a história da política da saúde mental brasileira entre os séculos xix e xxi (ii)

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disso, defendia a segregação social, garantindo à moral burguesa uma universalidade de fato que lhe permitiria opor-se como um direito a todas as formas de alienação (FOUCAULT, 1997). Dessa forma, criou- se um novo mecanismo de inclusão/exclusão nessas casas de internamento: foram colocados em liberdade os indivíduos que foram internados com os loucos, com exceção dos criminosos e dos próprios loucos. Assim, a loucura passou a ocupar um espaço específico (o manicômio), onde Philipe Pinel fez nascer, a partir da observação sistemática da loucura, a clínica psiquiátrica. Isso proporcionou, no início do século XIX, um novo status à loucura, pois torna-se um objeto médico e ganha o valor de doença (TEIXEIRA et al, 2001; OLIVEIRA, 2002;). Surge então uma nova lógica para a existência do hospício e para o isolamento como forma de tratamento: se a loucura é, na verdade, doença, logo há cura e, portanto, justifica-se o tratamento. Os altos custos do internamento dos doentes não eram vistos mais como desperdício, porque tinham uma função clara, a cura racional do indivíduo e a produção da saúde moral da comunidade, a partir do tratamento pregado por Pinel e executado por ele e seus discípulos (OLIVEIRA, 2002). O hospício foi concebido para exercer a ordem necessária à recuperação do alienado. O isolamento, vigilância, a organização classificatória, a hierarquia e a repressão nele contidas faziam parte do tratamento moral e eram instrumentos necessários para a normalização do doente mental. Nesse período, na Europa, prevaleciam as idéias capitalistas e ocorriam os avanços no saber da Medicina e, com esses, as grandes transformações nas instituições hospitalares, como a qualificação do pessoal que auxiliava os médicos nos hospitais. No Brasil, até o fim do século XVIII, não havia uma grande preocupação com os loucos, que vagavam pelas ruas e não representavam ameaça política nem social. Contudo, a chegada da corte portuguesa ao Brasil, no início do século XIX, desencadeou um rápido desenvolvimento econômico, político e cultural no País e, conseqüentemente, foi necessário reordenar o meio urbano e isso incluía a retirada de todos os habitantes desviantes que perambulavam pelas ruas, considerados incapazes de trabalhar e produzir riquezas. Os mendigos, os órfãos, os marginais de todos os tipos e os loucos foram recolhidos nos Asilos de Mendicância e de Órfãos, administrados pela Santa Casa de Misericórdia. Esse tipo de higiene pública obedeceu à mesma lógica da grande internação ocorrida na Europa (ESCOLA POLITÉCNICA DE SAÚDE JOAQUIM VENÂNCIO, 2003). Em 1830, surgiram denúncias médicas sobre a situação dos loucos no Hospital da Santa Casa de Misericórdia, em relação ao cuidado que eles recebiam, aos métodos de tratamento empregados nesses pacientes e em relação à insalubridade das instalações. Essas denúncias e críticas levaram a um movimento em prol da criação de um lugar específico para os loucos, o hospício. Assim, em 18 de julho de 1841, no Rio de Janeiro, criou-se, como dependência da Santa Casa, na Praia Vermelha, bem distante do centro urbano na época, o Hospital D. Pedro II, que foi inaugurado em 1852, com 350 leitos. O hospício era considerado como lugar de exercício da ação terapêutica, tendo como objetivo tornar os alienados completamente desprovidos da loucura. Para isso, era necessário seguir o princípio de isolamento formulado por Esquirol (1816), pelo qual o doente era completamente afastado da sociedade, com a finalidade de atingir a “cura”. O hospício permanece por um tempo como símbolo de cura e ciência. Contudo, em 1886, surgem novas denúncias médicas sobre a real situação do Hospício D. Pedro II, segundo as quais ele não poderia prestar serviços reais aos loucos, uma vez que não se tratava de uma verdadeira instituição hospitalar, porque a maioria dos internos era considerada incurável e isto fazia do hospício um lugar para simples refúgio dos doentes mentais. Essas denúncias culminaram na desanexação do hospício à Santa Casa em 1890; passou a se chamar Hospício Nacional de Alienados e o poder das religiosas foi substituído pelo poder dos médicos (MACHADO, 1978). Entretanto, a mudança ocorrida foi apenas do poder administrativo, pois passou para o controle medico. O tratamento intencionavam a normalização e a moralização do louco as custas de técnicas brutais, traumáticas e coercitivas. Utilizavam, por exemplo terapias medicamentosas com Cardiazol medicamento que induziam convulsões; com Insulina que induziam ao choque insulínico e, consequentemente, ao coma. Outras terapias conhecidamente utilizadas foram Eletrochoque; isolamento em solitárias ou em cubículos; camisas de força NOEREMBERG; OLIVEIRA; MULLER; ALVES, 2013). Após a Segunda Guerra Mundial, novas questões foram colocadas no cenário mundial. A sociedade européia rejeitava qualquer experiência que lembrasse as terríveis experiências do nazismo e dos campos de concentração, repudiava a violência e o desrespeito aos direitos humanos. A sociedade incitava a tolerância e sensibilidade para com as diferenças e as minorias. Além do mais, diante do projeto de reconstrução nacional, tornava-se importante a restauração da mão-de-obra que havia sido invalidada pela guerra. Assim, as condições dos internos em hospitais psiquiátricos eram considerados resquícios das dificuldades ocorridas na Segunda Guerra e, por isso, foram fortemente criticadas e repelidas. A partir de então ocorrem várias tentativas de Reforma na Europa e nos EUA com a intenção de superar gradualmente a internação nos manicômios, de liberar a Psiquiatria (e o seu objeto) da coação e da cronicidade que esta produzia e devolver para essa especialidade o estatuto terapêutico a partir de outros dispositivos de atendimento. As Reformas mais evidenciadas ao longo da história foram as ocorridas na Inglaterra, a Comunidade Terapêutica; na França, a Psicoterapia Institucional e a Política de Setor; nos EUA, a Psiquiatria Preventiva ou comunitária; na Inglaterra, a Antipsiquiatria; e na Itália, Reforma Democrática Italiana. Há várias leituras e

