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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP IVELAINE DE JESUS RODRIGUES A MODERNIDADE NA SINTAXE DA GRAMMATICA ANALYTICA DE MAXIMINO MACIEL MESTRADO EM LÍNGUA PORTUGUESA São Paulo 2014

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Page 1: A MODERNIDADE NA SINTAXE DA GRAMMATICA ANALYTICA DE ... de... · Língua Portuguesa do Programa de Estudos Pós-Graduados em Língua Portuguesa da Pontifícia Universidade Católica

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

IVELAINE DE JESUS RODRIGUES

A MODERNIDADE NA SINTAXE DA GRAMMATICA

ANALYTICA DE MAXIMINO MACIEL

MESTRADO EM LÍNGUA PORTUGUESA

São Paulo

2014

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

IVELAINE DE JESUS RODRIGUES

A MODERNIDADE NA SINTAXE DA GRAMMATICA

ANALYTICA DE MAXIMINO MACIEL

MESTRADO EM LÍNGUA PORTUGUESA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Língua Portuguesa, sob a orientação da Professora Doutora Leonor Lopes Fávero.

São Paulo

2014

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Banca Examinadora

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Confia ao Senhor as tuas obras e

os teus planos serão estabelecidos.

(Provérbios 16: 3)

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À minha família hoje e sempre! Ivo,

Vera, Jamille e Gabriel: vocês são a

minha fortuna.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, a Deus por ter me colocado nesse lugar, por ter me dado

capacidade, equilíbrio, condições financeiras (ao meu paitrocinador) e, principalmente, pelas

pessoas maravilhosas que colocou ao meu lado durante esses dois anos e meio.

À minha família que acreditou mais em mim do que eu mesma acreditei. Vocês foram

escolhidos “a dedo” por Deus para que fizessem parte da minha vida. Obrigada por todo

respeito, consideração, amor e, mais do que isso, por não me deixarem sozinha nessa selva de

pedra! Pai, mãe, Milla e Biel: vocês são a minha vida! Nunca esquecerei das histórias

homéricas que vivemos aqui!

À professora Drª Leonor Lopes Fávero que, com toda paciência do mundo, orientou-

me da forma mais excelente que poderia: sanou minhas dúvidas, corrigiu minhas falhas,

puxou a orelha nos momentos necessários e compreendeu que meus períodos em férias em

Aracaju significavam o não cumprimento dos prazos. Meu eterno agradecimento!

Ao professor Dr. Jarbas Vargas Nascimento que, mesmo com toda ocupação que a

vida profissional lhe impõe, teve o carinho de me atender nos momentos em que precisei e,

como se não bastasse, aceitou participar da minha banca fazendo sugestões importantes.

À professora Drª Márcia Molina que, com grande generosidade, concordou em fazer

parte da minha banca e apontou coisas relevantes para que meu trabalho chegasse a esse

resultado (tudo isso com muita organização!).

À Drª Christianne de Menezes Gally por ter me incentivado a fazer essa loucura que é

o mestrado e ter me apresentado à professora Leonor e aos demais amigos. Além disso, você

tem sido o meu anjo em São Paulo (não somente na vida acadêmica, corrigindo as baboseiras

que eu escrevia, mesmo doente, ou dizendo que eu sou muito mais capaz do que eu acredito

ser, mas também me ensinou coisas da vida que mais ninguém poderia fazer). A você e a sua

família, digo o maior muito obrigada que o mundo já ouviu.

À Capes por me conceder uma bolsa integral.

Aos amigos que me ajudaram nessa luta: Thiago, tudo começou porque você me

ajudou e me incentivou (quando eu falava com você, você fazia parecer que era tudo tão fácil,

que as partes difíceis acabaram sendo mais leves). Rodrigo, compartilhar as dificuldades de

estarmos tão longe dos nossos sonhos e, ao mesmo tempo, conseguirmos rir de tudo isso é

uma arte e você foi o artista perfeito (agradeço a Deus pela sua insônia)! Sandy, mesmo com

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toda a distância, você faz parte disso: lembro-me bem das suas tentativas em me explicar o

“b-a-bá” das partes de um projeto e pela companhia, que é inquestionável.

Aos amigos de curso, em especial, a Laura, a primeira amiga que fiz, desde a primeira

disciplina que cursei (nossas caminhadas, conversas e trabalhos valem muito ao meu coração,

muito mais do que você possa imaginar); Cristiano e Alexandre (até aqui vocês estão juntos?),

irmãos por parte de orientadora, saibam que conhecer vocês, cultivar a amizade e dividir as

angústias foi um marco em minha vida, pois, depois dessa amizade, os “pitos” foram mais

suaves e nossas músicas... motivo de risada! Acho que a música de hoje poderia ser: “ha ha ha

ha, mas eu tô rindo a toa” (será?).

Às amigas que, mesmo longe, estiveram sempre presente: Ana, Nandinha, Nadja, Lili,

Tássia, Priscila, Larice, Lisbeth e Monize. Vocês são amigas de uma vida inteira e irão

permanecer dessa maneira. Obrigada pelos conselhos, pela companhia, pela ajuda, pelas

gargalhadas e pelo carinho! Eu amo vocês!

A Léo que me ajuda em vários aspectos e, apesar do pouco tempo que nos

conhecemos, já é bem presente. Além disso, não posso desprezar um cara que acha que meu

trabalho é “a mais rica pesquisa jamais vista na história desse país, segundo a revista

FORBES”.

Aos irmãos da Igreja do Evangelho Quadrangular (SE e SP) por torcerem sempre por

mim e me ajudarem com cobertura espiritual, nos nomes dos pastores Luiz Antônio, Davi

Rodrigues, Ângela Abreu e aos que tornaram os meus domingos mais divertidos, Paulo Preto

e Davizinho.

Enfim, a todos que direta ou indiretamente passaram por minha vida, contribuindo de

alguma forma com o meu crescimento profissional.

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RESUMO

Partindo do princípio de que as produções gramaticais brasileiras do século XIX deixaram de

ser influenciadas somente pela orientação da corrente geral e filosófica e passaram a ser

influenciadas também pela orientação da corrente científica, no período em que emergia o

processo de gramatização, Maximino de Araújo Maciel publicou, em 1887, a Grammatica

Analytica. Embasado nos fundamentos teórico-metodológicos da História das Ideias

linguísticas, este trabalho tem como objetivos descrever e analisar a Grammatica Analytica,

com a finalidade de apontar a “modernidade” presente, de acordo com o que o próprio

gramático sugere no prólogo da sua obra, comparando-a, quando necessário, com a

Grammatica Descriptiva do mesmo autor e analisar a syntaxologia, considerando tais teorias.

Com essa análise, pretendemos afirmar que a concepção de modernidade – que nesse período

estava ligada ao método histórico comparativo – se faz presente na gramática de Maximino

Maciel, pois conseguimos identificar a fidelidade aos preceitos das “teorias modernas”

utilizadas por ele. O cuidado com a forma, com as nomenclaturas, com os exemplos

empregados, com as regras que caíram em desuso fez das Grammaticas Analytica e

Descriptiva, referência no ramo de gramáticas brasileiras do século XIX.

Palavras-chave: História das Ideias Linguísticas, Grammatica Analytica, Grammatica

Descriptiva, Maximino Maciel, modernidade, syntaxologia.

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ABSTRACT

Assuming that Brazilian grammatical productions of the nineteenth century ceased to be

influenced by the orientation of the general and philosophical movement and began to be

influenced by the orientation of the scientific mainstream in the period in which the process of

grammar mastering was emerging, Maximino de Araújo Maciel published, in 1887, the

Grammatica Analytica. Based upon the theoretical and methodological foundations of the

History of Linguistic Ideas, this paper aims to describe and analyze the Grammatica

Analytica, for the purpose of pointing out the present "modernity ". According to the

grammarian himself suggests in the prologue of his work, comparing it, when necessary, with

the Grammatica Descriptiva and analyze syntaxologia considering such theories. With this

analysis, we intend to assert that the conception of modernity – which in this period was

linked to the comparative historical method – is present in the grammar of Maximino Maciel,

because we can identify allegiance to the precepts of the "modern theories" used by him. The

attention to the shape, to the classifications, to the examples used, to the rules that have fallen

into disuse made the Grammaticas Analytica and Descriptiva a reference to the Brazilian

grammars branch of the nineteenth century.

Keywords: History of Linguistics Ideas, Grammatica Analytica , Grammatica Descriptiva ,

Maximino Maciel , modernity, syntaxologia .

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................................14

Capítulo 1 – FUNDAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS: A HISTÓRIA DAS

IDEIAS LINGUÍSTICAS

1.1 A Escola dos Annales e a Nova História.............................................................................19

1.1.1 A primeira geração.......................................................................................................20

1.1.2 A segunda geração e a História Quantitativa...............................................................24

1.1.3 A terceira geração e a História das Mentalidades........................................................27

1.2 A Nova História Cultural....................................................................................................30

1.3 A história das ideias linguísticas.........................................................................................33

Capítulo 2 – CONTEXTO POLÍTICO, ECONÔMICO, CULTURAL E

EDUCACIONAL DO BRASIL NA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XIX

2.1 O Brasil na segunda metade do século XIX.......................................................................36

2.1.1 Da Monarquia à República..........................................................................................36

2.1.2 O café, a extinção do tráfico de escravos e a imigração: a história econômica...........40

2.1.3 Os brasileiros e a cultura brasileira..............................................................................43

2.2 A educação no Brasil na segunda metade do século XIX...................................................47

2.2.1 O ensino secundário no Brasil e o Colégio Pedro II....................................................47

2.2.2 O ensino secundário na província de Sergipe..............................................................51

2.2.3 A disciplina Língua Portuguesa na grade curricular....................................................55

Capítulo 3 – AUTOR E OBRA: MAXIMINO MACIEL E A GRAMMATICA

ANALYTICA

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3.1. O Autor..............................................................................................................................58

3.2. Breve Retrospecto Sobre o Ensino da Lingua Portugueza................................................61

3.2.1 Intelectuais e obras que marcaram o final do século XIX...........................................62

3.2.1.1 Júlio Ribeiro..........................................................................................................63

3.2.1.2 Fausto Barreto.......................................................................................................63

3.2.1.3 Ventura Bôscoli.....................................................................................................64

3.2.1.4 Said Ali.................................................................................................................65

3.2.1.5 João Ribeiro e Alfredo Gomes..............................................................................65

3.2.1.6 Heráclito Graça e Mario Barreto...........................................................................66

3.3. Descrição da Grammatica Analytica.................................................................................67

3.3.1. Visão Geral.................................................................................................................69

3.3.2. Divisão da Obra..........................................................................................................70

3.3.3 Definição de Gramática...............................................................................................72

3.3.4 Phonologia...................................................................................................................73

3.3.4.1 Phonetica...............................................................................................................73

3.3.4.2 Prosodia.................................................................................................................74

3.3.4.3 Phonographia........................................................................................................74

3.3.4.4 Orthographia.........................................................................................................74

3.3.5 Lexeologia....................................................................................................................75

3.3.5.1 Morphologia..........................................................................................................75

3.3.5.2 Taxeonomia...........................................................................................................76

3.3.5.3 Kampenomia.........................................................................................................77

3.3.5.4 Etymologia............................................................................................................78

3.3.6 Syntaxologia.................................................................................................................78

3.3.7 Senecologia/ Semeiologia............................................................................................79

3.3.7.1 Exegetica...............................................................................................................79

3.3.7.2 Technica................................................................................................................80

Capítulo 4 - A MODERNIDADE NA SYNTAXOLOGIA DA GRAMMATICA

ANALYTICA: UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE A PRIMEIRA E A OITAVA

EDIÇÕES

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4.1 Análise descritiva da syntaxologia na Grammatica Analytica...........................................82

4.1.1 Syntaxe.........................................................................................................................83

4.1.2 Topologia.....................................................................................................................93

4.1.3 Phraseologia..............................................................................................................104

4.1.4 Estylistica...................................................................................................................108

4.2 Análise-comparativa da syntaxologia na Grammatica Analytica (1887) e na Grammatica

Descriptiva (1922)...................................................................................................................109

4.2.1 Syntaxe Relacional.....................................................................................................110

4.2.2 Syntaxe Phraseologica...............................................................................................111

4.2.3 Syntaxe Literaria ou Estylistica.................................................................................114

CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................................116

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................................118

 

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Lista de Quadros

Quadro 1. Professores, disciplinas e material didático utilizado na primeira cadeira do

Atheneu Sergipense. (p. 53 e 54)

Quadro 2. Plano da disciplina Língua Portuguesa no Colégio Pedro II durante o Império. (p.

55 e 56)

Quadro 3. Principais obras de Maximino Maciel. (p. 59 e 60).

Lista de Tabelas

Tabela 1. Classificação dos diferentes tipos de gramática (p.72).

Tabela 2. Divisão da sintaxologia (p. 82 e 83).

Tabela 3. Tipos de subjeito (p. 84).

Tabela 4. Tipos de predicado (p. 85).

Tabela 5. Tipos de “complemento objectivo” (p. 85).

Tabela 6. Casos de concordância nominal (p. 87 e 88).

Tabela 7. Casos de concordância verbal (p. 89).

Tabela 8. Casos de concordância semeiotica (p. 91).

Tabela 9. Omissão do artigo definito (p. 96).

Tabela 10. Omissão do artigo indefinito (p. 97).

Tabela 11. Topologia dos adjectivos (p. 97 e 98).

Tabela 12. Topologia do subjeito (p. 99).

Tabela 13. Usos da colocação pronominal (p. 100).

Tabela 14. Classificação das sentenças (p. 104).

Tabela 15. Classificação das proposições (p. 112).

Lista de Gráficos

Gráfico 1. Proporção das partes da Grammatica Analytica (p.71)

 

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14  

INTRODUÇÃO

Esta dissertação está ambientada na linha de pesquisa História e Descrição da

Língua Portuguesa do Programa de Estudos Pós-Graduados em Língua Portuguesa da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e tem como objeto de estudo analisar a

primeira edição da gramática de Maximino de Araújo Maciel, a Grammatica Analytica. A

produção das gramáticas, no Brasil, no final do século XIX e início do século XX, foi

fartamente discutida no âmbito de sua história e sua descrição, como em Cavaliere (2000);

Bastos & Palma (2004); Fávero & Molina (2006) e Gally (2013), para citar alguns.

O método histórico-comparativo de Franz Bopp norteou “a remodelação” e o plano

de ensino de preparatórios, especialmente elaborados por Fausto Barreto. João Ribeiro,

Pacheco da Silva e Lameira de Andrade, Maximino Maciel e Alfredo Gomes construíram

suas gramáticas para atenderem às exigências desse plano, apropriando-se também das

teorias “revolucionárias” do positivismo e do evolucionismo. É também nessa época que

os estudos lexicográficos e fraseológicos tornam-se importantes, seguindo os passos da

geografia linguística de Gillérion.

Maximino de Araújo Maciel, para atender a essas exigências, elaborou a

Grammatica Analytica, em 1887, que foi refeita, em 1894, com o nome de Grammatica

Descriptiva. Daí em diante, a obra teve várias edições até o ano de 1931. Sua proposta era

construir uma “gramática moderna” que rompesse com a tradição oitocentista e que

estivesse de acordo com o programa de ensino de preparatórios proposto por Fausto

Barreto e uma de suas preocupações, a partir da segunda edição, estava na sintaxe, pois,

segundo o autor, os gramáticos que o antecederam seguiam os antigos moldes e abordavam

a sintaxe superficialmente.

Para Maximino Maciel, a “modernidade” enfatizada em sua gramática e,

consequentemente, neste trabalho está diretamente relacionada à teoria evolucionista, ao

Realismo, ao advento do pensamento positivista – que chegou ao Brasil nesse período – e

ao método histórico-comparativo. Em todo momento, portanto, em que for empregada a

concepção de modernidade e novas teorias, faremos menção a uma dessas linhas de

pensamento.

Utilizando o referencial teórico-metodológico da História das Ideias Linguísticas,

propomo-nos responder às seguintes perguntas: de que maneira o autor conciliava as

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concepções de mudança com as inovações linguísticas Quais as doutrinas utilizadas na

construção da syntaxologia que se referem à nova abordagem proposta por Maximino

Maciel em sua Gramática Analytica? Qual o diferencial apresentado nas explicações da

syntaxologia?

Para isso, seguimos três principais procedimentos metodológicos:

Seleção e leitura das fontes teóricas utilizadas;

Levantamento do corpus gramatical;

Descrição e análise da gramática.

Este trabalho tem como objetivos descrever e analisar a Grammatica Analytica, a

fim de identificar a “modernidade” nela instaurada, conforme afirma o seu autor nos

preâmbulos, comparando-a, quando necessário, com a Grammatica Descriptiva; verificar

como ela se insere na produção gramatical brasileira e qual a sua importância na época em

que foi produzida; e analisar as orientações contidas na syntaxologia, considerando as

novas teorias defendidas por Maximino Maciel.

Esta dissertação justifica-se porque se propõe a ampliar as discussões acerca da

construção das gramáticas no Brasil. A Grammatica Analytica de Maciel, tal qual a

maioria das gramáticas de língua portuguesa no Brasil do final do século XIX, foi

construída com o propósito maior de subsidiar os alunos do ensino secundário oferecido

pelo Colégio Pedro II, e pelo Colégio Militar do Rio de Janeiro, de onde era professor. A

contribuição pretendida, nesta investigação, portanto, está na análise de uma gramática que

se pretendeu inovadora naquele momento histórico.

Este trabalho organiza-se em quatro capítulos: no capítulo 1, discutimos a História

das Ideias Linguísticas, pensada por Auroux (1992), que remete ao processo de

gramatização, entendido como “o processo que conduz a descrever e a instrumentar uma

língua na base de duas tecnologias, que ainda hoje são os pilares de nosso saber

metalinguístico: a gramática e o dicionário”. (AUROUX, 1992, p. 65). Vemos, ainda, que

a História das Ideias Linguísticas preocupa-se com o estudo tanto dos saberes linguísticos,

quanto das gramáticas e instituições nas quais esse saber fora moldado. Assim, o papel do

historiador das ideias linguísticas é “... analisar, no contexto em que foi criada [uma] ideia,

como frutificou, foi compreendida, difundida, interpretada e representada, mergulhando

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16  

em sua profundidade, enxergando os fios que a constituíram e todos os seus reflexos,

favorecendo uma melhor compreensão da Linguística atual” (FÁVERO & MOLINA,

2006, p. 29).

No segundo capítulo, para situar a produção gramatical de Maximino Maciel,

traçamos um breve panorama do contexto histórico, político, econômico, cultural e

educacional do Brasil no século XIX (por exemplo, a transição da Monarquia para a

República, a economia cafeeira, o abolicionismo e o ensino secundário no Brasil e na

província de Sergipe, já que o autor era sergipano e cursou o ensino primário e secundário

nessa província). Por meio desta contextualização, é possível perceber a inserção de um

novo ideário de ensino da Língua Portuguesa em terras brasileiras, em especial,

relacionando o desenvolvimento educacional no Estado de Sergipe, com a construção do

Atheneu Sergipense, onde o autor desenvolveu seus estudos.

No capítulo três, apresentamos a biografia de Maximino Maciel, e fazemos um

levantamento das obras por ele publicadas. Além disso, realizamos a descrição e análise da

Grammatica Analytica (exceto da syntaxologia, que está descrita e analisada no capítulo

seguinte) e abordamos os autores que Maximino Maciel apresentou em seu Breve

Retrospecto Sobre a Língua Portuguesa juntamente com a relevância das obras por eles

produzidas nesse período, pela visão do autor.

Por fim, no quarto capítulo, descrevemos e analisamos a syntaxologia presente na

Grammatica Analytica e, em seguida, fazemos uma comparação entre a syntaxologia da

primeira edição e a publicada na oitava (última em vida do autor), já intitulada

Grammatica Descriptiva, a fim de identificarmos quais os pontos que indicam a concepção

de modernidade nela citada.

 

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17  

Capítulo 1

FUNDAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS: A

HISTÓRIA DAS IDEIAS LINGUÍSTICAS

A História, desde a antiguidade clássica até o início do século XX, esteve associada

à narrativa de acontecimentos – apesar de ter-se apresentado sob diferentes formas e de ter

variado quanto ao seu conceito no decorrer do tempo. Essa História – em sua forma mais

corriqueira – limitava-se à narrativa de “grandes” eventos políticos e militares e destacava

alguns homens – chefes militares, reis etc. – como personagens fundamentais do

acontecimento registrado.

Além disso, os fatos históricos compilados dependiam unicamente da visão do

historiador que os arrolava e fazia dos documentos fontes comprobatórias suficientemente

únicas para a descrição do episódio que se pretendia reconstruir – ou seja, a ocorrência e os

documentos dispensavam a interpretação do historiador, que carregava uma concepção e

uma visão de mundo próprias e não inseria essas concepções pessoais, conscientemente.

Segundo Reis, a “história tradicional era “um olhar a partir de cima”: psicológica, elitista,

biográfica, qualitativa, visava ao particular, ao individual e ao singular, era legitimadora,

partidária, comemorativa, uma narrativa justificadora do poder presente”. (REIS, 2000: 22)

Foi no período do iluminismo (BURKE, 2010) que houve a tentativa de comutação

desse padrão histórico: começaram-se a verificar registros históricos que se distanciavam,

mesmo que discretamente, das características acima descritas – temas como as leis e o

comércio, a moral e os bons costumes começaram a ser levados em consideração, como

relatado no livro Essai sur les moeurs, de Voltaire. Assim, os teóricos despertam as

atenções:

(...) para concentrarem-se na história das estruturas, tais como o sistema feudal ou a constituição britânica. Alguns deles dedicaram-se à reconstrução de comportamento e valores do passado, especialmente, à história do sistema de valores conhecido como “cavalaria”; outros à história da arte, da literatura e da música. (BURKE, 2010: 18)

Essa vertente sociocultural, entretanto, acabou desgastada e esquecida,

principalmente, voltando a interface política a ser objeto de estudo e pesquisa nas revistas

profissionais.

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18  

Entre 1860 e 1865, alguns historiadores como Michelet, Burckhardt e Fustel de

Coulanges escreveram obras sobre o Renascimento que iam além de qualquer tentativa já

feita quanto à renovação do fazer histórico, tratando temas sobre a história das classes

subalternas contada por elas mesmas: Estado, religião e cultura; história da religião, da

família e da moralidade, respectivamente e passaram a interpretar, de acordo com algumas

das suas concepções, o fato histórico.

Com o surgimento da disciplina Sociologia, Augusto Comte (1864) rebateu

bruscamente, por meio de suas publicações, a história que destacava “nomes” e fatos

isolados – assim como Durkheim (1896) rejeitava fatos isolados – primando pelo registro

de uma história coletiva, da nação, sem destacar nomes e grandes feitos.

As críticas à história política só aumentavam e, no último ano do século XIX,

tornaram-se ainda mais intensas. Karl Lamprecht sugeriu a substituição dessa história pela

história cultural e econômica – como depois a chamou de “ciência sociopsicológica”.

Esses estudiosos são um pequeno exemplo de que nem toda a história construída

nesse período esteve sob a égide da narrativa de eventos políticos como a maioria fazia e

que o desejo de mudança da história não dependia apenas de alguns estudiosos

separadamente.

Por mais importantes e inovadoras que possam ter sido estas tendências, não foram suficientes para provocar de imediato grandes alterações no panorama da historiografia, ou seja, não conseguiram abalar a posição dominante da história política, nem a supremacia institucional da “historiografia metódica” ou positivista. No máximo, talvez, pode-se propor a hipótese de que o historicismo tenha trazido à tona certas preocupações teóricas que, como desafios, atuaram em diversos níveis e campos do pensamento historiográficos. [grifo do autor] (FALCON, 1997: 67).

Em 1903, o economista Simiand publicou um artigo na revista Revue de Synthése

Historique, em que pretendia atacar três práticas constantes nos registros de história da

época – a história política, a ênfase em homens que tinham prestígio como parte totalizante

do acontecimento e a concentração dos estudos das origens).

Henri Berr, fundador da Revue de Synthése Historique, tentava encorajar os novos

pesquisadores a uma interdisciplinaridade ligada à construção histórica. Essa

interdisciplinaridade foi levada adiante por dois jovens historiadores que publicaram em

sua revista: Lucien Febvre e Marc Bloch.

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19  

1.1 A Escola dos Annales e a Nova História

Incomodados e, ao mesmo tempo, inconformados com o rumo que a história

tradicional – baseada na narrativa de caráter biográfico dos fatos políticos – tomava, dois

jovens historiadores, Lucien Febvre e Marc Bloch, influenciados pela recente corrente

teórica de renovação dos estudos geográficos, que, encabeçada pelo grupo de Vidal de La

Blache, pensava a geografia voltada para um novo objeto – o homem – propõem uma

Nouvelle Historie.

(...) uma história problematizadora do social, preocupada com as massas anônimas, seus modos de viver, sentir e pensar. Uma história de estruturas em movimento, com grande ênfase no estudo das condições de vida material, embora sem qualquer reconhecimento da determinância do econômico na totalidade social, ao contrário do proposto pela concepção marxista da história. (VAINFAS, 1997: 130).

Como os dois compartilhavam a mesma concepção acerca das novas perspectivas

relacionadas ao modo de fazer história, mantinham contato diariamente e estavam

inseridos em um grupo que contava com estudiosos de diversas áreas do conhecimento – o

psicólogo social Charles Blondel, o sociólogo Maurice Halbwachs, além de Georges

Lefebvre e Gabriel Le Bras, que trabalhavam com sociologia histórica e das religiões, entre

outros – surgiu o interesse em criar uma revista que trabalhasse a história com um caráter

interdisciplinar, assim como pregava Henri Berr, uma nova história.

Seguindo, inicialmente, o modelo da Annales de Géographie de Vidal de La

Blache, Febvre e Bloch publicaram, em 15 de janeiro de 1929 o primeiro número da

revista Annales d’histoire économique et sociale com a finalidade de intensificar e

disseminar o “espírito” de renovação que alguns estudiosos propagavam desde o início do

século XX.

Com a responsabilidade de dirigir e editar essa revista, Febvre e Bloch pregavam

uma história social e econômica que abandonasse a narrativa dos acontecimentos políticos

e, a partir disso, impulsionavam uma nova espécie de história que priorizasse as

concepções humanas coletivas e que cada vez mais se afastasse da política e do estilo

biográfico que estavam ligados ao método tradicional.

(...) os Annales foram bem-sucedidos no agrupar as ciências humanas por detrás de sua bandeira. Nesse combate contra o historicismo, temos como resultado o núcleo permanente do discurso dos Annales, para além de suas flutuações: a

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relativização ou, pelo menos, a recusa do relato factual e do relato político. É a partir dessa recusa que os Annales se definem como escola, superando a diversidade dos seus componentes. (DOSSE, 2003: 90).

Essa nova proposta foi a grande responsável por mudanças significativas no âmbito

metodológico da pesquisa histórica. Acabando com a ótica exclusivamente política em que

se descreviam fatos grandiosos, os novos pesquisadores eram levados a trabalhar sob a

perspectiva socioeconômica, em parceria com as ciências sociais, pois o principal objetivo

era unir a história a outras áreas do conhecimento humano – geografia, sociologia,

psicologia, economia, linguística, antropologia social, entre outras –, promovendo a

interdisciplinaridade para trabalharem sobre o mesmo objeto: o homem social. Esse

momento também foi marcado “pela heterogeneidade e por uma grande abertura na

aceitação de novas propostas e métodos.” (FÁVERO & MOLINA, 2006, P. 21).

Houve, na história dos Annales, três gerações, que, apesar de divergirem em

algumas concepções com o passar do tempo e com a mudança dos dirigentes, marcaram a

chamada École des Annales e tornaram-na o grande marco na implantação da Nova

História na França. Cada uma dessas gerações, em um determinado momento, teve o seu

papel de importância no novo rumo que desejavam atribuir à história e, a despeito dos

destaques de alguns nomes, o sucesso dos Annales se deu por ser um grupo, ou seja, um

empreendimento coletivo.

