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A Modificação do Sujeito Passivo com a Disciplina da Responsabilidade Tributária
Gustavo Saad Diniz advogado
Sumário: 1. Introdução - 2. Sujeição passiva direta e indireta – 3. Responsabilidade sucessória – 3.1. Sucessão nos tributos originados dos bens imóveis – 3.2. Responsabilidade pessoal – 3.3. Responsabilidade sucessória na alienação de pessoa jurídica – 4. Responsabilidade solidária de terceiros – 5. Responsabilidade pessoal de terceiros (art. 135 do CTN) – 6. Responsabilidade da pessoa que deve reter tributos na fonte e repassar à Fazenda Pública.
1. Introdução
Sobre o fato jurídico tributário atua a hipótese de incidência (ocorrência do fato
gerador na linguagem do CTN – art. 113, §1º), desde que previstos em lei todos os
elementos (espacial, temporal e material) e conseqüentes (base de cálculo e alíquotas),
conferindo ao sujeito ativo (arts. 119 e 120 do CTN) uma obrigação oponível contra o
sujeito passivo (arts. 121 e seguintes do CTN). Com a caracterização das partes envolvidas
(sujeitos ativo e passivo), a definição do objeto (tributação) e o vínculo, obtém-se a
obrigação tributária, que é o meio que permite à Fazenda Pública a consecução do escopo
de exigir do contribuinte uma prestação, representada pelo crédito tributário. Sob o ponto
de vista material, a existência e a validade da obrigação tributária e, consequentemente, do
crédito tributário, têm a ocorrência a partir do fenômeno jurídico da incidência. A eficácia
ocorre após a formalização, através do lançamento1. É o que ALFREDO AUGUSTO BECKER
denomina relação jurídica de conteúdo máximo, obtida a partir da incidência da regra
jurídica sobre o conteúdo fático, gerando: direito, pretensão, coação e dever, obrigação e
sujeição2.
1 Nada obstante esse entendimento mais atualizado, deve-se anotar que o CTN optou por apontar a “constituição pelo lançamento” como o verdadeiro para a ocorrência do crédito tributário (art. 142 do CTN). Por isso se justifica a antinomia do art. 139: “o crédito tributário decorre da obrigação principal”. 2 Alfredo Augusto Becker. Teoria Geral do Direito Tributário. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1972. p. 312.
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Diante do vínculo obrigacional instituído entre o Estado (sujeito ativo) e o
contribuinte (sujeito passivo), passa a ser exigível, compulsoriamente, uma prestação
(objeto), com os respectivos acessórios (obrigações acessórias). Não adimplida a
obrigação, o sujeito passivo passa a ser responsável pelo cumprimento da prestação
pecuniária compulsória (art. 3º do CTN). Portanto, a compreensão lata de responsabilidade
tributária é a conseqüente exigência feita ao sujeito passivo, que descumpre a obrigação
tributária ocorrida e formalizada pelo lançamento.
Este lato conceito de responsabilidade, pela sistemática do CTN, tem a
compreensão estrita quando se apresenta como: a) sucessória; b) solidária de terceiros; c)
pessoal de terceiros; d) personalização da responsabilidade quando houver cometimento de
infrações. Para empreender um estudo mais lógico, é imprescindível diferir a
caracterização econômica do sujeito passivo, de modo que não sejam cometidos equívocos
na análise da responsabilidade.
2. Sujeição passiva direta e indireta
O sujeito passivo da obrigação principal é o devedor do tributo e respectiva
penalidade pecuniária (art. 121 do CTN). A sistemática do CTN, no art. 122, ainda define
o sujeito passivo da obrigação acessória, como sendo a pessoa obrigada às demais
prestações (dar, fazer e não-fazer) componentes do objeto principal, que é o pagamento do
tributo. Impende analisar com o tributarista LUCIANO AMARO, que “a identificação do
sujeito passivo da obrigação principal (gênero) depende apenas de verificar quem é a
pessoa que, à vista da lei, tem o dever legal de efetuar o pagamento da obrigação, não
importando indagar qual o tipo de relação que ela possui com o fato gerador”3.
Além dessa conceituação, ainda se diz que o sujeito passivo da obrigação
principal se subdivide em dois comportamentos (art. 121, parágrafo único): a)
contribuinte: quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o
respectivo fato gerador4. Se não cumpre a obrigação tributária, o contribuinte é o próprio
3 Luciano Amaro. Direito Tributário Brasileiro. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 280. 4 Arnaldo Borges. O Sujeito Passivo da Obrigação Tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 58-60.
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responsabilizado pela conduta antijurídica que gerou a sanção pelo inadimplemento; b)
responsável: sem se revestir necessariamente na condição de contribuinte, a obrigação do
responsável decorre de disposição expressa de lei, configurando o que LUCIANO AMARO
denomina “modificação subjetiva no polo passivo da obrigação”5. O responsável não é
titular da obrigação, mas a ele pode ser imponível a sanção.
Muito embora o prof. PAULO DE BARROS CARVALHO não reconheça
juridicidade ao conteúdo econômico da sujeição passiva6, porque sempre que a lei
determinar o sujeito estar-se-á diante de sujeição passiva direta, para compreensão da
responsabilidade tributária é imprescindível engendrar esta diferenciação. Foi o tributarista
RUBENS GOMES DE SOUSA quem empreendeu estudo específico dos efeitos econômicos da
sujeição passiva, classificando-a como direta e indireta7.
Ainda segundo a classificação de RUBENS GOMES DE SOUSA, duas são as
modalidades de sujeição passiva indireta, quais sejam, por transferência e por
substituição8. Por transferência pura e simples, três condutas são praticadas pelo sujeito
passivo direto: solidariedade, sucessão e responsabilidade. Assim são descritas as
modalidades nas palavras do tributarista:
“A) Transferência: ocorre quando a obrigação tributária, depois de ter surgido
contra uma pessoa determinada (que seria o sujeito passivo direto), entretanto, em virtude
de um fato posterior, transfere-se para outra pessoa diferente (que será o sujeito passivo
indireto). As hipóteses de transferência, como dissemos, são três, a saber:
a) solidariedade: é a hipótese em que duas ou mais pessoas seja
simultaneamente obrigadas pela mesma obrigação. No caso de condomínio (imóvel com
mais de um proprietário), o Município pode cobrar o imposto predial de qualquer dos
proprietários, à sua escolha (...);
b) sucessão: é a hipótese em que a obrigação se transfere para outro devedor
em virtude do desaparecimento do devedor original; esse desaparecimento pode ser por
5 Luciano Amaro. Op. cit. p. 285. Também: Arnaldo Borges. Op. cit. 60-66. 6 Paulo de Barros Carvalho. Curso de Direito Tributário. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 219. 7 Rubens Gomes de Sousa. Compêndio de Legislação Tributária. 2ª ed. São Paulo: Resenha Tributária, 1975. p. 92. 8 Luciano Amaro diferencia transferência e substituição nos seguintes termos: “A diferença entre ambas estaria em que, na substituição, a lei desde logo põe o ‘terceiro’ no lugar da pessoa que naturalmente seria definível como contribuinte, ou seja, a obrigação tributária já nasce com seu pólo passivo ocupado por um substituo legal tributário. Diversamente, na transferência, a obrigação de um devedor (que pode ser um contribuinte ou um responsável) é deslocada para outra pessoa, em razão de algum evento” (Luciano Amaro. Op. cit. p. 289).
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morte do primeiro devedor (a obrigação se transfere aos herdeiros) ou por venda do imóvel
ou estabelecimento tributado (a obrigação se transfere ao comprador);
c) responsabilidade: é a hipótese em que a lei tributária responsabiliza outra
pessoa pelo pagamento do tributo, quando não seja pago pelo sujeito passivo direto. No
imposto Sisa (transmissão de propriedade inter vivos), o tabelião é responsável pelo
imposto se não providenciar a sua cobrança no ato de passar a escritura.
B) Substituição: ocorre quando, em virtude de uma disposição expressa de lei,
a obrigação tributária surge desde logo contra uma pessoa diferente daquela que esteja em
relação econômica com o ato, fato ou negócio tributado: nesse caso, é a própria lei que
substitui o sujeito passivo direto por outro indireto (...)”9.
Diante das orientações esposadas, pode-se empreender melhor análise em torno
do dispositivo do art. 128 do CTN, que preconiza: “Sem prejuízo do disposto neste
Capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a
terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a
responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do
cumprimento total ou parcial da referida obrigação”.
Assim, estar-se-á enfrentando, neste trabalho, a situação do sujeito passivo da
obrigação principal que, por expressa disposição de lei10, é considerado responsável pelo
9 Rubens Gomes de Sousa. Compêndio de Legislação Tributária. 2ª ed. São Paulo: Resenha Tributária, 1975. p. 92-93. 10 A obediência ao princípio da legalidade nessa matéria foi observada pelo STJ no seguinte caso concreto: “Tributário. Responsabilidade. ICMS. Isenção. Fertilizantes. Uso indevido por terceiros. Artigos 121, 124 e 176, CTN. 1 — A responsabilidade tributária é pessoal. Não permite o ordenamento jurídico a sua transferência a quem não produz fato capaz de fazer gerar a sua incidência. 2 — É inadmissível a pretensão fiscal de exigir do comerciante, vendedor de produto isento (no caso, fertilizante para emprego na agricultura), o pagamento do ICMS, por ter o comprador, usuário do referido produto, desviado a finalidade de sua aplicação. 3 — À Fazenda Estadual cabe, na espécie, exigir o tributo do contribuinte de fato, autor do desvio, e não do comerciante vendedor, por este não ter meios legais de fiscalizar o comportamento do adquirente do produto. 4 — Homenagem ao princípio da legalidade em se tratando da fixação da responsabilidade tributária. 5 — Recurso provido” (STJ – 1ª Turma - REsp nº 85.888 — SP – Rel. Min. José Delgado – DJ 20.05.96 – RSTJ 87/118). Em doutrina: Henry Gonçalves Lummertz. A Inconstitucionalidade e a Ilegalidade da Instrução Normativa nº 022/99. Síntese. Porto Alegre. Revista de Estudos Tributários. (7):129-134. Mai-Jun/1999. Também do STJ, dando guarida jurisprudencial à tese defendida: “I – O comerciante que adquire mercadoria de pessoa jurídica regularmente inscrita, mediante nota fiscal e comprova o respectivo pagamento do preço e do ICMS não pode ser responsabilizado pela omissão da vendedora, em recolher o tributo. Imputar responsabilidade ao comprador, em tal situação, seria atribuir a terceiro, sem previsão legal, responsabilidade tributária, em flagrante ofensa ao Art. 128 do CTN. II – Não é lícito exigir do comprador, que recolha novamente o tributo, que ele pagara ao adquirir a mercadoria. Semelhante exigência ofenderia o princípio da não-cumulatividade. III – O Art. 112 do CTN tempera o dispositivo do Art. 128, determinando se levem em consideração as circunstância que envolvem os fatos. Na hipótese, a teor dos autos, nem mesmo o Fisco tinha conhecimento da situação irregular da fornecedora (STJ – 1ª Turma – REsp nº 189.428-SP – Rel. Min. Humberto Gomes de Barros – DJ 17.12.1999 – p. 00328).
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pagamento do tributo, por conta de situações fáticas-econômicas de transferência
(solidariedade, sucessão e responsabilidade) e substituição, todas contempladas em lei
específica. De se ressaltar que a eleição de terceiro responsável é baseada em critérios
pragmáticos de pertinência e necessidade para potencialização do pagamento e,
necessariamente, o terceiro deverá estar vinculado ao fato jurídico tributário por conta de
existência de nexo jurídico ou econômico11.
Finalmente, é mister analisar a natureza da norma de responsabilidade
tributária. A relação jurídica tributária normal toma por base a ocorrência de um fato
jurídico tributo, subsumido por uma hipótese de incidência de tributo. Na hipótese de
incidência, contempla-se (além dos aspectos material, espacial, temporal) o conseqüente de
determinação do sujeito passivo do tributo.
