a ideia de liberalismo politico em j rawls

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Publicado primeiramente em: Filosofia Poltica Contempornea (Manfredo Oliveira et al., orgs.), Petrpolis, Vozes, 2003, pp. 251-270.

A Idia de Liberalismo Poltico em Rawls: Uma Concepo Poltica de Justia* Theresa Calvet de Magalhes** ([email protected])

Para Odlio Alves Aguiar Como possvel que exista e mantenha-se ao longo do tempo uma sociedade democrtica estvel e justa, composta por cidados livres e iguais, que permanecem profundamente divididos entre si por doutrinas religiosas, filosficas e morais razoveis, incompatveis entre si?1 Segundo Rawls, esta questo deveria ser formulada de uma* A primeira verso deste texto foi apresentada na Mesa Redonda Estado, Democracia e Cultura, ciclo de conferncias promovido pela Fundao Joo Pinheiro no Palcio das Artes, em Belo Horizonte, a 28 de maio de 1990. Nove anos mais tarde, uma verso inteiramente modificada foi apresentada para os alunos da disciplina Teoria Poltica no Curso de Mestrado em Cincia Poltica da UFMG, a 17 de novembro de 1999. Agradeo ao Professor Dr. Jos Eisenberg esse convite e o dilogo contnuo nos dois semestres seguintes que me permitiu retomar e completar este trabalho. ** Professora Adjunto IV do Departamento de Filosofia da UFMG (aposentada desde Agosto de 2003). 1. J. Rawls, Political Liberalism [PL] (1993, 1 ed.), New York: Columbia University Press, 1996, pp. xx, xxvii, 4, 44, 47 e 133 (todas as nossas referncias so a esta ltima edio - a edio paperback de PL). Uma sociedade, escreve Rawls, tambm pode conter doutrinas abrangentes no-razoveis [unreasonable] e irracionais, e at mesmo loucas, e o problema, ento, o de conter essas doutrinas, ou de as controlar, de tal maneira que no abalem ou destruam a unidade e justia da sociedade (PL, pp. xviii-xix). Na Introduo primeira edio de Political Liberalism, Rawls afirma que deve a Wilfried Hinsch [ver o III de sua Introduo traduo dos Gesammelte Aufstze, 1978-1989, de Rawls (Frankfurt: Suhrkamp, 1992)] a sugesto de que o liberalismo poltico teria de usar em sua formulao a idia de uma doutrina compreensiva razovel, enquanto oposta a uma doutrina compreensiva simpliciter (PL, p. xxxiii; ver tambm PL, p. 59, nota 12). Segundo Rawls, as doutrinas razoveis possuem trs caractersticas (e o que permite sua definio): 1) uma doutrina razovel um exerccio da razo terica, escreve Rawls; ela cobre os principais aspectos religiosos, filosficos e morais da vida humana, de uma maneira mais ou menos consistente e coerente, ou seja, ela organiza e caracteriza valores reconhecidos de tal modo que sejam compatveis entre si e para que expressem uma viso inteligvel do mundo; 2) na medida em que especifica quais so os valores que tm de ser considerados como particularmente importantes, e indica como ponderar esses valores quando conflitam, uma doutrina razovel tambm , diz Rawls, um exerccio da razo prtica; a razo terica e a razo prtica* (que inclui, enquanto adequado, o racional) so, assim, ao mesmo tempo usadas na formulao de uma doutrina razovel; 3) mesmo no sendo necessariamente

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maneira mais aguda da forma seguinte: Como possvel para aqueles que confessam uma doutrina religiosa que se apia na autoridade religiosa, por exemplo, a Igreja, ou a Bblia, tambm defenderem uma concepo poltica de justia que sustenta os regimes democrticos justos? (PL, p. xxxix). Este problema - o problema do liberalismo poltico2 pode ser desdobrado em duas questes fundamentais: 1) Que concepo de justia seria a mais apropriada para especificar os termos eqitativos [fair terms] da cooperao social entre cidados considerados como livres e iguais, e como membros plenamente cooperadores da sociedade no decurso de toda uma vida, de uma gerao gerao seguinte? 2) Que razes podem ser dadas em favor da tolerncia, entendida no seu sentido geral, dado o fato do pluralismo razovel - o fato de uma pluralidade de doutrinas compreensivas ou abrangentes razoveis (que podem ser religiosas e at mesmo noliberais), mas conflitantes e incomensurveis - como resultado normal do exerccio da razo humana sob condies de liberdade (ou seja, no quadro das instituies livres de um regime democrtico constitucional)?3fixa e imutvel, uma viso compreensiva razovel pertence normalmente, conclui ento Rawls, a uma tradio de pensamento e de doutrina ou, pelo menos, se apia nela; embora estvel no decorrer do tempo e no sujeita a mudanas bruscas e inesperadas, uma viso compreensiva razovel tende, observa Rawls, a evoluir lentamente em funo do que ela considera, de seu ponto de vista, como boas razes e como razes suficientes. (PL, p. 59). Para os propsitos do liberalismo poltico, esta caracterizao deliberadamente vaga (justamente para no correr o risco de ser arbitrria e intolerante) das doutrinas razoveis suficiente. Rawls evitou excluir, assim, determinadas doutrinas como no-razoveis [unreasonable]: O liberalismo poltico reconhece como razoveis [counts as reasonable] muitas doutrinas - religiosas, filosficas e morais - bem conhecidas e tradicionais, mesmo se no pudssemos seriamente admitir tais doutrinas para ns mesmos, porque pensamos que elas do um peso excessivo a alguns valores e so incapazes de admitir a importncia de outros. (PL, pp. 59-60). * Ao seguir a maneira como Kant explicita essa distino na sua Crtica da Razo Prtica, Rawls diz aqui que a razo prtica trata da produo de objetos de acordo com uma concepo desses objetos por exemplo, a concepo de um regime democrtico justo entendida como o objetivo do esforo poltico, e que a razo terica trata do conhecimento de objetos que so dados (PL, p. 93, p. 117). 2. O termo liberalismo poltico foi usado por Rawls em The Idea of an Overlapping Consensus (Oxford Journal of Legal Studies, vol. 7, n. 1 (1987), pp. 1-25, mais especificamente nas pginas 23-25) e em On the Priority of Right and Ideas of the Good (Philosophy and Public Affairs, 17 (1988), pp. 251-276, mais especificamente nas pginas 271, 273 e 275). Este termo j tinha sido introduzido nas duas ltimas divises de Justice as Fairness: Political, not Metaphysical (Philosophy and Public Affairs, vol. 14, n. 3 (1985), pp. 223-251, mais especificamente nas pginas 245-251), e encontra-se tambm em The Domain of the Political and Overlapping Consensus (New York University Law Review, vol. 64, n. 2 (1989), pp. 233255). 3. PL, pp. xviii-xix, xxvi, xlii, 3-4, 36-37, 47, 54-55, 135-136, 141, 144, 153. Para Rawls, o fato do pluralismo razovel no uma mera condio histrica que pode logo desaparecer, mas um trao permanente da cultura pblica da democracia, ou a condio normal da cultura da democracia, dadas as

