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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS - MG Instituto de Ciências da Natureza Curso de Geografia Bacharelado THAIS MAIARA VIEIRA A OBRA GEOGRAFIA COMPARADA E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A HISTÓRIA DO PENSAMENTO GEOGRÁFICO Alfenas - MG 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS - MG

Instituto de Ciências da Natureza

Curso de Geografia – Bacharelado

THAIS MAIARA VIEIRA

A OBRA GEOGRAFIA COMPARADA E SUA

CONTRIBUIÇÃO PARA A HISTÓRIA DO

PENSAMENTO GEOGRÁFICO

Alfenas - MG

2015

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THAIS MAIARA VIEIRA

A OBRA GEOGRAFIA COMPARADA E SUA

CONTRIBUIÇÃO PARA A HISTÓRIA DO

PENSAMENTO GEOGRÁFICO

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado como parte dos requisitos

para obtenção do título de Bacharel em

Geografia pelo Instituto de Ciências da

Natureza da Universidade Federal de

Alfenas- MG, sob orientação do Profº.

Drº. Flamarion Dutra Alves.

Alfenas – MG

2015

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS

Rua Gabriel Monteiro da Silva, 700 - Alfenas MG - CEP 37130-000

A OBRA GEOGRAFIA COMPARADA E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A

HISTÓRIA DO PENSAMENTO GEOGRÁFICO

THAIS MAIARA VIEIRA

Alfenas/Agosto 2015

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“Logo que, numa inovação, nos mostram alguma coisa de

antigo, ficamos sossegados.” Friedrich Nietzsche

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AGRADECIMENTOS

Agradeço minha Mãe ANDRÉA em primeiro lugar porque sem ela esse trabalho

não seria possível. Sua paciência, seu esforço e sua fé em mim me incentivaram a

continuar. Sei que demorou, e que em muitos momentos quando pensei em desistir te

deixei extremamente preocupada, porém você ficou firme e se manteve ali do meu lado, me

ajudando a seguir em frente, e mesmo nos piores momentos não deixou a distância entre

nós duas atrapalhar, sempre disposta a fazer o que fosse preciso por mim e pela minha

felicidade, te dedico esse trabalho.

A minha família, meus avós Maria e Paulo, meus tios Paulo e Fabrício, meu

irmão lindo que me fez morrer de saudade cada segundo dos meus dias, Murilo, o qual

não vi crescer, mas acompanharei de perto nessa nova fase, e meu padrasto Márcio, que

tanto fez para que tudo caminhasse bem, tomando conta da minha mãe e irmão, obrigada a

todos pelo apoio durante essa extensa caminhada, pela preocupação, pelos incentivos e pelo

apoio, mesmo à distância. Sem vocês eu não conseguiria.

Aos amigos que fiz em Alfenas e que não se restringiram a serem apenas amigos,

mas que foram uma segunda família, Lennon, Bruno, João Paulo, Felipe e Daniel. Eu

nunca vou me esquecer dos aprendizados de companheirismo, amor, respeito e culinários

também. Vocês são irmãos que vou levar pra sempre comigo.

Agradeço as irmãs que fiz pelos lares que passei, em especial a Aline que ficou ao

meu lado nos piores e melhores momentos e nas fases mais intensas que a vida em Alfenas

me possibilitou, e ainda entre as irmãs que fiz, mesmo não morando comigo, também

estiveram ao meu lado como estacas de ferro me ajudando a não desistir, Caroline e

Juliana, sempre com palavras de conforto e o ombro pronto pra aguentar todo o desespero

da faculdade e afins.

Ao namorado mais lindo, João Eurico, que me apoiou imensamente e proporcionou

grandes momentos durante o final dessa graduação, sendo também peça chave pra que tudo

fosse mais fácil e divertido, me mostrando em diversos momentos a necessidade de

perseverança e foco nos meus deveres, sempre ao meu lado se dedicando com todo o

carinho e amor que precisei.

Agradeço aos professores que tive o prazer de conhecer. Aprender suas lições com

certeza me tornaram uma pessoa mais sábia e com uma visão de mundo muito mais ampla

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e justa. Vocês são exemplos de pessoas e de profissionais que moldaram o meu

aprendizado universitário.

Em especial agradeço ao meu orientador Flamarion Dutra Alves por todos os

puxões de orelha, que não foram poucos, e principalmente por não ter perdido a paciência

com a minha cabeça de vento. Obrigada por todos os ensinamentos e por ser esse

orientador atencioso e disposto que você foi desde o início.

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RESUMO

Este ensaio visa trazer ao panorama científico geográfico um destaque a uma obra de

importância fundamental à disciplina, a obra Geografia Comparada (1809), de Karl Ritter.

Karl Ritter foi um sistematizador da ciência geográfica que durante o século em que viveu

dedicou-se a contribuir sistematicamente com a compreensão do mundo em que viveu,

bem como retratar aquilo que compreendia do mundo e da natureza. No entanto, suas

obras se tornaram pouco acessíveis ao decorrer dos anos e há que se fazer o resgate de seu

pensamento e elucidar quais foram suas ideias que tanto contribuíram para a história do

pensamento geográfico. Ritter não fez escola enquanto professor na Universidade de

Berlim, mas ensinou a muitos grandes geógrafos que hoje estudamos vigorosamente

para que se faça a nossa compreensão geográfica, do mundo e da sociedade. Parte do que

vemos hoje na Universidade nos mostra como é importante integrar os conhecimentos

geográficos concernentes as duas grandes áreas do nosso pensamento, o físico e o

humano e foi Ritter que elucidou a importância e a integralidade de ambas as esferas

quando em seus estudos procurou evidenciar a complexidade de um sistema integrado do

começo ao fim, entre os fatores orgânicos e não orgânicos que coexistem na natureza.

Sendo assim, resgatar partes do pensamento de Karl Ritter é de extraordinária importância

para que hoje, os geógrafos de nossa época possam estar mais perto daquilo que deu

início ao pensamento geográfico e que proporcionou o salto que a Geografia

precisava para ser entendida como a ciência importante que de fato é e sempre foi.

Palavras Chave: História do Pensamento Geográfico; Geografia Comparada; Karl Ritter.

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ABSTRACT

This essay aims to bring the geographical scientific panorama a highlight to a work of

fundamental importance to the discipline , the work Compared Geography ( 1809) , Karl

Ritter. Karl Ritter was a systematizer of geographical science during the century in which

he lived he devoted himself to contribute systematically to the understanding of the world

in which he lived, as well as portraying that which comprised the world and nature.

However, his works became little accessible to over the years and we must make the

rescue of his thought and elucidate what were their ideas that both contributed to the history

of geographical thought. Ritter didn't do school while a professor at the University of Berlin,

but taught many great geographers that today we study vigorously for our geographical

understanding of the world and society. Part of what we see today in the University shows

us how important it is to integrate the geographic knowledge concerning the two large areas

of our thinking, the physical and the human and Ritter elucidated the importance and the

entirety of both balls when in his studies sought to highlight the complexity of an

integrated system from beginning to end, between the organic and inorganic factors that exist

in nature. Therefore, to rescue parts of the thought of Karl Ritter is of extraordinary

importance for today, the geographers of our time might be closer to what initiated the

thought and which provided the jump that the geography needed to be understood as the

important science that actually is and always has been.

Key-words: History of Geography, Comparative Geography; Karl Ritter.

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SUMÁRIO

1 - INTRODUÇÃO................................................................................................................10

2 – OBJETIVOS....................................................................................................................11

3 – JUSTIFICATIVA............................................................................................................12

4 – METODOLOGIA...........................................................................................................13

5 - INTRODUÇÃO A KARL RITTER, SEU MÉTODO E SUA OBRA.........................15

6 – A GEOGRAFIA COMPARADA DE KARL RITTER...............................................21

6.1 - INTRODUÇÃO: A FORMA ESFÉRICA DA TERRA...............................................21

6.2 -PARTE I: O ELEMENTO HISTÓRICO NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA......................25

6.3 - PARTE II: CONSIDERAÇÕES MAIS PROFUNDAS SOBRE OS RIOS...................29

6.3 - PARTE III: O NOVO MUNDO.....................................................................................31

7 – CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................................35

8 – REFERÊNCIAS..............................................................................................................37

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1 - INTRODUÇÃO

A Geografia passou por muitos momentos durante sua existência até que chegasse ao

que conhecemos hoje. Várias foram as escolas do pensamento que foram compondo o corpo

dessa disciplina e conforme o passar dos séculos diversos autores elaboraram significados

mais ricos para ela. Dentre os trabalhos mais importantes estudados no século XIX, foi a obra

de Karl Ritter que contribuiu para sua institucionalização como Ciência Acadêmica e dotou

de significado aquilo que antigamente eram estudos meramente descritivos, tornando os

estudos geográficos mais significativos a partir de seu método comparativo que detalharemos

ao longo dessa pesquisa.

As pedras, as plantas, os animais e o homem, em si mesmos objetos de suas

próprias ciências, constituem objeto da Geografia na medida em que tiverem

importância para a natureza da superfície da Terra ou dela forem características. (KRAFT, apud WOOLDRIDGE 1980.)

