a natureza jurÍdica das serventias extrajudicias e de …

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I Pró-Reitoria Acadêmica Escola de Direito Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE SEUS EMOLUMENTOS Autor: Roberto Moreira da Silva Filho Orientador: Professor Doutor Antônio de Moura Borges Brasília - DF 2017

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Page 1: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

I

Pró-Reitoria Acadêmica

Escola de Direito Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito

A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS

E DE SEUS EMOLUMENTOS

Autor: Roberto Moreira da Silva Filho

Orientador: Professor Doutor Antônio de Moura Borges

Brasília - DF

2017

Page 2: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

i

ROBERTO MOREIRA DA SILVA FILHO

A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE SEUS

EMOLUMENTOS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação Stricto Sensu em Direito da

Universidade Católica de Brasília – UCB,

como requisito parcial para a obtenção do

título de Mestre em Direito.

Orientador: Professor Doutor Antônio de

Moura Borges.

Brasília

2017

Page 3: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

ii

FICHA CATALOGRÁFICA

Referência: SILVA FILHO, Roberto Moreira da. A NATUREZA JURÍDICA DAS

SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE SEUS EMOLUMENTOS. 2017. Número de folhas.

Dissertação do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Tributário.

Page 4: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

iii

Dissertação de autoria de Roberto Moreira da Silva Filho, intitulada ―A NATUREZA

JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE SEUS EMOLUMENTOS‖,

apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre ao Programa de Pós-

Graduação Stricto Sensu em Direito da Universidade Católica de Brasília, em 04 de dezembro

de 2017, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:

_____________________________________________________________________

Prof. Dr. Antônio de Moura Borges

Orientador

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da Universidade Católica de Brasília –

UCB

_____________________________________________________________________

Prof. Dr. João Rezende Almeida Oliveira

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da Universidade Católica de Brasília –

UCB

_____________________________________________________________________

Prof. Dr. Antônio de Jesus da Rocha Freitas

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da Universidade de Brasília – UnB.

Brasília

2017

Page 5: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

iv

À minha família, em especial, ao meu irmão

Rodrigo Moreira da Silva.

Page 6: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

v

AGRADECIMENTOS

Aos meus familiares pelo apoio e compreensão nesta difícil caminhada para o grau de Mestre.

Ao meu irmão Rodrigo Moreira da Silva.

Aos meus amigos pelo apoio e compreensão que, mesmo ante a minha ausência, se fizeram

presentes.

Ao Prof. Dr. Antônio de Moura Borges, pela orientação, paciência, incentivo e atuação

exemplar, digna de inspiração.

Ao Prof. Dr. João Rezende Almeida Oliveira, pelos ensinamentos e atenção fornecidos

durante a elaboração deste trabalho.

Ao Prof. Dr. Antônio de Jesus da Rocha Freitas, meu agradecimento especial por ter aceitado

o convite para participar da banca de defesa desta dissertação.

Aos meus colegas de curso por todo apoio, incentivo e admiração recíproca.

Aos demais professores da Universidade Católica de Brasília – UCB/DF, que estimulam o

aprimoramento científico.

A todos os que fazem do Mestrado da Universidade Católica de Brasília um destacado

programa de Pós-Graduação no cenário nacional. À coordenadora do mestrado, Prof. Dra.

Liziane Angelotti Meira.

Ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, pelo apoio em meu aprimoramento

científico.

Page 7: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

vi

―Los Notarios, en cuanto delegatarios de una

parte de la soberanía del Estado, deberán

ejercer su función pública, controlando de

manera imparcial, independiente, y

responsable, la legalidad de los actos y

negocios que se celebran mediante su

autorización, prestando con su actuación el

servicio público de interés general de

seguridad jurídica preventiva, evitando litigios,

y contribuyendo al desarrollo económico

sostenible, y a la paz social. La función

notarial es indelegable y obligatoria, a salvo

las causas de denegación de la función que

luego se recogen en este Código.‖ (Principios

Fundamentales del Sistema de Notariado de

Tipo Latino - Unión Internacional del

Notariado - UINL).

Page 8: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

vii

RESUMO

Este trabalho visa definir a natureza jurídica das serventias extrajudiciais e de sua

remuneração, os emolumentos, bem como analisar todos os seus fundamentos. O sistema

jurídico vigente não é claro, porém uma interpretação sistemática é capaz de afirmar, com

segurança, a natureza jurídica de serviço público aos serviços notariais e registrais, bem como

a natureza jurídica de taxa aos seus emolumentos. A jurisprudência reconhece a natureza de

taxa aos emolumentos, porém nega a condição de serviço público aos serviços notariais e

registrais, negando-lhes a imunidade tributária.

PALAVRAS-CHAVE: direito tributário; natureza jurídica; serventias extrajudiciais; serviço

público; emolumentos; taxa; imunidade tributária; interpretação doutrinária e jurisprudencial.

Page 9: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

viii

ABSTRACT

This work aims to define the legal nature of out-of-court services and their remuneration,

emoluments, as well as to analyze all its foundations. The legal system in force is not clear,

but a systematic interpretation is able to assert, with certainty, the legal nature of public

service to notary and registry services, as well as the legal nature of fee to their emoluments.

The jurisprudence recognizes the nature of tax to the emoluments, but denies the condition of

public service to the notary and registry services, denying them the tax immunity.

KEYWORDS: tax law; legal nature; extrajudicial services; public service; emoluments; rate;

tax immunity; doctrinal and jurisprudential interpretation.

Page 10: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

ix

SUMÁRIO

FOLHA DE ROSTO ................................................................................................................. i

FICHA CATALOGRÁFICA................................................................................................... ii

FOLHA DE APROVAÇÃO ................................................................................................... iii

DEDICATÓRIA ...................................................................................................................... iv

AGRADECIMENTOS ............................................................................................................. v

EPÍGRAFE .............................................................................................................................. vi

RESUMO ................................................................................................................................. vii

ABSTRACT ........................................................................................................................... viii

SUMÁRIO ................................................................................................................................ ix

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 11

CAPÍTULO I: SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS ........................................................... 13

1) SERVIÇO PÚBLICO X SERVIÇO PRIVADO .............................................................. 13

1.1) Serviço público quanto à extensão (sentido amplo e sentido estrito) .................. 16

1.2) Serviço público quanto aos seus elementos (objetivo, subjetivo e formal) ......... 22

2) FORMAS DE PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO ................................................ 28

2.1) Execução direta de serviço público ........................................................................ 29

2.1.1) Administração Direta ............................................................................... 30

2.1.2) Administração Indireta ............................................................................ 32

2.2) Execução indireta de serviço público ..................................................................... 36

CAPÍTULO II: AGENTES PÚBLICOS (NOTÁRIOS E REGISTRADORES) .............. 38

1) AGENTES POLÍTICOS .................................................................................................. 40

2) SERVIDORES PÚBLICOS ............................................................................................. 42

2.1) Servidores estatutários ............................................................................................ 43

2.2) Empregados públicos ............................................................................................... 47

2.3) Servidores temporários ........................................................................................... 52

3) MILITARES ..................................................................................................................... 53

4) TRANSIÇÃO DO SISTEMA NOTARIAL: CONSTITUIÇÃO FEDERAL 1969 X

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ............................................................................... 55

5) PARTICULARES EM COLABORAÇÃO COM O PODER PÚBLICO ........................ 60

5.1) Gestores do negócio público .................................................................................... 61

5.2) Requisitados, nomeados ou designados ................................................................. 63

5.2.1) Delegatários de função pública ................................................................ 64

Page 11: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

x

5.2.2) Concessionários e permissionários de execução de obras ou serviços

públicos ................................................................................................................. 66

5.2.3) Notários e registradores ............................................................................ 74

CAPÍTULO III: NATUREZA JURÍDICA DOS EMOLUMENTOS CARTORÁRIOS 85

1) ANÁLISE DAS ESPÉCIES TRIBUTÁRIAS .................................................................. 85

2) TAXA x TARFIFA .......................................................................................................... 91

3) IMUNIDADE DOS IMPOSTOS ..................................................................................... 98

CAPÍTULO IV: ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA DO STF ....................................... 104

CONCLUSÃO ....................................................................................................................... 125

Page 12: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

11

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem o objetivo de investigar a natureza jurídica das serventias

extrajudiciais, vulgarmente denominadas de ―cartórios‖, bem como a natureza jurídica de sua

remuneração, os emolumentos. As serventias extrajudiciais são a organização técnica e

administrativa responsável pela prestação dos serviços notariais e de registro, tendo como

titular os tabeliães e/ou registradores.

O regramento constitucional da matéria não é claro, portanto é preciso fazer uma

interpretação sistemática para chegarmos a um resultado coerente, é a proposta deste trabalho.

O sistema constitucional e infraconstitucional constrói um quadro que reconhece a natureza

jurídica de serviço público aos serviços notariais e de registro, bem como a natureza jurídica

da espécie tributária taxa aos emolumentos.

A jurisprudência e a doutrina são concordes em reconhecer a natureza de taxa aos

emolumentos, porém a jurisprudência é vacilante em reconhecer a natureza jurídica de serviço

público a estes serviços, negando-lhes, por consequência, a imunidade tributária. O sistema de

remuneração por taxa, da forma que está posto, é uma decorrência lógica da colocação à

disposição ou da prestação de um serviço público ou do exercício do poder de polícia pelo

Estado.

Assim a jurisprudência, em especial do Supremo Tribunal Federal, em sentido

contrário, reconhece a natureza jurídica de taxa aos emolumentos cartorários e, por outro lado,

nega a condição de serviço público. A pesquisa se iniciará com a análise das disposições

constitucionais a respeito do tema, seguindo pela análise da legislação infraconstitucional.

No primeiro capítulo, faremos a distinção entre os serviços públicos e os serviços

privados, a abordagem do conceito de serviço público em todas as suas vertentes e a

comparação destes conceitos com o regramento dos serviços notariais e registrais para

verificarmos se estes serviços podem ser classificados como serviços públicos.

Em seguida, analisaremos todas as formas de prestação dos serviços públicos pela

Administração Pública e por seus prepostos para localizarmos onde os serviços notariais e

registrais estão situados na máquina pública.

No segundo capítulo será feito um estudo sistemático dos Agentes Públicos para

identificarmos em qual categoria os prestadores dos serviços notariais e registrais (notários e

registradores) se encaixam. Será feita também uma análise da transição do sistema notarial e

registral vigente anterior à Constituição Federal de 1988 e a sua comparação com o atual.

Identificadas a natureza jurídica de serviços públicos para os serviços notariais e

registrais e a de particulares em colaboração com o poder público para os notários e

Page 13: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

12

registradores, abordaremos sistematicamente todas as suas características sob a ótica da

doutrina e da jurisprudência dominantes.

No terceiro capítulo, analisaremos a natureza jurídica dos emolumentos cartorários

para identificarmos se estes possuem natureza tributária ou tarifária e em qual modalidade

tributária se encaixam. Definida a natureza jurídica dos emolumentos cartorários como tributo

na modalidade ―taxa‖, analisaremos então a questão a imunidade tributária dos serviços

notariais e registrais, sob a ótica da doutrina e da jurisprudência dominantes.

No quarto e ultimo capítulo, abordaremos a jurisprudência do Supremo Tribunal

Federal sobre todo o tema abordado no trabalho para confrontarmos o trabalho acadêmico

produzido com o entendimento desta corte. E, por fim, faremos uma conclusão a respeito do

tema abordado, apresentando todo o entendimento majoritário da doutrina e da jurisprudência.

Page 14: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

13

CAPÍTULO I: SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS

Os emolumentos são a contraprestação devida aos notários e registradores pelos

serviços notariais e registrais prestados nas serventias extrajudiciais. Para entendermos melhor

a sua natureza jurídica, faz-se necessário definirmos o que são essas serventias, quem são os

seus titulares e as suas naturezas jurídicas.

Walter Ceneviva, ao definir a natureza da função administrativa dos serviços notariais

e de registro, delimita-a como:

―A natureza, assim definida, abarca os serviços, considerados em si mesmos

(organizados técnica e administrativamente, para prestação eficiente e

adequada), e seus responsáveis, enquanto delegados do Poder Público,

habilitados à plenitude e providos de fé pública, para cumprimento de suas

tarefas.‖1

A serventia extrajudicial é o local físico em que os serviços notariais e registrais são

prestados e, de acordo com Walter Ceneviva, houve uma mudança da terminologia cartórios

para serviços, no intuito de fugir da carga pejorativa da primeira expressão, porém reconhece

que esta ainda é utilizada no linguajar popular, bem como em diversas leis vigentes2. Portanto

devemos diferenciar as serventias ou serviços extrajudiciais, que são locais físicos, dos

serviços notariais e registrais propriamente ditos.

A serventia extrajudicial, vulgarmente denominada de ―cartório‖, é a estrutura

organizacional técnica e administrativa criada para o fornecimento dos serviços notariais e de

registro3. É uma das formas de prestação de um serviço. Para entendermos a que título este

serviço é prestado, faremos uma explanação das formas que o Estado possui para prestar os

seus serviços em geral e investigaremos em qual delas os serviços notariais e registrais se

encaixam, para podermos concluir se se tratam de serviços públicos ou de atividades privadas

de cunho econômico.

A necessidade de tal diferenciação se dá pelo fato de o entendimento atual do Supremo

Tribunal Federal ser no sentido de que as atividades notariais e registrais se tratam de

atividades de caráter econômico e com o intuito lucrativo, portanto não merecedoras da

imunidade tributária recíproca.

1) SERVIÇO PÚBLICO X SERVIÇO PRIVADO

A delimitação do que vem a ser o serviço público é de suma importância para

estabelecermos as fronteiras entre o serviço público e a atividade privada (econômica)

propriamente dita. Definidas estas fronteira, teremos condições de apontar se um serviço é um

1 CENEVIVA, Walter. Lei dos registros públicos comentada. – 20. ed. – São Paulo : Saraiva, 2010, pág. 36.

2 Ibidem. p. 36.

3 Lei 8.935/94: Art. 1º Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a

garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.

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serviço público ou um serviço privado. Esta imputação faz toda a diferença, pois, a depender

de como o serviço for classificado, todo o seu regramento será predominantemente de regime

público ou privado. É o entendimento de Paulo Modesto:

―A dicotomia serviço público/atividade de exploração econômica tem base

na clássica dicotomia entre Estado/Sociedade e entre interesse

público/interesse privado. De fato, como em outros países, é tradicional no

direito administrativo brasileiro a identificação entre os órgãos do Estado e

as tarefas públicas. Segundo este paradigma, a administração pública de

todos os poderes, nas diversas unidades da Federação, monopoliza a

prestação de serviços de natureza pública. Por outro lado, os particulares são

detentores do domínio sobre a atividade econômica em sentido estrito,

cumprindo ao Estado tarefas de agente normativo regulador da atividade

econômica em sentido estrito, cumprindo ao Estado tarefas de agente

normativo regulador da atividade econômica, com funções de fiscalização,

incentivo e planejamento. Ao Estado é vedado substituir os particulares na

atuação direta na economia, salvo em casos excepcionais envolvendo a

segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, definido em lei. Os

particulares podem exercitar atividades públicas apenas como delegados do

Estado.‖4

O direito brasileiro tem como regra a separação entre a atividade pública e a atividade

privada, sendo certo que existem algumas exceções, mas que não chegam a infirmar a regra.

Algumas diferenças que podemos apontar a título exemplificativo, caso o serviço seja

enquadrado como público, são: 1) necessidade de se respeitar os princípios da administração

pública5; 2) regramento da atividade predominantemente pelo sistema de direito público; 3)

criação de vínculo com o estado por meio de processo seletivo público (seja licitação ou

concurso público) ou por dispensa nos termos da lei; 4) remuneração pelo sistema tributário

ou de preços públicos; 5) responsabilização penal de seus agentes pelos crimes praticados por

funcionário público contra a administração pública; 6) responsabilidade civil regida pelo

sistema público6.

Para o direito brasileiro o regime de prestação de um serviço é excludente: ou o

serviço é um serviço público ou é um serviço privado (atividade econômica). Não temos uma

figura híbrida que é considerada pública e privada ao mesmo tempo. Não obstante, termos

4 MODESTO, Paulo. Reforma do Estado, Formas de Prestação de Serviços ao Público e Parcerias Público-

Privadas: demarcando as fronteiras dos conceitos de serviço público, serviços de relevância pública e

serviços de exploração econômica para as parcerias público-privadas. Revista Eletrônica de Direito

Administrativo Econômico, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, nº. 2, maio-jun-jul, 2005. Disponível

na Internet: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 25 de setembro de 2017, página 2. 5 Constituição Federal de 1988: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da

União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,

impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte; Lei nº 9.784/99: Art. 2o A

Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação,

razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e

eficiência. 6 Lei nº 8.935: Art. 24. A responsabilidade criminal será individualizada, aplicando-se, no que couber, a

legislação relativa aos crimes contra a administração pública.

Page 16: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

15

algumas atividades que são consideradas serviços públicos, porém possuem parte de sua

administração não afetada ao serviço público. Conclui Paulo Modesto:

―Trata-se de modelo de soma zero: as atividades são qualificadas como

atividades públicas ou privadas, por um lado, e de interesse público ou de

interesse privado, por outro. Tertium non datur. É possível a modificação de

fronteiras, a ampliação da esfera de atividade privada ou a assunção pelo

Estado de novas esferas de ação na área econômica. Mas não há zona

híbrida, zona cinzenta ou zona de convergência entre o que compete como

próprio ao Estado e o que compete ordinariamente aos particulares. As

fronteiras são consideradas nítidas, com clara repercussão sobre o regime

jurídico da atividade em cada caso, sem maiores ressalvas.‖7

Para Hely Lopes Meirelles o serviço público é aquele prestado pela Administração ou

por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou

secundárias da coletividade ou simples conveniência do Estado8. Portanto podemos apontar

quatro requisitos para a caracterização de um serviço como sendo serviço público: a)

qualidade do prestador (Administração Pública ou seus delegados); b) regramento de direito

público; c) controle estatal; e d) afetação legal da atividade como sendo serviço público, tendo

em vista o princípio da legalidade.

Mais a frente o autor conclui que até mesmo atividades notoriamente dispensáveis pela

comunidade são consideradas serviços públicos (caso haja o preenchimento de todos estes

requisitos), como os serviços de Loteria Federal no Brasil, portanto não cabe não cabe à

doutrina classificar o que vem ou não a ser serviço público, tendo em vista que isto varia de

acordo com as exigências de cada povo e de cada época. Na ausência de qualquer destes

requisitos, a atividade será de natureza privada.

Para Alexandre Mazza, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu uma divisão clara

entre os dois setores de atuação: o domínio econômico (arts. 170 a 174) e o serviço público

(arts. 175 e 176), sendo que o primeiro é de domínio próprio dos particulares tendo como

fundamento a livre-iniciativa. Ressalta ainda que atuação do Poder Público na atividade

econômica só é possível quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou à

relevante interesse coletivo (art. 173). Sendo que os serviços públicos são próprios do Estado,

somente se admitindo a prestação por particulares quando houver expressa delegação estatal9.

Estudaremos então a abrangência do serviço público para identificarmos de que lado

desta fronteira se encontram os serviços notariais e registrais. O que nos dará recursos para

identificar a qual regramento estão sujeitos (público ou privado). Este sistema excludente

7 MODESTO. 2005, p. 2.

8 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 40ª ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 387.

9 MAZZA, Alexandre. Manual de direito administrativo. – 5. ed. – São Paulo: Saraiva, 2015, pp. 817 e 818.

Page 17: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

16

entre serviço público e atividade econômica pode ser depreendido pela leitura conjunta dos

artigos 173 e 175 da Constituição Federal:

―Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração

direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando

necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse

coletivo, conforme definidos em lei. (...) Art. 175. Incumbe ao Poder

Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou

permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.‖10

Portanto, por se tratarem de situações distintas, cada uma seguirá regime próprio e

inconfundível. Identificado tudo o que se trata de serviço público, o que exceder será serviço

privado ou atividade econômica.

1.1) SERVIÇO PÚBLICO QUANTO À EXTENSÃO (SENTIDO AMPLO E SENTIDO

ESTRITO)

O conceito de serviço público é matéria de grande embate tanto na doutrina nacional

quanto na estrangeira pode ser estudado tanto em seu sentido amplo quanto em seu sentido

restrito. Quanto ao sentido amplo, é definido como a prestação de todas as atividades

exercidas pelo Estado, ou seja, incluindo as de todos os três poderes: Executivo, Legislativo e

Judiciário. Conforme os ensinamentos de Diogo Figueiredo:

―Em sentido amplo, todas as atividades estatais poderiam ser consideradas

como serviços públicos, o que se sustentou na escola francesa clássica, por

considerar-se que prestá-los se constituiria na única (Gaston Jèze) ou na

primordial (Léon Duguit) missão do Estado. Adotado, porém, esse sentido

amplíssimo, não haveria como distinguir os serviços públicos de outras

atividades como as legislativas e as judiciárias, nem, com mais razão, das

outras atividades administrativas, de polícia, de ordenamento econômico, de

ordenamento social e de fomento público‖11

Portanto todas as atividades típicas de todos os poderes são consideradas serviços

públicos para o conceito amplo. Por consequência, os serviços notariais e registrais por serem

serviços do Poder Público (como veremos mais a frente) são considerados serviços públicos

para esta visão ampla.

Edmir Netto de Araújo define o serviço público em sentido amplo como toda atividade

exercida pelo Estado, através de seus Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) para a

realização direta ou indireta de suas finalidades12

. Porém este conceito acaba sendo amplo

demais e não fazendo distinção entre as atividades legislativas, judiciárias e administrativas.

Bem como não faz distinção entre as atividades administrativas exercidas pelo Poder

10

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 14 nov. 2017, art. 173 e 175. 11

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral

e parte especial. – 16. ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 530. 12

ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 123.

Page 18: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

17

Executivo, como o poder de polícia (atividade jurídica), o serviço público propriamente dito e

a atividade econômica exercida pelo Estado.

Para Alexandre Mazza, o serviço público em sentido amplo é qualquer atividade

estatal ampliativa ainda que produza somente vantagens difusas pela sociedade, englobando

os serviços de fruição geral (uti universi) e os serviços de fruição individual (uti singuli)13

.

Portanto, todas as atividades estatais desempenhadas por qualquer dos Poderes da república

são consideradas serviços públicos, para o seu sentido amplo.

Por outro lado, temos o conceito de serviço público em seu sentido restrito, que

considera serviço público apenas parte das atividades desempenhadas pela administração

pública. Ou seja, serviço público é apenas aquele prestado pelo Poder Executivo, excluindo-se

o exercício de atividade econômica, atividades jurídicas (poder de polícia) e atividades

sociais. Podemos perceber que é um conceito bem menos abrangente.

Na visão de Alexandre Mazza é conceito priorizado pela doutrina, tendo em vista que

o sentido amplo compreende atividades estatais muito diferentes entre si, que diminuem a

funcionalidade da sua utilização. Prossegue afirmando que o sentido estrito compreende

somente as atividades estatais passíveis de fruição individual pelos usuários (uti singuli)14

.

Portanto são aquelas passíveis de remuneração por taxa ou tarifa.

Nas palavras de Edmir Netto de Araújo o serviço público em sentido restrito é todo

aquele que o Estado exerce direta ou indiretamente para a realização de suas finalidades, mas

somente pela Administração, com exclusão das funções legislativa e jurisdicional, sob normas

e controles estatais, para satisfação de necessidades essenciais ou secundárias da coletividade

ou simples conveniência do Estado15

.

Di Pietro define que restritos são os conceitos que confinam o serviço público entre as

atividades exercidas pela Administração Pública, com exclusão das funções legislativa e

jurisdicional; e, além disso, o consideram como uma das atividades administrativas,

perfeitamente distinta do poder de polícia do Estado. Parte-se da distinção entre atividade

jurídica e atividade social16

. A atividade jurídica, que é excluída do conceito de serviço

público, para o conceito restrito, é o poder de polícia desempenhado pelo Estado, que é

definido pelo Código Tributário Nacional como:

―Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública

que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a

prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público

13

MAZZA. 2015, p 819. 14

MAZZA. 2015, p 820. 15

ARAÚJO. 2005, p. 123. 16

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. - 27. ed. - São Paulo: Atlas, 2014, p. 104.

Page 19: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

18

concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da

produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes

de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao

respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.‖17

Portanto, poder de polícia é toda a atividade estatal que visa à preservação da

tranquilidade pública, da paz e da segurança coletivas. É a faculdade de que dispõe a

Administração pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos

individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado18

. Para o conceito de serviço

público em sentido restrito os serviços notariais e registrais são considerados serviço público,

tendo em vista que não são considerados como o desempenho do Poder de Polícia, mas sim a

prestação efetiva de um serviço específico e divisível pelos administrados.

Os serviços sociais são aqueles em que, apesar de haver uma obrigação legal de

prestação pelo Estado, são livres à iniciativa privada. Livres no sentido de que não é exigida

qualquer autorização prévia para a atuação do particular, como concessão ou permissão de

serviço público. Há que se ressaltar que esta liberdade não significa ausência de controle e

fiscalização pelo poder público. Conforme Paulo Modesto:

―Essas atividades, por outro lado, mesmo quando desempenhadas por

particulares em regime de livre iniciativa, sujeitam-se a normas detalhadas e

a controle do Poder Público de forma mais intensa do que a prevista para a

atividade de exploração econômica. Sujeitam-se, inclusive, a atuação do

Ministério Público na tutela de direitos fundamentais assegurados na

Constituição da República (CF, art. 129, II). Nestas hipóteses, o Estado não

atua de modo suplementar da iniciativa privada, mas por dever legal ou

constitucional. Nestas atividades seria impróprio aplicar, consequentemente,

o enquadramento jurídico de atividades econômicas em sentido estrito.‖19

Para o autor seria uma terceira forma de prestação de um serviço. Vimos que a

Constituição Federal adota um modelo dicotômico e excludente em que ou temos um serviço

público ou temos uma atividade econômica. Para Paulo os serviços sociais não se

enquadrariam perfeitamente no conceito de serviços público, são livres à iniciativa privada e

não dependem de qualquer delegação pelo poder público. Não se enquadrariam também em

atividade econômica, tenho em vista que possuem controle e fiscalização mais rigorosos do

que os da atividade econômica, portanto não podem ser equiparados a estes. Então define

estes serviços como serviços de relevância pública:

―Essas atividades de regime jurídico peculiar são os serviços de relevância

pública, referidos expressamente na Constituição Brasileira em duas

passagens (art. 129, II e art. 197), mas cujo regime pode ser extraído de um

número significativo de normas. São atividades sociais em que a atuação do 17

BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei 5.172, de 25 out. 1966. Institui o Código Tributário Nacional.

Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 27 out. 1966. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172.htm>. Acesso em: 14 nov. 2017. 18

MEIRELLES. 2014, p. 145. 19

MODESTO. 2005, p. 6-7.

Page 20: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

19

Estado é obrigatória e a atuação do particular ocorre por direito próprio

(assistência à saúde, educação, produção e proteção cultural, desporto,

defesa do meio ambiente, pesquisa científica e tecnológica, entre outros

setores).‖20

Usa ainda como paradigma para chagar a esta interpretação a redação do artigo 197 da

Constituição Federal que prevê expressamente que os serviços de saúde são de utilidade

pública, bem como uma das competências do Ministério Público, prevista no artigo 129, para

zelar pelos serviços de relevância pública21

. A natureza jurídica destes serviços sociais é

divergente na doutrina. Di Pietro, por exemplo, os classifica como sendo serviços públicos

impróprios. Paulo Modesto prossegue fazendo severa crítica a esta classificação dicotômica22

,

porém é a adotada pela nossa Constituição Federal.

Os serviços notarias e registrais claramente não se enquadram nesta classificação dos

serviços sociais ou de relevância pública, pois não são livres à iniciativa privada e dependem

de delegação pelo poder público, condicionada a aprovação prévia em concurso público de

provas e títulos, bem como está sujeita a todo um regramento de direito público e a

fiscalização pelo Poder Judiciário.

Por critério de exclusão, os serviços notariais e registrais estão (ou deveriam estar)

entre as atribuições do Poder Executivo, tendo em vista que não se configuram atividades

típicas dos outros dois poderes (legislativa ou jurisdicional) e não são considerados exercício

do poder de polícia ou serviços sociais. É o que entente José dos Santos Carvalho Filho:

―[O]s Poderes políticos da nação têm funções típicas - aquelas naturais,

próprias e para as quais foram instituídos - e atípicas, assim consideradas as

funções que, conquanto impróprias, foram expressamente admitidas na

Constituição. 5 Típicas, como sabemos, são as funções legislativa,

20

Ibidem. 21

Constituição Federal de 1988: Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao

Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua

execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público (...) II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes

Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as

medidas necessárias a sua garantia; 22

Entendo, entretanto, com o máximo respeito pelas posições divergentes, que o enquadramento dos serviços de

relevância pública no conceito de serviço público, vinculado a critério estritamente orgânico ou subjetivo,

introduz no tema contradições conceituais e problemas de ordem prática que não podem ser desconsiderados.

Em primeiro lugar, por adotar implicitamente o modelo dicotômico de repartição de atividades, essa

compreensão remete toda a atuação privada na esfera dos serviços sociais para o domínio da exploração

econômica. Em segundo, sujeita o poder público a princípios e normas que inviabilizam ou dificultam a

formação de parcerias e instrumentos de cooperação úteis para ampliar a efetividade dos direitos sociais objeto

de atenção nesses mesmos serviços. Enquadrar todos os serviços de relevância pública, sem distinção subjetiva,

no conceito de serviço público, por outro lado, é solução ainda mais equivocada, pois esgarça o próprio conceito

de serviço público, tornando-o inútil em termos jurídicos ou de cariz meramente sociológico, e afasta dessas

atividades sociais entidades privadas sem fins lucrativos que podem contribuir para a garantia concreta de

direitos fundamentais pelas classes menos favorecidas da população brasileira. O aprofundamento dessa

avaliação, que sugere a ruptura do modelo de soma zero e a adoção na classificação das atividades de prestação

pública em três categorias fundamentais de atividade, reclama uma reavaliação do próprio conceito de serviço

público no Brasil.

Page 21: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

20

administrativa e jurisdicional, quando atribuídas, respectivamente, aos

Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Relevante função do Estado

moderno, a função administrativa é dentre todas a mais ampla, uma vez que

é através dela que o Estado cuida da gestão de todos os seus interesses e os

de toda a coletividade. Por isso, tem sido vista como residual. Na verdade,

excluída a função legislativa, pela qual se criam as normas jurídicas, e a

jurisdicional, que se volta especificamente para a solução de conflitos de

interesses, todo o universo restante espelha o exercício da função

administrativa. Só por aí já é fácil verificar a amplitude da função. Não custa

relembrar, nesta parte introdutória, que a função administrativa é

desempenhada em todos os Poderes da União, dos Estados, do Distrito

Federal e dos Municípios, abrangendo todos os órgãos que, gerindo os

interesses estatais e coletivos, não estejam voltados à legislação ou à

jurisdição.‖23

Já para o conceito de serviço público em seu sentido amplo, os serviços notariais e

registrais são considerados serviços públicos propriamente ditos, já que todas as atividades

prestadas pelo Estado, e não só pela Administra Pública, são consideradas serviços públicos.

Estes serviços são de titularidade do Poder Público consistente na solução prévia de conflitos

e, apesar de serem fiscalizadas pelo Poder Judiciário, não são de sua titularidade.

Walter Ceneviva, ao comentar um projeto de lei que visava regulamentar as atividades

notariais e registrais (projeto de iniciativa do Poder Executivo n. 639, de 14-11-1991),

defende que a titularidades dos serviços notariais e registrais é Estadual24

, tendo em vista que

a nossa Constituição Federal reserva aos Estados membros todas as competências que não são

privativas da União ou dos Municípios25

. Defende ainda que o Poder Executivo é o

competente para a outorga da delegação deste serviço, porém a Resolução nº 81, do CNJ

conferiu esta competência ao Poder Judiciário: Art. 13. Encerrado o concurso, o Presidente do

Tribunal de Justiça expedirá ato outorgando a delegação26

.

A mensagem de veto da Lei nº 8.935/94 também traz este entendimento ao vetar o

artigo 2º da referida lei que tinha a seguinte redação: Os serviços notariais e de registro são

exercidos, em caráter privado, por delegação do Poder Judiciário do Estado-Membro e do

Distrito Federal. Sendo que justificou o veto pelo fato de o artigo 236 da Constituição Federal

explicitar que os serviços notariais e de registro são atendidos em caráter privado, por

delegação do poder público não fazendo remissão a qualquer dos poderes. Assim entende

também Walter Ceneviva:

23

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. - 27. ed. rev., ampl. e atual.- São

Paulo: Atlas, 2014, p. 456. 24

CENEVIVA, Walter. Lei dos registros públicos comentada. 2010, pág. 23. 25

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 25, §1º. 26

BRASIL. Resolução nº 81 do Conselho Nacional de Justiça de 09/06/2009. Dispõe sobre os concursos

públicos de provas e títulos, para a outorga das Delegações de Notas e de Registro, e minuta de edital.

Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 16 jun. 2009. Disponível em:

<http://www.cnj.jus.br/atos-normativos?documento=105>. Acesso em: 14 nov. 2017.

Page 22: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

21

―Sustentei, então, o entendimento — o qual encontrou eco na lei afinal

sancionada —da inconstitucionalidade do art. 1° do texto preparado pelo

Executivo, em seu parágrafo único, ao dispor que os serviços notariais e de

registros seriam exercidos por delegação da União Federal, sendo que o

texto magno aludia, como alude, à delegação do Poder Público. O defeito foi

repetido no caput do projetado art. 2°. A expressão ―Poder Público‖ foi

utilizada pelo constituinte no art. 236, entre outras razões, porque se aceitou

a competência concorrente dos Estados, para ajuste às condições locais.

Sexta. Estendi, em maior amplitude, a discussão sobre a atribuição

constitucional ao Poder Público e a atribuição projetada à União Federal para

a delegação. Defendi a primeira, de vez que esta se encontra na Carta Magna

para observar o sistema federativo, preservar a autonomia dos Estados e

determinar a competência exclusiva da União apenas nos casos

expressamente indicados. A referência à União Federal, erroneamente feita

no projeto, conflitava com o sistema federativo (CF, art. 1°) e com a

autonomia dos Estados (CF, art. 18). Era, ainda, inconstitucional, porque

entre as competências da União (CF, art. 21) não se inclui a de prestar

exclusivamente os serviços registrários e notariais, descabendo a restrição do

projeto como consequência da competência federal exclusiva para legislar

sobre registros públicos. Legislar, ponderei então, não se relaciona com

delegar serviços. Em cada Estado a delegação é outorgada pelo Poder

Executivo local, na forma da lei estadual, reservada, em qualquer caso, a

fiscalização à magistratura do respectivo Estado ou do Distrito Federal.‖27

O fato de o Poder Judiciário ser o responsável pela fiscalização destes serviços deixa

implícito que estes não são de sua competência28

, tendo em vista o nosso sistema de separação

de poderes (freios e contrapesos) em que, em regra, a fiscalização é atribuída a outro Poder

que não o seu titular.

Para o conceito de serviço público em sentido restrito, os serviços notariais e registrais

também são considerados serviços públicos, tendo em vista ser um serviço prestado pelo

estado passível de fruição individual por seus usuários (uti singuli). Ou seja, é a atuação do

Poder Público em sua função precípua por meio de seus agentes delegatários, particulares em

colaboração com o poder público.

Visto estes conceitos, os serviços notariais e registrais só podem ser enquadrados

como serviços públicos, tanto para o sentido amplo como para o estrito, mas nunca como

atividade econômica, como firmou a jurisprudência do STF, o que será visto mais a frente.

Para efeitos remuneratórios, veremos que os serviços estatais de fruição geral (uti

universi – serviço público apenas para o sentido amplo) são remunerados diretamente pelo

poder público com verbas provenientes dos impostos, tendo em vista que estes serviços não

27

CENEVIVA, Walter. Lei dos notários e dos registradores comentada: (lei n. 8.935/94). 2010, p. 22. 28

BRASIL. Mensagem de veto nº 1.034 de 18 de novembro de 1994. Veto parcial do Projeto de Lei nº 16, de

1994, que “Regulamenta o art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre serviços notariais e registrais.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/Mensagem_Veto/anterior_98/VEP-LEI-8935-

1994.pdf>. Acesso em: 04 dez. 2017.

Page 23: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

22

são passíveis de individualização, ao contrário dos serviços de fruição individual (uti singuli –

serviço público propriamente dito) que são remunerados ou por taxa ou por tarifa.

1.2) SERVIÇO PÚBLICO QUANTO AOS SEUS ELEMENTOS (OBJETIVO,

SUBJETIVO E FORMAL)

Sob outra vertente, o conceito de serviços públicos é estudado classicamente pela

doutrina sob três óticas: 1) orgânico ou subjetivo; 2) material ou objetivo; e 3) formal. Estas

classificações, apesar de terem contribuído substancialmente para formação da doutrina

administrativista, encontram-se obsoletas, tendo em vista que nenhuma delas de forma isolada

consegue definir com precisão o conceito de serviço público.

Hely Lopes Meirelles defende que o conceito de serviço público não é uniforme na

doutrina e, resumidamente, apresenta a noção destas classificações, sendo considerado serviço

público em sua perspectiva orgânica todo aquele que é prestado por órgãos públicos; em sua

perspectiva formal, todo aquele tendente a ser identificado por características extrínsecas; e,

em sua perspectiva material, todo aquele que é definido por seu objeto29

.

Os serviços públicos em sentido orgânico ou subjetivo são apenas aqueles prestados

diretamente pelos órgãos públicos, ou seja, pelo próprio Estado30

. Para Diogenes Gasparini,

na forma orgânica o serviço público é um complexo de órgãos, agentes, e recursos da

Administração Pública, destinados à satisfação das necessidades de interesse geral dos

administrados31

. Portanto é uma visão do serviço público sob a ótica de quem presta o

serviço, sendo considerados serviços públicos somente aqueles prestados diretamente pelo

Poder Público.

Atualmente possuímos diversas situações, inclusive com previsão constitucional, de

particulares agindo em colaboração com o serviço público na prestação de serviços públicos,

situações estas que não são compatíveis com a teoria orgânica. É o entendimento de Diogo de

Figueiredo: ―Com efeito, adotando-se um critério subjetivo, referido ao prestador, chega-se

não mais que a um conceito tautológico e inútil, pois se estaria apenas afirmando que os

serviços públicos se definem como aqueles prestados pelo Estado-administrador.‖32

. A teoria

orgânica se tornou insuficiente para definir com precisão o serviço público, tendo em vista

que o concito atual é mais abrangente do ponto de vista de quem o presta.

29

MEIRELLES. 2014, p. 386. 30

CARVALHO FILHO. 2014, p. 328. 31

GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo. – 17. ed. atualizada por Fabrício Motta – São Paulo:

Saraiva, 2012, p. 349. 32

MOREIRA NETO. 2014, p. 531.

Page 24: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

23

É este também o entendimento de José dos Santos: A crítica consiste em que essa

noção clássica está hoje alterada pelos novos mecanismos criados para a execução das

atividades públicas, não restritas apenas ao Estado, mas, ao contrário, delegadas

frequentemente a particulares33

. Estas delegações são feitas aos particulares em colaboração

com o Poder Público, podendo ser feita, em regra, por meio de concurso público, processo

licitatório. Portanto se tornou um critério insuficiente perante a evolução do Estado. Sob esta

ótica os serviços notariais e registrais não seriam considerados serviços públicos, bem como

tantos outros previstos constitucionalmente.

O conceito objetivo ou material de serviço público o caracteriza como sendo aqueles

que são de interesse da sociedade como um todo. É uma função, uma tarefa ou uma atividade

da Administração Pública, destinada a satisfazer necessidade de interesse geral dos

administrados34

. Portanto, deixa-se de considerar serviço público apenas aqueles prestados

diretamente pela maquina estatal para se considerar serviço público aquelas atividades que

sejam de interesse público, não importando quem os presta.

Celso Antônio Bandeira de Mello defende que o serviço público, em sua acepção

material, é toda a prestação que o Estado assume como próprias, por serem consideradas

imprescindíveis, necessárias ou apenas correspondentes a conveniências básicas da Sociedade

em um dado tempo histórico, consistente no fornecimento aos administrados em geral (caso

contrário, seriam serviços particulares) de utilidades ou comodidades materiais fruíveis

singularmente (uti singuli) por estes35

.

Para José dos Santos o critério material dá relevo à natureza da atividade que é

prestada, caracterizando serviço público como todo aquele que atende direta e essencialmente

à comunidade. E tece a crítica de que algumas atividades são prestadas de forma secundária,

indireta e mediatamente aos cidadãos e nem por isso deixariam de ser de interesse público,

portanto ficam de fora deste conceito de serviço público36

. Este conceito objetivo permite que

particulares prestem serviços públicos desde que sejam prestados em colaboração com o

Estado e em nome deste.

Apesar de o conceito de serviço público sob a ótica material ser mais abrangente que o

conceito orgânico e ser compatível com a tese de que os serviços notariais e registrais são

serviços públicos, este conceito ainda é insuficiente ante a evolução da teoria

administrativista, tendo em vista que existem atividades prestadas indiretamente pelo Estado

33

CARVALHO FILHO. 2014, p. 328. 34

GASPARINI. 2012, p. 349. 35

MELLO. 2006, p. 646. 36

CARVALHO FILHO. 2014, p. 328.

Page 25: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

24

que também são consideradas serviços públicos, bem como existem atividades prestadas

diretamente por este que não são de interesse geral (como Lotérica, por exemplo).

O conceito de serviço público de acordo com o critério formal determina que serviço

público é todo aquele prestado sob o regramento de direito público excludente do regramento

do direito privado, como leciona Di Pietro: ―o formal, que considera o regime jurídico: o

serviço público seria aquele exercido sob regime de direito público derrogatório e exorbitante

do direito comum.‖37

. Portanto a natureza jurídica das normas que regulamentam o serviço

que seria determinante para a sua caracterização.

Para Diogenes Gasparini o serviço público, em sentido formal, é a atividade

desempenhada pelo Poder Público ou seus delegados, sob regras exorbitantes do Direito

Comum, para a satisfação dos interesses dos administrados, sendo a submissão de certa

atividade ao regime de Direito Público38

. Portanto é um sistema dicotômico que estabelece

uma forma de regulamentação pura para aquelas atividades que são consideradas serviço

público, ou seja, somente as atividades integralmente regulamentadas pelo Direito Público

conseguem o status de serviço público.

