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540 PSICOLOGIA: CIÊNCIA E PROFISSÃO, 2014, 34(3), 540-554 A Perda de um(a) Filho(a) Jovem no Romance Paula, de Isabel Allende The Loss of a Child (Young Adult): a Psychoanalytic reading Based on Isabel Allende's Novel, Paula La Pérdida de un(a) Hijo(a) Adulto-Joven: Una Lectura Psicoanalítica a partir de La Novela Paula, de Isabel Allende Elenice Cazanatto & Margareth Kuhn Martta Universidade Federal do Rio Grande do Sul Artigo http://dx.doi.org/10.1590 / 1982 – 3703001212013

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PSICOLOGIA: CIÊNCIA E PROFISSÃO, 2014, 34(3), 540-554

A Perda de um(a) Filho(a)Jovem no Romance Paula,

de Isabel Allende

The Loss of a Child (Young Adult): a Psychoanalyticreading Based on Isabel Allende's Novel, Paula

La Pérdida de un(a) Hijo(a) Adulto-Joven: Una Lectura Psicoanalítica a partir de La Novela Paula, de Isabel Allende

Elenice Cazanatto &Margareth Kuhn Martta

Universidade Federal doRio Grande do Sul

Artigo

http://dx.doi.org/10.1590 / 1982 – 3703001212013

Resumo: O adoecimento e a perda de um filho são situações não naturalmente esperadas naperspectiva do ciclo vital, provocando uma ruptura na vida dos pais, despertando sentimentosintensos e muito sofrimento. No romance autobiográfico Paula, a autora Isabel Allende escrevepara a filha que estava internada na UTI de um hospital, há alguns meses, com um diagnósticopouco favorável. O presente artigo trata de uma leitura psicanalítica sobre a perda de um (a)filho (a) adulto-jovem, tomando como objeto de estudo a história desse romance. A partir dametodologia proposta por Iribarry (2003) de uma pesquisa psicanalítica, é realizada a construçãode um ensaio metapsicológico. A história dessa obra aponta para a possibilidade de elaboraçãosimbólica pela perda de um filho jovem, por meio da escrita literária, tendo em vista que, emPaula, o ato de escrever torna possível à mãe retomar a palavra, em uma tentativa de inscrevera perda real da filha em uma ordem simbólica.Palavras-chave: Maternidade. Luto. Psicanálise. Literatura.

Abstract: The illness and loss of a child are situations not naturally expected from theperspective of life cycle, causing a disruption in the lives of parents, arousing intense feelingsand lots of suffering. In the autobiographical novel Paula, author Isabel Allende writes to thedaughter who was hospitalized in intensive care in a hospital, a few months ago, with a littlefavorable diagnosis. This article discusses a psychoanalytic reading about the loss of a youngadult child, taking as object of study the story of this novel. From the methodology proposed byIribarry (2003) of a psychoanalytic research, a construction of a metapsychological test is carriedout. The story of this work points to the possibility of symbolic framing for the loss of a youngchild, through literary writing, considering that in Paula, the act of writing makes it possible togo back to the word, in an attempt to enlist the real loss of daughter in a symbolic order.Keywords: Motherhood. Mourning. Psychoanalysis. Literature.

Resumen: La enfermedad y la pérdida de un hijo son situaciones no naturalmente esperadasen la perspectiva del ciclo vital, provocando una ruptura en la vida de los padres, despertandosentimientos intensos y mucho sufrimiento. En la novela autobiográfica Paula, la autora IsabelAllende escribe a la hija que estaba internada en la UCI de un hospital, desde hacía algunosmeses, con un diagnóstico poco favorable. El presente artículo trata de una lectura psicoanalíticasobre la pérdida de un(a) hijo(a) adulto-joven, tomando como objeto de estudio la historia deesa novela. A partir de la metodología propuesta por Iribarry (2003) de una pesquisapsicoanalítica, es realizada la construcción de un ensayo metapsicológico. La historia de esaobra apunta hacia la posibilidad de elaboración simbólica por la pérdida de un hijo joven, pormedio de la escritura literaria, teniendo en vista que, en Paula, el acto de escribir torna posiblea la madre retomar la palabra, en una tentativa de inscribir la pérdida real de la hija en unorden simbólico.Palabras clave: Maternidad. Luto. Psicoanálisis. Literatura.

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Os textos literários tiveram um papel funda-mental no desenvolvimento da Psicanálise,pois, por meio deles, foi possível nomear esustentar importantes aspectos teórico-psi-canalíticos. Em Freud, podemos citar o ÉdipoRei de Sófocles, uma tragédia grega que

serviu de inspiração para nomear e descrevero Complexo de Édipo, um conceito funda-mental na teoria psicanalítica. Em Lacan, oestudo sobre o delírio paranoico de Aimée ea escrita de Joyce são algumas das muitascontribuições da Literatura para a Psicanálise.

A partir de Freud e Lacan, muitos foram osdesdobramentos dessa relação, que resultaramem encontros e desencontros. O presentetrabalho foi inspirado em autores psicanalíticoscontemporâneos, que apostam na escrita li-terária como uma possibilidade de dizer oindizível e de aproximar o real do simbólico(Villari, 2000; Teixeira, 2005; Vegh, 2006;Radaelli, 2007). Tomando como objeto deestudo a história do romance Paula, escritopor Isabel Allende, buscou-se fazer umaleitura sobre a perda de um (a) filho (a)adulto-jovem, a partir dos aportes teóricosda Psicanálise.

Nesse romance autobiográfico, lançado noChile em 1994,1 Isabel Allende escreve parasua filha Paula, que estava em estado decoma profundo. O objetivo da autora eraescrever um caderno com histórias da famíliapara presentear a filha, assim que ela acor-dasse, mas o estado de inconsciência dePaula foi se prolongando e essas anotaçõesse transformaram em um romance. Na nar-rativa, Isabel Allende relata fatos de suahistória pregressa, ao mesmo tempo em quedescreve o que se passa durante o ano emque se dedicou aos cuidados de Paula, seussentimentos em relação ao processo de adoe-cimento e a perda de sua filha.

