a história nunca contada de 'mandela', o cão

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64 v 16 DE JANEIRO DE 2014 SOCIEDADE JUSTIÇA Q uem olhar para este cão e não sou- ber da polémica em que esteve envolvido, dificilmente o achará perigoso. Depois de ser fotografa- do nos estúdios da VISÃO, onde chegou aba- nando a cauda a desconhecidos, passou todo o tempo a dormir e a ressonar, deitado ao colo da treinadora e da sua detentora legal. No final de setembro, Zico foi entregue a Rita Silva, 33 anos, presidente da associa- ção Animal, que vive com ele no santuário de quatro hectares pertencente ao coletivo e onde residem, também, outros cães. Todos os animais ocupam parques individuais, com espaço para correr e brincar. Não há celas de cimento, não estão fechados e comem ape- nas ração vegana (sem nenhum produto de origem animal). O bicho passou por um pro- cesso de recuperação e foi rebatizado – hoje, responde pelo nome Mandela. Mas já lá va- mos. Para melhor compreender esta história, teremos de viajar primeiro até ao Alentejo. Má sorte Há uma ferradura presa no aro da porta de entrada, no terceiro andar deste prédio, no «Bairro do Texas», como é conhecida esta zona dos subúrbios de Beja. Há outra por cima do acesso à cozinha. Mas nem estes amuletos têm afastado a tragédia da casa de Jacinto Pinto, 55 anos, avô de Dinis Janeiro, um bebé de 18 meses que morreu em terrí- veis circunstâncias. Eram 18 e 30 de domingo, 6 de janeiro de 2013. Tinha escurecido. «O miúdo veio para a cozinha e o cão saltou, o miúdo caiu-lhe em cima e ele agarrou-o», contou, na altura. A mãe, Vanessa das Neves, pegou em Dinis e levou-o, em braços, até ao Hospital José Joaquim Fernandes, a 600 metros de casa. Ali, deu entrada com ferimentos muitos gra- ves, já em coma, devido a «lesão por mor- dedura de cão», como consta do relatório O País conheceu-o como Zico – e a campanha em defesa da sua vida atingiu uma dimensão sem paralelo. Dinis Janeiro, o bebé de 18 meses que terá sido atacado pelo pit bull da família, morreu há um ano. A VISÃO revela o que se passou, desde então POR PEDRO MIGUEL SANTOS A história nunca contada de ‘Mandela’, o cão hospitalar. A urgência era tal que, de imedia- to, o estabelecimento de saúde requisitou um helicóptero e trans- feriu-o para a Unidade de Cuidados Intensivos Pedi- átricos do Hospital de Santa Maria, em Lisboa. Ainda foi ope- rado, mas não resistiu. O óbito foi declarado às 23 e 20, no dia 7 de janeiro. No relatório da autóp- sia, pode ler-se que a causa da morte, classificada como «violenta», terão sido «le- sões traumáticas crânio-me- ningo-encefálicas». Descre- ve-se, ali, que «estas denotam terem sido produzidas por ação de natureza perfurocontudente, ou atuando como tal, como o que pode ter sido a mordedura de um cão». Não é uma afirmação, é uma hipótese. Caberá ao tribunal judicial de Beja apurar o que realmente se pas- sou naquele dia. Mas o processo crimi- nal ainda está longe da conclusão. Ter coração A ordem natural seria que Jacinto Pinto e a esposa, Maria Antónia, juntos há 40 anos, nunca tivessem vivido esta tragédia. Estes avós viram morrer um neto e, anos antes, já tinham perdido um filho. Como pode uma pessoa suportar uma dor deste tipo não se sabe, mas Jacinto sabe de cor a manhas do sofrimento. Pelo menos o físico. O pai dele foi forcado, ele forcado foi. Nasceu e cresceu no meio de pegas e lides, da brutalidade de enfrentar bestas com centenas de quilos. Fez parte dos grupos de Beja, de Évora, dos Lusitanos. Foi a França, a Espanha, à Vene- zuela, ao México. Durante 23 anos, partiu-se todo. Tantas vezes, que tem a pele cravada de cicatrizes e os ossos moídos das cornadas. Não o mataram, mas moeram-no. O corpo, se dava para os touros, não aguentava a pro- fissão de bate-chapas, que Jacinto não exer- ce há 20 anos, por incapacidade. Vive de uma pensão de invalidez. Passa os dias em casa. Lava, passa a ferro, cozinha, esfrega, limpa. FERNANDO NEGREIRA ‘Zico’/’Mandela’ Ainda que não seja puro, o cão é considerado de raça potencialmente perigosa. Em 9 anos com a família, nunca terá sido agressivo