Este critério formal, se analisado desta forma, também se tornou suficiente para a

conceituação do serviço público, tendo em vista que existem serviços públicos que não são

regidos integralmente pelo direito público, como é o exemplo das empresas concessionárias e

permissionárias de serviços públicos e dos notários e registradores. Maria Sylvia Zanella Di

Pietro sintetiza:

―A partir daí, dois elementos foram afetados; o elemento subjetivo, porque

não mais se pode considerar que as pessoas jurídicas públicas são as únicas

que prestam serviço público; os particulares podem fazê-lo por delegação do

Poder Público. E o elemento formal, uma vez que nem todo serviço público

é prestado sob regime jurídico exclusivamente público.‖39

Em regra, os particulares em colaboração com o poder público, apesar de

desempenharem função pública, possuem parte de sua atuação regida pelo Direito Privado,

pois não deixam esta qualidade de particulares. Como veremos adiante, a parcela do serviço

prestado pelos particulares em colaboração com Poder Público que diz respeito ao contato

direito com os cidadãos é regida pelo Direito Público, sendo que, por outro lado, a parte

eminentemente administrativa é regida pelas normas de Direito Privado.

Portanto, o conceito de serviço público sob a perspectiva puramente formal se tornou

insuficiente e trouxe novamente o problema, porém de forma amenizada, advindo da teoria

37

DI PIETRO. 2014, p. 105. 38

GASPARINI. 2012, p. 349. 39

DI PIETRO. 2014, p. 106.

Page 26: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

25

subjetiva que fora solucionado pela teoria objetiva, qual seja, a exclusão dos serviços

prestados por alguns particulares do conceito de serviço público. Tendo em vista a

insuficiência destes três critérios apresentados para a conceituação do que vem a ser serviço

público, instaurou-se a crise no conceito de serviço público, o que é reconhecido

majoritariamente pela doutrina. Foram desenvolvidas diversas teorias para tentar solucionar

esta problemática com adaptações nestes critérios ou com a conjugação destes. É o que

entende José dos Santos Carvalho Filho40

.

Diogenes Gasparini reconhece a fraqueza destas teorias, quando analisadas de forma

isolada, afirmando que os serviços públicos variam de acordo com as necessidades e

contingências políticas, sociais e culturais de cada comunidade e época. Cintando exemplos

de serviços que já foram considerados serviços públicos e não são mais atualmente: serviços

religiosos e exploração de cassinos em alguns países. Cita exemplos também no Brasil de

serviços que não preenchem o critério material de serviço público, mas que possuem esse

status: loteria federal e esportiva. Mais a frente aponta a falha na teoria subjetiva, afirmando

que não há mais que se falar em prestação de serviços públicos única e exclusivamente de

forma direita pelo Poder Público, citando ao a atuação de particulares, como concessionários e

permissionários de serviço público41

.

Para Celso Antônio, a caracterização de um serviço como sendo público depende de

sua afetação pelo ordenamento jurídico, ou seja, a lei deve dispor quais serviços são

considerados públicos, bem como de o seu regramento ser de direito público, portanto

conjuga os critérios material e formal para determinar o conceito de serviço público:

―toda a atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material

destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente

pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e

presta por si mesmo ou por quem lhe faça às vezes, sob um regime de

Direito Público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de

restrições especiais -, instituído em favor dos interesses definidos como

públicos no sistema normativo.‖42

E mais a frente defende que a adoção do critério material (atividade de interesse

público), sem a presença do critério formal (regramento de Direito Público), pode gerar uma

situação de serviço governamental, mas não necessariamente a de serviço público. O que só

ocorrerá se a atividade for regida pelo regime administrativo (Direito Público)43

.

Tendo em vista que todos estes critérios, quando analisados de forma isolada, se

tornaram insuficientes para conceituar o serviço público, instaurou-se uma crise no conceito 40

CARVALHO FILHO. 2014, p. 328. 41

GASPARINI. 2012, p. 349. 42

MELLO. 2006, p. 642. 43

MELLO. 2006, p. 651.

Page 27: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

26

de serviço público. Como analisado, um mesmo serviço pode preencher os três critérios

apresentados, como pode preencher apenas um deles e ser considerado serviço público. Por

outro lado, pode preencher algum desses requisitos e não ser considerado serviço público. A

título de exemplo, podemos citar a situação de algumas empresas públicas e sociedades de

economia mista, que são entes estatais de direito privado, prestam serviços de natureza

privada e são regidos pelo direito privado. Portanto não é qualquer atividade desempenhada

pelo Estado que será considerada serviço público.

Para a doutrina administrativista mais apurada o critério que deve prevalecer para a

conceituação de serviço público é critério legal, por vezes tratado, talvez por equivoco, como

critério formal. Há que se ressaltar as diferenças. Para o critério legal, o serviço público é tudo

aquele que é determinado por lei. Para o critério formal, o serviço público é aquele que possui

regramento de Direito Público. O regramento de Direito Público é uma consequência da

adoção do critério legal para a definição do serviço público. Portanto regramento de direito

pública deixaria de ser um critério para se determinar a natureza de direito público de um

serviço passando a ser um de seus elementos.

A afetação legal de um serviço como sendo serviço público impõe o regramento de

Direito Público a esta atividade, porém, há que se ressaltar, que não de forma pura como

apresentado pelo conceito de serviço público em sentido formal, pois existem prestadores de

serviço público, previstos constitucionalmente, que são regidos de forma parcial pelo Direito

Privado, na parte em que não diz respeito à prestação do serviço propriamente dito. É o

entendimento de Diogo Figueiredo:

―Por essas razões, a opção por um critério funcional, eminentemente

jurídico, que independe das flutuações conceptuais – que sempre resultarão

das recorrentes referências sociológicas e políticas – visa a superar essas

velhas deficiências e se apresentar, em acréscimo, como consentânea com a

ideia de Estado Democrático de Direito, que supõe, por definição, que toda

atividade administrativa pública há de estar, formal, funcional e

integralmente, submetida à Constituição e, por isso, à sua missão de

realização dos direitos fundamentais das pessoas.‖44

Os serviços públicos, na ótica de Diogo Figueiredo, são apenas aqueles estabelecidos

na Constituição Federal, tendo em vista que a lei não poderia exercer tal papel, pois, como o

nosso sistema é excludente (ou serviço público ou serviço particular), à medida que um novo

serviço público é criado, este sai da esfera de atuação dos particulares, o que não poderia ser

feito por lei, com a ressalva das exceções legais.

Para que o Estado ingresse em uma atividade particular, deve preencher os requisitos

do artigo 173, da CF/88, portanto o ingresso do Estado em uma atividade anteriormente 44

MELLO. 2006, p. 651.

Page 28: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

27

considerada particular e sua consequente transformação em atividade pública deve seguir o

mesmo regramento, sob pena de ser considerada inconstitucional. É o que defende também

Paulo Modesto:

―Reversamente, ao tratar da atividade econômica em sentido estrito, sob a

denominação de ―exploração direta de atividade econômica‖, a Constituição

Federal estabeleceu fortes restrições à atuação do Estado, admitindo-a

apenas quando ―necessária aos imperativos da segurança nacional ou a

relevante interesse coletivo, conformes definidos em lei‖ (art. 173) ou, ainda,

por imposição constitucional de monopólios (v.g., CF art. 177). Nesta esfera

de atuação os particulares atuam por direito próprio, de modo ordinário, sem

delegação do poder público. Não precisam recorrer à licitação pública para

assegurar o exercício da atividade, pois é assegurado a todos o ―livre

exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de

autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei‖ (art. 170,

parágrafo único, da CF). O Poder Público, entretanto, atua nesta esfera em

caráter excepcional, por autorização especial da lei, sujeito ao ―regime

jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e

obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários‖ (art. 173, §1º, II).‖45

Como só é permitido à Administração Pública fazer o que a lei permite e não o que a

lei não proíbe, como ocorre com os particulares, não é lícito ao Poder Público invadir a esfera

de atuação da atividade privada a pretexto de se tratar de serviço público, sem que haja

previsão legal. É uma decorrência do princípio da legalidade.

Alexandre Mazza também partilha deste entendimento, porém o denominando de

critério formal, afirmando que o único critério admitido pela doutrina moderna para

conceituação do serviço público é a determinação legal do legislador ou do constituinte, não

importando se a atividade é ou não essencial para a sociedade46

.

José dos Santos Carvalho Filho define o serviço público como sendo toda atividade

prestada pelo Estado ou por seus delegados, basicamente sob regime de direito público, com

vistas à satisfação de necessidades essenciais e secundárias da coletividade47

. Portanto a

utilização desses critérios auxilia na identificação de um serviço público, porém não é

determinante para tanto. Di Pietro apresenta o seu conceito de serviço público como:

―é o Estado, por meio da lei, que escolhe quais as atividades que, em

determinado momento, são consideradas serviços públicos; no direito

brasileiro, a própria Constituição faz essa indicação nos artigos 21, incisos

X, XI, XII, XV e XXIII, e 25, § 2º, alterados, respectivamente, pelas

Emendas Constitucionais 8 e 5, de 1995; isto exclui a possibilidade de

distinguir, mediante critérios objetivos, o serviço público da atividade

privada; esta permanecerá como tal enquanto o Estado não a assumir como

própria;‖48

45

MODESTO. 2005, pp. 4 e 5. 46

MAZZA. 2015, p 821. 47

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. - 27. ed. rev., ampl. e atual.- São

Paulo: Atlas, 2014, p. 328. 48

DI PIETRO. 2014, p. 106.

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28

Para a autora o serviço público é todo aquele determinado pela lei ou pela

Constituição. Assim, o critério legal é o determinante para a definição do que é serviço

público. A lei, por ter força cogente, prevalece sobre todos aqueles critérios apresentados,

porém não os exclui. Então a afetação pela Constituição ou pela Lei de um serviço como

sendo um serviço público é o critério mais seguro para o identificarmos.

Como veremos a diante, todas as vezes que a Constituição ou a Lei fez tal distinção,

um ou mais dos critérios estudados estavam presentes (objetivo, subjetivo ou formal). Di

Pietro então conclui que:

―toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça

diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer

concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou

parcialmente público. Os três elementos que compõem a definição -

subjetivo, material e formal - permanecem, porém, com sensíveis diferenças

em relação à sua concepção original.‖49

Definimos então o conceito de serviço público como sendo aquele determinado na

Constituição Federal ou na Lei (atendidos os requisitos constitucionais) que tenha regramento

de direito público (critério formal) na parte eminentemente pública deste serviço,

independentemente de seu prestador, tendo a presença ou não de um ou dos dois critérios:

objetivo (prestação do serviço pelos órgãos estatais) e/ou subjetivo (matéria de interesse

coletivo). Portanto estes dois últimos critérios são facultativos.

Os serviços notariais e registrais são considerados serviços públicos, pois estão

previstos constitucionalmente, possuem regramento de Direito Público quanto à prestação de

seus serviços propriamente ditos e são de interesse geral fruíveis individualmente. Portanto só

nos resta investigar se são passíveis ou não de exploração como atividade econômica para

definirmos se lhes é devida a imunidade tributária recíproca ou não (§3º, do artigo 150, da

Constituição Federal). Para isso examinaremos as forma de prestação dos serviços públicos.

2) FORMAS DE PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO

Com a definição do que vem a ser serviço público, a primeira distinção de grande

relevância para estudarmos as formas de execução dos serviços públicos é quanto à execução

direta ou indireta deste. O Estado pode prestar um serviço público tanto de forma direta aos

administrados como de forma indireta, este é o mandamento do art. 175 da CF/88: Incumbe

ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão,

sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos50

.

49

DI PIETRO. 2014, p. 107. 50

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 175.

Page 30: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

29

A execução direta é aquela feita pela própria Administração Pública, já a indireta é

feita pelos particulares em colaboração com o poder público. A primeira pode ser feita tanto

pela Administração estatal direta (órgãos públicos), quanto pela Administração estatal indireta

(entidades). A segunda é feita por particulares nomeados, designados ou delegatários de

função pública. Os notários e registradores são delegatários de função pública como veremos.

2.1) EXECUÇÃO DIRETA DE SERVIÇO PÚBLICO

A prestação dos serviços públicos de forma direta é aquela feita pelos órgãos ou

entidades da Administração Pública, ou seja, é feita tanto pela Administração Direta, quanto

pela Administração Indireta do Poder Público. A Administração Pública é todo o

aparelhamento do Estado preordenado à realização de serviços, visando à satisfação das

necessidades coletivas, sendo que não pratica atos de governo, apenas atos de execução51

. É

preciso cautela, tendo em vista que a proximidade das terminologias utilizadas pelo legislador

pode causar confusão. A administração direta não é sinônimo de prestação direta de um

serviço público.

Todos os poderes da república possuem tanto a administração direta quanto a

administração indireta, é a disposição expressa do artigo 37 da Constituição Federal: ―A

administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do

Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,

moralidade, publicidade e eficiência‖52

. Portanto qualquer dos três poderes que preste um

serviço público por meio de seus órgãos públicos ou entidades estará executando um serviço

público de forma direta.

Para Aloísio Zimmer Júnior, embora a tradição indique a presença do Poder Judiciário

e do Poder Legislativo apenas na Administração Direta, não existe qualquer limitação para a

confecção de leis que ampliem as possibilidades de atuação desses outros Poderes53

,

defendendo então a possibilidade de atuação destes dois Poderes por meio da Administração

Indireta.

Assim como o conceito de serviço público, a Administração Pública também é

estudada em seu aspecto objetivo e subjetivo. Celso Antônio, ao comentar o Decreto-Lei nº

200, afirma que este não adotou o critério da atividade (objetivo), tendo em vista que, além

dos serviços públicos, existem atividades econômicas atribuídas aos Poder Público. Bem

como não adotou o critério do regime jurídico (formal), tendo em vista que os particulares,

51

MEIRELLES. 2014, p. 66. 52

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 37. 53

ZIMMER JÚNIOR, Aloísio. Curso de direito administrativo. – 3. ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:

METODO, 2009, p. 222.

Page 31: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

30

quando do desempenho de funções públicas, são submetidos a regime jurídico distinto do das

pessoas de Direito Público, ainda que e integrem a administração pública e sofram acentuados

impactos de normas publicistas. Conclui que foi adotado o critério orgânico (subjetivo), pois

os sujeitos da Administração Indireta são considerados Administração Federal apenas pelo

fato de comporem tal aparelho, independente da natureza da sua atividade e de seu regime

jurídico54

.

Em sentido objetivo, de acordo com Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a Administração

Pública abrange as atividades exercidas pelas pessoas jurídicas, órgãos e agentes incumbidos

de atender concretamente às necessidades coletivas, abrangendo fomento, polícia

administrativa e serviço público. Outros autores ainda acrescentam intervenção e regulação55

.

Para José dos Santos Carvalho Filho, a Administração Pública em sentido objetivo,

trata-se da própria gestão dos interesses públicos executada pelo Estado, seja através da

prestação de serviços públicos, seja por sua organização interna, ou ainda pela intervenção no

campo privado, inclusive de forma restritiva (poder de polícia)56

. Portanto é uma abordagem

demasiadamente abrangente e de pouca utilidade para este estudo.

Em sentido Subjetivo, a Administração Pública pode ser entendida como o conjunto

de todos os órgãos integrantes das pessoas jurídicas políticas (União, Estados, Distrito Federal

e Municípios), formando a Administração Direta, e de todas as pessoas jurídicas de direito

público ou privado, que compõem a Administração Indireta do Estado57

.

Então a Administração Pública é o conjunto de agentes, órgãos e pessoas jurídicas que

tenham a incumbência de executar as atividades administrativas, tomando-se em consideração

o sujeito da função administrativa, que a exerce de fato58

. Portanto, para estudarmos as formas

de execução dos serviços públicos, devemos partir da abordagem a Administração Pública em

seu sentido subjetivo, tendo em vista que o objetivo deste trabalho é investigar a natureza

jurídica dos serviços notariais e registrais e de seus prestadores. Portanto, é preciso saber

quais as suas posições dentro da Administração Pública e não se realmente a integram, tendo

em vista não haver dúvidas de que são serviços estatais.

2.1.1) ADMINIATRAÇÃO DIRETA

A Administração Direta é composta pelos órgãos dos respectivos poderes (Executivo,

Legislativo e Judiciário) que estão diretamente ligados aos entes políticos (União, Estados,

54

MELLO. 2006, pp. 150 e 151. 55

DI PIETRO. 2014, p. 55. 56

CARVALHO FILHO. 2014, p. 11. 57

DI PIETRO. 2014, p. 58. 58

CARVALHO FILHO. 2014, pp. 11 e 12.

Page 32: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

31

Distrito Federal e Municípios), sem que possuam, no entanto, qualquer personalidade jurídica,

eis que é privativa destes, conforme previsão do Código Civil: Art. 41. São pessoas jurídicas

de direito público interno: I - a União; II - os Estados, o Distrito Federal e os Territórios; III -

os Municípios59

.

O Decreto-Lei nº 200/67, que organiza a Administração Pública Federal no âmbito do

Poder Executivo estabelece em seu artigo 4º que a Administração Direta se constitui dos

serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos

Ministérios60

. Apesar de este texto normativo não fazer nenhuma referência aos Poderes

Judiciário e Legislativo, não significa que estes poderes não tenham Administração Pública

direta, pois esta norma se destina apenas ao Poder Executivo, porém pode ser usada como

parâmetro para delimitarmos a Administração Direta dos demais poderes.

Fernanda Marinela conceitua a Administração Direta como o conjunto de órgãos

públicos que compõem a estrutura dos Estes Federativos, sendo composta pelas pessoas

políticas dotadas de personalidade jurídica de direito público e competências legislativas e

administrativas, mesmo que não sejam titulares de função jurisdicional, sendo: União,

Estados, Distrito Federal e Municípios. Conclui que estes entes, por serem pessoas jurídicas

de direito público, estão sujeitos às prerrogativas e obrigações inerentes a esse regime, o que é

extensível às suas estruturas internas, os seus órgãos61

.

Estes órgãos são os órgãos públicos que fazem as vezes da Administração Pública

podendo ser definidos como as unidades abstratas que sintetizam os vários círculos de

atribuições do Estado, sendo necessário, para que tais atribuições se concretizem e ingressem

no mundo natural, o concurso de seres físicos, prepostos à condição de agentes, são os agentes

públicos62

. Portanto, o conjunto abstrato destas atribuições conferido aos órgãos públicos e

executado de fato por seus agentes é que caracteriza a atuação da administração pública.

A Administração Direta está sustentada na existência obrigatória de quatro pessoas

jurídicas de Direito Público, criadas diretamente pelo texto constitucional – os entes da

Federação -, dotadas de autonomia política, administrativa e financeira, que distribuem entre

os seus órgãos um conjunto de competências de caráter irrenunciável, considerando-se que

59

BRASIL. Código Civil. Lei 10.406, de 10 jan. 2002. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 14 nov. 2017. 60

BRASIL. Decreto-Lei nº 200, de 25 de fev. de 1967. 61

MARINELA, Fernanda. Direito administrativo. – 9. ed.. – São Paulo: Saraiva, 2015, p. 137. 62

MELLO. 2006, p. 136.

Page 33: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

32

esses foram atribuídas por lei ou pela Constituição63

. Assim, a Administração Direta é uma

consequência da existência dos Entes Federados, sendo a reunião seus órgãos.

A Administração Direta do Poder Legislativo Federal é composta por todos os seus

órgãos, como: Congresso Nacional, Câmara dos Deputados, Senado Federal e todos os de

órgãos que lhes são subordinados: Art. 44. O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso

Nacional, que se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal64

.

A Administração Direta do Poder Executivo é composta pela Presidência da República

e de todos os seus demais órgãos, como os Ministérios: Art. 76. O Poder Executivo é exercido

pelo Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado65

.

A Administração Direta do Poder Judiciário é composta por todos os Tribunais,

demais órgãos administrativos (como o Conselho Nacional de Justiça ou Conselho de Justiça

Federal) e subordinados, bem como por todos os juízes de direito, tendo em vista disposição

constitucional expressa:

―Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário: I - o Supremo Tribunal Federal; I-

A o Conselho Nacional de Justiça; II - o Superior Tribunal de Justiça; II-A -

o Tribunal Superior do Trabalho; III - os Tribunais Regionais Federais e

Juízes Federais; IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho; V - os Tribunais e

Juízes Eleitorais; VI - os Tribunais e Juízes Militares; VII - os Tribunais e

Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.‖66

Como podemos ver, os serviços notariais e registrais não estão incluídos na

Administração Direta de nenhum dos poderes da república, tendo em vista não serem órgãos

públicos. As serventias extrajudiciais são apenas o local físico onde os serviços notariais e

registrais são prestados pelos tabeliões e registradores, a exceção daquelas que atualmente

estão oficializadas (situações estas que são transitórias e somente perdurarão até que estes

serviços sejam declarados vagos nos termos da lei) nos termos do artigo 32 do Ato das

Disposições Constitucionais Transitórias, tendo em vista serem consideradas órgãos públicos

propriamente ditos, como será visto mais a frente.

2.1.2) ADMINISTRAÇÃO INDIRETA

A Administração Indireta é composta pelas entidades da Administra Pública. No

âmbito do Poder Executivo Federal, a Administração Indireta compreende as seguintes

categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria: a) Autarquias; b) Empresas

Públicas; c) Sociedades de Economia Mista; e d) fundações públicas67

. A prestação de

serviços públicos pela Administração Indireta é feita por meio de outorga legal a pessoas 63

ZIMMER JÚNIOR. 2009, p. 230. 64

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 65

Ibidem. 66

Ibidem. 67

BRASIL. Decreto-Lei nº 200, de 25 de fev. de 1967, art. 4º, II.

Page 34: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

33

jurídicas de direito público (Autarquias ou Fundações Públicas) ou privado (Empresas

Públicas, Sociedades de Economia Mista ou Fundações), que são criadas pelo poder público.

Toda prestação de um serviço público por meio da Administração Direta é uma

prestação direta de um serviço público, porém a prestação direta não se resume à atuação da

Administração Direta do Poder Público. A prestação de um serviço público pela

Administração Indireta também é uma forma de prestação direta de serviços públicos. É o que

dispõe o artigo 6º, da lei 8.666/93: Para os fins desta Lei, considera-se: (...) VII - Execução

direta - a que é feita pelos órgãos e entidades da Administração, pelos próprios meios;68

.

As entidades da Administração referidas na lei são as que compõem a Administração

indireta do poder público (Autarquias, Fundações, Empresas Públicas e Sociedades de

Economia Mista). De acordo com o artigo 37 da Constituição Federal, os poderes Legislativo

e Judiciário, apesar de não ser o que ocorre na prática, também podem constituir qualquer das

entidades da Administração Indireta descritas acima. O Poder Executivo por ser encarregado

da administração pública propriamente dita é o quem mais se utiliza da Administração

Indireta para atingir os seus objetivos.

São raras a hipóteses em que o Legislativo e o Judiciário se utilizam da Administração

Indireta, até mesmo porque duas das hipóteses possuem natureza empresarial (Empresa

Pública e Sociedade de Economia Mista), não sendo cabível esta atuação a estes dois poderes.

Um exemplo recente foi a autorização para a criação de uma fundação para cada um dos três

poderes para que estes possam gerir a previdência privada complementar de seus servidores69

:

Funpresp-Exe, a Funpresp-Leg e a Funpresp-Jud.

Fernanda Marinela afirma que a Administração Pública Indireta é composta pelas

entidades que possuem personalidade jurídica própria e são responsáveis pela execução de

68

BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de jun. de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal,

institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Diário

Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 22 jun. 1993. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666cons.htm>. Acesso em: 14 nov. 2017. 69

Lei nº 12.618/12: Art. 4o É a União autorizada a criar, observado o disposto no art. 26 e no art. 31, as

seguintes entidades fechadas de previdência complementar, com a finalidade de administrar e executar planos de

benefícios de caráter previdenciário nos termos das Leis Complementares nos 108 e 109, de 29 de maio de 2001:

I - a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Executivo (Funpresp-Exe),

para os servidores públicos titulares de cargo efetivo do Poder Executivo, por meio de ato do Presidente da

República; II - a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Legislativo

(Funpresp-Leg), para os servidores públicos titulares de cargo efetivo do Poder Legislativo e do Tribunal de

Contas da União e para os membros deste Tribunal, por meio de ato conjunto dos Presidentes da Câmara dos

Deputados e do Senado Federal; e III - a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal

do Poder Judiciário (Funpresp-Jud), para os servidores públicos titulares de cargo efetivo e para os membros do

Poder Judiciário, por meio de ato do Presidente do Supremo Tribunal Federal.§ 1o A Funpresp-Exe, a

Funpresp-Leg e a Funpresp-Jud serão estruturadas na forma de fundação, de natureza pública, com

personalidade jurídica de direito privado, gozarão de autonomia administrativa, financeira e gerencial e terão

sede e foro no Distrito Federal.(grifo nosso)

Page 35: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

34

atividades administrativas que necessitam ser desenvolvidas de forma descentralizada,

cotando todas aquelas já mencionadas previstas no Decreto-Lei nº 20070

. Mais a frente faz um

estudo comparado de todas estas entidades e apresenta as suas características em comum: a)

personalidade jurídica própria e por isso, com responsabilidade sobre seus atos, patrimônio e

receita próprios e autonomia técnicas, administrativa e financeira; b) criação e extinção

condicionada à previsão legal (lei cria ou autoriza sua criação); c) finalidades específica,

definida pela lei de criação; d) sem fins lucrativos, sendo possível a aquisição de lucro; e e)

não estão subordinadas à Administração Direta, mas estão sujeitas a controle71

.

Aloízio Zimmer ressalta a importância do surgimento da Administração Pública

Indireta, tendo em vista a necessidade de ampliação das atividades do Estado. Sendo suas

integrantes pessoas jurídicas de Direito Público ou de Direito Privado, criadas, ratificadas ou

autorizadas por lei e com o objetivo de prestação de serviço público, exercício do poder de

polícia e/ou desempenho de atividade econômica. Apresentas também as suas características

em comum: a) autonomia administrativa e financeira; b) algumas podem exercer poder de

polícia; c) sujeitam se ao controle externo e aos princípios administrativos, sem vinculação

hierárquica com a Administração Direta; d) apresentam personalidade jurídica de Direito

Público ou Privado72

.

Como podemos ver, todas as entidades administrativas integrantes da Administração

Indireta são dotadas de personalidade jurídica, o que não acontece com os serviços notariais e

registrais. É bem verdade que atualmente os serviços notariais e registrais, por determinação

legal (INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 1634, DE 06 DE MAIO DE 2016), possuem

numeração no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas – CNPJ:

―Art. 4º São também obrigados a se inscrever no CNPJ: I - órgãos públicos

de qualquer dos Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos

municípios, desde que se constituam em unidades gestoras de orçamento; II -

condomínios edilícios, conceituados nos termos do art. 1.332 da Lei nº

10.406, de 10 de janeiro de 2002, e os setores condominiais na condição de

filiais, desde que estes tenham sido instituídos por convenção de

condomínio; (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1684, de

29 de dezembro de 2016) (...) IX - serviços notariais e de registro (cartórios),

de que trata a Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994, inclusive aqueles

que ainda não foram objeto de delegação do Poder Público;‖(grifo nosso)73

70

MARINELA. 2015, p. 138. 71

MARINELA. 2015, p. 142. 72

ZIMMER JÚNIOR. 2009, p. 243. 73

BRASIL. Instrução normativa da Receita Federal do Brasil nº 1634, de 06 de mai. de 2016. Dispõe sobre o

Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ). Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 09

mai. 2016. Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=73658>.

Acesso em: 14 nov. 2017.

Page 36: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

35

Porém isto não quer dizer que possuam personalidade jurídica. Esta exigência legal se

dá apenas para fins tributários, ou seja, para facilitação da administração tributária. Conclusão

que pode ser tirada também pela comparação com os outros obrigados à inscrição no mesmo

cadastro, como os órgãos públicos. De acordo com o Código Civil de 2002, somente são

consideradas pessoas jurídicas de direito privado: I - as associações; II - as sociedades; III - as

fundações. IV - as organizações religiosas; V - os partidos políticos. VI - as empresas

individuais de responsabilidade limitada74

. Portanto os serviços notariais e registrais não se

incluem neste rol.

Os serviços notariais e registrais e as serventias extrajudiciais não são pessoas

jurídicas por determinação expressa Constitucional, seja de direito público seja de direito

privado. Estes serviços são prestados pelos notários e registradores em caráter e sob

responsabilidade pessoais. Portanto exercem as atividades como pessoas físicas, é o que

determina a Lei nº 8.935/94: Art. 22. Os notários e oficiais de registro são civilmente

responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo,

pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o

direito de regresso75

.

Com isso, os serviços notariais e registrais não integram a Administração Direta do

Poder Público, ante a ausência de previsão legal, bem como não integram a Administração

Indireta por carecerem de personalidade jurídica e serem incompatíveis com a sistemática a

Administração Indireta do poder público. Celso Antônio Bandeira de Mello, ao definir que o

conceito de Administração Pública adotou a teoria subjetiva, pelo motivo de que os seus

órgãos e entidades serem considerados Administração Pública apenas pelo fato de o

integrarem, sem que haja qualquer requisito finalístico, afirma que:

―Esta conclusão se redemonstra na circunstância de que ficam à margem de

tal esquema, apenas por serem alheios ao sobredito aparelho estatal, sujeitos

prestadores de atividades tipicamente administrativas, como os

concessionários de serviços públicas ou delegados de ofício público

(titulares de serviços notariais e registros de nascimento, de óbito, de

casamento etc.). O modelo destarde concebido, é bem de ver, revela-se

inapto para descortinar todas as modalidades pelas quais se desempenham

atividades administrativas públicas. Com efeito, a expressão ‗Administração

indireta‘, que doutrinariamente deveria coincidir com ‗Administração

descentralizada‘, dela se afasta parcialmente. Por isso, ficaram fora da

categorização coo Administração indireta os casos em que a atividade

administrativa é prestada por particulares, ‗concessionários de serviços

74

BRASIL. Código Civil. Lei 10.406, de 10 jan. 2002. 75

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994. Regulamenta o art. 236 da Constituição Federal, dispondo

sobre serviços notariais e de registro. (Lei dos cartórios). Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil,

Brasília, 21 nov. 1994. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8935.htm>. Acesso em: 14

nov. 2017.

Page 37: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

36

públicos‘, ou por ‗delegados de função ou ofício público‘ (caso dos titulares

de cartórios.‖ (grifo nosso)76

Com isso, o simples fato de um serviço não ser prestado de forma direta pelo Poder

Público (por meio das Administrações Direita e Indireta) não significa que tal serviço não seja

considerado um serviço público ou uma atividade típica estatal. Portanto os serviços notariais

e registrais de fato não integram as Administrações Direta e Indireta do Poder Público, porém

são atividades típicas estatais, que consistem em serviços públicos prestados de forma indireta

pelo Estado por meio dos particulares em colaboração com o poder público.

Vistas todas as formas de atuação do poder público por meio das administrações

direitas e indiretas, que somadas equivalem à execução direta dos serviços públicos,

passaremos a estudar as formas de execução indireta de um serviço público para vermos em

qual delas os serviços notariais e registrais se encaixam.

2.2) EXECUÇÃO INDIRETA DE SERVIÇO PÚBLICO

Deixando as divergências doutrinárias e jurisprudências de lado neste momento, os

serviços públicos podem ser prestados pelo estado tanto de forma direta (pelos seus próprios

órgãos e entidades da administração pública), como visto anteriormente, ou de forma indireta

por meio de terceiros (pessoas físicas ou jurídicas) em colaboração com o poder público.

Celso Antônio Bandeira de Mello, ressaltando a falta de técnica do legislador do Decreto-Lei

nº 200, afirma que a conceituação de Administração Indireta não condiz com o conceito

doutrinário que deveria coincidir: Administração descentralizada, tendo em vista o legislador

ter optado por classifica-la como execução direta da Administração Pública (Administração

centralizada)77

.

Portanto teríamos duas opções para classificarmos as formas de execução dos serviços

públicos: a) a adotada pelo Decreto-Lei nº 200, que divide em execução direta (prestada pelas

Administrações Direta e Indireta do Poder Público) e execução indireta (prestada pelos

particulares em colaboração com o Poder Público; e b) a adotada majoritariamente pela

doutrina, que divide em Administração centralizada (compreende a Administração Direta do

Poder Público, tão somente) e Administração descentralizada (compreende a Administração

Indireta e os particulares em colaboração com o Poder Público).

Apesar de entendermos pelo acerto da doutrina majoritária na divisão entre

Administração centralizada e descentralizada, a adoção de qualquer destes dois entendimentos

não influencia a conclusão deste trabalho, tendo em vista que os serviços notariais e registrais

claramente não estão inseridos nas Administrações Direta ou Indireta do Poder Púbico.

76

MELLO. 2006, p. 151. 77

MELLO. 2006, p. 151.

Page 38: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

37

Portanto de qualquer forma estes serviços são prestados de forma indireta ou descentralizada

pela Administração Pública.

Feitos todos estes apontamentos e já analisadas as formas de prestação dos serviços

públicos de forma direta pelo Poder Público (Administrações Direta e Indireta), resta a nós

analisar a prestação indireta dos serviços públicos pelos particulares em colaboração com o

Poder Público que são os sujeitos que, sem perderem a qualidade de particulares – portanto,

de pessoas alheias à intimidade do aparelho estatal –, exercerem função pública, ainda que às

vezes apenas em caráter episódico, sendo eles: a) requisitados; b) gestores de negócios

públicos; c) contratados por locação civil de serviços; d) concessionários e permissionários de

serviços públicos, assim como os delegados de função ou ofício público (como os notários e

registradores)78

. Portanto, a depender da situação, estes particulares serão pessoas físicas ou

pessoas jurídicas de Direito Privado.

78

MELLO. 2006, p. 241.

Page 39: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

38

CAPÍTULO II: AGENTES PÚBLICOS (NOTÁRIOS E REGISTRADORES)

Qualquer pessoa que exerça qualquer função pública é considerada um agente público,

não importando a que título esta função seja exercida. A expressão agente público é o gênero

que envolve todas as espécies de vínculos entre o Estado e um particular, seja pessoa física ou

jurídica. Assim ocorre também com os particulares em colaboração com o Poder Público. O

vínculo que estamos a tratar é entre o Estado e os particulares, portanto o vínculo entre o

Estado e órgãos públicos ou entidades da Administração Pública são de outra natureza e

seguem sistemática diferente.

Os notários e registradores são agentes públicos classificados como particulares em

colaboração com o Poder Público delegatários de função pública. Antes de aprofundarmos no

estudo dos particulares em colaboração com o Poder Público, que são considerados agentes

públicos, faremos uma breve explanação sobre os demais agentes públicos, comparando-os

com os notários e registradores para que não restem dúvidas quanto aos seus posicionamentos

em nosso ordenamento jurídico.

O Conceito de agentes públicos, por ser o mais amplo possível, envolve todos os

vínculos, sejam transitórios ou definitivos, remunerados ou não. As legislações que dispõe

sobre as infrações administrativas e penais estabelecem alguns parâmetros para que

definirmos os agentes públicos, vejamos a Lei de Improbidade Administrativa nº 8.429/92:

―Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que

exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição,

nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura

ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas

no artigo anterior.‖79

Já podemos identificar então o primeiro requisito de natureza subjetiva para

definirmos o conceito de agente público, qual seja, a investidura em uma função pública. É o

mesmo que dispõe o Código Penal em seu artigo 327: Considera-se funcionário público, para

os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego

ou função pública80

. A investidura de um particular em função pública pode ser feita de várias

formas, a depender da categoria de agente público que é enquadrado.

Apesar de o Código Penal se utilizar da terminologia funcionário público, há que ser

levado em consideração a data desta legislação, qual seja, 1940. O legislador se utilizou desta 79

BRASIL. Lei nº 8.429, de 2 de jun. de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos

casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração

pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do

Brasil, Brasília, 03 jun. 1992. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8429.htm>. Acesso

em: 14 nov. 2017. 80

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dez. de 1940. Diário Oficial [da] República Federativa

do Brasil, Brasília, 31 dez. 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-

lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 14 nov. 2017.

Page 40: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

39

expressão porque a Constituição Federal vigente à época (1937) não se utilizava da expressão

servidor público, mas sim funcionário público.

A título de exemplo, os servidores públicos são investidos em suas funções públicas

por meio da posse, de acordo com o artigo 7º, da Lei 8.112/90: A investidura em cargo

público ocorrerá com a posse81

. Os notários e registradores não são enquadrados na categoria

servidor público, que é apenas uma do gênero agente público. Os notários e registradores são

particulares em colaboração com o poder público que recebem uma função pública por meio

de outorga e são investidos nesta função perante a Corregedoria Geral de Justiça do Tribunal

de Justiça do respectivo Estado.

O segundo requisito para que um particular seja considerado agente público é de

ordem objetiva. A função que este exerce deve ser de natureza pública, caso não seja desta

natureza, será considerada uma atividade particular e, por consequência, o seu titular não será

um agente público. É o entendimento de Celso Antônio Bandeira de Mello: Dois são os

requisitos para a caracterização do agente público: um, de ordem objetiva, isto é, a natureza

estatal da atividade desempenhada; outro, de ordem subjetiva: a investidura nela82

. Então

apresenta o conceito de agentes públicos como:

―a mais ampla que se pode conceber para designar genérica e indistintamente

os sujeitos que servem ao Poder Público como instrumentos expressivos de

sua vontade ou ação, ainda quando façam apenas ocasional ou

episodicamente. Quem quer que desempenhe funções estatais, enquanto as

exercita, é um agente público. Por isso, a noção abarca tanto o Chefe do

Poder Executivo (em quaisquer das esferas) como os senadores, deputados e

vereadores, os ocupantes de cargos ou empregos públicos da Administração

direta dos três Poderes, os servidores das autarquias, das fundações

governamentais, das empresas públicas e sociedades de economia mista nas

distintas orbitas de governo, os concessionários e permissionários de serviço

público, os delegados de função ou ofício público, os requisitados, os

contratados sob locação civil de serviços públicos e os gestores de negócios

públicos.‖83

Qualquer pessoa física que atue em nome do Poder Público, mesmo que em situação

de urgência e com investidura precária e informal, a exemplo dos gestores do negócio

público, será considerado um agente público. José dos Santos Carvalho Filho conclui que:

―A expressão agentes públicos tem sentido amplo. Significa o conjunto de

pessoas que, a qualquer título, exercem uma função pública como prepostos

do Estado. Essa função, é mister que se diga, pode ser remunerada ou

gratuita, definitiva ou transitória, política ou jurídica. O que é certo é que,

81

BRASIL. Lei nº 8.112, de 11 de dez. de 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis

da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Diário Oficial [da] República Federativa do

Brasil, Brasília, 19 abr. 1991. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8112cons.htm>.

Acesso em: 14 nov. 2017. 82

MELLO. 2006, p. 235. 83

MELLO. 2006, pp. 234 e 235.

Page 41: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

40

quando atuam no mundo jurídico, tais agentes estão de alguma forma

vinculados ao Poder Público. Como se sabe, o Estado só se faz presente

através das pessoas físicas que em seu nome manifestam determinada

vontade, e é por isso que essa manifestação volitiva acaba por ser imputada

ao próprio Estado. São todas essas pessoas físicas que constituem os agentes

públicos.‖84

Por esta definição podemos percebem que o conceito de Agentes públicos realmente é

o gênero que engloba todas as espécies de particulares (pessoas física ou jurídicas) que atuam

em nome do estado. Maria Sylvia conceitua Agente público, bem como sistematiza suas

categorias:

―Agente público é toda pessoa física que presta serviços ao Estado e às

pessoas jurídicas da Administração Indireta. (...) Perante a Constituição de

1988, com as alterações introduzidas pela Emenda Constitucional nº 1 8/98,

pode-se dizer que são quatro as categorias de agentes públicos: 1. agentes

políticos; 2 . servidores públicos; 3 . militares; e 4. particulares em

colaboração com o Poder Público.‖85

O gênero Agentes públicos é dividido então em: a) agentes políticos; b) servidores

públicos – que por sua vez são subdivididos em: b.1) servidores estatutários, b.2) empregados

públicos, b.3) servidores temporários –; c) militares; d) particulares em colaboração com o

Poder Público. Os notários e registradores são classificados como particulares em colaboração

com o Poder Público, portanto faremos breves comentários quanto às demais categorias para

fins de comparação.

1) AGENTES POLÍTICOS

Os Agentes políticos são todos aqueles que exercem as suas funções em cargos

políticos de primeiro escalão do Poder Público, ou seja, possuem poder decisório e vinculante

à Administração Pública, desde que pautado na lei. Celso Antônio Bandeira de Mello os

define como:

―os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, ou seja,

ocupantes dos que integram o arcabouço constitucional do Estado, o

esquema fundamental do Poder. Daí que se constituem nos formadores da

vontade superior do Estado São agentes políticos apenas o Presidente da

República, os Governadores, Prefeitos e respectivos vices, os auxiliares

imediatos dos Chefes de Executivo, isto é, Ministros e Secretários das

diversas pastas, bem como os Senadores, Deputados federais e estaduais e os

Vereadores.‖86

Estes agentes ingressam no Poder Público não razão de suas profissões, mas sim como

representantes do povo. Seus vínculos com o Estado são de natureza política e não

profissional. O poder de decisão que possuem não é aquele de simplesmente fazer cumprir a

lei, mas sim de ordem política, de decidir quais rumos a sociedade que representam deve

84

CARVALHO FILHO. 2014, p. 592. 85

DI PIETRO. 2014, p. 596. 86

MELLO. 2006, pp. 237 e 238.

Page 42: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

41

tomar, tendo em vista que os recursos são escassos e não é possível atender todos os anseios

da sociedade. É o entendimento de Celso Antônio:

―O vínculo que tais agentes entretêm com o Estado não é de natureza

profissional. Exercem um múnus público. Vale dizer, o que os qualifica para

o exercício das correspondentes funções não é a habilitação profissional, a

aptidão técnica, mas a qualidade de cidadãos, membros civitas e, por isso,

candidatos possíveis à condução dos destinos da Sociedade.‖87

Estes agentes se distinguem dos demais por possuírem um vínculo, em regra,

decorrente de eleição e de caráter transitório, pois estes são requisitos para o exercício de um

cargo político em um País democrático. Transitório no sentido de que possui prazo pré-

determinado de duração. Para José dos Santos Carvalho Filho, como regra, sua investidura se

dá através de eleição, que lhes confere o direito a um mandato, e os mandatos eletivos

caracterizam-se pela transitoriedade do exercício das funções, como deflui dos postulados

básicos das teorias democrática e republicana88

. O exercício destes cargos políticos por

pessoas que não foram eleitas de forma democrática e/ou com caráter não transitório

caracteriza distorção, forma impura ou corrompida do regime político democrático e da forma

republicana de governo.