1.1.1 A primeira geração

A chamada primeira geração dos Annales, encimada pelos fundadores da revista

Febvre e Bloch, foi a grande responsável em revelar a insatisfação dos novos historiadores

com relação ao rumo que a história tradicional tomava. Essa geração (de 1929 a 1946)

conquistou mudanças significativas quanto ao modo de pensar, pesquisar e registrar a

história e foi conhecida como o ponto de partida inicial para aquela que seria, segundo

Burke (2010), a revolução francesa da historiografia.

Quanto às técnicas e aos métodos, além da ênfase na interdisciplinaridade – citada

anteriormente – algumas outras características, novas direções de pesquisa e novos

métodos foram importantes no processo de mudança empreendido por esses estudiosos a

partir dessa revista que, posteriormente, se tornaria o principal veículo de difusão dessas

novas ideias.

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Se a história política tradicional explanava eventos, separadamente, fatos que não

pertenciam à realidade social do indivíduo, a nova história projetada pelos Annales

pretendia investigar aquilo que fazia parte do cotidiano do homem dentro do meio social

em que ele estava inserido e que pudesse ser considerado duradouro, aquilo que fosse

estável, já que se acreditava na inércia dos acontecimentos. Esse novo campo histórico de

pesquisa foi chamado de geo-história e, em parceria com a geografia, tinha como objeto as

ligações entre a natureza e o homem – ação coletiva do homem na natureza.

Diferentemente do que pensavam os historiadores tradicionais, ao reconhecer que

não havia como reproduzir fielmente um fato histórico, da maneira exata como ele se

passou – devido à distância e à subjetividade do olhar – os Annales elaboraram o novo

método que mudou a trajetória da tradicional pesquisa histórica: a história-problema. Esse

novo método de pesquisa acabou com a história puramente narrativa e trouxe consigo

várias outras particularidades que chegaram para acrescentar essa nova maneira de fazer

história.

Na história que até então era feita, o processo para que um fato fosse pesquisado e

descrito surgia a partir da existência de um documento oficial que tivesse registrado o

acontecimento. Esse processo era o único desencadeador dos demais até que o fato fosse

narrado, com base na comprovação dos documentos, do mesmo jeito em que ele passava

na época pesquisada.

O historiador tinha a função de arrolar os documentos e organizá-los no tempo

cronológico, narrar os fatos com objetividade e constituir um texto impessoal e

parcialmente voltado para a exaltação de personalidades “importantes” e, nele, todos já

sabiam o final da história antes mesmo que ela começasse a ser escrita, pois o documento

lhe assegurava início, meio e fim.

A história-problema afirma que a primeira instrução para a pesquisa histórica, terá

de partir do problema lançado pelo próprio historiador, portanto, esse problema é o que

guiará a pesquisa histórica – e não o documento. Assim, a partir do momento em que o

pesquisador elabora a hipótese – fundamentada em algo que ele acredite –, é que vai ao

encontro dos documentos que a legitimem.

Nela, o historiador sabe que escolhe seus objetos no passado e os interroga a partir do presente. Ele explicita a sua elaboração conceitual, pois não pretende se apagar na pesquisa, em nome da objetividade. Ao contrário, exatamente para ser mais objetivo, o historiador “aparece e confessa” seus pressupostos e conceitos, seus problemas e hipóteses, seus documentos e suas técnicas e os modos como as

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utilizou e, sobretudo, a partir de que lugar social e institucional ele fala. (REIS, 2000:25).

O historiador, destarte, deixa de ser um reprodutor daquilo que aparece no

documento, para interpretar o fato, e reabrir a história, sabendo que jamais conseguirá fazer

a reconstituição exata daquilo que deseja remontar por meio de suas pesquisas. Isso é uma

construção teórica e não mais uma compilação de documentos que atestam objetivamente

um fato já cógnito. Essa nova definição de temporalidade prioriza aquilo que há de

permanente e perdurável na história pública, do homem comum.

Ao contrário dos historiadores tradicionais que descreviam o fato no tempo

cronológico, o novo grupo começou a trabalhar com um tempo não-linear, ou seja, o

pesquisador precisa examinar o passado a partir das necessidades verificadas no presente,

pelo episódio e não pelo tempo – não com o objetivo de desconsiderar tudo o que já havia

de produção histórica até então, mas de reabrir esse passado interligando-o às necessidades

identificadas no presente.

Ainda diante das mudanças introduzidas pelos Annales em nome de uma nova

história, há a ampliação do conceito de fonte. Enquanto para os historiadores tradicionais a

única fonte confiável que conseguia comprovar o fato histórico político eram os

documentos oficiais – geralmente manipulados pelos que detinham o poder, justamente

com o objetivo de destacar nomes, elevar ações ou forjar uma situação – para os Annales,

além dos documentos já utilizados, fonte poderia ser tudo aquilo que retratasse o cotidiano

das massas, de maneira que parecesse mais ligado à realidade social:

Os documentos não são mais ofícios, cartas, editais, textos explícitos sobre a intenção do sujeito, mas listas de preços, de salários, séries de certidões de batismo, óbito, casamento, nascimento, fontes notariais, contratos, testamentos, inventários. A documentação massiva e involuntária é prioritária em relação aos documentos voluntários e oficiais. (idem, p.23).

Lucien Febvre e Marc Bloch trabalharam juntos durante 20 anos e, apesar de terem

ingressado na Escola Normal Superior, lugar de base tradicionalista, seguiram influências

de estudiosos que contribuíam com a modernização do fazer histórico. Essas influências

tornaram-se ainda mais evidentes após as publicações de artigos nos quais, tanto um

quanto o outro defendiam uma visão não tradicional da história, abordando novos temas e

métodos até então não reconhecidos.

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Inspirado principalmente pelo estilo interdisciplinar do geógrafo Vidal de La

Blache, pelo antropólogo e filósofo Lucien Lévy-Bruhl, pelo historiador que se dedicava à

história da imagem Émile Mâle, pelo linguista que se preocupava com o aspecto social da

língua, Antoine Meillet, e pelos historiadores Michelet, Burckhardt e Louis Courajod,

Febvre desenvolveu o interesse por alguns aspectos que normalmente não seriam comuns

aos historiadores.

O interesse de Febvre, incentivado por Henri Berr, girou, inicialmente, em torno da

geografia histórica, evidenciado por meio da tardia publicação La terre et l’évolution

humaine em 1922, trabalho que gerou muitas críticas por parte dos geógrafos – já que

Fevbre não era um especialista na área.

Dedicou-se, tempos depois, ao estudo das atitudes coletivas, inserindo a noção de

utensilagem mental – “todas as formas de percepção, expressão, ação, as técnicas e a

língua de uma sociedade, abarcando, dessa forma, o conjunto de elementos usados pelos

indivíduos para se expressarem e agirem em sociedade.” (SILVA e SILVA, 2010:280) – na

história do Renascimento e da Reforma – ligando a religião à história social e,

consequentemente, criando hipóteses diferentes das que já eram conhecidas, refutando

assim os historiadores que tratavam da religião. As mentalidades coletivas, sobretudo no

século XVI, estavam relacionadas ao seu principal trabalho.

Deve ter sido óbvio, nesse momento, que certos temas são recorrentes na obra de Febvre e também que há uma tensão criativa entre sua fascinação pelos indivíduos e sua preocupação com grupos sociais – como havia entre seu profundo interesse em escrever uma história social da religião e seu igualmente forte desejo de não reduzir atitudes e valores espirituais a meras expressões de transformações na economia ou na sociedade. (BURKE, 2010: 35).

Já Bloch, embora não tivesse dado tanta ênfase à geografia histórica quanto Febvre,

marcou nas suas obras o caráter sociológico de Émile Durkheim – nome de maior

influência em sua trajetória intelectual. Na obra Les Rois Thaumaturges, especializou-se

em história medieval e trabalhou três características importantes à nova história que se

tentava implantar. Bloch não tratou apenas de um momento histórico, mas fazia a história

de longa duração, empregou a psicologia religiosa coletivamente e aplicou o método

comparativo à história, a fim de identificar a divergência de pensamento levantada como

hipótese pelo historiador.

Além dessa obra, Bloch escreveu livros que aumentaram ainda mais o seu prestígio

na comunidade acadêmica, como por exemplo Les caractères originaux de l`histoire

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rurale française (1931) – que tratava da história rural – e La société feodale (1930) – livro

que discute o feudalismo e que foi considerado por estudiosos a obra que mais marcou a

vida profissional de Bloch e, ainda sob a perspectiva da psicologia coletiva (mesmo sendo

um historiador econômico), ampliando o conceito de fonte ao utilizar mapas cartográficos.

Quanto ao método, Bloch inovou, em grau superior àquele feito por Febvre,

utilizando o método retrospectivo criado por Weber (consiste em fazer um texto em que o

passado explique o presente). Por meio desse método, o objeto da história deixa de ser o

passado e passa a ser o presente, assim como nas outras áreas do conhecimento.

Apesar de produzir um texto narrativo, essa não é a marca discursiva mais marcante

no texto histórico desde então:

A nouvelle histoire não se reduz a uma narração factual. É um esforço de conceituação, isto é, de reunião da diversidade factual sob a unidade do conceito. Mas, temendo sempre a tendência do conceito à autonomização, contrasta constantemente seus conceitos com a diversidade do real, para testar os limites temporais de sua validade. (REIS, 2000: 83).

A revista dos Annales sofreu uma queda significativa durante a segunda guerra

mundial, pois tanto Bloch quanto Febvre se alistaram e ausentaram-se das publicações e

orientações acadêmicas. Durante a guerra, Bloch foi fuzilado, mas, logo após o término da

guerra, a revista e o espírito dos Annales se fortaleceram e a École passou a ser uma sólida

instituição marcada por discípulos dispostos a continuar seguindo o seu modelo.

Durante um tempo, Febvre continuou editando a revista, porém com a sua

nomeação para vários cargos – devido ao grande destaque, consequência do sucesso dos

Annales – o tempo para a revista ficou escasso e ele precisou delegar pessoas nas funções

mais importantes a fim de que os trabalhos continuassem com o vigor que estavam até

aquele momento. Nesse grupo, destaca-se o discípulo de Febvre, Fernand Braudel.

1.1.2 A segunda geração e a História Quantitativa

Na segunda fase dos Annales – de 1946 até 1968 – a revista, inicialmente dirigida

por Febvre e, após a sua morte, a partir de 1956, dirigida por Braudel, após a segunda

guerra, passou por sucessivas mudanças em seu nome a fim de retratar, por meio dele,

aquilo que ela significava. O título mudou e assim foi conservado: Annales: economies,

societés, civilisations. Segundo Dosse (2003), a palavra história foi suprimida para

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propiciar a contribuição das ciências sociais à história. Essa alteração teve ligação direta

com os novos rumos tomados por Braudel, pois, enquanto a primeira geração focava as

atenções na pesquisa histórica e o fator econômico-social, a segunda fase favoreceu o

econômico e o demográfico.

Em 1963, um novo centro de pesquisa e ciências sociais foi fundado em Paris e isso

contribuiu para a divulgação e implantação da nova história – já que antes era

institucionalizada e divulgada somente por meio da revista. Esse novo centro colaborou

com a disseminação dos novos métodos utilizados pelos Annales e, consequentemente,

consolidou o movimento mundialmente:

Essa concordância entre o espírito do pós-guerra e os temas dos Annales assegura o brilho internacional da revista. Nessa sociedade em crescimento do pós-guerra, em que os temas da modernização, do equipamento, do investimento e da inflação dominam a vida das nações, o aspecto econômico, mais ainda do que nos anos 30, recobre o conjunto do universo social e modela os quadros de pensamento. (DOSSE, 2003:151-152).

Braudel, nesse período, já publicara a obra O Mediterrâneo(1949) – almejando

escrever uma história total, ou seja, capaz de estudar, simultaneamente, o econômico, o

social e o cultural (FÁVERO e MOLINA, 2006: 19) – e tratou a obra sob a perspectiva

espaço-temporal, inicialmente, pelo tempo de longa duração, ao relacionar o homem ao

ambiente, o que chamou de geo-história; posteriormente, trabalhou a história de média

duração relacionada às estruturas – social, política e econômica – e, em sua terceira parte,

a temida história dos acontecimentos – que, para ele, apesar de enriquecer a atenção do

homem, pouca importância tinha em relação aos novos aspectos historiográficos –,

considerada uma história de curta duração.

Essa narrativa de eventos, contudo, está longe de ser uma história tradicional de “tambores e trombetas”, como pode parecer à primeira vista. Frequentemente, o autor desvia-se de seu caminho para enfatizar a insignificância dos eventos e as limitações impostas à liberdade de ação dos indivíduos. (BURKE, 2010:51).

A geo-história – explorada na primeira parte do seu livro – tinha ligação direta com

o movimento geográfico de Vidal de La Blache e a sua importância fora justificada pelo

próprio Braudel – as peculiaridades geográficas não só têm uma história, como também

fazem parte dela e, por essa razão, precisavam ser levadas em consideração.

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Em suas três obras subsequentes Portos – Rotas – Tráficos, Negócios e Gente dos

Negócios e Moeda – Preço – Conjuntura, publicadas em 1951-52, ainda visando a uma

abordagem histórica totalizante, Braudel enfatiza as categorias econômicas – consumo,

distribuição e produção – remetendo ao que fez em O Mediterrâneo quanto à

temporalidade: quase imóvel, lenta e rápida, respectivamente. Essas obras deixaram

evidentes, para os historiadores que seguiam a mesma linha, as diferenças que existiam

entre a história do cotidiano e a história socioeconômica da época.

Ao enfatizar em sua história totalizante os aspectos econômicos, Braudel elabora

“(...) a advertência que achava necessário acrescentar, para preservar uma certa distância

intelectual de Marx e, mais ainda, do marxismo, evitando cair na armadilha de uma

estrutura intelectual que considerava muito rígida.” (Burke, 2010: 70) – embora tivesse

utilizado metáforas semelhantes às de Marx em suas últimas obras.

Ainda na segunda geração, a história quantitativa, serial (por se tratar dos

Annales), que se tornou bastante significativa entre 1950 e 1970 (já que era considerada

importante para os historiadores econômicos), não foi bem aceita por Braudel e a maneira

que ele a utilizara destinou-se, unicamente, à elaboração das estatísticas.

Ernest Labrousse, entretanto, publicara, em 1933, uma obra meritória sobre preços

e, por meio dele, houve a oportunidade de inserir, no movimento, as ideias marxistas –

tornando-se outro nome relevante na história da segunda fase dos Annales. Posteriormente,

influenciado por Simiand, escreveu também sobre métodos estatísticos em um estudo

quantitativo da economia na França do século XVIII, atentando para os ciclos econômicos

de longa e curta duração.

Para Reis (2000), a originalidade da segunda fase está ligada à história quantitativa,

serial, econômica e demográfica suscitada por Labrousse, pois continuava sendo dirigida

por meio do levantamento de hipóteses – fazendo alusão à história-problema defendida

pelos fundadores.

Braudel fez o recrutamento de alguns jovens, pretendendo uma renovação dos

Annales; dentre eles, destacou-se o seu futuro orientando, Emmanuel Le Roy Ladurie.

Este, ao escrever sua tese Les paysans de Languedoc em 1966, evidenciou-se por fazer

nela uma história total que, ao mesmo tempo em que se aproximava das orientações de

Braudel – interdisciplinaridade, longa duração e engenhosidade – tentava um afastamento

quanto à divisão dos estudos regionais:

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Le Roy adota uma forma de organização cronológica no lugar de uma divisão em estrutura e conjuntura. Em cada uma das seções cronológicas, discute os desenvolvimentos culturais, tais como a ascensão do protestantismo e a alfabetização, e descreve também as reações do homem comum da região às tendências econômicas vividas no dia a dia. (BURKE, 2010: 85).

Todo o interesse imposto por Braudel em fazer uma história totalizante resultou na

relevante contribuição para segunda geração dos Annales – independente das inúmeras

críticas que ajudavam a aprimorar suas publicações. Relacionando-o à continuação do

movimento proposto desde 1929, houve uma dívida significativa, entretanto, com a história

das mentalidades, implantada, principalmente, por Febvre na primeira geração.

1.1.3 A terceira geração e a História das Mentalidades

Uma série de fatores contribuiu para o surgimento de uma nova geração no

movimento, pois, a partir de 1968, Braudel se cerca de uma comissão de jovens

pesquisadores (Jacques Le Goff, Emmanuel Le Roy Ladurie, entre outros); nomeia novos

integrantes na administração dos Annales em 1969; aposenta-se do cargo de presidente da

revista em 1972 e Jacques Le Goff, seu ex-aluno, assume a sucessão, substituído, em 1977,

por François Furet.

A partir de 68, fala-se de Nouvelles Nouvelles Annales, o que desperta o riso e a ironia dos adversários, pois parece-lhes um claro esforço de continuarem sempre jovens e capazes de vencer as resistências ao seu poder. Essa expressão se liga, certamente, àquele manifesto de Febvre de 1949, quando ele falava de Nouvelles Annales. Em 68, só se poderia falar, então, de Nouvelles Nouvelles Annales, no espírito do mesmo manifesto que é o de não transformar as instituições controladas pelos Annales em “majestosos túmulos”, mas manterem-nas “em face do vento” da história. (REIS, 2000:112)

A presidência de Le Goff não impediu a fragmentação intelectual da terceira

geração, prevalecendo, nesta, o policentrismo. Com a ampliação das fronteiras, a história

disseminada por Febvre e Bloch teve vários objetos de pesquisa e diferentes métodos, que

iam desde os disseminados na primeira geração, até aos disseminados na última.

Além disso, a fragmentação possibilitou influências originadas no exterior, já que

alguns dos seus integrantes estudaram nos Estados Unidos: “por diferentes caminhos,

tentaram fazer uma síntese entre a tradição dos Annales e as tendências intelectuais

americanas – como a psico-história, a nova história econômica, a história da cultura

popular, antropologia simbólica, etc.” (BURKE, 2010: 90).

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Na geração dos Annales presidida por Braudel, a história cultural e suas derivações

foram pouco difundidas e passou-se a priorizar a história econômica e demográfica. O

determinismo na era braudeliana, entretanto, começou a incomodar e os intelectuais

introduziram uma história que vai do porão ao sótão, que:

Modifica suas preocupações, centrando-se nas mentalidades, nas vidas cotidianas, firmando-se em representações e interpretações, ampliando sensivelmente o conceito de fonte, utilizando-se de vários tipos delas: documentos psicológicos, arqueológicos, orais, religiosos, fazendo uma sábia e benfazeja mistura. (FÁVERO & MOLINA, 2006: 21)

Foi por meio dos estudos sobre a relação entre a natureza e a cultura, a maneira em

que as diferentes culturas veem e classificam os fenômenos naturais, as famílias e as

escolas durante o antigo regime, entre outros, produzidos pelo demógrafo histórico

Philippe Ariès (que rejeitava a história quantitativa) e publicados a partir de 1960, que a

história das mentalidades – “no ocidente, a palavra mentalidade designava os

comportamentos e as atitudes coletivas” (GALLY, 2013:15) – voltou a fazer parte de

maneira mais ativa nos Annales e tornou-se mais conhecida publicamente.

Criticado principalmente por Herlihy, Hunt e Pollock, Ariès ainda recebe merecido

destaque por apresentar a história da infância pelo modelo histórico proposto pelos

Annales, por conseguinte, suscitando várias outras pesquisas sobre esse mesmo tema, ou

baseados nessa iniciativa, criar outras categorias de análise.

Seus últimos anos foram dedicados a estudos sobre as atitudes perante a morte, focalizando de novo um fenômeno da natureza refratado pela cultura, a cultura ocidental, e atendendo a um famoso reclamo de Lucien Febvre, em 1941, “nós não possuímos uma história da morte” (Febvre, 1973, p.24). (BURKE, 2010: 93).

A nova abrangência de temas a serem estudados motivou os historiadores que

seguiam essa mesma linha a utilizar fontes até então pouco exploradas, como obras

literárias, e, por meio delas, fazer uma conexão entre a história das mentalidades e a

historia social.

No campo da psico-história, trabalhos como os de Le Roy – sobre o carnaval dos

romanos (1980), Delumeau, Besançon, que definiu seu ensaio como história psicanalítica,

entre outros, foram inspirados, principalmente, pelas ideias de Freud e obras de freudianos

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e neofreudianos, enfatizando, porém, o fato de que historiadores psicanalistas não são

profissionais da psicologia, então, devem apenas observar características e descrevê-las.

No início dos anos 60, Jacques Le Goff e Georges Duby, grandes nomes da história

das mentalidades, dedicaram seus estudos a uma temática diferente das que foram citadas

anteriormente: Le Goff publicou artigos sobre a história, entendida, atualmente chamada

de imaginário medieval – O tempo dos mercadores e o tempo da igreja na Idade Média

(1960) e história das mudanças das representações da vida após a morte (1980) – além

das já trabalhadas estruturas mentais; Duby, por sua vez, migrou da história econômica de

Braudel para as histórias cultural francesa, das ideologias – baseando-se, em parte, na

concepção neomarxista –, da reprodução cultural e do imaginário social, combinando-as

com a história das mentalidades.

A obra publicada em 1968 por Robert Mandrou – secretário executivo da revista

dos Annales até 1962 –, Magistrats et sorciers em France au XVII siède, apresentava como

tema a perseguição à feitiçaria na França moderna, Segundo Vainfas (1997), este tenha

sido, talvez, o grande nome na história das mentalidades, apesar de marginalizado após o

falecimento de Febvre em 1956.

Os métodos quantitativos ainda eram empregados na terceira geração dos Annales,

com a finalidade de uni-los à história das mentalidades. Burke (2010) apontou dois

exemplos: o que chamou de mais original, o trabalho de Vovelle (1973) (levantou como

objeto a descristianização) que argumentou sua pesquisa com base em mapas, gráficos e

tabelas, chamando a história religiosa estudada por laicos, que se utilizam das novas

tecnologias de história serial de terceiro nível; e o que chamou de mais importante,

dirigido por Furet e Ozouf (1977), que tratava da mudança dos níveis de alfabetização, na

França entre os séculos XVI e XIX.

Problemas foram levantados quanto à tentativa de utilizar os métodos quantitativos

na história das mentalidades: essas estatísticas utilizadas como fonte são indicadores

seguros? São suficientes? Os historiadores estavam deixando de explicitar em suas

pesquisas um fator citado na primeira geração dos Annales: seus documentos, suas técnicas

e o modo como as utilizaram.

Uma abordagem que tomou direções acentuadas nesse período foi a história

antropológica ou a antropologia simbólica. Ela manteve a noção do tempo de longa

duração já realizado por Braudel, acrescentando à longa duração hábitos cotidianos,

costumes etc.; essa história se desliga ainda mais da noção quantitativa, pois é mais

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descritiva; volta a ser função do historiador o papel de interpretação da história-problema

suscitada por ele e, aquilo que é cultural, retoma sua importância.

Foucault é o teórico que melhor expressou o projeto Nouvelle Nouvelle Annales. A história não visaria mais a uma síntese, mas a análises monográficas. A palavra que predomina, vinda de Foucault, é “descontinuidade”: a história produz abordagens múltiplas de uma sociedade sem centro, sem sujeito e sem futuro. (...) ela não explica mais a realidade, mas somente descreve partes dela, utilizando a tecnologia mais sofisticada e o texto mais rigoroso. (REIS, 2000: 114,115).

Os livros de Foucault serviram como inspiração ao trabalho de outros historiadores

como Le Goff, P. Nora, Le Roy, Chartier, entre outros que pertenciam ao movimento dos

Annales. A partir de Foucault, temas relacionados à história do corpo e a ligação entre ela e

a história do poder tiveram uma abordagem significativa.

Segundo Le Goff (1974), o conceito das mentalidades pode ser trabalhado sob o

recorte social das mentalidades, defendendo que a mentalidade coletiva pode ser apreciada

diante desse recorte; diante do domínio de crenças a atitudes comuns a toda sociedade; e

ainda quanto ao tempo das mentalidades – representado pelo tempo braudeliano de longa

duração, a mente muda lentamente.

Uma das críticas sofridas pelos Annales em oposição ao determinismo que

despontou a partir da segunda geração foi a falta de análise sobre o Estado, ou seja, o

esquecimento da história política. Apesar de não ter sido objeto de estudo de líderes como

Febvre e Braudel, a história política se fez presente em vários outros estudiosos durante

todas as gerações dos Annales nos anos que seguiam, inclusive na terceira fase, por Le Roy

até 1987.

Embora com traços tão distintos, o elemento unificador dessas três gerações é a ênfase na questão metodológica, já que a interdisciplinaridade, a análise de fatos advindos de várias áreas, tendo em vista a construção de uma história-problema, imprime uma especial importância à interpretação dos dados e à busca constante de esclarecimento dos porquês. (FÁVERO e MOLINA, 2006:22).

1.2 A Nova História Cultural

O conceito de Mentalidade se dissemina entre diferentes disciplinas a partir da

década de 1980 e é utilizado sob os variados temas; dessa maneira, diversos objetos são

postos em análise mediante essa perspectiva. Os microrrecortes, feitos em coleções de

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livros, na França, como Histoire des femmes (Duby & Perrot) e Histoire de la vie privee

(org. Ariès & Duby), são os responsáveis pela tentativa de ascender à tão massificada

mentalidade.

Segundo Burke (2005), a história cultural pode ser dividida em quatro fases: a fase

clássica, a fase da história social da arte, a história da cultura popular e a nova história

cultural. A “nova história cultural”, nesse caso, torna-se oposta à noção de história

intelectual, tradicionalmente conhecida, passando a priorizar o estudo das mentalidades.

Essa história que, sem abdicar da história como disciplina, preconiza e legitima o estudo

das mentalidades, além de fazer uma reconstrução teórica com base nas críticas recebidas

desde a sua breve explanação na primeira geração dos Annales à explosão que aconteceu

em 1970.

Diferentemente da maneira como a história cultural era enquanto disciplina

acadêmica – estudava manifestações oficiais da cultura de um povo – e com uma definição

menos genérica que a do sentido anteriormente aplicado à mentalidade – associação entre o

mental e o social, a nova história cultural, ainda que leve em consideração a cultura da

elite, inclina-se, preferencialmente, ao âmbito das manifestações coletivas do povo.

Os historiadores da cultura, – nomenclatura dada aos estudiosos pertencentes a essa

nova linha – em seus trabalhos, aproveitam as benesses da aproximação entre a história

cultural e a antropologia; permanecem, em suas pesquisas, com a definição temporal de

longa duração; valorizam a vida cotidiana e consideram os temas empregados pelas

mentalidades.

Em oposição a algumas linhas da história das mentalidades, conhecidas por limitar-

se à descrição da vida diária e defender a teoria de que mentalidade é o pensamento

comum de uma sociedade, independente do meio em que ela vive ou do grupo de que ela

faz parte, a nova história cultural volta sua atenção ao papel das classes sociais, do

antagonismo social e da sedimentação.

A nova história cultural, assim como a história das mentalidades, possui

característica diretamente associada à pluralidade, evidenciando diferentes caminhos a

serem seguidos no âmbito da pesquisa que se deseja realizar, caminhos esses bem

delimitados pelo pesquisador, para não correr o risco de sujeitar-se ao estabelecimento de

um caos teórico, caso essa pluralidade entre em total desordem.

O modelo da nova história cultural, desenvolvido por Roger Chartier, é apresentado

no final da década de 1980, quando publica seu livro A História Cultural: entre práticas e

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representações em que, assumidamente, se afasta das anteriores concepções tanto da

história das mentalidades, sua ligação fixa à história de longa duração, quanto da história

serial, quantitativa, pertencentes à terceira geração dos Annales na França e que por ele já

tinham sido estudadas.

Valoriza, portanto, o dimensionamento da cultura em termos de classes sociais, mas desde que não se procure delimitar as classes em qualquer âmbito externo ao da produção e consumo culturais. Neste sentido – e isto faz de seu modelo tão original quanto problemático –, Chartier se afasta não só das mentalidades, como da tradição francesa da história social. (VAINFAS, 1997: 153)

Planejando uma historia nova cultural que fugisse da tirania social, emprega a

história social concomitantemente ao que chamamos de utensilagem mental – utilizada

pelos Annales em sua primeira fase – e, para isso, oferece um conceito diferente de cultura,

dessa vez, associado à prática, criando, para a concretização dessas ideias, as chamadas

categorias de representação e apropriação.