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Page 1: A História Da Política Da Saúde Mental Brasileira Entre Os Séculos XIX e XXI (II)

disso, defendia a segregação social, garantindo à moral burguesa uma universalidade de fato que lhe permitiria opor-se como um direito a todas as formas de alienação (FOUCAULT, 1997). Dessa forma, criou-se um novo mecanismo de inclusão/exclusão nessas casas de internamento: foram colocados em liberdade os indivíduos que foram internados com os loucos, com exceção dos criminosos e dos próprios loucos. Assim, a loucura passou a ocupar um espaço específico (o manicômio), onde Philipe Pinel fez nascer, a partir da observação sistemática da loucura, a clínica psiquiátrica. Isso proporcionou, no início do século XIX, um novo status à loucura, pois torna-se um objeto médico e ganha o valor de doença (TEIXEIRA et al, 2001; OLIVEIRA, 2002;). Surge então uma nova lógica para a existência do hospício e para o isolamento como forma de tratamento: se a loucura é, na verdade, doença, logo há cura e, portanto, justifica-se o tratamento. Os altos custos do internamento dos doentes não eram vistos mais como desperdício, porque tinham uma função clara, a cura racional do indivíduo e a produção da saúde moral da comunidade, a partir do tratamento pregado por Pinel e executado por ele e seus discípulos (OLIVEIRA, 2002). O hospício foi concebido para exercer a ordem necessária à recuperação do alienado. O isolamento, vigilância, a organização classificatória, a hierarquia e a repressão nele contidas faziam parte do tratamento moral e eram instrumentos necessários para a normalização do doente mental. Nesse período, na Europa, prevaleciam as idéias capitalistas e ocorriam os avanços no saber da Medicina e, com esses, as grandes transformações nas instituições hospitalares, como a qualificação do pessoal que auxiliava os médicos nos hospitais.

No Brasil, até o fim do século XVIII, não havia uma grande preocupação com os loucos, que vagavam pelas ruas e não representavam ameaça política nem social. Contudo, a chegada da corte portuguesa ao Brasil, no início do século XIX, desencadeou um rápido desenvolvimento econômico, político e cultural no País e, conseqüentemente, foi necessário reordenar o meio urbano e isso incluía a retirada de todos os habitantes desviantes que perambulavam pelas ruas, considerados incapazes de trabalhar e produzir riquezas. Os mendigos, os órfãos, os marginais de todos os tipos e os loucos foram recolhidos nos Asilos de Mendicância e de Órfãos, administrados pela Santa Casa de Misericórdia. Esse tipo de higiene pública obedeceu à mesma lógica da grande internação ocorrida na Europa (ESCOLA POLITÉCNICA DE SAÚDE JOAQUIM VENÂNCIO, 2003).

Em 1830, surgiram denúncias médicas sobre a situação dos loucos no Hospital da Santa Casa de Misericórdia, em relação ao cuidado que eles recebiam, aos métodos de tratamento empregados nesses pacientes e em relação à insalubridade das instalações. Essas denúncias e críticas levaram a um movimento em prol da criação de um lugar específico para os loucos, o hospício. Assim, em 18 de julho de 1841, no Rio de Janeiro, criou-se, como dependência