Visto o conceito de agente político e os requisitos para o vínculo político entre estes e

o Estado, podemos concluir que os notários e registradores não se enquadram nesta categoria,

tendo em vista que o ingresso na atividade notarial e registral se dá por meio de aprovação em

concurso público, bem como o pelo preenchimento de alguns requisitos objetivos, portanto é

um vínculo profissional entre o particular e o Estado e não político, conforme disposição

expressa da lei 8.935/94:

―Art. 3º Notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são

profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício

da atividade notarial e de registro. (...) Art. 14. A delegação para o exercício

da atividade notarial e de registro depende dos seguintes requisitos: I -

habilitação em concurso público de provas e títulos; II - nacionalidade

brasileira; III - capacidade civil; IV - quitação com as obrigações eleitorais e

militares; V - diploma de bacharel em direito; VI - verificação de conduta

condigna para o exercício da profissão.‖89

(grifo nosso)

Portanto não é uma função política que tem a missão de conduzir os rumos da

Sociedade, mas sim o exercício de uma atividade profissional sem qualquer grau considerável

de discricionariedade. Além do mais é uma atividade de caráter permanente e não transitório,

ao contrário do que acontece com os agentes políticos. A outorga da atividade notarial e

registral é vitalícia e perdura enquanto não ocorrer qualquer das hipóteses previstas no artigo

87

MELLO. 2006, p. 238. 88

CARVALHO FILHO. 2014, p. 594. 89

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994.

Page 43: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

42

35 da lei 8.953/94, que devem ser declaradas por decisão judicial transitada em julgado ou por

processo administrativo:

―Art. 35. A perda da delegação dependerá: I - de sentença judicial transitada

em julgado; ou II - de decisão decorrente de processo administrativo

instaurado pelo juízo competente, assegurado amplo direito de defesa. (...)

Art. 39. Extinguir-se-á a delegação a notário ou a oficial de registro por: I -

morte; II - aposentadoria facultativa; III - invalidez; IV - renúncia; V - perda,

nos termos do art. 35. VI - descumprimento, comprovado, da gratuidade

estabelecida na Lei no 9.534, de 10 de dezembro de 1997.‖

A outorga pode durar a vida toda de seu delegatário, não tendo um prazo fixo pré-

determinado. Com isso estas funções não podem ser consideradas de caráter político. Funções

estas que inclusive não estão sujeitas à aposentadoria compulsória por idade prevista

constitucionalmente. É o entendimento do Supremo Tribunal Federal – STF:

―O art. 40, § 1º, II, da Constituição do Brasil, na redação que lhe foi

conferida pela EC 20/1998, está restrito aos cargos efetivos da União, dos

Estados-membros, do Distrito Federal e dos Municípios – incluídas as

autarquias e fundações. Os serviços de registros públicos, cartorários e

notariais são exercidos em caráter privado por delegação do Poder Público –

serviço público não privativo. Os notários e os registradores exercem

atividade estatal, entretanto não são titulares de cargo público efetivo,

tampouco ocupam cargo público. Não são servidores públicos, não lhes

alcançando a compulsoriedade imposta pelo mencionado art. 40 da CF/1988

– aposentadoria compulsória aos setenta anos de idade.‖90

Entendimento que torna evidente também que os notários e registradores não se

enquadram na próxima categoria de agentes públicos, os servidores públicos, tendo em vista

que não possuem vínculo empregatício com o Poder Público. Estes são subdivididos em: 1)

servidores estatutários, 2) empregados públicos, 3) servidores temporários.

2) SERVIDORES PÚBLICOS

Os servidores públicos são as pessoas físicas que prestam serviços a Administração

direta ou indireta do Estado, com vínculo empregatício e mediante remuneração paga pelos

cofres públicos91

. Para Celso Antônio Bandeira de Mello, Servidor Público é a designação

genérica utilizada para englobar, de modo abrangente, todos aqueles que mantêm vínculos de

trabalho profissional com as entidades governamentais, integrados em cargos ou empregos da

90

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.602/MG. Relator: Ministro

Eros Grau, Brasília, 31 de março de 2006. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266859 >. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 28.440 ED-AgR. Relator: Ministro Teori Zavascki, Brasília, 07 de

fevereiro de 2014. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=5236097 >. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 556.504 ED. Relator: Ministro Dias Toffoli, Brasília, 25 de outubro de

2017. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=5236097 >. Acesso

em: 04 dez 2017. 91

DI PIETRO. 2014, p. 598.

Page 44: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

43

União, Estados, Distrito Federal, Municípios, respectivas autarquias e fundações de Direito

Público92

.

2.1) SERVIDORES ESTATUTÁRIOS

Os servidores estatutários são os ocupantes dos cargos públicos e que possuem um

vínculo com o Estado por meio de um estatuto. O cargo público é o conjunto de atribuições e

responsabilidades previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um

servidor93

. O servidor é a pessoa legalmente investida em cargo público94

. O vínculo entre

este servidor e o cargo público é o referido estatuto, por isso a denominação de servidor

estatutário. Celso Antônio Bandeira de Mello define os cargos públicos como:

―[A]s mais simples e indivisíveis unidades de competência a serem

expressadas por um agente, previstas em número certo, com denominação

própria, retribuídas por pessoas jurídicas de Direito Público e criadas por lei

(...) Os servidores titulares de cargos públicos submetem-se a um regime

especificamente concebido para reger esta categoria de agentes. Tal regime é

estatutário ou institucional; logo, de índole não-contratual.‖95

O estatuto é uma lei que regulamenta este vínculo, desde antes de seu início até após o

seu termino. No âmbito Federal, é a Lei nº 8.112/90 que institui o Regime Jurídico dos

Servidores Públicos Civis da União, das autarquias, inclusive as em regime especial, e das

fundações públicas federais96

. O vínculo estatutário não caracteriza vínculo trabalhista, tendo

em vista este ser regido por legislações diferentes e com características substancialmente

distintas, como a estabilidade no serviço público, após três anos de serviço, que somente é

conferida aos servidores estatutários. O vínculo trabalhista é regido pela Consolidação das

Leis do Trabalho – CLT que, se for com o Poder Público, criará um vínculo na modalidade de

emprego público.

Os notários e registradores não são titulares de cargos públicos de provimento efetivo

(servidores estatutários), pois exercem função pública com regramento próprio instituído no

artigo 236 da Constituição Federal e na Lei nº 8.935/94. Estes exercem função típica estatal,

tendo em vista que há a necessidade de delegação pelo Poder Público para que o particular

possa exercê-la. Somente o titular de um serviço pode delega-lo. É o entendimento também de

Walter Ceneviva: O notário e o registrador não exercem cargo público, mas são agentes

públicos. Agem como representantes da autoridade pública, eles mesmos providos de

autoridade, posto que substituem, por delegação, o Estado, em serviços deste97

.

92

MELLO. 2006, p. 239. 93

BRASIL. Lei nº 8.112, de 11 de dez. de 1990, art. 3º. 94

Ibidem, art. 2º. 95

MELLO. 2006, pp. 241 e 242. 96

BRASIL. op. cit., art. 1º. 97

CENEVIVA. 2010, p. 45.

Page 45: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

44

O regime jurídico imposto aos servidores estatutários é completamente diferente do

regime jurídico imposto aos notários e registradores. A única identidade que temos entre estes

é a exigência de prévia aprovação em concurso público, o que não é critério hábil para

equipará-los. É o entendimento de Carlos Ayres Britto, proferido em voto na ADIn nº

2.602/MG:

―se os serviços notariais e de registro não têm a natureza nem o regime

jurídico dos serviços públicos, o mesmo é de ser dito quanto à natureza e ao

regime normativo dos cargos públicos efetivos. A identidade, aqui, é tão-só

quanto à exigência constitucional da aprovação em concurso público de

provas e títulos como requisito de investidura na função, obedecida a ordem

descendente de classificação dos candidatos. É que se não existe cargo

público efetivo sem uma específica função estatal, pode haver uma

específica função estatal desapegada de um cargo público. do lado de fora

dele, portanto, tal como se dá com a junção de jurado e mesário eleitoral,

verbi gratia.‖98

Uma característica em comum entre o cargo público e os serviços notariais não é

capaz de lhes imputar o regime legal de cargo público. Como bem pontuado, um cargo

público é inerente a uma função estatal, porém o inverso não é verdadeiro. Existem funções

estatais que não são vinculadas a um cargo público. É o que ocorre com os serviços notariais e

registrais.

Diversas outras características dos cargos públicos são inaplicáveis aos serviços

notariais e registrais, a começar pela forma de investidura. Os servidores estatutários são

nomeados para os cargos públicos e se investem neles por meio de posse. A investidura nos

serviços notariais e registrais se dá por meio de delegação de serviço público expedida pelo

presidente do respectivo Tribunal de Justiça do Estado. Outros direitos conferidos aos

servidores públicos também não são compatíveis com o exercício da atividade notarial e

registral, como férias, licenças em geral, assistência médica, aposentadoria com proventos

integrais etc.

Apesar de não ser obrigatória a aposentadoria para os notários e registradores, estes

são obrigados a contribuir para o Regime Geral de Previdência Social – RGPS e podem se

aposentar facultativamente, porém com rendimentos limitados ao teto deste sistema,

atualmente no valor de R$ 5.531,31 (cinco mil quinhentos e trinta e um reais e trinta e um

centavos). O que evidencia que não estão sujeitos ao regime de aposentadoria dos servidores

públicos e, por consequência, não são considerados como tal. Carlos Ayres de Britto conclui:

98

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.602/MG. Relator: Ministro

Eros Grau, Brasília, 31 de março de 2006. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266859 >. Acesso em: 04 dez 2017, p.

100.

Page 46: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

45

―Deveras, se o cargo público efetivo é provido por nomeação, toda serventia

cartorária extra-judicial tem na delegação a sua inafastável forma de

investidura; se o exercício dos cargos públicos efetivos é remunerado

diretamente pelos cofres do Estado, o exercício das atividades notariais e de

registro é pago pelos pessoas naturais ou pelas pessoas coletivas que deles se

utilizem; se ao conjunto dos titulares de cargo efetivo se aplica um estatuto

ou regime jurídico-funcional comum, ditado por lei de cada qual das pessoas

federadas a que o servidor se vincule, o que recai sobre cada um dos titulares

de serventia extra-judicial é um ato unilateral de delegação de atividades,

expedida de conformidade com lei específica de casa Estado-membro ou do

Distrito Federal, respeitadas as normas gerais que se veiculem por lei da

União acerca dos registros públicos e da fixação dos sobreditos

emolumentos (inciso XXV do art. 22 e §§ 1º e 2º do art. 236 da Carta de

Outubro, um pouco mais a cima transcritos); se as pessoas investidas em

cargo público efetivo se estabilizam no serviço do Estado, vencido com êxito

o que se denomina de ―estágio probatório‖, e ainda são aquinhoadas com

aposentadoria do tipo estatutário, pensão igualmente estatutária para os seus

dependentes econômicos, possibilidade de greve, direito à sindicalização do

tipo profissional (não espécie econômica) e mais uma cláusula constitucional

de irredutibilidade de ganhos incorporáveis aos respectivos vencimento ou

subsídios, nada disse é extensível aos titulares de serventia extra-forense,

jungidos que ficam os notários aos termos de uma delegação administrativa

que passo ao largo do estatuto jurídico de cada qual dos conjuntos de

servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Enfim, as marcantes diferenciações pululam a partir do próprio texto da

Magna Carta Federal, permitindo-nos a serena enunciação de que as

atividades notariais e de registo nem se traduzem em serviços públicos nem

tampouco em cargos públicos efetivos.‖99

Além do mais, os notários e registradores contribuem para a previdência como

contribuintes individuais, nos termos do Decreto nº 3.048/99, portanto exercem o seu ofício

na qualidade de autônomos, não possuindo qualquer vínculo de natureza empregatícia:

―Art. 9º São segurados obrigatórios da previdência social as seguintes

pessoas físicas: (...) V - como contribuinte individual: (...) j) quem presta

serviço de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais

empresas, sem relação de emprego; (Incluída pelo Decreto nº 3.265, de

1999); l) a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica

de natureza urbana, com fins lucrativos ou não; (Incluída pelo Decreto nº

3.265, de 1999) (...)§ 15. Enquadram-se nas situações previstas nas alíneas

"j" e "l" do inciso V do caput, entre outros: (...)VII - o notário ou tabelião e o

oficial de registros ou registrador, titular de cartório, que detêm a delegação

do exercício da atividade notarial e de registro, não remunerados pelos

cofres públicos, admitidos a partir de 21 de novembro de 1994;‖100

Os contribuintes individuais são aqueles que não possuem vínculo empregatício e são

responsáveis pelo recolhimento de suas próprias contribuições, sendo incluídos nesta

99

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.602/MG. Relator: Ministro

Eros Grau, Brasília, 31 de março de 2006. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266859 >. Acesso em: 04 dez 2017, p.

100 - 102. 100

BRASIL. Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999. Aprova o Regulamento da Previdência Social, e dá

outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 07 mai. 1999. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048compilado.htm>. Acesso em: 21 nov. 2017.

Page 47: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

46

categoria a figura do empresário, do antigo trabalhador autônomo e do equiparado ao

trabalhador autônomo101

. Caso o legislador entendesse que estes profissionais são servidores

ou empregados públicos, estes teriam que contribuir, respectivamente, para os Regimes

Próprios de Previdência Social, na qualidade de servidor público, ou para o Regime Geral de

Previdência Social, na qualidade de empregado público.

Outra característica determinante dos cargos públicos é a o pagamento de suas

remunerações diretamente pelo Poder Público, o que não acontece com os serviços notarias e

registrais. Estes serviços são remunerados pelo sistema tributário (taxas-emolumentos)

diretamente pelos seus usuários e não pelo estado. É o que dispõem o artigo 28 da lei

8.935/94: Os notários e oficiais de registro gozam de independência no exercício de suas

atribuições, têm direito à percepção dos emolumentos integrais pelos atos praticados na

serventia e só perderão a delegação nas hipóteses previstas em lei102

.

Todos os auxiliares necessários aos serviços notariais são contratados diretamente

pelos notários e registrados, sob o regime trabalhista (CLT e legislação trabalhista) e com

todos os encargos arcados por estes. Portanto estes profissionais assumem a qualidade em

empregadores. O que não acontece com os servidores públicos. Todos os servidores que são

auxiliares ou subordinados a outros servidores também são servidores públicos, remunerados

pelo estado e não pelo chefe imediato. É a redação do artigo 20 da lei 8.935/94: Os notários e

os oficiais de registro poderão, para o desempenho de suas funções, contratar escreventes,

dentre eles escolhendo os substitutos, e auxiliares como empregados, com remuneração

livremente ajustada e sob o regime da legislação do trabalho103

.

Fazendo-se uma interpretação a contrário sensu do artigo 40 da nossa Constituição

Federal em conjunto com a jurisprudência do STF já colacionada, podemos perceber que os

notários e registradores não estão sujeitos à aposentadoria compulsória aos 70 ou 75 anos de

idade, prevista constitucionalmente:

―Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados,

do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações,

é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário,

mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e

inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio

financeiro e atuarial e o disposto neste artigo. § 1º Os servidores abrangidos

pelo regime de previdência de que trata este artigo serão aposentados,

calculados os seus proventos a partir dos valores fixados na forma dos §§ 3º

e 17: (...) II - compulsoriamente, com proventos proporcionais ao tempo de

101

BALERA, Wagner. Direito previdenciário. – 10ª ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São

Paulo: Método, 2014, p. 55. 102

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994. 103

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994.

Page 48: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

47

contribuição, aos 70 (setenta) anos de idade, ou aos 75 (setenta e cinco) anos

de idade, na forma de lei complementar;‖104

Portanto não podem ser considerados servidores públicos estatutários ocupantes de

cargos efetivos. A única aposentadoria a que estão sujeitos é a facultativa, prevista no artigo

39 da lei 8.935/94: Extinguir-se-á a delegação a notário ou a oficial de registro por: (...) II -

aposentadoria facultativa105

. É o entendimento também de Walter Ceneviva:

―Mesmo antes da EC n. 20, esta obra sustentou, com base na regra do art. 40

da Lei n. 8.935 (v. comentário adiante), que os notários e os registradores

não eram profissionais submetidos à aposentadoria compulsória ao atingir

seu septuagésimo aniversário. Na mesma linha, no comentário ao inciso IV

do art. 32, referente à perda de delegação, fez-se menção, também antes da

edição da EC n. 20, à não aplicabilidade da aposentadoria expulsória, aos

setenta anos de idade.‖106

Então não nos restam dúvidas de que notários e registradores não são servidores

públicos estatutários, com exceção dos notários e registradores lotados em serventias

extrajudiciais oficializadas (que estão em vias de extinção), como será visto mais a frente.

Analisaremos agora a próxima categoria dos servidores públicos, os empregados públicos,

para sabermos se é compatível com estes serviços.

2.2) EMPREGADOS PÚBLICOS

Os empregados públicos são o pessoal admitido para emprego público na

Administração federal direta, autárquica e fundacional e tem suas relações de trabalho regidas

pela Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio

de 1943, e legislação trabalhista correlata, naquilo que a lei não dispuser em contrário107

. É

um vínculo semelhante ao da iniciativa privada, porém com as diferenças estabelecidas na

Constituição Federal e na Lei nº 9.962/90, só podendo ser rescindido pelo Poder Público

unilateralmente nos seguintes casos:

―Art. 3o O contrato de trabalho por prazo indeterminado somente será

rescindido por ato unilateral da Administração pública nas seguintes

hipóteses: I – prática de falta grave, dentre as enumeradas no art. 482 da

Consolidação das Leis do Trabalho – CLT; II – acumulação ilegal de cargos,

empregos ou funções públicas; III – necessidade de redução de quadro de

pessoal, por excesso de despesa, nos termos da lei complementar a que se

refere o art. 169 da Constituição Federal; IV – insuficiência de desempenho,

apurada em procedimento no qual se assegurem pelo menos um recurso

hierárquico dotado de efeito suspensivo, que será apreciado em trinta dias, e

o prévio conhecimento dos padrões mínimos exigidos para continuidade da

104

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 105

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994. 106

CENEVIVA, Walter. Lei dos notários e dos registradores comentada: (lei n. 8.935/94). 2010, p. 286. 107

BRASIL. Lei nº 9.962, de 22 de fev. de 2000. Disciplina o regime de emprego público do pessoal da

Administração federal direta, autárquica e fundacional, e dá outras providências. Diário Oficial [da]

República Federativa do Brasil, Brasília, 23 fev. 2000. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9962.htm>. Acesso em: 14 nov. 2017.

Page 49: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

48

relação de emprego, obrigatoriamente estabelecidos de acordo com as

peculiaridades das atividades exercidas.‖108

Portanto os seus integrantes não são titulares de cargos públicos e sim de empregos

públicos. É um vínculo profissional com o Poder Público que deve se submeter, assim como

os cargos públicos, a todo o regramento referente à investidura, acumulação de cargos,

vencimentos e outros previstos no Capítulo VII, do Título III, da Constituição Federal109

.

Os empregos públicos são núcleos de encargos de trabalho permanentes a serem

preenchidos por agentes contratados para desempenhá-los, sob relação trabalhista, como,

aliás, prevê a Lei 9.962, de 22.2.2000. Quando se trate de empregos permanentes da

Administração direta ou em autarquia, só podem ser criados por lei, como resulta do art. 61, §

1º, II, ―a‖110

.

Em regra, o critério diferenciador entre cargo público e emprego público é a natureza

jurídica da instituição em que o serviço é prestado. Sendo cargos públicos aqueles exercidos

em órgãos ou entidades que possuam personalidade jurídica de direito público, ou seja, são os

servidores titulares de cargos públicos da Administração Direta (anteriormente denominados

funcionários públicos), das suas Autarquias e Fundações de Direito Público da União, dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, assim como no Poder Judiciário e na esfera

administrativa do Legislativo111

.

Os empregos públicos são aqueles exercidos nas fundações públicas de direito

privado, empresas públicas e sociedades de economia mista, os quais estarão todos,

obrigatoriamente, sob regime trabalhista112

. Portanto em pessoas jurídicas integrantes da

Administração indireta do Poder Público que possuam personalidade jurídica de direito

privado. Porém ainda existem alguns empregos públicos na estrutura da Administração direta

e indireta com personalidade de direito público, a exemplo das Agências Reguladoras, o que

foi determinado pela Lei nº 9.986/00 de constitucionalidade duvidosa.

Os notários e registradores também não se enquadram na categoria de empregados

públicos, pois não exercem emprego público. Este é de natureza trabalhista, sendo regido pela

legislação trabalhista. É um contrato de trabalho firmado entre um particular que preenche

todos os requisitos e aprovado em concurso público.

Como qualquer vínculo trabalhista, este deve preencher todos os requisitos da relação

de trabalho para que exista, sendo eles: a) pessoalidade; b) subordinação; c) habitualidade; e

108

BRASIL. Lei nº 9.962, de 22 de fev. de 2000. 109

DI PIETRO. 2014, p. 599. 110

MELLO. 2006, p. 243. 111

Ibidem, p. 239. 112

MELLO. 2006, p. 240.

Page 50: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

49

d) onerosidade. Gustavo Felipe Barbosa Garcia o define como: O contrato de trabalho pode

ser conceituado como o negócio jurídico em que o empregado, pessoa natural, presta serviços

de forma pessoal, subordinada e não eventual ao empregador, recebendo, como

contraprestação, a remuneração113

.

Estes requisitos são cumulativos e a ausência de qualquer deles descaracteriza o

vínculo trabalhista e, por consequência, a relação de emprego público. Vimos que se trata de

um negócio jurídico de natureza contratual trabalhista, o que é incompatível com a delegação

de serviços notariais e registrais. O vínculo contratual é aquele em que é permitido às partes

negociarem os seus termos previamente. A delegação dos serviços notariais e registrais não

possui qualquer margem de discricionariedade para negociação entre o Poder Público

delegante e particular delegatário, tendo em vista que toda a sua regulamentação já está

prevista legalmente. Com isso, já podemos descartar o vínculo trabalhista entre os notários e

registradores e o Poder Público.

Mesmo que ignorássemos este fator, os demais requisitos do vínculo trabalhista não

estão presentes. A pessoalidade significa a prestação dos serviços pelo próprio trabalhador,

sem que seja substituído constantemente por terceiros, aspecto este relevante ao empregador,

que o contratou tendo em vista a sua pessoa114

. A pesar de os serviços notariais serem

conferidos a título pessoal ao seu delegatário, não podendo transferi-los a terceiros, os

notários registradores podem contratar substitutos para exercerem as suas atribuições em

casos de ausência, porém sob sua responsabilidade pessoal.

A pessoalidade dos serviços notariais e registrais é no sentido de que toda a

responsabilidade civil da atividade será suportada pelo notário ou registrados, sendo exercida

pessoalmente ou por meio de prepostos, e não no sentido do vínculo trabalhista propriamente

dito em que um terceiro não pode substituir a pessoa contratada. É o que dispõe o estatuto que

regulamenta as atividades notariais e registrais:

―Art. 20. Os notários e os oficiais de registro poderão, para o desempenho de

suas funções, contratar escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos, e

auxiliares como empregados, com remuneração livremente ajustada e sob o

regime da legislação do trabalho. § 1º Em cada serviço notarial ou de

registro haverá tantos substitutos, escreventes e auxiliares quantos forem

necessários, a critério de cada notário ou oficial de registro. (...) Art. 22. Os

notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os

prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos

113

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. – 8.a ed., rev., atual. e ampl. – Rio de

Janeiro: Forense, 2014, p. 126. 114

GARCIA. 2014, p. 126.

Page 51: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

50

substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o

direito de regresso.‖115

Portanto não está presente o requisito da pessoalidade no vínculo entre os notários e

registradores e o Poder Público. Passando para o segundo requisito do vínculo trabalhista, a

subordinação, também está ausente na relação entre notário e registradores e o Poder Público.

A subordinação pode ser entendida como:

―A subordinação, considerado o requisito de maior relevância na

caracterização da relação de emprego, significa que a prestação dos serviços

é feita de forma dirigida pelo empregador, o qual exerce o poder de direção.

O empregado, inserido na organização da atividade do empregador, deve

seguir as suas determinações e orientações, estabelecidas dentro dos limites

legais. O empregador é quem corre os riscos da atividade exercida. O

empregado, assim, presta serviços por conta alheia, o que corresponde à

―alteridade‖, presente no contrato de trabalho.‖116

Os notários e registradores não possuem qualquer vínculo de subordinação. São

profissionais independentes, estando sujeitos unicamente à fiscalização pelo Poder Judiciário,

sem que haja qualquer subordinação de ordem técnica, administrativa ou financeira. É o que

dispõe a Lei nº 8.935/94:

―Art. 37. A fiscalização judiciária dos atos notariais e de registro,

mencionados nos artes. 6º a 13, será exercida pelo juízo competente, assim

definido na órbita estadual e do Distrito Federal, sempre que necessário, ou

mediante representação de qualquer interessado, quando da inobservância de

obrigação legal por parte de notário ou de oficial de registro, ou de seus

prepostos.‖117

Os atos que estão sujeitos à fiscalização pelo poder judiciário (artigos 6º ao 13

da lei 8.935/94118

) são apenas os atos funcionais propriamente ditos exercidos pelos notários e

115

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994. 116

GARCIA. 2014, p. 126. 117

BRASIL. op. cit. 118

Art. 6º Aos notários compete: I - formalizar juridicamente a vontade das partes; II - intervir nos atos e

negócios jurídicos a que as partes devam ou queiram dar forma legal ou autenticidade, autorizando a redação ou

redigindo os instrumentos adequados, conservando os originais e expedindo cópias fidedignas de seu conteúdo;

III - autenticar fatos. Art. 7º Aos tabeliães de notas compete com exclusividade: I - lavrar escrituras e

procurações, públicas; II - lavrar testamentos públicos e aprovar os cerrados; III - lavrar atas notariais; IV -

reconhecer firmas; V - autenticar cópias. Parágrafo único. É facultado aos tabeliães de notas realizar todas as

gestões e diligências necessárias ou convenientes ao preparo dos atos notariais, requerendo o que couber, sem

ônus maiores que os emolumentos devidos pelo ato. Art. 8º É livre a escolha do tabelião de notas, qualquer que

seja o domicílio das partes ou o lugar de situação dos bens objeto do ato ou negócio. Art. 9º O tabelião de notas

não poderá praticar atos de seu ofício fora do Município para o qual recebeu delegação. Art. 10. Aos tabeliães e

oficiais de registro de contratos marítimos compete: I - lavrar os atos, contratos e instrumentos relativos a

transações de embarcações a que as partes devam ou queiram dar forma legal de escritura pública; II - registrar

os documentos da mesma natureza; III - reconhecer firmas em documentos destinados a fins de direito marítimo;

IV - expedir traslados e certidões. Art. 11. Aos tabeliães de protesto de título compete privativamente: I -

protocolar de imediato os documentos de dívida, para prova do descumprimento da obrigação; II - intimar os

devedores dos títulos para aceitá-los, devolvê-los ou pagá-los, sob pena de protesto; III - receber o pagamento

dos títulos protocolizados, dando quitação; IV - lavrar o protesto, registrando o ato em livro próprio, em

microfilme ou sob outra forma de documentação; V - acatar o pedido de desistência do protesto formulado pelo

apresentante; VI - averbar: a) o cancelamento do protesto; b) as alterações necessárias para atualização dos

registros efetuados; VII - expedir certidões de atos e documentos que constem de seus registros e papéis.

Parágrafo único. Havendo mais de um tabelião de protestos na mesma localidade, será obrigatória a prévia

Page 52: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

51

registradores, sendo que os demais atos são de gerência exclusiva destes profissionais, ou

seja, sequer serão fiscalizados pelo Poder Judiciário. De acordo com o artigo 21 da mesma lei:

―Art. 21. O gerenciamento administrativo e financeiro dos serviços notariais

e de registro é da responsabilidade exclusiva do respectivo titular, inclusive

no que diz respeito às despesas de custeio, investimento e pessoal, cabendo-

lhe estabelecer normas, condições e obrigações relativas à atribuição de

funções e de remuneração de seus prepostos de modo a obter a melhor

qualidade na prestação dos serviços.‖

O terceiro requisito da habitualidade ou não eventualidade significa a prestação de

serviços ligados às atividades normais do empregador, ou seja, realizando serviços

permanentemente necessários à atividade do empregador ou ao seu empreendimento119

.

Apesar de as atividades notariais e registrais serem de fato habituais nos termos do artigo 4º

da citada lei: ―Os serviços notariais e de registro serão prestados, de modo eficiente e

adequado, em dias e horários estabelecidos pelo juízo competente, atendidas as peculiaridades

locais, em local de fácil acesso ao público e que ofereça segurança para o arquivamento de

livros e documentos‖120

, esta habitualidade não coincide com a habitualidade do contrato de

trabalho, tendo em vista que esta é a habitualidade de quem presta os serviços e não do

serviço em propriamente dito.

O quarto e ultimo requisito da relação de trabalho, a onerosidade, também não está

presente na relação entre notários e registradores e o Poder Público. A onerosidade significa

que os serviços prestados têm como contraprestação o recebimento da remuneração, não se

tratando, assim, de trabalho gratuito. O empregado trabalha com o fim de receber salário,

sendo este seu objetivo ao firmar o pacto laboral121

.

Apesar de estas atividades serem remuneradas, este encargo não é suportado pelo

Poder Público e sim pelos usuários do serviço, portanto não há como reconhecermos um

vínculo empregatício entre os notários e registradores e o Poder Público. Por outro lado e por

motivos óbvios, não há relação de emprego entre os notários e registradores e os usuários de

seus serviços, tendo em vista se tratar de uma relação eventual.

distribuição dos títulos. SEÇÃO III. Das Atribuições e Competências dos Oficiais de Registros. Art. 12. Aos

oficiais de registro de imóveis, de títulos e documentos e civis das pessoas jurídicas, civis das pessoas naturais e

de interdições e tutelas compete a prática dos atos relacionados na legislação pertinente aos registros públicos, de

que são incumbidos, independentemente de prévia distribuição, mas sujeitos os oficiais de registro de imóveis e

civis das pessoas naturais às normas que definirem as circunscrições geográficas. Art. 13. Aos oficiais de registro

de distribuição compete privativamente: I - quando previamente exigida, proceder à distribuição eqüitativa pelos

serviços da mesma natureza, registrando os atos praticados; em caso contrário, registrar as comunicações

recebidas dos órgãos e serviços competentes; II - efetuar as averbações e os cancelamentos de sua competência;

III - expedir certidões de atos e documentos que constem de seus registros e papéis. 119

GARCIA. 2014, p. 126. 120

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994. 121

BOMFIM, Vólia. Direito do trabalho. – 9.ª ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método,

2014, p. 301.

Page 53: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

52

2.3) SERVIDORES TEMPORÁRIOS

A terceira e ultima classificação dos servidores públicos é a de servidor para atender a

necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do inciso IX, do artigo

37, da Constituição Federal, que também é regido pelas leis trabalhistas por força da Lei nº

9.962/00, e regulamentado pela Lei nº 8.745/93. Porém não exercem cargo ou emprego

público, mas apenas função pública. Celso Antônio Bandeira de Mello classifica os servidores

temporários como sendo uma subespécie dos empregados públicos122

.

O servidor temporário é aquele contratado pela administração pública para atender a

uma situação emergência ou de necessidade temporária de serviço prevista taxativamente em

lei123

. Tal contratação tem o intuito de atender a situações que, devido à urgência, não possam

esperar pelo regular processo seletivo público ou que, devido à transitoriedade, não

justifiquem a criação de um encargo estável e duradouro para o Poder Público, como ocorre

com as contratações para empregos públicos ou investiduras em cargos públicos.

122

MELLO. 2006, p. 240. 123

Lei nº 8.745/93: Art. 2º Considera-se necessidade temporária de excepcional interesse público: I - assistência

a situações de calamidade pública; II - assistência a emergências em saúde pública; III - realização de

recenseamentos e outras pesquisas de natureza estatística efetuadas pela Fundação Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística - IBGE; IV - admissão de professor substituto e professor visitante; V - admissão de

professor e pesquisador visitante estrangeiro; VI - atividades: a) especiais nas organizações das Forças Armadas

para atender à área industrial ou a encargos temporários de obras e serviços de engenharia; b) de identificação e

demarcação territorial; c) (Revogada pela Lei nº 10.667, de 2003); d) finalísticas do Hospital das Forças

Armadas; e) de pesquisa e desenvolvimento de produtos destinados à segurança de sistemas de informações, sob

responsabilidade do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento para a Segurança das Comunicações - CEPESC; f)

de vigilância e inspeção, relacionadas à defesa agropecuária, no âmbito do Ministério da Agricultura e do

Abastecimento, para atendimento de situações emergenciais ligadas ao comércio internacional de produtos de

origem animal ou vegetal ou de iminente risco à saúde animal, vegetal ou humana; g) desenvolvidas no âmbito

dos projetos do Sistema de Vigilância da Amazônia - SIVAM e do Sistema de Proteção da Amazônia - SIPAM.

h) técnicas especializadas, no âmbito de projetos de cooperação com prazo determinado, implementados

mediante acordos internacionais, desde que haja, em seu desempenho, subordinação do contratado ao órgão ou

entidade pública. i) técnicas especializadas necessárias à implantação de órgãos ou entidades ou de novas

atribuições definidas para organizações existentes ou as decorrentes de aumento transitório no volume de

trabalho que não possam ser atendidas mediante a aplicação do art. 74 da Lei no 8.112, de 11 de dezembro de

1990; j) técnicas especializadas de tecnologia da informação, de comunicação e de revisão de processos de

trabalho, não alcançadas pela alínea i e que não se caracterizem como atividades permanentes do órgão ou

entidade; l) didático-pedagógicas em escolas de governo; e m) de assistência à saúde para comunidades

indígenas; e VII - admissão de professor, pesquisador e tecnólogo substitutos para suprir a falta de professor,

pesquisador ou tecnólogo ocupante de cargo efetivo, decorrente de licença para exercer atividade empresarial

relativa à inovação. VIII - admissão de pesquisador, de técnico com formação em área tecnológica de nível

intermediário ou de tecnólogo, nacionais ou estrangeiros, para projeto de pesquisa com prazo determinado, em

instituição destinada à pesquisa, ao desenvolvimento e à inovação; IX - combate a emergências ambientais, na

hipótese de declaração, pelo Ministro de Estado do Meio Ambiente, da existência de emergência ambiental na

região específica. X - admissão de professor para suprir demandas decorrentes da expansão das instituições

federais de ensino, respeitados os limites e as condições fixados em ato conjunto dos Ministérios do

Planejamento, Orçamento e Gestão e da Educação. XI - admissão de professor para suprir demandas

excepcionais decorrentes de programas e projetos de aperfeiçoamento de médicos na área de Atenção Básica em

saúde em regiões prioritárias para o Sistema Único de Saúde (SUS), mediante integração ensino-serviço,

respeitados os limites e as condições fixados em ato conjunto dos Ministros de Estado do Planejamento,

Orçamento e Gestão, da Saúde e da Educação.

Page 54: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

53

Os servidores públicos temporários não exercem cargos ou empregos públicos, tendo

em vista estes serem de titularidade dos servidores estatutários e dos empregados públicos.

Portanto os servidores temporários exercem apenas funções públicas, que possuem esta

característica de transitoriedade. Para Maria Sylvia, os servidores temporários, contratados

por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse

público (art. 37, IX, da Constituição); eles exercem função, sem estarem vinculados a cargo

ou emprego público124

.

Os notários e registradores também não são considerados servidores públicos

temporários, tendo em vista que as hipóteses para que este vínculo ocorra são previstas

taxativamente em lei e não consta a prestação de serviços notariais e registrais neste diploma

legal. O vínculo do servidor público temporário com o Poder Público é regido pelas leis

trabalhista, portanto, os mesmo fundamentos de que os notários e registradores não podem ser

considerados empregados públicos se aplicam a aos servidores temporários.

Além do mais, vimos que a atividade notarial e registral é delegada por prazo

indeterminado, perdurando enquanto não ocorrer qualquer das hipóteses de extinção da

delegação, previstas nos artigo 39, da lei 8.935/94. Já os servidores públicos temporários são

investidos em suas funções com prazo fixo e limite máximo pré-determinado que pode chegar

ao máximo de seis anos.

Feitos estes apontamentos a respeitos dos servidores públicos e visto o entendimento

doutrinário e jurisprudencial, podemos concluir que os notários e registradores não se

enquadram na classificação de servidores públicos, não exercendo cargo, emprego ou função

pública temporária.

O vínculo entre estas três categorias de servidores públicos e o Poder Público é de

natureza empregatícia, seja regida por estatuto seja por leis trabalhistas. O que não acontece

com os serviços notariais e registrais, que são regidos por lei própria. Apesar de os notários e

registradores serem profissionais do direito, o vínculo legal entre estes profissionais e o estado

não é de natureza de natureza trabalhista ou empregatícia.

3) MILITARES

Os Militares, conforme denominação adotada após a Emenda Constitucional nº 18/98

(anteriormente eram chamados de servidores públicos militares), são aqueles que, no âmbito

federal, prestam serviços às Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica), nos termos

do artigo 142 da Constituição Federal, e, no âmbito dos Estados, Distrito Federal e

124

DI PIETRO. 2014, p. 599.

Page 55: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

54

Territórios, são os membros das Polícias Militares, Corpos de Bombeiros Militares, nos

termos do artigo 42 do mesmo diploma:

―Art. 42 Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros

Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são

militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. Art. 142. As

Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela

Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas

com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do

Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos

poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da

ordem. (...) § 3º Os membros das Forças Armadas são denominados

militares, aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as

seguintes disposições.‖125

Estes possuem regramento próprio pautado na hierarquia e disciplina o que não é

compatível com o regramento do sistema notarial e registral, tendo em vista que possuem

independência funcional, não estando subordinados a qualquer dos Poderes da República. De

acordo com Maria Sylvia:

―Seu regime é estatutário, porque estabelecido em lei a que se submetem

independentemente de contrato. Esse regime jurídico é definido por

legislação própria dos militares, que estabelece normas sobre ingresso,

limites de idade, estabilidade, transferência para a inatividade, direitos,

deveres, remuneração, prerrogativas (art. 42, § 1º, e 142, § 3º, X, da

Constituição).‖126

Apesar de parecer óbvia a afirmação, os notários e registradores não são Militares,

pois não prestam serviços a nenhuma destas Forças Militares. Não integram nenhuma

estrutura hierárquica pautada na disciplina, pois, como vimos, está sujeito apenas à

fiscalização pelo Poder Judiciário, bem como não recebem remuneração diretamente do Poder

Público.

A afirmação já deixa de ser um tanto óbvia quando nos deparamos com diversas

passagens legais atribuindo serviços notariais e registrais aos Militares. Como podemos ver na

Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73) e no Código Civil Brasileiro (Lei nº 10.406/02):

―Lei de Registros Públicos: Art. 64. Os assentos de nascimento em navio

brasileiro mercante ou de guerra serão lavrados, logo que o fato se verificar,

pelo modo estabelecido na legislação de marinha, devendo, porém, observar-

se as disposições da presente Lei. Art. 66. Pode ser tomado assento de

nascimento de filho de militar ou assemelhado em livro criado pela

administração militar mediante declaração feita pelo interessado ou remetido

pelo comandante da unidade, quando em campanha. Art. 85. Os óbitos,

verificados em campanha, serão registrados em livro próprio, para esse fim

designado, nas formações sanitárias e corpos de tropas, pelos oficiais da

corporação militar correspondente, autenticado cada assento com a rubrica

do respectivo médico chefe, ficando a cargo da unidade que proceder ao

sepultamento o registro, nas condições especificadas, dos óbitos que se

125

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, artigos 42 e 142. 126

DI PIETRO. 2014, p. 603.

Page 56: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

55

derem no próprio local de combate. Código Civil: Art. 1.888. Quem estiver

em viagem, a bordo de navio nacional, de guerra ou mercante, pode testar

perante o comandante, em presença de duas testemunhas, por forma que

corresponda ao testamento público ou ao cerrado. Art. 1.893. O testamento

dos militares e demais pessoas a serviço das Forças Armadas em campanha,

dentro do País ou fora dele, assim como em praça sitiada, ou que esteja de

comunicações interrompidas, poderá fazer-se, não havendo tabelião ou seu

substituto legal, ante duas, ou três testemunhas, se o testador não puder, ou

não souber assinar, caso em que assinará por ele uma delas.‖127

Porém, como podemos ver, estas situações somente acontecem em casos de

emergência, de guerra ou campanha militar, sempre de caráter transitório, o que não é o

suficiente para infirmar a regra que os notários e registradores não são Militares. Quando

prestam estes serviços que não são suas funções típicas, os Militares atuam como gestores do

negócio público, ou seja, como particular em colaboração com o Poder Público e não como

Militar propriamente dito. Por decisão política o legislador decidiu atribuir estas funções aos

Militares, pois são as pessoas que possuem mais condições para o exercício deste encargo nas

situações descritas, o que não impediria de ter sido atribuído a qualquer outra pessoa.

4) TRANSIÇÃO DO SISTEMA NOTARIAL: CONSTITUIÇÃO FEDERAL 1969 X

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Deixaremos de lado a discussão se a Emenda Constitucional nº 01 de 1969 da

Constituição Federal de 1967 realmente se tratou de uma nova constituição ou se se tratou

apenas de uma emenda constitucional. Com a promulgação da Constituição Federal de 1988,

houve uma mudança substancial da forma de prestação dos serviços notariais e registrais que

eram previstos na referida Constituição de 1969.