Chartier propõe investigar o passado por meio das representações: de acordo com

aquilo que o homem, em um determinado meio social, transmite: seja pelo que ele fala, ou

da forma como ele age (aquilo que é visível), ou, por aquilo que o pesquisador consegue

apreender por meio da interpretação tanto do indivíduo, quanto sobre a maneira como ele

vê o mundo.

Trabalhando assim sobre as representações que os grupos modelam deles próprios ou dos outros, afastando-se, portanto, de uma dependência demasiado escrita relativamente à história social entendida no sentido clássico, a história cultural pode regressar utilmente ao social, já que faz incidir a sua ação sobre as estratégias que determinam posições e relações que atribuem a cada classe, grupo ou meio um <ser apreendido> constitutivo da sua identidade. (CHARTIER, 1990: 23)

Ainda sobre as representações, que Chartier considera a pedra angular da história

cultural por ele formulada, o autor (1990: 23) elenca três modalidades para a interpretação

do meio social: o trabalho de classificação e delimitação que produz as configurações

intelectuais múltiplas; as práticas que possibilitem identificar um grupo social e

reconhecer sua identidade; as formas institucionalizadas e objetivadas graças às quais uns

representantes (...) marcam de forma visível a existência de um grupo.

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O seu segundo conceito é sobre a “apropriação que objetiva uma história social das

interpretações, remetidas para as suas determinações fundamentais (que são sociais,

institucionais, culturais) e inscritas nas práticas específicas que a produzem”. (1990: 26)

São esses dois critérios de Chartier – representação e apropriação – que servirão

como base para a análise interpretativa da Grammatica Analytica de Maximino Maciel que

será feita no terceiro capítulo dessa dissertação.

1.3 A história das ideias linguísticas

Assim como a nova história, a história das mentalidades, a história cultural e a nova

história cultural, a história das ideias faz parte do resultado da preocupação do historiador

desde o século XIX – quando sua existência ainda estava atrelada à história positivista.

Diante da necessidade de interdisciplinaridade, há a junção da história – considerada uma

disciplina – com a linguística – já considerada ciência.

A designação História das Ideias, entretanto, suscita discussões entre os

historiadores. Darnton (1990), por exemplo, a caracteriza como a história das ideias

propriamente dita – o estudo do pensamento sistemático, ou seja, as ideias geralmente

expostas em tratados filosóficos; quanto à história intelectual – o estudo do pensamento

informal, climas de opinião, movimentos literários; a história social das ideias- estudo das

ideologias e da difusão das ideias; e ainda a história cultural- estudo da cultura no sentido

antropológico, inclusive as concepções ou visões de mundo e as mentalidades.

A História das Ideias Linguísticas que é entendida “como todo saber construído em

torno de uma língua, num dado momento, como produto quer de uma reflexão

metalinguística, quer de uma atividade metalinguística não explícita” (AUROUX, 1992:

13-4), tem o objetivo de

pensar a gramática e o dicionário, a passagem da gramática para a linguística, a diferença entre o método normativo e o científico, ou o expositivo e o histórico, a passagem deste para a descrição e a explicação que são o próprio da linguística, e a relação do conhecimento linguístico com o ensino ou os lugares por onde as gramáticas circularam, a concepção de língua subjacente a textos literários. (FÁVERO & MOLINA, 2006: 24).

Auroux (1992), ao tentar responder sob que formas o saber linguístico se constitui

no tempo e como ele se cria, evolui e se transforma ou desaparece, remete essa história ao

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processo de gramatização, entendido como “o processo que conduz a descrever e a

instrumentar uma língua na base de duas tecnologias, que ainda hoje são os pilares de

nosso saber metalinguístico: a gramática e o dicionário”. (AUROUX, 1992, p. 65). Para

essa análise, utiliza três princípios metodológicos: o da definição puramente

fenomenológica do objeto (responsável pela definição do objeto a fim de fazer um recorte

e limitá-lo), o da neutralidade epistemológica (já que é necessária a imparcialidade quanto

ao que pode ser considerado ou não ciência) e o do historicismo moderado (pois o recorte

histórico deve limitar-se ao que influencia diretamente no objeto da pesquisa).

Essa história, então, preocupa-se com o estudo tanto dos saberes linguísticos,

quanto das gramáticas e instituições nas quais esse saber fora moldado. Assim, o papel do

historiador das ideias linguísticas é “... analisar, no contexto em que foi criada [uma] ideia,

como frutificou, foi compreendida, difundida, interpretada e representada, mergulhando

em sua profundidade, enxergando os fios que a constituíram e todos os seus reflexos,

favorecendo uma melhor compreensão da Linguística atual” (FÁVERO & MOLINA,

2006, p. 29).

Ao fazer uma história baseada nos fundamentos da História das Ideias Linguísticas

é necessário considerar o percurso histórico, a constituição de instrumentos linguísticos

específicos, as políticas públicas, o ensino e sua sistematização.

Como o Brasil é um país colonizado, Orlandi (2002) apresenta uma relação

intrínseca no modo de construção entre a Nação e a identidade linguística brasileira, o que

diferenciará da concepção que essa história assume na França, por exemplo. A história de

como a língua portuguesa no Brasil foi constituída, deve estar vinculada à história de

elaboração e entendimento dela. De acordo com o que foi dito, é necessário que haja uma

relação entre Língua e Estado, já que a independência se dá ao mesmo tempo em que a

língua oficial é implementada.

Fávero e Molina (2006) alertam os pesquisadores que se propõem a fazer a História

das Ideias Linguísticas para as limitações e dificuldades quanto às fontes necessárias para o

desenvolvimento de uma boa pesquisa: i. a impossibilidade da exaustividade (já que o

saber é uma construção entre o passado e o presente); ii. a busca das fontes (enfatizam

tanto a dificuldade do acesso à documentação, quanto a importância da seleção e

recuperação de fontes de difícil acesso); iii. O estudo da documentação (pois um

documento pode e deve ser questionado quanto à veracidade e originalidade, entre outras

coisas).

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Inseridos nos princípios norteadores de Auroux, estudaremos a sintaxe na

Grammatica Analytica de Maximino Maciel (1887), a fim de que façamos, dessa análise,

mais um trabalho pautado na história das ideias linguísticas, tomando a Grammatica

Analytica não somente como uma produção gramatical do século XIX, mas também,

classificando-a como um objeto cultural de sua época.

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Capítulo 2

CONTEXTO POLÍTICO, ECONÔMICO, CULTURAL E

EDUCACIONAL DO BRASIL NA SEGUNDA METADE DO SÉCULO

XIX

Definido o objeto desta pesquisa – a Grammatica Analytica de Maximino Maciel,

publicada em 1887 – o recorte histórico feito nesse capítulo refere-se ao momento em que

as novas ideias políticas, culturais e educacionais efervesciam no Brasil e no mundo e,

mais especificamente, o novo período que inspirava o processo de “gramatização”, sob

orientação das correntes “científicas” 1. Dessa maneira, faremos um levantamento dos

principais fatos históricos que moveram o Brasil nesse período.

2.1 O Brasil na segunda metade do século XIX

2.1.1 Da Monarquia à República

Em meados do século XIX, apesar do regime monárquico (que durou até 1889), o

Brasil viveu um momento de conflito político entre os interesses da Coroa, da Igreja e do

Exército – este último veio ganhar força somente após a guerra do Paraguai. Essa guerra –

também conhecida como Guerra da Tríplice Aliança – começou timidamente em

novembro de 1864 e durou cinco anos.

                                                            1 “Elia (1975), baseado em Antenor Nascentes, divide nossos estudos filológicos em dois grandes períodos: o vernaculista e o científico. O primeiro vai de 1820, quando ocorre nossa independência política, até 1880, com o surgimento da gramática de Júlio Ribeiro e caracteriza-se por contradições entre as preocupações puristas, de estudiosos conservadores, com os representantes da nova geração. Em outras palavras, foi o momento bipolar de encontro da corrente classicizante – dos que queriam a língua portuguesa calcada no modelo lusitano – com a dos reformistas – dos que aceitavam vários falares que começavam a constituir a língua Portuguesa do Brasil. Cita Sotero dos Reis e Gonçalves Dias, dentre outros, como representantes desse momento. Já o segundo período, que vai de 1880 a 1960, chamado por ele de científico, compreende duas fases: a primeira, de 1880 a 1900, tem como principal característica a transição, melhor dizendo, é a instância em que a renovação prevalece sobre o conservadorismo da época anterior (...).A segunda fase desse segundo período, que vai de 1900 a 1960, possui, de acordo com Elia, três gerações: a primeira, de 1900 a 1920 (...). A segunda geração de 1920 a 1940 (...). A última geração, de 1940 a 1960.” (FÁVERO & MOLINA, 2006: 48).

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Analisando o envolvimento do Brasil com os demais países que protagonizaram

essa guerra, em resumo, houve, nesse período, uma relação não só de rivalidade entre

Brasil e Argentina, como também de interesses econômicos entre Brasil e Uruguai que

giravam em torno da criação de gado – vínculo esse que desencadeou um acordo secreto

entre o governo brasileiro e os colorados – e de divergências quanto a fronteiras e livre

navegação pelo Rio Paraguai, entre Brasil e Paraguai. O rompimento diplomático entre

Brasil e Paraguai aconteceu quando, em dezembro de 1864, o então presidente do

Paraguai, Solano López, promoveu um ataque ao Mato Grosso, temendo o expansionismo

brasileiro.

Após ser eleito presidente da República Argentina em 1862, Bartolomé Mitre se

posicionou a favor da livre negociação dos rios e manteve um relacionamento estável com

os colorados (uruguaios), política que agradou os liberais brasileiros – apesar da tão

conhecida rivalidade entre esses dois países. Isso fortaleceu o vínculo político entre Brasil,

Argentina e Uruguai; dessa maneira, em 1865, o Paraguai declarou guerra à Argentina, fato

que acarretou, sob a liderança de Bartolomé Mitre, uma aliança entre Argentina, Brasil e

Uruguai – conhecida como Tratado da Tríplice Aliança2.

Apesar do alto poder demográfico e econômico dos países que integraram a

Tríplice Aliança, o Paraguai ostentava, no início da guerra, um poderio militar maior do

que os três países juntos – no Brasil, por exemplo, não havia serviço militar obrigatório, o

país contava apenas com a milícia do Rio Grande do Sul que fora suficiente nas campanhas

militares do Brasil, mas foi inábil para esse novo confronto. Ademais, a Guarda Nacional,

formada em sua maioria por brancos, não participou da guerra e a única maneira de

integração de jovens brasileiros ao exército era um sorteio limitado:

No correr dos anos, as forças da Tríplice Aliança cresceram, com predominância dos brasileiros que representavam pelo menos dois terços do total. Calcula-se entre 135 mil e 200 mil o número geral de brasileiros mobilizados para uma população masculina estimada de 4,9 milhões, em 1865. As tropas foram organizadas com o exército regular, os batalhões da Guarda Nacional e gente recrutada em sua maioria segundo os velhos métodos de recrutamento forçado que vinham da Colônia. Apesar disso, muitos foram integrados no corpo dos Voluntários da Pátria, como se tivessem se apresentado para combater por vontade própria. (FAUSTO, 2010: 213)

                                                            2 Cf. Fausto (2010: 208).

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Além desse método de recrutamento, senhores cederam seus escravos para

aumentar a tropa brasileira e, aos africanos que moravam ilegalmente no Brasil e se

voluntariaram para lutar, foi concedido pelo governo Imperial, em 1866, o direito de

liberdade e receberam o título de “escravos da Nação”. Entre invasões, mortes nas batalhas

e por doenças, mudanças no comando da guerra, em 1869 o Paraguai foi derrotado e em

1870 Solano Lopes foi morto por soldados brasileiros3.

As principais consequências dessa guerra para o Brasil foram o aumento da dívida

com a Inglaterra e o desenvolvimento do exército brasileiro que deixou de ser um grupo

escasso que seguia ordens, tornando-se uma instituição com concepções e objetivos

peculiares que contestou o poder imperial e renegou a importância dos “casacas”;

começou, então, durante o período de guerrilha, a levantar líderes como Deodoro da

Fonseca e Floriano Peixoto – este último, apesar da ligação com o partido liberal, levava à

discussão a questão militar e o direito dos cidadãos – que assumiram um papel importante

na queda do Império.

Outro grande fator que enfraqueceu o sistema monárquico brasileiro foi o problema

da escravidão no Brasil. A briga entre os partidos conservador e liberal utilizava o tema

abolicionista para angariar preferência popular; dessa maneira, em 1871, o conservador

Visconde do Rio Branco propôs a lei do Ventre Livre – que libertava os filhos de escravas

que nascessem após a aprovação da lei.

A criação dessa lei, apesar de contrariar a base conservadora, foi uma tentativa de

que não houvesse revolução escravista em busca da total abolição – atitude repudiada por

Lima Barreto, que acusava o Visconde do Rio Branco de segregar a população negra do

Brasil e não os reconhecer como seres humanos. Independente da aprovação dessa lei – lei

2040 de 28 de setembro de 1871 – um reduzido número de escravos foi entregue ao poder

público e os senhores permaneceram utilizando seus serviços.

Em 1880, houve uma explosão de adeptos à campanha abolicionista feita por

associações, meios de comunicação em massa, figuras políticas e intelectuais influentes, da

elite às pessoas pobres – o norte e o nordeste do país já não dependiam mais da mão de

obra escrava e apoiavam o movimento.

                                                            3 Após a guerra, o Paraguai tornou-se um dos países da América do Sul que enfrentou mais problemas, devido à quantidade de pessoas que foram mortas, à perda de território para o Brasil e para a Argentina, à dívida de indenização do pós-guerra e ao domínio militar durante quase dez anos. (Cf. FAUSTO, 2010).

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Nesse contexto, em 1885, foi aprovada a Lei dos Sexagenários – estabelecia que

fossem libertados os escravos a partir de 60 anos de idade. Essa lei criada pelos liberais,

entretanto, não foi capaz de conter os ânimos das pessoas que eram a favor da libertação

total dos escravos e, abruptamente, aconteceram fugas em massa.

Diante dessa nova realidade, o conservador João Alfredo sugeriu a iniciativa de

Abolição total de escravos – aprovada pela maioria dos parlamentares e sancionada pela

Princesa Isabel em 13 de maio de 1888. Ao descrever a realidade do chamado

“proletariado da capital” nesse momento, Carvalho (1987) salienta que:

Eu diria mesmo que a Monarquia caiu quando atingia seu ponto mais alto de popularidade entre essa gente, em parte como consequência da abolição da escravidão. A abolição deu ensejo a imensos festejos populares que duraram uma semana e se repetiram no ano seguinte, cinco meses antes da proclamação da República. A simpatia popular se dirigia não só à princesa Isabel, mas também a Pedro II, como ficou evidenciado pela ocasião da comemoração do aniversário do velho imperador, a 2 de dezembro de 1888. (CARVALHO, 1987: 29)

Foi na Escola Militar de Praia Vermelha – instituição antes pensada para a

preparação militar e, depois, voltada para o estudo de letras, filosofia e matemática – que a

questão do regime monárquico começou a ser debatida com mais intensidade e o

pensamento de transformar o Brasil em República ganhou força com o ingresso de

Benjamin Constant no quadro de professores.

Benjamin Constant introduziu, a partir de 1872, na Escola Militar o “espírito

positivo” de Augusto Comte (1848), principalmente, sob a perspectiva da preferência

política republicana – não no sentido da República que dá voz ao povo, mas um ditador

republicano que, mesmo representando a massa popular, poderia contrariar a vontade dela

em nome do bem da República; além disso, esse ditador teria um mandato vitalício – e pela

ideia de separação da Igreja e do Estado (o que levou os militares a defenderem a

concepção de modernização conservadora do Brasil à luz do pensamento positivista).

Sob a presidência de Deodoro da Fonseca, o Clube Militar foi fundado em junho de

1887 com o objetivo de defender os interesses dos militares – devido à insatisfação do

modelo político vigente e ao crescimento da campanha republicana – e, após uma

sequência de reformas4, em 11 de novembro de 1889, houve uma reunião de civis e

militares que tentaram convencer Deodoro a iniciar a marcha republicana; contudo, o

                                                             4 Cf. Azevedo (1963).

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Marechal, como era o homem de confiança do imperador, sugeriu que esperassem a morte

de D. Pedro II, já que o mesmo estava velho e debilitado,

Mas a situação se precipita. Em razão de um erro estratégico, é chamado para presidir o conselho Silveira Martins, chefe liberal gaúcho, que estando fora da corte só chegaria em 17 de novembro. Além disso, a indicação era duplamente enganosa, já que Martins era inimigo político de Deodoro no Rio Grande do Sul. Mesmo assim, é só na noite do dia 15 que a situação se delineia e a República é, de fato, proclamada. Afinal, até então, o movimento não havia se definido, mais parecendo uma agitação interna do Exército. (Schwarcz, 1998: 687).

Dessa maneira, ainda segundo Schwarcz (1998), a República não foi proclamada,

mas aclamada, já que não houve participação popular, nem grande movimentação entre

todos os militares – a marinha praticamente não estava representada – mas um pequeno

grupo de integrantes do exército, intelectuais e oficiais que estavam na ponta da hierarquia

e cansados do regime monárquico brasileiro.

Carvalho (1987: 9), por sua vez, apresenta a famosa frase de Aristides Lobo em

resumo à proclamação do novo regime: “o povo, que pelo ideário republicano deveria ter

sido protagonista dos acontecimentos, assistiu a tudo bestializado, sem compreender o que

se passava, julgando ver talvez uma parada militar.”. Assim se descreve o processo político

que engloba a queda da Monarquia e a transição para a República.

2.1.2 O café, a extinção do tráfico de escravos e a imigração: a história econômica

Quanto à questão econômica desse período, podemos resumir em três fatores

principais: a economia cafeeira, a extinção do tráfico de escravos e a imigração. A

produção e exportação do café foi o grande nome da economia brasileira – começou

timidamente na segunda metade do século XVIII no Pará e tomou força no início do século

XIX, no Vale do Paraíba – mas, deixemos claro que o Brasil não era só café (embora se

compreenda que a maior parte do tráfico de escravos era destinada, nesse período, às

lavouras de café).

Nas primeiras décadas do século XIX, os fazendeiros brasileiros começaram a

investir nas fazendas de café para exportação no Vale do Rio Paraíba, que fica entre São

Paulo e Rio de Janeiro e possuía ótimas condições, tanto relacionadas ao clima, quanto ao

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solo. Nesse período, os fazendeiros dependiam da mão de obra escrava e o sistema

utilizado na instalação das fazendas era o plantation5.

Para implantar uma fazenda de café, o fazendeiro tinha de fazer investimentos significativos, que incluíam a derrubada da mata, o preparo da terra, o plantio, as instalações e a compra dos escravos. Além disso, se o cafeeiro é uma planta perene – ou seja, o plantio não deve ser renovado a curto prazo – as primeiras colheitas só ocorrem após quatro anos. Ao que tudo indica, no começo, os recursos para se implantar uma fazenda se originaram, principalmente, da poupança obtida com a grande expansão do comércio, após a vinda de D. João VI para o Brasil. Com o tempo, os lucros da própria cafeicultura e, a partir de 1850, os capitais liberados pela extinção do tráfico de escravos tornaram-se fontes de investimento. (Fausto, 2010: 187)

Como não havia cuidados específicos quanto à conservação do solo, quando este se

tornava inútil para a atividade da lavoura cafeeira, a área que não tivesse condições de

produzir era abandonada e o cultivo, transportado para uma nova região. Além da falta de

cuidado com o solo, existia outro problema: a precariedade do transporte para a exportação

do café brasileiro.

Tropa de burros foi o primeiro transporte responsável em levar o café do Vale do

Paraíba até o Rio de Janeiro, onde era entregue ao comissário e esse assumia a

responsabilidade de negociar a mercadoria. Posteriormente, o Brasil começou a investir em

ferrovias – primeira estrada de ferro foi construída por Irineu Evangelista de Souza, o

Barão de Mauá, em 1854 na Baía de Guanabara (RJ) – para profissionalizar e tornar mais

rápido o deslocamento da carga.

O mercado interno não era suficiente para absorver a produção cafeeira em larga

escala, dessa forma, o Brasil investiu na exportação e teve como maiores compradores do

seu café os Estados Unidos, a Alemanha, os Países Baixos e a Escandinávia. A dívida que

o Brasil tinha com a Inglaterra aumentava substancialmente e, apesar desta não consumir o

café exportado pelo Brasil, esse negócio lhe foi rentável – entre 1840 e 1850 – já que era a

própria Inglaterra que subsidiava as construções das ferrovias.

O auge da produção cafeeira no Vale do Paraíba se deu em 1850, porém,

aproximadamente em 1860, devido ao desgaste do solo, a plantação de café nessa região

                                                            5 Plantation é uma expressão que indica o sistema agrícola baseado na monocultura que se utiliza da mão-de-obra escrava. No Brasil, além do trabalho dos escravos africanos, utilizou-se do trabalho escravo indígena e, além da monocultura cafeeira, houve também a da cana-de-açúcar, da soja, do algodão, etc. (Cf. PRADO, 1994).

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entrou em declínio – situação retratada no livro Cidades Mortas de Monteiro Lobato – e o

grande polo cafeeiro passou a ser o Oeste Paulista.

Nesse período, o grande problema enfrentado pelos cafeicultores do Oeste Paulista

não eram as condições climáticas, mas a mão-de-obra. Desde setembro de 1850, a lei

Eusébio de Queiroz6 proibira o tráfico de escravos e, como eles constituíam a principal

fonte de trabalho das fazendas de café, os senhores tiveram que substituir o trabalho

escravo pelo trabalho remunerado e a única alternativa viável era a imigração de

estrangeiros, dando início ao maior processo imigratório até então no Brasil.

A mão-de-obra europeia nas fazendas de café para tentar suprir o trabalho escravo

foi a opção mais aceitável para a época, pois, o preconceito ao negro como um trabalhador

remunerado impediu que eles fossem contratados para dar continuidade à função que

exerciam:

A Política adotada de financiamento da imigração que passou a ser subsidiada pelo Estado, a partir de 1886; as novas perspectivas que se rasgaram no trabalho dos colonos, com a abolição do elemento servil, e o desenvolvimento da lavoura cafeeira que atingiu em 1895 um dos seus ponto culminantes com a grande alta do preço do café, concorreram poderosamente para atrair a essa região do país e nela fixar as maiores correntes de imigração. (AZEVEDO, 1963: 631)

Além disso, a massa de flagelados atingida pela seca do nordeste não poderia, nesse

momento, ser levada ao Centro-Sul, pois as fazendas de algodão localizadas no nordeste do

país também sofreram com a falta de escravos e já pretendiam utilizar esses trabalhadores

em suas plantações e outros seriam levados ao Norte para a extração de borracha.

Campanhas com o objetivo de atrair trabalhadores europeus para o Brasil, a partir

de março de 1871, foram intensificadas fora do país – em forma de folhetos redigidos em

português, alemão e italiano que explicavam as vantagens de vir ao Brasil ao invés de ir

aos Estados Unidos e Argentina, por exemplo. Nesse período, entretanto, os senhores ainda

confundiam o modo de tratar o trabalhador com o modo como tratavam os escravos e, por

esse motivo, a imigração para o Brasil ainda não era uma opção atraente para os europeus.

Com a crise na Itália e o aumento dos benefícios concedidos pelo Brasil aos

imigrantes, aconteceu um salto na imigração já no final do regime imperial – de 1885 para

1888 – onde 90% desses imigrantes eram italianos, fato que garantiu a substituição da

                                                            6 Aprovada em 4 de setembro de 1850 e formulada pelo ministro Eusébio de Queirós, essa lei não gerou efeitos imediatos, aumentando, consideravelmente, o número de escravos traficados.

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mão-de-obra escrava pelo trabalho remunerado e encaminhou o país à total abolição da

escravidão.

2.1.3 Os brasileiros e a cultura brasileira

É sabido que a instrução no Brasil, desde o período colonial, estava ligada à elite e

ao sistema de ensino pautado pelos jesuítas da Companhia de Jesus. No século XVIII,

quando esse modelo jesuítico já era considerado atrasado e antiquado – pois não estava

acompanhando as novas ideias que eclodiam na Europa durante o iluminismo – o então

primeiro ministro, Marquês de Pombal, em 1759, expulsou os jesuítas e reformulou o

modelo de ensino em Portugal e, consequentemente, no Brasil.

Como a expulsão se deu abruptamente e, apesar de organizado na teoria, na prática,

não havia um planejamento de substituição da instrução que era praticada pelos jesuítas, o

Brasil passou por um momento de, pelo menos, 70 anos para que um novo método,

baseado na ideia de capacitação profissional (advogados, médicos, engenheiros e militares)

e uma cultura mais liberal, fossem criados no Brasil Imperial.

Até a metade do século XIX, apesar da remodelação dos conteúdos educacionais,

tornando-os mais atuais, o caráter humanista e eclesiástico ainda estava presente, pois as

escolas de instrução profissional eram seminários e colégios de padres que transmitiam

uma cultura ligada à finalidade cristã e tudo o que a ela estivesse relacionado. Além disso,

a massa popular ainda estava alheia à importância da instrução; em contrapartida, a elite

intelectualizada aproveitava para, por meio desses novos cursos, adquirir os títulos de

bacharel e doutor, aumentando ainda mais a oposição letrados x iletrados/ elite x massa

popular.

Estes estabelecimentos ensinavam um número reduzido de matérias, visando apenas à ciência ornamental e tinham em vista sobretudo a ciência eclesiástica; pode-se dizer, em seu louvor, que o dogma e a moral aí dominavam e penetravam profundamente no coração e na alma dos seminaristas. Saíram daí homens ilustres que honraram o Brasil antes da sua independência e o serviram brilhantemente por sua coragem, seu caráter e seu devotamento nesta gloriosa época. (ALMEIDA, 2000: 62)

Durante o reinado de D. João VI, foram fundados cursos de medicina e de marinha,

mas, somente em agosto de 1827, foram criadas escolas profissionais na área jurídica em

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São Paulo e em Olinda – esta última transferida para Recife em 1854 – e, a partir disso,

tornaram-se grandes centros da cultura jurídica do país (apesar de ligados à Igreja, é por

meio desses cursos que letrados introduziram pensamentos de grandes filósofos ingleses e

franceses no Brasil):

(...) é nêles que se forjam e se temperam as armas políticas, para as lutas pelo direito e as campanhas liberais; e é dêles que se elevam, nas asas da poesia e da eloquência, para serem espalhadas por tôda parte, a semente das ideias revolucionárias, enquanto se forma, no recolhimento dos estudos e do magistério, a elite dos construtores do direito que devia dar travejamento à estrutura jurídica e política do Estado. (AZEVEDO, 1963: 285)

Seguiu-se, a partir desse momento, o real rompimento entre a cultura brasileira e a

Universidade de Coimbra, que era, até então, o grande berço da cultura intelectual

brasileira, mas que, nesse momento, deixou a desejar quanto ao conhecimento jurídico e à

falta de familiaridade com as teorias jurídicas de outros países. Nessa atmosfera de

efervescência jurídica, no ano de 1830, houve a criação do código criminal no Brasil e, em

1850, o código comercial – que foi reorganizado em 1855 por Teixeira de Freitas,

consolidando, nesse momento, as Leis Civis.

Além das academias de direito, D. João VI instituiu, ainda, a Academia Real

Militar no Rio de Janeiro, não somente para as atividades de atribuições militares, mas

também, voltada para a matemática – desenvolvendo o interesse pelo pensamento

econômico – e para a engenharia que direcionava à construção de estradas, portos, pontes,

etc.. Segundo Azevedo (1963),

Todo o esfôrço, largo e generoso, de D. João VI, criando escolas e instituições de caráter técnico, e estabelecendo cursos de economia, veterinária e agricultura, e organizando e reformando a Academia Militar e a de Marinha, foi uma ofensiva manifesta contra as tendências e características da instrução colonial que deixou desarmada a sociedade de quadros capazes de remover, pelos fundamentos econômicos, a sua reconstrução. (AZEVEDO, 1963: 289).

