualmente ocupados”12

.

“Podem esbravejar os inimigos da Igreja Católica

(...) mas não poderão apagar esta figura grandiosa

que no branir da borrasca fala e o mundo pára”15

.

Page 72: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

73

.

É um tom apologético de defesa e ataque, se o Papa procura evitar confrontos

em sua proclamação, o articulista, ferido na luta contra a expansão do protestantismo e

do espiritismo, além de ferido pela política do Estado laico, desafia, tendo como

objetivo alcançar a realidade local, por isso escreve:

Interessa ainda à TRIBUNA RELIGIOSA esclarecer a importância e a ação do

Papa, sempre e cada vez mais. Então, apresenta uma série de notícias registrando a

resposta das Nações à proposta do Papa, permite o leitor admitir o quanto o Pontífice

importa ao mundo. Na Secção Registro da Semana, diz que

Embora não apresente qualquer comentário sobre a resposta do governo

americano. A TRIBUNA RELIGIOSA tece comentários sobre a maçonaria inglesa, pois

começa a se ventilar que esta estaria forçando medidas pra impedir a presença do Papa

em um futuro Congresso de Paz20

, enquanto os jornais ingleses acusam de que deve ter

havido uma influência alemã na proposta de Paz feita pelo Papa21

e, entretanto, pelos

católicos da Inglaterra, Bélgica e França a “proposta de Paz do Santo Padre foi bem

receviada”22

.

A TRIBUNA RELIGIOSA mostra que a proposta de Paz feita pelo Papa Bento

XV estava fadada ao fracasso. No número 14 do ano XII, datada de 18 de abril de 1918,

A TRIBUNA RELIGIOSA apresenta um artigo publicado pelo jornal A UNIÃO do Rio

“só a Igreja Católica aparece em todos os campos de

batalha, caridade para com todos, somente ela pode

dizer e diz: basta, eu vos pelo a Paz em nome de

Deus”16

.

“onde estão as outras religiões? Onde estão as filosofias

e seitas que nos movem guerra? Onde está esta Ciência

Materialista que pretende substituir-se à Igreja de J.C?

são instrumentos da destruição e da morte nas mãos dos

governantes”18

.

“o Presidente dos Estados Unidos responde á Proposta de

Paz de Bento XV, dizendo que era impossível aceitá-la,

agora”19

.

Page 73: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

74

de janeiro, como título “A Santa Sé e a Paz”. Neste artigo fala-se sobre a Convenção de

Londres, realizada em 26 de abril de 1915, onde um acordo secreto foi assinado pela

Inglaterra, Rússia e França. Esta acordo “foi tornado público pelos Maximalistas

Russos”23

após a vitória da Revolução Bolchevique naquele país. A TRIBUNA

RELIGIOSA reproduz o artigo XV da Convenção de Londres, que diz assim:

Sem apresentar qualquer comentário próprio, A TRIBUNA RELIGIOSA

continua a citar o artigo de A UNIÃO, onde se diz:

É este um acordo que praticamente tornou nula a proposta de Paz de Bento XV.

As Nações recusam o auxílio do Pontífice. O Vaticano parece relegado a um plano

secundário entre as grandes Nações. As disputas entre a Itália e o Vaticano pesam muito

forte, e o que pode fazer o Papa? A TRIBUNA RELIGIOSA mostra que o Papa não se

afastou de sua conduta. Na verdade “O Vaticano se tornou uma Segunda Cruz

Vermelha”26

. Foi criada uma extensa rede informações para acudir prisioneiros de

guerra e esforço dos homens em guerra. A TRIBUNA RELIGIOSA registra uma farta

quantidade dessas ações. Por exemplo:

ou como forma de resumo em um artigo sob o título “Que Fez o Papa Pelas Vítimas da

Guerra?”

“Artigo XV – A França, a Grã Bretanha e a Rússia tomam o

compromisso de apoiar a Itália, não consentindo que a Santa

Sé desenvolva qualquer ação diplomática sobre a conclusão

de Paz e solução de assuntos conexos com a guerra”24

.

“o que há deveras odioso em tal acordo, interessou a

opinião pública, não só dos católicos, mas dos que estão

superiores às mesquinhezas partidárias”25

.

“O Santo Padre obteve do governo Austro-húngaro a liberdade

para os prisioneiros na Áustria, vítimas de tuberculose”27

Page 74: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

75

Vê-se, portanto, que há um discurso que promove a figura do Papa, a sua

autoridade, como aquele que verdadeiramente está preocupado com o destino dos

homens, acima de qualquer interesse e o único que tem a real intenção de, como pai de

todos, encontrar o melhor para seus filhos. Mais ainda, A TRIBUNA RELIGIOSA

procura nos jornais internacionais o reconhecimento, principalmente dos que não são

católicos.

Aq

ui, mais

que em

“1- O Papa tem condenado as barbaridades e as crueldades,

2- O Papa tem obtido das Nações beligerantes a libertação dos

prisioneiros inábeis par guerra,

3- O Papa tem conseguido comutação de pena de morte,

4- O Papa obteve a cessação das perseguições turcas conta os

armênios,

5- O Papa obteve que os prisioneiros fossem conduzidos para a

Suiça, país onde têm tratamento humano,

6- O Papa tem socorrido os povos mais duramente atingidos pela

guerra – os belgas e polacos,

7- O Papa tem levantado a voz para que sejam preservadas as obras

de arte e a vida dos não combatentes,

8- O Papa obteve serem internadas na Suíça os prisioneiros com

mais de três filhos”28.

“É tal a influência benéfica da Santa Sé que o Boletim da Sociedade

Alliance Française em seu número de 15 de novembro passado inicia um

artigo sobre a Santa Sé e a guerra com as seguintes palavras que tiramos da

edição portuguesa editada em Paris: “No decorrer desta guerra os neutros

honraram-se imenso pela sua tão infatigável como engenhosa caridade.

Aqui mesmo dissemos o que os Estados Unidos e a Suíça fizeram. Todavia

no destaque desta luta de generosidade deve se ainda citar a Santa Sé.

Tendo afirmado em diversas ocasiões a sua neutralidade, não quis nunca

que a pudessem tomar por indiferença. O Papa praticou plenamente a

palavra do Evangelho que tomou como divisa: Misereor Super Turbam. Em

seu nome mandou declarar pelo Cardeal Gaspari numa circular aos bispos:

Ele “entende que não se faça distinção nenhuma de religião, nem de

nacionalidade, nem de língua”29.

Page 75: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

76

qualquer outro momento, A TRIBUNA RELIGIOSA assume o seu caráter de jornal

católico. A defesa do primado de Roma, a defesa da infabilidade papal. A prática de

Bento XV é visto como sinal da santidade de sua função e, sem dúvida, ele está acima

de qualquer paixão ou patriotismo. O desejo do Papa é o fim da guerra. A TRIBUNA

assiste, registra e procura convencer.