A primeira redação do artigo que tratava sobre os serviços notariais e registrais nesta

Constituição, dada pela Emenda Constitucional nº 7/77, determinou a oficialização de todas

as serventias judiciais e extrajudiciais, portanto estes serviços passaram a ser prestados

diretamente pelo Poder Público por meio de servidores públicos estatutários, ressalvando

apenas os titulares dos serviços de forma vitalícia ou nomeados em caráter efetivo. Vejamos:

―Art. 206. Ficam oficializadas as serventias do foro judicial e extrajudicial,

mediante remuneração de seus servidores exclusivamente pelos cofres

públicos, ressalvada a situação dos atuais titulares, vitalícios ou nomeados

em caráter efetivo. § 1º Lei complementar, de iniciativa do Presidente da

República, disporá sobre normas gerais a serem observadas pelos Estados e

pelo Distrito Federal na oficialização dessas serventias. § 2º Fica vedada, até

a entrada em vigor da lei complementar a que alude o parágrafo anterior,

qualquer nomeação em caráter efetivo para as serventias não remuneradas

127

BRASIL. Lei nº 6.015, de 31 de dez. de 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá outras

providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 31 de dez. 1973. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6015compilada.htm>. Acesso em: 14 nov. 2017; e BRASIL.

Código Civil. Lei 10.406, de 10 jan. 2002.

Page 57: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

56

pelos cofres públicos. § 3º Enquanto não fixados pelos Estados e pelo

Distrito Federal os vencimentos dos funcionários das mencionadas

serventias, continuarão eles a perceber as custas e emolumentos

estabelecidos nos respectivos regimentos.‖128

Portanto os notários e registradores eram efetivamente servidores públicos estatutários,

pois preenchiam todos aqueles requisitos vistos a cima para o vínculo estatutário, quais sejam:

remuneração paga diretamente pelo poder público, vínculo regido, à época, pelo Estatuto dos

Funcionários Públicos (Lei nº 1.711/52) e a prestação do serviço feita diretamente pelo Poder

Público por sua conta e risco.

A Emenda Constitucional nº 22/82 deu nova redação a este artigo e determinou a

exigibilidade de concurso público para que se possa exercer as funções notariais e registrais,

prevendo que apenas as serventias judiciais seriam oficializadas:

―Art. 206 - Ficam oficializadas as serventias do foro judicial mediante

remuneração de seus servidores exclusivamente pelos cofres públicos,

ressalvada a situação dos atuais titulares, vitalícios ou nomeados em caráter

efetivo ou que tenham sido revertidos a titulares. § 1º - Lei complementar, de

iniciativa do Presidente da República, disporá sobre normas gerais a serem

observadas pelos Estados, Distrito Federal e Territórios na oficialização

dessas serventias. Art. 207 - As serventias extrajudiciais, respeitada a

ressalva prevista no artigo anterior, serão providas na forma da legislação

dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, observado o critério da

nomeação segundo a ordem de classificação obtida em concurso público de

provas e títulos. Art. 208 - Fica assegurada aos substitutos das serventias

extrajudiciais e do foro judicial, na vacância, a efetivação, no cargo de

titular, desde que, investidos na forma da lei, contem ou venham a contar

cinco anos de exercício, nessa condição e na mesma serventia, até 31 de

dezembro de 1983.‖129

Portanto, fazendo uma interpretação a contrario sensu e histórica, as serventias

extrajudiciais deixaram de ser oficializadas pelo Poder Público a partir desta Emenda. Apesar

de o texto constitucional não ser expresso, houve um silêncio eloquente do legislador, tendo

em vista que houve a supressão da determinação da oficialização das serventias extrajudiciais,

o que era previsto expressamente na redação anterior.

A palavra oficial significa algo que é emanado de alguma autoridade pública, portanto

a serventia oficializada é aquela que é investida por um agente do governo, ou seja, por um

servidor público estatutário, de acordo com as redações do artigo 206 desta Carta

Constitucional. Prova maior disso é o artigo 32 do Ato das Disposições Constitucionais

Transitórias da Constituição Federal de 1988: O disposto no art. 236 não se aplica aos

serviços notariais e de registro que já tenham sido oficializados pelo Poder Público,

128

BRASIL. Emenda Constitucional nº 1, de 17 de out. de 1969. Edita o novo texto da Constituição Federal

de 24 de janeiro de 1967. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc01-69.htm>. Acesso em:

14 nov. 2017. 129

Ibidem.

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respeitando-se o direito de seus servidores130

. Este artigo prevê expressamente as pessoas que

exercem as funções notariais e registras que tenham sido oficializadas são servidores públicos.

O artigo 208, com redação também pela Emenda Constitucional nº 22/82, é uma regra

de transição que garantiu a titularidade de forma definitiva destes serviços aos substitutos

legais dos notários e registradores que tenham sido investidos na forma da lei e que tenham

pelo menos cinco anos de efetivo exercício na mesma serventia até a data de 31 de dezembro

de 1983 no caso de vacância do titular.

Então no caso de qualquer vacância, após a Emenda Constitucional nº 22 de 29 de

junho de 1982, em que o substituto legal do notário ou registrador não tenha preenchido os

requisitos do artigo 208, esta vaga deve ser preenchida obrigatoriamente por concurso público

e não pela efetivação de seu substituto legal.

Há que se ressaltar que esta regra de transição teve validade somente até o dia 05 de

outubro de 1988, data em que foi promulgada a vigente Constituição Federal. Esta

Constituição revogou todo o regramento anterior, tendo disciplinado novamente a matéria e

acabado com a regra de transição instituída pela Emenda Constitucional nº 22/1982.

A Constituição Federal de 1988 seguiu a mesma linha da EC nº 22/82, porém de forma

mais clara e precisa. Conferiu os serviços notariais e registrais de forma exclusiva e em

caráter privado aos particulares por meio de concurso público. Portanto, não existe mais a

possibilidade de se oficializar as serventias extrajudiciais e as já oficializadas, quando da

promulgação desta Constituição, permanecerão nesta situação até que haja a vacância de seus

titulares, respeitando-se o direito de seus servidores (Art. 32, da ADCT, da CF/88).

A Lei nº 8.935/94, que regulamentou os serviços notariais e registrais, instituiu regra

de transição que garantiu a titularidade dos serviços notariais e registrais a todos aqueles que

ingressaram regularmente na atividade até a data da promulgação da Constituição de 1988:

Art. 47. O notário e o oficial de registro, legalmente nomeados até 5 de outubro de 1988,

detêm a delegação constitucional de que trata o art. 2º131

.

Portanto, apesar de ter avalizado as investiduras feitas de acordo com a regra de

transição da instituída pela EC nº 22/82 da Carta anterior, não possibilitou mais que novas

investiduras sejam feitas naqueles termos, após a CF/88, tendo em vista que aquela norma

fora revogada e não existir direito adquirido a regime jurídico. É o entendimento expresso na

exposição de motivos da Resolução nº 80 do CNJ:

130

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 131

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994.

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―CONSIDERANDO os sucessivos precedentes monocráticos e colegiados

do C. Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a atual ordem

constitucional estabelece que a investidura na titularidade de unidade do

serviço, cuja vacância tenha ocorrido após a promulgação da Constituição

Federal de 1988, depende da realização de concurso público para fins

específicos de delegação, inexistindo direito adquirido ao que dispunha o

artigo 208 da Constituição Federal de 1967, na redação da EC 22/1982,

quando a vaga ocorreu já na vigência da Constituição Federal de 1988 (RE

182641, 378347 e 566314, MS 27118 e 27104, Agravos de Instrumento

516427 e 743906, ADI 417-4, 363-1 e ADI/MC 4140-1, dentre outros);‖132

Assim, aqueles que preencheram os requisitos anteriormente à Constituição de 1988 e

foram investidos legalmente na função tiveram a suas situações preservadas, tendo em vista já

se tratar de direito adquirido. Quem preencheu tais requisitos somente após a dita Carta de

1988 não pôde mais ser investido de forma definitiva nas funções, tendo em vista que as

normas da Constituição de 1969 não mais vigiam.

Mais a frente, a mesma lei determina a desestatização daquelas serventias já

oficializadas que vieram do sistema anterior: Art. 50. Em caso de vacância, os serviços

notariais e de registro estatizados passarão automaticamente ao regime desta lei133

. Então

temos duas situações distintas para estas serventias estatizadas advindas do sistema anterior: a

situação do titular dos serviços e a situação de seus auxiliares, todos considerados servidores

públicos estatutários.

Quando da vacância do titular, a serventia passa automaticamente para o regramento

do artigo 236 da CF/88, passando a ser exercida em caráter privado e por particulares por

meio de concurso público. Convoca-se o substituto mais antigo para que exerça as atividades

provisoriamente até que o novo titular seja investido. Já em relação aos auxiliares, estes

permanecem em seus cargos até que haja a vacância, independentemente de a serventia ter

sido desestatizada. Com isso, qualquer investidura nos serviços notariais e registrais, após a

Constituição de 1988, que não tenha se dado por concurso público ou que não seja de caráter

transitório é considerada irregular.

Atualmente, apenas para a garantia da continuidade, que é um dos princípios do

serviço público, o substituto legal do notário ou registrador, em caso de vacância definitiva do

titular, assume a titularidade do serviço de forma provisória e precária tão somente até que o

novo notário ou registrador aprovado em concurso público seja investido na função. É a

132

BRASIL. Resolução nº 80 do Conselho Nacional de Justiça de 09/06/2009. Declara a vacância dos serviços

notariais e de registro ocupados em desacordo com as normas constitucionais pertinentes à matéria,

estabelecendo regras para a preservação da ampla defesa dos interessados, para o período de transição e

para a organização das vagas do serviço de notas e registro que serão submetidas a concurso público.

Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 16 jun. 2009. Disponível em:

<http://www.cnj.jus.br/atos-normativos?documento=105>. Acesso em: 14 nov. 2017. 133

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994.

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redação do § 2º, do artigo 39, da Lei nº 8.935/94: Extinta a delegação a notário ou a oficial de

registro, a autoridade competente declarará vago o respectivo serviço, designará o substituto

mais antigo para responder pelo expediente e abrirá concurso134

.

Então houve uma transição do sistema de serventias extrajudiciais oficializadas

(Constituição Federal de 1969) para as serventias extrajudiciais não oficializadas

(Constituição Federal de 1988). As serventias deixaram de ser órgãos públicos propriamente

ditos, com servidores públicos estatutários, e passaram para o regime privado por meio de

delegação de serviço público a particulares. É o entendimento do STF na ADI nº 575:

―A atividade notarial e registral, ainda que executada no âmbito de

serventias extrajudiciais não oficializadas, constitui, em decorrência de sua

própria natureza, função revestida de estatalidade, sujeitando-se, por isso

mesmo, a um regime estrito de direito público. A possibilidade

constitucional de a execução dos serviços notariais e de registro ser efetivada

"em caráter privado, por delegação do Poder Público" (CF, art. 236), não

descaracteriza a natureza essencialmente estatal dessas atividades de índole

administrativa. As serventias extrajudiciais, instituídas pelo Poder Público

para o desempenho de funções técnico-administrativas destinadas "a garantir

a publicidade, a autenticidade, a segurança e a eficácia dos atos jurídicos"

(Lei 8.935/1994, art. 1º), constituem órgãos públicos titularizados por

agentes que se qualificam, na perspectiva das relações que mantêm com o

Estado, como típicos servidores públicos.‖135

(grifo nosso) Os serviços notariais e registrais passaram a ser prestados por particulares em

colaboração com o poder público que não podem ser confundidos com servidores públicos.

Os notários e registradores prestam serviços em caráter privado por sua conta e risco e não

são remunerados pelos cofres públicos. É o entendimento de José dos Santos Carvalho Filho:

―Outra categoria de agentes públicos é a dos agentes particulares

colaboradores. Como informa o próprio nome, tais agentes, embora sejam

particulares, executam certas funções especiais que podem se qualificar

como públicas, sempre como resultado do vínculo jurídico que os prende ao

Estado. Alguns deles exercem verdadeiro munus público, ou seja, sujeitam-

se a certos encargos em favor da coletividade a que pertencem,

caracterizando-se, nesse caso, como transitórias as suas funções. Vários

desses agentes, inclusive, não percebem remuneração, mas, em

compensação, recebem benefícios colaterais, como o apostilamento da

situação nos prontuários funcionais ou a concessão de um período de

descanso remunerado após o cumprimento da tarefa. Clássico exemplo

desses agentes são os jurados, as pessoas convocadas para serviços

eleitorais, como os mesários e os integrantes de juntas apuradoras, e os

comissários de menores voluntários. São também considerados agentes

particulares colaboradores os titulares de ofícios de notas e de registro não

oficializados (art. 236, CF) e os concessionários e permissionários de

serviços públicos.‖136

134

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994, art. 39, § 2º. 135

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.378 MC. Relator: Ministro

Celso de Mello, Brasília, 30 de maio de 1997. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=347013 >. Acesso em: 04 dez 2017. 136

CARVALHO FILHO. 2014, p. 595.

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Não resta então outra classificação para os notários e registrados que não a de

particular em colaboração com o poder público. Estes exercem função pública por meio de

delegação do Poder Público e em nome próprio, assumindo todos os riscos da atividade,

recebendo parte dos emolumentos cartorários como remuneração.

5) PARTICULARES EM COLABORAÇÃO COM O PODER PÚBLICO

Os particulares em colaboração com o Poder Público são agentes públicos que

exercem função pública, porém não integram os quadros da Administração Pública. A própria

nomenclatura desta classificação já deixa bem clara esta divisão entre o Agente público e o

Poder Público. De um lado temos um particular, como pessoa física ou jurídica, que atua em

nome próprio e por sua conta e risco desempenhando uma função do Poder Público. E do

outro temos a Administração pública transferindo a execução de um serviço. É uma das

formas de descentralização de um serviço público, em que o Poder Público transfere a

execução de um serviço público a pessoas não integrantes da máquina pública:

―A organização administrativa resulta de um conjunto de normas jurídicas

que regem a competência, as relações hierárquicas, a situação jurídica, as

formas de atuação e controle dos órgãos e pessoas, no exercício da função

administrativa. Como o Estado atua por meio de órgãos, agentes e pessoas

jurídicas, sua organização se calca em três situações fundamentais: a

centralização, a descentralização e a desconcentração.‖137

(grifo nosso)

A descentralização administrativa pressupõe a existência de uma pessoa (física ou

jurídica), distinta da do Estado, a qual, investida dos necessários poderes de administração,

exercita atividade pública ou de utilidade pública. O ente descentralizado age por outorga do

serviço ou atividade, ou por delegação de sua execução, como ocorre com os notários e

registradores, mas sempre em nome próprio138

.

Para Celso Antônio Bandeira de Mello esta categoria de agentes é composta por

sujeitos que, sem perderem sua qualidade de particulares – portanto, de pessoas alheias à

intimidade do aparelho estatal (com exceção única dos recrutados para serviço militar) –,

exercem função pública, ainda que às vezes apenas em caráter episódico139

. Portanto estes

particulares não integram o Estado, porém exercem algumas de suas funções.

O termo ―particulares‖ traz a ideia de que se trata de pessoas que não integram o Poder

Público e, apesar de serem Agentes públicos, com aquele não se confunde. Já a locução ―em

colaboração‖ visa a estabelecer as fronteiras entre estes particulares e o Poder Público, tendo

em vista que os primeiros atuam em nome próprio e assumindo toda a responsabilidade da

atividade, seja civil, criminal, tributária, trabalhista etc. Esta responsabilidade somente é

137

CARVALHO FILHO. 2014, p. 457. 138

MEIRELLES. 2014, p. 846. 139

MELLO. 2006, p. 240.

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imputada ao Poder Público de forma subsidiária. Maria Sylvia Zanella Di Pietro subdivide

estes particulares em três categorias:

―Nesta categoria entram as pessoas físicas que prestam serviços ao Estado,

sem vínculo empregatício, com ou sem remuneração. Podem fazê-lo sob

títulos diversos, que compreendem: 1. delegação do Poder Público, como se

dá com os empregados das empresas concessionárias e permissionárias de

serviços públicos, os que exercem serviços notariais e de registro (art. 236 da

Constituição), os leiloeiros, tradutores e intérpretes públicos; eles exercem

função pública, em seu próprio nome, sem vínculo empregatício, porém sob

fiscalização do Poder Público. A remuneração que recebem não é paga pelos

cofres públicos, mas pelos terceiros usuários do serviço; 2. mediante

requisição, nomeação ou designação para o exercício de funções públicas

relevantes; é o que se dá com os jurados, os convocados para prestação de

serviço militar ou eleitoral, os comissários de menores, os integrantes de

comissões, grupos de trabalho etc; também não têm vínculo empregatício e,

em geral, não recebem remuneração; 3. como gestores de negócio que,

espontaneamente, assumem determinada função pública em momento de

emergência, como epidemia, incêndio, enchente etc.‖140

Então temos três categorias de particulares que atuam em colaboração com o Poder

Público, sendo: a) os gestores do negócio público; b) os requisitados, nomeados ou

designados para determinada função pública; e c) os delegatários de serviços públicos.

Passaremos aos seus estudos, porém inverteremos a ordem por fins didáticos.

5.1) GESTORES DO NEGÓCIO PÚBLICO

Os primeiros (gestores de negócio) são aqueles agentes públicos que são investidos em

funções públicas sem que haja a ciência ou concordância prévia da Administração Pública.

Ocorre em situações de emergência em que não há tempo hábil para que o Poder Público

entre em ação. Caso houvesse tempo hábil para isso, tendo em vista o princípio da

impessoalidade, o Poder Público deviria efetuar a escolha por meio de regular processo

administrativo (licitatório ou concurso público).

O Gestor de negócio é aquela pessoa que, sabendo que um terceiro (seja particular ou

Poder Público) não está em condições de gerir o seu próprio encargo, assume as funções

deste, sem a sua autorização e de forma voluntária para evitar que os interesses deste vão à

ruína. A gestão de negócio entre particulares está regulamentada nos artigos 861 e seguintes

do Código Civil. Nos termos desta legislação o gestor é aquele que, sem autorização do

interessado, intervém na gestão de negócio alheio, dirigi-lo-á segundo o interesse e a vontade

presumível de seu dono, ficando responsável a este e às pessoas com que tratar141

.

Apesar de não haver normatização do gestor do negócio público, estas regras

utilizadas entre particulares podem ser utilizadas como parâmetro. A diferença entre a gestão

140

DI PIETRO. 2014, pp. 603 e 604. 141

BRASIL. Código Civil. Lei 10.406, de 10 jan. 2002, art. 861.

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do negócio privado e a gestão do negócio público está na natureza da atividade que é

administrada por este terceiro. Se se tratar de uma atividade pública, o gestor será um gestor

de negócios públicos, portanto um particular em colaboração com o poder público.

A gestão de negócios alheios é então um ato de altruísmo que, em regra, não é

remunerado. O gestor do negócio público fica inclusive sujeito a todo o regramento a que os

agentes públicos estão sujeitos. Sendo considerado agente público para efeitos penais e

sujeitos à responsabilidade civil caso cause prejuízo a terceiros, sem prejuízo da

responsabilidade civil objetiva do Estado.

Uma situação bem elucidadora do gestor do negócio público é a autorização legal para

que qualquer do povo proceda à prisão de qualquer pessoa que se encontre em flagrante

delito: Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão

prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito142

. Isto ocorre por se tratar de uma

situação de emergência e o estado não ter condições de estar presente em todos os locais em

que ocorram crimes.

Efetuar a prisão de qualquer que se encontre em flagrante delito é um dever do estado.

O particular tem a faculdade de assumir este encargo em situação de emergência e/ou

ausência do Poder Público. Esta faculdade existe apenas até o momento em que o particular se

imbui da função pública, pois, a partir deste momento, este é considerado um funcionário

público nos termos da legislação e do Código Penal.

Caso este particular que resolveu, de livre e espontânea vontade, gerir o negócio

público, efetue uma prisão em flagrante, por exemplo, e, após, por benevolência ou por aceitar

uma vantagem ilícita, resolva liberar o flagranteado, estará cometendo crime praticado por

funcionário público contra a administração em geral, sendo, respectivamente, prevaricação e

corrupção passiva.

Toda esta sistemática, em regra, é incompatível com os serviços notariais e registrais,

tendo em vista que o exercício desses serviços não é de emergencial ou transitório, apesar de

poder acontecer em situações bem específicas como a do casamento nuncupativo que ocorre

[q]uando algum dos contraentes estiver em iminente risco de vida, não obtendo a presença da

autoridade à qual incumba presidir o ato, nem a de seu substituto, poderá o casamento ser

celebrado na presença de seis testemunhas, que com os nubentes não tenham parentesco em

142

BRASIL. Código de Processo Penal. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de out. de 1941. Diário Oficial [da]

República Federativa do Brasil, Brasília, 13 out. 1941. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm>. Acesso em: 14 nov. 2017.

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linha reta, ou, na colateral, até segundo grau143

. Situação que ocorre também quando da

atuação de militares em serviços notariais e registrais, como visto acima.

Portanto os serviços notariais e registrais só podem ser prestados por gestores do

negócio público em situações taxativas e emergenciais, o que não configura a regra, mas sim a

exceção. Assim, esta classificação é incompatível com os serviços notariais e registrais

prestados de forma ordinária. Vajamos então as demais classificações dos particulares em

colaboração com o Poder Público.

5.2) REQUISITADOS, NOMEADOS OU DESIGNADOS

Já os particulares em colaboração com o poder público requisitados, nomeados ou

designados para o exercício de funções públicas são os chamados agentes honoríficos que são

convocados devido a sua condição cívica para exercer uma função pública transitória, muitas

vezes não remunerada. Os exemplos clássicos são: a função de jurado no tribunal do júri, a de

mesário em eleições, a de comissários da Vara da Infância e Juventude etc.

Hely Lopes Meirelles os define como sendo os cidadãos convocados, designados ou

nomeados para restar, transitoriamente, determinados serviços ao Estado, em razão sua

condição cívica, de sua honorabilidade ou de sua notória capacidade profissional, mas sem

qualquer vínculo empregatício ou estatutário e, normalmente, sem remuneração144

. Então

prestam serviços públicos relevantes, sem que exerçam cargos públicos, mas apenas funções

públicas. Diogo de Figueiredo Moreira Neto, ao tratar dos cargos públicos, faz uma breve

explanação quanto a estes agentes públicos:

―Fora do Direito Administrativo, encontra-se, também, a função sem cargo,

quando há cometimento do chamado múnus público, como ocorre, por

exemplo, para o exercício da função de jurado, à qual não corresponde cargo

algum de jurado, ou para a função de mesário em época de eleições, que

tampouco se vincula a um cargo.‖145

Os agentes honoríficos são convocados para o exercício de uma função pública de

forma compulsória e, na maioria dos casos, de forma não remunerada, só podendo se eximir

deste encargo legal mediante justificativa plausível e após avaliação e dispensa da autoridade

competente. Esses agentes recebem dispensa legal de suas atividades e não podem sofrer

qualquer desconto da remuneração que recebem, seja de empregador público ou privado.

Além do mais são funções exercidas em caráter transitório, podendo durar apenas

algumas horas ou, em casos excepcionais como o serviço militar obrigatório, até um ano.

Portanto são funções com um prazo de curta duração e pré-determinado.

143

BRASIL. Código Civil. Lei 10.406, de 10 jan. 2002, art. 1.540. 144

MEIRELLES. 2014, p. 82. 145

MOREIRA NETO. 2014, p. 387.

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Então os serviços notariais e registrais não se encaixam nesta categoria, tendo em vista

que os notários e registradores não são convocados para exercer estas atividades de forma

compulsória, mas se candidatam em certame público para, caso obtenham êxito, escolherem

se desejam ou não ser investidos na função pública. Como visto anteriormente, as funções

notariais e registrais são conferidas de forma vitalícia aos notários e registradores e não de

forma transitória como ocorre com as funções honoríficas.

5.2.1) DELEGATÁRIOS DE FUNÇÃO PÚBLICA

A última classificação dos particulares em colaboração com o Poder Público é a dos

delegatários de função pública, sendo eles: a) os concessionários e permissionários de

serviços públicos; b) os notários e registradores das serventias extrajudiciais não oficializadas;

c) outros particulares que praticam atos com força jurídica oficial. É o entendimento de Celso

Antônio Bandeira de Mello:

―Na tipologia em apreço reconhecem-se: (...) d) concessionários e

permissionários de serviços públicos, bem como os delegados de função ou

ofício público, quais os titulares de serventias da Justiça não oficializadas,

como é o caso dos notários, ex vi do art. 236 da Constituição, e bem assim

outros sujeitos que praticam, com o reconhecimento do Poder Público, certos

atos dotados de força jurídica oficial, como ocorre com os diretores de

Faculdades particulares reconhecidas.‖146

A principal diferença entre estes particulares e os classificados anteriormente é forma

como assumem a função pública e a duração de seu exercício. Os delegatários recebem suas

funções em caráter não transitório, portanto o Poder Público, por não se tratar de situações

emergenciais, tem a obrigação de fazer prévio e regular processo seletivo para a escolha do

particular que desempenhará a função pública (processo licitatório ou concurso público). Caso

contrário estaria infringindo diversos princípios constitucionais, em especial o princípio

republicano e o da impessoalidade.

Hely Lopes Meirelles os define como sendo particulares (pessoas físicas ou jurídicas)

que não se enquadram na acepção própria de agentes públicos, que recebem a incumbência da

execução de determinada atividade, obra ou serviço público e o realizam em nome próprio,

por sua conta e risco, mas segundo as normas do Estado e sob permanente fiscalização do

delegante, constituindo uma categoria a parte de colaboradores com o Poder Público. Sendo

seus integrantes: concessionários e permissionários de obras e serviços públicos; notários e

registradores, na forma do art. 236 da CF; leiloeiros; tradutores e interpretes públicos; e

146

MELLO. 2006, p. 241.

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demais pessoas que recebem delegação para a prática de alguma atividade estatal ou serviço

de interesse público147

.

Ressalta ainda que estes agentes delegados, tendo em vista atuarem em nome próprio,

são responsáveis civil e criminalmente nos mesmos termos da Administração Pública

delegante, porém apenas no que disser respeito a suas atribuições (função pública), tendo em

vista que os atos de ―gestão comercial‖ não integram estas funções. A Administração Pública

somente pode ser responsabilizada por aqueles atos de forma subsidiária148

. Adverte também

que não se deve confundir estas funções delegadas com as atividades que são meramente

fiscalizadas pelo Estado, sendo que as primeiras possuem natureza e origem públicas e as

segundas são particulares, sem equiparação aos atos estatais.

Para Diogenes Gasparini, para estes colaboradores ingressarem nas funções públicas

depende de aquiescência expressa da Administração Pública. São os contratados e os

delegados de função, ofício ou serviço público. Os primeiros se vinculam à Administração

Pública por um contrato de locação de serviço ou mediante um contrato administrativo, como

os concessionários, permissionários ou autorizatários a execução de uma obra ou prestação de

um serviço público. Os segundos são os tabeliães, juízes de paz, titulares de serventias

públicas não oficializadas, diretores de faculdades particulares, leiloeiros, comissários de

menores, despachantes policiais e aduaneiros149

.

Como podemos ver, esta delegação de função pública pode ser dar basicamente de

duas formas. Uma de natureza contratual (concessionários e permissionários), que é regida

por toda a legislação administrativista, como as leis nº 8.666, 8.987, 11.079, Decreto-Lei nº

200 etc. Outra de natureza legal, por meio de delegação, sendo que cada caso específico terá

regulamentação própria. Os notários e registradores, por exemplo, são regidos pela Lei nº

8.935/94 de outras.

Assim como Hely Lopes, Diogenes entende que estes particulares ficam sujeitos aos

termos e condições dos atos de delegação e dos contratos que os ligam à Administração

Pública, respondendo civil e criminalmente por seus atos e comportamentos, ainda que não

sejam remunerados por estas funções, sendo que o Poder Público assume a responsabilidade

apenas de forma subsidiária em caso de insolvências destes agentes150

.

Devido à especificidade de algumas dessas funções delegadas aos particulares, não há

dúvidas de que não podem ser confundidas com as funções dos notários e registradores, como

147

MEIRELLES. 2014, p. 83. 148

Ibidem. 149

GASPARINI. 2012, p. 220. 150

Ibidem.

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os tradutores juramentados, comissários de menores, juízes de paz etc. A divergência

jurisprudencial é entre considerar os notários e registradores como particulares em

colaboração com o Poder Público ou equipará-los aos concessionários e permissionários de

execução de obras ou de serviços púbicos. O Supremo Tribunal Federal optou pela segunda

opção, visando proteger interesses arrecadatórios, o que é uma impropriedade. Portanto é

necessário fazermos um estudo comparado entre as atividades desempenhadas pelos notários

e registradores e as atividades desempenhadas pelos concessionários e permissionários de

serviços públicos para sabermos se são compatíveis.

5.2.2) CONCESSIONÁRIOS E PERMISSIONÁRIOS DE EXECUÇÃO DE OBRAS OU

SERVIÇOS PÚBLICOS

Aloísio Zimmer ensina que a Administração Direta pode transferir parte das suas

competências às pessoas jurídicas de Direito Público ou Privado, por outorga ou delegação,

desde que não seja nenhuma função indelegável prevista no inciso III, do artigo 4º, da Lei nº

11.079/04, quais sejam: funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de polícia e

de outras atividades exclusivas do Estado151

. A execução indireta de serviço público é feita

por meio de uma delegação em nome do particular colaborador. A delegação de um serviço

público é o vínculo contratual ou legal criado entre o vencedor do procedimento

administrativo (licitação, concurso público etc.) e o Estado.

É importante frisarmos a diferença entre a outorga e a delegação de um serviço

público. A outorga é feita por meio de lei às Entidades integrantes da Administração Indireta

estatal (já estudadas neste trabalho). Há a transferência da titularidade e do exercício do

serviço público àquelas pessoas jurídicas que passarão a ser responsáveis pelo serviço, ou

seja, exercem-no em nome próprio sob supervisão do poder público.

Já a delegação é feita a particulares em colaboração com o Poder Público (pessoas

físicas ou jurídicas), não integrantes da Administração Pública. Esta delegação pode ser feita

por meio dos institutos da concessão, permissão e autorização152

. Há a transferência apenas do

exercício do serviço público e não de sua titularidade, ou seja, o particular presta o serviço em

nome próprio e por conta e risco, porém a titularidade permanece com o ente delegante. Como

vimos, esta delegação pode se dar na forma de regulamentação própria (como no caso dos

notários e registradores) ou na forma contratual. A delegação feita aos concessionários e

permissionários de serviço público é feita na forma contratual.

151

ZIMMER JÚNIOR. 2009, p. 231. 152

MARINELA. 2015, p. 565.

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Aloízio Zimmer, ao tratar dos contratos de concessão de serviços públicos, afirma que

são exemplos de descentralização por delegação ou colaboração de atividades típicas da

Administração, e não desconcentração, pois decorre de delegação por meio de contrato

administrativo que só admite adjudicação do seu objeto após processo licitatório, estando

disponível apenas para as pessoas jurídicas ou para consórcio de empresas que demonstrem

capacidade para desempenhar tais funções por sua conta e risco e por prazo determinado153

.

Ao tratar das permissões, apresenta as suas diferenças e afirma que estas são feitas a título

precário e revogável a qualquer tempo, podendo ser delegadas a particulares pessoas físicas.

Fernanda Marinela define a concessão de serviços públicos como sendo uma forma de

transferência da titularidade para a prestação de serviços públicos, denominada delegação,

sendo feita para empresas ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu

desempenho, por sua conta e risco. Feito por meio de contrato administrativo, precedido de

licitação, na modalidade concorrência e por prazo determinado154

. Alerta ainda que somente o

ente político que é o titular do serviço é quem pode delega-lo aos particulares (salvo algumas

exceções de constitucionalidade duvidosa), respeitando se as previsões constitucionais, sendo

que, em sua omissão, deve se levar em consideração a órbita de interesses: interesse nacional

– União; interesse regional – Estados ou Distrito Federal; interesse local – Municípios ou

Distrito Federal.

Para Alexandre Mazza, a concessão de serviço público pode ser definida como um

contrato administrativo que transfere à pessoa jurídica privada a prestação de um serviço

público mediante o pagamento de tarifa, tendo as seguintes características: exigência prévia

de concorrência pública, assunção da atividade por conta e risco do particular

(responsabilidade objetiva do prestador e subsidiária do Estado), exigência de lei específica

autorizando a delegação, por prazo determinado, admitindo arbitragem e remuneração por

meio do sistema tarifário (não tributário)155

.

Então os serviços concedidos são todos aqueles que o particular executa em seu nome,

por sua conta e risco, remunerados por tarifa, na forma regulamentar, mediante delegação

contratual ou legal do Poder Público concedente. Serviço concedido é serviço do Poder

Público, apenas executado por particular em razão da concessão156

. A concessão e a

permissão de serviços públicos são formas de execução indireta do serviço público que são

transferidas aos particulares por meio de delegação do Poder Público titular do serviço.

153

ZIMMER JÚNIOR. 2009, p. 617. 154

MARINELA. 2015, p. 565. 155

MAZZA. 2015, p 519. 156

MEIRELLES. 2014, p. 451.

Page 69: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

68

A responsabilidade pela prestação do serviço público concedido ou permitido (seja

cível, penal ou tributária) é indexada ao exercício e não à titularidade. Portanto, a não

transferência da titularidade do serviço público não impede a responsabilização de quem o

exerce. É o que está disposto no artigo 2º, da lei 8.987/95, que dispõe sobre o regime de

concessão e permissão de serviços públicos:

―II - concessão de serviço público: a delegação de sua prestação, feita pelo

poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à

pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu

desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado; (...) IV -

permissão de serviço público: a delegação, a título precário, mediante

licitação, da prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à

pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho,

por sua conta e risco.157

‖ (grifo nosso). A execução do serviço público é feita por ―conta e risco‖ do particular que recebe a

concessão ou a permissão o que tem como contrapartida a possibilidade de obtenção de lucro,

apesar de não ser uma atividade econômica. Caso não fosse assim, o Poder Público que

assumiria este encargo do risco da atividade, assim com o faz com os serviços públicos

prestados de forma direta pelo Poder Público.

De acordo com Hely Lopes Meirelles, a concessão é a delegação contratual da

execução do serviço, na forma autorizada e regulamentada pelo Executivo. O Contrato de

concessão é ajuste de Direito Administrativo, bilateral, oneroso, comutativo e realizado

intuitu personae, que está sujeito a todas as imposições da Administração necessárias à

formalização do ajuste, dentre as quais a autorização governamental, regulamentação e

licitação158

.

Os serviços públicos propriamente ditos, no sentido de Administração dos interesses

Públicos e coletivos, são de titularidade dos estes políticos (União, Estados, Distrito Federal e

Municípios). Portanto estes que detêm o poder de delegá-los ou não. Como a função típica do

Poder Executivo é administrar a máquina pública, geralmente é este poder o competente para

expedir o ato de delegação. Então o Poder Executivo apenas executa aquela decisão política

que fora tomada pelo ente político de transferir o exercício do serviço público à iniciativa

privada. A delegação dos serviços notariais e registrais deveriam seguir também esta

sistemática, porém, como veremos mais a frente, o Poder Judiciário que fico encarregado de

expedir os atos delegação destes serviços.

157

BRASIL. Lei nº 8.987, de 13 de fev. de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da

prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências.

Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 12 fev. 1995. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8987cons.htm>. Acesso em: 14 nov. 2017, art. 2º, incisos II e III. 158

Ibidem.

Page 70: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

69

O §7º do artigo 10 do Decreto-Lei nº 200/67159

, que organiza a Administração Publica

Federal, determina que os serviços públicos prestados pelo Poder Executivo sejam prestados

preferencialmente de forma indireta, para evitar o inchaço da máquina pública, bem como

para que a Administração Pública possa se desincumbir de tarefas que podem ser executadas

sem qualquer prejuízo pela iniciativa privada. A execução indireta referida neste Decreto-lei é

aquela feita por meio de concessão ou permissão de serviço público à iniciativa privada por

meio de contrato. A prestação de serviços públicos de forma indireta é prestada por um

terceiro, alheio ao Estado, que é um particular em colaboração com a Administração Pública

(pessoas física ou jurídica).

Segundo o teor do art. 175, da Constituição Federal, a prestação de serviços públicos

incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou

permissão, sempre através de licitação. Os particulares somente podem prestar serviços

públicos como delegatários do Estado, estando sujeitos à lei, às cláusulas dos contratos de

concessão e permissão de serviço, à observância dos direitos dos usuários, à política tarifária e

à obrigação de manter o serviço adequado.

O Estado atua na prestação dos serviços públicos em caráter ordinário, por

determinação legal, implementando direito próprio e encargo originário do Poder Público. Os

particulares atuam em caráter excepcional, como delegados do Poder Público, em nome do

próprio, sob a tutela e fiscalização constante deste. O regime jurídico dos serviços públicos é

legal, estatutário ou de direito público (ainda que parcial), cabendo à lei disciplinar as

condicionantes fundamentais da prestação dos serviços públicos.

A prestação de serviços públicos por particulares em colaboração com a administração

pública pode se dar por diversas formas sendo apenas uma delas prevista no artigo 175 da

Constituição, qual seja, por meio de concessão ou permissão de serviço público: Incumbe ao

Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre

através de licitação, a prestação de serviços públicos160

. Como podemos ver (no âmbito

contratual), ao prever que a execução indireta dos serviços públicos se dará mediante contrato,

podemos concluir que esta não pode ser feita pela administração direta ou indireta do poder

159

§ 7º Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e contrôle e com o

objetivo de impedir o crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará

desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta,

mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a

desempenhar os encargos de execução. 160

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 175.

Page 71: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

70

público, tendo em vista que o vínculo destas administrações com o poder público não é

contratual e sim, respectivamente, político e legal161

.

Estas formas de execução indireta dos serviços públicos (concessão e permissão) são

feitas por meio de contratação de particulares pelo poder público. A lei de licitações que

institui as normas gerais para as licitações e contratações por qualquer dos poderes

(Executivo, Legislativo e Judiciário) de qualquer dos Entes Federados (União, dos Estados,

do Distrito Federal e dos Municípios) define execução indireta como a que o órgão ou

entidade contrata com terceiros sob qualquer dos seguintes regimes: a) empreitada por preço

global (...); b) empreitada por preço unitário (...); d) tarefa (...); e) empreitada integral (...)162

.

Em regra, ressalvados os casos de dispensa ou inexigibilidades previstos em lei,

qualquer delegação de serviço público na modalidade contratual (execução indireta) deve ser

precedida de licitação pública, conforme determinação do art. 175, da CF/88, bem como do

inciso XXI, do art. 37 do mesmo diploma:

―ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços,

compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação

pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com

cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições

efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as

exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do

cumprimento das obrigações.‖163

O procedimento licitatório é exigido para se garantir os princípios previstos no caput

do art. 37, da Constituição Federal, em especial o da impessoalidade. Como dito

anteriormente estes serviços públicos prestados indiretamente pelo Estado por meio de

contratação com particulares não são suscetíveis de exploração econômica (tendo em vista a

aplicação do interesse público), apesar de ser possível o auferimento de lucro, por este motivo

que estão sujeitos aos regramentos da lei geral de licitações e contratações.

Apesar de alguns serviços públicos prestados indiretamente pelo Estado por meio dos

particulares serem passíveis de auferimento de lucro (sistema tarifário) e serem regidos

parcialmente pelos princípios e regras da iniciativa privada, nossa Constituição Federal os

conferiu o status de serviço público, o que é incompatível com o conceito subjetivo de serviço

público. Prova maior disso é a necessidade de disposição constitucional expressa excluindo

tais serviços da imunidade constitucional recíproca:

161

Constituição Federal de 1988, artigo 37: (...) XIX – somente por lei específica poderá ser criada autarquia e

autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei

complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação; 162

BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de jun. de 1993, art. 6º, inciso III. 163

BRASIL. op. cit., art. 37.

Page 72: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

71

―Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é

vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) VI -

instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;

(...) § 3º As vedações do inciso VI, "a", e do parágrafo anterior não se

aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração

de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a

empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento

de preços ou tarifas pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da

obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel.‖164

Então a regra instituída pela nossa Constituição é no sentido de reconhecer que tais

serviços prestados pelos particulares são de natureza pública e, ante a consequência lógica de

se ter que conferir a imunidade dos impostos a estes serviços, tomou-se a decisão política de

excluí-la, tendo em vista que a sua prestação é feita, na maioria das vezes, por particulares e

com a obtenção de lucro.

Caso não existisse o §3º do referido artigo, estes serviços, mesmo que prestados por

particulares, seriam imunes aos impostos em relação às suas atividades de caráter público.

Como será visto, o legislador constitucional não tomou este cuidado em relação aos serviços

notariais e registrais, tendo em vista que o sistema remuneratório destes é de taxa (tributário).

A exclusão da imunidade tributária feita por tal parágrafo foi apenas para os serviços públicos

remunerados pelo sistema tarifário, que é completamente diferente.

Há que se ressaltar que esta norma prevê a exclusão da imunidade tributária para duas

situações distintas. A primeira é o caso da prestação de serviços públicos remunerados pelo

sistema tarifário, e a segunda que é relacionada à exploração de atividade econômica pelo

Poder Púbico (como ocorre com a exploração do petróleo, por exemplo).

O § 3º do art. 150 da Constituição Federal165

é claro ao impedir a concessão da

imunidade tributária aos serviços prestados pelo Estado que sejam decorrentes de exploração

econômica ou aos serviços públicos remunerados pelo sistema tarifário, tal mandamento visa

a garantir a livre concorrência no primeiro caso (exploração de atividade econômica), que é

um dos princípios previstos constitucionalmente para a ordem econômica:

―Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano

e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna,

conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

(...) IV - livre concorrência166

.‖

164

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 165

Constituição Federal de 1988: Art. 150, § 3º As vedações do inciso VI, "a", e do parágrafo anterior não se

aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas

pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços

ou tarifas pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao

bem imóvel. 166

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Page 73: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

72

Como a exploração de atividade econômica está inserida no mercado, a não exclusão

da imunidade tributária para os seus prestadores ocasionaria o desequilíbrio do mercado, bem

como colocaria em xeque a livre iniciativa, que é inclusive um dos fundamentos da República

Federativa do Brasil (Inciso IV, art. 1º, da CF/88).

Ao Estado só é lícito desempenhar atividades econômicas diante de autorização legal.

Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica

pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a

relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei167

. Portanto são necessários dois

requisitos para que Estado ingresse na atividade econômica: o primeiro que é formal, no caso

a lei; e o segundo que é justificante, sendo uma situação de segurança nacional ou de

relevante interesse coletivo. Qualquer atuação do Estado na atividade econômica fora destes

termos será inconstitucional.