Os laços, entretanto, que prenderam grande parte dos intelectuais desse período ao

pensamento da era colonial – provavelmente pautada na mentalidade e defesa do trabalho

escravo e na falta de atividade industrial no país – ainda eram muito fortes e, esse conjunto

de determinações não foi suficientemente concreto para aplacar uma nova ideia cultural em

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grandes grupos atuantes na Academia Militar, prevalecendo a inatividade da economia

nacional.

A Academia Militar continuou passando por diversas mudanças quanto ao

funcionamento e à área de abrangência. Fazendo um levantamento dos processos de

mudança dessa instituição no tempo cronológico, observa-se que em 1833 houve o

desligamento da Academia Militar da Academia Naval e, ainda nesse período, ampliou-se

o curso militar e, consequentemente, o número de oficiais engenheiros.

Procedendo com os mesmos objetivos e utilizando-se dos mesmos métodos, em

1839, a Academia Militar teve o nome mudado para Escola Militar. A partir de 1842,

todavia, acontece a Reforma da Escola Militar, os cursos de militares, de cavalaria, de

infantaria, de artilharia foram criados e o de engenharia foi ampliado, passando a ter uma

duração de sete anos.

Em 1858, a Escola Militar recebeu o nome de Escola Central e a Escola de

Aplicação – fundada em 1855 – transformou-se em Escola Militar. A primeira

responsabilizou-se pelo curso de engenheiros civis e a segunda, de oficiais e engenheiros

militares. Somente em 1874, a Escola Central tornou-se Escola Politécnica, com os três

cursos de engenharia civil, o de minas, o de artes e manufatura e o de ciências físicas e

matemática.

Independente da fundação desses cursos superiores que influenciaram no processo

de crescimento geográfico no Brasil, construções de estradas de ferro etc., o prestígio

intelectual não residiu, nesse período, nos cursos de engenharia nem nos de medicina, mas

na atividade jurídica.

Penetrado, em geral, em todo o século XIX, do velho espírito livresco e dialético, o ensino superior fabrica incessantemente, uma espécie de aristocracia nova, a dos diplomados, quer dos que se conservam dentro da profissão para que se preparam, quer dos que se desertam ou transbordam dos quadros profissionais para as letras, o jornalismo, a política e a administração. (AZEVEDO, 1963: 296)

Apesar de toda a transformação cultural e intelectual que o Brasil estava vivendo

durante todo o século XIX, a elite do país foi identificada como portadora de cultura e não

criadora, pois tanto no desenvolvimento profissional, quanto na manifestação cultural –

literatura, artes – o Brasil estava tentando se integrar a uma cultura europeia que não fazia

parte da nova civilização brasileira. Se essa reflexão for trazida para a atualidade, seria

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considerável o pensamento de que o Brasil não apenas criou a sua própria cultura, como

também agrega a ela culturas apreendidas em outros países.

Os esforços para a integração do conhecimento científico e técnico eram

irrelevantes, pois eram esforços individuais, remotos. Essa organização cultural do Império

à República estava pautada somente nos aspectos transmitidos nas escolas e faculdades,

pensamento gerido por outros. Vale destacar também que intelectuais como José de

Alencar, Joaquim Nabuco, Osvaldo Cruz, Barão do Rio Branco, Tobias Barreto, Silvio

Romero e Euclides da Cunha eram raros nesse período (se compararmos ao alto índice de

analfabetos que havia no Brasil).

O Romantismo – que, na Europa, eclodiu em 1830 – com o pensamento lírico,

imaginativo e subjetivo; com a negação daquilo que é concreto, ao confrontar o que é

abstrato, vai aparecer no Brasil, em 1850, com as obras de autores como Gonçalves

Magalhães, Gonçalves Dias, Castro Alves, Fagundes Varela, José de Alencar, Junqueira

Freire, Casimiro de Abreu, Bernardo Joaquim da Silva Magalhães, entre outros.

Esses poetas e romancistas tentavam, por meio das obras que escreviam,

estabelecer a formação da língua nacional, da identidade do homem brasileiro, criticar o

problema dos escravos e os problemas políticos que os afligiam. A depender da fase do

Romantismo em que esses autores estivessem inseridos, o objeto e o objetivo mudavam.

Em 1881, com a publicação das obras Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de

Assis, e O Mulato, de Aluízio Azevedo, um novo período da literatura, inspirado pelos

novos ideais positivistas, é inaugurado no Brasil: o Realismo/ Naturalismo.

Fazer uma síntese sobre o pensamento cultural do homem que vivia no período de

transição entre o Império e a República e o levantamento dos fatores históricos que

moldaram esses pensamentos não é uma tarefa fácil, devido ao sistema de transição

cultural que o país vivia ao tentar encontrar uma identidade nacional. Ao falar da educação

na segunda metade do século XIX, veremos outros fatores de grande relevância para,

então, chegarmos a uma conclusão do pensamento cultural e intelectual do brasileiro desse

período.

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2.2 A educação no Brasil na segunda metade do século XIX

O ensino no Brasil, no século XIX, é marcado pela educação voltada aos interesses

da elite. Dessa forma, pouco se investiu no ensino primário, das primeiras letras – que

permaneceu precário durante muito tempo – e as atenções estavam sempre voltadas ao

ensino secundário e superior. (Cf. Fávero, 2002)

Relacionado ao ensino secundário, na primeira metade do século XIX, este se

resumia a aulas avulsas e particulares, seguindo o ultrapassado modelo proposto pelo

Marquês de Pombal, desde 1759, as aulas régias, extintas, em sua totalidade, a partir de

1857, já que não abrangiam todas as disciplinas cobradas nos exames preparatórios.

2.2.1 O ensino secundário no Brasil e o Colégio Pedro II

Com o objetivo de descentralizar o controle do ensino no Brasil – que pertencia ao

Governo Central – a Reforma Constitucional de 1834 criou as Assembleias Legislativas

Provinciais e estabeleceu dois diferentes meios de organizar o ensino: o provincial –

permitiu que as províncias se responsabilizassem pela instrução pública, pelos

estabelecimentos próprios – e o geral – responsável pelo ensino nas faculdades de

medicina, pelos cursos jurídicos, pelas academias já existentes e pelas instituições que

fossem criadas por meio da Lei Geral.

A participação direta dos poderes gerais no desenvolvimento do ensino provincial dos níveis primário e médio, em geral admitida como perfeitamente constitucional, não chegou, contudo, a se efetivar. A prática consagrou partilha bem diversa das competências em matéria de educação. De fato, após a reforma constitucional, a atuação dos poderes gerais no que concerne ao ensino primário e secundário limitou-se, quase que exclusivamente, ao município da corte; não se criaram por leis gerais quaisquer estabelecimentos desses níveis nas províncias. Por outro lado, abstiveram-se as províncias de criar estabelecimentos de ensino superior, conservando, de fato, o Poder Geral, o monopólio dos estudos maiores. (HAIDAR, 1972: 19)

O primeiro passo para o desenvolvimento e sistematização do ensino secundário no

Império foi a criação de Liceus provinciais, por exemplo, o Ateneu do Rio Grande do

Norte em 1835, Liceus da Bahia e da Paraíba em 1836, além do decreto lançado em

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dezembro de 1837, aprovado em março de 1838, que estabeleceu a transformação do

Seminário de São Joaquim, localizado no Rio de Janeiro, no Colégio D. Pedro II que foi

coordenado diretamente pelo governo, sendo considerado o Colégio da Corte.

O Colégio Pedro II foi a grande instituição do ensino secundário no Império e,

desde sua criação, o objetivo era de que ele fosse uma escola modelo e que o ensino – que

antes era feito por meio de aulas avulsas e sem controle e nenhum tipo de organização –

tivesse um nível elevado. A grade curricular era formada pelas seguintes disciplinas:

gramática nacional, gramática latina, aritmética, geografia, desenho, música vocal, latim,

grego, ciências naturais, física, filosofia, retórica e estudos históricos – distribuídas em oito

séries, cursadas em oito anos. As aulas avulsas não fizeram parte dessa nova formulação

ideal de ensino.

Fávero (2002:74) afirma que as classes deveriam ter de 30 a 35 alunos,

prioritariamente com o mesmo preparo e chama atenção para os requisitos necessários para

se matricular no Pedro II:

a) idade de pelo menos 8 anos e de 12 quando muito; os que excedessem essa

idade, não seriam admitidos;

b) saber ler e contar as quatro operações de aritmética;

c) histórico feito pelos professores ou diretores da escola anterior atestando bom

comportamento;

d) despacho de admissão do reitor. Além disso, o aluno precisava ser vacinado.

Ao aluno que concluísse os estudos no Colégio Pedro II, era-lhe concedido o

diploma de bacharel em Letras e, segundo Almeida (2000: 86), “por uma solução

legislativa de 30 de setembro de 1843, os bacharéis em Letras, formados pelo Colégio D.

Pedro II, foram dispensados de exame para inscrever-se em qualquer Faculdade ou

Academia do Império.”. Essa escola foi pautada na concepção da pedagogia científica – já

disseminada na Europa – e pretendeu a expansão do ensino para a elite.

Apesar da ampliação de disciplinas – línguas latina, grega, francesa, e inglesa,

gramática nacional e retórica, geografia e história, ciências naturais, matemática, música

vocal e desenho – para o ensino secundário provincial, os liceus provinciais restringiam-se

ao ensino das disciplinas que eram exigidas para a preparação dos alunos para ingressar

nas academias.

Dessa forma, normas foram sugeridas, a partir de 1846, em assembleias gerais para

que o ensino secundário nos Liceus Provinciais se equiparasse ao modelo proposto no

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Colégio Pedro II a fim de padronizar o ensino e os estudos preparatórios em todo o

território, sem agredir os direitos adquiridos anteriormente pelas províncias. Essa proposta

de equiparação, todavia, foi reprovada em todas as tentativas pelas posições

centralizadoras mais radicais, inclusive o próprio ministro, Paulino de Souza, se posicionou

contra, já que o gasto em transformar liceus em escolas-padrão seria muito alto.

Gonçalves Dias, poeta e originário da província do Maranhão, recebeu, do governo,

a incumbência de visitar as instituições pública das províncias do Norte e Nordeste do

Brasil e 1849. Ao final, Gonçalves Dias solicitava uma reforma urgente no ensino, porém,

o relatório não chegou a ser publicado:

Nesse excelente trabalho, apreciável sob todos os aspectos, o ilustre poeta faz observar quanto é deplorável a diversidade de legislação, de província a província, a respeito da instrução pública. Umas matérias ensinadas são insuficientes, noutras, a multiplicidade e a má escolha dos livros escolares prejudicam os estudos; em outra parte, os programas estão mal organizados; e em geral, há insuficiência de inspeção que, às vezes, falta inteiramente. Em quase todos os lugares as escolas são frequentadas de modo irregular. (ALMEIDA, 2000: 86)

Em 1870, o ministro Paulino de Souza – inspirado na questão do ensino científico

de cunho positivista que permeava as instituições na Europa e com o ideal de educação que

não ensina somente os conteúdos na sala de aula, mas também prepara o aluno para as

novas necessidades da sociedade moderna – fez um levantamento das condições gerais de

ensino no Império.

O resultado descreveu esse ensino como atrasado e retrógrado, chamou atenção a

falta de frequência e de aproveitamento dos alunos e os escassos recursos financeiros das

províncias para o desempenho de uma educação de qualidade. Esses fatos despontaram o

aparecimento de inúmeras instituições de ensino particular que, embora oferecessem

instrução sem qualidade, eram um meio de manter escolas funcionando em determinadas

províncias.

Esses fatos levaram ao aparecimento de inúmeras instituições de ensino particular

que, embora oferecessem instrução sem qualidade, era um meio de manter escolas

funcionando em determinadas províncias. Decorrente da constatação de que o ensino do

Colégio Pedro II – posteriormente todas as instituições de ensino secundário – necessitava

de uma reforma que acompanhasse tais evoluções europeias, criou-se a possibilidade de

uma reforma em 1870.

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A partir de 1870, introduzem-se no cenário brasileiro teorias de pensamento até então desconhecidas, como o positivismo, o evolucionismo, o darwinismo. No entanto, a entrada coletiva, simultânea e maciça dessas doutrinas acarretou, nas leituras mais contemporâneas sobre o período, uma percepção por demais unívoca e mesmo coincidente de todas essas tendências. Tais modelos, porém, foram utilizados de forma particular, guardando-se suas conclusões singulares, suas decorrências teóricas distintas. Dessa forma, se a noção de evolução social funcionava como um paradigma de época? Acima das especificidades das diferentes escolas, não implicou uma única visão de época, ou uma só interpretação. (SCHWARCZ, 1993: 43)

Por meio do decreto 4468, essa reforma priorizaria o fortalecimento do espírito de

uma juventude renovada à preparação de doutos, mas os exames parcelados levaram os

alunos a abandonar os cursos antes mesmo de concluí-los para tentar ingressar rapidamente

nas faculdades e, por esse motivo, o estudo no melhor estabelecimento de ensino

secundário do país estava ameaçado.

A partir da década de 1870, sucessivas reformas foram empreendidas. Em 1876:

reforma José Bento da Cunha, com a extinção das matrículas avulsas no Colégio Pedro II;

1878: Leôncio de Carvalho decreta novas regras relativas ao ensino e grade curricular; em

1881: Barão Homem de Mello faz o plano de estudo que vigora até o fim do Império.

Dentre as determinações dessa última reforma – 1881 – podemos citar a prioridade

pelo estudo do vernáculo em todas as séries do curso, a restauração do primeiro ano

elementar; os estudos propriamente secundários a serem cursados nas seis últimas séries, o

estudo de duas línguas mortas, o estudo de quatro línguas estrangeiras, a aprendizagem da

matemática e ciências físicas, o conhecimento de história geral e do Brasil, geografia geral

e do Brasil, além da retórica, da poética e da filosofia.

Em 1889, o ministro Ferreira Viana fez um comparativo entre a grade curricular do

Colégio Pedro II e a das escolas estrangeiras – França, Alemanha e Bélgica, por exemplo –

e, por meio dele, percebe-se que a grade do Pedro II era mais extensa e completa – tanto

relacionada ao número de disciplinas, quanto ao número de línguas estrangeiras – a

duração de curso, contudo, era maior nos países da Europa do que no Brasil, o que sugeria

que quanto maior o tempo do curso, mais aprofundado seria o conteúdo e,

consequentemente, o Pedro II deveria fazer a devida ampliação.

A maioria dessas novas determinações, o novo modelo imposto por meio da

reforma de 1881, tentou buscar o caráter científico defendido pelas novas correntes que

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permeavam o mundo intelectual nesse período, como já citamos, o positivismo, mas Rui

Barbosa levantava críticas sobre a forma brasileira de exercer essa corrente e acusava os

intelectuais brasileiros de não terem entendido o pensamento de Augusto Comte.

Independente disso, o fato era que as reformas serviram para inovar o campo educacional e

fazer com que o Brasil se equiparasse aos países europeus.

Entre reformas, críticas e tentativas em transformar o Colégio Pedro II em escola

modelo, Fávero (2010), salienta que:

O Colégio Pedro II não conseguira, durante o Império, realizar seu objetivo inicial que era o de ser o estabelecimento-padrão no país e acabou por tornar-se apenas mais um estabelecimento preparatório aos exames para ingresso nas escolas superiores. Só se converteria em padrão nacional em 1890 quando, pela reforma assinada pelo então Ministro da Instrução Pública, Correios e Telégrafos, Benjamin Constant, passa a denominar-se, num primeiro momento, Instituto Nacional de Instrução Secundária e, no ano seguinte (decretos 981 de 08 de novembro de 1890 e 1075 de 22 de novembro de 1890), Ginásio Nacional, e extinguem-se os exames parcelados de preparatórios, conferindo unicamente aos exames de madureza nele realizados (ou nos estabelecimentos a ele equiparados) a habilitação aos cursos superiores. (FÁVERO, 2010: 287)

2.2.2 O ensino secundário na província de Sergipe

Em Sergipe, o ensino secundário na segunda metade do século XIX estava centrado

no Atheneu Sergipense, instituição que foi fundada em 1870 durante o governo do Tenente

Coronel Francisco José Cardoso Júnior, grande propagador das ideias progressistas,

reformistas e positivas que habitavam na cultura intelectual do Brasil nesse período.

Antes da fundação do Atheneu, em torno de 1829, o ensino secundário era

resumido em aulas de Latim e os estudantes sergipanos que desejavam pleitear uma vaga

nas instituições de ensino superior – em Olinda ou em São Paulo – eram obrigados a se

deslocar até Salvador, pois era a cidade mais próxima que oferecia o curso secundário

completo.

A partir de 1846, após a autorização concedida pela Assembleia, foi criado o Liceu

em Sergipe, dirigido, primeiramente, pelo então professor de Latim Frei Roberto de

Oliveira. A frequência dos alunos, entretanto, era baixa, pois ainda não havia a cultura da

necessidade da instrução. Então, apesar de todos os esforços para o pleno desenvolvimento

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da educação, o Liceu foi fechado. Haidar (1972) apresenta parte do relatório do Ministro

do Império Paulino de Souza:

Em Sergipe, por exemplo, suprimiram-se os liceus porque “os pais de família que estão no caso de melhor educar os filhos preferem manda-los estudar os preparatórios necessários para a matrícula dos cursos superiores de instrução nas vizinhas províncias da Bahia e Pernambuco, onde têm de exibir as provas de suas habilitações”. (HAIDAR, 1972: 31)

No novo momento da educação em Sergipe, após a fundação do Atheneu, o ensino

público foi desenvolvido por Manuel Luiz Azevedo D’Araújo – exerceu a função de

Inspetor Geral da Instrução – por meio da elaboração do Regulamento Orgânico da

Instrução Pública da Província de Sergipe, documento responsável pela criação da Escola

Normal. Observa-se, no relatório feito em 1871 pelo então governador, que, na escola

pública de primeiras letras, foram matriculados 4.457 alunos, sendo 2.825 alunos do sexo

masculino e 1.632 do sexo feminino.

Esse novo regulamento garantiu a consolidação do Curso Normal, que durava dois

anos e a abertura do curso de Humanidades – que começou a funcionar em 1871 com as

aulas de Latim, Francês, História e Geografia, Aritmética, Álgebra e Geometria, Poética e

Retórica, Filosofia Moral e Racional, Inglês e Gramática Nacional (Cf. NUNES, 1984) –

com duração de quatro anos. Àqueles que concluíssem os cursos, era dado o privilégio de

exercer cargos públicos sem a necessidade de novas avaliações de conhecimento, contanto

que não concorressem com outros egressos.

O trecho a seguir, que foi retirado do Jornal do Aracaju e publicado em 1871 – sem

identificação quanto à autoria – revela o momento de consagração intelectual em que a

Província viveu e a satisfação que moveu intelectuais, jovens e autoridades da época,

revelando que Sergipe ansiava por um avanço educacional e que a população participou

ativamente desse momento:

A sexta-feira, 3 de fevereiro de 1871, marcou a sociedade sergipana. O progresso moral, de ha muito estacionario, - adiantou um passo; a mocidade radiosa, forte, alegre, communicativa, corajosa; a mocidade que nem a fortuna, nem o genio, que se eleva acima do vulgo ajoelhado, podem conquistar; ella em sua orgulhosa e divina flor a tranpoz o porteiro arruinado e sombrio que a segregava do templo da sciencia, - comprimindo-lhe n’alma as aspirações da gloria. [...] Depois da missa votiva [...] encaminharam-se todos para o paço da camara municipal, onde provisoriamente funcionarão as differentes aulas. [...] A casa estava

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cuidadosamente adornada. Extraordinaria foi a concorrencia de assistentes [...] o paracho benzeu os diversos compartimentos do edifício [...] o illustre e disctinto presidente da provincia pronunciou um eloquente e bem elaborado discurso. Outros se lhe seguiram [...] Terminou a festa com a leitura da acta da installação na qual assignaram as pessoas presentes, - com os vivos análogos, erguidos por s. exc. – e com o hymno nacional executado pela musica do corpo de policia. A noite illuminou-se, interna e externamente, a casa do Atheneu em frente da qual a banda de musica, de espaço em espaço, tocava escolhidas peças. [...] O pouco que fica ligeiramente narrado não pode, de certo, dar a medida exacta do enthusiasmo, do jubilo que transluzia no riso de todos os labios. É impossível descrever aquilo que só o coração póde sentir.(Jornal do Aracaju, 5 de fevereiro de 1871, autor desconhecido)

O Atheneu, visando à propagação de conhecimento intelectual e à educação que

prepara o cidadão na vida social, foi colocado à disposição da sociedade sergipana para a

instrução secundária que, nesse momento, era custeada, a título de matrícula, pelos alunos

ou responsáveis – informação registrada no Regulamento da Instrução Pública – e pré-

requisito para o ingresso dos alunos nos cursos de ensino superior.

As cadeiras para o curso Normal e o de Humanidades, disponibilizadas no Atheneu,

foram preenchidas por intelectuais que exerceram função de destaque na Província ou

ocuparam, anteriormente, cadeiras isoladas nos liceus e, provavelmente, por influência

política – já que não houve concurso público para a nomeação desses docentes. Segue uma

tabela com o nome dos professores, as disciplinas por eles ministradas, e os livros que

utilizaram, alguns deles, seguindo o modelo proposto no Colégio Pedro II:

Quadro 1: professores, disciplinas e material utilizado na primeira cadeira do Atheneu Sergipense

Docentes Disciplinas Livros

Antônio Diniz Barreto Latim Cartinha e Novo Método – Padre

Pereira;

Sintaxe – Dantas, Eutropio, Cornélio,

Fedro, Cícero, Tito Lívio, Salústio,

Tácito, Horácio e Virgílio.

Geminiano Paz de

Azevedo

Francês Gramática – Emílio Serene, Filon;

Narrações e Seletas – Charles André.

Justiniano de Melo e

Silva

Inglês Gramática – Gibson;

Seleta – Sandler;

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History – F. Roma.

Rafael Araújo de

Moura Matos

Geografia e História A Geografia – Pompeu Brasil;

Atlas – Grosselin de Lamarcho.

História Universal: Compêndio de

Victor Duruy;

História do Brasil: Compêndio de

Salvador Correia.

Sancho de Barros

Pimentel

Filosofia Curso Completo de Filosofia Racional

e Moral – Barbe.

Tomás Diogo

Leopoldo

Gramática filosófica,

Retórica e Poética

Gramática – e apostilas – de F. Sotero

dos Reis.

Íris Clássico – Castilho;

Tito Augusto Souto de

Andrade

Geometria e Filosofia Compêndios de C. Otoni

Fonte: Gally (2004).

Os candidatos que almejassem ocupar as demais vagas que surgissem,

posteriormente, precisariam submeter-se a concurso público, tendo como ritual de

avaliação: a) defesa de tese com tema livre, a ser escolhido pelo candidato; b) defesa da

tese com tema escolhido mediante sorteio; c) prova prática; d) prova oral; e) arguição.

Ser professor no Atheneu Sergipense foi sinônimo de prestígio e esse fato fez

desses docentes construtores dos modelos culturais que seriam seguidos por outros.

Prestígio esse não somente atribuído aos que estrearam as cadeiras, mas também aos que

entraram depois, beneméritos como Abdias Bezerra, Alcebíades Paes, Alfredo Montes,

Arthur Fortes, Baltazar Góis, Brício Cardoso, Felix Diniz Barreto, Guilhermino Amâncio

Bezerra, Manuel Francisco de Oliveira, Prado Sampaio e Severino Cardoso. (Cf. Lima,

1948).

Segundo Almeida (2000: 179), “A província do Sergipe era, em 1876,

comparativamente às outras províncias mais ricas, mais populosas e mais extensas, a que

possuía mais escolas e alunos e que mais dispendia com a instrução pública.”.

O Atheneu sergipense passou por diversas mudanças – tanto politica quanto

estruturalmente – e teve seu plano de ensino alterado diversas vezes, para melhor se

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adequar aos exames para ingresso no curso superior. Além disso, os professores que

atuavam nesse estabelecimento não estavam alheios aos fatos políticos que vinham

acontecendo, manifestando-se por meio da imprensa a favor de questões como a Abolição

e a transição do Império para República.

2.2.3 A disciplina Língua Portuguesa na grade curricular

Antes mesmo de se pensar em estudar Poética e Retórica, a base dos estudos girava

em torno do aprendizado gramatical. Essa cultura vinha, no Brasil, desde a Reforma

Pombalina de Ensino, em 1759, que fora inspirada no Verdadeiro Método de Estudar de

Luis Antônio Verney e seguiu para o currículo nos estudos do Colégio Pedro II e,

consequentemente, atingindo o currículo das escolas que o seguiam, já que era colégio-

modelo no século XIX.

Esse ensino de língua vernácula, entretanto, era restrito, até 1862, ao primeiro ano,

exceto pela aplicação da disciplina “Gramática Filosófica e Retórica”. Pois, como alerta

Fávero (2002:73), a grade foi planejada “de acordo com o desejo dessa elite que ao entrar

na escola já dominava a norma culta: assim eram mais importantes o Latim e a Retórica do

que a gramática filosófica e nacional para a qual dois anos eram mais do que suficientes”.

Isso pode ser observado, ao se fazer o levantamento das aulas de língua portuguesa

no Império, tomando 1841 como ano de partida:

Quadro 2: Plano da disciplina Língua Portuguesa no Colégio Pedro II durante o Império

ANO PLANO DE LÍNGUA PORTUGUESA NO COLÉGIO PEDRO II NOS ANOS DO IMPÉRIO

1841 Gramática Geral e Nacional (1º Ano)

1850 Gramática Nacional (1º Ano)

1856 Português (1º Ano)

1858 Português (1º Ano)

1862 Português (1º Ano)

Gramática Filosófica e Retórica (6º Ano)

1877 Português (1º Ano)

Português (2º Ano)

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1878 Português (7º Ano)

1882 Português (1º Ano)

Português (2º Ano)

Português (3º Ano)

Português (4º Ano)

Português (5º Ano)

Português (7º Ano)

Fontes: HAIDAR, 1972; VECHIA & LORENZ, 1998.

Com essa periodização, testifica-se, a prioridade que o latim exercia sobre a língua

portuguesa e o seu reduzido programa. Segundo Gasparello (2004),

como parte de um movimento que orientava uma referência “nacional” para os estudos secundários, o plano de estudos do período 1856-1915 mostra uma lenta evolução da conquista do espaço da língua nacional frente ao latim (...). (GASPARELLO, 2004: 75).

Em 1871, esse quadro começou a mudar, a partir do decreto Imperial que criou o

cargo de professor de português, pois as exigências dos exames preparatórios, relacionadas

ao estudo da língua portuguesa, tornaram-se intensas. Os programas, entretanto, sofreram

diversas mudanças – ligadas ao avanço dos programas – em todas as disciplinas do Colégio

Pedro II e a língua portuguesa acompanhou todas essas mudanças.

Maximino Maciel, em seu Breve restrospecto sobre o ensino da Língua Portugueza

publicado em anexo a partir da quarta edição da Grammatica Descriptiva, confirma a

informação de que, o ensino, nesse período, atravessava uma fase de transição nas

províncias e que estava cada vez mais estacionário, excetuando-se os professores Sotero

dos Reis, no Maranhão e Dr. Ernesto Carneiro, na Bahia, embora suas gramáticas ainda

estivessem baseadas nos moldes das gramáticas portuguesas. Analisaremos esse período

descrito por Maciel no próximo capítulo para que se possa entender melhor a construção da

gramática por ele elaborada e, posteriormente, faremos a análise da sintaxe na sua

Gammática Analytica redigida em 1885 e publicada em 1887.

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Capítulo 3

AUTOR E OBRA: MAXIMINO MACIEL E A GRAMMATICA

ANALYTICA

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3.1. O Autor

Maximino de Araújo Maciel nasceu em Rosário do Catete, no estado de Sergipe,

em 20 de abril de 1865. Há divergências a respeito do ano de seu nascimento nas duas

principais biografias sobre este intelectual sergipano: Guaraná (1925) afirma que é 1866 e

Bittencourt (1917) aponta o ano de 1865. No prefácio da primeira edição da Grammatica

Analytica, entretanto, Maciel revela que, apesar de publicada em 1887, sua gramática foi

produzida em 1885, “quando contávamos 20 anos de edade”. Dessa forma, adotamos 1865

como ano de nascimento do autor.