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O País conheceu-o como Zico - e a campanha em defesa da sua vida atingiu uma dimensão sem paralelo. Dinis Janeiro, o bebé de 18 meses que terá sido atacado pelo pit bull da família, em Beja, morreu há um ano. A VISÃO revela o que se passou, desde então

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Page 1: A história nunca contada de 'Mandela', o cão

64 v 16 DE JANEIRO DE 2014

SOCIEDADE JUSTIÇA

Quem olhar para este cão e não sou-ber da polémica em que esteve envolvido, dificilmente o achará perigoso. Depois de ser fotografa-

do nos estúdios da VISÃO, onde chegou aba-nando a cauda a desconhecidos, passou todo o tempo a dormir e a ressonar, deitado ao colo da treinadora e da sua detentora legal.

No final de setembro, Zico foi entregue a Rita Silva, 33 anos, presidente da associa-ção Animal, que vive com ele no santuário de quatro hectares pertencente ao coletivo e onde residem, também, outros cães. Todos os animais ocupam parques individuais, com espaço para correr e brincar. Não há celas de cimento, não estão fechados e comem ape-nas ração vegana (sem nenhum produto de origem animal). O bicho passou por um pro-cesso de recuperação e foi rebatizado – hoje, responde pelo nome Mandela. Mas já lá va-mos. Para melhor compreender esta história, teremos de viajar primeiro até ao Alentejo.

Má sorteHá uma ferradura presa no aro da porta de entrada, no terceiro andar deste prédio, no «Bairro do Texas», como é conhecida esta zona dos subúrbios de Beja. Há outra por cima do acesso à cozinha. Mas nem estes amuletos têm afastado a tragédia da casa de Jacinto Pinto, 55 anos, avô de Dinis Janeiro, um bebé de 18 meses que morreu em terrí-veis circunstâncias.

Eram 18 e 30 de domingo, 6 de janeiro de 2013. Tinha escurecido. «O miúdo veio para a cozinha e o cão saltou, o miúdo caiu-lhe em cima e ele agarrou-o», contou, na altura. A mãe, Vanessa das Neves, pegou em Dinis e levou-o, em braços, até ao Hospital José Joaquim Fernandes, a 600 metros de casa. Ali, deu entrada com ferimentos muitos gra-ves, já em coma, devido a «lesão por mor-dedura de cão», como consta do relatório

O País conheceu-o como Zico – e a campanha em defesa da sua vida atingiu uma dimensão sem paralelo. Dinis Janeiro, o bebé de 18 meses que terá sido atacado pelo pit bull da família, morreu há um ano. A VISÃO revela o que se passou, desde entãoPOR PEDRO MIGUEL SANTOS

A história nunca contada de ‘Mandela’, o cão

hospitalar. A urgência era tal que, de imedia-to, o estabelecimento de saúde requisitou um helicóptero e trans-feriu-o para a Unidade de Cuidados Intensivos Pedi-átricos do Hospital de Santa Maria, em Lisboa. Ainda foi ope-rado, mas não resistiu. O óbito foi declarado às 23 e 20, no dia 7 de janeiro. No relatório da autóp-sia, pode ler-se que a causa da morte, classificada como «violenta», terão sido «le-sões traumáticas crânio-me-ningo-encefálicas». Descre-ve-se, ali, que «estas denotam terem sido produzidas por ação de natureza perfurocontudente, ou atuando como tal, como o que pode ter sido a mordedura de um cão». Não é uma afirmação, é uma hipótese. Caberá ao tribunal judicial de Beja apurar o que realmente se pas-sou naquele dia. Mas o processo crimi-nal ainda está longe da conclusão.

