a influencia africana na economia cultural da bahia

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Cadernos de Estudos Africanos (2012) 23, 53-83 © 2012 Centro de Estudos Africanos do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa A Influência Africana na Economia Cultural Baiana Noelio Dantaslé Spinola Universidade Salvador (UNIFACS) - Salvador, Bahia, Brasil [email protected]

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Análise da influência da população afrodescendente na formação cultural da cidade do Salvador. Cadernos de Estudos Africanos (2012) 23, 53-83© 2012 Centro de Estudos Africanos do ISCTE - Instituto Universitário de L

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  • Cadernos de Estudos Africanos (2012) 23, 53-83 2012 Centro de Estudos Africanos do ISCTE - Instituto Universitrio de Lisboa

    A Influncia Africana na Economia Cultural Baiana

    Noelio Dantasl Spinola

    Universidade Salvador (UNIFACS) - Salvador, Bahia, Brasil

    [email protected]

  • 54 a influncia africana na economia cultural baiana

    A influncia africana na economia cultural baiana

    Este artigo apresenta um breve comentrio sobre a influncia africana na economia da cidade de Salvador, a terceira maior do Brasil em populao e a maior do mundo, fora da frica, em termos da populao negra, sem pretenses de esgotar o assunto. Relata os resultados de uma pesquisa de campo que informa como os cultos religiosos, como o can-dombl, se transformam nos veculos inspiradores e condutores de atividades econmicas que se materializam atravs do folclore. Espera fornecer elementos para uma discusso econmica e antropolgica mais profunda.

    Palavras-chave: economia cultural, influncia africana, religio afro-brasileira,

    economia baiana, emprego e renda, Salvador

    The influence of Africa on the cultural economy of Bahia

    While by no means an exhaustive account, this article discusses the influence of Africa on the economy of Salvador, Brazils third most populous city and the largest concentra-tion of people of African origin outside the continent. This paper details the findings of fieldwork that examined how religious cults such as Candombl have become vehicles for folklore-inspired economic activity. It hopes to present an approach that results in a deeper economic and anthropological understanding of these phenomena.

    Keywords: cultural economy, African influence, Afro-Brazilian religion, Bahian

    economy, employment and income, Salvador

    Recebido 17 de novembro de 2011; Aceite para publicao 9 de abril de 2012

  • 55noelio dantasl spinolacadernos de estudos africanos janeiro-junho de 2012 23, 53-83

    Desde o sculo XIX que os cientistas sociais brasileiros e de outras partes do mundo, atravs de variados estudos e uma farta literatura cientfica, tm anali-sado a cultura e a sociedade negra1. Neste plano se insere a anlise dos cultos afro-brasileiros em suas diferentes ramificaes, discorrendo sobre a sua hist-ria, teologia, psicanlise, caractersticas regionais e modalidades de prtica. Toda esta ateno torna o tema complexo e objeto de diferentes abordagens pelos estu-diosos do assunto, adeptos e simpatizantes2.

    Segundo Arthur Ramos (1956, p. 200), estudos sobre os negros no Brasil so complexos por exigirem o concurso multidisciplinar de especialistas, constituin-do-se em um problema histrico, antropogeogrfico, antropolgico cultural, bio-lgico, lingustico, sociolgico e poltico. razovel supor que ao longo do tem-po os estudos africanos tenham evoludo substancialmente, incorporando novas contribuies e enfoques, cujo exame foge ao escopo deste texto.

    Uma definio de cultura negra que pode ser vlida no contexto de diferentes

    sistemas de relaes raciais a seguinte, apresentada por Sansone (1994): a cultu-ra negra uma subcultura especfica das populaes de origem africanoamerica-na, dentro de um sistema social que destaca a cor ou a descendncia de cor como critrio importante para diferenciar ou segregar pessoas.

    As culturas negras existem em diferentes contextos: em sociedades plurais, em sociedades predominantemente brancas e em sociedades nas quais uma nor-ma somtica predominante situa os negrides no nvel mais baixo, ou prximo a este (cf. Whitten & Szwed, 1970, p. 31). Fora aglutinadora especfica da cultura

    dos negros o sentimento de um passado comum, na condio de escravos e desprivilegiados. A frica usada como um banco de smbolos, sacados de for-ma criativa. A cultura negra , por definio, sincrtica (Mintz, 1970, pp. 9-14).

    Tambm especfico da cultura negra, em certa medida, o alto grau de interde-pendncia em relao cultura urbana ocidental. Por causa disso, a cultura ne-gra geralmente no goza do mesmo tipo de reconhecimento oficial conferido s

    culturas tnicas estabelecidas, e os negros enfrentam dificuldades maiores do

    que outras minorias tnicas para se expressar enquanto comunidade. A principal

    1 Entendida como o conjunto de pessoas que vivem em certa faixa de tempo e de espao, seguindo normas comuns, e que so unidas pelo sentimento de conscincia do grupo (Ferreira, 2009, p. 1865). uma parcela da populao negra (pessoas que, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), se autodeclaram pretas e ou pardas) vinculada direta ou indiretamente ao candombl. A este respeito ver Costa Lima (1977); Bastide (2001); Maia (1977). 2 Segundo Arthur Ramos (1956, p. 200) foi o professor Nina Rodrigues (1862-1906) quem pela primeira vez, no Brasil, dedicou ao Negro um monumento cientfico. Em sua obra clssica, O Negro na civilizao brasileira, Arthur Ramos tambm apresenta (p. 209) uma bibliografia geral onde relaciona as principais contribuies sobre o tema produzidas at o ano de 1938. Outra importante contribuio a de Munanga (2002), que relaciona entre outras obras muito importantes os trabalhos mais conhecidos do pblico no especializado como os de Pierre Verger e Roger Bastide.

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    base de ao dos grupos de presso negros a negrofobia branca, bem como a percepo da discriminao racial. Aspecto relativamente especfico da etnicida-de negra o fato de se basear amplamente na manipulao da aparncia fsica. As populaes negras do Novo Mundo e da dispora caribenha na Europa produ-ziram uma variedade de culturas e identidades negras que se reportam, por um lado, ao sistema local de relaes raciais e, por outro, a fenmenos internacionais e internacionalizantes (Sansone, 1994, p. 2).

    Neste estudo destacam-se dois pontos fundamentais. O primeiro que, tanto quanto o Portugus e o ndio, o Negro um dos fundadores da cultura brasi-leira3. O segundo que o culto afro, uma das suas manifestaes coletivas mais tpicas, constitui uma religio reconhecida pelo governo brasileiro e um elemento significativo da economia cultural4 da cidade do Salvador, influenciando o estilo

    e a prtica de inmeras atividades populares, dentre as quais se destacam o arte-sanato, a produo musical, a culinria, a moda e a medicina5 do corpo e da alma, com as quais se inter-relaciona numa cumplicidade sutil, muitas vezes cercada de magia e misticismo.

    o carter simblico das mercadorias que nos permite falar em economia cultural, mas preciso compreender agora o que vem a ser cultura.

    A noo de cultura multissignificada. Em alguns contextos, ela aparece como

    sinnimo de erudio ou educao acadmica. No cenrio miditico, cultura apa-rece geralmente associada ao mundo das artes: cinema, teatro, televiso, etc. Do ponto de vista socioantropolgico, entretanto, a cultura concebida de forma muito mais ampla. Trata-se de toda e qualquer criao humana, real ou simblica e que se expressa como modo de vida.

    Sua concretude , portanto, onipresente, pois se manifesta em todas as esfe-ras do cotidiano: poltica, econmica, religiosa, etno-lingustica, sociocomporta-mental e fenotpica. A cultura dos povos a interconexo de todas estas esferas, perpassada ainda pelos aspectos histricos e geogrficos (tempo/espao). Morin

    (2003) compara a cultura a um megacomputador altamente complexo. Em mbi-to universal ela um gerenciamento coletivo da sobrevivncia humana e particu-larmente representa a identidade de um povo, expressa na lngua, nas prticas e no imaginrio das comunidades.

    3 Para melhor compreender esta afirmao sugere-se a leitura de Ribeiro (1995).4 O termo economia cultural refere-se a um vigoroso campo de produo, circulao e consumo de bens e servios simblicos, de natureza material e imaterial, genericamente chamados de bens ou produtos culturais. Seu uso tem sido cada vez mais recorrente nos meios acadmicos, intelectuais e nas mdias, embora a bibliografia sobre o assunto ainda seja exgua (Spinola, 2003).5 Fitoterpica.

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    Os bens culturais, alm do seu elemento cultural estruturante, compartem com os demais bens e servios econmicos o emprego, na sua produo, de re-cursos naturais, de capital, de trabalho e de outros elementos, notadamente uma tecnologia especfica que deriva de uma inspirao criadora. A maioria destes

    recursos possuem usos alternativos e portanto um custo de oportunidade e um preo. Isto no quer dizer que todos os bens e servios culturais se vendam em um mercado, ainda que isso suceda em muitos casos, como, por exemplo, na contratao dos servios de artistas e outros profissionais criativos. O Estado cos-tuma fornecer alguns produtos culturais de forma gratuita. Esta uma deciso poltica e no econmica: a maior parte dos bens culturais no so bens pblicos.