Filho de Maria Clara dos Santos de Araújo Maciel e João Paulo dos Santos,

Maximino Maciel diferenciou-se dos jovens intelectuais abastados do seu tempo, pois sua

família não pertencia à elite sergipana e, consoante Guaraná (1927:432), tornou-se

bacharel e médico devido à “perseverança e ingentes sacrifícios materiais” visando ao

avanço intelectual. Sua morte aconteceu aos cinquenta e oito anos de idade, em 2 de maio

de 1923, no Rio de Janeiro.

A Grammatica Analytica foi publicada em 1887, quando o nível escolar de Maciel

resumia-se aos preparatórios no Atheneu Sergipense, pois só ingressou na faculdade de

direito, no Rio de Janeiro, em 1890 e concluiu o curso em 1894:

Por esta occasião vinhamos nós de apparecer com o publicar o nosso modesto trabalho, Grammatica Analytica, na qual, embora collaborassemos para quebrar a tradição, no emtanto sobrelevavam defeitos e senões, porquanto, além de nossa pouca idade, traziamos apenas o preparo que hauriramos em nosso Estado, Sergipe. (MACIEL, 1910: 502).

A partir de 1896, iniciou o curso de medicina na Faculdade de Medicina do Rio de

Janeiro – com término em 1901 – e aceitou o desafio de, concomitantemente aos estudos

médicos, lecionar no Colégio Militar (onde se tornou Lente Catedrático de Português já em

1893). A tese de doutoramento – na medicina – tratou sobre As proporções do indivíduo

humano e suas deduções médicas e alitrológicas.

Um decreto de 19 de fevereiro de 1919 conferiu-lhe as honras para o posto de

Tenente Coronel; foi sócio do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe; ocupou a nona

cadeira das dezesseis criadas – em 1º de junho de 1929 – na Academia Sergipana de

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Letras, sendo, dela, patrono; foi membro da Imperial Academia de Medicina; membro da

Sociedade de Medicina Cirurgia do Rio de Janeiro; entre outros.

Suas principais obras são:

Quadro 3: Principais obras de Maximino Maciel Grammatica Analytica, baseada nas doutrinas modernas. Rio de

Janeiro, 1887, 316 páginas. in. 12º Tip. Central de Evaristo Rodrigues da Costa. A partir da segunda edição, publicada em 1894, altera o nome para Grammatica Descriptiva que segue até a 12ª (e última) edição, em 1931;

Philologia Portugueza: ensaios descritivos e históricos, 1888, Tip. José Dias de Oliveira. 120 páginas. in. 8º;

A Taxinomia social e seu autor. (Coleção de artigos publicados no “Debate”);

Lições de Botânica Geral professadas no Ginásio Nacional. Paris, 1901, 246 páginas. in. 8º. H. Garnier Livreiro Editor;

Noções de Agronomia: lições complementares ao estudo de Botânica. Professadas na Escola Normal do Distrito Federal. Paris, 1903, 109 páginas. H. Garnier Livreiro Editor;

Discurso na distribuição de prêmios aos alumnos do Collegio Militar em 1903. Rio de Janeiro, 1903, 22 páginas. in. 16º. Tip Orosco;

Valeur des differentes méthodes de traitement dans la turbeculose: mémoire présenté au Congrés International de Paris.Rio de Janeiro, 1905, 138 páginas. in. 8º. Tip Orosco. (Trabalho que angariou uma gama de elogios de professores e médicos europeus);

As proporções do indivíduo humano e suas deduções médicas e alitrológicas. Tese apresentada à Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro em 09 de setembro de 1901, para ser defendida a fim de obter o grau de Dr. Em medicina. 162 páginas. in. 8º. Tip. de A Tribuna;

Diagnóstico precoce da tuberculose: memória apresentada ao 3º Congresso Científico Latino-Americano reunido no Rio de Janeiro em 1905;

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Elementos de Chimica geral baseados nas modernas aquisições científicas. Rio de Janeiro, 1907, 232 páginas. In. 8°. Tip da Papelaria Brasil;

L’illusion des arsenicauz dans la tuberculose, Rio de Janeiro, 1906, na Revista Médico-cirúrgica do Brasil;

La medication urique dans la tuberculose. Rio de Janeiro, 1909 na Revista Médico-cirúrgica do Brasil;

Discurso pronunciado na sessão realizada a 13 de março de 1909 na Associação Mantenedora do Orfanato Osório em homenagem ao General Mandes de Morais. Rio, 1909, 10 páginas. in. 16º. Tip. Meurer & C. Pereira;

Discurso gratulatório na promulgação dos Postos de Honra no Colégio Anchieta

em Nova Friburgo aos 17 de maio de 1914. Nova Friburgo, 1914, 16 páginas. in. 8º pq. Oficinas Tipográficas da Aurora Colegial;

A Constituição Federal glorifica a incompetência e acoroçoa a irresponsabilidade. No Diário da Manhã. Aracaju, de 14 a 17 de outubro de 1915;

A Escola Social Positiva de Florentino Menezes. Idem de 27 e 28 de abril de 1918;

Elementos de Zoologia, de accordo com a fauna brasileira.

Fontes: GUARANÁ (1925); MACIEL (1926).

O vasto conhecimento cultural, os títulos conferidos e as produções literárias

relacionadas às ciências naturais, médicas e jurídicas fizeram de Maximino Maciel um

intelectual, médico, professor, filólogo e bacharel reconhecido tanto no Brasil quanto na

Europa. Bittencourt (1917:199) assim o descreve:

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Homem alto e forte, com grande lucidez de inteligência e notável erudição científica, filológica e literária, fala e escreve com grande correção, assim em português como em francês. E, dotado de pasmosa atividade intelectual, pleno de força de vontade e de justíssimo amor à glória literária, tem à sua brilhante folha de serviços, a lhe iluminar os passos, as seguintes unidades literárias, qual mais valerosa e mais profunda: Gramática Analítica (já à 4ª edição), Filologia Portuguesa, Gramática Descritiva, Taxionomia Social, Lições de Botânica Geral, Noções de Agronomia, As Proporções do Indivíduo Humano, Lições Elementares de Língua Portuguesa, Discurso, Valeur des différentes méthodos de traitement dans la tuberculose, La médication unique dans la tuberculose, D’illusion des arsenicaux dans la tuberculose, Elementos de Botânica Geral e Elementos de Zoologia. É, sem questão, uma das glórias intelectuais do pequenino Estado do Norte, ninho de águias chamado, como também uma das figuras de mais destaque do magistério oficial brasileiro. (Grifos do autor).

3.2. Breve Retrospecto Sobre o Ensino da Lingua Portugueza

Na quarta edição da Grammatica Descriptiva (1910), Maximino Maciel apresentou

um texto onde explicava o significado de modernidade no final do século XIX e o que se

passava, naquele momento, no ensino de línguas, principalmente, da língua portuguesa no

Brasil. O Breve retrospecto sobre o ensino da Lingua Portugueza foi reapresentado em

todas as edições posteriores à quarta e, até os dias atuais, é bastante útil para entendermos o

período de transição entre as obras, sob orientação da gramática geral e filosófica e as

obras sob orientação das correntes “científicas”.

Ao explanar a transformação que a ciência da linguagem estava atravessando em

1887, o autor justificou que, nesse período, o método de ensino de língua portuguesa no

Brasil era ultrapassado – excetuando os estados do Maranhão, com Sotero dos Reis e da

Bahia, com Ernesto Carneiro –, pois seguia os parâmetros estipulados pelas gramáticas

portuguesas – Soares Barbosa, Bento J. de Oliveira, José Gonçalves Lage, entre outros.

Para ele, apesar de as gramáticas de Sotero dos Reis, Charles Grivet, padre Antônio da

Costa Duarte, padre José Noronha Nápoles Massa e Soares Passos serem brasileiras, não

transmitiam a realidade linguística do Brasil porque estavam presas a diversos moldes

portugueses.

No Rio de Janeiro, todavia, começava a fervilhar um novo rumo para os estudiosos

das letras, aquilo que Maciel intitulou de doutrinas modernas: o método histórico-

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comparativo. Faraco (2011) aponta William Jones, Friedrich Schlegel e Franz Bopp como

pioneiros desse método:

(...) procedimento central nos estudos de linguística histórica. É por meio dele que se estabelece o parentesco entre línguas, a partir do pressuposto de que entre elementos gramaticais de línguas aparentadas existem correspondências sistemáticas (e não apenas aleatórias ou casuais), passíveis de serem estabelecidas por meio de uma comparação cuidadosa e rigorosa. Com esse procedimento, podemos não só explicitar o parentesco entre línguas, como também determinar, por inferência, características da língua ascendente comum de um certo conjunto de línguas. (FARACO, 2011: 32).

As ideias relacionadas ao novo método eram disseminadas no Collegio Pedro II e,

para que os candidatos fossem aceitos nos concursos, Maciel alegava que eles precisavam

transparecer familiaridade com as teorias de intelectuais como Max Muller, Miguel Bréal,

Gaston Paris, Whitney, Littré, Darmesteter, Ayer, Brunot, Brachet, Frederich Diez, Bopp e

Adolpho Coelho, “principalmente as dos autores allemães em que se estavam haurindo os

elementos primordiaes para esta verdadeira Renascença dos estudos philologicos no

Brasil” (MACIEL, 1910: 499).

Essa novidade positivista na principal instituição de ensino do país marcou a quebra

parcial da tradição – responsável pela dicotomia maximiniana escola clássica x escola

positiva –, por meio das publicações pouco discutidas de Pacheco Junior e José M. Nunes

Garcia, pois a falta de conhecimento, cultura e estrutura atrapalhavam o desenvolvimento

em massa dos estudos comparativistas.

3.2.1 Intelectuais e obras que marcaram o final do século XIX

Maciel citou, em seu Breve Retrospecto, estudiosos e produções gramaticais que

fizeram parte deste momento histórico-comparativo que, em sua opinião, colaboraram

direta ou indiretamente, com a implantação das novas teorias no ensino de língua

portuguesa. Os autores por ele citados são:

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3.2.1.1 Júlio Ribeiro

A Grammatica de Júlio Ribeiro publicada em 1881 teve uma ampla repercussão,

pois, considerada divisora de águas e precursora das obras, sob a orientação das correntes

científicas, exerceu um papel fundamental na disseminação das novas ideias linguísticas.

Apesar de tal reconhecimento, Maciel fez críticas ferrenhas sobre a maneira como Júlio

Ribeiro inseriu teorias alemãs, inglesas e francesas em sua obra:

Tão de perto se lhes abeirava, porém, que se diria antes uma adaptação á lingua vernacula do que um trabalho onde transluzissem, com individualidade do autor, os seus processos, o seu methodo, enfim norteação propria, oriunda de um trabalho de assimilação. Até pontos havia em que o Sr. Julio Ribeiro se adscrevia a transverter, quasi ipsis verbis, para o vernaculo, as novas doutrinas dos autores estrangeiros, de Guardia, de Mason, de Bergmann. Além disso, resumbrava-lhe do estylo certo gráo de frouxidão e obscuridade; do methodo, certa desorientação; e, quanto á syntaxe, ao envez de exemplos hauridos aos monumentos literários, dava-lh’os elle proprio, quasi sempre. O que se nos afigura é que se apressurou o Sr. Julio Ribeiro a de chofre quebrar a rotina, fosse como fosse, embora ainda não houvesse assimilado o quanto lera nos philologos estrangeiros. (MACIEL, 1910: 500).

O fato de Júlio Ribeiro ter, ou não, se apressado em publicar uma obra baseada em

teorias que ainda não haviam sido absorvidas da maneira correta desencadeou uma série de

publicações – de diferentes autores – que seguiam o novo modelo teórico e uma renovação

na mente de vários professores que, a partir daquele momento, passaram a transmitir as

novas doutrinas associadas ao recente método de ensino da língua portuguesa.

Nesse grupo, Maciel insere Fausto Barreto, Hemetério dos Santos, Alfredo Gomes,

Silvio de Almeida, João Ribeiro, Pacheco Júnior, Lameira de Andrade, Said Ali, Ventura

Boscoli, Veríssimo Vieira, Vicente de Souza, Paranhos de Macedo e Aureliano Pimentel.

3.2.1.2 Fausto Barreto

Copiosamente elogiado, Fausto Barreto, segundo Maciel, inseriu adequadamente as

novas teorias ao recém-adquirido conteúdo “filológico” que estava sendo moldado naquele

momento. Com a nomeação para a cadeira do Collegio Pedro II em 1870 e, depois, da

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Escola Normal, ele conseguiu interligar o conhecimento que obtivera dos estudiosos

estrangeiros ao ensino da língua vernácula brasileira e, como legado dessa nova forma de

estudar a língua, Fausto Barreto angariou seguidores que, posteriormente, viraram grandes

professores e escritores.

Tornou-se pois Fausto Barreto o centro de onde se irradiaram os delineamentos geraes, o trabalho de synthese das novas acquisições philologicas, adscriptas ao ensino da lingua vernacula. Havendo-se especialisado nos estudos de humanidades, mórmente nas linguas novi-latinas e tendo perlustrado a Historia Natural no curso de Medicina que deixou no 5º anno, convenceu-se de que ás linguas, como organismos, se lhes deveria o methodo positivo das sciencas biologicas. (idem, 1910: 501).

Com a remodelação do plano de ensino dos preparatórios proposta pelo Diretor

Geral da instrução pública Emygdio Victório em 1887, Fausto Barreto foi nomeado para

reformular a área do ensino de línguas e publicou juntamente com Vicente de Souza a

Seleção Literária – referência para qualquer profissional das letras que tivesse o objetivo

de exercer sua função com excelência – que, além das explanações gramaticais, possuía

um resumo sobre a biografia dos autores e suas produções literárias para que o aluno

aprendesse não somente a língua, mas também os nomes e as características dos bons

escritores da literatura brasileira e da portuguesa.

O programa traçado por Fausto Barreto não encontrou gramáticas já publicadas que

estivessem dentro dos parâmetros delineados e, por esse motivo, Pacheco e Lameira, João

Ribeiro e Alfredo Gomes – professores renomados – foram convidados a redigir

gramáticas inspiradas nos novos princípios concretizando, por meio de suas obras, o que

Maciel chamou de reforma do ensino da lingua vernacula.

3.2.1.3 Ventura Bôscoli

As obras do professor Bôscoli – Orthographia e Analyse Phonética (1885, em

coautoria com Pacheco Junior), Grammatica da Puericia (1895) e Grammatica

Portugueza (1893) – seguiram a influência da gramática de Julio Ribeiro, com algumas

alterações relacionadas à opinião de alguns outros escritores. Ao falar desse professor,

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Maciel (1910: 503) deixou evidente a sua concepção de que a língua é mutável – mesmo

que lenta e gradualmente – pois critica o rigorismo etymologico a que se apega nas

graphicas vocabulares.

3.2.1.4 Said Ali

Apesar de resumir a importância das obras de Said Ali em um parágrafo, Maciel

exalta a colaboração dos seus estudos linguísticos não somente relacionada à produção

gramatical, resultado de pesquisas próprias, mas também pela produção do livro

Difficuldades da Lingua Portugueza, de 200 páginas, que é constituído de artigos em que o

autor aponta fatos controversos da língua.

3.2.1.5 João Ribeiro e Alfredo Gomes7

As gramáticas desses dois autores receberam destaque pelas sucessivas edições e

por terem sido bastante solicitadas: “por isso que, por serem dous nomes conceituados,

lhes acceitaram desde logo os professores os trabalhos, adoptando-os, reservando o de

Pacheco e Lameira apenas para consulta”. Maciel (1910: 504). Os principais trabalhos de

Alfredo Gomes foram a Grammatica Portugueza e a Franceza, muito elogiados pela

imprensa.

A Grammatica Portugueza (1889) de João Ribeiro foi a mais disseminada e a que

conseguiu popularizar com mais intensidade as determinações que estavam de acordo com

o projeto de reforma do ensino, essa popularidade não se deu somente pela qualidade, mas

essa dissipação deveu-se também ao trabalho de divulgação do editor Francisco Alves, já

que era conhecido pelo grande investimento em propagandas.

A crítica que Maciel (1910: 506) faz ao trabalho de João Ribeiro está ligada à falta

de síntese, pois, tanto suas gramáticas quanto o Diccionario Grammatical (1889), possuem

uma leitura extensa e cansativa: “de inimitável paciência, de acuradas investigações

philologicas, esparsas com o objectivo de documentar o quanto assevera o autor”.

                                                            7 Os nomes de João Ribeiro e Alfredo Gomes encontram-se no mesmo subtítulo devido ao modelo seguido, de Maciel, que escreveu sobre esses dois autores no mesmo parágrafo.

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3.2.1.6 Heráclito Graça e Mario Barreto8

Responsável por coluna nomeada Notações philológicas no jornal Correio da

Manhã, Graça escrevia sobre o trabalho da filologia – sempre amparado no método

histórico-comparativo – objetivando confrontar diferentes visões e textos publicados no

Jornal do Commercio que eram escritos por Cândido de Figueiredo.

Grande influencia exerceu, nas rodas literarias, este excelente trabalho do Sr. Dr. Heraclito Graça, pois, além da dicção escorreita em que o redigiu, houve por effeito rebater os conceitos do Sr. Candido de Figueiredo que se arvorara em mentor de nós outros, explanando ás vezes factos da lingua sem o verdadeiro criterio, e documentação precisa de que se há mister nestes trabalhos. (idem, 1910: 506)

Mario Barreto obteve destaque intelectual pela produção da obra Estudos da Lingua

Portugueza, prefaciada por João Ribeiro. “Este trabalho, além de vir firmado por um nome

de tradição no magisterio, mereceu os elogios de Heraclito Graça, Sylvio de Almeida,

Osorio Duque Estrada e carta de Ruy Barbosa”.

Suas outras obras que também mereceram destaque foram: Acentuação tonica,

Ortographia, artigos em prol da simplificação graphica conforme as bases de Gonçalves

Viana, Genero, Observações sobre os graus de comparação, Conjugação, Erros de

conjugação e de pronuncia, Mudança de significação das palavras, Extravagancias da

linguajem, Etimologia popular e Confusão de paronimos, A concordância gramatical,

Casos curiosos de regencia e Atração e analocuto.

Maciel encerrou o documento explicando que esse trabalho de explosão de

gramáticas com a finalidade de modernizar – de acordo com as novas determinações do

programa proposto por Fausto Barreto – as produções intelectuais relacionadas à língua –

que hoje conhecemos por processo de gramatização – foi o início de algo que deveria ter

continuidade por novos pesquisadores.

Na succinta resenha que esboçamos attinente ao movimento philologico entre nós, é possivel que hajamos omitido alguns dos obreiros que de algum modo tenham collaborado com a reforma do ensino da lingua vernacula. Seja como for, sendo esse o histórico nas suas linhas geraes, afigura-se-nos havermos exposto os factos com imparcialidade e animo

                                                            8 Maciel também explana a grandeza intelectual de Heráclito Graça e Mario Barreto no mesmo parágrafo e, por esta razão, agrupamo-los no mesmo subtítulo.

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desprevinido esforçando-nos tão sómente para nos appropinquar, tanto quanto possível, aos dictames da verdade. (idem, 1910: 508)

3.3. Descrição da Grammatica Analytica9

Grammatica Analytica foi o nome dado apenas à primeira edição da gramática de

Maximino Maciel publicada em 1887 e, a partir da segunda edição, o autor alterou o nome

para Grammatica Descriptiva, que permaneceu em todas as demais edições (apesar do

prólogo da segunda edição, ele não explica a alteração feita no nome). A gramática de

Maciel – seja Analytica ou Descriptiva – foi editada até o ano de 1931, porém, depois da

oitava edição publicada em 1922, as demais foram póstumas. Um fato interessante a

respeito das diferentes edições é que, até a sexta (1921), o autor escreveu prólogos em que

justificava a publicação de uma nova versão.

No prólogo da segunda edição, o autor reafirmou a escolha pelas doutrinas

modernas – método histórico-comparativo, em oposição ao modelo tradicional – e ratificou

que sua obra rompia os moldes tradicionais, referindo-se ao momento de transição em que

as gramáticas não mais seguiriam as orientações da gramática geral e filosófica.

Como novidade na segunda edição (1894), Maciel enfatizou a diferença relacionada

à experiência que teve no magistério, pois a primeira foi baseada apenas em teorias sobre o

ensino de língua e, a segunda, na sua própria prática docente, visto que foi catedrático no

Colégio Militar desde 1893. Uma preocupação do autor nesse prólogo era que, por haver

bastantes citações no decorrer da gramática, ela perdesse a sua identidade, mas ele mesmo

assevera que suas características ainda permanecem no decorrer de toda a obra.

A parte sintática foi reformulada na segunda edição – já que o autor diz que a

desprezou na primeira – e melhor desenvolvida, utilizando-se novos exemplos com trechos

de autores clássicos. Maciel criticou o hábito de alguns filólogos da época em elaborar seus

próprios exemplos, pois reconhecia a diferença entre a gramática e as particularidades da

linguagem. Ao final do prólogo, Maciel insinua que a segunda edição não tem relação com

a primeira e a colocou na condição de “protesto” contra as críticas recebidas pela que a

antecedeu, ou seja, a Analytica.

Ao publicar a terceira edição (1901), Maciel explanou o grande sucesso da anterior

– sabemos que a segunda edição foi adotada no Colégio Pedro II nos anos de 1892, 1893 e                                                             9 Manteremos, neste trabalho, a ortografia utilizada pelo autor.

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1896 (Cf. Fávero e Molina, 2006: 174) – e, motivado pelos elogios, decidiu prosseguir seu

trabalho e fazer a terceira edição. Enquanto na introdução da gramática publicada em 1887

o autor explicava que era um livro direcionado aos alunos iniciantes, na terceira, ele a

considerou pesada e aconselhou os professores a delimitar o que poderia ou não ser

estudado.

Apesar de relativamente grande, a terceira edição não foi dividida em três volumes,

como solicitaram alguns professores na época. Maciel orientou os mestres a procurarem

compêndios mais simples, caso não estivessem sabendo trabalhar com a Grammatica

Descriptiva, porque, para ele, a competência para lecionar por essa gramática teria que

partir da capacidade intelectual de cada professor.

Maciel, em forma de desabafo, criticou autores – mas não citou nomes – que

copiaram, desde a primeira edição, o trabalho dele e não lhe fizeram referência:

Até houve Grammaticas que se diriam o resumo da nossa, nossos exemplos, as nossas doutrinas lá se acham e ao nosso nome não se reservou siquer a minima referencia. Mas deixemos passar estes factos: aquelles que nos leram nos manusearam, nos farão a justiça que nos assistir no fôro da consciencia, ainda que os admova por ventura conra nós qualquer motivo. Na materia que nos occupa, temos as nossas opiniões assentadas: bôas ou más, erroneas ou acertadas, esforçamo-nos em pol-as de maior concerto possivel com os factos da lingua. Corram então por conta de exiguo criterio nosso na interpretação d’elles os desacertos de que, si por acaso os houver, nos penitenciaremos, desde que nol-os próvem com logico fundamento e com os factos da lingua. (MACIEL, 1901: 5)

O prólogo da quarta edição (1910) não trouxe grandes novidades, apenas a

informação de que ele continuava empenhado em realizar uma interpretação que estivesse

de acordo com as inovações da linguística, exaltou mais uma vez a sua sofisticada seleção

de exemplos utilizados para explicar sua sintaxe.

A quinta edição, publicada em 1920, foi, segundo o próprio autor, a que exigiu

maior dedicação e esforço, uma vez que alguns equívocos da primeira ainda não tinham

sido reformulados e o patriotismo e o espírito nacionalista que eclodiram nesse período

exigiram uma atenção maior à língua nacional (alterações voltadas diretamente para a parte

da gramática chamada semasiologia e ampliação de outras partes); já a sexta (1921), possui

o menor de todos os prólogos e, nele, o autor advertiu os iniciantes que lessem previamente

a obra Lições elementares de Língua Portuguesa – manual simplificado que servia como

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base para os alunos do Colégio Militar – para que o entendimento da gramática fosse

positivo.

Não existem prefácios referentes às demais edições, mas, de acordo com os que

aqui analisamos, percebemos um crescimento gradual no nível de dificuldade (de acordo

com cada nova edição publicada), o salto intelectual de Maximino de Araújo Maciel10 e o

modo zeloso com que ele tratava a língua portuguesa. Apesar do apanhado cronológico

feito nas diferentes edições da gramática, esse trabalho será focado na primeira edição, já

que o nosso objetivo é saber como o autor via o conceito de modernidade enquanto este

ainda estava sendo moldado nas gramáticas brasileiras.

3.3.1. Visão Geral

Na introdução da Grammatica Analytica, Maximino Maciel tinha certeza de que

estava inserido no momento mais importante da história do processo de gramatização no

Brasil. Ao explicar o avanço dos estudos linguísticos no nosso país (por influência de

europeus como Hovelaque e Max Muller), o autor atribuiu caráter científico à exposição

methodica dos factos da linguagem, inserindo a linguística no campo das ciências sociais

e, destarte, atestou a importância do envolvimento da linguística com as demais ciências.

Assim emquanto a taxeonomia natural estabelece as leis da calssificação das especies, que povoam o universo e a morphologia estuda-lhes a estructura e organização interna, a taxeonomia grammatical, baseando-se nos conceitos significativos dos vocabulos, dita-lhes as leis da classificaçãoe nomenclatura e a morphologia, penetrando-lhes na estructura, separa o elemento organico embryonario daquelles elementos que, advindo do exterior, se reduziram ao estado de elementos, dotados simplesmente de funcções de relação. (MACIEL, 1887)

Sempre interligando aspectos das ciências biológicas aos aspectos linguísticos –

seguindo o pensamento evolucionista defendido por Julio Ribeiro (1881) de que a língua é

um organismo vivo – Maciel sustentava a ideia de que a linguística era uma das ciências

mais importantes para o desenvolvimento humano, pois, para ele, o objetivo da linguística

era analisar o estudo do principal instrumento de comunicação entre os povos, isto é, o

                                                            10 No próximo capítulo deste trabalho, explicaremos esse “salto intelectual” por meio da análise da syntaxologia.

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estudo sistematizado dos fenômenos e das leis gerais da linguagem humana. (Cf. Maciel,

1887).

Ao fazer a distinção da superioridade do ser humano quanto a qualquer outro ser

vivo mediante a capacidade de se comunicar por meio da linguagem articulada, Maciel

enalteceu o poder dos estudos da língua como objeto de compreensão do homem e do seu

pensamento: “a sciencia que define exactamente o homem é a mais importante, porquanto,

occupando-se todas mais ou menos do estudo do homem sobre vários aspectos, têm a

restricta necessidade de definil-o antes de começar a estudal-o”.(idem, 1887)

A metodologia utilizada por Maximino Maciel ao escrever a Grammatica Analytica

seguiu a linha teórica do Comparativismo – embora ele ainda a chamasse de modernas

theorias – e, como era algo novo para os gramáticos e mestres brasileiros, solicitou àqueles

que não estivessem entendendo a nova abordagem da gramática que não se precipitassem

em julgá-lo mal e esperassem, pois os efeitos dessa gramática seriam futuramente

reconhecidos.

O autor concluiu seu discurso justificando que a gramática foi escrita e direcionada

para o estudo de alunos iniciantes na língua vernácula, tal qual um manual, e não para

professores. Enfim, solicitou aos mestres que expressassem opiniões, correções e

contribuições acerca do trabalho (como era hábito dos autores nessa época).

3.3.2. Divisão da Obra

De acordo com o conteúdo da gramática, segue o gráfico com a proporção de suas

partes:

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Gráfico 1: Proporção das partes da Grammatica Analytica

A obra apresenta o seguinte plano sinótico:

Veremos, a seguir, as principais noções de cada uma dessas partes.

PHONETICA PHONOLOGIA . . . PROSODIA PHONOGRAPHIA ORTHOGRAPHIA MORPHOLOGIA LEXEOLOGIA . . . TAXEONOMIA KAMPENOMIA GRAMMATICA . .