Ter coraçãoA ordem natural seria que Jacinto Pinto e a esposa, Maria Antónia, juntos há 40 anos, nunca tivessem vivido esta tragédia. Estes avós viram morrer um neto e, anos antes, já tinham perdido um filho. Como pode uma pessoa suportar uma dor deste tipo não se sabe, mas Jacinto sabe de cor a manhas do sofrimento. Pelo menos o físico. O pai dele foi forcado, ele forcado foi. Nasceu e cresceu no meio de pegas e lides, da brutalidade de enfrentar bestas com centenas de quilos. Fez parte dos grupos de Beja, de Évora, dos Lusitanos. Foi a França, a Espanha, à Vene-zuela, ao México. Durante 23 anos, partiu-se

todo. Tantas vezes, que tem a pele cravada de cicatrizes e os ossos moídos das cornadas. Não o mataram, mas moeram-no. O corpo, se dava para os touros, não aguentava a pro-fissão de bate-chapas, que Jacinto não exer-ce há 20 anos, por incapacidade. Vive de uma pensão de invalidez. Passa os dias em casa. Lava, passa a ferro, cozinha, esfrega, limpa. FE

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‘Zico’/’Mandela’ Ainda que não seja puro, o cão é considerado de raça potencialmente perigosa. Em 9 anos com a família, nunca terá sido agressivo

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SOCIEDADE JUSTIÇA

Maria Antónia, a mu-lher, também na casa dos 50 anos, faz limpezas. Não gosta das corridas. «Já penei muito com os touros», desabafa. Mas é impossível escapar-lhes, nesta casa. A pequena sala de estar parece um museu. A jaqueta de forca-do de Jacinto, bege, debruada com flores,

está pendurada na parede. Por cima, as meias brancas, rendilhadas. Entalado, um pequeno capote, vermelho, com que ensina ao neto mais velho, João, 7 anos, irmão de Dinis, os primeiros movimentos de um peão de brega. Os dois filhos mais velhos, João Pe-dro Janeiro, 29 anos, pai de Dinis,

e Pedro Janeiro, 37, proprietário de Zico, também pegaram touros. Mas «não tiveram coração para aguentar mais e abandonaram a lide», desabafa Jacinto. Ele também vem perdendo a afición. «Corridas já nem as vejo. Apaguei-me um bocadinho, por causa do meu neto.»

Olho por olho...O corpo de Dinis Santiago Neves Janeiro foi entregue à família na quarta-feira, 9, ao anoitecer, porque a autópsia se realizou nes-sa tarde. No dia seguinte, de manhã, desceu à terra, no cemitério de Algeruz, em Setúbal. Foi nesta cidade que Dinis nasceu e é aí que, hoje, vivem os pais. Não suportaram ficar na casa onde aconteceu o infortúnio.

Zico, um cão com caraterísticas físi-cas de pit bull, considerado por lei

como raça potencialmente pe-rigosa (existem quase 18 mil

animais registados com esta classificação), estava na fa-mília há nove anos. Nunca tinha sido agressivo, disse o avô, na altura: «Tenho

dois netos, nunca fez mal a nenhum. Abriam-lhe a boca,

faziam-lhe tudo.»O animal de estimação tinha

as orelhas cortadas (prática proi-bida mas comum em cães que par-

ticipam em lutas), não estava registado na junta de fre-

guesia nem possuía segu-ro de responsabilidade civil, não estava esteri-lizado e, das obrigações legais, apenas cumpria

uma: usava chip eletró-nico. Jacinto Pinto, sabia,

contudo, que o cão de Pe-dro Janeiro, o filho mais velho

– que hoje mora num outro prédio, no mesmo bairro –, não podia viver dividido entre a varanda e a cozinha. «Já pedi para o abaterem. Não tenho condições para o ter em casa», revelou aos jornalistas, no dia em que a criança morreu.

A família não apresentou queixa. A PSP, atenta ao fenómeno – nos últimos cinco anos, foram comunicados às autoridades 170 ataques a pessoas –, soube do caso pela comunicação social e participou o sucedido ao Ministério Público, que abriu um inqué-rito criminal e mandou recolher o animal. Linda Rosa Ferreira, veterinária municipal de Beja, acompanhou a apreensão e anun-

JULHO30, terça-feira

Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé decide que o pit bull não pode

ser abatido e manda entregá-lo à Animal

JANEIRO6, domingo

Dinis Janeiro dá entrada no hospital de Beja

com ferimentos graves, devido «a lesão por mordedura de cão»