    Entretanto muitos especialistas deste setor pensam que os bens culturais pos-suem caractersticas prprias dos bens pblicos que os mercados no podem cap-tar plenamente atravs dos preos (Towse, 2003).

    O culto afro constitui um fenmeno importante na cultura popular da cidade do Salvador porque, dos seus 2.676.606 habitantes, 80,9% so pretos ou pardos (IBGE, 2011)6. A cidade, que a terceira maior do Brasil em populao, tambm considerada como a maior capital negra do mundo, fora da frica (RankBrasil, 2011)7 e registra uma grande desigualdade social.

    Segundo De Paula (2011) esta desigualdade acontece em diversos aspectos. O ndice de Desenvolvimento Humano da cidade, por exemplo, era levemente maior que a mdia do Brasil em 2010, mas se reduzia a nveis da frica ou se ele-vava a nveis da Europa, dependendo do bairro da cidade considerado. Assim, de acordo com o PNUD, o IDH-M de alguns bairros de classe mdia alta atingia 0,971, maior que o da Noruega (0,938), lder mundial h seis anos. Porm, nos bairros mais pobres e populosos situava-se em torno de 0,664, ndice menor que o de pases como o Turquemenisto (0,669), Tonga (0,677) e Arglia (0,677), loca-lizados na sia Central, Oceania e frica.

    Por imperativo metodolgico que norteou a execuo da pesquisa realizada em 2009 pelo Grupo de Estudos da Economia Cultural (Gecal)8 da qual deriva este texto, faz-se necessrio distinguir claramente as modalidades do culto afro tendo em vista as diferenas das prticas existentes, a sua distribuio espacial e o fato de constituir o candombl um dos objetos deste estudo.

    Segundo a direo baiana da Federao Nacional do Culto Afro-brasileiro (Fenacab) os dois ramos principais do culto so: 1 - os terreiros de candombl 6 So 54,9 % pardos (mulatos) e 26% pretos segundo a mesma fonte.7 Pessoalmente tenho dvida desta afirmao. A centena de fontes que consultei e que a apresentavam, no informava a sua origem. No obstante, parece ser uma unanimidade. 8 Vinculado ao Programa de Ps-Graduao em Desenvolvimento Regional e Urbano (PPDRU) da Universidade Salvador (Unifacs).

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    e 2 - as casas de umbanda. Os terreiros de candombl so regidos pela tradio africana e no se deixam influenciar pelas outras religies9. A umbanda surgiu no Brasil e mistura, num processo sincrtico, a tradio africana, a indgena, a europia catlica e esprita. Existem diferenas ritualsticas entre os dois cultos e, inclusive, rivalidade. Esta distino no claramente percebida pelos leigos, gerando muita confuso na sua anlise.

    Na viso de Carneiro (2002, p. 136) o Candombl o local em que se reali-zam as festas religiosas em geral; as cerimnias religiosas anuais obrigatrias do culto. Viana de Ftima (2007, p. 513) define-o como uma religio afro-brasilei-ra, medinica, que cultua entidades chamadas Orixs, os quais se manifestam no corpo dos crentes por meio de uma crise de possesso. Para Bastide (2001), candombl primitivamente significava dana e instrumentos de msica e, por

    extenso, passou a designar a prpria cerimnia religiosa. uma prtica religio-sa eminentemente urbana, e tem considervel nmero de seguidores no pas. O

    culto organizado no podia, sob a escravido, florescer no quadro rural ou seja,

    a fazenda ou a cata. Para mant-lo o negro precisava de dinheiro e de liberdade, que s viria a ter nos centros urbanos (Carneiro, 1959, p. 7).

    O fato que o candombl praticado por descendentes de diversas naes africanas10 cujos ancestrais vieram escravos para o Brasil. Uma idia deste com-plexo quadro de civilizaes fornecida a seguir por Bastide (1985, p. 67), citando Arthur Ramos11:

    a) as civilizaes sudanesas representadas especialmente pelos yorb (nag, ijex, egba, ketu, etc.), pelos daomeanos do grupo jge (ewe e fon) e pelo grupo fanti-axanti chamado na poca colonial de mina12;b) as civilizaes islamizadas representadas, sobretudo, pelos peuhls, pelos man-dingas, e pelos haussa13;

    9 Esta afirmao, como quase tudo que se refere aos cultos afro-brasileiros, discutvel. Esta pureza pretendida para o candombl vem se perdendo ao longo do tempo. Existe um grande discurso africano, mas no encontramos um s candombl que no contemplasse o sincretismo, ou que no possusse relao com os indgenas (caboclos).10 O trfico negreiro trouxe para o Brasil numerosas tribos e etnias que, apesar dos deslocamentos de populaes na frica, no tinham o hbito de estar normalmente em contato. Mesmo quando a miscigenao as misturou, essas etnias no se fundiram, conservando cada qual certo nmero de traos culturais irredutveis e agrupando-se em naes. Na Bahia no existem mais hoje indivduos eves, iorubas, angolas ou congos, mas essas naes sobreviveram sob a forma de candombl, ritual ou musicalmente diferentes (Bastide, 2001, pp. 260-261). Para maiores detalhes ver Karasch (2000, p. 127).11 Bastide (1985, p. 67) cita a obra de Arthur Ramos Las poblaciones del Brasil, cap. XII, Introduo antropologia brasileira.12 Nas denominaes de etnias africanas optou-se por manter a redao original dos autores consultados.13 Povos africanos islamizados tiveram grande influncia nas comunidades religiosas dos africanos no Brasil, notadamente na Bahia, onde, pela maior concentrao de mandingas, peuhls (fulas), haussas, etc., o islamismo propagou-se rapidamente e passou a constituir a religio dos negros mais inteligentes e mais instrudos, o que deu lugar a um verdadeiro irredentismo de insubmisso culminada em sangrentos levantes negros a exemplo da Revolta dos Mals. Ver a respeito Vianna Filho (1946) e Reis (2003).

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    c) as civilizaes dos bantos do grupo angola-congols representadas pelos am-bundas de Angola (cassangues, bangalas, inbangalas e dembos), os congos ou cabindas do esturio do Zaira e os benguelas;d) as civilizaes dos bantos da Contra-Costa representadas pelos moambiques (macuas e angicos).

    Como informa Bastide, a frica enviou ao Brasil:

    negros criadores e agricultores, homens da floresta e da savana, portadores de ci-vilizaes de casas redondas e outras de casas retangulares, de civilizaes totmi-cas, matrilineares e outras patrilineares, pretos conhecendo vastos reinados, outros no tendo mais que uma organizao tribal, negros islamizados e outros animis-tas, africanos possuidores de sistemas religiosos politestas e outros, sobretudo, adoradores de ancestrais de linhagens (1985, pp. 67-69).

    No de estranhar que mesmo entre os especialistas no campo encontrem-se frequentemente interpretaes diferenciadas e contraditrias.

    Existem controvrsias quanto ao nmero dos terreiros de candombl em

    Salvador. Na verdade no se conhece uma pesquisa confivel que informe com

    margem de segurana o nmero exato dessas unidades. A pesquisa realizada

    pelo Gecal (2009) constatou nos registros da FENACAB a existncia de 617 terreiros efetivamente registrados em Salvador. Entre seus responsveis predominavam os descendentes da nao Ketu (Yorb) que possuam 414 terreiros, ou 67% do total registrado. Em segundo lugar apareciam os descendentes da nao Angola (Bantos) com 166 terreiros ou 27%. Em menor nmero apareciam os oriundos da nao Ijex (tambm dos Yorbs), com 20 terreiros, equivalentes a 3%; seguidos dos Jeg (daomeanos) com 14 terreiros, ou 2%; e apenas 2 da nao Congo (0,3%). Este nmero discutvel porque muitos terreiros fecham e no do baixas do re-gistro e outros surgem e no se registram (Gecal, 2009). Tomando-se por base es-tes dados e considerando-se que a cidade possui 23 mil logradouros registrados pela Prefeitura, observa-se que os terreiros ocupam apenas 2,7% do seu espao.

    O mapa seguinte apresenta a distribuio dos terreiros na cidade do Salvador, construdo com base no cadastro da FENACAB. Nele observa-se que as concen-traes esto localizadas em reas da cidade que constituem vales onde existem remanescentes da Mata Atlntica, na proximidade do mar e nos subrbios que

    j foram distantes do centro urbano. A expanso da cidade do Salvador, com as suas avenidas de vale, destruiu o sistema urbano construdo pelos portugueses nos sculos XVI-XIX e o equilbrio que harmonizava as funes trabalho x habita-o. O candombl, que constitui uma religio essencialmente ecolgica, onde a mata e a vegetao constituem elementos base para a sua funcionalidade religio-

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    sa, vem sendo gradativamente esmagado pela expanso urbana e a especulao imobiliria14.

