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A ORIENTAO PARA A FORMAO PROFISSIONAL DE JOVENS COM DEFICINCIA PROFISSIONAL

A ORIENTAO PARA A FORMAO PROFISSIONAL DE JOVENS COM DEFICINCIA PROFISSIONAL

por

Adelaide do Amparo Duarte Claudino

Livros SNR n 11

SECRETARIADO NACIONAL PARA A REABILITAO E INTEGRAO DAS PESSOAS COM DEFICINCIALISBOA1997

NDICE

NOTA PRVIA1INTRODUO5PARTEIPERSPECTIVAS CONCEPTUAIS DA DEFICINCIA INTELECTUAL11Captulo 1Definies e Classificaes da Deficincia Intelectual13Captulo 2Abordagens Tericas da Deficincia Intelectual27PARTEIIA ORIENTAO DA CARREIRA EM CASOS DE DEFICINCIA INTELECTUAL37Captulo 3Modelos Tericos de Orientao e sua Aplicao em Casos de Deficincia Intelectual391.A abordagem trao-factor432.Modelos de tomada de deciso453.O modelo de Holland504.O modelo desenvolvimentista de Donald Super53Captulo 4Abordagens Especficas do Desenvolvimento da Carreira em Casos de Deficincia Intelectual61PARTEIIIA ORIENTAO PARA A FORMAO EM CASOS DE DEFICINCIA INTELECTUAL71Captulo 5A Formao Profissional de Indivduos com Deficincia Intelectual em Portugal731.Formao profissional e reabilitao752.A situao em Portugal79

Captulo 6O Papel da Orientao no Processo de Formao: Programas de Interveno851.Consideraes gerais em orientao para a formao872.Programas de interveno923.A formao dos tcnicos intervenientes no processo98Captulo 7Avaliao das Aptides no Contexto da Orientao para a Formao em Casos de Deficincia Intelectual1011.Consideraes gerais sobre avaliao psicolgica em casos de deficincia intelectual1032.Avaliao das aptides112PARTEIVA BATERIA DE TESTES DE APTIDES NATB E A SUA UTILIZAO EM POPULAES COM DEFICINCIA INTELECTUAL119Captulo 8A NATB no Contexto da Orientao de Grupos Minoritrios1211.O desenvolvimento da NATB1232.A composio da NATB125Captulo 9A Forma Portuguesa da NATB e o seu Ensaio Preliminar131Captulo 10Utilizao da Forma Portuguesa da NATB com um Grupo com Deficincia Intelectual1411.mbito do estudo1432.Definio das variveis, constituio da amostra e sua caracterizao1463.Procedimentos1513.1Aplicao da WAIS e determinao do QI1513.2Aplicao do Pr-teste da NATB1553.3Ensaio da NATB com um pequeno grupo1563.4Aplicao da bateria NATB159

Captulo 11Anlise dos Resultados1631.Anlise de itens e consistncia interna1652.Anlise da distribuio dos resultados dos testes1782.1Anlise da distribuio dos resultados da escala da WAIS reduzida1782.2Anlise das distribuies dos resultados brutos dos testes da NATB1833.Intercorrelaes1914.Anlise factorial1935.Correlao entre os resultados dos testes da NATB e a avaliao de desempenho nas reas de formao201CONCLUSES209BIBLIOGRAFIA217ANEXOS235

Prefcio

Procurando apoiar-se na Psicologia Diferencial, a Orientao Profissional surgiu, no final do sculo 19 e princpios do sculo 20, na Europa e na Amrica do Norte. Desde ento tem conhecido uma grande evoluo, sobretudo acentuada a partir de 1950, e ao mesmo tempo uma ampla difuso a nvel mundial, existindo hoje servios de orientao em muitos pases de todos os Continentes. Na dcada de 50 ocorre uma mudana muito importante, em oposio crtica ao modelo clssico e pontual de "trao-e-factor", quando aparecem as teorias desenvolvimentistas, nomeadamente as de Eli Ginzberg e de Donald Super, que passaram a influenciar decisivamente a prtica da Orientao nos anos 70.Em funo dos contactos cientficos que mantive pessoalmente com Super desde 1967, as suas perspectivas inovadoras foram desde logo introduzidas no Curso Superior de Psicologia criado em 1977 na Universidade de Lisboa, depois transformado em 1980 na respectiva Faculdade de Psicologia e de Cincias da Educao, onde Adelaide Claudino obteve a sua Licenciatura em Psicologia.Durante os ltimos vinte anos, foi levantado com frequncia o problema de as diversas teorias propostas sobre o desenvolvimento da carreira serem inadequadas ou menos satisfatrias no caso das mulheres e de alguns segmentos da populao, nomeadamente as minorias tnicas, os imigrantes e as pessoas com necessidades especiais educativas ou de formao. Em algumas obras entretanto publicadas, uma das tendncias tem sido a de mostrar a aplicabilidade das referidas teorias a vrios grupos especiais, enquanto outros estudos apontam para a necessidade de alteraes ou de modelos separados para o efeito. O assunto continua a ser controverso e poder justificar, na minha opinio, o facto de os avanos registados serem menos significativos nestes sectores.Por outro lado, na prtica da Orientao com grupos especiais tem havido oscilaes entre o recurso a tcnicas diferentes ou a abordagens diversas ou a adaptaes em tcnicas utilizadas com a generalidade da populao, todos as opes suscitando uma particular ateno na avaliao das suas vantagens e limitaes. As consideraes formuladas sobre as teorias do desenvolvimento da carreira e a prtica da Orientao de grupos especiais constituem uma explicao plausvel de neste campo a renovao desenvolvimentista se ter manifestado relativamente mais tarde. Parece corresponder tambm situao na Orientao de jovens com nvel intelectual baixo, razo pela qual o presente livro de Adelaide Claudino de certo modo um trabalho pioneiro em Portugal.Nos anos 80, a autora tinha sido minha aluna no curso de licenciatura em Psicologia, na Faculdade de Psicologia e de Cincias da Educao da Universidade de Lisboa, qual voltou mais tarde para frequentar o curso de Mestrado em Cincias da Educao, na rea de Pedagogia na Sade. Nesse contexto, preparou a dissertao de Mestrado intitulada "A Orientao para a Formao Profissional de Jovens com Deficincia Intelectual", a qual tive muito gosto em acompanhar e apoiar. A propsito, devo salientar o trabalho rduo e srio de Adelaide Claudino, demonstrando interesse muito elevado por uma temtica que se liga especialmente sua actividade profissional como psicloga no campo da formao profissional e da reabilitao.A dissertao ficou concluda em 1995 e evidencia claramente o itinerrio seguido por quem a escreveu. A autora procurou conhecer melhor os modelos tericos da Orientao e Desenvolvimento da Carreira e a sua aplicao em casos de jovens com deficincia intelectual, numa perspectiva concreta de formao profissional e reabilitao. Neste mbito, investigou tambm as possibilidades da forma portuguesa da bateria NATB (Nonreading Aptitude Test Battery), preparada pelo Servio de Emprego dos Estados Unidos da Amrica na sequncia da Bateria GATB (General Aptitude Test Battery) e com o objectivo de avaliar as mesmas aptides em alguns grupos especiais com dificuldades de leitura. Em sntese, o estudo realizado tem objectivos ambiciosos num vasto horizonte e conduziu a resultados valiosos. Assim, a sua leitura pode revestir-se de interesse como trabalho de investigao psicolgica e, ao mesmo tempo, de utilidade para a prtica da orientao e formao profissional em Portugal.Termino endereando as minhas felicitaes ao Secretariado Nacional de Reabilitao por proceder agora edio da dissertao de Mestrado de Adelaide Claudino, que sai assim do quadro universitrio em que foi elaborada para se tornar acessvel a um pblico mais vasto de leitores.

Lisboa, 18 de Novembro de 1996J. Ferreira Marques

NOTA PRVIA

A realizao deste trabalho insere-se na etapa final da concluso do curso de Mestrado em Cincias da Educao, rea de Pedagogia Sade. Decorre da experincia desenvolvida em actividades de formao para pessoas com deficincia intelectual e foi motivado pela necessidade de aprofundar conhecimentos e competncias no mbito do papel profissional desenvolvido h cerca de 10 anos, assim como da necessidade de reflectir sobre a prtica da formao e de a enquadrar teoricamente de uma forma mais estruturada e funcional.A escolha do tema do trabalho decorre essencialmente de trs grandes preocupaes experimentadas ao longo da actividade profissional. A primeira, de ordem terica e metodolgica, relaciona-se com a necessidade do estudo de instrumentos de avaliao psicolgica, no processo de orientao para a formao, e da aplicao das teorias do desenvolvimento da carreira, s escolhas vocacionais das pessoas com deficincia intelectual.A segunda, inclui-se nas questes sobre poltica de reabilitao. Na prtica, a abordagem fundamental da orientao e a sua relao com o sistema de reabilitao constitui um estmulo realizao deste trabalho.Por ltimo, a ideia da utilidade de um instrumento de trabalho para a avaliao psicolgica de aptides, inexistente em Portugal, que possibilite a orientao para a formao contribuiu igualmente para a adeso a este trabalho.A concretizao deste trabalho s foi possvel porque ao longo das suas fases de desenvolvimento recebeu a valiosa colaborao de pessoas e instituies que aqui nos cumpre salientar e agradecer.Ao Professor Doutor Jos Henrique Ferreira Marques, um agradecimento muito especial pelo privilgio que foi contactar com a sabedoria da sua orientao, pela disponibilidade atenta e particularmente por ter proporcionado a linha de investigao que tornou possvel este trabalho. Professora Doutora Helena Rebelo Pinto, pelo incentivo ao desafio que foi o estudo de um instumento de avaliao psicolgica no mbito da deficincia intelectual, pela cedncia do material indispensvel realizao deste trabalho, pelo dilogo e auxlio na reviso do texto desta dissertao.Ao Professor Doutor Antnio Nvoa que enquanto coordenador do curso de Mestrado e em colaborao com o Departamento dos Recursos Humanos do Ministrio da Sade, viabilizou a realizao desta dissertao.Ao Dr. Joo Moreira, pelo seu apoio e valioso contributo no tratamento estatstico dos dados.Ao Dr. Joo Nogueira, pela colaborao inicial no tratamento estatstico dos dados. Dra. Isabel Fernandes, pela ajuda na seleco da forma reduzida da WAIS e cedncia do respectivo material. Direco do Centro de Reabilitao de Cascais/Cercica, pelas facilidades concedidas e em especial Dra. Rosa Neto. colega Maria Jos Martins, pela ajuda na cotao das respostas enquanto juiz independente.A todos os alunos que de bom grado participaram neste estudo.