Ocorrida a hipótese de incidência da regra de responsabilidade, em virtude de
um fato previsto em lei, o sujeito passivo direto fica desobrigado, total ou parcialmente, do
pagamento do tributo, passando a obrigação tributária e responsabilidade de pagamento
para o responsável previsto em lei. Assim, a regra de responsabilidade, consagrada pelo
CTN, é norma estrutural, que faz alterar o conseqüente de sujeição passiva da hipótese de
incidência do tributo. Não se suprime o sujeito passivo originário, mas se acrescenta um
responsável por sucessão, solidariedade ou subsidiariedade.
O comum na sujeição passiva indireta por transferência é que a obrigação
primeiro está fixada em relação ao sujeito passivo direto (contribuinte ou destinatário legal
do tributo), sendo por disposição legal transferida ao sujeito passivo indireto, desde que
ocorrendo o fator de sub-rogação.
3. Responsabilidade sucessória
11 Sacha Calmon Navarro Coêlho cita o catedrático Ruy Barbosa Nogueira para justificar a vinculação econômica: “Se pensarmos no aspecto econômico da tributação, é fácil compreendermos a razão ou necessidade desta vinculação do contribuinte ou responsável ao fato econômico tributado, não só porque a vantagem ou resultado dele decorrente é que vai possibilitar o pagamento do tributo ao fisco, mais porque assim a lei atenderá ao princípio fundamental de justiça tributária, segundo o qual se deve atingir a capacidade econômica do contribuinte – capacidade contributiva” (Ruy Barbosa Nogueira apud Sacha Calmon Navarro Coêlho. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 603).
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Observou-se economicamente que, na sujeição passiva indireta por sucessão, a
obrigação é transferida para outra pessoa em virtude do desaparecimento do devedor
original, por morte ou alienação da propriedade ou de estabelecimento. O fenômeno
econômico foi positivado e reconhecido pelo CTN, atribuindo-se-lhe juridicidade à
modificação do sujeito passivo.
Assim, a matéria mereceu relevo no CTN, em especial no entrecorte normativo
dos arts. 129 a 133.
No art. 129, define-se o critério temporal de incidência das regras de
responsabilidade por sucessão: “O disposto nesta Seção aplica-se por igual aos créditos
tributários definitivamente constituídos ou em curso de constituição à data dos atos nela
referidos, aos constituídos posteriormente aos mesmos atos, desde que relativos a
obrigações tributárias surgidas até a referida data”. Nesse caso, especificamente, a
sistemática do CTN houve por bem delimitar a indistinta incidência da norma de
responsabilidade por sucessão, tomando-se por base o fato jurídico gerador da obrigação
tributária: a) créditos tributários em constituição (ou em formalização por lançamento) e
referentes ao fato jurídico tributário ocorrido; b) créditos tributários constituídos
(formalizados); c) créditos tributários formalizados, referindo-se a obrigações tributárias
ocorridas na época do falecimento ou alienação de propriedade ou estabelecimento.
3.1. Sucessão nos tributos originados dos bens imóveis
Especificando no tema, o art. 130 do CTN determina a regra de sucessão
advinda de “créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o
domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de
serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria”, sub-rogando na pessoa dos
respectivos adquirentes a responsabilidade pelo pagamento do tributo. Daí a importância
de manter atualizado o cadastro físico do imóvel junto ao órgão público competente, de
modo a evitar a cobrança injustificada dos proprietários anteriores. Aliás, é ZELMO DENARI
quem adverte para o descompasso entre o “titular da posição debitória (contribuinte em
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cujo nome encontra-se cadastrado o imóvel) e o titular da relação tributária pressupostual
(o adquirente, novo titular do domínio ou posse do imóvel cadastrado)”12.
É o caso da definição legal do art. 5º, da Lei nº 9.393/96, que regulamenta o
ITR e que dispõe, literalmente, ser “responsável pelo crédito tributário o sucessor, a
qualquer título”.
Ressalva-se, neste caso, se o adquirente inserir no título aquisitivo as certidões
negativas de débitos referentes a tributos devidos pelo alienante, originados a partir da
propriedade alienada. Ou seja, com a prova da quitação a obrigação não se transfere ao
sucessor.
O parágrafo único do art. 130, ainda faz distinção em relação à aquisição de
propriedade por arrematação em hasta pública, afirmando que a sub-rogação nos tributos
ocorrerá sobre o preço de arrematação. Em outras palavras, o arrematante não se onera
com a aquisição por hasta pública porque, no preço de arrematação depositado, sub-roga-
se a Fazenda Pública, abatendo o montante que corresponde à obrigação tributária oriunda
do imóvel13. Interpretando o dispositivo já se posicionou o 1º Tribunal de Alçada Civil do
Estado de São Paulo: “Alienação Judicial - Hasta pública - Arrematação de imóvel -
Débitos de imposto predial - Cobrança contra o arrematante - Inadmissibilidade -
Aplicação do art. 130, parágrafo único, do CTN. Por força do art. 130, parágrafo único, do
CTN, no caso de arrematação de imóvel em hasta pública a sub-rogação dos créditos
relativos a impostos sobre a propriedade predial e territorial não ocorre na pessoa dos
respectivos adquirentes, mas sobre o respectivo preço”14.
Além disso, o art. 130 do CTN projeta-se sobre a definição de competência
para execução fiscal. Assim, o parágrafo único do art. 578 do CPC define a competência
para execução fiscal dos débitos oriundos da propriedade imóvel, facultando à Fazenda
Pública escolher o foro da situação dos bens, quando a dívida deles se originar ou o foro do
domicílio do executado.
12 Zelmo Denari. Solidariedade e Sucessão Tributária. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 111. 13 Esta, inclusive, é conseqüência da preferência do crédito tributário sobre os demais (art. 186 do CTN). 14 1º TACivSP – Ap. 313.085 – 7ª C. – j. 29.11.83 – rel. Juiz Osvaldo Caron – v.u. – RT 582/102. No mesmo sentido: 1º TACivSP – Ap. 303.593 – 3ª C. – j. 25.5.83 – rel. Juiz Nelson Schiavi – v.u. – RT 582/125. 1º TACivSP – Ap. 362.495 – 8ª C. – j. 28.11.86 – rel. Juiz Rodrigues de Carvalho – RT 617/101.
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3.2. Responsabilidade pessoal
A responsabilidade pessoal dos sucessores ocorre em três casos taxativamente
enumerados pelo art. 131 do CTN.
O primeiro caso é a responsabilidade sucessória pessoal do adquirente ou
remitente, pelos tributos relativos a bens adquiridos ou remidos.
Já o segundo caso enumerado pelo art. 131 do CTN diz respeito ao “sucessor a
qualquer título e o cônjuge meeiro, pelos tributos devidos pelo de cujus até a data da
partilha ou adjudicação, limitada esta responsabilidade ao montante do quinhão, do legado
ou da meação”. Trata-se da responsabilidade sucessória do herdeiro ou do legatário,
limitando a exigibilidade pelo Estado às forças do patrimônio deixado pelo de cujus
(montante do quinhão, do legado e da meação)15.
Finalmente, considera-se sucessor e pessoalmente responsável o espólio, pelos
tributos devidos pelo de cujus até data da abertura da sucessão. O prof. EDUARDO
MARCIAL FERREIRA JARDIM, com o suporte de ALIOMAR BALEEIRO, entende que há
abrangência dos “tributos deixados pelo de cujus tanto antes da abertura da sucessão como
até o momento da partilha”16. Ademais, para a homologação da partilha, o art. 192 do CTN
exige que haja prova da quitação de todos os tributos relativos aos bens do espólio ou às
suas rendas.
3.3. Responsabilidade sucessória na alienação de pessoa jurídica
15 Dispõe o art. 23 do RIR (Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999). “São pessoalmente responsáveis (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, artigo 50, e Lei nº 5.172, de 1966, artigo 131, incisos II e III): I - o sucessor a qualquer título e o cônjuge meeiro, pelo tributo devido pelo de cujus até a data da partilha ou adjudicação, limitada esta responsabilidade ao montante do quinhão, do legado, da herança ou da meação; II - o espólio, pelo tributo devido pelo de cujus até a data da abertura da sucessão. § 1º Quando se apurar, pela abertura da sucessão, que o de cujus não apresentou declaração de exercícios anteriores, ou o fez com omissão de rendimentos até a abertura da sucessão, cobrar-se-á do espólio o imposto respectivo, acrescido de juros moratórios e da multa de mora prevista no artigo 964, I, "b", observado, quando for o caso, o disposto no artigo 874 (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, artigo 49)” (...). 16 Eduardo Marcial Ferreira Jardim. Manual de Direito Financeiro e Tributário. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 235. No mesmo sentido: Luciano Amaro. Op. cit. p. 304. Arnaldo Borges. Op. cit. p. 88.
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Outros dois casos de responsabilidade sucessória estão arrolados nos arts. 132
e 133 do CTN, tratando, respectivamente, (a) da responsabilidade tributária do sucessor de
fundo de comércio que desaparece por fusão, transformação ou incorporação e (b) da
responsabilidade de adquirente por sucessão de empresa que prosseguir na exploração da
atividade.
O dispositivo do art. 132 prevê a responsabilidade pela alteração societária
ocorrida em virtude de fusão, incorporação ou transformação de duas ou mais empresas.
A fusão é negócio jurídico, devidamente aprovado em Assembléia Geral, para
união de duas ou mais sociedades, de tipos iguais ou diferentes, formando uma sociedade
nova, que sucede em todos os direitos e obrigações (art. 228, da Lei nº 6.404/76). Por sua
vez, a incorporação decorre de negócio entabulado para que uma ou mais sociedades
sejam absorvidas por outra, que lhes sucede em todos os direitos e obrigações, inclusive
tributários (art. 227, da Lei nº 6.404/76 e 132 do CTN). Finalmente, o caput do art. 132
enumera a transformação societária como causa de responsabilidade societária.
Diferentemente dos dois outros casos antes referidos, na transformação não ocorre
extinção de uma pessoa jurídica em detrimento de outra. Há, isto sim, uma alteração na
estrutura societária da empresa, passando de um tipo para o outro (art. 220, da Lei nº
6.404/76). O que o art. 132 do CTN contempla, em verdade, não é a sucessão por extinção,
mas a continuação da obrigação tributária anterior à transformação, sendo perfeitamente
oponível contra a sociedade transformada.
Cabe ressaltar, contudo, que a Leis das Sociedades Anônimas, de 1976,
posteriormente ao CTN, regulou o instituto jurídico da cisão. Trata-se de operação jurídica
pela qual “a companhia transfere parcelas do seu patrimônio para uma ou mais sociedades,
constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, se houver
versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão” (art.
229, da Lei nº 6.404/76). Na cisão total, com extinção da cindida, a sociedade que absorver
parcela do patrimônio da companhia cindida sucede a esta nos direitos e obrigações
relacionados no ato da cisão (primeira parte do §1º, do art. 229, da Lei nº 6.404/76).
Na cisão parcial ou na cisão total com repartição entre duas outras sociedades,
divide-se o patrimônio (ativo e passivo) da sociedade cindida, inclusive tributos
eventualmente devidos, que, por convenção particular, podem ser divididos no negócio de
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cisão (art. 233, parágrafo único, da Lei nº 6.404/7617). Ou seja, as sociedades que
absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida sucederão a esta, na proporção
dos patrimônios líquidos transferidos, nos direitos e obrigações não relacionados (§1º, do
art. 229, da Lei nº 6.404/76).
Entretanto, regras de direito privado são inoponíveis à Fazenda Pública titular
do tributo (art. 123, do CTN). Assim, surge uma omissão normativa que não permite a
responsabilidade sucessória das empresas que absorveram a cindida, gerando complexa
discussão doutrinária e, consequentemente, utilização do instituto jurídico para
planejamentos tributários, muitos lícitos, mas outros tantos vacilantes entre a elisão (tax
avoidance) e a evasão (tax evasion).