O debate sobre a Geografia e seu objeto de estudo se provou extremamente complexo

ao longo dos anos, trata-se de uma ciência que possui um vasto campo de investigação que

compreende desde os espaços puramente físicos da natureza até o lado humano que vai a

busca da compreensão do homem, sua função na natureza e também sua função social, dentre

todos os outros homens. Ainda hoje podemos notar que o debate acerca do objeto geográfico

persiste, no entanto, muito se produziu e muitas foram as teorias que defenderam que a

Geografia, apesar de ser uma ciência de síntese dos conhecimentos sobre o Homem e a Terra,

possui, exatamente aí, o seu diferencial perante as demais ciências com objetos muito mais

específicos.

Assim, o presente trabalho busca fazer uma contribuição à História do Pensamento

Geográfico através da tradução de trechos da obra Geografia Comparada de Karl Ritter e

analisar as características da obra de Ritter e ver como os elementos humanos e naturais eram

interpretados.

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2- OBJETIVOS

A Geografia é uma Ciência que busca compreender as diversas relações do homem

com o mundo que habita, sendo assim, faz-se necessário ao Geógrafo que compreenda como

o pensamento científico e o objeto dessa nossa ciência tão abrangente evoluiu ao longo dos

séculos. Para que isso se torne possível, diversos autores têm se preocupado em estudar os

geógrafos mais antigos no intuito de compreender de fato a evolução do nosso pensamento e

das escolas pelas quais a Geografia passou.

Traduzir, então, esses trechos importantes e de relevância aos estudos geográficos de

capítulos da principal obra de Karl Ritter Comparative Geography faz-se necessário e

convidativo ao geógrafo que quiser melhor compreender o início da institucionalização da

Geografia no século XIX.

Dessa forma, os objetivos da pesquisa são:

OBJETIVO GERAL:

- Analisar partes da obra Comparative Geography de Karl Ritter e discutir sua

contribuição para a História do Pensamento Geográfico.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

- Traduzir textos selecionados na obra Compative Geography de Karl Ritter e

entender a associação entre homem e natureza;

- Discutir a importância da Geografia Clássica e do Positivismo no início da

Geografia Científica;

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3- JUSTIFICATIVA

Por se tratar de um autor como Karl Ritter e sua obra de suma relevância para a

História da Geografia, considera-se importante traduzir partes desses capítulos para a Língua

Portuguesa, uma vez que a obra original é escrita no idioma Alemão e não haver tradução

para a Língua Portuguesa, somente para a Língua Inglesa.

Karl Ritter, considerado um dos maiores Geógrafos do mundo e de renome para a

história da Ciência Geográfica escreveu sobre temas importantes e produziu um

conhecimento geográfico que, através desse trabalho, busca-se tornar acessível a todos os

Geógrafos brasileiros que tiverem interesse em estudá-lo e consultá-lo no intuito de

compreender melhor como foi a história dessa Ciência tão ampla e importante, que trata de

tantos temas relevantes para a compreensão do mundo e das relações humanas dentro dele.

A importância de Ritter para a Geografia vai muito além de seu tempo, sendo

referência teórica para diversos geógrafos como Paul Vidal de La Blache, Friedrich Ratzel,

Eliseé Reclus, entre outros Geógrafos renomados para nossa investigação geográfica.

A Geografia Regional e Comparada foram caminhos metodológicos que deram o

status de Ciência para a Geografia, ou seja, o rigor e uma normativa para os estudos do

espaço geográfico. A partir da obra Geografia Comparada têm-se um marco para a Geografia,

portanto, se faz necessário conhecer e discutir melhor essa obra.

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4 - METODOLOGIA

Como material foi utilizada a Obra Comparative Geography (Figura 1), traduzida para

o inglês por Willian L. Gage de 1865, de Karl Ritter, além de textos sobre a história da

geografia e sobre Karl Ritter.

A escolha dos capítulos foi feita de maneira aleatória, por representar temas

relevantes aos Geógrafos da atualidade, os temas irão abarcar quais os elementos históricos

da Geografia como uma Ciência institucionalizada, investigações de Karl Ritter a respeito da

superfície terrestre e por último, um estudo sobre o ‘Novo Mundo’, onde explicitaremos seus

conceitos pós-descobrimento das Américas e as consequências e visões para o mundo após o

descobrimento e desenvolvimento desses continentes.

Para a realização da pesquisa, foi realizada a leitura e tradução de 4 capítulos da Obra

Comparative Geography, cada um deles situado em uma parte do Livro.

Figura 1 - Capa do livro Comparative Geography de autoria de Karl Ritter, 1865.

Fonte: https://openlibrary.org/publishers/Van_Antwerp,_Bragg_&_Co.

As partes selecionadas para a confecção dessa pesquisa seguiram a introdução e uma

parte de cada capítulo, como a obra possui três capítulos, foram representados de forma igual (quadro

1).

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Quadro 1 – Partes da obra Comparative Geography selecionadas para tradução e análise.

CAPÍTULO SÍNTESE

Introduction Contendo partes relevantes para a compreensão do conteúdo que

será abordado nos capítulos sequenciais. Nele encontraremos

explicações de Karl Ritter mais generalizadas para que possamos

compreender o contexto que sua obra apresentará no demais

capítulos. A base metodológica está na Introdução.

The Historical Element

in Geographical

Science

Contido na parte um de sua obra. Nesse observaremos como Ritter

faz menção aos povos antigos em sua Geografia Comparada e a

importância da compreensão da forma complexa que se deu o

desenvolvimento das sociedades em conjunto com os recursos dos

quais faziam uso.

Rivers more closely

considered

Contido na parte dois de sua obra. Este capítulo traz uma

contribuição acerca dos rios e da rede hidrográfica e de como se dá

o seu funcionamento. Ritter explica os elementos e fatores que

fazem parte do curso de um rio e sua complexidade.

The New World Contido na parte três de sua obra. Por último, esse capítulo traz

estudos sobre a América do Sul que Ritter considerou relevante

salientar. Até então, não se conhecia o novo continente muito

bem, então Ritter realiza grande explanação acerca do novo

continente.

Portanto, as análises serão breves da obra de Ritter, cabendo a outros estudos, novas

traduções e interpretações dessa obra clássica. Esta pesquisa apenas trará alguns apontamentos

para a História da Geografia.

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5 - INTRODUÇÃO A KARL RITTER, SEU MÉTODO E SUA OBRA

Karl Ritter nasceu na Alemanha em 1779. A princípio se formou como Filósofo e

Historiador, mas veio a atuar como Geógrafo na Universidade de Berlim, onde ministrava

aulas.

Diferentemente de Humboldt (1769-1859) - seu maior companheiro e que também

fez parte das contribuições para a Ciência nessa época - que compreendia a Geografia como

uma ciência de síntese, na qual sintetizava os conhecimentos relativos à Terra

(MORAES 2005), Ritter defendia uma visão antropocêntrica da Terra na qual os arranjos

individuais das áreas em estudo seriam vistos pelo olhar do Homem, conforme Tatham

(1959),

[...] para Ritter, a geografia centralizava-se no homem; seu objetivo era o estudo

da superfície da terra, do ponto de vista antropocêntrico; procurar relacionar o

homem com a natureza, e ver a conexão entre o homem e a sua história e o solo

onde viveu. Desta forma, um elemento dinâmico entrava no seu ensinamento, “viu

que não devia apenas descrever a superfície da terra e subdividi-la em regiões naturais, porém compreendê-la como sendo a causa fundamental dos

acontecimentos. (TATHAM, 1959, p.210 apud ALVES 2009).

Isso se deve, principalmente, às influências recebidas por Ritter, dentre as quais se

destaca pelo Romantismo presente em sua concepção do mundo como janela de um

espectador, no caso, a visão do homem. O ambiente intelectual Romancista no qual viveu era

composto por personalidades como Goethe, Schiller, Schelling, Hegel, Herder, Humboldt,

dentre outros que não só produziram filosofia e estudos de cunho acadêmico, mas também

foram grandes poetas com grandes feitos para a literatura. As principais características

Românticas presentes em sua obra e na de seus contemporâneos são o redescobrimento da

poesia como forma de expressão, fundamentação teológica, e principalmente a

individualidade na observação e a expressão da compreensão das áreas estudadas em

conformidade com os sentimentos do observador. No entanto, Ritter não foi apenas a

influência romântica que esteve presente em seus livros e publicações bem como também,

além do romantismo podemos encontrar traços de influência Racionalista, que foi de onde

iniciou o uso de metáforas, analogias, comparações e concepções organicistas da natureza

(OSTUNI, 1967).

Podemos dizer que Ritter foi, sobretudo, influenciado por Salzmann em sua fase

racionalista, por Herder e Pestalozzi em sua fase romântica e teológica e por fim , Kant e

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Humboldt no que dizia respeito à comparação das áreas. Sobre os dois últimos, cabe dizer

que levaram Ritter à realização de arranjos individuais e que a metodologia comparativa dos

mesmos o levava a observar e descrever aquilo que via.

O método corológico surgiu com o filósofo Immanuel Kant (Königsberg, 22 de abril

de 1724 — Königsberg, 12 de fevereiro de 1804). Kant ministrava aulas de Geografia dentre

outras disciplinas das quais se ocupou e, em suas aulas ministrava conteúdos referentes à

taxonomia da Terra, Geografia matemática (que hoje conhecemos como a Geologia, pois

estuda as formas, dimensão e movimentos terrestres), a moral dos homens frente à natureza,

Geografia Política e Comercial e a Teologia, na qual realizada uma caracterização e

distribuição das religiões.