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O liberalismo poltico de Rawls, que no se confunde com o liberalismo como parte de uma doutrina moral compreensiva, tenta oferecer uma resposta particular a estas duas questes fundamentais ao elaborar uma concepo poltica de justia4 que se aplica estrutura de base da sociedade5, isto , s principais instituies polticas, sociais e econmicas de uma democracia constitucional moderna e ao modo como elas se ajustam de modo a formar um esquema unificado de cooperao social ao longo do tempo.6 Essa concepo de justia poltica independente, na medida em que no elaborada como uma doutrina - ela apresentada independentemente de toda doutrina compreensiva, seja ela

suas instituies (PL, pp. xxxviii, 36, 129, 216-217); ver tambm The Idea of Public Reason Revisited [1997], in J. Rawls, Collected Papers (Cambridge (Mass.): Harvard University Press, 1999), p. 573. Para a questo de saber como um Estado liberal e democrtico pode enfrentar o desafio do pluralismo cultural, ver W. Kymlicka, Liberalism, Community and Culture (Oxford: Oxford University Press, 1989); Multicultural Citizenship (Oxford: Clarendon Press, 1995) e W. Kymlicka (ed.), The Rights of Minority Cultures (Oxford: Oxford University Press, 1995). 4. Se, em 1971, em A Theory of Justice (Cambridge (Mass.): Harvard University Press), Rawls fez uma distino entre o conceito de justia e as concepes de justia (ver 1), o que importante agora a distino entre o termo doutrina, que se refere sempre a vises ou pontos de vista abrangentes ou compreensivos (comprehensive views), e o termo concepo, que usado sempre para uma concepo poltica e suas partes componentes, tais como a concepo de pessoa como cidado livre e igual. O termo idia usado por Rawls, em Political Liberalism, como um termo geral e pode referir-se tanto a concepo, neste sentido restrito, como a doutrina, dependendo do contexto (ver J. Rawls, Political Liberalism, pp. xxxvii-xxxviii, nota 2; mas ver tambm p. 14, nota 15). A distino entre doutrina, concepo e idia continua a ser defendida por Rawls em The Idea of Public Reason Revisited [1997] (J. Rawls, Collected Papers, p. 573, nota 2). Para transformar a sua teoria da justia, tal como foi apresentada em 1971, em uma concepo poltica de justia, Rawls reformula, em Political Liberalism, as idias componentes que formam sua doutrina da justia como eqidade em concepes polticas (ver, mais especificamente, toda a Parte I e a segunda diviso da Parte II de Political Liberalism). Segundo Rawls, uma concepo poltica de justia tem trs caractersticas: embora o seu contedo seja dado por certos ideais, padres e critrios e que essas normas articulem certos valores (neste caso, valores polticos), uma concepo poltica de justia se aplica somente estrutura de base de uma democracia constitucional moderna; a sua aceitao no pressupe uma viso compreensiva particular, ou seja, uma concepo poltica da justia apresentada como uma viso independente [a freestanding view]; e as suas idias fundamentais so familiares e derivam da cultura poltica pblica de uma sociedade democrtica (PL, pp. 11-15). 5. Em Political Liberalism, Rawls presume que essa estrutura de base a de uma sociedade fechada: temos de consider-la como auto-contida [auto-contained] e sem relaes com outras sociedades. Os seus membros s entram nela ao nascer e s saem dela ao morrer. Isso nos permite falar deles como tendo nascido em uma sociedade onde levam [will lead] uma vida completa. Considerar a sociedade como fechada uma abstrao considervel, que s se justifica na medida em que nos permite focalizar certas questes fundamentais sem nos deixar distrair por detalhes [PL, p. 12]. Mas esta concepo poltica da justia foi tambm elaborada por Rawls para se aplicar ao direito e s prticas da sociedade dos povos polticos (ver Rawls, The Law of Peoples [1993]. Cambridge (Mass.): Harvard University Press, 1999) 6. Ver J. Rawls, Political Liberalism, p. Xliii, nota 7, e pp. 11-12, 257-288. No se trata aqui de um liberalismo compreensivo, ou seja, do liberalismo como parte de uma doutrina moral compreensiva, tal como as vises liberais de Kant e de John Stuart Mill (PL, p. xxxix).

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religiosa, filosfica, ou moral7 - e formula, partindo das idias polticas fundamentais (implcitas na cultura poltica de uma democracia), os valores polticos essenciais de um regime constitucional. Como mdulo ou componente essencial que se ajusta, de diferentes maneiras, a vrias doutrinas distintas, esta concepo poltica pode ser a base de um consenso em favor das instituies democrticas, um consenso proveniente de uma sobreposio (ou entrecruzamento) de doutrinas razoveis. O problema do liberalismo poltico pode tambm se formular da maneira seguinte: Como possvel que doutrinas compreensivas profundamente opostas, mas razoveis, possam coexistir e todas sustentar a concepo poltica de um regime constitucional? (PL, p. xx). O consenso que Rawls busca - um consenso por sobreposio de doutrinas razoveis (an overlapping consensus of reasonable doctrines) - no um mero modus vivendi, um compromisso entre vises conflitantes (PL, p. 147). Ou seja, no suficiente que essas doutrinas aceitem um regime democrtico meramente como um modus vivendi. As doutrinas compreensivas razoveis tm de aceitar esse regime enquanto membros de um consenso por sobreposio razovel (PL, pp. xxxiv-xl). Referindo-se aos cidados que confessam uma doutrina religiosa, Rawls pergunta agora: Como possvel para cidados que confessam uma doutrina religiosa serem plenamente membros de uma sociedade democrtica8 quando endossam uma estrutura institucional que preenche com sucesso uma7. Isso significa, diz Rawls, que a teoria da justia como eqidade tem de ser entendida como uma viso independente [a free-standing view] que expressa uma concepo poltica da justia. Ela no fornece uma doutrina especfica, religiosa, metafsica ou epistemolgica, que iria alm do que implicado pela prpria concepo poltica [PL, p. 144; ver tambm p. xliii]. Ou seja, a sua tarefa consiste justamente em separar o liberalismo poltico do liberalismo compreensivo que permanece em competio com outras vises do mundo, sejam elas religiosas, filosficas, ou morais. Segundo Ricoeur, esta tarefa considerada por Rawls como inevitvel na medida em que a complexidade crescente do mundo moderno j no oferece a possibilidade a uma viso substancial do bem ou a uma viso transcendental do justo de servir de cimento ao lao social. A nica alternativa, diz ele, seria a imposio de uma nica viso do mundo por um regime tirnico. E, nesse sentido, conclui Ricoeur, a liberdade poltica, separada de sua matriz metafsica (...) aparece como a nica sada razovel [raisonnable] diante da alternativa entre a guerra de todos contra todos e a tirania. (P. Ricoeur, Aprs Thorie de la justice de John Rawls, in Le Juste (Paris: Esprit, 1995), pp. 114-115). 8. Como uma sociedade poltica, uma sociedade democrtica no , e no pode ser, diz Rawls, uma comunidade, se entendemos por comunidade uma sociedade governada por uma doutrina compreensiva comum (PL, p. 40, nota 43, e p. 42). O fato do pluralismo razovel exclui uma tal concepo de unidade social: esta concepo deixou de ser uma possibilidade poltica para aqueles que aceitam as coeres da liberdade e tolerncia das instituies democrticas. Uma sociedade democrtica tambm no para Rawls, e no pode ser, uma associao. No entramos nela voluntariamente: s entramos em uma sociedade poltica particular ao nascer e s samos dela ao morrer (PL, pp. 40-41).