da Santa Casa, na Praia Vermelha, bem distante do centro urbano na época, o Hospital D. Pedro II, que foi inaugurado em 1852, com 350 leitos. O hospício era considerado como lugar de exercício da ação terapêutica, tendo como objetivo tornar os alienados completamente desprovidos da loucura. Para isso, era necessário seguir o princípio de isolamento formulado por Esquirol (1816), pelo qual o doente era completamente afastado da sociedade, com a finalidade de atingir a “cura”. O hospício permanece por um tempo como símbolo de cura e ciência. Contudo, em 1886, surgem novas denúncias médicas sobre a real situação do Hospício D. Pedro II, segundo as quais ele não poderia prestar serviços reais aos loucos, uma vez que não se tratava de uma verdadeira instituição hospitalar, porque a maioria dos internos era considerada incurável e isto fazia do hospício um lugar para simples refúgio dos doentes mentais. Essas denúncias culminaram na desanexação do hospício à Santa Casa em 1890; passou a se chamar Hospício Nacional de Alienados e o poder das religiosas foi substituído pelo poder dos médicos (MACHADO, 1978). Entretanto, a mudança ocorrida foi apenas do poder administrativo, pois passou para o controle medico. O tratamento intencionavam a normalização e a moralização do louco as custas de técnicas brutais, traumáticas e coercitivas. Utilizavam, por exemplo terapias medicamentosas com Cardiazol – medicamento que induziam convulsões; com Insulina que induziam ao choque insulínico e, consequentemente, ao coma. Outras terapias conhecidamente utilizadas foram Eletrochoque; isolamento em solitárias ou em cubículos; camisas de força NOEREMBERG; OLIVEIRA; MULLER; ALVES, 2013).

Após a Segunda Guerra Mundial, novas questões foram colocadas no cenário mundial. A sociedade européia rejeitava qualquer experiência que lembrasse as terríveis experiências do nazismo e dos campos de concentração, repudiava a violência e o desrespeito aos direitos humanos. A sociedade incitava a tolerância e sensibilidade para com as diferenças e as minorias. Além do mais, diante do projeto de reconstrução nacional, tornava-se importante a restauração da mão-de-obra que havia sido invalidada pela guerra. Assim, as condições dos internos em hospitais psiquiátricos eram considerados resquícios das dificuldades ocorridas na Segunda Guerra e, por isso, foram fortemente criticadas e repelidas. A partir de então ocorrem várias tentativas de Reforma na Europa e nos EUA com a intenção de superar gradualmente a internação nos manicômios, de liberar a Psiquiatria (e o seu objeto) da coação e da cronicidade que esta produzia e devolver para essa especialidade o estatuto terapêutico a partir de outros dispositivos de atendimento. As Reformas mais evidenciadas ao longo da história foram as ocorridas na Inglaterra, a Comunidade Terapêutica; na França, a Psicoterapia Institucional e a Política de Setor; nos EUA, a Psiquiatria Preventiva ou comunitária; na Inglaterra, a Antipsiquiatria; e na Itália, Reforma Democrática Italiana. Há várias leituras e

É interessante se notar que o apelo por mão-de-obra válida é sempre uma constante nas discussões sobre a clínica psiquiátrica, já que internado, o louco não pode exrcer o papel de trabalhador.
Esclarecimento de uma possível reforma psiquiátrica mundial começa com o fim da II Guerra, após as terríveis experiências dos campos de concentração.
Criação do hospício no Brasil.
precarização dos cuidados aos loucos.
O histórico da loucura no Brasil é mais tardia, a preocupação com a loucura começou apenas no fim do século XVIII
Diagnóstico da loucura??
Nascimento da clínica. Ler Foucault.
Afastamento com o argumento da busca pela cura.
Combater a cronicidade da doença mental. Pensar sobre um estatuto terapêutico, diferente do manicômio e/ou hospício.
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análises sobre as Reformas, entretanto, a maior parte delas tem como base a Reforma Italiana como a mais assertiva e por isso faz avaliações comparativas. A da Itália é considerada uma mudança ampliada de caráter político–social e as outras somente de caráter clínico. A seguir será discorrido, resumidamente, sobre cada uma dessas.

Em 1946 surge um movimento na Ingleterra de Reforma chamada Comunidade Terapêutica, que operou mudanças referentes à estrutura interna dos hospitais psiquiátricos “[...] marcadas por medidas administrativas, democráticas, participativas e coletivas, objetivando uma transformação da dinâmica institucional asilar” (AMARANTE, 1995). Para explicar melhor como foi essa tentativa se faz importante ressaltar que diante da crise econômica pós guerra, a recuperação da força de trabalho foi imprescindível. O hospital psiquiátrico representava precariedade e disfuncionalidade de cura mental, dessa forma, se instituiu como terapêutica as práticas participativas, ou seja, o trabalho para os pacientes dentro do hospital. Dessa forma, os doentes poderiam ser ressignificados pela capacidade de “produção”. Além disso, o cuidado passa a ser coletivo ao invés do individual, assim, foram instituídos atendimentos em grupos de discussão, operativo, dentre outros. Por fim, intencionavam a democratização da relação entre profissionais e pacientes, menos hierárquica e principalmente, menos formal.