INTRODUO

s ltimas duas dcadas, a investigao no mbito da reabilitao vocacional de jovens e adultos com deficincia intelectual conheceu novos desenvolvimentos. Identificamos trs grandes linhas de pesquisa. A primeira corresponde a factores que afectam a empregabilidade das pessoas com deficincia intelectual, por exemplo, o estudo da relao entre empregabilidade e inteligncia. A segunda aborda a avaliao vocacional e a predio do potencial para emprego, por exemplo, procura estudar a correlao entre a inteligncia e os testes de destreza manual. A terceira e mais recente rea de estudo, centra-se na aquisio e modificao de competncias na modalidade de emprego protegido e em centros de reabilitao profissional (Rusch, Schutz & Heal, 1983, p. 455-456).Os resultados da investigao nesta ltima veretente e em combinao com as antecedentes fornecem fortes evidncias sobre a capacidade das pessoas com deficincia intelectual realizarem tarefas profissionais complexas, aps experincias de formao adequadas (Whelan, 1977, p. 93).A importncia do trabalho e do estilo de vida produtivo das pessoas com deficincia intelectual tem sido enfatizada. Estar envolvido numa actividade significativa, e se possvel em mercado aberto, tem um impacto positivo, na forma de lidar com a deficincia, suas consequncias e satisfao de vida. A integrao num mercado de trabalho essencial para a independncia econmica e integrao social. No entanto, para atingir tais objectivos absolutamente necessrio assegurar a continuidade entre o sistema educativo e o de formao profissional das pessoas com deficincia intelectual.Com frequncia nos centros de reabilitao profissional que estes jovens e adultos experienciam novas aquisies, regra geral, com implicaes benficas na sua auto-estima. Apesar disso, estudos empricos realizados em centros (Seifert, 1989, p. 144) revelam por ordem cronolgica e de frequncias trs reas problemticas: a escolha vocacional; o ajustamento formao e emprego e o ajustamento social. precisamente na primeira rea que incide este estudo. Seleccionar um objectivo vocacional apropriado e elaborar um programa de reabilitao profissional adequado o objectivo dos servios de reabilitao vocacional. A compreenso das necessidades e aptides dos utentes constitui uma tarefa primordial neste processo.Nesta perspectiva, procura-se analisar nas escolhas das reas/cursos de formao, o papel das aptides em estreita relao com a avaliao de desempenho nas respectivas tarefas e no mbito do desenvolvimento da carreira, sistematizando assim, novas abordagens de avaliao das aptides e novas metodologias para a sua integrao nos processos de deciso vocacional (Super, 1983, p. 555-559).Para o efeito, foi utilizado um instrumento de avaliao psicolgica, Nonreading Aptitude Test Battery NATB, para a obteno de dados que permitam concluir da sua qualidade em termos de orientao de pessoas com deficincia intelectual. O estudo das aptides enquanto determinantes pessoais das escolhas vocacionais, faz parte de muitos outros elementos actuantes no processo de desenvolvimento da carreira e neste sentido que o estudo das aptides avaliadas pelo NATB, deve ser considerado.O trabalho que se apresenta consiste no estudo de uma forma portuguesa da Nonreading Aptitude Test Battery (NATB) do Servio de Emprego dos Estados Unidos da Amrica e pretende analisar as contribuies desta bateria para a orientao da carreira no contexto da reabilitao, em especial para a formao profissional de jovens com deficincia intelectual.O trabalho est estruturado em quatro partes.Na Parte I, intitulada PERSPECTIVAS CONCEPTUAIS DA DEFICINCIA INTELECTUAL, far-se- uma breve referncia s conceptualizaes sobre a deficincia intelectual, medida que se salientam os instrumentos de medida psicolgica mais utilizados naquele grupo minoritrio. Esta Parte inclui dois captulos. No captulo 1 Definies e classificaes da deficincia intelectual, efectua-se uma breve reviso de literatura sobre a evoluo das definies mais comuns na investigao sobre a matria e apresentam-se, em traos gerais, os sistemas de classificao de deficincia mais usuais.No captulo 2 Abordagens tericas da deficincia intelectual, apresentam--se quatro perspectivas mais utilizadas sobre o estudo psicolgico da natureza da deficincia intelectual. Salienta-se o papel da abordagem psicomtrica na investigao da deficincia intelectual.Na Parte II, intitulada ORIENTAO DA CARREIRA EM CASOS DE DEFICINCIA INTELECTUAL, efectua-se uma reviso de literatura sobre diferentes abordagens da orientao e a sua aplicao populao com deficincia intelectual.Esta parte composta por dois captulos. No captulo 3 Modelos tericos de orientao e sua aplicao em casos de deficincia intelectual, apresentam-se os quatro modelos de maior aplicao na prtica da orientao com indvuduos com deficincia, com especial ateno para o modelo desenvolvimentista de Super. O captulo 4 Abordagens especficas do desenvolvimento da carreira em casos de deficincia intelectual, analisa os modelos concebidos especificamente para a compreenso do desenvolvimento da carreira, bem como a sua aplicabilidade.Na Parte III designada A ORIENTAO PARA A FORMAO EM CASOS DE DEFICINCIA INTELECTUAL, ser analisado o contributo das perspectivas de orientao para a compreenso, desenvolvimento e promoo das aptides para a formao profissional. Esta parte composta por trs captulos.No captulo 5 A formao profissional de indivduos com deficincia intelectual em Portugal, apresenta dados estatsticos sobre o nmero de pessoas com deficincia intelectual e recursos de formao existentes no Continente e em especial no Concelho de Cascais. Ser descrito o sistema de formao profissional em Portugal. No captulo 6 O papel da orientao no processo de formao: programas de interveno, salienta-se a pertinncia da orientao enfatizando a necessidade de se sistematizarem as prticas e conceptualizaes aplicadas no mbito da deficincia intelectual. No captulo 7 Avaliao das aptides no contexto da orientao para a formao em casos de deficincia intelectual, procede-se descrio e apreciao das perspectivas mais recentes e utilizadas de avaliao das aptides.A Parte IV, intitulada A BATERIA DE TESTES DE APTIDES NATB E A SUA UTILIZAO EM POPULAES COM DEFICINCIA INTELECTUAL, faz referncia aos aspectos gerais da bateria, ao estudo e resultados da amostra portuguesa. Esta parte inclui quatro captulos. No captulo 8 A NATB no contexto da orientao de grupos minoritrios, apresenta-se em traos gerais a histria da bateria, desde a sua primeira at ltima verso em 1982; descrevem-se os seus domnios de utilizao, a sua composio e organizao com referncia metodologia de construo.No captulo 9 A forma portuguesa da NATB e o seu ensaio preliminar, so descritos os procedimentos seguidos para este estudo.No captulo 10 Utilizao da forma portuguesa da NATB com um grupo com deficincia intelectual, apresenta-se uma descrio da populao de referncia em funo das variveis consideradas para a organizao da amostra do estudo e as fases em que o estudo se desenvolveu.O captulo 11 Anlise dos resultados, incide sobre a anlise de itens e consistncia interna; nela caracterizam-se as distribuies dos resultados brutos dos testes, e em funo do sexo e nvel de escolaridade; avaliam-se as intercorrelaes dos resultados dos onze testes que compem a bateria com os subtestes e escalas de uma forma reduzida da WAIS; apresentam-se os resultados da anlise factorial. Referem-se ainda as correlaes entre os resultados dos testes e as notas obtidas na avaliao de desempenho, globalmente e por rea de formao profissional.Nas Concluses, salientam-se os aspectos considerados de maior utilidade no estudo e apresentam-se algumas recomendaes e reflexes sobre as implicaes da utilizao dos resultados proporcionados pela NATB em modelos de orientao para a formao com deficientes intelectuais.