    Segundo Maria Stella de Azevedo, a Me Stella de Oxssi, do Il Ax Op Afonj, o candombl uma organizao eminentemente matriarcal. O seu co-mando exercido pela ialorix (me-de-santo). A liderana feminina nessa tra-dio religiosa vem de um simples fato: as pioneiras do candombl, princesas africanas que vieram para a Bahia em fins do sculo XVIII, criaram o princpio de que as suas casas religiosas s poderiam ser lideradas por mulheres. Uma tradi-o mantida at hoje nos terreiros como a Casa Branca, o Alaketu, o Gantois e o Il Ax Op Afonj 15.

    Evidente que existem muitos terreiros liderados por pais-de-santo (babalao-rix). No obstante, enquanto a figura feminina da ialorix venerada e muito respeitada, sendo alvo de muitas homenagens, o mesmo no ocorre com os ho-mens, que so frequentemente objeto da stira da mdia e dos preconceitos da populao. O famoso comediante brasileiro Chico Ansio difundiu pela mdia (Rede Globo de Televiso) a tendncia homossexual dos pais de santo com o seu personagem Painho. Neste caso devem ser observados dois aspectos. Primeiro, o candombl uma instituio matriarcal, preponderantemente liderada por mu-lheres. Segundo, o homossexualismo tolerado no candombl, no sendo seus praticantes discriminados16.

    Segundo Costa Lima (1977), a me-de-santo ou o pai-de-santo exerce toda autoridade sobre os membros do grupo em qualquer nvel de hierarquia dos quais recebe obedincia e respeito absoluto. A estrutura do candombl repou-sa em duas categorias de afiliados, perfeitamente distintas: os que so iniciados

    como filhos de santo (ias), at o estgio da feitura do santo, e os vrios titulares de posies executivas e honorrias no terreiro (obs e ogans) no campo espiri tual e litrgico como na organizao da sociedade civil que trata dos assuntos mais

    14 Segundo Santos (2007), em relao rea de cada terreiro, a metade dos terreiros soteropolitanos tem menos de 360 m2. E na rea construda h uma contiguidade dos espaos sagrado e domstico. Muitos terreiros apresentam uma fachada similar s de casas comuns na periferia, alguns tendo dois ou trs pavimentos, ou localizados em subsolos. Inmeros so os terreiros cujo espao residencial do pai/me-de-santo, inclusive com famlia consangunea, encontra-se prximo ao espao sagrado. Para termos uma idia desse contingente, existem seis pessoas, no mximo, residindo em 73% dos terreiros. 15 Denominao de terreiros famosos de Salvador. A Casa Branca ou Il Ax Iy Nass Ok a primeira casa de candombl aberta em Salvador, Bahia. Constitudo de uma rea aproximada de 6.800 m, com as edificaes, rvores e principais objetos sagrados, tombado pelo IPHAM. O terreiro do Alaketu, Il Ax Mariolaj, foi fundado por Maria do Rosrio Otamp Ojaro, descendente da Famlia Real de Ketu. Tambm conhecido como Casa de Me Olga do Alaketu, tombado pelo IPHAM. O terreiro do Gantois ou Il Iy Omin Ax Iy Mass, terreiro da famosa Me Menininha, difere dos demais porque a sucesso se d pela linhagem e no atravs de escolha pelo jogo de bzios. Tombado pelo IPHAM. O terreiro Il Ax Op Afonj, segundo vrios autores, serviu de modelo para todos os outros, de todas as naes. Fundado, em 1910, por um grupo dissidente do Terreiro da Casa Branca, funciona numa roa adquirida no bairro de So Gonalo do Retiro. Tombado pelo IPHAM.16 Para um aprofundamento no tema recomenda-se consultar Vertuan (2009); Santos (2009).

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    seculares do grupo e seu relacionamento com as instituies pblicas e agncias

    de controle da sociedade global em que os candombls se inserem.

    Toda Casa bem fundamentada na Bahia, alm de sua funo religiosa, tem sua parte social. Alm da ordem ritualstica, h uma ordem civil. Alm da hierarquia espiritual, h a administrativa, que cuida por assim dizer, dos interesses materiais da Casa... Esses homens podem ou no ser filhos-de-santo. De acordo com o querer

    da Ialorix e dos Orixs, dividem-se em categorias: so os ogs, e os obs. O og um indivduo escolhido pela Ialorix ou por uma de suas filhas montadas, isto , pelo

    prprio Orix em ateno aos seus servios prestados ao culto, a uma personagem importante, a algum cuja assiduidade nas festas seja notada ou que doe a Casa coisas de valor material. Sua funo quase que exclusivamente administrativa, podendo, contudo, aprimorar-se liturgicamente e ento, ajudar na prtica do cul-to. Seu nmero ilimitado. J os obs so reduzidos. So apenas doze. S perde o cargo, a funo, a honraria, em caso de morte. A nica Casa que mantm a tradio

    dos obs o Ax Op Afonj (Vasconcelos Maia, 1977, p. 5).

    Figura 1: Mapa dos terreiros de candombl da Bahia

    Fonte: A economia cultural de Salvador. Pesquisa do Gecal para a Prefeitura Municipal de Salvador, 2003.

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    Como em qualquer outra religio, o candombl atrai uma massa de aderentes, cujos vnculos com a casa, exteriormente, resumem-se presena nas diversas cerimnias. Existe ainda outro segmento onde estes vnculos espirituais so mais tnues, mas que tem papel importante na manuteno dos terreiros. Trata-se de pessoas que, sem qualquer ligao anterior com a casa, nem necessitando ma-nifestar f genuna na religio, buscam a proteo das foras sobrenaturais que acreditam os terreiros comandarem ou mediarem em momentos adversos da vida, em casos de doena ou em fases de incerteza, aflio ou desespero face aos

    problemas concretos da existncia. Tais pessoas, na medida em que considerem satisfatria a interveno do terreiro em seu benefcio tendem a assumir maiores compromissos com o culto, contribuindo com mais regularidade para sua manu-teno e funcionamento.

    Feitas estas consideraes introdutrias, compe este trabalho uma seo destinada ao exame da economia afro-baiana de Salvador que se subdivide na descrio de alguns segmentos selecionados dos setores relacionados com o ar-tesanato religioso, a produo de instrumentos musicais e o Carnaval. No foi possvel apresentar o estudo sobre a moda tnica e a culinria dada a limitao do espao. A maioria dos dados e informaes oriunda da pesquisa realizada em 2009 pelo Grupo de Estudos da Economia Cultural de Salvador (Gecal). Esta pesquisa atualiza outra que, com o mesmo propsito e pelo mesmo grupo, foi em realizada em 2003.

    A pesquisa do Gecal permitiu desenhar-se a figura seguinte, que apresenta

    uma indita cadeia produtiva derivada dos cultos afro em Salvador da Bahia, a qual busca demonstrar a inter-relao entre o culto afro e um conjunto de ativida-des dele derivados. A rigor elas constituem seis ramos independentes dos qual o de peso econmico maior o Carnaval que, gradativamente, vem se descolando desta influncia pela perda da criatividade e a invaso de outros ritmos influen-ciados, inclusive, pela msica pop norte-americana.

    O mesmo fenmeno ocorre com a culinria, que vem perdendo espao para as comidas gachas, chinesas, japonesas e italianas, uma decorrncia da crescente

    migrao de sulistas e paulistas mobilizados pelas indstrias que se implantam

    na regio.

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    Figura 2: Cadeia produtiva derivada da influncia dos cultos afro-brasileiros

    Fonte: Gecal (2009)

    A economia afro-baiana

    Analisando as atividades profanas integrantes ou derivadas do candombl, no mbito da economia cultural observamos que estas trazem em seu conceito o sentido implcito de uma espcie de interao equilibrada entre a administrao dos recursos e a ao do sobrenatural. No que diz respeito ao indivduo membro do culto isto significa que o grau de interveno amistosa, indiferena ou hostili-dade por parte dos Orixs que controlam seu destino e sua prpria sorte pessoal mantida pelo grau de devoo com que ele cumpre as exigncias ritualsticas do culto. No candombl, a intensidade em que ele est disposto a fazer sacrifcios um importante fator no sentido de lhe trazer recompensa e elevao de status17.

    Nas relaes econmicas mais diretas e transparentes, os cultos afro-brasilei-ros no diferem muito das demais religies. Assim, o candombl mantm equi-pes permanentes, que so sustentadas pelas respectivas casas. Alm disso, para

    17 A despeito das prticas da trplice obrigao (Mauss, 2011), como disse Bastide (1985, p. 323), o fator econmico tende, em todo o caso, a tomar um lugar cada vez mais importante na vida do candombl, modificando simultaneamente sua estrutura e funcionamento. Nesse sentido cada vez mais importante o papel dos Ogs.