Considera-se um estudo de relevância, poisa perda de um (a) filho (a) adulto-jovemprovoca uma ruptura na vida dos pais, des-pertando sentimentos intensos e muito so-frimento. E, por tratar-se de uma situaçãonão vista como natural, na perspectiva dociclo vital, é difícil dar sentido a essa vivência,sendo que a escrita literária pode ser consi-derada como uma dessas possibilidades.

A Psicanálise e a Literatura

É Freud quem inaugura a relação da Psica-nálise com a Literatura. (Villari, 2000; Teixeira,2005; Vegh, 2006; Radaelli, 2007). Desde aobra A Interpretação dos Sonhos, em 1900,que marca o início da Psicanálise, Freud fazcomentários sobre personagens da tragédia

de Sófocles, retomando a ligação da Psica-nálise com a Literatura ao longo de toda asua obra.

Em 1907, Freud publica o texto Delírios esonhos na ‘Gradiva’ de Jensen, sua primeiraanálise de um texto literário, realizada apartir do romance Gradiva, escrito por Wi-lhelm Jensen. Nesse texto, assinala que osescritores criativos são profundos observadoresda mente humana e conseguem descreveraspectos ainda não acessíveis à ciência. Dessaforma, o escritor literário e o psicanalista be-bem da mesma fonte e trabalham com omesmo objeto, sendo que a diferença é ométodo que utilizam. O psicanalista dirigesua atenção para o inconsciente e para assuas manifestações, assim como o faz umescritor, mesmo sem ter consciência disso.

De acordo com Freud (1907[1908]/1969),existe uma ligação entre as brincadeiras dainfância, as fantasias e a produção dos escri-tores criativos. A escrita criativa é um substitutoda atividade de brincar da infância, sendoque ambas dependem da fantasia. O escritorcriativo é capaz de reconhecer, em uma ex-periência presente, a lembrança de uma ex-periência anterior, geralmente infantil, a partirda qual encontra motivação para a realizaçãode sua obra. Por isso, ao mesmo tempo emque a obra revela elementos atuais, trazconsigo vestígios da lembrança antiga.

Para Freud (1907[1908]/1969), o pano defundo de toda a criação é o princípio doprazer/desprazer e o princípio da realidade.Por meio da fantasia e da escrita criativa, épermitido ao sujeito aquilo que lhe é vergo-nhoso ou proibido na vida real. O escritoremprega métodos próprios que ajudam oleitor a se envolver com a obra, pois suaviza,altera e cria disfarces, a partir dos quais serápossível a identificação e a revelação daquiloque há de mais íntimo em suas fantasias.

Para mostrar como os escritores criativos uti-lizam recursos para provocar efeitos de es-tranheza/familiaridade aos leitores, em 1919,Freud publica o texto O estranho, um dos

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Talvez nistoconsista o po-der prodigiosoda palavra es-crita: permite-

nos preservar amemória, trans-formar o sofri-mento em for-

ça, renascer emcada estação,como as velhasárvores que de-senvolvem fo-lhas novas de-pois de cada

inverno.

(Allende,1997a, p. 23)

1 Paula foi traduzidopara mais de 15idiomas, sendo a

versão portuguesa,a ser utilizada, tra-duzida por Laura

Moutinho Nery, pu-blicada pela editoraBertrand Brasil (Rio

de Janeiro), em1997 – 7ª edição.

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mais importantes de sua obra. Nesse trabalho,desenvolve suas observações a partir doconto de Hoffmann, chamado O homem daareia, e analisa a proximidade das palavrasestranho e familiar, que, em alemão, se es-crevem unheimlich e heimlich.

De acordo com Pereira (2006, p. 34), nessetexto, Freud “evidencia de forma mais diretaa imbricação da Literatura e da Psicanáliseenquanto possibilidade de pensar a subjeti-vidade: a Literatura não está ali como ilus-tração, mas sim compondo o caminho deelaboração”. O efeito de estranhamento pre-sente na ficção depende do jogo de posiçõesem que o autor coloca o leitor. Trata-se deum caminho com torções, movimentos quese alternam e dependem da circulação delugares. Assim como o analista ou o analisante,o escritor se deixa guiar pelos significantespartindo de detalhes e fragmentos, quepodem alterar o rumo de uma escrita, oumesmo de uma vida.

Além disso, a escrita de Freud é influenciadadiretamente pela Literatura. Ele possui umestilo próprio e uma sensibilidade que o dis-tinguem como escritor. Esse estilo próprio ea importância de sua obra renderam paraFreud o Prêmio Goethe de Literatura, recebidoem 1930.2

Na ocasião da entrega do prêmio, Freudpediu para que sua filha Anna o representassee lesse um discurso, no qual salienta a im-portância da Literatura para o desenvolvi-mento do arcabouço teórico da Psicanálise.

Se Freud servia-se da Literatura para legitimarseus achados psicanalíticos, buscando sim-bolizações, palavras, formas imaginárias,figuras de linguagem e escansões que servirampara a edificação da teoria e da clínica psi-canalítica, Lacan tem com a arte uma relaçãobem mais complexa. Segundo Radaelli (2007),o desenvolvimento da Psicanálise lacanianase deu em um momento em que artistassurrealistas influentes, tais como André Bren-ton, o poeta Philippe Soupault e Salvador

Dalí, provocavam uma transformação na for-ma de pensar a arte e essas transformaçõesinfluenciaram diretamente nos estudos teóricosde Lacan.

Lacan foi residente em Psiquiatria no HospitalSainte-Anne e, em 1932, publicou a tese dedoutorado intitulada A psicose paranóica emsuas relações com a personalidade. Nessetrabalho, Lacan estuda os textos escritos poruma paciente internada, Aimée, que tinhaagredido uma atriz a qual considerava suaperseguidora. Esses textos são incluídos emsua monografia não apenas como exemplo,curiosidade ou “arte bruta”, mas sim comoa direção de uma escuta clínica (Lacôte-Destribats, 2007).