A Psicoterapia Institucional, considerava que a própria instituição tem caráter doentio. “[...] foi o exercício permanente e questionamento da instituição enquanto espaço de segregação, da crítica ao poder médico e da verticalidade das relações intra-institucional. Esse processo tinha como ponto de partida a valorização do Hospital Psiquiátrico como transformação para a cura, tal como era desejado na época de Pinel, mas abrindo novos espaços para possibilidades terapêuticas, tais como ateliês, atividades de animação, festas, reuniões, dentre outras possibilidades (AMARANTE, 1995).

A Psiquiatria de Setor iniciou-se nos anos 1960 na França, apresentou-se como um movimento de contestação ao modelo asilar. Intencionava mudanças na ideologia da prática psiquiátrica, era contra a cronificação, isolamento, segregação do doente e estruturas asilares. Esse movimento buscava reaver a função terapêutica da psiquiatria e consideravam que isso não poderia acontecer no interior dos hospitais psiquiátricos. A ideia era que o paciente fosse tratado dentro de seu próprio meio social, a passagem pelo hospital seria, apenas, uma etapa transitória. Para isso, o hospital e as várias comunidades foram esquadrinhados de tal forma que cada “ala” do hospital era responsável por uma área geográfica e social (AMARANTE, 1995).

A Psiquiatria Preventiva ou Comunitária vai em direção à Saúde Pública e visava não apenas detectar precocemente as situações de crise, mas buscava resolvê-las antes que chegasse a uma internação, prevenindo, assim, o adoecimento mental.

Para isso foi criada uma rede de serviços comunitários em diferentes pontos dos EUA. Essa política trouxe a noção de desinstitucionalização, entendida como um arsenal de medidas que reduziria o ingresso do paciente nos manicômios; redução do tempo de permanência hospitalar; promoção de altas. Entretanto, a política dos EUA engendrou muito mais um processo de desospitalização, no sentido de retirar os pacientes dos hospitais. O fechamento dos hospitais psiquiátricos, objetivava reduzir despesas do Estado, sem ter a contrapartida adequada da criação de serviços comunitários, configurando-se no fenômeno “os loucos na rua” (KANTORSKI, 2001).

A Antipsiquiatria, ocorrida na Inglaterra, na década de 1960, questionava a Psiquiatria enquanto especialidade médica pois essa se mostrava incapaz de curar a “loucura”. Por isso, negava a doença mental, acreditava que sua manifestação era singular às experiências do sujeito e sua relação com o ambiente social em que vive (Amarante, 1995).

A Antipsiquiatria e a desinstitucionalização na tradição Basagliana (Itália) foi considerada transformadora e [...] A ênfase não é mais colocada no processo de ‘cura’ mas no projeto de ‘invenção de saúde’ e de ‘reprodução social do paciente’ (ROTELLI; LEONARDIS; MAURI, 1990, p. 30). Embora a Psiquiatria democrática italiana também questionasse o saber psiquiátrico, não negava a existência da doença mental, contudo propunha uma forma um tanto mais ampla de lidar com ela a partir de uma solução complexa, a desinstitucionalização (ROTELLI, 1990; ESCOLA POLITÉCNICA JOAQUIM VENÂNCIO, 2003). Na Psiquiatria democrática, o objeto não é a doença, mas a existência-sofrimento dos pacientes e sua relação com o corpo social, logo, desinstitucionalização é: “[...] o processo crítico-prático para reorientação de todos os elementos constitutivos da instituição para esse objeto bastante diferente do anterior. [...] (ROTELLI; LEONARDIS; MAURI, 1990, p. 30)”. A experiência italiana criou uma rede de novas estruturas que objetivavam substituir integralmente a concepção anterior do hospital psiquiátrico. Essa constituiu-se de centros de Saúde Mental, um espaço aberto que funcionava 24 horas por dia; apartamentos que funcionavam como residências e cooperativas de trabalho, numa tentativa de aglutinar a inserção social e unidades de internação em hospitais gerais. O funcionamento dessa nova estrutura foi previsto pela Lei 180 (Reforma Psiquiátrica) e aprovada pelo Parlamento Italiano em 1978 (ESCOLA POLITÉCNICA JOAQUIM VENÂNCIO, 2003).