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    auferir rendas que assegurem a sustentao financeira das casas, certos servios

    religiosos so cobrados, como ocorre comumente em tais casos. Neste sentido, pode-se concluir que, se em termos estritamente ocupacionais

    o papel dos terreiros no chega a ser relevante, seus efeitos indiretos assumem propores considerveis, sendo expressivos na vida econmica da regio, parti-cularmente de Salvador como demonstra a Figura 2. Aqui, dois aspectos devem ser considerados. Primeiro, o papel de agncia comunitria desempenhado pe-los terreiros, com reflexos importantes na vida de seus membros. O candombl

    deve ser pensado no apenas como uma unidade socialmente organizada para a adorao das foras que dominam o universo, mas tambm como uma institui-o que funciona pragmaticamente para proteger os interesses de seus membros seja no plano espiritual seja no material. O segundo aspecto refere-se ao papel dinmico que o candombl exerce, de estmulo a certas atividades econmicas, particularmente o comrcio e o artesanato. Isso deriva do fato de que um ele-mento presente na maioria das cerimnias e ritos a realizao de oferendas e sacrifcios s divindades, os Orixs. Tais oferendas, que incluem uma extensa lista de gneros alimentcios e outros, e o sacrifcio de animais (pombos, galinhas, bo-des, cgados, carneiros e bois), esto presentes tanto nas cerimnias das quais a comunidade dos terreiros participa coletivamente, quanto nas prticas desenvol-vidas, com maior ou menor regularidade, por seus membros individualmente. Por outro lado, a representao e manifestao das divindades se revestem de rica e complexa simbologia que, na prtica, se expressa em vestimentas, ador-nos os mais diversos e objetos rituais, prprios a cada divindade. Existe ainda o emprego de sementes, ervas, folhas, plantas em diversas cerimnias. Todos esses elementos tm a peculiaridade de obedecer a certos requisitos rituais, o que im-porta na observncia de procedimentos escritos na sua produo, levando a que sua oferta no seja to afetada pelos processos de modernizao18. Neste nvel, o candombl responsvel direto pelo emprego de artesos que produzem os adornos e objetos rituais, costureiras encarregadas das vestimentas, e produtores e comerciantes dos diversos gneros e materiais antes citados.

    O culto, na Bahia, se amplificou e repercutiu mundialmente ao servir de inspi-rao para inmeras manifestaes culturais que foram traduzidas na produo

    musical de artistas de renome internacional como Dorival Caymi, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Vinicius de Morais, Carlinhos Brown e muitos outros; na litera-

    18 Esta afirmao se aplica aos terreiros de candombl tradicionais (como o caso da Casa Branca, do Alaketu, do Gantois e do Il Ax Op Afonj) que so conservadores. A maior parte dos seus dirigentes so essencialistas e puristas. Esta pesquisa reflete muitas informaes gentilmente fornecidas pelo babala Otoniel dos Santos, poca Secretrio da FENACAB.

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    tura de Jorge Amado; na etnografia e fotografia de Pierre Verger19, na arte plstica de Caryb, Calazans Neto, Mrio Cravo Neto, Tati Moreno e por fim nas grandes

    escolas do Carnaval como o Olodum, o Yl Ay, e a Timbalada, cuja ao extra-pola o artstico e transborda para o social, e nos afoxs como os Filhos de Ghandi. Assim que O Olodum, um bloco de renome internacional, com 5,5 milhes de discos vendidos, mantm uma escola em Salvador (Pelourinho) onde atende a 360 alunos, constituindo uma referncia nacional e internacional pela inovao no trabalho com arte, educao e pluralidade cultural (Rodrigues20, 2011, p. 7).

    No Candeal, Carlinhos Brown (Timbalada) realizou o projeto T Rebocado, de urbanizao e saneamento do bairro, que recebeu, em 2002, o Certificado de

    Melhores Prticas do Programa de Assentamentos Humanos das Naes Unidas/UN-Habitat. Em 1994, ele fundou a Associao Pracatum de Ao Social. O lugar um centro de referncia em cursos de formao profissional em moda, costura,

    reciclagem, idiomas e oficinas de capoeira, dana e de temticas ligadas cultura

    afro-brasileira, alm de uma escola infantil. Os projetos so parceiros de institui-es importantes mundialmente, como os Ministrios da Educao e do Trabalho e a UNESCO (Pracatum, 2011).

    Nascido do Terreiro Il Ax Jitolu, o Yl Aiy criou o Centro Cultural Senzala do Barro Preto, onde cuida da realizao de diversas atividades scio-culturais importantes (no bairro da Liberdade - Curuzu) tais como: escola de primeiro grau, socializao de menores atravs da msica, dana e esportes, e cursos pro-fissionalizantes. Alm dessas atividades, o Il Aiy desenvolve um consistente

    trabalho no campo da negritude, onde a questo racial e cultural do negro di-fundida (Il Aiy, 2011).

    Assumido com vigor pelo trade turstico baiano, o candombl conquistou o reconhecimento e o respeito da sociedade em geral, ampliando o seu prestgio e verificando-se a disseminao do uso de muitos de seus adornos e instrumentos

    (pulseiras, colares, estatuetas de madeira e metal, instrumentos musicais, etc.) sem qualquer vnculo com a prtica ou compromisso com a f religiosa.

    Segundo o Censo 2010 do IBGE as religies afro-brasileiras tiveram um cresci-mento de 52%, o maior, em termos relativos, entre todos os grupos pesquisados. Hoje eles representam 0,35% da populao, o que em nmeros absolutos atinge a

    marca de 682.50021. A sociedade baiana em seus costumes flexvel e no oferece

    19 Pierre Fatumbi Verger (1981) foi um etngrafo e fotgrafo franco-baiano-africano.20 Nome formal de referncia de Joo Jorge Santos Rodrigues. Ver nota 37 seguinte.21 Estes nmeros so bastante duvidosos. Dado o preconceito que ainda forte, muitos adeptos do culto tm vergonha de assumi-lo publicamente, sendo muito comum se declararem catlicos, espiritualistas, ou sem religio. No so poucos os catlicos e ateus que adotam algumas das prticas do candombl ou usam adereos afro.

  • 66 a influncia africana na economia cultural baiana

    um campo promissor para o radicalismo religioso22. Mesmo os evanglicos no conseguem dobrar a arraigada tradio afro da maior parcela da populao.

    Como afirma Santos:

    O movimento contra a intolerncia religiosa vem se consolidando e alcanou j algumas vitrias, sendo que entre as mais dignas de registro est a condenao, em vrias instncias do judicirio brasileiro, da Igreja Universal, em funo de agres-ses e ofensas publicadas no jornal da referida igreja, que concorreram para a mor-te da yalorix Me Gilda, do Il Ax Abass de Ogum. A data do falecimento de Me Gilda, no ano de 2004, se transformou no Dia Municipal Contra a Intolerncia Religiosa, atravs do projeto de uma vereadora de Salvador. Em 2008, essa data se tornou o Dia Nacional Contra a Intolerncia Religiosa (projeto de dois deputados federais da Bahia) (2009, p. 2).

    Segundo Reginaldo Prandi (2009) em entrevista concedida a Abadon do site Ceticismo Net, um dos maiores problemas enfrentados pelas comunidades de candombl para sobreviver a descentralizao. Muitas vezes, h divergncias sobre o culto e os rituais dentro das prprias naes, j que as tradies afro no constituem uma religio monoltica, mas vrios cultos, oriundos de diversos povos africanos, que foram trazidos para o Brasil. s vezes existem divergncias dentro do prprio candombl Segundo Pandri, no existe uma religio afro-brasileira, mas vrias. Dentro de cada uma, h grande diversidade de naes e ritos diferentes, de acordo com as origens tnicas dos grupos fundadores. Dentro da religio, h grupos que conhecem muito pouco os outros. Para ele a falta de unio entre as comunidades gera uma dificuldade de se articular politicamente.

    Os terreiros no se unem nem se organizam, o que gera uma fraqueza para se defender. A religio afro tem origem no culto domstico. As relaes so sempre simbolizadas pelo parentesco. Existe o pai-de-santo, filho-de-santo, a casa-de-

    santo, como se fosse famlia. Ento, ainda segue essa idia de que cada chefe de famlia responsvel pela sua famlia. No implica responsabilidade com o outro. Cada comunidade totalmente autnoma.

    No obstante, pode-se afirmar que a existncia e a fora do candombl em

    Salvador constituem um fenmeno peculiar de nossa sociedade. Assim que nos ltimos anos, como relata Santos (2009), muitos militantes dos movimentos ne-gros passaram a valorizar e se integrar aos terreiros das diversas naes, que pas-saram a se articular at mesmo em termos de aes polticas e projetos diversos, realizando aes sociais e comunitrias.

    22 importante deixar claro que no estamos negando a intolerncia religiosa. Ela existe, porm bem menor do que a existente nos estados do Sul e Sudeste.

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    Com esse processo de politizao surgiram as articulaes, as aes conjuntas e as entidades representativas. O que levou ocupao dos espaos em conselhos, como o caso da representao formal e legal dos terreiros no CDCN Conselho de Desenvolvimento da Cidadania Negra (Governo do Estado) e no Conselho Municipal das Comunidades Negras (Prefeitura Municipal de Salvador). Esse processo de politizao levou criao da ACBANTU Associao Cultural de Preservao do Patrimnio Bantu. A ACBANTU integrante dos CONSEAs Conselhos de Segurana Alimentar em nvel estadual e nacional. E tambm criao da AFA Associao de Preservao da Cultura e Religiosidade Afro e Amerndia, que agrega os Terreiros de Candombl de Caboclo (mistura da reli-giosidade africana e indgena brasileira), muito presentes na Bahia (Santos, 2009, p. 2).