O legislador constituinte tomou o cuidado de estabelecer as fronteiras entre o serviço

público e a iniciativa privada, sendo que tudo o que não for privativo do Estado será livre à

iniciativa privada, sob pena de criarmos um estado intervencionista. É o que dispõe o

parágrafo único do art. 170 da Constituição: É assegurado a todos o livre exercício de

qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo

nos casos previstos em lei168

. O Estado age como agente normativo e regulador da atividade

econômica e exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento,

sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado169

. Portanto a

regulação para o exercício de atividade econômica pelo Poder Público tem força obrigatória.

A Constituição facultou também a delegação da prestação dos serviços públicos

suscetíveis ao lucro para a iniciativa privada, por meio das concessões e permissões. Por isso

há a necessidade de se dar o tratamento mais próximo possível dos particulares, tendo em

vista que são empresas privadas que prestam tais serviços. Estes serviços, apesar de poderem

receber tratamento diferenciado da iniciativa privada (pois não se tratam de exploração de

atividade econômica) continuam regidos pelo direito público e não são beneficiários da

imunidade tributária recíproca (§3º art. 150, da CF). Ou seja, não perdem a sua natureza

jurídica de serviço público, deve respeitar todos os princípios da Administração Pública e toda

a regulamentação imposta.

167

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 173. 168

Ibidem. 169

Ibidem, art. 174.

Page 74: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

73

De forma resumida, apresentamos as características das concessões e permissões de

obras ou serviços públicos para que possamos compará-las como os serviços notariais e

registrais: a) são funções públicas exercidas em caráter privado e privativo por agentes

públicos particulares em colaboração com o Poder Público; b) responsabilização civil e

criminal (sem prejuízo da individualização penal) dos concessionários e permissionários por

seus atos e de seus prepostos; c) responsabilidade civil objetiva, assegurado o direito de

regresso; d) fiscalização de seus atos e aplicação de eventuais sanções pelo Poder delegante;

e) remuneração pelo sistema de preços públicos (tarifa); f) ingresso nas funções por meio de

êxito em processo licitatório na modalidade concorrência; g) são funções públicas; h) não há

obrigatoriedade de delegação por meio de concessão ou permissão, tendo em vista que o

Estado tem a faculdade de prestá-los de forma direta; i) particulares investidos na função por

meio de adjudicação do objeto licitatório e de contrato administrativo com o Poder delegante;

j) vínculo de natureza contratual (Celso Antônio Bandeira de Mello defende a natureza mista

deste vínculo, sendo uma parte contratual e outra regulatória) e de caráter impessoal,

transferível (caso haja autorização da Administração Pública), com prazo determinado em

contrato (respeitados os prazos máximos previstos em lei) e revogável pelo Poder delegante,

caso haja interesse público (sujeito à indenização ao particular, caso haja prejuízo); k) é

transferido apenas o exercício das funções e não a titularidade dos serviços; l) serviços de

titularidade de cada Poder Público de cada ente federado, a depender do caso (União, Estados,

DF e Municípios); m) regramento de direito público no que diz respeito às funções públicas

(Leis nº 8.987/95, nº 8.666/93, Decreto-Lei nº 200/67 etc.); n) atividade típica do Poder

Público, prestada de forma descentralizada; o) possibilidade de alteração unilateral da

concessão ou permissão pelo Poder delegante, desde que respeitado o equilíbrio econômico

financeiro do contrato; p) formas de extinção previstas em lei (término do prazo contratual,

encampação – interesse público –, caducidade – descumprimento de obrigação contratual –,

rescisão – descumprimento pelo poder concedente –, anulação – por ilegalidade –, falência ou

extinção da empresa etc.); q) admite arbitragem para a solução de seus conflitos; r) atuação,

em regra, por pessoas jurídicas (permissão pode ser feita à pessoa física), portanto sujeitas às

falência nos termos da Lei nº 11.101/05; s) não exploram atividade econômica, possuem

conteúdo econômico; e t) não recebem a imunidade tributária recíproca por força de previsão

constitucional expressa (§3º do artigo 150 da CF/88).

Como veremos a diante, este modelo de prestação indireta de serviço público por

agentes delegados concessionários ou permissionários de serviço público é totalmente

incompatível com a prestação dos serviços notariais e registrais, porém o Supremo Tribunal

Page 75: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

74

Federal os equiparou para fins de tratamento tributário. Uma breve leitura do artigo 236 da

Constituição Federal já seria o suficiente para chegarmos a esta conclusão.

5.2.3) NOTÁRIOS E REGISTRADORES

Ao longo deste trabalho apresentamos as diversas características das serventias

extrajudiciais, dos serviços notariais e registrais e de dos notários e registradores, em seus

tratamentos constitucionais e infraconstitucionais. Evitaremos fazer repetições desnecessárias

neste tópico, tendo em vista a objetividade deste trabalho.

Vimos que os serviços notariais e registrais não são prestados pelos órgãos integrantes

da administração direta, pela administração indireta ou por meio de concessão ou permissão

de serviço público. Os notários e registradores são agentes públicos na modalidade particular

em colaboração com o poder público, assim como os concessionários e permissionários,

porém com estes não se confundem. Vejamos agora como é feita a prestação dos serviços

notariais e de registro:

―Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter

privado, por delegação do Poder Público. § 1º Lei regulará as atividades,

disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de

registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder

Judiciário. § 2º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de

emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de

registro. § 3º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de

concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer

serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de

remoção, por mais de seis meses.‖170

.

Pelo caput do artigo podemos perceber que é uma forma indireta de prestação do

serviço, tendo em vista que é uma atividade delegada e exercida em caráter particular, sendo

transferida aos particulares aprovados em concursos públicos. Pelo fato de os notários e

registradores prestarem os serviços na qualidade de pessoas físicas, podemos excluir todos os

vínculos que poderiam resultar no caso de prestadores de serviços por pessoas jurídicas, como

é o do regime de prestação indireta por concessões de serviços públicos. Podemos excluir

também o regime de permissão de serviços públicos que, apesar de serem passiveis de

prestação por pessoas física, há a exigência de licitação para tanto.

Celso Antônio bandeira de Mello define os notários e registradores como particulares

em colaboração com a administração pública, sendo delgados de função ou ofício público,

titulares de serventias da Justiça não oficializadas, ex vi do art. 236 da Constituição171

. É clara

a lição deste no sentido de separar os notários e registradores dos concessionários e

170

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 236. 171

Ibidem, p. 241.

Page 76: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

75

permissionários de serviço público, apesar de todos serem considerados particulares em

colaboração com o poder público, pois possuem regramentos distintos.

A classificação correta para os notários e registradores é a de ―agentes delegados‖ ou

―delegatários‖ de função pública, pois é o que está disposto no art. 236, da CF/88, que prevê

que o particular receberá uma delegação do poder público. Este é também o entendimento de

Hely Lopes Meirelles, que os definem como particulares que recebem a incumbência de

determinada atividade, obra ou serviço, por sua conta e risco, mas segundo normas do Estado

e sob permanente fiscalização do delegante172

.

Prossegue afirmando que são categoria distinta dos Servidores Públicos e dos Agentes

Honoríficos, bem como que não são representantes do Estado. Categoria esta que inclui: os

concessionários e permissionários de obras e serviços públicos, os titulares (pessoas naturais)

por delegação dos serviços públicos notariais e registro, na forma do art. 236 da CF, os

leiloeiros, os tradutores e interpretes públicos, as demais pessoas que recebem delegação para

a prática de alguma atividade estatal ou serviço de interesse coletivo173

. É o que defende

também Walter Ceneviva:

―No direito brasileiro, notário e registrador, conforme ficou dito, são agentes

públicos, considerando-se que o Poder lhes delega funções, subordinados

subsidiariamente, em certos casos, a regras do regime administrativo

especial admitido na Constituição, sem jamais atingirem, porém, a condição

de servidores do Estado.‖174

Para Fernanda Marinela, os delegados de função ou ofício público são aqueles que

exercem serviços notariais (antigos cartórios extrajudiciais), regulamentados pela Lei nº

8.935/94, terminologia que foi adotada pelo artigo 236 da CF. Ressalta ainda que, apesar da

exigência de concurso público, os notários e registradores não perdem a qualidade de

particulares, não podendo ser incluídos na categoria de servidores públicos175

. José dos Santos

Carvalho Filho trata os notários e registradores da seguinte maneira:

―No que concerne especificamente aos titulares de registro e ofícios de

notas, cujas funções são desempenhadas em caráter privado, por delegação

do Poder Público, como consigna o art. 236 da CF, sujeitam-se eles a regime

jurídico singular, contemplado na Lei nº 8.935, de 18.11.1994,

regulamentadora daquele dispositivo constitucional. Apesar de a função

caracterizar-se como de natureza privada, sua investidura depende de

aprovação em concurso público e sua atuação se submete a controle do

Poder Judiciário, de onde se infere que se trata de regime jurídico híbrido.

Não há dúvida, todavia, de que esses agentes, pelas funções que

desempenham, devem ser qualificados como colaboradores do Poder

Público, muito embora não sejam ocupantes de cargo público, mas sim

172

MEIRELLES. 2014, p. 83. 173

Ibidem. 174

CENEVIVA. 2010, p. 45. 175

MARINELA. 2015, p. 633.

Page 77: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

76

agentes que exercem, em caráter de definitividade, função pública sujeita a

regime especial.‖

É importante ressaltarmos que, similarmente ao que acontece com a delegação de

serviços públicos por meio de concessão ou permissão, o notário ou registrador recebe apenas

a execução dos serviços e não a sua titularidade, o que é mais uma evidência de que os

serviços de notas e de registros não são prestados pela administração pública direita ou

indireta, sendo este também o entendimento de Odemilson Roberto:

―o Estado não delega o serviço registral e de notas, cuja titularidade continua

a lhe pertencer, mas, apenas, parcela de função pública, parcela de poder,

parcela de competência, de que também é detentor, para que o delegado

possa cumprir a finalidade da delegação, qual seja, a execução do serviço

público registral.‖176

Além do mais, a prestação dos serviços notariais e registrais é uma das poucas

hipóteses, se não a única, de prestação de serviços públicos obrigatórios que devem ser

prestados obrigatoriamente por particulares. A única exceção, que se encontra em vias de

extinção (como visto anteriormente), é para aquelas serventias oficializadas anteriormente à

Constituição de 1988. Então o Poder Público não possui sequer a faculdade de prestar estes

serviços em conjunto com os particulares.

Prova maior disso é o fato de estes serviços estarem previstos desta forma na parte

permanente da nossa Constituição, portanto o regramento do artigo 236 é a diretriz a ser

seguida de sua promulgação em diante. Por outro lado, as serventias oficializadas, vindas da

sistemática da Constituição Federal anterior (1969), estão previstas nas disposições

constitucionais transitórias da CF de 88, portanto só devem perdurar nesta situação até que

fiquem vagas, passando automaticamente para o regramento da Constituição de 1988. É o

entendimento de Hely Lopes:

―Os serviços públicos notariais e de registro são exercidos em caráter

privado, por delegação do Poder Público, a qual, salvo os já oficializados até

5.10.1988, deverá ser feita somente a pessoa natural e mediante concurso

público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia desse

serviço fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou remoção, por

mais de seis meses (art. 237 (sic) e parágrafos, da CF, e art. 32 do

ADCT).‖177

(grifo nosso)

Hely Lopes Meirelles os classifica ainda como sendo serviços próprios do Estado,

relacionados intimamente com as atribuições do Poder Público (como segurança, polícia,

higiene, saúde públicas, judiciário etc.) e exercidos com supremacia sobre os administrados.

Ressalta que, em regra, estes serviços típicos do Poder Público só podem ser prestados pela

Administração Pública (órgão ou entidades públicas), porém regras constitucionais ou

176

FASSA, Odemilson Roberto Castro. Serviços notariais e de registro: formas de extinção da delegação –

uma nova hipótese. – 1. ed. – São Paulo: Editora Pillares, 2013. p. 128. 177

MEIRELLES. 2014, p. 474.

Page 78: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

77

infraconstitucionais podem atribuir tais tarefas aos particulares, como o fez com os notários e

registradores (artigo 236 da CF)178

. Portanto são serviços de natureza pública, que possuem tal

status por previsão constitucional, sendo de delegação obrigatória e exclusiva aos particulares

(pessoas físicas) aprovados em concurso público de provas e títulos.

Estes serviços próprios do Estado têm a finalidade de assegurar a autenticidade,

segurança jurídica, eficácia e publicidade de assentos, atos, negócios e declarações dos

registros e/ou das notas, todos com fé pública, sendo que os seus efeitos são, em regra,

constitutivos, comprobatórios e publicitários179

. É o que está disposto expressamente na Lei nº

8.935/94 e o entendimento também Alexandre Mazza:

―Os serviços notariais e registrais são serviços públicos exercidos em caráter

privado, por delegação do Poder Público, consistindo em uma organização

técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, a autenticidade,

a segurança e a eficácia dos atos jurídicos180

.‖

Consistem em atividades típicas do Poder Público que são fiscalizadas e

regulamentadas pelo Poder Judiciário. Para Walter Ceneviva, os serviços notariais e registrais

caracterizam o trabalho técnico desenvolvido sob as ordens de um delegado do Poder Público,

para exclusivo cumprimento de funções ali indicadas, delegado esse atuando com

independência, mas sujeito à fiscalização do Poder Judiciário181

. Apesar de serem

profissionais independentes, os notários e registradores estão sujeitos ao regramento e

fiscalização pelo Poder Público.

Os serviços notariais são prestados pessoalmente pelos notários ou seus prepostos e

consistem em redigir, formalizar e autenticar, quanto autorizado por lei e com fé pública,

instrumentos que consubstanciam atos jurídicos extrajudiciais do interesse dos solicitantes.

Por outro lado, os serviços de registro se dedicam ao assentamento (arquivamento) de títulos

de interesse público ou privado, para a sua oponibilidade contra terceiros, com a publicidade

que lhes é inerente, para que sejam garantidas a segurança, a autenticidade e a eficácia dos

atos da vida civil que dependam desta formalidade182

.

Apesar de estes profissionais exercerem os seus ofícios em caráter particular, ainda

continuam vinculados ao Estado e são estão sujeitos a todo um regramento de direito público

no que tange às suas funções públicas. Portanto estão sujeitos ao mesmo regramento que a

Administração Pública está sujeita na prestação de seus serviços públicos, assim como aos

178

MEIRELLES. 2014, p. 390. 179

MEIRELLES. 2014, p. 475. 180

MAZZA. 2015, p. 823. 181

CENEVIVA. 2010, p. 36. 182

CENEVIVA. 2010, pp. 37 e 38.

Page 79: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

78

princípios estabelecidos no artigo 37 da nossa Constituição Federal. É o entendimento de

Ceneviva:

―O art. 236 da CF considera o serviço notarial e de registro uma delegação

do Poder Público, sendo agentes públicos seus exercentes, ainda que em

caráter privado. Subordinam-se, assim, aos princípios do art. 37, com a

redação que lhe foi dada pela EC n. 19/98, os quais passaram a incluir a

eficiência em seu rol‖183

O simples fato de um serviço ser prestado por um particular não desnatura a condição

de serviço público, tendo em vista que em diversas oportunidades o texto constitucional

transfere o encargo de prestar um serviço público a um particular. Então, buscar a natureza

jurídica de um serviço pelas qualidades de seu prestador é uma técnica inadequada (conceito

subjetivo) que em inúmeras vezes gera equívocos, com já visto anteriormente. Inclusive há

casos em que serviços eminentemente privados (ex.: atuação de algumas empresas públicas)

são prestados pelo estado, o que não lhes confere o status de serviço público.

O serviço público não é incompatível com a administração privada, esta não é capaz

de lhe retirar a sua essência. Exemplo disso são os serviços públicos prestados pelos

concessionários e permissionários (art. 175, CF/88), o simples fato de serem gerenciados pela

iniciativa privada não lhes retira a qualidade de ser serviço público. Se investigarmos as

hipóteses dos incisos XI e XII do art. 21 da CF/88, que prevê as competência da União,

veremos que boa parte dos serviços públicos ali dispostos são prestados por particulares em

colaboração com a administração pública, similarmente ao que acontece com o sistema

notarial e registral (com as suas devidas características).

A parcela de gerência privada dos serviços notariais e registrais não contamina a

natureza de serviço público para lhe transformar em serviço privado, vajamos o entendimento

de Luís Paulo Aliende Ribeiro:

―O serviço público vai até o reconhecimento de que se trata de função

estatal, cujo exercício delega a particulares. Isso abrange, como antes

asseverado, a regulação da atividade no âmbito da relação de sujeição

especial que liga cada particular titular de delegação ao Estado outorgante, à

organização dos serviços, à seleção (mediante concurso de provas e títulos)

dos profissionais de direito, à outorga e cessação da delegação, à regulação

técnica e à fiscalização da prestação dos serviços para assegurar aos usuários

sua continuidade, uniformidade, modicidade e adequação. A gestão privada

começa no gerenciamento administrativo, financeiro e de pessoal dos

serviços delegados notariais e de registro, cuja autonomia está expressa no

artigo 21 da Lei Federal n. 8.935/94 e se completa com o pleno exercício da

atividade jurídica dos notário e registradores, característica peculiar destas

profissões oficiais ou profissões públicas independentes.‖184

183

CENEVIVA. 2010, p. 40. 184

RIBEIRO, Luís Paulo Aliende. Regulação da função pública notarial e de registro. – São Paulo: Saraiva,

2009, pp. 48 e 49.

Page 80: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

79

O serviço público termina no momento em que começa a administração privada e não

se confundem. Até mesmo porque o particular não tem a liberdade de prestar o serviço da

forma que bem entender, está sempre vinculado ao princípio da legalidade. Este é o

entendimento de Marcelo Rodrigues: Ainda que gerida em caráter privado a atividade

registrária, essa peculiaridade não desbota sua natureza intrinsecamente pública. Portanto, não

há que se falar em autonomia da vontade, pois no direito público só se pode fazer aquilo que a

lei expressar185

.

Retirar a qualidade de serviço público de um serviço apenas pelo fato de ser gerido por

um particular é uma impropriedade jurídica, seria o mesmo que afirmarmos que o particular

pode então administrá-lo ao seu bel prazer, de acordo com a sua conveniência e suas vontades

pessoais, a exemplo do que ocorre com a iniciativa privada, o que não é bem assim. Todo o

regramento da atividade continua a ser o mesmo da administração pública, desde os princípios

ate às minúcias dos regulamentos da atividade notarial e registral. Odemilson Roberto expõe

este entendimento de forma brilhante:

―Não fosse público o serviço registral, o Estado não poderia suprimi-lo

quando entendesse conveniente e também não estaria obrigado a garantir a

sua continuidade quando não fosse executado pelo particular delegado. Não

serve, para afastar a qualificação da atividade registral como serviço público,

a alegação de que o legislador constitucional se utilizou da palavra serviço e

não da expressão ‗serviço público‘, porque a mesma técnica é adotada em

relação aos serviços mencionados nos artigos 21, incisos XI, XII, letras ‗a‘,

‗b‘, ‗d‘, ‗e‘; 25, § 2º; nem por isto se afirma que, em tais hipóteses, não se

tratou dos ditos serviços públicos.‖186

O particular delegatário da função notarial e/ou registral está adstrito a todo o

regramento público exaustivamente descrito neste trabalho, submetido à regulamentação por

meio de normas públicas, aos critérios de implementação (concursos, formação acadêmica ou

experiência prévia, cumprimento de obrigações eleitorais e militares etc), à fiscalização e

eventual punição, inclusive com a perda da delegação, caso infrinja alguma dessas normas de

ordem pública. Além do mais o Estado é obrigado a manter os serviços notariais e registrais

em funcionamento, inclusive subsidiando o particular, caso a atividade não seja

economicamente viável em um determinado Município.

Outra evidência da natureza pública destes serviços é a fé pública conferida aos seus

prestadores pela lei que os regulamenta: Art. 3º Notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou

registrador, são profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício

185

RODRIGUES, Marcelo Guimarães. Tratado de registros públicos e direito notarial. – 2. ed. – São Paulo:

Atlas, 2016, p. 29. 186

FASSA. 2013, p. 121.

Page 81: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

80

da atividade notarial e de registro187

. Ora, o que é a fé pública se não uma parcela do poder

público? Como podemos afirmar que um particular possui o exercício de uma parcela poder

estatal para o exercício de uma função particular? A fé pública é uma manifestação da

soberania estatal e é incompatível com o exercício de uma atividade ou serviços privados, o

que não impede que seja exercida por um particular, porém em função eminentemente

pública. Walter Ceneviva, ao comentar decisão do STF (RTJ, 126:555), afirma que:

―Sustentou Maurício Corrêa que ―não mais se pode considerar que as

pessoas jurídicas públicas são as únicas que prestam serviço público; os

particulares podem fazê-lo por delegação do poder público‖. Indo ao art. 236

da Constituição, ressaltou ―a presunção de veracidade dos atos emitidos

pelos serventuários dos cartórios de notas e registros. As certidões, atestados,

declarações, informações, por eles fornecidos, são dotados de fé pública, em

razão da delegação conferida pelo Estado para consecução desse serviço

público. Essa prerrogativa, como todas as demais dos órgãos estatais, são

inerentes à ideia de ‗poder‘, como um dos elementos integrantes do conceito

de Estado, e sem o qual este não assumiria a sua posição de supremacia

sobre o particular‖.‖188

Estes serviços são prestados por conta e risco dos seus delegatários, respondendo civil

e criminalmente pelos seus atos e de seus prepostos, sem prejuízo da individualização da

responsabilidade criminal. A Constituição reservou à lei regulamentar tais responsabilidades,

o que foi feito pela Lei nº 8.935/94. Após alteração legislativa recente, 10 de abril de 2016, a

responsabilidade civil destes profissionais passou a ser subjetiva, ou seja, é necessária a prova

de dolo ou culpa, além de todos os outros requisitos da responsabilização civil, para que haja

a responsabilização: Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos

os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que

designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso189

.

A delegação destes serviços, como dito antes e nos termos da Resolução nº 81, do

CNJ, é feita pelo Presidente do Tribunal e Justiça do Estado em que a serventia extrajudicial

está localizada. Apesar desta resolução, a doutrina entende que tal ato deveria ser expedido

pelo Poder Executivo de cada Estado, tendo em vista que estes serviços são de titularidade do

Poder Público e não do Poder Judiciário e que compete àquele Poder Administrar as

atividades típicas do Poder Público que não sejam atribuição dos demais poderes.

Os serviços públicos em geral não estão inseridos na atividade econômica, tendo em

vista que são pautados pelo interesse público e este possui o objetivo de lucro, mas sim de

atender os interesses da coletividade. Os serviços notariais e registrais são serviços públicos,

187

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994. 188

CENEVIVA. 2010, p. 44. 189

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994, artigo 22.

Page 82: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

81

portanto seguem esta sistemática. É certo que não se tratam de serviços filantrópicos, portanto

a sua prestação deve ser remunerada, o que não descaracteriza aquele objetivo inicial.

Assim acontece também com todas as atividades prestadas pelo Poder Público, estas

são remuneradas (seja de forma indireta por meio da receita proveniente dos impostos ou de

forma direta por seus usuários – taxa ou tarifa) e alguém recebe por isso (como os servidores e

os particulares que viabilizam a sua prestação), nem por isto a atuação do Estado é

considerada atividade econômica. Ou seja, a remuneração ou o lucro não são determinantes

para se considerar uma atividade como de cunho econômico, caso contrário, somente as

atividades filantrópicas escapariam desta classificação.

O que diferencia a atividade econômica da não econômica é o objetivo de lucro e não

o lucro em si. Uma atividade não econômica pode gerar rendimentos sem que seja

considerada atividade econômica. É este o magistério de José Afonso da Silva:

―O tema da atuação do Estado no domínio econômico exige prévia distinção

entre serviços públicos, especialmente os de conteúdo econômico e social, e

atividades econômicas, distinção que tem fundamento na própria

Constituição, respectivamente art. 21, XI e XII, e arts. 173 e 174. A

atividade econômica, no regime capitalista, no regime capitalista, como é o

nosso, desenvolve-se no regime da livre iniciativa sob a orientação de

administradores da empresa privada. (...) O serviço público é, por natureza,

estatal. Tem como titular uma entidade pública. Por conseguinte, dica

sempre sob o regime jurídico de direito público. O que, portanto, se tem que

destaca aqui e agora é que não cabe titularidade privada nem mesmo sobre

os serviços públicos de conteúdo econômico, como são, por exemplo,

aqueles referidos no art. 21, XI e XII.‖190

Portanto, temos três categorias distintas de serviços: a) serviços públicos de conteúdo

não econômico; b) serviços públicos de conteúdo econômico; e c) exploração de atividade

econômica. A exploração da atividade econômica propriamente dita é aquela feita pela

iniciativa privada, bem como pelo Poder Público sob o regramento do artigo 173 da CF191

, ou

seja, apenas quando houver imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo.

Assim, tanto os serviços públicos prestados pelo regramento do artigo 175 da CF quanto os

serviços públicos notariais e registrais, regidos pelo artigo 236, não são considerados

exploração de atividade econômica.

Os serviços públicos concedidos ou permitidos aos particulares, apesar de não

configurarem exploração de atividade econômica, tendo em vista seguirem o princípio do

interesse público, possuem conteúdo econômico, tendo em vista que são remunerados pelo

190

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 27ª ed. rev. e atual. – São Paulo:

Malheiros, 2006, p. 801. 191

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo

Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse

coletivo, conforme definidos em lei.

Page 83: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

82

sistema de tarifa, possuem natureza contratual e são prestados por empresas particulares.

Apesar de não terem o objetivo de gerar lucro, podem gerá-lo, tendo em vista o conteúdo

econômico destes serviços.

A diferença entre o objetivo de lucro e a sua eventual obtenção está basicamente no

fundamento da criação do serviço. No primeiro caso, o serviço é criado com a intenção de

obter lucro, o que pode até mesmo nem chegar a existir. No segundo caso, o que fundamenta

a criação do serviço é outro objetivo que não o de obter lucro (o interesse público de atender

aos anseios da sociedade, no caso), sendo que podem ter caráter econômico e acabar gerando

superávits que proporcionem o lucro. Contudo, estes serviços de conteúdo econômico não se

confundem com os serviços notariais e registrais, é o que defende Hely Lopes Meirelles:

―Esta delegação é feita pelo Poder Judiciário, cabendo-lhe ainda

competência exclusiva para a fiscalização; esta, vista como poder de polícia,

permite a cobrança de taxa. Tal delegação não está entre as regidas pelo

art. 175 da CF, mas, está submetida a regime de direito público. Cabe à

lei federal, estabelecer normas gerais sobre a fixação dos emolumentos

relativos aos atos desses serviços (hoje, a Lei federal 10.169/2000).‖192

(grifo

nosso)

Cada delegação de um serviço feita pelo Poder Público possui regramento próprio,

portanto não podem ser confundidas apenas pelo fato de carregarem o mesmo nome ou

estarem inseridas no mesmo gênero. Walter Ceneviva compartilha do mesmo entendimento,

bem como cita diversas outras hipóteses constitucionais de delegação que não podem ser

confundidas com a delegação de serviços públicos por meio de concessão, permissão ou

autorização administrativas:

―A Constituição contempla diversas espécies de delegação, no âmbito do

Legislativo (arts. 49, V, 59, IV, 68, I e § 2°), do Executivo (arts. 84,

parágrafo único, e 87, IV) e mesmo do Judiciário (art. 102, I, m),

inconfundíveis com outros atos de direito administrativo, tais como

autorização, concessão e mesmo a nomeação.‖193

A distinção mais marcante entre os serviços públicos concedidos ou permitidos (artigo

175 da CF) e os serviços notariais e registrais (artigo 236 da CF) é a forma de suas

remunerações. Os primeiros são remunerados pelo sistema de preço público (tarifa) e os

segundos pelo sistema tributário (taxa). O que é de substancial importância, tendo em vista ser

este o critério adotado pelo §3º do artigo 150 da CF para distinguir, em regra, quais os

serviços públicos possuem conteúdo econômico ou não, sendo que àqueles não se aplica a

imunidade tributária recíproca. Apresentaremos então o resumo de todas as características dos

serviços notariais e registrais e passaremos a análise da natureza jurídica de seu sistema

remuneratório, os emolumentos. 192

MEIRELLES. 2014, p. 475. 193

CENEVIVA. 2010, p. 50.

Page 84: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

83

As serventias extrajudiciais são a estrutura técnica e administrativa, não integrante da

Administração Pública Direita ou Indireta e não delegada pelo sistema de concessão ou

permissão de serviços públicos (art. 175, da CF), encarregada de exercer os serviços de notas

e/ou registros, tendo as seguintes características: a) são funções públicas exercidas em caráter

privado e privativo por agentes públicos particulares em colaboração com o Poder Público194

;

b) responsabilização civil e criminal (sem prejuízo da individualização criminal) dos notários

e registradores por seus atos e de seus prepostos195

; c) responsabilidade civil subjetiva,

assegurado o direito de regresso196

; d) fiscalização dos seus atos e aplicação de eventuais

sanções pelo Poder Judiciário197

; e) remuneração pelo sistema tributário (taxa) regulamentado

por lei federal198

; f) ingresso nas atividades por meio de aprovação em concurso público de

provas e títulos199

; g) não é cargo público, mas sim função pública200

; h) proibição de que

qualquer serventia fique vaga sem a abertura de concurso público por mais de seis meses201

; i)

particulares são investidos nas funções por meio de delegação por ato do Presidente do

Tribunal de Justiça do respectivo Estado202

; j) vínculo de natureza legal e de caráter pessoal,

profissional, intransferível, vitalício e irrevogável203

; k) é transferido apenas o exercício das

funções e não a titularidade dos serviços; l) serviços de titularidade do Poder Público dos

Estados membros; m) são serviços públicos por disposição constitucional e possuem

regramento de direito público no que diz respeito às funções públicas (Leis nº 6.015/73, nº

8.935/95, nº 10.169/00 etc.); n) atividade típica do Poder Público, prestada de forma

descentralizada; o) impossibilidade de alteração unilateral da delegação pelo Poder delegante;

p) formas de extinção previstas taxativamente em lei (morte, aposentadoria facultativa,

invalidez, renúncia, perda – por sentença judicial ou processo administrativo –,

descumprimento, comprovado, da gratuidade)204

; q) não admite arbitragem para a solução de

seus conflitos de natureza pública205

; r) notários e registradores atuam como pessoas físicas,

194

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, artigo 236. 195

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, artigo 236, §1º. 196

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994, artigo 22. 197

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, artigo 236, §1º. 198

BRASIL. Lei nº 10.169, de 29 de dez. de 2000. 199

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, artigo 236, §2º. 200

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.602/MG. Relator: Ministro

Eros Grau, Brasília, 31 de março de 2006. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266859 >. Acesso em: 04 dez 2017 201

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, artigo 236, §3º. 202

BRASIL. Resolução nº 81 do Conselho Nacional de Justiça de 09/06/2009, artigo 13. 203

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994. 204

BRASIL. Lei nº 8.935, 18 de nov. de 1994., art. 39. 205

BRASIL. Lei nº 9.307, de 23 de set. de 1996. Dispõe sobre a arbitragem. Diário Oficial [da] República

Federativa do Brasil, Brasília, 24 set. 1996. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9307.htm>. Acesso em: 4 dez. 2017.

Page 85: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

84

portanto não estão sujeitos à falência prevista na Lei nº 11.101/05206

; e s) não exploram

atividade econômica e não possuem conteúdo econômico; e t) apesar de ser considerado

serviços público, não recebem a imunidade tributária recíproca por força de decisão do STF.

206

BRASIL. Lei nº 11.101, de 09 de fev. de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência

do empresário e da sociedade empresária. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 9 fev.

2005. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em:

4 dez. 2017., art. 1º.

Page 86: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

85

CAPÍTULO III: NATUREZA JURÍDICA DOS EMOLUMENTOS CARTORÁRIOS

Os emolumentos são a remuneração a que os delagatários dos serviços notariais e

registrais têm direito de receber em razão dos atos notariais e/ou registrais praticados, sendo

fixados nos termos dos regimentos de custas dos Estados, do Distrito Federal ou Territórios

(Lei Estadual ou Distrital) e devidos pelos interessados que os requererem, ressalvadas as

hipóteses legais de gratuidade, sendo este valor destinado ao efetivo custeio destes serviços,

bem como a uma adequada e suficiente remuneração a estes delegatários207

.

Os serviços públicos devem ser remunerados ou por uma das espécies tributárias ou

por preço público. A palavra ―emolumentos‖ em si não caracteriza nenhuma espécie tributária

específica ou forma de remuneração de serviços públicos, como o preço público. A doutrina e

a jurisprudência não enxergam tal expressão de forma autônoma, até mesmo porque o nosso

sistema tributário é taxativo e exaustivo, o que significa que todas as espécies tributárias

possíveis estão previstas em nossa Constituição. Além do mais, o Código Tributário Nacional,

Lei nº 5.172/66, é categórico ao afirmar que a nomenclatura e a destinação do recurso não são

relevantes para a determinação da natureza jurídica tributária:

―Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato

gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: I - a

denominação e demais características formais adotadas pela lei; II - a

destinação legal do produto da sua arrecadação.‖ (grifo nosso)208

Podemos perceber então que a utilização da palavra ―emolumentos‖ não é capaz de

conferir autonomia como espécie tributária, portanto estes deve se encaixar em alguma das

espécies tributárias previstas na Constituição Federal, sendo que somente o seu fato gerador

pode nos guiar nesta empreitada.

1) ANÁLISE DAS ESPÉCIES TRIBUTÁRIAS

Todas as formas tributárias estão expressas no texto constitucional, portanto não há

espaço para que a legislação infraconstitucional crie novas modalidades, ressalvadas as

situações de excepcionalidades, vejamos:

207

Lei Federal nº 6.015/73: Art. 14. Pelos atos que praticarem, em decorrência desta Lei, os Oficiais do Registro

terão direito, a título de remuneração, aos emolumentos fixados nos Regimentos de Custas do Distrito Federal,

dos Estados e dos Territórios, os quais serão pagos, pelo interessado que os requerer, no ato de requerimento ou

no da apresentação do título.; CF/88, Art. 98, § 2º: As custas e emolumentos serão destinados exclusivamente ao

custeio dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça.; Lei Federal nº 8.935/94: Art. 28. Os notários e

oficiais de registro gozam de independência no exercício de suas atribuições, têm direito à percepção dos

emolumentos integrais pelos atos praticados na serventia e só perderão a delegação nas hipóteses previstas em

lei.; Lei Federal nº 10.169/00: Art. 1o Os Estados e o Distrito Federal fixarão o valor dos emolumentos relativos

aos atos praticados pelos respectivos serviços notariais e de registro, observadas as normas desta Lei. Parágrafo

único. O valor fixado para os emolumentos deverá corresponder ao efetivo custo e à adequada e suficiente

remuneração dos serviços prestados. 208

BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei 5.172, de 25 out. 1966.

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86

―Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão

instituir os seguintes tributos: I - impostos; II - taxas, em razão do exercício

do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços

públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua

disposição; III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.‖

(grifo nosso)209

Além dessas três modalidades tributárias, a jurisprudência e parte da doutrina

reconhecem a existência de mais duas (doutrina pentapartida dos tributos), citando o

empréstimo compulsório e as contribuições especiais. Já adiantamos que a única modalidade

tributária que possui afinidade com a sistemática dos emolumentos é a taxa, porém

analisaremos os fatos geradores de cada uma para que não restem dúvidas e, ao final,

confrontarmo-la com o preço público para concluirmos qual é a sua real natureza jurídica, se

tributária ou tarifária.

O CTN define o fato gerador como ―a situação definida em lei como necessária e

suficiente à sua ocorrência.‖210

, ou seja, é uma situação jurídica que justifica a cobrança de

um tributo, seja por uma ação da administração pública do particular ou por simples

manifestação de riqueza deste. Geraldo Ataliba diferencia o fato gerador da hipótese de

incidência, sendo que esta é a previsão legal e abstrata de um fato e aquela é a materialização

desta hipótese no mundo real. Faz ainda uma analogia com o direito penal em que a hipótese

de incidência equivale à descrição do tipo penal e o fato gerador equivale ao cometimento do

crime em si.

É uma distinção entre a ordem imaginada (Direito) e a sua concretização no mundo

dos fatos, quando os dois se encontram (hipótese de incidência + fato gerador) o tributo passa

a ser devido. E prossegue afirmando que o fato imponível, que tem equivalência lógica ao fato

gerador, é o fato concreto, localizado no tempo e no espaço, ocorrido no mundo fenomênico

como acontecimento fático, sensível, palpável, concreto, material, apreensível e que

corresponde à ―imagem abstrata‖ prevista previa e hipoteticamente em lei211

.

A regra-matriz de incidência tributária é uma teoria desenvolvida por Paulo de Barros

Carvalho que sintetiza todos os elementos da incidência tributária e pode ser resumida em um

antecedente: critérios material (fato gerador), espacial (local em que se considerou devido o

tributo) e temporal (momento em ocorreu o fato gerador); e um consequente: critérios pessoal

(sujeitos ativo e passivo) e quantitativo (base de cálculo x alíquota). Preenchidos todos estes

critérios, surge a obrigação tributária. Segue então com precisão cirúrgica afirmando que:

209

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 210

BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei 5.172, de 25 out. 1966. 211

ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. – 6ª ed., 12ª triagem. – São Paulo: Malheiros,

2011, pp. 67 e 68.

Page 88: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

87

―Dentre tais critérios, interessam, para fins de identificação da natureza

jurídica do tributo, o material e o quantitativo. Isso porque, enquanto o

primeiro é o núcleo da hipótese de incidência, composto por verbo e

complemento, que descrevem abstratamente atuação estatal ou fato do

particular, o segundo, no âmbito da base de cálculo mensura a intensidade

daquela conduta praticada pela Administração ou pelo contribuinte,

conforme o caso. (...) A tipologia tributária é obtida pela análise do binômio

―hipótese de incidência e base de cálculo‘.‖212

Então a base de cálculo do tributo deve guardar pertinência com o fato gerador

(critério material ou hipótese de incidência) para que se confirme a natureza jurídica do

tributo, o que será feito mais a frente. Analisaremos então, uma a uma, as espécies tributárias

para que descubramos em qual delas os emolumentos se encaixam, tendo sempre em vista o

conceito apresentado acima de que os emolumentos são devidos face à contraprestação por

um serviço público notarial ou registral prestado pelos delegatários desta função pública.

Os tributos podem ser classificados quanto à destinação de sua arrecadação em:

tributos de arrecadação vinculada a uma despesa pré-determinada e tributos de arrecadação

não vinculada a nenhuma despesa. Bem como pela atuação estatal: tributos vinculados e

tributos não vinculados. Quanto à destinação da sua receita, os tributos de arrecadação

vinculada são os que a nossa legislação pré-determina uma despesa para o fruto da

arrecadação tributária. São eles: empréstimos compulsórios e contribuições especiais. O

legislador constitucional retirou a discricionariedade de o administrador público gastar os

recursos públicos angariados por estes tipos tributários de forma livre, estando vinculado a

uma despesa específica.

Estas duas modalidades são incompatíveis com o sistema de remuneração de um

serviço público, em especial o notarial e registral. São tributos não vinculados e de

arrecadação vinculada, ou seja, o fato gerador da obrigação tributária destes tributos não está

vinculado a nenhuma contraprestação estatal, porém os recursos arrecadados estão afetados a

uma despesa específica.

No primeiro caso, empréstimos compulsórios, os recursos arrecadados devem ser

gastos para atender a despesas extraordinárias decorrentes de calamidade pública, de guerra

externa ou de sua iminência que justificaram a sua cobrança. Os recursos arrecadados com a

taxa são destinados ao custeio das despesas que o fundamentaram, o que impede de o

empréstimo compulsório remunerar um serviço público, pois visam custear outras despesas.

A ―contrario sensu‖, o que justifica a cobrança do empréstimo compulsório é uma situação de

212

CARVALHO, Paulo de Barros. Parecer – Natureza jurídica e constitucionalidade dos valores exigidos a

título de remuneração dos serviços notariais e de registro. Disponível em:

<https://www.anoregsp.org.br/pdf/Parecer_PaulodeBarrosCarvalho.pdf>. Acesso em: 04 dez 2017, pág. 07.

Page 89: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

88

excepcionalidade e não a prestação de um serviço público. Então os emolumentos cartorários

não podem ser considerados empréstimos compulsórios, até mesmo porque o valor

arrecadado por este tributo deve ser devolvido ao seu contribuinte, o que também o

impossibilita de ser uma remuneração a um serviço prestado213

.

Já as contribuições especiais, são dividas em três espécies, cada uma com uma

finalidade: a) Contribuições Sociais, que são destinadas ao financiamento da seguridade social

(assistência social, previdência social e saúde); b) Contribuição de Intervenção no Domínio

Econômico – CIDE, que é destinada ao financiamento da atividade que interviu (qualquer

tributação é uma forma de intervenção no domínio econômico, portanto somente a afetação

destes recursos a uma determinada despesa – fomento da atividade tributada – justifica a sua

instituição, caso contrário seria outra forma tributária, um imposto – de acordo com os

adeptos à teoria penta partida dos tributos); c) Contribuições de interesse de categorias

profissionais ou econômicas, que possuem a finalidade de proporcionar a organização e o

financiamento destas entidades associativas.

Como vimos no CTN, a destinação dos recursos tributários são irrelevantes para a

determinação de sua natureza jurídica, portanto o empréstimo compulsório e as contribuições

sociais, apenas pelo fato de terem uma despesa pré-determinada, não seriam espécies

tributárias autônomas, esta é a crítica feita pela teoria tripartida dos tributos à teoria penta

partida.

De toda forma, seguindo o mandamento do CTN, essas contribuições não possuem

qualquer contraprestação estatal como fato gerador, são não vinculados, e, por outro lado, os

emolumentos exigem a prestação prévia de um serviço para serem devidos, portanto são

incompatíveis com as Contribuições especiais, pois o produto da arrecadação dos

emolumentos visa a custear os serviços prestados e o produto das contribuições visa a custear

as atividades fomentadas.