Kant vivia na Alemanha durante o período em que aconteceu as Revoluções

Burguesa e Industrial, da qual a Alemanha não participou. Seu projeto enquanto observava

todas as transformações no ideário europeu era o de incorporar o homem no discurso

científico e filosófico, em conjunto com a natureza. Apesar de dividir a Geografia que

ensinava em algumas, a Geografia da qual se ocupou era em suma uma Geografia

taxonômica, de descrição e classificação do mundo físico.

A Alemanha passava por um período difícil, a época da transição do Feudalismo

para o Capitalismo. Chegando tarde à partilha mundial, ainda contava com vários feudos e no

ideário alemão havia uma enorme vontade de expansão territorial e de independência. A

Geografia dessa época, também passando por esse processo de transição, ganhou corpo e

relevância maior, tendo em vista que a vontade de expansão e de uma política mais

abrangente e rica se faziam extremamente necessárias para o país, foi então o início que

elevou a importância de aprimorar os estudos geográficos e foi exatamente o que Ritter

percebeu e colocou em prática.

Ritter surge, então para dar sequência naquilo que Kant já havia proposto para a

Ciência através de seu método Corográfico. No entanto, como Kant não conseguiu por si só

realizar essa grande transformação, foi Karl Ritter quem prosseguiu (MOREIRA 2008)

transformando a Corografia em sua Metodologia Comparada, podendo ser denominada

Corologia (MOREIRA 2008), pois até então os estudo geográficos eram puramente

descritivos e não faziam analogias muito elaboradas. A Alemanha luterana antes da

reelaboração do plano disciplinar, só permitia que fossem ensinadas disciplinas que

servissem à doutrina evangélica, só com a revolução do pensamento é que passou a ser

permitido os estudos com cunhos mais científicos que servissem de base à política

terr itor ial e expansionista do país. A natureza passaria, então, de imutável a um fruto

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da História e produto do desenvolvimento. Para que pudessem se desenvolver, teriam que

produzir estudos acerca da natureza para que compreendessem e a dominassem a seu favor.

O Método Corográfico, que consistia em uma descrição pormenorizada das regiões

e lugares, considerando também todo o processo de formação histórica e os detalhes

dessa descrição. A corografia está inclusive entrelaçada diretamente com o

desenvolvimento e os fundamentos da Geografia Regional. Ritter caracterizava

muito bem a escola tradicional, pois após a análise detalhada das áreas ele partia para o Método Comparativo, diferenciando as regiões entre si. (TEODORO,

2013, p.17)

Ritter foi considerado Geógrafo de Gabinete por muitos de seus contemporâneos,

pois se valia de muitas fontes de viagens já anteriormente realizadas e realizava um

compêndio de informações, assim extraindo aquilo que de mais importante se enquadrava em

sua concepção. Sua comparação se dava em duas maneiras diferentes, uma por analogias e

outra por contraste; defendia ainda que sua maneira de organizar as informações coletadas e

delas extrair a relação de causa e efeito da qual se valia lhe possibilitava melhor compreensão

por nem sempre conhecer o lugar do qual tratava, assim evitava que suas concepções mais

íntimas tomassem forma e influenciassem em suas produções. Neste trecho de seu livro A

Geografia Comparada, suas influências se tornam claras. Por exemplo, no Romantismo, a

natureza traria ao homem a libertação de que necessita (SPRINGER 2009), quando compara

a servidão dos Alpes com a dos cavalos, Ritter romantiza sua escrita e exemplifica como o

Homem está de certa forma domesticando a natureza de seu tempo, e utilizando-a a seu favor.

“Enquanto muitos pontos na grande massa de terra continental foram,

outrora, o berço de uma alta cultura, berço das artes e das ciências, tornou-se um

deserto, a condição civil e política de muitas pessoas nos distritos mais remotos nas

costas oceânicas do globo avançaram com uma rapidez sem precedentes. O curso

do desenvolvimento se deu de maneira muito diferente daquela que foi antigamente.

As distâncias, as influências naturais e até mesmo as produções naturais se

renderam à vitoriosa marcha dos homens e desapareceram depois de seus passos. Em outras palavras, a raça humana está cada vez mais livre das forças da natureza,

o homem está cada vez mais livre do domínio da terra em que habita. As histórias

específicas dos lugares e de continentes inteiros podem confirmar isso.

No começo, os vales arenosos do Nilo foram completamente desperdiçados

pelos seus primeiros habitantes nômades, porém, mais tarde, os egípcios

transformaram aquilo que anteriormente fora desperdiçado, em terras de cultivo

através da instauração da irrigação e da criação de canais dentro daquele jardim, o

mais fértil do mundo. Eles não somente desenvolveram a si mesmos, mas

desenvolveram seu próprio país, até então estéril, em um lugar de suma

importância, e fizeram isso apenas estreitando as relações da água com o solo. Por

negligência e tirania de sucessivos reis daquela época, o vale fértil tornou-se infértil

novamente. O distrito ao lado de Tebas tornou-se um deserto, o frutífero lago

Mareotis, um pântano. Fenômenos similares ocorreram em diversas partes da Europa e da Ásia.

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Outro exemplo de subjugação da natureza pelo homem é encontrado em

grandes cadeias de montanhas. Durante os primeiros séculos depois de Cristo, o

cultivado sul da Europa foi separado do não cultivado céltico e teutônico norte por uma grande barreira natural, a cadeia inquebrável e inatravessável cadeia de Alpes

que passava por toda a Europa central, de leste a oeste. Ao sul estavam os ricos

estados do velho mundo e para além dos Alpes encontrava-se o norte, frio e estéril.

Mas esta antiga e enorme barreira desapareceu, assim como os cantões da Suíça e

os aglomerados populosos do Tirol testemunharam.

(...)

A Suíça tornou-se um país de rodovias estupendas. Os picos que antes eram

inacessíveis, e em torno do quais apenas águias voaram, são agora os Passos do Monte Cenis, Simplon, São Gothardo, Spluga, e São Bernardo; enquanto os Alpes

nevados de Ortler, à leste, agora dão lugar a uma estrada pública.

(...)

Assim como o cavalo selvagem do Turquestão desistiu de sua liberdade e

tornou-se o servo dócil e útil da civilização, este segmento alpino mudou todas as

relações dos países vizinhos. As influências naturais mais estupendas são

enfraquecidas a cada ano. As dimensões físicas podem e devem permanecer

inalteradas, mas a sua influência na vida e na história é prejudicada por essas novas

condições que operam de forma tão poderosa para libertar o homem da dominação

da natureza. O poder do homem fá-lo senhor da terra e dá ainda a chave para a

sujeição das mais grandiosas cadeias de montanhas em suas mãos.” (RITTER 1865,

p.58-60)

Assim, seu Método se resume na explicação de recortes paisagísticos, uma explicação

detalhada de cada recorte regional e não apenas uma análise taxonômica. Isso diferenciou a

sua proposta da de Humboldt que pensava a Geografia como uma ‘Ciência do Cosmos’

(MORAES 2007), fazendo com que também a Geografia servisse ao Estado, uma vez que

passou a diferenciar as áreas. Assim, para Ritter seria necessário fazer um estudo sobre

fenômenos e lugares de maneira singular para que se compreendesse a singularidade e

similaridade de cada recorte paisagístico. Segundo Alves (2009),

Quanto ao seu legado na geografia, Ritter procurou desenvolver

metodologicamente um caminho para as pesquisas, na qual houvesse uma

delimitação da área estudada destacando sua individualidade e características

próprias, para, por conseguinte comparar com outras áreas do globo.” (ALVES,

2009, p.52)

Comparando os estudos de determinada área com o de outra, visava comparar

semelhanças e diferenças, e assim explicar as individualidades de cada área e não somente

descrevê-las. Nesse seu principal trabalho há um intuito deliberado de propor essa

metodologia comparada da Geografia, sendo assim um livro normativo (MORAES 2005).

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O debate entre essas duas maneiras de se orientar os estudos geográficos foi discutida

durante muito tempo por seus sucessores ao longo dos anos. Foi com Paul Vidal de La

Blache (1845-1918) um pensador do possível, ou seja, das inúmeras possibilidades que o

homem tem diante da vida, que a geografia regional alcançou grande desenvolvimento

(LENCIONI 2007). Então, a ciência seguiu no debate entre estudos gerais ou particulares,

como ciência nomotética ou ideográfica, reflexão de Alfred Hetnner, cujo pensamento

buscava um retorno a Kant. Para ele a Geografia não era nem uma ciência nomotética nem

ideográfica, era ambas (LENCIONI 2007).