Lacan estuda a paranóia no mesmo períodoem que artistas influentes, tais como SalvadorDalí, consideravam o delírio paranóico comouma atividade criativa. Por isso, esse trabalhode Lacan é influenciado diretamente pelaarte contemporânea da época (Radaelli,2007). Portanto, para Lacôte-Destribats (2007,pp. 86-87),

Lacan não fazia uma ‘psicanálise’ de umaobra de arte. Mas, como para Freud, elelevou a sério a própria letra dos achadospoéticos de Aimée, sabendo que a escritanão é um modo de domínio da fala, masque o estilo frequentemente leva paraonde não se sabia inventar como ir.

Para Safatler (2006, citado por Radaelli,2007, p. 44), Lacan se utilizava de duas viaspara pensar a arte. A primeira delas seguia ainterpretação do material estético, buscandoo “desvelamento da gramática do desejo”,como ocorre nos textos A carta roubada, deEdgar Alan Poe, O Balão, de Jean Genet, nasanálises de Hamlet e em Despertar de Pri-mavera, de Wedking.

A segunda via pela qual Lacan pensa a arteestrutura-se em torno da irredutibilidade doobjeto estético. Segundo Radaelli (2007, p.47), Lacan entende o conceito de arte como

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2 O Prêmio Goethefoi criado em 1927,na cidade de Frank-furt. O prêmio deve-ria ser concedidoanualmente para

uma personalidadeque tivesse realiza-ções já firmadas,

cujas obras fossemdignas de uma hon-ra dedicada à me-mória de Goethe.

(Freud, 1930/1969)

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uma possibilidade de “nomear aquilo quenão se deixa ver, guardando, ao mesmotempo, sua obscuridade que, longe de serum campo de legitimação das noções metapsicológicas, é um campo de reflexõessobre os modos de subjetivação”. Por essasegunda via, Lacan pensa os textos escritospor James Joyce.

De acordo com Vegh (2006), ao escreversobre Joyce, Lacan se permite fazer uma ar-ticulação entre a obra e a biografia do autor.Isso não quer dizer que ele fez um diagnósticodo autor, mas sim que, por meio dessa arti-culação, sustentou que “Joyce fez de suaobra uma barreira protetora ante a psicose.(...) Sua obra serviu de invólucro necessárioàs epifanias a que recorreu na vida e que in-seriu em sua obra” (Vegh, 2006, p. 15).Dessa forma, Lacan utiliza a escrita de Joycepara retomar a teoria e, nessa postura dedeixar-se interrogar pela escrita, questionaum dos pilares da teoria psicanalítica, trazendoavanços para a abordagem da psicose.

A arte de Joyce fascina Lacan, principalmentepelo modo como o autor utiliza a linguagem,construindo uma escrita enigmática. Lacandiz que Joyce cria um jogo de palavras queprovoca um ponto de embaraço – real – apartir do qual é possível defrontar-se com oslimites da análise, o que lhe permitiu avançarem sua construção teórica. Lacan apresenta,dessa forma, uma nova concepção de sintoma– o sinthoma – e retira-o da condição demetáfora significante, efeito do recalque,para enraizá-lo no real, na conjunção entreletra3 e gozo4.

Dessa forma, Radaelli (2007) lembra que, sea Psicanálise trabalha com aquilo que é es-tranho a nós mesmos: o inconsciente emFreud ou o real em Lacan, a análise de umtexto literário deve partir do inconsciente,que não está ali para ser decifrado, é umobjeto a ser constituído, formando configu-rações reversíveis. Nesse aspecto, o texto li-terário é trabalhado com vistas a buscar pos-sibilidades de outros sentidos a serem arti-culados. “A análise do texto literário se apro-

xima da análise psicanalítica, pois, ao invésde buscar o conteúdo recalcado, possibilitaa criação de novos modos de pensar a partirde novos destinos para a pulsão.” (Radaelli,2007, p. 16). Villari (2000) propõe que

aquilo que pode ser questionado não éo texto literário a partir da Psicanálise,mas seu inverso, a Psicanálise a partir daLiteratura. Esse posicionamento acarretaum questionamento do saber da Psica-nálise, buscando, através do texto literárioaquilo que não alcançamos dizer enquantopsicanalistas. (p. 6)

Portanto, entende-se que, compreendendoo texto literário como uma possibilidade dedizer o indizível e de aproximar o real dosimbólico, abrem-se possibilidades de apro-ximação entre a Psicanálise e a Literatura. ALiteratura é considerada uma forma privile-giada de acesso ao conhecimento, o que re-quer o reconhecimento de que a Psicanáliseé uma teoria sempre em falta e nos remeteà leitura, privilegiando uma posição de nãosaber que nos orienta a buscar no textoaquilo que nos convoca à escrita. Ou seja, otexto literário é trabalhado com vistas abuscar possibilidades de outros sentidos aserem articulados.

O ensaio metapsicológico

O objetivo deste trabalho é realizar umaleitura psicanalítica sobre a perda de um (a)filho (a) adulto-jovem, considerando-se ahistória contada no romance Paula, de IsabelAllende. Por leitura psicanalítica, entende-se a construção de uma análise argumentativa,tendo como referência a metodologia pro-posta por Iribarry (2003) da pesquisa psica-nalítica e da construção de um ensaio me-tapsicológico.

Iribarry (2003) refere que a pesquisa psica-nalítica não exige uma sistematização com-pleta e exclusiva, visto que trabalha com oinconsciente e, portanto, com a impossibili-dade de previsão. A pesquisa psicanalítica

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3 Para a Linguística,letras são sinais gráfi-

cos elementares apartir dos quais serepresentam os vo-cábulos de uma lín-gua escrita. (Ferreira,1993). Para a Psica-nálise, a letra é umconceito estudado

sob outra perspecti-va. Costa (2008) situaa questão da letra apartir da proposta de

Freud, das forma-ções do inconscien-te, dizendo que a le-tra traz algo da pul-são que ainda de-

manda por inscrição.Para Kaufmann

(1996, p. 286), “se osignificante se situado lado do Simbóli-co, inaugurando acadeia significantepor intermédio do

falo como significan-te-mestre, a letra, porsua vez, se encontrado lado do Real”. Deacordo com o autor,Lacan define a letra apartir da metáfora dapaisagem, situando-acomo “terra do lito-ral”, “rasura de todo

traço que estejaantes”.