Os tributos de arrecadação não vinculada são aqueles que os recursos arrecadados

podem ser utilizados de forma livre tendo em vista não haver uma despesa pré-ordenada para

aquela receita, ou seja, o administrador tem discricionariedade para alocar os recursos de

acordo com o interesse público, porém deve respeitar a lei orçamentária em vigor para que

não aja em ilegalidade. São tributos de arrecadação não vinculada: impostos, taxas e

213

Código Tributário Nacional: Art. 15. Somente a União, nos seguintes casos excepcionais, pode instituir

empréstimos compulsórios: I - guerra externa, ou sua iminência; II - calamidade pública que exija auxílio federal

impossível de atender com os recursos orçamentários disponíveis; III - conjuntura que exija a absorção

temporária de poder aquisitivo. Parágrafo único. A lei fixará obrigatoriamente o prazo do empréstimo e as

condições de seu resgate, observando, no que for aplicável, o disposto nesta Lei.

Page 90: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

89

contribuição de melhoria. A vinculação da arrecadação diz respeito à forma como será gasto o

recurso público arrecadado. Já a vinculação do tributo, diz respeito à necessidade de uma

atuação prévia do Estado. Assim, tributo vinculado não é sinônimo de tributo com

arrecadação vinculada e vice-versa.

Os tributos não vinculados são aqueles em que o fato gerador não requer qualquer

atuação estatal, o sujeito passivo paga o tributo pelo simples fato de se enquadrar em uma

situação fática descrita na lei tributária, é a tipicidade tributária. Os tributos não vinculados a

uma contraprestação estatal prévia são os impostos.

O CTN define o imposto como: ―o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma

situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.‖214

.

Portanto o critério para identificarmos um imposto é de exclusão. Se não há qualquer

contraprestação por parte da administração pública, estamos diante de um imposto. Este é o

entendimento do professor Geraldo Ataliba: sob a perspectiva jurídica, é suficiente identificar

a materialidade da h. i. (hipótese de incidência) como consistente em um fato qualquer não

configurador de atuação estatal, para se reconhecer a natureza de imposto ao tributo

figurado215

. Os impostos são aqueles geralmente devidos pela simples manifestação de

riqueza pelo contribuinte ou pelo enquadramento em uma situação fática em que este se

encontre. Têm caráter eminentemente arrecadatório e o objetivo de custear a máquina estatal

como um todo. Confirma também este entendimento Hugo de Brito: A obrigação de pagar

imposto não se origina de qualquer atividade específica do Estado relativa ao contribuinte. O

fato gerador do dever jurídico de pagar imposto é uma situação da vida do contribuinte

relacionada ao seu patrimônio, independente do agir do Estado216

.

A classificação em tributos vinculados e não vinculados, foi proposta por Geraldo

Ataliba, que define os tributos vinculados como aqueles cujo aspecto material da h.i. (hipótese

de incidência) consiste numa atuação estatal217

, ou seja, são aqueles que nascem em

decorrência de uma contraprestação estatal. Deve haver uma ação do estado ou de seus

representantes para o surgimento do critério material da hipótese de incidência tributária. Esta

ação estatal deve ser prestada em benefício do contribuinte usuário do serviço, assim como o

seu pagamento destinado ao custei desta ação (referibilidade). Deve haver uma conexão entre

214

BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei 5.172, de 25 out. 1966, art. 16. 215

ATALIBA. 2011, p. 138. 216

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. – 35ª ed. revisada, atualizada e ampliada. – São

Paulo: Editora Malheiros, 2014, p. 302 e 303. 217

ATALIBA. Op. cit., p. 146.

Page 91: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

90

o aspecto material do tributo (atuação estatal) e o pessoal (o sujeito passivo tributário) para

que surja o crédito tributário. São exemplos: taxa e contribuição de melhoria.

A contribuição de melhoria, assim como a taxa, exige uma contrapartida estatal

anterior ao fato gerador. Esta contraprestação consiste na valorização imobiliária direita ou

indiretamente decorrente de obra pública. Frise-se que a obra pública não necessariamente

precisa ser feita pela administração estatal direta ou indireta, pode ser feita por um particular

em colaboração com a administração pública em regime de concessão, por exemplo, porém

este fato não retira do ente tributante a sua qualidade de sujeito ativo deste tributo.

A contribuição somente é devida após a conclusão ao menos parcial da obra pública

executada, portanto difere dos impostos. Os recursos provenientes tanto de contribuição de

melhoria quanto de impostos tomam o mesmo destino, os cofres públicos, e não possuem

qualquer destinação previamente estabelecida pelo legislador, portanto o administrador

público irá utilizá-los de acordo com a conveniência administrativa e previsão orcamentária.

A diferença entre estas duas modalidades reside em seus fatos geradores, que, como

vimos, é o critério válido para determinarmos a natureza jurídica de um tributo. Então a

contribuição de melhoria jamais poderia ter natureza jurídica de imposto, tendo em vista que o

seu fato gerador é a valorização imobiliária decorrente de uma obra pública, o que é uma ação

estatal. Já os impostos, como visto acima, tem como fato gerador uma situação determinada

por lei, que não seja uma atuação estatal. Então podemos afirmar que os impostos se

encontram em lado aposto às contribuições e às taxas, seus fatos geradores são excludentes.

Nós vimos que a contribuição de melhoria e as taxas possuem o mesmo fundamento,

pois correspondem à remuneração da administração pública por uma atuação estatal prévia ao

fato gerador, porém não se confundem. Os adeptos à teoria bipartida dos tributos não

diferenciam as contribuições de melhoria das taxas, pois entendem que têm a mesma natureza

jurídica, uma cobrança vinculada a uma contraprestação estatal prévia.

A primeira pressupõe uma atuação estatal específica, que é a conclusão de uma obra

pública somada à valorização imobiliária de um imóvel específico pelo contribuinte. Já a taxa

é devida em razão do exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou

potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua

disposição. Obra e serviço são prestações completamente distintas. Outra distinção é forma

como que a contraprestação beneficia o particular, pois o benefício auferido pela contribuição

de melhoria é de forma indireta, ou seja, a obra realizada não foi feita com o intuito de

valorizar o imóvel particular, porém foi uma consequência inevitável. Caso contrário, a obra

Page 92: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

91

seria ilegal, por ferir o princípio constitucional da impessoalidade e diversas disposições

constitucionais e legais, que não nos cabe analisar aqui, Roque Antônio Carrazza conclui:

―Esta atuação estatal – porque assim o exige o art. 145, III, da Constituição

da República – só pode consistir numa obra pública que causa valorização

imobiliária, isto é, que aumenta o valor de mercado dos imóveis localizados

em suas imediações. Já estamos percebendo, pois, que a contribuição de

melhoria, embora decorra de obra pública, depende, para nascer, de um fator

intermediário: a valorização do imóvel do contribuinte, em razão desta

atuação estatal. É por isso que é considerada um tributo indiretamente

vinculado a uma atuação estatal, que, no caso, é a obra pública.‖218

É importante frisarmos que a obra por si só não dá direito à administração pública de

instituir a contribuição de melhoria, tendo em vista que uma obra pública pode inclusive

desvalorizar um imóvel. Neste caso não será possível a cobrança de contribuição de melhoria,

pois a valorização imobiliária não ocorreu e, inclusive, o particular pode pleitear indenização

contra a administração pública, com fundamento na responsabilidade objetiva do estado,

disposta no artigo 37 da Constituição Federal.

2) TAXA x TARFIFA

Analisadas todas as outras espécies tributárias, a que nos restou foi a taxa. Por critério

de exclusão, os emolumentos só podem ter natureza jurídica de taxa ou de tarifa (preço

público). Analisaremos as características de ambas, para descobrirmos em qual delas os

emolumentos cartorários se encaixam. Paulo de Barros Carvalho define o preço público da

seguinte forma, bem como explica a diferença entra as terminologias tarifa e preço público:

―O preço público ou tarifa consiste na remuneração decorrente da prestação

de serviço de interesse público, ou do fornecimento ou locação de bens

públicos, efetivada em regime contratual e não imposta compulsoriamente às

pessoas, como é o caso das obrigações de caráter tributário. (...) O uso já

consagrou a equiparação dos termos ‗preço público‘ e ‗tarifa‘. Entretanto,

vale ressaltar que ‗tarifa‘, na tradição do Direito Financeiro, significa a

tabela de preços e não os preços em si.‖219

As características mais marcantes e mais relevantes para a política tarifária são a não

compulsoriedade e a natureza contratual. Como veremos, são os pontos chave para

diferenciarmos a tarifa da taxa. Por outro lado Paulo de Barros define as taxas como:

―A espécie tributária denominada ‗taxa‘ apresenta, em seu antecedente

normativo, a previsão conotativa de atividade de Estado diretamente

relacionada ao contribuinte, que somente pagará o valor exigido pelo Poder

Público quando deste receber ou tiver à disposição alguma prestação de

serviços públicos específicos e divisíveis, utilizados, efetiva ou

potencialmente, ou, ainda, se for exercido o poder de polícia, ficando certo

218

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 30. ed. – São Paulo: Malheiros,

2015, p. 654. 219

CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 4ª ed. – São Paulo: Noeses, 2011,

p. 410.

Page 93: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

92

que é imprescindível lei anterior prevendo determinada prática estatal como

condição suficiente e necessária à exigência do tributo.‖220

O regramento das taxas no CTN as divide em duas modalidades221

, como bem

explanado por Paulo de Barros: a) taxa decorrente de exercício do poder de polícia, ou seja,

fiscalizações relativas ao cumprimento de normas que dizem respeito à segurança, à higiene, à

ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades

econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade

pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos222

, porém esta não

é relevante para o nosso estudo, bem como não se confunde com a tarifa, tendo em vista que é

devida ante a uma atividade fiscalizatória do Poder Público e não a uma prestação de um

serviço, como é o caso dos serviços notariais e registrais; b) taxa decorrente de utilização,

efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou

posto a sua disposição.

O serviço público ensejador da taxa não é qualquer serviço público devendo ser um

serviço público específico e divisível. Caso o serviço prestado não tenha estas características,

deverá ser financiado pela recita de impostos e não por meio de taxa, tendo em vista que não

seria possível determinarmos o seu beneficiário e haveria uma impossibilidade fática de

vincularmos a taxa ao seu sujeito passivo.

O serviço específico é aquele que podemos determinar com certeza quem é o seu

beneficiário, então a sua hipótese de incidência consiste na descrição da atividade estatal

diretamente vinculada ao contribuinte usuário direto do serviço. É exatamente a referência ao

220

CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 2011, p. 786. 221

Código Tributário Nacional: Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou

pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder

de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte

ou posto à sua disposição. Parágrafo único. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que

correspondam a impôsto nem ser calculada em função do capital das empresas. Art. 78. Considera-se poder de

polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula

a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à segurança, à higiene, à ordem,

aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de

concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos

individuais ou coletivos. Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando

desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e,

tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder. Art. 79. Os serviços

públicos a que se refere o artigo 77 consideram-se: I - utilizados pelo contribuinte: a) efetivamente, quando por

ele usufruídos a qualquer título; b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua

disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento; II - específicos, quando possam ser

destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade, ou de necessidades públicas; III - divisíveis,

quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários. 222

PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário: completo. 6. ed. rev. atual. e ampl. – Porto Alegre:

Livraria do Advogado Editora, 2014, p. 388.

Page 94: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

93

particular que constitui a ―especificidade‖: um serviço público é específico quando há

individualização no oferecimento do serviço e na forma como é prestado223

.

Já a divisibilidade é a possibilidade de o serviço público ser mensurado

individualmente em relação ao seu usuário. O fato de se saber quais são os usuários de um

determinado serviço público e não conseguirmos auferir o quanto cada um se beneficia é

impeditivo ao sistema remuneratório de taxa, tendo em vista que seu valor deve ser calculado

de forma a cobrir os custos da atividade oferecida individualmente. Caso contrário, alguns

contribuintes se enriqueceriam sem causa à custa de outros.

A ―contrario sensu‖, alguns usuários dos serviços pagariam um valor excedente ao que

estariam se beneficiando para custear os serviços prestados a outros usuários e estariam

sofrendo uma sobretaxa. Estaria quebrada então a referibilidade entre a prestação estatal e

remuneração deste serviço, que, se observarmos com cautela, passaria a ser uma relação

tributária equivalente a dos impostos, pois aquela sobretaxa não teria lastro com qualquer

serviço público prestado.

Então o serviço que não é divisível ou específico não é passível de ser remunerado por

taxa. Esta vinculação entre o valor pago e a medida exata (ao menos em tese) do serviço

prestado é denominada de referibilidade e deve respeitar o princípio da proporcionalidade. É o

entendimento de Hely Lopes Meirelles:

―Serviços próprios do Estado (...). Mas, por força de norma constitucional ou

infraconstitucional, pode ser delegado ao particular, como, por exemplo, a

delegação dos serviços notariais e de registro prevista no art. 236 da CF/88.

Tais serviços, por sua essencialidade, geralmente são gratuitos ou de baixa

remuneração, para que fiquem ao alcance de todos os membros da

coletividade. Essa baixa remuneração deve merecer atenção do poder

responsável pela fixação de seu valor, objetivando não uniformizar valores

‗para realidades completamente distintas‘ e para a correlação do custo com o

volume, adequando-o ao princípio da proporcionalidade.‖224

A quebra desta referibilidade era a crítica feita pela doutrina à extinta taxa de

iluminação pública instituída pelos Municípios, pois a iluminação, apesar de ser possível

sabermos quem são os seus beneficiários, não é possível sabermos o quanto cada um se

beneficiou. Então os Municípios optaram por taxar os donos dos imóveis adjacentes à

iluminação pública, o que é uma anomalia jurídica, ante a estas características expostas. Paulo

de Barros Carvalho sintetiza com mestria:

―A ‗divisibilidade‘, por sua vez, significa possibilidade de mensurar o

serviço efetivamente prestado ou posto à disposição de cada contribuinte. É

223

CARVALHO, Paulo de Barros. Parecer – Natureza jurídica e constitucionalidade dos valores exigidos a

título de remuneração dos serviços notariais e de registro. Disponível em:

<https://www.anoregsp.org.br/pdf/Parecer_PaulodeBarrosCarvalho.pdf>. Acesso em: 04 dez 2017, pág. 14. 224

MEIRELLES. 2014, p. 390.

Page 95: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

94

elemento correlato à especificidade, pois o serviço mostra-se

individualizado, isso importará admitir que permitirá o cálculo de seu custo

relativamente a cada usuário, tornando viável a exigência da taxa. Outros,

contudo, preferem salientar o princípio da ‗retributividade‘, mediante a qual

o pagamento da taxa pelo sujeito passivo há de corresponder à retribuição

pecuniária pelo conhecimento do serviço público utilizada.‖225

Os serviços notariais e registrais preenchem claramente estes requisitos, tendo em

vista que é possível determinarmos com certeza quem são os seus beneficiários (sendo todos

aqueles usuários dos serviços notariais e registrais), bem como é possível auferirmos

exatamente quanto cada usuário se beneficiou dos serviços (pois cada ato possui uma

valoração econômica, de acordo com as tabelas dos emolumentos). Esse é entendimento de

Paulo de Barros Carvalho, vejamos:

―perante a realidade instituída pelo direito positivo atual, parece-me

indiscutível a tese segundo a qual a remuneração dos serviços notariais e de

registro, também denominada ‗emolumentos‘, apresenta natureza específica

de taxa. O presente tributo se caracteriza por apresentar, na hipótese da

norma, a descrição de um fato revelador de atividade estatal (prestação de

serviços notariais e de registros públicos), direta e especificamente dirigida

ao contribuinte‖226

Os emolumentos cartorários preenchem os requisitos e possuem natureza jurídica da

espécie tributária taxa, então podemos excluir todas as outras espécies tributárias para a

remuneração deste serviço. Ocorre que apenas estas duas características (especificidade e

divisibilidade), somadas à prestação de um serviço público, não são bastantes para

diferenciarmos a taxa do preço público, pois o fato gerador dos emolumentos são compatíveis

tanto com o sistema tributário das taxas quando com o sistema tarifário de preço público, no

que tange à especificidade e divisibilidade.

Como visto acima estas começam a se distanciar pela natureza de compulsoriedade e

de contratualidade (tarifa e taxa, respectivamente), é o que está disposto na Súmula 545 do

STF: ―Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente

daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização

orçamentária, em relação à lei que as instituiu.‖227

. Portanto a taxa é um sistema compulsório,

regido pelo Direito Tributário, em que o contribuinte não possui alternativa para obter o

resultado desejado, se não se utilizar dos serviços postos a sua disposição. Por outro lado, o

preço público não é compulsório e possui natureza contratual entre o usuário e o prestador do

serviço, tendo em vista que o usuário possui alternativas para obter o resultado desejado.

225

CARVALHO, Paulo de Barros. Parecer – Natureza jurídica e constitucionalidade dos valores exigidos a

título de remuneração dos serviços notariais e de registro. Disponível em:

<https://www.anoregsp.org.br/pdf/Parecer_PaulodeBarrosCarvalho.pdf>. Acesso em: 04 dez 2017, pág. 15. 226

Ibidem, pág. 18. 227

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 545.

Page 96: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

95

A facultatividade caracterizadora de tarifas ou de preços públicos é o regime jurídico à

qual a exação está sujeita, isto é, se se trata de serviço público primário e de prestação

obrigatória pelo Estado (ou exercício de poder de polícia, e.g., na forma de fiscalização),

trata-se de tributo228

. Os serviços notariais e registrais são funções típicas do Poder Público e

de prestação obrigatória, portanto atraem o sistema remuneratório tributário.

Estes serviços são de natureza compulsória aos seus usuários, tendo em vista que não

lhes é fornecida uma via alternativa para que se atinja o mesmo objetivo. Toda pessoa que

necessite daquele serviço (o registro de um imóvel, por exemplo) terá que se socorrer das

serventias extrajudiciais, qualquer outra via que o usuário escolha não terá validade jurídica

para aquele ato, pois é de natureza compulsória, ou seja, é uma imposição legal de utilização

daqueles serviços para que se atinja determinado resultado.

Poderia se argumentar que o serviço não é obrigatório, tendo em vista que as pessoas

não são obrigadas a adquirir imóvel, por exemplo, porém, esta obrigatoriedade não é imposta

à população em geral, mas apenas àquele que optou por comprar um imóvel. Caso contrário,

chegaríamos à conclusão de que nem mesmo os impostos são obrigatórios, pois, para uma

pessoa não ser tributada em Imposto de Renda - IR, basta não auferir renda, ou, para não ser

tributada em Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor – IPVA, bastaria não adquirir

veículos automotores sujeitos a este tipo de tributação, o que é uma impropriedade, tendo em

vista que estes impostos não deixam de ser obrigatórios àquelas pessoas que auferem renda ou

adquirem veículos.

A prestação de um serviço público remunerado pelo sistema tarifário deve ser apenas

uma das alternativas do usuário. Um bom exemplo é o sistema de pedágio rodoviário que, ao

menos em tese, só poderia ser implantando no caso de existência de uma rota alternativa

gratuita para os que desejarem não ser tarifados. Portanto o usuário teria a faculdade de se

utilizar da via conservada pelo concessionário (pagando preço público para tanto) ou de se

utilizar da via alternativa conservada pelo Poder Público de forma gratuita. Então atingiria o

seu objetivo e chegaria ao seu destino, mesmo que optasse por não ser tarifado. A doutrina faz

crítica severa e classifica os valores pagos aos pedágios que não possuem uma rota alternativa

em taxa, em vez de tarifa, tendo em vista que se transformariam em compulsórios.

228

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AI 531.529 AgR. Relator: Ministro Joaquim Barbosa, Brasília, 7 de

outubro de 2010. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=610669>. Acesso em: 04 dez 2017; e

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 181.475. Relator: Ministro Carlos Velloso, Brasília, 25 de junho de

1999. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=226079>. Acesso

em: 04 dez 2017.

Page 97: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

96

Outro exemplo é o sistema de transporte público remunerado pelo sistema tarifário. O

usuário tem a faculdade de se utilizar de tais serviços, bem como pode se utilizar de outros

meios para se locomover por aqueles itinerários, inclusive sem que precise pagar por isso.

As tarifas são fixadas de forma contratual entre o concessionário ou permissionário do

serviço público e o Poder Público. É o que dispõe a Lei nº 8.987: A tarifa do serviço público

concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras

de revisão previstas nesta Lei, no edital e no contrato229

. Portanto não possuem natureza

jurídica tributário, mas sim tarifária e contratual.

O sistema tarifário (concessões e permissões de serviço público) não possui as amarras

tributárias, portanto o prestador de um serviço público remunerado por este sistema não

necessita de uma lei para que haja alteração do valor de sua remuneração, muito menos está

sujeito aos princípios da anualidade e anterioridade tributárias. As disposições referentes aos

valores das tarifas são dispostas no edital licitatório anterior à concessão ou permissão dos

serviços públicos, inclusive já podendo prever mecanismo automáticos de reajustes tarifários.

As futuras alterações das tarifas são feitas pela via contratual entre o prestador do serviço

público e a Administração Pública.

O prestador de um serviço público pelo sistema tarifário pode obter ganhos de acordo

o sistema de mercado (concorrência mediante processo licitatório). Por outro lado, o prestador

de serviços pelo sistema tributário (taxa) está sujeito a um teto legal. Obviamente,

desconsiderando as anomalias que cada sistema pode ter, como fraudes em licitações, crimes

contra a administração pública, barganhas legislativas, apropriação da máquina pública,

public choice etc. Podemos perceber que o prestador de serviços públicos pelo regime

tarifário possui maior liberdade que o prestador de serviços públicos pelo regime de taxa, bem

como a variação de seus preços está sujeita às leis de mercado e não a um valor fixado por lei.

Paulo de Barros conclui que os emolumentos cartorários possuem natureza jurídica

tributária de taxa, tendo em vista que os serviços notariais e de registro, conquanto exercidos

por pessoas de direito privado, decorrem de delegação do Poder Público, sujeitando-se, por

conseguinte, ao regime de direito público. Ademais, tratando-se de prestação compulsória,

não está presente qualquer caráter contratual ou facultativo para seus usuários. Trata-se de

remuneração a serviço público específico e divisível por meio de ‗taxa‘230

.

229

BRASIL. Lei nº 8.987, de 13 de fev. de 1995. Artigo 9º. 230

CARVALHO, Paulo de Barros. Parecer – Natureza jurídica e constitucionalidade dos valores exigidos a

título de remuneração dos serviços notariais e de registro. Disponível em:

<https://www.anoregsp.org.br/pdf/Parecer_PaulodeBarrosCarvalho.pdf>. Acesso em: 04 dez 2017, pág. 21.

Page 98: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

97

Os serviços notariais e registrais são serviços públicos e o seu sistema remuneratório é

o de taxa (emolumentos), portanto como serviços públicos devem ser tratados. Os

emolumentos, como espécie tributária, estão sujeitos a todo o regramento do sistema

tributário constitucional, ou seja, são pautados pela estrita legalidade. Qualquer alteração dos

seus valores deve ser feita por lei ordinária estadual, tendo em vista se tratar de tributos

estaduais. Devem respeitar inclusive os princípios da anterioridade anual e nonagesimal.

Como visto a cima, a base de cálculo do tributo deve confirmar a hipótese de

incidência tributária para que se confirme a natureza jurídica do tributo, conforme

entendimento de Paulo de Barros Carvalho. O parágrafo único, do art. 1º, da Lei Federal nº

10.169/00, que regulamenta os emolumentos, estabelece que o valor fixado para os

emolumentos deverá corresponder ao efetivo custo e à adequada e suficiente remuneração dos

serviços prestados231

. Portanto a base de cálculo deste tributo deve ser apenas a suficiente para

atingir estes objetivos, o que sobrepujar terá natureza jurídica de imposto.

Pelas técnicas adotas pela lei que regulamenta os emolumentos, podemos perceber que

o intuito do legislador é apenas de atender aos custos dos serviços prestados e à justa

remuneração do delegatário dos serviços (notários e registradores). Evidência disto é a

proibição de cobrança de valores em percentual incidente sobre o valor do negócio jurídico

(inciso II, art. 3º, da mesma lei), portanto a base de cálculo confirma a hipótese de incidência

e a natureza jurídica de taxa. Não entraremos no mérito de como são feitos os cálculos para

chegar ao valor devido a título de emolumentos, pois não é o objetivo deste trabalho.

O valor da taxa está vinculado aos critérios legais, ou seja, deve ser apenas o

necessário para custear os serviços prestados e garantir uma adequada e suficiente

remuneração ao prestador, portanto, mesmo que de difícil quantificação, há um teto legal. Já o

sistema tarifário não encontra esta barreira, o valor da tarifa será aquele proposto pelo

vencedor do processo licitatório que resultou da concessão ou permissão, portanto pode, sem

qualquer barreira legal, exceder ao valor do custeio dos serviços e da suficiente remuneração

do prestador, desde que não encontre uma empresa concorrente que ofereça preços menores,

ou seja, regime de concessões e permissões é tipicamente um regime de livre mercado, sujeito

à livre concorrência.

Mais uma evidência da natureza jurídica tributária (taxa) dos emolumentos é a

necessidade de lei para a fixação dos seus valores, é o que dispõe o artigo segundo da referida

231

BRASIL. Lei nº 10.169, de 29 de dez. de 2000. Regula o § 2o do art. 236 da Constituição Federal,

mediante o estabelecimento de normas gerais para a fixação de emolumentos relativos aos atos praticados

pelos serviços notariais e de registro. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 30 dez.

2000. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L10169.htm>. Acesso em: 14 nov. 2017.

Page 99: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

98

lei: Para a fixação do valor dos emolumentos, a Lei dos Estados e do Distrito Federal levará

em conta a natureza pública e o caráter social dos serviços notariais e de registro, atendidas

ainda as seguintes regras232

. Exigência esta da política tributária. É o que dispõe a

Constituição Federal: Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte,

é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar

tributo sem lei que o estabeleça233

.

Não nos restam dúvidas então de que a natureza jurídica dos emolumentos cartorários

é tributária, de espécie taxa, tendo em vista as suas características de: a) especificidade; b)

divisibilidade; c) compulsoriedade de seus serviços; d) vinculo legal (tributária) entre sujeito

ativo e passivo; e) correlação entre a base de cálculo e a hipótese de incidência; e f) fixação de

valores por meio de lei. Definida a natureza jurídica dos emolumentos como sendo de taxa,

fica confirmada a tese inicial de que os serviços notariais e registrais são serviços públicos, de

acordo com o artigo 77 do Código Tributário Nacional.

3) IMUNIDADE DOS IMPOSTOS

A Constituição Federal veda expressamente incidência de impostos sobre os serviços

dos entes federados, vejamos: ―Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao

contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: VI -

instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros‖234

. Os serviços

notariais e registrais como serviços públicos de titularidade dos Estados membros e

remunerados pelo sistema tributário (taxa) deveriam se encaixar nesta regra e serem imunes à

incidência de impostos.

A jurisprudência vem entendendo, no entanto, de forma diferente em relação à

imunidade tributária. Apesar de reconhecer a natureza jurídica de taxa aos emolumentos, o

STF decidiu, equiparando os serviços notariais e registrais aos serviços prestados pelos

concessionários e permissionários de serviços públicos, por retirar a imunidade destes

serviços. Analisaremos então os seus argumentos. As conclusões a que a jurisprudência

chegou não são válidas, pois partiram de premissas falsas.

Apesar de ambos serem considerados serviços públicos, os serviços públicos notariais

e registrais não podem ser equiparados aos serviços públicos prestados por meio de

concessões ou permissões, tendo em vista que possuem sistemas remuneratórios distintos. O

critério adotado pelo legislador constitucional para retirar a imunidade dos serviços públicos é

232

BRASIL. Lei nº 10.169, de 29 de dez. de 2000. 233

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 234

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Page 100: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

99

o da natureza de sua remuneração, sendo excepcionados apenas aqueles serviços remunerados

por meio de preços ou tarifas pelos usuários: vejamos:

―§ 3º As vedações do inciso VI, "a", e do parágrafo anterior não se aplicam

ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de

atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos

privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas

pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar

imposto relativamente ao bem imóvel.‖235

Pela redação do dispositivo podemos ver que esta excepcionalidade é totalmente

incompatível com o sistema dos serviços notariais e registrais, pois são remunerados por meio

de tributo direto (taxa) e não por meio de tarifa (preço público). Portanto a vedação somente

se aplica ao regime de prestação de serviços públicos remunerados pela política tarifária.

O sistema tarifário permite ao concessionário planejar os seus preços de forma prévia

e incluir em sua proposta apresentada em procedimento licitatório os custos de toda a sua

cadeia produtiva, o que inclui o valor dos impostos incidentes por conta da vedação da

imunidade deste dispositivo. Portanto não traz nenhum prejuízo aos concessionários e

permissionários de serviços públicos, tendo em vista que todas as empresas concorrentes são

tributadas da mesma forma.

Já os serviços notariais e registrais não atuam com base no sistema de mercado, mas

sim por meio de pessoas físicas provadas em concurso público. Os notários e registradores

não possuem a faculdade de planejar os seus custos e adequar os seus preços, tendo em vista

que os valores dos emolumentos cartorários são fixados por meio de lei estadual, o que está

fora de suas alçadas. Portanto, a decisão do Supremo Tribunal Federal que negou tal

imunidade aos serviços notariais e registrais, além de inconstitucional (como veremos

adiante), causou um desequilíbrio econômico financeiros nestes serviços.

O §3º do artigo 150 da CF tratou de excluir a imunidade tributária recíproca dos entes

federados em três situações, sendo elas: a) exploração de atividade econômica; b) prestação

de serviços em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário; e c)

promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel. A

primeira hipótese já foi tratada neste trabalho e não possui relevância para esta pesquisa,

tendo em vista que os serviços públicos não são considerados atividades econômicas. A

ultima hipótese em verdade não se trata de uma exclusão, mas sim de uma interpretação,

tendo em vista que o promitente comprador de um imóvel do Estado não se confunde com

este e, portanto, não deve receber a referida imunidade tributária. Além do mais, os encargos

tributários das transações imobiliárias são de responsabilidade do comprador do imóvel.

235

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 150.

Page 101: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

100

Tendo em vista que, em regra, os serviços públicos são imunes aos impostos, o critério

adotado pelo legislador constitucional para a exclusão da imunidade foi o fato de possuírem

conteúdo econômico ou não (§3º do artigo 150 da CF). Este dispositivo definiu o que vem a

ser serviço público de conteúdo econômico negando-lhes a imunidade tributária recíproca.

Tanto é verdade que algumas empresas públicas remuneradas pelo sistema tarifário (Correios

e Infraero, por exemplo) precisaram de decisão do STF para que serem excluídas desta regra

do §3º e, então, poderem usufruir da imunidade dos impostos

Esta diferenciação é de extrema relevância, tendo em vista que o §3º do artigo 150 da

CF excluiu a aplicação da imunidade tributária recíproca aos serviços prestados pelos entes

federados em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário.

Portanto somente estes (remunerados pelo sistema tarifário – inciso III do artigo 175 da

CF/88) podem ser considerados como possuindo conteúdo econômico.

A exclusão da imunidade dos impostos dos serviços públicos somente se justifica para

aqueles serviços prestados de cunho econômico, que são os remunerados pelo sistema

tarifário, tendo em vista que estão inseridos no sistema de mercado. Por outro lado, tal

exclusão não se justifica para os serviços públicos remunerados pelo sistema tributário, tendo

em vista que não estão inseridos no sistema de mercado. É o entendimento de Floriano de

Azevedo Marques Neto:

―[A] Constituição se refere às duas acepções de serviço público. No art. 145,

II, parece-me que o termo ―serviços públicos‖ passíveis de suportar a

instituição de taxas trata-se de seu sentido amplo e impróprio, esvaziado dos

serviços públicos estritos (v.g., aqueles passíveis de exploração econômica).

Já no art. 175, dentro pois do Capítulo da Ordem Econômica, o constituinte

lançou mão do termo no sentido restrito (ou sentido próprio), prevendo a

prestação de serviços públicos passíveis de exploração pela iniciativa

privada, mediante delegação específica. Só assim se justifica a previsão, no

inciso III do Parágrafo único deste art. 175, de que a Lei estabelecerá a

―política tarifária‖. Dito doutro modo, os serviços públicos referidos na

ordem tributária são aqueles desprovidos de natureza econômica (porquanto

sinônimos de atuação estatal, impassível de delegação), remuneráveis pela

espécie tributária taxa. Já os serviços públicos referidos na Ordem

Econômica são aqueles passíveis de exploração econômica (ou seja, espécie

do gênero atividade econômica), cuja exploração pode ser trespassada à

iniciativa privada e cuja remuneração não poderia ter natureza tributária,

sendo remunerados por tarifa (espécie do gênero preço público).‖236

Com isso, apenas os serviços públicos concedidos e permitidos (art. 175 da CF) estão

inseridos na ordem econômica constitucional (artigos 170 ao 192 da CF) e possuem conteúdo

econômico. O simples fato de um serviço ser delegado pelo Poder Público não lhe confere de

236

MARQUES NETO, Floriano Peixoto de Azevedo. A Nova Regulamentação dos Serviços Públicos, Revista

Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, nº. 1, janeiro,

2004. Disponível na Internet: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 30 de novembro de 2017, p. 7.

Page 102: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

101

forma automática conteúdo econômico. Os serviços notariais e registrais são serviços públicos

propriamente ditos e não possuem esta característica, tendo em vista que são remunerados por

taxas (sistema tributário) e, como qualquer tributo, tem o objetivo de angariar recursos para

atender os interesses públicos e não de fomentar a atividade econômica. Caso a remuneração

por meio de taxa tivesse tal característica, todos os serviços prestados diretamente pelo

Estado, remunerados por taxa, teriam conteúdo econômico também, o que não é verdade.

As diferenças entre os serviços públicos concedidos e permitidos (art. 175 da CF) e os

serviços públicos notariais e registrais (artigo 236 da CF) foram amplamente debatidas neste

trabalho e podem ser sintetizadas da seguinte forma:

QUADRO RESUMITIVO E COMPARATIVO

CONCESSÕES E

PERMISSÕES DE

SERVIÇOS PÚBLICOS

SERVIÇOS PÚBLICOS

NOTARIAIS E REGISTRAIS

A) Agentes

Particulares em colaboração com

o poder público – pessoas físicas

ou jurídicas

Particulares em colaboração com

o poder público – pessoas físicas

(não são servidores públicos)

B) Responsabilidade Civil e criminal Civil e criminal

C) Modalidade da

responsabilidade civil Objetiva Subjetiva

D) Fiscalização e

sanção Poder concedente Poder Judiciário

E) Remuneração Preço público (tarifa) Tributo (taxa)

F) Ingresso Licitação (concorrência) Concurso Público

G) Natureza Jurídica Função pública Função pública

H) Prazo para abrir

processo seletivo Discricionário Seis meses da ultima vaga

I) Ato de delegação Contrato administrativo Delegação pelo Presidente do TJ

local

J) Vínculo Contratual (ou misto – contratual

e regulatório) Estatutário (legal)

K) Transferibilidade Somente se houver autorização Intransferível

L) Duração Prazo do contrato (respeitados o

critérios legais)

Vitalício, não sujeito à

aposentadoria compulsória

Page 103: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

102

M) Revogabilidade Por interesse público, mediante

indenização, se cabível Irrevogável

N) Transferência pelo

Poder Público

Apenas do exercício e não da

titularidade

Apenas do exercício e não da

titularidade

O) Titularidade

Ente federado titular do serviço

(União, Estados, DF e

Municípios)

Estados membros

P) Regramento

constitucional Art. 175 (Ordem econômica) Art. 236 (Disposições gerais)

Q) Regramento infra

constitucional

Direito Público (Leis nº

8.987/95, nº 8.666/93, Dec.-Lei

nº 200/67 etc.)

Direito Público (Leis nº 6.015/73,

nº 8.935/95, nº 10.169/00 etc.)

R) Posicionamento na

Adm. Pública

Atividade típica prestada de

forma descentralizada

Atividade típica prestada de forma

descentralizada

S) Alteração

unilateral pela

Administração

Possível, desde que respeitado o

equilíbrio econômico financeiro Impossível

T) Formas de

extinção

Término do prazo contratual,

encampação, caducidade,

rescisão, anulação, falência ou

extinção da empresa etc.

Morte, aposentadoria facultativa,

invalidez, renúncia, perda – por

sentença judicial ou processo

administrativo –, descumprimento

de gratuidade legal

U) Arbitragem Possível Impossível

V) Falência Possível Impossível (insolvência civil)

X) Natureza da

atividade

Não econômica, mas de

conteúdo econômico

Não econômica e de conteúdo não

econômico

Z) Imunidade dos

impostos Não (§3º art. 150 da CF) Não (decisão do STF)

ZA) Classificação

(Direito Financeiro) Receita originária Receita derivada

É importante observarmos que as leis que regulamentam as duas categorias: serviços

notariais e registrais (Lei federal nº 8.935/94) e serviços concedidos e permitidos (Lei federal

nº 8.987/95) tiveram um lapso temporal de menos de três meses. A simples leitura dos

Page 104: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

103

primeiros artigos das duas legislações já é o suficiente para atestarmos que se tratam de

situações diferente. Se estas duas categorias são tão semelhantes a ponto de serem

equiparadas (posicionamento do STF) e foram regulamentadas quase que simultaneamente

pelo Poder Legislativo Federal, porque então não foram regulamentadas sob o mesmo

diploma normativo?

Tendo em vista que todas estas características são incompatíveis, os serviços notariais

e registrais não podem ser equiparados aos serviços públicos concedidos e permitidos, nos

termos do artigo 175 da Constituição para fins de vedação à imunidade dos impostos

incidentes sobre suas atividades. Portanto os regramentos que são inerentes a estes serviços

não podem ser imputados àqueles. Qualquer decisão em sentido contrário deixará de ser uma

decisão técnica para se tornar uma decisão política por mera vontade do julgador por achar

que era a decisão mais conveniente para a sociedade.

Faremos agora uma análise das principais jurisprudências do Supremo Tribunal

Federal a fim de que possamos confrontá-las com todo o trabalho acadêmico aqui produzido

em relação aos serviços notariais e registrais, seus prestadores, os notários e registradores, e

sua remuneração, os emolumentos. Com a finalidade de fazermos uma conclusão a respeito

do tema.

Page 105: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

104

CAPÍTULO IV: ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA DO STF

Vistas todas as características dos serviços notariais e registrais e dos notários e

registradores, vamos analisar os principais julgados do Supremo Tribunal Federal a respeito

do tema para confirmarmos o trabalho acadêmico produzido e confrontarmos as divergências

encontradas. O julgado proferido na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.415 sintetiza e

confirma a maior parte das características dos serviços notariais e registrais apresentadas neste

trabalho, vejamos:

―Regime jurídico dos servidores notariais e de registro. Trata-se de

atividades jurídicas que são próprias do Estado, porém exercidas por

particulares mediante delegação. Exercidas ou traspassadas, mas não por

conduto da concessão ou da permissão, normadas pelo caput do art. 175 da

Constituição como instrumentos contratuais de privatização do exercício

dessa atividade material (não jurídica) em que se constituem os serviços

públicos. A delegação que lhes timbra a funcionalidade não se traduz, por

nenhuma forma, em cláusulas contratuais. A sua delegação somente pode

recair sobre pessoa natural, e não sobre uma empresa ou pessoa mercantil,

visto que de empresa ou pessoa mercantil é que versa a Magna Carta Federal

em tema de concessão ou permissão de serviço público. Para se tornar

delegatária do Poder Público, tal pessoa natural há de ganhar habilitação em

concurso público de provas e títulos, e não por adjudicação em processo

licitatório, regrado, este, pela Constituição como antecedente necessário do

contrato de concessão ou de permissão para o desempenho de serviço

público. Cuida-se ainda de atividades estatais cujo exercício privado jaz sob

a exclusiva fiscalização do Poder Judiciário, e não sob órgão ou entidade do

Poder Executivo, sabido que por órgão ou entidade do Poder Executivo é

que se dá a imediata fiscalização das empresas concessionárias ou

permissionárias de serviços públicos. Por órgãos do Poder Judiciário é que

se marca a presença do Estado para conferir certeza e liquidez jurídica às

relações inter-partes, com esta conhecida diferença: o modo usual de atuação

do Poder Judiciário se dá sob o signo da contenciosidade, enquanto o

invariável modo de atuação das serventias extraforenses não adentra essa

delicada esfera da litigiosidade entre sujeitos de direito. Enfim, as atividades

notariais e de registro não se inscrevem no âmbito das remuneráveis por

tarifa ou preço público, mas no círculo das que se pautam por uma tabela de

emolumentos, jungidos estes a normas gerais que se editam por lei

necessariamente federal. (...) As serventias extrajudiciais se compõem de um

feixe de competências públicas, embora exercidas em regime de delegação a

pessoa privada. Competências que fazem de tais serventias uma instância de

formalização de atos de criação, preservação, modificação, transformação e

extinção de direitos e obrigações. Se esse feixe de competências públicas

investe as serventias extrajudiciais em parcela do poder estatal idônea à

colocação de terceiros numa condição de servil acatamento, a modificação

dessas competências estatais (criação, extinção, acumulação e

desacumulação de unidades) somente é de ser realizada por meio de lei em

sentido formal, segundo a regra de que ninguém será obrigado a fazer ou

deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.‖237

237

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.415. Relator: Ministro Ayres

Britto, Brasília, 9 de fevereiro de 2012. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=1718027>. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.140. Relator: Ministro Ellen

Page 106: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

105

Como podemos ver, assim como a doutrina majoritária, esta corte entende que os

notários e registradores são agentes públicos, particulares em colaboração com o Poder

Público, delegatários das funções públicas notariais e registrais. Funções estas que somente

podem ser exercidas por pessoas físicas (naturais) em caráter pessoal e privado, mediante

aprovação prévia em concurso público de provas e títulos. Portanto todas aquelas

características apresentadas nas alíneas: ―A‖, ―F‖, ―G‖ e ―J‖ do quadro resumitivo

apresentado estão confirmadas.

Quanto aos serviços notariais e registrais propriamente ditos, o Tribunal os define

como sendo atividades jurídicas de titularidade do Poder Público (atividades típicas do

Estado), que não se confundem com as funções típicas do Poder Judiciário, tendo em vista

que estas possuem o objetivo de conferir certeza e liquidez às relações jurídicas em que já está

instaurado o contencioso. Por outro lado, as serventias extrajudiciais possuem um feixe de

competências públicas que possui o objetivo de formalização de atos de criação, preservação,

modificação, transformação e extinção de direitos e obrigações.