No entanto, ainda sobre a proposta metodológica abarcada por Humboldt e Ritter entre a

aplicação de leis para generalizar fenômenos comuns e recortes paisagísticos para evidenciar

singularidades de cada área, portanto, fenômenos específicos,

Deve-se a Bernard Varenius a incumbência de relacionar essa dualidade, ou dupla

tarefa, instaurada desde seus primórdios. Para ele, a geografia surgia da

possibilidade de interlocução entre dados dotados de características gerais e dados

de características especiais. Desta forma, a geografia daria conta de abarcar o seu

objeto – a superfície da Terra e suas partes – como apontava o próprio autor. Pode-

se assim apresentar de um lado os fenômenos matemáticos e astronômicos passíveis de aplicações de leis e generalizações, e de outro os fenômenos específicos de um

determinado lugar. Lados interdependentes e não excludentes. (LEAL, 2009, p.2)

Exemplifica-se a metodologia regional de Ritter na passagem a seguir de sua obra,

onde toma regiões específicas para explicar o progresso dessas regiões e como o panorama

regional tem se modificado, e como de certa forma, a reconfiguração de cada uma dessas

regiões em suas singularidades, tem reconfigurado o espaço como uma totalidade a partir do

momento em que cada progresso distinto é sentido em proporções maiores, o que reforça a

influência Kantiana dentro de seu pensamento, cruzando ciência ideográfica e nomotética e

resultando, num resultado geral, apesar de que as investigações tenham sido feitas através da

metodologia de estudos regionais.

Numa rápida ilustração disso, tomemos os Montes Urais como exemplo, foi e ainda é a linha de divisão oriental de um continente e uma barreira ocidental

de outro, mas que se tornou desde os tempos de Pedro I da Rússia, um grande

centro de trabalho e comércio, uma grande avenida da civilização na passagem da

Europa para a Ásia. E em qualquer lugar, desde o Cáucaso e os Himalaias às

grandes cordilheiras americanas, o mesmo progresso é visto; o Homem se torna

cada vez mais e mais o conquistador da natureza. E não é somente nas montanhas e

cordilheiras, mas nas grandes florestas da Europa-central, nas áreas mais primitivas e selvagens da América do Norte e nos pântanos dos Países Baixos.

(...)

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As planícies estéreis de Austrália e Califórnia têm atraído grandes colônias

de suas minas de ouro; os mares de gelo no norte tornaram-se, através dos esforços

de Parry Franklin, e outros, a cena de feitos heróicos e de grandes lutas do homem

com a natureza; de fato, as maiores vitórias da civilização moderna foram lá.” (RITTER 1865, p.60-61).

Ritter se destaca em meio a tantas obras de sua época, então, exatamente por

identificar a dificuldade da Geografia se estabelecer como ciência perante as demais da época

e desenvolver tão bem sua base teórico-metodológica a fim de levar a Geografia para um

nível superior onde não mais fosse somente descritiva, mas que fizesse um compêndio de

observações e que compreendesse quais as características relevantes das áreas e quais suas

funções orgânicas e inorgânicas dentro de um sistema complexo e interligado que é a

natureza. Nessa passagem supracitada notamos como Ritter se dedicava à realizar a conexão

que existia entre a terra e o homem e compreender e ensinar que o mundo era tão complexo

na antiguidade como era em sua época, e ainda mais.

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6 – A OBRA ‘GEOGRAFIA COMPARADA DE KARL RITTER

Na parte introdutória de seu livro, Karl Ritter fará considerações iniciais sobre

concepções que abordará ao decorrer de seu livro. Suas ideias principais se dão em torno da

concepção de Natureza em sentido amplo e complexo, no qual defenderá que o homem é

parte de um processo natural e agente orgânico da superfície terrestre. Veremos a seguir suas

primeiras considerações acerca do planeta Terra, o sistema de forças e agentes orgânicos e

inorgânicos, os quais define como os dois existentes na integração do sistema terrestre, e fará

comparações sobre a Terra com os demais planetas.

6.1 - INTRODUÇÃO: A FORMA ESFÉRICA DA TERRA

“O cenário geográfico que exploraremos nas leituras a seguir se farão em seu sentido mais profundo, porém compreensível. Será necessário, para tanto,

realizar um prefácio com algumas observações gerais que servirão para indicar sobre quais bases científicas nossa discussão irá se respaldar. Nosso ponto de

partida será a própria natureza, e não os sistemas geográficos que até então

foram construídos.

Por Natureza queremos dizer o processo de Criação por completo. Em

conjunto com a agência do tempo e do espaço, a Natureza e todos os seus

objetos e forças que agem como conjunto compreende, então, um sistema

complexo. As partes inanimadas da natureza serão definidas pelo termo

inorgânico, enquanto que as partes animadas serão definidas como orgânicas.

Ainda não há um contraste absoluto entre eles; em ambos há progresso

incessante, sem pausa, mas em um sentido mais elevado e abrangente uma vida

cósmica onde toda a formação de um grande organismo, se dá no mundo

inorgânico, sendo esse fundamental para o processo de criação da vida orgânica.

Para nós, nossa própria Terra é a característica mais marcante da natureza

vista de lado inorgânico. Para nós é o planeta mais conhecido de todos, o único

que conhecemos intimamente, o ponto de onde partem nossas conclusões sobre

todo o Universo.” (RITTER 1865, p.2)

“Os planetas externos são aqueles que possuem órbitas mais extensas que a

da Terra. Os planetas menores são aqueles que possuem órbitas menores que a

da Terra, são eles Mercúrio e Vênus.

Os antigos, contando o sol e a lua, contavam apenas sete planetas. No final

do século XVIII outro foi adicionado, Urano, um planeta externo. Através da

instrumentalidade dos telescópios melhorados, logo após, quatro menores que aqueles foram descobertos, Ceres, Pallas, Juno e Vesta e pelas mais recentes e

melhoradas lentes telescópicas recentemente produzidas e a habilidade dos

astrônomos, o número de pequenos corpos planetários situados entre as órbitas

de Marte e Júpiter tem aumentado. Para além de Saturno e Urano fica Netuno,

descoberto matematicamente por Le Verrier, em Paris e visto por Galle em

Berling, em 23 de Setembro de 1846. A estes planetas (agora oitenta) podem ser

adicionados de vinte a trinta luas do nosso sistema solar e também alguns

cometas.

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A posição média da Terra em relação ao tamanho de sua órbita carrega

consequências. A distância da Terra até o Sol, em números redondos, é de

92.000.000 milhas, quase três vezes o de Mercúrio, o planeta mais próximo do

Sol. Júpiter, por outro lado, é cinco vezes mais longe do sol que a Terra; Urano

cerca de dezenove vezes, e Netuno trinta e três vezes mais longe. O tempo de

translação da Terra em torno do sol é de 365 dias; Mercúrio 87 dias; Júpiter 11

de nossos anos; Urano 84 de nossos anos; e Netuno 165 de nossos anos.”

(RITTER 1865, p.3)

Em “A Terra como a casa dos Homens”, Ritter nos fala sobre por que a Terra nos é

infinitamente mais interessante, visto que é o planeta sobre o qual mais sabemos. Além de

não possuirmos informações sobre os demais planetas do sistema solar, a Terra se faz de

importante compreensão por se tratar da nossa morada, a morada da humanidade.

É aqui que disputamos forças diariamente para nossa sobrevivência e dos demais

seres vivos, o complexo sistema de forças e agentes que aqui coabitam são partes

interdependentes e precisam ser compreendidos.

A TERRA COMO A CASA DOS HOMENS

“A Terra chama a nossa atenção, no entanto, não como simplesmente uma unidade no sistema planetário, mas como o lar da raça

humana. A descrição física do globo inclui as relações da Terra como uma estrela entre os anfitriões celestiais, enquanto a geografia, tomada de forma mais

abrangente, considera a Terra como a morada do homem. Do ponto de vista

geográfico, o mundo se torna para nós a casa comum da nossa raça, o teatro, não

de operações da natureza no sentido mais irrestrito, mas a arena para o

desenvolvimento da vida humana e da história. Sem o homem como ponto

central, a natureza não teria nenhum interesse para o geógrafo; sem a Terra,

constituída apenas como ela é, a raça humana e o curso da história humana não

poderiam reivindicar sua atenção. A terra não é apenas o mais conhecido dos

planetas, mas, como a casa do homem, é infinitamente mais interessante. O

estudo dela é a base tanto da História quanto da Física.

Mais de cem anos atrás, George Foster observou que a cultura europeia se

desenvolveu muito, isso inclui um conhecimento muito amplo de todos os

fenômenos e características peculiares do globo terrestre. E como isso é

verdadeiro! Não é mais somente a cultura europeia que exige isso, mas o bem-

estar de todos os países depende muito mais agora dos estudiosos do que

dependia cem anos atrás. No entanto, ainda estamos muito longe de uma

Geografia perfeita, no amplo sentido; a Ciência que considera a terra como o

campo da disciplina humana; a Ciência que foi anteriormente chamada de

Geografia é apenas uma parte periférica, rudimentar.

O compasso utilizado para a compreensão de nossos objetivos é demasiado grande, no entanto, o conteúdo que precisamos compreender é infinitamente

mais extenso e, embora sempre tenha havido descrições detalhadas das

diferentes partes da Terra, apesar de muito notáveis por sua precisão, carecem

de um sentido mais estreitos que permeie sua unidade orgânica e

interdependente que englobe todos os processos envolvidos. É o conhecimento

das relações desses processos todos que levarão a Geografia a tornar-se de fato

científica, pois até então, ela tem sido meramente descritiva e tem pouco se

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preocupado com as relações dos processos mais importantes, somente agora estamos começando a compreender os verdadeiros elementos da ciência

geográfica, só agora estamos realizando os primeiros esforços para tratar

profundamente esta ciência, embora o progresso de descoberta continua com

velocidade sem esmorecer, deixando muito atrás de nós, todos os avanços dos

nossos predecessores.