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concepo poltica liberal de justia com seus prprios ideais e valores intrnsecos, e quando no a seguem apenas tendo em vista o equilbrio das foras polticas e sociais? (PL, p. xl). Trata-se, assim, de um problema que diz respeito justia poltica em uma sociedade democrtica9, e no de um problema que se refere ao bem supremo.10 Qual seria ento a viso relativa estrutura e contedo de uma concepo poltica capaz de obter o apoio de um tal consenso por sobreposio? O construtivismo poltico de Rawls justamente uma maneira de considerar a estrutura e o contedo de uma concepo poltica de justia:os princpios da justia poltica (contedo) podem ser representados como resultado de um certo procedimento de construo (estrutura). Nesse procedimento (...), os agentes racionais, enquanto representantes de cidados e sujeitos a condies razoveis, selecionam os princpios pblicos de justia para regular a estrutura de base da sociedade. (PL, pp. 89-90).

Nesta forma de construtivismo, o que afinal construdo? Rawls responde: o contedo de uma concepo poltica de justia, ou seja, os princpios de justia selecionados pelas partes na posio original. Considerada como um dispositivo analtico de representao, a prpria posio original construda? No, responde Rawls, ela simplesmente posta [it is simply laid out] (PL, p. 103). Ou, dito de outro modo, a posio original um dispositivo analtico utilizado para formular uma conjectura. Que conjectura?A conjectura que quando perguntamos Quais so os princpios mais razoveis de justia poltica para uma democracia constitucional cujos cidados so considerados como livres e iguais, razoveis e racionais? a resposta que esses princpios so9. Ou ainda, como esclarece Rawls: O problema do liberalismo poltico o de elaborar [work out] uma concepo poltica da justia poltica para um regime [liberal] democrtico constitucional, [uma concepo poltica] que uma pluralidade de doutrinas razoveis, tanto religiosas como no-religiosas, liberais e noliberais, pode livremente endossar [endorse] (PL, pp. xl-xli). Dado o fato do pluralismo razovel na vida poltica, esta maneira de apresentar o liberalismo parece muito natural e, por isso mesmo, Rawls estranha que o liberalismo poltico no tenha sido elaborado mais cedo (ver PL, p. 374, nota 1). 10 A idia da prioridade do justo sobre o bem j tinha sido defendida por Rawls, em 1971, em A Theory of Justice. A prioridade do justo sobre o bem no pressupe, diz agora Rawls, uma concepo particular da pessoa, nem mesmo a que foi apresentada na Parte III de A Theory of Justice. Ou seja, a prioridade do justo sobre o bem no para Rawls a aplicao da filosofia moral kantiana poltica, mas uma resposta prtica ao fato bem conhecido que as pessoas nas sociedades democrticas modernas de fato discordam sobre o bem. Ela apresentada por Rawls, a partir de 1988 (The Priority of Right and Ideas of the Good in Justice as Fairness), como sendo um elemento essencial do seu liberalismo poltico, e tem um papel central na concepo particular da justia como eqidade, que , ela mesma, enquanto concepo poltica, uma forma desse liberalismo (ver PL, pp. 172-211).

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dados por um dispositivo de representao no qual as partes racionais (enquanto mandatrios [trustees] dos cidados, um para cada cidado livre e igual) esto situadas em condies razoveis e absolutamente sujeitas a essas condies. Assim, os cidados livres e iguais so considerados como chegando eles prprios a um acordo sobre esses princpios polticos sob condies que representam esses cidados como sendo ao mesmo tempo razoveis e racionais. (PL, p. 381).

O acordo entre as partes acerca dos princpios mais razoveis de justia poltica para uma democracia constitucional, que se realiza atravs deste procedimento construtivista, estabelece uma conexo entre esses princpios polticos e a concepo de pessoa representada pela posio original. desse modo, diz Rawls, que o contedo dos termos eqitativos de cooperao, para as pessoas assim concebidas, determinado (PL, p. 305). Cada cidado , assim, eqitativamente representado neste procedimento um procedimento atravs do qual so selecionados os princpios de justia para regular a estrutura de base da sociedade no apenas porque o procedimento da posio original situa as partes simetricamente e as sujeita a coaes que expressam o razovel, mas porque as partes so representantes racionalmente autnomos cujas deliberaes expressam o racional (PL, p. 324). Considerar ento a teoria da justia como eqidade como tentando derivar o razovel do racional mal interpretar a posio original (PL, p. 53). Para Rawls, a posio original simplesmente um dispositivo analtico, ou seja, como ele disse logo no incio de Political Liberalism, ela descreve as partes, cada uma das quais responsvel pelos interesses essenciais de um cidado livre e igual, como eqitativamente situadas e como chegando a um acordo sujeito a condies que limitam adequadamente o que elas podem apresentar como boas razes (PL, p. 25). Rawls recusa aqui a interpretao, que ele tinha autorizado em A Theory of Justice, segundo a qual a sua teoria da justia seria uma parte da teoria da escolha racional (p.53, nota 7). Na teoria da justia como eqidade, tal como foi reformulada por Rawls como parte de uma concepo poltica de justia, o razovel e o racional so considerados como duas idias bsicas distintas e independentes. Distintas, porque no se trata de derivar uma da outra: a teoria da justia como eqidade, insiste agora Rawls, no tenta derivar o razovel do racional (PL, p. 51). Temos de lembrar aqui que Rawls busca uma concepo poltica de justia para uma sociedade democrtica considerada como um sistema de cooperao eqitativo entre

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cidados livres e iguais que, enquanto politicamente autnomos, aceitam voluntariamente os princpios de justia, publicamente reconhecidos, que especificam os termos eqitativos da cooperao. No quadro dessa idia fundamental de sociedade como um sistema eqitativo de cooperao social, o razovel e o racional so idias complementares:Cada uma delas um elemento nessa idia fundamental [a idia de sociedade como um sistema eqitativo de cooperao social] e cada uma delas relaciona-se com sua faculdade moral distinta, a capacidade de formar um sentido de justia [que aqui a capacidade de respeitar os termos eqitativos da cooperao social] e a capacidade de formar e sustentar uma concepo do bem. (...). Como idias complementares, nem o razovel nem o racional podem subsistir um sem o outro. Agentes meramente razoveis no teriam fins prprios que desejariam promover atravs da cooperao eqitativa; agentes meramente racionais seriam desprovidos do sentido de justia e seriam incapazes de reconhecer a validade independente das pretenses de outros. (PL, p. 52).11