O que a doutrina tem admitido, em verdade, é que se a cisão for total, as
sociedades resultantes respondem solidariamente pelas obrigações tributárias pendentes.
Repita-se: à Fazenda Pública não pode ser aplicado qualquer pacto entre as sociedades
resultantes da cisão.
Por outro lado, se a cisão for parcial, subsiste a sociedade cindida como sujeito
passivo da obrigação tributária. No entanto, na hipótese de transferência de patrimônio
para as sociedades resultantes, estas sociedades responderão de forma subsidiária pelo
pagamento do débito tributário. Sustenta-se esta pretensão da Fazenda Pública no art. 133,
inciso II e 185, ambos do CTN18, além do caput do art. 233 da Lei nº 6.404/7619.
Nada obstante, ainda existem entendimentos contrários dizendo ser
imprescindível dispositivo legal específico, regulando a matéria.
A interpretação exposta, nesse sentido, vai na linha da norma prevista no art. 5º
do Decreto-Lei nº 1.598/77, que regulou a responsabilidade em relação à cisão no
pagamento do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica. Aliás, o dispositivo foi adotado
pelo Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999, que aprovou o RIR/99, dispondo in litteris
o seguinte: 17 “Parágrafo único. O ato de cisão parcial poderá estipular que as sociedades que absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida serão responsáveis apenas pelas obrigações que lhes forem transferidas, sem solidariedade entre si ou com a companhia cindida, mas, nesse caso, qualquer credor anterior poderá se opor à estipulação, em relação ao seu crédito, desde que notifique a sociedade no prazo de 90 (noventa) dias a contar da data da publicação dos atos da cisão”. 18 Arnaldo Borges. Op. cit. p. 96. Entendendo ser aplicável, no caso, o art. 132 do CTN: Sacha Calmon Navarro Coêlho. Op. cit. p. 623. 19 Art. 233. Na cisão com extinção da companhia cindida, as sociedades que absorverem parcelas do seu patrimônio responderão solidariamente pelas obrigações da companhia extinta. A companhia cindida que
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“Art. 207. Respondem pelo imposto devido pelas pessoas jurídicas
transformadas, extintas ou cindidas (Lei nº 5.172, de 1966, artigo 132, e Decreto-Lei nº
1.598, de 1977, artigo 5º):
(...)
II - a pessoa jurídica constituída pela fusão de outras, ou em decorrência de
cisão de sociedade;
Parágrafo único. Respondem solidariamente pelo imposto devido pela pessoa
jurídica (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, artigo 5º, § 1º):
I - as sociedades que receberem parcelas do patrimônio da pessoa jurídica
extinta por cisão;
II - a sociedade cindida e a sociedade que absorver parcela do seu patrimônio,
no caso de cisão parcial”.
Em outro sentido de raciocínio, não é de se admitir a responsabilidade
tributária da cindida, na cisão parcial, por débitos vinculados ao estabelecimento da
empresa resultante da cisão, posterior a este ato. Assim se pronunciou o TRF 1ª Região:
“1. Encontrando-se o débito vinculado a estabelecimento pertencente à empresa resultante
do processo de cisão, não cabe à Embargante, empresa primitiva, suportar a exigência
fiscal de responsabilidade daquela, em consonância com o disposto no art. 132, do CTN,
pelo que é parte ilegítima para figurar no pólo passivo da Execução. 2. Precedentes do
TRF/1ª Região. 3. Provimento da apelação. Sentença reformada”20.
Além destes três casos enumerados no caput, o parágrafo único do art. 132
trata da extinção da pessoa jurídica de direito privado e a continuação da exploração da
atividade por qualquer sócio remanescente, ou seu espólio, sob a mesma ou outra razão
social, ou sob firma individual. Trata-se de caso de sucessão empresarial, com
oponibilidade do tributo em desfavor do ex-sócio da empresa extinção, se houver solução
de continuidade nas atividades da empresa extinta, sob a mesma ou outra razão social.
O último caso de sucessão arrolado pelo CTN, diz respeito ao adquirente de
empresa que prosseguir na exploração da mesma atividade, independentemente da
mudança de nome comercial ou estrutura jurídica. Este é o conteúdo do art. 133 do CTN:
subsistir e as que absorverem parcelas do seu patrimônio responderão solidariamente pelas obrigações da primeira anteriores à cisão. 20 TRF 1ª Região – AC 95.01.12719-2 – BA – 4ª T. – Rel. Juiz Conv. Alexandre Vidigal – DJU 08.10.1999 – p. 569 – RET 11/78.
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“Art. 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra,
por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou
profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob
firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento
adquirido, devidos até a data do ato:
I - integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou
atividade;
II - subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou
iniciar dentro de 6 (seis) meses, a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou
em outro ramo de comércio, indústria ou profissão”21.
Duas ressalvas iniciais quanto à interpretação do dispositivo são
imprescindíveis. Em primeiro lugar, ao se falar em fundo de comércio ou estabelecimento
adquirido deve-se interpretar como sendo o conjunto de bens incorpóreos (nome
comercial, marcas, patentes, clientela) e corpóreos (prédios, máquinas, dentre outros),
respectivamente. Por segunda ressalva, entenda-se que o art. 133 limita a responsabilidade
do adquirente somente em relação aos tributos relativos ao estabelecimento ou fundo de
comércio alienado. Assim, responderá o adquirente por ICMS de mercadorias vendidas
pela alienante, mas não terá qualquer obrigatoriedade no pagamento de IOF das operações
financeiras. Portanto, a responsabilidade se circunscreve ao que for relativo à atividade
econômica substituída.
Além disso, deve se considerar a cumulatividade de requisitos, não bastando
tão-somente a ocupação de mesmo espaço físico, sem aproveitamento do fundo de
comércio. Interessante o posicionamento do STJ, em relação à interpretação da ocupação
de mesmo prédio: “A responsabilidade prevista no artigo 133 do Código Tributário
Nacional só se manifesta quando uma pessoa natural ou jurídica adquire de outra o fundo
de comércio ou o estabelecimento comercial, industrial ou profissional; a circunstância de
que tenha de instalado em prédio antes alugado à devedora, não transforma quem veio a
ocupá-lo posteriormente, também por força de locação, em sucessor para efeitos
tributários. Recurso especial não conhecido”22.
21 Com mesmo conteúdo: art. 208 do RIR (Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999). 22 STJ – 2ª T. – REsp nº 108.873-SP – Rel. Min. Ari Pargendler – j. 04.03.1999 – DJ 12.04.1999. No mesmo sentido: TRF 3ª Região – 2ª Turma – Ap. Civ. 91.03.28225-2 – Rel. Des. Fed. Aricê Amaral – j. 03.09.1996.
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Outro aspecto, é o discrímen de circunstâncias feito pelo art. 133, tomando por
base fática a cessação ou não de atividades pelo alienante do estabelecimento.
Assim, haverá responsabilidade integral do adquirente do estabelecimento, se
houver aquisição e exploração imediata do comércio, indústria ou outra atividade, sob a
mesma ou outra razão social ou até mesmo na forma de firma individual. Cessa toda e
qualquer obrigação tributária para o alienante neste caso, transmitindo-se a
responsabilidade para o adquirente do estabelecimento23.
Por outro lado, será subsidiária a responsabilidade se o alienante prosseguir na
exploração ou iniciar dentro de seis meses, a contar da data da alienação, nova atividade no
mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão. Em outros termos, o
alienante prossegue como principal obrigado ao pagamento do tributo, sendo respaldado
subsidiariamente por quem adquire o estabelecimento. Com relação ao dispositivo é
esclarecedora a orientação de LUCIANO AMARO: “O dispositivo busca evitar que, na venda
de estabelecimento, o alienante se livre do patrimônio que poderia dar respaldo a suas
obrigações tributárias. Se o alienante continua em atividade, ou a reinicia, presume-se que
mantenha a capacidade de pagar suas obrigações tributárias. Caso, apesar disso, não a
mantenha, e na medida em que não a mantenha, opera a responsabilidade subsidiária do
adquirente pelos tributos gerados pela exploração do estabelecimento sob gestão do
alienante”24. Acrescendo na interpretação, ZELMO DENARI entende que o nexo sucessório
regulado comporta benefício de ordem, devendo ser excutidos os bens do antecessor25.
Finalmente, valemo-nos dos ensinamentos de SACHA CALMON NAVARRO
COÊLHO para relevar algumas dissidências doutrinárias e jurisprudenciais quanto ao tema:
“Cuidados especiais devem ser, no entanto, tomados pelos adquirentes para garantir os
seus interesses. Quando o sucedido tem vários estabelecimentos, convém clarificar se a
aquisição é de um ou de todos, porquanto a jurisprudência tende à transferência da
responsabilidade da pessoa jurídica sucedida independentemente dos estabelecimentos. Em
caso de arrendamento do estabelecimento, o arrendatário só responde por atos dolosos
23 O STJ foi incisivo em relação ao assunto: “O adquirente de fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, que continuar a respectiva exploração, responde integralmente pelos tributos relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade. Comprovada, no caso, a sucessão, a dissolução irregular, a responsabilidade da embargante e a responsabilidade pessoal de seu sócio-gerente, antigo sócio da empresa adquirida” (STJ – 1ª T. – REsp nº 36.540-6—MG – Rel. Min. Garcia Vieira – j. 08.09.93 – v.u. – RSTJ 52/216). 24 Luciano Amaro. Op. cit. p. 306. 25 Zelmo Denari. Op. cit. p. 105.
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(responsabilidade por infrações). O devedor é o estabelecimento (pessoa jurídica
pertencente aos arrendantes). Os sucessores só respondem pelos tributos, e não pelas
multas, já que o CTN, ao cuidar da responsabilidade dos sucessores, fala apenas em
tributo. O STF tem decidido que as multas punitivas só podem ser irrogadas ao infrator”26.
Outro exemplo a ser citado e sobre ele já tivemos a oportunidade de escrever,
diz respeito à incorporação de patrimônio de uma fundação privada por outra. Não ocorre o
fenômeno jurídico da sucessão de obrigações por fusão ou incorporação da própria
fundação com personalidade jurídica ainda existente. Isto sim, a extinção da fundação
privada faz terminar a pessoa jurídica, devendo ser liquidado o passivo pelo ativo e o
resultado patrimonial positivo é que será destinado à fundação com fins semelhantes. Por
essa premissa, já se verifica o ponto principal, de constatação imprescindível: incorpora-se
o patrimônio livre e não a personalidade jurídica da fundação extinta27.
4. Responsabilidade solidária de terceiros
A solidariedade passiva pressupõe o dever legal de um co-devedor obrigado ao
pagamento da totalidade do débito28. De acordo com o art. 124 do CTN, que exclui o
benefício de ordem e se referente somente à obrigação de dar, consideram-se solidárias: I –
as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da
obrigação principal29; II – as pessoas expressamente designadas por lei. LUCIANO AMARO
esclarece o dispositivo com muita propriedade: “Sabendo-se que a eleição de terceiro
como responsável supõe que ele seja vinculado ao fato gerador (art. 128), é preciso
distinguir, de um lado, as situações em que a responsabilidade do terceiro deriva do fato de
ele ter “interesse comum” no fato gerador (o que dispensa previsão na lei instituidora do
tributo) e, de outro, as situações em que o terceiro tenha algum outro interesse (melhor se
diria, as situações com as quais ele tenha algum vínculo) em razão do qual ele possa ser
26 Sacha Calmon Navarro Coêlho. Op. cit. p. 624. 27 Gustavo Saad Diniz. Direito das Fundações Privadas. Teoria Geral e Exercício de Atividades Econômicas. Porto Alegre: Síntese, 2000. p. 345. 28 Dispõe o parágrafo único, do art. 896, do CC: “Há solidariedade quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado à dívida toda”. 29 Rubens Gomes de Sousa, em seu Compêndio, cita como exemplo a possibilidade de cobrança do IPTU de qualquer dos condôminos em imóvel que apresente a situação fática de co-propriedade. Também Arnaldo Borges (op. cit. p. 81) cita este exemplo.