Como pode-se notar até agora, a preocupação de Ritter em fazer com que

soubéssemos a relevância dos estudos do homem sobre a terra era notável, ainda muitas

regiões não tinha detalhamento de informações naturais e humanas, por isso era importante

esse tipo de estudos.

“Karl Ritter não foi viajante, um explorador, mas um grande leitor e

excelente expositor. Procurou explicar a evolução da humanidade ligando-a às

relações entre o povo e o meio natural, fazendo sobretudo a descrição da sociedade. Baseado no idealismo de Shelling e no formalismo neoplatônico,

admitiu que o todo era formado pela soma das partes e que da soma das

partículas locais se poderia partir para a formulação das leis gerais, válidas para

toda a superfície da Terra. Daí a formulação do princípio da geografia geral ou

da analogia, utilizado em sua vasta obra, escrita em numerosos volumes. Ao

tentar estabelecer leis gerais que explicassem os fatos humanos, teve

dificuldades, uma vez que as leis sociais não eram uniformes como as leis

físico-naturais. Este problema ainda hoje dificulta a ação dos especialistas nas

ciências sociais, levando várias correntes de pensamento, de quando em vez, a

caminhar para o organicismo.” (ANDRADE, 1987, p.53)

GEOGRAFIA COMO CIÊNCIA

A terra, per se, é apenas um fragmento do universo, do kosmos, retomando a expressão criada por Humboldt em sua célebre obra. A terra é o chão, por assim

dizer, da natureza; a casa, o berço dos homens e das Nações, a morada da nossa

raça. Não é meramente uma região de imensos espaços, uma vasta superfície, e

sim o teatro onde todas as forças da natureza e as leis da natureza são exibidas

em sua variedade e independência. Além disso, é o campo de todo o esforço

humano e o palco de uma revelação divina.

A terra deve ser estudada, portanto, em uma tríplice relação: para o

universo, para a natureza, para a história. E não apenas como um mero agente passivo, como também ativo que assume essa tríplice relação. É inseparável,

uma Integral, em meio a um complexo sistema.

(...)

Em relação aos seus habitantes, dotados com o dom da razão, a terra não é

apenas o lugar onde eles podem habitar, o berço onde eles podem dormir, a casa

onde eles possam viver, é a escola onde eles podem ser treinados. Esta é uma

das primeiras e uma das maiores lições que aprendemos com a história da raça

humana. A terra encontra sua missão maior, não em sua relação à natureza inanimada, mas para o mundo ao qual ela dá vida. A terra foi feita para ser a

casa da mente, da alma, e do caráter humano. E o homem foi criado para tornar

esta terra condutora de seu crescimento maior, em mente, alma e caráter. E a

Terra permanece como a casa de milhões de seres avançados, permitindo-lhes

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crescer e garantindo-lhes a capacidade de cumprir todos os propósitos da vida humana.

(...)

A investigação sobre as relações da terra, a este respeito e na organização de

todas as leis naturais e fenômenos em sua influência sobre o homem, sua vida e

história, deve constituir um departamento proeminente da verdadeira ciência

geográfica. Quando a geografia deixa de ser um agregado de fatos não organizados

e torna-se a ciência que lida com a terra como uma verdadeira organização, um

mundo capaz de desenvolvimento constante, carregando em seu próprio seio as sementes do futuro, para germinar e se desdobram, idade após idade, antes que

atinja a unidade e a totalidade de uma ciência e mostra que cresce de uma raiz da

vida;

A Filosofia, alegremente, concede-lhe uma quota em seu próprio domínio e

permite mimar-se com essas especulações crescentes. Desde sempre sentiu a

necessidade de trazer a Terra, como uma organização, para dentro do debate

científico. O estudo das causas finais, o rastreamento de infinitas janelas nas

obras do criador, as teorias de tocar a primeira edição de todas as coisas, já

crescia com essa necessidade. Muitos erros têm, sem dúvida, à deriva durante o

curso dessas especulações; o Homem comprometeu-se a medir o plano divino, com

a maioria dos dados imperfeitos.

É importante para nós, portanto, inserir em nossas investigações não só a teoria,

e assim nosso conhecimento poderá avançar infinitamente mais e poderemos, então,

avançar em nossas explorações.

O Homem é o primeiro símbolo que nós devemos contemplar em nossos

estudos sobre a totalidade e organização da Terra. Ele carrega, como cada

indivíduo, a história do lugar onde viveu sintetizada em cada época de sua vida.

Cada homem é de uma forma, o representante da casa que lhe deu nascimento, seja

qual for o país em que cresceu e seja qual for a atividade de que se ocupou. É em

sua população que o país exerce a força natural de que dispõe. (RITTER, 1865 p.

25-27).

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6.2 -PARTE I: O ELEMENTO HISTÓRICO NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA

A importância de Ritter para a sistematização da Geografia já era sentida por seus

próprios contemporâneos que fizeram considerações acerca do desenvolvimento de seus

trabalhos e da relevância deles e do método que utilizava.

“Os grandes horizontes da Geografia Comparada não começaram a tomar

solidez e brilho até a aparição da obra admirável intitulada Estudo da Terra em suas relações com a Natureza e com a História do Homem, na qual Karl Ritter

caracterizou com tanta força a fisionomia do nosso globo, e ensinou a influência

de sua configuração exterior, tanto nos fenômenos físicos que tem lugar em sua

superfície, quanto nas emigrações dos povos, suas leis, seus costumes e todos os

principais fenômenos históricos dos quais é teatro. E, já ao finalizar a primeira

parte, encontramos uma nova referência relativa à Ritter: estava reservado a

Karl Ritter o quadro da geografia comparada em toda sua extensão e na sua

íntima relação com a história do Homem” (HUMBOLDT, 1944, p.41—42 apud

OSTUNI, 1967, p.34)

Ritter possuía uma facilidade em relacionar a História e a Geografia, valendo-se da

mesma para fundamentar o desenvolvimento do espaço geográfico bem como o de suas

civilizações. Como pudemos ver em alguns parágrafos já mencionados, seu método é

comparativo, antropocêntrico, histórico e observador. Nota-se claramente em sua obra

Comparative Geography a importância atribuída não exclusivamente aos fenômenos físicos-

geográficos, como também aos elementos históricos de formação e utilização do espaço

pelas civilizações e a correlação de um lugar com outro, tal fato exemplifica-se no trecho a

seguir quando fala sobre os oceanos no passado e à sua época, durante o início das grandes

navegações e dos descobrimentos:

“Os continentes e oceanos têm testemunhado ainda maiores transformações.

Os mares eram as barreiras intransponíveis das nações. As aves do céu só

atravessaram as grandes distâncias que separavam a costa da costa. As lojas de

metal, de terra, os legumes e os animais não foram transferidas de nenhum lugar para outro; o mar trouxe nada mais, de terras remotamente estrangeiras, que a

deriva de areia, cocos, madeira flutuante, massas de gelo e algas, varrido pelas

grandes correntes de costa a costa. Mas agora, os mares não são barreiras; eles não

separam os continentes, mas une-os, e une os destinos das nações da maneira mais

próxima.

As grandes melhorias na navegação oceânica teriam mudado

completamente as relações de todo o globo. A ilha isolada de Santa Helena, que foi

durante séculos os confins do mundo conhecido, tornou-se, no âmbito da segunda

década do século atual, uma cadeia para os grandes ladrões europeus, e ficou

guardada sob o olhar da Europa.

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O Cabo da Boa Esperança, que foi durante séculos o limite da navegação

portuguesa, tornou-se um mero lugar de parada para navios e barcos a vela e a

vapor. A viagem da Inglaterra para a China foi reduzida, dentro de cem anos, de um

período de oito meses a um total de quatro meses. Estas grandes alterações foram efetuadas, principalmente, pela implementação do barco a vapor.” (RITTER, 1865,

p.61-62.)

Notamos nessa passagem a relevância de seus estudos para os geógrafos atualmente,

pois são escritos de épocas distantes que fazem menção as características espaciais e

econômicas da época das navegações e explicam como se dava a reconfiguração espacial da

Europa, principalmente, frente às novas técnicas daquele tempo.

“Os grandes rios também tiveram sua importância reduzida e suas

distâncias foram encurtadas pela navegação a vapor em até seis vezes. Nos estágios

primitivos de navegação, esses rios só podiam ser navegados da montante para a jusante. Em 1864, quatrocentos navios atravessaram o Mississippi e seus afluentes,

e entraram em contato com uma região tão grande quanto a Europa.

(...)

Os grandes sistemas fluviais da Europa Central também foram

cuidadosamente navegados; ao sul da Alemanha, a província Trebizonda , Mainz,

Colônia e Londres puderam ser agrupadas praticamente como vizinhas. Os mares

mediterrâneos tornaram-se reduzidos à uma distância insignificante e suas margens

estão agora cobertos com vilas e cidades.

(...)