PARTEI

PERSPECTIVAS CONCEPTUAIS DA DEFICINCIA INTELECTUAL

C A P T U L O1

DEFINIES E CLASSIFICAES DA DEFICINCIA INTELECTUAL

Fundada em 1876, a Associao Americana de Deficincia Mental, que o orgo mais antigo e prestigiado no estudo da compreenso, definio e classificao da deficincia intelectual, tem apresentado manuais com linhas orientadoras sucessivamente revistas por diferentes autores (e.g., Heber; Grossman). A sua ltima e 9 edio de 1992 e prope a seguinte definio: "a deficincia mental refere-se a limitaes substnciais no funcionamento intelectual geral abaixo da mdia, coexistindo com limitaes relacionadas em duas ou mais das seguintes reas do comportamento adaptativo: comunicao; tomar conta de si; vida domstica; capacidades sociais; uso dos recursos da comunidade; auto-determinao; sade e segurana; funcionamento acadmico, lazer e trabalho. A deficincia intelectual manifesta-se antes dos 18 anos" (American Association on Mental Retardation [AAMD], 1992, p. 1).Na explicao desta definio a AAMD, salienta: "A deficincia intelectual refere-se s limitaes no funcionamento actual (), definida como uma dificuldade fundamental na aprendizagem e realizao de certas capacidades de vida diria. So limitaes pessoais no domnio conceptual, prtico e da inteligncia social" (p. 5)."Caracteriza-se por um funcionamento intelectual geral abaixo da mdia (), definido como o resultado de QI abaixo de 70 ou 75, baseado numa avaliao realizada atravs de testes de inteligncia geral desenvolvidos para a avaliao do funcionamento intelectual" (p. 5). Sugere-se a reviso e validao dos resultados por diferentes especialistas."As limitaes intelectuais coexistem com as limitaes nas capacidades adaptativas (). Estas esto mais relacionadas com as primeiras do que com circunstncias culturais (p. 6)."Em duas ou mais reas do comportamento adaptativo (), evidencia que a avaliao do funcionamento intelectual insuficiente para o diagnstico da deficincia intelectual" (p. 6)."Comunicao, auto-ajuda (), so capacidades centrais para o sucesso no funcionamento quotidiano, pelo que as pessoas com deficincia intelectual, necessitam de suporte especfico. Cada uma das capacidades descritas varia com a idade pelo que a avaliao do seu funcionamento deve ser refernciada idade da pessoa" (p. 6)."A deficincia mental manifesta-se antes dos 18 anos (), define-se por ser a partir dessa idade, que na sociedade ocidental se definem os papis de adulto. Admitem-se outros critrios de idade para sociedades diferentes" (p. 6).O manual da AAMD enuncia pressupostos para a aplicao da definio atrs descrita:1."Uma avaliao vlida considera a diversidade cultural e lingustica, bem como as diferenas nos factores comunicacionais e comportamentais" (p. 6).2."A existncia de limitaes no comportamento adaptativo ocorre na comunidade tpica dos seus pares e inerente s necessidades de suporte individual" (p. 6).3."As limitaes adaptativas especficas relacionadas com a deficincia intelectual coexistem com aspectos positivos noutros comportamentos adaptativos ou competncias pessoais" (p. 6).4."Com os servios adequados, por um perodo a definir e de acordo com as necessidades individuais, o funcionamento da vida da pessoa com deficincia intelectual progredir visivelmente" (p. 7).A reviso das definies e dos sistemas de classificao da deficincia intelectual na perspectiva da AAMD, desde as propostas por Heber em 1959 e at ltima superviso efectuada por Grossman (1983), salienta a evoluo da concepo classificativa da deficincia intelectual, associando abordagem psicomtrica ao conceito de "comportamento adaptativo", ou das capacidades de adaptao do indivduo ao meio (Bairro, 1981; Zigler & Hodapp, 1986).Analisando a ltima proposta de definio e classificao da AAMD reconheceu-se os aspectos fundamentais da verso de Grossman de 1983, por exemplo no que diz respeito ao conceito de deficincia intelectual que definido operacionalmente atravs do QI, com um valor aproximadamente de 70 a 75 ou abaixo. Tambm no mbito do conceito de comportamento adaptativo, a AAMD no se afasta das orientaes gerais enunciadas por Grossman, mas prope uma soluo descritiva especfica para dez reas particulares do comportamento adaptativo, afastando-se assim da definio globalista que o caracterizava. Preocupa-se em salvaguardar a diversidade intra e interindividual das pessoas com deficincia intelectual e dos meios em que vivem.Um aspecto inovador desta classificao a correspondncia apresentada entre as limitaes individuais, tradicionalmente classificadas por Grossman, apresentadas adiante em quatro nveis de deficincia intelectual (mdio, moderado, severo e profundo), e o seu nvel especfico de necessidades de suporte social. Consequentemente a responsabilidade poltico--social na criao e qualidade dos servios, surge pela primeira vez num outro sistema de sub--classificao de "intensidades" e "padres" de suporte, em quatro nveis:Intermitente "caracteriza-se por um suporte de natureza episdica, de curto prazo e pode ser de baixo ou elevada nvel de intensidade (ex: perda de emprego; crise mdica aguda)".Limitado "caracteriza-se por uma intensidade de suporte consistente mas limitada no tempo (ex: transio da escola para a formao profissional)".Extensivo "o suporte a longo termo, caracteriza-se por um envolvimemto regular (ex: diariamente), pelo menos nalguns meios (emprego, casa) e no limitado no tempo". Pervasivo "o suporte caracteriza-se por ser constante em todos os meios e relaciona-se com a manuteno mnima da qualidade de vida (AAMD, 1992, p. 26).Podemos afirmar que as mudanas propostas pela AAMD reflectem uma mudana de paradigma no campo da deficincia intelectual, salientando a interao entre a pessoa, o meio, as "intensidades " e "padres " dos suportes necessrios.No entanto, ainda postulado pela verso actual da AAMD que o funcionamento intelectual deve ser avaliado e medido atravs de testes de inteligncia padronizados e identifica a perspectiva psicomtrica como sendo a mais fidedigna para avaliar a presena de deficincia intelectual. Esta perspectiva de classificao criticada por diferentes autores (Zigler, Balla & Hodapp, 1984; Bairro, 1981; Halpern & Fuhrer, 1984), por se limitar o conceito de inteligncia pela definio operacional atravs do QI e por no explicar a natureza da deficincia intelectual (Vicari , Albertini & Caltagirone, 1992).Uma outra contribuio para a definio sobre deficincia intelectual a proposta do modelo de inteligncia social de Greenspan (citado por Mathias & Nettelbeck, 1992a, pp.113--120), que nos remete para a existncia de trs reas de competncia de certo modo independentes: a inteligncia conceptual (QI); a inteligncia prtica (comportamento adaptativo) e a inteligncia social (competncia interpessoal). Apenas a incluso desta ltima rea se destaca das propostas de definio de Grossman, uma vez que postula que a inteligncia medida por testes padronizados.A definio apresentada por Zazzo (1976) considera a debilidade como a primeira zona de insuficincia face s exigncias variveis entre as sociedades e em idades diferentes. As causas determinantes so biolgicas e os seus efeitos so irreversveis no estado actual dos conhecimentos.As Naes Unidas (1983, p. 9) fazem a seguinte distino entre deficincia, incapacidade e desvantagem no contexto da sade :Deficincia:"qualquer perda ou anomalia da estrutura ou funo psicolgica, fisiolgica ou anatmica"Incapacidade:"qualquer restrio ou falta (resultante de uma deficincia) de aptido para exercer uma activadade do modo ou no contexto das situaes consideradas normais para um ser humano"Desvantagem:"uma desvantagem sofrida por um dado indivduo resultante de uma deficincia ou de uma incapacidade, que limita ou impede o desempenho de uma actividade considerada normal para esse indivduo, tendo em conta a idade, o sexo e os factores scio-culturais".Zigler, Balla & Hodapp (1984), consideram que "sem uma definio clara e universalmente aceite de deficincia intelectual, os esforos para a compreenso da sua natureza podem comprometer o conhecimento cientfico e a qualidade de vida das pessoas com deficincia" (p. 215). Embora conscientes das limitaes que a definio de inteligncia e consequentemente de deficincia intelectual em funo do QI implica, estes autores so unnimes em consider-lo a melhor medida operacional que actualmente se dispe, no negligenciando os contributos dos estudos experimentais alternativos.Ainda para Zigler et al. (1984) na base da questo da clarificao da definio de deficincia intelectual, est o problema do sistema de classificao que para os autores reside fundamentalmente na diversidade etiolgica da deficincia intelectual, cujo critrio de definio psicomtrico no satisfaz. Apresentam dois grupos distintos para a origem da deficincia intelectual: os de causa orgnica conhecida e os de causa desconhecida e que por isso se designam com frequncia como atraso devido a factores scio-culturais, atraso familiar, etc. De acordo com os autores, este ltimo grupo atinge cerca de 70 a 75 % do total da populao com deficincia intelectual. Estes autores propem a etiologia como critrio para a classificao de deficincia e o QI como critrio para a sua definio. Relativamente ao papel do comportamento adaptativo na definio de deficincia intelectual, Zigler & Hodapp (1986), discordam argumentando que a "adaptao social o resultado da personalidade e de factores motivacionais, afectando todas as pessoas com ou sem deficincia intelectual" (p.11).Indissocivel da definio de deficincia a definio de inteligncia. Ao mencionar as dificuldades em se conseguir uma definio consensual de inteligncia, Wechsler (1958) considera que esta advm de se tratar uma construo abstracta e no de um mero facto material. Em seu entender, a diversidade de concepes tem em comum a limitao de oferecerem uma perspectiva restrita do comportamento inteligente, como seja, a capacidade de aprendizagem de adaptao ou raciocnio. Prope um conceito mais ecltico e "global" de inteligncia (Marques, 1969, p. 27) definindo-a como "o grau ou capacidade global do indivduo para actuar finalizadamente, pensar racionalmente e proceder com eficincia em relao ao ambiente" (Wechsler, 1957, citado por Marques, 1969).A noo de capacidade global no equivale, para o autor americano, ao somatrio dos elementos ou aptides individuais, uma vez que estes se diferenciam qualitativamente e so interdependentes. Do ponto de vista metodolgico, o conceito global de inteligncia fundamental, quando se trata das questes de medida e da avaliao quantitativa da inteligncia. Neste caso, a inteligncia realizada atravs das aptides intervenientes, embora conceptualmente a inteligncia no seja um mero somatrio destes (Wechsler, 1958). O autor defende a ideia de que ao incluir diversos testes (e.g., Vocabulrio; Aritmtica, etc.), num teste de inteligncia, no pretende medir as respectivas aptides mas "o que elas tm de comum, o que emerge delas" (Marques, 1969, p. 28). Tambm ao nvel psicofisiolgico Wechsler (1958) postula uma concepo globalista da inteligncia. Considera que esta s afectada no caso de leses cerebrais graves e no apresenta localizao especfica.Estritamente relacionado com a sua noo de inteligncia, est a concepo de desenvolvimento intelectual proposta por Wechsler preocupao dominante dos seus trabalhos designadamente na construo das baterias WISC, WPPSI e WAIS. Para Marques (1969), a caracterizao do desenvolvimento intelectual na adolescncia e na idade adulta ao longo da vida do indivduo um aspecto inovador dos estudos de Wechsler.A partir das investigaes efectuadas com a Wechsler-Belevue, forma I e com a WAIS, Wechsler concluiu que: entre os 14 e os 18 anos se verifica desenvolvimento da inteligncia, embora limitado, atinge o seu mximo entre os 25 e os 29 anos (dados da aferio da WAIS), em relao a valores mdios, constatando-se um declnio aps os 30 anos, que o autor salienta no ser uniforme para todas as aptides que contribuem para a medida da inteligncia (Wechsler, 1958, pp. 32-33).No que diz respeito definio de deficincia intelectual, Wechsler, apresenta duas perspectivas: uma mais ligada etiologia e uma outra de caractersticas mais ligadas ao diagnstico, em termos psicomtricos, e por isso mais metodolgica. Quanto s causas da deficincia intelectual e da sua contribuio diagnstica, o autor considera que os factores determinantes so biolgicos, fisiolgicos e genticos, apesar de se ter em ateno os aspectos scio-econmicos no diagnstico. Salienta os "factores no mensurveis", como a adaptao social, emocional, econmica e vocacional como sendo de fundamental importncia na anlise da noo de deficincia intelectual (Wechsler, 1958, pp. 47-48). Define operacionalmente, e face definio de inteligncia, uma pessoa com deficincia intelectual, como sendo anormal por se encontrar na "extremidade mais baixa de uma distribuio normal, correspondente aos ltimos 2%. luz do seu critrio estatstico de nveis de inteligncia definidos tendo como limite o erro provvel de 10, estabeleceu uma correspondncia entre graus de deficincia e os quocientes de inteligncia na WAIS. Na opinio de Marques (1969, pp. 43-43), Wechsler no atribui valor prtico significativo a esta classificao para as suas escalas, uma vez que as normas da WAIS no apresentam um QI da Escala Completa inferior a 41. Neste domnio, a questo da definio da deficincia intelectual indissocivel das questes de classificao da inteligncia.Zigler & Hodapp (1986) consideram que um sistema de classificao pressupe um objectivo bsico que o de aumentar o conhecimento cientfico na rea que serve. E tambm que um sistema de classificao til e bem especificado tem dois grandes objectivos: o primeiro o princpio classificativo que oferece as regras para colocar um indivduo em determinada classe e no noutra: o segundo o que permite essa colocao com elevada concordncia entre diferentes classificadores. Para os autores, as questes metodolgicas aqui envolvidas so a preciso (quanto melhor for o princpio, maior a preciso da classificao) e a validade (quanto mais se sabe sobre o indivduo com base na classificao, isto , mais classificaes correlacionadas, melhor a classificao (Zigler & Hodapp, 1986, pp. 45-46).No que se refere s classificaes da deficincia intelectual, e decorrente das premissas das definies apresentadas, podemos considerar duas orientaes fundamentais: a da medida de inteligncia com as abordagens clssicas de QI e a teoria do desenvolvimento cognitivo da Escola de Sguin (e.g., Piaget) e a abordagem da descrio de comportamentos, isto , avaliao do comportamento adaptativo de Sloan & Birch (1960, citado por Sattler, 1974) e de Grossman (1973 citado por Bairro, 1981).Historicamente a primeira abordagem que a mais comum na investigao sobre a descrio das variaes das capacidades cognitivas humanas, remete-nos para os estudos da medida da inteligncia atravs dos testes psicolgicos em associao com o conhecimento acadmico e posteriormente com a incluso da descrio de reportrios comportamentais. O funcionamento intelectual avaliado por testes de inteligncia geral padronizados, sendo os mais frequentemente utilizados as escalas de Standford-Binet e as de Wechsler (Silverstein, 1970; Bairro, 1981). Surgia o que a maioria dos autores na literatura comummente designa de, movimento dos testes de inteligncia, o que originou a teoria psicomtrica e clssica (Berg, 1992), termo que iremos manter ao longo deste trabalho, por ser consensual, embora noutro mbito pudssemos adoptar o rigor terminolgico que alguns autores defendem 11A este propsito Horn & Hofer (1992, pp. 44-45) apresentam uma clarificao interessante da palavra "psychometric", salientando que o termo "metric" se refere medida e o termo "psycho" refere-se a psicolgico, portanto "teoria psicomtrica", significa uma teoria baseada na medida do fenmeno psicolgico. Acrescenta que todas as teorias dos processos cognitivos so tambm psicomtricas, desde que a medida a base cientfica de qualquer teoria, o termo "teoria psicomtrica", no distingue as diferentes teorias entre si. Da mesma forma entendem que a forma mais simples de medida a classificao..Assim, os elementos bsicos do sistema de classificao, na perspectiva psicomtrica, caracterizam-se pela representao da inteligncia numa distribuio normal ou curva de Gauss, onde pequenas percentagens (mais ou menos elevadas) da populao, se distribuem equitativamente por ambas as extremidades da curva, identificando-se numa regio central a maior percentagem de indivduos, valores estes traduzidos em parmetros estatsticos como a mdia, a moda e a mediana. O valor mdio de 100 representa o valor terico da inteligncia mdia, designada por norma, porque face a ela se pode facilmente verificar os valores inferiores e superiores a esta razo. A distncia, em termos de resultados unitrios do resultado de uma pessoa num teste, face ao valor mdio, converte-se em resultados de desvio-padro inferiores ou superiores mdia (Anastasi, 1988 p. 81-86). A "zona limite que foi seleccionada para a diferenciao de pessoas com e sem deficincia intelectual baseada mais numa frmula estatstica do que num procedimento classificativo lgico" (Zigler & Hodapp, 1986, p. 44). Convencionou-se que nos testes de inteligncia de Standford-Binet e de Wechsler, o desvio--padro em relao mdia respectivamente de 16 e de 15 pontos. A fronteira entre a deficincia intelectual e a inteligncia, dada pela expresso numrica de dois desvios-padro inferiores mdia, sendo o valor 70, o limite crtico de separao entre a deficincia e a no deficincia intelectual (Wechsler, 1955 p. 20; Zigler & Hodapp, 1986).Este limite ou linha separadora arbitrrio, pelo que as suas consequncias sociais so inmeras, designadamente em termos de cuidados e servios a prestar e da prevalncia da deficincia intelectual. Exemplificativo desta ltima foi o que aconteceu com em 1961 com a proposta de Heber de alterar o desvio-padro de 2 para 1, o que teve como consequncia o aumento aproximado da populao com deficincia intelectual nos Estados Unidos de 3% para 16% da populao (Zigler & Hodapp, 1986).De acordo com os desvio-padro de QI que caracterizam a populao geral e com o objectivo de estudar a correspondncia de valores de QI com os nveis de deficincia, Grossman (1977) e a AAMD (1992), propem que se considere as provas de inteligncia mais frequentemente utilizadas: as escalas de Standford-Binet, e ainda as escalas de Wechsler, conforme se apresenta no quadro 1.Quadro 1 Nveis de deficincia intelectual considerados segundo Grossman e sua equivalncia em QI.