No contexto de uma concepo poltica de justia, Rawls associa, em primeiro lugar, o razovel com a disposio [willingness] para propor termos eqitativos [fair terms] de cooperao e para honr-los caso tambm sejam respeitados por outros, e, em segundo lugar, com a disposio [willingness] para reconhecer os nus do juzo [the burdens of judgment] e aceitar suas conseqncias no uso da razo pblica para dirigir o exerccio legtimo do poder poltico em um regime constitucional (PL, p. 54; e p. 49, nota 1). O razovel, insiste Rawls, pblico de uma maneira que o racional no o , e isso significa que pelo razovel que entramos como iguais no mundo pblico de outros e estamos prontos para propor, ou para aceitar, dependendo do caso, termos eqitativos de cooperao com eles. Esses termos, postos como princpios, especificam as razes que temos de partilhar e reconhecer publicamente, uns perante os outros, como fundando nossas relaes sociais (PL, p. 53). O que falta, ento, aos agentes racionais a forma particular11. Esta distino entre o razovel (reasonable) e o racional (rational), que paralela distino feita por Kant na sua Fundao para a Metafsica dos Costumes [Grundlegung zur Metaphysik der Sitten] (1783), entre o imperativo categrico (o imperativo de moralidade) e os imperativos hipotticos (os imperativos tcnicos (ou regras) da habilidade e os imperativos pragmticos (ou conselhos) da prudncia) (Ak 4, pp. 414-421), foi defendida por W. M. Sibley em The Rational Versus the Reasonable, Philosophical Review, 62 (1953), pp. 554-560, e Rawls afirma no apenas que concorda com a distino de Sibley, tal como ela apresentada de forma resumida, nesse texto, na p. 560, mas que essa distino fundamental para a compreenso de toda a estrutura da justia como eqidade (PL, p. 49, nota 1); ver tambm J. Rawls, Justice as Fairness: A Restatement [1989-1990]. Erin Kelly (ed.). Cambridge (Mass.): Harvard University Press, 2001, p. 7 ( nota 6).

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de sensibilidade moral que est subjacente ao desejo de se engajar na cooperao eqitativa [fair cooperation] enquanto tal, e de faz-lo em termos que outros como iguais poderiam razoavelmente aprovar (PL, p. 51). Rawls no presume que o razovel constituiria a totalidade da sensibilidade moral; mas o razovel inclui, segundo ele, a parte que faz a conexo com a idia de cooperao social eqitativa (PL, p. 51). Toda a importncia de uma concepo poltica construtivista, diz Rawls, reside em sua conexo com o fato do pluralismo razovel e a necessidade, para uma sociedade democrtica, de assegurar a possibilidade de um consenso por sobreposio em relao a seus valores polticos fundamentais. (PL, 90). justamente porque uma tal concepo poltica desenvolve os princpios de justia a partir das idias pblicas e compartilhadas de sociedade como um sistema eqitativo de cooperao no tempo, de gerao em gerao, e de cidados como livres e iguais, que ela pode ser o foco de um consenso por sobreposio de doutrinas compreensivas razoveis. Considerada como uma resposta primeira questo fundamental Que concepo de justia seria a mais apropriada para especificar os termos eqitativos da cooperao social entre cidados considerados como livres e iguais, e como membros plenamente cooperadores da sociedade no decurso de toda uma vida, de uma gerao gerao seguinte?- a teoria da justia como eqidade tenta decidir o conflito entre a tradio associada a Locke e a tradio associada a Rousseau (um conflito que pertence prpria tradio do pensamento democrtico)12 no apenas ao propor dois princpios de justia que orientam o modo como as instituies de base devem realizar os valores da liberdade e da igualdade, mas tambm ao especificar um ponto de vista a partir do qual estes dois princpios podem ser considerados como sendo mais adequados do que outros idia de cidados democrticos vistos como pessoas livres e iguais.13 Segundo Rawls, os dois princpios de justia devem ser enunciados da maneira seguinte:12. Ou seja, entre a tradio que atribui um maior peso ao que Benjamin Constant chamava a liberdade dos Modernos ou seja, a liberdade de pensamento e de conscincia, certos direitos fundamentais da pessoa e o direito de propriedade, assim como o Estado de direito [rule of law] - e a tradio que privilegia a liberdade dos Antigos, ou seja, a igualdade das liberdades polticas e os valores da vida pblica (PL, p. 5). 13. Para Ricoeur, essa reduo do campo de significao da pessoa ao cidado de uma democracia constitucional , de fato, muito liberante (Cf. P. Ricoeur, Aprs Thorie de la justice de John Rawls, in Le Juste, p. 115).

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a. Toda pessoa tem uma pretenso igual [an equal claim]14 a um esquema plenamente adequado de direitos e de liberdades de base iguais, um esquema que seja compatvel com o mesmo esquema para todos; e neste esquema, o justo valor das liberdades polticas iguais, e somente destas liberdades, deve ser garantido. b. As desigualdades sociais e econmicas devem satisfazer a duas condies: primeiro, devem estar ligadas a posies e cargos abertos a todos, em condies de igualdade eqitativa de oportunidades; e, segundo, devem proporcionar o maior benefcio aos membros menos favorecidos da sociedade. (PL, pp. 5-6).15

Cada um destes princpios regula ou governa instituies em um domnio particular no apenas no que diz respeito aos direitos, liberdades e oportunidades de base, mas tambm no que diz respeito s pretenses de igualdade. A segunda parte do segundo princpio o princpio de diferena acentua o valor dessas garantias institucionais.(PL, p. 6). Os dois princpios de justia o primeiro tendo prioridade sobre o segundo governam juntos as instituies de base que realizam esses valores, e so considerados, em Political Liberalism, como exemplificando o contedo de uma concepo (liberal) poltica da justia. Rawls no abandona aqui a sua concepo igualitarista de justia. Os dois princpios de justia expressam uma forma de liberalismo, que igualitarista em virtude dos trs elementos seguintes: a) a garantia do valor eqitativo das liberdades polticas, de tal modo que estas no so simplesmente formais; b) a igualdade eqitativa (e, portanto, no simplesmente formal) de oportunidades; e c) o assim-chamado princpio de diferena, que diz que as desigualdades sociais e econmicas ligadas a cargos e posies devem ser ajustadas de modo a que, seja qual for o nvel destas desigualdades, pequeno ou grande, possam proporcionar o maior benefcio aos membros menos favorecidos da sociedade.