4 De acordo comNasio (2007, pp. 46-47), “o gozo não é oprazer, mas o estadoque fica além do pra-

zer; ou, para reto-marmos os termosde Freud, ele é umatensão, uma tensãoexcessiva, um máxi-mo de tensão, ao

passo que, inversa-mente, o prazer é um

rebaixamento dastensões. Se o prazerconsiste mais em nãoperder, o não perdernada e dispender omínimo possível, ogozo, ao contrário,alinha-se do lado daperda e do dispên-

dio, do esgotamentodo corpo levado ao

paroxismo deseu esforço”.

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não inclui entre seus objetivos a necessidadede ser generalizadora, entendendo que osseus resultados podem ser diferentes, tornandosempre possível a produção de novos sentidos.

Outra particularidade da pesquisa psicanalíticaé que ela trabalha com o significante e nãocom o signo. Entende-se que o signo é algoque traz um conhecimento de mundo, porexemplo: nuvens negras significam a presençade chuva; e o significante vai além da expe-riência vivencial, não está atrelado à expe-riência da consciência. Enquanto o signomarca a primazia de um significado, que seantecipa ao sujeito, um significante puronão impede uma associação com determinadosignificado, pois essa associação não seráúnica e pode ser até múltipla. Por isso, o sig-nificante é diferente do signo, que está ligadonecessariamente à realidade de mundo, “poissó é significante para determinado sujeitoem determinada situação”. (Juranville, citadopor Iribarry, 2003, p. 121).

Caon (citado por Iribarry, 2003) propõe o de-lineamento de algumas linhas fundamentaispara o entendimento metodológico de umapesquisa psicanalítica. A primeira definição équanto ao campo de pesquisa: o inconsciente.A segunda definição é em relação ao objeto,que se trata do enfoque ou da perspectiva apartir de uma posição ocupada pelo pesqui-sador psicanalítico, aos conteúdos incons-cientes. Quanto ao método, a terceira linhafundamental para o entendimento da pesquisapsicanalítica trata-se do procedimento peloqual o pesquisador se movimenta pelas viasou perspectivas de acesso ao inconsciente.

Sendo assim, a partir do objeto de análise –a história contada no romance Paula –, sãoutilizadas técnicas psicanalíticas – procedi-mentos – para a interpretação dos dados: aleitura dirigida pela escuta e a transferênciado pesquisador ao texto (Iribarry, 2003); acriatividade e a associação livre do pesquisador(Martta, 2008).

Para a construção do ensaio metapsicológico,é importante ressaltar que, de acordo com

Iribarry (2003), “a forma do ensaio é irmãda Literatura. A ficção é o ponto de partidae o ponto de chegada do ensaísta. Entre osdois pontos está a experiência do mesmo”(p. 129). Sendo assim, o sujeito não se retirade cena, mesmo que o objeto da experiênciaexija uma evidência fundamental. Ele mesclasempre a leitura subjetiva da experiênciacom a objetividade. “O ensaio reúne o terri-tório da irracionalidade artística com o deuma ciência organizada para a produção deconhecimento” (p. 130).

Iribarry (2003) ressalta que o ensaio traz àtona a criatividade e a sensibilidade doescritor, que deixa falar seu próprio incons-ciente e é capaz de perceber pulsões ocultasno íntimo das coisas e pessoas. Nesse aspecto,pode-se dizer que a ficção é audaciosa,porém ela deve renunciar ao princípio doprazer: “toda a ficção deverá ser corrigidapelo diálogo com a alteridade. E alteridadeé princípio de realidade” (p. 130)

Por isso, quando se constrói um ensaio me-tapsicológico, deve-se levar em conta quese trata de um texto provisório sobre os re-sultados da investigação. Após a apreciaçãodo público, as colocações deverão suscitaruma série de outras ideias e modificações,pois sempre haverá a possibilidade de outrasleituras e de novos sentidos. É por essa viaque segue a construção deste trabalho.

A ficção do si mesmo, a repetição e aescrita: tentativas de elaboração simbólicapela perda de um (a) filho (a) adulto-jovemno romance Paula, de Isabel Allende

De acordo com Ferreira (1993), o romance éuma “descrição mais ou menos longa dasações e sentimentos de personagens fictícios,numa transposição da vida para um plano ar-tístico”. Trata-se de uma “descrição ou enredoexagerado ou fantasioso” (p. 485). Autobio-gráfico, por sua vez, refere-se à “vida de umindivíduo escrita por ele mesmo” (p. 56).

No romance autobiográfico Paula, Isabel Al-lende escreve sobre o processo da escrita e

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a possibilidade de falar de si mesma pormeio de seus livros:

Minha vida se faz ao ser contada e minhamemória se fixa com a escrita; o quenão ponho em palavras, no papel, otempo apaga. (...) A escrita é uma longaintrospecção, é uma viagem às cavernasmais escuras da consciência, uma lentameditação. Escrevo tateando o silêncio epelo caminho descubro partículas de ver-dade, cristaizinhos que cabem na palmada mão e justificam minha passagem poreste mundo. (Allende, 1997b, pp. 16-17)

No decorrer da narrativa, percebe-se que aautora faz uma construção da própria históriae da história de sua filha, resgatando a origemde seus antepassados. De acordo com Costa(2008), a necessidade que todos têm decontar-se resulta na construção de uma ficçãodo si mesmo. Essa construção ficcional ex-trapola o registro imaginário, pois acontecepor meio da fantasia, permitindo a leiturado real. À medida que o desejo se inscreve,o sujeito estará submetido às leis do simbólicoe, consequentemente, inscrito na linguagem.