    No plano econmico os cultos afro no esto imunes ao processo de globali-zao e a revoluo ciberntica. A divulgao da sua prtica e dos seus produtos vem alastrando-se na web, onde se registra uma imensa quantidade de sites que comercializam objetos e servios dos mais variados, alguns sem demonstrar pre-ocupao com a veracidade das informaes que propagam e outros divulgando propositadamente informaes falsas para adquirirem vantagens comerciais.

    Muitos produtos originrios da frica e naturalizados na Bahia, como, por exemplo, o berimbau (hungu ou mbolumbumba em Angola e grande parte do con-tinente africano), so fabricados em larga escala no Estado de So Paulo, num processo industrial que concorre com a produo artesanal baiana.

    Na Praa da S (Pelourinho) esto localizadas empresas importadoras dos ar-tigos mais sofisticados, originrios de So Paulo e do exterior. Alguns terreiros

    fazem compras diretamente nas cidades do Recncavo Baiano23.A Feira de So Joaquim, segundo a Prefeitura de Salvador, a maior feira

    aberta da cidade. Espalha-se por dez quadras, em 22 ruas, em um espao de mais de 34 mil metros quadrados. So 7.500 feirantes em mais de quatro mil boxes. Fundada h 41 anos, a Feira de So Joaquim est em pleno processo de obten-o do ttulo de Patrimnio Cultural Imaterial do Brasil, conferido pelo Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional (IPHAN). A feira o maior centro abastecedor dos artigos utilizados nos cultos afro-brasileiros de Salvador. L se encontra desde animais para sacrifcios at vestimentas de Orixs, contas e bzios vindos da frica e da sia.

    23 Fazem parte do Recncavo histrico e tradicional as cidades de Nazar das Farinhas, onde ocorre anualmente uma Feira de Caxixis (cermica), Maragogipe, So Flix, Muritiba, Cachoeira e Santo Amaro da Purificao.

  • 68 a influncia africana na economia cultural baiana

    Tabela 1 Produtos para o culto afro comercializados na Feira de So Joaquim

    Produto - Artesanato

    Preo Preo R$ Unidade Procedncia do produto acabado

    Abads 20,90 a 334,41 50,00 a 800,00 Unidade Salvador, Recncavo e frica

    Adjan (chama e tira Orixs)

    2,51 a 62,70 6,00 a 150,00 Unidade Salvador

    Agd (tachos de barro)

    0,02 a 5,02 1,00 a 12,00 Unidade Salvador, Recncavo e Juazeiro

    Atabaque 10,45 a 125,40 41,00 a 300,00 Unidade Salvador, Recncavo e Sudeste

    Baianas de mesa 0,84 a 6,27 2,00 a 15,00 Unidade Salvador

    Berimbau 2,09 a 12,54 5,00 a 30,00 Unidade Salvador

    Berimbau de mesa 0,84 a 2,09 2,01 a 5,00 Unidade Salvador

    Cajado (Opachor) 29,26 a 62,70 70,00 a 150,00 Unidade Salvador e Recncavo

    Carranca 1,25 a 209,00 3,00 a 500,00 Unidade Salvador, Recncavo, e Juazeiro

    Colar de contas 0,42 a 8,36 1,00 a 20,00 Unidade Salvador

    Conchas 0,42 a 8,36 1,00 a 20,00 Unidade Salvador e frica

    Coroa de Orixs 41,80 a 167,20 100,00 a 400,00 Unidade Salvador

    Defumadores 2,09 a 20,90 5,00 a 50,00 Unidade Salvador e Recncavo

    Ferramentas para assentamento

    8,36 a 25,08 20,00 a 60,00 Unidade Salvador

    Figa 0,42 a 12,54 1,00 a 30,00 Unidade Salvador e Recncavo

    Fita do Senhor do Bonfim

    0,42 a 2,09 1,00 a 5,00 Dzia So Paulo

    Imagem de santo 2,09 a 75,24 5,00 a 180,00 Unidade Salvador

    Mscaras africanas 8,36 a 209,00 20,00 a 500,00 Unidade Salvador, Recncavo e frica

    Miniatura de Orix

    2,09 a 20,90 5,00 a 50,00 Unidade Salvador

    Pau de chuva 2,51 a 8,36 6,00 a 20,00 Unidade Salvador

    Peas de argila artesanais diversas

    0,84 a 8,36 2,01 a 20,00 Unidade Salvador, Recncavo

    Penca de balangands

    8,36 a 209,00 20,00 a 493,00 Unidade Salvador

    Preto Velho (Omolu)

    8,36 a 20,90 20,00 a 50,00 Unidade Salvador

    Fonte: Pesquisa de campo do Gecal/Unifacs na Feira de So Joaquim em julho de 2010. Nota: Valores convertidos para Euros - Data da cotao utilizada: 04/11/2011. Taxa: R$ 2,3923 = 1,00 . Observe-se que os preos apresentados na Tabela 1 constituem preos no especulativos. Um conjunto de atabaques (Run, L e Runpi)24 pode custar at R$ 2.000,00.

    24 So os nomes dos atabaques em funo do tamanho (grande, mdio, pequeno) e do som (grave, mdio e agudo): Run, Runpi e L.

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    Artesanato religioso

    O artesanato de Salvador tambm recebe uma forte influncia dos cultos afro.

    Verdadeiras obras de arte popular so produzidas em cermica, madeira e metal. O Mercado Modelo, o Pelourinho e a Feira de So Joaquim so os maiores comer-cializadores de artesanato religioso da capital baiana.

    Os patus25, que revelam a f do povo baiano, so comercializados atravs das miniaturas de Orixs, cermicas, quadros, esculturas, pulseiras e colares de con-tas, bzios, contreguns26, etc. Entre os produtos artesanais que merecem desta-que est a fitinha do Senhor do Bonfim, que utilizada sincreticamente tambm

    por membros do candombl.Os materiais utilizados nos cultos afro-brasileiros vm sendo modificados

    pela introduo de tcnicas e materiais novos, como tecidos sintticos, metali-des, linhas de nylon, contas plsticas e de resinas, galvanizao de metais, que so amplamente usados por artesos, possibilitando a produo de objetos em maior escala, o que barateia o produto final (Gecal, 2009). As fitinhas do Senhor

    do Bonfim, por exemplo, deixaram de ser fabricadas em tecido de algodo, subs-titudo pelo nylon. Segundo alguns crentes perderam parte do seu efeito, pois neste novo material, mais resistente, custa muito a graa ser concedida quando se rompe a fita no pulso do devoto. A modernizao apresenta vantagens do

    ponto de vista da racionalidade econmica. Porm muitos consumidores reagem aos produtos modificados. J existem at berimbaus ecolgicos construdos em

    plstico.Os consumidores se dividem basicamente em trs categorias. A primeira a

    dos turistas desavisados, que compram qualquer coisa desde que os encante. So vtimas dos espertalhes que normalmente vendem produtos de baixa qua-lidade e a preos elevados. A segunda uma categoria cada vez mais significa-tiva, a dos turistas especialistas, que testam os produtos que compram e em muitos casos exigem e conferem a originalidade do produto, a sua exclusividade, a sua natureza artesanal, chegando ao ponto de exigirem conhecer os mestres fabricantes. A terceira e ltima a dos compradores locais, cuja procura muito

    pequena, pelo menos nos mercados citados, que consideram caros e destinados aos turistas27.

    25 Amuleto. Bentinho.26 Um dos objetos mais populares do candombl o contregun, um bracelete de palha que se coloca em torno do pulso ou brao, que serve para afastar, aps uma cerimnia fnebre do candombl, a alma do morto, que pode possuir aqueles que assistem cerimnia. Ento se usa esse objeto para proteger as pessoas que ali esto. Mas hoje em dia, caiu no gosto popular e foi disseminado o seu uso pelos baianos e turistas que muitas vezes nada tm a ver com a religio e no sabem o que esto fazendo.27 A no se considera os praticantes dos cultos afro que constituem uma demanda mais especializada e pulveri-zada pelos mercados menores da cidade, So Joaquim e o Recncavo.

  • 70 a influncia africana na economia cultural baiana

    Alguns artesos j exportam seus produtos, sendo os maiores mercados Portugal, Frana, Itlia, Espanha, Israel e frica do Sul, segundo informa a Dinho Artes e Percusso localizada no Pelourinho.

    Em geral, lucros altssimos so obtidos no processo de comercializao dos objetos confeccionados pelos artesos baianos. No s os objetos tm sido des-pudoradamente copiados como tambm padres tm sido apropriados revelia de seus criadores. Na maior parte dos casos o controle desse processo escapa aos artistas, que costumam receber quantias quase simblicas por seu trabalho de criao. Ocorre tambm no receberem nada e assistirem venda de cpias de seus trabalhos, com grande qualidade, produzidos na China28 (Gecal, 2009).