NveisEscalas Standford-Binet e CattellWechsler(desvio-padro = 16) (desvio-padro = 15)

Ligeiro67 - 5269 - 55Moderado51 - 3654 - 40Severo35 - 2039 - 25Profundo19 e inferior27 e inferior(Grossman, 1977, p. 19).

A classificao dos diferentes nveis de deficincia intelectual passa a efectuar-se tambm, por proposta da AAMD (1992, pp. 23-33) em funo do estabelecimento de nveis de correspondncia entre o critrio psicomtrico e o do comportamento adaptativo, sendo a sua relao traduzida da seguinte forma:Atraso ligeiro:" ligeiramente equivalente designao educvel do ponto de vista escolar".Atraso moderado:"engloba os indivduos considerados treinveis do ponto de vista escolar".Atraso severo:"corresponde designao dos indivduos considerados dependentes".Atraso profundo:"traduz a situao de vida com apoio e de no autonomia".Algumas crticas tm sido feitas a esta classificao, mais do ponto de vista conceptual do que do ponto de vista do princpio classificativo, assinalando que no se chega " delimitao e compreenso do que a deficincia intelectual da sua etiologia e prognstico" (Bairro, 1981, p. 3)Tambm as teorias do desenvolvimento cognitivo, designadamente a de Piaget, assinalam um marco histrico ao contribuirem tambm para a caracterizao e classificao da deficincia intelectual. A questo central na perspectiva piagetiana como caracterizar universalmente as mudanas no funcionamento intelectual desde a infncia adolescncia. O autor caracteriza o desenvolvimento intelectual como um processo de construo do conhecimento atravs das nossas interaces com o meio, processo que resulta na definio de estruturas cognitivas de um perodo ou estadio particular de desenvolvimento (Piaget & Inhelder, 1979).Piaget & Inhelder (1979) identificam quatro grandes perodos de inteligncia, que diferem nos tipos de estrutura cognitiva (definida em termos de propriedades lgicas), usada na interaco com o meio e que passamos apenas a designar: perodo sensrio-motor; perodo pr--operatrio; perodo operatrio concreto e perodo das operaes formais.Na definio de cada um destes estadios correspondem comportamentos tpicos na caracterizao do desenvolvimento cognitivo do indivduo normal que evoluiria de acordo com o critrio idade, respectivamente em torno dos 2 anos, 8 anos, 12 anos e dos 15 anos (Bidel & Fischer, 1992, pp. 107-108). De acordo com este princpio classificativo, as pessoas com deficincia intelectual incluem-se num dos perodos tpicos de acordo com o seu atraso cognitivo, permanecendo ou muito raramente progredindo neles, num esquema de equivalncias entre nvel de deficincia intelectual e perodo de desenvolvimento (Bairro, 1981, p. 102).As capacidades cognitivas das crianas e jovens so avaliadas em termos da forma como desempenham as tarefas propostas nas provas, com determinados materiais e de como justificam o que fazem. Os dados empricos confirmam que nem todas as pessoas atingem cognitivamente as tarefas de classificao bsicas do perodo sensrio-motor, outras com muita dificuldade atingem o nvel das operaes concretas.Inhelder (1943), prope mesmo uma equivalncia entre as idades limites para cada um dos perodos estabelecidos por Piaget, na abordagem dos aspectos de desenvolvimento cognitivo da deficincia intelectual. Para isso adoptou as zonas de deficincia descritas por Binet no final do sculo XIX, e fez as seguintes equivalncias : o "idiota", situa-se no perodo entre os 0 e os 2 anos; o "imbecil" entre os 3 e os 7 anos e o "dbil" entre os 8 e os 11 anos e o "atraso simples" entre os 12 e os 14 anos. Para Inhelder, a "debilidade , essencialmente, uma construo inacabada por incapacidade de acesso ao pensamento formal" (). "Esta noo de construo inacabada, no formal, refere-se necessariamente noo de velocidade do desenvolvimento" (pp. 272-274). Para Bairro (1981, p. 9), a escola de Genve apresenta no estudo da deficincia intelectual uma similitude na hierarquia das aquisies cognitivas quando avaliadas por provas psicomtricas clssicas.Do ponto de vista das abordagens do comportamento adaptativo, mencionam-se dois tipos de classificaes que caracterizam a deficincia intelectual em termos de descrio dos comportamentos. Trata-se de classificaes que utilizam nveis de comportamento adaptativo, no recorrendo noo de QI.A classificao de Sloan & Birch, (1960, citado por Sattler, 1974, p. 303), apresenta quatro nveis (profundo, severo, moderado e ligeiro), tipificados em termos de trs grupos etrios e tarefas de desenvolvimento equivalentes, do seguinte modo: idade pr-escolar (0 a 5 anos) corresponde a tarefa de "maturao e desenvolvimento"; idade escolar (6 a 21 anos), corresponde a tarefa de "aprendizagem e educao"; idade adulta (21 anos), equivale a tarefa da "adaptao social e profissional ". A classificao proporciona uma matriz de enunciados de comportamentos adaptativos pelos trs perodos etrios e para cada um dos nveis definidos. Nesta classificao, os comportamentos so descritos de uma forma global, em contraste com a classificao proposta por Grossman. Este autor apresenta nveis (moderado, severo e profundo), desde os 3 anos at idade adulta, dando para cada idade e nvel, exemplos do nvel mais elevado do funcionamento do comportamento adaptativo, discriminando os diferentes nveis de adaptao (e.g., funcionamento independente; fsico; comunicao; social etc) e descrevendo-os detalhadamente (Grossman, 1977, pp. 23-33).Em concluso, poder dizer-se que as definies de deficincia intelectual utilizam como principais critrios os resultados obtidos pelos indivduos nas provas de inteligncia e/ou a sua capacidade de adaptao e integrao na sociedade. Os sistemas de classificao, por seu lado, fundamentam-se nos desvios dos resultados obtidos nos testes de inteligncia relativamente mdia e/ou no grau de adaptao social.