Segundo Costa (2008), o ato de contar-se seconstitui em um paradoxo de difícil resolução,pois precisamos ser, ao mesmo tempo, ocontador e o contado, sujeitos e objetos dalinguagem. Para tanto, diz a autora, é precisoestar dentro e fora do argumento que seproduz: “Fora, porque os humanos precisamtratar a fala como objeto de troca, produzindocerta mestria sobre ela. Dentro, porque todaa produção lida necessariamente com umrepresentante do sujeito, sem que o mesmosaiba.” (Costa, 2008, p. 17). A partir desseato, o sujeito estabelece tanto uma identifi-cação quanto uma diferença em relação aooutro, além de ser preciso levar em conta aordem geracional, visto que sempre estaráinserido em uma filiação, a partir da qualpoderá construir a sua versão da história.

Escrever também é uma forma de contar-se,de fazer uma construção ficcional do si mes-

mo. Pode-se dizer que, em Paula, a obra li-terária se refere à autora de uma formamuito particular, podendo ser consideradacomo uma construção ficcional que ela fazda própria história. Mas, é importante ressaltarque essa construção do si mesmo tem sempreo estatuto de ficção e, para a Psicanálise, aficção não tem exatamente um estatuto deconceito, visto que o fundamento conceitualé diferente de outras disciplinas e liga-se aoefeito que produz.

Nesse aspecto, diz Gagnebin (2006): antesde teórico, o psicanalista é o relator do tes-temunho, ou seja, aquele que consegueouvir a narração do outro e que aceita quesuas palavras levem adiante, como em umrevezamento, a história do outro. É somentea transmissão simbólica que possibilita nãorepetir infinitamente, mas ousar esboçaroutra história, a inventar o presente.

De acordo com o autor, “não é a sensaçãoem si (...) que determina o processo daescrita verdadeira, mas sim a elaboraçãodessa sensação (...), a transformação,pelo trabalho da criação artística, da sensa-ção em linguagem, da sensação em sen-tido”. (Gagnebin, 2006, p. 154). Isabelescreve:

Minha infância foi um tempo de medossilenciados. (...) Sempre me senti diferente,desde que me entendo por gente vivimarginalizada; não pertencia realmente àminha família, ao meio social, a um grupo.Suponho que desse sentimento de solidãonascem as perguntas que me impelem aescrever, na busca de respostas se fazemos livros”. (Allende, 1997b, pp. 72-73)

Ao contar a sua história e a história de seusantepassados para que a filha, que estavaem coma e com a possibilidade de ter sofridodanos neurológicos irreversíveis, pudesse lerquando acordasse, pode-se pensar que, paraalém daquilo que está dito, a autora escrevepara que a filha possa de alguma forma con-tinuar existindo, fazendo parte de sua vida.Assim, ela se refere:

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Até agora não compartilhei meu passado,é meu último jardim, onde nem mesmoo amante mais íntimo se insinuou. Fiquecom ele, Paula, talvez lhe sirva paraalguma coisa, porque creio que o seupassado não existe mais, que você operdeu nesse longo sono, e não sepode viver sem lembranças. (Allende,1997b, p. 36)

Pode-se pensar que, para a autora, a escritaliterária se tornou uma forma de continuar acomunicar-se com a filha que estava emcoma profundo: “Escute, Paula, vou contaruma história para que você não se sinta tãoperdida quando acordar” (Allende, 1997b,p. 9); “não sei como atingi-la, chamo-a enão me ouve, por isso escrevo para você”(Allende, 1997b, p. 106).

O exercício da escrita configura a possibilidadede enfrentar, por meio da atividade intelectual,a ameaça do esquecimento, do silêncio eda morte. Enquanto a transmissão oral vivaé frágil e efêmera, a escrita permite a con-servação, por meio de uma inscrição quetalvez perdure por mais tempo, mas que de-senha o vulto da ausência, visto que “nem apresença viva nem a fixação pela escrituraconseguem assegurar a imortalidade; ambas,aliás, nem mesmo garantem a certeza daduração, apenas testemunham o esplendore a fragilidade da existência, e do esforço dedizê-la” (Gagnebin, 2006, p. 11).

O ato de escrever pode ser consideradocomo uma tentativa de perpetuar a lembrançade uma história, de não esquecer dos mortos,dos vencidos, e de não calar suas vozes.Mas, ao mesmo tempo em que luta contraas forças do esquecimento, a escrita corre orisco de petrificar o presente, na medida emque para escrever é necessário codificar efixar, transformando a plasticidade em rigidez,afirmando e confirmando sua ausência eprenunciando a sua morte (Gagnebin, 2006).

No decorrer da narrativa, Isabel afirma queé comum ela escrever quando perde pessoasque foram importantes em sua vida, ou per-

cebe a possibilidade de perdê-las. Sobre amorte da avó, Isabel diz que “escrevia men-sagens em pedaços de papel, dobrava-oscom cuidado e os prendia com um alfineteno tecido grosso para que ela os encontrassee soubesse que eu não a esquecera” (Allende,1997b, pp. 40-41).

Isabel também se mostra identificada com oavô. Ela lembra que ele era um grande con-tador de histórias, dotado de humor negro,capaz de contar cenas horripilantes soltandoboas gargalhadas. Os casos acumulados du-rante tantos anos, os principais acontecimentoshistóricos do século, as extravagâncias da fa-mília, os infinitos conhecimentos que adquiriuem suas leituras proporcionaram à neta ma-terial suficiente para escrever muitos livros.Quando o avô adoeceu, ela estava no exílioe, por isso, resolveu escrever uma carta paradespedir-se dele:

Hoje são 8 de janeiro de 1992. Nestemesmo dia, há onze anos, comecei emCaracas uma carta para me despedir demeu avô, que agonizava com um séculode luta nas costas. (...) Pouco depois ovelho morreu, mas o texto tinha tomadoconta de mim e não pude parar (...). Nofinal daquele ano tinham-se acumuladoquinhentas páginas numa sacola de lonae compreendi que aquilo não era maisuma carta; então anunciei timidamenteà família que tinha escrito um livro. (...)Este livro me salvou a vida. (Allende,1997b, pp. 16-17)

Isabel refere que, em todos os anos, nessamesma data, começa a escrever seus livros.Essa é também a data em que ela iniciou olivro Paula.