As décadas de 1960 e 1970, marca o primeiro período do Movimento de Reforma Psiquiátrica Brasileira – da crítica ao modelo hospitalocêntrico. Enquanto o mundo se voltava para desospitalização, o Brasil aumentava os seus leitos psiquiátricos e multiplicava as contratações das instituições privadas. Somente no fim da década de 1970, iniciou-se no País as reflexões sobre a assistência à Saúde Mental. Surgiram vários movimentos sociais, dentre eles, os

França
Inglaterra
França
EUA
substituir integralmente o hospital psiquiátrico, encarar a loucura como doença mental passível de cura e ressocialização do doente.
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congressos na área da Psiquiatria marcados por críticas e debates a respeito da assistência. Entretanto, esse movimento ganha força com o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM), em 1978, a partir das críticas ao paradigma psiquiátrico dominante, denúncias sobre a violência dos manicômios, da mercantilização da loucura, da hegemonia de uma rede privada de assistência e pelos direitos dos pacientes psiquiátricos em nosso país. Foi um Movimento plural formado por trabalhadores integrantes do movimento sanitário, associações de familiares, sindicalistas, membros de associações de profissionais e pessoas com longo histórico de internações psiquiátricas. A partir de então, passam a surgir as primeiras propostas e ações para a reorientação da assistência. Em 1987, o II Congresso Nacional do MTSM, adota o lema “Por uma sociedade sem manicômios”. Nesse mesmo ano, é realizada a I Conferência Nacional de Saúde Mental. Neste período, surge o primeiro Centro de Assistência Psicossocial (CAPS) no país, na cidade de São Paulo e as primeiras intervenções no Hospital psiquiátrico, Casa de Saúde Anchieta, em Santos, local de maus tratos e mortes de pacientes. Estas intervenções ganharam repercussão nacional e mostrou de forma inequívoca a possibilidade de construção de uma rede de cuidados efetivamente substitutiva ao hospital psiquiátrico. Ainda, neste mesmo período são implantados no município de Santos os Núcleos de Atenção Psicossocial (NAPS) que funcionam 24 horas, assim como cooperativas e residências para egressos do hospital. De acordo com Brasil (2005), a experiência no município de Santos, passa a ser um marco no processo de Reforma Psiquiátrica brasileira. Em 1989 dá entrada no Congresso Nacional o Projeto de Lei do deputado Paulo Delgado que propunha a regulamentação dos direitos da pessoa com transtornos mentais e a extinção progressiva dos manicômios no país. Esse projeto de Lei tramita por quase 12 anos no congresso e se efetiva somente em 2001 com a Lei 10.216 de seis de Abril de 2001.

Esse movimento, denominado de Reforma Psiquiátrica Brasileira, “[...] pretende uma transformação no campo do saber, das práticas profissionais, educacionais e institucionais da Saúde Mental”; para isso, faz-se necessário reorganizar os serviços, criar novas modalidades de atendimento terapêutico como centros de assistência psicossocial, hospitais-dia, enfermarias e ambulatório em hospitais gerais (MACHADO; COLVERO, 2003, p. 673).

O segundo período da Reforma é marcado pelo início da implantação da Rede extra-hospitalar. Esta década é marcada pela II Conferência Nacional de Saúde Mental em 1992 e pela assinatura pelo Brasil da Declaração de Caracas. A partir de então, passam entrar em vigor no país as primeira normas federais que regulamentam a implantação de serviços de atenção diária, fundadas nas experiências dos primeiros CAPS, NAPS e hospitais-dia. Os serviços foram cridos a partir da Portaria GM 224/92. Os CAPS são definidos por essa portaria como unidades de saúde locais/regionalizadas que contam com uma

população adscrita definida pelo nível local e que oferecem atendimento de cuidados intermediários entre o regime ambulatorial e a internação hospitalar; podem constituir-se também em porta de entrada da rede de serviços para as ações relativas à saúde mental e atendem também a pacientes referenciados de outros serviços de saúde, dos serviços de urgência psiquiátrica ou egressos de internação hospitalar. Os serviços substitutivos, diferentemente do paradigma manicomial, possibilitam a construção do coletivo, a partir da articulação com todas as profissiões, em um projeto terapêutico único.

Entretanto, a portaria não previa nem uma linha de financiamento para esses novos equipamentos, nem mecanismos sistemáticos para redução de leitos em hospitais psiquiátricos. No final dos anos 90, o país já tinha 208 CAPS em funcionamento e cerca de 90% dos recursos do Ministério da Saúde ainda eram destinados aos hospitais psiquiátricos (BRASIL, 2011). O processo de redução de leitos em hospitais psiquiátricos e de desinstitucionalização de pessoas com longo histórico de internação ganha impulso em 2002 com uma série de normatizações do Ministério da Saúde, que instituem mecanismos para a redução de leitos psiquiátricos a partir dos macro-hospitais (BRASIL, 2005). A Portaria/GM nº 106 de 2000 institui os Serviços Residenciais Terapêuticos definidos como moradias ou casas inseridas, preferencialmente, na comunidade, destinadas a cuidar dos portadores de transtornos mentais, egressos de internações psiquiátricas de longa permanência, que não possuam suporte social e laços familiares e, que viabilizem sua inserção social. A cada transferência de paciente do Hospital Especializado para o Serviço de Residência Terapêutica era reduzido ou descredenciado do SUS, igual n.º de leitos naquele hospital. Em 2011, por meio da Portaria 3.090 de 23 de Dezembro de 2011 são especificados os tipo de SRT. As modalidade são: SRT I – 8 pessoas egressos sem vinculo familiar; SRT II – 10 pessoas egressos com alta dependência de cuidados.