JANEIRO7, segunda-feira

A criança morre, vítima de lesões crânio-meningo--encefálicas. A veterinária

municipal de Beja anuncia que o cão será eutanasiado, em oito

dias. Ministério Público abre um inquérito criminal e manda

apreender o cão, por ser considerado

uma prova

JANEIRO11, sexta-feira

Associação Animal entrega no Tribunal

Administrativo e Fiscal de Beja uma providência

cautelar para impedir o abate do cão

AGOSTO5, segunda-feiraZico é entregue a Rita Silva. O seu nome é mudado

para Mandela

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SOCIEDADE JUSTIÇA

Processo A batalha legalA providência cautelar interposta pela associa-ção Animal no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja para, numa primeira fase, impedir o abate do pit bull Zico e, mais tarde, requerer a tutela legal do animal, esteve pendente oito meses. A decisão acabaria por ser tomada em período de férias judiciais, pelo juízo congénere de Loulé, que estava de turno. A VISÃO consul-tou o processo e, em www.visao.sapo.pt, revela e descodifica os momentos mais importantes desta disputa judicial.

ciou que o cão seria abatido: «Cães perigo-sos são eutanasiados.» Foi então que esta-lou o verniz.

Bons e mausAo ver as imagens de um cão acocorado e medroso, a ser levado para dentro de uma carrinha, sem que se soubesse o que tinha, de facto, acontecido, meio país co-moveu-se. Foi lançada na internet a peti-ção Contra o abate do Pitbull Zico e de todos os outros Zicos!, que somou mais de 15 mil assinaturas, na primeira semana. O docu-mento chegou a ser entregue na Assem-bleia da República. Hoje, conta com quase 80 mil subscritores.

Seguiram-se outras petições, a favor e contra o abate do animal. Escreveram-se dezenas de artigos de opinião e, nas redes sociais, travou-se um combate raivoso e maniqueísta: de um lado, os que defendiam a criança; do outro, os que queriam prote-ger o cão. Bons e maus. Defensores da vida humana e «maluquinhos» pelos animais. Figuras públicas envolveram-se e deram a cara: o actor Ruy de Carvalho pela vida do bicho; o comentador político Daniel Olivei-ra, pela morte.

Pedro Galvão, 40 anos, autor livro Os Ani-mais Têm Direitos? Perspectivas e Argumentos (Ed. Dinalivro, 2011, 240 pp., €15,37), profes-sor de Filosofia na Universidade de Lisboa, lembra que «um cão não é um agente mo-ral, nunca faz o menor sentido julgar que ele merece ser castigado pelos males que tenha causado». Ainda assim, entende que «toda a preocupação com o destino do Zico foi abso-lutamente desproporcionada. Revelou até

As cuidadorasCláudia Estanislau (à esq.) reeducou o cão durante dois meses. Agora quem cuida dele é Rita Silva, presidente da Associação Animal

Advogada ativista Rita Henriques, 33 anos, evitou nos tribunais o abate de Zico. Fê-lo pro bono, por ser uma defensora dos direitos dos animais: «Não sabia qual seria o desfecho, mas sabia que valia a pena lutar»

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bastante insensibilidade em relação à morte trágica da criança».

Mas, ao contrário do que dissera a veteri-nária municipal, o cão não tinha de ser «eu-tanasiado» em oito dias. O n.º 1, do artigo 15.°, do Decreto-Lei n.º 315/2009, refere que o animal agressor só é eutanasiado «uma vez ponderadas as circunstâncias concre-tas, designadamente o carácter agressivo do animal». E o n.º 1, da Portaria 81/2002, determina que «os cães (...) agressores de pessoas ou outros animais (...), são conside-rados suspeitos de raiva e deverão ser objeto de observação médico-veterinária obrigató-ria e imediata e permanecer em sequestro durante, pelo menos, 15 dias».

Conhecendo a Lei, a associação Animal meteu-se ao barulho. Quatro dias depois da morte de Dinis, entregou uma providência cautelar no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Beja, requerendo o impedimento do abate do cão e, mais tarde, a sua entrega ao coletivo. Começaria aqui uma longa bata-lha mediática e jurídica, que culminaria com a entrega de Zico à Animal.