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eleito como responsável. Neste segundo caso é que a responsabilidade solidária do terceiro
dependerá de a lei expressamente estabelecer”30.
É importante exemplificar com a interpretação que o saudoso tributarista e
Ministro de STF, ALIOMAR BALEEIRO31, dá ao tema. Descreve ele como caso de
solidariedade o disposto no art. 42 do CTN, que trata do Imposto sobre a Transmissão de
Bens Imóveis, nos seguintes termos: “Contribuinte do imposto é qualquer das partes na
operação tributada. como dispuser a lei”. Assim, se uma das pessoas é eleita como
contribuinte, a outra pessoa envolvida no negócio jurídico pode ser indicada como
responsável solidária. Semelhante é a interpretação do art. 66 do CTN, consagrando o
mesmo princípio em relação ao Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro e
Título de Valores Mobiliários.
Dessa forma, o contribuinte principal impossibilitado de efetuar o pagamento
do tributo32 e desde que o terceiro tenha participado da ocorrência do fato jurídico
tributário (comissão) ou que nela tenha se omitido (omissão), surge o dever de pagamento
por parte daqueles relacionados no arts. 134 do CTN33, quais sejam:
I - os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores;
II - os tutores e curadores, pelos tributos devidos por seus tutelados ou
curatelados;
III - os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes;
IV - o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio34;
V - o síndico e o comissário, pelos tributos devidos pela massa falida ou pelo
concordatário;
30 Luciano Amaro. Op. cit. p. 297. 31 Aliomar Baleeiro. Op. cit. p. 278. 32 Por conta deste trecho inserido no art. 134 do CTN, o tributarista Luciano Amaro entende que não se trata de responsabilidade solidária, mas sim de subsidiariedade, porque o responsável somente é chamado quando o outro estiver impossibilitado de pagar o tributo. Também: Zelmo Denari. Solidariedade e Sucessão Tributária. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 54. Em sentido contrário aos dois outros doutrinadores, dizendo que o responsável obriga-se por débito de terceiro: Arnaldo Borges. Op. cit. p. 101. 33 Para Zelmo Denari, a análise do art. 134 permite concluir a existência de relação entre o novo sujeito passivo (responsável) e o titular do fato imponível (contribuinte), gerente a responsabilidade “inerente ao cargo (administradores de bens de terceiros; sócios de sociedades em nome coletivo), função (tutores, curadores, síndicos, comissários, inventariante), ofício (serventuários) ou mesmo à relação de parentesco com o contribuinte (pai pelos tributos devidos pelos filhos menores)” (Zelmo Denari. Op. cit. p. 52-53). Ademais, o jurista Zelmo Denari entende justificadamente que o rol do art. 134 é de caráter exemplificativo, podendo a lei ordinária federal, estadual ou municipal, livremente, criar outras modalidades de responsáveis tributários (op. cit. p. 55). 34 Art. 11 do RIR (Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999).
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VI - os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos
devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício;
VII - os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.
Nos casos enumerados, somente se admite a responsabilização do terceiro se
ele concorreu efetivamente para o não pagamento da obrigação tributária. Por conta dessa
premissa, conclui-se que não existe responsabilidade de administrador se o ente
administrado não reúne meios econômicos suficientes para a satisfação da obrigação
tributária. Estende-se o raciocínio para o sócio de empresa em liquidação, que somente
responde solidariamente pela obrigação tributária se a empresa reunia condições de pagar o
tributo e não o fez por comprovado desvio de patrimônio para os sócios.
Verifica-se que, em essência, a responsabilidade é de terceiro e reporta-se à
obrigação tributária de forma integral, gerando os efeitos enumerados pelo art. 125 do
CTN, quais sejam: a) o pagamento efetuado por um dos obrigados aproveita aos demais; b)
a isenção ou remissão de crédito exonera todos os obrigados, salvo se outorgada
pessoalmente a um deles, subsistindo, nesse caso, a solidariedade quanto aos demais pelo
saldo35; c) a interrupção da prescrição, em favor ou contra um dos obrigados, favorece ou
prejudica aos demais36.
Ressalvam-se as penalidades, que cingem-se às de caráter moratório (parágrafo
único, do art. 134, do CTN). Justifica-se o dispositivo, conforme orientação da doutrina,
pela necessidade de punição da culpa in vigilando do responsável solidário, atingindo-o
somente pela mora no pagamento do tributo. Não há outro tipo de penalidade.
Alguns exemplos extraídos da jurisprudência podem concretizar o raciocínio
em termos práticos:
a) o pai, titular do pátrio poder, que administra o bem imóvel de propriedade de
um filho menor impúbere, deixa, negligentemente, de providenciar o pagamento do IPTU
devido no ano base anterior, fazendo com haja a inscrição na dívida ativa. Responderá este
pai, solidariamente, pelo pagamento do imposto. O mesmo exemplo pode ser estendido a
tutores e curadores, por tributos decorrentes de bens imóveis do domínio de tutelados e
curatelados; 35 O princípio adotado pelo dispositivo também deve ser estendido para a inclusão para imunidade, não existindo fato jurídico tributário em relação à pessoa imune, mas subsistindo o mesmo em relação aos demais obrigados.
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b) o administrador de uma Fazenda, com procuração plena para alienação de
semoventes, omite-se no pagamento do ICMS pela venda do gado para abate, gerando
obrigação tributária. O contribuinte está impossibilitado de pagar o imposto, por estar em
lugar incerto e não sabido, gerando a oponibilidade ao administrador negligente, solidário
no pagamento do imposto;
c) o inventariante deixa de pagar os Imposto sobre a Renda devido pelo
espólio, permitindo que haja pagamento de credores não preferenciais e posterior partilha
dos bens, responderá pelo IR devido;
d) o síndico, que não providencia o pagamento dos tributos vencidos e
vincendos devidos pela massa falida e que permite o pagamento a credores com gradação
de preferência inferior ao crédito tributário, fica responsável pelos valores devidos37;
e) o Tabelião que lavra escritura de venda e compra de bem imóvel e que deixa
de cobrar o ITBI. Estando as partes em lugar incerto, impossibilitando a cobrança, o
Tabelião fica responsável pelo imposto apurado;
f) o sócio quotista, sem função de gerência, não responde por dívida contraída
pela sociedade de responsabilidade limitada38. Portanto, seus bens não podem ser
penhorados em processo de execução fiscal movida contra a pessoa jurídica39. A ressalva é
a dissolução irregular da sociedade ou correspondendo o débito a período em que o sócio
quotista participou da gerência na sociedade executada40. Deve ser dito que a
responsabilidade do sócio está adstrita a suas cotas de capital social, devidamente
integralizadas. A não-integralização faz com que a responsabilidade seja ilimitada41.
Ademais disso, o Decreto Lei nº 5.844/43, no art. 53, repetido pelo art. 211 do RIR/99,
dispôs que a extinção de uma firma ou sociedade de pessoas não exime o titular ou os
sócios da responsabilidade solidária do débito fiscal.
36 Luciano Amaro, em relação ao dispositivo, estende o âmbito de aplicabilidade aos prazos extintivos em geral e ao aproveitamento dos casos de interrupção de prescrição em favor de todos os co-obrigados (Luciano Amaro. Op. cit. p. 301). 37 TRF 1ª Região – MAS 01000239302 – MG – 3ª T. – Rel. Juiz Olindo Menezes – DJU 30.04.1999 – p. 490. 38 Sobre a ausência de responsabilidade do sócio quotista minoritário, sem poderes de gerência: TJSP – Ap. 193.759/5 – 13ª C. – j. 11.8.92 – rel. Des. Corrêa Viana – RT 690/93. 39 STJ – REsp nº 151.209-AL – 1ª T. – Rel. Min. Humberto Gomes de Barros – DJU 08.03.1999. 40 TRF 4ª Região – AI 96.04.55595-2 – SC – 2ª T. – Rel. Juiz Vilson Darós – DJU 23.02.2000 – p. 70. 41 Art. 9º do Decreto nº 3.708/19. Também: arts. 50 e 51 do Decreto-Lei nº 7.661/45.
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5. Responsabilidade pessoal de terceiros (art. 135 do CTN)
O art. 135 do CTN enumera como pessoalmente responsáveis por obrigações
tributárias praticadas com excesso de poder ou ato infracional à lei, contrato social ou
estatutos, as seguintes pessoas: I - as pessoas referidas no artigo anterior; II - os
mandatários, prepostos e empregados; III - os diretores, gerentes ou representantes de
pessoas jurídicas de direito privado42.
A responsabilidade pessoal exclui o contribuinte, mantendo na sujeição passiva
somente o terceiro pessoalmente responsável.
Essa hipótese contemplada se difere da responsabilidade solidária do art. 134,
que diz respeito a impossibilidade de pagamento pelo contribuinte e atos comissivos ou
omissivos em que terceiro tenha participado. Há responsabilidade solidária (subsidiária,
para parte da doutrina).
No caso do art. 135, o que se discute é responsabilidade pessoal exclusiva das
pessoas enumeradas e que, efetivamente, tenham praticado: a) atos com excesso de
poderes, em outros termos, sem concessão de poderes específicos; b) que os atos tenham
sido praticados com infração da lei, do contrato social ou dos estatutos. Sem estes
requisitos, reveladores de conduta ilegítima e muitas vezes ilícita, não se pode invocar a
responsabilização pessoal. Para sustentar tal assertiva, é imprescindível estender o
raciocínio para outro ponto conflitivo em doutrina e jurisprudência, que diz respeito ao
simples não-recolhimento do tributo, se ele constitui infração da lei, levando à
responsabilidade pessoal na forma do art. 135 do CTN.
O não-cumprimento de obrigação tributária, por si, caracteriza ilícito coibido
pelos consectários da mora. Entretanto, não foi esse ilícito simples o descrito pelo art. 135.
Trata-se, isto sim, do ilícito deliberado, arquitetado, marcado pelo elemento subjetivo
doloso que fundamenta a fraude ou o excesso de poderes.
Mero descumprimento culposo da obrigação tributária (inadimplemento) faz
incidir o art. 134 do CTN e seus requisitos de impossibilidade de pagamento pelo devedor
principal e participação comissiva ou omissiva do responsável.
42 O art. 16 do Decreto nº 3.708/19, dispõe, em termos semelhantes, acerca da responsabilidade ilimitada por conta de atos fraudulentos: “As deliberações dos sócios, quando infringentes do contrato social ou da lei, dão responsabilidade ilimitada àqueles que expressamente hajam ajustado tais deliberações contra os preceitos contratuais ou legais”.
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O que importa no art. 135, portanto, é elemento subjetivo doloso efetivamente
comprovado no sentido de extrapolar poderes ou fraudar a lei43.
Ao final desse raciocínio, conclui-se que o simples não-pagamento da
obrigação tributária não constitui infração à lei. A admissão da hipótese contrária seria
consagrar a responsabilidade ilimitada do sócio, independentemente do modelo societário
escolhido. Isso é inadmissível. Nesse sentido, decidiu o Supremo Tribunal Federal: “É
inadmissível a penhora de bens particulares de sócio de sociedade por cotas de
responsabilidade limitada se não se demonstrou haver agido ele irregularmente, como
administrador, no ato gerador do tributo”44. O Superior Tribunal de Justiça, em acórdão da
lavra da Ministra Fátima Nancy Andrighi, também acompanhou este entendimento: “Os
sócios da sociedade de responsabilidade por cotas não respondem objetivamente pela
dívida fiscal apurada em período contemporâneo a sua gestão, pelo simples fato da
sociedade não recolher a contento o tributo devido, visto que, o não cumprimento da
obrigação principal, sem dolo ou fraude, apenas representa mora da empresa contribuinte e
não ‘infração legal’ deflagradora da responsabilidade pessoal e direta do sócio da
empresa”45.