Referências Bibliográficas

1 TUCLE, H. e K. Bihlmeyer. História da Igreja. Vol. 3, São Paulo: Editora Paulinas,

1965, pp. 604.

2 Idem. pp. 604.

3 Os dados sobre Bento XV foram tirados da História da Igreja de Bihlmeyer. Op. Cit.

pp. 608 e vs.

4 TUCLE e BIHLMEYER. Op. Cit. pp. 608.

5 Idem. pp. 605.

6 Idem. Ibdem.

7 T.R. n.º 30, Ano XI: 04.10.1917, pp. 1.

8 Idem.

9 Idem

10 Idem.

11 Idem.

12 Idem.

13 O dogma da infalibilidade Papal foi decretado no Concílio Vaticano I, sob o Governo

de Papa Pio IX, em 1870.

14 T.R. n.º 24, Ano XI: 23.08.1917, pp. 1.

15 T.R. Idem, pp. 1.

16 Idem.

17 Em vários números do jornal aparecem artigos de caráter apostólico analisando o

“erro da reforma e do espiritismo. Isso, aliás, desde o primeiro número. Por outro lado,

toda a Igreja do Brasil está em forte campanha para que seja permitido o ensino

religioso nas escolas. Mas, esse é um assunto para outro trabalho.

18 T.R. n.º 24, Ano XI: 23.08.1917, pp. 1.

19 T.R. n.º 25, Ano XI: 30.08.1917, pp. 5.

Page 76: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

77

20 T.R. n.º 26, Ano XI: 06.07.1917, pp. 1.

21 T.R. n.º 37, Ano XI: 22.11.1917, pp. 1.

22 Idem, Ibdem.

23 T.R. n.º 14, Ano XII: 18.04.1917, pp. 1.

Os Bolchevistas, ao tomarem o poder, tornaram público documentos secretos assinados

pelo governo Tzarista, como forma de justificar a sua saída da guerra européia, uma vez

que travavam uma guerra intestina contra o Exército Branco, este financiado pelas

potências capitalistas.

24 T.R. n.º 14, Ano XII: 108.04.1917, pp. 1.

25 Idem, Ibdem.

O historiador Bihlmeyer diz que “enquanto, porém, o secretário de Estado (da Santa

Sé), espera a solução dela (a guerra) não com a força das aramas ou de uma

internacionalização da lei das garantias, mas do bom senso e do espírito de justiça do

povo italiano (26 de junho de 1918), a Itália, com o artigo XV do tratado secreto de

Londres (26 de abril de 1915), já havia empenhado todos os seus aliados na exclusão da

Santa Sé nas futuras negociações de Paz e da discussão da questão relativas à guerra”.

Bihlmeyer, Op. Cit., pp. 610.

26 Bihlmeyer. Op. Cit., pp. 609.

27 T.R. n.º 15, Ano XIII: 25.04.1918, pp. 2.

28 T.R. n.º 34, Ano XII: 05.09.1918, pp. 1.

29 T.R. n.º 2, Ano XII: 24.01.1918, pp. 3.

A partir deste número, a TRIBUNA RELIGIOSA passa a ter como endereço a Rua da

Aurora n.º 197, Recife.

Page 77: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

78

Capítulo VIII

O Fim da Guerra

A guerra, vista pela hierarquia católica e comentada nas páginas da TRIBUNA

RELIGIOSA, não apresentava nenhuma das causas encontradas pelos setores operários

da sociedade. Para a hierarquia a guerra era quase uma brincadeira de mau gosto,

praticada por meninos travessos e que estava causando um grande mal ao mundo,

embora tenha vindo para cumprir algum desígnio de Deus. Mas, na verdade, é um

distanciamento muito grande da Igreja para com os segmentos subalternos da vida

nacional. A hierarquia via a guerra como um pecado. Apenas afirma que

Esta é a posição dos católicos, de A TRIBUNA RELIGIOSA, de Dom Sebastião

Leme, arcebispo de Olinda e Recife.

Mas, a guerra veio, e os bispos tomaram a posição de católicos e de patriotas.

Admoestaram e deram uma orientação de como os católicos deveriam agir para

enfrentar o grave momento que era vivido pela Pátria e pelo mundo. Aqui em

Pernambuco, como em todo o Brasil, padres admoestaram e aconselharam os jovens a

participarem das “Linha de Tiro”. A TRIBUNA RELIGIOSA anunciava:

“O Clero não deseja a guerra porque a guerra é

um mal, mas quer a Paz porque a Paz é bem”1.

“Afaste Deus do Brasil os flagelos de uma

guerra”2.

“Do dia 1º a 10 do corrente, está aberto o

voluntariado para exército em todas as regiões

militares”. Na Terça-feira, mais de 50 jovens

foram-se apresentar ao quartel-general do Recife

para entrarem nas gloriosas fileiras do nosso

exército”3.

Page 78: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

79

Não se pode deixar de notar uma certa euforia na parte final desta nota. É um

orgulho enorme que sente A TRIBUNA RELIGIOSA. Nesse mesmo número, aparece

uma outra nota, também em linguagem de euforia. É sobre o fim da guerra que se

aproxima. É feito anúncio de uma nota alemã pedindo o final da guerra. A TRIBUNA

RELIGIOSA diz assim:

Este editorial vem acompanhado com uma foto de um anjo e, nA TRIBUNA

RELIGIOSA, começa a contagem regressiva para o dia da Paz.

A proposta do príncipe Maximiliano Baden tem por base os Quatorze Pontos

apresentados pelo Presidente W. Silson, dos Estados Unidos. No mesmo número, nas

“Notícias da Grande Guerra”, vem o seguinte telegrama:

“A nota alemã é assim concebida:

“O governo alemão pede ao Presidente dos Estados Unidos que

assuma a direção das discussões para o estabelecimento da Paz e leve

o pedido ao conhecimento dos beligerantes, convidando-os a enviar

plenipotenciários para iniciar as necessárias conversações tomando

por base das negociações a exposição feita pelo Presidente Wilson na

mensagem de 8 de janeiro, e declarações subsequentes,

particularmente as do seu discurso de 27 de setembro, a fim de impedir

a continuação da efusão de sangue. O governo alemão pede a

conclusão imediata do armistício na terra, no mar e no ar. (ass)

Maximiliano Baden”.

Oxalá, continuava A TRIBUNA RELIGIOSA, este desejo ardente de

Paz que há muito se manifesta no mundo inteiro, se venha a realizar

desta vez e brevemente. Que os homens abandonem o ódio sedento de

sangue e voltem ao trabalho, unidos todos no ósculo da Paz”6.