Renascer como ‘Mandela’Nos bastidores do processo administrativo tem estado Rita Henriques, 33 anos, advoga-da. No seu gabinete, em Montemor-o-Novo, conta com a companhia de Pantufas, um pe-queno rafeiro, anafado, de cor castanha, que todos os dias vai com ela para o trabalho. Há um cartão, em cima do sofá onde dorme o canito, com os adjetivos «adoptado e mima-do». Ofereceu-se para defender o Zico, pro bono: «Não sabia qual seria o desfecho, mas sabia que valia a pena lutar.» A ação prin-

cipal ainda corre no TAF de Beja e não se espera que a sentença seja conhecida antes de 2015. Só nessa data se decidirá se a asso-ciação Animal fica definitivamente com a guarda do cão... ou se é emitida uma ordem para o pit bull ser abatido.

Zico foi entregue a Rita Silva, a 5 de agosto passado. «Vi um cão debilitado, que tinha perdido bastante massa corporal. Ficou lá oito meses, sem possibilidade de exercício. A cela era lavada com ele lá dentro e ainda hoje tem as patas traseiras com muita abra-são. Quando chegámos estava ensopado em urina. De Beja a Lisboa íamos morrendo, com o cheiro», conta.

No Hospital Veterinário do Restelo, to-mou banho, fez análises, retirou uns nódu-los benignos. E mudou de nome. Passaria a chamar-se Mandela, ou Mandy, no diminu-tivo. Rita Silva, justifica a polémica escolha: «Tenho um Karl Marx, um Martin Luther King... Todos os animais que vêm para os nossos cuidados são renomeados. Damos nomes de amigos, de humanos importantes ou de outros animais falecidos, como home-nagem. É regra. Os lutadores pela liberdade

têm um papel fundamental para quem tra-balha pelos direitos dos animais. Acredita-mos que homenageámos o homem Nelson Mandela ao dar o seu nome a este cão.»

Pela positivaSaído do hospital, Mandela foi entregue a Cláudia Estanislau, 36 anos, treinadora de cães e proprietária da escola It´s All About Dog’s. A especialista em comportamento animal, que trabalhou no Canadá e em In-glaterra, foi escolhida por não utilizar méto-dos aversivos no processo de educação dos bichos. «Não uso a força, uso a inteligência. Os métodos tradicionais – já os pratiquei, falo com conhecimento – provocam com-portamentos agressivos nos cães.» Prefere o método do reforço positivo.

Mandela esteve à solta dentro de casa, na lavandaria, que continuou em uso. Era lá que dormia e comia. Não estava preso, cir-culava entre o jardim e a sala de estar. Nunca lhe pôs um açaime. «Sou muito boa a ler os cães e não vi nada na linguagem do Mandy que me indicasse que ele podia ser um peri-go para mim, ou para outra pessoa.»

Durante dois meses, treinou-o. «No iní-cio, só caminhava e olhava, desconfiado. Depois, começou a abrir-se: choraminga-va, ladrava quando íamos embora, corria quando o soltávamos. Só lhe toquei 15 dias após estar com ele. Comecei a provocar de-terminados comportamentos. Experimen-tei os brinquedos, percebi que ele perdia o controlo e desisti. Fui para a comida, para lhe ensinar que tem valor. Dei-lha sempre à mão, todos os dias», explica Cláudia, que recupera e treina todo o tipo de animais, até suricatas. Além disso, dá aulas nas quais en-sina os seus métodos. «O maior problema é a falta gritante de informação por parte das pessoas. Trabalho mais vezes o comporta-mento dos donos que o dos cães.»

O que realmente se passou naquela noi-te de 6 de janeiro de 2013, só será esclareci-do quando o inquérito criminal, que ainda decorre, estiver concluído. Caberá ao Mi-nistério Público arquivar o processo ou de-duzir acusação e avançar para julgamento. O dono do cão, Pedro Janeiro, tio de Dinis, arrisca-se a ser incriminado por homicídio por negligência, com uma moldura penal até cinco anos de prisão. Poderão as ferra-

duras penduradas em casa de Jacinto Pinto e Maria Antónia livrar esta família de mais uma desgraça?

WWW.VISAO.SAPO.PTLEIA A ENTREVISTA DE

PEDRO GALVÃO, AUTOR DE ‘OS ANIMAIS TÊM DIREITOS?’

Nos últimos 5 anos foram comunicadas às autoridades 170 ataques de cães a pessoas

No local do acidente Jacinto Pinto, avô de Dinis, foi forcado durante 23 anos. Era aficionado, mas desde que o neto morreu já não vê corridas. Depois da tragédia, admitiu não ter condições para manter o cão

JOSÉ

CAR

IA