C A P T U L O2

ABORDAGENS TERICAS DA DEFICINCIA INTELECTUAL

A literatura sobre o estudo psicolgico da natureza da deficincia intelectual, apesar de no ser to vasta quanto a que se refere s questes da sua medida, sugere a Baumeister & Brooks (citado por Bairro, 1981) a seleco de quatro perspectivas mais utilizadas que passamos a enunciar e a descrever: a perspectiva piagetiana, a perspectiva do enriquecimento instrumental de Fuerstein, a abordagem do processamento da informao e a abordagem clssica psicomtrica ou diferencial.O modelo gentico Piagetiano contribuiu para a formulao de uma anlise do raciocnio das pessoas com deficincia intelectual. A perspectiva do desenvolvimento intelectual formulada por Piaget, correspondeu a uma insatisfao quanto s tarefas e concepes psicomtricas, quantitativas, de Binet e Simon. Como resultado, os objectivos das suas investigaes divergiam dos objectivos das investigaes da abordagem diferencial ou psicomtrica, dita quantitativa. O desenvolvimento do "mtodo clnico", no qual o raciocnio de uma criana examinado extensivamente para alm da resposta dada disso exemplo. Estas investigaes levaram Piaget a concluir que o raciocnio de uma criana em diferentes idades representa qualitativamente diferentes formas de pensamento (Piaget, 1975).O pressuposto bsico da sua teoria de que o conhecimento construido pelos nossas aces no processo de regulao das nossas interaces com o mundo (Piaget & Inhelder, 1979). Ao coordenar essas aces em diferentes contextos e situaes, a pessoa interioriza-as de forma a serem reutilizadas enquanto representaes para antecipar aces noutros contextos. Esta interaco provoca a construo sucessiva de estruturas com organizaes qualitativamente superiores, ou estadios no processo de adaptao.A estrutura operatria um conjunto de operaes regido por regras definidas, de orientao biolgica, epistemolgica e lgico-matemtica. O desenvolvimento mental descrito como uma sucesso de construes, as regulaes sensrio-motoras, as operaes concretas, as operaes formais, reconstruindo-se cada uma num plano superior, ultrapassando a que antecede havendo uma constncia na ordem de sucesso das aquisies. Os estadios constituem um processo de equilibraes sucessivas integrando um sistema de auto-regulao de compensao das experincias do meio, fsicas e dos factores biolgicos (Piaget, 1975).A perspectiva construtivista e dinmica da "modificabilidade cognitiva estrutural" de Feurstein, que foi aluno de Piaget e colaborador de Rey, prope uma "teoria de conjunto que d s prticas de funcionamento intelectual um sentido, um objectivo, uma razo de ser" (Feurstein, 1993, p. 6). Ao postular que o "trao comum a todos os seres humanos a modificabilidade", (p. 6) considera que um indivduo com baixo QI, com insucesso escolar, disfuncionamento e problemas de comportamento, no pode ser reduzido a uma entidade fixada pela hereditariedade. O conceito de modificabilidade central e entendido como uma modificao qualitativa estrutural e no unicamente como uma mudana de quantidade das unidades de informao, ou experincias que o indivduo dever adquirir, explicitando que no se refere evoluo na quantidade de aptides (Feurstein, 1993). O factor cognitivo est na base da modificabilidade estrutural e um elemento de adaptao individual preponderante porque tambm assume um papel muito importante nos elementos afectivos, emotivos e motivacionais. A cognio refere-se aos processos atravs dos quais um indivduo percebe os dados ("input"), os transforma ("elaborao") e os comunica ("output") de uma forma entendvel visando a adaptao. Estas constituem as trs fases do "acto mental", consideradas com pr-requisitos da adaptao cognitiva, que se relacionam com sistemas funcionais cerebrais, e que contribuem para explicar a (in)capacidade do indivduo se adaptar a situaes novas a partir da integrao de experincias anteriores (Feurstein, 1993).As "disfunes cognitivas", (deficincia intelectual; dificuldades de aprendizagem), constatam-se quando o acto mental no efectuado adequadamente, prejudicando a realizao e o rendimento cognitivo do indivduo numa ou nas trs combinaes dos pr-requisitos mencionados. Feurstein, designa-os "lista das funes cognitivas" e considera-os um dos dois aparelhos conceptuais por ele criados.O segundo aparelho conceptual sugerido pelo autor a "carta cognitiva", ou seja, a descrio do tipo de tarefas s quais o indivduo com disfuno cognitiva se dever adaptar. Este aparelho foi concebido para facilitar a escolha de instrumentos ou tcnicas para a interveno que efectuada por "mediadores" ou "mediatizadores" (pais, educadores, professores, formadores) que, atravs de formao especfica, se envolvem no "sistema de crenas"que implica a assero bsica para esses mediadores de que "todo o ser humano modificvel" (Feuerstein, 1993, p. 7).Para Feurstein a modificabilidade conseguida atravs de uma situao de aprendizagem mediatizada. A evoluo na aprendizagem geral e adaptao na organizao das disfunes cognitivas, so abordadas por trs processos:1.Processo de avaliao: "objectiva detectar e identificar as disfunes cognitivas". O autor desenvolveu um instrumento de avaliao e denominou-o " Avaliao do Potncial de Aprendizagem "(Learning Potencial Assessment Device LPDA). Neste processo de avaliao o autor utiliza as Matrizes Progressivas de Raven; a prova de desenho de Fay; provas escolares.2.Processo de Interveno: feito atravs do "Programa de Enriquecimento Instrumental (IE Instrumental Enrichement), que pretende reorganizar e optimizar as duas funes cognitivas. Utiliza quinze instrumentos que se aplicam dois a dois em sequncias (e.g., Organizao de Pontos; Comparao e Percepo Analtica etc)3.Processo de Alterao: Relaciona-se com a produo de "Estratgias de Alteraes de Enriquecimento Ambiental" e o ajustamento das funes cognitivas (Feuerstein, 1985, citado por Fonseca, 1991, p. 20).Atravs destes trs processos, postula-se que a modificao estrutural das disfunes cognitivas desenvolve as capacidades intelectuais figurativas e operativas, bem como as competncias do domnio interpessoal, pelo que o modelo facilita a interveno nas diferentes reas da educao especial e formao profissional de pessoas com deficincia intelectual entre outras (Debray, 1989; Fonseca, 1991; Feurstein, 1993).Em traos gerais, o modelo de caracterizao da deficincia intelectual de Jensen (1970), designado por "teoria do atraso primrio e secundrio", hipotetiza a existncia hierrquica nos nveis de maturao intelectual que se caracteriza pelo grau de correspondncia entre "input" e "output". Os nveis baixos da hierarquia envolvem pouco processamento ou transformao da informao do "input", ou seja, a correspondncia estmulo-resposta relativamente simples e directa. Os nveis elevados dependem das elaboraes e transformaes da informao recebida "input", mas tambm da comparao com a informao armazenada prviamente. Desta forma se estabelece um contnuo entre nveis baixos e elevados na hierarquia das capacidades intelectuais. De acordo com o autor, este contnuo resultante de, pelo menos, duas capacidades: o nvel I ou "capacidade associativa" e o nvel II ou "capacidade cognitiva". Os dois nveis so considerados qualitativamente diferentes (Jensen, 1970, p. 53).Os estudos sobre deficincia intelectual levaram Jensen a formular trs hipteses para a existncia de correlaes entre os testes de nvel I (e.g., sub-teste de Memria de Dgitos) e os testes de nvel II (e.g., Matrizes Progressivas de Raven). A primeira relaciona factores genticos com deficincias nas capacidades de nvel I. A segunda liga-se dependncia funcional entre os dois nveis: as correlaes mais elevadas entre os testes de nvel I e de nvel II, situam-se em mdia nas classificaes da distribuio abaixo da mdia, mais do que nas classificaes superiores. Finalmente a capacidade de informao envolvida nos testes de nvel II no depende apenas do substracto neurolgico dos testes de nvel I, mas tambm da aprendizagem prvia de certas competncias (Jensen, 1970 pp. 53-54).Ao analisar as propriedades dos itens de alguns testes diferenciais tradicionais (e.g., Cattel; Matrizes Progressivas de Raven; Escalas de Standford-Binet; Escalas de Wehsler), o autor conclui que contm uma mistura das funes de nvel I e II. Utilizando provas psicomtricas e diferentes tarefas de aprendizagem, conclui que as crianas ou jovens que pontuaram valores baixos nos testes de QI, mas que possuiam um bom nvel de realizao nas tarefas de nvel I (capacidades associativas), consideram-se capazes de realizar tarefas de ordem superior, quando estimuladas (Jensen, 1970. p. 55)De acordo com Gardner & Clark (1992), a "teoria do processamento de informao de Jensen, pode considerar-se uma nova verso dos estudos de Galton (sec. XIX), dominados pela crena que a inteligncia pode estar ligada a simples atributos fsicos ou sensoriais" o que leva estes autores a "incluir o modelo de Jensen numa das duas diferentes perspectivas que salientam ter dado origem e influenciado estudos psicomtricos sobre a inteligncia" (p. 25).A perspectiva psicomtrica clssica surge com Binet e por contestao a Galton e postula que a inteligncia deve ser estudada atravs de processos mais complexos, como a ateno, a compreenso verbal e o raciocnio (Sternberg, 1986, p. 4).Historicamente, a psicologia da deficincia intelectual tem sido influnciada pela tradio de Binet e Simon, que consideravam que o "pensamento e a aprendizagem dependiam de um normal e intacto funcionamento do sistema nervoso" (Binet & Simon, 1908, citado por O'Connor, 1987, p. 324). O suporte para este ponto de vista advm da correlao geralmente encontrada entre uma baixa medida de inteligncia ou incompetncia cognitiva e o insucesso na aprendizagem.A noo de idade mental introduzida por Binet na primeira reviso da Escala Mtrica de Inteligncia e o quociente de inteligncia definido posteriormente por Stern (Freeman, 1962). A renncia da idade mental como medida bsica do nvel intelectual, sobretudo em adultos, levou Wechsler (1955, p. 3), a definir o quociente de inteligncia (QI), "como um resultado padro com mdia 100 e desvio-padro 15". Para alm da discordncia quanto aos mtodos estatsticos utilizados por Binet, estava presente uma discordncia psicolgica, uma vez que os testes de Wechsler, se baseavam na sua concepo de inteligncia como uma capacidade global do indivduo para agir determinadamente; pensar racionalmente e lidar eficazmente com o seu meio, assinalando a existncia de factores no intelectuais que contribuem para a noo global de inteligncia. neste quadro de referncia que iremos situar a perspectiva psicomtrica, que se caracteriza por definir e quantificar dimenses de inteligncia, atravs de medidas de desempenho em tarefas padronizadas, cuja anlise dos resultados permite a descrio das condutas cognitivas: "a avaliao constitui o ponto de partida e o ponto de chegada: a varincia emprica reflecte diferenas interindividuais na dimenso psicolgica; o tratamento estatstico--matemtico das medidas evidencia a organizao de dados; o padro explicativo do desempenho , simultaneamente, modelo operacional da dimenso. A avaliao fundamenta assim a teoria psicolgica, que por sua vez a justifica e lhe confere legitimidade" (Miranda, 1986, p. 64).A perspectiva psicomtrica comea as suas investigaes da natureza da inteligncia e da deficincia intelectual, atravs da medida da realizao dos indivduos em testes especficos de inteligncia. Os procedimentos estatsticos, tais como a anlise factorial sumarizam cada uma das diferenas individuais e propem uma estrutura da organizao da realizao dos indivduos nesses testes de inteligncia. Sublinham as dimenses da variabilidade humana designados por factores (Gardner & Clark, 1992). Este mtodo permitiu o desenvolvimento de diversos modelos de inteligncia e " apenas til na medida em que contribui para o desenvolvimento dos princpios do comportamento humano" (Nunnally, 1978, p. 330).O modelo bifactorial de Spearman (1927, p. 88) inicialmente identificado por g, inteligncia geral, considerava que todas as funes intelectuais se baseavam numa capacidade geral comum. Para Spearman "no parecia ser muito claro o que o factor g media, identificando ora com uma energia mental ora como inductor entre relaes e correlaes"(Gardner & Clark, 1992, p. 22). Outras formulaes resultantes da tcnica e do nvel de anlise, indicavam um factor geral, g, que contribuia para a realizao de todas as tarefas, e um factor especfico, s, que contribua apenas para tarefas especficas (Sperman, 1927, pp. 137-140). Spearman, "estava mais preocupado com a compreenso das capacidades humanas do que com a sua medida. Defendia teorias interessantes acerca de g, as suas bases biolgicas, a influncia da cultura, a interaco de g com as manifestaes das capacidades na vida diria, e a relao de g com a velocidade, e outras variveis" (Nunnally, 1978, p. 508).Uma posio terica diferente provocada por utilizaes diferentes da anlise factorial mltipla, levou Thurstone a supor que a realizao nalguns testes, depende de "factores comuns" ou factores de grupo (Thurstone, 1957, pp. 411-420). Identificou nove factores, sete dos quais designados por capacidades mentais primrias (aptido espacial (S); velocidade perceptiva (P); aptido numrica (N); aptido verbal (V) ; fluncia verbal (W); raciocnio (I ou R), e ainda outros dois factores de 2 ordem, um factor mais geral que designou, mais tarde de V e R, quando replicou os estudos iniciais a outros grupos (Nunnally, 1978, pp. 508-509).A concluso de que os factores e os testes que se correlacionam podem ser tambm submetidos a anlise factorial, surgindo um factor geral a um nvel elevado. Assim, tal como Spearman aceitou a existncia de factores de grupo, Thurstone aceitou a existncia da inteligncia geral como um factor de ordem superior (Sternberg & Powell, 1983 citado por Gardner & Clark, 1992, p. 23). Esta aproximao proposta por Vernon (1961) com o modelo hierrquico da inteligncia baseado na anlise factorial. Prope para alm de um factor geral (g) e de um factor especfico (s), dois outros grandes factores de grupo: verbal-educacional-v:ed e um factor espacial-prtico-mecnico-k:m. Aps anlise estes factores de grupo podem ainda constituir factores menores de 3 ordem. Ainda a um 4 nvel assinala a existncia de factores especficos natureza dos testes utilizados, distintos dos outros factores dependentes das amostras experimentais.Cattel (1963) aproxima-se das concepes factoriais de 2 ordem iniciados por Spearman e prope uma teoria multinvel diferente para o funcionamento intelectual, distinguindo um factor "fluido" (gt) e um factor "cristalizado" de inteligncia (gc), representando respectivamente as bases biolgicas da capacidade humana e o produto da aculturao ou conhecimento adquirido.A estrutura da teoria do intelecto de Guilford (1967), difere das anteriores em trs grandes aspectos: primeiro, cria um modelo hipottico atravs da anlise factorial, contrariamente aos outros tericos que utilizam a anlise factorial para analisar a estrutura que um modelo dever ter; o segundo, prope um numero extenso de factores: 120, a maioria empiricamente verificados. So o resultado do cruzamento entre cinco tipos de operaes (cognio, memria, pensamento divergente, pensamento convergente, avaliao); os quatro contedos (figurativo, simblico, semntico e comportamental) e os seis produtos (unidades, classes, relaes, sistemas, transformaes e implicaes (pp. 464-466). Mais tarde o nmero de factores foi aumentado para 150, passando de cinco para quatro contedos: visual, auditivo, simblico, semntico e comportamental, (Cronbach, 1990, p. 386). O terceiro aspecto remete--nos para a "independncia, isto , para a ausncia de correlao dos factores de primeira ordem, e para a questo da medida e da avaliao atravs dos testes" (Gardner & Clark, 1992, pp. 24-25).Diversos estudos empricos tm incidido sobre o papel da anlise factorial na investigao da deficincia intelectual. Os estudos de validade factorial realizados por Wechsler, com a WISC e a WAIS, permitiram identificar para a amostra de padronizao cinco factores correlacionados e designados: Compreenso Verbal I; Organizao Perceptiva; Liberdade para a Distraco; Compreenso Verbal II; um factor quase especfico e um factor geral de segunda ordem, g (Wechsler, 1958, pp. 285-286).Tambm no que se refere ao papel da anlise factorial na investigao da deficincia intelectual, alguns estudos citados por Silverstein, (1990, pp. 213-214), e em seguida mencionados, tm sido realizados com as escalas de Wechsler (WISC e WAIS).Nas revises de literatura sobre o papel da anlise factorial na investigao da deficincia intelectual, Dingman & Meyers (1966), observaram que, apesar das duas escalas atrs referidas no terem sido concebidas para esse objectivo, no apresentam objeces na identificao da estrutura existente nesses testes para a populao com deficincia intelectual. Cohen (1958, citado por Silverstein, 1970), investigou a estrutura factorial das duas escalas, utilizando dados padronizados. Identificou vrios estudos com a WISC e pelo menos um com a WAIS em populaes com deficincia intelectual.Baumeister & Bartlett (1962) investigaram a estrutura factorial da WISC para trs grupos de indivduos com deficincia intelectual e um grupo de indivduos normais da amostra de padronizao equiparados na idade com um dos grupos de indivduos com deficincia. Identificaram um factor geral, um verbal e um factor de realizao para todos os grupos. Um quarto factor, encontrado apenas nos grupos de indivduos com deficincia intelectual, foi interpretado como sendo de Memria Imediata, caracterizada pelos testes de Aritmtica; Memria de Dgitos; Disposio de Gravuras; Cubos e Cdigo. Os autores concluem que os seus resultados corroboram a hiptese que as capacidades intelectuais dos indivduos com deficincia intelectual diferem qualitativamente das dos indivduos normais.As intercorrelaes dos subtestes da WAIS foram tambm analisadas para um grupo de indivduos com deficincia intelectual e um grupo de indivduos normais de idade semelhante da amostra de padronizao. Sprague & Quay (1966) identificaram um factor geral, um factor verbal e um factor de realizao para ambos os grupos, e ainda um quarto factor, interpretado como "descoberta de estmulos", apenas para o grupo com deficincia intelectual. Os autores notaram uma forte semelhana entre os seus resultados e os de Baumeister & Bartlett, explicitando, no entanto, algumas diferenas devidas presumivelmente s diferenas dos sujeitos e/ou testes.Apesar das diferenas entre os estudos, existe um elevado grau de consonncia nos resultados obtidos. Um peso factorial consistente emerge nos sub-testes de aritmtica, memria de dgitos e cdigo, invariavelmente para os sujeitos com deficincia intelectual, mas no (ou pelo menos de forma to proeminente), para os sujeitos normais. O facto de surgir o factor memria a curto prazo ou "descoberta de estmulos", para os sujeitos com deficincia intelectual, no significa que essa capacidade esteja ausente nos normais, mas antes que apresentam maior variabilidade nesta capacidade (Silverstein, 1970, p. 214).A reviso apresentada confirma a concluso de Silverstein (1965) e de Stevens & Heber, (1968 citado por Silverstein, 1970) referida no captulo 1 relativamente aos testes mais frequentemente utilizados com indivduos com deficincia intelectual: a Escala de Inteligncia de Stanford-Binet, a Escala de Inteligncia para Crianas de Wechsler (WISC) e a Escala de Inteligncia para Adultos de Wechsler (WAIS).