O terceiro período é marcado pela III Conferencia Nacional de Saúde Mental que ocorreu em 2001, teve como Tema “Cuidar, sim. Excluir, não. – Efetivando a Reforma Psiquiátrica com acesso, qualidade, humanização e controle social”. Os debates se organizaram através dos subtemas: financiamento; recursos humanos; controle social, acessibilidade; direitos e cidadania. Esse movimento impulsionou a sansão da em 2001, a Lei 10.216, Lei Nacional de Reforma Psiquiátrica, que dispõe sobre a proteção das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Estabelece que a internação só deve ser indicada quando os recursos extra-hospitalares mostrarem-se insuficientes; define, ainda que o tratamento visará como finalidade permanente, à reinserção social; deverá oferecer assistência integral. A Lei esclarece que é vedada a internação de pacientes portadores de transtornos mentais em instituições com características asilares.

A discussão sobre saúde mental no Brasil só acontece a partir de 1960, com críticas ao sistema manicomial e às contratações de clínicas privadas para doentes mentais. Em 1978, o Movimento dos Trabalhadores da Saúde Mental (MTSM) critica os paradigmas psiquiátricos dominantes e denunciam a violência, a mercantilização da loucura e a hegemonia das redes privadas na assistência desses pacientes.
Ainda em 1987, o Brasil lutava por uma sociedade sem manicômios, o que nos leva a crer que, em relações aos outros países estudados, o Brasil teve esse movimento antimanicomial eextremamente tardio.
Primeiro CAPS nasce em 1987
Projeto de lei do Deputado Paulo Delgado tramita ´por quase 12 anos antes de virar a LEI 10.216 de seis de Abril de 2001, em que propõe a extinção gradual dos manicômios e ao mesmo tempo, a regulamentação dos direitos da pessoa com transtornos mentais.
REDES!!!
Serviço de Residência Terapêutica
Pensar o conceito.
Fim do manicômio.
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A partir dessa Lei Nacional de Reforma Psiquiátrica, vieram muitas discussões sobre reformulação dos equipamentos substitutivos, a rede apropriou-se de um outro objeto, bem diferente do anterior, ou seja, o olhar não é mais apenas para a doença do ser, e sim, para o ser em sua complexidade biopsicossocial. A partir de então, outros serviços foram criados objetivando a redução de leitos psiquiátricos no país e o fechamento de vários hospitais destinados ao tratamento psiquiátrico. A Portaria/GM 336 de 19 de fevereiro de 2002 estabeleceu as modalidades de CAPS, a saber: CAPS I para 20 A 70 mil habitantes, funcionando das 8 as 18h; CAPS II 70 a 200 mil habitantes, funcionando das 8 as 18h, podendo aderir ao terceiro turno, até as 21h; CAPS III, acima de 200 mil habitantes, atendendo 24h com leitos de internação. Esses leitos são definido como leitos de Hospitalidade, e de acordo com a Portaria nº 854, DE 22 DE AGOSTO DE 2012, é utilizado recurso do projeto terapêutico singular de usuários já em acompanhamento no serviço, que recorre ao seu afastamento de situações conflituosas e vise ao manejo de situações de crise motivadas por sofrimento decorrente de transtornos mentais - incluídos aqueles por uso de álcool e outras drogas e que envolvem conflitos relacionais caracterizados por rupturas familiares, comunitárias, limites de comunicação e/ou impossibilidades de convivência e que objetive a retomada, o resgate e o redimensionamento das relações interpessoais, o convívio familiar e/ou comunitário. não deve exceder o máximo de 14 dias. Além dessas modalidades estão incluídas, o CAPS i – para cidades acima de 200 mil – atendendo das 8 as 18 ou com o terceiro turno, até 21h; CAPS ad – alcool e drogas – para municípios acima de 200 mil - 8 as 18 /21h; CAPS AD III – alcool e drogas – com atendimento 24 horas, leitos para hospitalidade e cidades acima de 200 mil habitantes. Em Fevereiro de 2005 a Portaria nº 245 destina incentivo financeiro para implantação de CAPS. Já em 2012, em meio o Programa Crack, é Possível vencer, a Portaria 130 de 26 de janeiro de 2012 redefine o CAPS AD III e seus respectivos financiamentos. Além dos serviços substitutivos, o programa de avaliação e descredenciamento dos leitos psiquiátricos e o auxílio financeiro para egressos dos hospitais de longa permanência foi sine qua non para impulsionar o processo de desmontagem dos hospitais psiquiátricos. O primeiro instituído pela Portaria/GM nº 251 de 31 de janeiro de 2002 que estabelece diretrizes e normas para a assistência hospitalar em psiquiatria, reclassifica os hospitais psiquiátricos, define e estrutura a porta de entrada para as internações psiquiátricas na rede do SUS. Estabelece ainda que os hospitais psiquiátricos integrantes do SUS deverão ser avaliados por meio do PNASH – Programa Nacional de Avaliação do Sistema Hospitalar/Psiquiatria e o segundo inaugurado por meio da Lei Nº 10.708 de 31 de Julho de 2003 que institui o auxílio-reabilitação psicossocial para assistência, acompanhamento e integração social, fora de unidade hospitalar. O auxílio é parte integrante de um programa de ressocialização de pacientes internados em hospitais ou unidades