De acordo com o nosso ordenamento jurídico-tributário, os sócios (diretores,
gerentes ou representantes da pessoa jurídica) são responsáveis pelos créditos
correspondentes a obrigações tributárias resultantes da prática de ato ou fato eivado de
excesso de poderes ou com infração de lei, contrato social ou estatutos, nos termos do art.
135, III, do CTN. A solidariedade do sócio pela dívida da sociedade só se manifesta,
todavia, quando comprovado que, no exercício de sua administração, praticou os atos
elencados na forma do art. 135, caput, do CTN. Há impossibilidade, pois, de se cogitar na
atribuição de tal responsabilidade substitutiva quando o sócio sequer estava investido das
43 “Nos termos do que dispõe a lei tributária nacional, há que ser observado o princípio da responsabilidade subjetiva, não prevalecendo presunção quanto ao descumprimento, pelos sócios, de suas obrigações sociais. Divergência jurisprudencial superada” (STJ – 2ª Turma – REsp nº 149.314-PE – Rel. Min. Peçanha Martins – DJU 10.04.2000). No mesmo sentido: STJ – REsp 100.739 – SP – 2ª T – Rel. Min. Ari Pargendler – J. 19.11.1998 – DJU 01.02.199902.01.1999 – RET 8/67. Em doutrina: José Morschbacher. Responsabilidade Tributária Objetiva – Criação Judicial. Síntese. Porto Alegre. Revista de Estudos Tributários. (1):26-32. Mai-Jun/1998. Em sentido contrário: “Os sócios-gerentes são responsáveis pela dívida tributária resultante de atos praticados com infração à lei e quem deixa de recolher tributos devidos pela sociedade comete infração à lei. Recurso improvido. (STJ – REsp 203.878 – RJ – 1ª T. – Rel. Min. Garcia Vieira – DJU 21.06.199906.21.1999 – p. 96 – RET 8/88). 44 STF – RE nº 91.631-8-RJ – 1ª Turma – Rel. Min. Xavier de Albuquerque – j. 09.10.79 – v.u. – RT 538/246. 45 STJ – 2ª Turma – REsp nº 121.021-PR – Rel. Ministra Nancy Andrighi – v.u. – DJU 11.09.2000 – p. 235.
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funções diretivas da sociedade46. Diferentemente da responsabilidade solidária, em que se
paga somente a penalidade moratória, a responsabilidade pessoal é completa, porque houve
conduta dolosa de excesso de poderes ou fraude, por parte de quem a lei elege como
responsável. Assim, são devidos tanto os tributos, como os demais acréscimos previstos
em lei.
Cabe ressaltar, além disso, que para que seja aplicado o princípio da
responsabilidade pessoal, mister se faz a efetiva comprovação da conduta dolosa de
extrapolação de poderes conferidos ou, então, de conduta fraudulenta. Nesse sentido, é
esclarecedor o acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do
Agravo Regimental contra decisão que deu provimento ao Recurso Especial, que se
colaciona nos seguintes termos: “1. Agravo Regimental interposto contra decisão que, com
base na jurisprudência remansosa desta Casa, deu provimento ao recurso especial intentado
pela parte ora agravada. 2. Cuida o presente caso de se buscar definição acerca da
possibilidade de se cobrar integralmente de ex-sócio de uma empresa tributo por ela não
recolhido, quando o mesmo já não exercia mais atos de administração da mesma,
reclamando-se ofensa ao art. 135, do CTN. 3. Os bens do sócio de uma pessoa jurídica
comercial não respondem, em caráter solidário, por dívidas fiscais assumidas pela
sociedade. A responsabilidade tributária imposta por sócio-gerente, administrador, diretor
ou equivalente só se caracteriza quando há dissolução irregular da sociedade ou se
comprova infração à lei praticada pelo dirigente. 4. Em qualquer espécie de sociedade
comercial, é o patrimônio social que responde sempre e integralmente pelas dívidas
sociais. Os diretores não respondem pessoalmente pelas obrigações contraídas em nome da
sociedade, mas respondem para com esta e para com terceiros solidária e ilimitadamente
pelo excesso de mandato e pelos atos praticados com violação do estatuto ou lei (art. 158, I
e II, da Lei nº 6.404/76). 5. De acordo com o nosso ordenamento jurídico-tributário, os
sócios (diretores, gerentes ou representantes da pessoa jurídica) são responsáveis, por
substituição, pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes da prática
de ato ou fato eivado de excesso de poderes ou com infração de lei, contrato social ou
estatutos, nos termos do art. 135, III, do CTN. 6. O simples inadimplemento não
46 Esta a orientação do STJ: “TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – ART. 135, III, CTN – 1 – Os bens de sócio de pessoa jurídica comercial não respondem, de forma solidária, por dívidas fiscais assumidas pela sociedade. 2 – Recurso especial improvido” (STJ – REsp 230754 – PE – 1ª T. – Rel. Min. José Delgado – DJU 28.02.2000 – p. 62) No mesmo sentido: STJ – AgRg-ED-REsp 109639 – RS – 1ª S. – Rel. Min. José Delgado – DJU 28.02.2000 – p. 32.
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caracteriza infração legal. Inexistindo prova de que se tenha agido com excesso de
poderes, ou infração de contrato social ou estatutos, não há falar-se em responsabilidade
tributária do ex-sócio a esse título ou a título de infração legal. Inexistência de
responsabilidade tributária do ex-sócio. 7. Precedentes desta Corte Superior. 8. Agravo
regimental improvido”47.
Conclui-se, dessa forma, que os bens do sócio de uma pessoa jurídica
comercial não respondem, em caráter solidário, por dívidas fiscais assumidas pela
sociedade. Isto sim, a responsabilidade tributária é imposta a sócio-gerente, administrador,
diretor ou equivalente, somente se caracterizando quando há dissolução irregular da
sociedade, atuação fora dos poderes outorgados ou se comprova infração à lei praticada
pelo dirigente. Outrossim, não será responsável por dívida tributária, no contexto do art.
135, III, CTN, o sócio que se afasta regularmente da sociedade comercial, sem ocorrer
extinção ilegal da empresa, nem ter sido efetivamente provado que praticou atos com
excesso de mandato ou infração à lei, contrato social ou estatutos48.
A caracterização da responsabilidade solidária deve atender às limitações
legais, como ocorreu nos seguintes casos concretos: “1 – A responsabilidade tributária do
acionista encontra-se adstrita à situação contemplada pelo artigo 135, III, do CTN, pelo
que, não configurado o exercício de diretoria, gerência ou representação, não lhe cabe
responder pelos débitos cobrados. 2 – A eventual responsabilidade da acionista-executada,
enquanto integrante Assembléia-Geral, por não ter adotado as medidas que lhe cabiam à
liqüidação da sociedade, e a viabilizarem o pagamento do passivo (Lei 6404/76, art. 210,
IV), não é suficiente a alcançar a responsabilidade tributária disciplinada pelo referido
artigo 135, CTN, ensejando, isso sim, que venha a suportar os efeitos por sua inércia no
âmbito meramente cível, de todo inconfundível com a abrangência da discussão tributária
47 STJ – AGRESP nº 247.862-SP – (200000122173) – 1ª T. – Rel. Min. José Delgado – DJU 19.06.2000 – p. 00119. Também sobre a responsabilidade do sócio-gerente e a sua citação para a execução fiscal: STJ – 1ª T. – REsp nº 141.516-SC – Rel. Min. Humberto Gomes de Barros – j. 17/09/1998 – v. u. – RSTJ 117/125. Por outro lado, disposto acerca da exclusão de responsabilidade de sócio que se retirou sem atos com excesso de poderes ou infração à lei, sendo aplicável, então, o art. 133 para responsabilização dos novos sócios: STJ – 1ª Turma – REsp nº 29.769-6-SP – j. 9.12.92 – rel. Min. Garcia Vieira – DJU 5.4.93 – RT 696/247. 48 “Tributário — Execução fiscal — Responsabilidade tributária — Sociedade de responsabilidade limitada — Sócio-gerente — Transferência de cotas sem dissolução da sociedade — CTN, arts. 135 e 136. I — Não é responsável tributário pelas dívidas da sociedade o sócio-gerente que transferiu regularmente suas cotas a terceiros, continuando, com estes, a empresa. II — A responsabilidade tributária solidária prevista nos artigos 134 e 135, III alcança o sócio-gerente que liquidou irregularmente a sociedade limitada. O sócio-gerente responde por ser gerente, não por ser sócio. Ele responde não pela circunstância de a sociedade estar em débito, mas por haver dissolvido irregularmente a pessoa jurídica” (STJ – 1ª Turma - REsp nº 85.115—PR – Rel. Min. Humberto Gomes de Barros - DJ 10.06.96 – RSTJ 88/51).
22
caracterizadora desta ação. 3 – Apenas na liqüidação de sociedade de pessoas é que o sócio
responde solidariamente com o contribuinte principal (CTN, art. 134, VII). 4 –
Improvimento do recurso. Sentença confirmada”49.
Já o TRF 4ª Região apresentou o seguinte entendimento: “Constitui infração à
lei o não-pagamento de dívida fiscal regularmente lançada, no prazo consignado pela
legislação atinente. Assim, de acordo com art. 135 do CTN, o sócio-gerente é sujeito
passivo da obrigação, por substituição, respondendo seus bens particulares pelo débito
tributário contemporâneo à sua administração. Em caso de dissolução irregular da
sociedade ou correspondendo o débito a período em que o sócio quotista participou da
gerência na sociedade executada, é ele responsável solidário, na forma do art. 134, inc. 7º,
c/c o art. 135, inc. 3º, do CTN/66”50.
Finalmente, quanto à inclusão de nome de mandatário da pessoa jurídica, o STJ
definiu o seguinte: “1. Não comete infringência aos artigos 134, III e 135, III, do Código
Tributário Nacional, o acórdão que reconhece a existência de relação jurídica entre o
procurador da empresa autuada e o Fisco estadual, para fins de inscrição do seu nome
como coobrigado solidário em auto de infração relativo à cobrança de ICMS, posto que à
época da constituição do débito, era, o mesmo, mandatário da empresa. 2. A inclusão do
nome do procurador da empresa autuada não implica, necessariamente, que este venha a
ser responsabilizado pessoalmente (art. 135, III), pelos débitos existentes. Esta
responsabilidade pessoal, caso existente, deverá ser oportunamente apurada e comprovada
pelo Fisco e debatida, ainda, em sede de Embargos do Devedor caso venha a ser
promovida a execução fiscal do débito. No momento, tudo o que se discute é a existência
ou não da relação jurídica entre o recorrente, mandatário da Empresa autuada, e o Fisco
estadual. Esta relação jurídica existe, sim. É o que diz o artigo 134, III, do CTN. 3.
Recurso especial desprovido”51.
49 TRF 1ª Região – AC 01120153 – GO – 4ª T. – Rel. Juiz Alexandre Vidigal de Oliveira – DJU 25.06.1999 – p. 515. Também: TRF 4ª R. – AC 95.04.09634-4-PR – 1ª T. – Rel. Juiz A. A. Ramos de Oliveira – DJU 22.07.199807.22.1998, p. 399 – RET 05/96. 50 TRF 4ª Região – AI 96.04.55595-2 – SC – 2ª T. – Rel. Juiz Vilson Darós – DJU 23.02.2000 – p. 70. 51 STJ – REsp nº 245.489-MG – 1ª Turma – Rel. Min. José Delgado – DJU 05.05.2000 – p. 00129. Sobre a necessidade de procedimento administrativo prévio: TJMS – AI 29.773-0 – 1ª T. – rel. Des. Elpídio Helvécio Chaves Martins – RT 693/207.