PARTEII

A ORIENTAO DA CARREIRA EM CASOS DEDEFICINCIA INTELECTUAL

C A P T U L O3

MODELOS TERICOS DE ORIENTAO E SUA APLICAO EM CASOS DE DEFICINCIA INTELECTUAL

O reconhecimento da aplicao das teorias do desenvolvimento da carreira s pessoas com deficincia, em geral, e com deficincia intelectual, em particular, tem assumido especial interesse nos E.U.A, desde a dcada de 70. A publicao, em 1973, das "Actas de Reabilitao e da Educao para Todas as Crianas com Deficincia", salientava os mesmos direitos educao pblica, formao profissional e ao emprego deste grupo minoritrio (Ryan, 1979). Razes sociais e polticas esto na base desta "mudana de atitude". O trabalho, enquanto parte do estilo de vida, passa a ser um conceito central; por outro lado o ressurgimento de diversos problemas escolares e sociais influenciaram o percurso paralelo da orientao em populaes com e sem deficincia (Humes 1982, p. 351).Em Portugal, a adopo da nova concepo na poltica de reabilitao, atravs da Lei Quadro da Reabilitao (Ministrio do Emprego e Segurana Social, Decreto-Lei n 247/89), proporcionou, a partir dos anos 80, a construo de centros de formao e com eles o desenvolvimento de programas de formao profissional em larga escala. Estes programas destinam-se a "dotar os jovens e adultos com conhecimentos, capacidades e competncias para obter um emprego, conserv-lo e progredir profissionalmente" (Charana, 1988, p. 68).A formulao destes estatutos e regulamentaes focaliza-se em torno de diversos componentes que tm profunda influncia na orientao, nomeadamente na organizao curricular de planos individuais de educao/formao; na asceno do desenvolvimento da pessoa com deficincia a meios menos restritivos no ensino regular, na formao e no emprego, na educao profissional dos jovens e formao profissional dos tcnicos (Chubon, 1985).Enquanto processo global, a reabilitao profissional distncia-se do papel tradicional da escola especial (ou regular) que caracteriza, de uma forma geral, o utente como sendo passivo e dependente. Ao contrrio, nos meios ps-acadmicos, designadamente os de formao profissional e emprego, -lhe requerido um estilo de vida produtivo, em que o trabalho o factor central. "Um dos principais factores de insucesso nesta fase de transio perda de continuidade, ou ligao entre os programas de educao especial e o emprego, o que poderia ser minorado se a identificao das necessidades da carreira fosse feita mais cedo de modo a permitir a subsequente sequncia do processo de desenvolvimento da carreira" (Humes 1982, p. 352).O conceito de desenvolvimento da carreira definido por Sears (1982), como sendo "a constelao de factores psicolgicos, sociolgicos, educativos, fsicos, econmicos e do acaso que em conjunto modelam a carreira do indivduo ao longo da vida" (p. 139). Estes factores da experincia individual contribuem para o processo pelo qual se desenvolve e apura, caractersticas como a identidade pessoal e da carreira, planeamento e maturidade da carreira. O desenvolvimento da carreira prossegue de uma forma lenta ou rpida, positiva ou negativa, independentemente da existncia de programas da educao e/ou orientao. Ou seja, "o desenvolvimento da carreira no uma interveno, mas objecto de uma interveno" (Herr & Cramer, 1992, p. 27).Embora existam vrias concepes de carreira, optamos pelo modelo do "Arco ris da Carreira" de Super (1984) cuja reprentao grfica indica que "a carreira composta por uma constelao de papis em mudana e que nessa constelao o nmero de papis varia com a idade" (Super, 1988a, p. 24). Considera a existem de nove papis ao longo da vida: o de criana; o de estudante; o dos tempos livres; o cvico; o profissional; o conjugal; o domstico; o parental e o da reforma. Para o autor, o esquema mostra claramente que na escolha da combinao dos papis, cada pessoa faz uma escolha da forma de se expressar, de utilizar as suas aptides, de encontrar a satisfao para os seus interesses e de consolidar os seus valores (Super, 1988a, p. 23).No que se refere s abordagens tericas, Crites (1981) menciona que tm sido desenvolvidos alguns esforos na perspectiva do desenvolvimento da carreira em reabilitao.Nesta rea, a literatura evidencia duas formas de posicionamento diferentes: os investigadores que descrevem e utilizam as abordagens tericas-prticas tradicionais do desenvolvimento da carreira para as populaes normais e seleccionam as tcnicas e estratgias que consideram mais adequadas no(s) modelo(s) escolhido para os casos com deficincia; e os investigadores que propem modelos especficos para estes casos.No presente captulo, so apresentadas as quatro abordagens tericas da orientao da carreira para populaes normais que, segundo Navin e Myers (1983), so as mais frequentemente referenciadas na literatura sobre a carreira de sujeitos com deficincia intelectual: abordagem trao-factor; os modelos de tomada de deciso; o modelo de Holland e o modelo desenvolvimentista de Donald Super.Cada um dos modelos ser analisado sob o ponto de vista dos pressupostos tericos originais, e apreciado em termos da sua aplicabilidade na orientao de indivduos com deficincia intelectual.