psiquiátricas, denominado "De Volta Para Casa", sob coordenação do Ministério da Saúde. Alem desses dois importantes recursos de desinstitucionalização, a Portaria nº 52, de 20 de janeiro de 2004 inicia o Programa Anual de Reestruturação da Assistência Psiquiátrica Hospitalar no SUS – 2004 a fim de garantir uma transição segura de redução dos leitos hospitalares. Posteriormente, foi necessário pensar em outro equipamento que fortalecesse a vida social dos pacientes de saúde mental, então, em 2005, foi constituído mais um equipamento de cuidado em saúde mental, o Centro de Convivência e Cultura (CCC) por meio PORTARIA Nº 396 DE 07 DE JULHO DE 2005. Esse serviço torna-se estratégico para a inclusão social das pessoas com transtornos mentais (acima de 200.000 habitantes) pois revela-se como espaços de convívio e sustentação das diferenças na comunidade; construção de laços sociais e inclusão da pessoa com transtornos mentais nas atividades sociais da comunidade. O quarto período da Reforma é marcado pelo desafio imposto à saúde relacionado ao uso de Substancias Psicoativas, sobretudo o Crack e junto dela a necessidade de estratégias intersetoriais mais articuladas, criativas e efetivas. Em 2006, surge, no campo legislativo, a Lei nº 11.343/2006, que institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad) e estabelece medidas para a prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas, é o marco legal da mudança de paradigma e de procedimentos no Brasil. A lei contempla a perspectiva da intervenção integrada, pois envolvem diretamente as políticas de saúde, assistência social e segurança pública e, de forma complementar, ações de educação e de garantia de direitos. No campo da saúde, inclui ações de promoção da saúde e de conscientização sobre os riscos do uso de Crack, álcool e outras drogas, de disponibilização de serviços de atendimento e enfrentamento do tráfico. As ações do Programa são organizadas em três eixos temáticos: Prevenção, Cuidado e Autoridade. No eixo cuidado incluiu não só os serviços já citados da Rede de Saúde Mental, mas também outros que foram criados para viabilizar o cuidado nessa área. Dentre esses novos equipamentos destaca-se o Núcleo de apoio à saúde da Família (NASF) que é uma estratégia de ampliação das ações da atenção básica a partir de equipe composta por profissionais de diferentes áreas de conhecimento, que devem atuar de maneira integrada e apoiando os profissionais das Equipes Saúde da Família, das Equipes de Atenção Básica para populações específicas, compartilhando as práticas e saberes em saúde nos territórios sob responsabilidade destas equipes. Vale salientar que a Atenção Básica desempenha um papel importante na atenção à saúde mental, pois tem como princípio a atuação da equipe em domicílio, por meio de instrumentos facilitadores para criação de vínculos com os profissionais, família e sociedade. A ESF constitui-se de mais um espaço terapêutico para uma assistência humanizada e promoção da saúde. Deste modo, torna-se uma estratégia adequada para atender o paciente na área de Saúde Mental, visto que inserido no convívio social