Portanto a atuação das serventias extrajudiciais é predominantemente preventiva e não

litigiosa enquanto a atuação do Poder Judiciário é predominantemente repressiva e litigiosa.

Complementa que a titularidade destas funções é do Poder Público e que somente o seu

exercício que é delegado ou trespassado aos delegatários (notários e registradores), sob

fiscalização exclusiva do Poder Judiciário. O que confirma os conceitos apresentados nas

alíneas: ―D‖, ―I‖, ―N‖ e ―R‖ do mesmo quadro.

Quanto ao sistema remuneratório, confirma também que estes serviços são

remunerados pelos regramentos do Direito Tributário por meio da modalidade tributária

―Taxa‖. O que é regulamentado em suas normas gerais por lei federal, portanto os valores dos

emolumentos são fixados por lei estadual (tabela de emolumentos), tendo em vista que a

titularidades destes serviços pertence aos Estados Membros. Há que se ressaltar que, se cabe à

União estabelecer apenas as normas gerais em relação aos emolumentos, estes tributos não

são de sua titularidade. Conforme os critérios residuais já estudados neste trabalho, os

emolumentos são de competência dos Estados Membros.

Além do mais, afirma que as funções notariais e registrais constituem parcela do poder

público estatal que possuem força cogente para os administrados e confirma a sua natureza de

serviço público compulsório que justifica a adoção do sistema tributário (taxa), nos termos da

súmula 545 do mesmo Tribunal. Confirma ainda o regramento de Direito Público, ao

Gracie, Brasília, 20 de setembro de 2009. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=627638>. Acesso em: 04 dez 2017.

Page 107: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

106

estabelecer que estão sujeitos ao princípio da legalidade e que a modificação de suas

competências (criação, extinção, acumulação e desacumulação de unidades) só pode ser feita

por lei em sentido formal. O que já foi apresentado nas alíneas: ―E‖, ―O‖, ―Q‖.

O julgado apresenta características de ordem negativa ao comparar os serviços

notariais e registrais aos serviços públicos concedidos e permitidos nos termos do artigo 175

da Constituição Federal. Reconhece que estas concessões e permissões são instrumentos

contratuais de privatização de atribuições materiais do Poder Público (atividades não

jurídicas), portanto inconfundíveis com as atividades cartorárias (atividades jurídicas).

Entendendo que, de nenhuma forma, pode se atribuir a natureza contratual das concessões e

permissões de serviços públicos à delegação dos serviços notariais e registrais.

Frisa que as concessões e permissões são instrumentos destinados a empresas ou

pessoas mercantis vencedoras de processo administrativo licitatório que recebem a

adjudicação do serviço público. O que é incompatível com a delegação dos serviços notariais

e registrais, tendo em vista que é feita apenas a pessoas naturais vencedoras em concurso

público de provas e títulos. Ressalta que a fiscalização dos serviços públicos concedidos e

permitidos é feita pelo Poder Executivo, diferente do que acontece com os serviços notariais e

registrais que são fiscalizados de forma exclusiva pelo Poder Judiciário. Estabelece por ultimo

que os serviços concedidos e permitidos são remunerados por tarifa ou preço público, ao

contrário dos serviços notariais e registrais que são remunerados por taxa.

Assim os entendimentos das alíneas: ―K‖, ―L‖, ―M‖, ―P‖, ―S‖, ―T‖, ―U‖ e ―V‖ também

são confirmados, tendo em vista que são matérias aplicáveis apenas aos serviços públicos

concedidos e permitidos (art. 175 da CF) e às pessoas jurídicas de direito privado e não aos

serviços notariais e registrais (art. 236) e às pessoas naturais (físicas). Há que se ressaltar que

tais entendimentos foram proferidos em sede de Ação Direita de Inconstitucionalidade,

portanto possuem efeitos vinculantes inclusive para os demais órgãos do Poder Judiciário238

.

Os notários e registradores não são titulares de cargos públicos, portanto não estão

sujeitos à aposentadoria compulsória prevista constitucionalmente. Estes contribuem para o

Regime Geral de Previdência Social na qualidade de contribuintes individuais, o que

demonstra que não possuem qualquer vínculo empregatício, é neste sentido a decisão do STF

na ADI 575:

238

Lei nº 9.868/99, artigo 28, Parágrafo único. A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade,

inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de

texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração

Pública federal, estadual e municipal.

Page 108: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

107

―Tabeliães e oficiais de registros públicos: aposentadoria:

inconstitucionalidade da norma da Constituição local que, além de conceder-

lhes aposentadoria de servidor público, que – para esse efeito não são –

vincula os respectivos proventos às alterações dos vencimentos da

magistratura: precedente (ADI 139, RTJ 138/14).‖239

As hipóteses de extinção da delegação dos serviços notariais e registrais estão

previstas de forma taxativa no artigo 39 da Lei nº 8.935/94. Estes profissionais exercem tão

somente funções públicas na condição de delegatários e não cargos públicos. A aposentadoria

compulsória é uma característica própria dos cargos públicos, que exigem um vínculo

estritamente pessoal, portanto se optou por afastar compulsoriamente os servidores públicos

de suas atividades, quando atingem certa idade (70 ou 75 anos, a depender do caso), tendo em

vista a presunção de que não estão mais aptos ao trabalho.

Os notários e registradores, por outro lado, apesar de também possuírem um vínculo

de caráter pessoal com o Poder Público, exercem as suas funções com o apoio de auxiliares e

substitutos. Esta presunção de inaptidão ao trabalho não se aplica a estes profissionais, tendo

em vista que não possuem vínculo empregatício. Apenas a incapacidade de fato (invalidez) é

capaz de lhes afastar das atividades. Isso não que dizer que não tenham direito de se

aposentar. Podem sim requerer a aposentadoria, tendo em vista que contribuem para o RGPS,

porém é facultativa e limitada ao teto remuneratório daquele sistema.

A responsabilidade civil dos notários e registradores, até maio de 2016, pelas

atividades notariais e registrais prestadas era de ordem objetiva, porém recente alteração da

Lei nº 8.935/94 mudou tal responsabilidade para subjetiva. Em sede de Recurso

Extraordinário em Agravo Regimental o STF reconheceu a responsabilidade civil objetiva do

Estado, assegurado o direito de regresso, em caso de dolo ou culpa, pelos atos dos notários e

registradores delegatários do Poder Público:

―Tabelião. Titulares de Ofício de Justiça. Responsabilidade civil.

Responsabilidade do Estado. CF, art. 37, § 6º. Natureza estatal das atividades

exercidas pelos serventuários titulares de cartórios e registros extrajudiciais,

exercidas em caráter privado, por delegação do Poder Público.

Responsabilidade objetiva do Estado pelos danos praticados a terceiros por

239

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 575. Relator: Ministro

Sepúlveda Pertence, Brasília, 25 de junho de 1999. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266423>. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AI 668.533 AgR. Relator: Ministro Cármen Lúcia, Brasília, 23 de

novembro de 2011. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=629820>. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 565.936 AgR. Relator: Ministro Ellen Gracie, Brasília, 29 de

novembro de 2010. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=617246>. Acesso em: 04 dez 2017.

Page 109: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

108

esses servidores no exercício de tais funções, assegurado o direito de

regresso contra o notário, nos casos de dolo ou culpa.‖240

Apesar de ser um julgado anterior à referida alteração legislativa, quando vigia a

responsabilidade civil objetiva também para estes profissionais, já determinava esta

responsabilidade do Estado, com fundamento no art. 37 §6º da CF, de forma direta e objetiva

e a responsabilização dos notários e registradores de forma direta e subjetiva ou de forma

regressiva, apenas no caso de comprovação de dolo ou culpa, tendo em vista que cabe ao

Estado assumir os riscos da atividade administrativa só podendo imputá-la aos seus agentes

que tenham agido com dolo ou culpa. O que confirma as alíneas ―B‖ e ―C‖ do nosso estudo.

Quanto ao requisito da aprovação em concurso público para ingresso nas atividades

notariais e registrais, foi proferido o seguinte julgamento reconhecendo que, após a

promulgação da Constituição Federal de 1988, somente é admitido o ingresso nestas

atividades de forma definitiva mediante preenchimento deste requisito:

―Cartório de notas. Depende da realização de concurso público de provas e

títulos a investidura na titularidade de Serventia cuja vaga tenha ocorrido

após a promulgação da Constituição de 1988 (art. 236, § 3º) não se

configurando direito adquirido ao provimento, por parte de quem haja

preenchido, como substituto, o tempo de serviço contemplado no art. 208,

acrescentado, à Carta de 1967, pela Emenda 22, de 1982.‖241

Confirma também o entendimento já apresentado em outro julgado colacionado a cima

de que aqueles oficiais que adentraram na atividade sem aprovação prévia em concurso

público e que não foram investidos de forma definitiva nas atividades antes da promulgação

da Carta de 1988, nos termos do artigo 208 da Constituição de 1969 (5 anos de exercício),

devem ser destituídos destas funções para que sejam providas mediante concurso público.

Quanto à titularidade destes serviços o STF, na ADI 865 MC, confirma que são da

competência dos Estados Membros e reconhece a competência legislava suplementar a estes

240

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 209.354 AgR. Relator: Ministro Carlos Velloso, Brasília, 16 de

abril de 1999. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=331007>.

Acesso em: 04 dez 2017; BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 518.894 AgR. Relator: Ministro Ayres

Britto, Brasília, 23 de setembro de 2011. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=627852>. Acesso em: 04 dez 2017. 241

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 417. Relator: Ministro Maurício

Corrêa, Brasília, 8 de maio de 1998. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266346 >. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AI 541.408 AgR. Relator: Ministro Ricardo Lewandowski, Brasília, 14 de

agosto de 2009. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=600815>. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AI 829.502 AgR. Relator: Ministro Gilmar Mendes, Brasília, 24 de

setembro de 2012. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=629820>. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 182.641. Relator: Ministro Octavio Gallotti, Brasília, 15 de MARÇO

de 1996. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=22682 >.

Acesso em: 04 dez 2017.

Page 110: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

109

entes federados para que tratem de normas gerais em caso de omissão do Legislativo Federal,

como forma de garantir a continuidade de seus serviços:

―A ausência da lei nacional reclamada pelo art. 236 da Constituição não

impede o Estado-membro, sob pena da paralisação dos seus serviços

notariais e registrais, de dispor sobre a execução dessas atividades, que se

inserem, por sua natureza mesma, na esfera de competência autônoma dessa

unidade federada. A criação, o provimento e a instalação das serventias

extrajudiciais pelos Estados-membros não implicam usurpação da matéria

reservada à lei nacional pelo art. 236 da CF.‖242

A fiscalização destes serviços também foi tratada por esta corte, confirmado a sua

natureza jurídica de serviços públicos e reconhecendo o poder de fiscalização e de controle da

atividade ao Poder Judiciário de forma ampla e exclusiva, apesar de reconhecer que não era

essa a intenção inicial do legislador, tendo em vista no projeto inicial da Lei 8.935/94 e em

outros projetos de lei se buscou dar o máximo de autonomia a estes serviços e seus

profissionais, propondo inclusive que apenas os atos notariais e registrais seriam fiscalizados

por este poder e não os serviços como um todo:

―Transformação constitucional do sistema, no que concerne à execução dos

serviços públicos notariais e de registro, não alcançou a extensão

inicialmente pretendida, mantendo-se, em consequência, o Poder Judiciário

no controle do sistema. A execução, modo privato, de serviço público, não

lhe retira essa conotação específica. Não há de se ter como ofendido o art.

236 da Lei Maior, que se compõe também de parágrafos a integrarem o

conjunto das normas notariais e de registro, estando consignada no § 1º, in

fine, do art. 236, a fiscalização pelo Poder Judiciário dos atos dos notários e

titulares de registro.‖243

Outra proposta que chegou a se cogitar foi a criação de conselhos federais e regionais,

similarmente ao que acontece com a advocacia a Ordem dos Advogados do Brasil, para a

fiscalização e controle de seus atos, sendo que apenas os atos notariais e registrais

propriamente ditos que ficariam sujeitos ao controle pelo Poder Judiciário. Porém esta

proposta foi rejeitada pelo Legislativo Federal.

A Lei nº 8.935/94 prevê expressamente a competência do Poder Judiciário para: a)

realização dos concursos públicos de ingresso e remoção nas atividades notariais e registrais;

b) a fiscalização dos atos notariais e registrais; e c) declaração de vacância destes serviços.

Apesar do entendimento apresentado por Walter Ceneviva de que estes serviços deveriam ser

delegados pelo Poder Público, representado por seu Poder Executivo (tendo em vista que a

titularidade não foi atribuída a nenhum poder específico, então caberia ao poder que possui a

242

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 865 MC. Relator: Ministro

Celso de Mello, Brasília, 8 de abril de 1994. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=346655>. Acesso em: 04 dez 2017. 243

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 255.124. Relator: Ministro Néri da Silveira, Brasília, 08 de

novembro de 2002. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=258438>. Acesso em: 04 dez 2017.

Page 111: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

110

função típica de administração a máquina pública delegar tais funções), o STF entendeu que

esta atribuição (delegação das funções) compete ao Poder Judiciário local, como uma

consequência lógica das atribuições que lhe são conferidas, em decorrência do princípio da

paridade das formas:

―A mens legislatoris dos arts. 14, 15 e 39, § 2º, da Lei federal 8.935/1994

(Lei dos Cartórios) aponta que a autoridade competente para proceder à

declaração de vacância é a autoridade judicial, mais especificamente o

presidente do TJ da respectiva unidade da Federação. Isso porque, ante a

ausência de menção expressa e tendo o legislador ordinário federal

condicionado a delegação para os exercícios das atividades notariais à prévia

aprovação em concurso público de provas e títulos realizado pelo Poder

Judiciário (arts. 14 e 15), é de se supor que a declaração de vacância dessa

serventia incumbe ao próprio Poder Judiciário. A inteligência do art. 22,

XXV, da Carta Magna, que atribui à União competência privativa para

legislar sobre registros públicos, indica, inexoravelmente, que a competência

para regular e disciplinar a autoridade competente para declarar a situação de

vacância das serventias extrajudiciais recai sobre a União. Consectariamente,

ao expedir a Lei dos Cartórios – Lei 8.935/1994 –, a União exerceu sua

competência para conferir ao chefe do Poder Judiciário o poder para declarar

vaga a serventia. Tal conclusão impõe o afastamento específico do que

dispõe a LC catarinense 183/1999, pois a previsão de competência adstrita

ao chefe do Executivo usurpa as determinações constitucionais inerentes.‖244

Este princípio dispõe que os atos públicos têm que adotar a mesma forma para que

sejam feitos e desfeitos. Uma matéria tratada por lei, por exemplo, só poderia ser desfeita por

outra lei. Assim, se a vacância dos serviços notariais e registrais compete ao Poder Judiciário,

o seu provimento deve ser feito pelo mesmo Poder. Tal entendimento é ratificado pelas

Resoluções nº 80 e 81 do CNJ que determina que: a) a autoridade competente para a

expedição do ato que delega tais serviços é o Presidente do Tribunal de Justiça local; e b) o

Poder Público competente para a declaração da vacância dos serviços notariais e registrais é o

Poder Judiciário.

Quanto ao regramento das serventias extrajudiciais, o Tribunal entendeu, na ADI

2.129, que é de Direito Público, sendo que nas atividades notariais há serviços exercidos por

delegação do Poder Público, serviços fiscalizados nos termos do § 1º do art. 236 da

Constituição, não havendo "direito, interesse, ou liberdade", porém atividade pública, função

pública, dever245

. Portanto não há discricionariedade ou liberdade para os notários e

244

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 336.739. Relator: Ministro Luiz Fux, Brasília, 15 de outubro de

2014. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=6954961>. Acesso

em: 04 dez 2017. 245

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.059. Relator: Ministro Eros

Grau, Brasília, 9 de junho de 2006. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=375317>. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.129. Relator: Ministro Eros

Grau, Brasília, 16 de junho de 2006. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=375339>. Acesso em: 04 dez 2017.

Page 112: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

111

registradores no exercício de suas funções notariais e registrais, devendo desempenhá-las nos

estritos termos legais. As atividades notariais e registrais são funções públicas, sendo pautadas

pelo interesse público e não pelo interesse de seus delegatários. Tal julgado se deu na referida

ação que julgava a constitucionalidade de lei local que destinava porcentagem dos

emolumentos ao Fundo Especial para Instalação, Desenvolvimento e o Aperfeiçoamento das

Atividades dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Estado de Mato Grosso do Sul.

Em relação à natureza jurídica dos emolumentos cartorários, os entendimentos, tanto

da doutrina quanto do STF, são concordes em reconhecê-los com sendo tributo na modalidade

taxa. O julgamento da ADI 1.790 é clara neste sentido: A idoneidade em tese da disciplina de

matéria tributária em medida provisória é firme na jurisprudência do Tribunal, de que decorre

a validade de sua utilização para editar norma geral sobre fixação de emolumentos cartorários,

que são taxas246

. Os emolumentos, como espécie tributária, estão sujeitos a todo o regramento

pertinente:

―A jurisprudência do STF firmou orientação no sentido de que as custas

judiciais e os emolumentos concernentes aos serviços notariais e registrais

possuem natureza tributária, qualificando-se como taxas remuneratórias de

serviços públicos, sujeitando-se, em consequência, quer no que concerne à

sua instituição e majoração, quer no que se refere à sua exigibilidade, ao

regime jurídico-constitucional pertinente a essa especial modalidade de

tributo vinculado, notadamente aos princípios fundamentais que proclamam,

dentre outras, as garantias essenciais (a) da reserva de competência

impositiva, (b) da legalidade, (c) da isonomia e (d) da anterioridade.‖247

Portanto os notários e registradores não possuem qualquer tipo de gerência em relação

aos emolumentos cartorários, tendo em vista que se tratam de tributos e que qualquer

modificação deve ser feita por meio de lei, o que é de competência do Poder Legislativo

Estadual e não deste profissionais. O desrespeito a qualquer preceito em relação aos

emolumentos constitui infração ao dever funcional, podendo inclusive ser considerado crime

em alguns casos, como excesso de exação (§1º do artigo 316 do Código Penal), no caso de

cobrança de valores a maiores.

246

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.790 MC. Relator: Ministro

Sepúlveda Pertence, Brasília, 8 de setembro de 2000. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=347269>. Acesso em: 04 dez 2017. 247

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.378 MC. Relator: Ministro

Celso de Mello, Brasília, 30 de maio de 1997. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=347013 >. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.826. Relator: Ministro Eros

Grau, Brasília, 20 de agosto de 2010. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=613539>. Acesso em: 04 dez 2017.

Page 113: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

112

De acordo com a súmula 545 do STF248

, colacionada a cima, o critério diferenciador

entre as taxas e os preços públicos é a compulsoriedade ou não da exação que é feita. Sendo

que as primeiras constituem um vínculo legal e obrigatório entre os contribuintes e os

segundos constituem um vínculo contratual e facultativo entre os usuários do serviço e seu

prestador. As taxas constituem uma obrigação legal imposta ao contribuinte, que não possui

alternativa para a obtenção daquele bem da vida almejado. Já o preço público constitui uma

obrigação contratual aderida pelo usuário do serviço, que possui outra forma de obter o

resultado daquele serviço que lhe é prestado. O voto vencedor do Ministro Ricardo

Lewandowski no RE 576189/RS compartilha deste mesmo entendimento afirmando que:

―se a alguém é dado optar por certo comportamento dentre vários outros

igualmente possíveis, e estando um ou mais deles liberados do pagamento de

determinada obrigação pecuniária, a submissão ao ônus passa a ter caráter

voluntário, o que não se coaduna com o conceito de tributo. Se, por outro

lado, todos os meios legítimos de realização desse mesmo comportamento

levarem ao pagamento compulsório da obrigação, o ônus, por não dependes

da vontade do responsável, apresentará inequívoca natureza tributária.‖249

Portanto, a diferenciação está na forma que a obrigação nasce. Se decorrer da vontade

das partes, estar-se-á diante de obrigação convencional. Se este vínculo surgir

independentemente da vontade das partes – ou até mesmo contra esta vontade –, por força de

lei, estar-se-á diante de um tributo250

. Os serviços notariais e registrais possuem natureza

obrigatória para aqueles que desejam obter os efeitos legais previstos no artigo 1º da Lei nº

8.935/94 (garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos), não

conferindo qualquer alternativa aos usuários destes serviços. A obrigação de pagar os

emolumentos cartorários surge com fundamente na lei e de forma independente da vontade

das partes.

Outro entendimento digno de nota proferido neste julgado pelo mesmo Ministro é a

adoção da classificação financeira da receita para a identificação da compulsoriedade ou não

da cobrança. Sendo que as tarifas (não compulsórias) são classificadas como receitas

originárias e as taxas (compulsórias) como receitas derivadas. A Lei nº 4.320/64, que institui

as norma gerais de Direito Financeiro, classifica os tributos como receita derivada e a define

como sendo aquela instituída pelas entidades de direito publico, compreendendo os impostos,

as taxas e contribuições nos termos da constituição e das leis vigentes em matéria financeira,

248

Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são

compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as

instituiu. 249

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 576189/RS. Relator: Ministro Ricardo Lewandowski, Brasília, 22

de abril de 2009. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=598034>. Acesso em: 04 dez 2017. 250

ATALIBA. 2012, p. 37.

Page 114: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

113

destinando-se o seu produto ao custeio de atividades gerais ou especificas exercidas por essas

entidades251

. As taxas, por serem receitas derivadas do Poder Público, possuem o requisito da

compulsoriedade descrito no artigo 3º, do Código Tributário Nacional252

.

O que não ocorre com as tarifas, pois estas são classificadas como receita originária do

Poder Público. As receitas originárias são as receitas decorrentes da exploração dos bens

públicos e que não possuem a característica da compulsoriedade. Todas as demais receitas do

Poder Público, que não as derivadas, são classificadas como receitas originárias, sendo as

receitas: de contribuições, patrimonial, agropecuária, industrial, de serviços e outras e, ainda,

as provenientes de recursos financeiros recebidos de outras pessoas de direito público ou

privado, quando destinadas a atender despesas classificáveis em Despesas Correntes253

.

Entendimento este que foi replicado na ADI 800/RS254

, que tratou sobre a natureza

jurídica do pedágio, pelo Ministro Teori Zavascki defendendo a tese de que não seria

necessária a disponibilização de um serviço alternativo e gratuito pelo Poder Público para que

se possa classificar uma receita com sendo tarifária, fundamentado o seu entendimento no §1º

do artigo 9º da Lei nº 8.987/95: A tarifa não será subordinada à legislação específica anterior

e somente nos casos expressamente previstos em lei, sua cobrança poderá ser condicionada à

existência de serviço público alternativo e gratuito para o usuário255

. Portanto a

compulsoriedade não seria no sentido de se possuir um serviço alternativo, mas sim de se

classificar a receita como sendo derivada (compulsória) ou originária (não compulsória).

Defende ainda que esta exigência não está expressa na Constituição Federal, portanto

não se poderia condicionar o sistema tarifário a tal requisito. Apesar de bem fundamentado

este entendimento, cairíamos em uma tautologia, tendo em vista que, dentro da classificação –

despesas derivadas e despesas originárias –, não teríamos critérios para diferenciação. Assim,

as receitas derivadas seriam consideradas de natureza compulsória porque são receitas

derivadas e as receitas originárias seriam consideradas não compulsórias porque são receitas

originárias. Então o que realmente diferenciaria as taxas das tarifas seria apenas o arbitro do

251

BRASIL. Lei nº 4.320, de 16 de mar. de 1964. Estatui Normas Gerais de Direito Financeiro para

elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito

Federal. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 3 de jun. 1964. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4320.htm>. Acesso em: 14 nov. 2017., art. 9º 252

Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que

não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente

vinculada. 253

BRASIL. Lei nº 4.320. Art. 10, §1º. 254

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 800/RS. Relator: Ministro Teori

Zavascki, Brasília, 11 de JUNHO de 2014. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=6274991>. Acesso em: 04 dez 2017. 255

BRASIL. Lei nº 8.987, de 13 de fev. de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da

prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências.

Page 115: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

114

legislador em classificar determinada receita como derivada ou originária na lei orçamentária.

Ocorre que, para que o legislador faça tal escolha, deve se utilizar de algum critério válido,

que é o de possuir um serviço alternativo para o usuário ou lhe conferir a possibilidade de

atingir o mesmo resultado por meios diversos.

O entendimento proferido na ADI 1.378256

é no sentido de que as sutas e os

emolumentos extrajudiciais são taxas remuneratórias de serviços públicos que ensejam o

exercício de missão essencialmente estatal: conferir fé pública a atos e documentos, certificar

a legitimidade de situações, possibilitar o exercício de direitos subjetivos privados e públicos,

possibilitar a garantia da prestação jurisdicional do Estado. Tais serviços, implicando com o

exercício de direitos subjetivos e referindo-se a caso particular concreto, são específicos,

permitindo o vínculo tributário entre devedor e entidade estatal; são divisíveis, posto que

individualiza sai utilização pelas pessoas vinculadas ao dever de custa-los. A

compulsoriedade de sua utilização e do pagamento das custas e emolumentos são inarredáveis

porque consubstanciam o único caminho para exercer a pretensão, por imperativo legal,

vedada que está a justiça privada. Portanto, a jurisprudência do STF é unânime em reconhecer

a natureza jurídica de taxa aos emolumentos cartorários.

Uma consequência inevitável da instituição de uma taxa é o fundamento de sua

instituição, tendo como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização,

efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou

posto à sua disposição257

. Ante o que já foi exposto neste trabalho, e por critério de exclusão,

os serviços notariais não são se constituem em exercício regular do poder de polícia nem a

prestação em potencial de um serviço público, tendo em vista que os emolumentos somente

são devidos quando os serviços são efetivamente prestados. Portanto, os emolumentos

decorrem da prestação efetiva de um serviço público.

Apesar de não haver divergência quanto à natureza de taxa dos emolumentos, a

jurisprudência do STF é divergente em reconhecer a natureza de serviço público aos serviços

notariais e registrais. Ora os considerando atividades típicas do poder público, ora serviços

públicos propriamente ditos e, por fim, atividades análogas à atividade empresarial.

Prevalecendo a tese de que são serviços públicos. Veremos seus entendimentos em ordem

cronológica. Em 08 de novembro de 2006, no julgamento da ADI nº 3.643, o plenário decidiu

256

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.378 MC. Relator: Ministro

Celso de Mello, Brasília, 30 de maio de 1997. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=347013 >. Acesso em: 04 dez 2017. 257

BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei 5.172. Art. 77.

Page 116: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

115

que as atividades notariais e registrais são atividades típicas do Poder Público, não sendo

consideras serviços públicos:

―Numa frase, então, serviços notariais e de registro são típicas atividades

estatais, mas não são serviços públicos, propriamente. Inscrevem-se, isto

sim, entre as atividades tidas como função pública lato sensu, a exemplo das

funções de legislação, diplomacia, defesa nacional, segurança pública,

trânsito, controle externo e tantos outros cometimentos que, nem por ser de

exclusivo domínio estatal, passam a se confundir com serviço público.‖258

Portanto, neste julgamento, foi adotado o conceito restrito de serviços públicos, em

que as atividades típicas do Poder Público são separadas dos serviços públicos propriamente

ditos. Para esta teoria, os serviços públicos são apenas aquelas atividades tipicamente de

administração pública, ou seja, apenas as funções típicas do Poder Executivo. As funções

atípicas do Poder Executivo e as funções típicas dos outros poderes (Legislativo e Judiciário)

são consideradas atuação primária do Poder Público, mas não serviços públicos.

Os serviços notariais e registrais foram incluídos nas funções típicas do Poder Público,

por esse motivo não foram considerados serviços públicos. Tal entendimento não traz

qualquer prejuízo para a análise da imunidade dos impostos incidentes sobre estas atividades,

tendo em vista que, se os serviços públicos recebem tal imunidade, com mais razão as

atividades típicas do poder público também receberão. A atuação primária do Poder Público

não pode ser tributada com impostos.

Menos de um ano depois, no julgamento da ADI 1.800, esta corte decidiu que a

atividades notariais e registrais são análogas às atividades empresariais, porém continuam

regidas pelo Direito Público:

―Atividade notarial. Natureza. Lei 9.534/1997. (...) A atividade desenvolvida

pelos titulares das serventias de notas e registros, embora seja análoga à

―atividade empresarial, sujeita-se a um regime de direito público. Não

ofende o princípio da proporcionalidade lei que isenta os "reconhecidamente

pobres" do pagamento dos emolumentos devidos pela expedição de registro

civil de nascimento e de óbito, bem como a primeira certidão respectiva.‖259

Criaram então uma quimera jurídica que presta um serviço que é considerado ao

mesmo tempo atividade empresarial (exploração de atividade econômica) e serviço público.

Como visto, as finalidades que fundamentam a criação destas duas atividades é totalmente

incompatível. As atividades empresariais são criadas com o objetivo de gerar lucros, mesmo

que nunca cheguem a acontecer.

258

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.643. Relator: Ministro Ayres

Britto, Brasília, 8 de novembro de 2007. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=406334>. Acesso em: 04 dez 2017. 259

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.800. Relator: Ministro

Ricardo Lewandowski, Brasília, 28 de setembro de 2007. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=488644>. Acesso em: 04 dez 2017.

Page 117: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

116

Ao contrário, os serviços públicos são criados com o objetivo de atender os interesses

públicos e não de gerar lucros, o que pode eventualmente acontecer e, de fato, ocorre nos

serviços públicos prestados pelos concessionários e permissionários de serviços públicos e

remunerados pela política tarifária (art. 175 da CF).

Por este motivo que estes serviços são excluídos da imunidade dos impostos. São

serviços prestados por empresas privadas e em ambiente negocial, apesar de não serem

considerados atividade econômica. A empresa que os presta tem o objetivo de obter lucro,

mas a criação do serviço pelo Poder Público não. O que demonstra que não possuem fins

lucrativos, mas possuem conteúdo econômico. Um serviço não pode ser considerado, ao

mesmo tempo, exploração de atividade econômica e serviço público como fez este Tribunal.

Em 2013, no julgamento da ADI nº 2.602/MG, que tratou da não aplicação da

aposentadoria compulsória aos notários e registradores, este Tribunal apresentou o

entendimento de que de que os serviços notariais e registrais são serviços públicos não

privativos:

―O art. 40, § 1º, II, da Constituição do Brasil, na redação que lhe foi

conferida pela EC 20/1998, está restrito aos cargos efetivos da União, dos

Estados-membros, do Distrito Federal e dos Municípios – incluídas as

autarquias e fundações. Os serviços de registros públicos, cartorários e

notariais são exercidos em caráter privado por delegação do Poder

Público – serviço público não privativo. Os notários e os registradores

exercem atividade estatal, entretanto não são titulares de cargo público

efetivo, tampouco ocupam cargo público. Não são servidores públicos, não

lhes alcançando a compulsoriedade imposta pelo mencionado art. 40 da

CF/1988 – aposentadoria compulsória aos setenta anos de idade.‖260

(grifo

nosso)

Portanto, não restam dúvidas de que o Supremo Tribunal Federal reconhece a natureza

jurídica de serviço público aos serviços notariais e registrais, tendo em vista que, até mesmo o

julgado que equipara estas atividades à atividade empresarial, reconhece que são regidos por

Direito Público. Para o conceito formal de serviço público, as atividades regidas por direito

público são consideradas serviços públicos.

Como visto anteriormente, nos termos do artigo 150 da Constituição, a prestação de

um serviço público remunerado pelo sistema tributário (taxa) é imune à incidência dos

260

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.602/MG. Relator: Ministro

Eros Grau, Brasília, 31 de março de 2006. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266859 >. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 28.440 ED-AgR. Relator: Ministro Teori Zavascki, Brasília, 07 de

fevereiro de 2014. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=5236097 >. Acesso em: 04 dez 2017;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 556.504 ED. Relator: Ministro Dias Toffoli, Brasília, 25 de outubro de

2017. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=5236097 >. Acesso

em: 04 dez 2017.

Page 118: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

117

impostos. É esta a situação dos serviços notariais e registrais tanto sob a ótica da doutrina

quanto da jurisprudência do STF. Porém, no julgamento da ADI 3.089/DF, em 2008, esta

corte decidiu de forma diferente:

―Alegada violação dos arts. 145, II, 156, III, e 236, caput, da Constituição,

porquanto a matriz constitucional do Imposto sobre Serviços de Qualquer

Natureza permitiria a incidência do tributo tão-somente sobre a prestação de

serviços de índole privada. Ademais, a tributação da prestação dos serviços

notariais também ofenderia o art. 150, VI, a e §§ 2º e 3º da Constituição, na

medida em que tais serviços públicos são imunes à tributação recíproca pelos

entes federados. As pessoas que exercem atividade notarial não são imunes à

tributação, porquanto a circunstância de desenvolverem os respectivos

serviços com intuito lucrativo invoca a exceção prevista no art. 150, § 3º da

Constituição. O recebimento de remuneração pela prestação dos serviços

confirma, ainda, capacidade contributiva. A imunidade recíproca é uma

garantia ou prerrogativa imediata de entidades políticas federativas, e não de

particulares que executem, com inequívoco intuito lucrativo, serviços

públicos mediante concessão ou delegação, devidamente remunerados. Não

há diferenciação que justifique a tributação dos serviços públicos concedidos

e a não-tributação das atividades delegadas. Ação Direta de

Inconstitucionalidade conhecida, mas julgada improcedente.‖261

Tal entendimento foi replicado, em 2013, no julgamento da Repercussão Geral no

Recurso Extraordinário nº 756.915/RJ:

―Tributário. 2. Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN).

Incidência sobre serviços de registros públicos, cartorários e notariais.

Constitucionalidade. 3. Imunidade recíproca. Inaplicabilidade. 4.

Constitucionalidade da lei municipal. 5. Repercussão geral reconhecida.

Recurso provido. Reafirmação de jurisprudência. Decisão: O Tribunal, por

unanimidade, reputou constitucional a questão. O Tribunal, por

unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão

constitucional suscitada. No mérito, por maioria, reafirmou a jurisprudência

dominante sobre a matéria, vencidos os Ministros Joaquim Barbosa e Marco

Aurélio.‖

A decisão equiparou os serviços notariais e registrais àqueles serviços públicos

prestados em regime de concessão e permissão para fins de lhes negar o direito à imunidade

dos impostos incidentes sobre estas atividades. O Tribunal reconhece a causa (existência de

um serviço público de titularidade dos Estados Membros remunerado por taxa) e nega a sua

consequência (imunidade aos impostos). A taxa, como visto exaustivamente, tem como fato

gerador a prestação de um serviço público específico e divisível. Um não pode se dissociar do

outro. Podemos até ter a situação de um serviço público remunerado de outra forma (tarifa –

concessões e permissões), porém, nunca, uma taxa remunerando outra coisa que não um

serviço público.

261

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.089/DF. Relator: Ministro

Ayres Britto, Brasília, 12 de fevereiro de 2008. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=539087>. Acesso em: 04 dez 2017.

Page 119: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

118

O Tribunal defende a sua tese com base em três argumentos: a) intuito lucrativo das

atividades notariais e registrais; b) a imunidade dos impostos se trata de prerrogativa imediata

dos entes federados e não de particulares em colaboração com o poder público; e c)

capacidade contributiva dos notários e registradores.

Quanto ao caráter lucrativo das atividades notariais, como demonstrado, a inteligência

do artigo 150 da Constituição divide as atividades estatais em três modalidades, sendo elas: a)

exploração de atividades econômicas; b) prestação de serviços público de conteúdo

econômico; e c) prestação de serviços públicos de conteúdo não econômico. A vedação à

imunidade dos impostos se impõe às atividades econômicas e aos serviços públicos de

conteúdo econômico, mas não aos serviços públicos de conteúdo não econômico. O legislador

constituinte originário optou por fazer a diferenciação entre os serviços públicos de conteúdo

econômico e não econômico pelo sistema remuneratório e não pela qualidade de seus

prestadores. Tendo atribuído ao primeiro caso a remuneração por meio de preço público ou

tarifa e, ao segundo caso, as demais formas de remuneração, como por taxas ou diretamente

pelo Poder Público.

As atividades econômicas são aquelas que visam ao lucro e estão sujeitas às regras de

mercado (oferta e demanda). Como vimos somente a exploração de atividades econômicas

pode ter este objetivo, pois está sujeita ao livre mercado. A prestação dos serviços notariais e

registrais não é compatível com esta sistemática porque está totalmente regulada pelo poder

pública, não restando qualquer margem de discricionariedade aos notários e registradores para

atuarem de acordo com o mercado.

Os preços de mercado, por exemplo, variam de acordo com vários fatores, como a

disponibilidade do produto ou serviço na localidade, o poder aquisitivo de seus consumidores,

o valor que os consumidores precisariam dispor para obter o mesmo resultado por meio de

uma segunda opção etc. O que não ocorre com os serviços notariais e registrais, até mesmo

porque estão limitados pelo regramento tributário (legalidade, anterioridade, referibilidade

etc.). A Lei nº 10.169/00 dispõe que o valor dos emolumentos deve corresponder ao efetivo

custo do serviço mais a adequada e suficiente remuneração de seu prestador. Esta disposição é

taxativa e não deixa espaço para interpretarmos esta remuneração adequada e suficiente como

exploração de atividade econômica.

Não fosse assim, os notários teriam a liberdade, por exemplo, de aumentar o valor dos

emolumentos em comarcas do interior, em que os serviços são mais escassos, e os usuários

teriam que se deslocar até outros municípios, caso não desejassem se submeter àqueles

Page 120: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

119

valores. Porém não é o que ocorre, tendo em vista que os emolumentos são fixados por lei

estadual e com vigência para todos os Municípios daquele estado.

O exercício de uma atividade econômica é feito pelo empresário, nos termos do art.

966 do Código Civil, o que geralmente é feito pelas pessoas jurídicas. Estas são analisadas

sempre por suas qualidades objetivas, como habilitação jurídica, qualificação técnica,

qualificação econômico-financeira, regularidade fiscal e trabalhista etc. E não por qualidades

subjetivas como é exigido para o exercício da atividade notarial e registral (formação jurídica,

quitação com obrigações militares e eleitoras etc.). Este é o entendimento de Walter

Ceneviva:

―O Código Civil passou a distinguir, desde 2003, a atividade das empresas a

contar da figura do empresário, descrita (art. 966) como a da pessoa que

―exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção

ou a circulação de bens ou de serviços‖. A definição não inclui notários e

registradores, embora prestadores profissionais encarregados dos serviços

previstos nesta lei, mesmo em não lhes sendo aplicáveis as exceções do

parágrafo único do art. 966. A lei geral, nesse caso, não modifica a lei

especial anterior e, demais disso, não se confronta com a norma

constitucional (art. 236), que os define como agentes públicos, por delegação

do Poder Público.‖262

Os notários e registradores, portanto, não podem ser confundidos com empresários,

como feitos nas referidas decisões do STF, tendo em vista que as suas atividades não são

pautadas pelo intuito lucrativo. São profissionais do direito que atuam sim com finalidade

remuneratória, mas não com finalidade de lucro:

―Profissional do direito é todo prestador de serviço remunerado cuja área

principal de atividade compreende a aplicação da lei. A condição

profissional evidencia a finalidade remuneratória, que nem decorre de

relação de trabalho, nem é diretamente funcional (com vencimentos

predeterminados). Não se caracteriza, outrossim, como empresarial, mas de

prestação de serviço público, para satisfazer interesses coletivos. Seu caráter

privado, que sugeriria a aplicação do art. 966 do Código Civil, sofre as

restrições constitucionais aplicáveis ao agente público enquanto atuador do

direito em nome do Estado, conforme se lê, mais adiante, neste mesmo

comentário do art. 3°. A interpretação sistemática, com o art. 593 do Código,

assim o confirma, ao distinguir prestação trabalhista e leis especiais, em cuja

lista se enquadra a LNR.‖263

O artigo 593 do Código Civil determina que a prestação de serviço, que não estiver

sujeita às leis trabalhistas ou a lei especial, reger-se-á pelas disposições deste Capítulo264

. Os

serviços notariais e registras são regidos por lei especial (Lei nº 8.935/94), portanto não têm

natureza nem trabalhista, nem empresarial.

262

CENEVIVA. 2010, p. 38. 263

CENEVIVA. 2010, p. 45. 264

BRASIL. Código Civil. Lei 10.406/02.

Page 121: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

120

Os serviços concedidos e permitidos resultam de um vínculo contratual entre a pessoa

empresária e o Poder Público e de um serviço público delegado por meio de licitação na

modalidade concorrência. Já os serviços notariais e registrais resultam da soma de um vínculo

profissional entre o particular e o Poder Público e de um serviço público delegado por meio

de concurso público. Portanto é inequívoco o conteúdo econômico dos primeiros, tendo em

vista serem prestados por empresas privadas após processo licitatório. O que não ocorre com

os segundos, que não podem ser excepcionados da regra imunizante apenas por vontade do

julgador.

O Poder Público é obrigado a manter os serviços notariais e registrais em pleno

funcionamento, subsidiando o particular ou anexando os serviços a outras serventias, caso a

atividade não seja economicamente viável em uma determinada serventia extrajudicial.

Portanto não podem ser considerados atividade econômica, tendo em vista que uma situação

desta em regime de mercado resultaria simplesmente no fechamento dos serviços.

A vontade interna dos prestadores dos serviços notariais e registras em obter ganhos

por meio do exercício de suas profissões não configura o exercício de atividade econômica ou

de conteúdo econômico. Qual é o profissional que não visa obter ganhos financeiros com o

exercício de sua profissão? Se isso fosse o que determina a natureza de atividade econômica

ou de conteúdo econômico, até os serviços pelo Poder Judiciário deveriam ser tributados em

Imposto Sobre Serviços, tendo em vista que são remunerados por custa judiciais e seus

prestadores (os servidores públicos) possuem o objetivo de obter ganhos financeiros com a

prestação dos serviços. Por óbvio que esta hipotética tributação não recairia sobre a

remuneração dos servidores, mas sobre os valores das custas judiciais.

A gerência privada destes serviços não lhes retira a natureza de serviço público. Vimos

que há um limite entre a gestão privada e a prestação de um serviço público. Temos que

separar o que é serviço público e o que é gestão privada. A regência das funções notariais e

registrais propriamente dita é de Direito Público desde a sua regulamentação e implementação

até à fiscalização e punição. Caso o sistema funcionasse como deveria, os serviços notariais e

registrais seriam imunes à tributação. O patrimônio necessário à sua prestação ou a renda

auferida pelos prestadores destes serviços não são imunes, pois estes sim são de natureza

privada e devem ser tributados.