Para resumir tudo em uma palavra, a poderosa influência do tempo sobre o

desenvolvimento geográfico da Terra é exibido de maneira mais clara. Mas esta

influência não é o mesmo para todos os locais no mundo. Embora existam algumas pessoas e alguns lugares que são deixados para trás, há outros que fizeram

progressos maravilhosos e hoje ocupam um lugar de destaque. É a posição que a

Europa ocupa no momento presente. A Europa, o mais central de todos os

continentes em relação à grande massa de terra, e também o mais igualmente

removido do ponto médio sobre a grande massa de água, toca todo o mundo

mantendo-se no maior número de pontos , e isso, juntamente com sua linha de costa

extremamente quebrada, tão favorável para fins de navegação, deram-lhe seu lugar

de comando, e atribuiu à Inglaterra seu papel evidente da amante dos mares.

E, olhando do presente para o nosso passado, vemos na Tailândia como

algumas grandes tribos de homens têm dado todos os frutos de sua existência

natural para que o mundo possa utilizar futuramente (...). Eles eram grandes no

passado, e os resultados dessa grandeza estão hoje incorporadas na vida do

mundo. A terra é uma; e através do que podemos chamar de tempo ou história,

todas as suas partes estão em constante processo de ação e reação. Embora alguns

grandes lugares pareçam agora ter nenhum papel a desempenhar, o elemento

tempo atrai-os para dentro do grande cosmos. Eles tiveram um dia, enorme

participação nos negócios mundiais e seus frutos e suas contribuições estão agora

em todas as mãos.

A terra é, portanto, como foi dito na introdução, uma unidade, um

organismo de si mesmo: ele tem sua própria lei de desenvolvimento, a sua própria

vida cósmica; esse organismo pode ser estudado em qualquer uma de suas partes

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e em qualquer época especial de sua história que passado e o futuro, o próximo e

o distante, estarão todos misturados em um sistema de interdependência mútua, e

devem ser analisados em conjunto.

Isso se torna claro se analisarmos o passado da Ásia, o presente da

Europa, e alguns lugares do Novo Mundo, enquanto a história de toda a África

central parece que ficou para o futuro, pois, até os dias atuais não se viu nenhum

progresso no continente, excetuando a porção norte de sua costa. A porção média

do velho mundo sobreviveu ao seu impulso etnográfico primitivo, mas afundou

novamente em um estado de inação. A Ásia projetou sua própria vida de dentro

para fora e por isso, quero dizer, que enquanto ele parece estar exausta de seu

antigo vigor, outros países herdaram o poder que por ela foi disseminado. A população da Ásia é muito menor do que era no tempo de Alexandre, o Grande,

muito menor do que durante a época de Maomé e a conquista dos mongóis,

quando todas as partes habitáveis daquele imenso continente foram unidas por

estradas de comércio e viagens. Por outro lado, as costas são agora muito mais

dotadas de valor e significância do que eram nos tempos antigos, e a navegação

tem dotado de valor também sua costa que hoje é contornada por cidades

maravilhosas e populosas.

Esses progressos foram frutos da navegação ter se modernizado, em razão

das facilidades que o vapor ofereceu ao facilitar as viagens e o comércio com a

Europa, enquanto os indígenas, que habitam a Ásia Central não só são

amplamente separados do mundo civilizado, mas são divididos e separados por

conflitos políticos e religiosos mais acirrados.” (RITTER, 1865, p. 63-65)

Apesar de suas abordagens antropocêntricas e históricas, Ritter insistiu enfaticamente

que o verdadeiro método da ciência da Terra é perguntar à Terra mesma por suas leis e que

este deve ser usado empiricamente, detendo-se nas principais etapas da formação da natureza

(OSTUNI 1967). Suas investigações seguiram, então, sempre na intenção de relacionar os

aspectos físicos do espaço com o social e temporal. Sendo assim, explica-se a grande junção

com Humboldt, que foi seu antecessor e realizou amplo levantamento geográfico de diversas

regiões as quais Ritter recorreu diversas vezes em suas publicações. Apesar de suas

dualidades, seus pensamentos estavam centrados no que mais tarde viria a ser os

fundamentos da Geografia, ambos tinham seus ideais científicos centrados na concepção de

superfície terrestre como um todo coerente e harmônico, nos quais se encontravam os

aspectos físicos e também humanos, assim como na Geografia que deles herdamos para os

nossos dias.

Ritter escreveu sobre a importância do território Europeu, Africano e Asiático como

difusores da cultura antiga, a qual deu início a todas as outras que conhecemos. Considerou a

Inglaterra como beneficiária de todas as conexões marítimas que sua costa lhe permitia e

explicou sobre a importância do desenvolvimento fértil dos solos dos Rios Tigre, Eufrates,

Nilo e Ganges, atualmente.

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Este cinto Asiático-Africano-Europeu exerceu a maior influência sobre todo o curso

da vida humana, em todas colonização, sobre as diferentes raças e línguas, e as artes da

guerra e da paz (RITTER 1865). Portanto, explica a relevância de serem estudados para que

se faça a conexão de causa e efeito dos eventos histórico-geográficos passados, presente e

futuros.

O que para nós hoje em dia não representa mais tanta relevância em termos de

distância, se formos considerar as técnicas navais já desenvolvidas ao longo dos séculos,

para a época em que Ritter escreveu sua obra, era um feito formidável que traria à

sociedade recursos antes inimagináveis, e que exemplificaria o progresso mundial

abarcando a todas as nações do globo terrestre.

“Egito, Palestina, Grécia e outros países ainda se destacam como as terras de formação de toda a história moderna, e não podemos estudar o presente sem

estudá-los. Portanto, não é sem razão que antiga geografia deveria ser sujeito a

um tratamento mais sistemático do que a geografia da Idade Média. (...) Partindo

desses princípios, então, avançaremos em um maior e mais aprofundado estudo

sobre a superfície terrestre para o qual estamos agora melhor preparados”.

(RIITER 1865, p.68)

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6.3 - PARTE II: CONSIDERAÇÕES MAIS PROFUNDAS SOBRE OS RIOS.

Este capítulo situa-se na segunda parte da Obra Geografia Comparada. Nessa

parte, Ritter disserta mais sobre as configurações dos continentes e as relações físicas

exercidas por cada parte estudada, no caso desse trecho, Ritter explica as características

físicas dos rios, passando pela explicação de como se dão determinadas características

em conformidade com tipos de relevos, entre outros fatores que irão interferir e modificar

cada curso. Como veremos a seguir na transcrição desse capítulo para o idioma português.

“A peculiaridade de cada rio é determinada pela abundância de suas fontes, a

bifurcação de seus afluentes, a velocidade de sua descida, a distância entre sua

nascente até a foz, a direção principal de seu curso e a sinuosidade e direção com que percorre que é devido às características do terreno do país onde está

localizado.

A abundância de suas águas é condicionada pela maior ou menor quantidade

de neve que se acumulam no topo das montanhas, as chuvas recebidas, por

exemplo, em países tropicais, e as influências extremamente variadas que climas

temperados podem exercer sobre ela. A queda suaviza-se rapidamente ao descer o

relevo, primeiro de um curso rápido, em seguida, para um curso moderado,

depois em um movimento gracioso deslizando, para, por fim, acabar com um

fluxo quase imperceptível, apenas antes de entrar no mar.

A direção do rio é determinada:

1) Pela estrutura da região por onde ele passa, em alguns lugares sendo um

relevo horizontal, e em outros, inclinado mais verticalmente. Aqui agrupados

como no granito da cadeia dos Cárpatos, de tal forma que os cursos de rio que

começam lá correm em linhas paralelas, irradiando como os raios de uma estrela

de um ponto central; então, agrupados de tal forma que um fluxo pode receber

afluentes de dois intervalos quase contíguos, como entre as esporas dos montes

Urais, o Ródano, no Valais, recebendo águas dos Alpes Berneses no norte, e

Pennine Alpes do Sul; Isère, na mesma forma, o Rhine superior em Grisons (...)

2) A direção é também determinada pela ação mútua dos afluentes e o

córrego principal no ponto de confluência. Muitas vezes a União das duas

correntes fortes dá origem a um terceiro sentido, de acordo com a lei conhecida

como paralelogramo de forças. Isso geralmente ocorre quando nenhum obstáculo atrapalha, fazendo assim um curso normal e é exemplificado nos casos dos rios

Kama e Volga, o Tisza e Danúbio, o Reno e Meno, o Saône e o Ródane. Onde um

obstáculo lhe corta, sua direção anormal se manifesta nas curvas abruptas do leito

do Rio. Uma instância encontra-se na dobra norte do Ródano logo que emerge de

Valais. Seu baixo curso, do Lago de Genebra para Lyons, trai as mesmas

angulosidades, resultantes dos obstáculos que encontra e não pode remover. O

Ródano, rompendo o Jura na Basileia, é outra instância; o Reno, entre Bingen e

Caub, e Dalf-Elf, na Suécia, também exemplificam o mesmo. No caso, esses rios

se encontram em seus cursos mais largos de rochas estratificadas, elas forçam

seus caminhos em ziguezagues, criando ângulos acentuados e frequentemente

ângulos retos também. Exemplos disso são atualmente encontradas no Rio Reno,

entre Mainz e Coblentz. (RITTER, 1865, p. 150-151)

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As diferentes formações geológicas encontradas nas regiões de montanhas

têm importante influência para determinar a direção dos rios. Montanhas não

consistem geralmente em rochas de um tipo estrutural apenas, mas de vários, bem

como suas camadas estruturais.