“Os Estados Unidos responderam à nota alemã pedindo a Paz,

declarando recusar a proposta de Armistício feita aos aliados

enquanto a Alemanha não evacuar os territórios da Entente que

ora ocupam.”7

Page 79: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

80

Na medida do possível, sendo um jornal semanal, A TRIBUNA RELIGIOSA

procura apresentar o diálogo entre as nações em direção à Paz. Não são feitos quaisquer

comentários quanto aos interesses que estão em jogo. Dentro da visão dos redatores da

TRIBUNA RELIGIOSA não importa saber muito o que ocorre por trás dos telegramas,

quais as tramas de interesses que existem e não desenvolvidas pelas nações. Apenas os

telegramas. Nenhum partido é tomado, por isso nenhuma análise é feita.

Em outro telegrama publicado nas “Notícias da Grande Guerra” diz que:

O encaminhamento em direção de paz é acompanhado em outros países. Assim

temos:

e na mesma coluna traz as notícias da Alemanha com o seguinte teor:

É desejo dA TRIBUNA RELIGIOSA informar os seus leitores, embora saiba

que ela não pode concorrer com os jornais diários. Contudo, ela atinge um público

vasto, e este público, embora com pequenos flashes, recebe as notícias e acompanha o

andamento das negociações; assim é que os seus leitores recebem as notícias da Paz:

“Na sua resposta a Wilson, a Alemanha declara desejar

discutir um Armistício sobre a base da situação atual e

em relação às forças atuais”8.

“A Áustria pediu Paz em separado ao Presidente

Wilson, aceitando todas as condições impostas

pelos aliados”9.

“a Alemanha declarou que as autoridades militares

imperiais acham-se agora, debaixo da autoridade do

povo e que a Alemanha aguarda a proposta de Paz

para um Armistício”.10

“Assinado Armistício com a Áustria cessando as

hostilidades no dia 4 às 15 horas”11

“O Armistício com a Turquia começou a vigorar às 12

horas de 31 de outubro”12

Page 80: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

81

Finalmente, na primeira página do número 43, datado de 14 de novembro de

1918, vem uma oração que tem por título “Aurora da Paz” e neste número vem um artigo

onde se explica como se alcançou a Paz com a Alemanha. Ei-lo:

Diz ainda o artigo que os alemães “sujeitaram-se a todas as imposições dos

aliados” e afirma que isso significa que foi confessada a “completa derrota”. Informa

ainda que a notícia chegou ao Recife, por volta do meio dia, da mesma Segunda-feira e

que foi “confirmada no dia seguinte por telegrama do Sr. Nilo Peçanha dirigido ao Sr.

Governador do Estado”. Passa então a descrever a cidade, na ocasião:

O Arcebispo uniu-se ao povo na alegria do fim da guerra. Foi expedido, pela

secretaria do arcebispado, o aviso sob n.º 75, que diz o seguinte:

“O Fim da Guerra”

“Na Segunda-feira, 11 do corrente, foi assinado logo de

manhã, no quartel do Marechal Foch, o Armistício pedido

pelos alemães aos aliados. Neste Armistício foi

estabelecido que as hostilidades cessariam às 11 horas

desse dia”13

.

“o entusiasmo que tal notícia despertou foi

indiscutível. A cidade embandeirou-se, manifestações

foram, improvisadas, as sirenes dos vapores surtos no

porto uniram os seus silvos ao repicar dos sinos das

Igrejas, ao troar dos canhões, e no som melodioso

das bandas muicais”.14

“Aviso n.º 75

Em regozijo pela assinatura do Armistício entre as Nações beligerantes,

menda o Exmo. e Rvdmo. Sr. Arcebispo Metropolitano que todas as Igrejas

matrizes repiquem festivamente os sinos hoje à tarde, por ocasião do toque

da Ave-Maria.

Domingo próximo, em todas as matrizes que o quiserem fazer, em seguida à

missa mais freqüentada de povo, haverá canto do “Te-Deum”.

Os Rvdmos. Vigários, convidem o povo a orar pelas intenções do Santo

Padre, o Apóstolo da Paz, cujo coração magnânimo vê hoje restituídos ao

mundo, a Concórdia e a Fraternidade.

Câmara Eclesiástica, 12 de novembro de 1918.

Mons. José de F. Machado.

Secretário do Arcebispo”.

Page 81: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

82

Foi assim que A TRIBUNA RELIGIOSA viu chegar a paz, comemorada pela

cidade, com festas, o pensamento voltado para o Papa. As palavras finais do Arcebispo

foram para as intenções do Papa, que desde o início do conflito tentou evitá-lo, ou

estancá-lo. Alguns anos mais tarde, o pensador Alceu de Amoroso Lima escreveria:

Mas, o que chama atenção é que, a partir desta data, 14 de novembro de 1918,

não há mais menção sobre a guerra, em todo o restante do mês de novembro e

dezembro, nem mesmo das repercussões ocorridas em outras partes do país, nem sobre

o encaminhamento do desarme. É como se nada mais houvesse de importância a ser

dito, agora que a guerra acabou. Para a TRIBUNA a guerra havia acabado. Não há mais

o que conversar ou discutir. Outros seriam os temas para os redatores de A TRIBUNA

RELIGIOSA. A guerra havia cumprido o seu termo. A TRIBUNA havia cumprido o

seu dever.

Referências Bibliográficas 1 T.R. n.º 12, Ano XI: 31.05.1917, pp. 1.

2 T.R. n.º 09, Ano XI: 10.05.1917, pp. 1.

3 T.R. n.º 35, Ano XI: 08.11.1917, pp. 1.

4 T.R. n.º 36, Ano XI: 15.11.1917, pp. 2.

5 T.R. n.º 26, Ano XII: 12.07.1918, pp. 1.

6 T.R. n.º 39, Ano XII: 10.10.1918, pp. 1.

7 T.R. Idem, pp. 3.

8 T.R. n.º 40, Ano XII: 24.10.1918, pp. 3.

“Por maior, portanto, que seja a diminuição do poder

efetivo da palavra do Papa, em virtude das condições da

moderna sociedade seculareizada –seu poder moral é

considerável- de modo que a mensagem de Roma assume em

nossos dias, a despeito do fracionamento da cristandade

unida de outrora, uma importância considerável para o

nosso tempo, mesmo para os que estão fora da Confissão

Católica”15

.

Page 82: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

83

9 T.R. n.º 41, Ano XII: 31.10.1918, pp. 2.

10 T.R. Idem. Ibdem.

11 T.R. n.º 42, Ano XII: 07.11.1918, pp. 3.

12 Idem. Ibdem.

13 T.R. n.º 43, Ano XI: 14.11.1918, pp. 2.

14 Idem.

15 LIMA, Alceu de Amoroso. Mensagens de Roma. Rio de Janeiro: Ed. Agir, 1950, pp.

77.