Estabelecimento de vínculos, através de Centros de Convivência em cidade com mais de 200 mil habitantes.
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possibilita valorizar as trocas e a abertura de espaços para negociação. Outra estratégia de grande valor porque trata da vinculação com as pessoas de baixa coesão social são os Consultórios de Rua - Portaria 122 de 25 de janeiro de 2012 – Esse é definido por um trabalho realizado por multiprofissionais e lidam com diversos problemas e necessidades de saúde da população em situação de rua. Realizam busca ativa e utilizam-se do principio da Redução de Danos que é o princípio do zelo pelos cuidado de saúde do usuários de álcool, crack que muitas vezes pela condição de rua e pelo uso compulsivo não tem suas necessidades de saúde contempladas, desde as mais básicas até as mais complexas. Esse trabalho é realizado nas ruas, mas articulado com ações compartilhadas e integradas às UBS, CAPS, serviços de Urgência e Emergência. Funciona em três modalidades que se diferenciam pelo numero e qualificação dos profissionais. A Modalidade I é formada por 4 profissionais (2 médio; 2 superiores); Modalidade II por 6 profissionais (3 médio; 3 superiores); e a modalidade III : mesmos profissionais que constituem a modalidade II acrescida de um médico. Outro equipamento surge no início de 2012, também idealizado a partir do Programa Crack, as Unidades de Acolhimento (UA), constituídas pela Portaria 121 de 25 de Janeiro de 2012, são definidas como unidades de caráter transitório destinadas às pessoas com vulnerabilidade social e familiar, que demandem cuidados terapêuticos e protetivos devidos ao uso abusivo de substancias psicoativas. As pessoas inseridas na UA seguem o projeto terapêutico construído pelo CAPS de referência. Poderá ser construída em duas modalidades, a UA adulto – acima de 18 anos e dispondo de 10 a 15 vagas; UA i – entre 10 e 18 anos e com até 10 vagas. Entretanto, quando a crise mental não for passível de manejo em CAPS e ainda gerar risco para o próprio paciente ou para outro, é necessário que se faça a internação hospitalar nas enfermarias especializadas em hospital geral. Embora já existissem desde a Portaria N° 224/MS, DE 29 DE JANEIRO DE 1992, o Plano Crack qualifica esses leitos por meio da destinação de recursos para construção ou habilitação do Leitos em Hospital Geral. A PORTARIA Nº 148, DE 31 DE JANEIRO DE 2012 define as normas de funcionamento e habilitação do Serviço Hospitalar de Referência para atenção a pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades de saúde decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas, do Componente Hospitalar da Rede de Atenção Psicossocial. Concomitantemente a implantação dos serviços do Eixo cuidado do Plano Crack, o SUS começa a se organizar em uma Rede - Portaria 4.279 de 30 de Dezembro de 2010 - de serviços com o objetivo de superar a assistência fragmentada e “[...] aperfeiçoar o funcionamento político-institucional do Sistema Único de Saúde (SUS) com vistas a assegurar ao usuário o conjunto de ações e serviços que necessita com efetividade e eficiência” (BRASIL, 2010). Dentre as Redes prioritárias, a Rede de Assistência Psicossocial – RAPS tem como finalidade a criação, ampliação e articulação de pontos de atenção à saúde

para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Instituída pela PORTARIA Nº 3.088, DE 23 DE DEZEMBRO DE 2011, organiza os pontos de atenção da seguinte forma: Atenção Básica (Unidade Básica de saúde, Núcleo de apoio à saúde da Família NASF, Consultório de rua, Centro de Convivência e Cultura); Atenção psicossocial estratégica (todos os tipos de CAPS); Atenção de Urgência e Emergência (SAMU 192; Sala de estabilização; e UPA 24 horas e portas hospitalares de atenção à urgência/ PS); Atenção Residencial de caráter transitório (Unidades de Acolhimento); Atenção Hospitalar (Serviço Hospitalar de Referência); Atenção à Desinstitucionalização (SRT, Programa de Volta pra Casa e Geração de trabalho e renda e empreendimentos solidários e cooperativas Sociais, por meio da Portaria 132, de 26 de Janeiro de 2012

Atualmente, a Saúde Mental experimenta uma importante propulsão com a criação política de recursos humanos para a Reforma Psiquiátrica. Essas novas propostas de assistência no campo da saúde mental, exige de todos os profissionais a necessidade de rever conceitos, métodos e formas de lidar com o sofrimento psíquico, o que os torna agentes de mudanças para novos hábitos e atitudes a partir do conhecimento criativo e reflexivo que habilite os profissionais a realizarem invenções competentes no seu ambiente de trabalho, pautados na escuta, no diálogo e na construção do vínculo com usuários e familiares em prol da construção de projetos de inserção social, respeitando as possibilidades individuais e os princípios da cidadania.

A perspectiva, estigmatizante e excludente da loucura e da saúde mental levou a um tratamento coercitivo. O lema foi por séculos “aos loucos, o hospício”. A mudança desse paradigma e a luta pelos direitos dos portadores de doenças mentais perpassa, principalmente, pela mudança da lógica do cuidado. Entretanto, essa só ocorrerá mediante à vigilância e flexibilização da memória cultural da sociedade. A advocacia é, sobretudo, em prol da expansão do campo do saber e das prática, reinventar o cuidado a partir da perspectiva do sujeito, de como esse dá significado as suas experiências. É respeitando o limite, a vontade, o potencial e as fragilidades. É apostando que a saúde pode ser produzida pelo respeito ao outro, pela valorização da autonomia, pelo cuidado em liberdade e pela tolerância das diferenças. É deixando de lado o valor dos diagnósticos mentais em detrimento do cuidado, pois o diagnóstico importa para o tratamento medicamentos, mas não é preponderante à vida. O lema agora é “aos loucos, a vida” “à intolerância e ao preconceito, a loucura” “à cidadania, a luta”.

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i Doutora em Saúde Mental Pela USP e professora Adjunta II da Universidade Federal de Uberlândia).