(...)

As camadas podem ser divididas em superior, inferior e adjacente. Estas

geralmente variam em relação à idade e podem ser encontradas em uma antiguidade geológica regular, como por exemplo o arenito, gipsita, calcário,

grauvaque e granito. Estas formações são também estreitamente contíguas, ou são

separadas apenas por vales, como por exemplo na cadeia dos Cárpatos, onde o nó

central do granito é separado por planícies do vale da cadeia mais meridional de

calcário; um exemplo encontra-se no ramal oeste da mesma extensão dos

Cárpatos. (RITTER, 1865, p. 152-153).

Ritter ensinou por muitos anos na Universidade de Berlim a grandes Geógrafos, tais

como Reclus, Ratzel, e La Blache. No entanto, não fez escola, mas deixou para seus alunos a

importante missão de realizá-las.

“Estes, porém, tinham grande entusiasmo por ele a ponto de Reclus, ao traduzir o seu estudo A configuração dos continentes sobre a superfície do globo e suas

funções na história, haver afirmado que Ritter ‘retirou a geografia da miserável

sombra das nomenclaturas que nos fez estudar com o mesmo espírito da terra e

dos astros, e, em seguida, ‘graças a ele nós sabemos que os continentes, os

planaltos, os rios e os litorais, são dispostos não ao hazard, mas em virtude de leis

de movimentos, leis eternas que fazem gravitar os astros em torno dos astros, os

continentes e mares em torno de um eixo austral’”. (ANDRADE, 1987, p.53)

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6.3 - PARTE III: O NOVO MUNDO

Em “The New World”, Ritter já adentrou a parte três de sua obra, onde explica

criteriosamente as novas descobertas do mundo moderno, as conquistas realizadas pelo

desenvolvimento das técnicas de navegação e as reconfigurações dos continentes tendo em

vista o desenvolvimento de terras recém descobertas, como é o caso das Américas do Norte e

do Sul, por exemplo.

Ritter nos faz compreender as íntimas relações da América do Norte com a Europa

naquela época e explica o por quê de ter sido um dos novos continentes que mais aparecem

no cenário mundial, frente suas similaridades com a Europa e facilidades de comunicação

com o Velho mundo espacialmente. Além disso, chama nossa atenção para o fato de que as

configurações naturais do continente americano determinam por si só que aquele continente

será influente e rico em recursos naturais, dada sua configuração.

Por último, Ritter revela que os três continentes situados no hemisfério sul foram

tidos como berços de uma nova era, descobertos pelo Velho Mundo à época das grande

navegações, foram mantidos para que futuramente, posto que são descobertos posteriormente,

fossem capazes de tornarem-se palco de outras grandes civilizações e progressos que a

história ainda fosse revelar.

“A América é dividida pelo mar do Caribe em um continente duplo, ambas as partes de uma magnitude colossal, embora a parte sul seja 2.000.000 km menor

do que a parte norte. A América do Norte contém 9.055.146 milhas quadradas,

enquanto a América do Sul contém 7.078.875 milhas quadradas; e ambas as

Americas, juntas, contém 16.129.021. O elo entre ambas é encontrado no Istmo da

América Central, com seus 302,443 km2 de superfície.

Mesmo intimamente ligados, Sul e Norte em sentido físico, na ligação real,

tratando-se dos homens, são continentes amplamente divididos.

Durante os três séculos que se passaram desde a descoberta da América, os

espanhóis e os americanos têm pensado em quebrar a conexão de ambas. Toda a

comunicação entre a América do Norte e a América do Sul ocorre pela água,

absolutamente nenhum por terra. Antes do surgimento da navegação do período

histórico, nenhuma estrada foi aberta ao longo do Istmo que conecta ambas as Américas.

A antiga raça caribenha atravessava em botes dos Apalaches da América do Norte para a América do Sul e Índias ocidentais. Os Toltecas e os Astecas - as mais

antigas tribos que vagavam em direção ao sul - pareciam ter terminado sua marcha

sobre o planalto elevado do México e o vale de Anáhuac. As lendas dos Incas não

nos dão nenhum parâmetro sobre como atravessaram o Istmo e chegaram ao Peru à

pé.Peru em pé, e é provável que eles o fizeram. O istmo parece nunca ter sido uma

ponte, mas sim uma barreira. O grande grupo de ilhas parecem ter sido mais um

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meio de comunicação entre ambas as Américas.

Em matéria de contorno, as duas divisões têm uma analogia inconfundível,

que aparece à primeira vista. Ambos apresentam uma forma triangular, com base no

norte e o ápice no sul. Em direção ao sul, também, ao invés de em direção a oeste,

generalizando, as conquistas graduais do homem avançam e, portanto, não pode haver no novo mundo, bem como não pode no velho mundo, um contraste marcante

entre oriente e ocidente.

Leste e Oeste são menos dependentes entre si no Novo Mundo, eles têm

maior individualidade, mas com uma grande preponderância de importância no

leste ao longo do lado oeste, em virtude da situação mais favorável em relação ao

mar, menos acentuado nas características físicas e com uma população mais

escassa. O lado oeste da América não acompanhou o avanço do seu lado oriental. Nem poderia a costa mais a sul da América competir com aqueles mais ao norte, e

fornecer uma analogia para o Ocidente do Velho Mundo.

A América do Norte está mais relacionada à Europa por laços de natureza

mais próxima, por seus sistemas de vento, correntes, um clima não muito diferente

um do outro e muito mais conectada, em termos de proximidade, com ela do que

com a América do Sul: que nem pode extrair a mesma vantagem de seu vizinho

oposto, rudemente pouco desenvolvido, a África, nem tampouco o mar do Caribe

proporcionou alguma real vantagem para as Américas como o Mediterrâneo

proporcionou para a Europa, sendo duas vezes mais largo em área e muito mais

desfavoravelmente situado pra desenvolver os interesses da civilização. É somente

dentro de um período recente que o Caribe tornou-se um auxiliar valioso para a

cultura do mundo.

A América do Sul é apenas um triângulo colossal de terra, com pouquíssima

articulação em suas margens. O noroeste e os ângulos orientais são agudamente definidos, e o Sul é muito definido, o continente termina em uma clivagem bem

fina. Com algumas modificações, ele tem a mesma forma com a sua vizinha África.

(...)

Como a África, a América do Sul também é destituída de penínsulas e ilhas

adjacentes, sua costa é como a da África e Austrália, todos os três continentes do

hemisfério sul, em conformidade estrita. No entanto, a América do Sul é capaz de

grande progresso: suas condições são muito maleáveis; caracteriza-se pelo tamanho

e número dos grandes rios que passa através de seu centro; sua flora e fauna são extremamente ricas. Na fecundidade do seu solo, sua divisão por montanhas e seu

sistema de água, ela detém grande preeminência sobre a África. Um esforço para

conectar seus grandes rios e assim tornar suas imensas vantagens naturais de

serviço mútuo, parece prometer um futuro mais próspero para a América do Sul,

que pode ser predito para a África central; no entanto, a população nativa do país se

encontra num plano muito baixo de virilidade. (RITTER 1865, p. 212-214)

O planalto da Patagônia em forma de cunha não é de todo beneficiado,

conforme análise anterior nos levaria a esperar, por sua longa costa e a proximidade

da ilha da Terra do fogo. A frutífera ilha da Tasmânia é muito mais valiosa para a

Austrália do que é esta ilha para a Patagônia e até mesmo a Islândia é um vizinho

mais produtivo para a Noruega.

(...)

Com uma costa escarpada, precipitada, sem árvores e sem grama, coberto

apenas com musgo e estritamente pertencentes ao mundo polar, deve dar uma

habitação para a menor e mais degradada parte da raça humana, isolados do mundo

e apenas casualmente visitados quando ventos e tempestades jogaram navegantes em suas margens.

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Nem toda ilha é considerada, portanto, como um ganho para as principais

terras adjacentes. Se a Terra do Fogo tivesse encostado à foz do Rio La Plata, teria

se tornado um auxiliar valioso para o Brasil. O valor de uma ilha é relativo, não

absoluto.” (RITTER 1865, p. 214-215)

“O nordeste da América do Norte em todo lugar é cortado por entradas do oceano, amplas baías, e golfos. Esta é a característica principal da costa do norte

dos Estados Unidos e Canadá. Como todas estão abertas em direção à Europa, a

situação de toda a região tem sido especialmente adaptada para o avanço mais

rápido da civilização. O orgulho americano não mais pode querer pra si um

progresso independente do que pode ser o da União Europeia; para começar, a

Europa lhes proporciona em estágio avançado aquilo que anteriormente já

receberam da Ásia.

As menos importantes penínsulas da América do Norte e o lado mais pobre

deles são transformados em direção ao Pacífico Norte. À esta região pertencem as

possessões russas, o desolado resíduo Aliaska, e mais ao sul, a península da velha

Califórnia, que já começou, dentro dos últimos anos, a desempenhar um papel ativo

nos assuntos do mundo. Mas todos os três são atualmente capazes de uma pequena

independência. Eles devem esperar até que sintam o impulso de civilização dos antigos Estados Americanos antes de tomarem esse lugar recentemente organizado

de relações comerciais que a China e o Japão parecem estar liderando.