Page 83: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

84

Capítulo IX

O Monsenhor Affonso Pequeno

Uma Pena Pela Paz

A guerra é uma situação excepcional e, com isso, faz brotar emoções diversas e

traumatizantes. Diante de cada situação traumatizante, os indivíduos e as pessoas

colocam observações sobre a sua vida, uma reconsideração dos conceitos que até então

os têm norteado na vida. A Primeira guerra levou a Igreja Católica no Brasil a uma

situação de limite e ela tomou atitudes que definiram uma conduta posterior. A guerra

promoveu a possibilidade de uma nova ação conjunta entre o Estado e a Igreja, ação

que, desde a época de Dom Vital e Dom Macedo, parecia uma redefinição do papel da

Igreja diante de sociedade brasileira. Ela optou por um caminho de cooperação quase

irrestrita aos valores do Estado, esquecendo-se de praticar um criticismo sobre os

motivos reais da guerra. Temerosas de não ser considerada uma “boa brasileira”,

indicou que “é necessário que nós, brasileiros, sendo mais patriotas como os que mais o

são, fiquemos mais que nunca unidos a Deus e aos seus representantes na terra, a fim de

que, sobrenaturalizado o nosso patriotismo, chamamos sobre nós e a nossa causa a

abundância das graças divinas”, como foi a proclamação de Dom Sebastião Leme,

Bispo de Olinda, em 30 de novembro de 1917. Nessa declaração podemos perceber que

não há um vestígio de crítica sobre as verdadeiras causas da guerra. Pelo contrário,

induz o leitor e ouvinte a confundir qual a vontade de Deus e qual a vontade do homem.

É um momento crucial. A Igreja Institucional tem que se definir e defender-se de

acusações de que está ligada a um poder estrangeiro. As situações críticas exigem uma

tomada de posição rápida e clara. A Instituição tomou a sua. Não teve uma posição

crítica diante da guerra. Alguns homens, dentro da Instituição, sempre se sobressaem e,

de alguma maneira, conseguem fazer a ligação entre o passado e o futuro, não dando

créditos definitivos ao presente. O Monsenhor Affonso Pequeno é um desses homens

que não se deixa dominar pelas ondas momentâneas do emocionalismo fácil e de

interesse de certos grupos, setores da sociedade brasileira.

O Monsenhor Affonso Pequeno foi uma das mais vibrantes penas que

freqüentou as páginas dA TRIBUNA RELIGIOSA. O exemplar de n.º 1 do Ano XII,

datado de 26 de março de 1918, apresenta o elogio fúnebre do Monsenhor. Ele foi

Page 84: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

85

sepultado na Catacumba n.º 8, no cemitério da Ordem Terceira de São Francisco, em

Olinda. Os seus artigos eram assinados simplesmente como A.P.

Nasceu o Monsenhor Affonso Pequeno em Icó, Ceará, no dia 24 de julho de

1817, e fez seus estudos no Seminário de Fortaleza, porém os concluiu na Pontifícia

Universidade Gregoriana, no Pio Latino-Americano. Nos últimos anos, problemas de

saúde forçaram o então seminarista a retornar aos estudos em Olinda. Foi ordenado

sacerdote no dia 19 de agosto de 1894, em Nova Friburgo. Na época era secretário de

Dom Francisco do Rego, Bispo de Niterói. Vindo para o Nordeste, ocupou o cargo de

Vice Reitor do Seminário de Olinda, além de acumular as cátedras de História

Eclesiástica e Direito Canônico.

Mas, se o Monsenhor era um homem de letras, não lhe faltou a experiência do

contato com o povo, pois foi vigário de Villa Bella, Floresta, Belmonte e Garanhuns. O

contato com os hábitos e trabalhos dos sertanejos e agrestinos é que lhe permitiram,

mais tarde, escrever, sobre assuntos referentes à economia e ao plantio de certas

espécies nos sertões de Pernambuco. Vivendo em uma região em que o protestantismo

avançava, juntamente com outras religiões, o Pe. Affonso Pequeno fez surgir o jornal

“O SERTÃO”, levando a imprensa católica para o interior do Estado. A sua luta contra

o protestantismo o fez publicar no número 22 do Ano XI, em 09 de agosto de 1917, um

artigo onde faz a relação entre o avanço do protestantismo e uma praga que dizimava os

algodoais de Pernambuco. Ambos, segundo o Monsenhor Pequeno, vinham da mesma

fonte, os Estados Unidos da América. Em seu artigo, que tem o título A LAGARTA

ROSADA E AS NOVAS SEITAS, ele diz que, enquanto uma destrói os algodoais do

agreste, a outra pretende destruir a unidade nacional1. Na defesa dos seus ideais o seu

estilo é forte e contundente. Para estancar o fluxo do protestantismo no agreste e sertões,

o Monsenhor Pequeno fundou o Colégio Santa Sofia em Garanhuns, para atender jovens

que então estavam buscando as lições no Colégio XV de Novembro, de orientação

protestante, fundado alguns anos antes. Aliás, seria interessante um estudo de ocupação

ideológica dos sertões, não só de Pernambuco mas dos Estados vizinhos. Esses dois

colégios recebiam alunos das principais cidades da Paraíba e Ceará.

Pessoalmente, parece que o Monsenhor Pequeno era contrário à guerra. Não era

uma simples conseqüência do seguimento da linha dos bispos e da Igreja. Ele possuía

uma adesão pessoal ao pacifismo, à neutralidade. A maioria dos artigos publicados pela

TRIBUNA RELIGIOSA nos anos 1917 e 1918, até da sua morte, passaram pela sua

pena.

Page 85: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

86

O Monsenhor Affonso Pequeno tem uma sensibilidade para os efeitos da guerra

sobre a população brasileira que escapa á maioria dos analistas. Em maio de 19172 ele

analisa as conseqüências da guerra sobre alimentação da população. Na época está

ocorrendo a escassez de farinha de trigo e de farinha de mandioca. O arguto professor

argumenta que esta é uma ótima oportunidade pra que se aumente a área de plantio da

maniva e da excessiva dependência de produtos que não produzimos aqui. Na verdade,

nota o Monsenhor, serão os ricos que mais irão sentir a falta dos produtos europeus. A

guerra afeta a todos, a massa miserável sentirá pouco, pois a ausência de certos produtos

é crônica. A guerra afeta o fornecimento dos produtos pra os ricos, e o país pode lucrar

com isso, pois pode haver uma melhoria na balança comercial do Brasil, uma vez que a

guerra leva, forçosamente, a uma diminuição das importações. A análise do Professor

de Direito Canônico e de História está de olho em que a neutralidade pode e deve ser

mantida, tendo em vista os benefícios que advirão á economia brasileira. Mesmo

quando ele empunha a sua pena em defesa do clero, em artigo publicado no dia 12 de

abril de 1917, ele afirma que está defendendo o Clero

Devemos ter em mente que o Monsenhor julga as questões econômicas e os interesses

que existem por trás da guerra. Expressará os mesmos argumentos um mês depois em

um artigo outro.