14. Ou seja, tem igual direito a esse esquema de direitos e de liberdades de base; Rawls diz tambm: Toda pessoa tem a mesma pretenso irrevogvel a (...) [Each person has the same indefeasible claim to (...)] (J. Rawls, Justice as Fairness: A Restatement, p. 42). 15. Esta formulao dos dois princpios de justia difere da maneira como foram formulados em 1971, em A Theory of Justice, e est mais prxima da formulao apresentada, em 1982, em The Basic Liberties and Their Priority (Tanner Lectures on Human Values. Vol. III. Salt Lake City: University of Utah Press, p. 5). As razes destas modificaes so examinadas por Rawls na conferncia VIII, de Political Liberalism, p, 347 e pp. 391-395. A conferncia VIII, de Political Liberalism, uma verso consideravelmente revisada da Tanner Lecture, ministrada por Rawls na Universidade de Michigan, no ms de abril de 1981 (publicada em 1982), que pretende responder s objees feitas por Herbert L. A. Hart na sua resenha crtica de A theory of Justice (Rawls on Liberty and its Priority, in N. Daniels, Reading Rawls [1975] (New York: Basic Books, 1989), pp. 230-252).

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(PL, pp. 6-7). Todas as modificaes introduzidas em Political Liberalism no afetam, diz Rawls, esta caracterstica de sua concepo da justia (PL, p. 7). O objetivo da teoria da justia como eqidade prtico: ela no se apresenta como uma doutrina compreensiva, nem como uma concepo verdadeira, mas se apresenta como uma concepo de justia que pode ser partilhada por cidados enquanto base de um acordo poltico voluntrio, informado e discutido [reasoned]. Ela expressa a razo poltica, a razo pblica e compartilhada, dos cidados. (PL, p. 9). Mas para atingir essa razo pblica, diz Rawls, a concepo de justia teria de ser, na medida do possvel, independente das doutrinas filosficas e religiosas doutrinas conflitantes e opostas - que os cidados admitem. (PL, p. 9). Ao formular uma tal concepo de justia, conclui ento Rawls, o liberalismo poltico aplica o princpio de tolerncia prpria filosofia, ou seja, lega aos prprios cidados a tarefa de resolver as questes que dizem respeito religio, filosofia e moral, de acordo com vises que eles defendem livremente. (PL, p. 154). O liberalismo poltico busca, assim, uma concepo poltica de justia que possa, o que se espera, obter o apoio de um consenso por sobreposio de doutrinas compreensivas razoveis numa sociedade governada ou regulada por ela. Conseguir esse apoio de doutrinas religiosas, filosficas e morais razoveis fornece ento a base para responder segunda questo fundamental: como cidados, que permanecem profundamente divididos entre si por doutrinas religiosas, filosficas e morais razoveis, podem ainda assim manter uma sociedade democrtica, justa e estvel? E Rawls responde que normalmente desejvel que as vises compreensivas (...), que usamos habitualmente quando discutimos questes polticas fundamentais, sejam abandonadas na vida pblica. A razo pblica, ou seja, a forma de raciocinar apropriada a cidados livres e iguais, agora melhor orientada por uma concepo poltica cujos princpios e valores podem ser endossados por todos os cidados. (PL, p. 10). Enquanto concepo poltica, a justia como eqidade visa a ser o foco de um consenso por sobreposio, ou seja, o liberalismo poltico espera constituir uma base pblica de justificao para a estrutura de base de uma democracia constitucional procedendo a partir de idias fundamentais, implcitas na cultura poltica pblica, e fazendo abstrao das doutrinas compreensivas. O terreno comum que ele busca a prpria concepo poltica de justia enquanto foco de um consenso por sobreposio. Mas isso

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no significa que o liberalismo poltico no possa defender algumas formas do carter moral e encorajar algumas virtudes morais. Segundo Rawls, a teoria da justia como eqidade compreende tambm uma considerao de certas virtudes polticas as virtudes da cooperao social eqitativa, tais como as virtudes de civilidade e tolerncia, a virtude de razoabilidade e o sentido de eqidade (PL, p.157). O que crucial para uma concepo poltica de justia que ela no conduza, ao admitir essas virtudes, ao estado perfeccionista de uma doutrina compreensiva. Quando estas virtudes da cooperao poltica espalham-se na sociedade e sustentam a sua concepo poltica de justia, diz Rawls, elas constituem um grande bem pblico [a very great public good], uma parte do capital poltico da sociedade. (PL, p. 157). Como uma forma de liberalismo poltico, a teoria da justia como eqidade perfeitamente consistente com o republicanismo clssico:O republicanismo clssico , a meu ver, a viso de que, para poder preservar suas

liberdades e seus direitos fundamentais, incluindo as liberdades civis [civil liberties] que asseguram as liberdades da vida privada, os cidados de uma sociedade democrtica tambm tm de possuir, em um grau suficiente, as virtudespolticas (tal como eu as denominei) e estarem dispostos [be willing] a participar da vida pblica. A idia que sem uma larga participao de um corpo vigoroso e informado de cidados na poltica democrtica, e certamente com uma retirada geral e um refgio na vida privada, at mesmo as mais bem-projetadas instituies polticas cairo nas mos daqueles que buscam dominar e impor sua vontade atravs do aparelho de Estado, seja por sede de poder e de glria militar, ou por razes de interesse econmico ou de classe, para no mencionar o fervor religioso expansionista e o fanatismo nacionalista. A garantia das liberdades democrticas exige a participao ativa de cidados que possuem as virtudes polticas necessrias para manter um regime democrtico (PL, p. 205).16

No haveria, portanto, nenhuma oposio entre o republicanismo clssico, assim entendido, ou seja, como uma viso que no pressupe uma doutrina compreensiva, religiosa, filosfica, ou moral, e o liberalismo poltico de Rawls. Mas a teoria da justia como eqidade, considerada como uma forma de liberalismo poltico, rejeita o humanismo cvico. No seu sentido pleno, o humanismo cvico para Rawls, por definio, uma forma de aristotelismo:[O humanismo cvico], como uma forma de aristotelismo, s vezes enunciado como a viso que sustenta que o homem um animal social e at mesmo poltico, cuja16. Ver tambm J. Rawls, Justice as Fairness: A Restatement, p. 144.

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natureza essencial realizada mais plenamente em uma sociedade democrtica onde existe uma participao larga e intensa na vida poltica. A participao no encorajada como necessria proteo das liberdades fundamentais da cidadania democrtica, e como sendo ela mesma uma forma do bem entre outras, por mais importante que seja para muitas pessoas. Ao contrrio, tomar parte ativamente na vida pblica de uma democracia considerado como o lugar [locus] privilegiado da vida boa. Isso consiste em voltar a dar um papel central quilo que [Benjamin] Constant chamava de liberdade dos antigos, e tem todos os seus defeitos. (PL, p. 206).