1.A abordagem trao-factor

A abordagem trao-factor deriva das contribuies iniciais da psicologia diferencial para o desenvolvimento da carreira, atravs do uso e construo de testes de inteligncia e de aptides (Super 1984, p. 193). Tambm a psicologia aplicada influenciou esta abordagem que defende que o indivduo possui um padro de traos (interesses, aptides, caractersticas de personalidade) que podem ser identificados atravs do uso de testes psicolgicos, cujos resultados proporcionam um perfil de potencial individual. Tambm os grupos profissionais so susceptiveis de proporcionar um perfil de acordo com traos individuais requeridos. O sistema permite "combinar" os dois perfis permitindo a escolha vocacional do indivduo. Do ponto de vista histrico, foram os estudos trao-factor que contribuiram para os fundamentos tcnicos da orientao vocacional, com o procedimento de trs etapas que requeria melhor e maior informao acerca das diferenas individuais e mtodos de avaliao (primeiro etapa); das profisses ou grupos profissionais (segundo etapa), e tambm do processo de tomada de deciso (Herr & Cramer, 1992, p. 6). Etapas que estimularam respectivamente, os estudos psicomtricos, a ateno para a recolha e uso de informao das profisses e por ltimo as investigaes sobre a tomada de deciso.Crites (1981) sugere que o modelo trao-factor construdo com base em dois grandes pressupostos filosficos e psicolgicos. O primeiro caracteriza-se por ser aterico com excepo para o conceito de diferenas individuais. Contrariamente maioria das outras teorias do desenvolvimento da carreira esta no apresenta conceitos hipotticos. O segundo, salienta a orientao atomista e analtica, na medida em que os "traos e factores" do indivduo so medidos atravs de testes padronizados o que "torna os procedimentos em actual declnio" (p. 23).Outros autores, como por exemplo Osipow (1983), consideram que as ideias do modelo trao-factor foram integradas em abordagens teoricas subsequentes. Herr & Cramer (1992) defendem que um dos aspectos mais fracos da abordagem trao-factor (a perspectiva esttica dos traos individuais/exigncia do meio) tem sido actualmente ultrapassada, medida que os procedimentos se alteram, em vez de se relacionar um preditor (como por exemplo, o resultado num teste) a uma profisso, tem-se cada vez mais em conta os padres dos atributos e a sua relao com a sequncia das decises que os indivduos estabelecem no mundo do trabalho, evidenciando uma perspectiva mais dinmica.A questo da predio do sucesso formativo ou profissional a partir dos resultados obtidos com testes psicolgicos padronizados tambm assinalada como uma limitao da teoria (Herr & Cramer, 1992). Alguns outros autores, (Brown, 1984) consideram haver uma relao positiva e at forte entre as medidas psicolgicas, o sucesso e a satisfao profissional "quando se analisam os coeficientes de validade mais elevados e no as suas mdias" (pp. 11-12).Entre as variveis preditivas de maior importncia e estudo nesta abordagem, mencionam-se as aptides. No entanto, outros importantes preditores, como as caractersticas da personalidade, os valores, os nveis de energia, a perseverana revelam-se de inegvel importncia e "com elevada probabilidade explicam a varincia no prevista pelas medidas de trao" (Herr & Cramer, 1992 p. 159). Por isso se considera a abordagem descritiva e no explicativa, no que se refere ao desenvolvimento dessas variveis no processo de escolha da profisso.A utilidade da abordagem trao-factor em deficincia intelectual verificou-se rapidamente do ponto de vista da aplicao prtica no processo de reabilitao profissional. Este processo caracteriza-se por oferecer servios que incluem diferentes componentes: mdico, psicolgico, social e profissional. Este ltimo composto por vrias fases: avaliao do desempenho no trabalho; ajustamento ao trabalho; formao profissional e colocao (Bolton, 1982, p. 8).A necessidade de combinar as capacidades das pessoas com deficincia s exigncias dos empregos um dos factores mais citados na literatura sobre ajustamento ao trabalho e colocao em reabilitao, onde as tcnicas de anlise e descrio de funes, da modificao e reestruturao das tarefas, so fundamentais e derivam do desenvolvimento da orientao trao--factor (Navin & Myers, 1983).Um dos modelos de referncia na etapa de ajustamento ao trabalho, que mais se aproxima da abordagem trao-factor o Minnesota Minnesota Theory of Work Adjustment de Dawis (1976, citado por Bolton, 1982). Baseia-se no pressuposto que o indivduo procura realizar e manter uma correspondncia com o meio profissional. O modelo sumarizado em princpios, dos quais se destacam os conceitos de : tempo de durao e manuteno no emprego (combinao entre a satisfao e realizao); satisfao profissional (a semelhana entre as necessidades profissionais e os reforos do meio profissional); realizao (funo da correspondncia entre as capacidades individuais e as exigncias requeridas pela profisso).Desta forma, o grau de correspondncia ou semelhana entre as necessidades e reforos determina a satisfao profissional, enquanto a correspondncia entre as capacidades individuais e as exigncias determina o grau de realizao profissional. O conceito de correspondncia depende do pressuposto que as caractersticas relevantes da pessoa e do meio profissional so relativamente estveis (Bolton 1982, p. 2-6).

2.Modelos de tomada de deciso

A literatura revela que a investigao sobre os modelos explicativos do processo de tomada de deciso no desenvolvimento da carreira se desenvolve ao longo de todo o processo de tomada de deciso, desde a fase da imaginao, escolha at fase da sua implementao ou no (Fouad, 1994). Adoptando a definio de Herr & Cramer (1992) as decises "so os testemunhos pblicos acerca de como as pessoas se vem a elas prprias, como vem as relaes entre elas () "simbolizam mas no descrevem todos os significados ocultos da escolha, os factores que a constituem, ou a esperana ou desespero subjacentes a uma deciso especfica" (p. 164).Apesar de assumirem o processo de tomada de deciso como construto central no desenvolvimento da carreira, os diversos autores que se inscrevem na teoria da deciso, adoptam abordagens conceptuais diferentes (Herr & Cramer, 1992). Exemplo disso so as perspectivas da aprendizagem social (Mitchell & Krumboltz, 1984) e da teoria da informao (Gelatt, 1962) que seleccionamos por serem das mais citadas na literatura sobre orientao em casos de deficincia.Para Mitchell & Krumboltz (1984), as experincias da aprendizagem e os seus efeitos so um poderoso determinante nas escolhas e no desenvolvimento da carreira dos indivduos. Antes do desenvolvimento formal da teoria, os autores estudaram a aplicao das tcnicas comportamentais, tais como o reforo verbal e modelao social, s questes profissionais da educao. Na teoria da aprendizagem social, a nfase dada explicao de como as preferncias e competncias educativas e profissionais so adquiridas e na forma como so feitas as escolhas nestas duas reas (Harrington, 1982).Mitchell & Krumbolt (1984) consideram que as personalidades e reportrios comportamentais individuais que as pessoas possuem "derivam mais das suas experincias de aprendizagem nicas e no tanto do desenvolvimento inato ou dos processos psquicos. Estas experincias consistem no contacto e na anlise cognitiva de acontecimentos reforantes positivos ou negativos" (p. 235). Os autores explicitam ainda que a teoria da aprendizagem social "reconhece que as pessoas so inteligentes, que os indivduos se esforam a todo o momento resolver os reforos que o rodeiam, controlando no entanto o seu meio de forma a realizarem os seus objectivos e necessidades" (pp. 235-236).As experincias de aprendizagem so proporcionadas pelo meio e pelas iniciativas dos indivduos e resultam em generalizaes acerca de si prprio, no desenvolvimento de competncias para lidar com o meio e o incio de comportamentos relacionados com a carreira, tais como a seleco de um programa de formao profissional (Harrington, 1982).De uma forma global, o modelo de Mitchell & Krumboltz (1984) acentua a importncia das experincias aprendidas dos indivduos na preferncia por determinadas actividades, bem como na capacidade de abordagem das diferentes tarefas.Assim, no contexto da teoria da deciso da carreira, em particular, as escolhas so influenciadas pelos factores do meio j mencionados passveis de serem aprendidos pelo indivduo, bem como a aquisio sistemtica das capacidades de tomada de deciso da carreira.Do ponto de vista prtico, Mitchell & Krumboltz (1984) tm desenvolvido trabalhos no estudo das crenas irracionais e a sua influencia no processo de deciso. Essas crenas potencialmente elicitadoras de mal-estar na deciso da carreira, relacionam-se, por exemplo, com a ignorncia dos factores relevantes, generalizaes de culpa, auto-comparao a uma s referncia, valorizao indevida de acontecimentos de "stress" de baixa probabilidade. Os autores identificam quatro causas que esto na origem do processo de tomada de deciso (auto--estima; surpresa; limites de tempo e ausncia de tempo para tomar a deciso), que podem provocar reaces do tipo: diminuio da ateno, aumento da rigidez cognitiva, limitao de perspectivas, e sentimentos de culpa (pp. 264-266). A teoria prev ainda mtodos para a identificao e interveno dessas crenas, que incluem avaliaes das auto-observaes dos indivduos e das suas generalizaes sobre o exterior; tcnicas de reestruturao cognitiva; passando pelos instrumentos de avaliao psicomtrica, at anlise das "capacidades de abordagem tarefa" com a prescrio de estratgicas para os aspectos fracos das capacidades.Finalmente Unruh (1979, citado por Harrington, 1982, p. 18) menciona seis vantagens da teoria da aprendizagem social sobre as existentes:1."O comportamento humano est sob controlo do indivduo bem como do meio; o indivduo pode exercer determinado controlo sobre as alternativas e consequncias".2."As fontes de reforo, quer internas quer externas, actuam como fontes motivacionais e informativas na interpertao das experincias do passado com a antecipao dos acontecimentos, facilitando o processo de aprendizagem".3."A teoria abrangente e inclui a influncia de factores sociolgicos, econmicos e psicolgicos tais como experincias, aspiraes e capacidades".4."So considerados constructos, tais como o auto-conceito".5."O modelo descreve os processos e operaes em termos operacionais e demonstra como se ajusta uma estrutura dupla".6."O modelo lida com causas e efeitos observveis, facilitando a investigao e interveno".Numa perspectiva diferente, Gelatt (1962, citado por McDaniels & Gysbers, 1992) descreve o processo de tomada de deciso afirmando de um modo geral que todas as decises tm as mesmas caractersticas: um decisor, a situao na qual existem dois ou mais cursos de aco possveis e a deciso a ser feita com base em informaes. A estratgia para tomada de deciso requer trs elementos: "obter informao, que constitui a base da deciso; organizar e reorganizar essa informao e efectuar a deciso" (p. 58). Desta forma, quanto mais bem informada estiver a pessoa, mais claros se tornam os riscos do processo de tomada de deciso (Harrigton, 1982, p. 2).Com o objectivo de melhor conhecer as condies sob as quais o processo de tomada de deciso ocorre, Gelatt (1989) sugere uma nova definio de tomada de deciso como sendo "o processo de organizar e reorganizar informao numa escolha ou aces" (p. 253). Complementa o seu paradigma inicial mencionando que: "o apropriado identificar uma estrutura de deciso de aconselhamento que permita ajudar os utentes a lidar com a mudana e a ambiguidade, aceitarem a incerteza e inconsistncia, e a utilizarem o lado irracional e intuitivo do pensamento e da escolha" (p. 255). Assim, prope o conceito de "incerteza positiva" integrando-o no conceito de risco que envolve, segundo o autor, todo o processo de deciso (McDaniels & Gysbers, 1992, p. 59).Gelatt (1989) postula que "no mundo actual, o futuro no existe e no pode ser previsvel, mas imaginado e inventado" () que a "estratgica racional no obsoleta mas apenas insuficiente" (p. 255). Ao formular estratgicas de aconselhamento, o autor considera que "ajudar algum como decidir deve incluir o desenvolvimento de estratgicas racionais, lineares e sistemticas, mas tambm, o ensino de situaes intuitivas e por vezes mtodos inconsistentes de resoluo de problemas ou tomada de deciso" (p. 253).No que se refere aplicao destes dois paradigmas da teoria da deciso, ao desenvolvimento da carreira em deficincia intelectual, Harrington (1982), Thomas & Parker (1992) referenciam-nos como fundamentais enquanto quadro conceptual apropriado e prescritivo em orientao.Gelatt (1962 citado por Harrington, 1982) considera que a perspectiva da tomada de deciso serve para "ajudar o estudante a utilizar as decises mais imediatas preparando-o com objectivos de testar a realidade e modificar o seu auto-conceito, e consequentemente influenciar as suas decises acerca de objectivos finais" (p. 23). Ponto de vista que leva Harrington (1982) a defender esta teoria por entender que os autores tiveram em conta que as expectativas irrealistas so um dos maiores problemas da orientao em deficincia intelectual. Por outro lado, a incluso de estratgicas de tomada de deciso num paradigma metodolgico de fundamental importncia por se considerar uma competncia bsica do desenvolvimento da carreira de qualquer pessoa sobretudo com deficincia intelectual.Objectivos onde se incluem tambm os princpios tericos e tcnicos da teoria da aprendizagem de Krumboltz, cujo ecletismo leva os autores em reabilitao profissional particular a adopt-la como referncia. No contexto da teoria da aprendizagem, Thomas & Parker (1992, p. 54) assinalam que apesar de a teoria revelar pouca preocupao com a causalidade e classificao dos diferentes inadaptados e nenhuma suposio sobre os processos psicopatolgicos, oferece um arqutipo explicativo e prescritivo passvel de adaptao ao desenvolvimento da carreira em deficincia intelectual. Na medida em que os problemas correntes derivam quer da aprendizagem de comportamentos inadequados quer da ausncia de aprendizagem de diferentes comportamentos adaptativos especficos, o foco da interveno est na identificao do(s) problema(s) do utente, em estabelecer objectivos comportamentais especficos para minimizar o problema e seleccionar a tcnica mais apropriada para atingir o objectivo.Da proposta terica e metodolgica de Krumboltz & Thoresen (1964, citado por Thomas & Parker, 1992) destacam-se quatro caractersticas interrelacionadas que os ltimos autores consideram responder s necessidades em reabilitao profissional, por permitirem que os procedimentos se tornem continuamente flexveis e adaptados na ajuda ao utente. A primeira relaciona-se com a nfase no processo de formulao de objectivos, que deve cumprir trs critrios: "ser desejado pelo utente"; "que o conselheiro esteja disposto a ajudar o utente a atingir o objectivo"; "ser possvel avaliar se o objectivo foi ou no atingido" (Krumboltz & Thoresen 1969, citado por Thomas & Parker, 1992, p. 54). A segunda caracterstica de que a mesma tcnica no aplicada universalmente, permitindo seleccionar um ou a combinao de procedimentos para atingir um objectivo. A terceira caracterstica que, exceptuando consideraes ticas, no existem restries s possveis tcnicas a serem utilizadas. Como quarta caracterstica, os autores referem que os procedimentos necessitam ser modificados com base na evidncia emprica.Finalmente, a abordagem da tomada de deciso revela-se de aplicao prtica num vasto nmero de contextos em reabilitao, designadamente em orientao (Harringhton, 1982) sobretudo ao postular-se que critrio de sucesso tende a ser nico para cada cliente (Thomas & Parker, 1992).