O Monsenhor Pequeno não é um sonhador, embora pareça. Ele sabe dos

sacrifícios que são impostos à Nação em guerra. Ele reflete sobre as conseqüências

práticas de duma guerra para a população. Essas razões o fazem preferir a neutralidade,

pois esta pode trazer benefícios para a maioria, embora alguns pequenos grupos, os que

se alimentam de produtos importados, sejam prejudicados. Arrisca-se a passar por

covarde, mas não pretende ser o líder de um povo em direção à guerra. Bem poderia ser

dele a frase de Dom Sebastião Leme

“contra indigna insinuação de alguns jornalistas

belicosos que devemos passar ao lado dos aliados, para

não sofrermos pressões da Inglaterra”3.

“longe de mim concorrer para escaldar o espírito público.

Apóstolo da Paz, não posso pregar a guerra”5.

Page 86: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

87

Entretanto, a guerra veio. E, com ela, os problemas que os belicistas,

embriagados pelo ideal do falso patriotismo, não perceberam, ou não quiseram perceber.

A falta de alimentos, a escassez de produtos, as cotas que são determinadas a serem

enviadas aos homens em batalha, tudo isso afeta o falso patriotismo. Os descontentes

com o fim da neutralidade por causa das seqüelas que a guerra acarreta, apoquentam-se.

Queriam a guerra, mas jamais pensaram nos problemas que a guerra acarreta. Viam a

guerra como um empreendimento romântico. Estavam desiludidos. A guerra não lhes

parecia mais tão bela. Em artigo publicado no dia 16 de agosto de 1917, número 23 do

Ano XI, o Monsenhor Pequeno cobra o entusiasmo dos belicistas, cobra o patriotismo, o

falso patriotismo burguês que alegremente esperou e desejou a guerra e agora abomina

os eus efeitos, pois ales agora são atingidos em sua farinha de trigo. Mas, vejamos o

artigo do Monsenhor:

“NÃO TEMOS RAZÃO

Eu fui pela neutralidade do Brasil na guerra européia. Pensava que não nos devamos

intrometer em questões alheias. Isto dos aliados estarem defendendo o direito, a civilização, a

democracia não há ingênuo que o creia agora depois de os aliados terem declarado o seu

intuito de anexações, destruição da Turquia, desmembramento dos Impérios Centrais. O direito

da Inglaterra nem parece tão respeitável como o da Alemanha; não sei em que os alemães são

menos civilizados de que seus inimigos. Quanto à democracia, que não existe menos nos

Impérios Germânicos de que nas outras nações, não é coisa que, pelas amostras que nos têm

dado nesta adorável república, valha a pena morrer por ela. Mas, uma vez que o nosso

governo, cedendo à pressão da opinião pública que não sei se foi encomenda, ou à dos

poderosos credores de além mar e dos nossos amigos yankees, rompeu a neutralidade, manda-

me o Patriotismo que seja solidário com o Governo do meu País, porque um povo dividido é um

povo vencido. Eis porque venho defender o nosso Governo contra os clamores que se erguem

por causa da carestia de vida e dos aumentos dos impostos.

Não temos Razão.

O rompimento da nossa neutralidade que a nossa imprensa advogou com suspeito ardor,

impunha-nos obrigações para com a causa da nossa simpatia. Não tínhamos exército pra

mandar combater pela Inglaterra ao lado dos Cipaios e Zulus; devíamos mandar ao menos

gêneros alimentícios. Mas não havia barcos para o transporte. Intimaram-nos que nos

apoderaríamos dos navios alemães abrigados à sombra de nossa bandeira, e que eu também

não achei nem justo nem honroso para o Brasil. Dizia-se que era para resolver a crise do

transporte, sobretudo do nosso comércio interno. Nenhum deles se anuncia que venha a nossos

portos, mesmo porque a maioria desses portos não tem fundo para o calado dos grandes

Page 87: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

88

transatlânticos. Estes navios que vão tomando o nome das nossas cidades, servirão pra levar à

faminta Europa carnes congeladas, feijão, arroz, batatas, e até a nossa outrora farinha de pau.

Daí a carestia. Nossa posição internacional tão desejada, havendo até quem quisesse guerra

efetiva, exige que nos ponhamos em defesa, fatalmente tinha que vir o aumento das despesas e

portanto de impostos. Por que este clamor? Quisemos a causa e não queremos os efeitos! Bem

vêem que não temos razão. O Dr. Manoel Borba convida os interessados que nos ameaçam com

greves e desordens contra a carestia, a discutir e acertar com ele os meios de debelar a crise na

alimentação. Não sei que medidas poderão sugerir ao Governador. Um inverno desmantelado

não nos deu milho e feijão

. A seca de 15 destruiu mais da metade dos nossos rebanhos. Do sul não nos virá o bom

feijãozinho de São Paulo, a exportação de cereais congelados elevou o charque a um preço

fabuloso e a Argentina e os Estados Unidos nos dão trigo à ração. Se a carestia já é

insuportável ao povo agora no tempo da safra, a que será da pobreza daqui a alguns meses?

Faça-se um meeting colossal e peça-se ao meu belicoso amigo Dr. Gonçalves Maia que

propugnou com tanto civismo pela guerra do Brasil contra os Bárbaros e pelo confisco dos

navios alemães, para que faça com que ditos navios não nos levem os gêneros alimentícios

matando à fome o nosso povo e telegrafa ao Sr. Wilson par que nos mande trigo e, antes de

acudir a Europa, acuda ao Brasil, em nome da Doutrina Monroe e do Pan-americanismo que

nos fez romper a neutralidade.

A.P:”

É um linguajar rápido e preciso em que se mostra a anatomia do falso

patriotismo, das falsas análises de grupos sedentos de sangue e carentes de uma real

preocupação com as questões que atingem a maior parte da população. Em seu artigo, o

Monsenhor denuncia os falsos motivos da guerra. É provável que ele perceba que os

reais motivos não foram abordados pelos bispos como também não o foram pelos

jornalistas aos quais se referes. A sua intervenção nesse debate é de clareza meridiana,

pois demonstra a dissimulação dos motivos. Chega a duvidar se a grande campanha pelo

engajamento do Brasil na guerra não foi fruto de interesses de potências estrangeiras,

levando em consideração o fato de que a participação do Brasil na guerra, a quem

interessaria?