    As vestimentas dos Orixs utilizadas nas cerimnias, s vezes vindas da frica, so vendidas nas lojas por valores que oscilam em torno de 600,00 . So produ-zidas artesanalmente e utilizam como matria prima: contas plsticas, bzios,

    fibras de coco, sisal, couro, lantejoulas, tecidos de variados tipos (Gecal, 2009).

    Os instrumentos e os ritmos que so executados possuem valores histricos. So meios de comunicao e de informao, so sagrados e, aps as obrigaes, tornam-se instrumentos de materializao e exteriorizao das foras vitais, ou seja, do ax. Este , por exemplo, o caso dos atabaques.

    O ax29, energia vital, fundamento maior desta religio, fixado em objetos vrios e por meio deles se transmite. Os exemplos, enfim, podem ser numerosos.

    At mesmo a identidade do indivduo relaciona-se intimamente a um conjunto particular de objetos religiosos que geralmente desaparecem com ele, quando de sua morte, como o caso do colar de contas, um objeto sagrado que a pessoa ini-ciada leva consigo e passa por uma preparao especial para ter um significado

    para quem o usa. Como descreve Bastide: cada membro da seita tem um colar que lhe prprio, cujas contas so da cor da divindade a que pertence (...) mas o colar no tem valor por si mesmo; deve sofrer previamente determinada prepa-rao; deve ser lavado (2001, p. 41).

    Os cultos, as cerimnias, as festas e trabalhos realizados pelo candombl pedem folhas especficas. As principais so mercadas nas feiras da cidade com

    destaque para as de So Joaquim, das Sete Portas. Podem ser encontradas tam-bm no Parque So Bartolomeu, uma reserva florestal que ainda sobrevive na

    periferia da cidade. Muitos pais-de-santo ortodoxos dizem que Osse, o Orix das

    28 A China mundialmente conhecida pela sua prtica de benchmarking pirata. Copiam as criaes locais de orixs, por exemplo, e as reproduzem em alta qualidade e grande quantidade a preos bastante inferiores aos locais dada a escala e o dumping social que praticam.29 Segundo alguns crentes mais ortodoxos, inclusive antroplogos, esta palavra sagrada da religio afro tem sido vulgarizada e profanada pela mdia.

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    plantas medicinais e litrgicas, no gosta que se compre ervas nos mercados. Que

    elas devem ser colhidas na natureza segundo os seus preceitos.

    Instrumentos musicais

    Como se sabe, a cidade do Salvador possui uma grande vocao musical. Os instrumentos musicais percussivos dominam o seu mercado. Em geral, so de origem africana, com pequenas modificaes realizadas com o passar do tempo

    para melhor atender aos novos estilos musicais. Foram trazidos pelos negros na poca da escravido e servem at hoje para ritmar os cantos e as festas dos cultos afro. Perpetuada pela tradio oral africana a forma de produzir e de tocar esses instrumentos, sobreviveu ao logo do tempo, sendo as informaes passadas de pai para filho nas sucessivas geraes.

    A produo destes instrumentos exige poucos recursos, o que viabiliza a sua fabricao artesanal em pequenas oficinas, na maioria das vezes nas condies

    mais rudimentares possveis e disseminadas pela cidade em locais de difcil aces-so para o grande pblico, apenas conhecidos pelos intermedirios compradores.

    Os equipamentos utilizados so pouco sofisticados (usuais de carpintaria), muitos

    fabricados ou adaptados pelos prprios artesos, bem como as instalaes fsicas que tambm so extremamente precrias e insalubres. O trabalho realizado em famlia, numa tradio que passa de pai para filho. Utilizam como matria-prima

    restos de madeira obtidos na construo civil (num autntico mercado de sucata). A pele dos instrumentos originria do interior do Estado, sendo muito utilizado o couro de bode e de cobra. A intermediao muito grande, havendo o caso de existirem trs negociantes entre o produtor e o fabricante. O nvel de instruo baixo e a propenso associativa inexistente (no que pouco difere das camadas mais esclarecidas da populao). Vem com profunda desconfiana e ceticismo a

    possibilidade de receberem algum tipo de ajuda.Quarenta por cento do universo pesquisado pelo Gecal (2009) utiliza exclu-

    sivamente o seu prprio trabalho como mo-de-obra e setenta e trs por cento possui at trs funcionrios. Esta mo-de-obra, em geral, quase toda oriunda da prpria famlia do arteso. Setenta por cento do universo pesquisado est na informalidade. E no pretendem se formalizar. Alegam que temem o pagamento de impostos e as presses da fiscalizao.

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    Figura 3: Localizao dos produtores de instrumentos musicaisFonte: Gecal - Pesquisa 2009

    Argumentam que a margem de lucro do setor muito baixa, tornando-se in-sustentvel a legalizao de alguns deles. Para se ter idia, a maioria possui uma receita mensal de aproximadamente $7.000,00 (3.000,00) e outra parcela, tam-bm significativa, no ultrapassa a receita mensal de at R$ 3.000,00 (1.300,00) .

    Assim sendo, quando so pagos os custos, muito pouco sobra que compense os esforos (Gecal, 2009).

    A Tabela 2 fornece uma idia do grau de explorao dos produtores de instru-mentos musicais em Salvador. Foram considerados na pesquisa os dois maiores pontos de venda destes produtos na cidade.

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    Tabela 2 Margens de lucro dos vendedores nos mercados de instrumentos musicais de Salvador

    Instrumentos Mercado Modelo (%) Pelourinho (%)Berimbau Gunga 166,67% 153,33%

    Berimbau Viola 166,67% 153,33%

    Berimbau Mdio 166,67% 153,33%

    Bong 160,00% 180,00%

    Atabaque (l) 187,50% 155,00%

    Agog 200,00% 166,67%

    Ganz 250,00% 250,00%

    Cabulet 166,67% 166,67%

    Pau-de-chuva 200,00% 160,00%

    Pandeiro 180,00% 120,00%

    Xequer 233,33% 193,33%

    Bacurei 192,31% 153,85%

    Tringulo 250,00% 200,00%

    Afox 187,50% 150,00%

    Jeb 0,00% 800,00%

    Kalimba 250,00% 200,00%

    Kechada 208,33% 166,67%

    Xequer 233,33% 193,33%

    Pfano 500,00% 333,33%

    Apito 400,00% 266,67%

    Maraca 214,29% 142,86%

    Berrante 280,00% 280,00%

    Arpa 166,67% 166,67%

    Baculele 175,00% 125,00%

    Timbal 175,00% 150,00%

    Tchimba 233,33% 200,00%

    Mini-Tchimba 200,00% 150,00%

    Kaxixi 240,00% 200,00%

    Atabaque (rum) 187,50% 155,00%

    Atabaque (rumpi) 187,50% 155,00%

    Fonte: Pesquisa direta do Gecal, 2009

    Observe-se que todos os comerciantes, tanto os do Mercado Modelo quanto os do Pelourinho, possuem margens de lucro superiores a 100%, pois compram os instrumentos diretamente dos produtores por preos aviltados.

    importante destacar que estas receitas poderiam ser muito maiores se o mer-cado no funcionasse em regime de oligopsnio. Este regime se formou ao longo do tempo e de forma natural, diante da total omisso das autoridades regula-

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    mentadoras (o Governo). Comerciantes antigos foram ocupando os espaos de comercializao, muitos mediante proteo poltica, dedicando-se ao atendimen-to da procura pelos turistas. Uma parte deles montou pequenos fabricos e outra parte ingressou no mercado do sistema fabril a fao ou disperso30, montando uma rede de fornecedores que trabalham pautados recebendo a matria-prima e as especificaes do produto; ou em artesanatos caseiros e em oficinas. Trata-se

    de uma imensa rede que se espalha por alguns bairros e subrbios de Salvador.

    Estes produtores, muitos deles artistas, ou no possuem tino comercial ou no tm acesso ao mercado. No existe mais espao para mostrar suas peas. Se as colocarem nas ruas a Prefeitura confisca. Por outro lado, se forem vender no

    produzem. E assim acabam presos na teia dos comerciantes e dos intermedi-rios outra categoria especializada em ir buscar o produto nas fontes e at em export-lo. Alm disso, os comerciantes recebem os produtos em consignao, o que significa liquidar as possibilidades de capitalizao e a limitao do capital

    de giro. Por essas e por outras as novas geraes esto fugindo do ofcio dos pais, cuja perspectiva em mdio prazo a de extino.

    O Carnaval

    O Carnaval uma importante manifestao cultural de Salvador, pelo volume de recursos humanos e financeiros que mobiliza, numa sinergia com o organis-mo sociocultural e pela imagem da cidade, que projeta de forma significativa no

    mercado turstico nacional e internacional.O Carnaval uma festa mvel ocorrendo entre os meses de fevereiro e maro

    de cada ano, tendo na capital baiana uma durao oficial de seis dias, comean-do na quinta-feira noite e encerrando-se na manh da Quarta-feira de Cinzas. Ocupa em mdia 25 km de ruas para os desfiles nos trs circuitos em que se divi-de a festa e nos quatro bairros onde so montados palcos31.