A regulação de um serviço, qualquer que seja, passa basicamente por três etapas:

edição de normas regulamentadoras; implementação de forma concreta das regras; e

fiscalização do cumprimento e eventual punição. Todas essas três funções, no tocante a

atividade notarial e registral, são exercidas pelo poder judiciário. Em primeira escala, o Poder

Page 122: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

121

Judiciário é o responsável pela iniciativa da Lei de Organização Judiciária do Estado, bem

como pela edição do Código de Normas e os regulamentos que regem esta atividade. Em

segunda escala, a implementação é feita por meio de delegação da função também pelo Poder

Judiciário, por meio de concurso público promovido por este. Por ultimo, a fiscalização e

punição são feita pelo mesmo poder, seja por meio do Conselho Nacional de Justiça, das

Corregedorias dos Tribunais de Justiça ou por processos administrativos ou judiciais. Este é o

entendimento de Luís Paulo Aliende Ribeiro, vejamos:

―A regulação da função notarial e de registro, no Brasil, cabe ao Poder

Judiciário, incumbido, pela Constituição Federal, da fiscalização dos atos

dos notários e registradores, encargo cujo pleno exercício pressupõe o

estabelecimento, o controle e a verificação do cumprimento das regras, com

a correspondente aplicação, aos infratores, das penalidades legalmente

previstas, o que corresponde ao processo de regulação.‖265

Portanto, vemos claramente que é uma função típica do Poder Público (ante o regime

de regulamentação - normatização, delegação e fiscalização), que consiste no serviço de

administração pública de interesses públicos e privados.

A outra hipótese do artigo 150 da Constituição que permite o afastamento da

imunidade dos impostos é a contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas. O sistema de

preço ou tarifa é inerente às concessões e permissões por disposição expressa do inciso III do

artigo 175 da CF. Portanto, apenas os serviços remunerados pelo sistema tarifário são

excluídos as imunidades dos impostos, tendo em vista que, apesar de não serem considerados

exploração de atividade econômica, possuem conteúdo econômico, como defendido a cima. O

tribunal reconhece no mesmo julgado que as serventias extrajudiciais são remuneradas por

taxa e não por tarifa.

Alguns Ministros justificaram a interpretação do dispositivo (contraprestação ou

pagamento de preços ou tarifas pelo usuário) no sentido de que a primeira parte

(contraprestação) justificaria a inclusão das taxas. Mas, é uma interpretação equivocada, pois

ficariam três formas de retribuição excluídas da imunidade: a) contraprestação; b) pagamento

de preços; ou c) pagamento de tarifas. Sendo que existem apenas duas: taxa e tarifa.

Se prosseguíssemos nesta interpretação, todos os outros serviços públicos que

tivessem qualquer tipo de contraprestação (como taxa), até mesmo os prestados diretamente

pelo Poder Público, poderiam ser tributados, tendo em vista que este dispositivo não faz

distinção quanto ao seu prestador e que não cabe ao interprete encaixar na regra escrita

hipóteses não previstas pelo legislador, que sejam frutos apenas de sua imaginação.

265

RIBEIRO. 2009, pp. 138 e 139.

Page 123: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

122

O §3º do artigo 150 da CF, quando tratou das exceções à imunidade dos impostos, não

fez qualquer distinção quanto aos seus prestadores. Não há qualquer regra constitucional que

vede a concessão de imunidades tributárias aos particulares. Pelo contrário, existem diversas

passagens na Carta Constitucional prevendo tais imunidades a estes, mesmo quando atuam

em atividades privadas e até mesmo empresariais, como é o caso da comercialização de

livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão.

Ocorre que os serviços notariais e registrais não são de titularidade dos notários e

registradores, mas sim do Poder Publico. Estes profissionais não tem qualquer poder de

gerência sobre as atividades, sendo meros executores dos mandamentos públicos. Recebem

apenas a execução dos serviços. Portanto estes serviços não saem da esfera jurídica do Poder

Público e devem ser tratados como tal. Caso não fosse assim, estas serventias seriam tratadas

como patrimônio particular destes profissionais, como ocorria antigamente. O que a

Constituição de 1988 buscou rechaçar veementemente.

Então a interpretação do STF de que a dita imunidade estaria beneficiando os seus

prestadores não se sustenta, tendo em vista que estes serviços pertencem de fato e de direito

ao Poder Público e que somente estes serviços são imunes aos impostos e não o patrimônio

particular de seus prestadores.

Os rendimentos destes profissionais são perfeitamente tributáveis em Imposto de

Renda – IR; os prédios em que os serviços são prestados são tributados em Imposto Predial e

Territorial Urbano – IPTU; os bens móveis que adquirem são objetos de Imposto sobre

Circulação de Mercadorias – ICMS; e assim sucessivamente.

Caso os particulares prestadores dos serviços notariais e registrais fossem mesmo os

beneficiários da imunidade recíproca, qualquer outro serviço que prestassem ou qualquer

outra atividade que desenvolvessem seria imune aos impostos. O que não acontece, tendo em

vista que a imunidade é conferida à atividade notarial e registral e não aos notários e

registradores.

Por fim, o STF fundamenta o seu entendimento na suposta capacidade contributiva

dos notários e registradores. Ocorre que esta deve ser avaliada de acordo com o que

fundamentou o tributo e não de acordo com o seu sujeito passivo. O que fundamenta a

incidência do Imposto Sobre Serviços é a prestação do serviço, então deve ser avaliada a

capacidade contributiva deste e não de seu sujeito passivo. Os serviços públicos, salvo aqueles

remunerados pelo sistema tarifário, são imunes e não possuem capacidade contributiva.

Assim, os serviços notariais e registrais não possuem capacidade contributiva.

Page 124: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

123

Além do mais, a capacidade contributiva não se confunde com a capacidade

econômica. A capacidade contributiva rege as relações jurídicas tributárias e busca determinar

com precisão qual a parcela do patrimônio publico ou privado deve ser atingida para que seja

quebrado o princípio da proporcionalidade e da igualdade em relação às relações jurídicas

tributárias similares. Então a capacidade contributiva não visa buscar patrimônio, enquanto

esse existir, mas apenas estabelecer critérios para que não seja quebrada a justiça fiscal. É a

aplicação de fato do consagrado brocardo jurídico de que se deve tratar os iguais de forma

igual e os desiguais na medida de suas desigualdades.

A capacidade econômica, ao contrário da contributiva, é a disponibilidade de recursos

que a pessoa dispõe. Mesmo após a tributação de um patrimônio ou rendimento, aquilo que

sobrou ao particular possui capacidade econômica até que se esgote por completo. Portanto a

capacidade econômica não é critério para a tributação. O fato de existirem recursos

financeiros disponíveis não dá poder ao Estado para que se utilize da sua capacidade tributária

ativa para atingir o patrimônio particular além do que a capacidade contributiva permite.

O objeto da tributação, após recolhido do seu devido tributo ao Estado, não possui

mais capacidade contributiva aos olhos do Poder Público e se torna patrimônio particular

intangível, até que surja novo fato gerador. A tributação do patrimônio, enquanto ele existir,

como sugere o STF, fere diversos princípios de ordem constitucional, como: propriedade

privada, proporcionalidade, igualdade, vedação ao confisco etc.

A incidência dos impostos sobre os serviços notariais e registrais não podem ser

transferidas aos seus prestadores de forma inconstitucional, por meio de decisão judicial, com

o STF o fez. Até mesmo porque os rendimentos destes profissionais já são tributados em

Imposto de Renda – IR, portanto não possuem mais capacidade contributiva para assumir os

encargos tributários do exercício de atividades de titularidade do Poder Público.

Todos os entes federados possuem capacidade econômica, no entanto são imunes e

não possuem capacidade contributiva por expressa disposição constitucional. O objetivo desta

imunidade não é proteger quem é desprovido de recursos financeiros. Cada imunidade tem o

seu objetivo, sendo que a que está em discussão (imunidade recíproca) visa proteger o pacto

federativo de forma a impedir que entes federados tentem intervir em outros, por meio da

capacidade tributária ativa de modo que impeçam ou dificultem as suas atividades e, por

consequência, percam a autonomia.

Apesar da natureza jurídica de serviço público dos serviços notariais e registrais, a

jurisprudência do STF lhes nega a imunidade tributária da alínea ―a‖, inciso VI, art. 150, da

CF/88, com o fundamento de estarem inclusos na proibição do § 3º do mesmo artigo. As

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124

decisões do STF fogem completamente à técnica jurídica e se tomam deo cunho político no

intuito de defender os interesses arrecadatórios dos Municípios em detrimento das atividades

notariais e registrais e de seus usuários. O sistema jurídico, da forma que está posto, não

possibilita intepretação diversa, no sentido de não lhes conferir a imunidade tributária,

portanto a intepretação feita pelo STF é equivocada.

Tais decisões são inconstitucionais por ferirem o pacto federativo. Não estamos a dizer

que a federação está comprometida ao tributarmos as atividades notariais e registrais, porém a

abertura de exceções não previstas constitucionalmente dá margem a interpretações futuras

similares que pode gerar uma situação insustentável.

Além do mais, o Judiciário não possui atribuição para tomar as escolhas públicas, o

que deve ser feito por meio do Poder Legislativo. Porém, a matéria de imunidade tributária

recíproca se trata de cláusula pétrea, por ser um dos mecanismos constitucionais de defesa do

pacto federativo, e não pode ser reduzida sequer por emenda constitucional. Portanto, a opção

tomada pelo legislador constituinte originário de não tributar os serviços públicos que não

sejam remunerados pelo sistema tarifário não pode ser mitigada por qualquer meio. Apenas a

convocação de uma nova Assembleia Constituinte Originária teria poderes para tanto.

Page 126: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

125

CONCLUSÃO

O Brasil adota o modelo de notariado latino, que possui origem no Direito Romano e

tem como característica principal a intervenção obrigatória de profissional do direito (notário

ou registador) em determinados negócios jurídicos para que surtam os efeitos legais perante a

sociedade. É uma atividade preventiva de conflitos, tendo em vista que determinados

negócios jurídicos somente atingirão os efeitos desejados se houver a intervenção destes

profissionais. É considerado um modelo de notariado mais seguro que os demais e que gera,

em regra, o menor custo social.

O outro sistema notarial de grande relevo é anglo-saxão, mais utilizado nos países com

sistemas jurídicos provenientes da common law. Neste sistema de notariado, o notário possui

um papel não tão relevante quanto no sistema latino, sendo que, na maioria das vezes, se

limita a mero tomador de depoimentos, o que não confere segurança jurídica aos atos ou

negócios jurídicos realizados em sua presença. Em se tratando de imóveis, em regra, existem

registros que possibilitam a consulta da procedência do imóvel que está sendo negociado,

porém esta segurança jurídica que falta nesse sistema pode ser compensada com a contratação

de um seguro da operação.

As atividades notariais e registrais são funções essenciais ao convívio em sociedade.

Trazem segurança jurídica e efetividade aos atos e negócios jurídicos praticados com a

intervenção dos notários e registradores. Atuam de forma preventiva aos conflitos, ajudando a

desonerar o Poder Judiciário com demandas excessivas. A população em geral não possui

conhecimentos jurídicos suficientes para a realização de todos os atos e negócios jurídicos

necessários à convivência em sociedade, portanto os notários e registradores devem

desempenhar a função de assessores jurídicos das partes, interpretes e aplicadores da lei.

Em 2 de outubro de 1948, Buenos Aires Argentina, foi fundada a União Internacional

do Notariado (UINL), que é uma organização não governamental internacional da qual o

Brasil faz parte, instituída para promover, coordenar e desenvolver a função e a atividade

notarial pelo mundo. Até outubro de 2016, contava com 87 países266

, sendo 22 dos 28 da

266

Albania, Alemania, Andorra, Argelia, Argentina, Armenia, Austria, Benín, Bolivia, Bosnia-Herzegovina,

Brasil, Bulgaria, Burkina Faso, Bélgica, Camerún, Chad, Chile, China, Ciudad del Vaticano, Colombia, Corea

del sur, Costa Rica, Costa de Marfil, Croacia, Cuba, Ecuador, El Salvador, Eslovaquia, Eslovenia, España,

Estonia, Francia, Gabón, Georgia, Grecia, Guatemala, Guinea, Haití, Honduras, Hungría, Indonesia, Italia,

Japón, Kosovo, Letonia, Lituania, Londres (Reino Unido), Luxemburgo, Macedonia, Madagascar, Mali, Malta,

Marruecos, Mauricio, Mauritania, Moldavia, Mongolia, Montenegro, México, Mónaco, Nicaragua, Níger,

Panamá, Paraguay, Países Bajos, Perú, Polonia, Portugal, Puerto Rico, Quebec (Canadá), República

Centroafricana, República Checa, República Dominicana, República del Congo, Rumanía, Rusia, San Marino,

Senegal, Serbia, Suiza, Togo, Turquía, Túnez, Ucrania, Uruguay, Venezuela, y Vietnam.

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126

União Europeia, 15 dos 19 do G20. Atualmente este sistema latino é utilizado por

aproximadamente 120 países, que representam dois terços da população mundial267

.

Para esta organização, conceitua o notário como sendo um profissional do direito,

titular de uma função pública, nomeado pelo Estado para conferir autenticidade aos atos e

negócios jurídicos contidos nos documentos que redige, assim como para aconselhar e

assessorar os requerentes de seus serviços. A função notarial é uma função pública, tendo o

notário a autoridade do Estado. Sendo exercida de forma parcial e independente, sem estar

situada hierarquicamente entre os funcionários do Estado. A função notarial se estende a todas

as atividades jurídicas não contenciosas, conferindo ao usuário segurança jurídica, evitando

possíveis litígios e conflitos, que podem ser resolvidos por meio do exercício da mediação

jurídica, sendo um instrumento indispensável para a administração de uma boa justiça268

.

Na Assembleia de Notariados Membros, ocorrida em Roma, no dia 8 de novembro de

2005, foi aprovado texto com o desenvolvimento e atualização dos ―Princípios Fundamentais

do Sistema de Notariado de Tipo Latino‖, prevendo em seu artigo 4º a natureza jurídica de

serviço público a estas atividades. Sendo que os notários, enquanto delegatários de uma parte

da soberania do Estado, deverão exercer suas funções controlando de maneira imparcial,

independente e responsável a legalidade dos atos e negócios que se celebram mediante sua

autorização, prestando com sua atuação um serviço público de interesse geral de segurança

jurídica preventiva, evitando litígios e contribuindo com o desenvolvimento econômico

sustentável e com a paz social. A função notarial é indelegável e obrigatória, salvo as causas

de denegação da função prevista naquele texto269

.

Os notários e registradores carregam parte da soberania estatal que consiste em

conferir a fé pública aos atos e negócios jurídicos feitos com a sua intervenção. Estes

profissionais executam os serviços públicos notariais e registrais, que são de titularidade do

Poder Público. Portanto o desenvolvimento e o tratamento adequado do tema são de extrema

importância para a contribuição com a paz social.

A Constituição Federal de 1988 organizou estes serviços de forma rasa, sendo

necessária uma análise sistemática do nosso direito e todo um trabalho doutrinário e

jurisprudencial para apontarmos com precisão qual é a natureza jurídica dos: a) serviços

267

UNIÓN INTERNACIONAL DEL NOTARIADO. Missión. Disponível em: <http://www.uinl.org/mision >.

Acesso em: 4 de dezembro de 2017. 268

UNIÓN INTERNACIONAL DEL NOTARIADO. Principios fundamentales del sistema de notariado de

tipo latino. Disponível em: <http://www.uinl.org/principio-fundamentales >. Acesso em: 4 de dezembro de

2017. 269

UNIÓN INTERNACIONAL DEL NOTARIADO. Organización de la función. Disponível em:

<http://www.uinl.org/organizacion-de-la-funcion >. Acesso em: 4 de dezembro de 2017.

Page 128: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

127

notariais e registrais; b) do vínculo entre os notários e registradores e o Poder Público; e c)

emolumentos cartorários. Foi feita a análise desses três itens sob as perspectivas da legislação,

da doutrina e da jurisprudência do STF. Salvo alguns pontos específicos, todas estas fontes do

direito são concordes em relação às naturezas jurídicas.

Quanto aos serviços notariais e registrais, estes estão previstos expressamente no

artigo 236 da nossa Constituição Federal. São prestados nas serventias extrajudiciais

(cartórios), que se constituem na organização técnica e administrativa desempenhada pelos

notários e registradores, não sendo, porém, órgãos públicos, com a ressalva das serventias

oficializadas pelo Poder Público (art. 32 da ADTC) que se encontram em vias de extinção.

A divisão entre o que é uma atividade pública e o que é uma atividade privada é de

substancial importância para definirmos qual o regramento determinada atividade deve seguir

(Direito Público ou Direito Privado). A delimitação das atividades privadas é feita de forma

residual, ou seja, definidos os limites da atividade pública, todo o que exceder será

considerado atividade provada.

A conceituação dos serviços públicos é uma forma de estabelecer as fronteiras entre a

atuação do Poder Público e a da iniciativa privada. Diversas teorias formas desenvolvidas

tentando estabelecer um padrão, porém a maioria fracassou, tendo em vista não terem

conseguido abranger toda a atividade pública ou terem abrangido atividades não públicas.

Instaurou-se então a chamada pela doutrina crise do conceito de serviço público.

Existem diversas teorias para a conceituação dos serviços públicos, sendo a primeira

delas a divisão dos serviços públicos em sentido amplo e em sentido restrito. Para a primeira,

qualquer atividade desenvolvida pelo Estado por qualquer dos seus poderes é considerada

serviço público. É a conceituação mais ampla possível e não foi abandona, tendo em vista

que, vez ou outra, o Poder Público desempenha atividades privadas em igualdade com os

particulares, como ocorre, por exemplo, quando o poder público explora diretamente

atividade econômica (art. 173 da CF). Para esta teoria, os serviços notariais e registrais são

serviços públicos, pois são de titularidade do Poder Público.

Para a segunda teoria (em sentido restrito) serviço público é apenas aquele prestado

pela Administração Pública propriamente dita, representada por seu Poder Executivo,

excluindo-se o exercício de atividade econômica, atividades jurídicas (poder de polícia) e

atividades sociais. Portanto não inclui as demais atividades típicas do Poder Público e dos

demais poderes (Legislativo e Judiciário). Para esta teoria, os serviços notariais e registrais

são considerados atividades típicas do Poder Público, portanto não são considerados serviços

Page 129: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

128

públicos, mas atuação típica do Estado em suas atividades primárias. Este foi o entendimento

adotado no julgamento da ADI 3.643.

Outra teoria desenvolvida pela doutrina foi que conceitua os serviços públicos por

meio de seus elementos, sendo eles: a) subjetivo; b) objetivo; e c) formal. A primeira

(subjetivo) considera serviço público somente aqueles prestados diretamente pelos órgãos e

entidades do Poder Público (Administração Direta e Indireta), tendo se tornado insuficiente

ante a exclusão do conceito de serviço público a prestação de serviços públicos por

particulares em colaboração com o Poder Público (como os notários e registradores e

concessionários e permissionários de serviços públicos).

A segunda (objetivo) considera serviço público aquelas atividades que sejam de

interesse público de forma direta, não importando quem os presta. Esta teoria sanou a

problemática da primeira, porém ainda é insuficiente ante a existência de atividades prestada

pelo poder público que não de interesse geral, mas são consideradas serviços públicos (como

serviços lotéricos). Os serviços notariais e registrais são considerados serviços públicos para

esta teoria, tendo em vista que possuem natureza obrigatória e previsão constitucional.

A terceira classificação (formal) considera serviço público a atividade desempenhada

pelo Poder Público ou seus delegados, sob regras exorbitantes do Direito Comum, ou seja,

sob regras de Direito Público. Esta teoria, em sua forma pura, também é insuficiente, tendo

em vista que existem atividades que são consideradas serviços públicos, inclusive com

previsão constitucional (concessionários e permissionários – art. 175 da CF), que são

parcialmente regidas pelo Direito Privado. Portanto, este entendimento deve ser mitigado e

serem considerados serviços públicos aqueles em que a parcela eminentemente públicas de

suas funções são regidas pelo direito público.

Tendo em vista a deficiência de todas estas teorias, a doutrina vem entendendo como

sendo mais adequada a conceituação de serviços públicos pelo critério da afetação legal, ou

seja, são serviços públicos aqueles que o povo elegeu por meio de sua Constituição ou de suas

leis de por meio de seus representantes (Poder Legislativo). Então optamos por conceituar os

serviços públicos, reconhecendo a contribuição de cada teoria, como sendo: aquele

determinado na Constituição Federal ou na Lei (atendidos os requisitos constitucionais) que

tenha regramento de direito público (critério formal) na parte eminentemente pública deste

serviço, independentemente de seu prestador, tendo a presença ou não de um ou dos dois

critérios: objetivo (prestação do serviço pelos órgãos estatais) e/ou subjetivo (matéria de

interesse coletivo). O que inclui os serviços notariais e registrais.

Page 130: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

129

Definidos os serviços notariais e registrais como sendo serviços públicos, vimos quais

são as formas de prestação destes pelo Poder Público para localizarmos aqueles serviços

dentro da máquina estatal. O Poder Público pode prestar os seus serviços de forma direta (por

meio da Administração Pública Direta – órgãos públicos – ou da Administração Pública

Indireta – entidade: Autarquias, Fundações, Empresas Públicas ou Sociedades de Economia

Mista) ou indireta (por meio dos particulares em colaboração com o Poder Público). Os

serviços notariais e registrais são prestados por particulares como pessoas físicas, portanto só

podem ser prestados de forma indireta pelo Poder Público, tendo em vista a prestação direta é

feita por entes personalizados.

Os serviços públicos notariais e registrais são de titularidade dos Estados Membros,

tendo em vista que o §1º do artigo 25 da CF atribuiu a estes, utilizando-se do critério residual,

todos aquelas competências que não sejam reservadas aos outros entes políticos (União e

Municípios). Como a Constituição Federal não atribuiu a competência para o ato de delegação

destas funções a nenhum dos poderes da república de forma específica, este deveria ser de

competência do Poder Executivo, que é o poder responsável por Administrar a máquina

pública, porém não foi o que decidiu o Conselho Nacional de Justiça, tendo atribuído tal

competência ao Poder Judiciário, por meio da Resolução nº 81.

A atribuição conferida ao Poder Judiciário pela Constituição Federal para promover os

concursos públicos para ingresso e remoção nas atividades notariais e registrais, bem como

para fiscalizar tais serviços não subentende a competência para a delegação dos mesmos. Pelo

contrário, confirma que deveria ser feita por outro poder, tendo em vista que, para a teoria dos

freios e contrapesos, o poder responsável pela fiscalização deve outro que não o seu titular.

Quanto ao vínculo entre os notários e registradores e o Poder Público, este é de

natureza estatutária (Lei nº 8.935/94) e não se confunde com o vínculo dos servidores

públicos (Lei nº 8.112/90), tendo em vista que não são titulares de cargos públicos (e sim de

funções públicas), não são remunerados pelos cofres públicos (e sim pelos usuários de seus

serviços) e não possuem vínculo empregatício (e sim funcional). Ressalvas as situações dos

servidores públicos das serventias extrajudiciais oficializadas (art. 32 da ADCT).

Os notários e registradores são particulares em colaboração com o Poder Público, na

qualidade de delegatários de função pública, assim como os concessionários e permissionários

de serviços públicos (art. 175 da CF), porém não se confundem com estes, tendo em vista

possuem regramentos distintos. Os notários e registradores ingressam nas atividades por meio

de aprovação em concurso público e as exercem como pessoas físicas. Estas funções são de

caráter técnico e administrativo (art. 1º da Lei nº 8.935/94), não constituindo atividade

Page 131: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

130

econômica ou de conteúdo econômico, sendo remuneradas pelo sistema tributário (taxa). Já os

concessionários e permissionários ingressam nas atividades por meio de processo licitatório e

as exercem na qualidade pessoas empresárias. São funções públicas que não se constituem

atividade econômica, porém possuem conteúdo econômico e são remuneradas por tarifa.

Apresentamos um quadro comparativo270

das características dos serviços notariais e

registras e dos serviços públicos concedidos e permitidos, de forma a diferenciá-los, tendo em

270

QUADRO RESUMITIVO E COMPARATIVO

CONCESSÕES E PERMISSÕES DE

SERVIÇOS PÚBLICOS

SERVIÇOS PÚBLICOS NOTARIAIS

E REGISTRAIS

A) Agentes

Particulares em colaboração com o

poder público – pessoas físicas ou

jurídicas

Particulares em colaboração com o poder

público – pessoas físicas (não são

servidores públicos)

B) Responsabilidade Civil e criminal Civil e criminal

C) Modalidade da

responsabilidade civil Objetiva Subjetiva

D) Fiscalização e sanção Poder concedente Poder Judiciário

E) Remuneração Preço público (tarifa) Tributo (taxa)

F) Ingresso Licitação (concorrência) Concurso Público

G) Natureza Jurídica Função pública Função pública

H) Prazo para abrir

processo seletivo Discricionário Seis meses da ultima vaga

I) Ato de delegação Contrato administrativo Delegação pelo Presidente do TJ local

J) Vínculo Contratual (ou misto – contratual e

regulatório) Estatutário (legal)

K) Transferibilidade Somente se houver autorização Intransferível

L) Duração Prazo do contrato (respeitados o

critérios legais)

Vitalício, não sujeito à aposentadoria

compulsória

M) Revogabilidade Por interesse público, mediante

indenização, se cabível Irrevogável

N) Transferência pelo

Poder Público

Apenas do exercício e não da

titularidade Apenas do exercício e não da titularidade

O) Titularidade Ente federado titular do serviço (União,

Estados, DF e Municípios) Estados membros

P) Regramento

constitucional Art. 175 (Ordem econômica) Art. 236 (Disposições gerais)

Q) Regramento infra

constitucional

Direito Público (Leis nº 8.987/95, nº

8.666/93, Dec.-Lei nº 200/67 etc.)

Direito Público (Leis nº 6.015/73, nº

8.935/95, nº 10.169/00 etc.)

R) Posicionamento na

Adm. Pública

Atividade típica prestada de forma

descentralizada

Atividade típica prestada de forma

descentralizada

S) Alteração unilateral

pela Administração

Possível, desde que respeitado o

equilíbrio econômico financeiro Impossível

T) Formas de extinção

Término do prazo contratual,

encampação, caducidade, rescisão,

anulação, falência ou extinção da

empresa etc.

Morte, aposentadoria facultativa,

invalidez, renúncia, perda – por sentença

judicial ou processo administrativo –,

descumprimento de gratuidade legal

U) Arbitragem Possível Impossível

V) Falência Possível Impossível (insolvência civil)

X) Natureza da atividade Não econômica, mas de conteúdo

econômico

Não econômica e de conteúdo não

econômico

Z) Imunidade dos

impostos Não (§3º art. 150 da CF) Não (decisão do STF)

Page 132: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

131

vista que o STF os equiparou para fins de enquadramento na regra do §3º do artigo 150 da CF

(vedação da concessão da imunidade tributária recíproca – impostos incidentes sobre os

serviços públicos). Estes particulares recebem apenas a titularidade da execução dos serviços

públicos e não a titularidade dos serviços em si, o que permanece com o Poder Público, tendo

em vista os princípios da indisponibilidade e da irrenunciabilidade. Portanto estas funções não

podem ser repassadas por estes colaboradores a terceiros, salvo nos casos dos concessionários

e permissionários, mediante autorização prévia e expressa do Poder Público.

Quanto à natureza jurídica dos emolumentos cartorários, tomando por base a teoria

pentapartida dos tributos adotada pelo STF (impostos, taxas, contribuições de melhorias,

empréstimo compulsório e contribuições especiais) e os critérios interpretativos do artigo 4º

do CTN (de que a natureza jurídica do tributo é determinada pelo fato gerador e não de sua

denominação ou destinação de seus recursos), analisamos cada espécie tributária para

definirmos em qual delas os emolumentos cartorários se encaixam.

O fato gerador dos impostos, em regra, é a simples a manifestação de riqueza pelo

contribuinte, não sendo necessária qualquer contraprestação estatal para que surja a obrigação

tributária. Portanto a prestação dos serviços notariais e registrais não pode ser considerada

fato gerador de imposto, tendo em vista que se trata a prestação efetiva de um serviços

público específico e divisível ao contribuinte, o que constitui fato gerados das taxas.

A contribuição de melhoria tem como fato gerador a valorização imobiliária do

contribuinte, desde que decorrente de obra pública, o que é incompatível com a prestação dos

serviços notariais e registrais. Portanto os emolumentos não podem ser classificados como

contribuição de melhoria.

Em relação ao empréstimo compulsório, a Constituição Federal não especificou qual é

o seu fato gerador, podendo ser qualquer um escolhido pelo legislador, desde que o produto

da arrecadação seja destinado a atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade

pública, de guerra externa ou sua iminência ou no caso de investimento público de caráter

urgente e de relevante interesse nacional.

Como vimos, o CTN considera apenas o fato gerador para se classificar em qual a

espécie tributária o tributo se encaixa, não importando a sua denominação ou destinação.

Portanto, seria necessário analisar a lei que eventualmente instituir o empréstimo compulsório

para então definirmos de que espécie se trata. Tal divergência se dá porque o CTN adota a

ZA) Classificação (Direito

Financeiro) Receita originária Receita derivada

Page 133: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

132

teoria tripartida dos tributos (impostos, taxas e contribuições de melhoria). Assim, o

empréstimo compulsório não é considerado espécie tributária autônoma para este Código. O

mesmo pensamento se aplica às contribuições especiais, tendo em vista que seria necessária a

análise da lei que as instituiu para determinar de qual espécie tributária se trata.

Estas contribuições são destinadas: a) Contribuições Sociais, ao financiamento da

seguridade social (assistência social, previdência social e saúde); b) Contribuição de

Intervenção no Domínio Econômico – CIDE, ao financiamento da atividade que interviu; c)

Contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas, a proporcionar a

organização e o financiamento destas entidades associativas.

Contudo a diferenciação doutrinária dos empréstimos compulsórios e das

contribuições especiais, em relação às outras modalidades tributárias, é o destino de suas

receitas, o que é incompatível com a prestação dos serviços notariais e registrais, tendo em

vista que os emolumentos cartorários são destinados a custear estes serviços, a remunerar os

notários e registradores e a outras despesas determinadas por lei de constitucionalidade

duvidosa.

Os serviços notarias e registrais consistem a prestação efetiva de um serviço público

específico e divisível, portanto são fatos geradores das taxas, nos termos do inciso II do artigo

145 da CF. Os serviços públicos remuneráveis por taxa devem preencher os requisitos da

especificidade (no sentido de se poder determinar com certeza quem são os seus usuários) e

da divisibilidade (no sentido de se poder determinar com certeza a quantidade do serviço que

cada usuário se beneficiou), o que é perfeitamente possível para estes serviços, tendo em vista

que os seus usuário são os requerentes de seus serviços, que se beneficiam nos exatos termos

dos atos ou negócios jurídicos prestados.

As taxas sustentam esta natureza jurídica somente até o limite da referibilidade, tendo

em vista que a arrecadação deve ser tão somente do necessário para se custear as suas

atividades, ou seja, não tem a finalidade de gerar lucros ou superávits. O que não acontece

com o sistema tarifário, aplicável aos serviços públicos concedidos e permitidos. Estes

seguem as regras de mercado e podem gerar lucro, apesar de não serem decorrentes de

atividade econômica.

A diferença substancial entre as taxas e as tarifas, de acordo com a súmula 545 do

STF, é a compulsoriedade dos serviços remunerados por Taxas, o que está presente nos

serviços notariais e registrais, tendo em vista que os seus usuários não possuem outro meio

para atingir os efeitos conferidos legalmente a estes serviços (publicidade, autenticidade,

segurança e eficácia dos atos jurídicos). O que não se aplica aos serviços públicos prestados

Page 134: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

133

por concessionários ou permissionários, tendo em vista que estes serviços não são

compulsórios, pois os particulares pode se utilizar de outros meios para atingir o mesmo

objetivo. Tanto a doutrina quando a jurisprudência do STF são unânimes em reconhecer a

natureza jurídica de taxa aos Emolumentos cartorários.

A Constituição Federal, quando trata das limitações ao poder de tributar, veda

expressamente que qualquer ente federado institua impostos sobre patrimônio, renda ou

serviços uns dos outros. Esta disposição é clausula pétrea, tendo em vista que protege a forma

federativa de Estado (incido I do §4º do artigo 60 da CF) e impede que um ente federado

intervenha em outro, utilizando-se da sua capacidade ativa tributária, de forma que prejudique

ou inviabilize a sua existência. Portanto, salvos as exceções (§3º do artigo 150 da CF), todos

os serviços públicos são imunes aos impostos.

Os serviços notariais e registrais são serviços públicos, o que é confirmado pelo seu

sistema remuneratório, tendo em vista que as taxas só podem ser instituídas, quando da

prestação de um serviço, em razão de serviços públicos. O sistema remuneratório tributário

(taxa) é uma decorrência jurídica da prestação de um serviço público. Toda taxa remunera um

serviço público, porém nem todo serviço público é remunerado por taxa. Podendo ser feito

por tarifa, nos casos dos serviços públicos não compulsórios.

Os serviços notariais e registrais, como serviços públicos remunerados por taxa, são

imunes à incidência dos impostos. Imunidade esta que beneficia apenas os serviços e não os

seus prestadores (notários e registradores) tendo em vista que a titularidade destes serviços

continua a pertencer aos entes federados. Apenas a execução do serviço que é de titularidade

dos particulares. Portanto o patrimônio, renda e serviços (que não sejam os notariais e

registrais) dos notários e registradores não são imunes aos impostos.

O §3º do artigo 150 da CF estabelece que a referida imunidade não se aplica ao

patrimônio, à renda e aos serviços: a) relacionados com exploração de atividades econômicas

regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos provados; b) em que haja contraprestação

ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário; e c) nem exonera o promitente comprador da

obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel. A exploração de atividade

econômica pelo Poder Público não pode receber qualquer privilégio fiscal (§2º do artigo 173

da CF) não extensivo à iniciativa privada, sob pena de infringir um dos princípios

fundamentas da República, a livre iniciativa (inciso I, in fine, do artigo 1º da CF).

A exploração da atividade econômica propriamente dita é no sentido empresarial, em

que o Poder Público atua por meio de suas empresas (Empresas Públicas e Sociedades de

Economia Mista), tendo em vista que a prestação de serviços públicos não considerada

Page 135: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

134

exploração de atividade econômica. Os serviços públicos não possuem finalidade econômica

ou empresarial, pois são pautados pelo princípio do interesse público, que tem o objetivo de

atender aos anseios da sociedade e não de gerar lucro.

Não ter o objetivo de obter lucro não quer dizer que este não possa existir. Pode até

existir, mas não foi o que fundamentou a instituição e a prestação do serviço público. Então os

serviços públicos podem ser divididos em: a) serviços públicos de conteúdo econômico; e b)

serviços públicos de conteúdo não econômico.

Os primeiros são aqueles serviços públicos prestados pelas empresas concessionárias

ou permissionárias de serviços públicos e remunerados pelo sistema tarifário (art. 175 da CF),

tendo em vista que estas atuam no sistema de mercado, em que vige a livre concorrência e a

livre iniciativa. São os serviços públicos em que há contraprestação ou pagamento de preços

ou tarifas pelo usuário. Estas empresas também não podem obter privilégios não extensíveis

aos outros particulares, sob pena de se frustrar a livre concorrência, que é um dos princípios

da atividade econômica, título em que estão inseridos estes serviços públicos (Da Ordem

Econômica e Financeira – arts. 170 ao 192). O sistema remuneratório tarifário está previsto no

artigo 175 da Constituição e se aplica exclusivamente aos serviços públicos concedidos e

permitidos por meio de processo licitatório.

Os serviços públicos de conteúdo não econômico são todos os demais, ou seja, aqueles

prestados pelo Poder Publico de forma direta (pela Administração Pública Direita ou Indireta)

ou indireta (particulares em colaboração com o Poder Público), remunerados diretamente

pelos cofres públicos ou pelo sistema tributário (taxa). Os serviços notariais e registrais são

prestação de serviços público de forma indireta (particulares com colaboração) pelo Poder

Publico, remunerados pelo sistema tributário.

O §3º do art. 150 da CF especificou quais os serviços públicos são excepcionados da

regra da imunidade recíproca dos impostos, sendo os serviços públicos de conteúdo

econômico, aqueles em que há pagamento de preço público ou tarifa. Caso o legislador

constituinte desejasse ressalvar desta imunidade todos os serviços prestados diretamente por

particulares, teria disposto expressamente que a vedação de os entes federados instituírem

impostos sobre os serviços uns dos outros não se aplica aos serviços prestados diretamente

por particulares, em vez de escolher o sistema remuneratório tarifário como critério para

exclusão desta imunidade.

Podemos concluir então que a prestação de um serviço público de titularidade dos

entes federados não remunerado pelo pagamento de preço público ou tarifa tem como

consequência inevitável a vedação da instituição de impostos prevista na alínea ―a‖ do inciso

Page 136: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

135

VI do artigo 150 da Constituição Federal. Os serviços notariais e registrais se incluem nesta

categoria, tendo em vista que são de titularidade dos Estados Membros (apenas o exercício é

transferido aos notários e registradores) e não são remunerados por preço público ou tarifa,

mas sim por taxa (tributo).

O Supremo Tribunal Federal, apesar de sua função precípua de guardião da

Constituição Federal (art. 102 da CF), decidiu, no julgamento da ADI 3.089/DF (o que foi

confirmado no julgamento do RE 756.915/RS, em 2013), em uma decisão claramente política

em defesa dos interesses arrecadatórios dos Municípios (Impostos sobre Serviços - ISS), por

equiparar os serviços notariais e registrais (art. 236 da CF) aos serviços públicos concedidos e

permitidos (art. 175 da CF) para fins de exclusão da imunidade dos impostos, apesar de

reconhecer no mesmo julgado que aqueles serviços são remunerados por taxa (emolumentos).

As referidas decisões partiram de argumentos desprovidos de fundamentos científicos

e chegaram a conclusões errôneas. O STF fundamentou as suas decisões afirmando que: a

imunidade recíproca é uma garantia ou prerrogativa imediata de entidades políticas

federativas, e não de particulares que executem, com inequívoco intuito lucrativo, serviços

públicos mediante concessão ou delegação, devidamente remunerados. Além de ressaltar a

capacidade contributiva dos notários e registradores.

Os serviços públicos notariais e registrais são de titularidade dos Estados Membros e

não dos particulares que os prestam, portanto a dita imunidade não é um privilégio destes

particulares, mas sim destes entes federados. Por outro lado, os serviços públicos, por se

fundamentarem no princípio do interesse público, não podem ter o intuito lucrativo ao mesmo

tempo, apesar de poderem gerar lucro. O que, no entanto, não é o suficiente para classificar

uma atividade como exploração de atividade econômica.

A capacidade contributiva é um princípio da relação jurídica tributária que visa

mensurar qual a exata porcentagem do patrimônio do sujeito passivo deve ser atingida por

meio da tributação para que não seja quebrado o princípio da proporcionalidade e não lhe

sejam exigidos recursos maiores do que o efetivamente é devido à sociedade. Esta capacidade

deve ser avaliada em razão do que fundamentou a tributação. Em relação ao ISS, deve-se

avaliar a capacidade contributiva do serviço que é prestado e não de seu prestador. Os

serviços públicos, salvo os remunerados por tarifas, não possuem capacidade contributiva por

expressa disposição constitucional, o que envolve os serviços notariais e registrais.

Este princípio difere da capacidade econômica, que é a disponibilidade de recursos

que uma pessoa detém. O fato de existirem recursos financeiros disponíveis não dá poder ao

Estado para que se utilize da sua capacidade tributária ativa além do que a capacidade

Page 137: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

136

contributiva permite, sob pena de se ferir diversos princípios constitucionais, como:

proporcionalidade, propriedade privada, não confisco etc.

A corte suprema fez tábula rasa da Constituição Federal e a reescreveu para negar (de

forma inconstitucional) a imunidade dos impostos aos serviços notariais e registrais, ferindo a

forma Federativa do Estado Brasileiro, tendo em vista que permitiu os Municípios tributarem

serviços públicos de titularidade dos Estados Membros, e a separação constitucional dos

poderes, tendo em vista que não cabe ao Poder Judiciário eleger as escolhas públicas, mas sim

guardá-las a sete chaves. As escolhas públicas são tomadas pelo povo por meio do poder

constituinte originário e do legislador ordinário (Poder Legislativo).

Page 138: A NATUREZA JURÍDICA DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS E DE …

137

REFERÊNCIAS

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______. Lei nº 10.169, de 29 de dez. de 2000. Regula o § 2o do art. 236 da Constituição

Federal, mediante o estabelecimento de normas gerais para a fixação de emolumentos

relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro. Diário Oficial [da]

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______. Lei nº 12.618, de 30 de abr. de 2012. Institui o regime de previdência

complementar para os servidores públicos federais titulares de cargo efetivo, inclusive os

membros dos órgãos que menciona; fixa o limite máximo para a concessão de

aposentadorias e pensões pelo regime de previdência de que trata o art. 40 da

Constituição Federal; autoriza a criação de 3 (três) entidades fechadas de previdência

complementar, denominadas Fundação de Previdência Complementar do Servidor

Público Federal do Poder Executivo (Funpresp-Exe), Fundação de Previdência

Complementar do Servidor Público Federal do Poder Legislativo (Funpresp-Leg) e

Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder

Judiciário (Funpresp-Jud); altera dispositivos da Lei no 10.887, de 18 de junho de 2004;

e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 2 mai.

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______. Resolução nº 80 do Conselho Nacional de Justiça de 09/06/2009. Declara a

vacância dos serviços notariais e de registro ocupados em desacordo com as normas

constitucionais pertinentes à matéria, estabelecendo regras para a preservação da ampla

defesa dos interessados, para o período de transição e para a organização das vagas do

serviço de notas e registro que serão submetidas a concurso público. Diário Oficial [da]

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______. Resolução nº 81 do Conselho Nacional de Justiça de 09/06/2009. Dispõe sobre os

concursos públicos de provas e títulos, para a outorga das Delegações de Notas e de

Registro, e minuta de edital. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 16

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