Analisa, também, Affonso Pequeno, a parca disponibilidade de material bélico

da Nação. Como fazer guerra sem navios, sem exército? Só mesmo pessoas de

patriotismo duvidoso levariam o país a tal situação. O Monsenhor denuncia e deixa

claro a irresponsabilidade da burguesia urbana militarista, que estava aliada aos

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89

interesses europeus, notadamente britânicos6 e

7. Argumenta Affonso Pequeno que o

esforço da guerra vem a tornar mais pesada a carga sobre os pobres, uma vez que a

carestia é uma das conseqüências doa envolvimento do Brasil no conflito europeu.

Embora preocupado em desnudar o “patriotismo” da burguesia, apenas de relance, A. P.

fala de “greves e desordens”, usando expressão própria dos detentores do poder quando

talvez o Monsenhor percebesse a real profundidade dos problemas sociais advindos com

a participação do Brasil na guerra, porém não dirige a sua análise nessa direção, quiçá

limitado pela sua posição de padre e por não pretender entrar em suas pastorais. Poderia

o Monsenhor Affonso Pequeno ter escrito mais sobre os conflitos, ou tensões sociais

que estavam ocorrendo então. Esses conflitos eram percebidos pelas classes dominantes

como “anarquistas”, obra de baderneiros, pois desde sempre ao povo não é dado o

crédito de poder-se organizar para defender e estabelecer com clareza as suas idéias.

Contudo, vale ressaltar que o Monsenhor Pequeno admite a existência desses

movimentos em que simplesmente não se menciona tais eventos nas páginas de A

TRIBUNA RELIGIOSA. A TRIBUNA RELIGIOSA prefere assumir as posições da

Liga de Defesa Nacional, este um movimento da burguesia ascendente e de caráter

militarista. A análise de A.P. é uma voz isolada no jornal.

Há uma clara percepção por parte do Monsenhor Affonso Pequeno, do jogo das

grandes potências. Ele entende que tal jogo não leva em consideração os interesses reais

dos pequenos Estados. Ironiza a Doutrina Monroe e os sentimentos de Pan-

Americanismo, que só são usados em benefício dos Estados Unidos e pouca

importância têm, nessa política, os interesses dos demais países americanos8. É por essa

razão que o Monsenhor lamenta a quebra da neutralidade, pois ela em nada beneficiou o

país, apenas veio a dar uma dimensão maior aos graves problemas econômicos e sociais

que estão esgotando a paciência do povo mais pobre. O Monsenhor entende que um não

alinhamento, ou uma neutralidade semelhante a tal posição, teria sido bem melhor para

o Brasil, seja no plano da economia doméstica, seja no plano internacional9.

Na verdade, tudo indica que para o Monsenhor Pequeno, a Paz não significa

apenas o estancamento de guerra, o fim das hostilidades. A paz requer uma economia

que efetivamente atenda aos interesses de toda a população brasileira e não apenas da

burguesia. O Monsenhor Pequeno percebe e denuncia que a falta de gêneros

alimentícios está “matando à fome o nosso povo”. Durante a guerra os preços dos

alimentos quase dobraram.

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90

Infelizmente, o Monsenhor Pequeno é uma voz isolada, além do que morreu

ainda nos primórdios da participação da Brasil na guerra. É provável que sua pena teria

voltado à cena em outros assuntos e oportunidades e teria cobrado uma outra postura

diante do conflito. Teria voltado a denunciar o vazio do discurso burguês-militarista

que, empapado de falso patriotismo levou o país a participar de uma guerra para a qual

não estava preparado, nem em homens, nem em armas.

Referências Bibliográficas

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2 T.R. n.º 11, Ano XI: 24.11.1917, pp. 2.

3 T.R. n.º 5, Ano XI: 03.04.1917, pp. 1.

4 Ver Cit. 2, acima.

5 T.R. n.º 11, Ano XI, pp. 1.

6 CARONE, Edgar. A República Velha – L. Instituições e classes sociais. São

Paulo:Difel, 1975, pp. 130.

7 As idéias de Monsenhor Pequeno chegam próximas à de Pandiá Calógeras, citado por

Nelson Werneck Sodré em História Militar do Brasil, quando afirma “Há trinta anos

está acéfaloo ministério da guerra”, escreverá o comentarista abalizado. O latifúndio só

se preocupava com os chefes militares, com sua formação, de acordo com a situação

política. “As promoções ao generalato foram felizes. Obedeceram a considerações políticas e

pessoais, a relações de amizade, muito mais do que às conveniências do serviço. Apesar de

estarmos em guerra, da responsabilidade tremenda que recai sobre quem tem que escolher os

chefes futuros de nossas tropas, seus guias nos combates; apesar de se tratar de selecionar os

homens a quem incumbirá a missão terrível, embora honrosíssima, de defender o nome do

Brasil, o brilho de sua bandeira, o resguardo da vida de seus comandados o que mais pesou no

critério da eleição foram a simpatia, serviços políticos, parentes influentes e empenhos, e não

como devera ser, o crisol do valor profissional, de dedicação á tropa, do esforço militar”.

Prossegue Nelson Werneck, demonstrando as forças do exército que ia para a

guerra: “no que dizia respeito ao aparelhamento material, a situação era precaríssima. E

surgiram, agora, iniciativas, cujas finalidades eram transparentes, de introduzir

indústrias inteiras de armas e munições, como se houvesse aqui uma siderurgia

altamente desenvolvida, que as suprisse do necessário, como se a demanda interna de

canhões fosse inexaurível. (...) A instrução estava esteticamente e dão coesão à tropa; a

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91

de combate não existia; as unidades estavam desfalcadas ou mesmo sem efetivos ou

sem verbas; “de norte a sul chovem telegramas sobre a situação precária da força, sem

cobertores, sem capotes, sem fardamentos, sem quartéis, sem viaturas, pré-retardados,

instrução nula”. A Cavalaria não tinha cavalos, a artilharia não tinha canhões, a

infantaria não tinha fuzis: a norma fora liquidada, a Instituição estava praticamente

liquidada” pp. 195.

8A crítica do Monsenhor Pequeno sobre a doutrina Monroe não se distancia do

pensamento de Alberto Torres, que cita Elihu Root “Uma falsa concepção da Doutrina

Moroe, do que ela prescreve e do que ela justifica, de seu escopo e de seus limites,

invadiu a imprensa e afetou a opinião pública, nestes últimos anos. Grandiosos planos

de expansão nacional invocam a Doutrina de Monroe. Interessa por obrigar os países da

América Central e do Sul a fazer ou deixar de fazer qualquer coisa de que cidadãos

americanos possam tirar proveito, invocam a doutrina de Monroe. Ambições de glória

nacional, alimentadas por cérebros muito vazios, para aprenderem, em seu conjunto, o

senso do dever nacional, invocam a doutrina de Monroe. A pretensão intolerante de

exercer essa espécie de superintendência sobre a conduta e opiniões de outros povos,

que é da essência da tirania, invoca a doutrina de Monroe é um título de intervenção dos

negócios internos das nações mais fracas do novo mundo”. Citado por Nelson Werneck

Sodré – pp. 197, in História Militar do Brasil – Civilização Brasileira, RJ, 1968, 2ª

edição.