23
6. Responsabilidade da pessoa que deve reter tributos na fonte e repassar à Fazenda
Pública
A obrigação jurídica de quem deve reter o tributo na fonte não é de sujeição
passiva direta. Diz-se que há responsabilidade especial advinda da obrigação de fazer
(repassar a retenção), por expressa disposição de lei, oponível contra a pessoa que tinha o
dever legal de reter o tributo na fonte e, depois, repassar à Fazenda Pública. Assim, a
pessoa com dever de retenção do tributo não participa da relação jurídica tributária, sendo
um “agente de arrecadação, por ter à sua disposição o dinheiro de terceiros obrigados, em
razão de relações extratributárias”52.
Mister ressaltar, ainda, que a obrigação de repasse se restringe ao valor do
tributo, não se lhes exigindo multas, salvo a multa moratória prevista em lei para punir o
atraso de quem deveria repassar.
Finalmente, em relação aos efeitos, valemo-nos de enumeração feita pelo
ilustre doutrinador SACHA CALMON NAVARRO COÊLHO53: a) somente ao retentor do tributo
pode ser imputado o delito de apropriação indébita, diferindo-se dos responsáveis que só
podem ser inadimplentes; b) a obrigação do retentor é de fazer (facere) a retenção e
entrega ao Fisco dos valores retidos. A obrigação dos responsáveis é de dar; c) o retentor,
em tese, não tem legitimidade para pedir a repetição, tampouco para impugnar a exigência,
porque nada pagou, só reteve e entregou. Essas duas atitudes são facultadas ao
responsável.
Pode-se exemplificar com o caso de entidades imunes a impostos, com
fundamento no art. 150, VI, ‘c’, da CF/88 e art. 14 do CTN. Com efeito, o Poder Público
não tem competência para instituir impostos onerando o patrimônio, renda ou serviços das
entidades que se enquadrem como de assistência social e educação. Nada obstante,
referidas entidades têm a obrigação, contida no §1º, do art. 9º, do CTN, de reter tributos na
fonte, sob pena de responsabilidade. É o caso de desconto de Imposto sobre a Renda de
Funcionários remunerados acima do limite legal de isenção ou então de retenção de
Imposto sobre a Renda de prestador de serviços autônomo devidamente remunerado.
O raciocínio se aplica e se estende, por exemplo, a empresas privadas que,
como unidade pagadora, não procedem à retenção de tributos na fonte. Para exemplificar,
o art. 26, do Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999 (RIR/99), fundado no art. 182 do 52 Sacha Calmon Navarro Coêlho. Op. cit. p. 614.
24
Decreto-Lei nº 5.844/43, determina que as firmas ou sociedades nacionais e as filiais,
sucursais ou agências, no País, de firmas ou sociedades com sede no exterior, são
responsáveis pelos débitos do imposto correspondentes aos rendimentos que houverem
pago a seus diretores, gerentes e empregados e de que não tenham dado informação à
repartição, quando estes se ausentarem do País sem os terem solvido.
Para finalizar esta questão, ressalta-se a importância da responsabilização
administrativa, que influencia decisivamente a apuração de existência do crime de
apropriação indébita, previsto na Lei nº 9.983/2000.
Bibliografia
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53 Sacha Calmon Navarro Coêlho. Op. cit. p. 614-615.
25
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Revista dos Tribunais, 1995.
26
Responsabilidade por Infrações e Denúncia Espontânea
Sumário: 1. Responsabilidade objetiva do agente no tocante ao cometimento de infrações – 2. Denúncia espontânea e seus efeitos – 3. Projeção da responsabilidade tributária sobre o crime contra a ordem tributária – 4. Conclusões.
1. Responsabilidade objetiva do agente no tocante ao cometimento de infrações
Com respeito a obrigações estipuladas pela legislação, destinadas ao
pagamento de tributos e a responsabilidade por este adimplemento, adotou-se o princípio
da responsabilidade objetiva do agente pelo descumprimento da legislação tributária, não
importando a intenção do agente (elemento subjetivo anímico de violação ou não da lei) ou
do resultado prático do evento, salvo por expressa disposição legal em sentido contrário.
Assim, imprescindível a demonstração do liame causal entre a conduta irregular praticada
pelo contribuinte e a materialidade do prejuízo causado ao Fisco, que poderá ser de não
pagamento da obrigação tributária (e.g., falta de recolhimento do ICMS) ou desobediência
a deveres instrumentais ou acessórios (e.g. entrega de declaração de rendas fora do prazo),
fazendo incidir a penalidade54. Referido princípio está insculpido no art. 136 do CTN:
“Salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação
tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e
extensão dos efeitos do ato”55.
Não há que se confundir a responsabilidade por infrações com a
responsabilidade pelo pagamento do tributo. Nesta, discute-se a sujeição passiva e a
54 O prof. Paulo de Barros Carvalho arrola as seguintes espécies de penalidades: a) pecuniárias; b) multas de mora; c) juros de mora; d) apreensão de mercadorias e documentos; e) pena de perdimento de mercadorias contrabandeadas e, se houver discussão judicial, a devolução somente ocorre com o oferecimento de fiança idônea ou depósito no valor correspondente à mais elevada multa aplicável; f) sujeição a regime especial de controle, consistente na “rotulagem especial, na numeração ou controle quantitativo dos produtos; no uso de documentos ou livros de modelos especiais; na prestação de informações periódicas sobre as operações de seu estabelecimento; e até na vigilância constante dos agentes do Fisco, que poderão fazer plantões à porta do estabelecimento”; g) cassação de regimes especiais de pagamentos de impostos e do uso de escrituração específica (Paulo de Barros Carvalho. Op. cit. p. 352-353). Sobre arrecadação de documentos e instrumentos eletrônicos: arts. 34 a 38 da Lei nº 9.430/96. 55 Importa colacionar, ainda nesse desiderato, o posicionamento do prof. Paulo de Barros Carvalho, afirmando que a responsabilidade objetiva do art. 136 não é absoluta, admitindo-se que a “possibilidade de dispor em sentido contrário oferta espaço para que a autoridade legislativa construa as chamadas infrações subjetivas” (Paulo de Barros Carvalho. Op. cit. p. 349).
27
solidariedade, subsidiariedade ou a sucessão, com presença de elemento anímico (dolo ou
culpa). Naquela, por outro lado, o que se tem em vista é a violação de deveres estipulados
pela legislação tributária, tais como a formalização de Notas Fiscais devidamente
respaldadas, a regularidade de documentação aduaneira, dentre outros exemplos não-
exaustivos. Essa, aliás, a doutrina de MISABEL ABREU MACHADO DERZI, nas notas de
atualização da obra de ALIOMAR BALEEIRO, que especifica a incidência do dispositivo em
relação a dois pontos: “1. Às infrações, relativas ao descumprimento do dever de pagar o
tributo tempestivamente e às infrações apuradas em autuações, de qualquer natureza
(multas moratórias ou de revalidação); 2. às infrações aos deveres de fazer ou não fazer,
chamados acessórios (às quais se cominam multas específicas)”56.
É o caso desta decisão do STJ, ora colacionada: “ICMS — Saída de café
inexistente — Empresa fictícia — Infração tributária. Suposta venda de café à empresa
fictícia, através de documentação falsa, é prática de fraude para acobertar a entrada do
produto, não recolher o imposto e beneficiar-se de créditos. A responsabilidade por
infração tributária não depende da intenção do agente. Recurso improvido”57.
Diante desta responsabilidade objetiva estabelecida para as infrações à lei
tributária, o art. 137 circunscreve a responsabilização pessoal (art. 134 do CTN) em
diversas hipóteses que passamos a analisar detidamente. Ou seja, deixa de existir a
responsabilidade do sujeito passivo (direto ou indireto), para existir somente a
responsabilização pessoal do agente infrator da legislação tributária.
O primeiro comando do dispositivo diz respeito à responsabilidade pessoal nos
casos de infrações conceituadas por lei como crimes ou contravenções. Além da
responsabilidade criminal, o infrator que cometer um dos tipos arrolados pelos arts. 1º e 2º
da Lei nº 8.137/90, somente para exemplificar, responderá pessoalmente pelo pagamento
do tributo, juros e multa (art. 161 do CTN). É o caso de quem frauda a fiscalização
tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em
documento ou livro exigido pela lei fiscal; ou então quem falsifica ou altera nota fiscal,
fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação
tributável. Outro exemplo: o sujeito ativo competente para cobrar ICMS referente a
mercadoria acompanhada de documentação fiscal inidônea é aquele onde se encontre tal
56 Aliomar Baleeiro. Direito Tributário Brasileiro. 11ª ed. Atualização Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 759. Também: Paulo de Barros Carvalho. Op. cit. p. 344. 57 STJ – 1ª Turma – REsp nº 51.267-0-SP – Rel. Min. Garcia Vieira – j. 31.08.1994 – RSTJ 69/476.
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mercadoria (alínea b, art. 11, Lei Complementar nº 87/96). É responsável solidariamente
em razão da infração para o recolhimento do tributo aquele que adquiriu mercadoria em
situação irregular, cujo fato gerador do ICMS, configura-se no momento em que ocorreu a
constatação da inidoneidade fiscal.
Em outras palavras, o que se observa nestes casos de infração de legislação
tributária, baseados no cometimento de atos tidos como crimes, é a cumulação entre
supressão ou redução deliberada de tributo a pagar, com prática de atos fraudulentos, que
servem como instrumento de evasão parcial ou total do tributo, seja ele imposto, taxa,
contribuição de melhoria ou contribuição social.
A ressalva, neste primeiro caso, é a justa e regular prática de ato de
administração, mandato, função, cargo ou emprego, no cumprimento de ordem expressa
emitida por pessoa autorizada a fazê-lo.
Nos incisos II (casos de simulação com conluio doloso) e III, do art. 137, do
CTN, exige-se o dolo específico na prática de infrações. Além disso, especifica a punição
pessoal do agente que pratique ato contra a vontade da pessoa representada. É o caso das
pessoas arroladas no art. 134 do CTN e que, verificado o dolo específico, deixam de
responder solidariamente para se tornar devedor pessoal do tributo. Também se trata de
mandatários, prepostos ou empregados, contra seus mandantes, preponentes ou
empregadores. Finalmente, consagra-se a responsabilidade pessoal dos diretores, gerentes
ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado, contra estas. O agente deverá
responder pelo valor do tributo, acrescido de juros e multa, nos termos do art. 161 do CTN
e de acordo com a lei instituidora do tributo devido.
Ainda, é imprescindível invocar o disposto no art. 123 do CTN58, que torna
inoponível à Fazenda Pública as convenções particulares relativas às responsabilidades
pelo pagamento do tributo, sendo meio impróprio de modificação da definição legal do
sujeito passivo. Interpretando o dispositivo, SACHA CALMON NAVARRO COÊLHO traz
orientação no sentido de que “os particulares podem pactuar o que quiserem, mas que
58 O art. 123 possui o correspondente na Abgabenordnung alemã de 1977, que no §192 dispõe o seguinte: “Quem se obrigar, através de contrato, a responder pelo imposto de um terceiro poderá ser responsabilizado apenas com base nos dispositivos do Direito Civil” (Ruy Barbosa Nogueira. Novo Código Tributário Alemão. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Instituto Brasileiro de Direito Tributário, 1978. p. 82).
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jamais poderão elidir contratualmente o dever de pagar tributos na qualidade de sujeitos
passivos diretos e indiretos”59.
As infrações à legislação tributária, outrossim, decorrem dos dispositivos
reguladores de cada um dos tributos (legislação federal, estadual e municipal), bem como
dos dispositivos incriminadores da Lei nº 8.137/90, que arrola diversas hipóteses
consideradas infracionais (além de criminais). Todos os crimes da Lei nº 8.137/90
caracterizam infração tributária. A recíproca, entretanto, não é verdadeira, porquanto haja
infrações com menor potencial ofensivo ao Fisco, que não são tipificadas como crimes.