3.O modelo de Holland

No mbito das diferentes abordagens psicologicas, Herr & Cramer (1992) consideram que a teoria de Holland (1985) d especial nfase ao estilo de comportamento ou tipo de personalidade como tendo grande influencia na escolha e desenvolvimento da carreira. O prncpio que sublinha a teoria do autor a de que a escolha profissional expresso da personalidade (Holland, 1985). Este modelo tem sido descrito como sendo "estrutural e interactivo, no sentido em que estabelece a ligao entre as caractersticas da personalidade individual e as profisses" (Weinrach, 1984, p. 63).Ao serem caracterizadas, pela sua semelhana, em seis tipos de personalidade, (realista, investigativo, artstico, social, empreendedor e convencional), Holland (1985) considera que as pessoas podem identificar-se com um tipo de personalidade predominante associado a um segundo ou terceiro tipo que em conjunto contribuem para a forma como o indivduo se relaciona com o meio. Quanto mais uma pessoa se assemelha a determinado tipo, maior ser a probabilidade de manifestar diferenas e traos atribuidos a esse tipo. Devido complexidade da personalidade, uma pessoa pode assemelhar-se a diferentes tipos em vrios graus. "Um tipo um modelo terico com o qual uma pessoa pode ser comparada" (p. 2). Holland e Gottfredson (1976), descrevem o desenvolvimento da predisposio tipolgica de um indivduo como: "as pessoas crescem assemelhando-se a um tipo ou outro porque, os pais, a escola, e a vizinhana servem como meios que reforam mais uns comportamentos do que outros e fornecem modelos diferentes para comportamentos adequados. O reforo consiste no encorajamento selectivo de actividades, interesses, auto-estima e competncias ()" (p. 21).Existem tambm seis tipos de meios profissionais, com as mesmas designaes e certas caractersticas de orientao pessoal, o que acentua o carcter interactivo da teoria (Herr & Cramer, 1992). A hiptese de Holland (1985) que as pessoas procuram meios compatveis com os seus tipos de personalidade. De uma forma geral, as pessoas preferem associar-se com quem partilhem pontos de vista, interesses e competncias. Assim, um tipo de personalidade investigativa procura e tende a obter maior satisfao em meios investigativos.Numa anlise efectuada por Harrington (1982), sobre a teoria do desenvolvimento da carreira de Holland, o autor considera de grande importncia transpr os pressupostos tericos e metodolgicos para mbito da deficincia. Porque a teoria oferece um "modelo estrutural" que relaciona o indivduo e a sua personalidade s profisses, pelo que a metodologia implica a explorao alargada do mundo do trabalho.Relativamente ao conhecimento da orientao e do processo de desenvolvimento da carreira em deficincia, Merachnik (1970, citado por Harrington, 1982) menciona algumas recomendaes:1."A avaliao para as oportunidades de trabalho deve focar os aspectos fortes e no os fracos."2."Com grande probabilidade os estudantes com deficincia tm restries no processo exploratrio e poucas experincias que os ajudem a formular interesses."3."Os estudantes com deficincia tm menos oportunidades do que os no deficientes em participarem em situaes de teste para explorao da carreira. Testes individuais e de grupo so necessrios."4."A aceitao por parte das famlias de um plano de carreira definido, depende da aceitao que tm das limitaes do educando" (p. 17).Ao analisar estas recomendaes, em termos de teoria de Holland, Harrigton (1982), salienta cinco aspectos tericos e metodolgicos relevantes para o mbito da reabilitao profissional. Assim,1."As pessoas s se definem a elas prprias em termos positivos se existirem apenas alternativas positivas. A teoria de Holland no utiliza o conceito de aspectos fracos ou negativos. A incluso de limitaes no processo de planeamento da carreira, especialmente no incio, pode limitar as opes."2."A introduo de instrumentos de avaliao exploratrios (e.g., Self Directed Search-SDS), permite analisar os projectos profissionais individuais, competn-cias, actividades, preferncias profissionais e capacidades."3." necessrio adoptar instrumentos de avaliao s populaes com necessidades especiais, (o que j foi realizado por Reardon & Weiler (1980), com uma forma tctil do S.D.S), o que potencia o desenvolvimento metodolgico dos instrumentos de Holland."4."A interaco em pequenos grupos de partilha e discusso sobre diversos pontos de vista acerca das profisses, talentos e interesses, proporcionada por alguns instrumentos de avaliao (e.g., S.D.S) o que deve tambm ser complementado por avaliaes individuais afim de controlar alguns enviasamentos (e.g., pensamentos estereotipados) criados no grupo."5." medida que as pessoas alteram as suas prticas tradicionais, o que irrealista pode tornar-se realidade no futuro" (Harrington, 1982, p. 17).Este ltimo aspecto assinalado por Thomas & Parker (1992) como uma limitao da teoria de Holland por no reconhecer as mudanas na sociedade o que prejudica a sua aplicao aos grupos minoritrios. Uma segunda crtica da teoria de Holland considera-a mais descritiva do que explicativa. A nfase colocada na descrio quer dos tipos de personalidade, quer dos tipos de meio, em desfavor da explicao dos factores causais, que os determinam bem como das sequncias de desenvolvimento atravs das quais a personalidade de cada indivduo passa.De uma forma geral e especficamente no mbito da reabilitao, os autores entendem que a teoria do desenvolvimento da carreira baseada na personalidade proporciona uma estrutura para a classificao das profisses ou grupos profissionais e os meios para efectuar a relao entre as caractersticas de personalidade dos utentes a essa estrutura, o que lhe confere utilidade.

4.O modelo desenvolvimentista de Donald Super

A abordagem desenvolvimentista uma das linhas de pesquisa mais produtivas no domnio das escolhas profissionais e do modo como os indivduos as efectivam. A nfase desenvolvimentista afasta-se das abordagens precedentes na medida em que a carreira e o processo de tomada de deciso se consideram expressar longitudinalmente no decorrer da vida do indivduo (Herr & Cramer, 1992).De acordo com a sua teoria, Super (1951) salienta que os indivduos escolhem as profisses que lhes permitem desempenhar papis consoante o seu auto-conceito. Identifica tarefas de desenvolvimento da carreira para cinco estadios de vida, cujos contedos diferem, mantendo-se todavia os princpios de deciso em qualquer idade ou estdio de vida. A comprenso dos estdios da carreira permite um conhecimento das questes, papis e conflitos que a maioria das pessoas enfrenta durante o seu perodo de vida, bem como uma perspectiva longitudinal da maturao da carreira. Uma das suas premissas de que as pessoas so simultaneamente racionais e emotivas e, consequentemente "o melhor aconselhamento profissional uma combinao dos dois, algures entre extremos tericos" (p. 91). Atravs das investigaes efectuadas no Career Pattern Study, desenvolveu o conhecimento base acerca da maturidade profissional que levou a perspectivar a orientao "no apenas um aconselhamento destinado escolha mas um tipo de aconselhamento que leva ao desenvolvimento da escolha () e que envolve a ajuda na compreenso dos factores, sociais, pessoais e outros que contribuem para as decises educacionais e profissionais dos indivduos" (Super & Overstreet, 1960,