9 A guerra de 1914, confirmava a inferioridade das nações que dependiam do

estrangeiro para as coisas essenciais da vida. Demonstrava, por outro lado, que éramos

capazes de improvisar várias indústrias. O nacionalismo econômico nascia, pois com a

guerra, abrindo novas perspectivas, novo trabalho”.

José Maria Bello, citado por N.W.S.

H. Militar do Brasil, pp. 198.

Page 91: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

92

Conclusão

O final do século XIX assistiu ao rompimento das relações privilegiadas entre o

Estado e a Igreja no Brasil. desde o descobrimento pelas terras brasileiras por

navegadores portugueses que o Brasil foi definido como terra pertencente à Ordem de

Cristo. Ora, como o Rei de Portugal era o Prior desta ordem também era a maior

autoridade para assuntos de religião na Colônia. Assim, todos os padres, bispos, ordens

religiosas, antes de virem ao Brasil, deveriam passar pelo território português e prestar

obediência ao rei português. Então, observamos uma perfeita união entre essas duas

instituições sócio-culturais. Uma unidade perfeita, de interesse de ambas, pois tanto o

Estado passaria a ter uma auxiliar perfeita para a dominação cultural da colônia, como a

religião via-se atendida em suas necessidades para atingir um número maior de pessoas,

visando convertê-las para a lei de Cristo. A essa situação de união perfeita dos „dois

gládios‟ para usar uma expressão querida aos teólogos e filósofos da Idade Média,

chamamos de Cristandade. A Igreja usa os meios que lhe são oferecidos pelas classes

dominantes para, através deles, converter o mundo. Historicamente isso fez crescer

numericamente a Igreja, todavia os resultados de benefícios pastorais podem ser

bastante contestados. Mas com grande esforço teórico e uma vasta produção, sendo um

dos aspectos que mais chamam atenção, agora, na Igreja da América Latina e na

Universal.

Durante o Período Colonial e durante o Império, apenas pequenas escaramuças

afetaram essa cristandade, esse pacto das duas instituições. Nesses casos o simples

afastamento dos envolvidos foi a solução, sendo que o Pe. Malagrida sofreu na fogueira

a sua desatenção ao Padroado.

Com a proclamação da Independência e o fortalecimento do clero regalista,

chegou-se a pensar-se na nacionalização do clero, procurando evitar qualquer influência

da Santa Sé nos negócios da Igreja no Brasil. Na segunda metade do século XIX o

governo brasileiro veio a tomar medidas que diminuíram as possibilidades de uma

expansão das congregações religiosas. Houve pouca defesa das ordens, por parte dos

bispos. A questão que mais emocionou a população e forçou um maior congraçamento

entre os bispos foi a prisão dos bispos em Pernambuco e Pará. Mesmo assim a

solidariedade com os bispos em prisão não teve a prontidão esperada.

Page 92: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

93

Quando da proclamação da República, ocorreu o inevitável, a separação da

Igreja do Estado, ainda no governo Provisório e, mais tarde ratificado pela Constituição

de 1891. Então a Igreja teria, agora, de viver sem o auxílio do Estado, se bem que este

auxílio nem sempre foi benéfico para a Instituição. Entretanto, uma série de privilégios

que eram concedidos ao catolicismo, vieram a ser substituídos por uma política de

indiferença e, segundo alguns observadores, até por um desprestígio que beneficiava

mais outros grupos religiosos.

A impossibilidade de contar com o apoio do novo governo na execução de sua

tarefa é que fez a Igreja tornar-se mais atuante na formação de novos bispados.

Procurava-se dar um maior dinamismo à Igreja, pois de repente ela se descobre fraca e

percebe que o auxílio recebido dos Estados nos momentos anteriores mais serviram para

torná-la dependente do que uma força realmente ativa dentro da sociedade.

No final do século XIX e no início do século XX, muitos movimentos surgiram

na igreja, procurando dar alguma resposta aos problemas que a nova realidade social

apresentava. No Nordeste, o Padre José Ibiapina promoveu uma assistência social ás

populações mais carentes, vindo inclusive a gerar preocupações às autoridades, pois

temiam ser ele um dos chefes do movimento Quebra-Quilos, conforme estudo do

Armando Souto Maior. Essa atuação do Padre Ibiapina não comoveu as autoridades

eclesiásticas, que inclusive chegou expulsá-lo da diocese de Fortaleza. O espírito

religioso do Povo Nordestino veio a promover a sua própria organização no movimento

liderado por Antônio Vicente Maciel, mais conhecido como Antônio Conselheiro. Foi

mais uma oportunidade que a igreja perdeu para uma melhor ligação com as populações

marginalizadas e periféricas da sociedade brasileira. É notória a ação da hierarquia ao

lado dos poderosos da República Velha e do Estado da Bahia, em detrimento da

benéfica ação de Antônio Conselheiro para o povo pobre do nordeste. Essa

incapacidade de compreender os signos do tempo parece acompanhar a parte

institucional da Igreja no final e início do século.

Ainda no Nordeste, foi completamente mal visto a atuação do Padre Cícero

Romão, que, apesar dos percalços, foi um momento de modernização de certas relações

sociais nos sertões nordestinos. Como não foi compreendido pela Igreja, que poderia

ter-se aplicado melhor à compreensão dos eventos. O Pe. Cícero terminou sendo usado

pelas oligarquias, tornando-se um sustentáculo dos poderes estabelecidos e parte de um

processo de alienação do povo pobre. O que poderia ter sido um passo em direção da

liberdade foi uma corrida para a alienação.

Page 93: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

94

E foram tantos os desencontros da hierarquia eclesiástica com o povo brasileiro.

Mesmo nos setores urbanos da sociedade houve uma tentativa de uma relação mais

positiva entre a hierarquia e o povo brasileiro. O Pe. Júlio Maria, primeiro redentorista

brasileiro, pregou incessantemente que a Igreja não poderia dar as costas ao povo, para

ele o verdadeiro poder dentro do Brasil. Mas, no mesmo ano em que morria o Padre

Júlio Maria, Dom Sebastião Leme, então eleito bispo para a Diocese de Olinda, que ele

irá transformar em Arquidiocese de Olinda e Recife, lançou a sua famosa pastoral, a

Pastoral de 1916. Nela estão esboçados os caminhos que a hierarquia irá trilhar. Ali é

feita a opção pelas camadas médias da população. Ali estão os caminhos que serão

seguidos por Dom Sebastião, quando ele se tornar Cardeal Arcebispo do Rio de Janeiro.