ETYMOLOGIA

SYNTAXE SYNTAXOLOGIA . . TOPOLOGIA PHRASEOLOGIA ESTYLISTICA EXEGETICA SENECOLOGIA . . . TECHNICA

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3.3.3 Definição de Gramática

A gramática é vista como disciplina, tem por objetivo tratar as normas11 do

pensamento humano por meio de estudo e analisar os fatos da linguagem12. Pode ser

classificada da seguinte maneira:

Tabela 1: classificação dos diferentes tipos de gramática

(FONTE: MACIEL, 1887)

Segundo Fávero e Molina (2006: 177), a modernidade de tais definições reitera o

subtítulo da obra, ou seja, percebemos que o autor está efetivamente imprimindo, em seu

manual, orientações fornecidas pela vertente científica dos estudos linguísticos.

Além dessas definições, temos o conceito de linguagem como a manifestação do

pensamento por meio da voz humana; a escrita representa a manifestação do pensamento

por meio de caracteres significativos e a gesticulação, que também pode ser chamada de

mímica ou aceno. Esses três elementos, para o autor, são três maneiras distintas que o

homem possui para manifestação do pensamento.                                                             11 Cavalieri (2000) diz que “É grande equívoco, pois, afirmar que o estudo de Maciel fosse pautado em uma norma anacrônica, a título de purismo gramatical ou coisa que o valha. O rigor descritivo acima mencionado, que exige a exemplificação farta do fato gramatical, impunha-lhe a escolha de uma norma que, obviamente, deveria ser escrita. A questão é que no mais das vezes a norma escrita contemporânea de Maciel aproximava-se bastante da norma clássica lusitana, pelos motivos já conhecidos da influência do português europeu nos nossos escritores.” (p.139) e também que “A palavra ‘norma’, na definição de Maciel, deve ser entendida como ‘regra’, bem à semelhança do sentido que dedicamos hoje a esse termo linguístico.” (p.140). 12 Fávero e Molina (2006: 178) explanam que, apesar de seguir o conceito de gramática proposto por Darmesteter, Maciel não consegue desligar-se completamente da herança logicista, assim como outros gramáticos da época. 13 Apesar de chamar a sua gramática de Analytica, Maciel não apresenta tal nomenclatura como um tipo de gramática. Tal fato talvez explique a alteração feita a partir da segunda edição, a Descriptiva (já que o autor altera o nome e não justifica a mudança).

a) Descritiva ou expositiva13 É aquela que trata praticamente das normas ou aspectos

de uma língua qualquer.

b) Histórica ou comparativa É aquela que trata os aspectos de uma língua em

diferentes épocas ou compara-os com outra língua para

conhecer suas relações.

c) Filosófica É aquela que procura ou investiga as diferentes leis e

princípios que dirigem os fatos gerais da linguagem.

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3.3.4 Phonologia

Por phonologia, entende-se o tratado dos sons constitutivos das palavras debaixo de

todos os pontos de vista14. O autor a divide em quatro partes: a) phonetica; b) prosodia; c)

phonographia; e d) orthographia. Vejamos as particularidade de cada uma dessas partes.

3.3.4.1 Phonetica

A phonética é, na GA15, o estudo dos sons das palavras, considerados em si e em

suas relações (GA p. 3). Esse estudo pode ser dividido em phonetica physiologica – que

consiste em sons produzidos pelos órgãos que os emitem – e phonetica historica – o estudo

da evolução dos sons no curso da vida da língua. É fácil percebermos a presença dos

termos “história” e “evolução” imprimindo-lhe uma confirmação da linha teórica que o

autor estava buscando por meio de uma inovação em sua gramática com as orientações

“científicas”.

O autor define phonema como qualquer som que sai da laringe, seja vocálico ou

consonantal produzido pelas cordas vocais. O phonema é resultado da corrente respiratória,

cuja intensidade é administrada pelos músculos do movimento de respiração; do obstáculo

que a corrente respiratória encontra e o som é produzido na glote ou no canal bucal e do

espaço ressonante, ou seja, a cavidade bucal onde o som emitido adquire caráter específico.

Os órgãos que estão envolvidos no processo da emissão de sons são chamados pela

GA de apparelho phonetico e, referente a isso, um dos tópicos pertencentes à phonetica é a

classificação physiologica, que consiste na distribuição dos fonemas pelos órgãos que os

produzem – são elas gutturaes, palataes, linguaes, dentaes e labiaes – já que os

“phonemas se produzem em diversos pontos do apparelho phonetico, e chamamos logar

articulativo o ponto do orgam em que se produz o phonema” (GA: 6).

O autor apresenta ainda quatro itens importantes no campo fonético: diphthongos

(oraes e nasaes), triphthongos (critica autores que, contrariando a opinião de Frederico

Diez, não admitem na gramática o tritongo), syllabas e tautosyllabas (palavras que

possuem duas sílabas idênticas. Ex.: dadá, nhonhô).                                                             14 A fonologia apresentada como autônoma não causa estranheza porque assim já estava em Adolfo Coelho e em Epifânio da Silva Dias. (Cf. Fávero e Molina, 2006: 179). 15 De agora em diante, referir-nos-emos à Grammatica Analytica por GA.

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3.3.4.2 Prosodia

A prosodia na GA – que também pode ser chamada de orthoepia ou orthophonia –

é a parte da fonologia que cuida da acentuação necessária para a pronunciação correta das

palavras. A acentuação prosodica é a intensidade de uma sílaba comparada às outras da

mesma palavra. As sílabas, a depender da sua tonicidade, podem ser classificadas em:

oxytonas, paroxytonas e proparoxytonas.

Como parte importante da prosodia, podemos observar também a “assimilação e

dissimilação que estão comprehendidas no numero das alterações phoneticas, como o estão

a consonificação, a vocalisação, a substituição dos phonemas; phenomenos que só podem

ser tractados em grammatica comparativa”. (GA: 26).

3.3.4.3 Phonographia

Entende-se por phonographia as letras, chamadas também de “notações graphicas”.

As lettras são definidas como “notações visuaes ou mesmo tacteis adaptadas por

convenção para as representações dos phonemas” e classificadas em vogais – a, e, i, (y), o,

u – e consoantes. (GA: 27) Além disso, vale ressaltar a constituição do alfabeto: composto

por vinte e cinco caracteres ou letras, sendo seis vogais e dezenove consoantes.

3.3.4.4 Orthographia

Para Maximino Maciel, orthographia é o tractado de representação externa dos

phonemas; quando coustituidos em palavra. (GA: 30). Essa orthographia abrange os

seguintes pontos: a) acentos orthographicos; b) orthographia das vozes livres; c)

orthographia das vozes nasaes; d) orthographia dos diphthongos; e) orthographia dos

diphthongos nasaes; f) orthographia dos phonemas polymorphicos; g) lettras geminadas;

h) emprego das lettras maiusculas; i) regras orthographicas e j) divisão das palavras.

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3.3.5 Lexeologia

A maior parte da gramática é constituída pela lexeologia e nada há como definição

para esta palavra na GA. Seguiremos, então, esquematizando as partes mais importantes e

fazendo a descrição da maioria delas.

3.3.5.1 Morphologia

A morphologia é vista na Grammatica Analytica como a parte da lexicologia que

tracta das palavras sob o ponto de vista de formas, consideradas como elementos

constitutivos do pensamento. (GA: 47)

Apresenta uma lista com 34 itens de sufixos adjetivos; 53 itens de sufixos

nominativos; 44 itens de prefixos; e 40 itens de raízes latinas. Além disso, Maciel

transcreve sete trechos, cada um deles relacionado a um século – do século XII ao XVIII –

para que se faça uma comparação na transformação da língua vernácula, reafirmando a

linha histórico-comparativa da qual o autor faz parte.

Morphologia

Radical/ Raiz: parte invariável da palavra sujeita à ação dos afixos. O autor classifica as raízes baseado em Max Muller.

Affixos: são elementos mórficos que modificam o radical e a sua significação.

Prefixo

Suffixo

Nominal

Pronominal

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3.3.5.2 Taxeonomia

A taxeonomia é a parte mais extensa da lexeologia e o autor a elucida como a parte

que trabalha a classificação das palavras que são divididas em categorias de acordo com a

ideia que exprimem16.

                                                            16 “O apego à tradição somado ao uso de expressões emprestadas da vertente naturalista da língua – como órgão, organismo –, revelam um certo, porém contido, ecletismo por parte de Maximino Maciel”. (MOLINA, 2004: 133)

Taxeonomia

Palavras Nominativas

Palavras

Conjunctivas

Substantivo: “é a palavra nominativa destinada a designar uma pessoa, uma cousa ou noção abstracta”. (p. 74).

Pronome: “é qualquer palavra substituta do nome ou de qualquer parte da oração tomada nominativamente”. (p. 80).

Adjectivo: “é a palavra que modifica a extensão ou a comprehensão do nome appellativo”. (p. 87).

Advérbio: “é uma palavra invariavel modificativa do verbo, do adjectivo, do substantivo e até de outro adverbio”. (p. 99).

Interjeição: “é uma palavra invariavel, synthetica e natural que traduz os sentimentos repentinos de que a nossa vida sente-se possuida”. (p. 106).

Preposição: “é a palavra conjunctiva destinada a estabelecer uma relação de complemento entre dous termos”. (p. 101).

Conjuncção: “é a palavra connectiva destinada a estabelecer uma relação entre duas proposições completas ou incompletas”. (p. 103).

Verbo: “é a palavra conjunctiva que sob a noção de tempo exprime a existência de um facto abstracto ou concreto”. (p. 107).

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Os substantivos são categorizados em “proprio ou individual” (aquele que se refere

à coisa ou pessoa com individualização) e “apellativo ou comum” (se aplica a qualquer

coisa que forme uma classe). Além disso, o autor cria subcategorias; são elas: substantivo

concreto, substantivo abstrato e substantivo colletivo.

Maximino Maciel divide o pronome em dois tipos: pronome substantivo – que se

subdivide em pessoaes, demonstrativos, conjunctivos e indefinitos – e pronome adjectivo –

qualquer adjetivo determinativo empregado sem substantivo enunciado. (GA: 81).

Ainda sobre a classificação das palavras, os adjectivos são divididos em seis tipos:

demonstrativos, determinativo (artigo definito e artigo indefinito), qualificativo, indefinitos,

numeraes e possessivos.

A classe “verbo”, dentro da taxeonomia, é agrupada em attributivo (onde trabalha a

transitividade verbal e critica a troca do nome “verbo bitransitivo” por “verbo relativo”,

feita por Ernesto Carneiro), pronominado, irregular, abundante, vozes verbais (ativa

passiva, reflexiva e recíproca) e conjugação verbal.

3.3.5.3 Kampenomia

A definição de kampenomia encontrada na Grammatica Analytica é a parte da

lexeologia que trata da flexão da palavra (p. 125):

Kampenomia

Generica: “é a classificação dos nomes em relação ao sexo”. (p. 125).

Numerica: “é a mudança na terminação do nome para indicar a unidade ou pluralidade”. Ex.: homem-homens. (p. 133).

Gradativa: “é a mudança na terminação da palavra para representar o gráo de significação”. (p.137).

Verbal: “é a mudança na desinência do verbo, para enunciar o modo, tempo, numero e pessoa”. (p. 143).

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A parte referente aos verbos tratada na Kampenomia também é a maior. Nela, o

autor faz a conjugação de oito verbos (ter, ser, estar, falar, vender, punir, por e dar); faz a

explanação dos tempos e flexões verbais, acrescentando o particípio e o infinitivo.

3.3.5.4 Etymologia

Também chamada de lexiogenia, o autor define-a como a parte da lexeologia que

trata da derivação e formação das palavras. Ainda segundo o autor, as palavras da língua

portuguesa derivam de três fontes:

a) Da língua latina: nesse tópico, antes de exemplificar as palavras que derivaram

da língua latina, o autor elabora um texto explicando a influência, pois os

lusitanos falavam a língua céltica que sofreu grandes modificações com a

chegada dos fenícios, cartagineses, e as diversas invasões dos Alanos, Suevos,

Árabes e Godos;

b) De línguas estrangeiras: devido à relação dos portugueses com diversos povos;

c) Da língua vernácula: é o processo empregado pela língua formando palavras

derivadas de outras. Essa derivação pode ser por: aggluttinação e juxtaposição.

3.3.6 Syntaxologia

Toda a parte de Syntaxologia será descrita e analisada no próximo capítulo.

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3.3.7 Senecologia/ Semeiologia

A gramática de Maximino Maciel é a primeira que insere o estudo dos tropos na

Semeiologia, diferentemente das suas demais contemporâneas17. Para ele, a semeiologia

consiste no “tractado da significação da palavra para a interpretação do sentido total da

proposição”. (p. 295). As palavras, aqui, são sinais que representam pensamentos. Ela é

dividida em duas partes:

3.3.7.1 Exegetica

Na exegetica as palavras são sinais e sua significação é estudada no tempo e no

espaço, investigando os fenômenos que dizem respeito à significação. Em nota, o autor

ainda acrescenta: “A exegetica procura interpretar os documentos antigos e reconstituil-os

ás suas condições antigas como na epocha em que foram escriptos” (p. 295), já que uma

palavra ou expressão pode mudar o significado com o passar do tempo ou de acordo com o

contextoem que está inserida.

O autor, seguindo os abalisados, aponta três causas para as mudanças de

significação: a alteração phonetica, a renovação dialectal e os tropos. Na tropologia –

mudança ou transição do sentido da palavra –, o autor explica os quatro principais tropos:

metonymia; metaphora; synedoche; ironia e cita catachrése, allegoria, antiphrase,

antonomasia, hyberbole e metalepse sem fazer nenhum tipo de definição.

                                                            17 Cf. Molina, 2004.

Semeiologia

Exegetica

Technica

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3.3.7.2 Technica

Nessa subdivisão, o autor discorre sobre os sinais de pontuação:

a) Virgula (,) – tem por finalidade separar orações ou seus membros;

b) Poncto e virgula (;) – tem como função distinguir duas orações de um mesmo

período;

c) Dous ponctos (:) – usa-se quando se enuncia nossas próprias palavras ou as

palavras de outrem;

d) Poncto final (.) – aplica-se para finalizar um pensamento e iniciar outro que não há

ligação com o anterior;

e) Poncto interrogativo (?) – emprega-se nas frases onde há necessidade de fazer uma

pergunta;

f) Poncto admirativo (!) – emprega-se nas orações exclamativas;

g) Ponctos reticentes ou suspensivos (...) – significa interrupção repentina de um

pensamento;

h) Parenthesis “( )” – usado para colocar palavras com a função explicativa;

i) Virgulas dobradas ( ) – esse sinal substituía o que hoje conhecemos por aspas e a

sua função é designar uma citação qualquer;

j) Travessão (–) – pode ser usado para substituir os parênteses ou para trocar o

interlocutor em um diálogo.

No próximo capítulo, trataremos da descrição e análise da syntaxologia na

Grammatica Analytica e a comparação entre a primeira e oitava edições.

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Capítulo 4

A MODERNIDADE NA SYNTAXOLOGIA DA GRAMMATICA

ANALYTICA: UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE A PRIMEIRA E

A OITAVA EDIÇÕES

Sabemos que o século XIX focou como ponto principal das suas gramáticas, a

lexicologia, fato que pode ser comprovado se observarmos as gramáticas de Júlio Ribeiro,

João Ribeiro, Alfredo Gomes, Moraes e Silva, Pacheco da Silva e Lameira de Andrade18,

por exemplo, que reservaram lugar de destaque a essa parte em seus compêndios (já que a

parte lexiológica, e não a sintaxe, era compreendida como o principal mecanismo de

entendimento de uma língua):

A lexeologia é certamente no projeto de descrição gramatical proposto por Ribeiro, o núcleo unitário de onde reverberam todos os campos de investigação lingüística. Isso por que é efetivamente a palavra que sintetiza o foco das atenções, seja como elemento monolítico isolado, seja enquanto conjunto de segmentos morfológicos, seja como item da organização frasal. A sintaxe, destarte, embora constitua autonomamente a segunda parte da descrição gramatical, na prática não vai além de um grande tentáculo da lexeologia. (CAVALIERE, 2000: 53-4) (Grifo do autor).

Em Maximino Maciel, a importância dada à lexicologia não foge à regra, pois,

como pudemos observar no capítulo anterior, gráfico 1, ela ocupa 51% da Grammatica

Analytica. Observando esse fato: a) de que maneira se deu a construção da sintaxe em sua

gramática? b) Onde estão localizadas as concepções de modernidade na sintaxe? c) Por que

o autor se preocupou, nas demais edições de sua gramática, em ampliar e melhorá-la?

A responsabilidade com a reformulação e aperfeiçoamento dessa parte da gramática

é explicitada por meio dos seus prólogos. Na segunda edição (1894), Maximino Maciel

declara que “a syntaxe mereceu-nos attenção por ter sido uma das partes mais descuradas;

assim se acha desenvolvida tanto quanto nos permittiram as nossas investigações e ao

mesmo tempo exemplificada mediante classicos e estylistas de nota”.

                                                            18 A partir desse momento, chamaremos de Pacheco da Silva e Lameira de Andrade de Pacheco e Lameira, respectivamente.

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Na edição de 1910, a quarta, deparamo-nos com mais uma afirmação relacionada à

sintaxe, enquanto o autor fala da importância em reformular sua gramática de acordo com

“o progresso da linguística”: “ainda nos esforçamos por estudar a lingua nos seus

monumentos literarios, consolidando-lhe por isso os factos e a doutrina com exemplos

selectos, hauridos aos principaes escriptores que se nos afigurou poderem servir de normas

á syntaxe da lingua”.

O cuidado que Maximino Maciel imprimia aos exemplos presentes na sua

gramática era constante e fruto de condenação – em vários textos – direcionada a autores

que elaboravam os seus próprios, “já que a corrente positivista rezava que um bom

exemplo favorecia um bom caminhar.”. (FÁVERO & MOLINA, 2006: 183).

Para chegarmos a uma conclusão referente aos questionamentos levantados,

faremos a descrição da syntaxologia na Grammatica Analytica e, por meio do estudo

comparativo entre a primeira (1887) e a oitava19 (1922) edições, veremos de que maneira

as “doutrinas modernas” presentes no final do século XIX, início do XX, influenciaram

Maximino Maciel no decorrer das revisões expostas nas diferentes edições da Grammatica

Descriptiva.

4.1 Análise-descritiva da syntaxologia na Grammatica Analytica

O autor inicia o capítulo definindo a syntaxologia como “a parte da grammatica que

tracta as orações ou proposições em toda a sua extensão” e classifica-a em quatro partes

(p.205):

Tabela 2: Divisão da sintaxologia SYNTAXOLOGIA

Syntaxe: tracta das funcções ou relações das palavras e da respectiva concordancia na formação da oração;

                                                            19 Selecionamos a oitava edição (1922) – denominada Grammatica Descriptiva – para fazer a comparação por ter sido a última edição publicada em vida.

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Topologia: tracta da posição das palavras na construcção das orações;

Phraseologia: tracta da natureza20 das orações e da sua classificação;

Estylistica: tracta das differentes leis e fórmas ou do estylo das composições litterarias em toda a sua extensão.

(Fonte: Maciel, 1887)

Esses quatro elementos atribuídos à syntaxologia, por Maximino Maciel, diferem

nas gramáticas que foram publicadas ou editadas para suprir o programa elaborado por

Fausto Barreto, por exemplo: a de Júlio Ribeiro (divide a sintaxe em léxica e lógica), a de

Pacheco e Lameira (classificam em sintaxe de palavras e de proposição) e a de Alfredo

Gomes (a sintaxe compreende a concordância, a subordinação ou regência e a colocação

ou ordem) 21.

4.1.1 Syntaxe

Maximino Maciel entende por syntaxe “o tractado das funcções e concordancia das

palavras, consideradas como elementos constitutivos da oração”. A palavra funcção, por

ele utilizada, está diretamente ligada à corrente naturalista, e significa “o papel que ella

exerce na proposição, como resultado syntatico das suas diversas relações”. Para o autor, a

proposição – ou oração – é “a manifestação externa de um juízo”. Essa ideia de “juízo”

atribuída à proposição, remete à Grammaire Générale et Raisonnée de Port-Royal (1660),

que entende a proposição como um julgamento.

Diferenciando da nomenclatura “relação” que usavam Julio Ribeiro e Pacheco e

Lameira, por exemplo, e reafirmando a tendência evolucionista que apregoava: “As

funcções se designam tambem pelo nome de relações: assim, tanto se diz funcção

predicativa como relação predicativa, sendo mais logico o nome funcção, porquanto a

palavra é um orgam vivo da economia da proposição.” (p. 211) (Grifos do autor).

                                                            20 Palavra que remete ao ramo seguido pelo autor e explicitado na introdução da sua gramática, quando, seguindo a linha de Julio Ribeiro, afirma que a língua é um organismo e relaciona-lhe questões da natureza. 21 Cf. Fávero e Molina, 2006.

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Essas funcções foram fragmentadas em sete, são elas: a) Subjectiva; b) Predicativa;

c) Attributiva; d) Vocativa; e) Objectiva; f) Terminativa; g) Adverbial. A gramática de

Maximino Maciel enfatiza a importância do sujeito e do predicado na oração – assim como

a de Pacheco e Lameira (1887) – diferentemente, por exemplo, de gramáticas como a de

Moraes Silva (1806) e a de Sotero dos Reis (1866), que reconhecem o “sujeito”, o

“atributo” e o “verbo”, seguindo o modelo de Port-Royal (1660) e da gramática de Julio

Ribeiro (1881) – que divide o predicado em “predicado propriamente dito” e “copula”

(p.194) – permanecendo, destarte, no modelo tripartite. Esse é mais um aspecto que

confere modernidade e inovação à Grammatica Analytica. Vejamos cada uma dessas

funções:

a) Funcção subjectiva “é aquella que é exercida pelo sujeito em relação ao seu

verbo” (p.206). Ela pode ser exercida por um substantivo, por um pronome, por uma

oração e por qualquer elemento taxonomico substantivado. Para o autor, “a palavra em

função subjectiva denomina-se subjeito. Subjeito é qualquer parte proposicional que, por

sua funcção nominativa dirige a flexão verbal” (p.212). O sujeito é, assim, classificado

pelo autor:

Tabela 3: Tipos de Sujeito (p.212) Simples: “é aquelle que é representado por um só substantivo, pronome ou infinito”.

Composto: “é aquelle que é representado por mais de um substantivo, pronome ou

infinito”.

Complexo: “é aquelle que é representado por uma oração, por qualquer expressão ou

citação substantivada”.

Essa classificação do sujeito difere, por exemplo, de gramáticas do início do século

XIX, sob a influência da gramática geral e filosófica, como as de Moraes Silva (cuja

classificação inexiste) e de Soares Barboza (que agrega “composto e complexo” na mesma

classificação).

b) Funcção predicativa “é aquella que é exercida pelo predicado em relação ao

subjeito” (p.207). Ela pode ser exercida por um adjectivo, por um verbo (seja ele transitivo

ou intransitivo), por um pronome, por qualquer elemento taxonomico adjectivado. “A

palavra em funcção predicativa chama-se predicado” (p. 213). Maximino Maciel divide o

predicado em:

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Tabela 4: Tipos de predicado (p. 213). Abstracto: “si estiver separado do subjeito por meio de verbo”.

Concreto: “si estiver internado na raiz verbal”.

Simples: “si for representado por um só verbo, ou por uma só qualidade”.

Complexo: “si estiver modificado por uma oração”.

Ampliado: “si estiver modificado por alguma palavra de funcção attributiva, terminativa,

objectiva ou adverbial”.

c) Funcção attributiva “é aquella que é exercida por uma palavra, exprimindo

qualidade, determinação e restrincção sem formar uma proposição”. Essa função pode ser

exercida por um adjectivo qualificativo, por um adjectivo determinativo, por um

complemento restrictivo (ex.: a rainha da noite), por um apposto, por uma oração incidente

(ex.: Si na importância que se ligava ás comunicações do arcebispo sypentino havia boa

fé, ignoramol-o. – A. Herculano). (Grifos do autor. p. 206).

d) Funcção vocativa “é aquella que é exercida por uma palavra a quem se dirige o

discurso”. Ex.: Muito me conta, Sr. Patrão... Foi um sonho, não foi, meu Carlos? (A.

Herculano). (Grifos do autor. p. 206). Ao substantivo que assume função de vocativo, o

autor chama de compellativo.

e) Funcção objectiva “é aquella que é exercida por uma palavra sobre que recae

immediatamente a acção do verbo transitivo directo” (p. 209). A mesma pode ser exercida

por um substantivo, por um pronome, por um verbo e por uma oração. À palavra que

assume função objetiva, o autor atribui o nome de “complemento objectivo” (p. 215) e o

classifica como:

Tabela 5: Tipos de “complemento objectivo” (p. 215-6) Simples: “si for representado por mais de um substantivo, pronome ou infinito”.

Composto: “si for representado por mais de um substantivo, pronome ou infinito”.

Complexo: “si for representado por uma oração ou qualquer expressão substantivada”.

Ampliado: “si estiver modificado por qualquer funcção attributiva, objectiva ou

adverbial”.

f) Funcção terminativa “é aquella que é exercida por uma palavra inteirando

mediatamente o conceito significativo de outra”. (p. 209). Essa função pode ser exercida,

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segundo Maximino Maciel, por um substantivo, por um pronome, por um verbo, por uma

oração e, à palavra que exerce essa função, dá-se o nome de “complemento terminativo”

(p. 217).

g) Funcção adverbial “é aquella que é exercida por uma palavra que, mediante a

uma circumstancia, mediante o verbo, o adjectivo, o substantivo ou adverbio”. Para o

autor, as palavras que exercem a funcção adverbial – que podem ser um advérbio, um

pronome, um substantivo, uma oração e um adjectivo adverbiado – será um complemento

circunstancial. As circunstâncias transmitidas pelo complemento circunstancial podem ser

(p.217):

Circunstâncias Exemplos

De modo Corria com ancia.

De logar Estava no pulpito.

De tempo Chegamos de noite.

De causa Choramos de terror.

De exclusão Estamos sem amigos.

De ordem Vinha um após outro.

De duvida Talvez venham.

De negação Nunca queremos.

De quantidade Gastar com escassez.

De affirmação Vamos realmente.

De favor Falar por mim.

De substituição Vá por mim.

Apesar da utilização frequente de autores clássicos – como veremos adiante – em

seus exemplos, não é difícil observarmos, na Grammatica Analytica, a presença de

exemplos simplificados e elaborados pelo próprio autor, comportamento que ele criticava

em outros autores.

A segunda parte da syntaxe na Grammatica Analytica trata da concordancia, que,

ao entendimento de Maximino Maciel, significa “a conformidade da flexão das palavras na

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construcção da oração”. Para o autor, se há duas classes de flexão, há duas classes de

concordância: concordancia verbal e concordancia nominal (p.218):

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A concordância nominal, em Maximino Maciel (1887), é iniciada com a

concordância do adjetivo com relação ao substantivo a que se refere. Em regra geral, “o

adjectivo, quer seja de funcção predicativa, quer attributiva, recebe a flexão do genero e

numero do seu substantivo”. (p. 218-9). Nos demais casos:

Tabela 6: Casos de Concordância Nominal 1- O adjectivo substantivado: assume o gênero masculino e todas as outras palavras

precisam concordar com ele em gênero e número. Ex.: O justo é filho de Deus e

membro vivo de Christo; o pecador é escravo e membro do diabo. (Padre Bernardes)

2- O adjectivo representando um nome por ellipse: toma-lhe a flexão de gênero e

número. Ex.: Estella e Aurea são donas da quinta, porém a principal é Estella.

3- Dous ou mais substantivos no masculino singular: o adjectivo ficará no masculino

plural. Ex.: O cravo e o lyrio são formosos.

4- Dous ou mais substantivos no femenino singular: o adjectivo ficará no femenino

plural. Ex.: A ociosidade e a preguiça são companheiras da infância.

5- Dous ou mais substantivos de generos differentes: o adjectivo ficará no masculino

plural. Ex.: O irmão e a irmã estavam banhados de lagrimas.