Rawls considera, assim, o humanismo cvico como uma doutrina filosfica compreensiva e, nesse sentido, ela incompatvel com a concepo poltica de justia que ele defende em Political Liberalism. Podemos agora resumir o debate de 1995 de Habermas com Rawls. Em Reconciliation Through the Public Use of Reason: Remarks on John Rawlss Political Liberalism17, Habermas afirma logo no incio, antes de tecer suas trs crticas bsicas teoria da justia de Rawls, no apenas que admira a tentativa de Rawls, em Political Liberalism, de dar uma resposta s posies contextualistas que contestam a pressuposio de uma razo comum a todos os homens, mas que partilha a inteno bsica desse projeto e considera como corretos os seus resultados mais importantes. Ou seja, o desacordo que ele expressa permanece aqui no quadro estreito de uma querela de famlia. 18 As dvidas de Habermas limitam-se ento questo de saber se Rawls afirma sempre as suas importantes

17. J. Habermas, Reconciliation Through the Public Use of Reason: Remarks on John Rawlss Political Liberalism, Journal of Philosophy, vol. 92, n. 3 (1995), pp. 109-131. A verso alem deste texto (Vershnung durch ffentlichen Vernunftgebrauch), assim como a rplica de Habermas resposta de Rawls, foi publicada em 1996, em J. Habermas, Die Einbeziehung des Anderen. Studien zur politischen Theorie (Frankfurt:Suhrkamp); traduo inglesa de Ciaran Cronin: Reconciliation through the Public Use of Reason e Reasonable versus True, or the Morality of Worldviews, The Inclusion of the Other. Studies in Political Theory. Cambridge (Mass.): The MIT Press, 1998, pp. 49-73, e pp. 75-101 (daqui em diante: The Inclusion of the Other). A resposta de Rawls ao primeiro texto de Habermas (Reply to Habermas), publicada no Journal of Philosophy, vol. 92, n. 3, 1995 (pp. 132-180), encontra-se na edio paperback de Political Liberalism (1996), pp. 374-434 (todas as nossas referncias so a esta edio). 18. Cf. J. Habermas, The Inclusion of the Other, pp. 49-50. Ver tambm Manfredo A. Oliveira, O Debate Acerca da Fundamentao de uma Teoria da Justia: Rawls e Habermas, e Luiz B. L. Arajo, Uma Questo de Justia: Habermas, Rawls e MacIntyre, in Snia T. Felipe (org.), Justia Como Eqidade. Fundamentao e interlocues polmicas (Kant, Rawls, Habermas) [Anais do Simpsio Internacional sobre a justia realizado na Universidade Federal de Santa Catarina, em Florianpolis, de 18 a 22 de agosto de 1997]. Florianpolis: Insular, 1998, pp. 87-102; e pp. 209-230; Jean-Marc Ferry, Philosophie de la communication. T. II: Justice politique et dmocratie procdurale. Paris: Cerf, 1994; e Nythamar F. Oliveira, Critique of Public Reason Revisited: Kant as Arbiter between Rawls and Habermas, Veritas, vol. 45, n. 4 , 2000, pp. 583-606.

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intuies normativas da maneira a mais convincente. Habermas retoma rapidamente, num nico pargrafo, o projeto de Rawls tal como ele se apresenta em Political Liberalism, e afirma que a sua crtica a alguns aspectos da prpria execuo desse projeto construtiva e imanente:Rawls tenta fundar os princpios em funo dos quais uma sociedade moderna tem de ser organizada para garantir a cooperao eqitativa entre os seus cidados considerados como pessoas livres e iguais. O seu primeiro passo consiste em elucidar o ponto de vista a partir do qual representantes fictcios dos cidados seriam capazes de dar uma resposta imparcial a essa questo. Ele explica as razes pela quais as partes, na assim-chamada posio original, chegariam a um acordo sobre dois princpios: primeiro, sobre o princpio liberal de acordo com o qual toda pessoa tem direito a um sistema igual de liberdades de base, e, segundo, sobre um princpio subordinado que estabelece o acesso igual aos cargos pblicos e estipula que as desigualdades sociais s so aceitveis quando so para o benefcio dos cidados menos favorecidos. Em um segundo passo, Rawls mostra que esta concepo espera mesmo alcanar um acordo sob condies de um pluralismo que ela prpria favorece. O liberalismo poltico, [considerado] como uma construo razovel que no levanta uma pretenso quanto verdade, neutro em relao a vises de mundo conflitantes. Em um terceiro e ltimo passo, Rawls esboa os direitos fundamentais e os princpios do Estado constitucional que podem ser derivados dos dois princpios de justia. Ao seguir a seqncia destes trs passos, apresentarei objees dirigidas no tanto ao projeto enquanto tal, mas a certos aspectos de sua execuo. (...). A minha crtica construtiva e imanente. (The Inclusion of the Other, p. 50).

A primeira objeo de Habermas diz respeito posio original tal como ela caracterizada por Rawls: esse dispositivo, em todos os seus aspectos, realmente apropriado para esclarecer e garantir o ponto de vista da apreciao imparcial que inerente aos princpios de justia deontolgicos? A segunda objeo afirma que seria necessrio fazer uma distino mais ntida entre questes de justificao e questes de aceitao. Rawls parece querer, segundo Habermas, obter a neutralidade de sua concepo de justia ao preo de um abandono de sua pretenso de validade cognitiva. Na sua terceira objeo crtica, Habermas resume o resultado da estratgia terica adotada por Rawls uma construo do Estado constitucional que subordina o princpio democrtico de legitimao aos direitos fundamentais de tipo liberal e afirma que Rawls solapa, assim, o seu objetivo que era o de conciliar a liberdade dos Modernos com a liberdade dos Antigos. E ele conclui as suas observaes crticas como uma tese sobre o auto-entendimento da filosofia poltica: em condies de pensamento ps-metafsico, este [auto-entendimento da filosofia

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poltica] deveria ser modesto, mas no do modo errado (The Inclusion of the Other, pp. 50-51). Habermas lamenta ter sido obrigado, para atender a solicitao do editor do Journal of Philosophy, a transformar em objees crticas o que no fundo seriam apenas algumas reservas. No que diz respeito primeira crtica, toda a fora do argumento de Habermas diluda na medida em que ele afirma logo, e repete ao longo deste texto e na sua rplica a Rawls:Reasonable versus True, or the Morality of Worldviews (1996)19- que [p]ara a construo da posio original, Rawls (...), que a construo de uma posio original (...), que [e]ste procedimento pode explicar-se sem recorrer aos conceitos (...) que Rawls utiliza na construo da posio original, e que a construo de uma posio original que molda, de uma maneira razovel, a liberdade de escolha de atores racionais, explica-se afinal pela inteno, seguida desde o incio, de apresentar a teoria da justia como uma parte da teoria geral da escolha racional (The Inclusion of the Other, pp. 51, 52, 59; grifos nossos). A posio original, como vimos mais acima, no construda mas simplesmente posta. Ou seja, a posio original um dispositivo analtico utilizado por Rawls para formular uma conjectura: descreve as partes racionais (enquanto mandatrios dos cidados, um para cada cidado livre e igual) como estando eqitativamente situadas e como chegando a um acordo sujeito a condies (razoveis) que limitam adequadamente o que elas podem apresentar como boas razes (PL, p. 25). Os cidados livres e iguais so considerados como chegando eles prprios a um acordo sobre os princpios de justia poltica sob condies que representam esses cidados como sendo ao mesmo tempo razoveis e racionais. A teoria da justia como eqidade no considerada por Rawls como uma parte da teoria da escolha racional: no se trata de derivar princpios razoveis de justia a partir do conceito de racionalidade considerado como o nico conceito normativo (PL, p. 53).20 Nem tudo construdo na forma de construtivismo explicitada por Rawls em Political Liberalism, ou seja, no seu construtivismo poltico: (...) somente os princpios substantivos que especificam o contedo do justo poltico e da justia poltica so construdos. O prprio procedimento simplesmente posto, utilizando como pontos de