O que se deve ressaltar, em arremedo à teoria, é a advertência da doutrina a
respeito das violações cometidas pelo legislador tributário, que tem agravado penalidades
administrativas decorrentes de infrações, confundindo o que seja crime com
responsabilidade. A principiologia que define um e outro é completamente distinta. No
caso do crime, a apuração de existência da responsabilidade influi decisivamente na
definição do delito. O mesmo não ocorre em sentido inverso. Portanto, o distanciamento
entre os institutos jurídicos versados é verdadeiramente ontológico e normativo, conforme
nos orienta o jurista PAULO DE BARROS CARVALHO: “Entre tais entidades existe uma
distinção formal e, atrás disso, uma grande diferença de regime jurídico, posto que os
crimes fiscais estão subordinados aos princípios, institutos e forma do Direito Penal, ao
passo que as infrações contidas em leis tributárias, de caráter não-criminal, sujeitam-se aos
princípios gerais do Direito Administrativo”60.
Nada obstante, arrolam-se na jurisprudência diversas hipóteses, que passam a
ser colacionadas para esclarecimento e compreensão:
“1 – O comerciante adquirente de mercadoria estrangeira no mercado interno
não pode suportar o ônus pela irregularidade da importação, se aquela aquisição deu-se
com a regular emissão de nota fiscal pelo estabelecimento importador, e não restou
comprovado conluio do adquirente com a Importadora, e nem mesmo qualquer indício de
sua responsabilidade com aquela importação irregular. 2 – Sendo a falsidade das notas
fiscais apuradas pelo Fisco em diligência à empresa gráfica mencionada como tendo-as
emitido, não há como exigir-se do adquirente da mercadoria o conhecimento da mesma. 3
– A legislação tributária não logrou adotar a responsabilidade objetiva, conforme infere-se 59 Sacha Calmon Navarro Coêlho. Op. cit. p. 594. Na jurisprudência do 1º TACivSP: “ISS – Operações de fechamento de câmbio – Tributo devido ao Município onde se encontra a sede da empresa intermediária – Convenção relativa à responsabilidade tributária – Irrelevância” (1º TACivSP – RT 595/148).
30
do disposto no artigo 136 c/c o art. 112, II, III, do CTN, pelo que à configuração da
responsabilidade do contribuinte impõe-se a demonstração de prova a balisá-la. 4 –
Precedentes jurisprudenciais do STJ e do TRF 1ª Região. 5 – Improvimento da apelação e
da remessa de ofício. Sentença confirmada”61.
“I – A responsabilidade por infrações, conforme disposição expressa do
Código Tributário Nacional, "independe da intenção do agente ou do responsável e da
efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato" (art. 136). II – Constitui infração
qualificada o transporte de mercadoria desacompanhada do documento fiscal exigido pela
legislação tributária (lei 6537/73, art. 8º, d, c/c Lei nº 8.820/89, art. 43, I). III – Inobstante
a retroatividade da lei comina penalidade menos severa a infração a obrigação acessória
(CTN, art. 106, II, c), e inviável a redução da multa quando postulada apenas em sede de
apelação, e não antes da prolação da sentença, sob pena de indevida inovação da lide e
supressão de um grau de jurisdição. IV – E cabível a utilização da TR como índice de
correção monetária. Apelo provido em parte”62.
“IPI - Infração capitulada no art. nº 365 inciso I, do RIPI/82 - Mercadorias de
procedência estrangeira dadas a consumo sem a competente prova da sua regular
importação. Alegação de boa fé não aproveita a empresa autuada face ao disposto no art. nº
136 do CTN. I - Notas fiscais emitidas anteriormente a 28 de fevereiro de 1986 estão
alcançadas pela dispensa constante do parágrafo quinto, alínea c, do art. primeiro, do
Decreto-lei nº 2.331 de 28.05.87. Recurso parcialmente provido”. (2º CC - 1ª C. - Ac.
201-66267).
“IPI - SELOS DE CONTROLE FALSOS - Sujeita à pena de perdimento a
mercadoria encontrada com selos de controle falsos. Caracter objetivo da responsabilidade
por infração, face artigo 136 do CTN. Recurso negado” (2º CC - Ac. 202-03832 - 2ª C.).
“RESPONSABILIDADE PESSOAL DO AGENTE - A responsabilidade
pessoal do agente para os casos de dolo especifico prevista no art. 137 do CTN não ocorre
se o ato delituoso é ato de vontade da pessoa jurídica, não havendo proveito econômico do
agente. OMISSÃO DE RECEITAS - As receitas omitidas apuradas a partir de compras
não contabilizadas não estão necessariamente compreendidas nas receitas omitidas
apuradas a partir de vendas não contabilizadas. INCIDÊNCIA DA TRD COMO JUROS
60 Paulo de Barros Carvalho. Op. cit. p. 345. 61 TRF 1ª Região – AC 93.01.34222-7 – MG – 4ª T. – Rel. Conv. Juiz Alexandre Vidigal – RET 06/101. 62 TJRS – AC 598196863 – RS – 2ª C. Civ. – Rel. Des. Arno Werlang – j. 26.05.1999 – Síntese Fiscal.
31
DE MORA - Por força do parágrafo 4º do artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Civil
Brasileiro, os juros de mora só podem ser calculados segundo os índices da TRD a partir
do mês de agosto de 1991, quando entrou em vigor a Lei 8.21 8t91. CONVERSÃO DOS
VALORES EM UFIR - Tendo, a Lei 8.383, sido publicada em 31 de dezembro de 1991
descabe invocar o principio da retroatividade para deixar de aplicá-la em relação ao
exercício financeira, de 1992. Acordam os Membros da Primeira Câmara do Primeiro
Conselho de Contribuintes, por unanimidade de votos, DAR provimento parcial ao
recurso, para excluir da exigência o encargo da TRD relativo ao período de fevereiro a
julho de 1991” (1ºCC - Ac. 101-89.825 - 1ª C. - Relª. Sandra Maria Faroni - DOU
27.08.1996 - p. 16478).
Seguindo outro raciocínio, não se pode considerar a prática de infração da
legislação tributária nos seguintes casos: a) falta de prova do nexo causal de violação da lei
para incidir a sanção; b) na dúvida, interpretação das normas tributárias que definem
infrações e cominam penalidades em favor do contribuinte acusado, conforme autoriza o
art. 112 do CTN; c) aplicação da retroatividade benigna da lei nova, em favor do
contribuinte que cometeu a infração (art. 106 do CTN); d) interpretação jurisprudencial
mais favorável para atenuar a penalidade, caso verificada a boa-fé63.
Exemplifica-se com a decisão do STJ no REsp nº 160.120-SP64, em que se
discutia auto de infração e imposição de multa referente transação com gado, imposto ao
vendedor, porque o comprador foi declarado inidôneo e porque a entrega das reses a
destinatário diverso do indicado no documento fiscal. No caso, o STJ confirmou a decisão
do TJ paulista, afirmando a inexistência de indícios suficientes à inculpação do produtor.
Com efeito, entendeu o Superior Tribunal de Justiça que “inscrito o pecuarista vendedor na
repartição estadual, possuindo inscrição regular e habilitação à emissão de nota fiscal de
produtor, documento hábil inclusive para o transporte das reses vendidas, acompanhando-
as até o destino, cabia apenas à destinatária, ao recebê-las, a obrigação de expedir nota
63 Misabel Abreu Machado Derzi. Op. cit. p. 761-762. Sacha Calmon Navarro Coêlho, por sua vez, noticia caso ocorrido em que pequeno comerciante deu saída da mercadoria negligentemente sem a via de acompanhamento da Nota Fiscal fatura, muito embora tenha lançado a operação no livro de Registro de Saída de Mercadorias, anotado a movimentação no estoque e o crédito da duplicata emitida contra o comprador. No Posto Fiscal a mercadoria foi parada cobrando-se multa de 40% pela falta de documentação fiscal (prevista em lei pela presunção juris tantum de falta de pagamento do imposto). O contribuinte recorreu da multa, alegando boa-fé e falta de prejuízo ao Erário pelo lançamento nos livros, tendo a multa reduzida para 1% (Sacha Calmon Navarro Coêlho. Op. cit. p. 638). 64 STJ - REsp 160.120 - SP - 97.0092399-1 - Rel. Min. Humberto Gomes de Barros - DJU 03.02.1999 - p. 71.
32
fiscal de entrada, tal como procedido, de modo que a legislação de fato foi cumprida, não
sendo certamente obrigação do vendedor verificar se o destino estabelecido também havia
sido cumprido, mormente que o transportador estava por conta da empresa adquirente do
gado”.
O raciocínio se estende a emissão de Nota Fiscal de saída de produtos
industrializados, como o sapato, por exemplo. Se a empresa calçadista for regularmente
cadastrada na repartição fiscal, não pode ser responsabilizada pelo destino da mercadoria,
após a saída do seu estabelecimento. Se cumprida a legislação, com emissão da Nota Fiscal
de Fabricante, sem qualquer vício e com lançamento na escrita contábil, não há que se falar
em responsabilidade da empresa vendedora, sobretudo se a Nota Fiscal de saída coincidir
com a Nota Fiscal de entrada. O STJ já decidiu nesse sentido: “1. À época da transação, a
compradora estava regularmente inscrita e, se posteriormente foi constatada fraude na sua
constituição, não pode o vendedor, que realizou a transação de boa-fé, emitindo nota fiscal
de produtor para fazer acompanhar a mercadoria, ser responsabilizado. 2. Recurso
improvido”65.
Outro caso se refere a emissão de guia de importação e o seu conteúdo. Se a
erronia não é essencial em relação ao produto, não se pode ter como infração: “1. Guia de
importação mencionando erroneamente a classificação da base química do produto, mas
descrevendo corretamente seu nome comercial, não equipara-se a sua inexistência,
configuradora da infração prevista no art. 526, II, do Regulamento Aduaneiro. 2. O art. 136
do CTN, que consagra o princípio da responsabilidade objetiva, deve ser interpretado em
harmonia com o art. 112 do mesmo Código, que prescreve a interpretação mais favorável
ao acusado nas hipóteses nele previstas. 3. Apelação e remessa oficial improvidas”66.
Outro aspecto, em relação a emissão de Notas Fiscais inidôneas, tanto os
Tribunais Administrativos (Conselho de Contribuintes e Tribunais de Impostos e Taxas)
têm entendido que a infração é cometida por quem emite a Nota, não podendo ser
imputada ao adquirente, salvo se houve conluio e aproveitamento incorreto de créditos nos
impostos não-cumulativos67.
65 STJ – 1ª Turma – REsp nº 90.153 – Rel. Min. José Delgado – DJU 16.12.1998. No mesmo sentido: REsp nº 175.204. 66 TRF 1ª R. - AC 1997.01.00.016932-1 - MG - 3ª T. - Rel. Juiz Eustáquio Silveira - DJU 18.12.1998 - p. 1326. 67 RET 11/95 e 12/61.
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2. Denúncia espontânea e seus efeitos
A regra da responsabilidade pessoal consagrada no art. 137 do CTN é
excepcionada pelo disposto no art. 138 da mesma codificação. Com efeito, dispõe-se que
“A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for
o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância
arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de
apuração”. Sobre o dispositivo o ilustre tributarista EDUARDO MARCIAL FERREIRA JARDIM
esclarece que a denúncia espontânea é hipótese excludente de infração, elidindo a
imposição de penalidade. O doutrinador aduz, ainda, que “sempre que o sujeito passivo, na
condição de infrator, antecipar-se ao Fisco por iniciativa própria e regularizar o debitum,
estará a salvo de multas de qualquer natureza, inclusive a chamada multa moratória(...)
Dessarte, o juro de mora, sim, depara-se necessário na hipótese vertente, porquanto tem
por finalidade indenizar a Fazenda em relação ao retardo no pagamento do tributo. Em
despeito da clareza hialiana do comando sob exame, a Fazenda Pública faz tábula rasa
desse preceito e, num manifesto descumprimento de disposição expressa de lei, exige a
multa de mora, o que mostra um inconcebível desrespeito à ordem jurídica”68.