Ali estão direcionados os passos que formarão a nova cristandade, a nova aliança entre a

Igreja e a classe que tomará o poder em 1930, a classe média armada. Embora sem

descuidar de sua ligação com a República Velha, Dom Sebastião aponta para uma

aliança com a classe média ascendente. Aliás, é essa a direção que se pode notar com as

pastorais dos Bispos sobre a Boa Imprensa, publicadas ultimamente pelas Edições

Loyola em conjunto com o Centro de Estudos e Pesquisa da História da Igreja no Brasil.

uma preocupação tão grande em atingir uma parte tão ínfima da sociedade civil

brasileira será recompensada com as benesses que a Igreja volta a usufruir após a

Revolução de 1930.

No período que nós estudamos, neste trabalho, Dom Sebastião Leme é o bispo

de Olinda, e o jornal A TRIBUNA RELIGIOSA, publicado como órgão oficial de

Diocese, esponsa as idéias e as disposições do seu bispo. Podemos ver, nesse momento,

a preparação da nova cristandade que se forma, sob a direção do Cardeal Arcoverde, do

Rio de Janeiro. A atuação de Dom Leme em Recife há de levá-lo ao Rio e ao

Cardinalato. Ele será o artífice da nova aliança entre o poder político e o poder

eclesiástico. Ele estará presente na Liga de Defesa Nacional e estará presente no

Gabinete de Washigton Luiz, quando de sua deposição. Dom Leme será o principal

interlocutor dos generais nesse incidente. Ele é o chefe da Igreja no Brasil, ele dará o

tom da nova cristandade.

Dirigindo a Diocese de Olinda, Dom Sebastião Leme é o principal responsável

pela TRIBUNA RELIGIOSA. Ela é o porta voz da diocese. É através dela que se dá a

conhecer as decisões e disposições da cúria. Observando o comportamento da

TRIBUNA RELIGIOSA, podemos já adivinhar o comportamento que tomará a

hierarquia nos próximos anos.

Page 94: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

95

Durante todo o período da guerra, quase não há menção da existência de

problemas com os pobres. Embora naqueles anos tenha ocorrido uma série de

manifestações públicas contra a guerra e os grupos operários tenham se pronunciado

contra a participação do Brasil na guerra, A TRIBUNA RELIGIOSA não lhes faz eco.

Contudo, discursos de deputados, citações de autoridades, celebrações promovidas pela

Liga de Defesa Nacional, manifestações favoráveis ao governo, tudo isso aparece pelas

páginas do jornal católico. É parece-nos, uma política de cooperação em relação a um

grupo e de desassistência ao outro. Ao mesmo tempo em que desenvolve esses temas. A

TRIBUNA RELIGIOSA enfoca a necessidade de retornar-se ao ensino religioso nas

escolas, e a defesa que faz do catolicismo como religião capaz de manter a unidade

nacional é um exemplo de atitude de colaboração extensiva aos grupos dominantes. É

extremamente interessante as constantes referências ao exército e o apoio dado à

formação das Linhas de Tiro. As páginas dA TRIBUNA RELIGIOSA apontam o

compromisso com os novos estratos sociais que crescem na vida política brasileira,

assumindo todos os seus valores, inclusive com a possibilidade de denunciar os

católicos, mesmo participantes do clero, que não se enquadraram na linha patriótica

desenvolvida pela Liga de Defesa Nacional, liderada por Olavo Bilac, e assumida pelo

Bispo de Olinda. Evidentemente, a Primeira Guerra ofereceu esta bela oportunidade de

a Igreja hierárquica provar a sua fidelidade e a sua capacidade de mobilizar a população.

É lógico que isso não poderia passar despercebido pelos grupos sociais que se

encaminhavam para o poder. Os documentos pastorais expedidos pelos bispos de

diversas regiões do Brasil e publicados pela TRIBUNA RELIGIOSA são uma amostra

clara do que podem as classes governantes auferir de uma colaboração, favorecendo as

atividades da Igreja, evitando que sejam oferecidos os deveres da “consciência

católica”. Observamos ainda que, clamando os católicos a darem à Pátria “tudo quanto

ela pedir e estiver em nossas forças”, os bispos esperam que o governo não tome

nenhuma “medida de exceção contra as ordens religiosas e seus bens”. Não aparece uma

preocupação desse nível sobre as condições de vida do povo, sobre a possibilidade de

falta de gêneros alimentícios, ou coisa que o valha. A hierarquia assume os sonhos da

classe média ascendente, separa-se do povo, deixa passar uma oportunidade de estar

mais ligada ao povo.

Embora o Bispo Dom Sebastião Leme seja um dos responsáveis pela introdução

da Ação Católica no Brasil, juntamente com o Pe. Leonel Franca, devemos notar que,

tendo sido um seguidor dos ensinamentos do Papa Pio XI quanto à Ação Católica, não

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96

percebeu o lamento do pontífice que dizia ter sido um a maior perda da Igreja, a perda

da classe operária. A cristandade que se formará, e a guerra é uma preparação para tal,

será com a classe média. É uma nova cristandade, ufanista, que viverá até meados do

século XX, quando, então, os setores apontados como importantes pelo Pe. Ibiapina. Pe.

Cícero, Antônio Conselheiro, Pe. Júlio Maria e o Monsenhor Affonso Pequeno irão

desabrochar na miséria a que foram relegados pelos dirigentes hierárquicos e pelos

redatores da TRIBUNA RELIGIOSA e de outros jornais católicos do Brasil. As

contradições inerentes a uma cristandade são muitas, os enganos que ela propõe são

maiores. O maior deles é confundir as disposições de uma classe com a Igreja, isso é

querer usar e ser usado. Os herdeiros da TRIBUNA RELIGIOSA saberão disso, e

compreenderão, um pouco tarde, talvez, que as opiniões do Monsenhor Pequeno eram

as mais corretas com o encaminhamento de história e, agora, deverão dizer: “Não temos

razão” em afirmar que o povo abandonou a Igreja; foi a hierarquia, a Igreja

institucional, que preferiu, durante a guerra, aliar-se aos poderosos e olvidar o povo.

Nas páginas da TRIBUNA RELIGIOSA duma voz aponta para o caminho que será

seguindo depois. Assim, nesse jornal, que fala pela hierarquia, sobrou um lugar para os

“outros”, o lugar do futuro. O mesmo jornal aponta o presente e o passado, mas nele

podemos encontrar os passos do futuro, o futuro que seria do povo, se as elites não se

aliassem tão fortemente para evitar que o verdadeiro afiançador da vida da Nação viesse

a desabrochar. A TRIBUNA RELIGIOSA viveu enquanto o pacto entre a Igreja e a

burguesia durou, a sua morte marca, na área local, a morte dessa cristandade.

Page 96: A Primeira Guerra mundia na Tribuna Religiosa

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