Obs.: Se o adjectivo estiver diretamente ligado ao substantivo, é necessário que a

Tipos de

Concordância

Concordancia Verbal: “é a conformidade da flexão verbal com o caracter numerico e pessoal do subjeito”.

Concordancia Nominal: “é a conformidade da flexão nominal com o genero e numero do substantivo”.

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ligação seja feita pelo substantivo masculino. Ex.2: Irmã e irmão prostrados e não

irmão e irmã prostrados.

6- Dous ou mais substantivos de generos differentes no plural: o adjectivo concordará

com o substantivo mais próximo. Ex.: Seus brios e dignidades eram louvados22. Ex.2:

Louvadas eram seus dignidades e brios.

7- Dous ou mais substantivos precedidos por adjectivo, a concordância é feita com o

primeiro substantivo. Ex.: As bellas florestas e os rios davam magestade á paisagem.

8- Dous ou mais substantivos sucedidos por adjectivo, a concordância é feita com o

último nos seguintes casos: a) substantivos sinônimos (ex.: Mostram-se dignos de

amor e dedicação paterna); b) ideia de gradação (ex.: A verdade é o dever, o bem, a

virtude aplicada); c) palavras ligadas pela conjuncção (ex.: O amor ou amizade

extremada é causa de graves contendas).

9- Os pronomes concordam em gênero e número com o substantivo “substituído”.

Ex.: Pedro e Elisa são applicados: elle ainda mais do que ella.

10- Os pronomes relativos que e quem são invariáveis, mas qual (número) e cujo

(número e gênero) são variáveis.

11- “Na linguagem arithmetica os numeros, significando algarismos, assumem a

flexão de plural, ex.: Lançar fóra os quatros, os noves e os onzes”. Se o numeral não

estiver nesse contexto, ele é considerado invariável. Ex.: Tenho sete penas menos

cinco.

12- “O artigo, adjectivo possessivo, o demonstrativo, o numeral ordinal e os

indefinitos estão, como verdadeiros adjectivos, subjeitos a lei da concordancia, ex.:

Este meu livro está com a pagina estragada e em alguns pontos tem suas

imperfeições”.

Exceto pelo exemplo da primeira regra de concordância nominal aqui exposta, é de

grande relevância chamar atenção para os exemplos dispostos nesta parte da gramática de

Maciel: todos sem autoria. O que nos leva a repensar a crítica (indevida?) feita por Maciel

a Julio Ribeiro, por ter elaborado seus próprios exemplos.

                                                            22 “Nesse caso o adjectivo póde ficar no masculino plural, segundo se acha em muitos escriptores modernos”. (p. 221).

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Apesar de prezar por exemplos clássicos e de utilizar diversos trechos de Camões,

Maximino Maciel ainda não admitira uma das colocações utilizada pelo escritor português,

aceita por Frederico Diez23 “e alguns gramatistas”. A saber:

“É grave incorreção syntatica o emprego de um substantivo na flexão plural modificado por dous ou mais adjectivos singular, ex.: As litteraturas brazileira e italiana; os passaros selvagem e domestico. Posto que se encontre tal fórma de construcção em alguns que se dizem classicos, não deve ser imitada e seguida, porque neste caso fica o substantivo concordando com os adjectivos. Em latim raras vezes se encontra tal construcção, por isso mesmo pode se considerar como um verdadeiro descuido do auctor (...). A verdadeira e racional construcção consiste em ficar o substantivo no singular e empregar-se o artigo antes do adjectivo conveniente, ex.: a litteratura brazileira e a italiana”. (MACIEL, 1887: 220).

A concordância verbal é definida, pelo autor, como “a conformidade da flexão

verbal com o caracter numerico e pessoal do subjeito” (p. 224) e a regra geral a ela

atribuída é de que “o verbo concorda com o sujeito em numero e pessoa” (idem). Nos

demais casos:

Tabela 7: Casos de Concordância Verbal 1- Se houver “dois ou mais sujeitos” no singular, o verbo será flexionado no plural

concordando com todos, ou ficará no singular, concordando com cada um

individualmente. Ex.: A mosquetaria e arcabuzaria foi primeiro em fazer seu dever. (Luiz

Cacegas)

2- Se o sujeito for um “collectivo geral”, seguido pela preposição “de” e por um

substantivo no plural, o verbo ficará no singular e concordará com o complemento. Ex.: E

um rancho de nymphas iam boiando no azul sereno das ondas. (Anonymo) (p. 225).

3- Se o sujeito for um “collectivo geral” e não estiver acompanhado por um substantivo

seguido de preposição, o verbo poderá ficar no singular ou no plural. (p. 225).

Ex.: Ditosa condição, ditosa gente

Que não são de ciumes offendidos. (Camões)

4- Se o sujeito for um “collectivo partitivo” isolado ou seguido de substantivo

                                                            23 O alemão Friedrich Christian Diez (1794-1876), considerado fundador da filologia românica, publicou a Gramatik der romanischen Sprachen, em 1836, e foi o primeiro a estudar sistematicamente as línguas românicas pelo método histórico-comparativo. Cf. Guimier, 1981.

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acompanhado pela preposição “de”, o verbo e o adjectivo flexionarão no plural,

concordando com o complemento. Ex.: A maior parte dos homens são inclinados aos

vícios.

5- Se houver “dois sujeitos” ligados pela conjunção “ou” ou pela conjunção “nem”, a

flexão de número será facultativa. Ex.: O tempo ou a morte há ou hão de ser nossos

remedios. Ex.2: Nem a esperança nem a virtude consola ou consolam o impio. (p.225).

Mas, se a ação do verbo só puder ser atribuída a “um dos sujeitos”, o verbo ficará

obrigatoriamente no singular. Ex.3: Ou elle ou ella será louvado.

6- Se o sujeito for a expressão “um e outro” ou a “nem um nem outro”, é preferível que o

verbo seja flexionado no plural, mas a flexão é facultativa. Ex.: Um e outro tinham ou

tinha razão. Ex.2: Nem um nem outro soffre ou soffrem. (p. 226).

7- Para Maximino Maciel, no caso de “dous subjeitos”, o verbo só poderia concordar com

o último se: a) os sujeitos formarem uma enumeração gradativa (ex.: uma palavra, um

olhar, um gesto bastava para infundir respeito); b) se a enumeração estiver resumida por

uma palavra de sentido collectivo (ex.: a vaidade, o orgulho, a presumpção, tudo

manifesta a fraqueza humana); c) se o sujeito estiver ligado ao substantivo por meio das

conjunções “como”, “assim como”, etc., que indiquem comparação (ex.: A verdade, como

a luz, é inalteravel). (p. 226).

É importante destacar que, na regra de número 1, apresentada na tabela 7, o autor

chama atenção para a forma clássica com que o exemplo foi construído, datada de 1808.

Segundo Maximino Maciel, essa forma só estaria atualizada com as novas concepções se

estivesse construída da seguinte maneira: “Foi a mosquetaria e arcabuzaria a primeira em

fazer seu dever”, ou seja, com o verbo precedendo os sujeitos (p. 224). Além disso, para o

autor, o que decide se o verbo ficará no singular ou no plural (quando a sentença tiver o

collectivo) é “a harmonia da phrase”. (p. 225).

Com relação à regência verbal em que o verbo está “dependente dos pronomes

relativos” “que” e “quem”, Maximino Maciel admite as seguintes regras: a) se o verbo

estiver “dependente” do pronome relativo “que”, concordará sempre em número e pessoa

com o antecedente desse pronome (ex.: Sou eu que digo); b) se o verbo estiver

“dependente” do pronome relativo “quem”, irá para a terceira pessoa, pois, “quem”

significa “a(s) pessoa(s) que” (ex.: sou eu quem diz); c) se o relativo “que” estiver

antecedido de “um predicado do verbo ser”, o verbo concordará com o “subjeito do verbo

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ser” 24 (ex.: eu sou Diomedes que venci a guerra) ou com o predicado (ex.: eu sou aquelle

homem que comprou). (p. 227).

Inova ao falar de concordancia semeiotica (o que hoje chamamos de silepse) e

define-a como “aquella em que as flexões não se governam pelas palavras constitutivas da

oração, porém por palavras occultas acomodadas ao sentido” com isso, segundo Molina

(2004:139), “o autor demonstra toda a sua sensibilidade para a descrição dos fatos

gramaticais”. Nessa concordancia, chamamos atenção para cinco regras:

Tabela 8: Casos de Concordância Semeiotica 1- Se houver dois substantivos no singular de gêneros diferentes, o adjetivo assumirá o

gênero masculino no plural. Ex.: O menino e a menina estão promptos (p. 227).

2- Se houver nome próprio na proposição, a concordancia do adjetivo será feita de acordo

com o nome próprio. Ex.: Dario é estudioso (p. 228).

3- Nas expressões de tratamento, os adjetivos não concordam com a expressão de

tratamento, mas com o gênero da pessoa a quem se refere. Ex.: Sua Alteza (o Conde) está

satisfeito (p. 228).

4- Se houver um pronome pessoal na primeira e outro na segunda ou terceira, o verbo

assumirá a flexão no plural concordando com o pronome “nós”. Ex.: Eu e tu (nós) vamos.

Mas, caso seja um pronome pessoal da segunda com outro da terceira, o verbo assumirá a

flexão da segunda pessoa do plural. Ex.2: Tu e elle passaes bem. Caso haja adjetivos, estes

concordarão com o gênero da pessoa que fala. Ex.3: Eu e tu ficamos calados ou caladas

(p. 228).

5- Se na oração aparecerem os pronomes “nós” e “vós” para se referir a autores,

professores, imperantes, escritores, bispos, etc., o verbo flexionar-se-á no plural. Ex.:

Levado pela importancia do assumpto, viemos manifestar (p. 229).

                                                            24 Maciel afirma que “alguns grammaticos, não estando rigorosamente de accordo, admittem a corncordancia do verbo com o subjeito do verbo ser ou com o predicado, ex.: Somos aquelles homens que vendemos ou venderam. A presença do determinativo, segundo os grammaticos francezes, concorrendo para o predicado ficar de terceira pessoa, contribue egualmente para o verbo assumir a flexão da terceira pessoa.” (MACIEL, 1887: 227).

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Quanto aos verbos impessoais, ainda inseridos na concordancia verbal, o autor

define como “aquelle que, empregado somente na terceira do singular, exprime um facto

cujo subjeito se desconhece”. Ainda sobre a impessoalidade dos verbos, afirma: “na maior

parte dos casos os verbos impessoaes não apresentam subjeito, porque indicam

phenomenos que se passam no seio da atmosphera ou da natureza atronomica” (p. 229).

Ex.: anoitecer, amanhecer, alvorecer – trovejar, nevar, chover, etc. Quanto à classificação

dos verbos impessoais, Maciel assim divide:

Finalizando a concordancia dos verbos impessoais, Maximino Maciel chama

atenção para algumas regras quanto à impessoalidade do verbo “haver”:

O verbo haver, derivado de habere, tem suscitado grandes debates grammaticaes, quando apresenta-se nas construcções seguintes: – Há homens – Há professores – Havia deputados, etc. (...) É certo que o verbo habere é pessoal, porque em accepção propria póde ter um subjeito representado por nome de pessoa; porém nas linguas romanas o termo latino habere tomou nova direcção syntatica, segundo as novas tendencias geniaes, desenvolvidas nos novos idiomas latinos. (...) O fato é que o verbo haver assumiu o caracter impessoal e não póde ter subjeito claro, ex.: Há homens – Houve combates. (p. 230).

Além disso, o autor critica os gramáticos que já admitem a utilização do verbo

“haver” no sentido de “ter” – assim como João Ribeiro (1887) – alegando que os mesmos

não conhecem a língua latina para saberem que, nela, o verbo “haver” não assumia esse

VERBOS

IMPESSOAES

Impessoal essencial: “caracterisa-se, pois, pela noção de um facto astronomico ou metereologico e o fundamento da classificação dos verbos impessoaes baseia-se na não existencia do sujeito” (p. 229).

Impessoal accidental: verbos que têm como sujeitos orações de natureza nominal e se contrapõem aos impessoaes essenciaes.

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sentido: “porquanto ignoram como procedia o latim na expressão das phrases

compondentes ás nossas, construidas com o verbo haver” (p.230).

Diferentemente de Maciel e Julio Ribeiro (1881), por exemplo, as gramáticas do

Padre Argote, Sotero dos Reis e Moraes Silva admitem uma forma para o verbo “haver”

em que ele passa a ser flexionado em número, com o sujeito considerado oculto.

Percebemos que, apesar de toda modernidade dada ao emprego do verbo “haver”

impessoal, Maximino Maciel ora bebe da fonte naturalista, ora toma como modelo a língua

latina:

Porque o maior absurdo é sustentar-se que o verbo haver tem a significação de existir, ficando no singular com o subjeito no plural por idiotismo. Há outros grammaticos que chegam a ponto de dizer que o verbo haver póde ter o subjeito em complemento circumstancial, ex.: Havia iguarias na mesa. Para taes grammaticos insensatos a palavra mesa é o subjeito. Ao nosso parecer, o verbo haver é impessoal de natureza transitiva, do mesmo modo que os verbos dar e fazer o são nas seguintes phrases: – Deu duas horas, – Faz vinte anos que. (...) No Brazil o verbo haver substitue-se frequentemente pelo verbo ter: o que não pode ser imitado, por isso que é uma construcção grammaticalmente reprovada, ex.: – Tem agua. (idem). (grifos do autor).

4.1.2 Topologia

A segunda parte do que Maximino Maciel designou syntaxologia na Grammatica

Analytica, é a topologia podendo também ser chamada de construcção ou collocação. Para

ele, a syntaxologia “é o tractado da posição das palavras na construcção da proposição” (p.

232).

Nessa concepção, a oração é regida pelo verbo, que “é o centro de attracção para

onde gravitam as outras partes da proposição, ex.: O Cardeal Reginaldo foi aquella

firmissima coluna de fé. (Bernardes)”. A essa disposição das palavras em uma proposição,

Maximino Maciel designa ordem oracional e a divide em (p. 232):

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A classificação da ordem das palavras na proposição foge, por exemplo, da

classificação feita nas gramáticas de Pacheco da Silva e Lameira de Andrade – que

consideram as ordens direta, inversa e interpolada – e de Alfredo Gomes – que admite a

ordem direta e a ordem inversa, apenas25.

A ordem directa, também chamada de natural, é definida como “aquella em que o

verbo fica no centro, precedido pelo subjeito e seguido pelos complementos, ex.: A serva

de Deus respondeu com a mesma generalidade que lhe falavam, não obstante que já que já

tinha relações do caso (Bernardes)” (p. 232).

Maximino Maciel define ainda a ordem inversa como “aquella em que o verbo não

occupa o centro da oração, ex.: Gozava neste tempo Malaca de uma profunda paz,

assentada sobre as amizades. (F. de Andrade)” e a interrupta como “aquella em que o

subjeito ou partes relativas estão estão separadas do verbo por meio de orações

                                                            25 Cf. Fávero e Molina, 2006.

Ordem Oracional

Ordem Interrupta

 

Ordem Transposta

 

Ordem Inversa

 

Ordem Directa

 

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subordinadas26 ou expressões incidentes, ex.: Um diccionario é, depois do abecedário ou

syllabario, o primeiro livro que se deve estudar. (João de Deus)” (p. 232).

A topologia na Grammatica Analytica é dividida em:

Ainda nessa segunda parte da syntaxologia, Maximino Maciel trata da preposição,

da correlação dos tempos verbais, do que chama de figuras topologicas e dos vícios de

construção, como veremos posteriormente.

A topologia dos adjectivos é dividida em duas partes: artigos e topologia dos

adjectivos. Ao discorrer sobre os artigos, o autor afirma que “o artigo definito é sempre

uma particula dotada de funcção attributiva e antepõe-se aos nomes”. Os casos de

anteposição do artigo definito ao nome são (p. 233-4):

a) antes dos nomes que recebem características generalizadas (ex.: o homom é

racional. Ex.2: o cão é fiel);

                                                            26 Até esse momento, Maciel não havia citado o que entendia por oração subordinada, que veremos na terceira parte da syntaxologia, a phraseologia.

Topologia

Topologia das átonas

Topologia do subjeito

Topologia do artigo

definito e indefinito

Topologia dos adjectivos

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b) antes dos apellativos modificados por palavras que exercem função attributiva

(ex.: passamos a catarata do Niagra. Ex.2: o homem, director do gremio);

c) antes dos adjectivos qualificativos que estejam se referindo a nomes próprios

(ex.: O valente Napoleão);

d) antes dos nomes de pessoas célebres (ex.: O Vasco da Gama); das coisas únicas

no seu genero (ex.: o sol e a lua); das cinco partes do mundo (ex.: A África, a Europa, a

Asia, A Oceania); de regiões, de cidades, de ilhas, de aldeias, de paizes, de provincias (ex.:

a Nubia, o Chili); de montes, de mares, de estreitos e de rios (ex.: O Hymalaia, o Pacífico);

de obras de arte ou de literatura (ex.: a Eneida, o Albambra); de embarcações (ex.: o

Pirapampa, o Gram-Pará); de nomes próprios com sentido figurado (ex.: Dirceu foi o

Virgilio brazileiro); das palavras “senhor” e “senhora” isoladas para nos referirmos a

alguém (ex.: A senhora pode obsequiar-me?); apelidos (ex.: O Tiradentes);

e) para substituir o adjectivo possessivo, caso o sentido da frase esteja completo

(ex.: João feriu-se na perna);

f) antes dos pronomes possessivos e alguns pronomes indefinitos (ex.: aquelle é o

meu).

Além disso, o autor trabalha com situações que obrigam a omissão do “artigo

definito” (p. 235):

Tabela 9: Omissão do Artigo Definito 1- “Nas proposições setenciosas”. Ex.: Pobreza não é deshonra.

2- “Nas enumerações”. Ex.: Honra, gloria, fama, fortuna, tudo é pó, tudo se aniquila.

3- “Nas apostrophes ou vocativos”. Ex.: Vedae, meninos, as levadas assaz bebeu o prado

(Virgilio).

4- “Nas exclamações”. Ex.: Dia feliz!

5- “No substantivo da definição”. Ex.: Idéa é a noção mais simples de um facto elementar.

6- “Antes dos tractamentos politicos precedidos de – senhor ou senhora, si nos dirigirmos

ás pessoas investidas de taes títulos”. Ex.: Senhor Marquez, quizera falar.

7- “Antes dos nomes predicativos”. Ex.: Este é pai de Pedro.

8- “Antes do pronome que nas orações interrogativas, significando que cousa”. Ex.: Que

dizes?

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Os casos de anteposição do artigo indefinito ao nome são expressos de forma

reduzida, vejamos (p. 236): a) Antes dos nomes tomados em sentido indeterminado (ex.:

vejo uma mulher ao longe); b) antes dos nomes proprios para energia e vivacidade da

sentença (ex.: só um Napoleão dominaria o mundo!); c) antes dos nomes proprios em

função attributiva (ex.: Castro lves foi um Dante e Casimiro de Abreu um Lamartine); d)

antes de qualquer expressão substantivada (ex.: um não sei, um como, um eu posso).

Já quanto à omissão do “artigo indefinito”, determina Maximino Maciel (p. 236):

Tabela 10: Omissão do Artigo Indefinito 1- “Nos nomes empregados na funcção predicativa”. Ex.: Mariana é poetisa.

2- “Antes do nome precedido do adverbio como, ficando em qualidade de”. Ex.: Como

homens, somos perfeitos.

3- “Nas sentenças intensivas pela influencia do adverbio tão”. Ex.: Elle é tão bom

professor.

4- “Nas apposições”. Ex.: Sapho, poetisa suaviosa, precipitou-se d’um rochedo.

5- “Antes de certos substantivos formando com o verbo uma só expressão

semeiologicamente considerantes”. Ex.: Dizer adeus, pedir desculpas, dar parte, fazer

carinhos.

Quanto à topologia dos adjectivos, Maximino Maciel já começa esse subtítulo com

as seguintes regras (237-8):

Tabela 11: Topologia dos Adjectivos 1- “Os adjectivos determinativos antepõem-se aos substantivos”. Ex.: Três homens.

2- “Os adjectivos possessivos e os indefinitos nenhum, qualquer, tal, todo, tanto se

pospoem algumas vezes aos substantivos principalmente na poesia ou na phrase

emphatica”. Ex.: Deus meu, ser nenhum sobre a terra pode mais.

3- “O adjectivo algum anteposto ao substantivo tem sentido affirmativo e posposto

negativo”. Ex.: Homem algum. Algum homem.

4- “Os adjectivos alheio, proprio, mesmo ordianriamente pospoem-se ao substantivo”. (o

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autor não cita exemplo).

5- “Ha adjectivos, como certo, vario, diverso, differente, etc, que, estando antepostos, são

indefinitos e qualificativos”. Ex.: Certo dia. Dia certo.

6- “Nas phrases exclamativas os demonstrativos podem se pospor ao substantivo”. Ex.:

Que razão essa! Que vaidade esta!

7- “Os adjectivos numeraes ordinaes, exprimindo simplesmente a ordem são antepostos e

exprimindo a data ficam pospostos”. Ex.: Segundo livro, livro segundo.

8- “Si na phrase concorrer um cardinal com um ordinal, o cardinal se collocará antes do

adjectivo ordinal”. Ex.: Os dous quintos livros27.

É importante notar que o autor reconhece a presença da licença poética, pois afirma

que “na poesia e na linguagem apaixonada os preceitos topologicos dos adjectivos são

infringidos por elegancia de expressão”. (p. 240).

A topologia do subjeito, terceira das quatro apresentadas pelo autor, é a que

apresenta o maior número de regras. Para Maximino Maciel, a construção da frase está

diretamente relacionada com a “attracção que o verbo exerce entre as outras partes da

oração”. Ele afirma que o local ocupado pelo verbo deve ser o centro da oração, precedido

pelo sujeito e seguido pelo complemento, porém, a inversão clássica do sujeito pode se dar

em alguns casos (p. 240-1):

                                                            27 Nesse caso, observamos que Maciel se opõe à regra apresentada por Julio Ribeiro, que admite as duas colocações, e que o exemplo criado pelo autor da Grammatica Analytica é bem semelhante ao exemplo criado por Julio Ribeiro (1881): “Os dez primeiros livros. Os primeiros dez livros”.

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Tabela 12: Topologia do Subjeito

A última das topologias, das atonas, é iniciada com uma explicação do que seria

uma partícula átona “aquellas que se incorporam ao verbo constituindo quasi um só

vocabulo” (p. 242). Para Maximino Maciel, as palavras átonas são “as variações

pronominaes me, te, se, nos, vos, lhe, lhes, o, a, os, as”. Quanto à classificação das

“palavras atonas”, o autor afirma: “assim com a anteposição da atona chama-se proclise, a

1- “Nas proposições exclamativas e interrogativas”. Obs.: “nas interrogativas o póde se

collocar tambem o subjeito anteposto ao verbo”.

Ex.: – Que largas são as praias!

– Que seguras são as enseadas. (J. Lucena)

Ex.2: E si este Senhor tiver determinado desposar a vossa illustríssima com a sua Egreja?

(Bernardes)

2- “Nas proposições reduzidas representadas por participios presente ou passado”.

Ex.: E chegando nós ao porto de Chatigao, no reino de Bengala... (F. Pinto)

3- “Nas proposições representadas por infinito pessoal”.

Ex.: ... e depois a origem por serem as obras dos proprios paes melhores que as que da

natureza recebem. (J. Freire)

4- “Nas orações representadas pelos indefinitos do modo infinito”.

Ex.: Não tendo ficado filhos de Paqueirão. (F. Pinto)

5- “Nas proposições imperativas”.

Ex.: Dize-o tu, severa musa. (C. Álves)

6- “Nos tempos do subjunctivo sem conjuncção”.

Ex.: Lance cada um os olhos pelo campo. (Lucena)

7- “Se o adjectivo predicativo exprimir um facto em evidencia”.

8- “Nas proposições emphaticas por elegancia”.

Ex.: Era S. Pedro Gonçalves mancebo dado a tempos, galas e leviandades. (Bernardes)

9- “Nas proposições começadas por tal, qual, e alguns adverbios”.

Ex.: Lá vão cincoenta annos, de merecimento e penitencia em um instante. (Bernardes)

10- “Nas orações intercalladas, enunciando pallavras proprias ou alheias”.

Ex.: Ninguem, dizia Sócrates, vive contente com ou sem sorte.

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posposição, enclise e a intercalação mesoclise” (p. 244) e obedece às seguintes regras (p.

242-3):

Tabela 13: Usos da colocação pronominal 1- A proposição nunca pode começar com a partícula colocada procliticamente28.

Ex.: Compra-se. Trago-lhe.

2- Uma palavra atona não pode ser colocada no futuro e no condicional.

Ex.: Dirão-lhe. Contarias-o.

3- “Nestes casos a particula atona será collocada mesocliticamente ou procliticamente si

podér sel-o”.

Ex.: Contal-o-ás ou elle o contarás.

4- A particula átona no “imperativo” deve ser aplicada encliticamente.

Ex.: Dize-me, dae-lhe.

5- A particula átona no “infinito pessoal” deve ser aplicada encliticamente.

Ex.: Trazer-lhe, contares-me.

6- A particula átona no “participio presente” deve ser aplicada encliticamente.

Ex.: Ensinando-nos, dizendo-te.

7- A particula átona nos “tempos compostos” deve ser aplicada mesocliticamente.

Ex.: Tinham-me aconselhado, tem-se dito.

Observamos que o pronome correto para o exemplo do terceiro ítem seria “tu”. Aos

erros identificados em sua primeira edição, Maciel justifica: “Ha descuidos de revisão

devidos á nossa falta de pratica, por isso o leitor desculpar-nos-á com justa razão”. (p.

317). 

Além de tratar os quatro tipos de topologia definidas, como vimos, topologia dos

adjectivos, topologia do artigo definito e indefinito, topologia do subjeito e topologia das

átonas, o autor, na segunda parte da syntaxologia, trabalha três outros pontos: a preposição,

correlação dos tempos verbaes e figuras topológicas.

A preposição é estudada, nesse capítulo, pelo aspecto das circunstâncias que ela

pode transmitir. O autor define a circunstância como “uma idéa que affecta o sentido da

oração, rodeando-lhe em todo seu enunciado” e divide-a em dois tipos: “circumstancias

                                                            28 “Seria imitar-se a syntaxe italiana e a hespanhola o emprego da atona procliticamente no principio da proposição: o que seria, pois, um barbarismo na syntaxe vernacula”. (MACIEL, 1887: 243).

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estaticas” – “aquellas que se enunciam materialmente pelas preposições de estado: ante,

apoz, contra, em, entre, sob, sobre” – e “circumstancias dinamicas” – “qualquer

circumstancia enunciada pelas preposições de movimento: a, até, de, desde, por, par, para”

(p. 245-7). Com essas definições e delimitações, o autor faz exemplos com cada uma

dessas preposições e indica de que maneira ela pode expressar cada circunstância.

A “correlação dos tempos verbaes”, “coexistencia de dous tempos,

correspondendo-se syntaxicamente no corpo da proposição simples”, é dividida em dois

tipos: homogenea (“si as duas fórmas verbaes estiverem no mesmo tempo, ainda que os

modos sejam differentes”) e heterogenea (“si as duas fórmas verbaes estiverem em tempos

differentes”) (p. 250). O autor discorre ainda sobre essa correlação no “presente do

indicativo”, no “imperfeito do indicativo”, no “aoristo absoluto”, no “aoristo relativo”, no

“futuro absoluto”, no “futuro relativo”, no “presente do imperativo”, nos “tempos do

condicional” e no “subjunctivo”.

As figuras topologicas são “aquellas que se manifestam na construcção figurada da

proposição” (p. 256) e manifestam-se por diminuição, consonancia, symmetria,

contraposição e accrescentamento:

Figuras por diminuição

Ellypse: “é a suppressão de uma palavra que é facilmente subentendida pelo sentido” (p.

256). Ex.: Aos heróes o vosso rebanho? (Vieira)

Assyndeton: “é a suppressão de uma ou mais conjuncções necessarias á oração” (p. 257).

Ex.: Uma hora chega emfim

Triste, espantosa, fêa, dura, amarga.