Sendo assim, é interessante considerar oconceito de rastro, que é trabalhado porGagnebin (2006). Trata-se de um conceitoobscuro que procura manter juntas a pre-sença do ausente e a ausência da presença.A escrita é considerada um rastro privile-giado que os homens deixam de si mesmos,sendo por muito tempo considerada o rastro

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mais duradouro, capaz de sobreviver àmorte de seu autor e deixar sua mensagem.“O rastro inscreve a lembrança de uma pre-sença que não existe mais e que semprecorre o risco de se apagar definitivamente.Sua fragilidade essencial e intrínseca contra-ria o desejo de plenitude, de presença e desubstancialidade.” (p. 44).

Em relação ao romance Paula, pode-se pensarque, decifrando os rastros e juntando osrestos de sua história, a autora busca manterpresente aqueles a quem perdeu, ao mesmotempo em que tenta lidar com a sua ausência– seja a ausência física, seja a psíquica. Isabelse refere à morte dos avós, ao desapareci-mento do pai, ao desaparecimento do irmão,à separação do esposo, às constantes mu-danças de país, ao exílio durante o GolpeMilitar no Chile, à perda dos sogros, àsperdas materiais, dentre outras perdas queteve durante a vida.

Para justificar o desaparecimento do pai,Isabel escreve que criou razões mórbidas efantasiosas:

Na infância imaginei-o como um criminosoe mais tarde, quando soube de perversõessexuais, atribuí todas a ele, mas pareceque nada tão romanesco ornamenta seupassado; era apenas uma alma covarde;um dia se viu acossado pelas própriasmentiras, perdeu o controle da situaçãoe escapuliu. (Allende, 1997b, pp. 26-27)

A fantasia é um mecanismo utilizado parasuportar as situações de perdas. Para Freud(citado por Nasio, 2007, p. 9), “a fantasia éo reino intermediário que se inseriu entre avida segundo o princípio de prazer e a vidasegundo o princípio de realidade”. De acordocom Nasio (2007, p. 10), a fantasia é um ro-mance de bolso que podemos abrir em qual-quer lugar e que irá interferir na realidadeimediata. Trata-se, diz o autor, de “um teatromental catártico que encena a satisfação dodesejo e descarrega sua tensão”. Isabel refereque, em seu terceiro livro, Eva Luna, a per-sonagem principal da trama diz: “Quando

escrevo, conto a vida como eu gostaria queela fosse, como um romance.” (Allende,1997b, p. 360).

Enquanto narra a história do romance Paula,percebe-se que Isabel estabelece uma relaçãomuito próxima entre as situações de perdase o processo da escrita literária – que podeser considerada uma mistura de ficção,fantasia e realidade –, como forma de lidarcom as situações que vivencia. “O temposolitário com a escrita é o meu tempo mágico,a hora das feitiçarias, o único tempo capazde me salvar quando tudo em volta ameaçaruir” (Allende, 1997b, p. 430). Em outro tre-cho, ela refere: “A partir das primeiras linhas,outros desígnios se apoderaram da carta,afastando-me da história incerta da famíliapara explorar o mundo seguro da ficção”(Allende, 1997b, p. 382).

Isabel cita não só as perdas, devido à mortede pessoas queridas, como também as mu-danças, perdas materiais e separações. “Entrefurtos, exílio, divórcio e viagens houve tantasperdas, que agora basta que eu compre al-guma coisa, para ir me despedindo dela,porque sei quão pouco irá durar em minhasmãos” (Allende, 1997b, p. 163).

Para Radaelli (2007), a escrita literária permitea construção de um litoral, no limite entre osaber e a verdade do inconsciente, trazendoconsigo o selo da ficção, que é a verdade dosujeito. Pode-se levantar a hipótese de que,ao rememorar essas experiências dolorosase contar por meio da escrita literária, Isabeltenta suportar a dor e a angústia diante dapossibilidade de perda da filha.

Para Nasio (1997, p. 57), quando existe aameaça de perder alguém que amamos surgea angústia. A angústia é uma reação à ameaçada perda de um objeto amado, que protegeo eu da ruptura e do trauma da perda.Quando alguém está condenado à morte,como no caso de uma doença grave, o eu seprepara para a separação: “É verdade queestou me distanciando, a dor é um caminhosolitário” (Allende, 1997b, p. 157).

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No decorrer da narrativa, Isabel se refere àdor por perceber que o mais provável é quea filha não acorde do coma profundo: “Jogo-me nestas páginas numa tentativa irracionalde vencer meu terror, parece que dandoforma a esta devastação poderei ajudar vocêa me ajudar, o meticuloso exercício da escritapode ser a nossa salvação” (Allende, 1997b,p. 17). Em outro momento, escreve: “Minhaavó escrevia nos seus cadernos para retermomentos fugidios e tapear a memória fraca.Eu tento distrair a morte” (Allende, 1997b,p. 230).

Nasio (1997) ressalta que a dor é uma defesacontra a loucura e o naufrágio do eu. A doré o real que invade, e a simbolização só serápossível mais tarde, quando se iniciar o tra-balho de luto. “Em si, a dor não temnenhum valor nem significado. Ela está ali,feita de carne ou de pedra, e, no entanto,para acalmá-la, temos que tomá-la como aexpressão de outra coisa, destacá-la do Real,transformando-a em símbolo” (p. 19) . Isabelescreve:

Decidi não procurar alívio nos remédios;este é um caminho que devo percorrersangrando. (...) A estranha doença deminha filha talvez seja como aquele parto:preciso apertar os dentes e resistir comcoragem, sabendo que este tormentonão será eterno, que um dia ele termina.Como? Só pode ser com a morte (...)Deixo a dor me invadir sem lhe opormais qualquer resistência. (Allende, 1997b,p. 409, 450)

Segundo Nasio (1997), não é a ausência dooutro que causa a dor, mas o vazio com oqual se depara o nosso desejo, que ficaprivado de seu objeto excitante. No caso deuma perda, a dor remete à necessidade deuma separação, causando uma transformação,principalmente pela ideia de que será precisoreconstruir a vida sem o outro. Para o autor,quando se perde alguém que se ama, a co-nexão e a textura de uma fantasia indispensávelà nossa estrutura deixam de existir. Perdemosaquele que sustenta o nosso desejo, objeto

das projeções imaginárias de nossas imagensinteriores e o ritmo da força do desejo. Porisso, deparamo-nos com uma tensão internaque é extrema, e isso é a dor que aparece nolimite do sofrimento e da loucura.