    Uma das foras africanas na festa o afox. Como explica o historiador Cid Teixeira (2011), trata-se de um bloco carnavalesco, uma brincadeira de forma, contedo e comportamento especfico tendo em vista que os seus membros fo-

    lies esto vinculados a um terreiro de candombl, unidos por uma religio, pelo uso de uma lngua, dana, ritmos e cdigos de origem nag. Entre os afoxs baia-nos os Filhos de Gandhy o mais famoso. Com sua roupa branca, seu turbante felpudo, inicialmente foi composto por negros, homens de origem humilde, ope-rrios, ligados aos inmeros terreiros de candombl da Bahia. Mais recentemente

    intelectuais, acadmicos, polticos e personalidades atradas pela fama tm se

    30 Ver uma excelente descrio deste sistema em Staley & Morse (1971, p. 18).31 Dados da Prefeitura Municipal, comprovados empiricamente.

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    agregado aos afoxs mais famosos. O primeiro grupo de afox saiu s ruas em 1895 e mostrava aos folies de Salvador aspectos dos ritos do candombl.

    Figura 4: Filhos de Ghandy em desfile (Fotografia de Eduardo Freire/G1)

    Outras manifestaes culturais enriquecem os carnavais baianos como os blo-cos afro: Olodum, Il Aiy, Timbalada, Mal Debal, Muzenza e muitos outros. A cultura africana, a plasticidade e beleza das suas coreografias, a criatividade dos

    seus temas, a louvao da me frica, e o ritmo contagiante das suas baterias conduzidas no som sincopado dos atabaques, constituem a fora desses blocos.

    Os nmeros da festa so os fornecidos pelo governo mediante pesquisa rea-

    lizada pela Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (Infocultura, 2011) que aponta para um comportamento singular dos moradores de Salvador nos lti-mos trs anos. A pesquisa indica que a grande maioria da populao de Salvador no participa da festa. Esta ausncia atingiu os nveis de 83,8% da populao em 2008; 81,00% em 2009 e 81,50% em 2010. Isto significa que alguma coisa est

    errada nos rumos da festa. Cabe investigar.Da populao local que participou da festa em 2010, 18,50% segundo a Infocultura (Carnaval 2010), a maioria esmaga-dora era de negros (87,4%). Desta maioria, quase a totalidade (91,2%) integrante da categoria dos folies pipoca, ou seja, aquele folio que no participa de qualquer entidade carnavalesca e que brinca livre nas ruas, imprensados pelos

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    cordeiros32 e pelos trios eltricos. A participao predominante de turistas e grande parte deles brasileira da regio Sudeste33 .

    A festa rende muito dinheiro, mas os resultados esto concentrados em um grupo restrito de organizaes privadas. Segundo os dados que foram apurados pelo Gecal junto Emtursa e Bahiatursa, empresas tursticas do Municpio e do Estado, respectivamente, para o ano de 2004, as empresas carnavalescas absorve-ram 52,01% dos recursos gerados pela festa, cabendo aos setores de transporte e montagem, bebidas, mdia e hospedagem outros 42,07% de toda a renda gerada, ficando para as atividades que podem ser classificadas como de pequeno e mdio

    porte como os restaurantes, bares e lanchonetes os restantes 5,92%.Os turistas estrangeiros parece que diminuem a cada ano, assinalando-se po-

    rm a presena de sul-americanos, notadamente argentinos, e europeus com des-taque para os italianos e espanhis34.

    Segundo a opinio de diversos estudiosos do assunto, o Carnaval baiano apresenta sinais de decadncia e em mdio prazo, se nada for feito em sentido contrrio, murchar ou, o que pior, degenerar como tantos outros eventos po-pulares baianos35. Trs fatos, pelo menos, contribuem para este destino, a saber:

    I. A elitizao da festa. Inegavelmente ela deixou de ser popular. O povo que no tem dinheiro para comprar um abada, ou levar a famlia para um camaro-te, est sendo expulso da folia. O seu espao foi loteado: no Carnaval baiano, agora, s com abada ou camarote. E quem participa como pipoca, pode ser vtima da violncia policial utilizada, claro, nos ppp36. Assistindo a cobertura do Carnaval pela TV tudo muito bonito e democrtico. E s festa e alegria. No entanto, como denuncia a imprensa, um circo de horrores ocorre no under-ground.

    II. O desligamento gradativo das origens africanas. A frica e sua cultura consti-tuam o leitmotiv da festa. Porm, assiste-se a um desligamento desta origem ins-piradora que atingiu o seu auge nas dcadas de 1970 a 1990. O Ax Music entrou em franca decadncia.

    III. A morte da criatividade. A severa reduo da qualidade da educao na cida-de, como de resto em todo o Estado, notadamente nas escolas pblicas, contribui

    para a produo de msicas de pssimo gosto, que normalmente apelam para a 32 Cordeiros so pessoas contratadas para segurar as cordas que delimitam os espaos privativos dos blocos, separando seus integrantes dos folies pipoca circundantes. So homens fortes, na totalidade negros e muito pobres.33 Dados fornecidos pelos hotis com base em seus registros de hspedes.34 Segundo os registros dos hotis.35 As crticas ao modelo do Carnaval baiano so to fortes e constantes na mdia, que os principais empresrios do setor e artistas esto se mobilizando para discutir a festa.36 Ironia baiana. Significa: pretos, pobres e perifricos.

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    pornografia. A perda da criatividade dos compositores baianos um fenmeno

    discutido na mdia por diversos personagens da cena musical baiana. Ver, por exemplo, as declaraes de Joo Jorge Santos Rodrigues, Presidente do Olodum, em entrevista Revista Muito, n 189, novembro de 2011, sob o ttulo A Bahia perdeu sua capacidade criativa. Coisas como o pagode, funk e outras, tomaram conta das ruas e retiraram todo o encanto da festa. So palavras de Joo Jorge37:

    A Bahia perdeu muito da sua capacidade criativa e inovadora nas reas da lite-ratura, teatro, msica, artes visuais, lazer e do entretenimento. Quando se perde

    essa capacidade de fazer coisas novas em todas essas reas, voc passa a viver do antigo, no que este seja ruim, mas no se estabelece a ponte com o presente e com o futuro. A Bahia precisa inovar. O teatro feito hoje o mesmo dos anos 1980. Na msica ainda estamos na ltima inveno, que foi o samba-reggae. Nada de novo de l para c. A Bahia estagnou. Mais, estamos voltando para trs (2011, p. 8).

    Sobre a perda de espao do samba reggae38 para o pagode que hoje domina o cenrio artstico local, afirma Rodrigues (2011, p. 10):

    Travamos todo tempo uma guerra contra produtoras, contra um modelo de pen-samento. O samba-reggae uma msica poltico-ideolgica da comunidade negra,

    pulsante e dinmica. Ora, ela no atendia aos esquemas da indstria de entreteni-mento. Ento aqui na Bahia, esse espao foi diminudo, substitudo por algo terr-vel, que no o pagode em si, mas as coisas que no so boas dentro do pagode. Ento, o fato de no terem esse controle sobre o nosso produto levou a isso.

    Assim sendo, o Carnaval baiano cada vez mais um megaempreendimento capitalista, programado para uma elite de novos ricos, famosos da televiso, socialites e deslumbrados que curtem tudo nos camarotes. Foge gradativamente das suas origens e elimina as chances da gerao de micro- e pequenos negcios pela maior capacidade de articulao e competitividade de diversos grupos de interesse internos e externos festa.

    Sobre a apropriao do Carnaval pelas classes abastadas e a expulso dos pobres, j dizia Singer (1998) que tanto o progresso como a misria so produtos do mesmo processo que consiste na penetrao e na expanso do capitalismo num meio em que predominavam outros modos de produo. Trata-se de um processo de transformao estrutural, que evolui ao longo do tempo. O capital penetra em determinados ramos de atividade em que possui maiores vantagens

    37 Este o nome artstico pelo qual Joo Jorge Santos Rodrigues internacionalmente conhecido. Por razes metodolgicas ele citado como Rodrigues, conforme registro no CNPq.38 Ver tambm Guerreiro (2000, p. 271).

  • 78 a influncia africana na economia cultural baiana

    em relao ao modo de produo preexistente, revolucionando os mtodos de produo e introduzindo outras relaes de produo. Ou ento, ele surge me-diante a implantao de atividades novas, que s ele capaz de suscitar. Cria-se, ento, um inter-relacionamento dinmico entre o segmento capitalista e os outros modos de produo que so postos disposio do capital, transformando-se, por exemplo, em reservatrio de mo-de-obra, ou em cordeiros diramos ns.

    Concluso

    A pesquisa de que deriva este texto procurou basicamente relatar aspectos da influncia dos cultos afro na economia cultural da cidade do Salvador, passando

    pelo candombl e desembocando nos setores que lhe esto mais prximos, como o artesanato, a produo de instrumentos musicais e o Carnaval. O quadro ob-servado inspira preocupao.