19. J. Habermas, The Inclusion of the Other, p. 81.

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partida as concepes fundamentais de pessoa e de sociedade, os princpios da razo prtica, e o papel pblico de uma concepo poltica de justia. (PL, p. 104). No plano procedimental, a teoria da justia como eqidade no neutra, na medida em que seus princpios de justia so substantivos e expressam algo mais do que simples valores procedimentais. Enquanto concepo poltica, ela visa a ser o foco de um consenso por sobreposio. Rawls faz aqui uma distino entre a neutralidade procedimental e a neutralidade do objetivo visado: Enquanto uma concepo poltica para a estrutura de base, a [teoria da] justia como eqidade, no seu conjunto, tenta fornecer um terreno comum como o foco de um consenso por sobreposio. Ela tambm espera satisfazer a neutralidade do objetivo no sentido em que as instituies de base e as polticas pblicas no devem ser projetadas para favorecer alguma doutrina compreensiva particular. (PL, pp. 193-194). todo o construtivismo poltico de Rawls que teria de ser aqui explicitado. Deixo de lado, portanto, toda a primeira objeo crtica de Habermas a Rawls. Na sua segunda observao crtica, Habermas formula duas questes. A primeira diz respeito ao prprio papel do consenso por sobreposio: este consenso acrescenta algo justificao de uma concepo poltica de justia, ou serve apenas para explicitar uma condio necessria da estabilidade social? Segundo Habermas, Rawls no teria feito uma distino ntida entre a aceitabilidade racional da sua concepo de justia poltica e sua aceitao efetiva. A segunda questo diz respeito ao sentido que foi dado por Rawls, no contexto do seu liberalismo poltico, ao termo razovel. Rawls usa esse termo para designar a validade dos juzos morais, ou simplesmente para expressar uma atitude reflexiva de tolerncia esclarecida? (The Inclusion of the Other, p. 60). Para Rawls, a resposta a estas duas questes, intimamente relacionadas, reside na maneira como o liberalismo poltico especifica trs tipos diferentes de justificao (a justificao pro tanto, a justificao plena, e a justificao pblica) e dois tipos de consenso, e como ele ento os relaciona com a idia de estabilidade e com a idia de legitimidade (Reply to Habermas, PL, pp. 385-386). Em primeiro lugar, e Rawls est se referindo aqui razo pblica, ou seja, ao uso pblico da razo nos debates pblicos de cidados livres e iguais sobre o bem pblico e as20. Rawls acredita que, no seu conjunto, a sua obra de 1971 (A Theory of Justice) sustenta esta interpretao. Ver tambm J. Rawls, Justice as Fairness: A Restatement, p. 82, nota 2.

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questes fundamentais de justia, a justificao da concepo poltica de justia s leva em conta valores polticos partilhados por cidados livres e iguais. Rawls presume que essa concepo poltica completa, ou seja, que os valores polticos que ela especifica podem ser convenientemente ordenados ou equilibrados, de tal modo que somente esses valores proporcionam uma resposta razovel uma resposta dada pela razo pblica - a todas ou a quase todas as questes que envolvem essenciais constitucionais (por exemplo, os direitos polticos e as liberdades polticas que razoavelmente podem ser includos em uma constituio escrita, presumindo aqui que ela pode ser interpretada por uma suprema corte) e alguns pontos de justia fundamental no cobertos por uma constituio. Esse seria o sentido [meaning] da justificao pro tanto: Ao examinar um vasto leque de questes polticas para saber se uma concepo poltica pode sempre oferecer uma resposta razovel, podemos conferir se ela parece completa. Mas como a justificao poltica pro tanto, ela pode ser derrogada pelas doutrinas compreensivas do cidado quando todos os valores so contados. (Reply to Habermas, PL, p. 386).21 Em segundo lugar, e trata-se agora da justificao plena [full justification] da concepo poltica de justia que levada a cabo por um cidado individual enquanto membro da sociedade civil (e Rawls presume que cada cidado sustenta no apenas uma concepo poltica mas tambm uma doutrina compreensiva), o cidado aceita uma concepo poltica, diz Rawls, e completa a sua justificao ao enquadrar de uma maneira ou de outra essa concepo, enquanto verdadeira ou razovel, na doutrina compreensiva que este cidado sustenta, segundo o que essa doutrina autoriza. Alguns cidados, diz ainda Rawls, podem considerar uma concepo poltica como plenamente justificada, mesmo se os outros no a aceitam: a cada cidado (individualmente ou em associao com outros) dado, assim, dizer como as pretenses de justia poltica devem ser ordenadas, ou ponderadas, em relao a valores no-polticos. No que diz respeito a esses valores nopolticos, a concepo poltica de justia no oferece aqui nenhuma orientao. Contudo, insiste ainda Rawls, mesmo que uma concepo poltica de justia seja independente, isso no significa que ela no possa ser enquadrada ou mapeada [mapped], ou inserida21. Cf. PL, pp l-lvii; ver tambm J. Rawls, The Idea of Public Reason Revisited [1997], Collected Papers, pp. 573-615.

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enquanto mdulo nas diferentes doutrinas que os cidados sustentam. (Reply to Habermas, PL, p. 387). Finalmente, diz Rawls, temos a justificao pblica da concepo poltica pela sociedade poltica:Isso uma idia de base do liberalismo poltico, indissocivel das trs outras: as de um consenso razovel por sobreposio, de estabilidade pelas boas razes, e de legitimidade. A justificao pblica ocorre quando todos os membros razoveis da sociedade poltica levam a cabo uma justificao da concepo poltica partilhada, ao enquadr-la em suas vrias vises compreensivas razoveis. Neste caso, cidados razoveis levam em conta uns aos outros como tendo doutrinas compreensivas razoveis que endossam essa concepo poltica, e este levar em conta mtuo molda a qualidade moral da cultura pblica de uma sociedade poltica. (Reply to Habermas, PL, p. 387).