Figuras por consonancia

Paranomasia: “é o emprego de palavras de som quasi identico, porém de significação

differente” (p. 257). Ex.: Cidadão de boas artes e boas partes. (Vieira)

Antanaclase: “é o emprego de palavras quasi similhantes na fórma e na significação” (p.

257). Ex.: Não emittido da cidade senão mettido nella. (Cicero)

Homcoteleuton: “é o emprego de palavras de egual desinencia” (p. 257). Ex.: Não só para

a vida lhe tirar, mas tambem a gloria lhe menoscabar. (Cicero)

Homeoptoton: “é o emprego de verbos no mesmo modo, tempo, numero e pessoa, ou o

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emprego de palavras de egual funcção syntatica” (p. 257).

Ex.: Bramando durocorre e os olhos cerra,

Derriba, fere, mata e põe por terra. (Camões)

Isocolon: “é o emprego de orações tendo quasi um numero egual de palavras” (p. 257).

Ex.: Olha o quanto é vaga e voluvel a fortuna; quantas as deslealdades nos amigos;

quantas as ficções proprias do momento. (Vieira)

Antithese: “é a contraposição dos termos nas sentenças” (p. 258).

Ex.: Passou o mundo do estado da innocencia e da culpa; da immortalidade á morte; da

patria ao desterro. (Vieira)

Antimetabole: “é a repetição das palavras de uma oração em outra, porém em ordem

differente” (p. 258). Ex.: Vivo para comer; como para viver.

Figuras por contraposição ou transposição

Anastrophe: “é a inversão na collocação das palavras” (p. 258). Ex.: A deligencia d’estas

matronas servio de allivio aos trabalhos, nos perigos de exemplo. (J. Freire)

Tmese29: “é a introducção da palavra atona no futuro ou no condicional” (p. 258). Ex.:

Dir-se-á, contar-nos-ia.

Hyperbaton: “é a transposição da proposição do lado proprio para o outro” (p. 258). Ex.:

A criança por não obedecer ao mestre foi castigada.

Figuras por acrescentamento

Epezeuxis: “é a repetição successiva e animada da mesma palavra” (p. 258). Ex.: Coridon,

Coridon, quanto és demente!

Diacopo: “é a repetição da mesma palavra, intercalando-se outra de permeio” (p. 259).

Ex.: Tu só tu puro amor com força crua. (Camões)

Anaphora: “é a repetição da mesma palavra no principio de cada oração” (p. 259). Ex.:

Tudo cura o tempo, tudo gosta, tudo digere, tudo acaba. (Vieira)

Anaphora alternada: “é a repetição reciproca da mesma palavra no principio de varias

orações” (p. 259). Ex.: Aquelle armado e tu sem armas; aquelle exercitado em batalhas e

tu sem exercicio da guerra. (Vieira)

                                                            29 Na “topologia das atonas”, Maciel remete a tmese à mesóclise.

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Epistrophe: “é a repetição da mesma palavra no fim de cada oração” (p. 259). Ex.: Tudo

acaba a morte e tudo acaba com a morte até a mesma morte. (Vieira)

Synploce: “consiste em começar e terminar as orações pelas mesmas palavras” (p. 259).

Ex.: Quem promulgou a lei? Rullo.

Quem privou dos votos a maior parte do povo? Rullo. (Cicero)

Ploce: “é a repetição de uma palavra no meio ou fim da phrase seguinte” (p. 259). Ex.:

Chorou-te da Angicia selva saudosa,

Do Frucino chorou-te a vitrea onda. (Virgilio)

Epanalepse: “é a repetição de uma palavra no meio de cada oração ou no principio e fim

da mesma” (p. 260). Ex.: Vencido quer não parecer vencido. (Ulysses)

Epanodos: “é a repetição de palavras que foram dictas junctamente” (p. 260). Ex.:

Admiravel foi David na harpa e na funda: com a harpa afugentava demonios, com a funda

derribava gigantes. (Vieira)

Polyptoton: “é a repetição da mesma palavra em differentes funcções ou variando nas

fórmas” (p. 260). Ex.: Vi claramente o lume visto. (Camões)

Anadiplose: “é a repetição de uma palavra do fim da oração e no principio da seguinte” (p.

260). Ex.: O regedor das ilhas que partia

Partia alegremente navegando. (Camões)

Synonymia: “é o emprego de palavras tendo quasi a mesma significação” (p. 260). Ex.:

Foi-se, sahiu, abalou, escapou. (Souza)

Polysyndeton: “é o emprego de muitas conjuncções na sentença” (p. 261). Ex.: O bom

engenho ha de ter agudeza e subtilezae força e velocidade. (Heitor Pinto)

Climax: “é a repetição do que está dito, passando para o seguinte, depois de ter parado no

antecedente” (p. 261). Ex.: Da perda nasce o conhecimento; do conhecimento a estimação;

da estimação a dor. (Vieira)

Além das “figuras topologicas” descritas, o autor exibe vicios de construcção

(barbarismo, solecismo, cacophato, hiato, echo, collisão, amphibologia e synchese),

gallicismo (simples, composto e syntatico), brazileirismo e teoria da negação (assumindo

um posicionamento a favor do que defendia Pacheco e Lameira e criticando a teoria da

negação escrita por Frederico Diez).

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A minúcia a que Maximino Maciel trata as categorizações na sua gramática é uma

característica que remete ao que o autor atestava como moderno, reafirmando, diante dessa

categorização exarcebada – e criticada por Eduardo Carlos Pereira –, o caráter de rigor

científico, ligado diretamente ao evolucionismo e positivismo.

4.1.3 Phraseologia

A phraseologia é o “tractado da proposição e da sua distribuição na formação das

sentenças” (p. 267). O autor, nesse capítulo, retoma o conceito das ordens direta e indireta

da sentença e indica os elementos essenciais da proposição (sujeito, verbo e predicado),

atribuindo a significação de cada um desses elementos: a definição de subjeito “é a pessoa

ou cousa a que attribuimos o predicado” e acrescenta: “o subjeito é o objeto do juizo, a

idéa de substancia e a idéa principal” (p. 268); por verbo, entende como “o elemento

connectivo que liga formalmente o predicado com o subjeito” e acrescenta: “é a base da

affirmação”; e, referente ao predicado, “é a qualidade que attribuimos ao subjeito”.

Como sentença, Maximino Maciel define “uma proposição ou agregado de

proposições formando um pensamento completo” e divide-a em simples (aquela que

contém uma proposição, pode ser chamada de oração e compõe a sentença composta) e

composta (aquela que possui duas ou mais sentenças simples). Em outro momento, ele faz

mais quatro classificações referentes à sentença:

Tabela 14: Classificações das sentenças Sentença declarativa é aquela que declara um fato e pode ser positiva: quando declara a

existência de um fato (ex.: as flores respiram); negativa: quando declara a não existência

de um fato (ex.: as flores não respiram).

Sentença imperativa “é aquella que exprime a realização de um facto subordinado a uma

noção de ordem ou supplica” (p. 269). Ex.: Faze o bem.

Sentença exclamativa é aquela que exprime um fato exclamativo ou interjectivo. Ex.: Oh,

o remorso, o remorso! Não sabeis o que isso é! (Herculano)

Sentença interrogativa é aquela que empregamos para indagar um fato. Ex.: Não vê alli

aquelles vultos? (Herculano)

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As proposições na Grammatica Analytica ainda assumem mais duas classificações:

Para que haja a oração subordinada, Maximino Maciel elenca três importantes

fatores: a) a relação grammatical ou connectivo; b) a natureza das proposições; c) a

funcção das proposições (p. 273):

Relação gramatical

Conjunctiva: se estiver ligada à principal por meio de uma conjuncção (ex.: não sei se

voltes). (p. 273).

Pronominal conjunctiva: se estiver ligada à principal por meio de um pronome

conjunctivo (ex.: vi o homem que passou). (p. 273).

Natureza das proposições

Substantiva: se a proposição tiver valor de substantivo. Ex.: Quero que venhas, isto é,

quero a tua vinda. (p. 273).

Adjectiva: se a proposição tiver valor de adjectivo. Ex.: O negocio que favorece (isto é,

favoravel), deve ser aprehendido. (p. 274).

Adverbial: se a proposição tiver valor de adverbio. Ex.: Partirei antes que elle venha. (p.

274).

Proposições

Proposições Subordinadas: são orações ligadas de tal modo que acarreta dependência de sentido. Esta dependência é concretizada pela intervenção das conjuncções subordinativas. A oração principal é a primeira oração de sentido.

Proposições Coordenadas: são aquelas que apresentam um juízo independente e não necessitam da mediação de outra para que façam sentido. Pode ser syndética (se houver a necessidade de ligação com preposição ou conjuncção) ou assyndetica. Maciel altera o termo “oração principal” como era conhecida, por “oração culminante”, alegando que a oração principal só existe nas subordinadas.  

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A funcção das proposições

Subjectiva: “si servir de subjeito a outra” (p. 274). Ex.: Parece que haja festas.

Attributiva: “si servir de attributo a outra” (p. 274). Ex.: O pensamento de que tenho de

morrer me abate.

Predicativa: “si servir de predicado a outra” (p. 274). Ex.: Elle é quem deve partir.

Terminativa: “si servir de complemento terminativo” (p. 274). Ex.: Estou satisfeito do que

me disseram.

Objectiva: “si servir de objecto directo a outra” (p. 274). Ex.: Desejamos que partas.

A seguir, veremos como se dá a classificação de cada uma dessas funcções da

proposição na Grammatica Analytica:

Proposição

Substantiva 

Terminativa – ex.: Preciso de que me empreste dinheiro.

Objectiva – ex.: Desejo que

passes bem.

Attributiva – ex.: Pelo facto de teres dinheiro tiveste amigos.

Predicativa – ex.: Tu és que

fazes.

Subjectiva – ex.: É bom

que partas.

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Explicativa – ex.: O sol que é

uma fonte de calor, vivifica a

vegetação. Proposição

Adjectiva

Restrictiva – ex.: O homem que

cumpre seus deveres, dá exemplo

de virtude a seus concidadãos.

Funcções cirumstanciais expressas pela proposição adverbial.

1- Temporal- ex.: quando quizeres ir, deves me prevenir.

2- Locativa- ex.: onde está o relogio?

3- Causativa- ex.: não falei, porque não quiz.

4- Condicional- ex.: si chover não sahirei.

5- Concessiva- ex.: ainda que chóres, não ficarei.

6- De fim- ex.: para que tenhas amigos, deves ser docil e affavel.

Pronominal conjunctiva: se estiver ligada

por um pronome conjuntivo. Ex.: Na ocasião

em que te encontrei estava distrahido.

Proposição

Adverbial

Conjunctiva: se estiver ligada por conjunção.

Ex.: Chegaram as tropas logo que

amanheceu.

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4.1.4 Estylistica

A quarta e última parte da syntaxologia na Grammatica Analytica é composta por

apenas 4% de toda a parte syntaxológica da gramática. E o autor assim a define: “é o

tratado syntaxico das differente fórmas do estylo, isto é, das leis organicas e das

tendemcias naturaes30 que determinam a feição e o cunho caracteristico das diversas

composições litterarias” (p. 290).

Depois da conceituação do que é estylistica, Maximino Maciel faz um estudo

cronológico do que significava a palavra “estylo”, que, em 1887, estava diretamente

relacionada à forma de escrita: “o estylo era um instrumento tendo uma extremidade

afilada com que escreviam e a outra extremidade era mais ou menos achatada e servia para

raspar as dicções escriptas erradamente” (p. 290).

Já na acepção literária, o estylo pode ser definido como “o caracter peculiar e a

feição invariavel de cada escriptor na expressão externa dos seus pensamentos” (p. 291). O

estylo é classificado em: a) segundo a quantidade – das antigas nações gregas – b) segundo

a qualidade – pode ainda ser natural, ornado e sublime e os seus tipos são:

Estylo Attico: é o nome que se dá ao emprego de “pensamentos finos e delicados”,

palavras e ornamentos desnecessários;

Estylo Asiatico: é o nome que se dá ao emprego de pensamentos impolados,

palavras e ornamentos excessivos;

Estylo Rhodio: é o que está entre o Attico e o Asiatico, ou seja, é moderado;

Estylo Laconico: é o que apresenta imprecisão e deficiência de palavras. Falta-lhe

clareza e o sentido é initeligivel;

                                                            30 Nessa definição, o autor retoma as palavras que passaram a integrar o vocabulário dos gramáticos do final do século XIX que seguem o pensamento evolucionista e naturalista, iniciado, no Brasil, por Julio Ribeiro, por meio da sua gramática publicada em 1881.

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Estylo Natural: é o que instrui e emprega palavras claras, desprezando todos os

adornos da oratória;

Estylo Ornado: é o que emprega adornos leves e figuras moderadas;

Estylo Sublime: é o que intenciona comover e incitar paixões com frases e palavras

que engrandecem e manifestam vigor e energia.

No mais, o autor encerra sua estylistica informando que o estudo mais amplo,

quanto ao estylo, pode ser encontrado nos livros de Rhetorica.

4.2 Análise-comparativa da syntaxologia na Grammatica Analytica (1887) e na

Grammatica Descriptiva (1922)

Em todas as edições da gramática escrita por Maximino Maciel, encontramos, após

o título, o seguinte subtítulo: “baseada nas doutrinas modernas”. Anteriormente, pudemos

constatar que, ao escrever sua primeira gramática em 1885 e publicá-la em 1887, o autor

estava amparado na linha histórico-comparativa e aderiu ao modelo de gramáticos

brasileiros e estrangeiros que seguiam a mesma orientação.

A Grammatica Analytica (1887) – que, como já dissemos, a partir da segunda

edição (1894) foi chamada de Grammatica Descriptiva – teve, enquanto Maximino Maciel

exercia sua função de professor, oito edições – as demais foram póstumas – em um período

de trinta e cinco anos. Entre 1887 e 1922, a gramática brasileira estava consolidando suas

ideias e regulamentando o seu uso. O objetivo desse tópico é comparar a sintaxologia da

primeira edição que, segundo o autor, foi escrita quando possuía 20 anos de idade com a da

última edição em vida, a fim de percebermos as mudanças na sintaxe e a modernidade nela

instaurada.

Diferentemente do plano sinótico apresentado na primeira edição, a Grammatica

Descriptiva (1922) apresenta alterações nas partes da syntaxologia, começando pela

divisão que, na oitava edição, consiste em apenas três partes: syntaxe relacional, syntaxe

phraseologica e syntaxe literaria.

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4.2.1 Syntaxe Relacional

A syntaxe relacional possui o conteúdo semelhante à parte que Maximino Maciel

chamou “syntaxe” na primeira edição: “o tractado das funcções e relações das palavras,

isto é, da sua concordância e posição no organismo da proposição simples. (...) Seis são as

funcções das palavras ou expressões no organismo da proposição” (p. 2275-6), exceto pela

supressão da “funcção terminativa”, presente na primeira edição, todas as outras funções

possuem a mesma nomenclatura, porém com ampliação no número de regras. Sendo assim,

Maximino Maciel classifica as funcções em: subjectiva, predicativa, attributiva, objectiva,

vocativa e adverbial.

Enquanto na funcção subjectiva da GA31 o autor classificava o sujeito em três tipos

(simples, composto e complexo), na GD, ele acrescenta o sujeito proposicional, desde que

seja constituído por uma proposição conjunccional, indefinitiva ou indefinida (GD, p. 286).

Além disso, a funcção attributiva da GD trabalha a noção definida de predicativo do

sujeito – “é toda palavra ou expressão que, integralisando o conceito do verbo, se refere ao

sujeito” – (GD, p. 293), de predicativo do objecto – “há verbos objectivos que, além do

objecto directo, precisam geralmente de um adjunto predicativo para lhes integralizar o

conceito” – (GD, p. 293) e de adjunto adverbial.

Ao analisar cada uma dessas funções, percebemos a ampliação de regras e a

mudança na nomenclatura do que antes Maximino Maciel chamava de “complemento

objectivo” e “objectiva sporadica” (GA), passa a chamar na GD (p. 287-9) de “objecto

direto”, “objecto indirecto” e ainda acrescenta o “objecto directo preposicional”, que não

existia na GA, e seu uso é atribuído quando “o objecto directo apparece modificado por

preposição” (GD, P. 289).

Ainda na syntaxe relacional, o autor da GD trabalha a função sintática da partícula

“se” (GD, p. 327), podendo ser: a) objecto directo; b) objecto indirecto; c) particula da voz

passiva; d) sujeito indeterminado32; e) particula expletiva. A função sintática e

                                                            31 A partir de agora, chamaremos de GD a Grammatica Descriptiva (1922). 32 Em nota, o autor questiona a grande discussão que havia acerca da partícula “se” como sujeito indeterminado e afirma: “Ao publicarmos as edições anteriores, já tinhamos sentido necessidade de admittir o se como sujeito, pois, tendo a lingua a sua individualidade syntactica, não importa que o se provenha de sui, sibi, se que não possue nominativo, adaptado á funcção de sujeito. (...) Alguns professores, sem minimo fundamento, reputam erroneas taes construcções, como si a grammatica não fosse o registro dos factos da lingua. Além disso, todas as linguas têm um pronome monosyllabico, de funcção subjectiva para exprimir o sujeito inderteminado. Assim é que no

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morfológica da palavra “que”, que não foi citada na GA, aparece na GD (p. 336), podendo

ser classificada como:

4.2.2 Syntaxe Phraseologica

Semelhantemente ao conceito exposto na GA, a syntaxe phraseologica na GD é “o

tratado das proposições e das suas diversas relações na estructura do periodo” (GD, p.

354). Maximino Maciel considera dois elementos como termos da proposição, sujeito e

predicado, (diferentemente da GA que considerava sujeito, verbo e predicado) e divide a

proposição em simples e composta, assim como a Grammatica Analytica. Além disso, a

classificação da proposição simples deixa de ser declarativa, imperativa, exclamativa e

interrogativa e passa a ser (p. 355-6):

                                                                                                                                                                                    Francez existe o pronome on, no Inglez one, no Allemão man. Como pois nos querermos obstinar em não darmos se por- sujeito nos casos de que tratamos acima?” (MACIEL, 1922: 330)

Funcções da palavra “que”

Pronome

Adjectivo indefinito

 

Adverbio de quantidade

Conjuncção

Particula

decorativa

Relativo

Indefinito

Integrante

Circunstancial

Optativa

Iterativa

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Tabela 15: Classificação das Proposições Expositiva: “si exprime e assevera um facto e é expressapelo modo indicativo ou

condicional”. Ex.: A numerosa cavalgada atravessou o territorio por entre o povo

apinhado. (Antonio Vieira)

Imperativa: “si exprime uma ordem, uma noção de mando, e é expressa pelo modo

imperativo”. Ex.: Inclinae por um pouco a magestade. (Camões)

Optativa: “si exprime permissão, desejo e é expressa pelo modo subjuntivo”.

Ex.: Cessem do sábio grego e do troiano

As navegações grandes... (Camões)

Interrogativa: “si serve para interrogar acerca de um facto”. Ex.: Que são as honras e as

dignidades? (Manoel Bernardes)

Exclamativa: “si exprime o facto sob a fórma interjectiva. Ex.: Quantos rostos alli se vêem

sem côr! (Camões)

O autor continua a dividir a proposição em coordenadas e subordinadas, porém,

assume uma característica que não aparece na GA que é a função conectiva da conjunção.

E, por meio dessa afirmação, Maximino Maciel afirma que, para que a proposição seja

syndetica ou asyndetica, ela precisa estar ligada por uma conjunção coordenativa ou não

pode estar ligada a uma conjunção, respectivamente.

Ademais, outras classificações são inseridas na Grammatica descriptiva (p. 358-9):

Segundo a natureza

Aproximadas: desde que sejam ligadas por conjunção approximativa. Ex.: Era eu vestida

de riquissimas galas; alva c’roa de rosas me toucava. (Garret)

Alternadas: desde que sejam ligadas por conjunção alternativa. Ex.: Os monarchas

indultam ou toleram facilmente a republica americana. (Coelho)

Adversativas: desde que sejam ligadas por conjunção adversativa.

Ex.: Às torturas da dor resiste a vida

Da linda Branca, mas razão lhe foge. (Garret)

Illativas: desde que sejam ligadas por conjunção conclusiva. Ex.: Jesus Christo nasceu do

Espirito Santo, logo era espirito. (Bittencourt Sampaio)

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A classificação das subordinadas muda apenas a nomenclatura, mas a essência

permanece a mesma e segue o seguinte esquema (GD, p. 366):

Conjunccional

Quanto ao conectivo Relativa

Indefinita

Substantiva

Quanto á natureza Adjectiva

Adverbial

Subjectiva

Objectiva

Quanto á funcção Attributiva

Predicativa

Circunstancial

Ao falar da impessoalidade do verbo haver na primeira edição da sua gramática,

Maximino Maciel afirma que não se pode considerar o verbo haver variável no sentido de

“ter”. Na oitava edição, de 1922, a forma é aceita e exemplificada: “Na acepção de ter,

servindo então de auxiliar ao particípio passado, ex.: Haviam os cavalheiros da cruzada

acceitado as offertas de Aleixo. (Pe. Theodoro D’Alheida)” (p. 395).

Maximino Maciel discute os casos de indeterminação do sujeito, apresenta as vozes

verbais (passiva, ativa e reflexiva) não tratados na Grammatica Analytica e trabalha regras

da collocação pronominal (proclise, mesoclise e enclise).

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4.2.3 Syntaxe Literaria ou Estylistica

Na última parte da syntaxologia, o autor inicia, assim como na GA, falando sobre o

“estylo”, defendendo as mesmas concepções. A diferença da GA aparece a partir do

momento em que o autor discute sobre as formas de expressão: prosa, definida como “a

fórma de expressão que se não sujeita á medida regular, isto é, a um certo numero de

syllabas e ao rythmo” (GD, p. 422) e classificada como solta e poética; verso, definido

como “a fórma de expressão sujeita á medida regular, isto é, ao rythmo e a um certo

numero de syllabas” (GD, p. 422) e classificado como rimado ou solto.

As figuras de syntaxe na Grammatica Descriptiva possuem definição semelhante às

figuras encontradas na Grammatica Analytica. Na GA, porém, elas estavam localizadas na

segunda parte da syntaxologia, chamada “topologia”, excluída pelo autor na edição de

1922. Segue um resumo das figuras de syntaxe presentes na Grammatica Descriptiva:

Ellipse*

Zeugma

Omissão Asyndeto*

Reticencia

Syllepse

FIGURAS Pleonasmo

DE Excesso Repetição

SYNTAXE Polysyndeto*

Particula decorativa

Anastrophe

Transposição Hyperbato* 33

Hyperstrophe

                                                            33 (*) Apenas essas quatro figuras recebem a mesma nomenclatura que as figuras de syntaxe expostas na Grammatica Analytica.

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Os vícios de expressão, que também estão presentes na GA, encontram-se

ampliados na GD, como podemos observar:

Cacoepia

Lexicos ou Cacographia

barbarismos Dialectismo

Estrangeirismo

Synchyse

Cacologia

VICIOS De construcção Anacolutho

DE Dynssynclise

EXPRESSÃO Perissologia

Sintacticos ou Eco

solecismos Assonancia

De audição Hiato

Collisão

Cacophato

Encerramos, também, a análise da sintaxologia na gramática de Maximino Maciel

além de termos observado, por meio da comparação, as mudanças ocorridas com o passar

das edições até a última por ele revisada. Destarte, é importante considerarmos a

contribuição dessa gramática no cenário gramatical brasileiro do século XIX.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por se tratar de uma investigação pautada na História das Ideias Linguísticas –

discussão do capítulo 1 –, quando tratamos da obra de Maximino Maciel, Grammatica

Analytica, escrita em 1887 e refeita em 1894, procuramos entrar no universo do autor, nas

condições de produção por ele vivenciadas e passamos a examiná-la, levando em

consideração não só o contexto histórico da época – capítulo 2 – mas também o que

representou como material didático, elaborado para suprir um novo e, até então, moderno

plano de educação – capítulo 3.

A individualidade linguística que os intelectuais brasileiros implementaram no final

do século XIX, amparada pelo método histórico-comparativo e inspirada em novas

correntes, como a evolucionista, a positivista e a realista/naturalista, foi a grande

responsável pela reformulação da gramática brasileira, fato que contribuiu com a afirmação

de uma identidade nacional e com o início de uma separação linguístico-cultural dos

portugueses.

A proposta da gramática escrita por Maximino Maciel de romper com a tradição,

pautada, principalmente, nos conceitos da gramática geral e filosófica, e se adequar ao

novo plano educacional proposto por Fausto Barreto, de acordo com as chamadas “teorias

modernas”, rendeu ao autor sergipano bons resultados e frutos que seriam colhidos com o

decorrer de sua vida intelectual: tornou-se membro de instituições importantes; escreveu

artigos para jornais; escreveu obras relacionadas à medicina que tiveram relevância

internacional; sua gramática foi adotada no Colégio Pedro II e no Colégio Militar, entre

outros.

Por meio das análises, constatamos que a Grammatica Analytica estava voltada às

“novas teorias”, tanto por meio das categorizações utilizadas por Maximino Maciel, quanto

por meio da linguagem utilizada, além da adequação moderna – naquele período – dada ao

conteúdo, eliminando aspectos considerados obsoletos e renovando a estrutura da

gramática brasileira.

A comparação que fizemos, no quarto capítulo – entre a syntaxologia da primeira

publicação e a última publicada em vida, a oitava –, serviu para corroborar a ideia de que o

desejo do autor em manter-se inteirado nas frequentes mudanças presentes na língua e,

consequentemente, na gramática permaneceu até a última edição, já que cada nova edição

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trazia consigo novidades justificadas pelo “avanço” dos estudos linguísticos daquele

período. Para Maximino Maciel, era a sintaxe a sua maior preocupação em “modernizar”,

pois acreditava que os gramáticos que lhe antecediam a tratavam superficialmente, além de

seguirem antigos moldes para explicá-la.

Quatro pontos chamaram a nossa atenção no início da análise, ao questionarmos as

concepções de modernidade e o diferencial apresentado nas explicações da syntaxologia: o

uso frequente da palavra “organismo”, sempre nos confirmando a informação de que sua

obra faz parte da corrente naturalista, a ortografia de determinadas palavras, que mudaram,

aproximando-se, cada vez mais, do modo como escrevemos hoje, os quadros sinóticos em

cada nova parte da gramática e o último ponto encontra-se na preocupação em citar

exemplos de grandes escritores clássicos e contemporâneos.

Enquanto em sua primeira edição a maioria dos exemplos era criada pelo próprio

autor, na última, eles são extraídos quase sempre de: Camões, Alexandre Herculano,

Almeida Garrett, Heitor Pinto, Rodrigues Lobo, Castro Alves, Junqueira Freire, Manoel

Bernardes, Rui Barbosa, José de Alencar, Padre Antônio Vieira, Gonçalves Dias,

Gonçalves de Magalhães, Gomes Leal, Alvarenga Peixoto, Casimiro de Abreu, Pinheiro

Chagas, Tobias Barreto, Rebello da Silva, Candido Jucá, Diogo do Couto, Thomaz

Ribeiro, Homem de Mello, Pereira da Silva, e ainda, gramáticos como Júlio Ribeiro,

Epiphanio Dias, Ernesto Carneiro, Padre Pereira, João de Barros.

Encerramos a análise da Sintaxologia na gramática de Maximino Maciel e, por

meio da comparação, conseguimos identificar tanto o crescimento intelectual do autor,

quanto a fidelidade aos preceitos das “teorias modernas” utilizadas por ele. O cuidado com

a forma, com as nomenclaturas, com os exemplos empregados, com as regras que caíram

em desuso fez das gramáticas Analytica e Descriptiva, referência no ramo de gramáticas

brasileiras do século XIX.

Esse trabalho pretende contribuir para os estudos referentes à História das Ideias

Linguísticas no Brasil, uma vez que descreve e analisa uma das obras mais importantes da

gramaticografia brasileira no final do século XIX. Trabalhos futuros, entretanto, poderão

ser empreendidos, considerando ser o corpus aqui selecionado uma pequena parte do

campo gramatical: a sintaxe.

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JORNAIS

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