A multa moratória foi concebida como forma de punir o atraso no
cumprimento das obrigações fiscais, tornando-o oneroso. Seu escopo final é intimidar o
contribuinte, prevenindo sua mora. Inegável sua natureza punitiva. Com efeito, a denúncia
espontânea é uma exceção legal concedida ao devedor inadimplente, para que não se lhe
aplique multa moratória se o tributo for recolhido de uma só vez, acrescido de juros e
correção monetária.
Em outro sentido de interpretação, muito embora com autorizados
entendimentos em sentido contrário, alinhamos nosso posicionamento com o tributarista 68 Eduardo Marcial Ferreira Jardim. Op. cit. p. 238-239. No mesmo sentido, entendendo toda multa como punitiva: Sacha Calmon Navarro Cêlho. Op. cit. p. 641. A respeito da exclusão da multa moratória, decidiu o STJ, em acórdão da lavra da Ministra Nancy Andrighi: “A exigência do pagamento de multa punitiva, nos casos de confissão de dívida, acompanhada do pedido de parcelamento, sem que tenha havido qualquer ato da fiscalização ou se iniciado procedimento administrativo, importa em violação ao art. 138, do Codex Tributário. Recurso provido. (STJ – RESP 246457 – (200000073628) – RS – 2ª T. – Rel. Min. Nancy Andrighi – DJU 08.05.2000 – p. 00086). No mesmo sentido: STJ – AGA 278920 – (199901166012) – SP – 1ª T. – Rel. Min. José Delgado – DJU 19.06.2000 – p. 00124. STJ – Ac. 199800735429 – REsp 190721 – SP – 1ª T. -Rel. Min. Humberto Gomes de Barros – DJU 03.04.2000 – p. 00114. STJ – 2ª Turma – REsp nº
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SACHA CALMON NAVARRO COÊLHO69, para quem as responsabilidades acessórias
autônomas ou formais (obrigação de fazer e não-fazer), sem qualquer vínculo direto com a
existência do fato jurídico tributário, também estão alcançadas pelo art. 138, do CTN. Para
isso, deduzem-se dois argumentos: a) a terminologia do art. 138 não faz distinção da
responsabilidade excluída, ou seja, se referente à obrigação tributária ou a obrigação
acessória de fazer ou não-fazer; b) não seria justificável o art. 138 trazer a possibilidade de
pagamento “se for o caso”, ou seja, se o descumprimento fosse apenas de obrigação de
pagamento do tributo, tornando despicienda a ressalva. Assim, possível a denúncia
espontânea tanto com a elisão do pagamento do tributo, como também em relação à multa
advinda de obrigação acessória. É o caso, para exemplificar, do afastamento da multa
moratória prevista no art. 88, da Lei nº 8.981/95, que contempla a falta de apresentação da
declaração de rendimentos ou a sua apresentação fora do prazo, por pessoa física ou
jurídica. Esse, aliás, o entendimento do STJ, em acórdão da lavra da Ministra Eliana
Calmon: “1. A imposição de multa por atraso na entrega da declaração de rendimentos,
prevista no art. 88 da Lei 8.981, está em testilha com o art. 138 do CTN. 2. Imposição
apenas de juros moratórios àquele que se atrasou no pagamento, com a dispensa de sanção
pelo não-cumprimento de obrigação acessória – Art. 138 do CTN. 3. Recurso especial
conhecido, mas improvido”70.
A professora MISABEL ABREU MACHADO DERZI entende, ainda, que o art. 138
“ao determinar que a denúncia espontânea da infração exclui a responsabilidade tributária,
elide igualmente a responsabilidade penal. É que somente haverá crime se houver ilícito
tributário, regra que decorre da unidade do injusto”71.
Por expressa exigência normativa do parágrafo único do art. 138, somente se
considera espontânea a denúncia efetivada antes do início do procedimento administrativo
ou de medida de fiscalização, relacionados com a infração72. Procedendo o contribuinte à
16.672-91-SP – Rel. Min. Ari Pargendler – DJU 04.03.1996 – p. 5.394. TRF 3ª Região – AgIn 00.03000111426/0 – Relatora Des. Fed. Cecília Marcondes – DJU 19.07.00 – p. 88 – v.u. – RNDJ 09/98. 69 Sacha Calmon Navarro Coêlho. Op. cit. p. 644. Também: Misabel Abreu Machado Derzi. Op. cit. p. 769. 70 STJ – RESP nº 246.295-RS – 2ª T. – Relatora Ministra Eliana Calmon – DJU 12.06.2000 – p. 00101. No mesmo sentido: STJ – REsp nº 192.489-RS – 2ª T. – Rel. Min. Francisco Peçanha Martins – DJU 19.06.2000 – p. 00130. Em sentido contrário: STJ – AI 244.523 – PR – 99.0048685-4 – Rel. Min. José Delgado – DJU 22.09.199909.22.1999 – p. 66 – RET 10/147. 71 Misabel Abreu Machado Derzi. Op. cit. p. 764. 72 Considerando ineficaz a denúncia espontânea desacompanhada do pagamento: STJ – 2ª Turma – REsp nº 64.680-95-SP – Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro – DJU 16.06.1997 – p. 27.340.
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denúncia espontânea de débito tributário em atraso, com o devido recolhimento do tributo,
é afastada a imposição da multa moratória.
Em relação ao parcelamento deferido pela autoridade competente, doutrina e
jurisprudência têm entendido que se trata de forma de moratória individual em casos
excepcionais. Se não for cumprido o parcelamento por inadimplência, passa a ser devida a
multa moratória, sendo incabível a denúncia espontânea para o fim de excluir a multa.
Por outro lado, há grande dissidência jurisprudencial acerca da admissão do
pedido de parcelamento e o reconhecimento da denúncia espontânea. Muito embora haja
entendimento contrário, a simples confissão do débito, inclusive acompanhada de pedido
de parcelamento, configura a denúncia espontânea, de modo a afastar a cobrança de multa
e juros moratórios.
Houve definição da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça nesse sentido: “O
pagamento não é condição para que se dispense a responsabilidade por infração tributária.
O benefício outorgado pelo art. 138 do CTN incide, também, quando o contribuinte obtém
o parcelamento do débito. Sem antecedente procedimento administrativo, descabe a
imposição de multa, mesmo pago o imposto, após a Denúncia Espontânea, sob a forma de
parcelamento”73.
Nada obstante, a 2ª Turma daquele Sodalício, em acórdão da lavra da Ministra
Eliana Calmon, entendeu em sentido contrário: “1. A denúncia espontânea caracteriza-se
pela vontade do contribuinte de pagar antes de iniciado o procedimento fiscal. 2.
Entretanto, para fazer jus ao benefício do art. 138 do CTN, é preciso que a denúncia
espontânea seja acompanhada do pagamento devido. 3. O parcelamento não substitui o
pagamento. 4. Precedentes da Segunda Turma do STJ. 5. Recurso especial conhecido, mas
improvido”74.
73 STJ – REsp. 138.669/RS – (97/0045961-6) – 1ª T. – Rel. Min. Humberto Gomes de Barros – DJU 06.04.1998 – RET 01/70. No mesmo sentido, também da 1ª Turma: STJ – 1ª T. – REsp nº 168.868-98-RJ – rel. Min. Garcia Vieira – DJU 24.08.1998 – p. 26. STJ – 1ª T. – REsp nº 117031-97-SC – Rel. Min. José Delgado – DJU 18.08.1997 – p. 37.788. STJ 1ª T. – REsp nº 111.470-96-SC – rel. Min. Demócrito Reinaldo – DJU 19.05.1997. 74 STJ – REsp nº 228.101-PR – 2ª T. – Relatora Ministra Eliana Calmon – DJU 12.06.2000 – p. 00099. Quando ainda figurava nos quadros do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, a ilustre Ministra já possuía esse entendimento: TRF 1ª Região – 4ª Turma – MAS 7534-95/DF – Rela. Juíza Eliana Calmon – DJU 17.06.1996 – p. 41.244.
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3. Projeção da responsabilidade por infrações da legislação tributária sobre o crime
contra a ordem tributária
Para finalizar o estudo, resta verificar a repercussão da responsabilidade
tributária sobre a existência ou não de delito qualificado como crime. Um princípio inicial
já pode ser fixado: se há crime, há infração à legislação tributária, impondo-se dupla
sanção (penal e tributária). Se há infração, pode não haver crime.
Diante disso, é evidente o tangenciamento e, por vezes, os pontos de
intersecção entre a responsabilidade por infrações e o crime tributário. O fato sobre o qual
se opera é basicamente semelhante, diferindo somente na qualificação jurídica atribuída
pela legislação.
É a professora MISABEL ABREU MACHADO DERZI, nas notas lançadas na obra
de ALIOMAR BALEEIRO, quem comenta a caracterização do crime, diante do fato jurídico
também tido como atribuidor de responsabilidade por infração: “Em todos esses casos em
que há ilícito tributário (quer simultaneamente exista ou não delito), a apuração da
responsabilidade por infrações no Direito Tributário é independente (somente a apuração
da responsabilidade penal é que depende da tributária). A responsabilidade penal sujeita-se
a princípios diferentes daqueles vigorantes para a tributária. Entretanto, todas as infrações
são espécies de uma mesma família (princípio da unidade do injusto), razão pela qual,
apesar das especificidades, há aproximações significativas no regime jurídico de todas
essas infrações, penais ou tributárias”75.
O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou sobre a imbricação entre os
temas: “Descabe obstar o curso da ação penal, via habeas corpus, diante da necessidade de
averiguar a responsabilidade solidária dos administradores de bens de terceiros, pelos
tributos por estes devidos, quando impossível o cumprimento da obrigação principal pelo
contribuinte, nos termos do artigo 134 do CTN – Recurso desprovido”76.
Cabe finalizar o tópico informando que a infração e o crime são regulados por
princípios e leis distintas, que orientam a atuação do legislador. Se, por um lado, a
apuração de responsabilidade por infração antecede e informa a apuração do crime, por
75 Misabel Abreu Machado Derzi. Op. cit. p. 761. 76 STJ – RO-HC nº 6499-DF – 5ª T. – Rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini – DJU 30.03.1998 – p. 97.
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outro, o delito está sujeito ao escorreito preenchimento do trinômio de ação típica, ilícita e
culpável, inclusive com as ressalvas das excludentes.
4. Conclusão
O percurso das normas de responsabilidade tributária estipuladas no CTN
trouxe diversas observações, sobretudo no concernente à interpretação da norma estrutural
da responsabilidade, para chegar à norma de conduta de cobrança do tributo e
sancionamento pela infração.
Apesar de algumas ambigüidades na sistemática do CTN, em linhas gerais a
definição de responsabilidade tributária e responsabilidade por infrações à legislação
tributária determina principiologia, sobretudo no concernente à exigência ou não do
elemento subjetivo que determina a incidência da regra. Se na responsabilidade tributária a
lei define caso a caso o elemento subjetivo determinante (dolo ou culpa), na
responsabilidade por infração à legislação tributária, por sua vez, é adotada a teoria do
risco, prescindindo do fator anímico na conduta do contribuinte infrator.
A interpretação da norma tributária de responsabilidade, nesse sentido, deve
atender à correta observância do sistema, salvo quando o próprio sistema dispuser no
sentido de permitir maiores benefícios da interpretação, conforme se faz nos arts. 106 e
112 do CTN. Interpretar uma lei é descobrir seu sentido e alcance. De acordo com
GIULIANI FONROUGE a busca de métodos de interpretação mais flexíveis é a eterna luta
pela justiça como suprema aspiração do direito. É de FONROUGE a orientação de que o
direito tributário não atua com preceitos em favor ou contra o contribuinte ou o Estado. A
única finalidade do intérprete deve ser obter o sentido de justiça para que a norma possa
cumprir sua função. Pode-se afirmar, então, que o intérprete deve se valer de todos os
métodos a seu alcance, para examinar a letra da lei, verificar a intenção do legislador e tem
que adequar esse pensamento à realidade. Além disso, deverá coordenar a norma com todo
o sistema jurídico, assim como contemplar a realidade econômica que se regrou.
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