A América do Norte goza de uma vantagem grande sobre a Europa na posse

dos seus grandes lagos e mares. A prevalência de articulação e das ilhas adjacentes

não é em direção ao sul, mas em direção as regiões polares e subpolares, (a partir de

40º a 50º N. Lat.,) como na Europa. E embora muitas dessas ilhas e penínsulas

ainda serem pouco conhecidas, o progresso de descoberta foi tão rápido nos últimos

anos, que ao que parece, por analogias europeias, uma importante história ainda está

por vir; há um grande parentesco entre estas regiões, do norte da América e os

domínios escandinavos e russos do norte da Europa e, além disso, nós sabemos bem

que nenhum grau de temperatura intimidou a civilização para que se recusassem a

penetrar os confins do mundo polar.” (RITTER 1865, p. 216-217).

“Tudo isto mostra que a América do Norte tem sua formação muito mais

equiparada à da Europa do que à da América do Sul. A analogia que demonstra esse fato seria muito mais evidente se as condições climáticas norte americanas fossem

tão favoráveis quanto foi para a Europa. Tanto ao Sul quanto ao Norte de ambos os

continentes encontramos os grandes mares que os dividem de maneira peculiar.

Desta articulação, a América, menos favorecida pelo clima, tem maior

atuação por seus portos admiráveis e pela ação da corrente do Golfo; ao atravessar o

Atlântico em duas direções, foi especialmente equipada para receber a população e

civilização do velho mundo e para relacionar-se mais intimamente com ele.

No presente, unidos com o arranjo de sua cadeia de montanha e as características

dos seus sistemas de rios, a América ostenta uma diferença do que é na Ásia. Nesse

continente os rios colossais do Norte não têm conexões entre seus grandes rios,

diferentemente do que ocorre na America, onde o fluxo do Rio São Lourenço,

Mackenzie, Columbia, Colorado, Mississippi e Missouri da mesma região, a partir

de um centro comum, não são separado em suas fontes por um planalto imenso, mas formam um sistema único de rio, da foz de um para a do outro, fluindo apenas

em direções contrárias.

Temos então que, como no norte da Europa, a civilização tem seguido os

cursos d’água e instalado suas colônias até 70º Norte na costa da Groenlândia;

enquanto na Ásia, as habitações cessam com Lat. 65º N.

A América parece ter sido a apontada, pelas suas condições físicas, a ser

aquela a plantar a bandeira do progresso humano para a maior parte norte do globo,

e fazer pelo hemisfério norte o mesmo que a Grã-Bretanha, através de suas colônias

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na Tasmânia e na parte sul da Austrália, e seus portos admiráveis, fez para o

hemisfério Sul.

O Norte da Ásia parece não ter nenhum futuro indicado por ela, além das

fontes e os cursos superiores de seus grandes rios; Ela parece depender da Ásia

Central e da Europa para todo tipo de cultura que venha a possuir. À Sul e Leste

parece ter, dentro de suas populações chinesas e indianas, as sementes de um

desenvolvimento independente, cujos resultados, como as da Arábia, foram

transferidos para a Europa, para ser aprimorada e depois disseminada pelo mundo.

(...)

Os dois grupos - o orientais no sul da Ásia, o ocidental na Europa - cada um

composto por três penínsulas, são os mais valiosos auxiliares da civilização que o

mundo já teve. Através de sua agência, a Ásia na zona tórrida e a Europa na zona

temperada, tornaram a América, a África e a Austrália, em uma reserva para a

necessidade futura de repouso de uma civilização que está por vir, para que assim

possam expandir-se em perfeição.

Eles agora estão em sua infância, o dia só começa a nascer para eles.

Preparados como foram, com os presentes mais generosos da natureza, terão um

futuro muito maior do que conseguimos imaginar. Isso poderá acontecer bem como

o passado histórico já nos revelou. A arte da navegação, dentro dos últimos três

séculos, deu a ilhas e continentes uma vida nova e desconhecida até então. O toque da civilização europeia já tem acordado o mundo para a nova vida; e os oceanos,

que uma vez foram o mais intransponível dos obstáculos, tornaram-se o caminho

mais provável para desenhar a terra juntos e para promover seu progresso em

direção a consumação de toda a história.” (RITTER 1865, p. 218-220).

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7– CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho conta com a tradução de trechos considerados relevantes para os

pesquisadores da História do Pensamento Geográfico por carregar aspectos históricos e

geográficos de um passado muito diante do que conhecemos hoje.

Ritter vivenciou grande eventos mundiais, grandes mudanças no panorama mundial,

viveu um período de inovações técnicas, de revoluções na Europa de sua época, bem como

pode testemunhar as transformações que cada um dos eventos separadamente atribuíam

características históricas e geográficas completamente novas e inimagináveis para cada

continente separadamente e, ao mesmo tempo, juntas, formavam um cenário novo para toda a

gente de seu século e também dos séculos seguintes, tendo em vista que as transformações

sobre as quais discorre formularam um mundo novo, tal qual esse que concebemos hoje.

Portanto, se faz necessário e também prazeroso poder estreitar o contato, ainda que de

maneira tímida, com trechos da obra do autor que foi um marco na história da Geografia e

não só para a Geografia, mas para a História de uma maneira geral.

Com a modernização das técnicas de sua época, Ritter presenciou transformações nas

navegações, transformações terrestres, em termos de descobertas de novos continentes e

lugares, e transformações sociais que acompanharam o desenvolvimento humano. Pôde, além

disso, estudar intimamente as relações que a Terra desenvolvia naquele tempo, sendo capaz

de compreender dinâmicas terrestres de rios, montanhas, as relações que cada configuração

espacial permitia à determinadas regiões, quais eram suas especialidades e deficiências, quais

as possibilidades de comunicações de lugares com outros lugares e além disso, propôs

analogias e comparações de desenvolvimento enfatizando o que cada lugar possuía em

comum com outro e extraiu importantes lições de cada uma dessas observações.

Seu método basicamente ficou conhecido por sua forma de comparar diversas áreas

diferentes do globo, fazendo assim com que a partir de pequenas evidências pudessem ser

feitas maiores investigações, bem como associações que permitiam a constatação e a

compreensão da existência de leis gerais.

Foi assim que deixou suas contribuições para aqueles que seguiram seus caminhos,

como Vidal de La Blache, que reproduz muitos dos ensinamentos de Ritter em seus livros

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através das comparações e estudo das relações do homem com o meio e de fenômenos em

escalas locais, regionais e globais. É ele quem, através das bases da Geografia Alemã,

desenvolvera a Geografia na França.

Vidal, assim como fez Ritter, também estudou o impacto das sociedades na natureza

ao longo dos anos e como as sociedades primitivas tiravam proveito daquilo de que

dispunham e também podemos encontrar os princípios da definição de unidade terrestre em

seus livros visando fazer com que o leitor intere-se acerca do assunto que será tratado em sua

obra.

A Geografia Regional, então, inicia-se com Ritter e vai se aprimorando e se

propagando ao longo dos anos pelas mãos de outros geógrafos mais populares atualmente e

de obras com mais fácil acesso, no entanto, esse resgate das bases sólidas do pensamento da

Geografia Regional e Comparada se faz necessário para que possamos expandir o

conhecimento geográfico que está sempre sendo modificado através das relações do homem

com a natureza.

Ritter nos propõe, então, olhares mais focados na interpretação dos fenômenos

naturais e sociais bem como suas relações e cabe a todos os geógrafos buscar a compreensão

de todos esses fenômenos não somente através dos estudos posteriores a institucionalização

da nossa ciência, bem como também os predecessores, pois somente alargando o nosso

conhecimento e a gama de obras influentes já produzidas é que faremos com que o

pensamento geográfico se fortaleça ao longo dos séculos, tornando a Geografia uma ciência

cada vez mais excepcional naquilo que se dispõe a ser.

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8- REFERÊNCIAS

ALVES, F.D & PICCOLI NETO, D. O legado teórico-metodológico de Karl Ritter:

Contribuições para a sistematização da geografia. Geo UERJ - Ano 11, v.3, n.20, 2º semestre

de 2009. p. 48-63.

ANDRADE, Manuel Correia de. Geografia: ciência da sociedade. Uma introdução à análise

do pensamento geográfico. São Paulo: Atlas, 1987.

MORAES, Antônio C. R. Geografia: pequena história crítica. 20.ed. São Paulo: Annablume,

2005.

OSTUNI, Josefina. Carlos Ritter. p.30-48. In: Boletim Geográfico. v. 26, n. 196, 1967.

RITTER, Karl. Comparative geography. Traduação William L. Gage. Filadélfia: J. B.

Lippincott & CO, 1865.

TATHAM, George. A geografia no século dezenove. p. 198-226. In: Boletim Geográfico.

v.17, n.150, 1959.

TEODORO, A. E. C. Geografia Francesa em questão: trajetória e concepção do

conhecimento geográfico em Pierre George. Trabalho de Conclusão de Curso - Universidade

Federal de Alfenas, 2013.