    Entende-se que urgente a necessidade da formulao de polticas pblicas

    que contemplem de forma eficaz os segmentos pesquisados que transitam entre a

    formalidade e a informalidade, ponteadas por empreendimentos de grande a pe-queno porte. Entende-se tambm que no existe como se formular uma poltica uniforme para o setor. Devero ser vrias polticas enfeixadas num programa de fomento economia cultural na cidade de Salvador, de contornos multifacetados compostos por projetos que se ajustem tipicidade de cada segmento e que no conjunto respeitem a cultura especfica de cada um, nunca procurando impor

    modelos exgenos de organizao empresarial quando na presena de compor-tamentos arraigados da comunidade. Estes projetos tambm devem ter cuidado com a preservao da pureza tradicional do segmento estudado, evitando a in-troduo de modernidades que possam prostitu-lo e, consequentemente, elimi-nar o seu valor intrnseco que constitui o maior patrimnio para aproveitamento pela indstria do turismo39. Isto importa na capacidade de aceitao do statu quo informal, o que significa admitir que, se forem formalizadas, determinadas ativi-dades podero desaparecer, dado que suas lideranas atingiram o limite de suas competncias, como ensinam Peter e Hull (1969), e que for-las a migrar para novos patamares consiste em conden-las a uma situao pior do que a anterior.

    Os programas e projetos que contemplem efetivamente a realidade brasileira devem exercitar a criatividade na construo de modelos inditos e ajustados situao estudada, despidos da preocupao monocrdia que consiste em c-

    39 Podemos ser considerados puristas. E talvez sejamos, pela convico que temos de que a perda da pureza, o afastamento da tradio, o abastardamento das prticas, que tm conspurcado a beleza natural da arte e afastado o pblico.

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    pia medocre dos modelos organizacionais ditados pela cultura anglo-saxnica. Assim sendo torna-se necessria a criao de mecanismos e alternativas que efe-tivamente garantam espaos para os pequenos e que possibilitem uma efetiva democratizao na gerao da renda, notadamente no Carnaval. Isto passa por uma revolucionria compreenso no fiscalista de que a receita pblica para in-vestimentos pode aumentar atravs da reduo das despesas de subsdio social direto aos desvalidos, quando esses adquirem renda legtima para atender suas necessidades (antes providas pelo Estado), pelos efeitos diretos do trabalho nos segmentos informais.

    Sem pretenses panfletrias, afirma-se que no existe desenvolvimento ape-nas sob a tica capitalista da acumulao e que podem existir outras lgicas econmico-culturais que podem vicejar e sobreviver, mesmo num mundo globa-lizado. Descobri-las, entend-las e proteg-las constitui um desafio para os estu-diosos e pesquisadores que no devem se deixar vencer pela falta de criatividade, submisso colono-intelectual e mediocridade consuetudinrias.

    Neste sentido, vale recordar o alerta de Hirschman (1980) em seu ensaio Auge y ocaso de la teora econmica del desarrollo que, na sua inconformidade antevia, com clarividncia, a revoluo neoliberal e a volta do paradigma que ele denominava de monoeconomia, ou seja, a validade da aplicao exclusiva e universal da teoria econmica gestada no primeiro mundo. O que constitui um desastre para os pases pobres da frica, sia e Amrica Latina.

    Este estudo no pretende delinear um programa. Sero feitas apenas algumas consideraes sobre os segmentos aqui estudados.

    O candombl vtima da modernidade que o deturpa e que dificulta a reno-vao dos seus quadros pela fuga dos jovens atrados por novas ocupaes, ou, o que pior, recrutados pela criminalidade, onde se destaca o narcotrfico. Em

    Salvador os cultos afro foram vtimas nos ltimos oito anos de uma administra-o municipal evanglica que at terreiros mandou destruir40. Tambm o acaraj, o famoso bolinho de Xang, tombado pela UNESCO como patrimnio cultural da humanidade, no escapou da sanha exorcista dos evanglicos. Est sendo vtima de um ataque dos fanticos pseudo-religiosos que criaram um similar denomi-nado de bolinho de Jesus41.

    O que cabe fazer no caso do candombl?

    40 Foi obrigada pela Justia a reconstruir tudo e a indenizar as vtimas. O prejuzo poltico foi incalculvel.41 No obtiveram sucesso. As baianas evanglicas no conseguem concorrer com as baianas tradicionais. Principalmente no tempero.

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    Preliminarmente deve-se fortalecer, poltica e financeiramente, rgos como

    o Instituto Mau42, o Instituto do Patrimnio Artstico e Cultural da Bahia (IPAC), o Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO)43 e outras instituies cientificamente srias para, em seguida, com elas ou atravs delas, estabelecer uma poltica con-sistente que impea a destruio deste culto. Dentro destas polticas, uma que se afigura de maior urgncia consiste na proteo dos terreiros contra a especulao

    imobiliria e a reserva de territrios para o culto, com a preservao dos poucos espaos verdes ainda remanescentes em Salvador, entre os quais o Parque de So Bartolomeu. Esta proteo deve figurar com clareza no Plano Diretor da Cidade.

    Tambm ser de muita importncia um aumento do intercmbio com a frica, inclusive com a promoo de congressos e festivais, intercmbios de estudantes e de estudiosos.

    A pesquisa do Gecal (2009) identificou que os produtos religiosos consumidos

    em Salvador procedem, majoritariamente, de So Paulo e de vrios lugares do planeta, inclusive da China e Filipinas, o que ressalta a importncia de determi-narem-se os volumes consumidos e as especificaes dos diversos produtos para

    que se possa avaliar as exigncias de escala e a consequente viabilidade de sua fabricao local.

    Os artesos baianos carecem de acesso ao microcrdito para a aquisio de insumos e, sobretudo, de apoio ao marketing dos seus produtos. Uma poltica de criao de novos espaos para exposio que, a exemplo do Pelourinho e do Mercado Modelo, gere externalidades para os artesos, se insere como uma me-dida indispensvel. Esses espaos, que atraem turistas, configuram mercados

    importantes para o escoamento de uma produo que muitas vezes realizada de porta em porta, de hotel em hotel. Praas e jardins podem ser programados sistematicamente para feiras de artesanato. Neste aspecto a Bahia tem muito a aprender com outros estados nordestinos, entre os quais Pernambuco, Cear e Rio Grande do Norte.

    No segmento vinculado msica, pesquisou-se o setor responsvel pela fa-bricao de instrumentos musicais. Constatou-se a existncia de inmeras fabri-quetas de instrumentos de percusso vicejando, em sua maior parte, na informa-lidade. Neste caso, concluiu-se pela necessidade da realizao de um estudo de viabilidade econmica para o desenvolvimento de um projeto que contemple a implantao de pequenas fbricas desses instrumentos em Salvador que viriam, provavelmente, conformar no futuro um arranjo produtivo local.

    42 Autarquia estadual incumbida de cuidar do artesanato que se encontra totalmente fossilizada.43 Que h mais de 50 anos estuda este segmento.

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    Quanto ao Carnaval, no estgio em que se encontra, um resultado de uma poltica neoliberal que vem sendo desenvolvida pela Prefeitura do Salvador, que centrou seus esforos em preparar o palco (a cidade e seus circuitos), para que os folies possam brincar confortavelmente ao longo dos seis dias de festas. Criadas as condies, prosperou uma indstria que se apropriou deste espao, expulsou

    a massa popular e fatura milhes de reais no esquema BTC (bloco, trio, camaro-tes). Na esteira desta indstria surgiu uma nova classe, a do artista-empresrio

    que acumula fortunas. Esta uma grave distoro a corrigir. A acelerada concen-trao da renda em poder de um pequeno grupo, que j assume caractersticas oligopolsticas, formando um cartel, elimina as chances competitivas dos peque-nos empresrios, e reduz o espao da festa para os folies pipocas que consti-tuem, ainda, e provavelmente por muito tempo, parcela majoritria do pblico

    brincante. Isso, alm de elitizar a festa, poder mat-la em mdio prazo. No custa lembrar que quem fez e faz mesmo a festa o povo que, por uma questo de sobrevivncia, deve ser respeitado.

    A propsito de se lamentar que a Fbrica de Carnaval, um projeto genuina-mente baiano de gerao de emprego e de renda, no tenha sido desenvolvido na Bahia. Porm faz grande sucesso no Rio de Janeiro e So Paulo, que o copiaram e empregam centenas de micro empresrios.

    Todas estas consideraes e muitas outras similares vm sendo feitas desde o ano de 2003 por diversas pessoas que estudam o desenvolvimento de Salvador. Mas, como diz o ditado popular, caem em ouvidos moucos.

    Quando se v o que realizado em outros estados do Nordeste, constata-se que a incompetncia administrativa, a falta de imaginao, de criatividade e de sintonia com os reais interesses da populao de Salvador, da parte das administraes municipais e estaduais, um caso calamitoso. Parece que o com-portamento e a cultura das nossas elites do sculo XIX se perpetuaram at os dias atuais. Este um verdadeiro enigma baiano. Porm, como dizia o velho governador baiano Octvio Mangabeira: pense num absurdo e na Bahia tem precedentes.

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