A dor enquanto afeto “é um estremecimentofinal que comprova a vida e o nosso poderde nos recuperarmos” (Nasio, 1997, p. 20).Por isso, a dor nem sempre é patológica epode ser entendida como uma passagemque leva a atravessar algum limiar. “Não semorre de dor”, ao contrário, “enquanto hádor, também temos as forças disponíveispara combatê-la e continuar a viver” (pp.19-20). Isabel refere: “A dor é inevitável nanossa passagem pela vida, mas dizem quepode ser quase sempre suportável se nãohouver resistência e se não acrescentarmosa ela o medo e a angústia” (Allende, 1997b,p. 263).

Quando existe a ameaça de morte a dor doluto começa a ser nomeada antes de aparecer,permitindo que o trabalho de luto se inicieantes da morte da pessoa amada, o que sig-nifica uma dor integrada ao eu, emboraainda insuportável (Nasio, 1997).

Isabel consegue, por meio da escrita, referir-se à iminência da perda da filha, entendendoque ela não é mais a destinatária daquiloque está sendo escrito: “Já não escrevo paraque minha filha não se sinta tão perdidaquando acordar, porque ela não acordará.Estas páginas não têm destinatário, Paulanunca poderá lê-las” (Allende, 1997b, p.285). Em outro momento, a autora afirma:“Sua única saída é a morte, filha, agora meatrevo a pensar isto, a dizê-lo para você, aescrevê-lo no meu caderno amarelo” (Allende,1997b, p. 451).

Levanta-se a hipótese que Isabel escrevesobre a perda da filha buscando uma formade lidar com esse evento traumático. ParaFreud (1920/1969), a repetição de uma ex-periência traumática constitui-se em umatentativa de elaboração dessa experiência.Para Lacan, o traumático de Freud é o real,

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que não cessa de se inscrever. Nessa pers-pectiva, pode-se considerar que, na cons-trução ficcional dessa obra literária, existeum processo de rememoração das perdas –eventos traumáticos – por meio da escrita,em uma tentativa de inscrição simbólicapara dar conta desse real que não cessa. Apartir da escrita literária, Isabel passa aassumir uma posição ativa diante das expe-riências de perdas vividas passivamente.

De acordo com Gagnebin (2006), uma me-mória traumática impossibilita à linguagemcotidiana e à narração tradicional assimilaremo choque, o trauma, visto que este, por de-finição, fere, separa, corta ao sujeito esseacesso ao simbólico, em particular, à lingua-gem. “O trauma é a ferida aberta na alma,ou no corpo, por acontecimentos violentos,recalcados ou não, mas que não conseguemser elaborados simbolicamente, em particularsob a forma de palavra, pelo sujeito” (Gag-nebin, 2006, p. 110). Como refere Isabel:“É muito difícil escrever estas páginas, Paula,percorrer de novo as etapas desta viagemdolorosa, avivar os detalhes, imaginar comoseria se você tivesse caído em melhoresmãos” (Allende, 1997b, p. 34).

Segundo Gagnebin (2006), a rememoraçãonão implica somente repetir aquilo que selembra, mas abrir-se “aos brancos, aos bura-cos, ao esquecido e ao recalcado, para dizer,com hesitações, solavancos, incompletude,aquilo que ainda não teve direito nem àlembrança nem às palavras” (p. 55). A re-memoração implica uma atenção precisa aopresente, em particular às estranhas ressur-gências do passado no presente, visto que“não se trata somente de não se esquecerdo passado, mas também de agir sobre opresente. A fidelidade ao passado, não sendoum fim em si, visa à transformação do pre-sente” (p. 55). Assim expressa Allende (1997b):

Escrever me faz bem, apesar de ser às vezespenoso, porque cada palavra é como umaqueimadura. Estas páginas são uma viagemirreversível por um longo túnel, não enxergoa saída, mas sei que deve haver alguma; im-

possível voltar atrás, tudo é questão de conti-nuar avançando passo a passo, até o final. Es-crevo procurando um sinal, esperando quePaula rompa seu implacável silêncio e meresponda sem voz nestas folhas amarelas, outalvez o faço somente para superar o espantoe fixar estas imagens fugazes antes que elascaiam no esquecimento. (p. 330)

Durante a construção do romance, perce-be-se que Isabel estabelece certa continuidadeem relação aos fatos passados e atuais, queestão relacionados a experiências de perdasreais e simbólicas. Por meio da escrita, aautora repete suas histórias de perdas, re-memorando-as: “As recordações de minhainfância são dramáticas, como as de todomundo, suponho, porque as coisas banaiscaem no esquecimento, mas isso tambémpode se dever à minha inclinação para a tra-gédia” (Allende, 1997b, pp. 76-77).

Segundo Nasio (1997), a cada perda, o indi-víduo pode reviver suas perdas antigas. Oautor refere-se a Freud e a Lacan e desenvolvea ideia de que o luto é um “buraco noReal”, opera como o núcleo central de umturbilhão de energia, como um abismo emcujas bordas o sistema simbólico gravitariaem um movimento centrípeto. Nasio (1997)ressalta que não se perde uma pessoa quandoela morre, mas após um longo processo deelaboração, que implica um laborioso processode recalcamentos, diversos retornos do re-calcado, sintomas e flutuações na vida dosujeito.