Rawls insiste aqui num ponto que ele considera crucial: embora, para a sociedade poltica, a justificao pblica da concepo poltica depende das doutrinas compreensivas razoveis, esta justificao s depende dessas doutrinas de maneira indireta, ou seja, os contedos expressos dessas doutrinas no tm um papel normativo na justificao pblica; os cidados no consideram o contedo das doutrinas dos outros, e permanecem assim nos limites do poltico. Ou, mais exatamente, a nica coisa que eles levam em conta e qual do um certo peso, o fato a existncia do prprio consenso razovel por sobreposio. (Reply to Habermas, PL, p. 387). A justificao pblica um caso fundamental para o liberalismo poltico: para Rawls, a concepo poltica de justia da sociedade poltica s pode ser publicamente embora nunca definitivamente justificada, quando existe um consenso razovel por sobreposio. No liberalismo poltico de Rawls, a idia fundamental de justificao pblica est no apenas intimamente ligada idia de consenso razovel por sobreposio mas conectase tambm com as idias de estabilidade pelas boas razes e legitimidade. Rawls desenvolve agora mais detalhadamente estas trs idias. Em primeiro lugar, para evitar qualquer mal-entendido, Rawls diferencia duas idias de consenso: a idia de consenso advinda da poltica cotidiana e idia de consenso em Political Liberalism. A primeira diz respeito ao acordo que um poltico busca: ao considerar diversos interesses e pretenses existentes, um poltico tenta chegar a uma coalizo ou a um plano de ao que todos, ou um

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nmero suficiente de pessoas, podem sustentar para obter uma maioria. Essa idia de consenso , portanto, a idia de uma sobreposio [an overlap] j presente ou latente. A idia muito diferente de consenso, defendida por Rawls em Political Liberalism a idia de um consenso razovel por sobreposio a de que a concepo poltica de justia elaborada primeiro como uma viso independente que pode ser justificada pro tanto sem considerar as doutrinas compreensivas existentes, ou tentar se ajustar a elas, ou nem mesmo saber o que so. Esta idia de consenso tenta, assim, no colocar obstculos no caminho de todas as doutrinas razoveis que endossam uma concepo poltica, ao eliminar nesta concepo toda idia que vai alm do domnio do poltico, e das quais no se poderia razoavelmente esperar que sejam endossadas por todas as doutrinas razoveis. Quando a concepo poltica conforme a essas condies e tambm completa, diz Rawls, esperamos que as doutrinas compreensivas razoveis, sustentadas pelos cidados razoveis na sociedade, so capazes de dar suporte a essa concepo (Reply to Habermas, PL, p. 389).22 Segundo Rawls, numa sociedade democrtica marcada pelo pluralismo razovel, o fato de mostrar que a estabilidade pelas boas razes pelo menos possvel tambm uma parte da justificao pblica: quando cidados sustentam doutrinas compreensivas razoveis, embora diferentes, examinar se um consenso por sobreposio sobre a concepo poltica possvel uma maneira de testar se existem razes suficientes para propor a teoria da justia como eqidade (ou uma outra doutrina razovel) que podem ser sinceramente defendidas diante de outras pessoas sem que seja necessrio criticar ou rejeitar seus mais profundos engajamentos religiosos ou filosficos. E se podemos estabelecer que existem razes adequadas para diversos cidados razoveis sustentar juntos a teoria da justia como eqidade enquanto sua concepo poltica efetiva, diz Rawls, ento as condies que lhes permitem exercer legitimamente um poder poltico coercitivo uns sobre os outros algo que inevitavelmente fazemos enquanto cidados ao votar ou de uma outra maneira esto preenchidas. Ou seja, apesar do fato do pluralismo razovel, as condies para a legitimidade democrtica esto preenchidas. E Rawls pode ento afirmar que dada uma sociedade poltica com um tal consenso razovel, o liberalismo poltico diz22. Cf. PL, p. 39-40, 133-172.

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que como cidados desta sociedade alcanamos a mais profunda e a mais razovel base de unidade social que nos acessvel [dado o fato do pluralismo razovel] numa democracia moderna (Reply to Habermas, PL, pp. 390-391). Em que sentido Rawls usa ento aqui o termo razovel? A resposta de Rawls breve:O liberalismo poltico no usa o conceito de verdade moral aplicado aos seus prprios juzos polticos (sempre morais). Diz aqui que os juzos polticos so razoveis ou no-razoveis; e expe ideais, princpios e padres enquanto critrios do razovel. Esses critrios por sua vez conectam-se com as duas caractersticas fundamentais das pessoas razoveis enquanto cidados (...). O uso do conceito de verdade no rejeitado ou questionado, mas deixado para as doutrinas compreensivas, que o podem usar, rejeitar, ou usar uma outra idia em vez desse conceito. E, finalmente, o razovel expressa, claro, uma atitude reflexiva em relao tolerncia, na medida em que reconhece os nus dos juzos, e isso por sua vez conduz liberdade de conscincia e de pensamento. (Reply to Habermas, PL, pp. 394-395).

A resposta de Rawls terceira objeo crtica de Habermas consiste em defender mais uma vez o modo como entende o liberalismo. Na teoria da justia como eqidade, considerada como uma forma de liberalismo poltico, a autonomia pblica e a autonomia privada so igualmente co-originrias e tm igual importncia, nenhuma sendo exteriormente imposta outra; ou seja, a teoria da justia como eqidade reconhece a conexo interna entre a liberdade dos Modernos e a liberdade dos Antigos. Como? s recordar aqui, diz Rawls, o que ocorre na sociedade civil quando os cidados discutem e aceitam os mritos da posio original e dos princpios que seriam a presumivelmente selecionados: As partes enquanto mandatrios [trustees] dos cidados [um para cada cidado livre e igual] no selecionam princpios de justia para especificar o esquema de liberdades (de base) que melhor protege e favorece os interesses fundamentais dos cidados, e que eles em seguida concedem uns aos outros? (...) No primeiro princpio de justia, as liberdades da autonomia pblica e da autonomia privada so ajustadas uma outra sem ser hierarquizadas. Estas liberdades so co-originrias por uma razo suplementar: as duas espcies de liberdade esto enraizadas em uma das duas faculdades morais, ou nas duas, a capacidade de formar um sentido de justia e a capacidade de formar uma concepo do bem. Como previamente, as duas faculdades no so elas prprias hierarquizadas e as duas so aspectos essenciais da concepo poltica de pessoa, cada faculdade tendo o seu prprio interesse de ordem superior. (...).

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(...) as duas famlias de cada uma das duas formas de autonomia foram internamente ligadas pela construo da justia como eqidade enquanto uma concepo poltica de justia. Esta forma de liberalismo, portanto, no deixa subsistir entre as liberdades uma rivalidade no resolvida. (Reply to Habermas, PL, pp. 413-419). Habermas conclui as suas observaes crticas como uma tese sobre o autoentendimento da filosofia poltica -em condies de pensamento ps-metafsico, este [auto-entendimento da filosofia poltica] deveria ser modesto, mas no do modo errado- e nesse contexto que ele afirma que a sua nova teoria discursiva do direito, desenvolvida em Faktizitt und Geltung (1992), ao estipular no apenas uma relao conceitual interna entre as idias de Estado constitucional e as formas democrticas de poder poltico, mas ao introduzir tambm um conceito moralmente neutro de discurso enquanto tal, mais modesta do que a teoria da justia de Rawls. Esta tese razovel?

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