Para Mannoni (1995), a elaboração do lutopela morte de um filho é quase impossível,visto que o adulto jamais se recupera deuma experiência como essa. “Ele se vê am-putado de uma parte de si mesmo, projetadana sua descendência. Vê-se de repente muitovelho, como que fora do tempo, e que nãopode mais sonhar com o futuro através desua descendência” (p. 93). A autora ressaltaque Freud perdeu sua filha Sophie e seuneto Heinele, filho mais novo de Sophia.Nesse período, o autor trocou muitas cartascom Jones, partilhando sua dor.

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Mannoni (1995) se refere a uma passagemem que Freud observa que “a ferida narcísica”aberta nessas ocasiões é irreparável, atingindoo sujeito de forma tão radical que ele nãotem palavras para traduzir o que sente. “Amorte do filho despedaça o pai” (p. 94).

Zygouris (1995, p. 100) em seu artigo Umapalavra que falta, diz que não existe, ouainda não foi criada uma palavra para nomeara mãe ou o pai que perdem seu filho. Aautora ressalta que “não faz parte da ordemnatural das coisas a criança morrer antes da-quele e daquela de quem ganhou a vida eque terão de sobreviver. Quando a ordemda natureza se inverte, não há palavras”.

Segundo Zygouris (1995), a perda de umente querido é sempre marcada por umnome, que designa a relação com o falecidoe que coloca o indivíduo em uma posiçãopassiva diante daquele que morreu. Por exem-plo, a morte de um esposo deixa a mulherviúva, a morte dos pais deixa os filhos órfãos.Porém, como poderíamos chamar um pai euma mãe que perdem seu filho?

A ausência de um nome equivalente ao deum órfão, do lado parental, não permite aeste pai ou a mãe ocupar uma posição passivade vivo perante a morte de seu filho. Penso,justamente, não existir posição passiva de vivoante tal acontecimento. É essa a “coisa” quefalta. (...) Podem, caso tenham as palavras, eessas não faltam, queixar-se, gritar acusar,esquecer, fazer outros filhos, mas nenhumapalavra significando seu luto e o direito a elevirá inocentá-los, seja perante si mesmos,seja perante os demais. (Zygouris, 1995,p. 101)

Nessa perspectiva, é importante considerarque, se para Freud (1924/1969), o filho é osubstituto simbólico para o falo e, se paraKehl (1998), o falo é a fala5, na perda de umfilho a mãe se vê diante do real da castração,em todos esses sentidos. Talvez por isso aperda de um filho seja tão traumática para amãe: ao mesmo tempo em que perde ofilho/falo, fica privada de palavras que pos-

sam nomear essa perda, o que a remete tam-bém à castração da fala. Por isso, pode-sepensar que, por meio da construção da pró-pria história, pela escrita literária, e do me-canismo da repetição, Isabel busca umasaída para enfrentar a dor pela iminência daperda da filha.

E, nesse aspecto, levanta-se a hipótese deque a escrita literária pode se constituir emuma tentativa de elaboração simbólica pelaperda de um filho, visto que, por meio dela,torna-se possível retomar a palavra, em umatentativa de inscrever a perda em uma ordemsimbólica. Como refere Isabel Allende:

O processo alegre de gerar um filho, a paciênciana gestação, a força para trazê-lo à vida e osentimento de profundo assombro em queisso culmina só podem ser comparado àcriação de um livro. Os filhos, como os livros,são viagens ao nosso interior, nas quais ocorpo, a mente e a alma invertem seus rumos,regressando ao próprio centro da vida. (Allende,1997b, p. 321)

Considerações finais

Considerando-se a proposta de realizar umaleitura psicanalítica sobre a perda de um (a)filho (a) adulto-jovem, a partir do romancePaula, de Isabel Allende, é possível pensarque a história dessa obra aponta para aescrita literária como uma possibilidade dese constituir em uma das saídas possíveisdiante da dor pela perda de um filho. Diz-sedor porque, em uma primeiro momento, épreciso lidar com a dor, com a ruptura pro-vocada pela perda, para que mais tarde otrabalho de luto se inicie.

Na construção da história do romance, exis-tem dois momentos distintos: o primeiro, emque a mãe escreve para que a filha possa lerquando acordar e que pode ser entendidocomo um intenso investimento afetivo, pro-vocado pela iminência da perda; e o se-gundo momento, em que a mãe percebeque a filha não lerá o livro, mas, mesmo

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5 Para Kehl (1998),na contemporanei-dade as mulheres

buscam um discur-so próprio que vaialém da maternida-de e do casamento.Segundo a autora, oque faz a diferença,tanto na feminilida-de quanto na mas-culinidade, não é terou não ter o pênis,mas ter ou não ter o

“falo da fala”,o Verbo.

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assim, continua a escrever, entendendo-seque, a partir de então, a dor da perda co-meça a ser simbolizada.

Ao ler a obra, é como se estivéssemos acom-panhando o desenrolar de um processo tera-pêutico, com suas angústias, elaborações e atomada de novos rumos. Nasio (1997), ao dis-correr sobre o lugar ocupado por aqueles quese propõem a escutar a dor do outro – e nessecaso em específico, pode-se pensar na dor de

uma mãe diante da perda de um filho –, re-fere que a dor se irradia para quem escuta.

Por isso, em um primeiro momento, há quese colocar no lugar daquele que, somentepor sua presença, mesmo que silenciosa, po-derá dissipar o sofrimento e receber suas ir-radiações. É desse lugar que a impregnaçãoaquém do que é dito verbalmente pode ins-pirar as palavras adequadas para expressar ador e por fim acalmá-la.

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Elenice CazanattoEspecialista em Psicologia Clínica pela Universidade Caxias do Sul – RS. BrasilE-mail: [email protected]

Margareth Kuhn MarttaDoutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Docente daUniversidade Caxias do Sul – RS. Brasil.E-mail: [email protected]

Endereço para envio de correspondência:Rua Júlio de Castilhos, nº 940, sala 206, centro. CEP: 95180-000. Farroupilha, RS. Brasil

Recebido 10/04/2013, Aprovado 12/12/2013.

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